Você está na página 1de 16

See discussions, stats, and author profiles for this publication at: https://www.researchgate.

net/publication/363762310

Uma breve história do Ayurveda e da psicoterapia: a via oriental e ocidental na


promoção da qualidade de vida do paciente oncológico. Adversidade, Emoções
e Espiritualidade, Em:Bri...

Chapter · September 2022

CITATIONS READS

0 56

1 author:

Paulo Martins
Nova School of Science and Technology
66 PUBLICATIONS 134 CITATIONS

SEE PROFILE

All content following this page was uploaded by Paulo Martins on 22 September 2022.

The user has requested enhancement of the downloaded file.


II Conferência Internacional de Psicologia da Religião e Espiritualidade, “Adversidade, emoções e espiritualidade”

FICHA TÉCNICA DAS ACTAS

Título: Adversidade, Emoções e Espiritualidade

Direcção científica: José Brissos-Lino (Universidade Lusófona).

Organização: José Brissos-Lino e Bárbara Gonzalez (Universidade Lusófona)

ISBN: 978-989-757-210-4

Data: Setembro de 2022

Edição:
Edições Universitárias Lusófonas

Os autores escreveram segundo a ortografia de Portugal ou do Brasil, na forma anterior ou posterior


ao AO/90, segundo a escolha de cada um.

FICHA TÉCNICA DA CONFERÊNCIA

II Conferência Internacional de Psicologia da Religião e Espiritualidade: Adversidade, 2


Emoções e Espiritualidade
Universidade Lusófona – Lisboa, 20 de Novembro de 2021 (online)

Organização:
Núcleo de Estudos em Psicologia da Religião e Espiritualidade (NEPRE)
Escola de Psicologia e Ciências da Vida (EPCV-ULHT)
Instituto de Cristianismo Contemporâneo (Área Ciência das Religiões-ULHT)
Centro Transdisciplinar de Estudos da Consciência (CTEC), Univ. Fernando Pessoa
Centro de Investigação em Cosmovisões e Mundivivências Espirituais e Religiosas
(CICMER)

Coordenação do Congresso: Bárbara Gonzalez (Universidade Lusófona).

Comissão Científica:
Presidente: José Brissos-Lino (NEPRE/ICC)
Vice-Presidente: Inês Jongenelen (EPCV/ULHT)
Carla Maria Fonseca Tomás (ISMAT)
Cleber Lizardo de Assis (FAJE-Brasil)
Hélia Bracons (ULHT)
Rute F. Meneses (UFP)

Comissão Organizadora:
Presidente: Bárbara Gonzalez (EPCV/ULHT)
André Leiria (ULHT)
Clara Margaça (Universidad de Salamanca)
II Conferência Internacional de Psicologia da Religião e Espiritualidade, “Adversidade, emoções e espiritualidade”

APRESENTAÇÃO

Em janeiro de 2019, a Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias levou


a cabo a que foi, segundo o nosso conhecimento, a primeira Conferência sobre a temática
da Psicologia da Religião e da Espiritualidade no nosso país, sob o tema “Religião,
espiritualidade e qualidade de Vida”. Esta iniciativa correspondeu, à época, ao desejo de
iniciar um caminho já percorrido noutros países, mas ainda sem afirmação em Portugal. Com
esta Conferência e os seus frutos, abriu-se uma porta que não poderíamos fechar e o apelo
para a realização de uma segunda conferência que desse continuidade a estes trabalhos. Em
novembro de 2021, ainda com os constrangimentos da pandemia de Covid-19 e refletindo
também, de alguma forma, o impacto da mesma, realizou-se então, em modalidade virtual, a
II Conferência de Psicologia da Religião e da Espiritualidade, sob o tema “Adversidade,
3
emoções e espiritualidade”. Mais uma vez, multidisciplinar, com diferentes áreas de formação
e de saber, e com um conjunto de trabalhos pertinentes, trazendo vários deles questões
disruptivas, que nos fazem refletir sobre a espiritualidade e religiosidade de forma não
superficial.
Miguel Farias, na Conferência de abertura intitulada “A variedade das técnicas de
meditação: Uma perspetiva psicológica” abordou a história e primórdios da ciência da
meditação, e sua ligação à atenção plena, chamando a atenção para os potenciais efeitos
adversos da meditação, o que conduz à necessidade do aprofundamento do seu estudo
científico.
Luis Villalobos, na Conferência de Encerramento intitulada: “Emociones y virtudes
al desnudo. Los procesos emocionales implicados en la fe, la esperanza y el amor” fez uma
abordagem pormenorizada às diferentes emoções e ao seu papel nestes importantes
processos para o ser humano.
José Brissos-Lino, na comunicação intitulada “A pandemia Covid-19 e a prática
religiosa em Portugal", abordou também um tema de extrema atualidade, o impacto da
pandemia na participação religiosa, tanto em termos quantitativos como de aspetos
qualitativos.
II Conferência Internacional de Psicologia da Religião e Espiritualidade, “Adversidade, emoções e espiritualidade”

No que respeita às comunicações que integram este livro, João Pedro da Silva, na
comunicação intitulada “Religiosidade e espiritualidade: Evidências para uma caracterologia
diferencial” desenvolve um pensamento aprofundado sobre os dois construtos, fundamental
ao desenvolvimento de uma nova medida de avaliação, partindo de uma análise crítica das
medidas de avaliação destes construtos existentes.
Vítor Rosa, na comunicação intitulada “O Martinismo: História e tradições”, traz-
nos uma perspetiva histórica sobre as tradições do martinismo, e a abordagem à forma como
ele se inscreve nas vivências da atualidade, assim como as conceções desta perspetiva sobre
o eu e o mundo.
Rute Meneses, na comunicação intitulada “Bem-estar psicológico de estudantes do
ensino superior e seus correlatos sociodemográficos psicossociais”, chama a atenção para a
vulnerabilidade, tantas vezes não reconhecida, desta população, e enfatiza a importância de
resultados específicos de cada dimensão do bem-estar psicológico e o seu papel num
programa de intervenção.
Jimmy Pessoa, na comunicação intitulada “Anjos cansados: A síndrome de burnout
em pastores das Assembleias de Deus em São Paulo” focou o papel do pastor das
Assembleias de Deus em São Paulo, com todas as dimensões deste papel e as
vulnerabilidades a nível psicológico que as múltiplas estas exigências a que está sujeito podem 4

trazer.
Marciele dos Santos Pereira, na comunicação intitulada - “Conceções sobre o
sofrimento psíquico no contexto religioso neopentecostal: Uma análise documental da Igreja
Universal do Reino de Deus” enfatiza o sofrimento psicológico no contexto religioso
neopentecostal no Brasil, e abordou as possíveis implicações deste fenómeno para a própria
prática da psicologia.
Valéria Garlet, na comunicação intitulada “A perceção de gestores acerca da
espiritualidade como caminho para a sustentabilidade nas organizações” foca a questão da
espiritualidade no âmbito organizacional e empresarial, partindo das perceções dos gestores
para poder propor um enquadramento que ligasse espiritualidade e sustentabilidade de forma
harmoniosa e eficaz.
Ana Carina Peixoto, na comunicação intitulada “Espiritualidade e personalidade nos
estudantes do ensino superior”, explorando a relação entre as dimensões de ambos os
construtos de uma forma que nos permite compreender melhor o ser humano, efetuando
também uma ponte para a intervenção psicológica.
II Conferência Internacional de Psicologia da Religião e Espiritualidade, “Adversidade, emoções e espiritualidade”

Cristina Duarte, na comunicação intitulada: “Competências espirituais e emocionais


nos assistentes sociais: Perceções dos estudantes de serviço social”, mostra-nos a relevância
que a maioria destes estudantes atribui à espiritualidade como competência fundamental
destes profissionais, e as implicações que isto tem para a prática dos mesmos.
Rodrigo Peres, na comunicação intitulada “Espiritualidade e religiosidade nas
vivências associadas ao adoecimento em mulheres com fibromialgia” centra-se no âmbito da
psicologia da saúde, e contempla o duplo papel que a espiritualidade e religiosidade poderão
ter, quer na vivência desta síndrome, quer na possível intervenção psicológica com estas
mulheres.
Sara Albuquerque, na comunicação intitulada: “Especificidades da espiritualidade nos
processos de luto”, efetua uma cuidadosa revisão de literatura sobre a relação entre
espiritualidade, religiosidade e luto, e traz-nos o olhar clínico sobre a vivência desta realidade
na consulta em psicologia clínica.
Paulo Nuno Martins, na comunicação intitulada “Uma breve história do Ayurveda e
da Psicoterapia: A via oriental e ocidental na promoção da qualidade de vida do paciente
oncológico” aborda os dois processos, cada um na sua cultura, como complementares na
intervenção mente-corpo, especificando o seu papel na intervenção com o doente
oncológico. 5

Bárbara Gonzalez
Presidente da Comissão Organizadora
II Conferência Internacional de Psicologia da Religião e Espiritualidade, “Adversidade, emoções e espiritualidade”

ÍNDICE

Apresentação 3

Religiosidade e espiritualidade – evidências para uma caracterologia diferencial 7

O Martinismo: história e tradições 17

Bem-estar psicológico de estudantes do ensino superior e seus correlatos 34


sociodemográficos e psicossociais

Anjos cansados: a síndrome de burnout em pastores das Assembleias de Deus 83


em São Paulo

Concepções sobre o sofrimento psíquico no contexto religioso 107


neopentecostal: uma análise documental da Igreja Universal do Reino de Deus
6
A percepção de gestores acerca da espiritualidade como caminho para a 113
sustentabilidade nas organizações

Espiritualidade e personalidade: relações em estudantes do ensino superior 123

Competências espirituais e emocionais nos assistentes sociais: percepções dos 133


estudantes de serviço social

Espiritualidade e religiosidade nas vivências associadas ao adoecimento em 141


mulheres com fibromialgia

Especificidades da espiritualidade nos processos de luto 147

Uma breve história do Ayurveda e da psicoterapia: a via oriental e ocidental na 150


promoção da qualidade de vida do paciente oncológico

Emociones y virtudes al desnudo: los procesos emocionales implicados en la 158


fe, la esperanza y el amor
II Conferência Internacional de Psicologia da Religião e Espiritualidade, “Adversidade, emoções e espiritualidade”

UMA BREVE HISTÓRIA DO AYURVEDA E DA PSICOTERAPIA:


A VIA ORIENTAL E OCIDENTAL NA PROMOÇÃO DA
QUALIDADE DE VIDA DO PACIENTE ONCOLÓGICO

A brief history of Ayurveda and Psychotherapy: The Eastern and Western


perspective in promoting the quality of life of cancer patients

Paulo Nuno Martins*

Resumo: Nos países desenvolvidos, os sistemas de cuidado de saúde têm dado especial atenção às
doenças cancerosas, mas com uma ênfase quase exclusiva no aspecto da cura do corpo físico, de
acordo com o paradigma cartesiano. No entanto, tem havido uma preocupação crescente em
complementar os tratamentos oncológicos convencionais, com o tratamento mente-corpo,
nomeadamente através do Ayurveda, na cultura Oriental, e da psicoterapia, na cultura Ocidental. Este
artigo pretende comparar estes métodos de tratamento complementares, nomeadamente a relação
das oito bases físicas com os padrões emocionais e mentais (designados por “doshas” no Ayurveda),
e a utilização da psicoterapia, ambos utilizados nas fases de adaptação psicológicas do paciente,
propostas por Elizabeth Kübler-Ross, sendo de realçar a espiritualidade subjacente em cada um deles,
particularmente no alívio do sofrimento e na promoção da qualidade de vida do paciente oncológico. 150

Palavras-Chave: Uma breve história do Ayurveda e da psicoterapia; A via Oriental e Ocidental da


medicina mente-corpo na promoção da qualidade de vida do paciente oncológico; As fases de
adaptação psicológica do paciente de acordo com Elizabeth Kübler-Ross.

Abstract: In developed countries, health care systems have given special attention to cancerous
diseases, but with a particular emphasis on the healing aspect of the physical body, according to the
Cartesian paradigm. However, there has been a growing concern to complement conventional cancer
treatments with mind-body healing, namely through Ayurveda, in Eastern culture, and
psychotherapy, in Western culture. This article aims to compare these complementary methods of
healing, namely the relationship of the eight physical bases with emotional and mental patterns (called
“doshas” in Ayurveda), and the use of psychotherapy, both used in the phases of patient´s
psychological adaptation, proposed by Elizabeth Kübler-Ross, highlighting the underlying spirituality
in each of them, particularly in terms of alleviating suffering and promoting the quality of life of
cancer patients.
Keywords: A brief history of Ayurveda and psychotherapy; The Eastern and Western perspective of
mind-body healing in promoting the quality of life of cancer patients; The patient´s psychological
adaptation phases according to Elizabeth Kübler-Ross

* PhD, História e Filosofia da Ciência, NOVA School of Science and Technology. Centro Interuniversitário
de História da Ciência e da Tecnologia, Nova School of Science&Technology, CIUHCT-NOVA/FCT. Centro
Transdisciplinar de Estudos da Consciência, Universidade Fernando Pessoa do Porto, CTEC-UFP.
II Conferência Internacional de Psicologia da Religião e Espiritualidade, “Adversidade, emoções e espiritualidade”

Introdução

Na Índia, desde 1995, várias entidades científicas, como sejam, o Departamento de


Ciência e Tecnologia (DST), o Conselho Indiano para a Investigação Médica (ICMR), o
Conselho Central de Investigação em Ayurveda (CCRA), desenvolveram um sistema
integrado de medicina tradicional, que engloba o Ayurveda, o Yoga, o Unani, o Siddha e a
Homeopatia (designado por AYUSH), tendo sido implementado em vários “clusters” ao
longo do país [1], com o intuito de complementar os tratamentos convencionais. O
Ayurveda, sendo uma medicina preventiva, visa a harmonia entre a mente, o corpo e o meio
ambiente defendendo que estes estão interligados entre si [2].

Por seu lado, no Ocidente, os cuidados primários de saúde procuram através da


medicina preventiva [3] promover determinados comportamentos saudáveis como, por
exemplo, não fumar, não abusar de bebidas alcoólicas, ter uma dieta adequada, fazer
exercício, de modo a prevenir potenciais doenças, como o cancro [4]. Ainda assim, quando
a doença se manifesta são utilizados diversos métodos complementares aos tratamentos
convencionais, tal como a psicoterapia que tem como finalidade o tratamento de problemas
psicológicos como, a ansiedade, a depressão, as fobias, bem como, o apoio em situações
151
difíceis da vida, tal como, o divórcio, o luto, entre outras [5].

Este ensaio tem como objectivo referir estes tratamentos da mente-corpo [6], que
são utilizados no Oriente e no Ocidente, como vias de promoção da qualidade de vida do
paciente oncológico [7].

Uma breve história do Ayurveda e da Psicoterapia: A via Oriental e Ocidental na


promoção da qualidade de vida do paciente oncológico
Na história do Ayurveda (do Sânscrito, vida (ayur) e ciência (Veda)) [8] existem quatro
fontes que lhe deram origem [9], [10], nomeadamente, o Atharva-Veda (um dos quatro livros
sagrados do Hinduísmo [11]), o Charaka Samhita (tratado de medicina interna), o Sushruta
Samhita (tratado de cirurgia) e a filosofia Samkhya.

O Atharva-Veda tem vários tipos de texto, nomeadamente os Samhitas, sendo que o


Atharva-Veda Samhita [12] é considerado um dos textos mais antigos da medicina tradicional
Indo-Europeia, o qual tem contribuído para a construção do modelo de medicina integrativa,
onde o paciente é visto nas suas várias dimensões: corpo, mente e alma [13]. Este texto trata
de vários tópicos como, por exemplo, Bhaisajya (anatomia, tipos de doenças e suas causas,
II Conferência Internacional de Psicologia da Religião e Espiritualidade, “Adversidade, emoções e espiritualidade”

tipos de curas), Ayusya (longevidade), Paustika (convalescência e bem-estar), Abhicarika


(progresso espiritual), entre outros.

Outra fonte é a filosofia Samkhya (uma das seis escolas das filosofias da Índia) [14]
que defende que a realidade é composta por Purusha (a Consciência Una ou Divino), por
Prakriti (a fonte do fenómeno em “potência”) que é constituída por três Gunas (qualidades
do estado mental ou fenómeno) - Sattva (equilíbrio), Tamas (inércia), Rajas (movimento) - e
o corpo físico (constituído pelos cinco elementos).

O Ayurveda [15] faz o diagnóstico do paciente através do “exame das oito bases”
(pulso, voz, língua, olhos, pele, unhas, urina, fezes) e relaciona-os com os padrões mentais e
emocionais do paciente [16]. Esta relação mente-corpo determina a constituição base do
paciente ou “doshas” (vata, pitta, kapha) permitindo que o terapeuta recomende um modo
de minimização da causa da doença [17].

No Ayurveda a mente desempenha um papel relevante no processo de auto-cura e


na restauração da saúde mente-corpo do paciente [18], [19], nomeadamente através da
meditação e do pensamento positivo, na promoção da qualidade do sono, no tipo de
alimentação, entre outros [20], [21]. Esta ideia central do Ayurveda tem uma influência
152
significativa nos métodos de tratamento mente-corpo realizados ao longo da história [22]. O
Ayurveda tem oito ramos ou especialidades que são vias para o equilíbrio mente-corpo [23].

Por outro lado, na história da psicoterapia (do Grego, mente (psykhē) e curar
(therapeuein)) assiste-se ao alívio do sofrimento emocional e espiritual do indivíduo desde
tempos imemoriais, estando presente esta actividade em diversas culturas, nomeadamente,
no Oriente, através do curandeiro, e no Ocidente, através do xamã [24]. Entretanto, no
século XVIII, os problemas mentais foram abordados por Mesmer e Puységur através da
utilização do “magnetismo animal”.

No entanto, o tratamento psicológico propriamente dito apenas surge nos finais do


século XVIII, através de Pinel (considerado o “pai da psiquiatria”) que defende que as
pessoas que sofrem de perturbações mentais devem ser consideradas doentes e tratadas de
um modo humano, ao contrário do que acontecia na época [25]. O método de cura utilizado
era a “sugestão” que viria a dar origem à hipnose. Assim, a hipnose passa a ter um papel
fundamental no tratamento do paciente, tal como preconizado por Charcot que a utilizou
para tratar os seus pacientes com histeria. Esta perspectiva contribuiu para o surgimento da
II Conferência Internacional de Psicologia da Religião e Espiritualidade, “Adversidade, emoções e espiritualidade”

teoria psicanalítica de Freud, cujos trabalhos foram complementados por Adler, Jung e
Horney [26].

Na primeira metade do século XX, a psicoterapia evoluiu para a chamada


“psicoterapia médica” [27] tendo havido várias figuras emblemáticas que contribuíram para
o aparecimento de métodos e técnicas bem definidas como, por exemplo, Watson, Skinner
e Wolpe (representantes da corrente behaviorista), Rogers, Maslow (representantes da
corrente humanista), Ellis e Beck (como representantes do RET ou Rational Emotive
Therapy), entre outros. Já nos anos 90, surgiram as chamadas terapias de terceira geração.

Actualmente existem diversos tipos de psicoterapia que englobam várias abordagens


terapêuticas, nomeadamente, a psicanálise, a psicanálise Junguiana, a hipnose, a terapia
Gestalt, a fenomenologia, a constelação familiar, o behaviorismo, a terapia cognitivo-
comportamental, a escola de Reich, a logoterapia, a terapia transpessoal, mindfulness, entre
outros [28].

As fases de adaptação psicológica do paciente oncológico de acordo com Elizabeth 153


Kübler-Ross
Actualmente existem estudos que mostram que os tratamentos oncológicos
(radioterapia, quimioterapia e cirurgia) provocam no paciente sofrimento físico (devido às
náuseas, fadiga) e sofrimento psicológico (devido à incerteza quanto ao futuro pessoal e
profissional) [29], onde o tratamento psíquico [30] tem um papel complementar aos
tratamentos convencionais, através de diversas abordagens. Neste sentido, refira-se o
aparecimento da psico-oncologia [31], [32] que procura monitorizar o sofrimento do paciente
oncológico [33] através do “Distress Thermometer” [34] e estabelecer metodologias que
minimizem os efeitos nefastos do cancro nas dimensões psicológicas e físicas do paciente e
seus familiares [35].

A este propósito, Elizabeth Kübler-Ross [36] estudou sistematicamente as várias


fases de adaptação psicológica do paciente, tendo identificado e caracterizado cinco fases
principais, onde o Ayurveda e a psicoterapia podem ter um papel muito útil. Estas fases são
a negação, a revolta, a depressão, a negociação e esperança, a aceitação e que estão
exemplificadas na Figura 1.
II Conferência Internacional de Psicologia da Religião e Espiritualidade, “Adversidade, emoções e espiritualidade”

Na fase da negação, o paciente fica em estado de choque, e por vezes, não aceita o
seu estado de saúde; na fase da revolta, o paciente revolta-se contra a vida por lhe ter dado
tal “destino”, sendo indispensável o acompanhamento dos profissionais de saúde e dos
familiares; na fase da depressão, o paciente evidencia estados de insónia, perda de apetite,
entre outros, por vezes ligados ao desenrolar da doença, e onde o Ayurveda e a psicoterapia
podem ter um papel complementar aos tratamentos convencionais; na fase da negociação, o
paciente evidencia esperança no desenrolar positivo da sua doença e decide “lutar” para
vencê-la, sendo nesta etapa que ocorre frequentemente uma mudança interior de valores,
onde o lado espiritual passa a ter um papel relevante na vida do paciente; a fase da integração
e aceitação é característica da “nova vida” do paciente, e tanto se aplica aos casos de sucesso
do tratamento, como nas situações paliativas e terminais.

Refira-se que nem todos os pacientes passam obrigatoriamente por todas as fases de
adaptação psicológica, e nem estas se sucedem pela mesma ordem em todos os pacientes.
Estas etapas são essencialmente uma referência, nomeadamente para os profissionais de
saúde quando têm de lidar com os diferentes factores que caracterizam esta adaptação
psicológica do paciente [37]. Por exemplo, é preciso ter em atenção os mecanismos habituais
de adaptação usados pelo paciente em situações semelhantes (coping) que envolvem as suas
154
convicções filosóficas e espirituais, a sua situação sócio-económica, entre outros factores
[38].

Conclusões

O paradigma cartesiano [39] de separação da mente (domínio da filosofia e religião)


com o corpo (domínio da ciência e medicina), onde o corpo físico é tratado como uma
“máquina” tem promovido o tratamento quase exclusivo do corpo físico, através da cirurgia,
radiação e medicação química. No entanto, alguns estudos mostram a importância da relação
mente-corpo e do tratamento psicológico do paciente oncológico [40], [41], como meio
complementar aos tratamentos convencionais.

Acrescente-se que o Programa “Escolhas Criteriosas em Saúde” - mais conhecido


por “Choosing Wisely” [42] - tem desenvolvido metodologias que visam minimizar os
desperdícios nos tratamentos médicos dados ao paciente, nomeadamente os oncológicos.

Assim, o modelo integrativo para o tratamento do paciente [43], através da integração


do corpo (aspecto físico), da mente (aspecto psicológico) e do lado espiritual mostra as
II Conferência Internacional de Psicologia da Religião e Espiritualidade, “Adversidade, emoções e espiritualidade”

vantagens desta perspectiva, não só como para minimizar os custos em saúde oncológica
[44], como também para dar uma melhor qualidade de vida ao paciente oncológico [45], [46].
Nesta última situação, a religião [47] e a espiritualidade [48] podem contribuir para dar um
sentido à vida do paciente, através da melhoria da auto-estima e da promoção de
comportamentos positivos mente-corpo [49], seja através da perspectiva Oriental ou
Ocidental, nomeadamente através do encorajamento dos contactos com familiares, amigos,
profissionais de saúde, entre outros [50].

Agradecimentos: O autor deste artigo agradece a Ken Ross por ter dado autorização para
a publicação da Figura 1, proveniente do site https://www.ekrfoundation.org
/5-stages-of-grief/change-curve/.

Referências bibliográficas:

[1]. India, Government of. (2016-2017). Ministry of Ayurveda, Yoga&Naturopathy, Unani, Siddha
and Homeopathy (AYUSH). Annual Report 2016-2017.
[2]. Meulenbeld, G. (1999). A History of Indian Medical Literature. Groningen: Egbert Forsten
Publishing.
[3]. Gingras, D e Béliveau, R. (2006). Foods that fight Cancer: preventing Cancer through Diet.
Toronto, ON: McClelland&Stewart Limited. 155
[4] Faulkner, A. e Maguire, P. (1996). Talking to cancer patients and their relatives. Oxford: Oxford
University Press.
[5]. Wedding, D. and Corsini, R. (2018). Current Psychotherapies. Boston, MA: Cengage
Learning.
[6]. Martins, P. (2018). The history of mind-body medicine: some practical examples. Advances
in Mind-Body Medicine, 32(1):4-7.
[7]. Almeida, A. e Stroppa, A. (2009). Espiritualidade&Saúde Mental: Importância e impacto
da espiritualidade na saúde mental. Zen Review, 1(1):2-6.
[8]. Martins, P. (2018). The history of traditional Indian medicine from beginning to present
day. International Journal of Advanced Research, 6(1): 1195-1201.
[9]. Mukhopadhyaya, G. (2003). History of Indian Medicine. New Delhi: Munshiram Manoharlal
Publishers.
[10]. Wujastyk, D. (2003). The roots of Ayurveda. London: Penguin Classics.
[11]. Staal, F. (2009). Discovering the Vedas: Origins, Mantras, Rituals, Insights, London: Penguin
Books.
[12]. Bloomfield, M. (1999). The Atharvaveda. Cambridge, MA: Harvard University Press.
[13]. Martins, P. (2017). The history of the Indian sacred book (Atharva-Veda) and its
contribution to the Integrative medicine model. Transdisciplinary Journal of Engineering
and Science, 8(4):54-59.
[14]. Dasgupta, S. (1997). A History of Indian Philosophy. New Delhi: Motilal Banarsidass.
[15]. Frawley, D. (1989). Ayurvedic healing. Salt Lake City, UT: Passage Press.
[16]. Lad, V. (2007). Textbook of Ayurveda: A complete Guide to Clinical Assessment. Albuquerque,
NM: Ayurvedic Press.
[17]. Chopra, D. (2000). Saúde Perfeita. Lisboa: Editora Estrela Polar.
[18]. Verma, V. (1995). Ayurveda: A Way of Life. Newburyport, MA: Red Wheel Weiser
Conari.
II Conferência Internacional de Psicologia da Religião e Espiritualidade, “Adversidade, emoções e espiritualidade”

[19]. Chopra, D. (2021). Cura Quântica. Lisboa: Editora Self.


[20]. Lad, V. (1984). Ayurveda: The science of self-healing. Twin Lakes, WI: Lotus Press.
[21]. Lad, V. (2012). Textbook of Ayurveda: General Principles of Management and Treatment.
Albuquerque, NM: Ayurvedic Press.
[22]. Heller, M. (2012). Body Psychotherapy: History, Concepts and Methods. New York, NY: W.
W. Norton & Company.
[23]. Rhyner, H. (1998). A Complete Book of Ayurveda. Woodbury, MN: Llewelyn Publications.
[24]. Porter, R. (2006). The Cambridge History of Medicine. Cambridge: Cambridge University
Press.
[25] Stone, M. (2005). História da Psicoterapia. In: Psicoterapia de orientação analítica: fundamentos
teóricos e clínicos. Porto Alegre, RS: Artmed Editora, 23-42.
[26]. Atkinson, W. (2010). The History of Psychotherapy. Whitefish, MT: Kessinger Publishing,
LLC.
[27]. Freedheim, D. e Freudenberger, H. et al. (1992). History of Psychotherapy: A Century of
Change. Washington, DC: American Psychological Association.
[28]. Norcross, J. (2010). History of Psychotherapy: Continuity and Change. Washington, DC:
American Psychological Association.
[29]. Bultz, B. e Holland, J. (2006). Emotional Distress in patients with cancer: The sixth vital
sign. Community Oncology. 3(5): 311-314.
[30]. Holmes, E. (1938). Science of Mind. New York, NY: J.P. Tarcher Putnam.
[31]. Landskron, L. (2008). Psico-oncologia: as descobertas sobre o câncer ao longo da
história. In: Hart, C. et al. Câncer: uma abordagem psicológica. Porto Alegre, RS: Editora
Age.
[32].Loving, T. e Glaser, R. (2002). Psycho-oncology and cancer: Psychoneuroimmunology
and cancer. Annals of Oncology. 13 (1): 165-169.
[33]. Roth, A. e Kornblith, A. e Batel-Copel, L. (1998). Rapid screening for psychologic 156
distress in men with prostate carcinoma: a pilot study. Cancer, 82(10):1904-8.
[34]. Mitchell, A. (2010). Short Screening Tools for Cancer-Related Distress: A Review and
Diagnostic Validity Meta-Analysis. Journal of the National Comprehensive Cancer
Network, 8: 487-494.
[35]. Schulz, U. e Schwarzer, R. (2003). Long-term effects of spousal support on coping with
cancer after surgery. Social Support, 1:1-20.
[36]. Kȕbler-Ross, E. (2014). On Death and Dying. New York, NY: Scribner Books.
[37]. Berkowitz, M. e Knight, L. (2001). Moses presages Kübler-Ross: five stages in accepting
death, as seen in the midrash. Mt Sinai J. Med., 68(6): 378-383.
[38]. Cardoso, G. e Luengo, A. e Trancas, B. et al. (2009). Aspectos Psicológicos do Doente
Oncológico. Psilogos (Revista do Serviço de Psiquiatria do Hospital Prof. Dr. Fernando Fonseca,
EPE), 8-18.
[39]. Martins, P. (2018). Descartes and the paradigm of Western medicine: An essay.
International Journal of Recent Advances in Science and Technology, 5(3): 32-34.
[40]. Goswami, A. (2004). The Quantum Doctor. Newburyport, MA: Hampton Roads
Publishing Company.
[41]. Martins, P. (2011). Science and the Art of Healing: a contribution to the history of Life
Science. World Futures – The Journal of General Evolution, 67(7):500-509.
[42]. Several authors. (2012). Choosing Wisely. Philadelphia, PA: ABIM Foundation.
[43]. Martins, P. (2019). Being Transdisciplinary in Human Sciences: The usefulness of
integrative medicine in contemporary society. Being Transdisciplinary, In: Nicolescu, B.
e Yeh, R. e Ertas, A. (eds.), ATLAS Publishing, 5:39-47.
[44]. Carlson, L. e Bultz, B. (2003). Benefits of psychosocial oncology care: Improved quality
of life and medical cost offset. Health and Quality of Life Outcomes, 1:8.
II Conferência Internacional de Psicologia da Religião e Espiritualidade, “Adversidade, emoções e espiritualidade”

[45]. Panzini, R. e Rocha, N. et al. (2007). Qualidade de Vida e Espiritualidade. Rev. Psiq. Clin.
34(1):105-115.
[46]. Teixeira, E. e Mȕller, M. et al. (2004). Espiritualidade e qualidade de vida. Porto Alegre, RS:
EDIPUCRS.
[47]. Panzini, R. e Bandeira, D. (2007). Coping (enfrentamento) religioso/espiritual. Revista
de Psiquiatria Clínica, 34(1):126-135.
[48]. Fornazari, S. e Ferreira, R. (2010). Religiosidade/espiritualidade em pacientes
oncológicos: Qualidade de vida e saúde. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 26(2):265-272.
[49]. Geronasso, M. e Coelho, D. (2012). A influência da religiosidade/espiritualidade na
qualidade de vida das pessoas com câncer. Câncer e Meio Ambiente: Revista
Interdisciplinar, 1(1):173-187.
[50]. Faulkner, A. e Maguire, P. (1996). Talking to cancer patients and their relatives. Oxford:
Oxford University Press.

157
ADENDA ÀS ACTAS

Por lapso de configuração textual o texto da comunicação “Anjos cansados: a síndrome de


burnout em pastores das Assembleias de Deus em São Paulo” inicia na página 82 e não 83 como
consta do Índice.

Também o texto da comunicação “Uma breve história do Ayurveda e da psicoterapia: a via


oriental e ocidental na promoção da qualidade de vida do paciente oncológico” deveria mostrar
a Figura 1 (que segue).

Figura 1: Um Modelo de adaptação psicológica de Elizabeth Kübler-Ross


Fonte da Foto: Cortesia de Ken Ross

Apresentamos as nossas desculpas aos autores e aos leitores.

View publication stats

Você também pode gostar