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Table of Contents

Cover
Aviso
Aviso de Conteúdo
Dedicatória
Epígrafe
5h54
6h37
7h21
8h02
9h07
10h08
11h14
11h52
12h26
12h57
13h33
14h02
14h49
15h07
15h49
16h15
16h46
17h33
18h22
19h03
19h34
20h28
20h51
21h20
22h09
22h42
23h26
0h05
0h27
0h43
1h21
2h04
2h49
3h28
5h31
Nota da Autora
Agradecimentos
Par Kel Rod ,
qu am es li p i ro
Alerta de Conteúdo

Gatilhos

Anti-semitismo

Uso de drogas

Misoginia

Sexo

Representações

Personagens principais judeus

Personagens secundários bissexual e lésbica

Tropes

Rivals to Lovers
MENSAGEIRO
Pelo que vejo, senhorita, esse gentil-homem não se acha inscrito em vosso livro de notas.
BEATRICE
Não; se o estivesse, eu queimaria o livro.
—Muito Barulho por Nada por William Shakespeare

I used to dream of you nightly


I would wake up screaming
—“Make Good Choices” por Sean Nelson
5h54

McNIGHTMARE

Bom dia!

Este é um lembrete amigável de que você tem três (3)


horas e está contando antes de sofrer uma derrota
humilhante nas mãos de seu futuro orador da turma.

Traga lenços. Eu sei que você é uma chorona.

O texto me sacode do sono um minuto antes do meu alarme das 05:55, três toques rápidos para me
informar que minha pessoa menos favorita já está acordada. Neil McNair – “McNightmare”1 no meu
telefone – é irritantemente pontual. É uma de suas únicas qualidades.
Nós nos provocamos por mensagens de texto desde o segundo ano, depois de uma série de ameaças
matinais que nos atrasaram para a aula. Por um tempo, no ano passado, decidi ser a pessoa mais madura,
prometi fazer do meu quarto uma zona livre de McNair. Eu coloquei meu telefone no silencioso antes de
escorregar para a cama, mas debaixo do travesseiro, meus dedos se contraíram com respostas combativas. Eu
não conseguia dormir pensando que ele poderia estar me mandando mensagens de texto. Me
atormentando. Esperando.
Neil McNair se tornou meu despertador, se despertadores tivessem sardas e conhecessem todas as suas
inseguranças.
Eu jogo os lençóis para trás, pronta para a batalha.

oh, não sabia que ainda pensávamos que chorar era um sinal
de fraqueza

no caso de interesse de precisão, gostaria de salientar que


você só me viu chorar uma vez, e não tenho certeza de que
isso necessariamente me torna "uma chorona"

Por um livro!

Você estava inconsolável.

isso se chama emoção

eu recomendo fortemente se sentir uma (1) algum dia


Em sua mente, a única coisa que você deve sentir ao ler um livro é uma sensação de superioridade. Ele é o
tipo de pessoa que acredita que toda a literatura real já foi escrita por homens brancos mortos. Se pudesse,
ele traria Hemingway de volta à vida para um último coquetel, fumaria um charuto com Fitzgerald,
dissecaria a natureza da existência humana com Steinbeck.
Nossa rivalidade remonta ao primeiro ano, quando um (pequeno) painel de jurados declarou sua
redação a vencedora de um concurso para toda a escola sobre o livro que mais nos impactou. Eu quei em
segundo. McNair, em toda a sua originalidade, escolheu O Grande Gatsby. Escolhi Álbum de Casamento,
meu favorito da Nora Roberts, uma escolha da qual ele zombou mesmo após ganhar, insinuando que eu
não deveria ter cado em segundo lugar por escolher um romance. Esta era claramente uma postura
realmente válida para alguém que provavelmente nunca leu um.
Eu o desprezei desde então, mas não posso negar que ele tem sido um antagonista digno. Aquele
concurso de redação me deixou determinada a vencê-lo na próxima chance que tivesse, seja lá qual fosse – e
eu z, em uma eleição para representante de primeiro ano. Ele virou o jogo e estreitamente me ultrapassou
em um debate na aula de história. Então, colecionei mais latas do que ele para o clube do meio-ambiente,
nos consolidando ainda mais como competidores. Comparamos as pontuações dos testes e do GPA2 e
entramos em confronto em tudo, desde projetos escolares a competições na barra durante as aulas de
ginástica. Parece que não podemos parar de tentar superar um ao outro... até agora.
Após a formatura neste m de semana, nunca mais terei que vê-lo novamente. Sem mais mensagens de
texto pela manhã, sem mais noites sem dormir.
Estou quase livre.
Eu largo meu telefone de volta na mesa de cabeceira ao lado do meu diário de escrita. Está aberto para
uma frase que rabisquei no meio da noite. Eu acendo a lâmpada para dar uma olhada mais de perto, para ver
se minha besteira das duas da manhã faz sentido à luz do dia – mas o quarto continua escuro.
Franzindo a testa, eu mudo o interruptor mais algumas vezes antes de sair da cama e experimentar a luz
do teto. Nada. Choveu a noite toda, uma tempestade de junho jogando galhos e agulhas de pinheiro em
nossa casa, e o vento deve ter rompido uma linha de energia.
Pego meu telefone novamente. Doze por cento de bateria.
(E nenhuma resposta de McNair.)
— Mãe? — Eu chamo, correndo para fora do meu quarto e descendo as escadas. A ansiedade deixa
minha voz uma oitava mais alta do que o normal. — Pai?
Minha mãe coloca a cabeça para fora do escritório. Os óculos laranja estão tortos na ponta do nariz, e
seus longos cachos escuros – os que herdei – estão mais selvagens do que o normal. Nunca fomos capazes de
domesticá-los. Meus dois grandes inimigos na vida: Neil McNair e meu cabelo.
— Rowan? — minha mãe diz. — O que você está fazendo acordada?
— É de manhã?
Ela ajeita os óculos e olha para o relógio.
— Acho que já é manhã há algum tempo.
O escritório sem janelas está escuro, exceto por algumas velas no meio de sua enorme mesa, iluminando
pilhas de páginas cortadas com tinta vermelha.
— Você está trabalhando à luz de velas? — Eu pergunto.
— Nós tivemos que trabalhar. Faltou energia em toda a rua e estamos perto do prazo.
Meus pais, a dupla de autores e ilustradores Jared Roth e Ilana García Roth, escreveram mais de trinta
livros juntos, desde livros ilustrados sobre improváveis amizades entre animais até uma série de livros sobre
um paleontólogo adolescente chamado Riley Rodriguez. Minha mãe nasceu na Cidade do México, lha de
mãe judia e russa e pai mexicano. Ela tinha treze anos quando sua mãe se casou novamente com um texano e
mudou-se com a família para o norte. Até ir para a faculdade e conhecer meu pai judeu, ela passou os verões
no México com a família de seu pai, e quando eles começaram a escrever (palavras: mamãe, ilustrações:
papai), eles queriam explorar como uma criança pode abraçar às duas culturas.
Meu pai aparece atrás dela, bocejando. O livro no qual estão trabalhando é um spin-o sobre a irmã mais
nova de Riley, uma aspirante a chef de confeitaria. Bolos, tortas e macarons franceses saltam das páginas.
— Ei, Ro-Ro — ele diz, seu apelido usual para mim. Quando eu era criança, ele costumava cantar “reme,
reme, Rowan, seu barco”, e quei arrasada quando descobri que essas não eram as letras verdadeiras. —
Feliz último dia de aula.
— Não acredito que nalmente chegou. — Eu co olhando para o tapete, de repente tomada pelos
nervos. Já limpei meu armário e tirei minhas provas nais sem interrupções. Tenho muito o que fazer hoje –
como co-presidente do conselho estudantil, estou liderando a assembleia de despedida do último ano – para
car nervosa agora.
— Oh! — minha mãe exclama, como se de repente acordasse. — Precisamos de uma foto com o
unicórnio!
Eu gemo. Eu esperava que eles tivessem esquecido.
— Pode esperar até mais tarde? Eu não quero chegar atrasada.
— Dez segundos. E você não está assinando anuários e fazendo brincadeiras hoje? — Minha mãe segura
meu ombro e me sacode suavemente para frente e para trás. — Você está quase pronta. Não se estresse
tanto.
Ela sempre diz que carrego muita tensão nos ombros. Quando eu tiver trinta, meus ombros
provavelmente tocarão minhas orelhas.
Minha mãe vasculha o armário do corredor, voltando com a mochila em forma de unicórnio que usei no
meu primeiro dia de jardim de infância. Na foto do primeiro dia, sou toda radiante e otimista. Quando eles
tiraram uma foto no último dia do jardim de infância, parecia que eu queria colocar fogo naquela mochila.
Eles se divertiram tanto que tiraram fotos no primeiro e no último dia de aula desde então. Foi a inspiração
para seu livro de imagens best-seller, Unicorn Goes to School. É estranho, às vezes, pensar em quantas crianças
cresceram me conhecendo sem realmente me conhecer.
Apesar da minha relutância, a mochila sempre me faz sorrir. O pobre chifre do unicórnio está
pendurado por um o e falta um casco. Eu estico as alças o máximo que posso e faço uma pose torturada
para meus pais.
— Perfeito — minha mãe diz, rindo. — Você realmente parece estar em agonia.
Este momento com meus pais me faz pensar se hoje será um dia de últimas coisas. Último dia de aula,
última mensagem de texto de McNair, última foto com esta mochila envelhecida.
Não tenho certeza se estou pronta para dizer adeus a tudo ainda.
Meu pai bate no relógio.
— Devemos voltar a isso. — Ele me joga uma lanterna. — Para que você não precise tomar banho no
escuro.
Último banho do ensino médio.
Talvez essa seja a de nição de nostalgia: car piegas sobre coisas que deveriam ser insigni cantes.
Depois do banho, eu luto para colocar meu cabelo em um coque úmido, não con ando que ele vai secar ao
ar em uma forma lisonjeira. Em minha primeira tentativa, desenhei um olho de gato perfeito com
delineador líquido, mas tenho que me contentar com um pequeno movimento medíocre no lado esquerdo.
Meu domínio pela capacidade de aplicar uma face simétrica de maquiagem.
O último olho-de-gato do colégio, eu penso, e então me paro porque se eu chorar por causa do delineador,
não tenho chance de sobreviver ao dia.
McNair, com sua pontuação e letras maiúsculas, volta à tona como o pior jogo de Acerte a Toupeira do
mundo.

Você não é daquela vizinhança sem energia?

Eu odiaria marcar você com atraso... ou se você perder o


prêmio de comparecimento perfeito.

Eles já tiveram um (co)presidente do conselho estudantil


que ganhou zero prêmios?

A roupa que planejei dias atrás espera no meu armário: meu vestido azul sem mangas favorito com gola
Peter Pan, o que encontrei na seção vintage da Red Light. Quando eu experimentei e coloquei minhas mãos
nos bolsos, eu sabia que tinha que ser meu. Meu amigo Kirby certa vez descreveu meu estilo como
bibliotecária hipster encontrando uma dona de casa dos anos 1950. Meu corpo é o que as revistas femininas
chamam de “em forma de pêra”, com um peito grande e quadris maiores, e não tenho que lutar com roupas
vintage como faço com as modernas. Termino o look com meias até o joelho, sapatilhas e um cardigã creme.
Estou en ando um simples brinco de ouro no lóbulo de uma orelha quando o envelope chama minha
atenção. Claro – eu o de ni no início da semana, e tenho olhado para ele todos os dias desde então, uma
mistura de medo e excitação guerreando em meu estômago. Na maioria das vezes, o medo está vencendo.
Na minha caligra a de catorze anos, que é um pouco maior e mais volumosa do que agora, está escrito
ABRIR NO ÚLTIMO DIA DO ENSINO MÉDIO. Uma espécie de cápsula do tempo, no sentido de que eu a selei há
quatro anos e só pensei brevemente sobre ela desde então. Tenho apenas meia certeza do que está dentro
dele.
Não tenho tempo para ler agora, então coloco no meu JanSport marinho, junto com meu anuário e
diário.

como você não ficou sem jeito de zombar de mim depois de


quatro anos?

O que posso dizer, você é uma fonte infinita de inspiração.

e você é uma fonte infinita de enxaquecas

— Estou indo, amo vocês, boa sorte! — Grito para meus pais antes de fechar a porta da frente,
percebendo, com uma pontada no coração, que não poderei fazer isso no próximo ano.

Excedrin e Kleenex, NÃO SE ESQUEÇA.


Meu carro está estacionado no quarteirão, já que a maioria das garagens de Seattle mal são grandes o
su ciente para nossas decorações de Halloween. Uma vez lá dentro, eu ligo meu telefone no carregador,
pego um grampo do porta-copo e o coloco na minha montanha de cabelo, imaginando que estou en ando-
o no espaço entre as sobrancelhas de McNightmare.
Estou tão perto de ser oradora da turma. Mais três horas, como sua primeira mensagem me lembrou tão
proveitosamente. Durante a assembleia de despedida, o diretor da Westview High School vai chamar um de
nossos nomes e, na minha fantasia perfeita do último dia, é o meu. Há anos que sonho com isso: a
rivalidade para acabar com todas as rivalidades. O laço de veludo que envolveu minha experiência no ensino
médio.
No início, McNair cará tão arrasado que não conseguirá olhar para mim. Seus ombros carão
arqueados e ele cará olhando para a gravata, pois sempre se veste bem nos dias de festa. Ele vai se sentir tão
envergonhado, um perdedor de terno. Sob suas sardas, sua pele pálida cará vermelha para combinar com
seu cabelo ruivo amejante. Ele tem mais sardas do que rosto. Ele percorrerá cinco estágios de luto antes de
chegar à aceitação do fato de que, depois de todos esses anos, eu nalmente o venci. Eu ganhei.
Então ele vai olhar para mim com uma expressão de maior respeito. Ele vai mergulhar a cabeça em
deferência.
— Você merece isso — ele dirá. — Parabéns, Rowan.
E ele vai querer dizer isso.
Conheça Delilah Park ESTA NOITE em Seattle!

Publicidade Delilah Park <updates@delilahpark.com>


para destinatários não revelados
12 de junho, 6h35

Bom dia, amantes do amor!

A excursão Scandal at Sunset da autora de best-sellers internacionalmente Delilah Park


continua esta noite com uma parada na Books & More em Seattle às 20h. Não perca a
chance de conhecê-la pessoalmente e tirar sua foto com uma réplica de três metros do
Sugar Lake gazebo!

E não se esqueça de pegar o novo livro de Delilah, Scandal at Sunset, à venda agora!

X's e O's,

Equipe de publicidade do Delilah Park


6h37

McNIGHTMARE

Tique-taque.

O céu cinzento estremece com a ameaça de chuva, as árvores de cedro estremecem contra o vento. Café é
minha primeira prioridade, e Two Birds One Scone está a caminho da escola. Trabalho lá desde os dezesseis
anos, quando meus pais deixaram claro que não podíamos pagar as despesas estudantis fora do estado.
Embora eu tenha passado minha vida inteira em Seattle, sempre quis ir embora para a faculdade, se pudesse.
As bolsas cobrem a maior parte do meu primeiro semestre em uma pequena escola de artes liberais em
Boston chamada Emerson. Meu dinheiro do Two Birds vai cobrir todo o resto.
A cafeteria é decorada como um aviário, corvos e falcões de plástico observando você de todos os
ângulos. Eles são famosos não por seus scones, mas por seus bolinhos de canela, que têm o tamanho de um
bebê pequeno, cobertos com cobertura de cream cheese e servidos quentes.
Mercedes, uma graduada recente de Seattle, que trabalha de manhã para tocar em sua banda cover
feminina dos Van Halen, a Anne Halen, durante a noite, acena para mim atrás do balcão.
— Ei, oi — ela diz em sua voz muito animada antes das sete da manhã, já pegando um copo
compostável. — Latte de avelã com espuma extra?
— Você é maravilhosa. Obrigada. — A Two Birds é pequena, uma equipe de cerca de oito pessoas com
duas trabalhando por turno. Mercedes é minha favorita, principalmente porque ela toca música melhor do
que ninguém.
Meu telefone vibra enquanto espero, Mercedes cantarolando os grandes sucessos da banda Heart. Tenho
certeza de que é McNair – mas é algo muito mais emocionante.
A sessão de autógrafos de Delilah Park está no meu calendário há meses, mas no meio do meu último dia
de aula, de alguma forma esqueci que esta noite vou encontrar minha autora favorita. Até guardei algumas
brochuras na minha bolsa no início desta semana. Delilah Park escreve romances com heroínas feministas e
heróis tímidos e doces. Devorei These Guarded Hearts e Lay It on Me e Sweet as Sugar Lake, pelos quais ela
ganhou o maior prêmio de romance do país quando tinha vinte anos.
Delilah Park é a pessoa que me faz pensar que meus rabiscos no diário poderiam ser algo algum dia. Mas
ir a uma sessão de autógrafos em que os livros sendo assinados são romances signi ca admitir que sou
alguém que adora romances, o que parei de fazer depois daquele fatídico concurso de redação da nona série.
E talvez admitir que também sou alguém que está escrevendo um romance.
Aqui está meu dilema: minha paixão é, na melhor das hipóteses, o prazer culpado de outra pessoa. A
maior parte do mundo aproveita qualquer oportunidade para menosprezar essa coisa que centra as
mulheres de uma forma que a maioria das outras mídias não faz. Os romances são uma piada, apesar de
serem uma indústria de milhões de dólares. Mesmo meus pais não conseguem encontrar respeito por eles.
Minha mãe os chamou de “lixo” mais de uma vez, e meu pai tentou levar uma caixa deles para a doação no
ano passado, simplesmente porque eu estava sem espaço na minha estante e ele pensou que eu não sentiria
falta deles. Felizmente, eu o peguei no caminho para fora da porta.
Hoje em dia, tenho que esconder a maior parte da minha leitura. Comecei a escrever meu romance em
segredo, presumindo que contaria a meus pais em algum momento. Mas estou a alguns capítulos do m e
eles ainda não sabem.
— O melhor café com leite de avelã em toda Seattle — Mercedes diz enquanto o apresenta para mim. A
luz atinge os seis piercings em seu rosto, nenhum dos quais eu poderia fazer. — Você está trabalhando hoje?
Eu balancei minha cabeça.
— Último dia de escola.
Ela leva a mão ao coração em ngida nostalgia.
— Ah, escola. Lembro-me com carinho. Ou, pelo menos, eu me lembro de como as arquibancadas
pareciam quando eu estava atrás delas bolando uma escondida com meus amigos.
Mercedes não cobra, mas coloco uma nota de um dólar no frasco de gorjetas mesmo assim. Passo pela
cozinha ao sair, gritando um rápido olá/adeus a Colleen, a proprietária e padeira-chefe.
Os semáforos estão apagados ao longo de toda a Quarenta e Cinco, tornando cada cruzamento uma
parada de quatro vias. A escola começa às 7h05. Vou chegar em ponto, um fato que encanta McNair, com
base na frequência com que ele está apitando no meu telefone. Enquanto estou parada, mando uma
mensagem de voz para Kirby e Mara para que saibam que estou presa no trânsito e canto junto com minha
trilha sonora de dias chuvosos: The Smiths, sempre The Smiths. Tenho uma tia tão obcecada por new-wave
que os toca sem parar quando passamos os Hanukkahs e a Páscoa na casa dela em Portland. Nada ca
melhor com o tempo sombrio do que as letras de Morrissey.
Eu me pergunto como elas vão soar em Boston, batendo contra meus tímpanos enquanto eu caminho
por um campus coberto de neve em um casaco, meu cabelo en ado em uma touca de tricô.
O SUV vermelho na minha frente se move centímetros para frente. Eu me inclino para frente. Esta noite
se desenrola em minha mente. Eu deslizo para dentro da livraria, de cabeça erguida, nada daquelas
contorções dos ombros pela qual minha mãe está sempre me repreendendo. Quando me aproximo de
Delilah na mesa de autógrafos, trocamos elogios sobre os vestidos uma da outra e conto-lhe como seus livros
mudaram minha vida. No nal da nossa conversa, ela me encontra cheia de tanto talento que me pergunta
se pode ser minha mentora.
Não percebo que o carro na minha frente pisou no freio até que estou batendo nele, o café quente
escorrendo pela frente do meu vestido.
— Oh, merda. — Eu respiro fundo algumas vezes após me recuperar do choque de ser jogada para trás,
tentando processar o que aconteceu quando meu cérebro está preso em uma festa exclusiva de autores –
after-party que Delilah me convidou. O som áspero de metal contra metal está tocando em meus ouvidos, e
carros atrás de mim buzinando. Sou uma boa motorista! Eu quero contar a eles. Nunca sofri um acidente e
sempre vou no limite da velocidade. Talvez eu não consiga estacionar em paralelo, mas apesar das evidências
atuais do contrário, sou uma boa motorista. — Merda, merda, merda.
As buzinas continuam. O motorista do SUV estica o braço para fora da janela e me faz sinal para segui-lo
até uma rua residencial, então eu o faço.
Eu me atrapalho com meu cinto de segurança, café escorrendo pelo meu peito e acumulando no meu
colo. O motorista segue em direção à parte de trás de seu carro, e o nó de pavor no meu estômago se aperta.
Eu bati na traseira do garoto que me largou uma semana antes do baile.
— Eu sinto muito — eu digo enquanto tropeço para fora do meu carro, e então, porque eu não
reconheci: — hum. Você comprou um carro novo?
Spencer Sugiyama franze a testa para mim.
— Semana passada.
Eu inspeciono Spencer inspecionando o dano. Com o cabelo preto comprido obscurecendo metade do
rosto, ele se ajoelha ao lado do carro, que mal está arranhado. O meu tem um pára-choque dianteiro
mutilado e uma placa dobrada. É um Honda Accord usado, cinza e completamente desinteressante, com
um cheiro estranho de interior do qual nunca consegui me livrar. Mas é meu, pago inteiramente com meu
dinheiro do Two Birds One Scone no verão passado.
— Que diabos, Rowan? — Spencer, um clarinetista substituto com quem z parceria em um projeto de
história no início deste ano, costumava me olhar como se eu tivesse todas as respostas. Como se ele estivesse
impressionado comigo. Agora seus olhos escuros parecem cheios de uma mistura de frustração – e alívio,
talvez, por não estarmos mais juntos. Sinto uma onda de prazer por ele nunca ter sido o clarinetista
principal (E sim, ele tentou).
— Você acha que eu z isso de propósito? — Nem é preciso dizer que a separação não foi cordial. —
Você parou realmente de forma abrupta!
— É uma parada de quatro vias! Por que você estava indo tão rápido?
Obviamente, não menciono Delilah. É possível que o acidente tenha sido principalmente minha culpa.
Spencer não foi meu primeiro relacionamento, mas foi o mais longo. Tive dois namorados de uma
semana no primeiro e no segundo ano, o tipo de relacionamento que termina com texto porque você é
muito estranho para fazer contato visual na escola. No nal do primeiro ano, namorei Luke Barrows, um
jogador de tênis que fazia qualquer pessoa rir e gostava de festejar um pouco demais. Achei que o amava,
mas acho que o que realmente amei foi como me sentia perto dele: divertida, selvagem e bonita, uma garota
que gostava de redações de cinco parágrafos e também de brincar no banco de trás de um carro. Quando as
aulas começaram no outono, nós tínhamos terminado. Ele queria se concentrar no tênis, e quei feliz por
ter tempo extra para gastar em minhas aplicações da faculdade. Ainda dizemos oi quando nos vemos nos
corredores.
Spencer, porém – Spencer era complicado. Eu queria que ele fosse meu namorado perfeito do ensino
médio, o cara de quem um dia eu relembraria com meus amigos em coquetéis com nomes escandalosos.
Sonhei com aquele namorado durante todo o ensino fundamental, supondo que chegaria ao colégio e ele
estaria sentado atrás de mim na aula de inglês, batendo no meu ombro e timidamente pedindo uma caneta
emprestada.
Eu estava cando sem tempo para encontrar aquele namorado e pensei que se passássemos tempo
su ciente juntos, Spencer e eu poderíamos chegar a esse ponto. Mas ele agiu retraído e isso me deixou
pegajosa. Se eu gostava de quem eu era com Luke, odiava quem eu era com Spencer. Eu odiava me sentir tão
insegura. A solução óbvia era terminar com ele, mas eu aguentei, esperando que as coisas mudassem.
Spencer tira o cartão do seguro da carteira.
— Devemos trocar informações, certo?
Lembro-me vagamente disso das aulas da autoescola.
— Certo. Sim.
Nem sempre foi terrível com Spencer. A primeira vez que zemos sexo, ele me abraçou por muito tempo
depois, me convenceu de que eu era uma coisa preciosa e especial.
— Talvez ainda possamos ser amigos — disse ele quando terminou comigo. Uma separação covarde. Ele
queria se livrar de mim, mas não queria que eu casse brava com ele. Ele fez isso na escola, pouco antes de
uma reunião do conselho estudantil. Disse que não queria começar a faculdade com uma namorada.
— Spencer e eu acabamos de terminar — disse a McNair antes de iniciarmos a reunião. — Então, se você
pudesse não ser mau comigo pelos próximos quarenta minutos, eu agradeceria.
Não tenho certeza do que esperava – que ele parabenizasse Spencer? Me dizer que eu mereci? Mas suas
feições suavizaram em uma expressão que eu nunca tinha visto e não conseguia nomear.
— Tudo bem — disse ele. — Eu... eu sinto muito.
O pedido de desculpas soou tão estranho em sua voz, mas começamos a reunião antes que eu pudesse me
demorar nisso.
— Eu realmente esperava que pudéssemos continuar amigos — diz Spencer após tirarmos fotos dos
cartões de seguro um do outro.
— Estamos no Facebook.
Ele revira os olhos.
— Não é o que eu quis dizer.
— O que quis dizer, então? — Eu me inclino contra o meu carro, me perguntando se nalmente vou
conseguir um encerramento. — Vamos mandar mensagens um para o outro sobre os horários das aulas da
faculdade? Assistir a um lme juntos quando estivermos em casa no intervalo?
Uma pausa.
— Provavelmente não — ele admite.
Então esse é não é um encerramento.
— Devíamos ir para a escola — diz Spencer quando co em silêncio por um segundo a mais. — Já
estamos atrasados, mas provavelmente eles não vão se importar no último dia.
Atrasada. Não quero nem pensar nas McMensagens esperando por mim no meu telefone.
Eu dou um pequeno aceno do meu cartão do seguro antes de colocá-lo de volta na minha carteira.
— Eu acho que seu seguro vai ligar para o meu. Como algo do tipo.
Ele acelera antes que eu possa ligar o motor. Meus pais não precisam saber sobre isso ainda, não
enquanto estiverem com um prazo nal. Ainda trêmula – por causa do impacto ou da conversa, não tenho
certeza –, tento relaxar meus ombros. Realmente há muita tensão aqui.
Se eu estivesse em um romance, teria entrado em uma briga com o cara bonito que é dono de um bar e
também trabalha meio período em construção, o tipo de cara que é bom com as mãos. A maioria dos
mocinhos dos romances são bons com as mãos.
Eu me convenci que se eu apenas esperasse o su ciente com Spencer, ele se transformaria naquele cara e
o que nós tínhamos se transformaria em amor. Embora adore romance, nunca acreditei no conceito de
almas gêmeas, que sempre me pareceu um pouco com o ativismo pelos direitos dos homens: não uma coisa
real. O amor não é imediato ou automático; requer esforço, tempo e paciência.
A verdade é que provavelmente nunca teria o tipo de sorte com o amor que as mulheres que vivem em
cidades litorâneas ctícias têm. Mas às vezes tenho essa sensação estranha, uma dor não por algo que sinto
falta, mas por algo que nunca conheci.

Começa a chover novamente quando me aproximo da Westview High School por que é Seattle. A sala de
aula já começou, e eu admito, minha vaidade é mais forte do que minha necessidade de chegar na hora. Já
estou atrasada. Alguns minutos a mais não farão diferença.
Quando chego ao banheiro e tenho uma visão clara de mim mesma no espelho, quase engasgo. A
mancha cobre totalmente um peito e meio. Passo um pouco de água e sabão em meu vestido, esfregando-o
com toda a força que consigo reunir, mas depois de cinco minutos, a mancha ainda está muito marrom e
tudo que consegui foi tentativas no banheiro do primeiro andar.
Não é mais a minha roupa perfeita do último dia, mas é tudo o que tenho. Eu limpo a umidade com
uma toalha de papel para que pareça um pouco menos que estou amamentando e ajusto meu suéter para
esconder a mancha o melhor possível. Eu mexo com minha franja, penteando-a com os dedos para a direita
e depois para a esquerda. Nunca consigo decidir se devo deixar crescer ou mantê-la curta. Agora elas roçam
minhas sobrancelhas, apenas o tempo su ciente para eu mexer com elas. Talvez eu as corte para a faculdade,
tente um visual tipo Bettie Page.
Estou quase terminando de car inquieta quando algo atrai minha atenção no espelho: um pôster
vermelho com letras maiúsculas.
HOWL
12 DE JUNHO

MEIO-DIA
GRAND PRIZE TBA

Outra coisa que passou pela minha cabeça na correria da manhã. Howl é uma tradição da Westview
High para formandos. É um jogo que é parte detetive, parte caça ao tesouro. Os jogadores perseguem uns
aos outros enquanto tentam decifrar os enigmas que os levam a toda Seattle. O primeiro a completar as
pistas ganha um prêmio em dinheiro. É promovido pelos calouros do conselho estudantil todo ano como
uma despedida para os formandos daquele ano, e no ano passado McNair e eu quase nos matamos tentando
organizá-lo. Claro que vou jogar, mas não posso pensar nisso até depois da assembléia.
Quando saio do banheiro, a Sra. Grable, minha professora de inglês do segundo e terceiro ano, sai
correndo da sala dos professores do outro lado do corredor.
— Rowan! — ela diz, os olhos brilhando. — Eu não posso acreditar que você está nos deixando!
A Sra. Grable, que deve ter apenas vinte e tantos anos, assegurou-se de que nossa lista de leituras fosse
composta, em sua maioria, por mulheres e autoras negras. Eu a amo.
— Todas as coisas boas têm um m — eu digo. — Até o ensino médio.
Ela ri.
— Você é talvez uma de cinco alunos meus que já me zeram sentir assim. Eu não deveria te dizer isso,
mas — ela se inclina, cobre a boca com uma mão conspiratória — você e Neil foram meus alunos favoritos.
É quando meu coração despenca até os dedos dos pés. Em Westview, sempre fui colocada com McNair.
Nunca deixamos de ser mencionados ao mesmo tempo, Rowan contra Neil e Neil contra Rowan, ano após
ano após ano. Eu observei tudo, de terror a pura alegria, passar pelo rosto de um professor no início do ano
ao perceber que eles têm nós dois em sua classe. A maioria acha nossa rivalidade divertida, colocando-nos
um contra o outro em debates e nos associando em projetos. Parte do motivo pelo qual quero tanto ser
oradora da turma é que quero terminar o ensino médio como eu mesma, não a metade de um casal
guerreiro.
Eu me forço a sorrir para a Sra. Grable.
— Obrigada.
— Você está indo para Emerson, certo? — ela pergunta, e eu aceno. — Seus ensaios sempre foram tão
perspicazes. Planejando seguir os passos de seus pais?
Quão difícil seria dizer sim?
Embora, é claro, eu esteja preocupada com a forma como as pessoas reagem aos romances, há outro
medo que me faz encolher os ombros quando as pessoas perguntam o que quero ser quando crescer.
Enquanto ser escritor é um sonho que ca na minha cabeça, não tenho que enfrentar a realidade de
potencialmente não ser boa o su ciente. Na minha cabeça, sou minha única crítica. Lá fora, todo mundo
será.
Assim que eu me declarar escritora, as expectativas surgirão por ser lha de Ilana e Jared. E se de alguma
forma eu não conseguir atendê-las, se for confuso e imperfeito e ainda estiver aprendendo, o julgamento
seria mais severo do que se meus pais fossem podólogos, chefs ou estatísticos. Contar às pessoas signi ca que
acho que posso ser ok nisso – ser boa nisso – e, embora queira desesperadamente que isso seja verdade, estou
apavorada com a possibilidade de não ser.
Pelo menos ninguém espera que eu saiba minha especialização ainda, então, embora eu tenha escolhido
Emerson em grande parte por causa de seu ótimo programa de redação criativa, tenho dito às pessoas "Não
tenho certeza ainda" quando perguntam o que vou estudar. Nunca esperei querer seguir os passos dos meus
pais, mas aqui estou, sonhando em passar o dedo pelo meu nome em uma capa. Idealmente, em uma fonte
com relevo brilhante.
— Talvez — concordo por m, o que parece uma meia con ssão, mas justi co com o fato de que não
verei a Sra. Grable novamente após a formatura. Para alguém que ama as palavras, às vezes não sou muito
boa em pronunciá-las.
— Se alguém pudesse publicar um livro, seria você! A menos que Neil consiga chegar lá antes de você.
— Eu deveria ir para a aula — eu digo o mais gentilmente que posso.
— Claro, claro — ela diz, e me envolve em um abraço antes de seguir pelo corredor.
O dia de hoje está cheio de tantos últimos, e talvez o mais importante seja que é o último dia em que
posso derrotar McNair de uma vez por todas. Como oradora da turma, vou encerrar nosso cabo de guerra
acadêmico. Eu serei Rowan Luisa Roth, oradora da Westview High School, com um ponto nal no nal.
Sem vírgula, sem “e”. Apenas eu.
Meu seguidor de regras interno me guia para o escritório principal, em vez da sala de aula. Vou me sentir
pior entrando na aula sem um passe atrasado, mesmo no último dia. Quando chego ao escritório, empurro
a porta, endireito os ombros – e co cara a cara com Neil McNair.
Rowan Roth contra Neil McNair: Uma Breve História

SETEMBRO, PRIMEIRO ANO


O concurso de redação que deu início a tudo. É anunciada a primeira semana de aula para nos receber
de volta das férias de verão. Estou acostumada a ser a melhor escritora da classe. É quem eu tenho sido
durante todo o ensino fundamental, da mesma forma, eu imagino, que esse ruivo magrelo com
muitas sardas foi na escola dele. Primeiro lugar, McNair e seu amado Fitzgerald, segundo lugar, Roth.
Juro vencê-lo no que vier a seguir.
NOVEMBRO, PRIMEIRO ANO
O presidente do conselho estudantil visita tutores para pedir voluntários para o representante de
calouros. A liderança cará bem nas minhas futuras aplicações da faculdade, e eu preciso de bolsas de
estudo, então me voluntario. O mesmo acontece com McNair. Não tenho certeza se ele realmente
quer ou se só quer me irritar ainda mais. Mesmo assim, ganho por três votos.
FEVEREIRO, SEGUNDO ANO
Somos ambos obrigados a fazer ginástica para uma exigência de educação física, apesar da hora que
passamos tentando convencer o conselheiro de que, em vez disso, precisamos de espaço em nossos
horários para as aulas avançadas. Nenhum de nós pode tocar os dedos dos pés, mas McNair pode
fazer três exões, enquanto eu só consigo fazer uma e meia. Seus braços não têm de nição alguma,
então não entendo como isso é possível.
MAIO, SEGUNDO ANO
McNair obteve um resultado perfeito de 1600 no SAT e eu pontuo 1560. Volto a fazê-lo no mês
seguinte e pontuo 1520. Não conto a ninguém.
JANEIRO, TERCEIRO ANO
Nosso professor de química avançada nos torna parceiros de laboratório. Depois de um punhado de
discussões, derramamentos de produtos químicos e um (pequeno) incêndio, que talvez tenha sido
principalmente minha culpa, mas vou levar isso comigo para o túmulo, ele nos separa.
JUNHO, TERCEIRO ANO
Na eleição para presidente do conselho estudantil, a votação é dividida perfeitamente ao meio.
Nenhum de nós concorda. Relutantemente, nos tornamos co-presidentes.
ABRIL, ÚLTIMO ANO
Antes que as cartas de aceitação para a faculdade comecem a chegar, eu o desa o a ver quem consegue
obter mais aprovações. McNair sugere que, em vez disso, comparemos as porcentagens. Supondo que
ambos estejamos lançando redes largas, eu concordo. Eu entro em 7 das 10 escolas nas quais me
inscrevo. Só depois de todos os prazos terem passado é que descobri que McNair, astuto e
supercon ante como é, se inscreveu em apenas uma escola.
Ele entra.
7h21

— ROWAN ROTH — MEU pior pesadelo diz atrás da recepção. — Trouxe uma coisa para você.
Minha frequência cardíaca dispara, como sempre acontece antes de uma partida de discussão com
McNair. Eu tinha esquecido que ele é um assistente de escritório (também conhecido como puxa-saco 101
– por favor, até eu sou melhor do que isso) durante a tutoria. Eu esperava mantê-lo con nado ao meu
telefone até a assembleia.
Com as mãos cruzadas à sua frente, ele parece um rei malvado sentado em um trono feito com os ossos
de seus inimigos. Seu cabelo ruivo está úmido do banho matinal, ou talvez da chuva, e como previsto, ele
está em um de seus ternos de dia de reunião: jaqueta preta, camisa branca, gravata estampada azul com o nó
mais rme e nítido que eu já vi. Ainda assim, consigo identi car seus defeitos imediatamente: as calças meio
centímetro mais curtas, as mangas meio centímetro mais compridas. Uma impressão digital borrada na
lente esquerda de seus óculos, uma teimosa mecha de cabelo atrás da orelha que não ca esticada.
Seu rosto, porém – seu rosto é a pior parte, seus lábios se curvam em um sorriso que ele aperfeiçoou após
vencer aquele concurso de redação da nona série.
Antes que eu possa responder, ele en a a mão no bolso da jaqueta e me joga um pacote de lenços de
papel para viagem. Graças a Deus eu peguei, apesar de uma grave falta de coordenação motora.
— Você não precisava — eu digo inexpressiva.
— Só cuidando da minha co-presidente no último dia do nosso período letivo. O que o traz ao escritório
nesta manhã tempestuosa?
— Você sabe por que estou aqui. Apenas me dê um passe. Por favor.
Ele franze a testa.
— Que tipo de passe, exatamente, você quer?
— Você sabe que tipo de passe. — Quando ele dá de ombros, continuando a ngir ignorância, faço uma
reverência profunda e dramática. — Oh McNair, senhor do escritório principal — eu digo em uma voz que
exala melodrama, com a intenção de responder a sua pergunta o mais detestável possível. Se ele vai
transformar isso em uma produção, vou jogar junto. A nal, só tenho mais algumas chances de mexer com
ele. Posso ser ridícula enquanto eu ainda puder. — Eu humildemente peço que você me conceda um pedido
nal: uma porra de um passe de atraso.
Ele gira sua cadeira para pegar uma pilha de papéis verdes da gaveta da escrivaninha, movendo-se no
ritmo de xarope de bordo em um dia de trinta graus. Até conhecer McNair, não sabia que a paciência podia
ser sentida como um pedaço físico de mim, algo que ele estica e torce sempre que tem uma chance.
— Foi essa a sua impressão da Princesa Leia nos primeiros vinte e cinco minutos de Uma Nova
Esperança, antes de ela perceber que não era realmente britânica? — ele pergunta. Quando eu dou a ele um
olhar perplexo, ele estala a língua, como se eu não entender a referência o machuque em um nível molecular.
— Eu sempre esqueço que minhas grandes vintage falas de Star Wars são desperdiçadas com você, Artoo.
Por causa do meu nome alternativo, ele me apelidou de Artoo, em homenagem a R2-D2, e embora eu
nunca tenha visto lmes, acho que R2-D2 é algum tipo de robô. É claramente um insulto, e seu interesse
obsessivo pela franquia matou qualquer desejo que eu pudesse ter tido de assistir.
— Parece justo quando tantas coisas são desperdiçadas com você — eu digo. — Como meu tempo. Com
certeza, vá o mais devagar possível.
A sabotagem faz parte de nossa rivalidade quase desde o início, embora nunca tenha sido maliciosa.
Houve uma vez em que ele deixou o pendrive conectado a um computador da biblioteca e eu o enchi de
músicas dubstep, a vez em que ele derramou o chili misterioso da lanchonete na minha tarefa de matemática
com créditos extras. E minha favorita: a vez em que subornei a zeladora com um conjunto autografado dos
livros dos meus pais para os lhos dela em troca da combinação do armário de McNair. Vê-lo lutar com isso
depois que eu mudei foi impagável.
— Não me teste. Eu posso ir muito mais devagar. — Como que para provar, ele leva dez segundos
inteiros para destampar uma caneta esferográ ca. É uma performance real, e preciso de toda a minha força
de vontade para não mergulhar na mesa e arrancá-la dele. — Acho que isso signi ca que não há prêmio de
comparecimento perfeito — ele diz enquanto escreve meu nome.
Até suas mãos estão pontilhadas de sardas. Uma vez, quando estava entediada durante uma reunião do
conselho estudantil, tentei contar cada sarda em seu rosto. A reunião terminou quando eu cheguei aos cem
e nem tinha terminado de contar.
— Tudo que eu quero é ser a oradora o cial — eu digo, forçando o que espero ser um sorriso doce. —
Nós dois sabemos que os prêmios menores realmente não signi cam nada. Mas será um bom prêmio de
consolação para você. Você pode colocar o certi cado em sua parede ao lado do alvo de dardos com meu
rosto nele.
— Como você sabe como é o meu quarto?
— Câmeras ocultas. Em todos os lugares.
Ele bufa. Estico o pescoço para ver o que ele está escrevendo ao lado de "motivo do atraso".
Tentou tingir o vestido de marrom. Falhou espetacularmente.
— Isso é mesmo necessário? — Eu pergunto, puxando meu cardigã bem no meu vestido e a mancha de
café que grita aqui é onde meus seios estão! — Eu estava presa no trânsito. Todas as luzes do meu bairro
estavam apagadas. — Não conto a ele sobre o arranhãozinho do carro.
Ele veri ca a caixa marcada PERDIDOS e rasga o passe do bloco – rasgando-o no meio.
— Oops — ele diz em um tom que sugere que ele não se sente mal. — Acho que tenho que escrever
outro.
— Legal. Eu não tenho outro lugar para estar.
— Artoo, é o nosso último dia — diz ele, levando a mão ao coração. — Devemos valorizar esses
momentos preciosos que temos juntos. Na verdade — ele en a a mão no bolso do paletó em busca de uma
caneta extravagante — este seria um ótimo momento para praticar minha caligra a.
— Você não está falando sério.
Sem piscar, ele me olha por cima de seus óculos ovais nos.
— Como Ben Solo, eu nunca brinco sobre caligra a.
Certamente esta é a minha história de origem de vilã. Ele pressiona a ponta da caneta no papel e começa
a formar as letras do meu nome novamente, os óculos escorregando pela ponte do nariz. O rosto de
concentração de McNair é meio hilário, meio aterrorizante: dentes cerrados e mandíbula apertada, boca
ligeiramente contraída para um lado. O terno o faz parecer tão rígido, tão in exível, como um contador, um
vendedor de seguros ou um gerente de nível inferior em uma empresa que fabrica software para outras
empresas. Eu nunca o vi em uma festa. Não consigo imaginá-lo relaxando o su ciente para assistir a um
lme. Nem mesmo Star Wars.
— Realmente impressionante. Bom trabalho. — Eu digo isso sarcasticamente, mas meu nome realmente
ca bem naquela delicada tinta preta. Eu poderia imaginar isso na capa de um livro.
Ele passa o papel para mim, mas o segura com força, me impedindo de escapar.
— Espere um segundo. Eu quero te mostrar algo.
Ele solta o passe tão de repente que eu tropeço para trás, então pulo da cadeira e saio do escritório. Estou
aborrecida, mas curiosa, então o sigo. Ele para em frente à estante de troféus da escola e dá um aceno teatral
com o braço.
— Estou aqui há quatro anos, então, de fato, já vi essa estante de troféus antes — digo.
Mas ele está apontando para uma placa em particular, gravada com nomes e datas de formatura. Com o
dedo indicador, ele bate no vidro.
— Donna Wilson, 1986. Primeira oradora da turma de Westview. Você sabe o que ela acabou fazendo?
— Salvou-se quatro anos de agonia ao se formar três décadas antes de você se matricular aqui?
— Perto. Ela se tornou a embaixadora dos EUA na Tailândia.
— Como isso é perto?
Ele acena com a mão.
— Steven Padilla, 1991. Ganhou o Prêmio Nobel de Física. Swati Joshi, 2006. Medalha de ouro olímpica
no salto com vara.
— Se você está tentando me impressionar com seu conhecimento de ex-oradores da turma, está
funcionando. — Eu me aproximo dele, batendo meus cílios. — Estou tão excitada agora.
É exagero, eu sei, mas essa sempre foi a maneira mais fácil de irritar esse cara aparentemente
imperturbável. Ele e sua última namorada, Bailey, nem mesmo se reconheciam na escola, e eu me perguntei
como eles eram fora dela. Quando pensei sobre ele trocando seu exterior de pedra por tempo su ciente para
uma sessão de amasso, senti um pequeno tremor estranho na minha barriga. Foi assim que achei horrível a
ideia de alguém beijando Neil McNair.
Assim como eu esperava, ele cora. Sua pele é tão clara sob as sardas que ele nunca consegue esconder o
que realmente sente.
— O que estou tentando dizer — diz ele depois de limpar a garganta — é que Westview High tem um
histórico de oradores bem-sucedidos. O que isso diria para você – Rowan Roth, crítica de romance? Não
está exatamente no mesmo nível que os outros, não é?
Eu disse a Kirby e Mara que não os leio mais, mas McNair traz à tona meus romances sempre que pode.
Seu tom depreciativo é a razão de mantê-los para mim hoje em dia.
— Ou talvez você se gradue para escrever um de sua autoria — continua ele. — Mais romances –
exatamente o que o mundo precisa.
Suas palavras me empurram para trás até que suas sardas se misturem. Não quero que ele saiba o quanto
isso me enfurece. Mesmo se eu chegar ao ponto em que “autora de romance” está vinculado ao meu nome,
pessoas como McNair não hesitarão em me derrubar. Para rir daquilo que amo.
— Deve ser triste — eu digo — desprezar tanto o romance que a ideia de outra pessoa encontrar alegria
nele é tão repulsivo para você.
— Achei que você e Sugiyama tivessem terminado.
— Eu– o quê?
— A alegria que você encontra no romance. Presumi que fosse Spencer Sugiyama.
Sinto meu rosto esquentar. Isso é... não é onde eu pensei que isso estava indo.
— Não. Não Spencer. — Então eu vou para um golpe baixo: — Você está diferente hoje, McNair. Suas
sardas se multiplicaram durante a noite?
— Você é aquela com as câmeras escondidas.
— Infelizmente, eles não são HD. — Eu me abstenho de fazer uma piada suja que eu realmente quero
fazer. Eu mostro a folha verde na frente de seu rosto. — Já que você foi gentil o su ciente para me escrever
um passe de atraso, eu provavelmente deveria, você sabe, usá-lo.
Última sala de aula. Espero que a caminhada para a aula seja o su ciente para fazer meu sangue voltar a
uir normalmente. Minha adrenalina sempre faz hora extra quando estou falando com McNair. O estresse
que ele me causou provavelmente cortou meia década da minha vida.
Com um aceno de cabeça, ele diz:
— Fim de uma era. Você e eu, quero dizer. — Ele balança o dedo indicador entre nós dois, sua voz mais
suave do que há dez segundos.
Fico quieta por um momento, me perguntando se hoje carrega o mesmo senso de nalidade para ele que
tem para mim.
— Sim — eu digo. — Eu acho que sim.
Em seguida, ele faz um movimento de enxotar com uma das mãos, arrancando-me da minha nostalgia e
substituindo-a pelo desprezo que tem sido como um cobertor quente e uma cama de pregos. Um conforto
e uma maldição.
Adeus, adeus, adeus.
AVISO VENCIDO

Biblioteca da Westview High School


<westviewlib@seattleschools.org>
para r.roth@seattleschools.org
10 de junho, 14h04

Esta é uma mensagem automática da WESTVIEW HIGH SCHOOL LIBRARY.

Os registros da biblioteca mostram que os itens a seguir estão atrasados. Renove-os ou


devolva-os à biblioteca imediatamente para evitar multas.

- Seu guia para um 5: AP Calculus / Griffin, Rhoda


- Conquistando o exame AP Government / Wagner, Carlyn
- Notas de amor: romances através dos tempos / Smith, Sonia e Tilley, Annette
- Analisando Austen / Ramirez, Marisa
- What Now: Life After Senior Year / Holbrook, Tara
8h02

QUINZE MINUTOS COM ele, e já sinto uma McEnxaqueca chegando. Eu esfrego o espaço entre meus
olhos enquanto corro para a sala de aula.
— Nossa futura oradora o cial — diz a Sra. Kozlowski com um sorriso quando lhe entrego meu passe de
atraso, e espero que ela esteja certa.
Nossos tutores estão misturados para fomentar a camaradagem entre as séries. McNair propôs isso há
dois anos no conselho estudantil, e o diretor aceitou. Não foi a pior ideia, eu acho, se você ignorasse cada
um de nossos outros problemas mais urgentes: plágio desenfreado entre a classe de calouros, a necessidade
de um cardápio de refeitório expandido para acomodar restrições dietéticas, reduzindo nossa pegada de
carbono.
Antes de ir até Kirby e Mara, um trio de calouras se lança sobre mim.
— Oi, Rowan! — disse Olivia Sweeney.
— Estávamos preocupadas que você não estivesse aqui! — diz sua amiga Harper Chen.
— Bem... eu estou aqui — eu digo.
— Graças a Deus — diz Nisha Deshpande, e as três riem.
Estamos todas no conselho estudantil, onde elas unanimemente deram seu apoio a mim em vez de a
McNair, pelo qual sempre fui grata. Elas elogiaram minhas roupas e trabalharam em minhas campanhas e
me trouxeram cupcakes quando entrei em Emerson. Kirby e Mara os chamam de meu fã-clube. Na verdade,
elas são muito doces, embora um pouco ansiosas demais.
— Está tudo pronto para o Howl? — Eu pergunto.
Os três trocam sorrisos perversos.
— Estamos prontas há semanas — diz Nisha. — Não quero dizer que será o melhor Howl que a escola já
viu, mas pode ser.
— Não estamos dando nenhuma pista — acrescenta Harper.
— Por mais que queiramos. — Olivia se abaixa para puxar uma de suas meias até o joelho, que são
assustadoramente semelhantes ao par que estou usando.
— Sem dicas — eu concordo. McNair e eu organizamos o jogo no ano passado, mas nenhum dos locais
do ano anterior pode ser reutilizado.
— Você vai assinar nossos anuários? — Nisha pergunta. — Já que é seu último dia?
Três braços empurraram canetas permanentes em minha direção. Assino todos eles com mensagens
ligeiramente diferentes e, após um coro de agradecimentos, me viro para Kirby e Mara, que estão acenando
para mim de um canto da sala. Minha mãe estava certa; tudo o que estamos fazendo é assinar anuários.
Temos uma tutoria estendida, depois a assembleia, e depois as aulas encurtadas para todos que ainda estão
aqui.
— Aí está você — diz Kirby. Seu cabelo preto está trançado em uma coroa ao redor de sua cabeça. Nós
três passamos horas aprendendo a fazer tranças holandesas no ano passado, mas Kirby é a única que a
domina. — O que aconteceu esta manhã?
Eu conto o dia até agora, desde a queda de energia até minha batida em Spencer.
— E então eu estava com McNaired na secretaria da frente — eu termino. — Então, sim, já faz um dia e
meio e são apenas oito horas.
Mara coloca a mão no meu braço. Ela é mais quieta e gentil do que Kirby, raramente a primeira a falar
em uma conversa em grupo. A única vez que ela se destaca é quando está dançando um solo no palco.
— Você está bem?
— Estou bem. McNair estava apenas sendo troll de sempre. Você pode acreditar que ele escreveu meu
último passe na caligra a? Foi como no outono passado, quando ele baixou todos aqueles vídeos de cães da
biblioteca para mexer na internet quando eu estava pesquisando meu artigo sobre Jane Austen. Ele fará de
tudo para me atrasar.
Ela arqueia uma sobrancelha pálida.
— Eu quis dizer o acidente.
— Oh. Certo. Um pouco abalada, mas estou bem. Eu nunca bati em ninguém antes. — Não sei porque
minha mente foi imediatamente para McNair quando o acidente foi claramente o evento mais traumático.
— Mara — diz Kirby, apontando para uma foto do anuário dos dois dançando no show de talentos de
inverno no início deste ano. — Olha como somos fofas.
Kirby Taing e eu nos tornamos amigas primeiro, quando nos agrupamos para um rito de passagem da
quarta série: o experimento do vulcão. Kirby queria adicionar mais bicarbonato de sódio, criar uma erupção
maior. Fizemos uma bagunça. Tiramos B. Ela conheceu Mara Pompetti em uma aula de balé alguns anos
depois, embora Mara sempre tenha sido a dançarina mais séria.
Acabamos no mesmo colégio e temos sido uma unidade desde então, e embora eu ame as duas, durante
anos me senti um pouco mais próxima de Kirby. Ela me ajudou durante o funeral do meu avô na sétima
série, e eu fui a primeira pessoa a quem ela se assumiu na nona série, quando ela disse que só gostava de
meninas. No ano seguinte, Mara disse a nós duas que era bissexual e queria começar a usar esse rótulo para
si mesma. Por um tempo, ela e Kirby me usaram como intermediário, tentando descobrir como cada uma se
sentia uma pela outra. Elas foram ao baile juntas no ano passado, o que as consolidou como um casal.
Elas riem de uma situação infeliz de cabelo na foto do último ano de alguém enquanto eu folheio o livro,
embora, como editora-chefe, eu tenha visto cada página centenas de vezes. Para os superlativos seniores, o
editor de fotos fez McNair e eu posarmos com as costas pressionadas uma contra a outra, os braços
cruzados. Acima de nós estão as palavras MAIS PROVÁVEIS DE TER SUCESSO. Na foto e na vida real,
temos exatamente a mesma altura: 1,75. Depois que a foto foi tirada, ele saltou para longe de mim, como se
a parte de trás de sua camisa tocando a minha fosse muito contato físico para os rivais.
— Por favooooor podemos sair da sala de aula? — O quarterback da estrela Brady Becker está
implorando à Sra. Kozlowski. Brady Becker é o tipo de cara que recebeu B’s porque os professores
adoravam quando nosso time de futebol era bom, e eles não poderiam ser bons se Brady Becker recebesse
D’s. — Todas as outras turmas vão.
A Sra. Kozlowski levanta as mãos.
— Está bem, está bem. Vão em frente. Apenas certi quem-se de fazer o seu caminho para o auditório
depois de...
Já estamos fora da porta.
Mara e eu nos encostamos na leira de armários que reivindicamos no primeiro ano, compartilhando um
pretzel extravagante e um pacote de batatas fritas da loja de estudantes. As combinações serão alteradas na
próxima semana, depois que partirmos. Deveríamos limpar nossos armários no início desta semana. Kirby
está fazendo isso agora, o que é uma espécie de Kirby em poucas palavras.
— Devo car com isso? — Ela mostra sua camiseta de ginástica da WHS. Tivemos que fazer uma
intervenção para que ela o lavasse no segundo ano, porque ela sempre se esquecia de trazê-lo para casa.
— Não! — Mara e eu dizemos em uníssono. Mara aponta seu telefone para Kirby, que se apresenta
como se estivesse valsando com a camiseta.
— A educação física do segundo ano era um tipo especial de tortura — eu digo. — Não acredito que eles
não nos deixaram abrir mão disso.
— Você queria renunciar a isso — corrige Kirby. — Eu gostei de descobrir meu talento oculto para o
badminton.
Oh. Huh. Devo ter presumido, porque me lembro de odiar, e elas também. Mas acho que só McNair e
eu discutimos com o conselheiro sobre a mudança de nossos horários.
Se eu costumava ser melhor amiga de Kirby, isso diminuiu um pouco desde que ela e Mara se tornaram
um casal. Mas isso é natural. Embora elas passem muito tempo sozinhas, na maioria das vezes, somos tão
próximas quanto éramos no ensino médio.
Do outro lado do corredor está aquela estante de troféus com a placa dos nomes dos oradores. Diz algo
sobre nossa escola que é isso que está na frente e no centro – não os troféus de futebol ou basquete, mas
nossas realizações acadêmicas. Em Westview, é desaprovado se você não pega pelo menos uma boa
pontuação, e não a Teoria da Música, já que todo mundo sabe que Davidson usa isso como uma desculpa
para tocar seus discos de merda da banda de jam. Ele oferece crédito extra por ir a um de seus shows. Kirby e
eu estávamos no segundo ano quando ela fez o curso, e deixe-me apenas dizer que eu poderia ter passado
minha vida inteira sem ver um professor de meia-idade arrancar sua camiseta suada no palco e jogá-la no
público.
Mara liga o telefone para mim e abraço meu suéter com toda a força que posso.
— Esta mancha no seio não precisa ser imortalizada no Instagram.
Kirby balança a camiseta para mim.
— Olá, camiseta perfeita bem aqui. Ganhei muitos jogos de badminton com essa camisa.
— Você mal consegue ver a mancha. — Mara diz isso tão docemente que quase não parece mentira.
Então seu queixo cai. — Kirby Kunthea Taing. Isso é um preservativo?
— Da aula de saúde no ano passado! — ela diz, segurando o que é de nitivamente um preservativo. —
Eles estavam distribuindo e eu não queria ser rude...
Mara esconde uma risada atrás de uma cortina de cabelos loiros ondulados.
— Tenho certeza de que nenhuma de nós precisa disso.
— Você quer isso? — Kirby me pergunta. — Tem espermicida.
— Não, Kirby, não quero o seu velho preservativo de saúde. — Se eu precisar de uma em breve,
mantenho uma caixa na minha cômoda, en ada atrás da minha calcinha de menstruação. — Além disso,
provavelmente está vencido.
Ela olha para ele.
— Não até setembro. — Ela abre o zíper da minha mochila e a joga dentro, dando um tapinha na
mochila uma vez que ela fecha o zíper novamente. — Você tem três meses para encontrar um pretendente
digno.
Revirando os olhos, ofereço a Mara a última batata frita da sacola, mas ela balança a cabeça. Kirby joga
sua camisa de ginástica e algumas outras bugigangas em uma lata de lixo próxima. De vez em quando, um
grupo corre pelo corredor e grita: "FORMANDOS!" e nós gritamos de volta para eles. Nós trocamos socos
com Lily Gulati, toca aqui com Derek Price e assobios com os Kristens (Tanaka e Williams, melhores
amigos desde o primeiro dia do primeiro ano e virtualmente inseparáveis desde então).
Até Luke Barrows passa por aqui com sua namorada, Anna Ocampo – classi cada em primeiro lugar no
tênis universitário feminino – para que possamos trocar os anuários.
— Eu tenho contado os dias até que eles nos deixem sair daqui — Luke diz.
— Desde o primeiro ano? — Anna salta de volta. Virando-se para mim, ela diz: — Sentirei falta de seus
anúncios na quarta-feira de manhã. Você e Neil sempre me enlouqueceram.
— Fico feliz por ter fornecido algum entretenimento.
Os dois ganharam bolsas de tênis para as escolas da Divisão I e estou genuinamente feliz por eles. Espero
que eles possam fazer isso funcionar à distância.
— Kirby, oh meu Deus — Anna diz, abafando uma risada quando uma pilha de papéis cai do armário de
Kirby.
— Eu sei — diz ela com um pequeno gemido.
Os anuários são devolvidos aos seus donos, e Luke me dá um abraço com os braços musculosos por
causa de um backhand assassino.
— Boa sorte — ele diz, e por que todos os rompimentos não podem ser assim? Livre de drama, sem
constrangimento persistente.
Enquanto Mara carrega um vídeo no Instagram de Kirby tirando um lenço de 2,5 metros de seu armário,
completo com uma trilha sonora de lme de terror assustador, pego meu diário em minha mochila. Mas
meus dedos tocam em outra coisa: o envelope que coloquei lá esta manhã.
Eu sei o que é – ou pelo menos, tenho uma ideia geral. Mas não me lembro dos detalhes exatos, e isso me
deixa um pouco nervosa. Com cuidado, passo o dedo ao longo da aba do envelope e retiro a folha de papel
dobrada.
O Guia para o Sucesso do Ensino Médio de Rowan Roth, diz na parte superior, seguido por dez itens
numerados, e as palavras me arrastam de volta ao verão antes do colégio. Eu adicionei o número dez por mês
no primeiro ano. Naturalmente, fui inspirada por algo que li em um livro. Eu estava tão animada com o
ensino médio, meio apaixonada pela pessoa que imaginei que seria no nal dele. Na verdade, é mais uma
lista de objetivos do que um guia real.
Eu não realizei nenhum deles.
— O que é isso? — Kirby pergunta. — Cem por cento. Em um teste de matemática!
— Reciclagem, Kirby. — Mas Mara tira uma foto mesmo assim.
— Nosso pequeno paparazzo — diz Kirby.
Ainda estou no mundo do guia de sucesso – particularmente, o item número sete. Vá ao baile com o
namorado e Kirby e Mara. Desde que Spencer e eu terminamos um pouco antes, o baile não aconteceu. Eu
teria ido sem um par, mas temia acabar sendo a terceira roda de Kirby e Mara, e não queria estragar a noite
para elas.
Não deveria me atingir com tanta força quanto o fato de minha vida não ter corrido exatamente de
acordo com o planejado. E, no entanto, aqui está a prova física disso. O ensino médio está acabando, e só
hoje estou percebendo tudo o que não z.
É um alívio quando o relógio marca 8:15. Eu pulo de pé, jogando a lista em minha mochila e minha
mochila por cima do ombro. É hora do teste nal da minha carreira no ensino médio.
— Eu tenho que me preparar para a montagem — eu digo.
Kirby rasga um Snickers que ela encontrou no abismo de seu armário.
— Aconteça o que acontecer, você é uma vencedora para nós — diz ela em um tom que provavelmente
pretende ser encorajador, mas vindo dela soa sarcástico. Ela deve ouvir, porque ela estremece. — Desculpa.
Isso soou melhor na minha cabeça.
Tento sorrir.
— Eu acredito em você.
— Vá, vá — diz Mara. — Vou me certi car de que Kirby se desfaça de quaisquer outros materiais
potencialmente perigosos.
Enquanto me dirijo ao auditório, suas risadas demoram um pouco para desaparecer.
Estou saindo de Seattle no nal do verão, mas Kirby e Mara estão indo para a Universidade de
Washington. Juntas. Mara quer estudar dança e Kirby planeja fazer uma aula em cada disciplina antes de
decidir qual será o curso. Vou vê-las nos intervalos, é claro, mas me pergunto se a distância vai me afastar
ainda mais. Se essa amizade é outra coisa, não posso levar comigo para a faculdade.
Guia de Rowan Roth para o sucesso do ensino médio
Por Rowan Luisa Roth, de 14 anos
Para ser aberto apenas por Rowan Luisa Roth, de 18 anos

1. Descubra o que fazer com sua franja.

2. Obtenha o Namorado Perfeito do Ensino Médio (até então conhecido como NPEM), de preferência no meio
da 10.ª série, um verão após a 11.ª série, o mais tardar. Requerimentos mínimos:
- adora ler
- Gosto musical respeitável
- Vegetariano

3. Saia com Kirby e Mara TODOS OS FIM DE SEMANA! (Por mais que você ame livros, por favor, não se
esqueça do mundo exterior.)

4. Amasso com NPEM debaixo da arquibancada durante um jogo de futebol.

5. Torne-se fluente em espanhol.

6. Nunca diga a ninguém que você gosta de romances, a menos que tenha 100 por cento de certeza de
que eles não serão terrivelmente horríveis sobre isso.

7. Vá ao baile com seu NPEM e Kirby e Mara. Encontre um vestido fantástico, alugue uma limusine, coma
em um restaurante chique. Toda a experiência de John Hughes, sem a masculinidade tóxica. A noite
culminará em um quarto de hotel, onde você e o NPEM declararão seu amor um pelo outro e perderão
suas virgindades de uma forma romântica e terna que você lembrará para o resto de sua vida.

8. Entre em uma faculdade com um ótimo programa de ensino superior para realizar o sonho de sua vida
de se tornar uma professora de inglês para MOLDES AS JOVENS MENTES!!!

9. Torne-se orador da escola Westview.

10. Destrua Neil McNair. Faça-o se arrepender de ter escrito aquele ensaio sobre o Grande Gatsby e de
tudo o que fez desde então.
9h07

“...GRITE ALTO E EM BOM SOM para o azul e o branco–


Westview Wolf Pack, hora de lutar!”

No nal da canção de luta da nossa escola, todos nós jogamos nossas cabeças para trás e uivamos. Minha
primeira experiência com o time da Wolf Pack em um jogo de futebol no primeiro ano, estava envergonhada
e intimidada, mas agora adoro o barulho, a energia. A propósito, apenas por um momento, todos nós
esquecemos de ser autoconscientes.
É a última vez que uivarei com essa mistura exata de pessoas.
Nos bastidores, entrego o anuário da secretária do conselho estudantil Chantal Okafor e ela me devolve
o meu.
— Acho que usei o que restava do seu espaço — diz Chantal. — Espero que seja você. A oradora da
turma, quero dizer.
O guia do sucesso do ensino médio está queimando na minha mochila. Tento me concentrar no fato de
que tenho três meses com Mara e Kirby pela frente. Podemos ter um último verão perfeito antes do colégio:
festivais de música, dias na praia, noites reclamando do frio da água na praia.
Mas isso não explica todo o resto. Claro, foi uma quase-piada, mas eu ainda não cumpri o item mais
básico da lista: descobrir o que fazer com minha franja. Se eu não consigo descobrir o que fazer com minha
franja, como poderia esperar ser oradora da turma? Logicamente, eu sei que essas coisas não estão
conectadas, mas eu tive quatro malditos anos. Meu cabelo deve fazer mais sentido do que meu futuro.
A frase sobre se tornar um professor de inglês também me impressionou. No ensino médio, tive uma
fase em que ngia dar nota às provas e sonhava com uma ou duas listas de leitura. Meu eu de quatorze anos
disse que foi um “sonho para toda a vida”, mas mal consigo me lembrar. Eu me imagino aos quatorze anos,
transbordando de otimismo, querendo acertar exatamente aquele guia. Meus livros favoritos tiveram seus
felizes para sempre – por que eu não poderia?
Eu me agarro ao número nove da lista. Ser oradora ainda é possível. É quase meu.
Sorrio para Chantal e coloco meu anuário na mochila.
— Obrigado. Você está animada para Spelman?
— Oh sim. Mal posso esperar para deixar todo o drama do ensino médio para trás. — As tranças de
Chantal giram enquanto ela vira a cabeça na direção de McNair. Ele está revendo suas chas pautadas, seus
lábios formando as palavras. Amador – não preciso de chas. Sua cabeça está inclinada em concentração, e
seus óculos escorregam pelo nariz. Se eu não o desprezasse, iria marchar até lá e empurrá-los para cima.
Talvez os colar na parte de trás das orelhas. — Você tem que estar animada também, certo? Sem mais Neil?
— Sem mais Neil — eu concordo, batendo minha franja na minha testa, para um lado e depois para o
outro, desejando que ela casse retas. — Mal posso esperar.
— Eu nunca vou esquecer aquela reunião do conselho estudantil no ano passado que durou até meia-
noite. O Sr. Travers não conseguiu que vocês dois encerrassem. Achei que ele fosse chorar.
— Eu esqueci disso. — Estávamos tentando chegar a uma conclusão sobre a alocação de fundos para o
próximo ano. McNair insistiu que o departamento de inglês precisava de novas cópias de Homens Brancos
em apuros (tudo bem, os livros têm títulos reais, mas é disso que tratam), enquanto eu argumentei que
deveríamos usar o dinheiro para livros escritos por mulheres e autores não-brancos. Não são clássicos, dissera
McNair. Eu poderia ter respondido preguiçosamente “seu rosto não é um clássico também”. Em minha
defesa, já era tarde. Desnecessário dizer que cou um pouco fora de controle.
— Pelo menos você tornou o ensino médio memorável.
— Memorável. Certo. — Com uma pontada de culpa, percebo que mal conheço Chantal. Eu sabia que
ela estava indo para Spelman apenas porque ela me passou um marcador quando todos os alunos do último
ano escreveram nossas universidades em uma folha de papel manteiga pendurada na frente da escola.
Quando entrei para o conselho estudantil, presumi que faria amizade com todos, mas é possível que
estivesse tão focada em superar McNair que nunca tive a chance.
McNair deve nos pegar olhando, porque ele caminha até nós, até que ele e eu quemos cara a cara. Eu
gostaria, não pela primeira vez, de ter pelo menos uma polegada sobre ele.
— Boa sorte — diz ele secamente, tirando o pó de apos imaginários de sua lapela. Seu cabelo não está
mais úmido.
Eu concordo com seu tom.
— Para você também.
Não quebramos o contato visual, como se o vencedor desse concurso de encarar ganhasse um Jet Ski, um
cachorrinho e um carro novo.
Do palco, a diretora Meadows pega o microfone.
— Silêncio, silêncio — diz ela, e o auditório ca em silêncio.
— Nervosa, Artoo? — McNair pergunta.
— Nem um pouco. — Endireito meu cardigã. — Você?
— Claro, um pouco.
— Admitir isso não o torna melhor do que eu.
— Não, mas isso me torna mais honesto. — Ele olha para a cortina e depois para mim. — Foi muito
gentil da sua parte tornar essa mancha grande o su ciente para que as pessoas na última leira vissem.
Eu aponto para suas calças muito curtas.
— Eles precisam ter algo para distrair desse pedaço escandaloso de tornozelo que você está mostrando.
— Odeio quando minha mãe e meu pai brigam — diz Chantal.
McNair e eu nos viramos para encará-la. Meu queixo cai, minha expressão de horror certamente
espelhando a dele. Mas antes que possamos dizer qualquer coisa, a diretora Meadows continua.
— Para dar o pontapé inicial — diz ela —, junte-se a mim para dar as boas-vindas a seus co-presidentes,
Rowan Roth e Neil McNair!
Aprecio os aplausos e a alegria pequena, mas não insigni cante, de meu nome ser pronunciado antes do
dele. McNair puxa a cortina de veludo do palco e gesticula para que eu passe primeiro. Normalmente eu
resmungaria por isso – o cavalheirismo está desatualizado e eu não sou uma fã – mas hoje eu apenas reviro
os olhos.
Pegamos microfones sem o nas arquibancadas no centro do palco. As luzes são fortes e o auditório está
repleto de uma energia pulsante e impetuosa, mas não co nervosa aqui há anos – é o meu lar.
— Eu sei que todos estão ansiosos para sair daqui e jogar Howl — diz McNair —, então vamos manter
isso o mais breve possível.
— Mas não muito breve — acrescento. — Queremos ter certeza de que todos vocês recebam o
reconhecimento que merecem.
As sobrancelhas de McNair se juntam.
— Certo. Claro.
Risos ecoam pelo auditório. Nossos colegas esperam isso de nós.
— Foi um prazer servir como seu presidente este ano — disse McNair.
— Copresidente.
Ele mexe em algo em seu microfone, enviando uma onda distorcida de barulho pelos alto-falantes. As
mãos agarram os ouvidos e o público geme em uníssono.
— Acho que é assim que todos se sentem em relação à sua presidência — digo. McNair os irritou, mas
vou reconquistá-los.
Ele ca vermelho.
— Sinto muito por isso, Wolf Pack.
— Não tenho certeza se todo mundo ouviu isso. Você pode ter dani cado permanentemente alguns
tímpanos.
— Continuando — diz ele com rmeza, olhando para seus cartões de anotações —, gostaríamos de
começar com esta montagem que a aula de cinema da Sra. Murakami, que montou para lembrar a todos de
todos os grandes momentos que tivemos neste ano. A trilha sonora é fornecida pela banda do Sr. Davidson
— outro piscar de olhos em suas notas —, a Pure Funk Project.
Literalmente, duas pessoas comemoram. Tenho quase certeza de que um deles é o Sr. Davidson.
As luzes diminuem e o vídeo é projetado em uma tela atrás de nós. Rimos junto com todos os outros nos
momentos ridículos capturados pela câmera, mas não posso ignorar a ansiedade crescendo dentro de mim.
Há fotos de jogos de futebol, assembleias espirituais e produções de clubes de teatro. Do baile. Alguns
alunos do último ano na primeira la do auditório estão chorando e, embora eu nunca admita, estou grata
pelo pacote de lenços de papel de McNair em meu bolso. Talvez eu não ame cada uma dessas pessoas, mas
éramos uma unidade. Ninguém mais entenderia o quão perfeitamente sincronizadas as Kristens estão, a
ponto de aparecerem com seus acompanhantes no baile com o mesmo vestido, ou a diversão de Javier
Ramos comparecendo a todos os jogos de basquete em casa vestindo uma fantasia de cenoura.
Respirações profundas. Mantenha-se firme.
Depois que McNair e eu recitamos mais destaques do ano passado, a diretora Meadows pega o
microfone de volta. Recuamos para algumas cadeiras na lateral do palco enquanto ela anuncia os prêmios
departamentais, entregando troféus com lobos de plástico moldados aos melhores alunos em cada disciplina
acadêmica. Dói quando McNair ganha não apenas para o inglês, mas também para o francês e o espanhol, o
último me deixa um pouco chateada. Parei de estudar espanhol no primeiro ano para abrir espaço para mais
disciplinas eletivas em inglês. Eu queria um dia poder falar com o lado da família da minha mãe, e acho que
“um dia” ainda não chegou. Número cinco no guia de sucesso – outra meta não alcançada.
— O próximo é o prêmio de comparecimento perfeito — diz a diretora Meadows. — Claro, não é de
natureza acadêmica, mas sempre achamos divertido reconhecer os alunos que conseguiram fazer todos os
180 dias sem um único atraso ou ausência injusti cada. Este ano, temos o prazer de homenagear Minh
Pham, Savannah Bell, Pradeep Choudhary, Neil McNair e Rowan Roth.
Isso deve ser um engano.
— Rowan? — ela chama novamente quando sou a única que não se levanta, então me esforço para pegar
o certi cado com meus colegas pontuais.
De volta aos nossos assentos, eu en o a ponta do certi cado em papel na perna de McNair.
— Eu, uh, não acabei entregando o seu deslize de atraso — ele murmura. — Achei melhor deixar você
car com este. Já que é o último dia e tudo.
— Tão caridoso de sua parte — eu digo, mas não quero dizer com sarcasmo. Estou confusa, mais do que
tudo. McNair e eu não oferecemos brindes um ao outro.
Não há tempo para pensar nisso porque a diretora Meadows está gesticulando para nós, preparando-se
para a única homenagem que realmente importa.
— Tem sido uma competição acirrada para orador da turma este ano — diz ela. — Nunca antes tivemos
dois alunos tão equiparados em suas notas, atividades extracurriculares e devoção a esta escola.
Seguro o certi cado com mais força. É isso. Nossa última batalha.
— Vocês já conhecem bem esses dois, mas o mais surpreendente sobre eles é que se preocupam não
apenas com suas próprias realizações, mas profundamente com a Westview High School como instituição.
Ambos zeram um trabalho incrível para garantir que os futuros alunos de Westview tenham a melhor
experiência imaginável aqui.
— Deixe-me começar com Neil. Ele irá para a NYU no outono para estudar linguística. Ele teve uma
pontuação perfeita no SAT e alcançou todas as notas cinco nos exames AP de espanhol, francês e latim. Ele
foi o criador e chefe do clube do livro do corpo docente dos alunos e, durante sua liderança no conselho
estudantil, estabeleceu um fundo de atividades para gerar dinheiro para apoiar as atividades do clube no
campus, do qual muitos alunos irão se bene ciar por anos à frente!
Aplausos educados. Eu aplaudo sem entusiasmo. Um rubor e suas sardas lutam pelo controle do rosto
de McNair.
— E então temos Rowan. — Eu juro, ela sorri mais quando diz meu nome. — Ela será uma caloura
indecisa no Emerson College em Boston. Aqui em Westview, ela foi capitã da nossa equipe de debate,
editora do anuário, fez um total de doze aulas de AP e serviu no conselho estudantil durante todos os
quatro anos. Como copresidente, ela fez campanha por banheiros para todos os gêneros e também foi
responsável por ajudar a escola a se tornar um pouco mais verde. Agora, fazemos compostagem e temos um
sistema de separação de lixo, graças a Rowan.
Eu gostaria que ela não tivesse concluído com isso. Meu legado: lixo.
Mentalmente, considero minhas chances pela centésima vez nos últimos meses. As aulas de AP foram
ponderadas com matemática complicada, então não posso prever com precisão como seu GPA se compara
ao meu.
— Artoo — sussurra McNair enquanto a diretora Meadows fala sobre os oradores da turma
proeminentes na história da nossa escola e o que eles realizaram, completando sua lição anterior.
Eu o ignoro. Todos podem nos ver quando estamos sentados aqui. Ele já deveria saber que não deve
falar.
Gentilmente, ele bate no meu joelho com o seu.
— Artoo — ele repete, e tenho certeza de que ele vai me lembrar da mancha de café com leite. — Eu só
queria dizer... foram bons quatro anos. Competir com você realmente me manteve no chão.
Suas palavras demoram a penetrar. Quando dou uma olhada nele, seus olhos são suaves, não penetrantes,
por trás dos óculos, e ele está fazendo algo estranho com a boca. Demoro uma fração de segundo para
perceber que é um sorriso genuíno. Fiquei tão acostumada com seu sorriso malicioso que imaginei que fosse
sua única expressão.
Não tenho ideia de como responder. Eu nem tenho certeza que é um elogio. Devo agradecer a ele ou
dizer “de nada”? Ou talvez apenas sorrir de volta?
Neste ponto, eu estou olhando por muito tempo, então eu direciono minha atenção de volta para a
diretora Meadows. Por quatro anos, sonhei com este momento. Agora será o único item que posso riscar da
minha lista, a prova de que z algo certo. Posso praticamente ver meu nome nos lábios da diretora, ouvi-lo
pelos alto-falantes.
— Sem mais delongas, estou entusiasmada em apresentar seu orador da turma: Neil McNair!
10h08

O RESTO DA assembleia é borrado. Em um gesto simbólico, McNair e eu passamos o microfone para a


presidente do conselho estudantil do próximo ano, Logan Perez, embora eu esteja tão entorpecida que o
deixo cair. Então é minha vez de estremecer com o som distorcido.
A diretora Meadows informa aos alunos do último ano que, enquanto os do último ano terminam o dia,
todos os outros precisam estar de volta à aula às dez horas em ponto. Quando ela nos dispensa, o auditório
ca barulhento e eu me permito me perder na tempestade. Não consigo encontrar Kirby e Mara, mas o
texto do nosso grupo é preenchido com emojis chorosos de Kirby e encorajamento de Mara. As duas ainda
estão lá quando eu saio do meu aplicativo de mensagens. O fundo do meu telefone é uma foto de nós três
no verão passado no Bumbershoot, um festival de música que vamos todos os anos desde o ensino médio.
Nesta foto, abrimos caminho até o palco principal; Kirby está com as mãos para cima, a mão de Mara está
sobre a boca, abafando uma risada, e estou olhando diretamente para a câmera.
Tudo isso acabou – Seattle, minha McGuerra, colégio.
Não vou mais estar aqui, mas não consigo me obrigar a ir embora.
Eu perambulo pelo corredor por um tempo. Os alunos do último ano comemoram e os professores
tentam laçar os alunos do último ano de volta às salas de aula. Finalmente, encontro um banco comprido
em um corredor deserto perto das salas de aula de arte, me espremendo em um canto contra a parede. Pego
meu diário da mochila. Kirby, Mara e eu planejamos nos encontrar em nosso restaurante indiano favorito
antes do Howl, mas primeiro preciso me recompor. Escrever sempre me acalmou.
Abro meu diário na linha que rabisquei no meio da noite, meio que esperando que fosse alguma grande
inspiração que me permitisse passar o resto do dia.
E, claro, não é nem legível.
O guia me provoca do fundo da minha mochila. Namorado perfeito do colégio, não; baile, não; oradora
da turma – e, por extensão, a destruição de McNair – não. Cada sonho frustrado, cada plano frustrado,
alguns pelo tempo e alguns pelas circunstâncias e alguns apenas porque eu não era boa o su ciente.
Essa era a pessoa que eu queria ser no nal do ensino médio.
Uma pessoa que agora claramente não sou.
— Artoo?
Levanto os olhos do meu caderno, embora, é claro, seja McNair, arruinando meu momento de dúvida
contemplativa, como se ele já não tivesse arruinado todo o resto. Agitada, coloco meu diário na mochila.
Ele ca do outro lado do corredor, com a gravata afrouxada e o cabelo levemente despenteado, talvez por
tantos abraços de felicitações. Quando ele levanta uma das mãos em um aceno, sento-me mais ereta,
esperando que meus olhos comuniquem que pre ro comer as páginas do meu anuário uma por uma do
que falar com ele. Ele vem em minha direção, sem entender a mensagem.
— Quando eles vão fazer uma estátua da sua cabeça para car na entrada da escola? — Eu pergunto.
— Acabei de tirar as medições. Insisti em mármore, não bronze. Parece mais elegante.
— Isso é... bom — digo, deslizando. Normalmente mantemos o ritmo um com o outro, mas esta última
hora me abalou. Estou fora do meu jogo.
Após alguns momentos de hesitação, ele desliza para o banco ao meu lado. Bem, há meio metro de
espaço entre nós, mas como somos as únicas duas pessoas no banco, suponho que ele ainda esteja
tecnicamente ao meu lado. Ele levanta uma manga para checar o relógio. Não é digital e não pode fazer
nada, exceto dizer as horas. É antigo e prateado, com algarismos romanos em vez de números. Ele o usa
todos os dias, e sempre me perguntei se é uma herança de família.
— Eu quis dizer o que disse antes. Sobre competir com você todos esses anos. Você foi uma oponente
verdadeiramente formidável. — Apenas Neil McNair diria algo como “oponente formidável”. — Você me
pressionou para fazer melhor. Não quero dizer isso de um jeito idiota, mas... eu não poderia ter me tornado
o orador da turma sem você.
Meu temperamento se in ama – não consigo evitar. Talvez ele esteja tentando ser genuíno, mas parece
que está zombando de mim.
— Você não poderia ter se tornado o orador o cial sem mim? O que é isso, a porra de seu discurso do
Oscar? Acabou, McNair. Você ganhou. Vá comemorar. — Eu agito minha mão em um movimento de
enxotar, imitando o que ele fez com a estante de troféus antes.
— Vamos. Estou lhe dando um ramo de oliveira3 aqui.
— Se eu não posso te bater com isso, qual é o ponto? — Solto um suspiro e passo os dedos pela franja. —
Desculpa. Tudo está me atingindo. Está tudo acabando. É… uma sensação estranha. — Mas “estranho” é
uma palavra muito mansa para de nir como eu estou contrária ao Guia para o Sucesso do Ensino Médio de
Rowan Roth.
O que realmente parece é o fracasso.
Ele exala, seus ombros suavizando visivelmente, como se ele os tivesse tensionado o dia todo ou talvez até
o ano todo. Evidentemente, estamos ambos condenados a uma postura terrível.
— Sim — diz ele, puxando a gravata para afrouxá-la um pouco mais. Em outra estranha demonstração
de humanidade, ele acrescenta: — Não sei se isso já me ocorreu. Estou meio convencido de que aparecerei
na escola na segunda-feira.
— É estranho pensar que tudo está acontecendo sem nós.
— Eu sei. Tipo, Westview existe sem nós aqui? Se uma árvore cair em uma oresta e ninguém estiver por
perto para ouvir e tudo mais?
— Quem vai atormentar o Sr. O'Brien na AP de Química?
McNair bufa.
— Acho que ele era o único professor que nos odiava.
— Honestamente, eu não o culpo. E aquele incêndio foi sua culpa. — Não foi, mas esse equilíbrio entre
nós é perturbador, e estou morrendo de vontade de cutucá-lo mais um pouco. — Foi você quem adicionou
os produtos químicos errados.
— Isso é porque você os escreveu errado — diz ele, arregalando os olhos em uma expressão de inocência.
— Eu estava apenas seguindo suas instruções.
— Pelo menos a diretora Meadows vai sentir nossa falta.
Ele segura um microfone invisível.
— Rowan Roth, que revolucionou a coleta de lixo na Westview High School.
— Cala a boca! — Digo, mas estou rindo. Eu não posso acreditar que ele percebeu isso também. —
Rowan Roth, literalmente um emoji de lata de lixo.
— Você não é um emoji de lata de lixo. Você é, tipo, o emoji da garota segurando a mão assim. — Ele
demonstra, achatando a mão como se estivesse carregando uma bandeja invisível. Aparentemente, o emoji
deveria representar um balcão de informações, mas não o vejo.
— Ela está sacudindo o cabelo e ninguém vai me convencer do contrário.
— Tenho pena da pessoa que tenta.
É um momento incomum de acordo entre nós.
— De acordo com a diretora Meadows, você fala cerca de cem idiomas — eu continuo. — Portanto, os
emojis podem não ser avançados o su ciente para descrevê-lo.
— Verdade — diz ele —, mas estou chocado que você tenha perdido a oportunidade de me dizer que sou
o emoji de cocô.
— Se você acha que é o emoji que captura a essência de Neil McNair, quem sou eu para discordar?
Um zumbido no bolso de sua jaqueta encerra nosso debate sobre emojis. Ele pega seu telefone, franze a
testa.
— Você recebeu uma noti cação de que foi reprovado na AP de inglês e não é o orador da turma, a nal?
— Oh, ainda sou. — Ele envia uma mensagem rápida antes de colocar o telefone de volta no bolso, mas a
carranca não sai de seu rosto.
Se ele fosse outra pessoa, eu perguntaria se há algo errado.
Mas ele é Neil McNair, e não tenho certeza de como agir.
Não tenho certeza do que somos.
Cai sobre nós um silêncio estranho e ansioso que me faz car a olhar para as minhas sapatilhas, cruzar e
descruzar os tornozelos, bater as unhas na mochila. McNair e eu não fazemos silêncios. Somos feitos de
argumentos e ameaças. Fogos de artifício e chamas.
Não mais, você não é, uma voz no fundo da minha cabeça me lembra. Número dez em meu guia de
sucesso, o capítulo nal de meu livro de fracassos.
Ele bate os nós dos dedos em seu anuário, que percebo que ele está carregando, e pigarreia.
— Então – hum. Eu estava me perguntando. Se você talvez assinasse meu anuário?
Eu co boquiaberta com ele, convencida de que é uma piada. Exceto que eu não tenho ideia de qual é a
piada. As palavras “Claro, por que não?”, balançam na ponta da minha língua.
O que sai em vez disso é uma única palavra bem do meio: “Por quê?” Consigo pronunciá-lo com a voz
mais detestável que se possa imaginar. E eu me arrependo instantaneamente.
Suas sobrancelhas se franzem. É uma expressão que nunca vi em seu rosto, não nos quatro anos que
treinei com ele.
É algo parecido com mágoa.
— Deixa para lá — ele diz, empurrando os óculos de volta sem olhar para mim. — Eu entendo.
— Neil — eu começo, mas, novamente, as palavras se enredam por trás dos meus dentes. Se eu insistisse
em assinar seu anuário, o que escreveria? Que ele também tem sido um oponente formidável? Um maldito
oponente, como uma amadora? Eu farei isso, se é o que ele quer. Qualquer coisa para tornar isso menos
estranho, para restaurar o equilíbrio entre nós.
— Rowan. Está bem. Mesmo. — Ele se levanta e tira o pó da calça do terno muito curto. — Vejo você na
formatura. Serei aquele cujo discurso virá depois do seu.
O uso do meu nome verdadeiro me assusta, puxa meu coração para um ritmo estranho. Rowan soa suave
em sua voz. Incerto.
Acho que esta é uma das últimas vezes que vou ouvir.
Conversa de texto entre Rowan Roth e Neil McNair
Fevereiro do primeiro ano

NÚMERO DESCONHECIDO

Este é o número de Neil McNair.

Eu amo projetos em grupo elaborados para dar a mesma


nota a duas pessoas, mesmo quando uma delas
*claramente* faz mais o trabalho

NÚMERO DESCONHECIDO

Oi Rowan.

apenas me encontre na biblioteca depois da escola para que


possamos acabar com isso

NÚMERO DESCONHECIDO

Perto da seção de literatura muito inferior com homens


sem camisa nas capas, ou mais perto dos livros
verdadeiros?

Contato salvo como McNightmare.


11h14

O PÃO INDIANO LEVANTA meu ânimo como só o pão pode fazer.


— Tem certeza de que está bem? — Mara pergunta pela décima vez.
Eu aceno, arrastando um pedaço de pão pelo molho de tamarindo.
Aparentemente não acreditando em mim, ela continua:
— Este deve ser um dia emocionante. Vamos nos concentrar nos aspectos positivos. Estamos nos
formando, o Howl vai começar logo–
— Esta samosa existe — Kirby termina, segurando uma. — Vou voltar para buscar mais.
Mas os olhos azul-claros de Mara não deixam os meus. Ela estende o braço por cima da mesa, roçando
meu pulso com a ponta dos dedos.
— Rowan...
— Acho que estou tendo problemas para aceitar que tudo isso acabou — consigo dizer.
— Não é como se não tivéssemos um verão inteiro pela frente. Não acabou, acabou. E ser a segunda
melhor em uma turma de quinhentos é uma realização incrível.
Não sei como explicar. Não se trata de oradora da turma ou do fato de que, como segunda melhor, terei
de apresentar McNair como parte do meu discurso. É sobre tudo o que ser oradora da turma representa,
uma confusão inteira de coisas que não tenho certeza se estou pronta para dizer em voz alta. Mesmo na
minha cabeça, eles não parecem reais. O que McNair disse, sobre aparecer na escola na segunda-feira... Isso
se enterrou em algum lugar dentro de mim. Não há mais segundas-feiras no ensino médio. Chega de dias de
trotes ou reuniões do conselho estudantil. Não há mais alarmes de McNightmare às 05:55 ou até mais cedo.
E não é que vou sentir falta dos alarmes para acordar especi camente – eles foram apenas embrulhados em
toda a minha experiência de colégio.
O ponto principal é o seguinte: toda vez que imaginei hoje, me sentia muito melhor do que agora.
Kirby cai de volta na mesa com samosas e uma bem-vinda mudança de assunto.
— Eu não posso acreditar que nalmente vamos jogar Howl.
— Oh, estou pronta há anos — diz Mara com um sorriso malicioso. Ela tira uma foto do prato de
comida artisticamente organizado de Kirby.
— Vamos ver a Mara Competitiva? — Kirby pergunta, e Mara revira os olhos. — Ela me apavora, mas eu
a amo.
Embora eu seja competitiva em termos acadêmicos, Mara é implacável quando se trata de esportes e
jogos. Porque ela ser doce e pequena, é totalmente inesperado. No ano passado, jogamos uma rodada de
Ticket to Ride que durou três horas e deixou Kirby à beira das lágrimas.
— Eu só quero ver McNair perder. De preferência antes de mim — digo, surpresa com o quanto isso me
anima. Tomo um gole de manga lassi. Tem um gosto mais doce do que alguns minutos atrás.
Uma ideia começa a tomar forma. Ainda há Howl, o que signi ca que ainda há uma maneira de derrotar
McNair. É mais uma batalha entre nós dois – e o resto da escola, mas se os últimos quatro anos foram uma
indicação, eles nunca tiveram uma chance.
— Eu realmente vou sentir falta de odiá-lo no próximo ano — eu digo enquanto minhas engrenagens
mentais se aceleram. Eu derroto McNair e terei conquistado algo daquele guia de sucesso, provavelmente o
maior e mais grandioso algo. Um dez perfeito.
Kirby e Mara trocam um olhar.
— Vocês não trocam mensagens de texto com 'bom dia' todos os dias? — Mara pergunta, hesitante.
— Dizemos um ao outro para ter um dia horrível — explico, porque imagino que seja fácil até mesmo
para meus amigos mais próximos interpretar mal o relacionamento que tenho (tive?) com meu rival. — É
diferente.
— Você vai sentir falta dele dizendo para você ter um dia de merda? — Kirby pergunta, e balança a
cabeça. — Certo, eu juro. — Ela en a uma mecha de cabelo para trás em sua trança da coroa. — Se
estivermos todos mortos esta noite, deveríamos ter uma festa do pijama. Faz uma eternidade.
— De nitivamente — Mara concorda. Costumávamos ter uma festa do pijama no último dia de escola.
Na verdade, costumava haver um tempo em que dormíamos na casa de alguém uma vez por mês antes de
nos rendermos ao estresse do último ano.
— Eu-hum… — Eu tropeço, porque esta noite é a sessão de autógrafos de Delilah.
Posso ir para a sessão de autógrafos e ainda ser o melhor de McNair, mas se Howl não tiver terminado até
lá, terei que fugir dele. Embora não esteja preocupada em ver algum dos meus oponentes lá, não sei se posso
explicar a sessão de autógrafos para Kirby e Mara. Eu não posso dizer a elas o quanto eu quero ver o carimbo
de borracha de assinatura de Delilah, aquele feito de um molde de seus lábios que ela pressiona em tinta
carmesim para que pareça que ela beijou todos os livros.
A fantasia: minhas amigas amam os livros de Delilah Park tanto quanto eu.
A realidade: minhas amigas acham que meus livros favoritos são lixo.
Uma vez no shopping, passamos por uma exibição de livros de romance em uma livraria, e Mara
zombou disso. A maneira como ela os rebaixou com um único som me deixou com vergonha de ter lido
todos os livros naquela vitrine. Outra vez, Kirby notou os romances na minha estante. “Eles são da minha
mãe” eu menti. Kirby começou a retirá-los um por um, rindo dos títulos. Meu rosto cou vermelho e eu
não sabia como pedir para ela parar.
Once upon a Guy: aquele me distraiu na sala de espera do hospital no primeiro ano, quando meu pai
precisou de uma apendicectomia de emergência.
Lucky in Lust: aquele me fez perceber que as mulheres podem dar o primeiro passo em um
relacionamento.
The Duke’s Dirty Secret: bem, esse só me deixou feliz.
— Vamos ver como o Howl vai indo? — Eu terminei.
A campainha na porta do restaurante toca e eu olho por instinto, sem esperar ver os três amigos mais
próximos de McNair: Adrian Quinlan, Sean Yee e Cyrus Grant-Hayes, presidentes do clube de xadrez, do
clube de robótica e do Anime Appreciation Sociedade, respectivamente. McNair está notavelmente
ausente, o que imediatamente levanta o alarme.
Eu costumava ir para a escola com esses caras, acho, porque depois de hoje, vai ser verdade. Seattle vai estar
cheia de gente do passado.
— Vou buscar mais comida — digo, empurrando minha cadeira e entrando na la do bufê atrás deles.
— E aí, Rowan? — Adrian diz, colocando arroz basmati em seu prato.
— Ei, Adrian. Onde está McNair? — Eu pergunto o mais casualmente que posso.
Individualmente, seus amigos são humanos decentes. Como um grupo, eles o ajudaram na guerra Roth-
McNair em várias ocasiões. Houve um tempo em que ele reuniu o conselho estudantil com eles para fazer a
votação em sua direção e, assim que o zeram, desistiram imediatamente. Depois, houve o tempo em que se
juntaram para mexer na curva de um teste de cálculo. Na maioria das vezes, porém, eles apenas balançam a
cabeça e sorriem, como se fôssemos um programa no qual eles não estão investidos, mas que os entretém
apenas o su ciente para continuar.
Cyrus vai atrás do saag paneer4.
— Já está sentindo falta da sua outra metade?
A pergunta me desconcerta. Outra metade. Sempre odiei ser par com McNair, mas há algo na maneira
como Cyrus diz isso que me faz odiar menos do que o normal. Quase como se não fosse necessariamente
uma coisa ruim.
— Saudades dele? Só quero ter certeza de que ele está pronto para o Howl. Eu não sinto falta dele. Eu o
vi algumas horas atrás — eu digo, forçando uma risada com o ridículo da sugestão de Cyrus. —
Provavelmente o verei novamente em uma hora. Eu de nitivamente não sinto falta dele.
— Se acalme — Adrian diz. — O cara não está aqui. Houve alguma emergência e ele teve que buscar a
irmã na escola.
— Oh. — Uma emergência? — Está tudo... bem?
Eu deveria ter apenas engolido meu orgulho e assinado seu anuário. Trocamos tantos socos ao longo dos
anos, mas só agora é que consegui machucá-lo com uma única palavra. Aquela versão de corredor de
McNair parecia estranhamente vulnerável, uma palavra que nunca associei a ele simplesmente porque ele
nunca mostrou qualquer vulnerabilidade. Sem rachaduras em sua armadura.
Sean dá de ombros, adicionando algumas samosas ao prato.
— Ele não falou muito sobre isso. Ele... não é o mais aberto sobre sua vida pessoal.
— Pensando bem, não consigo me lembrar da última vez que estive na casa dele — diz Cyrus.
Adrian dá-lhe um olhar penetrante que não consigo interpretar.
— Ele realmente não tem muita gente por perto.
Faço um balanço do que sei sobre a vida pessoal de McNair. Ele deve morar perto de Westview, mas não
tenho certeza de onde. Evidentemente, ele tem uma irmã, mas até que Adrian disse isso, eu teria adivinhado
que ele era lho único como eu, porque ele nunca mencionou irmãos. Não é o mais aberto sobre sua vida
pessoal. O que poderia ser tão, bem, pessoal, que ele não compartilharia com seus amigos?
Mesmo confrontado com esta situação de emergência, é impossível imaginar McNair em qualquer
papel, exceto um Rival com R maiúsculo.
— Mas ele ainda está jogando, certo? — Eu pergunto.
— Oh sim. — Sean tira o cabelo preto dos olhos. Está fazendo essa jogadinha que eu sempre achei fofo.
O cabelo de McNair nunca poderia atingir esse tipo de golpe sem esforço. — Ele disse que não perderia isso.
Isso me ajuda a relaxar. A emergência não pode ter sido tão séria. Não vou deixar que isso me distraia de
meu novo objetivo, aquele que me enche com uma familiar onda de con ança.
Vou destruir McNair uma última vez.
Talvez então eu me sinta eu mesma novamente.
HOWL: Regras Oficiais do Jogo
Propriedade da classe júnior da Westview High School

ULTRA SECRETO
NÃO COMPARTILHE.
NÃO DUPLIQUE.
NÃO DEIXE O COMPUTADOR SEM VIGILÂNCIA ENQUANTO RECEBE UM PRETZEL
DE QUEIJO DA LOJA DE ESTUDANTES MESMO QUE TENHA “MUITO CERTEZA” DE
QUE O SALVOU. (ISSO É PARA VOCÊ, JEFF.)

HOWL é uma caça ao tesouro em toda a cidade com uma reviravolta: você está sendo caçado por seus
colegas de classe.

OBJETIVOS
1. Encontre e fotografe 15 pistas de caça ao tesouro localizadas pela cidade.
2. Envie para a classe júnior para veri cação.
3. Não morra.

No início do jogo, você receberá o nome do seu primeiro alvo. Você só pode eliminar seu alvo
removendo sua braçadeira azul. Depois de eliminar seu alvo, você assumirá o alvo dele.

Qualquer pessoa que usar armas reais será imediatamente desclassificada e denunciada à polícia.

Depois de encontrar todas as 15 pistas, você deve ser a primeira pessoa a vencer na academia Westview.

GRANDE PRÊMIO: $ 5.000


BOA SORTE… VOCÊ VAI PRECISAR.
11h52

QUANDO chegamos ao campo de futebol, quase toda a classe do último ano está aqui. Kirby e Mara vão
até seus amigos de dança para sel es e trocas de anuários. Está nalmente começando a esquentar, então tiro
meu cardigã e o coloco na mochila. Sinto-me muito melhor agora que tenho um plano. Destruir McNair.
Recuperar a con ança. Conhecer Delilah e esperar que ela me ame.
Assim como seus amigos me garantiram, McNair está aqui, parado nas arquibancadas e remexendo em
sua mochila. O sol em seu cabelo amejante é nada menos que um perigo ocular. Se eu olhar diretamente
para ele, provavelmente vai fritar minhas córneas. Eclipse total de McNair. Eu coloco a mão na minha testa
e desvio meu olhar para baixo. Ele vestiu uma camiseta preta com uma frase em latim rabiscada e seu jeans
escuro tem um buraco no joelho. Abaixo deles: Adidas arranhada, os laços mastigados e puídos nas pontas.
Eu me pergunto se ele tem um cachorro. Pela primeira vez, ele parece um adolescente, não um advogado de
impostos ou assistente do diretor do ensino médio.
A camiseta é o verdadeiro mistério. Normalmente ele usa suéteres ou camisas de botões, o ocasional
cardigã do vovô com cotoveleiras. Pelo que sei, este é seu uniforme de verão; estamos sempre juntos durante
os nove meses sombrios de escola. As sardas para cima e para baixo em seus braços pálidos desaparecem em
suas mangas, e acho que ele tem bíceps. Na aula de ginástica do segundo ano, ele era uma coisinha magricela,
braços de graveto saindo da camisa quadrada de ginástica de Westview que não servia exatamente para
ninguém. Esta camiseta, porém – de nitivamente se encaixa nele.
— Você está bem, Artoo?
Eu pisco. Ele se virou para mim, as sobrancelhas erguidas, um meio sorriso nos lábios.
— O quê?
— Você parece toda esquisita — diz ele.
Não tenho certeza do que ele está insinuando, mas eu não estava olhando para ele. Ele simplesmente
estava na minha linha de visão, parecendo diferente de como ele normalmente parece. Era natural que meu
olhar demorasse.
Levantando-me mais ereta, eu aponto para sua camiseta e jeans.
— Roupas casuais? O robô que controla seu corpo cou superaquecido no traje?
— Nah, nós dominamos a regulação da temperatura. Simplesmente não vale a pena ter um robô sem
essa habilidade atualmente.
— E aqui estava eu ansiosa para ver você correr por Seattle em doze pés cúbicos de poliéster. — É um
alívio brigar assim depois do desastre do anuário.
Ele cruza os braços sobre o peito, como se autoconsciente do quanto dele está à mostra. Isso faz com que
seus braços pareçam ainda mais musculosos. Deus, ele levanta pesos? De que outra forma ele alcançaria esse
tipo de de nição?
— Não me insulte — ele diz. — Esse terno é uma mistura de algodão e lã.
Aproximamo-nos o su ciente para que eu pudesse ler o latim em seu peito: QUIDQUID LATINE
DICTUM, ALTUM VIDETUR. Ele provavelmente está morrendo de vontade de que alguém lhe
pergunte o que isso signi ca. Eu pretendo pesquisar no Google mais tarde.
Ele fecha o zíper de sua mochila e a joga sobre um ombro. Há um broche nela, com uma cesta esmaltada
brilhante de corgis e as palavras CACHORROS GRÁTIS! Também não tenho ideia do que isso signi ca,
apenas que tenho 98 por cento de certeza de que ele não está conduzindo uma operação subterrânea de
criação de cães.
— Está tudo…? — Eu aceno minha mão para indicar a palavra “ok”, sem saber se terminar a frase
indicaria algum tipo de proximidade que nunca tivemos.
— Curvado? — ele pergunta. Ele bate no queixo. — Torcido? Minhas habilidades de charadas estão um
pouco enferrujadas. Quantas sílabas tem?
— Não, eu– eu encontrei seus amigos no almoço. Disseram que você teve uma emergência?
As pontas de suas orelhas cam vermelhas.
— Oh. Não. Quero dizer, sim, mas está tudo bem agora.
— Bom — eu digo rapidamente, porque se seus amigos não sabem muito sobre sua vida pessoal, eu sei
ainda menos. Sempre imaginei que ele faz o dever de casa de terno, janta de terno, dorme de terno. Em
seguida, acorda e faz tudo de novo. Esta camiseta e a revelação sobre seus braços abriram buracos em minhas
McTeorias. — Que não era sério, quero dizer. Estou feliz que você ainda pode jogar. Então eu não tenho
que me sentir mal quando eu ganhar de você.
— Mesmo que você não se digne a assinar meu anuário? — Ele diz isso erguendo as sobrancelhas, como
se soubesse exatamente o quão ruim eu me sinto sobre isso.
Agora é minha vez de corar. Se minha franja fosse mais longa, eu poderia me esconder atrás deles.
— Eu não– quero dizer–
Ele levanta a mão para indicar que está tudo bem, embora seu comentário me deixe inquieta.
— Vou encontrar o resto do Quad.
McNair e seus amigos se autodenominam Quadrilátero, abreviado como Quad, e sim, é a coisa mais
nerd que já ouvi. Mas isso torna o que eles disseram sobre sua vida pessoal ainda mais estranha. Quase como
se o Quad fosse mais um triângulo com um apêndice extra pendurado nele. Eles estão se separando no
próximo ano também, Neil para a NYU, Adrian para uma das UCs, Cyrus para o Western e Sean para a
UW.
Kirby e Mara voltam para mim. Mara está franzindo a testa para o telefone.
— É 12h02. Temos certeza de que estamos no lugar certo?
— É improvável que todos os trezentos de nós tenhamos errado — diz Kirby.
Mais alguns minutos se passam e uma energia nervosa percorre a multidão. Não posso deixar de me
perguntar se um dos calouros cometeu um erro. O jogo é diferente a cada ano; os juniores passam a maior
parte do último trimestre no conselho estudantil planejando isso. Apesar de todas as nossas brigas nos
bastidores, McNair e eu executamos um howl perfeito no ano passado. Nossas pistas, quando conectadas
em um mapa, formaram o contorno de um lobo.
— Dizia meio-dia em ponto — grita Justin Banks.
— Eles se esqueceram de nós? — Iris Zhou pergunta.
A alguns metros de distância, os olhos de McNair xam-se nos meus, fazendo uma pergunta silenciosa:
Devemos fazer alguma coisa? E não tenho certeza. Não somos mais presidentes, mas estamos acostumados a
assumir a liderança...
— Isso é besteira — diz Justin. — Estou fora.
Enquanto ele pisa fora do campo, quase trezentos telefones zumbem, tocam e apitam ao mesmo tempo.
Uma explosão de texto de um número desconhecido.
BEM-VINDOS, FORMANDOS DA WOLF PACK

Já se surpreendeu? Estamos apenas começando. Apenas


os primeiros 50 jogadores que chegarem ao nosso local
secreto permanecerão no jogo.

Aqui está o seu enigma:

2001

1968

70

2.5

— 2001, 2001… — diz Kirby. — Isso foi antes de nós nascermos. O que estava acontecendo em 2001?
Além de algumas opções de moda realmente questionáveis?
O Google não está fora dos limites, mas as pistas são sempre projetadas de uma forma que as torna
difíceis de serem encontradas online.
— Oh! — Mara exclama. — Talvez seja uma referência àquele lme antigo? 2001: Uma Odisséia no
Espaço?
— Fala um pouco mais alto — diz Kirby.
— Desculpa. Fico entusiasmada.
Decidimos ir para o meu carro, já que sou a única que dirige para a escola. Kirby e Mara moram perto o
su ciente para andar. O resto dos formandos parecem ter a mesma ideia. A maioria das pessoas se dividiu
em grupos, alguns correndo para o estacionamento e outros para o ônibus.
— Acho que Mara está certa sobre o lme — digo enquanto nossos sapatos batem no concreto, fazendo
com que meu navegador móvel funcione mais rápido. — Eu assisti com meu pai uma vez. Ou, mais
precisamente, ele assistiu e eu adormeci. E... foi lançado em 1968!
— Deve haver algum link para Seattle — diz Kirby. — Talvez tenha sido lmado aqui… Não, Wikipedia
diz Inglaterra.
— Você está nas aulas de AP há três anos e ainda usa a Wikipedia? — Mara parece horrorizada. Antes
que Kirby possa se defender, chegamos ao meu Accord e seu pára-choque dianteiro mutilado. — Rowan!
Oh meu Deus, seu pobre carro.
— Ainda dirige — eu digo, um pouco envergonhada. — Entrem.
— Se for relacionado a um lme, talvez 'setenta' esteja se referindo a um lme de setenta milímetros5 —
diz Mara, deslizando para a parte de trás depois que Kirby ocupou o assento do passageiro da frente. — Há
algum cinema em Seattle que ainda exibe setenta milímetros?
— Meu palpite seria Cinerama — eu digo. É um dos cinemas mais antigos de Seattle. Um pouco mais de
busca frenética no Google. — Um segundo... Pronto! — Viro meu telefone para mostrar a elas, com a
pressa de ter certeza de que você tem a resposta certa para um problema. — Cinerama deixou em cartaz o
lme em setenta milímetros por dois anos e meio.
— Para o Cinerama! — Kirby diz, batendo no meu painel.
Enquanto navegamos em direção ao centro da cidade, Kirby rola minha música, ignorando
descaradamente a regra de escolha do motorista não falada.
— Eu sabia que Howl iria consertar as coisas. Você já está signi cativamente mais animada — diz Mara.
Ela encosta a cabeça na janela. — Mas mataria Seattle se nos desse mais de dez minutos de sol?
As nuvens mudaram de novo, o céu de um cinza tranquilo.
— Você sabe o que dizem — diz Kirby sem tirar os olhos das minhas playlists. — O verão não começa
em Seattle antes do 4 de julho. Por que você tem Electric Light Orchestra aqui?
Tento pegar meu telefone, mas ela o mantém fora de alcance.
— Porque 'Don't Bring Me Down' é atemporal.
— Podemos até pegar chuva no Lago Chelan — diz Mara.
Kirby congela, virando a cabeça para olhar para Mara.
— O que está acontecendo no Lago Chelan? — Eu saio da 99 North para a Denny Way, parando no
meio do trânsito para o almoço no centro de Seattle.
Uma pausa. Kirby investe em descascar adesivos de estacionamento da minha janela.
— Merda — murmura Mara.
— Íamos contar para você — diz Kirby. — Os pais de Mara estão indo para o Lago Chelan no dia 4 e me
convidaram para ir com eles.
— Eles convidaram você — eu digo, meu estômago embrulhando. — Só você.
— Sim.
— Para o m de semana?
— Por, uh, por duas semanas.
Duas semanas inteiras. Não é que sempre passamos todos os dias de cada verão juntos. A cada dois anos,
a família de Kirby visita parentes no Camboja e, duas vezes, Mara foi a um acampamento de dança em Nova
York. Mas este verão é o nosso último, e achei que isso signi cava algo.
Eu tinha tudo planejado na minha cabeça. Areia entre os dedos dos pés no Alki e Golden Gardens,
desa ando uma as outras a tocar a fonte do Seattle Center como se fôssemos doze, hambúrgueres portabello
no Plum Bistro, bolos de chocolate derretido no Hot Cakes, rolos de canela no Two Birds One Scone...
— Ainda podemos ir para o Bumbershoot juntos — Mara diz suavemente.
Eu aperto o volante com mais força.
— Eu não posso ir para Bumbershoot. Vou para Boston no nal de agosto.
— Oh.
— Eu só... pensei que tínhamos todos esses planos.
— Ainda não conversamos sobre isso — diz Kirby, enquanto o tráfego avança.
Abro a boca para insistir que é claro que sim - exceto que não consigo me lembrar disso. Fizemos testes
de AP e exames preparatórios para a graduação e exames nais, e agora estamos aqui, nosso último dia no
auge do nosso último verão, e estou perdendo minhas melhores amigas muito mais cedo do que pensei que
estaria.
3. Saia com Kirby e Mara TODOS OS FIM DE SEMANA!
— Vaga de estacionamento! — Mara praticamente grita, depois leva a mão à boca como se estivesse
surpresa com a explosão. — Quero dizer, há uma boa vaga para estacionar. Ali.
Silenciosamente, eu estaciono lá.
O teatro ocupa quase um quarteirão inteiro, apesar de ter apenas uma tela enorme, e gurinos de várias
franquias de lmes estão em exibição no saguão. Mas minha coisa favorita sobre Cinerama sempre foi–
— Pipoca de chocolate — diz Mara, ainda tentando bancar a paci cadora. — Você quer um pouco,
Rowan?
Eu balancei minha cabeça, recusando, possivelmente pela primeira vez na minha vida.
As calouras do conselho estudantil Nisha Deshpande e Olivia Sweeney estão esperando na entrada do
auditório.
— Rowan, oi! — Nisha diz enquanto rabisca meu nome em sua prancheta. — Estou tão feliz por você
ter conseguido.
Fã-clube, Kirby murmura.
Estamos entre os dez primeiros a chegar. Com exceção de algumas conversas abafadas, o auditório está
silencioso. Pegamos três assentos no corredor perto uma das outras para que possamos escapar facilmente.
E então esperamos.
Nossos colegas aparecem principalmente em pequenos grupos, mas ocasionalmente sozinhos, e eu me
agacho em minha cadeira quando Spencer caminha pelo corredor. Vejo o cabelo de McNair – um farol de
direção, como sempre – e uma mistura de alívio e orgulho passa por mim. Ele conseguiu, mas eu venci.
São quase meio-dia e meio quando a última pessoa chega.
— Número cinquenta sortudo! — Brady Becker grita, destruindo o corredor com a mão estendida.
Algumas pessoas estendem a mão para cumprimentá-lo.
No momento em que ele desliza para um assento na segunda la, a porta do auditório se fecha com um
whoosh e as luzes se apagam completamente.
12h26

UM FILME COMEÇA a rodar. Bem-vindo, diz o título de início, letras brancas sobre fundo preto. Você
passou no primeiro teste.
Os calouros o modelaram em um lme mudo, fotos em preto e branco intercaladas com diálogos escritos
e marcadas por uma peça de jazz. Eles representam o jogo e demonstram mortes adequadas e conduta anti-
desportiva, incluindo uma sequência de perseguição exagerada que termina com um jogador mergulhando
no Lago Verde.
— Luzes! — alguém liga quando termina, mas o quarto continua escuro. — Luzes — dizem de novo,
com mais força.
Enquanto meus olhos se reajustam, um grupo de calouros do conselho estudantil sobe ao palco: a nova
presidente Logan Perez e o vice-presidente Matt Schreiber, além de Nisha e Olivia. Todas estão usando
camisetas azuis, embora Nisha e Olivia estejam carregadas de prancheta, papéis e caixas cheias de
braçadeiras. É claro que elas são as lacaias nesta operação.
— Parabéns, formandos! — Logan grita, sua voz tão controlada que ela não precisa de um microfone.
Ela já levou Westview a dois campeonatos de basquete e provavelmente o fará de novo em seu último ano,
embora eu não esteja por perto para ver. — Vocês estão o cialmente jogando Howl.
Whoops sobem da multidão, e é impossível não se sentir empolgada. No ano passado, mal podia esperar
até chegar a minha vez. Você não termina o WHS até jogar Howl. Agora, estou agarrada a isso com bastante
força.
— Até onde você sabe, todo mundo é um inimigo — Logan continua, compassando o palco. — Seu
melhor amigo, seu namorado, sua namorada. Não con e em ninguém.
Mara e Kirby trocam um olhar preocupado enquanto Matt pega o microfone.
— A estrutura básica do jogo é a mesma dos anos anteriores — diz ele. — Antes de sair desta sala, você
receberá uma braçadeira azul e um pedaço de papel com o nome do seu alvo. Para matar, você precisa retirar
a braçadeira de seu alvo. Então você assumirá o alvo deles, então não perca seu pedaço de papel. — Ele coloca
a mão em concha sobre a orelha. — O que é que foi isso?
— Não perca seu pedaço de papel — o auditório ecoa, e ele nos mostra um sinal de positivo.
— Você também precisa nos enviar uma mensagem quando matar alguém para podermos acompanhar
— acrescenta Logan. — Todos vocês têm o número de antes.
— Mas, Logan — diz Matt —, como que ganha?
— Ótima pergunta, Matt. Você receberá todas as quinze pistas da caça ao tesouro assim que sair desta
sala. Você precisará capturar evidências fotográ cas para cada pista. Alguns deles podem se referir a marcos
muito especí cos, enquanto outros são mais gerais. Você pode obtê-los em qualquer ordem, mas lembre-se
de que pode haver muitas outras pessoas nesses pontos de referência especí cos, pessoas que podem estar
caçando você. Você nos enviará suas fotos e nós as veri caremos para você. Embora você possa compartilhar
fotos com seus amigos a seu critério, faremos uma busca reversa de imagens para ter certeza de que você não
está trapaceando.
— Para vencer, você tem que ser a primeira pessoa com todas as quinze pistas a voltar para a academia
Westview. O jogo terminará uma hora antes da formatura no domingo se não tivermos um vencedor.
— Então o que você está dizendo é que este jogo dura a noite toda? — Matt diz. — E amanhã também?
Logan acena com a cabeça.
— Sim! E todos vocês levantaram muito dinheiro este ano, então temos um jogo realmente emocionante
reservado para vocês. — Logan faz uma pausa para um efeito dramático, depois sorri. — O grande prêmio é
cinco mil dólares.
Um assobio baixo rola pela multidão. Cinco mil dólares – isso é mais que o dobro do nosso prêmio do
ano passado. Cobriria a mensalidade do primeiro ano que minhas bolsas não cobriam.
Eu poderia comprar tantos livros.
— Ok, ok — Logan diz, levantando a mão para recuperar o controle. — Devemos falar sobre as zonas de
segurança, Matt?
— Vamos falar sobre as zonas de segurança, Logan!
Eu tenho que admirar como eles coreografaram isso, como eles funcionam bem juntos. Eles sempre
foram amigos, parceiros em projetos de liderança e, como demonstrado por seus votos quase esmagadores,
são universalmente apreciados entre o corpo docente. Provavelmente será um conselho estudantil muito
mais pací co.
— Ao longo do dia, você receberá mensagens de texto nossas instruindo-o a se encontrar em certas zonas
de segurança, e comparecer a essas zonas de segurança será obrigatório. Queremos ter certeza de que você
não está apenas se escondendo em algum lugar, mas também queremos dar a você a chance de descansar e
passar mais tempo com seus amigos. Você também pode car na zona de segurança se for morto. Este é seu
último dia! A última vez que você vai ver todas essas pessoas! Queremos que você se divirta com eles...
— ... quando você não está tentando assassiná-los — Matt termina. — Alguma pergunta?
Uma mão sardenta dispara para o ar.
— Devemos presumir que temos limitações geográ cas? — McNair pergunta de sua maneira
excessivamente formal.
Logan aponta para ele.
— Sim. Boa pergunta. Não mais ao norte do que a Eighty-Fifth Street, não mais ao sul do que Yesler,
não mais ao leste do Lago Washington, e não mais ao oeste do Puget Sound.
Eles respondem a mais algumas perguntas – "O que acontece se você perder sua braçadeira?" (não faça
isso), “Você pode duplicar as fotos?” (não: uma pista, um ponto de referência). Explosões de texto nos
manterão atualizados sobre a classi cação do jogo.
— Não tomaremos mais seu tempo — diz Logan. — Nisha tem braçadeiras, e Olivia tem seus alvos.
Certi que-se de coletar um de cada. Sua braçadeira deve ser amarrada apenas uma vez, não com um nó. E,
obviamente, não deixe ninguém ver o nome que você tem. Sabemos que alguns de vocês decidirão trabalhar
juntos na caça ao tesouro, mas tenham cuidado. Você nunca sabe se alguém vai sacri car sua amizade para
ganhar uma grande quantidade de dinheiro.
Foi o que aconteceu no ano passado: duas melhores amigas trabalharam juntas em toda a caça ao tesouro
e, no nal, uma delas matou a outra, que era seu alvo.
— Você tem cinco minutos antes que haja um alvo em suas costas — diz Logan. — O mesmo com as
zonas de segurança: cinco minutos de segurança antes que seus inimigos estejam livres para derrubá-lo.
— Boa sorte, Wolf Pack! — Matt diz, e o auditório irrompe em um uivo alto e ansioso antes de pularmos
e corrermos para as portas do auditório.
No saguão, Nisha amarra o lenço azul em volta do meu braço.
— Boa sorte — ela sussurra enquanto eu pego meu pedaço de papel de Olivia.
Meu estômago despenca quando vejo meu primeiro alvo: Spencer Sugiyama.
Fora do teatro, todos se dividem em direções diferentes, alguns em grupos, alguns sozinhos. A lista de pistas
é assustadora. Alguns deles são óbvios, mas estou perplexo com pelo menos alguns.
Kirby, Mara e eu demoramos na entrada da Lenora Street em Cinerama. Agora que estamos sozinhas
novamente, a conversa sobre o carro parece uma barreira física entre nós.
— Nossos cinco minutos estão quase acabando — eu digo, olhando para o meu telefone antes de colocá-
lo de volta no bolso do vestido.
— Certo. — Kirby dá um soco na calçada com a sandália. — E qualquer um de nós poderia car com o
outro.
Eu faço um cálculo mental rápido.
— Há uma chance de dois por cento.
— Sem matemática. A escola acabou — Kirby diz com um gemido. — Eu te contaria se eu tivesse você.
— Mesmo? Porque eu não contaria. — Mara en a uma mecha de cabelo loiro atrás da orelha, sorrindo
inocentemente
— Oh meu Deus, eu não con o em nenhum de vocês! — Kirby diz quando eu também não digo meu
alvo.
Há uma afetação que nunca antes encobriu nossas interações. Eu puxo minha franja, meu hábito
nervoso perene. A rua está movimentada, os tipos corporativos do centro voltam para seus escritórios
depois do almoço.
Meu telefone vibra.
— Isso são cinco minutos — eu digo baixinho, sem saber para onde ir a partir daqui. Literalmente e
gurativamente. — Acho que devemos nos separar até a primeira zona segura?
Não pensei que nos tornaríamos inimigos no Howl tão rapidamente, mas preciso de algum tempo
sozinha para descobrir como me sinto sobre tudo isso.
Mara acena com a cabeça, sua boca ameaçando se transformar em um sorriso malicioso. Modo
competitivo.
— Se vocês durarem tanto tempo.
Elas já se desculparam. Elas não deveriam se sentir mal por quererem sair de férias juntas. É que elas não
me contaram. Elas terão o ano inteiro para carem juntas, enquanto meus dias com elas estão, literalmente,
numerados no calendário do meu quarto, minha data de mudança para Boston no nal de agosto circulada
em vermelho.
— Boa sorte — diz Kirby. Mara ca na ponta dos pés para beijar Kirby, e elas apertam as mãos, um
pequeno gesto que comunica uma coisa: você é amada.
— Vejo vocês na zona segura — eu digo.
Então eu respiro fundo, aperto minha braçadeira e começo a correr.
PISTAS DO HOWL

Um lugar onde você pode comprar o primeiro álbum do Nirvana


Um lugar que é vermelho do chão ao teto
Um lugar onde você pode encontrar Chiroptera
Uma faixa de pedestres em arco-íris
Sorvete adequado para o Pé-Grande
O grandalhão no centro do universo
Algo local, orgânico e sustentável
Um disquete
Uma xícara de café com o nome de outra pessoa (ou seu próprio nome, totalmente incorreto)
Um carro com multa de estacionamento
Uma visão do alto
A melhor pizza da cidade (à sua escolha)
Um turista fazendo algo que um morador teria vergonha de fazer
Um guarda-chuva (todos nós sabemos que os verdadeiros moradores de Seattle não os usam)
Uma homenagem ao misterioso Sr. Cooper
12h57

ALGUNS MOMENTOS depois, paro de correr. Seattle tem muitas colinas.


Não é que eu não goste de exercícios. É que é desaprovado ler livros no campo de futebol... que foi o que
eu z quando tinha onze anos e meus pais me colocaram em um time chamado Geoducks. Coloquei um
livro de bolso na cintura e, quando a bola estava do outro lado do campo, puxei-o para ler. Sempre o
guardei antes que o outro time viesse em nossa direção, mas nem preciso dizer que foi minha primeira e
última temporada de futebol.
Eu veri co as pistas novamente para avaliar o que está nas minhas proximidades. Se eu for ao café do
outro lado da rua, posso pegar a xícara com o nome de outra pessoa e planejar uma estratégia para o resto. A
maioria das pessoas provavelmente se aventurou muito mais longe, então provavelmente estou segura aqui.
O café está tocando música folclórica com vocais femininos arejados, e eu inalo o cheiro de chocolate e
grãos de café. Minha visão de um verdadeiro escritor é alguém que frequenta cafeterias, usa suéteres grossos
e diz coisas como: “Não posso; Estou no m do prazo.” A maior parte da minha escrita acontece tarde da
noite, sentada na cama com meu laptop aquecendo minhas coxas.
— Riley — digo ao barista quando peço meu segundo café com leite do dia.
Depois de pegá-lo, pego uma mesa e entro no twitter de Delilah em vez da lista de pistas do Howl.

Delilah Park @delilahshouldbewriting


Estou indo atrás de você, Seattle! E ainda assim não está chovendo? Eu me sinto traída.
#ScandalatSunsetTour

Já ensaiei uma centena de vezes como dizer a ela o que os romances signi cam para mim, mas ainda estou
preocupada em car com a língua presa. Eu encontrei minha primeira inspiração, a Nora Roberts, em uma
venda de garagem quando eu tinha dez anos, um pouco jovem para entender o que realmente estava
acontecendo em algumas das cenas. Depois de revisar tudo o que o bibliotecário da escola recomendou, eu
queria algo um pouco mais adulto. E isso... de nitivamente era.
Meus pais me divertiram, deixando-me pegar aquele livro. Eles acharam engraçado e me incentivaram a
perguntar se eu tinha alguma dúvida. Eu tinha muitas perguntas, mas não sabia por onde começar. Com o
passar dos anos, os romances tornaram-se um modo de evasão e, ao mesmo tempo, fortalecedores.
Especialmente quando quei mais velha, meu coração disparou durante as cenas de sexo, a maioria das quais
li na cama com a porta trancada, depois de dizer boa noite aos meus pais e ter certeza de que não seria
interrompida. Elas eram emocionantes e educacionais, embora ocasionalmente irrealistas (Um cara pode
realmente ter cinco orgasmos em uma única noite? Ainda não tenho certeza). Nem todos os romances
tinham cenas de sexo, mas eles me deixavam confortável para falar sobre sexo, consentimento e controle de
natalidade com meus pais e amigos. Eu esperava que eles me deixassem con ante com meus namorados
também, mas Spencer e eu claramente tínhamos problemas de comunicação, e com Luke, tudo era tão novo
que eu não sabia como articular o que queria.
Mas então meus pais começaram a fazer perguntas como: "Você ainda está lendo isso?" e "Você não
prefere ler algo com um pouco mais de conteúdo?". A maioria dos lmes e programas que assisti com meus
amigos me mostraram que as mulheres eram objetos sexuais, acessórios, pontos da trama. Os livros que li
provaram que eles estavam errados.
É um conforto saber que cada livro acabará amarrado com um laço elegante. Mais do que isso, os
personagens se enterraram em meu coração. Eu investi em suas histórias, segui-os através das séries
enquanto eles ertavam, brigavam e se apaixonavam. Eu desmaiei quando eles acabaram em um hotel com
apenas um quarto, que obviamente continha apenas uma cama. Aprendi a amar o amor em todas as suas
formas e o desejava desesperadamente para mim: escrever sobre ele, vivê-lo.
Estou farta de car sozinha no meu amor por romances. É por isso que eu quero – preciso – encontrar
Delilah esta noite. Outras pessoas lêem e amam esses livros também, e eu tenho que vê-los na vida real para
acreditar. Talvez parte da con ança deles passe para mim.
— Você está se escondendo aqui? — alguém pergunta, interrompendo meus pensamentos.
Spencer Sugiyama está parado na minha frente, café na mão. Spensur, diz na xícara.
— Jesus Cristo. Você quase me matou de susto.
— Desculpa. — Ele olha a cadeira da minha mesa. — Posso… — ele pergunta, mas não espera por uma
resposta antes de deslizar para ela. Até McNair teria esperado, tenho certeza. — Estou realmente feliz em ver
você. Tenho pensado muito e... não quero terminar em condições tão ruins.
— Está bem. — O pedaço de papel com o nome dele está em brasa no bolso do meu vestido. Sua
braçadeira está bem ali. Eu poderia estender o braço por cima da mesa e puxá-lo. — Mesmo.
Mas uma pequena parte de mim de que não me orgulho muito quer ouvir o que ele tem a dizer
primeiro. Quero saber por que meu relacionamento de ensino médio mais longo foi um fracasso, me
transformou em alguém com quem eu não estava feliz, alguém incapaz de cumprir os itens de um a dez em
meu guia de sucesso.
— Não — ele diz. — Não está. Eu preciso dizer algo. — Ele faz uma careta de dor, e há algo vulnerável
ali que deve ter inicialmente me atraído para ele.
É isso que sempre me atrai nos romances: quando o interesse amoroso revela um passado trágico, ou o
motivo pelo qual ele nunca está em casa nas noites de sexta-feira não é porque ele está trapaceando – é
porque ele está jogando baralho com sua avó doente. Quando alguém mostra esse tipo de suavidade, não
posso deixar de querer saber mais. Eu quero que eles se abram, e eu quero que seja comigo.
Se fosse um romance, ele confessaria que não conseguiu parar de pensar em mim desde o nosso
rompimento. Que foi a pior decisão de sua vida, e ele foi lançado ao mar em um mar de arrependimento
sem um colete salva-vidas. De alguma forma, tenho a sensação de que não é isso que está para acontecer.
Spencer não é tão eloquente.
— Então diga.
Ele bebe seu café e depois limpa a boca com as costas da mão.
— Você se lembra do nosso primeiro encontro?
A pergunta me desconcerta.
— Sim — eu digo baixinho, meu coração me traindo no meu peito, porque é claro que me lembro.
Estávamos ertando no governo da AP por meses, a ponto de heróis de romances começarem a tomar
seu rosto. Como a maioria dos relacionamentos modernos, tudo começou nas redes sociais. Seus guias de
estudo codificados por cores são tão fofos, ele digitou, e eu respondi: Você também. Era mais fácil ser corajosa
quando você não podia ver o rosto de alguém.
Então ele perguntou se eu estava livre no sábado. Era outubro, então fomos a um canteiro de abóboras,
nos perdemos em um labirinto de milho e bebemos chocolate quente da mesma xícara. Depois de
jantarmos em um restaurante tão bonito que tinha um código de vestimenta, nos beijamos no carro dele.
Eu me senti bêbada por ele, bêbada pela maneira como ele passou as mãos pelo meu corpo e beijou a ponta
do meu nariz. Era mais do que o relacionamento de um garoto que gosta de mim no início do ensino médio.
Isso parecia sério. Adulto. Como algo saído de um dos meus livros.
Parecia que ele poderia me amar.
Meu rosto deve estar cando vermelho porque de repente estou quente.
Evidentemente, a memória não desencadeia a mesma resposta nele. Ele ainda está calmo, controlado.
— OK. Você se lembra do nosso segundo encontro? Terceiro? Sétimo?
— Quer dizer, não, mas não entendo o que você está tentando dizer.
— Exatamente. Eu acho que você quer que todo o relacionamento seja como aquele primeiro encontro.
— Isso é ridículo — eu digo, mas ele levanta um dedo para indicar que não terminou. Eu afundo no
meu assento, totalmente ciente de que posso fazer isso agora. Pegue a bandana e cale-o.
— Eu poderia dizer que você cou desapontada quando nós simplesmente saímos e zemos a lição de
casa ou assistimos a um lme. Senti essa expectativa estranha com você. Como se eu nunca fosse estar à
altura dos caras em seus livros.
De todos os arrependimentos que tenho sobre Spencer, no topo da lista está o fato de ter contado a ele
sobre minhas preferências de leitura. Ele aceitou melhor do que a maioria, mas, em retrospecto, talvez seja
porque ele só queria dormir comigo.
— Não quei desapontada — digo, mas não tenho certeza se con o na minha memória. — Parecia que
você simplesmente... parou de se importar.
Mas era mais do que isso. Era como se eu quisesse dar as mãos em público e ele mantivesse a sua no bolso.
Era como se eu quisesse encostar minha cabeça em seu ombro em um cinema e ele mexia o ombro até que
eu me movesse. Tentei chegar perto, mas ele continuou empurrando.
Planejei encontros românticos também: patinação no gelo, um piquenique, um passeio de barco. Na
maioria das vezes, ele olhava tanto para o telefone que eu me perguntava se eu realmente era desinteressante.
— Talvez eu tenha — ele admite. — Começou a parecer uma obrigação, eu acho. Ok, isso soa mal, mas...
os relacionamentos do ensino médio não foram feitos para durar.
Está claro agora que Spencer e eu nunca teríamos um feliz para sempre. As melhores partes de nosso
relacionamento aconteciam na cama, quando nossos pais não estavam em casa, e talvez tudo bem. Tudo
bem que ele não fosse o namorado perfeito.
O que não está bem é que ele ainda está sentado aqui, me fazendo duvidar de algo que nunca me
decepcionou.
— Lamento que nosso relacionamento tenha sido terríveis sete meses para você.
— Isso não foi o que eu quis dizer. — Ele faz uma careta, olhando para sua xícara de café. — Rowan… —
Então ele faz algo perplexo: ele estende a mão sobre a mesa como se quisesse que eu a segurasse. Quando ca
claro que não vou, ele recua.
Eu penso em Kirby e Mara. Seus apertos de mão nunca parecem obrigatórios. Meus pais também – eles
ainda têm os maiores olhares apaixonados um para o outro depois de 25 anos.
— Olha, eu não tenho certeza do que você queria com isso, mas se seu objetivo era me fazer sentir como
uma merda, parabéns?
Parecia uma obrigação. Você se sentiu como uma obrigação, é como minha mente a distorce. Eu quero
tanto ser mais forte do que isso. Luke e eu até assinamos os anuários um do outro. Mas Spencer nunca
deixou de ser complicado, e talvez seja porque eu sou a complicada.
Talvez eu seja muito difícil de amar.
Com um suspiro, ele passa a mão pelo cabelo.
— Só estou tentando explicar o que aconteceu, pelo menos do meu lado. Você quer esse romance
idealizado, e não acho que seja a vida real. Tenho certeza de que todos os relacionamentos cam chatos
depois de um tempo.
É nesse momento que a pena é a coisa mais avassaladora que sinto. Tenho pena desse troglodita porque
ele não tem ideia de que o amor não tem que azedar com o tempo. Não preciso ser levada embora numa
carruagem puxada por cavalos e acredito plenamente que ambos os parceiros são responsáveis por tornar
um relacionamento romântico, se é isso que desejam. Não qualquer besteira heteronormativa que nos diz
que os caras devem dar o primeiro passo, pagar pelo jantar e se ajoelhar.
Mas eu quero algo grande e selvagem, algo que preencha meu coração completamente. Eu quero uma
fração do que Emma e Charlie ou Lindley e Josef ou Trisha e Rose têm, mesmo que sejam ctícios. Estou
convencida de que, quando você está com a pessoa certa, todos os encontros, todos os dias são assim.
— Eu tenho que ir — ele diz, levantando-se e se afastando da mesa.
— Spencer?
Ele olha para mim e, com um sorriso doce, mergulho para frente para arrancar sua braçadeira.
13h33

AINDA ESTOU ZUMBINDO com a adrenalina do Howl quando pego um ônibus que desce a Third
Avenue. Não foi até que Spencer resmungou sobre estar fora do jogo tão cedo e entregou seu alvo (Madison
Winters, que escreveu muitas histórias sobre raposas que mudam de forma em minha aula de redação
criativa – uma ou duas, tudo bem, mas sete?) que me atingiu, correndo pelas minhas veias como uma droga
selvagem. Se é tão bom matar Spencer, só posso imaginar como seria vencer McNair.
Depois que Spencer saiu, eu enviei aos calouros uma foto da minha xícara de café, fui recompensada com
um emoji de marca de seleção verde quase instantaneamente e então examinei a lista de pistas. Aquelas que
se referem a pontos de referência especí cos se destacaram imediatamente – o grandalhão no centro do
universo tem que ser o Fremont Troll, uma estátua sob a ponte Aurora em um bairro apelidado de “Centro
do Universo”.
Faz mais sentido pegar o que puder no centro da cidade antes de ir para o norte. O Pike Place Market ca
a apenas alguns pontos de ônibus de distância, não vale a pena abrir mão da minha vaga de estacionamento.
É provavelmente uma das três principais coisas que as pessoas associam a Seattle, com o Space Needle sendo
o número um e Amazon-Microsoft-Boeing-Starbucks sendo um combinado o número dois. É um dos
mercados agrícolas mais antigos do país durante todo o ano, mas também é uma parte viva da história de
Seattle. E está sempre lotado de turistas, mesmo em dias chuvosos.
— Rowan! — uma voz chama depois que passo meu cartão ORCA6. Savannah Bell acena para mim do
meio do ônibus, e no começo eu hesito, preocupada que ela saiba meu nome. Mas ela levanta as mãos para
indicar que não, e eu aceno de volta para con rmar o mesmo enquanto gemo por dentro. A lei dos ônibus
determina que, se você encontrar alguém que conhece no transporte público, é obrigado a sentar-se ao lado
dele.
— Ei, Savannah — eu digo enquanto deslizo para o assento em frente a ela.
Ela empurra o cabelo preto atrás da orelha, revelando brincos grandes feitos inteiramente de materiais
reciclados. No ano passado, ela abriu uma loja Etsy para vendê-los. Não tenho sentimentos fortes sobre
Savannah Bell, embora saiba que não sou sua pessoa favorita. Em todas as classi cações de classe, ela vem em
número três, logo atrás de McNair e eu. Embora às vezes ela brincasse sobre isso – “Acho que nunca
alcançarei vocês!” – eu podia sentir que havia alguma hostilidade ali.
Tento conversar um pouco.
— Teve um bom último dia?
— Nada mal. — Quando ela ri, parece forçado. — Eu nunca tive uma chance contra você e Neil, não é?
— É possível que tenhamos sido um pouco intensos.
Savannah en a a mão no bolso e mostra um pedaço de papel familiar. Seu alvo Howl.
— Posso me contentar com alguma vingança.
Neil McNair, diz.
Meu estômago embrulha, o que pode ser a súbita guinada do ônibus para frente. Estamos jogando há
apenas uma hora e o olhar de Savannah é de pura determinação. Talvez fosse arrogante presumir que Howl
terminaria com McNair e eu, mas não é o su ciente simplesmente sobreviver mais do que ele. Eu quero ser
aquela que arranca sua bandana.
Se Savannah o matar, eu não o verei até domingo, seu cabelo amejante saindo de baixo de um boné de
formatura.
— Boa sorte — eu ofereço, embora minha voz soe áspera.
Savannah olha para seu telefone, o sinal universal de que está tudo bem para você olhar para o seu
próprio telefone, então eu faço o mesmo.
Estou digitando a mensagem antes de ter a chance de pensar duas vezes.

savannah bell tem o seu nome e ela quer sangue

Se ele acabar morto antes que eu tenha a chance de derrubá-lo, então não sei para que estou jogando. Eu
não teria como cumprir o número dez.
Sua resposta é quase imediata.

McNIGHTMARE

Por que eu deveria acreditar em você?

porque você quer ganhar isso tanto quanto eu

Suponho que você tenha razão.

ela está do outro lado do corredor de mim em um ônibus


agora, indo para o sul do cinerama

— Eu trabalhei pra caramba, sabe? — Savannah diz. — Não consigo me lembrar da última vez que fui
dormir antes da meia-noite. Mas nunca recebi o tipo de atenção que você e Neil tiveram. Todos os nossos
professores achavam que vocês dois eram tão fofos com sua rivalidadezinha.
— Acredite em mim, não foi fofo.
Um músculo em sua mandíbula se contrai.
— Oh, eu acredito em você. É que – eu poderia ter entrado em Stanford... mas eu estava na lista de
espera.
— Sinto muito — digo a ela. — Seattle U é uma ótima escola. — E eu quero dizer isso, mas Savannah
zomba.
— Pike Street! — o motorista chama, e Savannah me empurra para puxar a corda.
Relutantemente, eu a sigo para fora do ônibus e desço outra colina.
Há uma placa iluminada que diz PUBLIC MARKET CENTER. As ruas aqui são mais irregulares, com
tijolos, o que é comum nas partes mais antigas da cidade. Dentro do mercado, os vendedores vendem
produtos, ores e artesanato local. Descendo a rua está o primeiro Starbucks, que tem sempre uma la para
fora da porta, apesar de ter literalmente o mesmo menu que qualquer outro Starbucks. E mais à frente estão
os mundialmente famosos peixeiros que sacodem linguados e salmões por aí o dia todo. Sou vegetariana e,
todos os anos, na escola primária, fazíamos viagens de campo aqui e, todas as vezes, escondia meu rosto no
casaco, levemente perturbada pelo arremesso de peixes.
— Até logo — digo a Savannah, que já começou a andar em direção ao primeiro Starbucks. Não é uma
má ideia para a foto de turista clichê, mas eu tinha outra coisa em mente.
Viro à esquerda, seguindo um caminho de paralelepípedos ladeado de arte de rua até Post Alley e meu
motivo para vir aqui: a parede de chicletes.
Milhares de turistas colocam chiclete aqui todos os dias. Chiclete pinga das janelas e portas, estendido de
tijolo em tijolo, segurando brochuras e cartões de visita. Ele só foi limpo algumas vezes em seus mais de
trinta anos de história e, todas as vezes, os moradores de Seattle criaram uma confusão sobre isso, como se os
pedaços mastigados de Bubblicious fossem tão parte da cidade quanto o Space Needle ou a sequência de
derrotas dos Mariners.
É estranho e nojento e eu absolutamente amo isso.
— Você tira nossa foto? — pergunta um homem com um sotaque forte que não consigo identi car. Sua
família, incluindo um trio de crianças pequenas, está posando em frente à parede.
— Oh, claro — eu digo, segurando uma risada porque isso acontece toda vez que venho aqui. Eles se
juntam, soltando bolhas enquanto tiro algumas fotos.
Eles adicionam sua goma ao mosaico pegajoso, e eu tiro uma foto no meu próprio telefone. Um turista
fazendo algo que um local teria vergonha de fazer. Outra marca de veri cação verde dos calouros.
Dois já foram, faltam treze.
Estou examinando as pistas novamente, supondo que posso comprar algo local, orgânico e sustentável em
qualquer número de vendedores de produtos hortifrutigranjeiros no mercado, quando alguém passa por
mim, assustando-me tanto que quase deixo cair meu telefone. Eu me viro a tempo de pegar um borrão
avermelhado.
— Neil? — Eu grito, correndo atrás dele.
Ele derrapou até parar no meio do beco.
— Savannah — ele ofega, inclinando-se para colocar as mãos nos joelhos. — Ela me viu. Eu escapei por
pouco. Eu tenho que... — Ele gesticula vagamente em direção à extremidade oposta do beco.
— Savannah está determinada.
O olhar que ele me dá pode derreter uma geleira.
— Sim. Eu sei.
O pânico toma conta de mim. Não temos muito tempo. Savannah poderia estar descendo o caminho de
tijolos agora.
— Então você não pode fugir dela. Mas você poderia se esconder dela. — Aponto para o Market
Theatre, escondido dentro do Post Alley. Ghost Alley, alguns chamam, um aceno aos rumores de que Pike
Place é assombrado. Eles ainda oferecem passeios fantasma.
Na maioria das vezes, os turistas nos ignoram, muito focados em tirar a foto perfeita da parede de
chiclete. Eu atravesso o beco e tento a porta do teatro. Destrancada.
McNair levanta as sobrancelhas, como se se perguntasse se é seguro con ar em mim. Seu peito ainda está
subindo e descendo rapidamente, e o vento jogou seu cabelo fora do lugar. Seria divertido vê-lo tão exausto
se eu não estivesse tão perturbada com sua morte potencialmente iminente.
— Aqui — eu digo, acenando para ele, e após alguns segundos de deliberação, ele segue.
— Se você me trancar aqui apenas para fazer o discurso de orador, diga a todos que morri exatamente
como vivi...
— Como um gigante pé no saco? Entendi.
Ele desaparece na escuridão, e eu fecho a porta atrás dele apenas alguns segundos antes de Savannah vir
correndo pelo beco. Os turistas agarram seus pertences e saltam para fora do caminho.
— Você o viu? — ela pergunta, mal suando. — Neil?
Eu aponto para o beco.
— Ele passou correndo.
Ela me abre um sorriso que eu retorno facilmente, embora meu coração esteja batendo contra minhas
costelas. Não desacelera até que ela esteja fora de vista.
Espero mais um minuto antes de abrir a porta.
— Vamos — digo a McNair, e ele segue sem protestar.
Saímos correndo do beco juntos, para longe dos turistas, do chiclete e dos fantasmas.
WESTVIEW HIGH SCHOOL
FORMULÁRIO DE RELATÓRIO DE INCIDENTE

Data e hora do incidente: 15 de ja o, 11h20


Local: Sal #B208, la tóri de ciên i
Relatório enviado por: Tod O’Bri , p o s de quími

Nome da(s) pessoa(s) envolvida(s) no incidente: Row Rot , Ne l Mc a

Descrição do incidente: Fiz Rot e Mc a pa ro de quími no iníci do an pa en já-lo a t a l


ju s de fo ma pa ífica. Os al im a m e pe m no pa ro , in m i qu as ta s er
fina . Dep de al s di s ões no iníci do an le , es va qu el ti s ti is de se si m .
Es a er . Dur o ex me co re ções ex ér i s, su es ção de la tóri ex d u em c a s.
Peg i im a m e o ex t pa ap á-lo. Os al não co g i id fica o qu de er no
ex me , ca um co a in ção de cu r o o t .

Doença ou lesão envolvida: Não

Como o incidente foi tratado: Os al en os pa a sa do di r di r qu es m fe s em cu r


de ção, de qu o in n e não fo pa se re t pe n es. O in n e pa te si um
ac te e, co os al são réus p i ári e são os p i ro c a s fi os em su séri , ne m ação
di p ar ad o l é re n a . Rot e Mc a re rão no du s.

Assinado:

Diretora Karen Meadows, M.Ed.


14h02

ACABAMOS no porão de uma loja, que só posso descrever como um punk-rock de cinco e dez centavos.
Orange Drácula vende todos os tipos de novidades góticas retrô, de botões e adesivos a incenso de vampiro e
cabeças encolhidas. Eles realizam leituras de cartas de tarô ao vivo e uma placa na janela diz SIM,
VENDEMOS CHICLETE. Quando criança, eu achava que era o lugar mais legal do mundo. Em Seattle,
não faltam merdas estranhas e bregas, e esta está entre as mais bregas e as mais estranhas.
— Você salvou minha vida. — McNair diz quase com um ponto de interrogação no nal, como se ele
não estivesse convencido de que realmente aconteceu. Francamente, também estou surpresa.
Viro em um corredor de ímãs feitos de velhos livros de bolso com títulos como Half Past Danger e Sin
Street, a maioria deles com mulheres seminuas na capa. Achamos que estaríamos seguros de Savannah aqui,
já que ela provavelmente presume que McNair fugiu de Pike Place.
— Não é divertido para mim se você for eliminado tão cedo — eu digo, o que é uma semi-verdade.
Ele está agitado, en ando as mãos nos bolsos e, em seguida, puxando-as imediatamente para fora. Não
tenho certeza se é a experiência de quase morte ou se ele é apenas um cara inquieto e eu nunca percebi.
— Ah. Agora tudo faz sentido. — McNair folheia uma variedade de cartões-postais desbotados. Uma
bruxa animatrônica ri de nós, e alguns pré-adolescentes rindo se amontoam na cabine de fotos da loja,
aquela que usa lme real, não digital.
Ele está de costas para mim, e sem minha permissão, meu olhar mapeia o terreno de seus ombros, a
forma como eles se curvam e inclinam antes de mergulhar nos músculos de seu braço. É um belo par de
ombros, eu decido. Uma pena que sejam desperdiçados com alguém como ele.
— E sejamos realistas — digo para suas omoplatas —, quem mais tem chance contra nós?
Ele se vira, mudando as alças de sua mochila, chamando minha atenção para a exão de seus bíceps. Ele
está escondendo esses músculos há pelo menos um ano e meio, e eles distraem mais do que deveriam. Tenho
que descobrir uma maneira casual de perguntar sobre sua rotina de exercícios. Certamente, se eu resolver
esse mistério, pararei de olhar.
— Correto — diz ele.
Então, nossos dois telefones tocam ao mesmo tempo.

OLÁ, FORMANDOS DA WOLF PACK

ESPERAMOS QUE VOCÊS ESTEJA SE DIVERTINDO

VOCÊS TEM 20 MINUTOS

PARA CHEGAR À ZONA SEGURA UM

Um anexo leva a um mapa de Hilltop Bowl, uma pista de boliche no Capitólio.


— Já? — McNair diz, e embora seu telefone tenha a hora, ele veri ca o relógio. — Uau. Não tínhamos
nossa primeira zona de segurança até pelo menos cinco horas.
Zona segura signi ca Kirby e Mara falando sobre as férias que estão tirando sem mim. E,
inevitavelmente, pensando na vida que terei sem elas no próximo ano. Por mais que eu queira atrasar tudo
isso, as zonas de segurança não são opcionais.
— Bem — eu digo enquanto saímos da loja. Sempre faz calor no porão da loja, mesmo nos dias mais
frios. E parece bizarro demais ter passado dez minutos dentro de Orange Dracula com Neil McNair. —
Vejo você em vinte minutos, eu acho? — Se eu voltar de ônibus para o meu carro e dirigir para Hilltop
Bowl, poderei fazer uma fuga mais rápida quando nosso horário de zona de segurança terminar.
— Certo. Vejo você lá — ele ecoa, mas ele segue o meu passo.
— Você está me seguindo?
Ele para.
— Estamos indo para o mesmo lugar. Só que não tenho carro, então vou de ônibus. Eu odiaria chegar
atrasado, o que signi caria que eu correria o risco de ser expulso do jogo... e agora eu sei que você quer que
eu continue nisso.
Eu cruzo meus braços sobre meu peito.
— Não — eu digo enfaticamente. A ideia de Neil McNair no meu carro é inaceitável. Há tantas coisas
que ele poderia julgar: minha música, minha limpeza, o para-choque dianteiro destroçado. — Eu não vou te
dar uma carona.

— Belo carro — diz McNair, mexendo nos botões do ar-condicionado e baixando a janela quando percebe
que o ar-condicionado não funciona. Estou de volta ao meu cardigã, sem graça com a mancha no meu
vestido novamente. De qualquer maneira, não está tão quente – McNair deve se aquecer.
— Por favor, não toque em nada. — Estou encurralada, então tenho que me mover para fora da vaga de
estacionamento centímetro por centímetro agonizante. O carro na minha frente tem uma multa de
estacionamento, que ambos riscamos de nossas listas do Howl.
Ele examina os adesivos de estacionamento en ados no bolso da porta do passageiro, alguns recibos
perdidos no chão. Eu me pergunto o que ele está pensando. É tão evidente que não é um bom carro, mesmo
que eu o ame. Nós nos aproximamos por trás, então pelo menos ele não viu o dano. Espero que ele não diga
nada sobre o cheiro estranho. Não é exatamente ruim, apenas um pouco desagradável.
McNair arranha algum resíduo de adesivo de estacionamento e, em seguida, encontra a barra de ajuste
embaixo do banco do passageiro. Ele o move para trás – muito para trás – e então muito para frente. Então–
— Você é sempre tão inquieto? — Eu pergunto.
Ele retorna o assento à sua posição normal e coloca as mãos no colo.
— Desculpa. Ainda ansioso com a perseguição de Savannah, eu acho.
— Isso é algo de uma única vez — eu digo enquanto viro na Pike Street. Embora eu nunca o tenha
levado a lugar nenhum, andamos de ônibus e viajamos com outras crianças para os eventos da escola. — Só
porque você demoraria muito de ônibus. E se você pensar em criticar minha direção, pode sair agora
mesmo.
— Na verdade, eu não dirijo — diz ele —, então não posso realmente criticar você.
Eu... não sabia disso. Não consigo imaginar McNair não tendo sucesso em um teste.
— Frustrado pelo teste escrito?
— Eu nunca tentei.
— Oh.
— E estarei em Nova York no outono, então não adianta fazer isso agora.
— Certo
Dirigimos em silêncio por alguns minutos, e não é confortável. Aparentemente, nós dois esquecemos
como manter uma conversa. Nunca me senti tão estranha no meu próprio carro.
— Esta é a viagem para casa das regionais de quiz bowl novamente — eu digo.
Ninguém disse uma palavra no caminho das Tri-Cities para casa depois que perdemos no ano passado.
Darius Vogel e Lily Gulati estavam no banco da frente, deixando Neil e eu atrás. De alguma forma, até um
McNair quieto me irritou. Ele alegou que cou enjoado do movimento, mas presumi que estivesse infeliz
(com razão) por ter perdido.
— Exceto que ainda temos uma chance de ganhar — diz ele.
— Porque agora você sabe que a batalha nal da Guerra Revolucionária foi Yorktown, não Bunker Hill?
Ele geme.
— Con e em mim. Está gravado na minha memória para sempre.
Estou um pouco surpresa que ele não esteja se defendendo, mas então, muito desse dia não fez sentido.
Ele se mexe de novo no assento como se estivesse tentando car confortável, algo que pode não ser possível
no carro de sua rival, e quando estamos em um semáforo vermelho, noto um canto de seu anuário
aparecendo em sua mochila. É o su ciente para me fazer segurar o volante com mais força. Eu deveria
apenas ter assinado.
Então ele pega seu telefone, examinando a lista Howl. Eu me pergunto se ele conhece algum que eu não
conheço.
— Você sabia que a palavra 'clue' vem da mitologia grega? — ele diz. — Um clew, C-L-E-W, era um
novelo de lã. Ariadne deu a Teseu um novelo para ajudá-lo a sair do labirinto do Minotauro. Ele o
desvendou enquanto caminhava para que pudesse encontrar o caminho de volta.
Lembro-me vagamente do mito da história mundial.
— Então costumava ser literal, e agora estamos metaforicamente desvendando um novelo de lã quando
tentamos resolver algo?
— Exatamente — diz ele, balançando a cabeça vigorosamente.
— Huh — eu digo, porque embora não seja diferente de McNair falar um fato engraçado sobre
etimologia, esta é talvez a primeira vez que eu notei como isso o deixa animado.
Por m, paramos em uma vaga de estacionamento a poucos quarteirões do Hilltop Bowl.
— Graças a Deus — ele murmura, e eu não tenho certeza se ele está feliz por termos tido um tempo fácil
para encontrar estacionamento ou aliviado por sair do meu carro. Fugir de mim. Provavelmente ambos.
— Bem... boa sorte, eu acho — eu digo quando alcançamos a entrada da pista de boliche, um pouco
instável, mas não totalmente certa do porquê.
Ele en a as mãos nos bolsos.
— Sim. Para você também.
Depois que Logan Perez veri ca nossos nomes em uma lista e anuncia que temos 45 minutos na zona de
segurança, seguimos nossos caminhos separados. Nunca quei tão animada para calçar um par de sapatos
que esteve nos pés de outras centenas de pessoas.
Kirby e Mara estão esperando por mim em uma pista no nal.
— Você quer canaleta, bebê Ro? — Kirby pergunta.
Minhas habilidades de boliche estão quase no mesmo nível que minhas habilidades com delineador no
lado esquerdo. É um milagre chegar aos cinquenta.
— Ha ha. Pode ser.
— Deixe que ela tenha canaleta, se quiser — diz Mara, mexendo nos controles.
Algumas pistas abaixo, McNair arremessa uma divisão de sete por dez, a mais complicada das tacadas de
boliche, e seus amigos soltam um coro de gemidos. McNair apenas ri e balança a cabeça. Os quatro têm uma
facilidade de interação que me faz pensar novamente no que estará acontecendo com todos eles após a
formatura. Se eles vão passar o verão juntos antes do outono os destruir, e se eles vão manter contato depois
disso.
— Mara e eu decidimos nos unir pelo resto do jogo — diz Kirby depois de jogar uma bola na sarjeta. —
Não temos uma a outra, então achamos que estamos seguras por enquanto.
— Junte-se a nós também! — Mara diz, um pouco ansiosa demais. — Nós três! Isso seria divertido.
Kirby joga outra bola fora em seu segundo quadro.
— Talvez eu precise da canaleta também.
— Diz a garota que zombou da canaleta. — Normalmente, eu adoraria me juntar a elas. Mas… — Eu
não tenho certeza. Sobre a formação de equipes. — E não é só porque pretendo destruir McNair sozinha.
Kirby desliza para o assento de plástico na minha frente.
— Isso é sobre as férias?
Aí está.
— Sim, Kirb, você sabe o quê? É sobre isso. É sobre as férias de duas semanas que vocês duas estão
tirando sem mim, quando vocês terão um ano inteiro de faculdade para carem juntas.
— Sinto muito — diz Mara, mais para Kirby do que para mim. Ela limpa as mãos na calça cáqui antes de
pegar a bola roxa. — Eu realmente não achei que ela caria tão chateada.
Ela dá uma tacada, mas não parece feliz com isso.
— Acho que parece que há tantas coisas de Mara-e-Kirby das quais não posso fazer parte — digo,
tentando manter meu nível de voz. — Vocês estão apaixonadas e estou feliz por vocês duas, de verdade. Mas
é como se às vezes vocês esquecessem que eu também estou aqui.
Eles trocam um olhar estranho. Mara põe a mão nas costas do assento de Kirby.
— Rowan — diz ela suavemente —, é assim que nos sentimos sobre você.
Eu franzo meu rosto em confusão.
— O quê?
— Você esteve tão envolvida com Neil este ano — diz Mara, ganhando volume aos poucos. — Você teve
que passar todo o m de semana em seu projeto de física para ter certeza de que era melhor do que o dele.
Você tinha que comparecer a todos os eventos da escola para ter mais tempo na frente do público que votava
ou algo assim. Ainda esta manhã, quando perguntei se você estava bem após a batida no estacionamento,
você pensou que eu estava perguntando sobre ele. E... vocês dois chegaram aqui juntos? Talvez não seja fácil
de ouvir, mas... acho que você está um pouco obcecada por ele.
— Obcecada? — Eu jogo a palavra de volta para ela. — Eu não sou obcecada. McNair – ele não é meu
amigo. Vocês duas são. Não há comparação. — Eu olho para Kirby, esperando que ela esteja do meu lado.
Kirby suspira.
— Nós pensamos por um tempo que você gostava dele, e isso faria mais sentido. Você sabe que pode nos
dizer se quiser, certo? Podemos conversar sobre isso, talvez ajudá-la–
— Não estamos na terceira série. — Quase grito, mas não consigo evitar – a teoria de Kirby é absurda.
Um grupo de crianças na próxima pista gira suas cabeças em nossa direção, e eu baixo minha voz. — Não
estamos provocando um ao outro porque secretamente gostamos um do outro. E isso não deveria ser uma
coisa, de qualquer maneira.
— Certo. Você não está obcecada por McNair — Kirby diz categoricamente. — Você consegue se
lembrar da última vez que nós três saímos?
— Eu... — Eu paro quando nada vem à mente de imediato. No m de semana passado, McNair e eu
tivemos que nos encontrar com Logan para entregar algumas responsabilidades do conselho estudantil. E
no m de semana anterior, Mara estava em uma competição de dança. Então estávamos estudando para os
testes de AP e Mara e Kirby estavam no baile e, ainda mais longe, eu estava com Spencer...
— O leilão dos formandos — eu digo. Foi no início de maio, mas ainda conta.
— Há um mês — diz Mara. — E mesmo assim, você teve que resolver uma crise com ele, e você nos
abandonou pela maior parte da noite.
Passo os dedos pela franja.
— Eu sinto muito. É– você sabe como o nal do ano foi agitado...
Mas estou pensando em como costumava contar tudo a elas, mas elas não sabem que estou escrevendo
um livro. Mara também está buscando uma carreira artística, mas todos nós sabemos que ela é uma ótima
dançarina. Existem muitas evidências de vídeo. Tudo o que eu poderia fazer para me apoiar seria uma
pequena con ssão sussurrada: Acho que poderia ser boa nisso. Uma con ssão que agora desejo ter contado na
primeira vez que fechei um livro de Delilah Park e pensei: Talvez eu pudesse fazer isso um dia também.
Talvez eu pudesse escrever um livro assim. Então haveria a necessidade de convencê-los de que os romances
não são o lixo que pensam que são.
Penso no fundo do meu telefone de novo, na foto que tenho lá há nove meses inteiros.
Nós três tiramos fotos desde então?
— Você fala sobre nós três tendo esse último ótimo verão — Mara continua —, sinto muito, você sabe
que amamos você, mas é um pouco difícil de acreditar.
Suas palavras pesam, arrastando meus ombros quase até o chão. Nossa pista é instável. Minhas amigas e
eu nunca discutimos assim. Na minha cabeça, nosso relacionamento era sólido como uma rocha. Não pode
ser verdade que, na realidade, estava desmoronando.
— Vocês continuem jogando — eu digo, tirando os tênis de boliche. — Eu preciso pegar um pouco de
ar.
Várias ocasiões em que posso ter
(Inadvertidamente) abandonado meus amigos por Neil McNair

NOVEMBRO, TERCEIRO ANO


Kirby e eu estávamos na mesma aula de História dos EUA, e a Sra. Benson nos deixou escolher
parceiros para um projeto de nal de semestre. Kirby presumiu que trabalharíamos juntos, mas como
eu sabia que a Sra. Benson não acreditava na besteira de “todos no grupo recebem a mesma nota”,
fechei os olhos em McNair. Trocamos um aceno de cabeça que signi cava que estávamos na mesma
página: tentaríamos sabotar um ao outro trabalhando juntos. Cada um de nós tirou 98.
MARÇO, TERCEIRO ANO
McNair e eu camos até tarde depois do treino de boliche. Discutimos por tanto tempo sobre uma
das respostas que camos com fome e acabamos continuando nosso debate em um restaurante
mexicano no mesmo quarteirão da escola. Ele era tão irritante que eu mal conseguia saborear meu
burrito vegetariano. Eu deveria estar no recital de dança de Mara e Kirby, mas perdi a noção do tempo
e só peguei a segunda parte.
SETEMBRO, ÚLTIMO ANO
Kirby, Mara e eu planejamos ir para a noite de abertura da sequência da franquia Marvel favorita de
Kirby, mas eu tive que ajudar o conselho estudantil a computar os votos para presidente porque
simplesmente não era possível que eles estivessem divididos exatamente ao meio. Quando
terminamos de contar e recontar, à uma da manhã, cou claro que era possível. E eu tinha perdido o
lme.
MAIO, ÚLTIMO ANO
É tradição que os formandos realizem um leilão silencioso todos os anos para arrecadar dinheiro para
a escola. Todos os alunos do último ano e seus pais são convidados a oferecer algo – um item, uma
experiência – e percorremos a sala para anotar seus lances. É muito elegante para uma escola pública.
Kirby, Mara e eu nos arrumamos e comemos juntas a maior parte da noite – até que uma cesta de
queijos so sticados desapareceu e, como co-presidentes, McNair e eu tivemos que rastreá-la.
Acontece que uma criança havia se afastado com ela, mas levamos quase uma hora para encontrá-la
en ada em um carrinho.
HOJE
… Oh.
14h49

AS MÁQUINAS DE PINBALL DO FLIPERAMA devoram minhas moedas. Obcecada por Neil McNair
– é risível, realmente. Tivemos quase todas as mesmas atividades extracurriculares, as mesmas aulas. Isso não
é obsessão: somos nós dois trabalhando em direção a um objetivo único que apenas um de nós poderia
alcançar.
Qual seria a alternativa? Eu tinha que entrar em sua cabeça, descobrir como derrubá-lo, resolver
problemas que só nós dois conseguiríamos. Eu nunca o rachei totalmente, no entanto. Essa é a parte mais
estranha. Todos esses anos sem segredos obscuros ou con ssões embaraçosas. Conosco, são estritamente
negócios.
Ainda assim, não consigo tirar as palavras das minhas amigas da minha mente.
Acho que você está um pouco obcecada por ele.
Deus, mesmo agora estou pensando em McNair em vez de minhas amigas, as pessoas que quase
abandonei este ano.
Não podemos deixar a zona de segurança antes das três, e pinball é mais fácil do que autorre exão. Isso
me lembra de um dos meus primeiros encontros favoritos de romance. Em Lucky in Lust, Annabel e
Grayson passam horas em um iperama degradado, atraindo uma multidão enquanto ela ca cada vez mais
perto de bater a pontuação mais alta de uma máquina de pinball. O tempo todo, ela está quase totalmente
focada no jogo. Ela pode sentir a presença do adorável professor de história Grayson ao lado dela, o calor de
seu corpo, o cheiro de sua colônia. E quando ela reivindica a pontuação mais alta, ele a envolve neste incrível
abraço de vitória que ela sente na ponta dos pés. Eu não sabia que abraços podiam ser tão quentes.
Não tenho a sorte de Annabel na luxúria ou no pinball. Após perder mais alguns dólares em moedas,
veri co as horas no meu telefone. De alguma forma, só se passaram cinco minutos, mas ainda não estou
pronta para voltar.
Ao longe, ouço alguém dizer meu nome. Eu viro minha cabeça, mas do jeito que a conversa continua em
tons abafados, eu não tenho certeza se alguém estava realmente me chamando. Não estou sendo chamada –
estou sendo o assunto. O iperama ca no último andar, acima das pistas, e é difícil entender a conversa em
meio ao som de al netes batendo e pessoas conversando, rindo. Estou sozinha aqui, provavelmente porque
tudo parece não ter sido limpo nos últimos vinte anos, incluindo o carpete, que é o tom mais triste de cinza.
Mas então ouço meu nome de novo, e desta vez tenho certeza de que está vindo da praça de alimentação
em frente ao iperama.
Não há porta separando a galeria do corredor ou da praça de alimentação – mas há um vaso de plantas
na entrada da galeria que é aproximadamente da minha altura.
O que estou fazendo é ridículo. Eu estou ciente disso. E, no entanto, aqui estou eu, rastejando em
direção à planta, esperando que suas folhas possam esconder a maior parte do meu corpo. Quando eu espio
entre eles, vejo cerca de uma dúzia de Westviewers amontoados na praça de alimentação, o tipo que serve
pizza de plástico e refrigerantes de um dólar. Savannah Bell está na cabeceira da mesa e parece tão
emocionada quanto eu quando soube que os votos para presidente do conselho estudantil foram divididos
ao meio.
— Você não está cansado de Rowan e Neil ganhando tudo? — ela está dizendo, acenando com uma
xícara para dar ênfase. — Cada teste, cada competição, é Neil e Rowan, Rowan e Neil. Se eu nunca ouvir
seus nomes juntos novamente, será muito cedo.
Você e eu.
— É o último dia de aula, Sav — diz Trang Chau, namorado de Savannah. — Por que isso importa?
— Porque se um deles ganhar hoje — Savannah continua, seus brincos tremendo com a indignidade de
tudo isso —, então eles ganham o ensino médio. Eles vão para a faculdade presunçosos, pensando que são
melhores do que o resto de nós. Pense em como seria satisfatório derrubá-los. Os primeiro e segundo
melhores da turma, derrotados em seu último jogo.
Esta conversa parece sinistra, de alguma forma. McNair e eu ganhamos todos os elogios, todas as vitórias.
— Sempre achei que eles estavam se agarrando — diz Iris Zhou, e luto contra a vontade de me
amordaçar com uma folha de planta.
— Não. De jeito nenhum — diz Brady Becker. O abençoe. — Eu z um projeto em grupo com eles no
ano passado, e eles quase se mataram. Foi brutal pra caralho.
— Eu não sei. — Meg Lazarski bate no queixo. — Amelia Yoon disse que os viu entrar no armário de
suprimentos juntos durante a liderança no mês passado, e quando eles saíram, o cabelo de Neil estava uma
bagunça e Rowan estava totalmente corada.
Eu abafo uma risada. O armário era minúsculo, e eu acidentalmente esbarrei nele enquanto pegava um
frasco de tinta. A simples proximidade de outro ser humano em um espaço fechado faria qualquer um se
sentir corado. Quanto ao cabelo: bem, era semana de teste de AP, e algumas pessoas brincam com o cabelo
quando estão ansiosas. Acho que temos isso em comum.
— Eu não me importo se eles estão cando ou não — Savannah diz. — Tudo que eu quero fazer é
derrubá-los.
— Isso não é um pouco... antidesportivo? — Brady pergunta antes de en ar meia fatia de pizza em sua
boca.
— Não estamos fazendo nada que viole as regras do Howl — diz Savannah. — Eu tentei matar Neil mais
cedo, mas Rowan apareceu para salvá-lo.
— Ficando — Iris canta, como se isso explicasse tudo.
Savannah xa a Iris com um olhar mortal.
— Além disso — continua Savannah —, não é como se Rowan precisasse do dinheiro.
— O que você quer dizer? — Meg pergunta.
— Judia? — Savannah diz enquanto bate no nariz.
Ela bate. O nariz dela.
Não consigo ouvir o que as pessoas dizem a seguir – se alguém ri, se alguém concorda com ela ou se
alguém a chama. Eu não consigo ouvir. Eu não consigo ver. Eu mal consigo pensar. Um pânico que não
sentia há anos ui através de mim, incandescente.
Eu enrolo uma mão em torno da casca falsa da planta em uma tentativa de me ancorar. No azul mais
azulado de Seattle, um lugar que todos a rmam ser tão aberto, isso ainda acontece: os comentários que as
pessoas acham que são inofensivos, os estereótipos que aceitam como verdade. Não há muitos judeus aqui.
Na verdade, posso citar o nome de qualquer outro garoto judeu em Westview – nós quatro. Kylie Lerner,
Cameron Pereira e Belle Greenberg.
Quando você é judeu, aprende desde muito jovem que pode aceitar as piadas ou revidar e se arriscar em
muito pior, porque ainda não tem palavras para dizer a ninguém por que essas piadas não são engraçadas.
Escolhi a opção A. Às vezes co doente, pensando em como incentivei as pessoas na escola primária, porque
se você não consegue vencê-las, junte-se a elas, certo?
Eu corro meu dedo indicador ao longo da saliência de osso no meio do meu nariz. Na quarta série, falhei
propositalmente em um exame de vista, esperando que os óculos diminuíssem a monstruosidade no meio
do meu rosto, mas me senti tão culpada por isso que acabei confessando aos meus pais. Mesmo agora, não é
meu recurso favorito. Um comentário e isso me arrasta de volta para aquele lugar onde eu odiava olhar para
mim mesmo.
— Se você está aqui — Savannah está dizendo, e eu me forço a me concentrar na conversa —, é porque
você quer derrubá-los também. Quem não quiser, pode se sentir à vontade para ir embora.
No início, ninguém se move. Então Brady se levanta.
— Estou fora. Rowan e Neil são legais e não quero estragar a diversão de ninguém.
— E eu só estava aqui pela pizza — diz Lily Gulati. — O que foi maravilhosamente medíocre. Boa sorte
com sua vingança, eu acho.
Ninguém mais se levanta.
Não sou ingênua o su ciente para presumir que todos na escola gostavam de mim, mas imaginei que,
pelo menos, eles não me odiavam tanto. Essa dura realidade me deixa instável. Talvez eu tenha subestimado
Savannah. Ela é claramente alguém que pode invocar poder quando quer, dado o grupo que ela estabeleceu
aqui. E depois do que ela disse, o jeito que ela bateu no nariz – ela nunca foi minha pessoa favorita, mas
agora ela se tornou uma vilã completa.
Meu pescoço está começando a doer. Estou tão desesperada para torcer para o outro lado em busca de
algum alívio, mas não posso arriscar chamar a atenção para o meu esconderijo.
— Agora que isso está resolvido — diz Savannah —, vamos falar de estratégia. Ainda tenho o nome de
Neil. — Ela balança o papel para que todos vejam. — Mas ele sabe que eu tenho. — Esta última parte, ela
deixa pairar no ar, como se esperasse que seus seguidores assimilassem o signi cado oculto.
— Acho que entendi o que você está dizendo — diz Trang. — Mande um de nós matá-lo, então anote o
nome de Neil, para que ele não veja isso chegando?
Um sorriso perverso de Savannah.
— Exatamente.
— Artoo? O que você está fazendo?
A voz me assusta tanto que deixo escapar um suspiro e imediatamente coloco a mão sobre a boca.
— Merda, merda, merda — eu assobio, girando ao redor para encontrar McNair olhando para mim com
uma expressão muito confusa no rosto.
Com o coração martelando, pego sua manga da camisa e o arrasto até car agachado atrás da cabine de
aluguel de sapatos desocupada. Ele tropeça, mas rapidamente se endireita, seguindo minha liderança e
abaixando a cabeça. Nossos joelhos encontram o tapete cinza um pouco mais duramente do que eu
esperava. Os sapatos de boliche estão empilhados em leiras organizadas na frente de nossos rostos. Tenho
certeza de que estamos fora de vista, mas não consigo ouvir nada do que Savannah está dizendo.
— Você pode me soltar agora — sussurra McNair.
Oh. Só então percebo o quão próximos estamos e ainda estou segurando sua manga. Embora eu sinta
que não respiro normalmente há horas, seu peito sobe e desce da maneira mais constante, aquela misteriosa
frase em latim movendo-se para cima e para baixo.
Eu libero meu controle sobre ele, tentando o melhor que posso evitar o contato com sua pele enquanto
me sento nos calcanhares e me ocupo reajustando meu suéter. Comecei a suar quando estava espionando, e
estar sicamente perto de outra pessoa – mesmo que seja McNair – não está exatamente ajudando.
Minha mente está girando. Savannah quer que seu exército vá atrás de McNair e eu. Como o quê, algum
tipo de vingança distorcida por ser bom na escola?
McNair abre a boca para dizer algo, mas levo um dedo aos lábios. Devagar, devagar, rastejo para a
esquerda até que mal consigo ver a praça de alimentação. O grupo parece que está se encerrando, voltando
para suas pistas. O que quer que eles decidiram fazer, eu perdi completamente.
Eu rastejo de volta para Neil, que, para seu crédito, está imóvel muito quieto.
— Estou perdido — diz ele. — Isso faz parte do jogo?
— Eu vou te dizer o que está acontecendo. Eu prometo. — Veri co meu telefone. Nosso horário de zona
de segurança está quase acabando. — Mas não aqui.
Ele bate palmas e sorri dessa maneira exagerada.
— Isso signi ca que vou poder andar no seu carro de novo? Oh, Artoo, diga que não é super!
Eu reviro meus olhos.
— Encontre-me no meu carro assim que nos deixarem sair. E certi que-se de que ninguém o siga. —
Não quero que ninguém nos veja juntos.
Um lampejo de diversão cruza seu rosto, mas ele acena com a cabeça. Ele tem que conseguir ver o quão
sério eu falo sobre isso. Eu posso con ar nele.
Eu acho.

— Eu seria um espião realmente excelente — diz McNair quando me aproximo do carro. Ele já está
encostado nele, um pé apoiado no pneu traseiro. Se ele fosse outra pessoa, poderia parecer legal. — No caso
de você estar se perguntando.
Eu o ignoro e inspeciono nossos arredores para ter certeza de que ninguém nos seguiu. Depois que saí do
iperama, Mara disse que eu ainda poderia me juntar a ela e Kirby, mas balancei a cabeça e disse que as veria
mais tarde. Um silêncio pesado passou entre nós três, como se não tivéssemos certeza de como navegar nessa
nova fase de nossa amizade, onde todos os nossos problemas – meus problemas – estavam à vista.
Tudo que sei é que McNair e eu não estamos seguros.
Agora que ele está vendo outro ângulo do meu carro, ele nota meu para-choque dianteiro e respira
fundo.
— Oh — eu digo, estremecendo. — Sim. Eu, hum. Bati em alguém. Esta manhã.
— É por isso que você estava atrasada? — Ele se abaixa para examiná-lo.
— Fiquei com vergonha de dizer qualquer coisa.
Algo inesperado acontece então: sua voz ca suave, seus olhos cheios de algo que, se eu não soubesse
melhor, poderia ser preocupante.
— Você está bem?
— Estou bem. — Eu puxo meu suéter mais apertado em torno de mim. — Eu não estava indo muito
rápido. Meu vestido é o que mais sofreu.
— Ainda assim, eu sinto muito. Eu estava no banco do passageiro quando minha mãe bateu na traseira
no ano passado, e o carro estava bom, mas me abalou. Eu não percebi, ou não teria dado a você um
momento tão difícil esta manhã.
— É... obrigada. — Eu continuo, reconhecendo que esta é talvez uma conversa normal entre duas
pessoas em uma que se importa que a outra não tenha morrido esta manhã. — Eu não vejo ninguém. Entre.
Fechamos as portas, mas estamos muito perto da pista de boliche para maior conforto. Eu dirijo por
alguns minutos em silêncio, serpenteando por ruas residenciais até encontrar uma vaga de estacionamento
mais profunda no Capitol Hill.
— Você está começando a me assustar — diz McNair quando desligo o motor.
Solto um longo suspiro.
— Eu sei que isso é estranho... mas eu ouvi Savannah Bell falando na praça de alimentação sobre nós. Ela
tinha um grupo de dez ou doze pessoas, e eles planejavam formar uma equipe para nos tirar do jogo.
Seu rosto se contorce.
— O quê? Por quê?
— Por serem idiotas? Por estarem atrás de nós por sermos os melhores na escola?
— Tecnicamente, você é a segunda melhor — diz ele, e estou ansiosa demais para car irritada com isso.
— A forma como Savannah expressou isso, foi como se vingar de nós depois de todos esses anos. Eles
pareciam muito sérios sobre isso. E Savannah disse... — Mas então eu paro, percebendo que estava prestes a
contar a ele como ela bateu em seu nariz. Não tenho certeza se posso explicar para alguém que não é judeu,
que nunca experimentou isso, como comparar o judaísmo com a riqueza é anti-semita. Séculos atrás, os
judeus não tinham permissão para possuir terras e só podiam ganhar a vida como mercadores e banqueiros.
Evoluiu para um estereótipo de que não somos apenas ricos, mas também gananciosos. — Que ela, hum.
Tem você agora.
McNair acena com a cabeça, puxando um o solto de sua mochila.
— Mas pelo que eu pude perceber — continuo —, eles mandariam alguém para matá-lo apenas para
tirar o seu nome.
— Quem?
— Eu não consegui ouvir. Foi quando você me interrompeu.
— E você também não sabe quem está com você?
— Eu não. Como eu disse, foi quando você me interrompeu. Continuando — eu digo. — Todos eles
vão querer nos pegar. E também não se importam em se sacri car pela causa. Claramente, não se trata de
dinheiro para eles.
Um breve silêncio cai sobre nós. A testa de McNair está franzida, como se estivesse tentando entender o
plano de Savannah.
Não sei como explicar a ele que quanto mais tempo co no jogo, quanto mais co no colégio, mais não
terei que enfrentar a realidade de que não me transformei na pessoa dos meus quatorze anos queria ser. Na
segunda-feira de manhã, quero voltar para a sala de aula com a Sra. Kozlowski, debater com McNair
durante o Governo da AP, brincar com Mara e Kirby no almoço. Não estou pronta para o mundo além de
Westview ainda.
Ou talvez eu não precise explicar. Talvez ele se sinta exatamente da mesma maneira.
— Bem... merda — ele diz nalmente, e apesar de tudo, isso quase me faz rir. É uma coisa tão resignada
de se dizer, e McNair nunca se resignou sobre nada, desde que eu o conheço. — O que nós fazemos?
É estranho ele perguntar isso. Não só porque ele usa “nós” como se fôssemos uma unidade, mas porque
é exatamente o que eu estive pensando: Como é que vamos vai lidar com isso?
Eu convoco todas as minhas forças para proferir a próxima frase. Considerando todas as vezes que
estivemos juntos durante o ensino médio, talvez minha sugestão seja adequada. Tenho pensado nisso desde
que os ouvi conversando e tenho quase certeza de que é a única solução. Minha mandíbula está apertada,
minha garganta áspera enquanto as palavras sobem, lutando contra todo desejo de autopreservação.
— Acho que devemos nos unir.
POSIÇÕES DO HOWL
TOP 5

Neil McNair: 3
Rowan Roth: 3
Brady Becker: 2
Savannah Bell: 2
Mara Pompetti: 2

JOGADORES RESTANTES: 38

A MORTE MAIS BRUTA: Alexis Torres Aiden


Gallagher, por meio do término com ele
15h07

MCNAIR FICA QUIETO por alguns segundos. Ele está segurando sua mochila no colo e a deixa cair no
espaço perto de seus pés. No começo estou convencida de que ele vai me dizer que estou sendo ridícula, que
formar uma equipe é um absurdo. Ele franze a testa, depois achata a boca em uma linha reta e franze a testa
novamente. É como se ele estivesse pesando cuidadosamente as opções, os prós e os contras marchando ao
longo de seu rosto, bagunçando suas feições.
— Eu realmente esperava que houvesse outra maneira — eu digo. — Mas se nós dois queremos vencer, o
que eu acho que queremos, então… — Eu o deixo preencher o espaço em branco.
Não é uma sugestão fácil de fazer. Quando trabalhamos juntos no passado, geralmente é forçado. No
conselho estudantil, em projetos de grupo, estávamos trabalhando para os mesmos objetivos gerais com
planos de ataque completamente diferentes. O incidente do Homem Branco em Perigo em repetição in nita.
O enredo de Savannah deixou claro que isso é maior do que uma rivalidade, maior do que o número dez da
minha lista.
— O que exatamente isso implicaria, formar uma equipe? — ele pergunta, sempre lógico.
Na luz suave da tarde, suas sardas parecem quase iluminadas por dentro. Ele nunca cou assim sob as
luzes LED ecológicas de Westview. Seus cílios estão brilhando em âmbar, e o efeito é tão surpreendente que
tenho que desviar o olhar.
— Ajudar um ao outro com as pistas. Cobrir as costas um do outro. — Percebo que não tenho ideia de
quem é o alvo de McNair, e isso me deixa inquieto. — Espere, quem você tem?
— Oh, Carolyn Gao. — Presidente do clube de teatro. Ela foi incrível na produção de Little Shop of
Horrors do ano passado. — E eu sei que você não me tem, mas–
— Madison Winters.
Ele concorda.
— Então, se zermos isso, se nos juntarmos, o que acontece no nal? Presumo que isso signi que que
terminaremos a caça ao tesouro ao mesmo tempo, certo?
— Assim que tivermos a última pista, é uma guerra total. Quem conseguir voltar primeiro para o ginásio
vence. Um contra o outro, do jeito que sempre foi. — Nós nos juntamos agora e eu o destruo mais tarde.
Essa é a essência disso.
Eu me abstenho de mencionar a sessão de autógrafos de Delilah Park. Isso é daqui a quatro horas a partir
de agora. Se não tivermos irritado um ao outro até a morte, vou dar uma desculpa para fugir.
Ele puxa outro o solto de sua mochila, onde do broche dos FILHOTES DE GRAÇA! se agarra ao
náilon desgastado.
— Eu só estou me perguntando... o que isso signi ca para você? Se você quer muito vencer isso, não
pode ser apenas para me vencer.
— Isso é... uma boa parte disso — eu admito. Isso não o tiraria do posto de orador da turma, mas eu só
sei que seria incrível vencer nossa última competição. Não quero car presa no tempo, a segunda melhor. —
E eu adoraria o dinheiro para a faculdade. — Então eu disparo a pergunta de volta para ele.
— Escola — ele concorda, um pouco rápido demais. — Nova York é cara.
— Certo — eu digo, incapaz de evitar a sensação de que ele está apenas parcialmente dizendo a verdade.
— Hipoteticamente, se eu concordar com esse seu esquema, digamos que você ganhe o jogo inteiro.
Você obtém a glória. O que eu ganho? Parece um acordo de merda para mim nesse ponto.
Eu considero isso.
— Dividimos o dinheiro. Meio a meio. Independentemente do resultado.
Um sorriso se espalha em seu rosto e o medo se agita no meu estômago. Isso não pode ser bom.
— E se aumentássemos as apostas?
— Estou ouvindo.
— Uma aposta — ele propõe. — Você e eu. Uma aposta para encerrar nossos quatro anos épicos de
derramamento de sangue acadêmico.
— O quê, como se o perdedor tivesse que car nu sob a beca na formatura?
Ele bufa.
— Sério? Você tem doze anos? Eu estava pensando em algo muito mais pessoal.
Eu torturo meu cérebro. Provavelmente há muitas coisas que McNair não gostaria de fazer, mas não o
conheço bem o su ciente em um nível pessoal para adivinhar o que qualquer uma delas seria.
Então eu suspiro, cobrindo minha boca para esconder um sorriso quando a ideia me atinge.
— O perdedor tem que escrever para o vencedor um relatório sobre um livro de sua escolha.
— Quantos parágrafos?
— Cinco, pelo menos. Espaço duplo, não menos do que três páginas. — Cruzo os braços sobre o peito,
ciente de que essa é a aposta mais nerd da história. Mas, uau, os livros que eu poderia fazer com que ele
lesse... — Você está dentro ou não?
Por um instante, nenhum de nós pisca. Em todas as nossas competições, nunca colocamos uma aposta.
Sempre havia muito em jogo.
— Por mais estranho que seja falar sobre relatórios de livros no último dia de aula, é meio perfeito — diz
ele. — A única questão é: deveria ser O Velho e o Mar ou Grandes Esperanças? Ou espere, adoraria ver o que
você realiza com Guerra e paz. Abreviado, naturalmente.
— Tantos homens brancos medíocres para escolher.
— E ainda há uma razão pela qual eles são chamados de clássicos. — McNair se vira no assento e estende
a mão. — Para a destruição mutuamente assegurada — ele diz, e nós agitamos sobre isso.
Apesar de nossa altura igual, nossas mãos não são do mesmo tamanho, o que eu não tinha motivo para
notar até agora. Suas mãos são um pouco maiores, sua pele quente, dedos sardentos entrelaçados entre os
meus.
— Você realmente tem muitas sardas.
Ele retira a mão da minha e olha para ela em falso espanto.
— Oh, é isso que são. — Em seguida, ele coloca as mãos no colo. — Eu sempre as odiei.
— Por quê? — Eu sei que ele ca envergonhado quando eu o provoco sobre elas, mas eu não acho que
elas sejam feios ou algo assim, embora é claro que eu nunca diria isso na cara dele. Elas são simplesmente
abundantes. — Elas são... interessantes. Eu gosto delas.
Uma pausa. Uma sobrancelha levantada.
— Você... gosta das minhas sardas?
Eu reviro meus olhos e decido jogar junto.
— Sim. Sempre me perguntei se você tem sardas por toda parte.
É quase automático agora, a maneira como posso fazê-lo corar assim. Ele realmente é muito sensível a
respeito delas. Ainda assim, ele estala a língua e diz:
— É melhor algumas coisas deixarem um mistério. — Ele passa a mão para cima e para baixo em seu
braço nu. — Controle-se, Artoo. Somos companheiros de equipe agora. Se você não consegue lidar com
todas essas sardas quentes, então podemos estar condenados.
Deve ser por estar falando sobre elas que me faz encarar seu rosto por mais um momento do que
normalmente faria. Porque a questão que me pergunto é se ele tem sardas por toda parte. De uma forma
puramente cientí ca, da mesma forma que você se pergunta quando o próximo grande terremoto vai
atingir Seattle ou quanto tempo leva para mastigar chicletes para se decompor. Dado que elas estão tão
densamente pontilhadas em seus braços quanto em seu rosto, ele deve ter, certo?
Ele tem que saber que não estou falando sério. Não quero que ele pense que estou calculando a
proporção de pele sardenta e pele sem sardas. Mesmo que seja de forma puramente cientí ca.
— Seus óculos estão tortos — eu digo, esperando que isso nos faça voltar ao normal, e ele os ajusta.
Lá. Exceto que normal não é Rowan contra Neil; é Rowan e Neil contra o resto da turma de formando.
Provavelmente é uma péssima ideia.

Depois de uma fatia do que McNair declara ser a melhor pizza de Seattle, traçamos estratégias. Bem,
primeiro discutimos. Eu começo a pagar pela minha comida, mas ele insiste em fazer isso, já que sou eu que
está nos levando. Então, a contragosto, concordo em compartilhar minha foto da parede de chiclete, desde
que ele compartilhe sua foto de um guarda-chuva. Até este ponto, éramos iguais. E suponho que ainda
somos.
Adoraria decifrar todas as pistas agora, mas McNair acha que é uma perda de tempo. Ele quer se
concentrar no que sabemos e descobrir o resto ao longo do caminho.
— Isso é algo chamado de planejar demais — diz ele, jogando ocos de pimenta vermelha em sua pizza.
A Upper Crust não é a melhor pizza de Seattle, na minha opinião. Minha fatia tem mussarela pegajosa
demais, molho insu ciente. — Preciso lembrá-la do incidente da leitura de verão?
Eu faço uma careta. Nossa professora de inglês do primeiro ano havia enviado uma lista de títulos na
semana que a escola divulgou, e eu decidi ler todos os cinco o mais rápido que pudesse para que pudesse ler
o que queria pelo resto do verão. No dia em que terminei, ela mandou um e-mail para que todos soubessem
que ela havia enviado a lista errada e “com certeza” ninguém havia começado ainda.
— Isso foi uma anomalia. — Jogo a cartada do carro: se ele quer andar, pode ir embora assim que
terminarmos de comer, mas co aqui até pensar mais um pouco. Ele cede.
Pelo menos concordamos com algumas das pistas mais especí cas. Sorvete fit para Pé Grande é
provavelmente o sabor do yeti na Molly Moon's, a sorveteria mais popular de Seattle. E temos certeza de que
um lugar onde você pode encontrar Chiroptera, o nome cientí co de um morcego, é a exibição noturna do
Woodland Park Zoo.
— Você tem ideia do que poderia ser 'uma homenagem ao misterioso Sr. Cooper'? — ele diz. — É tão
vago. Pesquisei 'Seattle Cooper' no Google e só encontrei uma empresa de reboque, uma concessionária de
automóveis e um monte de médicos. Ou este – ‘um lugar que é vermelho do chão ao teto’?
— O Red Hall na Biblioteca Pública de Seattle no centro”, digo sem perder o ritmo. Meus pais têm
horários regulares para contar histórias na biblioteca, e eu explorei quase cada centímetro disso. O corredor
é assustador, mas fascinante, uma peculiaridade em um prédio cheio de peculiaridades. A pista do Sr.
Cooper, porém, é tão misteriosa quanto ele aparentemente é. — Agora eu sei por que você estava tão
ansioso para formar uma equipe — eu digo, empurrando um pouco do excesso de queijo da minha pizza.
— Você não conhece nenhum dos difíceis.
— Não é verdade. — Ele aponta para algo local, orgânico e sustentável. — O sistema de compostagem
que você introduziu em Westview.
Apesar de tudo, eu bufo e dou risada.
— Por favor, estou comendo.
É estranho, porém, comer pizza com Neil McNair. A janela da pizzaria é semirre exiva, quase me
deixando ver como é, nós dois juntos em público. Seu cabelo ruivo está ligeiramente bagunçado pelo vento,
enquanto meu coque saiu voando pelo vento e saltou para um desastre natural algumas horas atrás.
Depois de mais alguns minutos de discussão, ainda estamos perplexos com o misterioso Sr. Cooper, mas
lidaremos com isso mais tarde. Nossa primeira parada como equipe será perto da Doo Wop Records para o
primeiro álbum do Nirvana.
Jogamos nossos pratos na caixa de compostagem (naturalmente) antes de deixar a Upper Crust. Neil
pega seu telefone para mapear a loja de discos. Além de todas as mídias sociais regulares e ícones de
mensagens, há mais do que alguns aplicativos de dicionário em sua tela inicial.
— Um fã de Merriam-Webster? — Eu pergunto.
— Eu sou mais um cara do OED. — Quando eu olho para ele em branco, ele continua: — Oxford
English Dictionary? É apenas o registro de nitivo da língua inglesa.
— Eu sei o que é o Oxford English Dictionary — eu estalo. — Eu simplesmente não estava familiarizado
com a sigla. Com que frequência isso surge na vida diária, a nal? Quando você precisar sacar um
dicionário... ou cinco?
Ele encolhe os ombros.
— Com alguma frequência, se você quiser se tornar um lexicógrafo.
— Oh — eu digo, balançando a cabeça como se eu soubesse exatamente o que é.
O canto de sua boca se curva.
— Você também não sabe o que é isso, não é?
— Estou tentando muito não achar você irritante agora.
— É alguém que compila dicionários — diz ele, e isso meio que combina com ele. — Adoro palavras e é
isso que quero fazer. Não há melhor satisfação do que usar precisamente a palavra certa em uma conversa.
Adoro o desa o de aprender um novo idioma e adoro descobrir padrões. E acho fascinante que palavras em
outras línguas tenham se in ltrado em nosso vocabulário. ‘Cul-de-sac’7, ‘a cionado’, ‘tattoo…’
Enquanto ele explica isso, seus olhos se iluminam e ele gesticula com as mãos. Não sei se já o vi tão
animado, claramente apaixonado por alguma coisa.
— Isso é legal — eu nalmente admito. Porque, honestamente, é. — Quantas línguas você sabe?
— Vamos ver… — Ele os tira dos dedos. — Cinco em AP de espanhol, francês e latim. Teria aceitado
japonês, mas eles não ofereceram, então isso terá que esperar até a faculdade. As línguas do romance são
fáceis de aprender, uma vez que você tenha uma base em uma delas, então eu tenho me ensinado italiano no
meu tempo livre. — Seus lábios se curvam em um sorriso. — Você pode dizer que está impressionada. Está
tudo bem.
Eu me recuso, mas é difícil não car impressionada quando meu conhecimento da primeira língua de
minha mãe termina no espanhol III.
Como a loja de discos não ca longe, decidimos caminhar em vez de esperar ter sorte duas vezes com
estacionamento no Capitol Hill. Seguimos o passo, passando por uma lavanderia a seco, uma sapataria e
uma casa de sushi. Como temos exatamente a mesma altura, nossos sapatos batem no pavimento em
conjunto. Aposto que ganharíamos facilmente uma corrida de três pernas.
Broadway é a rua principal de Capitol Hill, uma rua onde restaurantes e boutiques vazios foram
lentamente substituídos por Paneras8 e cafés para gatos. Algumas peças da história de Seattle permanecem,
como a estátua de bronze de Jimi Hendrix na Broadway e Pine, solo congelado no meio de guitarra e Dick's
Drive-In. Não como hambúrgueres, mas seus milkshakes de chocolate são perfeitos em uma xícara
compostável. É também o centro da cultura queer em Seattle, daí as faixas de pedestres arco-íris, das quais
tiramos fotos e recebemos nossas marcas verdes.
— Posso te perguntar uma coisa? — ele diz de repente. Ele parece desconfortável, e eu entro em pânico,
preocupada que ele vá trazer seu anuário à tona novamente. Vou assinar agora mesmo se ele zer isso. Não
vou fazer nenhum comentário sarcástico. — Por que você me odeia tanto? — Sai tão facilmente, sem
acúmulo. Ele não tropeça, mas me pega desprevenida, me faz parar no meio da calçada.
— Eu… — Eu estava preparada para disparar uma resposta, mas agora não tenho certeza do que era. —
Eu não te odeio.
— Acho isso difícil de acreditar. Você tem zombado sem parar na última meia hora.
— ‘Ódio’ é uma palavra muito forte. Eu não te odeio. Você — eu aceno minha mão no ar como se a
palavra certa fosse algo que eu pudesse pegar — me frustra.
— Porque você quer ser a melhor.
Eu faço uma careta. A maneira como ele diz isso me faz sentir imatura sobre tudo isso.
— Bem, ok, sim... mas é mais do que isso. A maior parte do que falamos é completamente inofensivo,
mas você nunca foi capaz de parar com os comentários sarcásticos sobre romances, e isso não está me
importunando. Só... dói.
Seu aperto nas alças da mochila afrouxa e ele abaixa a cabeça como se estivesse envergonhado.
— Artoo — diz ele suavemente. — Eu sinto muito. Eu realmente pensei... Eu realmente pensei que
estávamos apenas provocando um ao outro. — Ele parece genuinamente arrependido.
— Não sinto como uma provocação quando você sai do seu caminho para me fazer sentir como um lixo
por gostar do que eu gosto. Já tenho que defendê-lo o su ciente com meus pais e para minhas amigas. Tipo,
eu entendo, ha ha, às vezes tem homens sem camisa nas capas. Mas o que nunca vou entender é por que as
pessoas são tão rápidas em jogar no lixo essa coisa que sempre foi para as mulheres em primeiro lugar. Eles
não nos deixam ter uma coisa que não faz mal a ninguém e que nos faz felizes. Não, se você gosta de
romances, você tem gosto zero ou é uma solteirona solitária.
Quando nalmente paro de falar (graças a Deus paro de falar), estou respirando com di culdade e um
pouco quente. Eu não esperava car tão preocupada com isso, não no dia em que vou conhecer a deusa
literária Delilah Park, e não na frente de Neil McNair.
Ele está olhando para mim, os olhos arregalados e sem piscar por trás dos óculos. Ele vai rir de mim em
três, dois, um...
Mas ele não ri.
— Artoo… — diz ele novamente, ainda mais silencioso desta vez. — Rowan. Eu realmente sinto muito.
Eu... eu acho que não sei muito sobre eles. — Ele muda de curso, usando meu nome verdadeiro. Em
seguida, ele levanta a mão até que esteja pairando acima do meu ombro. Eu me pergunto o que seria
necessário para ele abaixá-la. Lembro-me da sessão de fotos de Mais Prováveis para o Sucesso, de como ele se
opôs tanto a me tocar. Como se isso transmitisse algum tipo de carinho que nunca tivemos um pelo outro.
Respeito mútuo, com certeza. Mas carinho? Nunca.
Ele deixa cair a mão antes que eu possa contemplar mais.
— Desculpas... aceitas, eu acho. — Eu estava pronta para lutar. Não estou acostumada a negociações de
paz. — Posso te perguntar uma coisa?
— Não. Você não pode. — Talvez isso tenha o objetivo de aliviar o clima, pela forma como sua boca se
curva quando ele diz isso.
Eu empurro seu ombro, suavemente. É a maneira como eu tocaria um amigo mais próximo, e é tão
estranho que meu estômago embrulha. Eu nem tenho certeza se McNair e eu somos capazes de ser amigos,
ou se isso importa. Estamos indo embora em alguns meses de qualquer maneira. Não tenho exatamente
tempo para novos amigos.
— Por que você os odeia tanto? Livros de romances?
Ele me lança outro olhar estranho.
— Eu não odeio.
UPPER CRUST PIZZA

12 deJunho 15h18
Nº DO PEDIDO #: 0102
SERVIDOR: JENNIFER PESSOAS: 2 MESA: 9

JANTAR

1 VEGGIE VENGEANCE $2.99


1 PEPPERONI PIZZAZZ $3.49

SUBTOTAL $6.48
TAX $0.65

TOTAL $7.13

GORJETA $2.50
VISA CARD XXXXXXXXXXXX1519
MCNAIR, NEIL A

OBRIGADA!
15h40

THE TEMPTATIONS ESTÃO tocando dentro da Doo Wop Records, uma das várias coisas que me faz
sentir como se tivesse voltado no tempo. Todo o lugar é uma homenagem à década de 1960, com pôsteres
de shows vintage nas paredes e cabines de audição privadas nos fundos.
— Você se encaixa perfeitamente — diz McNair, apontando para o meu vestido.
— Eu– oh. — É uma coisa tão diferente de McNair dizer que levo um tempo para formar uma frase. —
Eu acho que sim. Gosto de roupas velhas e música velha. Você... gosta de música? — Parece um fato básico
para saber sobre uma pessoa: cabelos castanhos, olhos castanhos, fariam coisas questionáveis para poder ver
o show dos The Smiths ao vivo.
— Eu gosto de música? — Ele zomba a pergunta enquanto passamos de cabeça baixa por um corredor
marcado ROCK J-N. — Hemingway foi o maior escritor do século XX? Sim, gosto de música.
Principalmente bandas locais, algumas que zeram sucesso e outras ainda não. Death Cab, Modest Mouse,
Fleet Foxes, Tacocat, Car Seat Headrest...
— Você viu Fleet Foxes na Bumbershoot alguns anos atrás? — Eu pergunto, ignorando o comentário de
Hemingway. Só por isso, vou escolher um livro extra picante para ele ler quando eu ganhar.
Seus olhos brilham.
— Sim! Foi um show tão bom.
E embora estejamos na mesma escola por quatro anos, há algo estranho nisso: McNair e eu estivemos no
mesmo show, batendo palmas para a mesma banda em um mar de descolados suados de Seattle.
Ele encontra a seção N primeiro, folheia enquanto abro meu grupo de mensagens com Kirby e Mara.
Não é impossível que Savannah tenha recrutado mais pessoas desde Hilltop Bowl e, mesmo que estejamos
em terreno instável, não quero ter medo de minhas próprias amigas.

Tenho certeza que a resposta é não, mas vocês por acaso


não se juntaram a Savannah Bell para matar McNair e eu,
não é?

MARA

Definitivamente não.

KIRBY

PQP???

a ouvi organizando um exército na zona de segurança

KIRBY
Repito: PQP???

sim

então eu posso ter juntado forças com o McNair

Eu deslizo meu telefone no bolso, não completamente pronta para suas respostas ainda.
— Eles não têm — diz McNair, e eu o empurro para fora do caminho para dar uma olhada por mim
mesma.
— Posso ajudá-los a encontrar alguma coisa? — pergunta uma mulher com um cordão Doo Woop em
volta do pescoço. Ela provavelmente tem vinte e poucos anos, com um corte louro platinado, usando
macacão comprido e botas de combate. Seu crachá diz VIOLET.
— Estamos procurando o primeiro álbum do Nirvana — digo, e porque pesquisei antes: — Acho que é
o Bleach?
— É de fato! — Violet cantarola. — Nirvana mais antigo. Eu amo isso. Na verdade, você não é a primeira
pessoa a perguntar sobre isso hoje. Vocês estão jogando algum tipo de jogo?
— Uma espécie de caça ao tesouro — diz McNair.
— Hmm, eu sei que temos. Deve estar bem aqui. — Saímos do caminho para que ela possa dar uma
olhada na seção N.
Quem veio aqui antes de nós – e se eles o esconderam? Existem milhares de registros aqui. Eles poderiam
ter colocado em qualquer lugar.
McNair deve chegar à mesma conclusão, porque ele diz:
— Vocês teriam uma cópia em outro lugar?
— Nós temos Nevermind – superestimado, na minha opinião – In Utero, e MTV Unplugged in New
York. Agora, esse é um bom álbum. — Ela o puxa, acaricia-o com ternura. — Melhor álbum ao vivo que já
ouvi.
O olhar de Violet se xa em McNair e, a princípio, presumo que seja porque ele tem algo no rosto. Eu
me permito olhar por um momento também, mas não há nada lá. Eu... eu acho que ela pode estar ertando
com ele.
Estou tão envergonhada por ela.
— De nitivamente — concorda McNair. Ele está ertando de volta?
Violet sorri para ele.
— Infelizmente, eu não vejo Bleach aqui. Alguém pode tê-lo mudado de lugar ou levado de volta para
uma cabine de escuta.
— Ou comprou — acrescentei. Existem outras lojas de discos em Seattle, mas perderíamos tempo
chegando lá, e eles podem não ter o álbum também.
— Deixe-me dar uma olhada lá atrás, ok? — Violet desliza MTV Unplugged de volta para a seção N. — É
sempre possível que alguém trouxe uma cópia para vender.
— Muito obrigado. — A polidez de McNair está nível onze. Quando Violet se afasta com suas botas, eu
levanto minhas sobrancelhas para ele. — O quê? — ele pergunta.
— ‘Com certeza. Melhor álbum ao vivo já gravado na história da humanidade.’
Ele me encara.
— Isso... deveria ser uma imitação minha?
— Depende. Você estava ertando com Violet? — Não vou dar a ele a satisfação de minha suposição de
que Violet estava ertando com ele primeiro. Talvez ela também estivesse tentando contar as sardas dele.
— Ela estava mergulhada em algum tipo de devaneio do Nirvana. Eu não queria perdê-la
completamente para isso.
— Você nunca ouviu o Nirvana, não é?
— Nem uma única música. Enquanto esperamos — McNair vira a cabeça em direção às cabines de
escuta na parte de trás — eu meio que sempre quis ouvir alguma coisa lá.
— Você realmente pensa que podemos concordar em algo para ouvir? — Eu pergunto, embora eu esteja
olhando ansiosamente para as cabines de escuta desde que entramos.
Ele bate no queixo.
— E se cada um de nós escolher um álbum e a outra pessoa tiver que ouvir uma música inteira antes de
fazer o julgamento?
Não posso negar que parece divertido.
— Tudo bem, mas vamos rápido.

KIRBY

oh VOCÊ FEZ O QUÊ AGORA??

você se juntou ao cara por quem você definitivamente não


está obcecada?

MARA

Seja legal.

Mas na verdade:

Eu reviro meus próprios olhos, embora esteja aliviada que nossa amizade não esteja tensa a ponto de não
termos conversas como esta.
Acho que você está um pouco obcecada por ele.
Obcecada em vencer, sim. E ele é a única pessoa que pode me ajudar a chegar lá.
Eu volto à cabine de escuta um momento antes de McNair, e meu coração pula na minha garganta
enquanto escondo meu telefone, embora, é claro que ele não pode ver nosso grupo de conversa. Ele está
segurando um álbum tão perto de seu peito, ele pode muito bem estar abraçando-o. Na pequena mesa está
um toca-discos e pares gêmeos de fones de ouvido, com duas cadeiras dobradas. McNair fecha a cortina,
fechando-nos dentro do espaço minúsculo.
— Você pode ir primeiro — eu digo enquanto puxamos as cadeiras e pegamos os fones de ouvido.
Eu costumava me imaginar chegando aqui com alguém de quem eu gostava, passando horas navegando
nas gravações, batendo os joelhos ao ouvi-los em uma cabine como esta. É onde o namorado perfeito do
colégio e eu teríamos saído. Eu cava acordada à noite, marcando um mapa mental de Seattle para mim e
esse cara misterioso, e ouvir discos juntos era uma das coisas mais românticas que eu poderia imaginar. Eu
sonhei com playlists inteiras para nós. “Close to Me” do The Cure, com aquelas pausas ofegantes e letras
sugestivas, foi a música mais sexy que eu já ouvi. O universo deve achar hilário que a primeira vez que estou
aqui, seja com McNair.
A música de McNair é otimista, animada, com vocais masculinos agudos. Quinze segundos depois, ele
puxa os fones de ouvido de uma orelha e pergunta:
— O que você acha? — Ele está balançando a perna para cima e para baixo, impaciente pela minha
resposta.
— É... divertida — admito, mas não quero que ele tenha um ego sobre a escolha de algo não terrível,
então acrescento: — está quase na sua cara o quão divertido é.
— Não sabia que você cava tão ofendida com a diversão. — Ele mostra a capa do álbum, que mostra os
cinco membros da banda vestidos com cores brilhantes e tocando Twister.
— Free Puppies? — Eu digo. — Esse é mesmo o nome da banda?
— Não. É Free Puppies! Ponto de exclamação! — Ele bate no al nete em sua mochila. — Você não pode
falar sobre Free Puppies! sem um ponto de exclamação. Eles são locais, e eu os vi algumas vezes. Eles estão
começando a ter shows nacionais, mas não acho que vão vender todos os ingressos.
— Sua banda favorita se chama Free Puppies!? — Dou ao ponto de exclamação o máximo de ênfase que
posso e ele balança a cabeça para mim.
— Um dia você irá ao show dos Free Puppies! e ver a magia por si mesma.
Ficou muito quente no meu cardigã, provavelmente porque ainda está ensolarado lá fora. Ou talvez o
termostato aqui esteja muito alto. Mesmo assim, eu o tiro, acidentalmente batendo nele com a manga vazia
no processo.
— Desculpe — eu digo enquanto o coloco nas costas da cadeira.
— É meio apertado aqui — diz ele com um encolher de ombros contido, como se fosse sua culpa.
— Você está com sorte! — A voz de Violet. McNair puxa a cortina, revelando Violet acenando um
álbum preto com um grá co de foto negativo na frente. — Tínhamos uma cópia em uma pilha de discos
doados esperando para serem processados.
— Obrigada — eu digo enquanto McNair aceita o disco dela.
— Sem problemas. — Ela meio que demora um pouco, saltando na ponta dos pés, e por um momento
horrível me pergunto se ela realmente estava ertando. Então ela deixa escapar: — Faixa três. ‘About a Girl.’
Esse foi o primeiro sinal de que talvez o Nirvana seria mais do que grunge9. Mesmo que você não compre, é
preciso ouvi-la em vinil. É assim que sempre foi destinado a ser ouvido.
— Vamos ouvir — diz Neil, e Violet nos dá mais um sorriso antes de fechar a cortina.
McNair vira o álbum.
— Ela escreveu o número dela atrás? — Eu pergunto. — Espero que ela esteja pronta para muitos textos
com pontuação e letras maiúsculas adequadas.
— Artoo. Eu estava veri cando a lista de faixas. E eu acho que ela realmente ama o Nirvana.
Ele coloca o disco na mesa e cada um de nós tira uma foto.
— Acho que estamos bem, então — eu digo, mas ele franze a testa.
— Ainda temos que ouvir sua música.
— Não Nirvana?
Ele balança a cabeça.
— Posso ser expulso de Seattle por dizer isso, mas nunca fui um grande fã.
Apresento meu registro preferido: Louder Than Bombs dos The Smiths.
— É realmente tão estranho? — é a primeira faixa, e Neil ca irritantemente silencioso durante todos os
três minutos em que está tocando.
— É cativante, mas… parece melancólico também — diz ele.
— O que há de errado nisso?
— Há muita merda ruim no mundo para ouvir música deprimente o tempo todo. — Ele toca no álbum
FP. — Portanto, Free Puppies!
Quando puxamos a cortina para sair, é quase perfeito demais: Madison Winters, ela das sete raposas que
mudam de forma, está navegando nos discos com outros adolescentes de Westview. Ela não me vê até depois
de eu me esgueirar por trás dela, tirando o lenço azul de seu braço.
— Aquilo foi furtivo — seu amigo Pranav Acharya me disse, estendendo a mão para um toca aqui. —
Eu respeito isso.
— Uau, cadê a sua lealdade? — Madison pergunta, ngindo estar ofendida, e ela está tão bem humorada
sobre a coisa toda que eu me sinto um pouco mal por tirar sarro de suas raposas que mudam de forma.
Quer dizer, ela pelo menos tem uma marca.
McNair e eu camos na frente da loja enquanto pego meu telefone para registrar a morte.
Estranhamente, isso foi divertido. Talvez eu tenha romantizado vir aqui com um namorado, mas não foi tão
ruim assim com McNair.
— Você matou alguém! — McNair está praticamente tonto. Ele diz isso de uma maneira tão jovial, seus
olhos brilhando por trás dos óculos – como se ele estivesse orgulhoso, o que acho que faz sentido, já que
estamos tecnicamente no mesmo time. Por enquanto.
Em vez do meu aplicativo de mensagens, uma útil bolha azul aparece:
Instalando atualização de software 1 de 312…
Claro, agora é um ótimo momento para fazer isso.
— Um segundo. Meu telefone decidiu instalar uma atualização.
Instalando atualização de software 2 de 312…
De repente, a tela ca preta. Eu seguro o botão liga/desliga – nada.
— Merda — murmuro. — Agora não liga.
— Deixe-me ver.
Eu olho para ele.
— Eu não acho que você pressionar o botão fará algo diferente de eu pressionar o botão. — E não quero
que ele veja acidentalmente meu grupo de conversa com Kirby e Mara e, de alguma forma, tenha uma ideia
errada. Ainda assim, eu entrego. Vou pegá-lo de volta bem rápido se ligar.
— Não liga — ele concorda após segurar todos os botões por um período de tempo mais do que
aceitável e me irritar completamente no processo. — Você carregou?
— Ele foi conectado ao meu carro. — Estendo a palma da mão, pois há algo muito estranho no meu
telefone, com a caixa de padrão geométrico que Mara me deu de Hanukkah no ano passado, nas mãos de
Neil. Tento o botão liga/desliga mais uma vez. — Não consigo exatamente jogar sem meu telefone.
— Espera. Espera. Podemos consertar isso. — McNair desliza em seu próprio telefone, batendo na foto
de contato de Sean Yee. — Sean pode consertar qualquer coisa. Ele trouxe um MacBook de 12 anos de volta
à vida no ano passado.
— E porque ele me ajudaria?
— Ele estaria ajudando a nós dois. — Ele digita uma mensagem que não consigo ver. — E ele foi morto
muito rapidamente antes, então ele não é uma ameaça no jogo. — Seu telefone toca. — Sean está livre e ele
está em casa. Ele mora perto da I-5, Fourth-Third e Latona. Levaremos apenas dez minutos para chegar lá.
— Ele não estava na zona segura? Com você, Adrian e Cyrus? — Isso é muito estranho. O amigo de
McNair me ajudando, pela bondade de seu coração?
Um sorriso curva um lado de sua boca.
— Ele só veio para sair. Você estava... me procurando?
— Eu sou apenas perceptiva.
— Você estava me procurando — conclui. — Estou comovido.
PISTAS DO HOWL

Um lugar onde você pode comprar o primeiro álbum do Nirvana


Um lugar que é vermelho do chão ao teto
Um lugar onde você pode encontrar Chiroptera
Uma faixa de pedestres em arco-íris
Sorvete adequado para o Pé-Grande
O grandalhão no centro do universo
Algo local, orgânico e sustentável
Um disquete
Uma xícara de café com o nome de outra pessoa (ou seu próprio nome, totalmente incorreto)
Um carro com multa de estacionamento
Uma visão do alto
A melhor pizza da cidade (à sua escolha)
Um turista fazendo algo que um morador teria vergonha de fazer
Um guarda-chuva (todos nós sabemos que os verdadeiros moradores de Seattle não os usam)
Uma homenagem ao misterioso Sr. Cooper
16h15

— BEM-VINDOS AO MEU laboratório — Sean diz em uma voz que o faz soar como um vilão em um
lme de espionagem que de nitivamente não passa no Teste de Bechdel10. Ele nos conduz ao minúsculo
porão de sua casa em Wallingford. E, uau, realmente parece um laboratório aqui. Há uma mesa de trabalho
com quatro monitores, um rack de ferramentas e inúmeros os e aparelhos eletrônicos espalhados. A
iluminação dá a tudo um tom vagamente esverdeado.
Está frio no porão e, quando esfrego os braços nus, lembro onde deixei meu suéter: em uma cadeira na
cabine de escuta.
— Espero que não estejamos interrompendo — eu digo. — Sério, muito obrigado por fazer isso. Ou por
tentar.
Sean e eu nunca tivemos um motivo para conversar muito. Francamente, ele não tem nenhuma razão
para ser tão legal comigo. Savannah tem me feito descon ar de todos que costumavam parecer inofensivos.
— Tentar. — Sean diz baixinho, olhando para McNair, e os dois riem, como se a ideia de Sean não ter
sucesso fosse ridícula. — Nah, eu estava apenas jogando o novo Assassin's Creed.
— Por que você se submeteria a isso depois de ser morto tão cedo em Howl? — McNair pergunta
inocentemente.
— Muito obrigado pelo apoio emocional.
Eu toco meu telefone morto.
— Eu posso te pagar–
As sobrancelhas de Sean se erguem.
— O que? Não, não, você de nitivamente não precisa fazer isso. Eu teria falhado nos exames nais de
francês sem Neil. Eu devo uma a ele. Ou sete. — Não tenho chance de apontar que ele me ajudar não é a
mesma coisa que ajudar McNair antes que Sean tire um par de óculos grossos da mesa de trabalho e os
coloque. — Posso ver o paciente?
Mordendo uma risada, eu entrego meu telefone. Neil disse que explicou toda a situação quando
estávamos de carro, mas se é estranho para Sean nos ver juntos, ele não diz nada.
— Então, o que aconteceu exatamente? — Sean pergunta, gentilmente colocando meu telefone na mesa
e vasculhando uma gaveta antes de extrair um cabo e conectá-lo. Ele conecta a outra extremidade em seu
computador principal.
— Ele morreu durante a instalação de uma atualização. E então não ligava.
— Hmm. — Sean pressiona algumas teclas e a tela do telefone ca azul. — Isso não deve ser muito
difícil.
Solto um suspiro de alívio.
— Excelente.
— Obrigado — diz Neil, e me dá um sorriso encorajador.
Meus dedos estão inquietos. Eu meio que odeio ser tão casada com meu telefone que mesmo dez
minutos sem ele me leva à abstinência. O alvo de Madison, no entanto – eu tenho isso. Brady Becker. Acho
que ele ainda está vivo.
— Não consigo imaginar quanto vale tudo isso — digo, olhando ao redor do laboratório.
— Achei a maior parte de tecnologia usada e a restaurei. — Sean se inclina sobre o meu telefone, o cabelo
preto caindo em seu rosto. — Fiz um novo computador para Neil no aniversário dele no ano passado.
Eu co boquiaberta com ele.
— Isso é incrível.
Neil faz um som vagamente nada humano ao meu lado.
— Você provavelmente deveria deixá-lo trabalhar.
— Eu posso realizar várias tarefas ao mesmo tempo.
— Na verdade — diz Neil —, a multitarefa é um mito. Nossos cérebros só podem se concentrar em uma
tarefa de alto nível por vez. É por isso que você pode dirigir e ouvir música ao mesmo tempo, mas não pode
fazer um teste e ouvir um podcast simultaneamente.
— Nada de explicações no meu laboratório, por favor — diz Sean.
— Eu não estava… — Neil começa, mas então ele ca em silêncio, como se percebesse que era
exatamente o que ele estava fazendo. Quando eu espio ele, ele está olhando para seus sapatos.
Depois disso, deixamos Sean trabalhar em silêncio. De vez em quando, ele murmura uma maldição ou
toma um gole de um energético que está em sua mesa.
— Acho que consegui — diz Sean quinze minutos depois, desconectando meu telefone e passando por
mais algumas con gurações. — Nenhum de seus dados deveria ter sido afetado. Agora cruzamos os dedos
e... — Nós três olhamos para ele, esperando a tela inicial aparecer. E aí está, a foto de Kirby, Mara e eu e o
padrão de ícones familiares. — Voilà! Bom como novo.
— Você é um gênio — eu digo. — Obrigada, obrigada!
— Eu também alterei as con gurações para que a atualização não continue até a próxima semana, para
que você possa terminar o jogo sem interrompimentos.
— Oh meu Deus, eu te amo — eu digo, e Sean cora. — Muito obrigada. Novamente. Você conhece Two
Birds One Scone? Venha na semana que vem e vou te dar um rolinho de canela de graça.
Sean tira os óculos.
— Ela não é tão ruim — ele sussurra para McNair.
— Não o tempo todo — ele admite.
Eu aperto meu coração.
— Estou comovida. — digo, imitando McNair.
Neil coloca a mão no ombro de Sean. Meu reino por mais caras que podem expressar afeto físico sem a
necessidade de justi car sua masculinidade depois.
— Ainda no Café da Beth antes da formatura?
— Absolutamente. Nunca perco a Beth — diz ele. — Boa sorte para vocês dois.
— Quad life. — diz Neil.
— Quad life! — Sean responde com um grito, e eu experimento um constrangimento de segunda mão
tão extremo que posso explodir em chamas. Em seguida, os dois trocam um aperto de mão breve, mas
complexo antes de Sean nos levar para a luz do dia.

Descobrimos algumas das pistas fáceis enquanto dirigimos para o centro da cidade – sorvete de pé-grande
no Molly Moon's, uma exibição de maçãs cultivadas em Washington em um mercado de esquina (algo local,
orgânico e sustentável).
A caminho da Biblioteca Pública de Seattle, Neil me conta mais sobre o Quad. Ele e Sean eram melhores
amigos na maior parte do ensino fundamental, e o mesmo com Adrian e Cyrus em uma escola particular.
Sean e Adrian eram vizinhos, então no ensino médio, os quatro passavam muito tempo juntos com bastante
regularidade. Neil até vai às reuniões de família de Sean todos os anos.
A conversa parece estranhamente natural. De alguma forma, Neil e eu estamos nos dando bem, o que
exige um lembrete mental de que vou destruí-lo no nal disso. Essa foi a razão pela qual nos unimos.
Tenho sorte com o estacionamento no centro da cidade e não posso deixar de admirar o prédio
enquanto entramos na biblioteca. É uma maravilha arquitetônica, formas geométricas e cores brilhantes e
exibições de arte pública. E está sempre ocupado. Há um momento embaraçoso no nível principal com
Chantal Okafor e os Kristens, em que agarramos nossas braçadeiras, mas quando ninguém ataca ninguém,
todos expiramos de alívio. Então Chantal levanta as sobrancelhas e olha incisivamente para McNair. Tudo o
que posso fazer é encolher os ombros, já que não há tempo su ciente para explicar.
— É... realmente vermelho — Neil diz quando chegamos ao Red Hall no quarto andar. As paredes
curvas brilhantes dão a sensação de que estamos dentro do sistema cardiovascular de alguém.
— Alguma outra observação perspicaz?
— Que quem desenhou isso provavelmente era um pouco sádico?
Enviamos nossas fotos antes que nossos telefones zumbam com outra atualização do Howl.

TOP 5

Neil McNair: 10

Rowan Roth: 10

Iris Zhou: 6

Mara Pompetti: 5

Brady Becker: 4

— Uau — eu digo. — Nós avançamos muito.


— Naturalmente — Neil diz, mas ele está claramente satisfeito.
Com a pista da biblioteca conquistada, não consigo tirar da minha cabeça o que Sean disse antes. Ele não
é o mais aberto sobre sua vida pessoal.
— Você... costuma ir para a casa de Sean? — Eu pergunto, tentando soar casual enquanto refazemos
nosso caminho através do Salão Vermelho.
— Ao contrário de...?
— Eu, hum, os vi mais cedo, Sean e Adrian e Cyrus, antes do jogo começar. Disseram que você teve uma
emergência familiar e que fazia um bom tempo que não iam à sua casa. Eles são seus melhores amigos, então
eu não entendi, eu acho.
McNair ca quieto por alguns momentos.
— Todo mundo não tem seus segredos? — ele diz nalmente, categoricamente. Seu tom não é cruel, mas
também não é exatamente caloroso.
Bem quando eu acho que estamos fazendo algum progresso, começando a nos abrir um para o outro, ele
desliga. Exceto que– algo está errado. Seu rosto cou pálido e ele está com a mão contra a parede, como se
não pudesse permanecer rme sem ela.
— Ei. Você está bem?
— Eu não estou me sentindo bem — ele diz enquanto balança, pressionando a cabeça contra o cotovelo.
— Tonto.
— Foi todo o vermelho? — Eu pergunto, e ele acena com a cabeça. Ele parece miserável. Algum instinto
que eu não estava totalmente ciente entra em ação. — Vamos tirar você daqui.
Antes que eu possa pensar demais, coloco a mão em seu ombro e o conduzo para fora do Salão Vermelho
até uma cadeira perto do elevador. Ele pode não ser minha pessoa favorita, mas isso não signi ca que eu
quero que ele se sinta assim.
Ele embala a cabeça nas mãos.
— Não comi nada hoje, exceto aquela fatia de pizza — diz ele. — Eu sei, eu sei, má ideia, mas eu estava
lidando com minha irmã, e quei sem tempo, e...
— Fique aqui — digo a ele. — Eu volto já.
Sua irmã. A emergência familiar. Uma pergunta respondida e cerca de cem mais.
De um pedaço de papel preso entre os limpadores de para-brisa do carro de Rowan

Você deve ter notado as linhas brancas na rua indicando

que está ocupando duas vagas de estacionamento. Queria

lhe fazer um favor e informar que seu carro pode

caber perfeitamente em um só lugar.

Sinceramente,

Um cidadão preocupado
16h46

NEIL PEGA um pacote de biscoitos salgados.


— Você abriu isso para mim?
— Não — eu minto.
Em um minimercado do outro lado da rua, encontrei uma garrafa de água, uma lata de refrigerante de
gengibre e os biscoitos. É possível que eu tenha exagerado.
— Você não precisava fazer tudo isso — diz ele, tomando um gole lento de água. — Obrigado. Sempre
tive um estômago meio fraco. As viagens rodoviárias comigo são uma verdadeira explosão.
Eu aceno, lembrando. Quando pegamos o ônibus para os eventos da escola, como a viagem de campo do
ano passado para a Fundação Gates, ele disse aos professores que precisava sentar na frente. A lei dos ônibus
dita que a frente é para os dolorosamente chatos entre nós e, por qualquer motivo, eu me senti tão
constrangida por Neil que me sentei do outro lado do corredor (não ao lado dele; todo mundo sabe que
você ca no seu lugar se houver espaço su ciente) e discuti com ele pelo resto da viagem de ônibus.
Já estamos juntos há algumas horas – a maior parte do tempo que passamos só nós dois – e McNair tem
sido estranhamente normal. Estúpido e ocasionalmente irritante, claro, mas não exatamente odiável. Não
tenho certeza se o m da escola mudou algo, ou se nunca estivemos em uma situação em que não nos
colocássemos imediatamente um contra o outro.
Eu me abaixo na cadeira ao lado dele em uma pequena alcova no quarto andar, brincando com uma
tampa de garrafa. Ficamos sentados em silêncio por um tempo, o único ruído era o barulho da garrafa de
plástico ou a mastigação de McNair. Ele até me oferece um biscoito. De vez em quando, ele passa a mão pelo
cabelo, bagunçando ainda mais. Devemos compartilhar esse hábito nervoso.
Seu cabelo, porém – não parece ruim quando ele faz isso. E é lá, no quarto andar da biblioteca,
observando meu nêmesis tomar lentos goles de refrigerante de gengibre, que tenho uma percepção horrível.
Neil… é fofo.
Não do jeito que estou atraída por ele. Apenas, tipo, objetivamente bonito. Aparência interessante é
talvez mais precisa, com seu cabelo ruivo e sardas rebeldes e a maneira como seus olhos às vezes são
castanhos profundos e às vezes quase dourados. A curva de seus ombros naquela camiseta também não é
ruim, e nem a de nição em seus braços. Mesmo aquele sorriso dele é meio fofo. Deus sabe que já vi ele
muitas vezes para fazer essa avaliação.
Fofo. Neil. Inesperado, mas verdadeiro, e não é a primeira vez que penso assim.
— Eu poderia te dizer algo para animá-lo. — Deve ser a expressão ainda infeliz no rosto de Neil que me
faz dizer isso.
— Sim?
Nunca contei isso a ninguém, nem mesmo a Kirby ou Mara, porque sabia que elas nunca me deixariam
esquecer.
— Você se lembra do primeiro ano?
— Eu tento não lembrar.
— Certo. Certo. — Eu enterro a mão na minha franja. Ela realmente está muito curta. Provavelmente é
uma péssima ideia, mas se isso o afastar do Salão Vermelho, vale a pena. Pode ser. Eu continuo antes que eu
possa reconsiderar. — Antes de os vencedores do concurso de redação serem anunciados e você revelar seu
verdadeiro eu, eu... tinha uma queda por você.
Não, essa foi de nitivamente uma ideia terrível. O arrependimento me preenche quase que
instantaneamente, e eu aperto meus olhos, esperando a risada. Quando não vem, abro um olho com
hesitação.
Neil encontra meu olhar, não parecendo mais enjoado. Agora há diversão em seu rosto: uma curva mais
profunda em sua boca, como se ele estivesse prendendo uma risada na garganta.
— Você tinha uma queda por mim. — Ele a transforma em uma frase declarativa. Ele não está pedindo
esclarecimentos; ele está declarando um fato.
— Por apenas doze dias! — Corro para adicionar. — Quatro anos atrás. Eu era basicamente uma criança.
Ele não precisa saber o que, exatamente, eu o achei tão atraente nele naquela época. No começo quei
hipnotizada pelo grande número de sardas que ele tinha, achei que eram lindas, de verdade. Eu balancei a
cabeça junto com as ideias que ele compartilhou na aula, oferecendo as minhas próprias e sentindo uma
centelha de orgulho quando ele concordou comigo.
Ele não precisa saber que de vez em quando ao longo daquele ano, eu me peguei desejando que ele não
tivesse se tornado o pior tipo de esnobe para que eu pudesse retomar meus devaneios da aula de inglês,
aqueles em que nós nos encostávamos debaixo de um carvalho e leríamos sonetos em voz alta um para o
outro. Fiquei tão desapontada que ele não era o cara que eu sonhei. Ele não precisa saber que algumas vezes,
quando nossos ombros roçaram no corredor, eu senti um aperto na barriga porque eu tinha quatorze anos e
os meninos eram uma nova espécie misteriosa. Tocar em um, mesmo por acidente, era como passar a mão
por uma chama. Eu não estava orgulhosa disso, mas meu corpo não tinha alcançado o meu cérebro. E meu
cérebro decidiu, doze dias depois do início do primeiro ano, que Neil McNair deveria ser desprezado, sua
destruição ganhando a posição número dez em meu guia de sucesso. No segundo ano, todas aquelas
borboletas tinham ido embora, e eu mal conseguia me lembrar de ter uma queda por ele.
Ele também não precisa saber sobre o sonho que tive alguns meses atrás. Não foi minha culpa –
estávamos trocando mensagens de texto antes de dormir, e isso tinha bagunçado meu subconsciente. Pelo
que sei, seu subconsciente também lhe deu sonhos malucos. Estávamos em um restaurante chique
comendo testes de matemática e relatórios de laboratório quando ele pegou meu rosto em suas mãos e me
beijou. Ele tinha gosto de tinta de impressora. Meu lado lógico interveio e me acordou, mas não consegui
olhar nos olhos dele por uma semana inteira depois disso. Eu tinha sonhado que estava traindo Spencer com
Neil McNair. Foi horrível.
Neil está sorrindo abertamente agora.
— Mas eu era tipo... o garoto de quatorze anos mais idiota.
— E eu era tão legal?
— Você era — ele insiste. — Além de sua incapacidade de reconhecer O Grande Gatsby como o ápice do
romance americano.
— Ah, sim, O Grande Gatsby. Um texto feminista — digo, embora minha mente tropece sobre sua
declaração de minha frieza. — Nick é tipo um pedaço de pão-de-forma. Daisy merecia algo melhor do que
aquele nal.
Ele bufa com isso. Mas não posso negar que ele parece estar se sentindo muito melhor. Sua pele passou
de pálido de volta ao tom normal de pálido. Debatendo livros em uma biblioteca – este é nosso estado
natural, talvez.
— Então. Essa paixão — ele continua. — Você escreveu poemas sobre mim? Você rabiscou meu nome
em seu caderno com um coração nos i’s? Ou– oh! Você me imaginou como o herói de um romance? Por
favor, diga sim. Por favor, diga que eu era um cowboy.
— Parece que você está se sentindo muito melhor. — Eu estico minhas pernas, ansiosa para me mover
novamente.
Ele olha para seus braços.
— Eu nem percebi– estou expondo pele demais? Não quero estar me exibindo na sua frente, zombando
de você com o que você não pode ter. Eu tenho um moletom na minha mochila. Posso colocá-lo se você
estiver–
— Você está de nitivamente melhor. Estamos indo embora.

Minha mãe liga quando chegamos ao andar principal da biblioteca.


— Conseguimos! — ela anuncia. Seu telefone está no viva-voz e meu pai está torcendo ao fundo. — O
livro está acabado!
— Parabéns! — Eu faço um gesto para Neil me seguir ao virar da esquina para que não incomodemos
ninguém. — Vai sair ao mesmo tempo que o próximo livro de Excavated?
— Alguns meses antes. Próximo verão.
— E o mais importante, esse será aquele que será nalmente transformado em lme?
— Ha ha — ela diz secamente. Ela e meu pai ainda estão loucos sobre o lme de Riley ter cado
paralisado anos atrás. — Veremos sobre isso.
— Como foi seu último dia, Ro-Ro? — meu pai pergunta. — Você se tornou oradora da turma?
Suas palavras arrancam o Band-Aid da ferida.
— Não — eu digo, olhando para Neil. — Eu sou a segunda melhor.
— Isso é ótimo. Parabéns! — minha mãe diz. — Onde você está? Já está quase anoitecendo. Você vai
voltar para casa para o jantar do Shabat?
Neil está me olhando com uma expressão estranha.
— Eu não sei se eu posso. Estamos– estou no meio de Howl. A energia ainda está cortada?
— Infelizmente. Mas podemos pedir comida no seu restaurante italiano favorito. Isso levará uma hora.
Por favor. Seu último jantar de Shabat no ensino médio?
Isso é o que me pega. Além disso, Neil e eu estamos solidamente na liderança, e seria uma chance de
trocar de roupa.
— Estarei aí assim que puder.
Quando eu encerro a ligação e a foto de fundo de Kirby, Mara e eu reaparece, meu estômago se revira. Eu
desligo a tela para encontrar McNair boquiaberto para mim.
— Seus pais — diz ele, em tom cheio de reverência — são Jared Roth e Ilana García Roth.
— Sim…?
— Eu li seus livros. Todos eles. Eu era obcecado.
Agora é a minha vez de car boquiaberta com ele. Isso acontece de vez em quando, claro, mas nunca
suspeitei que Neil McNair fosse fã dos livros dos meus pais.
— Qual é o seu livro favorito? — Eu pergunto, testando-o.
Ele responde sem perder o ritmo.
— A série Excavated, sem dúvida.
— Riley é muito boa — eu concordo. Eu costumava me vestir como ela para os eventos dos meus pais,
em seu cardigã vermelho e as meias de pterodáctilo que eles tinham feito sob medida, meu cabelo em dois
coques bagunçados.
Neil ca nostálgico.
— Aquela onde ela teve seu bat mitzvah, e sua abuela e abuelo visitaram da Cidade do México e
aprenderam tudo sobre as tradições judaicas... Artoo, eu berrei de empolgação.
— Número doze, Mi Maravillosa Bat Mitzvah? — Foi baseado no meu próprio bat mitzvah, embora
não fosse bem a troca de culturas ideal apresentada no livro. Em vez disso, a família de minha mãe no
México estava convencida de que a família de meu pai os estava evitando, e a família de meu pai reclamou da
comida e de que não conseguiram ouvir o rabino. Desejei, não pela primeira vez, saber mais espanhol,
mesmo enquanto lia o hebraico.
— Sim. Eu leio esse o tempo todo. — Ele diz isso no tempo presente.
— Espera. Você ainda os lê?
Manchas rosadas aparecem em suas bochechas.
— Talvez.
Se fôssemos mais próximos de amigos do que de rivais, me pergunto se ele teria me contado isso antes.
Todo esse tempo, ele foi apenas metade do esnobe que eu pensei que ele era. É enervante perceber o quanto
tenho em comum com alguém que passei tanto tempo planejando destruir.
— Eu não estou julgando. Estou apenas surpresa. Por que você não foi a nenhuma de suas sessões de
autógrafos?
— Eu não queria ser o cara assustador lá atrás que é claramente muito velho para os livros.
— Você nunca é algo demais para livros — eu digo. — Nós gostamos do que gostamos. Meus pais têm
muitos fãs adultos, mas odeiam romances.
O rosa em suas bochechas se intensi ca.
— Mais uma vez, sinto muito. Seus pais realmente não aprovam o que você lê? Eles não deveriam estar,
eu não sei, contentes por você estar lendo?
— Isso nunca foi um problema para mim — eu digo. — Livros infantis, tudo bem, mas romances? — Se
eles soubessem sobre a sessão de autógrafos do livro de Delilah, eles balançariam a cabeça e franziriam os
lábios e eu saberia, antes mesmo de dizerem qualquer coisa, que eles estavam julgando não apenas a mim,
mas também a Delilah e seus fãs. — Eu meio que comecei a esconder meus livros deles. Eu não aguentava
mais.
— Minha mãe gosta deles — Neil oferece. — se isso ajuda em algo.
— Eu espero que você nunca a critique por isso.
Ele faz uma careta.
— Não mais.
Eu deslizo meu telefone de volta no meu bolso.
— Eu tenho que ir para casa para o jantar do Shabat — eu explico. — É o sábado judaico. Não somos,
tipo, os melhores judeus, mas tentamos jantar no Shabat todas as sextas-feiras e...
— Eu sei o que é o Shabat — diz ele, e aponta para si mesmo. — Também sou judeu.
— Espera. O quê?
Como ele explodiu minha mente duas vezes no espaço de um único minuto?
— Eu sou judeu. Minha mãe é judia e fui criado como judeu.
— Onde você vai ao templo? — Eu pergunto, ainda não convencida.
— Fiz meu bar mitzvah em Temple Beth Am. ‘Vezot Hab'rachah’ era a minha porção da Torá.
— Vou ao Temple De Hirsch Sinai — digo. Essa é a única outra sinagoga reformista em Seattle. Em
nossa cidade de quase oitocentas mil pessoas, temos dois. Dentro de três quarteirões da minha casa, há cinco
igrejas.
Eu o examino, como se procurasse algum judaísmo óbvio que perdi. Claro, não há nenhum – apenas seu
rosto objetivamente fofo. Normalmente tenho essa conexão instantânea com outros judeus. Aconteceu
minha vida inteira, apesar dos poucos judeus que conheço.
Neil McNair é judeu, e sinto aquele puxão em meu peito, o que sinto quando descubro que
compartilho uma religião com alguém.
— Defeito no radar de judeu? — ele pergunta.
— Acho que sim. É o sobrenome também.
Ele faz uma cara estranha.
— Do meu pai. Eu planejava mudar quando zesse dezoito anos. O nome de solteira da minha mãe é
Perlman. Mas então eu... não mudei. — Sua voz ca monótona.
— Oh — eu digo, sentindo algum constrangimento lá, mas sem saber como lidar com isso. — Então...
eu tenho que ir para casa para isso. — Mas não parece certo nos separarmos ainda, não quando um exército
inteiro de veteranos está tramando nossa morte.
Ele olha para o relógio e depois para mim.
— Estaria tudo bem se eu passasse lá por um minuto? Apenas para... dizer oi para seus pais e dizer-lhes
que eu os acho gênios literários? — Com os dentes, ele puxa o lábio inferior. — Não, isso seria estranho.
Seria estranho, certo? Você já fez centenas de coisas boas para mim hoje. Você não precisa — acrescenta ele
rapidamente. Ele está balbuciando, oh meu Deus.
É um alívio saber que ele não quer se separar – ou pelo menos que ele não mencionou isso – que tenho
que forçar meu rosto a não reagir. E então me pergunto por que estou sentindo alívio, de todas as coisas. Eu
teria presumido que estaria desesperado por uma pausa agora, mas acho que meus níveis de tolerância de
McNair estão mais altos do que eu pensava.
— Você... hum... quer jantar conosco? — Eu pergunto. — Você pode conhecê-los se prometer ser
normal.
Acabei de convidar Neil McNair para um jantar de Shabat comigo e com meus pais. Na minha casa. Em
qualquer outro momento, mandaria uma mensagem para Kirby e Mara sobre isso, mas não tenho certeza de
como explicaria. Eu mal consigo explicar para mim mesma.
Os olhos de Neil se arregalam.
— Você tem certeza?
— Claro — eu digo. — Eles adoram receber pessoas.
— Será que… — Ele se interrompe, empurrando os óculos para cima, que mais uma vez escorregaram
pelo nariz. — Estaria tudo bem se parássemos na minha casa no caminho para lá? Quero pegar alguns livros
para eles autografarem. Isso levará apenas alguns minutos.
Ocorre-me novamente o que seus amigos disseram antes, sobre ele não receber ninguém. Ele
provavelmente vai correr para dentro e sair correndo. Na verdade, não estou indo para a casa dele.
Eu digo a ele que sim e, no caminho de volta para o meu carro, mando uma mensagem para meus pais
dizendo que ele está vindo comigo. Em seguida, insisto em Neil com mais perguntas sobre os livros. Ele é
um especialista em Excavated, lembrando detalhes como o nome do esquilo de estimação de Riley
(Megalosaurus), a localização de sua primeira escavação no primeiro livro (uma pequena cidade ao sul de
Santa Cruz, onde sua família estava de férias) e o que ela encontrou lá (um dólar de areia do Plioceno).
Considere-me impressionada.
— Você vai ter que me dar instruções — eu digo enquanto giro a chave na ignição.
— Vire à esquerda após a saída da Forty-Fifth Street. — Ele a vela o cinto de segurança. — Isso é
estranho, hein? Você vai para a minha casa e então nós dois jantando com seus pais?
Solto uma risada um pouco mais aguda do que o normal.
— Sim. Isso é.
— E só para você saber, podemos jantar juntos, mas isso não é um encontro — Neil diz, completamente
sério. — Eu só não quero que você que muito animada. Quer dizer, seus pais estarão lá, então seria muito
estranho se você estivesse me bajulando o tempo todo.
A VIDA PESSOAL DE NEIL MCNAIR: O QUE EU SEI

- Ele mora em algum lugar ao norte de Lake Union, mas ao sul de Whole Foods.
- Ele tem um armário cheio de ternos.
- Ele é judeu.
- Ele tem uma irmã. Talvez mais de uma? Talvez um irmão também?
- Ele teve algum tipo de emergência hoje cedo.
- hum
17h33

NEIL SOLTA SEU cinto de segurança. Quando eu não me movo, ele pergunta:
— Você vem?
— Oh– eu não pensei... ok — eu digo, incapaz de decidir qual frase terminar.
— Seremos rápidos — ele me garante. Mas não faço a pergunta que desejo desesperadamente: Por quê?
Neil McNair me quer em sua casa, ou ele nem está pensando nisso, ou...?
Antes de abrir a porta, ele faz uma pausa.
— Pode… — ele começa, e então se interrompe. Ele passa a mão pelo cabelo e meus dedos coçam para
alisar os os de volta no lugar. Neil McNair não é Neil McNair se todas as partes dele não estiverem em
perfeita ordem. — Pode ser uma bagunça — ele nalmente decide, girando a chave e me deixando entrar no
McCovil pela primeira vez.
A casa de Neil ca em uma parte mais antiga de Wallingford. As casas neste quarteirão são todas térreas,
quintais cobertos de ervas daninhas. O de Neil é um pouco mais arrumado do que os outros, mas o
gramado ainda parece que precisa de uma hora com um cortador. Por dentro, está limpo – e frio. Pouca
decoração, mas nada fora do comum. Estou completamente perplexa com seu aviso.
— Espero que você goste de cachorros — diz Neil, enquanto um golden retriever pula em cima de mim,
abanando o rabo.
— Eu amo eles — eu digo, coçando o golden atrás das orelhas. Meu pai é alérgico, mas eu costumava
implorar por um no Hanukkah todos os anos. — Golden retrievers sempre parecem tão felizes.
— Ela parece ser. Ela está cando cega, mas é uma boa menina — diz ele, ajoelhando-se para que ela
possa lamber seu rosto. — Não é, Lucy?
— Lucy — eu repito, continuando a acariciá-la. — Você é tão bonita.
— Ela vai derrubar você.
— Você viu meu vestido hoje?
Ele se levanta e Lucy o segue. Ele deve perceber que estou segurando meus braços porque diz:
— Não ligamos o aquecedor no verão. Mesmo quando nossos verões são, bem, assim.
— Isso é bom — eu digo rapidamente. — Inteligente. Para, hum, economizar dinheiro e tudo.
Minha família é confortavelmente de classe média alta. Há um pouco de pobreza em Seattle, mas os
bairros ao redor de Westview são geralmente de classe média a alta, com alguns grupos de mega-riqueza.
Nunca imaginei que dinheiro fosse um problema para a família de Neil.
Uma garota com cabelo ruivo rebelde sai de uma sala no nal do corredor.
— Achei que você só voltaria para casa mais tarde. — Ela parece ter onze ou doze anos e é adorável: rabo
de cavalo alto, uma saia lilás sobre legging preta, sardas pontilhadas em seu rosto.
— Só estou parando aqui por um segundo — diz Neil. — Não se preocupe. Não vou estragar sua festa
do pijama.
— Isso é decepcionante. Nós nos divertimos muito fazendo uma transformação em você da última vez
— ela diz, e ele geme. Há algo sobre a ideia de crianças darem a Neil McNair uma transformação que é
muito preciosa para palavras. Ela se vira para mim. — Eu sou Natalie, e se ele te contou algo sobre mim, é
uma mentira completa. Espere, você é a Rowan? — ela pergunta, e toda a pele exposta de Neil ca
vermelha. — Eu adorei seu vestido.
— Eu sou — eu digo. — Obrigada. Eu gostei da sua saia.
Neil põe a mão no ombro da irmã.
— Você está bem? — ele pergunta em voz baixa, como se não quisesse que eu ouvisse. — Sobre mais
cedo?
Ela toca um band-aid em sua junta.
— Estou bem.
Emergência familiar. Oh Deus – alguém a machucou?
Eu recuo alguns passos, de repente, muito, muito cautelosa com o que estou entrando.
— Se eles te incomodarem sobre ele de novo, você jura que vai me contar? Você não vai usar seus
punhos?
— Mas eles são tão e cazes — ela diz, e Neil balança a cabeça. — Bem, certo. Eu prometo.
— Neil, bebê, é você? — uma voz chama da cozinha.
Bebê? Eu murmuro para ele e, se possível, ele ca ainda mais vermelho.
— Sim, mãe — ele diz. — Estou apenas pegando algo.
Lucy nos segue até a pequena cozinha. A mãe de Neil está sentada à mesa, encolhida sobre um laptop.
Seu cabelo curto é um castanho mais escuro do que o de Neil, e ela está usando o que presumo ser suas
roupas de trabalho: calça cinza, blazer preto, sapatos confortáveis.
— Eu sou a Rowan — eu digo, e de alguma forma sinto a necessidade de explicar por que estou aqui. —
Estou ajudando Neil com um – um projeto.
— Rowan! — ela diz calorosamente, levantando-se para apertar minha mão. — Claro. É tão bom
nalmente conhecê-la! Sou Joelle.
— Finalmente? — Eu repito, olhando para Neil, sorrindo para ele. “Horrorizado” nem mesmo começa a
descrever sua expressão. Oh meu Deus, isso é bom demais. Ele fala sobre mim para sua família. Eu decido
torturá-lo um pouco mais. — É ótimo nalmente conhecê-la também! Neil fala de você o tempo todo. É
tão bom quando os caras não têm vergonha de falar sobre suas mães, sabe?
— Quanta gentileza. Você tornou esses últimos anos desa adores para Neil da melhor maneira possível.
— Ela coloca a mão em seu ombro. Ele silenciosamente se desintegra sob ele. — Ele adora um bom desa o.
Ele nos disse que você vai para Boston para estudar no ano que vem?
Isso é incrível.
— Emerson, sim. É uma pequena escola de artes liberais em Boston.
— Você vai car bem em lidar com Natalie e suas amigas esta noite? — Neil pergunta, nalmente
entrando na conversa. Seu rosto tem um tom encantador de escarlate.
— Ela é uma brisa. Christopher virá mais tarde, de qualquer maneira.
— Diga a ele que sinto muito perder a visita.
Decido apontar o óbvio:
— Vocês são todos ruivos.
— Fazemos parte de menos de 2% da população mundial com cabelos ruivos — diz Joelle. — Eu digo a
eles que eles são especiais quando reclamam disso. — Ela bate no ombro de Neil. — Bebê, não se esqueça
das suas maneiras. Você sabe como tratar um convidado.
A poça de vergonha anteriormente conhecida como Neil McNair murmura:
— Uh, você quer beber alguma coisa?
— Eu estou bem. Você quer pegar seus livros? — Eu pergunto, para salvá-lo da combustão humana. Ele
concorda.
— Antes de irem – você descobriu hoje? — sua mãe pergunta. — Sobre ser o orador da turma?
— Oh — o olhar de Neil vai para o chão — sim. Eu, hum, eu consegui.
— Estou tão orgulhosa de você — diz ela, puxando-o para um abraço.
E, de repente, não sinto mais vontade de zombar dele.
Sua mãe o solta e eu o ouço murmurar um agradecimento.

Eu o sigo pelo corredor acarpetado de marrom até seu quarto. Assim que entramos, ele fecha a porta e se
encosta nela, fechando os olhos. É claro que ele precisa de um momento para descomprimir, embora eu não
entenda completamente o porquê. Sinceramente, isso me deixa um pouco nervosa. Sua mãe é um amor. A
irmã dele é fofa... Estou inclinada a achar que sua vida doméstica é bem normal.
Ainda assim, aproveito esta oportunidade para examinar seu quarto. A tinta está descascando das paredes
em alguns lugares. Há um pôster de Star Wars, um dos novos, eu acho, e um pan eto do show dos Free
Puppies! Acima de sua mesa está a porção da Torá emoldurada de seu bar mitzvah. Sua estante está repleta
de títulos como Aprenda japonês da maneira mais fácil e Então você quer falar hebraico moderno. Sua mesa
está entulhada de canetas de caligra a e, de um lado, dois halteres de quatro quilos. Um McMistério
resolvido. Tento imaginar McNair levantando pesos enquanto recita o alfabeto hebraico.
E ali está sua cama, um cobertor jogado aleatoriamente sobre ela. Achei que seria perfeitamente legal.
Seus ternos, espreitando para fora do armário, são a coisa mais bonita nesta sala. Estar no quarto dele parece
muito pessoal – como ler o diário de alguém quando você não deveria.
— Desculpe por tudo isso — ele diz quando abre os olhos.
— É legal. Você fala com sua família sobre mim. Fico lisonjeada. — Agora que seus olhos estão em mim,
de repente não tenho certeza para onde olhar. Claramente, olhar para ele é o mais seguro. Não quero que ele
pense que estou olhando para os pesos em sua mesa ou, Deus me livre, para sua cama. — Está tudo bem
com sua irmã?
— Ficará — ele diz, e então espera muito, muito tempo antes de falar novamente. — Meu pai... está na
prisão.
Oh. Meu coração cai no chão.
Isso não está nem remotamente dentro do domínio do que eu esperava, mas agora que ele disse isso, não
tenho ideia do que esperava ouvir. Prisão. Parece frio, distante e assustador. Eu mal posso envolver minha
mente em torno disso, mal consigo forçar as palavras para fora.
— Neil, eu... sinto muito. — Não é o su ciente, mas minha voz virou giz.
Seus ombros se contraem.
— Não sinta. Ele fodeu tudo. Isso é por conta dele. Ele fodeu com a vida dele, e fodeu com a nossa, e isso
é tudo culpa dele.
Eu nunca o vi assim. Há uma intensidade em seu olhar que me faz recuar alguns passos. Tenho tantas
perguntas – o que ele fez e quando aconteceu e como Neil está lidando com isso, porque não sei como eu
faria. E sua irmã, e sua mãe, e... puta merda. O pai de Neil está na prisão. Isso é muito.
— Eu não tinha ideia — é o que digo em vez disso.
— Eu não falo com ninguém sobre isso. Nunca. Também não convidei ninguém, porque é mais fácil
não responder a perguntas sobre isso. — Ele encara o chão. — Aconteceu na sexta série. No outono da sexta
série, depois que comecei o ensino médio. O dinheiro sempre foi escasso. Meu pai era dono de uma loja de
ferragens em Ballard, mas não estava indo muito bem e ele tinha alguns problemas de raiva. Uma noite ele
pegou algumas crianças roubando. Ele estava tão furioso... ele deixou um deles inconsciente. O garoto – ele
cou em coma por um mês.
Estou em silêncio. Porque, realmente – o que você pode dizer sobre isso? Nada que eu pudesse dizer
faria tudo car bem.
Quando ele fala, sua voz está áspera.
— Eu não sabia que ele era capaz de algo assim. Desse tipo de violência. Meu pai... ele quase matou
alguém.
— Neil — eu digo baixinho, mas ele não terminou.
— Eu tinha idade su ciente para entender o que estava acontecendo, sorte minha, mas Natalie não.
Tudo o que ela sabia era que nosso pai tinha ido embora — diz ele. — Os garotos do ensino fundamental
descobriram e foi horrível. As piadas, os insultos, as pessoas tentando arranjar briga comigo. Para ver se eu
atacaria como ele fez. Na maioria dos dias, eu nem queria ir para a escola. Não podíamos pagar uma escola
particular e, por causa do zoneamento, não pude mudar de escola, então criei meu próprio plano. Eu distraí
todo mundo fazendo o oposto do que eu queria fazer, que era desaparecer. Eu me joguei na escola, fui
consumido por ser o melhor. Se eu pudesse ter esse rótulo, imaginei, poderia abalar o rótulo de "pai na
prisão". E... funcionou. Se alguém em Westview ao menos se lembra, não diz nada sobre isso.
— Alguns alunos da escola de Natalie descobriram e a intimidaram por isso, então ela se defendeu.
Apesar de quantas vezes eu digo a ela que não está tudo bem, que não queremos nos tornar nosso pai...
— Isso não vai acontecer — eu insisto. Não consigo imaginar aquela doce menina sendo violenta.
— Então essa era a emergência familiar sobre a qual você estava perguntando. Eu tive que pegá-la na
escola antes que o Howl começasse. — Seus ombros caem. — Pelo menos ela está recebendo suas amigas
esta noite. Isso vai ser bom.
Todos esses anos, ele está usando uma armadura. Seu plano de esconder tantos pedaços de si mesmo
claramente funcionou, e não tenho certeza se isso é bom ou ruim.
— Vai ser. Obrigada... por me dizer isso. — Espero não estar dizendo todas as coisas erradas. Espero que
ele saiba que vou manter isso tão seguro como se fosse meu próprio segredo. Não – mais seguro.
— Eu– eu não conto a ninguém há algum tempo — diz ele. — Por favor, não aja estranho perto de mim
agora. É por isso que parei de falar com as pessoas sobre isso. Claro que meus amigos sabem, e eu costumava
falar com Sean sobre isso o tempo todo... mas não tanto. Todos agiriam como se quisessem fazer perguntas,
mas não conhecessem uma maneira diplomática de fazer isso. Então. Se você tiver dúvidas, vá em frente e
pergunte.
Deus, eu tenho um milhão, mas consigo escolher um.
— Você o visita?
— Natalie e minha mãe sim, mas eu não o vejo desde que eu tinha dezesseis anos. Foi quando minha
mãe disse que eu poderia decidir por mim mesmo se queria vê-lo, e simplesmente... não quero. É por isso
que quero mudar meu nome também. — Ele continua mexendo no cobertor. — Mas custa dinheiro, e foi
uma bagunça legal quando minha mãe investigou para mim e Natalie. Sempre havia algo mais que parecia
mais importante.
“Eu odeio ter o nome dele às vezes. Mesmo quando ele estava aqui, nunca fomos realmente próximos.
Estava claro que eu não me encaixava exatamente em sua descrição do que um homem deveria ser. Em sua
mente, havia 'hobbies de garotos' e havia 'hobbies de garotas', e muito do que eu gostava se encaixava na
última categoria. Foi um crime eu não estar interessado em esportes, e se ele soubesse que eu estava cando
emocionado com isso… — Ele se interrompe, como se o peso de tudo isso fosse muito pesado. Ele tenta
respirar fundo, mas tudo o que consegue é uma baforada super cial.
Eu desprezo o pai de Neil com cada bra do meu ser.
— Você tem todo o direito de ser emocional. Sobre qualquer coisa.
Ele se senta na beira da cama, segurando o cobertor. Seus ombros sobem e descem com sua respiração
difícil, e tudo que quero é me sentar ao lado dele, passar o braço em volta dele, qualquer coisa.
— Está tudo bem — digo a ele no que espero ser uma voz suave. Espero que seja algo que eu seja capaz
de fazer ao falar com Neil McNair. Mas não está bem. O que seu pai fez foi horrível.
— É por isso que eu queria tanto ganhar — diz ele, com a voz embargada. — Ele... ele quer me ver antes
de eu ir para a faculdade, mas a prisão ca do outro lado do estado, e eu teria que passar a noite lá, e minha
mãe já está fazendo hora extra e... eu não irei muito mais em casa nos próximos quatro anos e, quando o
zer, minha mãe e Natalie serão minha prioridade. Então... quase sinto que preciso me despedir e fechar o
livro sobre toda essa situação. E– e se eu ganhasse o dinheiro, não precisaria me sentir culpado por
mergulhar no que economizei para a escola.
Isso é o que mais quebra meu coração: ele achar que precisa usar o dinheiro do prêmio por alguém que
tem sido tão terrível com ele.
Ele está chorando. Não soluços intensos, apenas soluços suaves que fazem a bandana em seu braço
balançar para cima e para baixo. Neil McNair está chorando.
E é isso que acontece. A cama range quando me sento ao lado dele, alguns centímetros de espaço entre
nós. Ainda assim, posso sentir o calor de seu corpo.
Lentamente, levanto uma das mãos e a coloco em seu ombro, esperando sua reação. É um limite
estranho a ser cruzado. Estou ainda mais ciente de sua respiração, seu ritmo errático. Mas então ele relaxa ao
meu toque, como se fosse bom, e é um alívio tão grande que eu não tenha errado, que reagi a isso como um
amigo faria. Então eu corro minha palma para frente e para trás no tecido de sua camiseta, sua pele quente
por baixo. Então não é só minha palma, mas também a ponta dos meus dedos, meu polegar traçando
círculos em seu ombro. Um abraço teria sido demais, muito fora do personagem, mas isso– isso, eu posso
fazer.
O tempo todo, estou radicalmente ciente de que estou sentada na cama de Neil McNair. É aqui que ele
dorme, onde sonha, onde me manda mensagens todas as manhãs.
Me mandava mensagem todas as manhãs.
Tão perto, posso dizer que suas sardas não são apenas de uma cor, mas todo um espectro de marrom
avermelhado. Cílios longos roçam as lentes de seus óculos. Elas são um pouco mais claros do que o cabelo
dele, e co hipnotizada por elas por um momento – como são delicadas, uma centena de pequenas luas
crescentes.
Quando seus olhos se abrem para encontrar os meus, eu imediatamente tiro minha mão de seu ombro,
como se tivesse sido pega fazendo algo que não deveria. Algo com que meu eu de quatorze anos com
“destruir Neil McNair” como seu objetivo nal caria muito, muito decepcionada.
Além disso, passou um tempo médio de conforto para os ombros.
— Sinto muito — ele diz, e camos em silêncio por tanto tempo que suas palavras me chocam. Ele não
tem nada pelo que se desculpar. Eu deveria me levantar. É estranho sentar em sua cama assim, mas mesmo
que eu não esteja mais tocando nele, eu não consigo me mover. — Eu não sabia que ainda estava tão
confuso com isso. Meus pais se divorciaram há alguns anos — ele continua, enxugando as marcas de
lágrimas em seu rosto. — Todos nós já zemos terapia, o que ajudou muito. E minha mãe começou a
namorar novamente. Christopher, esse é o namorado dela. É extremamente estranho que minha mãe tenha
namorado, mas estou feliz por ela. E não tenho vergonha de não ter dinheiro — acrescenta. — Tenho
vergonha do que ele fez conosco.
— Obrigada por me dizer — eu digo novamente. Suavemente. — Verdadeiramente.
— É o último dia — diz ele. — Não é nada que você possa usar contra mim agora. — Ele dá o que parece
uma risada forçada. — Ou o choro.
— Nunca — eu digo enfaticamente. Quero que ele saiba que não há problema em chorar perto de mim,
que não é um sinal de fraqueza. — Eu juro. Eu não teria. Mesmo se estivéssemos indo para a escola na
segunda-feira. — Espero que ele encontre meus olhos novamente. — Neil. Você tem que acreditar que eu
nunca teria feito algo assim.
Lentamente, ele acena com a cabeça.
— Não, você está certa.
— Nós podemos mudar de assunto — eu digo, e ele solta um suspiro audível.
— Por favor.
Eu pulo de pé, incapaz de lidar com a realidade de estar na cama de Neil McNair por mais tempo. Está
quente aqui, apesar da con guração do termostato baixo. As estantes parecem uma parte muito mais segura
do quarto.
— Quando você disse que era fã... uau. Você pode ter mais cópias do que meus pais.
Ele se ajoelha ao meu lado, examinando os livros.
— Não ria, mas... eles eram como uma aventura que eu senti que nunca teria — diz ele. — Fizemos todas
as viagens de carro imagináveis no noroeste do Pací co, mas nunca entrei em um avião. Os livros de
Excavated foram uma forma de vivenciar tudo isso. Costumava me deixar triste por não ter isso... mas eu
sabia que um dia teria.
— No próximo ano — eu digo baixinho. — Ouvi dizer que a faculdade é uma aventura.
Ele passa muito tempo avaliando as estantes, puxando alguns livros, olhando para as capas, rindo. Se não
fosse Neil McNair, seria adorável. Talvez ainda seja.
Tudo o que aconteceu comigo na escola primária e secundária virou um livro de alguma forma. O livro
em que Riley teve sua primeira menstruação, aquele que foi criticado pelos pais porque funções
aparentemente básicas do corpo humano são tabu, é baseado em minha própria experiência. Comprei o
meu em uma viagem de campo da sexta série a um museu e disse a um professor que pensei que devia ter me
machucado porque estava sangrando – o que, pensando bem, é estranho porque eu sabia o que era
menstruação. Quando ela perguntou onde eu estava sangrando, apontei para o meio das pernas e ela
rapidamente encontrou um absorvente. Passei o resto do dia esperando que ninguém notasse a
protuberância em minhas calças, o que eu tinha certeza que todos podiam ver.
Agora que estou pensando nisso, espero que Neil não traga esse livro. Por mais que esse tipo de coisa
geralmente não me perturbe, eu realmente gostaria de não discutir minha menstruação ou a de Riley no
quarto de Neil McNair.
— Existe uma palavra em japonês: tsundoku — diz Neil de repente. — É minha palavra favorita em
qualquer idioma.
— O que isso signi ca?
Ele sorri.
— Signi ca adquirir mais livros do que você jamais poderia ler de forma realista. Não há tradução direta.
— Eu amo isso — eu digo. — Espera. O que é isso atrás?
— Nada — Neil diz rapidamente, mas estou pegando a capa familiar, a mulher em um vestido de noiva.
Vision in White de Nora Roberts. O romance que escrevi sobre no primeiro ano.
— Huh. Não é que é interessante. — Meu sorriso não pode ser contido.
Ele coloca a mão em seu cabelo.
— Eu– uh... li. Mais tarde, no primeiro ano. Eu pensei que talvez eu fosse... um pouco idiota sobre isso?
Achei que talvez você estivesse no caminho certo, talvez eu devesse ler se eu fosse fazer um julgamento tão
severo sobre isso. É como tantas pessoas falam sobre romances, certo? Eu era jovem e acho que achava legal
tirar sarro de coisas que eu realmente não entendia. Eu queria dar uma chance.
— E o que você achou?
— Eu... gostei — ele admite. — Foi bem escrito e foi engraçado. Foi fácil se envolver nos personagens. Eu
pude ver por que você amou.
Ele está me surpreendendo de muitas maneiras.
— Vou retirá-lo da minha lista de relatórios de livros em potencial. Existem mais três livros na série, no
entanto — eu digo. — Uau. Minha cabeça está girando. Sobre tudo. — Eu o abro e congelo ao acessar a
página de direitos autorais. — Espera. Esta é uma primeira edição? Você está falando sério?
Ele olha para ele.
— Uau, acho que é. Eu nunca olhei.
Estou boquiaberta. Neil tem uma primeira edição de Nora Roberts.
— Pegue para você — ele diz.
— O quê? Não. Eu não poderia — eu digo, embora esteja abraçando-o contra meu peito.
— Isso signi ca mais para você. Você deveria ter.
— Obrigada. Muito obrigada. — Abro o zíper da minha mochila e, na minha pressa para reorganizar e
abrir espaço para o livro, um pequeno pacote de papel alumínio cai no chão entre nós.
Nunca antes experimentei o silêncio que se abate sobre nós. “Vermelho” nem mesmo começa a descrever
a cor de seu rosto.
— Você... você tem planos mais tarde?
Eu estou morta
— Oh meu Deus. Não. Não — eu digo, pegando o preservativo e colocando-o na minha mochila. — Foi
uma piada. Kirby estava limpando seu armário – ela conseguiu na aula de saúde – e eu vou morrer agora.
Deixe-me aqui com seus livros.
Se isso tivesse acontecido com qualquer uma das heroínas de Delilah Park, elas iriam alegremente rir e
fazer piadas sobre isso mais tarde. Posso fazer isso com Kirby e Mara, mas não com Neil McNair. No fundo
da minha mente – ok, talvez em algum lugar mais perto do meio da minha mente – eu me pergunto se ele
fez sexo. Hoje cedo, eu teria dito absolutamente não por causa de como ele e sua namorada eram tão frios na
escola. Mas depois de tudo o que aconteceu aqui na casa dele... tudo é possível. Só agora estou percebendo o
quão pouco eu sabia sobre ele.
— Por favor, não morra. Eu tenho que provocar você sobre isso mais tarde.
— Nós temos que ir — eu insisto, empurrando minha pequena mochila atrevida. — Shabat.
Antes de abrir a porta, ele olha para trás uma vez, como se a imagem de mim em seu quarto fosse muito
estranha para palavras. Honestamente, tudo o que aconteceu aqui é muito estranho para palavras.
Estranho, porém, é o novo tipo de determinação pulsando em mim.
Eu estava errada antes. Howl é maior do que Neil e eu, mas também é maior do que Westview. Destruir
Neil para realizar algum sonho de primeiro ano parece tão trivial quando esse dinheiro pode mudar sua
vida. Deus, ele poderia até mudar seu nome. Embora eu não possa apagar o que aconteceu com ele, agora
está claro que não posso aceitar uma parte do prêmio em dinheiro. Não posso continuar jogando Howl só
para mim. Quando ganharmos o Howl – se ganharmos o Howl – estaremos ganhando para ele.
Excavated #8: Um Hanukkah Assombrado

por Jared Roth e Ilana García Roth

Riley apertou um dos pequenos coques enrolados no topo de sua cabeça, e depois o outro. Ela
não estava disposta a deixar seu cabelo atrapalhar esta missão. De novo não.
Ela não estava com medo. Ela não tinha medo desde os dez, talvez onze. Roxy foi quem ficou
com medo, implorou a Riley para verificar se havia monstros dentro de seu armário e embaixo
da cama. Riley sempre levou seu papel de destruidora de monstros muito a sério, e depois de
enfiar a cabeça em cada espaço sombrio, ela declarou em sua voz mais oficial que o quarto de
sua irmã estava oficialmente livre de monstros.
Não, ela não estava com medo, não enquanto subia os degraus familiares para seu lugar
favorito no mundo à meia-noite e meia. Estar no museu depois do expediente era um
privilégio; Riley sabia disso. Enquanto ela passava o distintivo e acenava para Alfred, o guarda
de segurança noturno, ela se lembrou que tinha que ver a pedra de perto. Ela precisava de
silêncio para permitir que sua mente o processasse totalmente.
A curadora sênior do museu, Sra. Graves, disse que ele foi encontrado em uma escavação na
Jordânia e que a imagem esculpida nele era inequivocamente uma menorá. Na verdade, era
talvez a representação mais antiga de uma menorá já encontrada.
E, no entanto, havia algo na escultura em pedra que não parecia muito certo para ela, algo
que a puxou de volta ao museu quando seus pais pensaram que ela estava dormindo.
Riley se aproximou, seus tênis da sorte batendo no chão de ladrilhos. Deve ficar mais à
frente, próximo às demais relíquias religiosas do acervo permanente do museu.
Mas assim que ela virou a esquina, ela ouviu alguém gritar.
E de repente, Riley estava muito, muito assustada...
18h22

NEIL MCNAIR ESTÁ admirando meus pais como se não pudesse acreditar que eles são reais.
— Você quer liderar o kiddush11? — minha mãe pergunta a ele depois de acender as velas com a mão
sobre os olhos. Talvez ela tenha percebido que ele queria, pela maneira como os olhava.
— Eu adoraria — diz ele após uma pausa.
No carro, ele lamentou não ter mudado de roupa para algo melhor, mas eu insisti que meus pais não se
importariam que ele estivesse usando uma camisa com uma frase em latim obscura. Desvantagem: toda a
questão dos braços de Neil está de volta.
Não é bem pôr do sol – leia-se: não somos os melhores judeus – então ainda há luz entrando de fora.
Quando chegamos aqui, ele tirou os sapatos no corredor e apertou as mãos dos meus pais, mas mal
conseguia falar. Eles sabem o básico sobre ele: rival de longa data, irritante e gosto medíocre em literatura. E
judeu, que inclui em minha mensagem para avisá-los que o orador da turma de Westiview estaria fazendo
uma aparição no jantar de Shabbat. Meus pais adoram abrir nossa casa para outros judeus, e isso acontece
muito raramente.
Minha mãe passa para ele o copo de kiddush.
— Baruch atah Adonai Eloheinu melech ha'olam borei p'ri hagafen — diz ele com sua voz baixa e melosa.
A bênção do vinho.
Sua pronúncia, sua in exão – perfeita. Claro que são, com sua a nidade por palavras e idiomas. Há
tantas coisas que amo no judaísmo, a história, a comida e o som das orações, mas isso também me isola. No
entanto, aqui está alguém que rotulei como um inimigo que talvez estivesse se sentindo isolado da mesma
maneira.
Depois do que aconteceu em sua casa, não tenho certeza de como agir perto dele. É claro que as coisas
mudaram entre nós; compartilhamos mais sobre nós mesmos do que com a maioria das outras pessoas. Mas
não sei como dizer a ele que, se vencermos, quero que ele pegue o dinheiro do Howl sem que pareça que
vem de um sentimento de pena.
Nós passamos o copo de kiddush que pertenceu aos avós do meu pai, de prata e ornamentado. Neil dá
um pequeno gole e me entrega. Meu gole também é minúsculo. Eu me pergunto se ele acha que eu
propositadamente bebi de um lugar que ele não fez. Em seguida, passo para meu pai e tento agir um pouco
menos neurótica.
Depois disso, recitamos a bênção do challa12 e então é hora de comer. Fiel à palavra, meus pais pegaram
ravióli de cogumelos e prepararam uma salada com a receita secreta de vinagrete do meu pai.
— Você pratica o Shabbat com sua família, Neil? — minha mãe pergunta.
— Não com muita frequência, não. Mas tenho uma boa memória e costumávamos fazer isso quando
minha irmã e eu éramos mais jovens. — É leve, mas noto sua mandíbula tensa por uma fração de segundo.
— Vocês fazem isso toda semana?
— Tentamos jantar no Shabbat juntos todas as sextas-feiras — diz meu pai. — Suponho que será
diferente quando Rowan estiver na faculdade.
— É estranho ser uma das poucas crianças judias na classe — diz Neil, e é estranho ouvi-lo vocalizar algo
que eu só pensei para mim mesma. Estranho e há um pouco de alívio em ouvir alguém dizer algo que você
pensava ser o que só você sentia.
Na maior parte do ano, você não percebe que isso o torna diferente. É apenas o que sua família faz todas
as sextas-feiras, e nós não nos desconectamos completamente como alguns judeus mais praticantes. Mas
durante os meses inteiros de novembro e dezembro, você é um forasteiro completo. Muitas pessoas nunca
percebem que alguém, por padrão, não celebra o Natal.
— Na quinta série, um dos meus professores armou uma árvore de Natal antes de se lembrar que eu era
a única judia da classe — digo. — Então ela anunciou para toda a classe que, porque ela não queria me
ofender, ela estava retirando o aparelho. E todo mundo cou com raiva de mim por, tipo, uma semana
inteira. Ela nem perguntou o que eu achava, ou se ela deveria adicionar uma menorá para equilibrar. Era
quase como se ela quisesse que as pessoas soubessem que eu era a razão pela qual eles não podiam ter uma
árvore.
A mesa ca em silêncio por alguns instantes. Eu não sabia que estava segurando isso por tanto tempo.
— Você nunca nos contou! — minha mãe exclama. — Que professor foi esse?
— Eu não queria fazer disso uma grande coisa — eu digo. Mas talvez eu devesse. — Sra. Garrison?
— Doamos um conjunto de livros para a classe dela — diz meu pai com um resmungo.
— Isso é terrível — diz Neil. Ele gesticula ao redor da sala. — Isso é bom, no entanto. Estar perto de
outro povo judeu.
E, simplesmente, é.
Minha mãe sorri para nosso convidado inesperado.
— Rowan disse que você é fã dos nossos livros?
A boca de Neil abre e fecha, mas nenhum som humano sai. Seus livros da série Excavated estão embaixo
da mesa. Fanboy Neil: de nitivamente não é alguém que eu pensei que conheceria.
Eu o chuto por baixo da mesa. Por favor, lembre-se de como falar, tento falar telepaticamente para ele. Os
egos dos meus pais carão incontroláveis depois disso.
— Grande fã — ele nalmente diz. — Comecei a ler Excavated na terceira série e depois não conseguia
parar. Esses livros realmente me introduziram no mundo da leitura.
Meus pais estão totalmente encantados.
— Esse é o melhor elogio que você poderia nos dar — diz meu pai. — Você leu a série inteira?
— Incontáveis vezes. — Ele aponta para a mesa. — E vocês dois são veganos, certo? Assim como Riley!
— Nós somos. — diz meu pai. — Mas Rowan é vegetariana. Ela simplesmente não consegue obter
laticínio su ciente. — Meus pais se tornaram veganos na faculdade e queriam que eu decidisse por mim
mesma quando tivesse idade su ciente. No jardim de infância, me declarei vegetariana e nunca mais voltei.
Eu amava muito os animais para imaginar comê-los. Como resultado, manter o kosher13, pelo menos suas
regras mais básicas, é muito fácil em nossa casa.
— Rowan adora queijo — diz minha mãe. — Às vezes, quando ela quer um lanche, ela leva uma colher e
um pote de cream cheese para seu quarto.
Neil levanta as sobrancelhas para mim, claramente tentando não rir.
— Mãe. — Sim, cream cheese é a comida dos deuses – especi camente Chris Hemsworth, cerca de Thor:
Ragnarok – mas eu só z isso algumas vezes. De nitivamente menos de dez. — Vamos, talvez, diminuir a
conversa sobre queijo?
Além disso, não é só queijo. Eu não sobreviveria sem os rolos de canela do Two Birds.
— Certo, bem. Como está o Howl?
Eles cam extasiados enquanto Neil e eu explicamos nossa estratégia, as pistas deste ano e o grande
prêmio. Agora que não estão perto do m do prazo, estão muito mais relaxados.
— Devíamos colocar isso em um livro — diz meu pai. — Isso seria divertido, hein?
Minha mãe dá de ombros.
— Eu não sei. Pode ser um pouco difícil de acompanhar. Um pouco de colocações demais.
— Acho que seria ótimo! — Neil diz, um pouco entusiasmado demais. — Qual era o livro que vocês
acabaram de terminar?
Depois que ele os coloca para falar, eles não serão capazes de parar. Eu dou uma olhada no meu telefone.
Uma hora e meia até a sessão de autógrafos de Delilah. Já que é improvável que consigamos todas as cinco
pistas restantes até lá, terei que deixar Neil sozinho por um tempo. Eu me pergunto se posso fazer isso sem
dizer a ele por quê.
— Este é o início de uma série spin-o sobre a irmã mais nova de Riley–
— Roxy! — Neil deixa escapar. — Ela é hilária. Adoro a forma como ela usa alimentos de que não gosta
em vez de exclamações, como ‘Oh my grapefruit’ ou ‘What the fig?’, sempre me mata de rir nos livros de
Riley.
— Nosso editor também a ama — diz minha mãe. — E a editora achou que poderíamos atingir um
público totalmente novo de crianças com essa série. Portanto, segue Roxy em sua busca para se tornar uma
chef de massas, e cada livro terá receitas fáceis para as crianças fazerem.
— Que ideia legal — Neil respira. — Minha irmã iria adorar isso. Ela tem onze anos e está começando a
entrar no mundo dos livros. Sabe, sempre pensei que Excavated daria um ótimo lme.
— Nós também! — meu pai diz. — Os direitos foram vendidos, mas nada aconteceu com eles.
— Conhecendo Hollywood, eles provavelmente a teriam tornado branca de qualquer maneira — diz
minha mãe. — Transformado Riley Rodriguez em Riley Johnson ou algo parecido, e fez os livros do
Hanukkah girarem em torno do Natal.
Neil estremece.
— Na verdade, trouxe alguns livros comigo, se vocês não se importarem...
— Claro que não nos importamos! — meu pai diz. Juro que ele já tem uma caneta de assinatura pronta.
— É Neil com e-a ou e-i?
Ele dá a gra a correta e eles colocam suas assinaturas na folha de rosto.

14

Neil lê sem parar, lábios formando as palavras. Ele parece que vai desmaiar.
— Você poderia assinar o outro para minha irmã, Natalie? — ele pergunta, e eles atendem. — Obrigado.
Muito obrigado. Eu não posso te dizer o quanto isso signi ca para mim.
Todos esses anos, estive travando uma guerra contra um superfã de Riley Rodriguez. Não posso negar
que é um pouco cativante.
— A qualquer hora, Neil — diz minha mãe. — Se você quiser passar aqui depois neste verão, podemos
mostrar alguns rascunhos de esboços para nosso próximo livro de imagens.
— Isso seria incrível — ele diz, e eu juro que ele se senta mais reto, parecendo ganhar mais con ança. —
Você sabe que outros tipos de livros eu amo? Livros de romance.
E então ele en a mais salada na boca, todo casual.
Perdoe-me enquanto eu levanto a metade inferior da minha mandíbula.
Minha mãe levanta as sobrancelhas.
— Huh — ela diz neste tom perplexo. — É mesmo?
— Você e Rowan têm isso em comum — diz meu pai. — acho que não são mais apenas para donas de
casa entediadas. — Ele coloca ênfase em “donas de casa entediadas”, como se não fosse uma frase de que ele
gostasse, necessariamente, mas não pudesse encontrar uma melhor. Pai, sua misoginia está aparecendo.
— E não apenas para mulheres, também — diz Neil, após uma pausa que talvez indique que ele também
se incomodou com o comentário de meu pai. — Embora centralizem as experiências das mulheres de uma
maneira que poucas outras mídias fazem.
Sua voz é sólida, rme. Não há nenhum indício de sarcasmo aqui, e não estou mais convencida de que
ele está me provocando. Quando seus olhos encontram os meus, um canto de sua boca se abre em um
sorriso que é mais reconfortante do que conspiratório. Quase como se ele estivesse tentando ajudar meus
pais a entenderem isso que eu amo.
Mas isso é em vão.
— Bem, não sei se isso é necessariamente verdade — diz meu pai, e recita os nomes de alguns programas
da Net ix porque, é claro, três exemplos recentes são provas incontestáveis de que uma forma de arte inteira
ainda não está totalmente distorcida em direção ao olhar masculino.
O que eles diriam se eu contasse agora? Se eu dissesse que quando faço aulas de redação criativa na
Emerson, é porque quero escrever o tipo de livro que eles acham que não tem valor? Eles tentariam mudar
minha opinião ou aprenderiam a aceitar isso? Parte de mim está esperançosa que eles entendessem se eu
quisesse quase-seguir seus passos, mas eu quero uma garantia de que sua reação não vai me rebaixar.
Meus pulmões estão muito tensos e, de repente, não há ar su ciente aqui. Em um movimento rápido,
co de pé.
— Me dêem licença por um momento — eu digo antes de escapar para a cozinha.

Eu me deleito em minha solidão por alguns minutos, tentando descobrir como este dia foi de Neil McNair
ganhar o título orador da turma para defender romances para meus pais. A risada na sala de jantar
diminuiu, mas ainda posso ouvi-la.
— Rowan? — A voz da minha mãe.
Eu me afasto de onde estava olhando pela janela em nosso quintal. Minha mãe tira os óculos, limpa as
lentes no suéter. Seu cabelo está no mesmo tipo de coque que o meu, embora o dela pareça desleixado de
autor pro ssional de alguma forma. Provavelmente é o par de lápis saindo dela.
— Esse não pode ser o mesmo garoto com quem você está competindo há quatro anos — ela diz,
apontando para a sala de jantar. — Porque ele é muito legal. Muito educado.
— É o mesmo garoto. — Eu me inclino contra o balcão da cozinha. — E ele é. Tão chocante.
Ela me dá um sorriso caloroso e segura meu ombro.
— Rowan Luisa Roth. Tem certeza de que está bem? Eu sei que este último dia deve ter sido difícil.
Rowan Luisa. Meu nome do meio pertencia à mãe de seu pai, uma avó que viveu e morreu no México
antes de eu nascer.
Só noto o sotaque da minha mãe de vez em quando, quando ela pronuncia certas palavras ou quando se
corta com papel ou bate o dedo do pé, murmurando “Dios mío” tão rápido que eu pensava que era tudo
uma palavra. Quando ela está lendo em voz alta para si mesma – instruções, uma receita, histórias – ela o faz
em espanhol. Uma vez eu disse isso a ela, só porque achei interessante e adoro ouvir minha mãe falar
espanhol. Ela nem estava ciente disso, e eu estava tão preocupada que agora que ela sabia que estava fazendo
isso, ela pararia. Felizmente, ela nunca o fez.
— Eu não sei.
Sempre fui capaz de ser honesta com meus pais. Até contei para minha mãe quando perdi minha
virgindade. Os romances me deixaram ansiosa para falar sobre isso.
A questão é que estou com medo.
Com medo de dizer que quero o que eles têm.
Com medo de que eles descartem isso como um hobby.
Com medo de que, se lerem meu trabalho, me digam que não sou boa o su ciente.
Com medo de que me digam que nunca vou conseguir.
Sua mão roça minha bochecha.
— Finais são tão difíceis — ela diz, e então ri do duplo signi cado. — Eu deveria saber. Passamos o dia
todo tentando fazer o nosso certo.
— Os seus são sempre perfeitos. — E eu quero dizer isso. Fui a primeira leitora dos meus pais, a primeira
fã deles. — Você já… — Eu paro, me perguntando como dizer isso. — Você já teve pessoas que desprezaram
você e papai por escreverem livros infantis?
Ela me lança um olhar por cima dos óculos, como se dissesse, obviamente.
— O tempo todo. Dissemos o que os pais dele disseram quando o terceiro livro de Riley entrou na lista
do New York Times, certo? — Quando balanço a cabeça, ela continua: — O pai dele perguntou quando
íamos começar a escrever livros de verdade.
— O vovô só lê livros da Segunda Guerra Mundial.
— E isso é bom. Não é a minha praia, mas entendo por que ele gosta deles. Sempre amamos escrever
para crianças. Eles estão tão cheios de esperança e maravilhas, e tudo parece grande, novo e excitante. E
adoramos conhecer as crianças que lêem nossos livros. Mesmo que eles não sejam mais crianças — ela diz
com um aceno de cabeça em direção à sala de jantar.
— Você já pensou…? — Eu mastigo o interior da minha bochecha. — O que o vovô disse sobre os seus
livros. É assim que às vezes me sinto.
— Sobre romances? Eu nunca diria que eles não são livros de verdade, Rowan. Cada um de nós tem suas
preferências. Podemos concordar em discordar.
Tento evitar que meu coração afunde. Não é um progresso, não exatamente, mas pelo menos não parece
um passo para trás. Vai ter que ser o su ciente até eu conhecer Delilah.
— Falando em romance — minha mãe diz. — Há algo acontecendo entre você e Neil?
Minhas mãos voam para a boca e tenho certeza de que há uma expressão de horror em meu rosto.
— Oh meu Deus, mãe, não, não, não, não, não. Não.
— Desculpe, não entendi direito.
Eu reviro meus olhos.
— Não. Nós nos juntamos para o jogo. Completamente platônico.
Mas minha mente tropeça na maneira como ele disse o kiddush, o som dessas palavras que eu conhecia
tão bem em uma voz que pensei que conhecia. Meus dedos formigam com a memória de sentar em sua
cama, tocando seu ombro. Um momento incomum de contato físico entre nós. Em seguida, o pontilhismo
de sardas em seu rosto e no pescoço, os pontos que se enrolam em seus dedos e sobem por seus braços. E os
braços – o jeito que cam naquela camiseta.
Provavelmente, estou realmente interessada nos braços.
— Bem. Espero que você aproveite o resto do seu jogo — minha mãe diz com um sorriso antes de voltar
para a sala de jantar.
PISTAS DO HOWL

Um lugar onde você pode comprar o primeiro álbum do Nirvana


Um lugar que é vermelho do chão ao teto
Um lugar onde você pode encontrar Chiroptera
Uma faixa de pedestres em arco-íris
Sorvete adequado para o Pé-Grande
O grandalhão no centro do universo
Algo local, orgânico e sustentável
Um disquete
Uma xícara de café com o nome de outra pessoa (ou seu próprio nome, totalmente incorreto)
Um carro com multa de estacionamento
Uma visão do alto
A melhor pizza da cidade (à sua escolha)
Um turista fazendo algo que um morador teria vergonha de fazer
Um guarda-chuva (todos nós sabemos que os verdadeiros moradores de Seattle não os usam)
Uma homenagem ao misterioso Sr. Cooper
19h03

— COMENDO CREAM CHEESE direto do pote — diz Neil, balançando a cabeça enquanto dirigimos
pela Fremont Avenue. — Sua bárbara.
— Ninguém tem boas maneiras quando está comendo sozinho — digo enquanto paro em uma vaga de
estacionamento. — Tenho certeza de que você tem muitos hábitos terríveis.
— Na verdade, sou bastante so sticado. Coloco as coisas nos pratos antes de comê-las. Você já ouviu
falar deles, certo? Pratos? Conheça também: tigelas.
Perto do nal do jantar, criamos uma estratégia: o Fremont Troll (o grandalhão no centro do universo) e,
em seguida, uma vista do alto. Quando sugeri Gas Works Park, que cou famoso pela cena do paintball em
10 Coisas que Eu Odeio em Você, ele zombou.
— Essa é realmente a melhor vista de Seattle? — ele perguntou.
— É uma vista de Seattle — eu disse. — Não precisa ser a melhor.
Fremont está ocupado nas noites de sexta-feira. Ainda não escureceu e vozes jorram de bares e
restaurantes. Na próxima semana, durante o solstício de verão, Fremont vai comemorar com um des le e
um passeio de bicicleta pelado. O troll, que tem quase seis metros de altura, tem uma mão enrolada em um
fusca de verdade e uma calota no lugar do olho.
Veri co a hora no painel do meu carro pela décima vez no último minuto. A sessão de autógrafos de
Delilah Park é em uma hora, e agora estou o cialmente em pânico.
Ela estará elegante, é claro, como em todas as fotos. E gentil. Tenho certeza que ela será gentil. Conheci
amigos autores de meus pais, mas não é bem a mesma coisa. Delilah é alguém que descobri por mim mesma,
não alguém que meus pais convidam para um drinque noturno sempre que estão na cidade. Horrorizada,
percebi que esqueci de trocar meu vestido manchado por algo limpo. Rezo para que esteja escuro na
livraria. Não quero sentar na primeira la, mas também não quero sentar na parte de trás. O que as pessoas
normais fazem quando vão a eventos sozinhas? Talvez eu deixe minha mochila no assento ao meu lado e
nja que estou guardando para alguém.
— Você tem outro lugar para estar? — Neil pergunta enquanto procuramos por estacionamento. —
Você ca olhando para o relógio.
— Sim. Eu quero dizer não. Eu só – há algo que eu quero fazer às oito.
— Oh. OK. Você estava... planejando me contar?
— Sim. Agora.
Mesmo depois de seu mini discurso sobre romances no jantar, essa sessão de autógrafos é algo que eu
tenho que experimentar por conta própria. Se ele estiver lá, não vou sentir que posso ser eu mesma, embora
não tenha certeza de quem é essa pessoa, aquela que é capaz de amar o que ama sem se envergonhar.
— Ok — diz ele lentamente. — Onde é?
— Greenwood. Levarei apenas dez minutos para chegar lá e estarei fora por cerca de uma hora. E já
estamos muito à frente — digo, ciente de que pareço estar tentando defendê-lo. — Podemos nos encontrar
de volta e terminar o jogo então. A menos que você ache que estará muito cansado?
— Estou nisso a longo prazo.
— Bom. Eu também.
Segue-se um pequeno silêncio constrangedor. Tenho que mudar de assunto antes de me dissolver em
uma poça de nervos.
— Você e sua irmã pareciam próximos.
— Nós somos — ele diz antes de reprimir um sorriso. — Exceto pelos seis meses em que a convenci de
que ela era uma alienígena quando tinha oito anos.
— O quê? — Eu gaguejo, rindo.
— Ela é canhota, e o resto de nossa família é destro, e ela é a única que tem um umbigo de fora, então eu
a convenci de que isso signi cava que ela era uma alienígena. Ela estava tão assustada com isso, e ela estava
determinada a tentar voltar para seu planeta natal, que eu disse que se chamava Blorgon Seven. De vez em
quando, eu pergunto a ela como estão as coisas no Blorgon Seven.
Posso dizer que há um afeto genuíno aí. Que ele é um bom irmão, embora, como lha única, nunca fui
capaz de compreender completamente as profundezas dos relacionamentos entre irmãos. Isso aperta meu
coração de várias maneiras.
— Sua pobre irmã.
— E você, com seus pais – vocês são próximos — diz ele, mais uma a rmação do que uma pergunta.
Eu concordo.
— Foi legal, o que você disse a eles. Obrigada.
— Achei que estava errado. Eles também estão — diz ele. — Mas, sério, seus pais são muito legais. Você é
sortuda.
Suas palavras parecem pesadas. Eu sei que tenho sorte. Eu realmente sei. E eu amo meus pais, mas não sei
como fazê-los entender o que eu quero quando eles não entendem o que eu amo.
— Obrigada — é tudo que consigo dizer. — Novamente. — Gentileza com Neil McNair. Essa é nova.
Encontramos uma vaga de estacionamento a dez minutos a pé do troll. Tranco meu carro enquanto Neil
imita o alongamento, como se estivesse se preparando para uma grande corrida. Ele levanta os braços para o
céu, sua camiseta subindo e expondo uma fatia de seu estômago. Ele está usando um cinto marrom simples,
e a faixa azul-marinho de sua cueca boxer aparece acima de sua calça jeans.
Meu rosto ca quente. O comando para desviar o olhar se perde entre a parte do meu cérebro que faz
boas escolhas e a parte que não faz. É como se o estômago de Neil McNair de alguma forma não zesse
sentido em minha mente. Obviamente, ele tem um estômago e, naturalmente, está coberto de sardas...
Objetivamente, é um estômago atraente. Isso é tudo – uma apreciação da forma masculina. Seus
ombros, seus braços, seu estômago.
E o anel de sardas em volta do umbigo.
E o cabelo ruivo logo abaixo dele que desaparece em sua cueca.
Seus braços caem para baixo, assim como a bainha de sua camisa, escondendo com segurança seu
estômago de vista. Ele encontra meus olhos antes que eu possa desviar meu olhar, e um canto de sua boca se
curva.
Oh não, não, não. Ele acha que eu estava olhando?
— Faz algum tempo que tenho um jantar de Shabbat — diz ele, e estou aliviada porque o Judaísmo é
algo sobre o qual posso falar. As razões pelas quais eu estava olhando para o estômago sardento de Neil,
nem tanto. — Obrigado por isso. Mesmo. O que você disse sobre aquele professor que você teve... — Ele
balança a cabeça. — Eu tive muitas experiências como essa para contar. As pessoas dizem para você relaxar,
que você está exagerando. Ou eles parecem assim no início, e então é uma 'piada' após a outra e você começa
a se perguntar se você realmente é inferior por causa disso. É por isso que parei de contar às pessoas, e com
meu sobrenome... ninguém presumiu. — Seguimos em frente, passando por uma loja de molduras e uma
padaria sem glúten. — Mas os feriados são difíceis. Todo ano, eu acho que eles não vão ser, e então eles são.
— Você não adora quando as pessoas chamam de feriado ou festa de m de ano, mas tudo é vermelho e
verde e tem um Papai Noel de merda? — Eu digo. — É como se eles pensassem que chamar isso de 'feriado'
os torna automaticamente inclusivos, mas eles não querem se dedicar ao trabalho real de inclusão.
— Sim! — Ele quase grita isso, tão alto que uma família saindo de um restaurante tailandês nos encara.
Neil está rindo um pouco, mas não porque seja engraçado. — Eu tive um professor bem direto que me disse
que eu não poderia participar de uma caça ao ovo de Páscoa, embora eu quisesse.
— Quando as pessoas descobrem que sou judia, juro que às vezes elas acenam com a cabeça, tipo, 'Sim,
faz sentido.' Já… me disseram que pareço muito judia.
— Eu tive um amigo no ensino fundamental que parou de vir à minha casa — diz ele, em voz baixa. —
Esse garoto Jake. Quando lhe perguntei sobre isso, ele me disse que seus pais não o deixariam. Voltei para
casa chorando com minha mãe porque não entendia, e ela ligou para o pai dele. Quando ela desligou o
telefone... Eu nunca a tinha visto assim. E uma parte de mim simplesmente sabia, antes mesmo de dizer isso,
por que ele não tinha mais permissão para ir.
Ele continua quebrando meu coração.
— Isso é terrível para caralho. — Eu examino nossos arredores antes de dizer a próxima parte. — Mais
cedo, quando eu ouvi Savannah na zona segura. Ela disse que eu obviamente não precisava do dinheiro do
Howl. E então– e então ela bateu no nariz. — Com isso, faço o mesmo com o meu, percebendo que estou
chamando a atenção para ele e me perguntando se Neil acha que é muito irregular ou muito grande para o
meu rosto, como eu costumava achar. Ele para abruptamente, suas sobrancelhas cortadas.
— Você está falando sério? — Uma exalação alta. — Que merda, Rowan. Isso é uma bagunça. Isso é
muita merda. Eu sinto muito.
Sua reação me ajuda a relaxar um pouco. Como se eu pudesse ter uma justi cativa de como me sentia
sobre isso, porque eu não estava sozinha em pensar que era uma merda, mas... minha reação foi o su ciente,
não foi? Se eu me sentia um lixo sobre isso, era o su ciente.
Neil dá um passo à frente e roça meu antebraço com a ponta dos dedos, um pequeno gesto para
combinar com sua expressão de empatia. A maneira como ele me toca é suave e hesitante. É a maneira como
eu o toquei de volta em seu quarto, em sua cama.
— Sinto muito — ele repete, seus olhos não deixando os meus, e há algo tão estranho nessas palavras
combinadas com as pontas de seus dedos na minha pele que eu tenho que desviar o olhar, o que o faz soltar
a mão.
— As pessoas pensam que é inofensivo. Eles acham engraçado. É por isso que eles fazem isso — digo,
tentando ignorar o estranho arrepio onde ele tocou meu braço. Deve ser eletricidade estática. — E com
certeza. Acho que é inofensivo até que algo ruim acontece. É inofensivo e então há seguranças na sua
sinagoga porque alguém chamou por causa de uma ameaça de bomba. É inofensivo e você ca com medo de
sair da cama no sábado de manhã e ir ao culto.
— Isso… — ele pergunta em voz baixa.
— Um pouco antes do meu bat mitzvah.
A polícia encontrou o cara que fez isso. Aparentemente, tinha sido uma brincadeira. Não tenho certeza
do que aconteceu com ele, se ele foi para a prisão ou se um policial simplesmente deu um tapinha em seu
ombro e pediu-lhe para não fazer isso de novo, como fazem quando homens brancos fazem algo assustador.
Mas eu estava com tanto medo que chorei e implorei a meus pais que não me obrigassem a ir à sinagoga
durante semanas. E nalmente paramos de ir, exceto nos feriados.
Esse medo tirou algo que eu amava de mim.
Obviamente não inofensivo.
Neil e eu estamos um pouco sem fôlego. Suas bochechas estão coradas, como se esta conversa tivesse sido
um esforço físico tanto quanto emocional. Caímos no mesmo ritmo novamente.
— Mas às vezes é estranho, com meu sobrenome, e depois com o cabelo e as sardas, a presunção que sou
totalmente irlandês. Eu me considero não-judeu até que alguém descubra que sou judeu e então se re ra a
isso o tempo todo. As pessoas aqui se esforçam para tentar fazer você se sentir confortável e, ao fazer isso, às
vezes o afastam ainda mais. Alguns têm boas intenções, mas outros...
Sim. Exatamente isso.
— Quando você aprende sobre o Holocausto, você assume que o antissemitismo é algo histórico. Mas...
realmente não é.
— Quando você aprendeu sobre isso? — ele pergunta. Eu tenho que pensar por um momento. —
Minha mãe me contou depois do que aconteceu com Jake.
— Em aula, aprendemos sobre isso na quarta série. Mas eu já sabia disso naquele momento. A questão
é… — Paro, procurando minha memória, mas apenas uma resposta devastadora vem à mente. — Não me
lembro de ter aprendido sobre isso. Tenho certeza de que meus pais me contaram em algum momento, mas
não me lembro de não saber.
Eu gostaria de poder me lembrar. Eu quero saber se chorei. Quero saber que perguntas z, que
perguntas eles não poderiam responder.
— Nós vamos totalmente destruir a Savannah, ok? — Neil diz.
Seu uso casual de palavrões é uma mistura de divertido e outra coisa que não consigo nomear. Ele está
falando sério. Ele está furioso por mim, em busca de vingança. Como se fossemos realmente aliados além do
jogo.
Essa conversa me faz me arrepender, um pouco, de não sermos amigos. Kylie Lerner, Cameron Pereira e
Belle Greenberg pertenciam a círculos diferentes, mas eu queria tanto amigos judeus. Eu estava convencida
de que eles me entenderiam neste nível profundo que ninguém mais poderia. Eu não estou isenta de culpa
– nunca z um esforço para conhecê-lo em um nível além de concorrente. Eu errei, tratando-o como um
rival quando ele poderia ter sido muito mais do que isso. O que seríamos agora, se eu não tivesse buscado
vingança depois daquele concurso de redação, se ele não tivesse retaliado?
Essa linha do tempo alternativa parece tão, tão adorável.
— Eu quase… — Eu começo, e então me contenho.
Ele para de andar.
— O quê?
— Eu– eu não sei. Eu quase gostaria que pudéssemos ter conversado sobre esse tipo de coisa antes, — eu
digo rapidamente, tudo de uma vez, antes que eu possa me arrepender. Foda-se, já compartilhamos muito
esta noite. — Nunca tive ninguém com quem conversar sobre isso.
Os poucos minutos que ele espera antes de responder são uma tortura.
— Eu também — ele diz baixinho.

Tiramos nossa foto do troll – com o troll, Neil insiste, entregando seu telefone a um turista. Tenho certeza
de que estou carrancuda, mas quando olhamos para a foto depois, co surpresa em nos encontrar sorrindo.
Um pouco estranho, com certeza, mas está um passo acima da foto Mais Provável de Ter Sucesso.
— Não temos tempo para ir para a Gas Works antes do seu compromisso — diz Neil enquanto voltamos
para o meu carro. — Devíamos passar no zoológico primeiro.
Eu concordo.
— OK. Certo. Espere, por que você está parando?
Ele torce a boca para o lado, como se estivesse considerando se quer dizer o que está prestes a dizer.
— Isso pode parecer ridículo, mas... Eu ouvi que ir à exibição enquanto está doidão é uma experiência
bem selvagem. — Com as sobrancelhas levantadas, ele aponta para a loja à nossa esquerda. HASH TAG diz
a placa na janela, com uma folha de maconha desenhada abaixo.
Neil McNair, orador da turma de Westview, apenas sugeriu ir ao zoológico, enquanto estivessemos
chapados.
— Espera aí — digo, lutando contra a vontade de rir —, acho que você acabou de sugerir que
comprássemos um pouco de maconha?
— Eu tenho camadas, Artoo.
— Nós temos… — eu veri co meu telefone — trinta e cinco minutos antes de eu ter que sair para a
minha, hum, coisa. Sem mencionar que nenhum de nós tem 21 anos.
— Temos muito tempo para suas coisas e o zoológico — diz ele. — Nós estamos bem aqui. E o irmão de
Adrian trabalha aqui. Ele está sempre dizendo que devemos passar por aqui e escolher alguma coisa.
— O funcionário do mês mesmo. — Mas tenho que admitir, estou curiosa. Não me oponho à maconha
e ela está disponível em festas. Me preocupo em não saber o que fazer com isso, o que me impediu de pedir
para experimentar.
— Não havia nada que você quisesse fazer no colégio, mas nunca teve a oportunidade?
É isso que me incomoda.
— Na verdade — eu digo, porque nós já compartilhamos muito hoje. É melhor mostrar-lhe mais do
meu cérebro estranho. — Eu tinha essa lista. Este guia de sucesso que z há quatro anos, que mapeou tudo
o que devo fazer antes de me formar. Eu tinha me esquecido disso por um tempo, até hoje. E estou
percebendo que perdi alguns ritos de passagem essenciais. Não maconha, necessariamente, mas – outras
coisas.
É um pouco catártico mencionar o guia em voz alta. Mas o que me pergunto é como uma amizade com
Neil McNair se encaixa nessa lista – porque tenho quase certeza de que não.
— Como o quê?
— Baile de formatura, por exemplo. Eu não fui. — Parte de mim se perguntava se teria sido divertido
sem um par, sem aquele namorado perfeito do colégio, mas na minha cabeça, o baile perfeito era com um
par que estava profundamente apaixonado por mim. Em vez disso, mergulhei no meu medo de perder
oportunidades a noite toda, percorrendo as redes sociais enquanto relia meu livro da Delilah Park favorito,
tentando ignorar a pontada que parecia arrependimento.
— Você não perdeu muito. Brady Becker era o rei do baile, Chantal Okafor era a rainha do baile e
Malina Jovanovic e Austin Hart quase foram convidados a sair porque estavam, uh, dançando muito
sugestivamente, de acordo com a diretora Meadows. — Ele esfrega a nuca. — E... Bailey cou muito quieta
o tempo todo, então fez sentido quando ela disse que queria terminar alguns dias depois.
Eu sabia que eles tinham terminado um pouco recentemente. Tive algumas aulas com ela, mas ela
sempre foi muito quieta.
Como se antecipando que eu pudesse me desculpar, Neil acrescenta:
— Tudo bem. Mesmo. Não tínhamos muito em comum. Até conseguimos continuar amigos.
— Spencer também queria continuar amigo, mas mal nos divertíamos, mesmo quando estávamos
juntos. — Eu suspiro, afundando meus pés na calçada. É estranho contar tudo isso a ele e, no entanto, sinto
vontade de fazê-lo. — Em retrospecto, o relacionamento era principalmente físico. O que foi divertido, mas
eu queria mais do que isso.
Neil tosse um pouco.
— Vocês dois pareciam... felizes? Vocês caram juntos por um tempo.
— Não é o mesmo que ser feliz.
Se há algo que estou aprendendo hoje, é que todo tipo de relacionamento é complicado. O que explica
porque estou aqui com Neil e não com minhas melhores amigas. Suas palavras me atingiram novamente.
Não estou aqui porque estou obcecada por ele – estou aqui para nalmente acabar com isso entre nós. Só
então serei capaz de superar tudo isso. Pelo menos eu espero que sim.
— Tantos relacionamentos estão terminando — eu continuo, não querendo me demorar em Spencer.
— Darius Vogel e Nate Zellinsky se separaram na semana passada e estão juntos desde o segundo ano. Acho
que é difícil car com alguém que está viajando a centenas de quilômetros de distância.
— É isso mesmo o que você pensa?
Eu encolho os ombros, sem saber a resposta, querendo outra mudança de assunto.
— Vamos entrar. — O dia de hoje já foi preenchido com muita coisa que nós dois nunca teríamos feito.
Se eu quiser que seja uma verdadeira despedida, podemos também riscar algo da lista de Neil. É isso que
Howl está se tornando: um adeus ao colégio e ao garoto que me deixou maluca durante a maior parte dele.
Neil sorri.
O cara atrás do balcão parece um típico hipster de Seattle, camisa xadrez e óculos de armação grossa,
pelos faciais bem tratados. As luzes são fortes e o balcão está abastecido com todos os tipos de comestíveis.
Tubos de todas as cores e desenhos revestem as paredes.
— Neil, meu cara!
— Ei, Henry — diz Neil, e quando nós dois registramos que Adrian está lá com ele — Ei!
Os irmãos Quinlan estão segurando recipientes gêmeos de comida. Adrian acena para nós.
— Nossa mãe não gosta que ele trabalhe aqui, mas ela ainda quer mantê-lo bem alimentado — diz ele a
título de explicação. — E eu estou morto, então. Vocês ainda estão vivos?
Neil acena com a cabeça e diz a ele nosso plano.
— Bacana! — Adrian exclama. Para crédito de Adrian, ele não lança nenhum olhar estranho na minha
direção.
— Avise-me se precisar de ajuda — Henry diz alegremente, evidentemente sem se preocupar em vender
maconha para menores.
Percorremos os itens comestíveis e a seleção de cachimbos, muitos dos quais parecem obras de arte.
Existem caramelos e biscoitos e pirulitos, tortas e gomas e até batom.
Estou em uma loja de maconha com Neil McNair. O que é a minha vida?
— Você quer que eu pergunte se eles têm cream cheese no pote e uma colher grande? — Neil sussurra.
— Cale a boca — eu digo em meio a uma risada, embora isso soe como se pudesse ser bom espalhado em
um bagel.
Neil bate os dedos na caixa de vidro.
— O que você recomendaria para duas pessoas que são relativamente novas no mundo da maconha? —
Ele não poderia soar mais como um idiota se tentasse, oh meu Deus.
— Você está procurando comestíveis ou algo para fumar?
— Comestíveis — eu digo. Muito menos conspícuo.
Ele en a a mão dentro da caixa de vidro.
— Uma boa dose inicial para iniciantes é cinco miligramas de THC. Esses cookies são os nossos mais
vendidos e nós os compramos em porções de cinco e dez miligramas. Chocolate, manteiga de amendoim e
hortelã.
— Qual é a sensação? — Eu pergunto, não querendo parecer uma amadora. Não quero levar nada que
me faça não ser muito parecido comigo mesmo.
— Relaxante — diz Henry. — Isso não desliga completamente o seu cérebro, mas uma porção tão
pequena, vai apenas abrandar você.
Meus ouvidos se animam com isso. Talvez seja disso que preciso para conhecer Delilah.
— Parece perfeito. — Iremos ao zoológico e depois irei para Delilah. Serei normal, calma e tranquila.
Compramos dois biscoitos de cinco miligramas.
Adrian nos deseja sorte e levanta o punho.
— Quad life! — Desta vez não co tão envergonhada quando Neil diz isso de volta.
Lá fora, Neil bate no meu biscoito de erva com o dele.
— Saudações às escolhas questionáveis — diz ele antes de darmos uma mordida.
PONTOS DE HOWL

TOP 5
Neil McNair: 11
Rowan Roth: 11
Mara Pompetti: 8
Iris Zhou: 8
Brady Becker: 7

RESTANTES DE JOGADORES: 21

HISTÓRIA DO HOWL: O jogo mais curto de Uivo durou 3


horas e 27 minutos. O jogo mais longo durou 4 dias e 10
horas, fazendo com que os futuros criadores de jogos
implementassem um prazo até a formatura de domingo.
19h34

NÃO CONSIGO ENXERGAR nada. Leva um tempo para meus olhos se ajustarem, para meus outros
sentidos me equilibrarem. Está quente na casa noturna. Mais escuro que escuro. Algo sussurra, algo corre,
algo apita. Formas de árvores, talvez um lago, lentamente entram em foco. Esta sempre foi minha exposição
favorita, sua paz misteriosa capaz de deixar até mesmo as crianças mais selvagens calmas e educadas.
Estou um pouco longe de estar em paz no momento, já que quase perdemos uma morte em nosso
caminho para o zoológico. Carolyn Gao estava cerca de seis metros à nossa frente, saindo da casa noturna
com Iris Zhou.
— Neil! — Eu assobiei, mas ele não reagiu. Tive que cutucar seu braço. Lá estava seu braço sardento e
bíceps inexpressivo, mas ainda agradavelmente surpreendente. — Sério? Carolyn!
— Carolyn...?
— Carolyn Gao. Seu alvo?
— Oh. — Ele piscou como se estivesse acordando, embora eu duvidasse que a erva ainda tivesse feito
efeito. — Oh. Merda. Você tem razão.
Carolyn e Iris se viraram na direção oposta, em direção à saída do zoológico.
— Não temos tempo — ele disse, indo para a exposição, e eu o segui relutantemente.
Tiramos uma foto na entrada da casa noturna, mas em vez de uma marca verde, os calouros enviaram
um X vermelho.
— Provavelmente teremos que entrar — disse Neil, o que eu acho que era o ponto principal daqueles
comestíveis. Ele insistiu que seríamos rápidos. Que eu não perderia meu compromisso misterioso. É melhor
ele estar certo.
Um morcego passa perto da minha cabeça e eu paro tão de repente que Neil esbarra em mim.
— Desculpe — ele sussurra, mas eu ainda posso senti-lo bem atrás de mim, as pontas de seus dedos
roçando meu ombro enquanto ele recupera o equilíbrio. Não saber exatamente onde ele está faz meu
coração parecer um coelho no meu peito. — Você já sente alguma coisa?
— Na verdade, não — eu digo, mas mesmo quando as palavras saem da minha boca, estou ciente de que
algo mudou. Uma risada borbulha de mim, embora nada seja engraçado. — Eu... espere. Posso estar
sentindo algo.
Minha irritação com ele parece ir embora, e de repente a sessão de autógrafos de Delilah não parece tão
assustadora. Obrigada, Henry.
Delilah. Eu veri co meu telefone novamente – mais dez minutos até que eu tenha que sair.
Uma conversa indistinta enche a exposição quando outro grupo de pessoas entra.
— O que você acha que fará se ganhar? — alguém diz, não sussurrando da maneira que devemos fazer.
— Cinco mil é o su ciente para um carro usado, e estou farto de ônibus — diz outra voz. — Eu sei que
Savannah disse que matá-los era mais importante, mas caramba se eu não quero esse dinheiro.
O mais devagar que posso, me viro e, embora não consiga ver a expressão no rosto de Neil, juro que
posso senti-lo tenso ao meu lado.
— Trang cou acampado aqui a tarde toda e não os viu. Eles têm que vir para cá em breve.
— Achei que ele seria mais fácil de identi car, com o cabelo ruivo.
— Aparentemente não foi. Savannah mencionou quem tinha Rowan?
— Não. Não deve ser alguém do grupo.
Nós nos agachamos e Neil se inclina para dizer diretamente no meu ouvido:
— Vamos car aqui até eles irem? — Sua respiração está quente na minha pele.
Eu engulo em seco.
— Ok — eu sussurro de volta.
Tão perto de Neil, posso sentir o calor de seu corpo, cheirar o que deve ter sido o sabonete que ele usou
esta manhã, ou talvez seu desodorante. Deve ser a maconha comestível tomando conta do meu cérebro,
distorcendo essa experiência.
Os emissários de Savannah continuam fazendo seu caminho através da exposição, parando de vez em
quando para dar uma olhada em algo mais de perto. Eu tento o meu melhor para manter minha respiração
sob controle, ciente de que a qualquer momento, eles podem encontrar e matar Neil.
E então eu não saberia pelo que estaria jogando.
Sem acesso ao meu telefone, não posso dizer quanto tempo se passou. Dois minutos? Dez? Tenho que
sair daqui, tenho que ver Delilah, mas a questão mais urgente é esta: estamos agachados há muito mais
tempo do que é razoavelmente confortável, e meus músculos não estão felizes comigo.
Eu me estico para frente até ter certeza de que minha boca está bem perto de sua orelha.
—Não sei se consigo manter o equilíbrio — sussurro. Estou tão perto que meu nariz roça – o lado do
rosto dele? A concha de sua orelha? Não tenho certeza.
Ele ca quieto por um momento.
— OK. O mais devagar que puder, que de joelhos — diz ele —, e deslize as pernas para o lado.
— Você poderia, hum...
— Ajudar você?
Eu aceno antes de perceber que ele não pode me ver.
— Por favor — eu sussurro.
Uma mão quente pousa no meu ombro, me rmando e, lentamente, lentamente, manobro para uma
posição mais confortável. Ele é mais forte, mais sólido do que eu esperava que ele fosse. De nitivamente não
era mais um galho em uma camiseta.
— Bom? — ele pergunta uma vez que estou acomodada.
Tento exalar.
— Mm-hmm — eu murmuro. Sua mão deixa meu ombro.
Somos extremamente próximos, e esse fato mais a droga mais o medo de ser pego se combinam para
enviar um tipo único de pânico através de mim.
— Não acho que haja mais ninguém aqui — diz nalmente um dos formandos. — Vamos lá. Savannah
pode ser uma idiota, de qualquer maneira. Eu quero ganhar isso para mim.
Eu espero um pouco mais do que provavelmente o necessário para ter certeza de que eles não apenas se
foram, mas também estão longe o su ciente da exposição para não nos notar quando sairmos. Então co de
pé, ansiosa para esticar as pernas.
— Acho que estamos seguros — digo a ele, e quando não recebo uma resposta, interpreto como um
acordo tácito.
Quando chego lá fora, o céu está azul-escuro e as nuvens estão mais pesadas do que durante todo o dia. É
lindo, realmente, e não posso deixar de olhar para ele por um tempo, esperando meus olhos se reajustarem à
luz. Ah, sim, aí está a doçura de que Henry estava falando.
Então, duas coisas me atingiram como um choque elétrico, uma após a outra.
A sessão de autógrafos de Delilah começou há dez minutos, e Neil não está à vista.
O zoológico está fechando em breve, e estou congelada entre a exibição noturna e o pavilhão principal. Não
quero enviar a ele uma mensagem frenética, então tento soar casual. Ei, você conseguiu sair de boa?
Eu não acho que ele me abandonaria. Ele iria? Talvez ele ainda esteja na exibição – mas e se ele saiu antes
de mim e um daqueles veteranos com o nome dele o matou?
Eu preciso de uma resposta antes de ver Delilah. Eu não posso me obrigar a sair sem falar com ele. Vou
me certi car de que ele está bem, então corro para a livraria e me esgueiro para uma cadeira bem no fundo.
Isto é bom. Isso tudo vai ser–
— Rowan?
Eu me viro para encontrar Mara levantando a mão em um aceno.
— Ei — eu digo, cautelosa, mas ela balança a cabeça.
— Eu não tenho o seu nome.
— Oh. Bom. — Eu meio que embaralho desajeitadamente de um pé para o outro. — Neil e eu ainda
estamos trabalhando juntos. Estou... esperando por ele. — Pelo menos, espero que esteja.
— Ele é Neil agora? — Um canto de sua boca se abre em um meio sorriso.
— É o seu nome.
— Você sempre o chama de McNair, ou McNightmare, ou algo assim.
Oh. Eu acho que sim. Devo ter feito a mudança mental em algum momento, sem nem mesmo pensar
nisso.
— Foi um dia estranho — eu nalmente admito, mas ela está sorrindo abertamente agora. — Onde está
Kirby?
— Morta. — diz Mara, tão monótona como se estivesse me informando que tirou um B no papel. — Eu
não pude salvá-la.
— Você realmente entrou de cabeça nisso.
— Aham, olha quem está falando — ela diz. — Foi muito selvagem. Meg Lazarski a viu no Seattle
Center e, por algum motivo, Kirby achou que ela poderia se esconder na fonte e Meg não iria atrás dela. Ela
estava errada. Então ela cou totalmente encharcada e foi para casa se limpar. Voltaremos a nos encontrar na
próxima zona segura.
Isso abre algo dentro de mim, imaginando as duas tendo um último dia completamente diferente. Mas
eu z minha escolha – vou car com Neil. Se eu puder encontrá-lo.
Entretanto, isso não signi ca que não posso tentar consertar as coisas com as minhas amigas.
— Mara — começo, e porque pedir desculpas é difícil, meus dentes tocam meu lábio inferior antes de
falar novamente. — Você e Kirby estavam certas. Eu fui muito egoísta este ano. Eu quero tornar as coisas
melhores entre nós três. Sinto muito por não ter feito esforço. Eu acho que talvez eu estivesse tão focada na
ideia de nós que eu tinha na minha cabeça que não percebi que realmente precisava, você sabe, tentar. Eu...
tenho sido uma amiga de merda.
Eu penso naquela foto no meu telefone novamente. Não sei quando perdemos isso, mas temos algum
tempo para recuperá-lo. Não tentar é a única coisa que garante que não o faremos.
Mara ca quieta por alguns instantes, mexendo com a sandália em um invólucro de palha no chão.
— Você está sendo dura consigo mesma — ela diz. — Quero dizer, sim, você tem sido um pouco como
uma fantasma este ano, mas todos nós tivemos muita coisa acontecendo.
— Você está me deixando fora do gancho tão facilmente? — Eu digo, e ela sorri.
— Sou muito mais difícil de se livrar do que você pensa. — Ela se inclina e coloca a mão no meu ombro.
— E ainda temos o verão. Temos intervalos na escola. Temos as redes sociais. Não vamos nos transformar de
repente em estranhas. Não posso prometer que caremos tão perto para sempre, mas... podemos tentar.
— Eu quero fazer as pazes com vocês duas. Nós nos falamos mais depois do jogo? Após a formatura?
— Eu adoraria. E quem sabe... talvez Neil possa ir também.
Eu levanto minhas sobrancelhas com isso, não entendendo totalmente. Não tenho certeza se Neil e eu
vamos sair depois de hoje, mas Mara está sendo otimista de costume: presumindo que porque Neil e eu nos
unimos hoje à noite, somos amigos magicamente agora.
— Se eu tenho alguma esperança de me encontrar com vocês depois, tenho que correr — diz ela.
— Boa sorte — digo a ela, e ela sai correndo em direção à saída do zoológico.
AP Literatura Grupo de mensagem
(Primeiro ano)
Terça-feira, 15 de janeiro, 20h36

Brady Becker

INCRÍVEL tem as duas pessoas mais inteligentes no meu


grupo

então estamos recebendo um A ou A +?

Lily Gulati

Brady, você pode realmente ter que *suspiro* se esforçar


para obter um A.

então, eu já tenho um monte de ideias de projetos

eu amo a sr. grable

Neil McNair

Claro, se você não se importa em ler livros que nem


mesmo estarão no exame AP.

Brady Becker

@lily você está matando minha felicidade!!!


você não tem que ser um idiota só porque não estamos
lendo seu bro mark twain

Neil McNair

Ele não é meu bro. E todas as outras turmas de inglês do


segundo ano estão lendo Huck Finn este ano. Perdoe-me
se eu estava ansioso por isso.

Brady Becker mudou a foto de perfil.


Brady Becker gostou disso.

não consigo me imaginar ansiando um racismo óbvio e


misoginia, mas você sim.

Lily Gulati

então ... todas as conversas vão ser assim?

Neil McNair

Não.

sim

Neil McNair saiu do grupo.


20h28

ELE AINDA NÃO atende o telefone. Delilah Park provavelmente está fazendo uma sala cheia de
românticos rir e rir, e Neil McNair não está atendendo ao telefone.
Meu grupo de bate-papo começa a acender novamente e, embora eu saiba que temos trabalho a fazer,
estou aliviada por estarmos bem.

KIRBY

olá do outro ladoooooo

MARA

Kirby. PORQUE.

KIRBY

Mas Neil está em silêncio. Estou prestes a perder a coragem completamente quando ele sai de um
pequeno prédio de tijolos do outro lado da praça.
— Onde diabos você estava? — Eu pergunto, ciente de que pareço um pai furioso porque o lho voltou
para casa depois do toque de recolher.
Ao nosso redor, pais carregam seus lhos em direção à saída do zoológico.
Ele me lança um olhar estranho.
— Eu estava no banheiro. Sussurrei para você na exposição. Eu disse que você deveria ir para o seu lugar e
me mandar uma mensagem quando terminar.
— Eu não ouvi. Eu estava... preocupada — eu digo, afetada, porque parece tão ridículo. — Temos que
car juntos. Eu pensei que você... — Eu paro, de repente envergonhada pela minha reação.
— Tinha abandonado você? — ele pergunta, mas ele não diz isso de forma mesquinha.
— Bem... sim — eu admito. — Ou que você foi morto.
— Eu não te abandonaria. Eu juro — Ele limpa a garganta e olha para o relógio. — Merda, são quase
oito e meia.
— Sim. Eu sei. — A raiva que esqueci em meu pânico de que ele se foi volta à superfície. Imagino pilhas
e mais pilhas de Scandal at Sunset, todas esperando para serem autografadas. Aposto que ninguém lá se
sente culpado por comprá-los. Aposto que eles não viram as capas para se certi car de que ninguém mais
pode vê-los quando saem da loja.
— Você pode chegar tarde? — Seus olhos estão grandes por trás dos óculos. Esperançoso.
Neste ponto, é tarde demais para tarde.
— Não, obrigada. Não preciso chamar mais atenção para mim. — Mesmo enquanto digo isso, há uma
pequena parte de mim que relaxa com a ideia de perder a sessão de autógrafos. Sem ansiedade para descobrir
onde sentar ou o que dizer a ela. O oposto do meu medo de perder oportunidades. Não estou totalmente
feliz com essa pequena parte de mim, mas ainda sim – é isso — Eu não deveria ter comido aquela maconha
comestível. Perdi completamente a noção do tempo na exposição. — Deve ser isso que está mexendo com
meu cérebro também.
— Bem, seria ótimo se você me dissesse o que é, para que eu possa pelo menos tentar uma sugestão útil.
— É uma sessão de autógrafos — digo com um suspiro, tentando fazer aquela pequena parte relaxada
ainda menor. É mais fácil car chateada com ele, então eu me concentro nisso. — Minha autora favorita,
Delilah Park, está – estava – fazendo uma sessão de autógrafos, e graças a Henry, 'isso vai te deixar mais
tranquilo', Quinlan e seu desaparecimento supremamente oportuno, está praticamente no m.
Ele não diz o óbvio: que eu não tinha que esperar por ele.
— Você não queria me falar sobre uma sessão de autógrafos? — Ele pergunta, acendendo ainda mais
minha frustração. Ele diz como se fosse tão simples. — Não falamos sobre romances antes? Você não viu
um na minha estante? Eu não sei por que você sentiu que tinha que manter isso em segredo.
— Porque estou escrevendo um livro, ok? — Apenas desliza para fora e, após um momento de choque,
percebo que gosto do jeito que soa alto. Admitir isso envia uma injeção de adrenalina por mim. — Um
romance. Estou escrevendo um romance. Não estou pronta para mostrá-lo a ninguém ainda, e
provavelmente é terrível de qualquer maneira – quero dizer, algumas partes são boas? Eu acho? E não contei
a ninguém porque você sabe como as pessoas tratam os romances, e só pensei, esse evento, vê-la, estar perto
de outras pessoas que amam esses livros... Achei que sentiria que pertenceria a esse lugar.
Não tenho certeza de por que meu cérebro escolhe o momento em que me declaro um escritor para
provar que sou completamente inarticulada. Eu me preparo para as provocações, mas elas não vêm.
— Isso é... extremamente legal — diz ele.
Eu não esperava que o alívio me sentisse assim: meus ombros relaxando, uma longa expiração. Presumi
que ele não entenderia o peso de um segredo guardado por tantos anos – exceto que talvez ele possa.
— Você realmente pensa isso?
Ele concorda.
— De você escrevendo um livro? Sim, absolutamente. Acho que nunca escrevi algo com mais do que dez
páginas.
— Eu quero… — Eu paro, me recomponho. Não há como voltar agora. — Eu quero ser uma escritora. E
não no sentido de que estou escrevendo e que, por de nição, me torna um escritor – é o que quero fazer da
minha vida. E parece... muito solitário às vezes. Não a escrita propriamente dita – é claro que é
principalmente solitário. Mas sinto que não posso contar a ninguém, quase me faz pensar que não existe
realmente. Esta sessão de autógrafos foi como uma validação disso.
— Eu li seus jornais — ele diz. — Nada disso era cção, é claro, mas você é uma boa escritora.
— Claro que não te impediu de criticar minha gramática e pontuação — eu digo, mas quero saborear o
elogio. Quero abraçar o que amo o tempo todo, não apenas com Neil no último dia de aula, quando as
apostas são praticamente inexistentes. Quero não ter medo disso, mesmo quando as pessoas o julgam. —
Acho que, na minha cabeça, minha escrita pode ser tão boa quanto eu quero. Mas assim que eu declarar
que sou escritora, terei algo a provar. É difícil admitir que você se acha bom em algo criativo. E então é
muito pior para as mulheres. Dizem que devemos ignorar os elogios, zombar quando alguém nos diz que
somos boas em alguma coisa. Nós nos encolhemos, nos convencemos de que o que estamos criando não
importa realmente.
— Mas você não pode acreditar nisso. Isso sim que não importa.
— É tão válido quanto se tornar um lexicógrafo — eu digo, sem sarcasmo em minha voz.
— Talvez seja todo o conceito de prazer secreto — Neil diz gentilmente. — Por que deveríamos nos
sentir culpados por algo que nos traz... prazer?
Ele gagueja um pouco antes de pronunciar essa palavra, as pontas das orelhas cando rosadas.
Eu aponto para ele.
— Sim! Exatamente. E geralmente são coisas que as mulheres e adolescentes ou crianças gostam.
— Não tudo.
Eu levanto uma sobrancelha.
— Boy bands, fan ction, novelas, reality shows, a maioria dos programas e lmes com personagens
femininos... Ainda somos tão raramente na frente e no centro, ainda mais raros quando você considera a
raça e a sexualidade, e então quando obtemos algo que é justo para nós, sentimo-nos mal por gostar disso.
Não podemos vencer.
Sua expressão ca envergonhada.
— Eu... nunca pensei sobre isso dessa maneira. — Neil McNair admitindo que estou certa: outro
momento surreal.
Ainda assim, seu acordo não parece tão válido quanto deveria. Se tivéssemos conversado sobre este, dois,
três anos atrás... poderíamos ter tido uma revolução do romance de Westview.
Neil pega o seu telefone.
— Veja isso. — Ele acessou o Twitter de Delilah. Seu tweet mais recente é de alguns minutos atrás.

Delilah Park @delilahshouldbewriting


Evento INCRÍVEL esta noite na Books & More! Obrigado a todos que compareceram.
Posso ler algumas páginas do meu próximo livro em um microfone aberto. Bernadette's é
boa?

— Você sabe do que ela está falando?


— Oh. É algo que ela faz às vezes. Ela sempre fala sobre a importância de ler a escrita em voz alta para
realmente acertar o ritmo, e ela gosta de fazer isso com o público.
— Então, por que não vamos para isso?
Eu sei que ele está tentando ser útil, e eu aprecio isso, eu realmente agradeço, mas...
— Não é a mesma coisa — eu digo, sentindo-me murchar. A questão toda era estar perto de pessoas que
amam o que eu amo. — E não devemos perder mais tempo. Vamos seguir em frente.
Ele desliza o telefone de volta no bolso.
— Se é o que você quer.
Eu forço para que seja. Fazemos um plano para voltar para o meu carro e dirigir até a Gas Works para ver
a pista. Quando chegamos ao ponto de ônibus na Phinney Avenue, esperando por um atalho, os números
na placa digital nos informam que o 5 não virá nos próximos vinte minutos. Embora o céu pareça
ameaçador, decidimos caminhar. É tudo em declive a partir daqui. Literalmente.
— É estranho ninguém vir atrás de mim — eu digo, minhas mãos en adas nos bolsos para me proteger
contra o frio, tentando o meu melhor para banir Delilah da minha mente. — Quer dizer, não sabemos
quantos deles se uniram. Mas parece que todo mundo está indo por você, não por mim.
Neil se endireita.
— Bem, eu sou o orador da turma.
Ignorando-o, digo:
— Isso está me deixando inquieta, não saber quem poderia ser.
— Vamos continuar a ser cuidadosos — diz ele. — Mais três pistas. Nós podemos fazer isso.
A primeira gota de chuva atinge minha bochecha quando estamos a alguns quarteirões do zoológico.
— Ok, então o que está escrito em sua camisa? — Eu pergunto. — Isso tem me incomodado o dia todo.
Ele sorri.
— Signi ca 'qualquer coisa soa profunda em latim'. A tradução literal é 'tudo o que é dito em latim
parece profundo'. Mas isso soa como a linguagem do Yoda.
— Quem?
Ele cambaleia para trás, segurando o coração.
— O que você disse? Talvez eu tenha que retirar esse apelido.
— Não… — Eu começo a protestar antes de me conter.
Isso o faz sorrir.
— Você gosta — diz ele. Há um brilho em seus olhos, como se ele entendesse algo que eu não entendo.
— Você gosta desse apelido.
E... eu meio que gosto. Faz um tempo que não é irritante. É uma linguagem que só nós temos, mesmo
que seja uma referência que não entendo.
— É original. E é melhor que Ro-Ro, como meu pai me chama.
O sorriso se aprofunda.
— Ok, Artoo. Yoda — ele continua, como se me informando como um sanduíche de pasta de
amendoim e geleia é feito — é um mestre Jedi de uma espécie desconhecida que treina Luke para usar a
Força.
— O carinha verde?
Ele geme, esfregando os olhos por trás dos óculos.
— O carinha verde — ele con rma, resignado.
A rua em que estamos é quase toda residencial, com casas pintadas em tons pastéis com placas políticas
progressistas nos jardins da frente. A garoa se transforma em uma chuva constante, fazendo-me sentir falta
do meu cardigã.
— Então... se vamos continuar, há algo que preciso lhe dizer — diz Neil.
— Ok... — eu digo, hesitante.
— Você se lembra de quando comparamos as aceitações na faculdade? — Eu aceno, e ele continua. —
Apliquei a decisão inicial ao programa de linguística da NYU. Eu teria que arcar com as taxas de inscrição se
não conseguisse entrar, e então prendi a respiração, sabendo que estaria contando com empréstimos, ajuda
nanceira ou ambos. Eu meio que deixei você acreditar que tive sorte, e tive, mas... — Ele ca
envergonhado. — Eu realmente não falo sobre isso com meus amigos, mas co... envergonhado às vezes.
Sobre dinheiro. E não ter muito. — Ele dá uma olhada no meu rosto. — E é exatamente por isso que eu não
faço. Porque sempre consegue essa reação, essa simpatia. Não quero que sinta pena de mim, Artoo.
— Eu–eu não — digo rapidamente, embora ele esteja 100% certo. Tento fazer meu rosto parecer menos
simpático. — Eu simplesmente não sabia.
— Eu faço um bom trabalho disfarçando. Os ternos ajudam. Eu vasculhei a Goodwill até encontrar o
que queria. Aprendi a costurá-los sozinho com a velha máquina de costura da minha mãe, embora nunca
tenha feito um trabalho perfeito. Trabalhei horas extras para economizar para competições regionais de
quiz. É tudo uma questão de projetar uma imagem. Sinto que passei todo o ensino médio mantendo essa
imagem porque não quero a pena das pessoas. E quando eu sair daqui, só quero começar de novo. Não
quero ser Neil McNair, orador da turma, ou Neil McNair, cujo pai está na prisão, ou Neil McNair, o cara
que nunca tem dinheiro su ciente. Eu quero ver quem eu sou sem tudo isso ligado a mim.
Eu afundo meu pé em uma poça que espirra água lamacenta nas minhas meias até os joelhos.
— Eu quero que você tenha tudo isso — eu digo, sendo sincera. — Embora, se você não quiser minha
simpatia, não tenho certeza do que mais dizer. — Agora é a minha vez de car envergonhada.
— Apenas... seja normal. Não mude a forma como você age porque você sabe disso sobre mim. Não
desista de mim. — A chuva encharca seu cabelo, pingando em seus óculos. — Espero que você, entre todas
as pessoas, não me tratasse de maneira diferente.
— OK. Eu não vou. Eu ainda acho você bastante insuportável. — Embora eu esteja presa em outra coisa,
ele disse: Não desista de mim. Depois de hoje, quando terei a chance de não fazer isso?
Por mais divertido que seja, por mais que tenha gostado de nossas conversas, não posso me permitir
esquecer que isso – nossa rivalidade, nossa parceria, até mesmo potencialmente nossa amizade nascente –
termina depois desta noite. Existe uma palavra para o que acontece depois que seu inimigo jurado deixa
você entrar em seu quarto e lhe conta seus segredos?
— Bom. Eu odiaria perturbar o equilíbrio do universo.
Eu quero revirar os olhos com isso, mas apesar das frustrações de última hora, meu rosto decide puxar
minha boca em um sorriso.
E... eu deixo.

Quando chegamos ao carro, estamos encharcados e tremendo. Eu me atiro para dentro. Neil é muito mais
meticuloso do que eu, enxugando os óculos e o mostrador do relógio com alguns toques delicados na
almofada do assento.
Quando ele se senta ao meu lado, seu cabelo está molhado com água, sua camiseta colada em sua pele. Se
eu pensei que sua camiseta era reveladora, sua camiseta molhada é completamente indecente.
Tateio embaixo do assento em busca do meu cardigã antes de me lembrar onde ele está.
— Eu deixei meu suéter na loja de discos. — Meus dentes estão batendo.
Ele remove um moletom cinza seco de sua mochila.
— Aqui — diz ele, estendendo-o para mim. — Pegue isso.
— Tem certeza? Estamos ambos muito encharcados.
— Sim, mas você está vestindo menos. — Seu rosto se contorce, sobrancelhas se juntando para formar
uma expressão de dor. — Espero que não tenha soado nojento. Quero dizer, você não está usando nada por
baixo do vestido, exceto, uh, você sabe. Tipo, você não tem calças ou meia-calças, ou leggings por baixo. Para
ser honesto, nunca entendi a diferença entre meia-calça e leggings. Estou piorando as coisas, não estou?
Você está vestindo uma quantidade de roupa completamente normal. Você vai mesmo me deixar continuar
falando?
— Sim. — Neil perturbado nunca deixa de ser engraçado. — Eu sei o que você queria dizer. Obrigada.
— Fecho o zíper do casaco com capuz sobre o vestido respingado de chuva e café. Então eu aumento o calor
e amarro a braçadeira na manga de seu capuz. — As leggings não têm pés e geralmente são muito mais
grossas do que as meias-calças.
Não é até que eu me inclino para trás no banco, esperando meu carro esquentar, que o cheiro de seu
moletom me atinge. Tem um cheiro bom, e me pergunto se é detergente ou apenas o cheiro natural de Neil,
um no qual nunca prestei atenção antes. Acho que nunca estive perto o su ciente para notar. Estou
surpresa com o quanto eu não odeio isso, tanto que me deixa tonta por uma fração de segundo.
Também pode ser o biscoito de maconha deformando meu cérebro novamente.
Ele empurra as mãos em direção às aberturas.
— Vai esquentar em breve — eu digo. Tenho medo da besta mitológica que vou ver no espelho, mas dou
uma espiada mesmo assim. Meu delineador praticamente desbotou e o rímel migrou para baixo em minhas
bochechas. Eu o limpo, em seguida, puxo o elástico do meu cabelo e abro a porta do carro para que eu possa
torcer a água o melhor que posso. Com os grampos extras em meus porta-copos, eu o prendo de volta.
Minha franja, entretanto...
— Você está sempre bagunçando seu cabelo.
Eu retiro a mão da minha franja como se tivesse sido pega fazendo algo que não deveria. É estranho
quando outra pessoa percebe seus hábitos nervosos.
— Minha franja estúpida — digo com um suspiro. — Nunca consigo decidir o que fazer com ela.
Ele me estuda por um longo momento, como se eu fosse uma frase que ele está tentando traduzir para
outro idioma.
— Gosto dela do jeito que é — ele diz nalmente, o que não ajuda muito e, de alguma forma, me deixa
mais constrangida.
Juro cortá-la antes da formatura. Não estou aceitando conselhos sobre cabelos de Neil McNair.
Eu ligo meu telefone e coloco The Smiths. De volta à música dos dias chuvosos.
Neil geme.
— Sério, você não tem nenhuma música alegre?
— The Smiths é alegre.
— Não, isso é melancolico e deprimente. Como se chama essa música?
— Eu não quero dizer.
Ele pega meu telefone. Tento pegá-lo de volta, mas ele é mais rápido do que eu.
— ‘Heaven Knows I’m Miserable Now’.
— É uma boa música!
Ele percorre meu telefone enquanto esperamos o carro esquentar. Estou tomada pela sensação de coceira
de alguém mexendo no meu telefone. Ele seleciona uma música do Depeche Mode e coloca o telefone de
volta no porta-copo. Meus ombros relaxam.
— Gas Works? — Eu digo, e Neil solta um longo suspiro de sofrimento.
— Não é a melhor vista, mas tudo bem. E temos que descobrir essa pista de Cooper ou estaremos
ferrados. Vou fazer mais investigações online, ver se Sean, Adrian ou Cyrus têm alguma ideia.
Com Neil ao telefone, dirigimos em relativo silêncio por alguns minutos, exceto por Dave Gahan
cantando sobre não ser capaz de obter o su ciente. Quando viro à esquerda, algo no banco de trás bate no
chão.
Neil se vira para olhar.
— Você sempre carrega tantos livros com você?
— Ai merda — eu digo, batendo no volante. — Era para eu devolver isso hoje! — Esqueci
completamente esta manhã com a queda de energia. — Você acha que há alguma chance de a escola ainda
estar aberta?
— Sim, dado que são quase nove horas – não, Artoo. Está de nitivamente fechada.
— Quanto você acha que seria a multa?
— Por livro? Você tem, o quê, cinco lá atrás, então… alta. — Ele estala a língua. — Ouvi dizer que eles
não deixam você caminhar para pegar seu diploma se tiver livros atrasados. Pode ser uma lenda urbana, no
entanto. Eu não ouvi isso acontecendo com ninguém. Ei, você pode ser a primeira! — Ele olha para os livros
novamente e de volta para mim. — Bem, acho que só há uma coisa a fazer.
Eu pisco para ele, esperando por alguma solução mágica.
— Temos que invadir.
Eu bufo e dou risada.
— Certo. O orador e a segunda melhor invadindo a biblioteca da escola. Sem mencionar que não
podemos continuar tomando desvios como este.
— Estamos solidamente na liderança — diz ele, e ele está certo. — Que outra opção existe se você não
quer uma multa? E se você quiser pegar seu diploma no domingo?
Eu mordo o interior da minha bochecha. Droga, ele está certo. Não quero correr o risco de não pegar.
Quer dizer, eu de nitivamente não acredito nele, mas só para garantir.
— Estaremos seguros lá — ele continua. — E seremos rápidos. Entrar e sair.
Eu paro em um cruzamento antes de fazer a curva que nos levará de volta à escola.
— Então eu acho que estamos fazendo isso. Estamos invadindo a biblioteca.
Conversa de texto entre Rowan Roth e Neil McNair
Abril primeiro ano

McNIGHTMARE

O Sr. Kepler acidentalmente sugeriu um teste surpresa no


terceiro período de hoje.

Eu sei que você está com ele no 4º período, então eu


queria que você soubesse.

Portanto, estamos em pé de igualdade e tudo mais.

isso foi... estranhamente bom?

você está quebrado?


20h51

— PETRICHOR — NEIL DIZ enquanto nos esgueiramos em direção à biblioteca. Estacionamos a alguns
quarteirões da escola para ter certeza de que ninguém reconheceria meu carro. Estamos em um bairro
residencial, metade das casas já estão fechadas durante a noite. Um homem puxa seu cachorro para longe de
uma leira de ores, enquanto, do outro lado da rua, um trio de garotas em vestidos extravagantes se
amontoa em um Lyft.
— O quê? — Pergunto, carregando os livros em uma sacola de lona do supermercado.
— O cheiro da terra depois da chuva — diz ele. — É uma palavra ótima, não é?
Eu puxo seu moletom mais perto. Não estamos mais ensopados, apenas um pouco úmidos. Agora que
estamos do lado de fora de novo, estou convencida de que o cheiro de seu moletom deve ser a chuva. Ainda
não estou pensando nisso, mas se estivesse, é só... petrichor.
— Então você sabe o plano? — ele diz enquanto descemos a calçada.
Discutimos isso no carro, depois de pesquisar no Google “como arrombar uma biblioteca” porque não
somos nada além de engenhosos.
— Sim. — Eu seguro a mochila cheia de livros. — Encontramos uma janela e veri camos se está
destrancada. Então entramos e deixamos os livros.
— E então vamos dar o fora — diz Neil.
— Tem certeza de que não há sistema de segurança?
— Não para a biblioteca.
Nós combinamos os passos um do outro, e tento o meu melhor para ignorar o cheiro de seu moletom.
— Eu posso adicionar isso à lista de minhas memórias sentimentais de Westview tarde da noite — eu
digo. — Logo depois de car com Luke Barrows pela primeira vez em seu carro, estacionado bem perto...
ali. — Eu aponto para o outro lado da rua.
Ele está arfando.
— Rowan Roth, pensei que você fosse uma boa menina.
Isso me faz parar no meio do caminho.
— Eu sou — digo, extremamente ciente da batida do meu coração — mas ... isso não signi ca que sou
virgem.
— Oh, eu não quis dizer–
— Porque você presumiu que boas garotas – garotas como eu, que tira nota máxima – não fazem sexo?
— Minha voz está um pouco dura, mas não consigo evitar. Ele caiu em algo que me sinto particularmente
fraca. Não sei o que está mais bagunçando minha cabeça, me perguntando o que Neil quis dizer ou que
agora estamos o cialmente falando sobre sexo. — Você percebe o quão errado e desatualizado isso é, certo?
Boas meninas não devem fazer sexo, mas se não o zerem, serão puritanas e, se o zerem, serão vagabundas.
E, claro, nada disso leva em consideração o espectro de gênero ou sexualidade. As coisas estão começando a
mudar lentamente, mas o fato é que ainda é completamente diferente para os caras.
Neil engasga com o que eu presumo ser sua língua, seus olhos arregalados indicando que ele não tinha
ideia de que era para onde a conversa estava indo.
— Eu não saberia — diz ele, claramente fazendo todos os esforços para não encontrar o meu olhar —, já
que nunca... você sabe.
Oh meu Deus, ele nem consegue dizer a palavra.
— Fez sexo? — Eu digo, e ele acena com a cabeça.
— Já z outras coisas — acrescenta ele rapidamente. — Eu z... tudo mais, quase. Tudo exceto… — Ele
acena com a mão.
Outras coisas. Minha mente ca um pouco selvagem com isso, me perguntando se outras coisas signi cam
o mesmo para ele e para mim. E aqui está minha resposta para a pergunta que z antes: Neil é virgem.
— Sexo.
— Sim.
— Não é um palavrão — eu digo.
— Eu sei que não.
Começamos a andar novamente. Alguns anos atrás, eu teria cado totalmente envergonhada com essa
conversa. Embora minhas amigas e eu tenhamos tido esse tipo de discussão – Kirby não perderá a
oportunidade de criticar o patriarcado –, nunca conversei assim com um cara. Nem Luke, nem Spencer. Os
romances deveriam ter me deixado com menos medo. Eu li as palavras tantas vezes. Eu deveria ser capaz de
dizê-las em voz alta, mas não foi fácil quando eu nem consigo admitir que amo esses livros em primeiro
lugar. E aqui estou eu, nalmente dizendo o que quero, e é com Neil de todas as pessoas.
— Você...? — ele diz, deixando-me preencher o espaço em branco.
— Sim, com Spencer. E Luke — eu digo, e eu aprecio que ele não tenha uma reação dramática a isso. —
Não sei por que deveria ser constrangedor quando tantos de nós pensamos nisso com tanta frequência. E,
no entanto, é especialmente tabu para as meninas falarem sobre isso. — Esse é outro motivo pelo qual adoro
romances: a maneira como eles tentam normalizar essas conversas. Não estou dizendo que o mundo seria
melhor se mais pessoas lessem romances, mas... bem, sim. Eu estou. — A masturbação é o pior padrão
duplo.
O céu está quase preto, mas um poste de luz acende seu rosto extremamente vermelho.
— Estou... familiarizado com o assunto.
Eu bufo.
— Eu tenho certeza que você está. É apenas assumido que os caras fazem isso, tanto que os caras podem
até brincar sobre isso. Mas, para as meninas, às vezes ainda parece essa coisa suja da qual não devemos falar,
embora seja perfeitamente saudável e muitas de nós o façamos.
— Então você…
— Quero dizer, não vou te dar uma explicação detalhada.
Ele tosse de novo, e começa a ter um ataque de as xia. É isso. Eu matei Neil McNair.
Ele levanta a mão como se quisesse me garantir que está bem.
— Aprendi muito esta noite.
Chegamos ao estacionamento dos idosos na beira da biblioteca. Agradeço por voltar a me concentrar no
motivo de estarmos aqui, porque, na verdade, a conversa estava me deixando um pouco febril. E meu
cérebro não para com as outras coisas em espiral, convocando uma variedade de imagens úteis para
preencher as muitas, muitas opções.
Mais provavelmente, porém, estou ansiosa com a invasão. Isso explicaria o aumento da minha frequência
cardíaca.
— Vou veri car essas janelas — diz McNair, correndo vários metros de distância, e uma vez que ele sai da
minha bolha geral, solto um suspiro longo e trêmulo e reorganizo minha franja.
Primeiro tento a porta dos fundos da biblioteca. Ela não se move.
— A porta dos fundos está trancada — eu chamo Neil. Eu empurro uma janela. — Caramba. Se alguém
nos vir aqui, você acha que eles tirariam nossos títulos? Quer dizer... estamos arrombando e entrando para
devolver livros. Eles não chamariam a polícia, certo? Desde que estudamos? Ou estudávamos aqui? Todos
esses estão presos. Deve haver algo que você pode fazer com um cartão de crédito, certo?
Pego um cartão de minha mochila e localizo um wikiHow muito útil.
— Diz para en ar o cartão no espaço entre a porta e a moldura e– Neil?
Eu me viro para Neil, que de repente está lutando para abafar uma risada. Ele falha fantasticamente, a
risada estourando.
— O quê? O que é tão engraçado?
Ele balança a cabeça, dobrando-se enquanto agarra o estômago. Tenho a sensação de que ele está rindo
de mim.
— Neil McNair. Eu exijo que você se explique.
Ele levanta um dedo e en a a mão no bolso, revelando um chaveiro.
— Eu... eu trabalho aqui — ele consegue dizer em meio a uma risada. — Ou– trabalhei aqui. Eu
provavelmente deveria entregar isso enquanto estamos aqui.
— Sério? Esse tempo todo? — Eu as alcanço, mas ele as segura fora do meu alcance. — Por que você não
me disse que ainda tinha a chave? — Mas estou rindo também. Um pouco.
— Eu queria ver se você realmente tentaria fazer isso. Eu não achei que fosse tão longe. Achei que você
desistiria mais cedo.
— Você é o pior — eu digo, empurrando seu ombro.
Ainda gargalhando de tanto rir, ele gira a chave na fechadura e então entramos.

Usamos a luz de nossos telefones para nos guiar até a mesa da bibliotecária.
— É meio estranho aqui — eu digo.
Ele deve sentir que estou nervosa, porque diz em voz baixa:
— Somos apenas nós, Artoo.
— Sabe, eu nunca vi Star Wars.
— Você não viu os originais — ele corrige, mas eu balanço minha cabeça. — Espera. O quê. — Ele
ilumina meu rosto com a luz do telefone, fazendo-me apertar os olhos.
— Eu disse que não sabia quem era Yoda!
— Yoda mal está nas novas. Achei que você tivesse pelo menos visto um desses!
— Eu acho que vi alguns minutos de um em uma festa? Tudo que me lembro é de um cara muito mal-
humorado, todo de preto.
— Você acha? Você saberia, Rowan. Você saberia — ele diz. — Nós temos que assisti-los.
Agora eu ligo a luz do meu telefone para ele. E eu co olhando.
— Nós temos que assisti-los.
Ele cora, usando a mão para proteger o rosto da luz do meu telefone.
— Você tem que assisti-los. Não comigo. Por que faríamos isso?
— Eu não tenho ideia — eu digo, levantando meus ombros e então dou um encolher de ombros
exagerado. — Foi você quem sugeriu. E agora você está corando.
— Porque você está me interrogando! — Ele tira os óculos para esfregar os olhos. — Foi um ato falho. E
eu odeio isso também, quase tanto quanto as sardas. Sempre revela como estou me sentindo. Nunca fui
capaz de falar com uma garota bonita sem me transformar na porra de um tomate.
— Eu entraria nessa categoria?
Seu rubor profundo diz tudo. Huh. Neil McNair acha que sou uma garota bonita.
— Você sabe que não é sem atrativos. — diz ele após alguns segundos de silêncio. — Você não precisa de
mim para validar isso.
É verdade que não, mas isso não signi ca que não seja bom ouvir. Devo realmente estar faminta por
elogios, se “não sem atrativos” me faz sentir tão bem comigo mesmo, se o calor em meu peito é uma
indicação.
— Devo apenas deixá-los aqui? — Pergunto, tirando os livros da minha mochila. — Ou devo escrever
uma nota, ou algo assim?
— Por mais que eu adorasse escrever em caligra a ‘Livros atrasados da biblioteca de Rowan Roth’, você
provavelmente deveria simplesmente colocá-los na caixa.
Um por um, eu alimento cada livro para o retorno. Eles pousam com baques cada vez mais altos.
Estive em Westview depois do horário muitas vezes. Eu conheço essa escola muito bem: melhores locais
de armários, quais máquinas de venda automática estão sempre fora de serviço, caminho mais rápido para a
academia para as montagens. Mas esta noite... é realmente assustador. Não parece minha escola.
Eu acho que não é mais.
Devíamos ir, tento dizer, porque quero tanto ganhar aquele dinheiro para ele, mas, em vez disso, me
encontro indo em direção às pilhas. Neil me segue. A biblioteca pode ser assustadora, mas também é
pací ca.
— Eu realmente vou sentir falta de tudo isso — digo, correndo meus dedos ao longo das colunas.
— Eu acho que eles têm bibliotecas em Boston. Grandes.
Eu cutuco seu ombro.
— Você sabe o que eu quero dizer. Esta pode realmente ser a nossa última vez aqui.
— Isso não é uma coisa boa?
Eu me inclino contra a pilha de livros em frente a ele.
— Não tenho certeza. — Pego minha mochila e pego o guia do sucesso. Já compartilhamos muito hoje.
Depois de chorar no ombro do seu inimigo, que limites sobraram? — Eu estava tão concentrada em ter essa
experiência de ensino médio perfeita, e não posso deixar de me sentir desapontada porque a realidade não é
o que pensei que seria. Você vai tirar sarro de mim, mas... aqui está o guia de sucesso.
Ele aceita a folha de papel amassada e a examina, com um canto da boca inclinado para cima. Eu me
pergunto do que ele está sorrindo: descobrindo minha franja ou beijando alguém embaixo da arquibancada.
— Acho que pensei que seria essa pessoa muito especí ca agora — continuo. — E eu simplesmente –
não sou.
Quando chega ao nal, ele toca o número dez dessa maneira prática.
— ‘Destrua Neil McNair’ — ele lê. — Não posso dizer que destruir você não estaria no meu próprio
guia de sucesso hipotético.
— Obviamente, eu falhei. Em tudo.
Ele ainda está olhando para ele e está me matando não saber o que está acontecendo em sua cabeça.
— Você queria ser professora de inglês? ‘Moldar mentes jovens’?
— O quê, você não acha que eu seria um boa moldadora de mentes?
— Eu realmente acho que você seria. Se você pudesse superar sua aversão pelos clássicos. — Ele devolve
para mim, e estou tão aliviada quanto desapontada por ele não ter falado nada sobre o namorado perfeito,
apenas porque estou curiosa para saber o que ele teria dito. — Não é uma lista ruim. Não sei se é realista,
mas... você ainda quer alguma dessas coisas?
O pensamento passou pela minha cabeça algumas vezes hoje – antes de eu rejeitá-lo totalmente.
— Alguns deles ainda é possível alcançar, sim. Não é algo em que penso com frequência, mas adoraria
ser uente em espanhol — digo. — Minha mãe é, e toda a família dela é, e eu sempre desejei ter aprendido
quando era mais jovem.
— Não é tarde demais, você sabe.
Eu gemo com o conhecimento de que ele está certo.
— E houve uma razão para você parar de estudar espanhol. — Quando dou de ombros, ele diz: —
Porque seus interesses mudaram. Outras coisas se tornaram mais importantes por um tempo. É a mesma
razão pela qual você não quer mais ser professora. Você não pode se amarrar a esta lista que fez quando
tinha quatorze anos. Quem ainda quer as mesmas coisas que faziam aos quatorze anos?
— Algumas pessoas querem.
— Claro — ele diz. — Mas muitos não. As pessoas mudam, Rowan. Graças a Deus eles mudam. Nós
dois sabemos que eu era um merdinha arrogante aos quatorze anos, embora isso não tenha impedido você
de se apaixonar por mim.
— Doze. Dias.
Ele sorri – engraçado, ele ainda acha que a arrogância é coisa do passado.
— Talvez essa versão sua fosse legal — diz ele, batendo no papel novamente. — Mas... você está ótima
agora também.
Ótima.
O elogio deixa meu coração selvagem. Eu deslizo para baixo na estante de livros, estabelecendo-me no
tapete, e ele me imita, então estamos um de frente para o outro.
— Eu só queria que não tivesse que acabar agora — eu digo, embora parte de mim adoraria que ele
falasse sobre todas as maneiras especí cas em que eu sou ótima. — Eu gostaria de ter mais tempo.
Só quando digo em voz alta é que percebo que é verdade. Tempo . É isso que tenho perseguido o dia
todo, essa noção de que depois desta noite, após a formatura, nenhum de nós estará na mesma cidade
novamente. As coisas que importaram para nós nos últimos quatro anos mudarão e evoluirão, e imagino
que elas continuarão fazendo isso para sempre. É assustador.
— Artoo. Talvez você não tenha feito tudo nesta lista, mas você fez muito. Você foi presidente de três
clubes, editora do anuário, copresidente do conselho estudantil... — O sorriso malicioso volta quando ele
acrescenta: —... a segunda melhor da turma.
Mas isso não me incomoda mais. Puxo minhas meias até os joelhos, que estão úmidas e enlameadas.
Howl causou estragos na minha roupa perfeita do último dia.
— É estranho, não é? — Eu digo. — Pensar em nosso grupo especí co de veteranos, todos espalhados no
próximo ano? A maioria de nós só estará em casa nos recessos, e cada vez menos depois disso. Não nos
veremos todos os dias. Tipo, se eu te vir na rua...
— Na rua? O que exatamente estou fazendo 'na rua'? Estou bem?
— Você provavelmente está vendendo sua coleção autografada de livros de Riley Rodriguez por dinheiro
para pizza.
— Uma coleção inteira autografada? Parece que estou ótimo, então.
Eu me estico pelo corredor para golpear seu braço com a manga do meu capuz, que é, bem, a manga do
capuz dele.
— Tudo bem, se eu esbarrar com você, como vamos agir? O que somos um para o outro quando não
estamos lutando para ser o melhor?
— Eu acho que seria mais ou menos como estamos hoje à noite — ele diz suavemente. Ele bate nas
minhas sapatilhas com o tênis e, enquanto meu cérebro diz ao meu pé para se afastar do dele, por algum
motivo, a mensagem não chega lá e meu sapato ca parado. — Mais ou menos como... amigos.
Amigos. Competi com Neil McNair desde que o conheço. Passei muito tempo imaginando como vencê-
lo, mas nunca o considerei um amigo.
A verdade é que estou me divertindo mais com ele do que há algum tempo. Aqui está ele, esta fonte
secreta de conversas profundas, aventuras e diversão. Eu tinha certeza de que estaria cansada dele agora, mas
o oposto é verdade. Nós só temos três pistas restantes. Terminar o jogo signi ca cortar qualquer conexão
que forjamos. Signi ca formatura e verão e embarcar em dois aviões diferentes no nal. Talvez seja por isso
que estou relutante em deixar a biblioteca – porque, de todas as coisas que aprendi sobre ele hoje, no topo
da lista é que eu realmente gosto de passar tempo com ele. Achei que ganhar dele seria incrível, mas tudo
isso é muito melhor.
Isso me faz desejar, mais uma vez, ter percebido antes que poderíamos ter sido mais que rivais. Eu me
pergunto se ele sente isso também, esse desejo de ter mais conversas como essa sobre uma pizza medíocre. E
se isso nos torna amigos ou apenas duas pessoas que deveriam se encontrar em algum lugar, mas se
perderam no caminho.
— Sim — eu digo, ignorando essa estranha reviravolta que meu estômago faz que deve ser causado por
esta conversa franca após o expediente. Eu deveria tirar meu sapato do dele. Rowan Roth e Neil McNair,
mesmo como amigos, não fazem contato de sapato com sapato. Eu não sei o que eles fazem. — Acho que
podemos ser isso.
Eu me inclino contra minha pilha de livros, me sentindo menos confortada pelas biogra as de mulheres
incríveis literalmente me apoiando do que eu pensei que faria. Neil e eu estivemos próximos em muitos
lugares escuros esta noite. Ele reorganizou minhas moléculas, me deixou insegura sobre coisas que eu achava
que tinha certeza.
Exemplo: o quanto eu gosto não apenas de seus braços ou de sua barriga, mas dele, e a maneira como ele
olhou para mim quando me disse que eu era "ótima".
Mas isso é um absurdo. Não é? De todas as coisas no meu guia de sucesso que eu entendi errado, Neil
de nitivamente não é o namorado perfeito do colégio. Só que é difícil lembrar disso quando nossos sapatos
se tocam ou quando um poste de luz do lado de fora atinge os ângulos mais suaves de seu rosto.
— Agora que somos amigos — diz ele —, você pode me contar mais sobre o seu livro?
Suas palavras me lembram o quão perto eu estava de conhecer Delilah Park. Ela provavelmente está de
volta ao hotel neste momento. Amanhã indo para a próxima parada da turnê.
Se eu não posso ser corajosa lá, talvez eu possa ser corajosa aqui.
— Você realmente quer saber? — Quando ele acena, eu respiro fundo. Qualquer coisa para tirar minha
mente do que está acontecendo com nossos sapatos e do que eu posso ou não querer que aconteça com o
resto de nossos corpos. — É... uma espécie de romance no local de trabalho. Entre dois colegas de trabalho.
Hannah e Hayden. Duas pessoas inventadas que vivem na minha cabeça desde o verão antes do primeiro
ano. Hannah veio até mim primeiro, uma advogada de espírito livre e boca esperta com uma mistura de
traços de minhas heroínas favoritas. Em seguida, Hayden, o advogado tenso com um lado suave oculto,
desa ando-a para uma promoção. Os opostos se atraem é a minha trope15 favorita, então fazia sentido
começar por aí. Porque, claro, a coisa sobre os opostos: eles sempre têm muito mais em comum do que
pensam.
Às vezes penso neles antes de dormir, depois sonho com eles. Contar a Neil sobre eles é como se eu
estivesse contando a ele sobre meus amigos imaginários. De certa forma, meio que estou.
— Isso foi tão difícil de dizer?
— Sim! Foi — eu digo, mas agora que está lá fora, não parece tão assustador.
— O objetivo de ser um escritor não é que alguém leia suas coisas?
— Quer dizer, sim, ugh, mas ainda não cheguei lá — protesto. — é complicado. Ninguém nunca leu
nada que eu escrevi que não fosse para a escola.
Teoricamente, quero compartilhar meu trabalho. Eu quero possuir totalmente essa coisa que quero
passar a minha vida toda fazendo. Não quero me importar quando as pessoas chamam isso de prazer secreto
ou ter a coragem de convencê-las de que estão erradas. Ou melhor ainda, a con ança para não se importar
com o que pensam.
— Você quer, no entanto — ele diz.
Eu concordo.
— Digamos que você não seja instantaneamente perfeita nisso. Você continua tentando. Você ca
melhor.
— Eu não sei, isso parece muito trabalho — eu digo, e ele revira os olhos.
— Eu tenho uma ideia. Mas você pode odiar. — Quando levanto minhas sobrancelhas para ele, ele
continua: — E se... você me deixar ler? Apenas uma ou duas páginas? O que pode ser mais assustador do
que eu lendo isso, certo?
Surpreendentemente, não odeio sua sugestão. Sua expressão é suave e estou convencida de que ele não
iria rir disso. O que é mais surpreendente é que quero mostrar a ele. Ele ama as palavras tanto quanto eu –
quero saber o que ele pensa.
— Você escreveu a porra de um livro. Você sabe quantas pessoas gostariam de fazer isso, ou quantas
pessoas falam sobre fazer e nunca fazem? — Ele balança a cabeça, como se estivesse impressionado comigo, e
eu quero tanto car impressionada comigo mesma. — Você viu Álbum de casamento no meu quarto. Não
sou o cara que era no primeiro ano. E você pode me dizer para parar quando quiser, ok? Vou colocá-lo de
lado assim que você disser a palavra.
Ele está sendo tão doce sobre isso. Quero dizer a ele o quanto essa falta de julgamento signi ca para mim,
mas talvez seja mais fácil mostrar a ele.
— Eu–eu sei. — Com as mãos trêmulas, encontro o arquivo no meu telefone e o passo para ele. Fecho
meus olhos, meu coração batendo forte. Não consigo vê-lo, mas posso senti-lo bem ao meu lado, ouço o
toque mais suave de seu polegar na tela do telefone.
— Capítulo um — ele começa.
— Oh meu Deus. Por favor, não leia em voz alta.
— Está bem, certo — Ele ca quieto e eu duro apenas alguns segundos antes de perder o controle.
— Eu retiro o que disse. O silêncio é pior.
Ele ri.
— Você quer que eu simplesmente não leia?
Soltei um suspiro trêmulo, mexendo meus ombros para liberar a tensão ali.
— Não. Isso é bom para mim. Continue indo e direi quando parar.
— Ok — diz ele. — Capítulo um. Hannah desprezou Hayden por dois anos, um mês, quatro dias e quinze
– não, dezesseis – minutos...
Capítulo 1

Hannah desprezou Hayden por dois anos, um mês, quatro dias e quinze – não, dezesseis –
minutos.
Ela se lembrou do momento exato em que ele entrou no escritório, seu terno impecável,
sem nenhum fio de cabelo fora do lugar. Ela sabia porque estava olhando – ok, encarando –
para o relógio pendurado acima de sua mesa, contando os minutos até o próximo colapso de
seu chefe.
Ela já tinha ouvido mais do que gostaria sobre essa nova contratação, um graduado de
Direito em Yale que também tinha um MBA na Penn. Ninguém mais na empresa tinha vários
diplomas avançados, e Hannah sabia que isso emocionava os sócios; o trio de homens de
cabelos grisalhos no escritório de canto ostentoso.
Hannah, entretanto, estava um pouco menos emocionada. Ela estava no caminho certo
para se tornar sócia, e ela não estava disposta a deixar esse figurão de vários graus entrar em
seu caminho. Não quando ela deu à empresa sessenta, setenta, oitenta horas por semana nos
últimos cinco anos de sua vida. Ela não tinha saído de férias ou um segundo encontro desde a
faculdade de direito, mas tudo valeria a pena quando ela tivesse um escritório de canto chique
também.
Se Hayden Walker não ficasse no caminho dela.
Então ela observou enquanto ele sacudia as gotas de chuva de sua jaqueta e se dirigia para
sua mesa, que por acaso ficava bem em frente à dela.
Ele olhou para ela com olhos azuis elétricos.
— Você é minha secretária? — ele perguntou.
Claro que ele tinha um sotaque britânico.
21h20

— VOCÊ PODE PARAR aí — digo baixinho.


Sem perder o ritmo, ele passa meu telefone de volta para mim. Ele não tenta ler o restante ou segura o
celular por mais tempo – ele ouve. Ele não falou nada, nem mesmo quando estava lendo o diálogo. Ele leu
como se estivesse na frente da sala de aula, fazendo uma apresentação. Quando eu nalmente recupero a
compostura o su ciente para olhar para ele, suas bochechas estão vermelhas.
Gostei de como minhas palavras soaram em sua voz.
— Isso foi...
— Horrível? Devo desistir? Vou desistir.
— Não. Deus não. De jeito nenhum. Artoo, isso foi muito, muito bom. Você deveria ter usado uma
vírgula nesse terceiro parágrafo, não um ponto e vírgula...
— Eu sinceramente te desprezo.
Ele oferece um sorriso tímido…
— Você é uma grande escritora. Quero dizer. Isso foi tão... tenso.
Agora estou corando também. Neil McNair gosta da minha escrita. Mais do que isso, ouvi-lo ler me fez
perceber o quanto gosto dessa história e desses personagens.
— Nada aconteceu entre eles — eu digo.
— É a antecipação, no entanto. O leitor sabe que algo vai acontecer.
— A expectativa é grande, não me interprete mal. Eu amo isso. Mas eu amo o felizes para sempre que um
romance quase sempre garante. Mesmo que não seja realista.
— A felicidade é, no entanto — Neil diz. — Ou pode ser. Talvez não seja um tipo de felicidade para
sempre, mas isso não a torna menos real. Minha mãe e Christopher passaram por muita coisa. Você não
deveria querer que outra pessoa ajudasse em coisas difíceis?
— Esse tipo de coisa não acontece depois do epílogo — admito. — A maioria dos livros de Dalila
termina com um casamento ou um pedido e a suposição de que tudo vai car perfeito. Eu sei que às vezes é
realmente apenas uma fantasia. Obviamente, Spencer e eu não éramos perfeitos.
Spencer, o garoto que tentei forçar no papel que sonhei. Como seria o semestre passado se eu tivesse
terminado com ele, me dado permissão para não ter um NPEM até o nal? Eu poderia ter me divertido
mais, tenho certeza. Eu poderia ter passado mais tempo com Kirby e Mara em vez de tentar interpretar o
último texto enigmático de Spencer.
— Eu também nunca me senti assim com ninguém — diz ele, e me sento um pouco mais ereta, pronta
para mais uma história de relacionamento com Neil McNair. — Os relacionamentos que eu tive… Eles
eram legais, mas não eram de tremer a terra. Eu não sei. Os relacionamentos deveriam ser assim?
— De tremer a terra?
— Sim. Como a cada momento que você está com eles, sua cabeça está girando e você não consegue
recuperar o fôlego e você sabe que essa pessoa está mudando sua vida para melhor. Alguém que desa a você
a ser melhor.
— Eu– eu acho que sim — eu digo, porque ele me pegou desprevenida, e eu realmente não tenho
certeza. Spencer não me desa ou – ele não era uma pergunta em um exame AP. O que não digo a Neil é que
também tenho procurado por aquele amor que faz a terra tremer, e às vezes o desejo tanto que estou
convencida de que poderia desejá-lo até existir.
— Você vai achar que isso é maluco, mas Bailey e eu... Nós terminamos porque ela pensou que eu tinha
uma queda por você.
Eu bufo. Ruidosamente. É tão ridículo.
— Oh meu Deus. Kirby e Mara, elas acham que sou obcecada por você.
— Meus amigos acham que sou obcecado por você!
Isso nos leva a um ataque de riso por alguns minutos.
Neil se recupera primeiro.
— Eu realmente pensei que os romances eram apenas… — Ele acena com a mão. — Sexo. — Embora ele
diga um pouco menos sem jeito desta vez, ele ainda deixa muito espaço ao redor da palavra.
— Bem. Isso geralmente faz parte, mas não o tempo todo. E... eu de nitivamente não odeio essa parte.
Mas eles são muito mais do que isso. Eles são sobre os personagens e seus relacionamentos. Como eles se
complementam e se desa am, como eles superam algo juntos. — Paro e acrescento: — Embora eles me
tenham feito acreditar que meu primeiro beijo seria mais mágico do que realmente foi.
— Agora estou curioso.
— Gavin Hawley. Sétima série. Nós dois tínhamos aparelho ortodôntico. Estávamos condenados.
— Vou fazer melhor que você. Você sabe como eu tenho hemorragias nasais no inverno?
— Oh. Oh não.
— Ah, sim — ele diz. — Chloe Lim, oitava série. No refeitório, o que, em retrospecto, foi absolutamente
a pior ideia que já tive. Todo mundo me chamava de Vermelhão. — Isso me faz bufar e rir, e ele balança a
cabeça. — Fiquei traumatizado. Eu não beijei outra garota por dois anos depois disso.
Mas ele está rindo também. Eu amo o som de sua risada e a maneira como ele ca quando está rindo. É
como se ele se deixasse levar, esquecendo que deveria ser rígido e presunçoso. Acho que nunca tinha visto
isso até hoje.
— Você vai nalmente assinar meu anuário agora? — ele pergunta quando nos acalmamos. — Preciso de
um autógrafo de Rowan Roth para quando você car famosa.
Uma cachoeira de alívio.
— Tenho me sentido um lixo desde que disse não.
Escrevo a melhor mensagem que consigo reunir, uma que relata algumas de nossas rivalidades passadas e
deseja-lhe tudo de bom no próximo ano. Neil leva seu tempo. A caneta para e começa, e ele bate no queixo,
mancha a mão com tinta.
Quando trocamos de volta, faço um movimento para abrir o meu, mas ele ataca.
— Não leia até amanhã — diz ele.
— É quase amanhã.
Ele revira os olhos.
— Só não leia enquanto estou aqui, ok?
Naturalmente, isso me deixa mais curiosa, mas como acabei de deixar alguém ler meus escritos, não
posso culpá-lo. Pode ser estranho ler uma mensagem do anuário na frente da pessoa que a escreveu.
— Certo. Então não leia o meu também. — Eu coloco o anuário na minha mochila. — Nós devemos ir.
A menos que haja alguma pista que possamos encontrar aqui?
— Oh, um disquete! — Tenho certeza de que é o mais entusiasta que alguém tem com um disquete em
pelo menos duas décadas. — É exatamente onde encontraríamos um, certo? Vou veri car a sala de recursos.
— Ele pula de pé, mas antes de deixar nosso corredor, ele se ajoelha de volta como se tivesse esquecido algo.
— Aquele no nal do corredor. Ao lado da ala de ciências. Só quero deixar bem claro para onde vou desta
vez. Eu sei que você ca assustada quando eu saio.

Quando ele volta cinco minutos depois, ele está segurando um disquete, um rolo de tas e um pacote de
Skittles.
— Eu presumo que isso não tenha nada a ver com o misterioso Sr. Cooper — eu digo, gesticulando para
as tas e os Skittles.
— Tive uma ideia. — Ele coloca tudo na mesa da bibliotecária, gastando uma quantidade excessiva de
tempo organizando cada objeto, como se meditando sobre o que vai dizer a seguir.
— Você não foi ao baile. Temos falado muito sobre o m do ensino médio, e parece ser essa experiência
fundamental do ensino médio, pelo menos se quisermos acreditar em lmes e na TV.
— Certo...
— Bem, a comida era bem medíocre. — Ele segura os Skittles. — E aqui está uma música
apropriadamente cafona. — Ele percorre o telefone, depois toca para tocar em uma música antiga de High
School Musical, e eu bufo porque é realmente extravagante. — Minha irmã acabou de descobrir isso.
Aceitarei gentilmente suas condolências. — Em seguida, ele ca sério, deslizando o telefone sobre a mesa da
bibliotecária e estendendo a mão. — Não será o baile perfeito do seu guia de sucesso, mas... você gostaria de
ir ao baile comigo?
Eu paro de rir porque, embora parte de mim ache isso cafona como o inferno, também é incrivelmente
doce. Meu coração está na minha garganta. Não consigo me lembrar da última vez que alguém fez algo tão
bom para mim.
Atrás dos óculos, seu olhar é rme. Inabalável. Isso me torna ainda mais consciente de como de repente
me tornei vacilante.
— Devíamos partir — é o que sai em vez de sim. Claramente, minha conexão cérebro-boca é quebrada
quando se trata dele.
Sua expressão não vacila.
— Uma dança?
E Deus, ele parece tão sério na escuridão que não tenho ideia de por que não dei a ele minha mão
imediatamente.
— Tudo bem — eu cedi — mas não essa.
Encontro outra coisa no meu próprio telefone, algo fofo e adorável dos Smokey Robinson and the
Miracles
— Muito melhor — ele concorda.
Eu deslizo uma mão na dele e levo a outra até seu ombro, enquanto sua mão livre se acomoda na minha
cintura. Já dancei com pessoas antes – Spencer, Luke, alguns caras estranhos no ensino médio – mas já
estávamos namorando. Este é um território desconhecido. Porque temos a mesma altura, estamos olhando
diretamente nos olhos um do outro, minha mão direita agarrada na esquerda dele.
— Não precisamos deixar espaço para Jesus — diz ele. — Ou qualquer que seja o equivalente judeu. Se
houver um. Deixar espaço para Moisés?
— Deixe a porta aberta para Elijah — eu digo, e ele bufa.
— Sim. Essa é a versão judaica.
— E nós somos os piores judeus. — Ainda assim, eu chego mais perto. — Mas é estranho, olhar para
você assim. Vou passar tudo isso tentando não rir.
Ele se move para que sua mão na parte inferior das minhas costas me empurre suavemente para mais
perto dele, para que eu possa descansar minha cabeça no espaço onde seu pescoço encontra seu ombro. Oh.
Uau. Estamos... muito mais próximos do que um segundo atrás, e ele é sólido, con ante e caloroso, o que eu
não entendo, já que ele está de camiseta a maior parte do dia. Deus. Aquela camiseta idiota. QUIDQUID
LATINE DICTUM, ALTUM VIDETUR. Também pode signi car “olhe para esses bíceps enormes”.
— Melhor? — Ele pergunta, seu hálito quente na minha bochecha, minha orelha. Essa única palavra
viaja pela minha espinha até os dedos dos pés, uma corrente elétrica. Lembro-me de minha paixão de
primeiro ano, quando por doze dias fantasiei sobre nós dois irmos ao baile juntos. É assim que teria sido?
Como ele teria me segurado?
Provavelmente não, eu decido. Eu me elevava sobre ele naquela época, antes que seu surto de
crescimento o trouxesse à minha altura. E ele era esquelético e agora decididamente... não é.
— Mm-hmm — eu consigo dizer, mas não tenho certeza se é. É melhor e pior porque Neil McNair é um
paradoxo do caralho. Aquele cheiro bom do capuz de antes – não era a chuva. Era só ele. Se meu rosto está
vermelho por estar tão perto, pelo menos ele não pode ver.
— Bom.
Conforme balançamos para frente e para trás com a música, uma coisa se torna aparente de imediato:
— Eu não sou muito boa nisso — eu digo depois de me desculpar por pisar em seus pés.
Isso me transporta para esta cena em Sweet as Sugar Lake, onde a dona da lanchonete Emma fechou o
lugar mais cedo para que ela pudesse ensinar seu melhor amigo (e paixão de longa data) Charlie como
dançar antes do casamento de seu irmão. Ainda dói, perdendo minha chance de tirar uma foto com a réplica
do gazebo de Sugar Lake que Delilah estava trazendo para a turnê.
— Tudo bem. Eu compenso isso.
É arrogante, mas é verdade. Ele é bom, enquanto meu estilo de dança se inspira nas coisas exíveis das
concessionárias de automóveis.
— Você é, tipo, absurdamente bom.
— Eu aprendi dança quando era criança. Balé e jazz, principalmente. Algumas aulas de sapateado aqui e
ali.
— Isso é muito legal — eu digo, e é. — Minha prima Sophie é coreógrafa. Ou ela está estudando isso na
faculdade. Ela, Kirby e Mara tentaram me ensinar, mas sou uma causa totalmente perdida. Você tem
movimentos irados? Eu quero ver alguns movimentos irados.
— Receio que esta seja a extensão dos meus movimentos irados hoje em dia — diz ele, e com isso, ele me
guia por um giro suave, e quando eu termino exatamente onde comecei, meu nível de impressão está
o cialmente fora dos grá cos. Seus membros estão mais con antes ao se moverem em um ritmo maior do
que no resto do tempo. Eu não posso acreditar que este é o mesmo garoto que usava um terno com mangas
muito longas hoje cedo.
Neil sendo tão bom dançarino – é meio quente.
A realização me vira do avesso, como se meu coração e cérebro traidores estivessem em exibição para ele
ver.
— O que fez você parar de dançar? — Pergunto em seu ombro, não sendo mais capaz de fazer contato
visual. Se eu não continuar falando, vou entrar em espiral. Neil. Quente. Meu cérebro se desequilibrou e,
com ele, minhas mãos trêmulas, que ele tenta ao máximo manter rmes. Porque ele é um bom dançarino.
Que eu acho quente. Caramba. Girando. Tento invocar memórias dos últimos anos, das vezes em que ele me
deixou tão furiosa que não conseguia ver direito.
Não funciona.
— Fiquei muito ocupado com a escola — diz ele. Há alguma tristeza aí que só aumenta minha ternura
por ele. — E meu pai nunca gostou que eu tivesse interesse nisso.
— Talvez você pudesse ter algumas aulas na faculdade.
— Talvez — ele ecoa conforme a música muda. Uma dança, ele disse. Tenho certeza de que ele vai me
soltar, mas ele não o faz, e eu permaneço rmemente em seus braços. — Eu senti falta disso. Isso é... legal.
Isto é. É é bom pra caralho, mas é fugaz, como tudo o mais nesta noite. Eu não consigo me apegar muito.
Tudo isso tem a ver com cinco tipos de preocupação. Neil não é meu NPEM. Ele não é o cara que eu caria
embaixo das arquibancadas ou seguraria minha mão durante um lme. Ele não tiraria sel es ridículas
comigo e as postaria com hashtags irônicas que eu meio que não acho irônico, ou declararia seu amor com
um buquê de rosas. Ele não é um herói de romance.
— Provavelmente é melhor se você realmente gosta da pessoa com quem está dançando.
Imediatamente, percebo que foi a coisa errada a dizer. Merda. Ele enrijece. Dura apenas um segundo,
mas é o su ciente para nos deixar dessincronizados com a música.
— Sim. Tenho certeza que é.
Eu mordo com força o interior da minha bochecha. Eu queria parar a corrente de emoções que ameaçava
me puxar para baixo, mas claramente fui longe demais. Eu deveria dizer a ele que não estou imaginando
mais ninguém. Que quei tonta com o cheiro dele. Que seria impossível pensar em ninguém além dele
quando estamos nos tocando assim, quando sua mão está espalhada em minhas costas, quando meus cílios
roçam em seu pescoço cada vez que eu pisco.
— Quero dizer — eu volto atrás, pisando em seus pés e murmurando um pedido de desculpas. — Não
que eu não goste de dançar com você. Eu só–
— Entendo. — Sem aviso, ele solta minha mão. — Você estava certa antes. Devemos ir.
— Nós– hum– certo. — Tropeço nas palavras, nos pés, que lutam para se mover por conta própria. O
clima mudou tão rapidamente que me deu uma chicotada, a temperatura na sala caindo de amena para
abaixo de zero. Pego meu telefone para me ancorar.
— Há outra atualização do Howl.
Ainda estamos na liderança: 13 para Neil e eu, 9 para Brady e Mara e 8 para Carolyn Gao.
— Bom trabalho, Brady — diz Neil com um assobio baixo.
Eu também perdi cerca de uma dúzia de noti cações em meu grupo do Two Birds.

COLLEEN

Alguém pode fechar para mim esta noite?? Meu filho


vomitou em uma festa do pijama, e eu tenho que ir buscá-
lo

Qualquer um?? Vou te dar todas as minhas gorjetas a


partir de hoje.

Todos os outros funcionários responderam que não podem fazer isso, que já têm planos de sexta-feira
dos quais não podem se livrar. A mensagem mais recente é de Colleen novamente, apenas meu nome com
três pontos de interrogação.
— Depois do disquete, chegamos a dois. A vista e o Sr. Cooper. Para a vista, devemos realmente fazer
Kerry Park. É meu lugar favorito em Seattle — Neil está dizendo enquanto eu debato como responder à
mensagem. Ele deve perceber que estou distraída. — O que foi?
— É trabalho — eu digo. — Two Birds One Scone. Minha chefe precisa de alguém para fechar o café esta
noite, e eu sou a única que está disponível. Você se importa se zermos uma parada rápida lá? Vai demorar
dez minutos, eu juro.
— Oh. Claro, ok. — Tenho certeza de que há um tom frio em sua voz que não está totalmente
relacionado a esse desvio.
Eu não deveria ter insinuado que gostaria que ele fosse outra pessoa. Ninguém caria feliz em ouvir isso
enquanto dança com alguém, mesmo que essa pessoa seja seu inimigo jurado. Estou amaldiçoada a nunca
dizer a coisa certa perto dele – mas estou começando a me perguntar se tenho alguma ideia do que é essa
coisa certa.
É o incidente do anuário novamente. Eu estava tão preocupada com o tipo de amizade que um “sim”
signi caria que saltei para o “não”? Meu subconsciente está tentando me proteger de chegar perto demais
ou estou realmente com medo do que signi caria reconhecer esses sentimentos? Porque está claro agora –
eles signi cam alguma coisa. Se aprendi alguma coisa com os romances, é que o coração é um músculo
imperturbável. Você pode ignorá-lo por apenas algum tempo.
Neil pega sua mochila. De repente, não consigo suportar a ideia de deixar este lugar. Não a escola ou a
biblioteca em si, mas neste momento. Com ele.
Mas eu forço meus pés a seguirem os dele enquanto rastejamos de volta para fora, a porta se fechando
automaticamente atrás de nós. Não falamos enquanto caminhamos para o meu carro, e só quando estamos
na penumbra dos postes é que abro a boca para falar.
— Obrigada — eu digo, estendendo a mão para roçar seu braço nu com a ponta dos meus dedos. Ele
também está com frio. — Por tudo isso. Embora eu duvide que o baile real tenha sido tão extravagante. Eles
provavelmente tinham a marca genérica de Skittles.
O que não digo é que, de alguma forma, tenho certeza de que isso foi melhor do que o baile. Eu mal
consigo me lembrar como imaginei isso. Claro, o NPEM e eu teríamos dançado, mas estaríamos
namorando por um tempo. Teria sido tão emocionante quanto dançar com Neil pela primeira vez? Eu teria
estremecido quando sua mão mergulhou nas minhas costas ou quando sua respiração sussurrou em meu
ouvido?
Graças a Deus, ele dá um meio sorriso para isso.
— Apenas o melhor para Rowan Roth — diz ele, e então estou entrando em uma espiral novamente.
Na luz, suas sardas estão quase brilhando, seu cabelo é de um âmbar dourado. Tudo nele é mais suave,
quase ao ponto de parecer embaçado, como se eu não pudesse dizer quem é essa nova versão de Neil
McNair, me deixando mais incerta do que nunca.
UMA LISTA INCOMPLETA DAS PALAVRAS FAVORITAS DE NEIL MCNAIR

- petricor: o cheiro da terra depois de chover (inglês)


- tsundoku: adquirir mais livros do que você jamais poderia ler (japonês)
- hygge: uma sensação calorosa e aconchegante associada a relaxar, comer e beber com seus entes
queridos (dinamarquês)
- Fernweh: saudade de um lugar onde você nunca esteve (alemão)
- Fremdschamen: o sentimento de vergonha em nome de outra pessoa; constrangimento de segunda mão
(alemão)
- davka: o oposto do que é esperado (hebraico)
22h09

— MUITO OBRIGADA — Colleen diz enquanto desamarra o avental. — Eu teria fechado mais cedo, mas
tivemos uma correria de última hora. — Ela lista as tarefas restantes: limpar a mesa, lavar pratos e embrulhar
os doces restantes para a coleta de lixo do dia seguinte.
— Não tem problema. Você sabe que amo este lugar.
Neil se inclina contra a vitrine da pastelaria, examinando as mercadorias. Se Colleen se pergunta por que
ele está aqui, felizmente ela não fala.
Colleen pega sua bolsa.
— Sentiremos sua falta no próximo ano.
— Eu estarei de volta nos recessos — eu insisto. — Você sabe que não resisto a esses rolinhos de canela.
— Isso é o que todos os universitários dizem. Mas então eles cam ocupados, ou querem passar mais
tempo com os amigos, ou se mudam para sempre. Acontece. Volte ao trabalho ou não, sempre haverá um
rolinho de canela com o seu nome.
Quero dizer a ela que não serei uma dessas pessoas, mas a verdade é que não há como saber.
Colleen nos deixa sozinhos neste pequeno café. Durante o passeio de carro, não conseguia parar de
pensar no baile. Eu estava tão envolvida nisso que abri mão de meus privilégios musicais, deixando-o tocar
uma música dos Free Puppies! que ele a rmava ser a melhor deles. Mas eu mal conseguia ouvir.
Estar tão perto dele na biblioteca turvou meus sentimentos. Tentei racionalizar: estou exausta e o jogo
me deixou delirando. Minha mente está pregando peças em mim, me convencendo de que sinto algo por
ele, que tenho certeza de que não senti ontem. Ou meu corpo ansiava por proximidade com o de outra
pessoa. Sou uma escritora – posso inventar centenas de motivos diferentes.
As coisas que eu disse, porém, sobre desejar que ele fosse outra pessoa, feriram seu ego. Elas devem ter.
Mas eu não gosto de nós assim. Não gostei depois da assembléia desta manhã, quando me recusei a assinar
seu anuário, e não gosto agora. Ou talvez seja porque eu gosto muito disso, e isso é ainda mais assustador.
Neil é mais fofo do que eu imaginava, e eu sou uma cerca de arame farpado. Cada vez que ele chega perto
demais, eu me torno mais cortante.
— O que devemos fazer primeiro? — ele pergunta.
Eu alcanço a caixa de pastelaria.
— Bem, eu vou comer um rolinho de canela. E você também deveria.
Não é uma espiral perfeita, porque, como Colleen gosta de nos dizer, comida de aparência imperfeita
tem o melhor sabor. Seguro o prato perto do rosto de Neil, deixando-o inalar o açúcar doce de canela. Antes
que ele possa dar uma mordida, eu o arranco.
— Glacê primeiro — eu digo, voltando para a cozinha.
Tudo o que quero é que sejamos normais depois do que aconteceu na biblioteca, e meu plano brilhante
é ignorar isso. Eu não posso gostar dele desse jeito. É o oposto de destruí-lo, e mesmo que esse não seja mais
meu objetivo, até cerca de sete horas atrás, ele era meu inimigo. Ele é Neil McNair e eu sou Rowan Roth, e
isso costumava signi car alguma coisa.
Abro a geladeira, o frio é uma explosão bem-vinda contra meu rosto, mas não desacelera meu coração
selvagem.
— Bolo gelado de cream cheese? — Ele pergunta, uma cadência provocante em sua voz.
— Eu nunca perdoarei meus pais.
— Eu, pelo menos, apreciei os fatos engraçados sobre Rowan Roth. — Ele se inclina contra o balcão, e
parece tão casual. Talvez a dança o tenha relaxado, o que é irônico, porque só me amarrou em nós. Não me
sentia tão tensa desde meu teste de AP de cálculo, e talvez nem mesmo então. — Como a febre de Kevin.
Isso era ouro.
Eu gemo. Depois que voltei à mesa de jantar, meus pais disseram a ele tudo o que ele poderia esperar
saber sobre os livros de Riley e suas vidas como escritores, incluindo como eles costumavam reclamar que
tinham febre de cabine quando se escondiam em casa no prazo. Quando eu era mais jovem, achava que eles
estavam dizendo “febre de Kevin” e um dia perguntei, muito preocupada, se Kevin estava bem.
— Não tenho medo de usar isso como arma — digo, segurando o pote de gelo. — E ei. Se você quiser
falar sobre pais constrangedores, devemos falar sobre como sua mãe sabe exatamente onde eu estou indo
estudar.
— A escola enviou uma lista. Minha mãe investe muito na minha educação. — Ele acena em direção ao
glacê. — E eu acho que você está blefando.
Só porque vou enxaguar este pote depois, mergulho meu dedo indicador dentro, e antes que eu possa
pensar demais, passo glacê em sua bochecha sardenta.
Por um momento, ele está congelado. E então:
— Não acredito que você acabou de fazer isso — diz ele, mas está rindo. Ele en a a mão no recipiente e
passa um dedo coberto de glacê pela minha sobrancelha. Está frio, mas não desagradável. — Pronto.
Estamos quites.
Nossos olhares se xam por alguns segundos, um concurso de encarar. Seus olhos ainda estão brilhantes
de tanto rir. Não estou prestes a transformar isso em uma guerra de comida total, não quando a dança da
biblioteca ainda está tão fresca em minha mente. Isso soa perigoso.
Então, algo assustador acontece: tenho a estranha vontade de lamber a cobertura de seu rosto.
Isso é divertido. Estou me divertindo com Neil McNair, de cujo rosto quero lamber a cobertura.
Thor me ajude.
— De alguma forma, tenho a sensação de que é o oposto do que deveríamos fazer aqui — diz ele,
pegando o rolo de papel toalha atrás dele.
Com as costas da minha mão, limpo o glacê da minha sobrancelha, tentando ignorar as batidas do meu
coração. Em um movimento rápido, pego uma espátula e coloco a cobertura em um lugar muito mais
seguro: o rolinho de canela. Eu corto ao meio, a canela açucarada escorrendo pelos lados.
Seus olhos se fecham enquanto ele dá uma mordida.
— Excelente — ele diz, e eu sinto um pouco de emoção, como se eu mesma tivesse feito isso. Eu nem
mesmo tenho vontade de zombar de sua escolha de palavras.
— Você come. Vou lavar esses pratos.
Ele franze a testa, colocando seu prato no balcão.
— Vou te ajudar.
— Não, não. É meu trabalho. É por isso que eles me pagam muito dinheiro.
— Artoo. Não vou car aqui sentado vendo você lavar a louça.
Eu limpo minha metade do rolinho de canela. Eu acho que terminaríamos mais rápido, e seria estranho
para ele apenas car parado olhando. Então ele liga alguns Free Puppies!, insistindo que esta é a melhor
música deles, mas é o que ele disse sobre as últimas três músicas. E então, juntos, lavamos os pratos.
Ele até canta dessa maneira inconsciente. Ele tem que mudar os registros para obter todas as notas, o que
acontece às vezes no meio de uma linha, e sempre me deixa maluca. A maioria das pessoas não se sentiria tão
con ante cantando perto de outra pessoa. Posso admitir que a banda tem uma boa música. Tudo bem,
talvez duas. E talvez eu me junte quando “Pawing at Your Door” começar, e cantamos o refrão juntos.
Este é o cialmente o dia mais estranho da minha vida.
— Sério, obrigada — digo pela décima vez, pendurando uma frigideira no escorredor. — É assim que
seria sermos amigos?
— Lavar pratos, comer rolinhos de canela e falar sobre ser judeu? Cem por cento — diz ele. A espuma de
sabão sobe por seus braços pontilhados de caramelo. — Pense em todos os lmes que poderíamos ter visto,
em todos os jantares de Shabat que poderíamos ter feito juntos.
Algo sobre a maneira como ele diz essa última puxa meu coração. A sensação é semelhante à nostalgia
que senti o dia todo, exceto que esta é uma nostalgia por algo que nunca realmente aconteceu. Tem que
haver uma palavra para esse tipo especí co de melancolia.
Arrependimento.
Talvez seja isso.
Nós poderíamos ter tido isso. Quatro anos de discussão quando poderíamos ter feito isso: sua voz
horrível para cantar, seu quadril batendo no meu para me encorajar a cantar junto, o escarlate em suas
bochechas quando eu o ataquei com glacê. Enquanto eu estava tão focada em destruí-lo, eu perdi muito.
— Acontece que sou uma péssima amiga, então talvez você esteja melhor — digo, e imediatamente
desejo poder voltar atrás.
Eu passo um prato para ele, mas ele apenas o segura sob a água.
— Isso é... algo que você quer falar?
— Tenho mantido a ideia da minha amizade com Kirby e Mara, mas não tenho estado lá para elas
ultimamente. Vou tentar ser melhor, mas – posso fazer isso com muitas coisas, na verdade. Eu idealizo. —
Solto um longo suspiro. — Não sou realista o su ciente? Eu também sou... sonhadora? — Eu me encolho
quando a palavra sai. — Não sonhador como quente, sonhador como... sonhando demais.
Ele considera isso.
— Você é... otimista. Talvez até demais, às vezes, como com aquele guia de sucesso. Mas não acho que
seja uma coisa ruim. Especialmente se você estiver ciente disso.
— Estou ciente disso há três horas inteiras.
Um lado de sua boca se curva em um sorriso.
— É um começo. — Ele faz um movimento para apontar, mas como suas mãos estão enterradas em
bolhas de sabão, ele gesticula para mim com o cotovelo. — Mas você está ciente que tem glacê, tipo, em toda
a sua sobrancelha?
Meu rosto está em chamas. Seus olhos perfuram os meus, e há uma intensidade ali que me mantém no
lugar.
Se estivéssemos em um romance, ele passaria o polegar pela minha sobrancelha, mergulharia na boca e
me daria um olhar sedutor. Ele me apoiaria contra o balcão da cozinha com seus quadris antes de me beijar,
e ele teria gosto de açúcar e canela.
Vou dar pontos ao meu cérebro pela criatividade. Este não deve ser um momento romântico. Estamos
esfregando as migalhas de outras pessoas e os pedaços de comida mastigados dos pratos. Ainda assim, a ideia
de beijá-lo me atinge como um terremoto, o tremor quase me fazendo perder o equilíbrio.
— Você... vai lavá-lo ou esperar até que que todo duro?
Ding, ding, ding, temos um vencedor para a palavra com maior probabilidade de matar o romance.
Parabéns, rabugento.
— Certo — eu digo, passando meu pulso pela minha sobrancelha. O momento se foi – porque é sempre
assim, não é? O que acontece na minha cabeça é melhor que a realidade. — Me dá essa toalha?
Assim que fecho as portas, Neil faz um estranho som de clique com a língua.
— Você sabe — ele diz. — Na verdade, não estamos longe daquela sessão de leitura. Temos tempo para
fazer isso, se você ainda quiser ver Delilah.
O ar atinge minhas bochechas.
— Não deveríamos — eu digo. Mas nós temos apenas duas pistas restantes, e a ideia de esta noite
terminar, acabando com Neil... me deixa irracionalmente triste. A sessão de leitura pelo menos aumentaria
nosso tempo juntos.
— OK. — Ele en a as mãos nos bolsos e vira na rua onde meu carro está estacionado.
— OK? — Eu tenho que correr para acompanhá-lo. — Achei que você fosse lutar mais.
Ele encolhe os ombros.
— Se você não quer vê-la, não a veja.
— Isso é algum tipo de besteira de psicologia reversa?
— Depende. Está funcionando?
— Eu realmente te odeio.
— Você não tem que fazer isso. Podemos entrar no carro agora. Mas você a ama, não é? Se não for hoje,
quando você terá outra chance? Que desculpa você dará da próxima vez que seu autor favorito estiver na
cidade, ou quando alguém quiser saber que tipo de livro você está escrevendo? — Ele se inclina e coloca
uma das mãos no meu ombro. É para ser encorajador, eu acho, mas é incrivelmente perturbador. — Eu sei
que você pode fazer isso. Você é a pessoa que revolucionou a coleta de lixo em Westview, lembra?
Apesar de tudo, eu abro um sorriso com isso.
— Então me escute — ele continua. — Se você não zer isso e arrancar o Band-Aid–
— Dois clichês em uma frase? — Eu digo, e ele atira adagas em mim.
— Você poderia desejar que tivesse. Todo aquele arrependimento de que você falou antes, com o guia de
sucesso – aqui está uma meta que você pode cumprir agora, mesmo que não consiga riscá-la de alguma lista.
Tento visualizar – mas nunca fui à casa de Bernadette, então não consigo. Talvez eu tropece em minhas
palavras, faça papel de boba na frente de Delilah. Mas hoje era para ser sobre possuir essa coisa que eu amo, e
eu já z muito progresso com Neil de todas as pessoas. Foi tão bom nalmente falar sobre isso. Liberdade.
E acho que ainda não terminei.
— Você venceu — eu digo.
Quando ele sorri, é claro o su ciente para iluminar o céu noturno.
É lindo.
SEIS COISAS SOBRE NEIL MCNAIR QUE NÃO SÃO REALMENTE TERRÍVEIS

- Ele ocasionalmente usa camisetas.


- Seu conhecimento de palavras e idiomas é um tanto impressionante.
- Ele é um ouvinte decente – quando não está sendo combativo.
- Ele leu Nora Roberts.
- Ele sabia, de alguma forma, que eu poderia ir naquela sessão de leitura, mesmo se não soubesse.
- Suas sardas. Todas as sete mil delas.
22h42

BERNADETTE’S FOI PROJETADO para parecer um lugar velho, barulhento, mal iluminado, com fotos
em preto e branco da velha Seattle forrando as paredes. Mesas e cadeiras apontam para um pequeno palco
no fundo, onde uma garota talvez alguns anos mais velha do que nós está no palco, serrando um violino
para frente e para trás. Não – uma viola.
— Ela provavelmente já foi embora — eu sussurro para Neil. — Ou ela vai pensar que é um perseguidor
invés de um fã que a rastreou para conseguir alguns livros autografados.
— Ou ela cará lisonjeada — diz ele.
Passo os dedos pela franja, empurrando-a para a esquerda, onde deveria car após anos penteando-a para
ensinar-lhe a car assim. Estou deixando ela crescer e ponto nal.
Eu gosto do jeito que é, Neil disse sobre minha franja antes. Ela ricocheteia dentro do meu crânio até que
eu gosto, gosto, gosto, gosto inde nidamente. Quando eu o pego olhando, ele rapidamente desvia o olhar e eu
me sinto corar.
Naturalmente, é quando eu a vejo, sentada com outra mulher em uma mesa a poucos metros de
distância.
Ela está impecável, rindo de algo que a outra mulher está dizendo dessa forma completa, mas silenciosa.
Seu cabelo preto é cortado em um corte elegante, e ela está usando um macacão azul marinho com corações
brancos por toda parte. Pequenos decalques de coração até adornam suas unhas.
E é claro que tenho o que parece uma merda manchando a frente do meu vestido.
— Diga oi — Neil sussurra, colocando a mão nas minhas costas.
De alguma forma, eu me impulsiono para frente.
— Desculpe, mas– você é, hum, Delilah Park?
Delilah e sua companheira de mesa se voltam para nós. Seus lábios de morango se curvam em um sorriso
caloroso.
— Sou eu. — Sempre educada, ela gesticula para a mulher ao lado dela, vestida com um blazer ajustado e
ignorando a frequência com que seu telefone acende na mesa à sua frente. — Esta é minha publicitária,
Grace. Sinto muito, acabei de me apresentar há cerca de vinte minutos.
Legal, legal, vou simplesmente desaparecer agora. Estou pronto para virar e correr quando Neil bate na
minha mochila.
Coragem. Eu posso fazer isso.
— Eu amo seus livros — eu deixo escapar. — Quero dizer, tenho certeza que você sabe muito disso.
Porque, obviamente, se alguém vai a um de seus eventos, é porque ama seus livros, a menos que esteja sendo
arrastado por outra pessoa, caso em que deve ainda, tipo, ser respeitoso e não dizer abertamente que não
ama seus livros? Não que eu esteja dizendo que muitas pessoas que vão aos seus eventos não amam seus
livros. Tenho certeza de que quase todos eles fazem. E eu de nitivamente amo. Amo seus livros, quero
dizer.
Grace tenta suprimir um sorriso.
— Obrigada — diz Delilah, e ela parece genuína. — Nós nos encontramos na livraria antes?
Eu balancei minha cabeça.
— Eu perdi a sessão de autógrafos É uma longa história que envolve o zoológico, um biscoito de
maconha e um jogo realmente complicado.
— Hum, parece uma ótima história — diz ela, como se fôssemos amigas.
Meus ombros caem de alívio. De alguma forma, estou falando com ela. Estou conversando com Delilah
Park, cujas palavras admiro há tantos anos.
— Esta é a pessoa que não ama meus livros que você arrastou com você? — ela pergunta, gesticulando
para Neil.
Eu me sinto mais quente, mas há bondade em sua voz. Ela não está tirando sarro de mim.
— Eu ainda não li nenhum — Neil admite, e então me olha nos olhos antes de acrescentar — mas eu
quero.
Eu estou utuando.
— Eu tenho alguns livros comigo, se você não se importa em autografa-los?
— Com certeza — ela diz. Grace já está entregando a ela uma caneta. — Para quem devo dedicá-los?
Eu soletro meu nome para ela. Grace tem a marca de lábios de Delilah também, e quando ela pressiona
na almofada de tinta e depois na página, estou chocada por ainda estar de pé. Isso me dá uma sensação de
déjà vu depois do que aconteceu com Neil e meus pais. Acho que não podemos evitar – nós dois somos
nerds dos livros.
— Foi tão bom conhecê-la, Rowan — diz ela, passando os livros de volta para mim. Ela gesticula em
direção ao palco. — Você estará performando algo?
— Na verdade — alguém diz, e com horror eu percebo que alguém sou eu —, eu estava prestes a me
inscrever.
Talvez ela me diga boa sorte ou que está ansiosa por isso ou que estou prestes a cometer o pior erro da
minha vida. É quando meu cérebro desliga temporariamente e Neil tem que me guiar até uma mesa.
— Você está tentando muito não sorrir, não é? — ele diz.
Eu aceno antes de deixar meu rosto se abrir.
— Oh meu Deus. Ela era tão legal? Eu amo ela? Eu soei muito ridícula ou apenas uma quantidade
normal de ridícula?
— Você estava bem — diz ele, sorrindo. — E você vai se apresentar?
Oh. Certo.
— Eu me deixei levar pelo momento.
— Eu acho que é uma grande ideia.
E talvez seja, ou pelo menos não terrível, porque eu, a nuvem humana Rowan Roth, de repente estou
indo até o hipster no balcão segurando uma prancheta.
— É uma noite tranquila — diz o cara quando pergunto se há algum espaço aberto. Ele está usando a
bandeira o cial de Seattle, uma camisa de anela xadrez. — Você pode subir em seguida, se quiser.
Com a voz trêmula, digo a ele meu nome antes de encontrar Neil de volta à nossa mesa. Ele pergunta se
pode me trazer água ou refrigerante, ou qualquer coisa, mas não tenho certeza se meu estômago seria capaz
de aguentar. Conforme eu removo meu caderno da minha mochila, meus dedos tocam meus novos livros
autografados. Escrevi os primeiros capítulos à mão antes de digitá-los e pre ro ler em papel do que em um
telefone.
Não consigo imaginar o melhor cenário possível, então também não me permito me preparar para o
pior. Isso não precisa ser assustador. Eu deixei Neil ler. Neil, meu rival e nêmesis, que costumava me
provocar implacavelmente sobre os livros que amo. E estou orgulhosa do que escrevi. Por que isso é tão
difícil de admitir, até para mim mesma?
— Aplausos para Adina — diz o mestre de cerimônias, suas botas fazendo as tábuas do assoalho
balançarem e rangerem. — É sempre um prazer tê-la de volta aqui.
A sala aplaude para a violista. Eu estava tão na minha cabeça que não tinha percebido que ela havia
terminado. Bato palmas junto com todos os outros, meu estômago realizando uma impressionante rotina
de ginástica.
Adina e eu nos cruzamos quando ela sai do palco, longos cabelos escuros caindo em suas costas, um
toque de vermelho em seus lábios. Suas bochechas estão coradas com a performance. Ela pode ser a pessoa
mais bonita que já vi de perto.
— Isso foi incrível — eu digo a ela.
Ela faz algo estranho então. Em vez de ignorar o elogio como outra pessoa faria, ela me deu um meio
sorriso, como se soubesse exatamente o quão incrível ela era.
— Obrigada. Eu já te vi aqui antes?
— Primeira vez — eu digo.
Seu sorriso ca mais amplo. Há uma facilidade para ela, uma tranquilidade.
— Venho aqui há alguns anos, principalmente nos recessos da faculdade. É um bom público. — Ela olha
para trás em direção ao público. — Seu namorado parece muito animado por você.
— Oh, ele não é… — eu começo, mas não estou prestes a recitar nossa história para essa desconhecida, e a
palavra "namorado" está fazendo coisas estranhas ao meu coração que eu não quero pensar antes de me
levantar naquele palco.
— Você vai se sair bem — ela me garante.
A voz do mestre de cerimônias:
— A seguir, temos uma recém-chegada, então vamos dar uma boas-vinda extra especial estilo Bernadette
a Rowan!
Subo até o palco, observando Adina se juntar a uma garota de cabelo curto em uma mesa nos fundos.
— Oi — eu digo no microfone. — Obrigada. — As luzes estão muito fortes. Demoro alguns segundos
para localizar Neil, e então me pergunto por que ele não se destacou para mim de imediato, porque ele está
sorrindo aquele sorriso genuíno, aquele que enruga os cantos dos olhos dessa forma adorável. E dane-se se
isso não acalma alguns dos nervos do meu estômago.
E lá está Delilah, dando-me toda a atenção, como se ela estivesse realmente interessada no que estou
prestes a ler.
— A propósito, isto é café — digo, gesticulando para o meu vestido, percebendo sob as luzes como a
mancha deve parecer marrom. — Um café com leite de avelã, para ser exata. Não, hum. Algo mais. Foi um
dia muito estranho.
Com isso, o público ri.
— Vou ler o começo de um romance em que estou trabalhando. É curto e tudo o que você realmente
precisa saber sobre ele é que é... um romance. — Algumas pessoas gritam com isso, e uma pessoa assobia.
Talvez seja Delilah. Talvez seja Neil.
— Aqui vai — eu digo, e então ca fácil.

Neil está esperando por mim do lado de fora, encostado no prédio de tijolos do outro lado do beco.
Quando terminei, ele ergueu o relógio e apontou o polegar na direção da porta. Meu coração ainda está
batendo forte, minha cabeça zumbindo. Uau, a adrenalina é selvagem.
— Eu consegui, porra — eu digo enquanto corro até ele.
Ele está radiante.
— Sim, você fez, porra — diz ele, combinando com o meu entusiasmo. — Você foi incrível.
Quando eu o alcanço, eu jogo meus braços em volta do seu pescoço em um abraço que claramente o
surpreende, dado como seu corpo pula para trás no início. Mas então ele relaxa, como se seu corpo
precisasse de um momento para processar o que estava acontecendo, e seus braços me envolvem, suas mãos
descansando nas minhas costas. Sou grata pelo moletom – estou suando como uma louca por baixo dele.
Meu rosto se encaixa no espaço abaixo de sua orelha, onde sua mandíbula encontra seu pescoço. Já nos
abraçamos antes? Esta pode realmente ser a nossa primeira vez. Eu coloco minhas mãos em seus ombros,
demorando-me no tecido macio de sua camiseta. Eu me pergunto se ele está com frio. Se eu devo devolver o
moletom dele, o que ainda estou usando. Ele cheira a uma combinação de chuva e suor de menino – não
totalmente uma coisa ruim – e, por baixo, algo limpo e reconfortante. Eu luto contra a vontade de inspirar
profundamente, para evitar soar como se eu estivesse literalmente inspirando ele.
— Eles não odiaram.
Seu pulso estremece contra minha pele.
— Porque foi bom.
Lentamente, nós nos afastamos do abraço, e eu não posso acreditar que acabei de fazer isso, e não posso
acreditar que Neil McNair estava aqui para ver e que ele está feliz por mim. Se fôssemos amigos em vez de
rivais, me pergunto quantos abraços a mais teríamos tido.
Foi uma adrenalina diferente de tudo que já experimentei, ler minhas palavras na frente das pessoas.
Pode ter sido ainda melhor do que ouvir a leitura de Dalila. Ela me ouviu, um completo ninguém esperando
um dia se tornar alguém.
— E Delilah está me seguindo no Twitter agora — digo, em parte para me distrair do quanto quero
abraçá-lo novamente. — Ela acenou para mim antes de eu sair, e ela simplesmente pegou o telefone e pediu
meu user e, ai meu Deus, o que eu devo twittar? Ela vai ver tudo. Talvez eu deva excluir minha conta.
Ele levanta as sobrancelhas.
— É assim que eu era quando conheci seus pais?
— Não. Você estava pior. — Agarro seu braço para olhar seu relógio. — Que horas são?
Tenho um telefone que sou perfeitamente capaz de tirar do bolso, mas há algo adorável na forma
anacrônica como Neil veri ca o relógio.
— Pouco depois das onze — diz ele. — Recebemos a próxima mensagem de zona segura enquanto você
estava lá.
Nós lemos juntos.

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A mensagem leva a um campo de minigolfe que não ca muito longe e pede que nos encontremos lá às
11h30.
— Eu preciso me sentar primeiro — eu digo, ainda trêmula com a adrenalina.
Como temos algum tempo extra, nos dirigimos para um banco no lado adjacente do estacionamento. O
frio parece me atingir de repente.
— Você quer seu moletom de volta? — Eu pergunto.
— Fique com ele. — Ele se mexe até que seu quadril esteja a alguns centímetros do meu. Eu poderia
colocar duas brochuras no espaço entre sua calça jeans e meu vestido. — É justo, dada a mancha de café.
Não tenho certeza se uma lavanderia a seco poderia salvar meu vestido depois de todo o sofrimento que
passei hoje, mas não sei se poderia jogá-lo fora. Será um troféu desta noite, uma lembrança de todas as coisas
que z, mas pensei que não poderia.
— Muito obrigada — digo a ele. — Por... por me ajudar a perceber que eu poderia fazer isso.
Levemente, eu chego mais perto dele no banco. Digo a mim mesma que é por causa do frio.
Eu sou uma grande mentirosa do caralho.
À luz da lua, seu cabelo parece bronze, como se ele fosse o busto de quem eu o provoquei hoje cedo. Não
consigo acreditar que isso foi há apenas algumas horas.
— Eu... não sei se você percebeu o quanto você me ajudou. — Ele diz isso para os joelhos desgastados de
sua calça jeans, em vez de para mim. — Todos esses anos. Eu não podia me dar ao luxo de não intensi car
meu jogo. Não foi só porque você me manteve alerta ou me fez melhor. Competindo com você, você no
geral… Você me ajudou a manter o foco. Me ajudou a evitar que tudo com meu pai se tornasse muito
opressor. Eu só... eu poderia ter me afogado tão facilmente nisso. E você fez isso sem nem mesmo tentar.
Isso parte meu coração de novo.
— Neil — eu digo baixinho. — Eu nem sei o que dizer sobre isso.
— De nada? — ele sugere, e eu rio, cutucando-o com meu cotovelo. Quase não há espaço entre nós
agora, e quando ele inclina a cabeça para olhar para mim, seus olhos me puxam para algo emocionante, algo
intenso. Não sei como perdi isso antes.
— De nada. E obrigada. De novo — eu digo, em seguida, avanço com o segredo que venho guardando
desde sua casa. — Então eu estive pensando. Se vencermos, você deve car com o dinheiro.
— Rowan...
Eu sabia que ele protestaria, então o interrompi imediatamente.
— E você não deveria cem por cento usá-lo para o seu pai. Ele fez algo horrível não apenas para aquele
garoto, mas para toda a sua família. Para você. — As palavras saem suavemente agora. — Você deve usá-lo
para você. Por algumas coisas boas. Mude seu sobrenome e talvez você possa estudar no exterior ou
conseguir um terno em... onde eles vendem ternos bonitos.
Ele ca quieto por alguns momentos. Eu teria certeza de que disse a coisa completamente errada se ele
ainda não estivesse quase me tocando, um sussurro de espaço entre seu quadril e o meu.
— Agora não sei o que dizer — diz ele, e força uma risada. — O que, como você sabe, é incomum para
mim. Não sei se conseguiria aceitar tudo isso, mas obrigado. Isso... parece realmente maravilhoso. — Ele
solta um suspiro e fala novamente. — Estou com medo — diz ele, e as palavras são tão suaves. Eu poderia
me en ar na cama com um cobertor feito de estou com medo. — Eu nunca disse isso a ninguém antes, mas
estou com muito medo do que vai acontecer quando eu for embora. Quero tanto ir embora, mas... co
preocupado por não ser tão independente quanto penso que sou. Vou para a faculdade e não saberei como
usar a máquina de lavar, embora já esteja lavando minha própria roupa há anos. Ou não saberei como me
locomover pela cidade e me perderei. Minha mãe parece feliz com Christopher, mas estou preocupado de
que ela se esforce demais. Estou preocupado de que minha irmã não consiga fugir de tudo. Ou que, onde
quer que eu esteja, não poderei fugir do meu pai.
“Às vezes me preocupo em acabar como ele. Eu me pergunto se esse tipo de coisa é genético. Se eu estiver
condenado a foder as coisas tanto quanto ele, se houver essa onda violenta dentro de mim.”
— Isso é terrível ‘pra’ caralho — eu digo, batendo em seu sapato com o meu, deixando-o saber que ele
está errado, que ele não está condenado. — E você não é nada disso.
Este menino é gentil até o m. Ele luta com suas palavras, não com os punhos. Ele está tão perto que eu
poderia usar a ponta do meu nariz para conectar cada sarda em suas bochechas. Esqueça a contagem. Sua
boca parece macia, e eu me pergunto como ele beijaria – lento e deliberado ou forte e desesperado, se ele
agarraria minha cintura ou meus quadris. Ele seria contido, cada movimento de seus lábios traçado de
antemão? Ou ele desligaria sua mente, deixaria seu corpo assumir o controle?
A ideia de ele perder o controle daquele jeito é quase demais para meu pobre cérebro aguentar.
— Você não tem que falar sobre isso — eu digo. — Se você não quiser.
— Essa é a questão. Eu acho que eu quero. Não falo sobre isso há muito tempo e com você... por algum
motivo, não é tão difícil quanto pensei que seria.
— Eu quero fazer uma piada suja agora, mas não quero envergonhar você.
Ele cutuca meu ombro com o dele. É um tipo de gesto de provocação amigável que me faz ter
pensamentos totalmente hostis. E nossas pernas – ainda quase se tocando. Parece mais íntimo do que nossa
dança na biblioteca. Nunca estive tão ciente de cada nervo na parte externa da minha coxa.
Um carro buzina a algumas ruas de distância e, quando viro a cabeça por instinto, percebo que um
pouco do meu cabelo está preso entre as ripas do banco. Apenas no caso de eu não ser bagunça o su ciente
esta noite. Eu alcanço meu coque bagunçado que está mais bagunçado do que neste ponto e puxo-puxo-
puxo para fora de seu elástico e al netes.
— Pode ser uma causa perdida — digo a título de explicação. — Eu selei seu destino quando tomei
banho no escuro esta manhã e não pude secar, e está cando exponencialmente pior a cada hora.
Neil me observa penteando meus dedos por ele.
— Isso, uh, não parece ruim, você sabe. Você brincou com isso o dia todo, mas sempre parece bom.
E então ele faz algo que talvez choca a nós dois: ele pega um dos meus cachos soltos pelos al netes,
roçando-o com a ponta do dedo. Como se dissesse: Isso. Esse é o cabelo que sempre fica bom. É tão leve, aquele
toque. A gentileza me dizima, do jeito que ele é incerto, mas corajoso ao mesmo tempo. A ponta do dedo
desaparece antes que eu possa me inclinar para ele, mesmo enquanto estou imaginando como seria para ele
deslizar ambas as mãos em meu cabelo.
Sempre parece bom.
— E eu realmente não odeio seus ternos — digo-lhe. — Quero dizer, não que arrogante sobre isso ou
algo assim. Ainda é uma coisa extremamente idiota de usar no colégio, mas... você não ca horrível com eles.
— Não somos os melhores em elogios, somos?
— Eu sou a melhor — digo, e ele ri. Sua risada soa como a primeira música indie pop pegajosa que ele
tocou para mim na Doo Wop Records, os Free Puppies! 1. Atrás dos óculos, seus olhos escuros se
iluminam, cando âmbar. Mais uma vez, estou convencida de nunca ter prestado atenção su ciente nele
quando ri. Talvez ele não tenha feito o su ciente na minha presença. Talvez ele tenha me olhado apenas com
os olhos semicerrados, as sobrancelhas franzidas em aborrecimento. Mas esta noite eu quero fazê-lo rir de
novo e de novo.
Com o coração martelando, eu mudo minha perna até que ela nalmente está bem contra a dele,
fechando a distância entre nós. Eu não aguentava mais, sem tocá-lo.
Sua respiração ca presa na garganta. Deus, esse é um ótimo som.
— Você está com frio? — Ele pergunta, e isso me faz sentir um pouco culpada, já que estou usando seu
moletom.
— Um pouco — eu digo, surpresa com a aspereza repentina da minha voz. Se o frio o deixa mais perto,
então eu sou a merda da Antártica.
Então eu ouço, sinto o farfalhar do tecido quando ele move sua perna contra a minha também, essa
pressão que con rma o que está acontecendo é absolutamente deliberada, e estamos quadril com quadril e
coxa com coxa e joelho com joelho. Ele roça meu joelho uma vez com o polegar, um pequeno golpe rápido.
Esse golpe merece seu próprio romance.
— Bem? — Ele pergunta, e eu não sei se ele está perguntando se estou bem, se o que estamos fazendo
está bem, ou se estou pronta para ir, e não estou. Eu não estou. Está frio, mas eu poderia acender um fogo
com a sensação de estar tão perto dele. Sim, está tudo bem, mas também não é o su ciente.
Tudo o que posso fazer é acenar com a cabeça. De repente, seu moletom parece muito quente. Lamentei
o que perdemos por não sermos amigos, mas e se nos tornássemos amigos e depois outra coisa? Talvez
tivéssemos compartilhado todos os nossos primeiros. Aprendemos juntos, exploramos juntos e, além do
físico, teríamos nos ajudado naqueles dias difíceis. A noite toda, estive defendendo minhas emoções porque
não conseguia admitir a realidade: que tenho sentimentos verdadeiros por esse menino. Tem tantas coisas
que eu não sabia sobre ele, como que ele é fã de livros infantis e sua palavra favorita é 'tsundoku' e ele
mesmo altera os ternos. Ele se preocupa com sua mãe e sua irmã. Ele se preocupa comigo, Rowan Roth, a
garota que ele está tentando destruir há quatro anos.
Nunca experimentei algo que abalasse a terra, como Neil disse. Mas tenho a sensação de que se algo
acontecesse conosco... poderia ser assim.
E essa possibilidade é o que me atrai como um ímã em direção ao meu antigo inimigo, Neil McNair, que
está olhando para minha boca como se tivesse acabado de descobrir o sinônimo perfeito para uma palavra
que não tem nenhuma.
E talvez seja o que o atrai para mim também.
— Rowan, certo?
Uma voz quebra a escuridão, e Neil e eu nos separamos antes que nossos lábios se encontrem.
— Ei, garota, era você no palco da Bernadette’s? — Uma garota que parece ter vinte e poucos anos está
parada a alguns metros de nós, um gorro escondendo seu cabelo, a luz da lamparina brilhando em um
piercing no septo.
— E-ei — eu resmungo. — Sim. Sim. Era eu.
Minhas bochechas estão em chamas, como se eu tivesse sido pega fazendo algo que queria que fosse
privado. Se ela viu o que talvez estivéssemos prestes a fazer, ela não percebeu ou não está deixando
transparecer. Não consigo nem olhar para Neil, que está congelado ao meu lado.
Um pé de espaço de repente se materializou entre nós no banco. Como se ele também estivesse
preocupado em ser pego.
Ela abre um sorriso.
— Adorei a sua apresentação. Sou viciada em romances, mas nenhum dos meus amigos realmente
entende. E lá estava você, lendo um romance em um microfone aberto e possuindo-o.
Uau, adoraria ter essa conversa literalmente em qualquer outro momento.
— Obrigada. Muito obrigada. — Obrigada por arruinar o que pode ter sido o momento mais romântico
da minha vida.
— Eu só tinha que te dizer. — ela diz. — Espero vê-la no próximo!
— Sim. Espero que sim.
Ela acena e sai voando noite adentro.
O lado esquerdo do meu corpo está frio e estou tremendo de novo. Eu quero aquela suavidade de Neil
de cinco minutos atrás, mas agora ele é uma estátua, coluna de ferro e ombros de concreto. Estávamos
prestes a nos beijar. Eu não apenas imaginei.
Finalmente, Neil ganha vida.
— Devemos ir — diz ele, levantando-se de um salto e tirando o pó das calças. — Temos que estar no
minigolfe às onze e meia.
— Certo — eu gerencio. Eu co com as pernas bambas.
Nenhum de nós diz uma palavra durante toda a caminhada até o meu carro.
PISTAS DO HOWL

Um lugar onde você pode comprar o primeiro álbum do Nirvana


Um lugar que é vermelho do chão ao teto
Um lugar onde você pode encontrar Chiroptera
Uma faixa de pedestres em arco-íris
Sorvete adequado para o Pé-Grande
O grandalhão no centro do universo
Algo local, orgânico e sustentável
Um disquete
Uma xícara de café com o nome de outra pessoa (ou seu próprio nome, totalmente incorreto)
Um carro com multa de estacionamento
Uma visão do alto
A melhor pizza da cidade (à sua escolha)
Um turista fazendo algo que um morador teria vergonha de fazer
Um guarda-chuva (todos nós sabemos que os verdadeiros moradores de Seattle não os usam)
Uma homenagem ao misterioso Sr. Cooper
23h26

TIVEMOS muitas viagens de carro estranhas hoje, mas esta é silenciosa. Neil está olhando pela janela, o
queixo apoiado em uma das mãos. Eu quero colocar minha música melancólica. Quero que ele me diga a
etimologia de “coração partido”.
A dor em meu peito só se intensi cou desde que deixamos o banco. Ele aprendeu a esconder muito de si
mesmo depois do que aconteceu com seu pai, e com base na maneira como ele se tornou estóico, ele ainda
está se destacando nisso. E porra, é esmagador. Eu não gosto nada disso, não do aperto no meu peito ou da
pressão crescendo atrás dos meus olhos.
Eu juro que ele estava se inclinando para mim também. A menos que, agora que temos distância da
adrenalina do microfone aberto, ele tenha percebido o erro colossal que quase cometemos. Talvez ele esteja
feliz por termos sido interrompidos. Lamenta o que quase aconteceu. Seis horas atrás, eu também teria
cado horrorizada com isso – ou caria mesmo? Quando isso realmente começou para mim? Porque tenho
quase certeza de que não foi hoje. Quando sonhei com ele? Esteve adormecida desde aquela paixão
passageira do primeiro ano? Não, não pode ter sido. Isso é algo novo, o que sinto por ele, mas também é
antigo e familiar. Eu o provoco sobre seus ternos, mas eu os amo, não é? E as sardas. Deus, as sardas. Eu sou
viciada por suas sardas.
Ele ca olhando entre seu relógio e o relógio do meu painel.
— Está três minutos adiantado. — eu digo.
— Nós vamos chegar em cima da hora.
O que ele não diz: se não tivéssemos ido ao microfone aberto, se não tivéssemos cado naquele banco, se
não tivéssemos quase nos beijado, não estaríamos ameaçando nosso status do howl.
— Havia uma vaga lá atrás — ele diz enquanto eu faço um loop ao redor.
— Era muito pequena.
Minha direção é segura, mas frenética, especialmente depois do acidente esta manhã, mas eu juro, somos
atingidos por todos os sinais vermelhos, o que nos abençoa com mais tempo para sentar em silêncio. Neil
suspira, tosse e suspira de novo, parecendo se preparar para dizer algo para o qual nunca encontra palavras.
— Atrasados. — ele diz baixinho quando eu estaciono meu carro perto do campo de minigolfe no
centro da cidade.
Não chore.
— Não podemos estar.
— Você não pode exatamente discutir com o tempo. Se estamos atrasados, estamos atrasados. É apenas
um fato.
Esse fragmento me pega desprevenida. Não foi assim que nós nos falamos nos últimos quatro anos.
Sempre houve um respeito ali. Eu não sei o que é isso, mas faz um buraco duro no meu estômago. Ele
lamenta o que quase aconteceu. Estou certa disso.
Logan Perez está na porta, armado com sua prancheta.
— Vocês dois estão atrasados — ela diz, balançando a cabeça.
— Apenas dois minutos — eu digo debilmente, mas sou uma seguidora de regras até o m. Tarde é
tarde, seja dois minutos ou duas horas.
— Logan. — Neil se endireita. — É minha culpa. Eu nos obriguei a tomar esse caminho estranho,
embora Rowan não quisesse. Elimine-me, se for preciso. Mas deixe-a car.
Meu rosto aquece imediatamente, e o buraco no meu estômago amolece. Não tenho certeza do que ele
está tentando fazer aqui. Ele não disse abertamente que aceitaria o dinheiro se ganhássemos, mas se eu fosse
a única que restasse, estaríamos reduzindo nossas chances de forma signi cativa.
O olhar de Logan passa rapidamente entre nós dois.
— Eu não deveria fazer isso — diz ela —, mas, como presidente iniciante, imagino que tenho algum tipo
de poder executivo. Em geral, me considero muito insensível. Mas o que você está fazendo, Neil, é muito
fofo. Isso me faz sentir algo certo nesta vizinhança geral. — Ela segura a mão sobre o coração e sorri. —
Vocês dois podem permanecer no jogo, mas não falem nada sobre isso para ninguém. — Nós acenamos
com a cabeça, e ela se afasta para nos deixar passar. — Aproveite a sua segurança.
Uma vez lá dentro, ele ca repentinamente fascinado com as alças de sua mochila.
— Você não precisava fazer isso — digo, ainda sem ter certeza de como interpretar.
Ele encolhe os ombros.
— Você estava certa. Não deveríamos ter feito tantos desvios.
Isso me faz sentir que tenho cerca de sessenta centímetros de altura.
— Acho que te vejo em meia hora?
Ele acena em concordância e mais uma vez desaparece com seus amigos. Nunca quei tão aliviada em ver
as minhas. Mara acena e Kirby, um pouco mais hesitante, oferece um sorriso.
— Oi — digo, instável em meus pés. Se vou chorar, pelo menos minhas amigas estão aqui. — Acho que
preciso conversar.

Em um canto escuro de um campo de minigolfe coberto, depois de me desculpar mais uma centena de vezes
por estar chateado com a viagem de Chelan, confesso a minhas amigas o que elas suspeitaram por todos
esses anos: que meus sentimentos por Neil McNair vão mais fundo do que rivalidade.
Conto tudo o mais também sobre os livros que li e o livro que estou escrevendo e Delilah Park.
— Vão em frente — eu digo, pressionando minhas costas contra a parede, me preparando. — Façam
piadas sobre mim.
— Você está escrevendo um romance — diz Kirby lentamente. — Você mostrou para Neil.
Miseravelmente, eu aceno, esperando que elas insistissem que eu poderia ter mostrado a elas. Mas me
sinto melhor agora, sabendo que não estou mais me escondendo.
— Você não achou que a apoiaríamos? — ela pergunta. Não há diversão em seu rosto. Acho que ela
pode se machucar.
— É um romance. Você deixou bem claro o que pensa sobre eles.
— Sim, mas… — Kirby balança a cabeça. — Eu não sabia que você os amava, os amava. Eu estava
sempre brincando. Não era para ser má. Você nunca deu a impressão de que gostava tanto deles, apenas de
que os lia por aí.
— Porque eu estava com medo — eu digo em voz baixa. — E eu não quero ter. Talvez eu não seja a
escritora mais incrível ainda, mas acho que estou bem. E tenho muito tempo para melhorar. Não quero ter
vergonha do que gosto.
Mara cou calada durante toda a conversa, o que não é totalmente incomum para ela.
— Eu gosto de Harry Styles — ela nalmente diz, o que surpreende a nós duas.
Kirby se vira para ela.
— Mesmo? Você nunca me disse isso. Quer dizer, posso admitir que ele é um cara bonito.
Um rubor rasteja em suas bochechas.
— Não. Gosto da música dele.
— Oh — diz Kirby. — Nunca ouvi.
— É bom — insiste Mara. — Vou mandar algumas músicas para você.
Então, Mara e eu olhamos para Kirby, como se esperássemos sua con ssão.
— Ok, ok — ela diz. — Amo reality shows. Mas nem mesmo os shows que exigem talento, como canto
ou design de moda. As coisas realmente ruins que são apenas pessoas ricas gostosas gritando umas com as
outras. Comecei a assistir ironicamente com minha irmã alguns anos atrás, antes de ela ir para a faculdade,
mas então comecei a gostar de verdade.
— Eu amo o Harry Styles! — Mara grita, em um movimento que está completamente fora do
personagem dela, e então ri quando alguns colegas olham em nossa direção com as sobrancelhas levantadas.
— E eu não me importo que saibam disso!
Eu adoro ela.
— Talvez você possa recomendar alguns livros para nós — diz Kirby, e meu coração dispara.
— Eu de nitivamente posso fazer isso.
Recuperada da explosão, Mara coloca a mão no meu joelho.
— Então... Neil.
Até mesmo seu nome traz calor ao meu rosto.
— Por um tempo, pensei que vocês só precisavam car e tirarem isso de seus sistemas — diz Kirby. —
Você realmente gosta dele, no entanto.
— Deus. Eu realmente gosto. Mas foi como se o que aconteceu no banco acionasse algum tipo de
interruptor com ele, e agora ele está agindo ainda mais estranho do que o normal.
— Parece que ele cou com medo — diz Mara. — Eu me senti assim com Kirby no início. Que se
fôssemos fazer isso, não poderíamos voltar a ser como as coisas eram antes. Que mudaria nossa amizade para
sempre, para melhor ou para pior.
— Felizmente, para melhor — interrompe Kirby.
Mara entrelaça os dedos com os de Kirby.
— E a escola pode ter acabado, mas você teria que descobrir o que vai acontecer neste verão e na
faculdade, supondo que vocês não tenham se matado até então. Isso é assustador. Estamos indo para o
mesmo lugar, e ainda estou apavorada.
Kirby pisca para ela.
— Você está?
— Bem, sim. Teremos novas aulas e conheceremos novas pessoas, e estaremos meio que morando por
conta própria. Nós vamos mudar.
— Mas eu gosto de mim mesma — Kirby diz com um pequeno gemido, e Mara dá um tapa em seu
braço.
Adoro elas. Eu amo tanto as duas, e talvez eu não as mereça, mas estou tão feliz por tê-las agora.
— Eu sinto muito — eu digo novamente. — Sobre tudo com Neil, e por abandonar vocês.
— Você não pode apagar toda a nossa história em apenas alguns meses — diz Mara. — Mas se você
realmente quiser me compensar, pode compartilhar algumas de suas fotos do Howl.
— Sem chance.
— E eu não vou dizer 'boa viagem' porque nós tivemos uma briga. — Kirby sorri tristemente. — Tudo
que eu queria é que tivesse acontecido antes. Nós quatro poderíamos ter saído juntos, ter encontros-duplos.
Há aquela pontada de arrependimento de novo, aquela que me faz desejar que os últimos anos tenham
sido diferentes. Posso imaginar: madrugadas no Capitólio, ocupando um estande inteiro na Hot Cakes,
Mara tirando fotos ridículas. Tenho que pressionar a mão no peito, como se o arrependimento fosse uma
dor física.
— Não sei como vai ser, se acontecer alguma coisa conosco. — É bizarro reconhecer isso como uma
possibilidade. Algo pode acontecer conosco. — Mas eu sei que quero que vocês duas façam parte disso. Bem,
nem tudo.
— Quero todos os detalhes do McSórdido. — diz Kirby, batendo os cílios.
Eu rolo meus olhos.
— Como você diz à pessoa que passou quatro anos tentando destruir que tem uma queda por ela?
— Acho que há um livro sobre isso — diz Mara. — E que você provavelmente já leu.
— Certi que-se de que ele saiba que você fala sério e de forma genuína. Sem sarcasmo — diz Kirby. —
Você é presunçosa. Tenho plena con ança de que você pode superar isso.
— Vou tentar. — Estou tão dominada pela emoção neste momento – por toda esta noite e por elas.
Então eu tenho uma ideia. — Ei– podemos tirar uma foto? Faz algum tempo.
Mara já está pegando o telefone.
— Achei que você nunca iria perguntar.
E não me importo se meus olhos estão inchados e minha maquiagem desbotada e meu vestido está, bem,
você sabe. Mara estende seu braço de sel e experiente e juntamos nossas cabeças e, sem nem olhar, já sei que
é perfeitamente imperfeito.
Ao longe, um apito soa e, em seguida, ouço a voz de Logan nos alto-falantes:
— Wolf Pack! Vocês têm três minutos até que o tempo da zona de segurança expire. Todos, por favor,
prossigam para a saída de forma ordenada.
— OK. — Eu co de pé, renovada e reenergizada. — Eu estou indo fazer isso. Eu vou contar a ele.
Ainda estou me sentindo um pouco como uma girafa recém-nascida aprendendo a andar, mas depois de
abraçar minhas amigas, estou mais sólida. Firme.
— Você pode se orgulhar de alguém que tem a mesma idade que você? Porque estou orgulhosa de você
— diz Mara, e isso faz com que as lágrimas voltem aos meus olhos por um motivo totalmente diferente.
Quando vejo Neil, meu estômago se revolta. Se possível, ele parece ainda mais bonito do que antes.
Tudo que eu quero é envolver meus braços em volta dele novamente, para ele me puxar para perto, do jeito
que nos abraçamos depois de Bernadette’s. Eu quero voltar para aquele banco e subir em seu colo. Eu quero
beijá-lo como nunca beijei ninguém. Quero que ele se perca em mim de uma maneira que nunca foi capaz
de imaginar – ou talvez seja porque não pode imaginar isso acontecendo com ninguém, exceto eu.
Oi. Eu posso gostar de você. Você quer comer outro pãozinho de canela comigo?
Então você sabe como eu te odeio? Acontece que eu não sei!
Você. Eu. Banco de trás do meu Honda Accord. Agora.
— Está pronta? — ele pergunta.
Estou tão presa em meus pensamentos que o que sai é:
— Huh? — o que o faz levantar uma sobrancelha para mim. Eu me sacudo para fora disso. — Sim.
Vamos pegar a pista da vista no lugar que você insiste ser a melhor vista de Seattle, então ver se podemos
descobrir qual é o mistério do Sr. Cooper.
Logan sopra outro apito, o que signi ca que temos cinco minutos para nos afastarmos o mais possível
deste lugar antes de começarmos a matar novamente. Alguém abre a porta e Neil e eu corremos para ela,
correndo em direção ao meu carro na escuridão tenebrosa.
Nós ziguezagueamos pelas ruas, garantindo que ninguém que tenha nossos nomes possa nos seguir.
Ficou muito mais frio, e coloco minhas mãos nos bolsos do capuz. Eu deveria devolver, eu sei que deveria,
mas eu gosto muito.
Estamos quase no meu carro quando meus dedos se fecham em torno de um pequeno pedaço de papel
no bolso.
Eu deslizo até parar e puxo-o para fora, meu coração despencando enquanto eu leio e releio o nome
escrito nele. Não. Não, não, não. Com o polegar, traço a tinta das letras, tentando fazer com que façam
sentido.
Rowan Roth.
00h05

NEIL TEM MEU nome.


Neil tem meu nome.
Neil não matou ninguém, o que signi ca que ele tem meu nome desde o início do jogo.
— Rowan? — ele está dizendo. Não é “Artoo”. Porque não somos amigos. Não somos o que quase nos
tornamos naquele banco. — Fico me perguntando se Cooper esteve envolvido na fundação de Seattle de
alguma forma, ou algo mais na história de Seattle, talvez. Encontrei este artigo sobre Frank B. Cooper, esse
cara que supervisionou a construção de novas escolas nos bairros de Seattle. Será que isso está nos levando à
primeira escola em Seattle ou é muito tortuosa? O que você acha?
Meu coração está batendo forte e oh meu Deus, oh meu Deus, oh meu Deus. Não consigo pensar nas
escolas Frank B. Cooper ou Seattle agora. Eu balanço para frente e para trás em meus calcanhares, puxando
as alças da minha mochila, meu rosto em chamas.
De repente, é tão óbvio: quando ele cou inquieto depois que eu o salvei, como ele não perseguiu
Carolyn Gao. Ele fez isso apenas para que pudesse me derrotar uma última vez. Ele brincou comigo,
deixando-me entrar em sua casa e seu quarto, me contando seus segredos e ouvindo os meus. Só para
esfregar isso quando ele me matar, mesmo depois de nos aliarmos.
Não posso acreditar que estava prestes a dizer-lhe que sentia algo por ele.
Fecho meu punho em torno do pedaço de papel. Lentamente, eu me viro para encará-lo, abrindo minha
mão, revelando meu nome.
Nós pairamos naquele espaço por alguns segundos, congelados.
A cor desaparece de seu rosto.
— Oh. Merda — ele murmura. — Eu posso explicar isso.
— Eu realmente adoraria ouvir isso.
Ele esfrega os olhos, empurrando os óculos.
— Eu sinto muito. Eu... eu não queria que você descobrisse.
— Obviamente — eu engasgo. —Você me teve o tempo todo?
Com um aceno miserável, ele diz
— Desde Cinerama. Sim. Eu deveria ter te contado. Eu apenas pensei – pensei que você não con aria em
mim se soubesse.
A ironia das ironias.
— Então, qual era o seu plano? Manter em segredo até o m, depois me surpreender porque já con ei
em você? Me amolecer, me faça baixar a guarda? — Eu balancei minha cabeça. Mais do que tudo, é sobre a
perda de con ança, não o grande prêmio. — Você sabe que não se trata mais de dinheiro para mim. Por que
você simplesmente não me contou?
Ele não diz nada.
— Bem, parabéns porra. Você me pegou. Então vá em frente. Me mata.
Estendo meu braço para ele, indicando que ele deve passar a braçadeira azul.
— Isso não é o que eu–
— Apenas faça isso, ok? — Eu corto. Nós dois olhamos para ele. Levemente, cutuco seu ombro, mas ele
não se move, como se fosse feito de metal em vez de pele e ossos. — Pare de falar olhando para seus sapatos!
Pelo menos me olhe nos olhos.
Quando ele nalmente levanta seus olhos para os meus, meu estômago embrulha. Ele parece mais
angustiado do que a noite toda.
— Rowan — ele diz, a voz tremendo, claramente tentando soar gentil. Ele engole em seco. — OK. Você
tem razão. Eu não iria esperar até o m no início. Quando estávamos na loja de discos, tive um momento
em que pensei: ‘É isso. Eu estou indo fazer isso.’, mas não consegui. Eu não sei. Estávamos nos dando bem e
foi – me perdoe – bom. Foi legal. Eu gostei de car com você.
— Você diz isso como se fosse um choque — digo, embora não possa negar como é bom ouvir isso. —
Como se fosse impossível ter gostado da minha companhia.
Ele cruza os braços.
— Nós dois sabemos que sua autoestima não é tão baixa. Desculpe, eu queria passar mais tempo com
você. Sinto muito por querer mantê-la no jogo – o que, devo salientar, foi exatamente o que você fez por
mim em Pike Place – para que pudéssemos lutar um contra o outro no nal e para que você pudesse
nalmente me derrotar, já que aparentemente é a única coisa que importa para você.
— Não é. — Faz horas que não.
Sob suas sardas, seu rosto é uma confusão de manchas vermelhas de raiva. Não é fofo. É enfurecedor pra
caralho. Perto dele, posso ver todas as suas sardas, além de uma cicatriz no queixo que nunca tinha notado
antes. E eu nunca o vi com pelos faciais, mas agora que ele esteve fora a noite toda, uma poeira ruiva está
começando a crescer, e não parece terrível. Exceto que é Neil, e eu o desprezo – não é? – e portanto, é.
— Até hoje — diz ele — nós apenas meio que nos conhecíamos. Eu sabia que você odeia quando não
consegue votos su cientes para uma medida no conselho estudantil e que gosta de romances. Mas não sei
por quê. Eu não sabia sobre sua família ou sua escrita. Não sei o quanto você gosta de canções tristes ou por
que adora ler os livros que adora. E — ele respira fundo — você também não sabia sobre mim. Você não
sabia sobre minha família. Você sabe quantas pessoas eu voluntariamente contei sobre meu pai? — Ele
balança a cabeça. — Talvez cinco? E eu con ei em você com isso. Não con ei em ninguém com isso, não
por muito tempo.
Ele está se desculpando. Ele claramente se sente mal com isso. Talvez não seja tão terrível ele esconder isso
de mim. Talvez possamos superar isso, continuar jogando.
O luar atinge seu rosto, e não posso negar o quão lindo ele parece.
— Nós compartilhamos algumas coisas realmente pessoais — diz ele. — Isso não importa realmente?
Eu também estou corando. Eu posso sentir isso. Estou pensando sobre o que conversamos na biblioteca.
Como era seguro ter essas conversas perto dele. Como gostei de brincar com ele, mas mais do que isso...
Eu queria beijá-lo e queria que ele me beijasse de volta. Isso é o que eu queria.
O que eu quero.
— Isso importa — eu digo, me aproximando. Eu não quero entrar em con ito com ele. O dia passa pela
minha mente: a assembléia, meu resgate no Pike Place Market, discutindo sobre pizzas. A loja de discos, o
laboratório de Sean Yee e a casa de Neil, o lugar onde ninguém vai. Minha casa, então, o zoológico e a
biblioteca. A biblioteca. A dança. Depois, Two Birds, e cantando enquanto esfregava pratos, e o microfone
aberto e como me senti incrível depois disso.
O banco.
Quanto disso era real? O que aconteceu na casa dele, sim, e o que aconteceu na minha. Mas tudo mais?
Antes de perdoá-lo, tenho que saber com certeza.
— Eu só preciso saber — eu digo. — Quanto do dia de hoje foi real? Porque o que aconteceu no banco –
quase nos beijamos, Neil. — Essa última parte, eu sussurro.
Eu não queria que fosse um quase, vou me obrigar a dizer. Eu queria sua boca na minha e suas mãos no
meu cabelo. Não era algo que eu tinha imaginado por meses e meses. Eu não tinha noções preconcebidas de
como seria e, pela primeira vez, queria desligar meu cérebro e simplesmente sentir.
Não sei como explicar a ele como isso é incomum para mim.
Ele ca ainda mais vermelho.
— Eu acho que é bom não termos feito isso. Nós apenas... fomos pegos no momento. Teria sido um
erro.
Um erro.
Ele encurva os ombros, virando-se ligeiramente para longe de mim. O choque de saber que isso foi
unilateral me faz recuar alguns passos. Uma pedra empurrou em meu peito. Então eu fui tocada. Depois de
todas essas horas, ainda sou apenas um jogo para ele.
Horas. Faz apenas horas. Uma mente não pode mudar tão rapidamente – e ainda assim a minha mudou.
Eu tinha certeza que o dele também.
Eu forço meu rosto a não cair, forço minhas mãos a não tremerem. Meu coração, porém – é esse que não
consigo controlar. Quando eu era mais jovem, nunca entendi quando alguém “sentiu um aperto no
coração” em um livro. Não é fisicamente possível, disse a quem quisesse ouvir. Agora eu sei mais do que
nunca exatamente como é a sensação de um coração afundar. Exceto que não é apenas meu coração; é meu
corpo inteiro que quer desmoronar.
Ele está tão envergonhado com o que aconteceu no banco que nem olha para mim, em vez disso está
imerso no que deve ser um mergulho fascinante na calçada.
— Rowan? — ele diz, como se quisesse ter certeza de que o ouvi me quebrar.
— Certo. Certo — eu digo com mais convicção do que sinto. Está muito frio lá fora, e abraço meus
braços com força. Isso não impede aquela sensação de afundamento. Isso não impede a pressão crescente
atrás dos meus olhos ou a forma como minha voz soa tensa e estridente. — Um grande erro. Entendi.
— Que bom que estamos na mesma página — ele diz, mas suas palavras são cortadas e ele soa tudo
menos feliz.
— Ainda bem que recuperamos os nossos sentidos. Quero dizer, você e eu? Em que universo isso faria
sentido? — Se eu me forçar a dizer em voz alta, talvez eu acredite. Tem que fazer isso doer menos. — O resto
da classe do último ano teria rido com isso.
Penso em todos os momentos em que fui muito cruel, nas vezes em que o afastei. Se eu tivesse feito o
oposto, estaríamos tendo essa conversa? Ou seria apenas mais doloroso?
— Podemos – podemos simplesmente esquecer isso? — ele pergunta. Gaguejando. — Por favor?
— Certo. Certo. — Eu me ajoelho para abrir minha mochila, procurando minhas chaves. Eu não posso
olhar para ele agora. Não quero que ele veja que estou prestes a chorar. Ele não precisa de mais munição.
Deus, o que há de errado comigo? Neil McNair não teria sido meu namorado perfeito. Sob nenhuma
circunstância ele é a pessoa com quem eu deveria estar.
Meus dedos se fecham em torno do metal frio, e fecho o punho com força em torno das teclas para me
ancorar. Talvez ele mereça vencer o jogo, a nal. Ele me enganou fazendo-me pensar que tinha sentimentos
por ele, então de alguma forma os tornou reais. Ele é o verdadeiro campeão de Westview, garantindo que
esta competição nal terminaria comigo totalmente afundado.
— Nós só temos mais duas pistas — ele diz, suavemente desta vez. Ele se vira para me encarar. Foda-se.
Espero que ele não ache que precisa me tratar com delicadeza agora. Não tenho certeza do que seria pior, a
provocação quando confessei minha paixão do nono ano, ou isso. — Vamos nalizá-los e então podemos
resolver tudo isso.
Isso é pior. De nitivamente isso.
— Não há– não há nada para resolver. — Eu pulo de pé tão rapidamente que minha cabeça gira. Eu
aperto as chaves com mais força. — Podemos seguir nossos caminhos separados agora ou no nal do jogo,
ou após a formatura. Por que adiar? Você e eu não sabemos ser amigos. — A vingança me preenche, do jeito
que tem feito todos esses anos. Tem que substituir a sensação de afundamento. O afogamento. Eu quero
machucá-lo de volta. E eu sei exatamente onde espetar bem entre suas costelas para que ele sinta mais. — A
pior parte é – gostei da pessoa que você foi hoje! Também gostei de passar um tempo com você. E é por isso
que é tão perturbador você ter escondido algo o dia todo. Você poderia ter me dito tantas vezes, mas não o
fez. Achei que você fosse diferente, mas talvez você seja mais parecido com seu pai do que pensava.
O arrependimento me atinge imediatamente. De novo, com essa habilidade estelar, tenho que derrubá-
lo. Isso me fez forte nos últimos quatro anos, mas esta noite só me fez sentir pequena. Esta não sou eu. Pelo
menos – eu não quero que seja.
Eu observo seu rosto enquanto o comentário o atinge. Seus olhos escurecem e sua boca se abre um
pouco, como se ele pudesse dizer algo, mas não sai nada.
— Isso é um golpe baixo de merda, e você sabe disso — diz ele. — Se estamos falando de falhas pessoais, e
quanto a você?
Eu dou um passo para trás.
— E quanto a mim?
Ele joga as mãos para cima.
— Rowan! Você está se sabotando. Você tem feito isso há anos. Aquele guia de sucesso do ensino médio?
— Eu não pensava nisso há muito tempo — digo baixinho, me perguntando por que de repente me
sinto na defensiva novamente.
— Você fez essa lista quando tinha quatorze anos. Claro que você vai querer coisas diferentes agora. Você
é uma pessoa diferente. Você cresceu e mudou e isso é uma coisa boa — diz ele. — Quando estávamos no
zoológico, você estava realmente chapada ou estava usando isso como desculpa porque estava ansiosa demais
para conhecer Delilah?
— Não — eu insisto, mas de repente não tenho certeza. Aquela pequena fatia de alívio que senti – é isso
que foi?
— Spencer? Kirby e Mara? A sua escrita, aquilo que deseja dedicar toda a sua vida? Você mesmo disse.
Você está tão preocupada que a realidade não vai corresponder ao que está em sua cabeça que você nem
mesmo tenta coisas que te assustam, e você não percebe que há um problema com seus relacionamentos.
Porque se você não tem que enfrentar isso, então ele não existe. Certo?
Eu estou balançando minha cabeça.
— Eu não. Não. — Eu subi no palco hoje à noite no microfone aberto. E Kirby e Mara, estamos bem.
Nós vamos resolver as coisas. Neil não sabe disso, mas não vou contar a ele. Eu não devo nada a ele. Eu não
tenho que convencê-lo de que ele me entendeu errado.
Ele se endireita em sua postura completa. Exatamente minha altura, mas de alguma forma ele parece
muito mais alto agora.
— Você está atrapalhando a porra do seu próprio caminho e, até perceber isso, nunca cará feliz com a
sua realidade.
Eu só tenho mais uma resposta.
— Se não somos amigos — eu digo, minha voz com um som horrível engasgado — então por que você
ainda está aqui?
Seu rosto é uma mistura de emoções doloridas. Mágoa, confusão – arrependimento? Talvez seja uma
ilusão da minha parte.
— Boa pergunta.
Com isso, ele se coloca de costas para mim, ombros curvados contra o vento, e vai embora.
E então estou sozinha na noite fria e escura.
POSIÇÕES DO HOWL

TOP 5

Neil McNair: 14

Rowan Roth: 13

Brady Becker: 12

Mara Pompetti: 10

Iris Zhou: 8

JOGADORES RESTANTES: 13
00h27

SE PIKE PLACE Market realmente estiver assombrado, os fantasmas estariam fora agora. Eu me sinto um
pouco horrível enquanto desabo pelo centro da cidade, passando pelo distrito comercial e ao longo da orla.
Está mais frio aqui. Congelante.
Eu abraço o moletom de Neil mais apertado em torno de mim, desejando que pertencesse a qualquer
pessoa, exceto ele. É irritante que ainda cheire bem. Maldito seja, moletom com cheiro bom que não posso
tirar sem congelar.
Meus pés doem de tanto caminhar. Eu estacionei no mercado, que estava vazio, as lojas fechadas há
muito tempo, mas então eu precisava limpar minha cabeça e descobrir o que diabos aconteceu e o que
diabos eu devo fazer agora.
Devo estar obcecada por Neil McNair porque, mesmo com ele morto, ele é tudo em que consigo pensar.
A pior parte é esta: ele não estava errado.
Esse guia de sucesso tem quatro anos. Só porque não sou 100 por cento quem queria ser naquela idade,
não signi ca que não tenha sucesso. No fundo, talvez eu tenha sabido disso o dia todo, mas o guia foi um
grande conforto para mim, a ideia de que eu ainda tinha a chance de riscar algo.
Nada sobre hoje, sobre esta noite, saiu como planejado, e até a nossa luta, estava tudo bem. Ótimo, até.
Eu me apeguei às minhas fantasias e me convenci de que a realidade não pode ser comparada.
Eu me permito pensar algo que nunca pensei antes: e se a realidade for melhor?
Eu só... não sei como consertar isso sobre mim. Esta falha, Neil chamou. Se eu conseguir terminar o
Howl sozinha, então não competiremos para sempre. Ele vai para Nova York e eu vou para Boston, e se nos
vermos em Seattle quando estivermos em casa nos recessos, talvez tenhamos um momento de contato visual
prolongado, um aceno de cabeça e, em seguida, uma rápida olhada na direção oposta. Se algo acontecesse
entre nós, ele seria apenas mais uma coisa que termina depois do colégio. Nossas faculdades cam a mais de
quatro horas de distância uma da outra. (Eu pesquisei antes.)
Quero contar a Kirby e Mara, mas ainda não sei se posso colocar o que aconteceu em palavras. E apesar
de tudo mais, estou feliz por ter subido no palco e lido meu texto. Outra coisa a que Neil McNair está
inexoravelmente ligado.
Foda-se.
Pego meu telefone e bato no ícone familiar na tela inicial.
— Rowan? — Minha mãe atende após o terceiro toque. Eles sempre celebram prazos da mesma
maneira: cando incrivelmente bêbados. Eles mantêm uma garrafa de uísque de 12 anos em seu escritório
para essas ocasiões. — Está tarde. Está tudo bem? Acabamos de abrir o uísque...
— Estou escrevendo um livro — deixo escapar.
— Neste exato momento?
— Não, quero dizer, estou trabalhando nisso há um tempo. — Eu mastigo o interior da minha
bochecha, esperando sua reação. Há alguma confusão no fundo, e posso dizer que ela me colocou no viva-
voz. — É um romance.
Silêncio do outro lado da linha.
— E eu sei que eles não são seus favoritos, mas eu realmente os amo, ok? Eles são divertidos e são
emocionais, e têm um melhor desenvolvimento do personagem do que a maioria dos outros livros por aí.
— Ro-Ro — diz meu pai. — Você está escrevendo um livro?
Eu aceno antes de perceber que eles não podem me ver. Ugh, falar é difícil. — Estou. Eu... posso querer
fazer isso. Pro ssionalmente. Ou, pelo menos, eu gostaria de tentar.
— Isso é incrível — diz minha mãe. — Você não tem ideia de como é legal ouvir isso.
— É?
Ela ri.
— Sim, o fato de nos ter como pais não arruinou a magia da escrita para você? Isso é incrível, se você
pensar sobre isso.
E talvez seja.
— É um romance — digo novamente, no caso de eles não terem me ouvido da primeira vez.
— Ouvimos você — diz meu pai. — Rowan, isso é... — Numa pausa, e alguns murmúrios trocados
entre eles — Me desculpe se alguma vez lhe demos a impressão de que pensávamos que era... um gênero
inferior. Talvez seja porque você começou a lê-los tão jovem, e pensamos que era essa fase fofa e engraçada
que você estava passando.
— Não foi.
— Nós sabemos disso agora — diz meu pai.
— Amo o que vocês escrevem e adoro esses livros — digo. — E eu sei que tenho muito a aprender, mas é
para isso que serve a faculdade, certo?
Previsivelmente, meu pai ri dessa não-piada.
— Descoberta total — diz minha mãe. — Nós dois estamos um pouco embriagados. Mas estamos tão
felizes que você nos contou. Se você quiser que qualquer um de nós leia, caremos mais do que felizes em
fazê-lo.
— Obrigada. Não sei se já cheguei lá, mas vou deixar você saber.
— Você está bem? Você não vai car fora muito tarde, vai?
— Provavelmente estaremos dormindo quando ela chegar em casa — diz meu pai — se o uísque
funcionar.
Minha mãe solta um assobio baixo.
— Isso é quase tão ruim quanto o que aconteceu depois daquele livro de DB Cooper. Mas acho que foi
uísque.
— O quê? — Eu pergunto.
— Riley tentou resolver o caso de DB Cooper em um dos livros Excavated — diz minha mãe. — Você se
lembra? Ficamos muito chateados quando nosso editor não quis publicá-lo. Ela não achou que fosse
adequado para crianças.
— DB Cooper... Isso foi uma coisa de Seattle, certo?
— Você não conhece a história? — E quando eu digo não, ela me explica.
Esta é a lenda de DB Cooper: em 1971, um homem sequestrou um avião da Boeing em algum lugar no
ar entre Portland e Seattle. Ele pediu $200.000 em resgate e saltou de paraquedas do avião... mas nunca foi
encontrado, mesmo depois de uma caça ao FBI. É o único caso não resolvido desse tipo.
Eu li o livro em forma manuscrita, mas devo ter esquecido quando eles tiveram que arquivá-lo. E Neil
também não saberia.
— Nós até trabalhamos com a equipe do Museu dos Mistérios — diz minha mãe. — Aquele prédio
antigo e assustador no centro da cidade?
— É tão assustador por dentro — diz meu pai. — E estranho também. É meio museu, meio bar. Então,
eles o mantêm aberto até tarde.
De repente, tudo se encaixa. Deus, eu amo meus pais.
— Rowan? — minha mãe diz, com urgência su ciente que me faz pensar que devo ter desmaiado. —
Rowan Luisa, quando você acha que estará em casa?
— Provavelmente não demorarei muito.
— Divirta-se — minha mãe diz, e eles começam a rir novamente quando desligamos.
O Museu dos Mistérios. Se eu ainda me importasse com Howl, pegaria essa pista de vista e iria para lá.
Bom saber, eu acho.
Eu solto um suspiro. Eles sabem, e Kirby e Mara sabem, e quando eu começar as aulas no outono, pode
ser o que direi aos meus novos amigos também. Estou escrevendo um romance.
A Grande Roda brilha contra o céu noturno. Na verdade, nunca estive nesta roda-gigante. O nome não
é brincadeira. Quando foi construída, era a roda-gigante mais alta da Costa Oeste, e a ideia de estar tão alto
me assustou. Mas esta noite suas luzes me atraem para mais perto, e me pergunto por que sempre tive medo
disso.
— Última viagem da noite — o cara na bilheteria diz depois que eu entrego meus cinco dólares. — Você
chegou bem na hora.
Um minuto depois, meus pés estão fora do chão.
O ar é frio contra meu rosto e, lá embaixo, a água é negra e serena. Alguns carros acima de mim, dois
adolescentes estão rindo e tirando sel es. Alguns carros abaixo de mim, um pai está tentando acalmar uma
criança muito turbulenta.
— Não se atreva a balançar este assento, Liam — ele diz. — Liam... LIAM!
Estou em uma roda-gigante à meia-noite. Seria extremamente romântico se eu não estivesse sozinha.
Este dia inteiro, eu me senti no limite de tantas coisas. No colégio, eu sabia fazer tudo e como isso deveria
me fazer sentir. É um conforto desa ar Neil porque existem apenas dois resultados: ele ganha ou eu ganho.
Uma rotina. Um cobertor de segurança.
Morei aqui minha vida inteira, mas nunca estive na Grande Roda. Eu quase nunca invadi uma
biblioteca. Eu nunca tinha experimentado Seattle da maneira que z esta noite, mas não é apenas o cenário.
Aos poucos, o dia de hoje me forçou a sair da minha zona de conforto. O m do jogo signi ca o m do
ensino médio, e embora haja muito que romantizei, há tantas que vou sentir falta. Kirby e Mara. Minhas
aulas, meus professores.
Neil.
— Oh meu Deus — alguém diz, quebrando minha concentração. Uma voz de mulher. — Oh meu
Deus!
As vozes estão vindo do outro lado da roda. Não é um som de medo, oh meu Deus. É do tipo bom.
— Ela disse sim! — A voz de outra mulher.
Todos no volante aplaudem quando o casal se abraça. Se isso não vale um romance, não sei o que vale.
Quero saltar sem medo para o que está por vir para mim. Eu realmente quero. E não é como se eu tivesse
escolha – não vou sentar em cima desta roda-gigante pelo resto da minha vida. Quer dizer, o cara disse que
sou o último passeio da noite, então, literalmente, não é uma opção. Estou com medo de cair, de falhar, de
não ser capaz de me segurar.
Meu assento para no topo. É tão linda, minha cidade iluminada, que vou ser turista e tirar uma foto.
Abro o zíper da minha mochila e pego meu telefone, meus dedos passando em uma capa dura familiar.
Meu anuário.
Lentamente, eu o retiro da minha mochila, as mãos tremendo enquanto eu viro para as últimas páginas.
Ele não queria que eu lesse até amanhã, mas foda-se, é amanhã e estou desesperada para saber o que diz.
Eu tenho que virar para encontrá-lo. Duas páginas atrás estavam grudadas e foi assim que ele conseguiu
encontrar um espaço. Esse é meu apelido na caligra a e – uau, é longo. Meus olhos correm ao redor no
início, lutando para se concentrar em qualquer palavra. O que espero é alguma garantia de que não
estraguei tudo além do conserto, embora, claro, ele tenha escrito isso antes de nossa luta. Ainda assim,
parece um salva-vidas.
Assim, inalo o ar frio da noite e começo a ler.
Artoo,
Estou voltando para a caligrafia normal. Caligrafia é difícil e eu não trouxe minhas boas
canetas. Ou preciso de mais prática.
Neste momento, você está sentada à minha frente, provavelmente escrevendo
ARROGANTE 30 vezes seguidas. Eu sei um pouco de vários idiomas, mas mesmo assim,
tenho dificuldade em colocar isso em palavras. OK. Eu simplesmente vou fazer isso.
Em primeiro lugar, preciso que você saiba que não estou divulgando isso com nenhuma
esperança de reciprocidade. Isso é algo que eu tenho que tirar do meu peito (clichê,
desculpe) antes de seguirmos nossos caminhos separados (clichê). É o último dia de aula e,
portanto, minha última chance.
“Esmagamento” é uma palavra muito fraca para descrever como me sinto. Não te faz
justiça, mas talvez funcione para mim. Eu sou aquele que está esmagado. Estou arrasado por
apenas nos considerarmos inimigos. Estou arrasado quando o dia termina e não disse nada a
você que não fosse coberto por cinco camadas de sarcasmo. Estou arrasado, por terminar
este ano sem saber que você gosta de música melancólica ou que come cream cheese
direto da banheira no meio da noite ou brinca com a franja quando está nervosa, como se
estivesse preocupada de que ela ficasse ruim. (Ela nunca fica.)
Você é ambiciosa, inteligente, interessante e linda. Coloquei “linda” por último porque, por
algum motivo, tenho a sensação de que você reviraria os olhos se eu escrevesse primeiro.
Mas você é. Você é linda, adorável e charmosa pra caralho. E você tem essa energia que
irradia de você, um otimismo cintilante que eu gostaria de poder pegar emprestado para mim
às vezes.
Você está olhando para mim como se não acreditasse que ainda não terminei, então
deixe-me encerrar antes de transformá-lo em um ensaio de cinco parágrafos. Mas se fosse
um ensaio, aqui está a declaração da tese:
Estou apaixonado por você, Rowan Roth.
Por favor, não tire muito sarro de mim na formatura?

Seu,
Neil P. McNair
00h43

A PRINCÍPIO, AS palavras não penetram. Não faz sentido. Isso tem que ser uma piada elaborada, uma
forma nal e distorcida de Neil vencer fazendo-me de boba. Então eu li de novo, demorando-me no quarto
parágrafo e no sexto parágrafo, e a forma como meu apelido aparece em sua caligra a. E então o sétimo
parágrafo, a con ssão de uma única frase:
Estou apaixonado por você, Rowan Roth.
Há muito cuidado e sinceridade nessas palavras para que sejam uma piada. Minha pulsação está rugindo
em meus ouvidos, meu coração é um animal selvagem.
Neil McNair está apaixonado por mim. Neil. McNair. Está. Apaixonado. Por. Mim .
Não tenho certeza de quantas vezes li isso. Cada vez, palavras diferentes saltam para mim, “apaixonado” e
“linda” e “apaixonado”, “apaixonado”, “apaixonado”.
Algo ca preso na minha garganta – uma risada? Um soluço? O orador da turma Neil McNair escreveu
“foda-se” no meu anuário. Eu li de novo. Eu não consigo parar. “Otimismo cintilante” – não de cabeça nas
nuvens. Ele gosta disso em mim, o su ciente para me dizer quando sou tão radical que estou atrapalhando
meu próprio caminho.
Exceto. Teria sido um erro, disse ele quando perguntei sobre o que aconteceu no banco.
Ele estava blefando. Ele tinha que estar. Esta nota é tão sincera que ele não poderia ter apagado esses
sentimentos em questão de horas. Posso não saber muito sobre o amor que não tenha lido em um livro, mas
tenho certeza de que dura mais do que isso. Um fogo brando, não uma faísca.
Esta mensagem é mais doce do que qualquer romance.
É real.
Neil me ama.
Hoje cedo, eu não conseguia imaginá-lo beijando ninguém. É porque eu só posso imaginar isso
acontecendo comigo, que Rowan mais Neil é essa inevitabilidade que todos conheceram, exceto nós? Kirby
e Mara, Chantal Okafor no conselho estudantil, Logan Perez que nos deixou entrar na zona segura, meus
pais...
Eu amo Neil McNair?
Mesmo que não tenha certeza absoluta, a realidade é que realmente acho que poderia.
Tenho que sair dessa porra de roda-gigante.
A vida é engraçada, porém: o momento mais romântico da minha vida, e estou no topo de uma roda-
gigante com um anuário, em vez do garoto que escreveu nele que está apaixonado por mim.

O Museu dos Mistérios, localizado em um porão no centro de Seattle, é o único museu de Seattle dedicado
ao paranormal. Não sei por que eles precisam explicar isso ou por que a cidade precisaria de mais de um
museu dedicado ao paranormal, mas lá está na placa na frente.
Podemos conversar? Mandei uma mensagem para Neil assim que a roda-gigante pousou. Eu me
sinto muito mal com o que aconteceu. E acho que descobri a última pista. Ninguém ganhou o
Howl ainda, ou teríamos recebido uma mensagem explosiva. Estou determinada a fazer as pazes com ele.
Ele respondeu ok sem pontuação, nada parecido com Neil. Ele estava claramente chateado para não
soletrar a palavra, mas talvez seja a prova de que ele ainda se sente da maneira que se sentiu quando escreveu
em meu anuário que concordou em se encontrar de novo. Ou ele quer ganhar este jogo e acabar esta noite.
Ele está esperando em uma rua de tijolos com uma escada instável que leva ao museu. Seu cabelo está
despenteado, sua postura ligeiramente curvada. Por que eu o provoquei sobre aquelas sardas? Adoro elas.
Eu amo cada uma delas. Eu amo suas sardas e seu cabelo ruivo e as pernas muito curtas de suas calças de
terno e mangas muito longas, o jeito que ele ri, o jeito que levanta os óculos para esfregar os olhos.
Estou apaixonado por você, Rowan Roth.
Ele levanta uma das mãos em um aceno e eu derreto.
Estou com muitos problemas.
— Oi — eu digo em voz baixa.
— Ei.
— É estranho que… — Eu digo, ao mesmo tempo que ele diz:
— Deveríamos...
— O que é que foi isso? — ele pergunta.
— Oh. Hum. Eu ia dizer, é estranho que esteja aberto tão tarde.
— Ele é o único museu de Seattle dedicado inteiramente ao paranormal — diz ele, apontando para o
sinal.
Ele não está tão rígido quanto pensei que estaria. Nós dois alcançamos a porta ao mesmo tempo, nossas
mãos se roçando. Então nós as arrancamos como se tocássemos fogo.
A mulher que trabalha aqui está lendo um livro atrás do balcão. Ela tem cabelo louro-claro que desce até
os quadris e grandes óculos roxos.
— Boa noite — diz ela, mal olhando para nós.
Pagamos a entrada barata, agradecemos a ela e nos aventuramos mais no museu. Uma estranha trilha
sonora está tocando, uma peça clássica pontuada por gritos. Parece que estamos em uma casa mal-
assombrada. Continuamos batendo um no outro, como se nossos pés tivessem se esquecido de como andar.
— Eu, hum, tive a pista de ‘um visão do alto’ — digo.
— Eu também. — Mas ele não pergunta para onde fui, então eu também não.
Paramos em frente a uma tela sobre o incidente de OVNIs na Ilha Maury.
Eu li na placa:
— ‘O incidente de OVNI na Ilha Maury ocorreu em junho de 1947. Após avistamentos de objetos
voadores não identi cados sobre a Ilha Maury em Puget Sound, Fred Crisman e Harold Dahl a rmaram ter
testemunhado a queda de destroços e ameaças de homens de preto. Dahl mais tarde retirou suas a rmações
e declarou que era uma farsa... MAS FOI?’ — Eu bato no meu queixo. — Um pouco de editorialidade, eu
acho.
Ele apenas grunhe.
Nenhum de nossos silêncios foi tão estranho.
— Você poderia trazer sua irmã aqui — eu sugiro, tentando aliviar o clima.
Ele encolhe os ombros.
— Ela pode car com medo. Ela não gosta de coisas assustadoras, especialmente depois de toda a coisa
do Blorgon Seven.
— Oh. Certo. — Viro uma esquina e aponto para uma placa que diz O QUARTO DE DB COOPER.
— Ele tem um quarto inteiro só para ele, cara de sorte.
Uma parede lista todos os fatos conhecidos sobre ele:

Pediu um bourbon com refrigerante


Anos quarenta
Olhos castanhos escuros
Usava um alfinete de gravata em madrepérola e uma gravata preta
Linha fina recuada
Tinha algum nível de conhecimento de aviação

O FBI retirou seu caso em 2016, mas claramente os nortistas do Pací co ainda estão fascinados por ele,
como demonstrado por esta exposição.
— Ele deve estar morto — diz Neil. — Não tem como ele sobreviver a esse salto.
— Eu não sei. É legal imaginar que ele ainda está por aí em algum lugar. Ele seria velho neste ponto, mas
ele poderia ter lhos. Talvez ele tenha se safado e superado todos nós. — Paramos em frente a um busto de
cera de sua cabeça. — Meio gostosa — eu digo, tentando aliviar o clima novamente.
— Meia-idade e careca é o seu tipo?
Não, ruivas sardentas que costuram seus próprios ternos são meu tipo.
— Oh sim — eu digo, e parece, por uma fração de segundo, como se estivéssemos de volta ao normal.
Mas então Neil anda pela sala, tira uma foto.
— Acho que é isso — diz ele. — Foram realizadas. Podemos ir à academia e dividir o prêmio e seguir
caminhos separados, como você queria. Você não tem que me dar sua parte como algum tipo de dinheiro de
piedade.
E se isso não for um soco no estômago.
Ele se vira para ir embora, mas pego seu braço.
— Neil. Espera.
— Eu não posso, Rowan. — Ele fecha os olhos e balança a cabeça, como se desejasse poder puxar um DB
Cooper e desaparecer. — Foi uma ideia ridícula, nós dois nos unindo. Se tentássemos destruir um ao outro
por quatro anos, por que de repente nos daríamos bem esta noite?
Eu mordo com força o interior da minha bochecha.
— Sinto muito pelo que disse sobre o seu pai. Eu não quis dizer isso. Você compartilhou muitas coisas
pessoais comigo hoje, e eu deveria ter tratado isso com mais respeito.
— Você deveria ter tido. Eu concordo.
Dou um passo para trás, tentando dar espaço a ele.
— Eu quero ser sua amiga.
Ele bufa.
— Por que diabos você quer isso? Você deixou bem claro que não somos o que somos.
— Você tem razão. Eu z. — Eu respiro fundo. — Olha... você tem sido uma grande dor na minha
bunda nos últimos quatro anos, mas você também é todas essas coisas que eu não sabia até hoje. Você é um
excelente dançarino. Você adora livros infantis. Você se preocupa com sua família. E você é judeu e, bem... é
bom conhecer outro.
— Você vai conhecer muitas outras crianças judias em Boston.
— Você está tornando muito difícil para mim elogiá-lo.
Ele me dá um sorriso tímido e, com isso, nalmente me sinto relaxar. Podemos car bem. Nós temos que
car.
— Também lamento o que disse — diz ele. — Sobre você se sabotar. Isso foi... completamente fora de
linha. Você foi incrível naquele microfone aberto e... e eu deveria ter lhe dado mais crédito por isso.
— Você não estava totalmente errado, no entanto. — Eu me inclino contra a grade, a alguns metros dele,
testando nossos limites. — Eu sou um pouco sonhadora e me oponho ao meu próprio caminho. Às vezes,
parece que competir com você é a única coisa que me deixa no chão. — Faço uma pausa, então: — Liguei
para meus pais. Eu contei a eles sobre meu livro.
Seus olhos brilham. É um crime eu nunca ter percebido como eles são lindos.
— E? Como se sentiu?
— Aterrorizada. Fantástica — eu digo. Mas ainda não terminei de me desculpar. Não fui totalmente
honesta com ele esta noite. Cada vez que eu dizia algo errado, estava tentando seguir um plano que não
parece mais meu. Eu me pergunto como seria abrir mão disso completamente. — Neil. Eu continuo
dizendo essas coisas horríveis para você, essas coisas eu não quero dizer. Não apenas o que eu disse sobre seu
pai. Como quando você me pediu para assinar seu anuário. É como se meu instinto natural fosse lutar com
você, e estou tentando muito superá-lo, mas errei algumas vezes. E eu sinto muito.
Ele ca quieto por um momento.
— Meu instinto é ignorar e dizer que está tudo bem, mas... obrigado por dizer isso.
— O que eu disse na biblioteca, quando estávamos dançando… — Quando eu expiro, estou trêmula. A
maneira como ele derramou seu coração na página do meu anuário, ele pode ser mais corajoso do que eu
jamais fui. Ele me faz querer me esforçar mais. — Eu não estava imaginando mais ninguém.
Isso arranca um sorriso dele.
— Sim? — ele diz, e eu aceno.
— Eu realmente me diverti com você hoje. — Lentamente, chego mais perto dele, observando seu rosto
com atenção. Suas sobrancelhas se contraem, e se eu não soubesse melhor, diria que ele está balançando
ligeiramente em minha direção. Mais um passo e meio e estaríamos peito com peito, quadril com quadril.
— Isso foi tão difícil de admitir? — Ele pergunta, seu sorriso se aprofundando em um sorriso malicioso.
Estou apaixonado por você, Rowan Roth.
Eu coloco a mão no meu cabelo e solto um som estrangulado e frustrado.
— Deus, você é tão irritante. — Mas não sai cruel. Provocador, talvez, mas não cruel.
— Mas você gosta disso. — É possivelmente a coisa mais ousada que ele disse durante todo o dia, e
quando ele dá um passo à frente, posso sentir o calor irradiando dele. Não é à toa que ele estava bem sem o
seu moletom – o garoto é uma sauna humana. — Você gosta de car furiosa. Por mim.
Eu gosto. Eu gosto muito disso.
Minha respiração acelera. Ele deve ser capaz de ouvir, porque um lado de sua boca se inclina para cima e
ele passa a mão ao longo do corrimão até quase tocar a minha, mas não exatamente. Há tão pouco espaço
entre nossos corpos agora. Seu cheiro é terreno e inebriante, fazendo-me ansiar por algo que eu não sabia
que queria.
A fantasia: que meu namorado perfeito do colégio seria a epítome do romance.
A realidade: Neil McNair sempre esteve aqui.
— Voz passiva? — Eu desa o, parecendo muito mais rouca do que estou acostumada a ouvir. —
Westview te ensinou melhor do que isso.
Isso não o faz rir da maneira que eu esperava. Em vez disso, ele me lança um olhar meio divertido e meio
sério, que me deixa eletrizante. Seu olhar é rme e eu tenho uma visão dos ângulos lindos de sua garganta
enquanto ele engole em seco.
— Não — ele diz, tão perto de mim que quase posso ouvir seu coração bater no mesmo ritmo do meu.
— Você me ensinou.
E é isso que me empurra para o limite. Antes que eu possa pensar demais, antes de passar para sempre
sonhando com o momento perfeito, eu salto para frente, prendendo-o contra a grade e cobrindo sua boca
com a minha.
POSIÇÕES DO HOWL

TOP 5

Neil McNair: 14

Rowan Roth: 14

Brady Becker: 14

Mara Pompetti: 13

Carolyn Gao: 10

JOGADORES RESTANTES: 11

ESTAMOS PERTO DE UM VENCEDOR? SE APRESSEM E


BOA SORTE!
01h21

NEIL MCNAIR ESTÁ me beijando de volta. Não há hesitação, não como quando nos abraçamos antes
com membros tímidos e incertos. Desta vez, ele se deixa cair.
Seus lábios pressionam com força contra os meus enquanto eu envolvo meus braços em volta do seu
pescoço, afundando nele. É um tipo de beijo rápido e desesperado, e Deus, ele é bom. Suas mãos se perdem
no meu cabelo, e isso mais sua boca mais esse som que ele faz no fundo de sua garganta transformam meu
sangue em fogo. Separo meus lábios, saboreando uma doçura persistente do rolinho de canela que
compartilhamos. Minha imaginação não teria sido capaz de fazer justiça a ele.
Quando ele sorri contra minha boca, posso sentir.
— Rowan? — ele diz enquanto se afasta, sua voz uma mistura de surpresa e admiração. Ele está
respirando com di culdade. Seus olhos são lindos e de pálpebras pesadas, aqueles cílios longos tremulando
contra as lentes de seus óculos. Talvez seja sonolência ou talvez ele esteja tão embriagado com esse
sentimento quanto eu. — O que está acontecendo?
— Eu estou beijando você. — Eu movo uma mão da gola de sua camisa para sua nuca e em seu cabelo.
Quero gravarr cada textura na ponta dos dedos. — Devo parar?
Ele patina o polegar ao longo da minha bochecha. Apesar de quão leve seu toque é, eu sinto que posso
detonar.
— Não. Absolutamente não — diz ele. Ele traça meu nariz. Meus lábios. — Eu só queria ter certeza
que– eu não sei. Que você percebeu que sou eu.
A incerteza em sua voz me desmancha. Todos os livros do mundo não poderiam ter me preparado para
este momento. Não há palavras su cientes.
— Essa é a melhor parte — digo-lhe.
Não, esta é a melhor parte: quando nos inclinamos de novo e tudo ca mais selvagem. Com uma das
mãos no meu cabelo e a outra no quadril, ele nos gira de modo que co pressionada contra a grade. Nossas
bocas se chocam, dentes e línguas discutindo entre si. Tentando vencer qualquer nova competição que seja.
Eu corro minhas mãos sobre seu peito, até os braços que estive olhando o dia todo, oprimida por quanto
dele eu quero tocar. Sublinho e rabisco aquela frase em latim idiota com a ponta dos dedos. Ele é tão sólido
sob minhas palmas, e não posso deixar de segurar um pouco o tecido de sua camiseta.
Suas mãos encontram o caminho de volta para o meu cabelo. E seus lábios, acenando, provocando,
desafiando-me. Porque porra, Neil é gostoso. É um absurdo e é verdade.
— Você gosta do meu cabelo — provoco entre beijos.
— Deus. Muito. É um cabelo fenomenal pra caralho.
Agora estou ainda mais certa do por que não conseguia imaginá-lo beijando outra pessoa: porque
deveria sempre ser assim. Nós.
Ele me mantém presa à grade, beijando minha mandíbula, meu pescoço, abaixo da minha orelha. Eu
tremo quando ele permanece lá.
— Está tudo bem? — ele pergunta contra a minha pele.
— Sim — eu digo, e ele cobre minha clavícula com sua boca. Estou viciada na maneira como ele me
pergunta isso. Como ele quisesse ter certeza.
Deve ser essa a sensação de abalar a terra de que ele estava falando. Isto: suas mãos deslizando pelas
laterais do meu corpo. Isto: seus dentes roçando minha clavícula. E isso: o jeito que, quando ele volta para
os meus lábios, ele beija como se eu fosse algo que ele não se cansa e algo que ele quer saborear. Rápido,
depois lento. Eu amo tudo isso.
Como temos a mesma altura, nossos corpos se alinham perfeitamente e... ah. A prova de quanto ele está
gostando disso me deixa febril. Eu balanço meus quadris contra os dele porque a pressão é incrível, e a
maneira como ele geme quando faço isso soa incrível também.
Eu coloco minhas mãos mais abaixo, em seu cinto. Meus dedos roçam a pele macia de seu estômago e ele
solta uma risada involuntária. Cócegas. Ao longe, estou ciente de que estamos em público. Que temos que
parar antes de irmos longe demais. Mas nunca senti esse desejo, e é um sentimento inebriante e poderoso.
Nunca me perdi em alguém assim.
Com cada molécula do meu corpo, eu me forço a me afastar.
— Isso foi... uau — eu digo, sem fôlego.
Ele encosta a testa na minha, ainda me segurando pela cintura.
— ‘Uau’ não é um adjetivo.
Em quatro anos, nunca ouvi sua voz assim. Está esfarrapada, gasta.
Não tenho certeza de quanto tempo camos ali, respirando um ao outro, quebrando o relativo silêncio
de vez em quando para rir como os idiotas bêbados de amor que somos. Suas bochechas estão vermelhas.
Tenho certeza que as minhas também estão.
— Eu tinha certeza de que havia estragado tudo — diz ele depois de um tempo. Ele pega minha mão, e é
tão fácil entrelaçar meus dedos nos dele. — Eu queria tanto beijar você naquele banco. Mas então fomos
interrompidos e eu quei... com medo, eu acho. Com medo de que você não se sintia da mesma maneira.
É um alívio ouvi-lo dizer isso.
— Então é por isso que você disse que teria sido um erro. — Eu rastreio suas juntas com meu polegar.
Ele concorda.
— Pensei, não sei, que você se arrependeu, e a melhor maneira de superar isso era ngir que era um erro.
Eu não queria que isso te deixasse desconfortável.
— Um mecanismo de defesa.
— Sim — diz ele, trazendo a outra mão para segurar meu rosto.
— Acho que também tenho alguns desses.
Quando nos beijamos de novo, é mais suave. Doce.
Com o canto do olho, posso ver DB Cooper nos observando, me lembrando por que viemos aqui em
primeiro lugar.
— O jogo. — Eu uso toda a minha força de vontade para parar de beijá-lo. Estamos tão perto dos cinco
mil, de Neil potencialmente ser capaz de mudar seu nome. Para alguma liberdade de sua antiga vida – quer
eu faça parte dessa nova vida ou não. — Nós devemos ir.
— Eu, hum. Preciso de um momento — diz ele, olhando para baixo timidamente. O calor sobe para
minhas bochechas, e eu não posso deixar de sorrir novamente.
Com algum esforço, nós nos desembaraçamos e pegamos nossos telefones. Nenhuma atualização do
Howl, o que signi ca que ninguém ganhou ainda. Lentamente, sinto que estou voltando ao modo
competitivo. Westview ca a menos de quinze minutos de distância. O Howl é quase nosso.
Abrimos caminho para fora do museu, escondendo nossos rostos corados da mulher na recepção.
Quando olho para trás, eu juro que vejo seu sorriso.
Não tenho certeza se alcanço sua mão primeiro ou se ele alcança a minha, mas imediatamente parece
natural. Ele passa o polegar pelos nós dos meus dedos no caminho para o meu carro e, quando chegamos lá,
ele me empurra contra a porta do motorista como um bad boy em um lme adolescente.
— Temos um verão inteiro para fazer isso — digo, enquanto estou agarrando sua camiseta e puxando
sua boca para a minha. — Quero dizer, se você quiser.
E embora sua con ssão do anuário esteja estampada atrás de minhas pálpebras sempre que eu piscar, sua
resposta envia faíscas até os dedos dos pés.
— Se eu quero beijar você durante todo o verão? — Ele levanta as sobrancelhas, a boca curvando-se para
o lado. — Nora Roberts é prolí ca?
— Mais de duzentos livros — eu digo. Então, com alguma relutância: — Mas estamos tão perto.
Voltaremos a isso.
Um longo beijo e então ele geme.
— Ok, ok. Você ganhou
— Você pode dizer isso de novo? Gosto do jeito que soa.
— Sem vergonha — ele diz, mas há aquele sorriso doce-preguiçoso de novo, aquele que eu nunca tinha
visto antes esta noite. Esse que eu conheço agora que é exclusivamente meu.
Mas algo aperta minha garganta. Um verão inteiro. De repente, não parece muito longo.
— Ei, pombinhos. Vocês nalmente descobriram, hein?
Do outro lado da rua, Brady Becker está destrancando um pequeno Toyota branco, parando para acenar
para nós. O papel com o nome dele queima no meu bolso.
Mais forte do que o choque do quarterback estrela Brady Becker percebendo que estamos juntos é a
sensação de pavor subindo pela minha espinha.
Neil pisca algumas vezes, como se estivesse tentando processar o que Brady está fazendo aqui.
— Ei — ele diz baixinho, a voz cheia de incerteza. Não conversamos sobre como nos anunciar para o
resto da nossa turma de formandos, se é que isso é algo que queremos fazer. Entrelaço meus dedos nos de
Neil, mostrando a ele exatamente como me sinto sobre isso. Suas feições relaxam e ele envolve seus dedos
nos meus novamente. — Sim, nós, hum... sim. Nós descobrimos.
Seus nervos são adoráveis.
— Museu legal — Brady diz, e eu forço meu cérebro confuso de oxitocina a lembrar onde Brady estava
na mais recente explosão da classi cação do Howl.
Quatorze.
Ele tinha quatorze pontos, assim como nós. E se ele está saindo do museu, isso deve signi car...
— Vejo você de volta na escola — ele diz. — Serei aquele com o cheque de cinco mil dólares.
RASCUNHO: (sem assunto)

Rowan Roth <rowanluisaroth@gmail.com>


para: jared@garciarothbooks.com,
ilana@garciarothbooks.com
Salvo no sábado, 13 de junho, às 12h32

Queridos Mamãe e Papai,

Isso é assustador, mas aqui estão os primeiros capítulos. Sejam gentis comigo.

Com amor,
Sua filha favorita, amante de cream cheese e um dia potenciamentel autora de romances.

Anexo: capítulos 1–3 para mamãe e papai.docx


02h04

EU NÃO PENSEI QUE O Howl iria terminar com uma perseguição de carro, mas eu estive errada sobre
muitas coisas hoje. Para ser justa, é uma perseguição entre dois carros usados com economia de combustível
decente e classi cações de segurança cinco estrelas. Velozes e furiosos: Sedans confortáveis.
As ruas estão desertas, as luzes noturnas manchando o horizonte com ouro, e meu coração bate contra o
cinto de segurança enquanto seguimos Brady até a rodovia.
— Não percebi que ele estava tão perto de nós — digo, mudando de faixa e pisando fundo no
acelerador. Permanecemos paralelos ao Toyota, mesmo enquanto acelero até 100 km/h.
Neil olha para seu telefone.
— DB Cooper deve ter sido o último dele também. Acho que estávamos... distraídos.
— Certo — eu digo, meu estômago embrulhando. Se ele se arrepende do que aconteceu no museu...
— Mesmo se ele ganhar — diz ele, como se pudesse detectar a insegurança em minha voz — eu não teria
feito nada diferente. Eu quero que você saiba disso. — Ele parece mais sólido do que durante toda a noite, e
isso me enche de uma determinação feroz.
— Não se preocupe. Não vamos deixá-lo.
Estamos pescoço a pescoço até nos aproximarmos da saída, onde tenho que voltar para sua pista. Atrás
dele.
— Nota A pelo esforço! — Brady grita pela janela enquanto se esgueira por uma luz amarela um
momento antes de ela car vermelha.
Eu piso no freio.
— Merda. E agora?
— Vire à direita — diz Neil. — Ele provavelmente está pegando a Forty-Fifth por todo o caminho. Se
pegarmos os atalhos, não pegaremos mais nenhum semáforo.
— Tem certeza disso?
— Não — ele admite. — Mas é nossa única chance.
Eu ligo meu pisca-pisca e viro para a direita, nos levando a um bairro residencial. Eu circulo algumas
rotundas, girando o volante com força o tempo todo.
O estacionamento da escola ca logo à frente, e o Toyota branco de Brady está se aproximando do outro
lado da rua. Lá está Logan Perez, parada na entrada da academia com Nisha e Olivia, segurando duas
bandeiras quadriculadas em preto e branco. Há um campo gramado entre o estacionamento e a academia.
Podemos chegar perto, mas ainda teremos que nos apressar.
É isso.
— Há dois de nós, e apenas um dele. Você tem que ir atrás de Logan — eu digo. — Vou estacionar o
mais perto que puder e tentar parar Brady. Tudo o que tenho que fazer é pegar sua bandana. — Uma risada
cai fora. — Parece fácil quando eu digo assim.
Ele estende a mão para escovar meu pulso com a ponta dos dedos. Mesmo seus toques mais leves
parecem impossivelmente intensos.
— OK. Nós conseguiremos. Então– então vamos resolver tudo mais tarde?
Nossa aposta. Dividindo o prêmio.
Já conquistei mais esta noite do que jamais pensei que conquistaria. O segundo lugar nunca pareceu tão
bom.
— Sim — eu digo, seguindo Brady para uma vaga de estacionamento na extremidade do estacionamento
e jogando o carro no estacionamento. — Vai!
Convocando qualquer habilidade atlética latente que deixei naquele campo de futebol no ensino médio
e qualquer força ganha por carregar uma mochila enorme nos últimos quatro anos, eu escancaro a porta,
me lançando em Brady. Do outro lado do carro, Neil salta para o campo gramado e se dirige para Logan.
— Rowan, o que... — Brady pergunta, mas estou me agarrando em direção a sua bandana, capturando-a
com o punho, arrancando-a. — Oh, merda.
Caímos na calçada com as pernas emaranhadas. Brady me amortece até certo ponto, sem dúvida
experiente quando se trata de disputas, mas ainda consigo bater com o joelho no caminho para baixo. Estou
muito cheia de adrenalina para me importar, especialmente quando ouço gritos e vivas a alguns metros de
distância. O sopro de um apito. A risada atordoada de Neil.
Respirando com di culdade, empurrei a bandana de Brady no ar como uma bandeira de vitória.
Conseguimos.
— Porraaaaa — Brady geme embaixo de mim, e eu não tenho certeza se é a dor ou a agonia de perder.
Eu me movo para uma posição sentada, em seguida, tento levan– ow. Não está sangrando, mas
de nitivamente vai deixar hematomas.
— Eu sinto muito — eu digo a Brady. — Você está bem?
— Vou ter um hematoma na minha bunda do tamanho de Júpiter, mas sim. Você?
— Sim — eu digo com um estremecimento, mancando em direção ao ginásio.
Quando ele me vê, Neil corre para frente e eu praticamente caio em seus braços.
— Seu joelho — ele diz, mas eu aceno. Ele me aperta com mais força, seus lábios roçando minha orelha
quando ele fala. — Você é incrível. Eu não posso acreditar que zemos isso. Nós vencemos.
— Você venceu. — Eu deslizo uma mão em torno de sua nuca e em seu cabelo, não me importando com
o que Logan, Nisha ou Olivia pensam sobre nós nos abraçando assim.
Ele se afasta e levanta uma sobrancelha.
— Seriamente? Eu não poderia ter feito nada disso sozinho. Acho que formamos uma equipe muito
boa, a nal.
E eu honestamente não posso deixar de beijá-lo depois disso.
Eu acredito agora, que é assim que sempre fomos feitos para ser, e ainda não consigo entender tudo o
que aconteceu. Ganhamos, e não acho que seria tão bom se eu tivesse feito isso sozinha.
O trio de calouros desce até nós.
— Parabéns de novo — Logan diz, os olhos indo e voltando entre nós como se ela soubesse exatamente o
que estava acontecendo conosco naquela zona segura. É assustador como ela pode ser uma boa política
algum dia. Ela se vira e abre a porta do ginásio. — Sua festa os aguarda. Bem, assim que contarmos a todos o
que aconteceu. — Ela gesticula para Nisha e Olivia, que pegam seus telefones, provavelmente para enviar
outra mensagem de texto.
— Nossa o quê? — Neil diz.
O ginásio é iluminado e festivo, decorado em azul e branco Westview – tas, faixas, luzes. Existem las de
jogos de feiras e vendedores de comida, um pequeno palco em uma extremidade. Alguns juniores ainda
estão terminando a con guração.
— Tínhamos algum dinheiro sobrando e queríamos dar a todos os veteranos mais uma coisa para
comemorar — diz Logan. — Íamos anunciar quando o jogo terminasse, então estávamos apenas
esperando–
— ... e torcendo para que possamos dormir em algum momento — Olivia acrescenta.
— Mas valeu a pena! — Nisha diz.
Não consigo parar de olhar boquiaberta para a cena à nossa frente. Talvez eu esteja delirando, mas nunca
vi um ginásio tão bonito.
— Obrigada. Todas vocês.
Neil parece hipnotizado pela banda desempacotando uma bateria e carregando seus ampli cadores no
palco.
— Oh meu Deus — ele diz. — Free Puppies!

É a melhor festa em que já estive. Quase todos os veteranos estão aqui, além da banda favorita de Neil, e ele
acabou de ganhar cinco mil dólares, metade dos quais me recusarei a aceitar se ele me oferecer. Alguns
professores aparecem como acompanhantes, mas não somos bagunceiros. Talvez estejamos muito cansados
para causar muitos problemas.
Quando elas nos veem juntos, Mara engasga, e Kirby corre imediatamente para nos apertar em um
abraço de urso.
— Eu sabia, eu sabia, eu sabia — ela grita. A maioria das reações se enquadra solidamente nessa faixa.
Neil e eu não conseguimos parar de sorrir, não conseguimos parar de nos tocar: mãos dadas, a palma da mão
nas minhas costas, um beijo furtivo quando pensamos que ninguém está olhando. Acontece que alguém
sempre está.
As paredes estão cobertas de cartazes de eventos já ocorridos, e há uma sensação de nostalgia no ar, mas
pela primeira vez esta noite, não parece triste. Howl sempre foi uma despedida de Westview e de Seattle.
Uma tradição dos últimos dias que envolve muito mais do que vencedores e perdedores.
Savannah se aproxima de nós enquanto esperamos os Free Puppies! começarem a tocar. A visão dela me
deixa tensa.
— Parabéns, eu acho — ela diz categoricamente.
— Obrigado — diz Neil, sempre educado. Sempre sério, por baixo de todo aquele sorriso malicioso.
Mas estou totalmente sem educação quando se trata de Savannah Bell.
— Ei, você sabe o que estou desejando? — Eu digo para Neil. — Pizza de boliche. Como em Hilltop.
Você acha que eles têm pizza aqui?
— Você... comeu pizza no Hilltop Bowl? — Savannah pergunta, as sobrancelhas se juntando em uma
expressão de preocupação.
— Não. Mas eu sei que você fez. — Com isso, encontro seu olhar, sem piscar, e levanto meu dedo
indicador direito para bater no meu nariz uma, duas vezes. Seu rosto ca vermelho e imediatamente ca
claro que ela sabe do que estou falando.
Neil entende.
— Eu também sou judeu. — Sua mão vai para minhas costas. — E isso pode parecer estranho para você,
mas esse dinheiro vai realmente fazer uma grande diferença para mim.
Eu realmente gosto dele.
— Isso é ótimo — Savannah fala, e ela dá um passo para trás até desaparecer na multidão.
Kirby e Mara acabam de um lado de nós, compartilhando um pretzel gigante e açucarado, e os amigos de
Neil do outro. Eles parecem tão surpresos com nosso desenvolvimento romântico como Kirby e Mara – ou
seja, de forma alguma.
— O que você vai fazer com o dinheiro? — Adrian pergunta. — E não me diga algo responsável como
colocar na poupança. Você tem que se divertir um pouco.
Neil olha para mim e eu me torno massa.
— Oh, nós vamos. E já tenho algumas ideias.
McSórdido, Kirby murmura para mim.
— O que é que foi isso? — Neil pergunta.
— Kirby está sendo inapropriada.
— Você achou que isso me deixaria menos curioso?
— Oh, vamos nos divertir neste verão — diz Kirby.
Mara, no entanto, é uma perdedora um pouco irritada.
— Só me restavam mais duas pistas. — lamenta ela, meio brincando.
Ainda assim, nós três e às vezes nós sete tiramos sel es e fazemos planos para ir à festa do bairro Capitol
Hill em algumas semanas. Não sei se vamos car bem na faculdade. Mas temos o verão, e depois disso,
vamos tentar o nosso melhor. Posso me contentar com isso por enquanto.
Um grito de volta atrai nossa atenção para o palco.
— Bom dia, Westview! — grita o vocalista de cabelo neon, ganhando um grito da platéia. — Estamos tão
felizes por vocês terem cado acordados a noite toda por nós. Essa primeira música se chama ‘Stray’ e, se não
te vermos dançando, vamos fazer as malas e ir embora.
Eles são fantásticos ao vivo, como Neil disse. Ele puxa meu cabelo para trás para dar um beijo abaixo da
minha orelha e, enquanto me pergunto se ele sabe exatamente o quão sensível eu sou lá, ele me dá um
sorriso malicioso que prova que sim.
Eu não sabia que poderia ser assim.
Quando a banda faz uma pausa, Neil e eu vagamos no meio da multidão, aceitando parabéns e jogando
alguns jogos, embora depois de cerca de dez minutos, estejamos um pouco esgotados. Meu joelho está
começando a doer e não tenho certeza se posso aguentar por muito mais tempo.
— Estou tentando pensar em uma maneira inteligente de dizer isso, mas... você quer sair daqui? —
Pergunto-lhe.
— Sim — diz ele — E, na verdade, tenho algo em mente, se você quiser mais uma aventura.
Dou-lhe um sim enfático antes de segui-lo em meio à multidão de nossos quase ex-colegas de classe.
Haverá mais festas na próxima semana. Estou certa disso. Mas há tanta coisa lá fora além do colégio, tanto
que não posso começar a entender. Estou tentando o meu melhor para mantê-lo assim. Neste verão, direi
muitas despedidas – aos meus amigos, aos meus pais, à parede de chiclete, ao Fremont Troll e aos rolinhos
de canela do tamanho do meu rosto. Não serão despedidas para sempre. Eu estarei de volta, Seattle. Eu
prometo.
Então, quando saímos, dou uma última olhada na escola. Mais tarde, Neil e eu falaremos sobre o que
isso signi ca, sobre o que zemos esta noite e o que acontecerá amanhã. Mas agora eu quero saborear este
momento com ele, tanto o silêncio quanto a maneira como ele me olha como se estivesse contando os
segundos até que possamos nos beijar como zemos no museu.
Talvez seja assim que eu deva dizer adeus ao colégio: não com uma lista arbitrária ou uma noção
preconcebida de como as coisas deveriam ser, mas percebendo que somos realmente melhores juntos.
Neil aperta minha mão.
— Preparada? — ele pergunta.
— Eu acho que estou.
Então respiro fundo... e deixo tudo ir.
TOP 5 CANÇÕES DOS FREE PUPPIES! DE ACORDO COM NEIL MCNAIR

1. “Pawing at Your Door”


2. “Enough (Is Never Enough)”
3. “Stray”
4. “Darling, Darling, Darling”
5. “Little Houses”
02h49

— A MELHOR VISTA de Seattle — Neil diz quando saímos do meu carro no lado sul de Queen Anne
Hill.
Kerry Park não é grande, uma faixa estreita de grama com uma fonte e algumas esculturas. A visão do
Space Needle se aproxima completamente de você. Parece irreal daqui, enorme, brilhante e glorioso,
especialmente à noite. Ele está certo: é a melhor vista de Seattle.
— É aqui que você foi antes? — Eu pergunto, e ele acena com a cabeça.
Eu manco junto com ele até a borda do mirante.
— Eu não posso acreditar que você fez isso. — Ele aponta para minha perna. — Tem certeza de que não
precisa de um pouco de gelo ou algo assim?
Eu balanço minha cabeça.
— Sacrifícios tiveram que ser feitos.
Nós nos posicionamos no chão, nossas pernas balançando na colina abaixo. Mais uma vez, co
impressionada com o quão normal isso parece. Ele faz parte da minha vida há tanto tempo que há um
conforto misturado com a novidade, e mal posso esperar para conhecê-lo de todas as maneiras que
perdemos antes.
— Quando você soube? — Eu descanso minha cabeça em seu ombro. — Que você não me desprezava.
— Não foi um evento singular — diz ele, com o braço em volta da minha cintura. — Tarde no primeiro
ano foi quando comecei a sentir algo por você, mas achei que era inútil. Você não me suportava e eu
aparentemente não suportava você.
— Você escondeu tão bem.
— Eu precisei. Se eu de repente agisse de maneira diferente, você caria descon ada.
— Então você gostava de mim mesmo durante aquela reunião do conselho estudantil que durou até
meia-noite, aquele incidente dos Homens Brancos em Perigo?
— O quê?
— Oh– Um Homem Branco em Perigo. É como eu chamo seus clássicos, já que têm tudo a ver com,
bem...
— Homens brancos em perigo — ele naliza, rindo. — E sim. Sim, eu gostava. E você?
— Três horas atrás? — Eu digo, e com a mão livre, ele agarra o coração como se estivesse com dor. —
Quinze horas atrás, quando eu vi seus braços naquela camiseta?
— Deus abençoe minha rigorosa rotina de exercícios.
— É assim que você chama aqueles pesos de um quilo em sua mesa?
— Eu– um– eu mantenho os maiores no meu armário — ele diz. — Realmente enormes. Vinte, quase
trinta quilos. Eu não quero que ninguém que muito intimidado, você sabe.
— Isso é muito atencioso. — Eu me aconchego mais perto. — Se eu estou sendo honesta, entretanto...
eu não tenho certeza. Percebi hoje, mas acho que gosto de você há um tempo.
Depois de alguns momentos de silêncio, ele pergunta:
— Você se lembra daquela eleição para representante do primeiro ano?
— Claro. Foi uma vitória esmagadora para mim.
— Pelo que me lembro, você venceu por uma margem bastante estreita. — Ele torce uma mecha do meu
cabelo. — Eu ganhei aquele concurso de redação, e você ganhou a eleição. E então continuamos tentando
superar um ao outro.
— Todos esses anos, nós lutamos quando poderíamos estar... não lutando.
Ele se afasta, e quando eu levanto minha cabeça, ele está me olhando estranhamente.
— Na verdade, eu estava pensando o contrário. Que não tenho certeza se estávamos prontos para isso.
Eu de nitivamente não estava.
— Talvez não — eu admito. Ainda assim, é devastador pensar no que poderíamos ter compartilhado.
Visões de uma linha do tempo alternativa passam pela minha mente – jogos de futebol e danças do baile e
fotos estranhas e...
Eu o forço para longe. Essa não é a nossa realidade.
— É meio poético que esteja acontecendo hoje à noite, no entanto — ele diz. Então, com um o de
preocupação na voz: — Não é só esta noite para você, é? Porque estou realmente nisso, se você estiver.
— Eu estou. Isso... isso parece real. Eu quero estar com você. — Estou ciente, novamente, de todas as
conversas que ainda não tivemos. As conversas que tenho de repente medo de ter quando ele se sente tão
bem ao meu lado.
Ele traça o contorno da minha sobrancelha com a ponta do dedo. Um e depois o outro, como se tentasse
memorizar minha aparência.
— Quero te contar. Decidi que não vou ver meu pai neste verão. Talvez um dia eu mude de ideia sobre
isso e queira algum tipo de relacionamento com ele, mas ainda é muito recente. Eu não estou preparado.
— Você se sente bem com isso?
Ele concorda.
— Eu sinto. E– eu z um agendamento online. Para mudar meu sobrenome. É a hora.
— Neil — eu digo, colocando minha mão em seu joelho. — Isso é... uau.
— É a decisão certa para mim. Por muitas razões.
— Vou ter que mudar seus apelidos. — Quando ele faz uma cara estranha, acrescento: — Estou ansiosa
por isso.
Eu me inclino e o beijo. É tão fácil ser pega no momento com ele, para o mundo exterior se dissolver.
— Eu também, hum, tenho algo para você — ele diz depois de alguns momentos, mudando para poder
pegar sua mochila. — Depois que nos separamos, passei por um QFC16 e achei que pelo menos faria você
sorrir se decidisse que queria falar comigo novamente. E que talvez você estivesse com fome. — Com isso,
ele revela o presente: um pote da Philadelphia com uma ta vermelha em volta e uma sacola reciclável com
dois bagels dentro. — Eu também tenho uma colher, se você preferir assim.
— Você nunca vai me deixar esquecer isso, hein? — Digo, embora meu coração tropece com esse
presente inesperado. É ridículo, sim, mas também é tão doce.
— Não. Eu amo isso. Eu... — ele se interrompe, como se percebesse que poderia revelar algo que não
tem certeza se estou pronta.
— Eu também te amo — eu digo, e o horror em seu rosto torna-se calmo. É tão fácil dizer e me dá tanta
pressa que quero dizer de novo imediatamente. — Eu, hum, li o que você escreveu no meu anuário. Em
minha defesa, era o dia seguinte e pensei que você me odiasse. Mas estou apaixonada por você, Neil McNair
– Neil Perlman – e acho que talvez já esteja apaixonada por você há muito tempo. Só levou um tempo para
meu cérebro alcançar meu coração. Não sei como não percebi, mas você é incrível pra caralho.
É incrível ver alguém derreter na sua frente. Seu rosto se suaviza e seus lábios se abrem, e ele me puxa para
tão perto que posso sentir nossos corações batendo um contra o outro.
— Eu sei que escrevi, mas tenho que dizer em voz alta agora também — diz ele. Eu me preparo para isso.
Eu queria ouvir essas palavras desde que descobri aquele primeiro romance em uma venda de garagem. —
Eu estou apaixonado por você. Você é a pessoa mais interessante que conheço e nunca consegui falar com
ninguém do jeito que falo com você. Dediquei os últimos quatro anos para deixar Seattle, mas você... Você é
a melhor coisa desta cidade. Você vai ser a coisa mais difícil de deixar. Eu te amo muito.
De todos os livros que li, achei que entendia o conceito de amor, mas, uau, não sabia de nada. Eu me
envolvo nele, não porque quero o calor de seu corpo, mas porque não consigo chegar tão perto quanto
quero. Achei que estava preparada para ouvir isso. A nal, eu já tinha visto isso por escrito. Mas isso me
preenche completamente, a ponto de meu peito quase doer. Eu dei a esse garoto as partes mais bagunçadas
de mim, e ele não fez nada além de me convencer de que será cuidadoso com elas.
Com brilhos nos olhos, nos beijamos e observamos o céu e mergulhamos bagels no cream cheese.
Quando terminamos de comer, pego minha mochila e pego o Guia para o sucesso do ensino médio de
Rowan Roth.
— Então isso foi meio besteira, hein?
— Não é besteira — ele diz. — Mas possivelmente não é a coisa mais encorajadora ou inspiradora?
— Não sei se quero rasgá-lo. — Eu o viro no parapeito, aliso os amassados. — Mas talvez pudéssemos
escrever um novo?
Guia de Rowan Roth para o sucesso na faculdade... e além!

Por Rowan Luisa Roth, de 18 anos e Neil (Perlman) McNair, de 18 anos

1. Abandonar a ideia de “perfeito” porque ela não existe. Ninguém quer um rolinho de canela perfeito;
eles querem um que seja instável, deformado e coberto de glacê. Cobertura de cream cheese, é claro.

2. Termiar meu livro. Escrever outro.

3. Fazer o máximo possível de aulas que pareçam interessantes. Escrita criativa e talvez espanhol, e
talvez algumas outras coisas também. Mantenha a MENTE ABERTA!

4. Ouça música mais alegre, embora a música melancólica também tenha seu tempo e lugar.

5. Desfrutar de tantas noites como esta quanto for possível.


03h28

AINDA ESTOU SEM ENERGIA ELÉTRICA e Neil McNair está no meu quarto, e isso, de alguma forma,
não é a coisa mais estranha que aconteceu hoje.
Depois que terminamos nossa lista, perguntei se ele gostaria de voltar para minha casa, já que ele nunca
teve a chance de ver meu quarto. É o nal certo para este dia: deixá-lo entrar no meu pedacinho do mundo,
do jeito que ele me deixou entrar no dele.
Sou extremamente grata por meus pais estarem lá embaixo e dormirem muito. Tenho certeza de que não
acordarão antes do meio-dia, mas não quero correr nenhum risco, então entramos na ponta dos pés e tenho
que me forçar a sussurrar.
Meu telefone tem um pouco de bateria após carregar no carro, então encontro uma música suave, mas
não muito deprimente, dos The Smiths e aperto o play.
— Então este é o quarto de Rowan Roth — ele diz, passando a mão pela minha mesa. Eu amo a maneira
como ele ca no meu quarto, suavemente iluminado por uma lanterna. Ele olha das colagens de fotos e
prêmios acadêmicos em minhas paredes para os livros empilhados na minha mesa de cabeceira para os
vestidos derramando para fora do meu armário.
— Sim. Toda a magia acontece bem aqui.
— Gosto disso. Tem muito de você. — Ele se vira de costas para a mesa. — O que você gostaria de fazer?
— Hmm... eu estava pensando em jogarmos Monopoly.
— Monopoly? — Tem aquele sorriso preguiçoso. — Ok, mas eu sou muito bom em Monopoly, e vai ser
constrangedor se eu vencer você novamente...
Meus lábios já estão nos dele. Esse beijo parece mais pesado do que o que aconteceu no museu, na
academia, no Kerry Park. Como se alguém nos colocasse em uma tomada elétrica ou nos incendiasse. Ele
enterra as mãos no meu cabelo, me empurrando para trás. Quando a parte de trás dos meus joelhos bate na
cama, ele sussurra:
— Desculpe — e eu tenho que segurar uma risada enquanto o puxo para baixo ao meu lado. Subo em
seu colo. Então estamos nos beijando de novo, e seus óculos continuam caindo, então ele os tira e os coloca
na mesa de cabeceira. Ele é tão adorável e tão quente e tão doce, sempre tão doce.
— Eu quero ver você — digo, meus dedos ertando com a bainha de sua camiseta.
— Estou avisando, é um monte de sardas. — Mas ele a tira, revelando, para meu deleite, a barriga
maravilhosamente sardenta que tive um vislumbre antes.
— Eu amo suas sardas. Realmente e verdadeiramente.
Deixo impressões de mãos invisíveis por todo o peito, aprendendo exatamente onde ele tem cócegas. Ele
desliza as mãos até meus joelhos, meu quadril, por baixo do vestido que de repente se tornou uma camisa de
força. Eu giro em seu colo, tentando alcançar o zíper. Ele tem que me ajudar com isso, e juntos nós o
arrancamos.
Uma vez que estou apenas de sutiã e calcinha, ele me encara.
— Eu não sou feia, certo? — Eu digo, porque provocá-lo nunca deixará de ser divertido.
— Agora você sabe por que fui totalmente incapaz de lhe fazer um elogio. Você é espetacular — diz ele,
inclinando-se para beijar meu pescoço. — E deslumbrante. E... sexy. — Há uma batida antes que ele diga a
última, e a palavra me faz estremecer. Deus.
— Você vai me destruir — eu sussurro.
Perder meu vestido me faz beijá-lo com ainda mais urgência. Eu corro minha mão na frente de sua calça
jeans, e ele respira fundo por entre os dentes. É talvez o melhor som que já ouvi, pelo menos até eu abrir o
zíper, desabotoar e jogar seu jeans de lado completamente, pressionando-o mais fundo na cama, e ele solta
outro gemido ofegante novamente. Sim, estou destruída.
Por um tempo, nos dissolvemos em um borrão de lábios, suspiros e toques. O ocasional rangido do
colchão quando nos reposicionamos, uma na camada de tecido nos separando. A cada novo toque, ele é
tímido no início, e isso me mata, porra.
Sua mão desliza entre minhas pernas, acariciando a parte interna da minha coxa e para cima, para cima.
— Isso... seria bom?
— Sim. Sim. — O que realmente quero dizer é por favor.
Levei tempo su ciente para descobrir por mim mesma, então eu dei-lhe algumas orientações. Acontece
que ele é um excelente ouvinte. Ele sussurra meu nome em meu ouvido, me desfazendo lentamente, e então
estou no limite e caindo, caindo...
Ainda estou me recuperando quando a energia volta de repente e a casa ganha vida, todas as luzes do
meu quarto piscando em simultâneo.
Ele tem sardas por toda parte.
Eu absolutamente amo isso.
Passamos tanto esta noite no escuro que não posso deixar de rir, e ele se junta a mim, apertando os olhos
para as luzes brilhantes.
— Shhh — eu digo, mas não adianta.
— Muito brilhante — ele geme. — Há muita luz natural vindo de fora.
E ele está certo, então eu me levanto da cama para desligar tudo e, em seguida, espero um minuto para ter
certeza de que meus pais não estão descendo as escadas. Quando estou con ante que eles ainda estão salvos
num coma de uísque escocês, rastejo de volta para ele.
Ele estende a mão para mim, mas eu coloco uma mão gentil em seu peito.
— Espere — eu digo. — Até onde estamos indo aqui, exatamente? Devíamos conversar sobre... o que
quer que estejamos fazendo. Ou não fazendo. — Ansiosamente, puxo minha franja. — Porque estou de
acordo com tudo isso, mas sei que você não... você sabe. Fez sexo.
O peso disso paira entre nós. Neil se senta, os lençóis amontoados em volta de nossos tornozelos. Não é
como com Spencer, onde, porque eu já tinha feito isso com Luke, pensei, por que não. Eu quero isso, com
Neil. Quero falar sobre isso e quero que ele se sinta à vontade para falar sobre isso comigo. A ideia de estar
com ele dessa forma me deixa tonta de desejo. Quero mais do que esta noite, mas não consigo pensar no
futuro agora.
— Acredite em mim — diz ele, com a mão na minha cintura como se fosse a coisa mais natural do
mundo — não há literalmente nada que eu queira mais do que você. Nem mesmo o orador da turma.
— Eu não sei se fazer sexo é melhor que ser o orador da turma. E também não tenho certeza se esse é o
uso correto de ‘literalmente’. Você deveria saber disso.
— Com você, pode ser. — A preocupação pisca em seu rosto. — Eu tenho que ser honesto. Estou um
pouco nervoso. Que eu vou, tipo, bagunçar ou algo assim, ou tornar isso horrível para você. E então você
nunca mais vai querer fazer isso de novo, o que seria devastador, dado o quanto eu gosto de você.
Seus nervos o tornam ainda mais querido por mim. Gosto que ele não se torne imediatamente um cara
supercon ante e manso.
— Eu também estou nervosa — eu admito. — Animada, mas nervosa, e isso é normal. É por isso que
falaremos um com o outro. Sempre fomos bons nisso, certo? — Digo, e ele acena com a cabeça. — A
primeira vez com alguém geralmente é imperfeita. Isso é parte do que o torna divertido: descobrir juntos
como torná-la boa.
— Não vai ser um romance perfeito — diz ele, mas não está me repreendendo.
— Não. Não na primeira vez, e provavelmente não na segunda ou na terceira. Talvez nunca,
honestamente, mas será nosso. E... isso pode ser melhor.
Seu polegar desenha círculos em meu quadril.
— Tem certeza que quer isso também? Nós não– quero dizer, nós nos conhecemos há algum tempo,
mas nós apenas nos beijamos hoje à noite, e… — Um desengonçado Neil McNair é quase adorável demais.
É uma decisão fácil.
— Tenho certeza.
— E ei, você ainda tem um preservativo na sua mochila.
Eu gemo.
— Oh meu Deus. Eu estava tão morti cada.
— Preservativo velho — ele diz, e então estou rindo com ele.
— Eu tenho, na verdade, alguns que não estão no armário do Kirby há Deus sabe quanto tempo.
Leva apenas um momento para sair da cama e agarrá-los, um momento para tirar nossas roupas íntimas.
Mais alguns momentos para ajudá-lo a colocar um antes de perceber que está do avesso. Ele vai para o lixo e
então tentamos novamente.
Após acertar, não dura muito, porque estamos cansados ou porque é a primeira vez dele ou alguma
combinação dos dois. Ocasionalmente, ele me checa, perguntando se ainda está bom, se ainda estou bem. E
sim. Sim. Fazemos o possível para car quietos, mas não conseguimos parar de sussurrar um para o outro.
Acabamos de nos tornar amigos, amigos de verdade, e há muito que queremos dizer.
Ele termina primeiro e, em seguida, seus dedos se movem entre nós e ele me leva lá pela segunda vez esta
noite. Outra coisa que aprendi: Neil McNair é extremamente generoso.
Então camos quietos, mais silenciosos do que minha casa adormecida e escura. É um tipo de silêncio
pací co e apreciativo. Eu me enterro perto dele, descansando minha bochecha contra seus batimentos
cardíacos enquanto ele brinca com meu cabelo.
— De tremer a terra — diz ele.
— O que acabou de acontecer? Concordo.
Ele beija o topo da minha cabeça.
— Bem, sim, mas eu quis dizer você.
ROWAN

bom dia

este é um lembrete amigável de que você tem um (1)


minuto e contando antes de eu acordá-lo
05h31

QUANDO ACORDO, sou imediatamente atingida por aquela sensação de pânico que você tem nos ns
de semana, às vezes, quando está convencida de que está atrasada para a escola.
Porém, não estou atrasada, não tenho mais escola e Neil McNair está na minha cama.
Ele está de lado ao meu lado, um braço jogado sobre o travesseiro, o outro em volta da minha cintura. A
luz do sol da manhã inclina-se sobre seu rosto, deixando seu cabelo em chamas. Ele é bonito. O céu é uma
tela clara de cobalto, a tempestade de ontem esquecida.
Finalmente parece verão.
Como se sentisse que estou acordada, ele me puxa para mais perto e dá um beijo na minha nuca. A
realidade volta à tona. Neil e eu zemos sexo ontem à noite. Bem, uma hora atrás, tecnicamente esta manhã.
E foi bom.
— Isso realmente aconteceu? — Digo em voz alta.
— Sim, a menos que você e eu tenhamos o mesmo sonho intensamente erótico.
— Eu pre ro a realidade. — Eu me aconchego mais perto. — Foi bom para você? Você se sente
diferente?
— Teremos que fazer isso mais algumas vezes para ter certeza — diz ele com aquele sorriso maravilhoso.
— Sim. Foi incrível. Não tenho certeza se me sinto diferente, exatamente. Principalmente, acho que estou
simplesmente feliz. E... não foi terrível para você?
Eu respondo pressionando-me contra ele, deixando cair beijos em sua mandíbula, em seu pescoço.
— Você me faz muito, muito feliz também. Eu espero que você saiba disso.
Ele me segura com mais força.
— Eu te amo, Rowan Roth — ele diz. — Não acredito que posso dizer isso.
Acho que nunca vou me cansar de ouvir isso. Eu sussurro de volta, em sua pele. Passo a mão em seu
braço sardento e o puxo para olhar seu relógio.
— Por mais horrível que pareça, devemos nos levantar antes que meus pais o façam.
Ele beija meu ombro nu enquanto me forço a me sentar.
— Não pense que não espero seu relatório sobre o livro na minha mesa amanhã só porque zemos sexo.
— Que livro?
— Hmm. A Era da Inocência? Moby Dick? Outra volta do parafuso? — Ele pensa por outro momento,
aquele sorriso preguiçoso aparecendo novamente. — Tempos difíceis?
— Isso é uma autobiogra a?
— Não, é Dickens. Pelo menos três páginas, por favor — ele diz antes de eu empurrá-lo de volta na cama.

Cerca de dez minutos depois, ele pega sua camiseta e a veste.


— Então, o que você acha? Devo car tranquilo e sair furtivamente pela janela?
— Eu acho que você precisa.
— Acho que te vejo na KeyArena para a formatura. Que agora é amanhã. Uau. Eu realmente deveria
trabalhar no meu discurso de orador.
— E no dia seguinte — eu digo — podemos ter uma maratona de Star Wars. Ou ir em um encontro
real.
— E isso? — ele diz, apontando para os meus lençóis. — De nitivamente, devemos fazer isso de novo.
— De nitivamente, deveríamos fazer muito isso. Pelo menos até agosto. — Esse peso repentino me joga
na cama. — Então... isso é uma coisa com a qual teremos que lidar.
Neil deve notar a mudança no meu rosto porque ele para no meio do caminho para a velar o cinto e se
aproxima.
— Artoo. Ei. Nós vamos resolver isso.
O apelido me derrete.
— Eu só... não estou pronta para dizer adeus — digo, surpresa com a quebra inesperada na minha voz.
— Posso dizer adeus ao resto, à escola e aos nossos professores e a todos os outros– mas não posso dizer
adeus a você.
— Você não precisa. — Ele segura meu rosto, passando o polegar ao longo da minha bochecha. — Este
não é o m. Longe disso, espero. Se não incomodarmos um ao outro até a morte até o nal do verão, então
porque não podemos continuar? Nova York e Boston não estão tão distantes um do outro.
— Um pouco mais de quatro horas de trem. — Explorar outras cidades com Neil – parece maravilhoso
demais.
— E estaremos de volta aqui nos recessos — diz ele. — Você e eu temos que ser sempre os melhores,
certo? Então seremos os melhores em longa distância, se for o que decidirmos fazer. Mas agora... — Ele
aponta para a sala ao nosso redor. — Agora, nós temos isso.
Eu deixo isso aprofundar em mim, tentando car bem com essa incerteza. Por mais que eu tenha
idealizado o feliz para sempre, não posso negar que ele está certo. Hoje não é meu epílogo com Neil – é um
começo.
Vou deixar os felizes para sempre nos livros.
— Eu acho que posso fazer isso — eu digo, e estendo a mão para ele novamente.
O amor que eu queria tão desesperadamente: não é assim que pensei que seria. Me deixou tonta e
grudou em mim. Me fez rir quando nada é engraçado. Brilha e acende, mas pode ser confortável também,
um sorriso sonolento e um toque suave e uma respiração calma e constante. É claro que esse garoto – meu
rival, meu despertador, meu aliado inesperado – está no centro de tudo.
E de alguma forma, é ainda melhor do que eu imaginava.
Nota da Autora

SEATTLE NEM SEMPRE teve meu coração.


Uma cidade construída nas terras de Duwamish, Seattle é habitada há milhares de anos. Foi incorporada
em 1869, depois que os pioneiros notaram a falta de “mulheres casáveis” e recrutaram cerca de cem da Costa
Leste para servir como noivas para os primeiros residentes da cidade. A cidade oresceu após uma corrida
do ouro, mas perdeu seu distrito comercial para o Grande Incêndio de Seattle em 1889, e então foi
rapidamente reconstruída. Duas feiras mundiais do século XX foram fundamentais para o progresso da
cidade: primeiro a Alaska-Yukon-Paci c Exposition em 1909 e, a seguir, a Century 21 Exposition em 1962,
que nos deu o Space Needle. Hoje, Seattle é um centro para start-ups e grande tecnologia.
Morei aqui minha vida inteira, primeiro em um subúrbio conhecido por sua conexão com a Microsoft,
depois em um bairro universitário e agora em uma colina no norte de Seattle, não muito diferente de onde
Rowan mora. Na adolescência, fui cativado pela ideia de me reinventar do outro lado do país e estava
ansioso para fugir. Eu estava farto de árvores, nuvens e escuridão. Quando cou claro que eu iria para a
faculdade em Seattle, concentrei minha energia em candidatar-me a estágios e, posteriormente, a empregos
fora do estado.
Não que eu me resignasse a amar Seattle quando nada desse certo. Eu não me senti preso. Em vez disso,
foi uma apreciação gradual dos pontos turísticos, da cultura e das pessoas. A música também – ainda estou
para conhecer alguém que seja mais esnobe da música do que alguém que cresceu em Seattle. Gosto de
pensar que Seattle e eu temos um relacionamento em que sou capaz de zombar e a cidade não se importa.
Estou fazendo isso por amor.
Quando vemos Seattle na cultura pop, geralmente temos apenas um pedaço dela: chuva, o Obelisco
Espacial, anela. Eu queria cavar mais fundo – e assim nasceu o jogo Howl. Embora este livro se passe em
uma cidade muito real, é uma colcha de retalhos da Seattle atual e da Seattle em que cresci. Muitos dos
marcos estão intactos no momento: Cinerama, Pike Place Market e a parede de gengiva, a Grande Roda, o
Biblioteca Pública de Seattle, Fremont Troll, Kerry Park. Alguns deles eu tomei liberdades ccionais.
Infelizmente, a exposição noturna do Woodland Park Zoo não está mais aberta. Ela foi fechada durante a
recessão e, embora houvesse planos de reconstrução, um incêndio no prédio interrompeu os planos. O
Museu dos Mistérios já foi um lugar real no Capitólio, mas agora existe apenas online em
nwlegendsmuseum.com. Devo também mencionar que Rowan e Neil realmente têm uma sorte incrível
para encontrar vagas para estacionar.
Quando comecei a escrever Today Tonight Tomorrow, era importante para mim que Rowan amasse
Seattle, mesmo que ela estivesse decidida a deixá-la para trás e ir para a faculdade. Este livro é uma carta de
amor para o amor, mas foi uma carta de amor para Seattle primeiro.
As cidades são obras perenes em andamento, e é possível que alguns dos detalhes da con guração
tenham mudado no momento em que você está lendo isto. Mais e mais dos meus buracos na parede
favoritos estão se tornando condomínios e moradias, e antes de serem meus buracos na parede favoritos, eles
eram a outra coisa favorita de outra pessoa.
Este é meu terceiro livro que se passa em Seattle, mas ainda há muito que não sei sobre o lugar que
sempre foi minha casa. Se e quando eu deixar esse cenário para trás, ele estará sempre em minhas veias e na
alma de meu contador de histórias.
Seattle, você é estranha e maravilhosa, e eu não aceitaria de outra maneira.
Agradecimentos

ESTE LIVRO É feliz, mas comecei a escrevê-lo em um momento difícil. Embora eu sempre tenha sido
atraída por livros sombrios e pesados, durante meses após a eleição de 2016, não consegui abrir um dos
muitos destruidores de corações garantidos esperando na minha estante. Eu queria ler – não sei quem sou se
não estou no meio de três livros em simultâneo – mas nada estava me chamando. E foi então que encontrei
romances.
Sempre adorei subtramas românticas, mas não estava familiarizado com o romance como gênero, e
quanto mais eu lia, mais percebia que era o que eu queria fazer a seguir. Meus dois primeiros livros tiveram
nais agridoces e muita leviandade, mas também havia muito desespero. Eu não sabia se poderia escrever
um livro divertido – até mesmo todos os meus manuscritos arquivados são sombrios, sombrios, sombrios –
e, no entanto, de repente, era tudo o que eu queria escrever. Rowan não era realmente uma romancista em
meu primeiro rascunho, mas depois que passei tanto tempo aprendendo o gênero, parecia certo transformá-
la em uma. Nora Roberts, Meg Cabot, Christina Lauren, Alyssa Cole, Tessa Dare, Alisha Rai, Sally
Thorne, Courtney Milan – sem seus livros, eu não teria sido capaz de escrever um romance sobre romance.
Tenho vergonha de admitir que meu eu mais jovem era muito parecido com Neil, muito parecido com as
pessoas que julgam uma parte inteira da cultura pop antes de ler, assistir, ouvir. A verdade é que os
romances me deixaram realmente feliz de uma maneira que os livros nunca me zeram sentir antes. Sempre
amarei livros sombrios, e a escuridão também encontra seu caminho nos romances, mas há um grande
conforto em saber que um feliz para sempre está esperando por você. E, no entanto, ainda consegue parecer
estilhaçante todas as vezes.
Não há adjetivos su cientes para minha fenomenal editora, Jennifer Ung. Obrigado por estar
imediatamente a bordo com um livro tão diferente dos meus dois primeiros. De alguma forma, você
entende exatamente o que estou tentando fazer, mesmo quando minhas intenções se perdem entre meu
cérebro e a página. Meus livros são in nitamente melhores por sua causa.
Obrigado a Mara Anastas e à brilhante equipe da Simon Pulse: Chriscynethia Floyd, Liesa Abrams,
Michelle Leo, Amy Beaudoin, Sarah Woodru , Ana Perez, Amanda Livingston, Christine Foye, Christina
Pecorale, Emily Hutton, Lauren Ho man, Caitlin Sweeny, Alissa Nigro, Savannah Breckenridge, Nicole
Russo, Lauren Carr, Anna Jarzab, Chelsea Morgan, Sara Berko, Rebecca Vitkus e Penina Lopez. Laura
Eckes, obrigada por desenhar a capa dos meus sonhos, e Laura Breiling, obrigada pelas ilustrações perfeitas,
perfeitas. Para completar a trindade de Laura, agradeço à minha agente, Laura Bradford, por acalmar a
ansiedade de minha autora e fazer o lado comercial da escrita funcionar tão bem.
Kelsey Rodkey, talvez seja apropriado que este livro comece e termine com você. As notas perspicazes, as
conversas estimulantes, as agitações, os memes... obrigado por tudo isso. Eu te adoro, e sua amizade é muito
cara para mim. HAGS! Sou imensamente grata aos amigos que deram feedback em vários estágios da vida
deste livro: Sonia Hartl, Carlyn Greenwald, Tara Tsai, Marisa Kanter, Rachel Gri n, Rachel Simon,
Heather Ezell, Annette Christie, Monica Gomez-Hira e Auriane Desombre. Obrigado aos meus
con dentes editoriais Joy McCullough, Gloria Chao, Kit Frick e Rosiee Thor, e obrigado à minha colega de
trabalho favorita da cafeteria, Tori Sharp. Eu nunca vou deixar nenhum de vocês ir!
Compartilhei a primeira versão deste livro em um workshop de Djerassi em junho de 2017, dirigido pela
espetacular Nova Ren Suma. Obrigado, Nova, e obrigado a Alison Cherry, Tamara Mahmood Hayes, Cass
Frances, Imani Josey, Nora Revenaugh, Sara Ingle, Randy Ribay e Kim Gra . Aquela semana nas
montanhas foi um dos destaques da minha carreira.
Ivan: estes são os primeiros agradecimentos onde posso chamá-lo de meu marido! Estou tão feliz por
você ser minha pessoa, e obrigado por fazer a melhor comida no prazo de entrega.
É sempre um pouco assustador enviar um livro ao mundo, e o apoio de leitores, blogueiros, livreiros,
bibliotecários e professores tornou essa experiência muito menos assustadora. Todos vocês são INCRÍVEIS
e estou grato além das palavras pelas postagens, tweets, e-mails e boca a boca que ajudaram a tornar possível
para mim continuar fazendo o meu trabalho dos sonhos. De todo o coração, obrigado.
Notas

[←1]
A protagonista faz um trocadilho com o nome dele pela semelhança no início da palavra,
traduzido literalmente seria “McPesadelo”.
[←2]
Sistema de notas que se baseia na média de todas as notas semestrais obtidas ao longo do curso,
sendo utilizada para medir o grau de sucesso do estudante durante o curso.
[←3]
O ramo de oliveira, num sen do metafórico, significa paz, como estender uma bandeira
branca.
[←4]
Saag ou sag é um prato à base de folhas tradicional do subcontinente indiano e
servido habitualmente com pão do tipo roti ou naan, ou arroz. O saag pode ser feito
das folhas de diversas plantas, e é temperado com especiarias e, por vezes, leva
outros ingredientes como paneer.
[←5]
Relacionado a resolução de filme.
[←6]
O cartão ORCA é um sistema de cartão inteligente sem contato com valor armazenado
para transporte público, como, por exemplo, o sistema de bilhete único que u lizamos aqui
no Brasil.
[←7]
Rua sem saída.
[←8]
Rede americana de restaurantes.
[←9]
subgênero do rock alterna vo
[←10]
O teste de Bechdel pergunta/ques ona se uma obra de ficção possui pelo menos duas
mulheres que conversam entre si sobre algo que não seja um homem. Algumas vezes se
adiciona a condição de que as duas mulheres tenham nomes. Muitas obras contemporâneas
falham no teste, que é um indica vo de preconceito de gênero.
[←11]
Kiddush é a bênção recitada sobre o vinho ou suco de uva para san ficar o Shabbat ou
uma festa judaica.
[←12]
A palavra hebraica Challa, refere-se à porção da massa de pão, que foi dada como um
sacri cio e dada aos sacerdotes do templo, no livro de Números 15: 17-21, onde as primícias
são descritas.
[←13]
Kosher (ou kasher) é um termo que faz referência aos alimentos que são adequados ou
permi dos pelas leis alimentares do judaísmo.
[←14]
Para Neil, Cave!
[←15]
Situações clichês que acontecem na história.
[←16]
A Quality Food Centers é uma rede de supermercados
Table of Contents
Aviso
Aviso de Conteúdo
5h54
6h37
7h21
8h02
9h07
10h08
11h14
11h52
12h26
12h57
13h33
14h02
14h49
15h40
16h15
16h46
17h33
18h22
19h03
19h34
20h28
20h51
21h20
22h09
22h42
23h26
0h05
0h27
0h43
1h21
2h04
2h49
3h28
5h31
Nota da Autora
Agradecimentos

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