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CATEGORIZAÇÕES DE LICENCIANDOS DO CAA/UFPE: ENTRE A CRUZADA

MORAL, O “IDEOLOGIA DE GÊNERO” E O CARÁTER DEMOCRÁTICO E


PLURAL DA ESCOLA

Maria Hosana Borges Duarte.1


Marcelo Henrique Gonçalves de Miranda2

INTRODUÇÃO

Este projeto de pesquisa aprofunda e aborda distintos aspectos a partir do estudo


realizado via Edital PIBIC/UFPE Propesq 08/2020 e está vinculado ao projeto guarda-chuva
intitulado: Inteligibilidades docentes, discentes e a equidade social: possíveis fortalecimento
do caráter plural e democrático da escola. Nesse sentido, O Brasil, na Pandemia COVID-19,
ainda enfrenta disputas por projetos de sociedade, de escola e de formação humana entre o
neoliberalismo , o neoconservadorismo e propostas que amplie o acesso a uma educação de
qualidade, crítica e reflexiva, fortalecendo o regime democrático, o respeito aos direitos
humanos, a inclusão e o reconhecimento social de grupos marginalizados e invisibilizados.
Essa convergência perversa entre o neoliberalismo e neoconservadorismo vem
ganhando força via cruzada moral promovida por religiosos fundamentalistas, políticos
conservadores, pelo Movimento Escola Sem Partido. Este movimento reacionário se utiliza
do pânico moral ao inventar o dispositivo acusatório “ideologia de gênero” como crítica aos
estudos de gênero, às teorias feministas, às políticas pela equidade de gênero e diversidade
sexual, às conquistas dos direitos sexuais e reprodutivos (JUNQUEIRA, 2017; LEAL, 2017;
BALIEIRO, 2018; BORGES; BORGES, 2018; MARAFON; SOUZA. 2018; MISKOLCI,
2018, MOURA; SALLES, 2018).
Nesse aspecto, indo além do pânico moral, do “ideologia de gênero” e das
sexualidades categorizadas como “disparatadas”, e levando em consideração que os alunos
que estão no Ensino Superior são egressos da Educação Básica nesse contexto do
neoliberalismo e do neoconservadorismo, pergunta-se: quais as inteligibilidades dos
licenciandos do curso de Física do Núcleo de Formação Docente, do Campus Acadêmico do
Agreste, da Universidade Federal de Pernambuco (NFD/CAA/UFPE) sobre as temáticas
relacionadas ao “ideologia de gênero, ao gênero e à sexualidade?

1
Estudante do Curso de Licenciatura em Física- CAA – UFPE; E-mail: hosana.duarte@ufpe.br
2
Docente/Pesquisador do Núcleo de Formação Docente- CAA – UFPE; E-mail: marcelo.gmiranda@ufpe.br
MATERIAIS E MÉTODOS

A pesquisa, de natureza qualitativa, buscou ter acesso ao mundo subjetivo dos


licenciandos do curso de Física do Núcleo de Formação Docente, do Campus Acadêmico do
Agreste, da Universidade Federal de Pernambuco (NFD/CAA/UFPE). O estudo foi
desenvolvido em três etapas. Na primeira etapa, foi realizado um levantamento e seleção dos
discentes divididos em três subgrupos: a) estudantes que estavam nos primeiros semestres do
referido curso; b) estudantes que estavam no meio do curso; e c) estudantes que estejam nos
últimos períodos dos cursos. Em seguida, aconteceu a visita à universidade para realizar o
contato com os licenciandos. Após a seleção e aceite dos licenciados, aplicamos as técnicas de
coletas de dados de conversas informais e de entrevista semiestruturada com um roteiro de
perguntas previamente estruturado, respeitando as medidas de saúde diante da pandemia da
COVID-19. Os dados obtidos, foram categorizadas pela metodologia da Análise de Conteúdo
(AC). A AC é “um conjunto de técnicas de análise de comunicações que utiliza
procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens” (BARDIN,
1977, p. 38). Dessa maneira, por meio da análise temática de conteúdo foi possível fazer
categorizações do material coletado via inferência, permitindo que se parta de um texto focal
para o contexto social sobre as temáticas em foco no estudo (BARDIN, 1977; BAUER, 2010;
GOMES, 2016).

RESULTADOS E DISCUSSÕES

As primeiras reflexões feitas pelos licenciando foram sobre as temáticas de gênero e


mesmo reconhecendo suas limitações, não se recusaram a falar sobre, sendo de forma
favorável ou não. As primeiras contatações foram que eles ainda são muito apegados as
definições de gênero pela dualidade, feminino e masculino, esse binarismo de gênero
cristaliza-se em nossas mentes, em nossas vidas de tal modo que nem nos questionamos o
porquê de todas as construções feitas desde criança para a menina e para o menino, o cor-de-
rosa feminino e o azul masculino (PERUCCHI, 2014, p. 118). Quando questionados sobre a
diversidade sexual, ficaram um pouco confusos e receosos, refletindo quais os melhores
termos para conceituarem, mesmo assim ainda acabam ligando essa questão a opção e sabe-se
que não é uma escolha.
O segundo eixo tratou de preconceito e discriminação, todos eles já observaram esse
tipo de situações e ou já estiveram no lugar de agressor e de vítima dessas situações. Vale
ressaltar que esses preconceitos e discriminações (violências), Bullying, geralmente são
praticados em formas de “brincadeiras” que machucam e atingem as pessoas. Em questão das
desigualdades eles citaram em sua maioria a questão empregatícia, principalmente nas
questões salarias. Observam também que as pessoas da comunidade LGBTQIA+ que seguem
o padrão heteronormativo sofrem um pouco menos, por seguirem os padrões impostos
socialmente. Esse ponto também foi citado para o curso de formação docente deles,
principalmente por mulheres, onde relatam que são excluídas apenas por serem mulheres, que
há um extremo preconceito ligando a área de física sempre ao masculino, os próprios
professores são em maioria homens e reproduzem isso para com os alunos.
O terceiro eixo tratou das temáticas no curso de formação docente, desse modo eles
foram questionados sobre quais disciplinas eles cursaram e que de alguma forma abordou as
temáticas. Eles citaram a disciplina obrigatória fundamentos da educação e duas eletivas mais
especificas que foram: Educação Inclusiva e Direitos Humanos e Educação, Gênero e
Sexualidade, sendo a segunda especifica da área e é importante observar que mesmo o
discente passando por essa disciplina ele não consegue desnaturalizar suas concepções
prévias. Outro ponto que um dos estudantes traz é que esse tipo de formação é de maior
preocupação da pedagogia, pois estão em um curso de exatas e percebe-se que não é apenas
um papel da pedagogia e acaba tirando a responsabilidade de si e jogando aos outros, mas
sim, de todos os cursos em todas as formações focando na cidadania e no respeito aos direitos
humanos (MIRANDA; LIMA, 2019).
O quarto eixo discursivo foi sobre o dispositivo Ideologia de Gênero, a maior parte
deles já ouviu falar sobre, mas não conseguem discorrer sobre, nem entendem do que se trata.
Necessitando ter um maior contato com a problematização, três deles conseguem ter uma
concepção mais alinhada com o real viés do tema, mas que alguns deles conheceu o próprio
movimento por meios de política partidária conservadora.

CONCLUSÕES
Diante das análises feitas, podemos concluir que os licenciandos tiveram concepções
semelhantes em boa parte das questões abordadas, enfatizando suas especificidades. Eles
tiveram noção sobre a sociedade em que estamos inseridos e que ela é a fonte de boa parte das
construções feitas e que contribui para a reprodução dos preconceitos, principalmente para
com as mulheres e a população LGBTQIA+, estando presente desde a educação básica à
universidade.
Pôde-se observar também que o curso de Física Licenciatura não oferece uma boa
base para as discussões de gênero nem de diversidade sexual, pois, segundo os estudantes, há
uma disciplina obrigatória e duas disciplinas eletivas, educação, gênero e sexualidade e
educação inclusiva e direitos humanos. Segundo o PPP do curso deveriam ser discutidos,
mesmo que brevemente nas disciplinas obrigatórias: Fundamentos Psicológicos da Educação
II e Políticas Educacionais- Organização e Funcionamento da Escola Básica. A maior parte
deles concordaram que deveria existir mais disciplinas obrigatórias sobre os temas de gênero
e diversidade sexual, já que eles necessitarão para o cotidiano escolar.
Assim, a partir desse contexto, percebe-se que existe uma necessidade enorme em
inserir mais discussões em todos os ambientes e principalmente no respectivo curso de
formação inicial docente, para que os futuros professores e professoras sejam informados e
reflitam em uma sociedade de respeito e aprendizado com as diferenças e com os direitos
humanos combatendo exclusões, discriminações e preconceitos.

REFERÊNCIAS

BALIEIRO, F. de F. “Não se meta com meus filhos”: a construção do pânico moral da


criança sob ameaça. In Cadernos Pagu, n. 53, 2018.

BORGES, R. O., BORGES, Z. N. Pânico moral e ideologia de gênero articulados na


supressão de diretrizes sobre questões de gênero e sexualidade nas escolas. In Revista
Brasileira de Educação. V. 23. p.1-23. 2018.

JUNQUEIRA, R. D. Ideologia de gênero”: a gênese de uma categoria política reacionária–ou:


promoção dos direitos humanos se tornou uma “ameaça à família natural”. In Debates
contemporâneos sobre educação para a sexualidade. Rio Grande, Ed. Furg, 2017.

LEAL, N. C. et al. A questão de gênero no contexto escolar. In Leopoldianum. V. 43. p. 96-


121. 2017.

MARAFON, G; SOUZA, M. C. Como o discurso da “ideologia de gênero” ameaça o caráter


democrático e plural da escola? In PENNA, F; QUEIROZ, F; FRIGOTTO, G. (Orgs.).
Educação democrática: antidoto ao Escola Sem Partido. Rio de Janeiro, LPP/UERJ,
2018.

MISKOLCI, R. Exorcizando um fantasma: os interesses por trás do combate à “ideologia de


gênero”. In Cadernos Pagu, n. 53, 2018.
MOURA, F. P; SALLES, D. C. O escola sem partido e o ódio a professores que formam
crianças (des)viadas. In Revista Periódicus, V. 1. n. 9. p. 136-160, 2018.

MENDONÇA, A. A. Projeto para educação brasileira: da retórica conservadora ao pânico


moral. In Revista Communitas. V.2. n. Edição Especial: Conservadorismos: políticas e
educação. p. 106-120. 2018.

MIRANDA, M. H. G. de; LIMA, L. S. G. A. de. A prática pedagógica dos direitos humanos:


marcadores sociais da diferença e o combate ao bullying. Momento-Diálogos em Educação.
V. 28, n. 1, p. 328-348, 2019.

PERUCCHI, J. Gênero e lesbianidades: Apontamentos para o campo da educação e da saúde.


In Currículos, Gênero e Sexualidades Experiências Misturadas e Compartilhadas, Vitória,
2013. P. 115-129.

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