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A reedição recente desse texto freudiano, feita pela Cosac Naif, além do
primor editorial que é uma marca da editora, nos brinda com o prazer de ler
uma bela tradução, acompanhada de uma introdução com os comentários da
tradutora, Marilene Carone, e de um denso e conciso trabalho de interpretação
do texto freudiano por Vladimir Safatle. Traz, ainda, uma entrevista com
Newton da Costa sobre o interesse de sua lógica paraconsistente para a
psicanálise lacaniana e um artigo de Andrés Raggio sobre a negação e a lógica
paraconsistente de Newton da Costa. Em suma, uma publicação muito
importante que extrai inúmeras consequências teórico-clínicas desse pequeno
texto seminal de Freud.
*
Psicanalista. Membro do Espaço Brasileiro de Estudos Psicanalíticos (EBEP). Doutora em
Ciências em Engenharia de Computação (COPPE/UFRJ, 1990).
admitir ou contestar se uma representação tem ou não existência na
realidade (FREUD, 2014, p. 23).
De fato, essa inadequação está posta desde sempre já que para Lacan
(2012, p. 135) a separação característica que produz o solo constitutivo de um
sujeito não é a separação do corpo da mãe, que poderia, de algum modo, vir a
ser entendida como uma metáfora da negação clássica. O processo originário
de separação entre o eu e o não-eu se inicia, não pela separação da criança do
corpo da mãe, mas pela separação vital entre o feto e seus invólucros
embrionários, nessa fase pré-especular em que se produz objeto a, como
primeiro resto dessa separação. Esse a é a primeira manifestação dessa
inadequação e, por isso, condição preliminar de todo objeto de desejo e de
todas as suas estranhas aparições posteriores que devem então ser negadas.
Através da negação, o sujeito diz duas coisas. Ele diz qual o objeto
imediato de seu desejo; por isso ele afirma algo. Mas ele diz também
que tal objeto lhe apareceu como desejante apenas por ter permitido que
algo de radicalmente heterogêneo encontrasse uma forma de se
manifestar em sua fala; por isso ele nega algo (SAFATLE, 2014, p. 49).
Lacan (1967-68), ao tratar o tema da negação, no seminário de 28 de
fevereiro de 1968, apresenta a fragilidade do argumento que interpreta a
afirmação freudiana “o inconsciente não conhece a contradição”, reduzindo-a
apenas à falha da operação gramatical: ¬(¬A)=A, e insiste que, na gramática, o
lugar em que o sujeito da enunciação está mais visível é exatamente no uso
deste “não” (na fórmula acima representado por ¬)
Referências bibliográficas
BORGES, J. L. A Biblioteca de Babel. In: Obras completas – volume I (1923-1949). São Paulo:
Globo, 2005.
DA COSTA, N. Psicanálise, Dialética e Lógica Paraconsistente. In: A negação. São Paulo:
Cosac Naif, 2014.
FREUD, S. (1925). A negação. São Paulo: Cosac Naif, 2014.
LACAN, J. (1962). O Seminário livro 10, A angústia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editores,
2004.
_______, (1967-68). O Seminário livro 15, O ato psicanalítico, notas do curso, publicação
informal.
SAFATLE, V. Posfácio – Aquele que diz “não”: sobre um modo peculiar de falar de si. In: A
negação. São Paulo: Cosac Naif, 2014.