1- Agradecimento e apresentação do roteiro desse trabalho : vamos
abordar dois aspectos que considero importantes nessa nossa conversa : o final de análise, o que seria esse final e se podemos pensar finais diferentes para ambos os sexos . 2- Projeto e carta 52 : A primeira relação com a mãe. Relação na qual mãe e criança se completam numa célula única . Essa relação inicial nunca deixa de ser almejada como uma relação sem faltas . No momento que o desejo materno aponta para outros objetos surge um vazio nunca preenchido. A criança inicialmente alucina esse seio criando representações da coisa Das Ding(mãe-seio) . Nesse processo de representação da coisa há uma perda , Com a entrada do simbólico, (Nome do Pai) essa representação da coisa é substituída pela representação de palavra, ocorrendo nova perda. 3- Essa concepção inicial é retomada por Melanie Klein ( açougueira genial –para Lacan) com os conceitos de posições esquizo paranoide e depressiva , assinalando mais uma vez a perda desse paraiso perdido , com ênfase na culpa e depressão provenientes das fantasias geradas pela pulsão de morte. 4- Lacan fala então da estrutura marcada pela entrada do simbólico onde algo escapa, algo não simbolizável, deixando no sujeito uma marca indelével de incompletude e uma busca constante desse objeto perdido. A entrada do pai aparece como traumática, a entrada no simbólico marca o sujeito falante com a impossibilidade de dizer tudo, de recuperar a coisa perdida para sempre. Essa falta é de estrutura e nos acompanha desde a entrada no simbólico até a morte. É o lugar do desejo e da possibilidade de criar ,é o que nos move na busca do outro abrindo caminho para o novo.É também o mal-estar que se manifesta por toda a vida. 5- Ferenczi é bastante claro ao dizer em 1927, que o sucesso de uma análise depende de superar a compulsão à repetição graças a uma postura ativa do analista com a possibilidade de obter um fim à angústia de castração . 1- Voltando a Freud: Entre O projeto para uma psicologia científica (1895) à Análise terminável e interminável (1937), ocorre a criação da psicanálise. Nesse trabalho no final de sua vida, Freud responde a Ferenzi , dez anos depois ,trazendo uma visão do final de análise oposta ao final proposto por Ferenczi : 2- O repúdio da feminilidade pode ser nada mais que um fato biológico; uma parte do grande enigma do sexo. Seria difícil dizer se e quando conseguimos êxito em dominar esse fator num tratamento analítico. Só podemos consolar-nos com a certeza que demos à pessoa analisada todo incentivo possível para reexaminar e alterar sua atitude para com ele.(1937) 3- Diante desse rochedo intransponível , a castração, Freud sugere um final de análise como uma questão prática : o momento que analista e cliente não mais se encontram com essa finalidade. Assinala duas condições para que isso ocorra : 1- o paciente já não padece de seus sintomas, superou suas angústias e inibições . 2- o analista julga haver tornado consciente um tanto do recalcado, esclarecido um tanto do incompreensível, atenuando as resistências de tal forma que já não seja necessário temer os processos patológicos.Essa segunda condição sugere uma cura definitiva, mas a experiência de Freud indica , que esses efeitos podem ser transitórios e irregulares. Pois algo , por mais que se analise, escapa. E ele fala então do limite às possibilidades de um fim de análise: o rochedo da castração. Sugere ainda que os analistas retomem suas análises de tempos em tempos , confirmando assim esse impasse do fim de análise. 4- Freud nos fala das três profissões impossíveis :governar, educar e analisar. Lacan retoma isso no seminário 17, O avesso da psicanálise, trazendo os quatro discursos , governar, o discurso do mestre, educar, o discurso da universidade e analisar, discurso do analista. Acrescenta o discurso da histeria, discurso do analisando. Balint propõe o final de análise como a identificação com o ego forte do analista. Essa proposição nos remete claramente ao discurso do mestre ,cuja produção seria o objeto a enquanto um gozo a mais, gozo de significações, gozo do sintoma. Um giro nesse discurso nos traz o discurso da universidade onde o saber manifesto se vincula ao saber do mestre , sujeitos castrados na sua condição de criar e desejar. 5- Freud , ao se referir ao rochedo da castração traz a questão da impossibilidade do analista frente ao real. Como curar o incurável? Há um ponto sem retorno , além do qual , a análise não prossegue por razões de estrutura. Isso quer dizer que, ao final de uma análise, tanto o homem quanto a mulher mantém a referência fálica, valendo-se ambos do falo como o elemento de referência. 6- Surge a questão: Qual o final de análise que impõe a estrutura? Dessa questão podemos acrescentar duas outras: Qual a resposta lógica que o processo analítico dá a essa inércia pulsional? O impasse da castração é o verdadeiro impasse da análise? 7- Lacan nos sugere que ao invés da lógica que utiliza o falo como referente único, que universaliza o sujeito dentro de um saber fálico, torna-se necessário recorrer a um outro saber, onde o elemento que falta é o que permite dizer algo além do ponto que Freud colocou como limite. Esse saber não é universal, é particular. Só se pode saber um a um pois falta o elemento em relação ao qual poderíamos fazer uma referência totalizadora. 8- Em Bate-se uma criança Freud refere-se a um segundo tempo da análise no qual o paciente tem dificuldade de falar, ininterpretável, que somente a construção poderá introduzir. 9- Para falarmos do final de análise em Lacan , vamos partir das colocações feitas em 1967 e 68 , mais claramente explicitadas nos seminários sobre a Ética, sobre o ato analítico e na Proposição de 9 de outubro de 1967. Faremos ainda referência à conferência proferida na Universidade de Yale em 1975. Nessa conferência ,ele coloca que o final de análise é estar feliz na vida, Essa colocação, bem ao gosto dos americanos , na verdade traz de forma clara que o analista tem seu ponto de basta e esse ponto é inadiável. Ele retoma o que foi colocado no seminário VII sobre a Ética da psicanálise em 1960: O que nos demandam é a felicidade. Com isso não digo nada de novo . Uma demanda de felicidade, de hapiness . como escrevem os autores ingleses, é justamente disso que se trata .Não de uma felicidade no sentido aristotélico , de uma virtude obtida no meio termo através de uma disciplina de razoabilidade em função do próprio bem. Não se trata de uma harmonia psicológica, uma felicidade sem sombras .Na análise as coisas acontecem de outra forma. A felicidade com a qual o analista se compromete não está a serviço dos bens, dos bens da cidade. Trata-se da felicidade a serviço das leis do desejo. Essa é a novidade quanto ao compromisso que o analista assume com essa demanda de felicidade . Seria uma trapaça se ele se comprometesse de outra forma. A ética da Psicanálise implica na dimensão trágica da vida . Isso tem a ver com um fracasso fundamental da relação do desejo com a satisfação , numa impossibilidade de se dizer tudo, no impossível da relação sexua ,lnuma recusa de uma síntese totalitária. O final de uma análise está na singularidade de cada sujeito, homens ou mulheres . Ainda no seminário da ética , Lacan acrescenta : O final de uma análise leva o sujeito a atingir e conhecer o campo do desarvoramento absoluto, ao confronto com a realidade da condição humana.
No final de uma análise o objeto a , testemunha do que não é
absorvido pelo simbólico, presentifica-se na função de causa de desejo. Essa função até então velada pela transferência a partir do sujeito suposto saber, aponta o que, como resto encontra-se no final : o desejo do analista. Para terminar vou citar mais uma vez Lacan, no seminário da Ética , com uma colocação que ele vai desenvolver na Proposição de 9 de outubro de 1967 : Uma análise, se devemos concebe-la terminada para alguém, este deve encontrar-se na posição responsável em relação à análise, isto é, ele mesmo analista. Aqui faz-se presente o ato analítico em toda sua extensão. Não há mais o que interpretar.