Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
BACHARELADO EM PSICOLOGIA
CÁCERES – MT
2021
CÁCERES – MT
2021
RELIGIOSIDADE, ESPIRITUALIDADE E PSICOTERAPIA: CONTRIBUIÇÕES DA
PSICOLOGIA DA RELIGIÃO PARA O MANEJO CLÍNICO POR DEMANDAS
RELIGIOSAS
BANCA AVALIADORA
CÁCERES – MT
2021
4
INTRODUÇÃO
1
Graduando em Psicologia: Estácio Fapan (Faculdade do Pantanal Matogrossense), e-mail:
danielpereira.cac123@gmail.com
2
Graduanda em Psicologia: Estácio Fapan (Faculdade do Pantanal Matogrossense), email:
emillyrafaela260299@gmail.com
5
1. DESENVOLVIMENTO
E desde de quando se mistura Psicologia com religião? Talvez essa seja a impressão e
pergunta de muitos estudantes e profissionais de saúde mental e precisa ser respondida com
mais clareza e objetividade baseada na literatura/autores que vem pretendendo responde-la já
a algum tempo.
Muitos questionamentos vem, pois muitas grades de Psicologia não contemplam a
disciplina e muitos profissionais de saúde mental e acadêmicos nunca ouviram falar dessa
área. De acordo com o Conselho Federal de Psicologia (CFP, 2013), “Pautar-se na
obrigatória laicidade não implica negar uma interface que pode ser estabelecida pela
psicologia e a religião, e pela psicologia e a espiritualidade.” A interface é claramente
reconhecida pelo conselho federal atualmente.
Uma importante nota publicada pelo Conselho Regional de Psicologia-Minas Gerais,
em 2018 (CRP-MG) reforçou a atual visão da Psicologia na interface com a religião.
Segundo a nota, “A religião é para a Psicologia, um importante objeto de pesquisa e deve
7
como tal ser tratado.” (CRP-MG, 2018) Portanto, a Psicologia da Religião existe como
campo de estudo regulamentado pela Psicologia no Brasil.
Embora exista uma Psicologia da Religião o que não existe enquanto campo científico
e regulamentado no Brasil é uma psicologia religiosa. Sendo assim o profissional psicólogo
deve tomar um posicionamento coerente com sua profissão regulamentada, especialmente no
que diz respeito a sua identidade profissional. A mesma nota destaca que,
estabelecer uma boa relação para que haja benefícios na intervenção (PERES; SIMÃO;
NASELLO, 2007, p.138).
Para tal, existe a Psicologia da religião que auxilia profissionais de saúde mental a
compreender a religiosidade e espiritualidade dos clientes a luz da ciência psicológica de
forma a auxiliar no manejo clínico ético e promoção de saúde mental.
Embora o Estado Brasileiro seja laico, sua grande maioria é religiosa. Apenas 8% dos
brasileiros dizem não ter uma religião (IBGE, 2010), portanto é comum receber no
consultório de psicologia clientes com conflitos, sofrimento psíquico que por observação do
psicoterapeuta ou relato do cliente se relaciona com questões religiosas.
Se o cliente trás uma demanda de sofrimento emocional que se relaciona com sua
religião, o terapeuta respeitando as crenças do cliente poderá demonstrar interesse pelo seu
relato.
De acordo com GERONASSO e MORÉ (2015, p.173)
O interesse é pelo relato e não pela validade ou invalidade de tais crenças. Suas ideias
teológicas/religiosas são verdadeiras até o presente momento Jung (1940/1978, p. 18) para o
cliente. Por mais que o diálogo ganhe o teor teológico, o processo continua sendo psicológico.
Tal fato precisa ficar claro tanto para o cliente como para o psicoterapeuta.
Uma vez que a relação terapêutica é fator indispensável para que haja o engajamento
sério no processo, o interesse e familiaridade com o assunto/demanda do cliente contribui
positivamente para esse aspecto.
De acordo com Brusgain (2008, p.714), “Assim, a compreensão da religiosidade e da
espiritualidade dos clientes pode ser um fator facilitador do trabalho do Psicólogo.”
Desta premissa surge indagações como: E se um cliente incorporar um espírito
durante a sessão? E se o cliente quiser fazer uma prece? Ou se um suposto anjo o interromper
durante a sessão? Qual deverá ser a postura ética do psicólogo durante a intervenção? Diante
9
destas circunstâncias antes de encontrar respostas para essas e outras questões deve-se
elucidar o medo ou receio que faz parte das dificuldades de muitos psicoterapeutas.
O medo ou receio de lidar com esse aspecto da vida do cliente por medo que de
alguma forma ele abandone a posição de profissional de saúde mental e sua abordagem, para
entrar em um mundo que não é seu e se caso fosse, não poderia pois o código de ética
regulamenta a profissão e o processo ali estabelecido no que diz respeito a indução a
ideologias.
O código enfatiza no art. 2º que o Psicólogo é vedado de “Induzir a convicções
políticas, filosóficas, morais, ideológicas, religiosas, de orientação sexual ou a qualquer tipo
de preconceito, quando do exercício de suas funções profissionais;”(CONSELHO FEDERAL
DE PSICOLOGIA, 2005, p.10).
Se o setting precisa ser colaborativo e é um espaço especial do cliente, dialogar
questões religiosas trazidas por ele é sinônimo de indução ou proselitismo religioso? Uma
vez que o assunto da religiosidade é tão comum e constituinte da história humana como a
sexualidade, sociabilidade, trabalho, etc impedir tal relato e trata-lo com indiferença pode
significar uma falta de interesse ou inviabilidade do assunto para aquele ambiente.
Entretanto,
“integrar dimensões espirituais e religiosas de vidas dos clientes
durante a psicoterapia requer profissionalismo ético, alta qualidade de
conhecimento e habilidades para alinhar as informações coletadas
sobre as crenças e valores ao benefício do processo terapêutico.”
(PERES; SIMÃO; NASELLO, 2007, p.138).
O psicoterapeuta poderá usar seu discurso, crença para de alguma forma se possível
configurar seu conflito, ressignificar seu sofrimento e se preciso for questionar sua crença. O
problema com o as palavras questionamento e crítica é uma questão de conotação para o
cliente e psicoterapeuta.
Um questionamento que leve a reflexão, outras visões sobre o mesmo assunto poderá
ser auxílio à resolução do conflito e a possibilidade de uma nova configuração. O aspecto
colaborativo da psicoterapia é justamente como um dos fatores que contribui à promoção de
autonomia do cliente.
Portanto, o abandono ou adesão de crenças depende de que o paciente tenha tal
autonomia para fazê-lo, não um proselitismo por parte do profissional de saúde mental.
10
1.2 Metodologia
com o sagrado, mas pode ser encontrado em outras instituições, a título de exemplo podemos
dizer que um ateu pode ser espiritual, mesmo sem ter uma religião.
De acordo com Lambert (2007, p.29), podemos conceituar religião como:
Portanto, a vivência dessas experiências por meio de seu sistema, podemos chamar de
religiosidade, é onde cada indivíduo tem sua experiência com o que acredita ser o
sagrado/transcendente. . Então, a religiosidade está ligada ao comportamento religioso. A
espiritualidade como uma dimensão onde está a busca pelo sentido da vida (CARUNCHIO et
al. 2018, p.9).
Portanto, o debate científico dentro da ciência psicológica é relativamente recente,
mas tem contribuído positivamente à psicologia como um todo, especialmente, no contexto
psicoterapêutico.
Vim até você porque acho que você pode me entender e porque também
preciso muito de ajuda. Minhas outras tentativas de terapia foram
fracassadas. Numa delas, o sujeito ficava me mandando fazer agendas,
tarefinhas e anotar coisas; noutra, ele queria me doutrinar, porque também
era espírita; e numa terceira vez, ele não me entendia, pois dizia que Frei
Giuseppe era uma imagem de meu inconsciente – o arquétipo do sábio. Pra
mim, ele é uma pessoa como eu ou você, só que sem o corpo físico. Então,
como vi sua palestra, acho que você pode realmente entender o que
acontece comigo. Você me pareceu ter sensibilidade com o tema, respeito
com ele. (NEUBERN, 2010, p.265)
Acredita-se, que tal postura é ética e que deixa o profissional livre para usufruir da sua
abordagem psicoterapêutica. Cada um dos envolvidos no processo precisa ter clareza do
processo e qual o posicionamento de cada um, bem como seus objetivos.
Segundo Neubern (2010, p. 264) na psicoterapia “se procura compreender como o
sujeito vivência essa experiência em termos simbólicos e emocionais.” Tal sentido pode ser
percebido quando sua religiosidade é relatada. Muitas vezes, diante do que o cliente acredita
ser sagrado, pode faltar expressões que melhor descreva a experiência, pois a experiência
pode ser muito complexa. (NEUBERN, 2010, p.271)
Uma postura de valorização à religiosidade pode trazer desconforto ao profissional de
saúde mental. Neubern (2010, p.268) destaca que “Tal postura não implica em dissolver as
referências teóricas do psicoterapêuta nas crenças do cliente...”
Em vez de abrir mão de sua abordagem psicoterapêutica ele à usa como ferramenta de
articulação entre os diferentes aspectos da vida do cliente. Há uma oportunidade dentro
15
dessas demandas para usufruir das informações religiosas para usá-las a favor do processo
psicoterapêutico.
No decorrer do processo, percebe-se que o profissional se desenvolve no
entendimento do sistema de crenças do cliente e há uma maior percepção e propostas de
intervenção que podem configurar novamente a vida do sujeito e fornecer a ele estratégias de
enfrentamento.
Neste caso o psicoterapêuta não necessariamente se torna um especialista em tal
assunto religioso ou teólogo, mas é um facilitador, mediador que age psicologicamente
tornando-se parte de uma processo importante da vida do sujeito.
Uma postura ética, psicologicamente científica, um olhar humano sobre o cliente pode
facilitar o processo, uma maior leitura sobre o assunto, especificamente um debruçar sobre a
Psicologia da Religião pode servir de aparato técnico e psicológico para que haja um melhor
manejo clínico para promover saúde mental.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
quem está ouvindo e falando, no caso o profissional Psicólogo. Embora haja espaço para seu
relato religioso, o processo é psicoterapêutico.
A abordagem teórica em momento algum deverá ser dissolvida, mas aproveitada de
maneira elaborada, científica e intencional no processo. Criando assim a oportunidade de
mergulhar profundamente na subjetividade do cliente. Uma questão séria, mas que se torna
necessária para o processo.
Uma vez que existe a incidência no consultório de sofrimento emocional que se
relaciona com questões religiosas, o profissional pode e deve se posicionar eticamente. Para
tal posicionamento exige técnica e fundamentação teórica no estudo do manejo clínico por
tais demandas.
Como propositura pode-se haver a inserção nas grades dos cursos de bacharelado em
psicologia com a introdução da disciplina de Psicologia da Religião como forma de preparar
melhor futuros profissionais. Por fim, uma estratégia de preparação de profissionais para uma
atuação mais ética.
REFERÊNCIAS
BRANT, Sandra Regina Corrêa; ANDRADE, Jairo Eduardo Borges. Crenças no contexto
do trabalho: características da pesquisa nacional e estrangeira. Rev. Psicol., Organ.
Trab. vol.14 no.3 Florianópolis set. 2014. Disponível em:
http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1984-66572014000300005.
Acesso em: 20/11/2021.
GIGLIO, J. The impact of patients’ and therapists’ religious values on psychotherapy. Hosp
Community Psychiatry 44(8):768-771, 1993.
17
IBGE, censo 2010, Número de católicos cai e aumenta o de evangélicos, espíritas e sem
religião. Disponível em: https://censo2010.ibge.gov.br/noticias- censo.html?
view=noticia&id=3&idnoticia=2170&busca=1&t=censo-2010-numero-catolicos- cai-
aumenta-evangelicos-espiritas-sem-religiao. Acesso em: 01/11/2021.
JUNG, C. G.; Psicologia e religião Vol. 11/1: Psicologia e Religião Ocidental e Oriental -
Parte 1: Volume 11. 11ª Edição. Editora Vozes. 2012.
PERES, Julio Fernando Prieto Peres; SIMÃO, Manoel José Pereira; NASELLO, Antonia
Gladys. Espiritualidade, religiosidade e psicoterapia. Peres, J.F.P. et al. / Rev. Psiq. Clín.
34, supl 1; 136-145, 2007.
SOUZA, Marcela Tavares de, SILVA, Michelly Dias da, CARVALHO, Rachel de. Revisão
integrativa: o que é e como fazer. Einstein. 2010; 8(1 Pt 1):102-6. Disponível em:
https://www.scielo.br/j/eins/a/ZQTBkVJZqcWrTT34cXLjtBx/?format=pdf&lang=pt. Acesso
em: 20/11/2021.