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DISCIPLINA FINAIS DE ANÁLISE

Este trabalho visa discutir os possíveis finais de análise a partir do texto “Análise terminável e
interminável” (FREUD, 1937) avançando nos desdobramentos teóricos de Lacan. O texto de
Freud parece apontar certo pessimismo quanto à chegada de um fim de análise. Por um lado
ela termina, por outro não. Toda análise termina, mas isso não quer dizer que ela chegou ao
fim. Para Freud, uma análise termina quando o paciente já não sofre mais de seus sintomas e
ou superou suas ansiedades e inibições e o analista julgue que todo material recalcado foi
acessado pela consciência. (FREUD, 1937/1980, p. 251).

Em seu texto “Análise terminável e interminável” Freud apresenta alguns de seus pontos de
vista em relação ao fim da análise. Em alguns sujeitos, a análise visa o desaparecimento total
de seus sintomas e o não retorno destes, embora sempre haja algo que é irredutível ao
sintoma. O não desaparecimento total do sintoma não quer dizer que a análise não produziu
seu efeito. Não se trata de erradicar o sintoma tal qual persegue o modelo médico, embora a
análise tenha efeitos terapêuticos para o sujeito, mas manter uma nova relação com seu
sintoma, eficácia que é sempre variável, a depender de cada caso.

Freud discute a possibilidade de se existir um tempo quais as análises estão fixadas e nos traz o
caso do Homem dos Lobos, quando estabelece um limite para que seu paciente faça as
associações corretas e conte tudo de seus sintomas. Por um lado acelerou o processo e por
outro o fez ser interrompido antes de que o paciente chegasse a seu fim. Com isso viu que não
há um tempo propriamente estabelecido para o fim. Acelerar o processo serviria para
aumentar ainda mais as resistências do paciente.

A partir do caso do Homem dos Lobos, Freud também constatou que houve resquícios da
transferência anos após o término da análise e com isso avaliou se toda análise é passível de
término, apontando assim para alguns possíveis fins de análises pensados a partir das
estruturas. Aponta que a pulsão não deixa de querer se satisfazer, mas o analisante pode
aceitar e consentir com essa modo de satisfação pulsional que ele havia rejeitado e/ou
também pode produzir novos recalques, embora a última não dê garantias que o recalcado
não retorne. A exigência pulsional não muda, mas como sujeito se haverá com ela será a
questão que aponta para um final de análise.

A partir das dicussões sobre o final de análise, Freud fala sobre uma espécie de re-análise dos
analistas. Ressalta que a análise dos analistas não para no dito “fim de análise” e que estes
devem se submeter sempre que possível a um novo processo de autoanálise, pois o analista
também é efeito constante de seu inconsciente e também se depara com o complexo de
castração na transferência.

A partir dessa discussão, Freud então aponta que o fim de análise seria um encontro com o
rochedo da castração. Na mulher, a inveja do pênis a levaria a procurar algo além, como um
filho, um casamento, tornar-se bela. Já no homem o resultado seria a protesta viril, pois jamais
vai ultrapassar os limites do falo.

Já Lacan, aponta em vários textos alguns possíveis finais de análise. Em “função e campo da
palavra e da linguagem” (p.322, ESCRITOS) diz que num final de análise o sujeito tem a
capacidade de obter a satisfação com a satisfação do outro que está a seu redor (princípio de
solidariedade). Reconhece o desejo do outro mesmo que este nos seja muito desagradável.

No texto “A instância da letra” o final de análise é o inverso pois há a incompatibilidade da


palavra com o desejo. Não se trata das leis da palavras, mas sim das leis da linguagem e assim
temos a incompatibilidade da palavra com o desejo.

Para Colete Soller, onde Freud vê o final de análise como o rochedo da castração, Lacan vê o
mais além, uma solução. No fim de análise o sujeito não ultrapassa a sua divisão, que é dada
pela linguagem. Este permanece dividido diante de algumas coisas. O sujeito continuará
fazendo o recalque, não irá se tornar “santo”.

O mais além de Lacan (Informe de Daniel Lagache, p. 689) aponta para uma destituição
subjetiva: perde o que nunca se teve mas imaginava ter. Vai figurar na fantasia aquilo que
diante do qual o sujeito se vê abolir-se. Ou seja, responderei o meu desejo ainda que isso
possa me causar certo desconforto. O sujeito realiza-se como Desejo.

A partir de Freud, Lacan também aponta para o desejo do analista ao fim de cada análise. Toda
análise que chega a seu fim produz um analista, ainda que o ex analisando não venha a exercer
esse ofício. Mas ainda que essa análise tenha chegado ao fim, não quer dizer que uma nova
análise possa ser endereçada a outro analista. Calligaris, em seu texto “cartas para um jovem
terapeuta”, conta que a cada viagem que fazia gostava de iniciar novas análises.

A proposição de que toda análise produz um analista aponta para a questão do passe. Algumas
pessoas que chegaram a seu final de análise testemunhavam sobre a passagem de sua
condição de analisante a analista. Essa condição trata-se de uma transformação subjetiva. Ao
mesmo tempo em que Freud marca que “Aquilo que a análise realiza para os neuróticos nada
mais é do que aquilo que as pessoas normais ocasionam para si próprias sem o auxílio delas”,
Lacan marca uma diferença: de que o final de análise produz um analista e faz emergir um
novo desejo.

Ou seja, ao mesmo tempo em que pessoas que não se submeteram ao processo de análise
conseguem passar por dificuldades sozinhas, outras só passam por suas dificuldades através de
suas análises. São pessoas iguais em suas condições, mas aquele que se submete a análise
encontra-se advertido de seu desejo e do advento do Real.Sabe que pode realizar algo de seu
desejo na medida em que mais a frente o desejo será desejo de outra coisa, nunca realizado
completamente. Lacan salienta que ainda que haja o desejo do analista, ele não se coloca
como um modelo ideal, ainda que o analisando o coloque numa posição de sujeito suposto
saber. A diferenciação não se trata de colocar o analista numa certa normalidade ou posição
de perfeição diante de outras pessoas, mas a possibilidade de se ocupar a posição de um
analista para um outro. Empresta o saber que certa forma lhe foi útil durante seu próprio
processo de análise.

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