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Tratado de

Espiritualidade e Saúde
TEORIA E PRÁTICA DO CUIDADO EM
ESPIRITUALIDADE NA ÁREA DA SAÚDE

Felipe Moraes Toledo Pereira


Camilla Casaletti Braghetta
Paulo Antonio da S. Andrade
Tiago Pugliese Branco

ÀAtheneu
Rio de Janeiro • São Paulo
EDITORA ATHENEU
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ASSESS0R1A EM LINGUAGEM E REVISÃO SEMÂNTICA: Iraci Nogueira

REVISÃO DE TEXTOS: Lígia Alves

CIF-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO


SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ

T698

Tratado de espiritualidade e saúde : teoria e prática do cuidado


em espiritualidade na área da saúde / editores Felipe Moraes
Toledo Pereira ... [ et al.] ; [colaboração Adiair Lopes da Silva ...
[et al.]] -1 . ed. - Rio de Janeiro : Atheneu, 2021.

552 p. : il. ; 28 cm.

Inclui bibliografia e índice


ISBN 978-65-5586-217-1

1. Saúde - Aspectos religiosos. 2. Espiritualidade. I. Pereira,


, Felipe Moraes Toledo. II. Silva, Adiair Lopes da.

21-71122 CDD: 204.4


CDU: 27-584:61

Leandra Felix da Cruz Cândido - Bibliotecária - CRB-7/6135


20/05/2021 21/05/2021

PEREIRA, F. M. T: BRAGHETTA, C. C.: ANDRADE, P. A. S.: BRANCO, T. P.


Tratado d e Espiritualidade e Saúde: Teoria e p rá tica d o cu idado em espiritu alidade na área d a saúde

,
£ Direitos reservados à EDITORA ATHENEU - Rio de Janeiro, São Paulo 2021.
PARTE I
Conceitos Fundamentais
Psicologia da religião (pr) é o estudo da religião “ psicologia” , no singular, oculta o grande número
em sua dimensão psicológica. Esse enfoque privilegia de perspectivas teóricas e, m esm o, epistemológicas
o indivíduo e o pequeno grupo, necessariamente em dessa área do conhecimento. M esm o assim, a ex­
interação. A subjetividade e a intersubjetividade do pressão “ psicologia da religião” pode ser utilizada, e
comportamento religioso são, portanto, o objeto par­ a utilizaremos, com o um atalho linguístico.
ticular dessa área da psicologia, o que a distingue de O capítulo apresentará alguns princípios da PR,
outras ciências hum anas e sociais, com o a antropo­ alguns prolongam entos desses princípios e algum as
logia e a sociologia, que se interessam pelo fenômeno de suas derivações, sob form a de pesquisas realiza­
religioso enquanto dado mais am plo da cultura e da das em tópicos da área, pelo autor e colaboradores.
sociedade. A abordagem teórica e prática no estudo
da religião é, contudo, interdisciplinar, associando Princípios
múltiplos enfoques, dos quais não se pode excluir, Um princípio fundamental da PR é o de que es­
dentre outras disciplinas, a história, a literatura e a tuda o psíquico no religioso, e não o religioso no psí­
teologia. Em bora no meio brasileiro teologia conote quico. A PR pode ser definida com o o estudo do que
as teologias cristãs, a diversidade religiosa brasileira há de psíquico no religioso. Esse princípio resguarda
reconhece várias outras teologias, conquanto nem o pesquisador de considerar a religião um produto do
sempre na acepção científica do termo. psiquism o. Ao contrário, a religião aí está, a ser estu­
A expressão “ psicologia da religião” não impli­ dada com o outras form as sociais. A tendência à pro­
ca que a psicologia seja propriedade de algum a visão dução psíquica da religião m uito deveu a Jung, em­
religiosa, em bora na origem o estudo psicológico bora o próprio Jung não se interessasse pela origem
da religião se tenha voltado para as religiões cristãs. da religião, m as sim pela função dela, por exemplo
Tampouco nos deve enganar o vocábulo “ religião” , por meio dos arquétipos, no psiquism o inconsciente.
pois o estudo psicológico não tem com o objeto um Um segundo princípio fundam ental é o de que
campo tão vasto e tão diversificado com o a religião. a psicologia da religião se abstém de afirm ar ou
Melhor se diria psicologia das religiões, entenden­ negar a existência real do term o intencionado pelo
do que a religião estudada no indivíduo ou no pe­ com portam ento religioso. E ssa posição epistem oló-
queno grupo é sempre uma religião determinada. gica está estabelecida desde Théodore Flournoy, da
Concordamos com que se possa falar de religião Universidade de G enebra, que nos prim eiros anos
desde que o termo não corresponda a nenhuma re­ do século X X form ulou o princípio da “ exclusão
ligião concreta, ou que se torne um objeto de difícil, do transcendente” . Essa é um a exclusão episte-
senão impossível, pesquisa. Registre-se que também m ológica e m etodológica, exigida pela psicologia
Parte I - C onceitos Fundam entais

como ciência moderna, isto é, empírica. Como por Como ciência empírica, a PR utiliza todos os
transcendente se entende o transempírico, a ciência métodos da psicologia. Em linhas gerais, o método
moderna, empírica, não tem como ocupar-se dele. qualitativo e o quantitativo. O primeiro é necessá­
A exclusão do transcendente se refere ao procedi­ rio para o aperfeiçoamento conceituai; o segundo,
mento científico, e não à convicção do pesquisador, para um primeiro levantamento do comportamento
que continua crente, agnóstico, ateu ou, segundo o e, a seguir, para a generalização dos resultados ou
neologismo, “ apateísta” , de acordo com sua opção, a sugestão de novas pesquisas. A tendência atual
história de vida e meio social. é juntar os dois métodos, seja no mesmo estudo,
Em seus primórdios, contudo, a PR, surgida no seja em estudos articulados. Ressalta-se que a me­
Ocidente, estava interessada em promover, com os todologia quantitativa se impõe cada vez mais, por
recursos psicológicos, a educação e a vivência reli­ influência da psicologia americana, e tornou-se até
giosas. Stanley Hall, nos Estados Unidos, criou um condição favorável à aceitação de artigos científi­
dos primeiros periódicos de psicologia, que deno­ cos. M ais comuns na pesquisa são os estudos de
minou American Journal o f Religious Psychology campo; os estudos de laboratório são propostos
and Education. N a Alemanha, a Escola de Dorpat por alguns pesquisadores, embora os experimentos
(atual Tartu, na Estônia), com K. Girgensohn e estritos não sejam frequentes pela dificuldade, ou
W. Gruehn, ao lado do estudo experimental da impossibilidade, de produzir comportamento reli­
estrutura da experiência religiosa, interessava-se gioso autêntico na situação artificial do laborató­
pela aplicação pastoral a uma religiosidade am a­ rio. Propõem-se no lugar deles os procedimentos a
durecida. N a época ainda não se tinha firmado a modo de experimentos, quasi experimental.
designação psicologia da religião, e era frequente Um terceiro princípio é o do juízo da verda­
a denominação psicologia religiosa, que permane­ de psicológica do comportamento religioso. Terá
ceu durante algum tempo nos estudos em francês, a psicologia autoridade para pronunciar um juízo
embora já desvinculados de alguma filiação reli­ de verdade acerca da religião? M esmo mantendo o
giosa. N os países de influência alemã, a psicologia princípio da exclusão do transcendente, que impe­
da religião era denominada psicologia do serviço de à Psicologia pronunciar-se sobre a existência ou
ou do culto a Deus (em holandês, por exemplo, inexistência do transcendente, tem-se como possí­
Godsdienstpsychologie) vel um juízo de verdade psicológica em relação ao
Importante é esclarecer o que a PR não é. A PR comportamento religioso. Em que consiste a ver­
não é, em primeiro lugar, uma religião dos tempos dade psicológica? N a afirmação, negação ou dúvi­
modernos, em que o culto de si mesmo é entendi­ da a respeito de uma relação verificada, com graus
do como religião.1 Em segundo lugar, não é ciência de probabilidade, entre variáveis antecedentes e
teológica ou um seu sucedâneo moderno. Os princí­ consequentes ou entre variáveis concomitantes. O
pios que regem uma e outra ciência são diversos. A comportamento, de fato, é o objeto da psicologia.
teologia fundamenta-se na fé religiosa, a psicologia Assim, frequência ao culto, atividade em prol das
se baseia nos sentidos e na razão. Em terceiro lugar, pessoas, crenças, desejos, sentimentos, vinculações
a PR não é um “ consultório” científico para dirimir sociais, e semelhantes, são legítimo objeto do juí­
problemas espirituais que devem ser tratados com zo psicológico. Essas crenças, desejos e o mais se
os ministros religiosos. definem como religiosos, quando visam a um ob­
Os princípios muitas vezes se esclarecem na jeto transcendente. Porém, são ações humanas. A
prática: daí a utilidade de acompanhar a história verdade psicológica dessas ações consistirá em sua
da psicologia da religião na Europa, nos Estados autenticidade psicológica. É sobre essa autenti­
Unidos e no Brasil. Uma indicação dessa utilidade cidade que se pronuncia a psicologia. Assim, por
foi a praxe dos European psycbologists o f religion exemplo, no sentimento de culpa, a psicologia não
de não centralizar suas reuniões ao redor de um se pronunciará acerca de Deus ou do pecado, mas
tema, mas de permitir que aflorasse todo tipo de se aterá ao ideal do ego da pessoa e à consciência de
estudo que se apresentasse como PR, de modo a não tê-lo alcançado ou de havê-lo infringido, com
permitir não só a variedade, mas também a liberda­ o consequente sentimento de culpa. A psicologia se
de dos estudos na área. pronunciará apenas sobre a adequação ou falta de

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C apítulo 6 - Princípios de P sicologia da Religião

adequação entre a culpa e a frustração do ideal da Temas pesquisados e temas pouco


pessoa. Nesse pronunciamento a psicologia reco­ ou não pesquisados
nhecerá o bom ou o mau funcionamento psíquico, Os temas tradicionalmente tratados na PR,
sem se ocupar com o pecado como ofensa a Deus. sempre com referência ao objeto religioso, são,
A psicologia da religião, como já enfatizamos, lida entre outros, as teorias psicológicas da religião, a
com o psíquico no religioso, e não com o religioso experiência, a atitude, a motivação, o desejo, a cul­
no psíquico. N a dúvida da existência de Deus ou pa, o desenvolvimento, a crença e a descrença, os
na militância ateia, a psicologia, igualmente, não conflitos, a conversão, o grupo, o enfrentamento,
se pronunciará a respeito de Deus, mas examinará a prece e o rito, a patologia religiosa. Esses temas
se esses comportamentos estão relacionados, por podem ser encontrados nos conceituados estudos
exemplo, com a solução incompleta do complexo de Vergote (1997), de Spilka, H ood Jr., Hunsberger
de Édipo, com a educação familiar ou com a pres­ 8c Gorsuch (2003), e já nos mais antigos trata­
são do grupo de referência. dos traduzidos no Brasil: Psicologia da religião,
de Johnson,6 e Psicologia da religião, de R osa.7
Prolongamento dos princípios Temas menos estudados, ao menos no Brasil, são
Como ciência, a PR se apoia na teoria. Ao lon­ “ a negação da fé ou o ateísmo; a desfiliação insti­
go do tempo foram propostas várias teorias psi­ tucional; o comportamento ligado a religiões não
cológicas, que passaram a ser utilizadas pela PR. tradicionais nem hegemônicas, como o budismo, o
Embora alguns estudiosos lamentem a ausência de islamismo, o judaísmo, as religiões indígenas, e as
uma teoria própria à psicologia da religião, enten­ “ novas religiões” japonesas; o lugar da experiência
demos que se trata da busca de compreensão do religiosa na sociedade pós-moderna ou pós-secular;
comportamento religioso em seu aspecto de com­ a religião na atividade profissional do psicólogo;8
portamento. D aí a utilização, pela psicologia da semelhanças e diferenças entre religião e espiritua­
religião, das teorias vigentes no amplo campo da lidade; as teorias psicológicas contemporâneas da
psicologia. Aplicam-se, pois, as teorias ao objeto religião; a “ publicização” da religião no Brasil, que
particular do comportamento intencionado ao so­ tem levado a religião à política; o caráter cultural
brenatural. Como ocorre com outras modalidades intrínseco às religiões;9 as raízes protopsíquicas e
da psicologia, tais como a psicologia do esporte ou pré-culturais do comportamento religioso; o impac­
da educação, a psicologia da religião se interessa to dos vários meios digitais nesse comportamento.
pelos processos básicos, os quais poderão, even­
tualmente, guiar ações práticas no campo. Interação da PR com a psicologia clínica,
Costuma-se distinguir teorias clássicas e teo­ social e do desenvolvimento
rias contemporâneas da psicologia da religião. Será possível à psicologia da religião intera­
Rodrigues e Gomes2 apontam como clássicas, de gir com outras áreas da psicologia se a religião for
alcance geral, as seguintes: psicologia comporta- entendida como integrante da vida das pessoas, o
mental-cognitivista (Skinner, Schoenfeld), psicolo­ que ela é. Aceita ou rejeitada, a religião é um hori­
gia profunda (Freud, Jung) e psicologia humanis­ zonte para a saúde física e psíquica, o laço social,
ta (Maslow, Allport, Erikson, Fromm). Entre as a construção progressiva da personalidade. N ão é
teorias contemporâneas, de alcance médio, Paiva3 demais repetir que, do ponto de vista da psicologia
destaca a psicologia narrativa (Sundén, van der como ciência que abstrai metodologicamente do
Lans), a teoria da atribuição de causalidade (Spilka, transcendente, religião ou irreligião são considera­
Shaver, Kirkpatrick), a teoria do apego (Kirkpatrick, das apenas em sua dimensão psicológica, o que faz
Granqvist), a psicologia cultural (Belzen, Hermans), de uma e outra comportamentos de igual densidade
a psicologia evolucionária (Boyer, Pyysiãinen) e al­ psíquica. Embora a psicologia da religião não seja
gumas perspectivas da psicanálise, representadas de conhecimento obrigatório para o psicólogo, que
por Ana-María Rizzuto e M ario Aletti. São estas conta com um corpus teórico bem estabelecido, pa­
teorias de médio alcance da psicologia, voltadas, rece conveniente ao psicólogo conhecer seu alcance
contudo, especificamente para o comportamento nos diversos campos de sua atuação.10 A psicologia
religioso, como seu objeto. clínica se ocupará, então, dos distúrbios psíquicos

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Parte I - C onceitos Fundam entais

com que a religião ou a irreligião acompanha a fases, não necessariamente piagetianas e kohlber-
pessoa. A psicologia se ocupará geralmente com a gianas. Essas fases se verificam tanto nas pessoas
associação, não com a causalidade, verificada en­ que se tornam religiosas como nas que se tornam
tre religião/irreligião e o bem-estar e o mal-estar da irreligiosas. Anna-María Rizzuto13 fornece ao psi­
pessoa. Como apontamos, a causalidade é de veri­ cólogo pistas para identificar os estados afetivos
ficação mais difícil, seja entre religião e bem-estar, que acompanham “ o nascimento do Deus vivo” , e
seja entre bem-estar e religião.11 O D SM IV, desde Oser, Reich e Bucher14 oferecem o acompanhamen­
sua edição de 1994, incluiu entre os distúrbios psi­ to da fé e da descrença ao longo do ciclo da vida.
cológicos os que acompanham a dúvida religiosa, a A atuação do psicólogo poderá ocorrer em institui­
mudança ou a perda da fé, a interrupção dos laços ções que oferecem ensino religioso e como auxílio
sociais com quem partilhava da religião ou da irreli­ psicológico à pastoral das confissões religiosas.
gião. A atuação do psicólogo será semelhante à que
ele exerce em casos de trauma, físico ou psicológi­ Distinção, separação e pontos de
co, como o luto. Sem desmerecer a densidade espe­ contato entre religião e espiritualidade
cífica do fato, o psicólogo se dedicará a identificar A Divisão 36 da American Psychological
os processos psíquicos envolvidos na situação, tais Association recentemente transformou sua designa­
como as emoções de perda, tanto cognitiva como ção de Psycbology o f Religion para Psychology of
social, e as emoções de ganho que podem surgir das Religion and Spirituality. Inicialmente, a Divisão era
novas cognições e dos novos grupos. denominada Psychologists Interested in Religious
N a psicologia social um tema clássico é o do Issues (PIRI). Observa-se, pois, um alargamento do
preconceito religioso. O psicólogo estará atento aos objeto da psicologia, que era a religião e passou a
estereótipos e aos preconceitos, enquanto obstam a incluir a espiritualidade. Essa inclusão não se en­
um convívio pacífico e produtivo entre pessoas de tende como de uma parte ao todo, mas como um
religiões diferentes ou de correntes diversas dentro todo à parte em relação à religião. Dos Estados
da mesma religião. Saberá distinguir os bem funda­ Unidos a febre pela espiritualidade se espalhou pelo
dos estereótipos, sem os quais a cognição se torna mundo acadêmico sob influência da língua inglesa
travada, e os estereótipos realmente insuficientes, e chegou ao Brasil. De fato, o tema da espirituali­
que viciam os comportamentos sociais e facilmen­ dade vem sendo, entre nós, um tópico privilegiado
te descambam para o preconceito. M ais delicado é em várias modalidades de eventos científicos. Pavel
o trato com os preconceitos religiosos, que se ori­ Rican15,16,17 é um acadêmico tcheco que realizou um
ginam menos da cognição do que da emoção de­ estudo histórico do termo “ espiritualidade” . Esse
fensiva provocada pelo diferente. Outro campo de é um termo abstrato derivado do adjetivo “ espiri­
possível atuação do psicólogo social é a política, en­ tual” , que designa uma qualidade do espírito. Esses
quanto a religião se torna “ pública” 12 e procura in­ vocábulos são de raiz latina, embora nem o adjetivo
fluir na sociedade por meio dos dispositivos legais, nem o substantivo abstrato estejam registrados no
mediante a atividade de seus filiados. Em um Estado latim clássico. Ao contrário, provêm do latim ecle­
laico, como o brasileiro, as religiões devem conviver siástico, como tradução do grego “ pneumáticos” ,
com iguais direitos, assegurados pela legislação. Os adjetivo derivado de “ pneúma” , espírito, referido
grupos religiosos, em particular os pequenos grupos ao Espírito Santo. Esse sentido primeiro perdura no
nos quais ocorrem as trocas psicológicas, podem entendimento da espiritualidade cristã, designando
exceder-se ou omitir-se na proposição de seus pró­ formas particulares de viver a doutrina e a práti­
prios valores religiosos. O excesso e a omissão deri­ ca cristãs. Fala-se, nesse sentido, de espiritualidade
vam, respectivamente, da estreiteza cognitiva acom­ franciscana, carmelita, dominicana, protestante, or­
panhada de emoções de intolerância, e de emoções todoxa. Em sentido mais amplo, baseado em ana­
provocadas pela baixa autoestima e pelo temor. logia, pode-se falar de espiritualidade islâmica e ju­
N a psicologia do desenvolvimento, o psicólo­ daica, ou em formas mais limitadas do islamismo e
go encontrará um campo complexo, em que muitas do judaísmo, que são religiões abraâmicas. Com o
vezes se mesclam indevidamente religião e moral. Iluminismo, explica Rican, o espírito passou a desig­
O desenvolvimento cognitivo da religião passa por nar a racionalidade, característica da humanidade, e

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C apítulo 6 - Princípios de Psicologia da Religião

espiritual passou a significar racional. Como reação não equivalem a oscilações de uma mesma disci­
ao Iluminismo, o Romantismo entendeu o espiritual plina, mas constituem duas disciplinas, com seus
como o emocional, o experiencial. E atualmente o conceitos e métodos próprios, capazes de valo­
espiritual passou a indicar o que não é simplesmen­ rizar respectivamente o sentido da religião e o da
te material ou trivial na vida. Sinal desse último es­ espiritualidade.22
tágio do conceito “ espiritual” e “ espiritualidade”
é o livro, aliás simpático, de Robert C. Solomon,18 Definição de religião a partir da relação
Espiritualidade para céticos: paixão, verdade cós­ com o sobrenatural nas diversas
mica e racionalidade no século X X I. Para Solomon, dimensões
a espiritualidade é, em resumo, “ um amor bem pen­ Embora a definição do que seja religião não
sado à vida” . Essa (in)definição ampla daria lugar seja do âmbito da psicologia, algum entendimen­
até ao transcendente, porém com muita frequência to do conceito é necessário para definir o compor­
a relação ao transcendente é substituída pela rela­ tamento religioso. Optamos por definir religião
ção com algo não trivial mas ainda dentro do ho­ como relação com o sobrenatural. Sobrenatural
rizonte simplesmente humano. Fala-se, assim, de é um conceito histórico, originado no cristianis­
uma espiritualidade ateia,19 ou da “ mindfulness” mo e trabalhado em sua teologia. Por isso, não é
(atenção concentrada), como a “ realização budista um conceito compartilhado por todas as religiões,
de um sonho protestante” (Hedstrom, citado por como, aliás, o próprio conceito de religião, ausen­
Parsons19). A espiritualidade não raro é identificada te em culturas e subculturas várias. De passagem,
com o “ sentido da vida” , que pode ser diverso, além recorde-se, em primeiro lugar, a hesitação em de­
do religioso. A distinção conceituai entre religioso e rivar religião de relegere ou de religare, o primeiro
espiritual, contudo, ainda não é clara. Em Parsons, descrito por Cícero como a execução atenta dos
por exemplo, registra-se que milhões de americanos rituais voltados para os deuses, e o segundo enten­
(ao redor de 30% ) usam agora a frase “ espiritual dido por Lactâncio como uma ligação ou religação
mas não religioso” para identificar sua complexa com Deus. Em segundo lugar, mesmo em algumas
atitude em relação à religião. A frase provavelmente línguas ocidentais, a palavra “ religião” é de uso re­
tem “tantos sentidos quanto as pessoas que a utili­ lativamente recente, em lugar de culto ou serviço de
zam” (Parsons19). N a mesma publicação observa-se Deus (Gottesdienst). Com base nessa indefinição, o
que, em seu sentido mais geral, “ espiritual mas não termo “ sobrenatural” deve ser entendido historica­
religioso” denota aqueles que, de um lado, estão de­ mente como o que ultrapassa a natureza humana,
siludidos com a religião institucional tradicional e, ou o que a transcende, ou o divino. Nem por isso
de outro, sentem que' essas mesmas tradições con­ se desfazem todas as dificuldades, pois o transcen­
têm profunda sabedoria acerca da condição huma­ dente, ou o divino, admite muitos graus de reali­
na. Daí decorre a grande ambiguidade que pode, zação. Pode-se falar de sobrenatural com referên­
talvez na maioria dos casos, obnubilar os conceitos. cia a Deus, a espíritos, a antepassados, a energias
Parece-me, em todo o caso, que se trata de um fe­ cósmicas e a outras dimensões que superam não só
nômeno tipicamente norte-americano, embora com a cotidianidade e a trivialidade do dia a dia, mas
tendência a espalhar-se, dado o processo de secula- também o horizonte humano. É o comportamento
rização que atinge muitos países. N a Europa, Hans em relação, seja de aceitação, seja de recusa, a essas
Stifoss-Hanssen,20 da Universidade de Oslo, expôs entidades o objeto da psicologia da religião.
em um artigo intitulado “ Religion and spirituality:
what a European ear hears” , que um europeu não Comportamento: o externo observável
diria que não é religioso, mas espiritual, e diria, e o interno de alguma forma inferido
diferentemente, que é religioso, mas não cristão. O comportamento estudado pela psicologia
Saroglou,21 da Universidade de Louvain-la-Neuve, da religião é, certamente, o externo e observável,
após amplo levantamento, concluiu que o que se como, por exemplo, a execução dos rituais ou o
manifesta vigoroso na espiritualidade de seus su­ pertencimento a um grupo religioso. Porém tam­
jeitos é o que resta de sua religiosidade. Assim, os bém os pensamentos, as lembranças, os desejos e te­
estudos psicológicos da religião e da espiritualidade mores, as atitudes relativas ao objeto sobrenatural

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Parte I - C on ceitos Fundam entais

são comportamentos que interessam à PR. O com­ rejeitá-lo ou negá-lo. N ossa posição é francamente
portamento observável, objeto de grande parte da favorável à definição substantiva no estudo psicoló­
pesquisa empírica em PR, é menos indicativo da re­ gico da religião, defendida por Vergote.4
lação com o sobrenatural do que o comportamen­
to interno, não observável. A execução de um rito, O homo religiosus
por exemplo, pode ser movida por um sem-número Será o homem, por natureza, religioso, ou irre­
de intenções, disposições e finalidades, que dão a ligioso, de modo a possibilitar à psicologia estudá-
chave do entendimento do rito que se pratica. As -lo em toda época e lugar? Uma primeira considera­
pesquisas quantitativas em psicologia da religião ção é a de que a psicologia, como ciência empírica,
utilizam de preferência os comportamentos obser­ deve basear-se em dados concretos. Faltam-nos, no
váveis, e certamente traçam um quadro valioso da entanto, tais dados em relação a épocas distantes e
prática religiosa da pessoa. Porém devem ser apro­ a locais inacessíveis. É certo que historiadores da re­
fundadas, no essencial, por métodos outros, capazes ligião, como Julien Ries,23 baseando-se na noção de
de obter informação acerca da intenção de quem se Sagrado, têm chegado à noção de homo religiosus,
comporta. A entrevista é um dos métodos que per­ reconhecendo a religião como coextensiva à huma­
mitem tal aprofundamento. O comportamento reli­ nidade. Empiricamente, contudo, só temos acesso a
gioso observável e inferido é um campo imenso de determinadas épocas e locais e às formas religiosas
estudo: o consciente e o inconsciente, o individual desses tempos e lugares. Em segundo lugar, a dinâ­
e o social, os correlatos e condições biológicas, o mica psíquica não pode ser acompanhada em sua
cultural e o intercultural, enfim todas as dimensões generalidade, senão que deve atentar para sua ex­
de que se reveste o comportamento humano. pressão concreta e particularizada. Podemos admi­
tir, sem dúvida, um mínimo denominador comum
Definição substantiva e definição de muitos comportamentos, inclusive do religioso,
funcional porém com isso se perde o real concreto, substituí­
Como se deve definir “ religião” ? Apesar da do por uma abstração de fecundidade discutível.
fluidez do conceito, não é possível pesquisar o tema É possível que a antropologia e a sociologia, que
sem uma definição acordada. H á dois tipos prin­ lidam com grandes grupos e inteiras culturas, che­
cipais de definição: a funcional e a substantiva. A guem ao conceito do homem como religioso ou não
definição funcional se interessa pela função que a religioso. M as à psicologia cabe investigar o com­
religião exerce na vida da pessoa. Se religião é, por portamento do indivíduo, na necessária interação
exemplo, entendida como busca de sentido para a do pequeno com o grande grupo, e com a cultura
vida, a pesquisa vai buscar o que, na vida das pes­ mediada por esses mesmos grupos.
soas, dá sentido para sua vida. Historicamente mui­
tas são as possibilidades de dar sentido à vida. A Religioso e sagrado
justiça social, a libertação dos oprimidos, a ética, o Com frequência se encontra no âmbito da PR a
prazer e outras têm inspirado muitas pessoas e tem referência ao Sagrado. À psicologia pode interessar
fornecido a elas a razão de viver. N essa perspecti­ o comportamento voltado para o Sagrado. Esse é
va, atribui-se a essas modalidades o epíteto “ reli­ um termo substantivo, proveniente do adjetivo “ sa­
gião” . Muito da pesquisa recente e contemporânea grado” . Discute-se na linguística o exato sentido do
da psicologia da religião tem utilizado o conceito adjetivo, de origem latina e com correspondentes
funcional, que é um recurso interessante para a pes­ gregos {sacer/hierós/hágios), e diverso do adjetivo
quisa científica em geral. Com isso, pode-se chegar sanctus. Ao que parece, o adjetivo sacer designava,
a falar de uma religião sem Deus. Ora, essa desig­ em primeiro lugar, a condição de separado: sepa­
nação funcional não corresponde ao que a lingua­ rado para os deuses, e separado da comunidade,
gem comum entende por religião. Se confiarmos na como o homicida, ou a atitude danosa da ambi­
linguagem compartilhada e no entendimento que ção, como no célebre verso de Virgílio (Eneida, 3,
dela resulta, não podemos denominar religião uma 57) Auri sacra fames, M aldita fome do ouro.24’25
disposição, conquanto nobre, que não tenha rela­ A transformação de um adjetivo em substantivo
ção com o divino, o sobrenatural, inclusive para diz algo da mudança social. Essa transformação

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C apítulo 6 - Princípios de P sicologia da Religião

: ocorreu na antropologia e na sociologia do sécu­ Religião, política e laicidade


lo XIX e inícios do X X , interessadas nas religiões N ão a política mas o comportamento político
' ditas primitivas,26 e condiz com a diluição do re­
pode ser do interesse da PR. Uma vez que a política
ligioso, ou da religião cristã como matriz da vida
se exerce em um Estado laico, como o Brasil con­
individual e social do Ocidente. Essa diluição não
temporâneo, a questão da laicidade está conexa com
significou o desaparecimento da religião: na cons­
o comportamento político. Ao lado de certa clare­
ciência coletiva perduraram muitos elementos reli­
za, existe muita incerteza e confusão na circunscri­
giosos, desvinculados, porém, de sua raiz cristã. Foi
ção conceituai do termo “ laicidade” . O Conselho
então que o termo passou a indicar algo, não al­
Regional de Psicologia de São Paulo publicou, em
guém, digno de intensa apreço, reverência e temor.
2016, alentado estudo intitulado Psicologia, laici­
0 famoso livro de Otto (1917), D as Heilige, traz
dade e as relações com a religião e a espiritualida­
no título precisamente esse algo, expresso pelo gê­
de, fruto dos Seminários Estaduais, realizados em
nero neutro. Atualmente, o substantivo O Sagrado
2015.28 A iniciativa do Conselho foi inspirada pela
é encontrado na conceituação de espiritualidade,
necessidade do diálogo entre a psicologia e as reli­
que expressa uma relação com algo separado da
giões, sobretudo no atendimento clínico. H á psicó­
trivialidade e da materialidade da vida cotidiana. À
logos que se sentem desconfortáveis com essa apro­
PR não compete definir a realidade do Sagrado, sua
xim ação, em razão de seu entendimento do que seja
eventual existência objetiva, sua identidade ou dife­
a laicidade do Estado. Para alguns, a laicidade veda
rença com o divino. Interessa-lhe entender o com­
o contato com a religião. Argumenta-se, ao contrá­
portamento intencionado ao Sagrado, inclusive por
rio, que a laicidade está embutida no próprio cará­
comparação com o comportamento voltado para
ter científico da psicologia, que exclui metodologi­
o sobrenatural ou divino. Um autor lúcido no as­
camente o transcendente. N ão se deve, pois, temer
sunto é Antoine Vergote,4 que identifica o Sagrado
a contaminação da psicologia pela religião: esta
nas realidades situadas nos extremos da vida e da
será considerada como comportamento, como ati­
valorização humana. Essas realidades podem va­
vidade do psiquismo, sem o juízo de verdade além
riar com o tempo e o lugar, mas, desde que sejam
dessa atividade. Isso posto, abre-se a possibilidade
experimentadas como extremas, serão sagradas e
de considerar o comportamento religioso em seus
constituirão O Sagrado. Como exemplos, Vergote
efeitos tanto positivos como negativos no funcio­
lembra, em nossas culturas, a família, a pátria, a
namento psíquico. De passagem, observe-se que o
honra, a liberdade e semelhantes, consideradas algo
por que se deve não só viver, mas morrer. N a ob­ conceito de laicidade não deriva de teoria ou práti­
ca psicológica, e sim de reflexão filosófica e socio­
servação de pessoas não religiosas, mas movidas
pela libertação dos oprimidos, pela ética na polí­ lógica do que se entende por política, sem excluir
tica, pelo amor à ciência, encontramos outras tan­ a representação social dessa reflexão, na origem de
tas formas do Sagrado. Essas referências, de per si, muitos mal-entendidos.
nada têm a ver com o sobrenatural, porém consti­ Em um Estado laico, oposto ao Estado teo-
tuem realidades que exigem o respeito, a defesa, o crático, é delicado o papel da religião na políti­
apreço das pessoas, mesmo ao custo da vida. São, ca. Ainda assim, é possível o olhar da psicologia
por isso, adequados componentes da espiritualida­ para a religião como força social. O sociólogo José
de. Vergote vai além, e entende o Sagrado como a Casanova12 tem estudado a influência recente da re­
meio caminho entre o profano e o religioso. N ão ligião na política em vários países secularizados ou
contrasta, pois, apenas o sagrado com o profano, semissecularizados, como o Brasil. Nesses países,
como Mircea Eliade27 e muitos outros, mas tam ­ Casanova percebeu o retorno da religião à cena pú­
bém o sagrado com o religioso. Porém o Sagrado, blica, depois de um período de recolhimento à esfe­
dada sua densidade, pode apontar para o religio­ ra pessoal. N ão há dúvida de que a religião é uma
so, e ensaiar o trajeto até o religioso, ao modo do realidade social, expressão da convicção dos cida­
espaço transicional winnicottiano. Para tanto, ob­ dãos, que tende a influir na organização do Estado,
viamente, deverá atender a insinuações cognitivas e se não for represada. Essa influência não se dá, ne­
afetivas do religioso propriamente dito, presente de cessariamente (e nem desejavelmente), por intermé­
muitas formas nas interações sociais e na cultura. dio de partidos políticos, mas no impacto que pode

63
Parte I - C onceitos Fundam entais

exercer “ na ética do mercado, na distribuição da esclarecer que nem por isso a aceitação da religião se
renda, na moralidade pública” .10 O que a psicolo­ referia a uma religião institucional, sendo, mesmo,
gia poderá considerar não é o amplo panoram a da notável o grau de decepção e, mesmo, de agressi­
organização do Estado, mas as pessoas concretas, vidade, não com o cristianismo, mas com a Igreja
que influenciam religiosamente o Estado com seus Católica tradicional. Os professores/pesquisadores
“ estilos de personalidade e de liderança, [que] inte­ se distribuíram entre filiados a religiões cristãs tra­
gram grupos menos ou mais coesos, experimentam dicionais e aderentes a formas superiores de energia
conflitos de vários tipos, reagem emocionalmente mais ou menos indefinidas. Embora o número de
aos sucessos e fracassos” de sua ação política.10 participantes fosse limitado (10 físicos, 8 zoólogos,
8 historiadores), e não permitisse generalização para
Ciência e religião o universo da Instituição pesquisada, e muito me­
nos para o universo dos docentes do ensino supe­
As relações entre ciência e religião podem ser es­
rior brasileiro, a consistência dos achados apontou
tudadas de várias maneiras. A mais frequente delas é
para a natureza prevalentemente psicológica, e não
a epistemológica, isto é, o discurso sobre o conhecer.
epistemológica, da posição pessoal dos cientistas
Pergunta-se se a religião permite conhecer verdadei­
em relação à religião. Resultado semelhante, po­
ramente seu objeto sobrenatural, assim como a ciên­
rém muito mais encorpado em razão do número de
cia permite conhecer seu objeto natural. Desse ponto
participantes, foi o obtido por Elaine Ecklund31 e
de vista, são várias as posições entre os estudiosos,
por Ecklund et al.32'33’34 Essas pesquisas, de índole
desde a completa negação (Dawkins), passando pela sociológica, foram realizadas em 21 Universidades
independência recíproca dos magistérios (Gould), de grande prestígio nos Estados Unidos, e visavam
até a sintonia fina (fides et ratio). Essa é uma ques­ examinar o “ paradigma de conflito” , de natureza,
tão moderna, uma vez que nem religião nem ciência, portanto, epistemológica. As pesquisas de Ecklund
no sentido atual, apareceram na linguagem até os et al. atingiram mais de 2 mil cientistas, das áreas
séculos XVIII e X IX , respectivamente.29 M as é uma da física, química, biologia, sociologia, economia,
questão candente, para quem se ocupa seriamente ciência política e psicologia, fornecendo um amplo
com o tema. À PR não interessa a discussão epis­ levantamento do campo acadêmico. O aspecto mais
temológica, campo muito mais da filosofia do que psicológico dessas pesquisas pode ser percebido nas
da psicologia. À psicologia da religião interessa o 275 entrevistas em profundidade que se sucederam
comportamento de quem nega ou afirma a compati­ ao levantamento.31 As linhas-mestras das entrevistas
bilidade entre ciência e religião. Em outras palavras, no Brasil e nos Estados Unidos foram muito seme­
a psicologia da religião se ocupa com o cientista e o lhantes.35 N o Brasil,
religioso, e não com a ciência e a religião. Nessa óti­
ca, é possível encontrar a epistemologia como justi­ [...] o eixo da entrevista era a elaboração
ficativa da adesão ou da rejeição seja à ciência, seja atual do entrevistado às interpelações da
à religião. Porém a justificativa não é simplesmente ciência e da religião, seja na ordem cogniti­
da ordem do puro conhecimento, mas está imbrica­ va seja, mais geralmente, no arranjo da vida.
Ao redor desse eixo inseriam-se referências
da em emoções, memórias, fidelidades e, afinal, na
ao ambiente familiar e aos anos de formação
ideia do que é o ser humano. É o que expressa Nick
acadêmica do entrevistado: influência do pai,
Spencer, do Théos Think Tank, de Londres: “ a ques­
da mãe ou de terceiros, favorável ou desfavo­
tão real é a moral, não o conhecimento” .29 Essa foi
rável à religião e à ciência; educação religio­
a conclusão a que chegou ampla pesquisa entre pro­
sa; experiência marcante, que aproximou ou
fessores/pesquisadores avançados da Universidade
afastou da religião e a ciência; posição dos
de São Paulo, nas áreas de ciências exatas, biológi­
professores e dos colegas diante da religião;
cas e humanas, publicada no ano 2000.30 N ão foi
impacto dos estudos científicos sobre a for­
encontrado um único caso em que a relação entre
mação religiosa anterior.30
ciência e religião fosse de natureza epistemológica,
ou seja, em que se apelasse para o conhecimento N a pesquisa de Ecklund et al., que resume o
científico como razão seja da aceitação, seja da rejei­ longo questionário e o roteiro das entrevistas, de
ção da religião por parte do cientista. É conveniente Ecklund,31

64
C apítulo 6 - Princípios de Psicologia da Religião

Como surge a religião e a espiritualidade, narcísica infligida ao homem por um princípio pes­
se é que surge, no curso de sua disciplina? soal externo a ele, e como embate entre autonomia
[...] Como a religião (ou a espiritualidade) e dependência.30
influencia o trabalho que você faz como cien­
tista? Como ser cientista influencia, se é que Religião e fenômenos anômalos
influencia, a maneira de você pensar ou ver a O termo “ anôm alo” tem algo de estatístico: é
religião? Alguns dizem que há um “ conflito anômalo o que é infrequente e, por isso, inesperado
entre a ciência e a religião” : como você res­ e inexplicado. Em psicologia, o anômalo se refere
ponderia a essa afirmação? Como atualmente aos fenômenos incomuns e, por isso, menos estuda­
é para você pessoalmente, como você descre­ dos, uma vez que a psicologia e as ciências tendem
veria o lugar da religião ou da espiritualidade a ser nomotéticas, isto é, voltadas para as leis gerais
em sua vida? Que crenças religiosas ou espi­ que regem a maior parte do que conhecemos.
rituais você mantém? Se você tem uma tra­
Seria a religião um fenômeno anômalo? Sob
dição religiosa, de que forma específica essa
um aspecto, certamente não, pois a religião é um
tradição influencia sua vida atualmente? Que
dos fenômenos mais comuns. É, até um fenômeno
tipo de coisas você faz para praticar a tradi­
mais comum que seus contrários, como o ateísmo e
ção religiosa de que faz parte?33
o agnosticismo. M as, sob outro aspecto, a própria
Um primeiro, e surpreendente, resultado foi a religião é um fenômeno anômalo, pois escapa do
ausência de conflito entre os cientistas americanos e trivial e cotidiano quando bem pensada. De fato, a
entre os brasileiros. “ Os cientistas, na maioria, não religião põe a pessoa em relação a algo ou alguém
percebem conflito entre ciência e religião” ;32 apenas distante das tarefas e dos relacionamentos quoti­
uma minoria de cientistas vê a religião e a ciência dianos. Como diria Schutz,36 a religião é uma pro­
como “ sempre em conflito” .33 Outras razões aduzi­ víncia finita de significado, distinta da ampla pro­
das pelos cientistas americanos são os magistérios víncia da vida quotidiana. Essa distância é óbvia
não coincidentes, de Gould; o fato de outros cien­ nas religiões monoteístas, mas também se verifica
tistas importantes serem religiosos; um cônjuge reli­ nas demais, pois, por mais concretas que sejam as
gioso ou a educação dos filhos em uma comunidade referências que se façam nestas, o sentido dessas
que lhes dê ambiente moral. Entre os brasileiros, referências não é cotidiano nem comum e foge às
vários afirmam nunca ter pensado na relação en­ leis que regem a vida de todo dia. Mesmo quando
tre ciência e religião; alguns não consideram a reli­ a pessoa está habituada à religião, que por isso ad ­
gião portadora de poder epistemológico, e por isso quire um caráter de “ normalidade” , o mundo da
não veem conflito erítre religião e ciência; outros religião, quando bem pensado, é surpreendente.
reconhecem colegas religiosos, embora não deem Imagine-se, no cristianismo, a ideia de que Deus se
à religião um lugar em seu espaço de vida; alguns fez homem: essa ideia está presente, em muitíssimas
não sentem conflito porque atribuem à religião e à pessoas, como algo tão natural que não desperta
ciência diferentes espaços topológicos; outros valo­ nenhuma perplexidade. N o entanto, se nos damos
rizam ciência e religião, sem relacionar uma com a conta do que a ideia comporta, ficamos admira­
outra; outros, finalmente, articulam ciência e reli­ dos, confusos, perplexos. Essa é, de fato, uma ideia
gião como complementares. não intuitiva, apesar de se ter tornado tão familiar
A pesquisa com os acadêmicos brasileiros, di­ que pareceu tornar-se intuitiva. Aqui nos socorre
versamente da pesquisa com os acadêmicos norte- a psicologia evolucionária estudiosa do fenômeno
-americanos, procurou investigar também a dinâ­ religioso. Segundo essa psicologia, o elemento re­
mica inconsciente na raiz das atitudes em relação ligioso surgiu na humanidade a partir de fenôme­
à ciência e à religião. Da análise resultou que as nos e de vivências não evidentes, não pertencentes à
dificuldades dos cientistas com a religião não são experiência quotidiana, embora não contraditórias
tão própria a eles quanto comum aos seres huma­ a ela.37’38 Diga-se de passagem que essa oposição
nos: o conflito não consciente entre a ciência e a à experiência cotidiana está igualmente na origem
religião cristã, onde cresceram, não se mostrou pu­ da ciência e da filosofia, provocada pela admiração,
ramente intelectual, mas se revelou como a ferida A ideia de admiração permanece na linguagem,

65
Parte I - C onceitos Fundam entais

quando se fala de milagre, etimologicamente algo do Sul, Rio de Janeiro, M inas Gerais, Paraíba,
que provoca o olhar por ser inusitado. A religião Ceará, M aranhão e M ato Grosso. A atividade prin­
tem, pois, uma natureza ao menos inicialmente cipal do GT em sido a realização dos Seminários
anômala, embora possa perder esse caráter ao lon­ “ Psicologia Sc Senso Religioso” , que, a cada dois
go da prática. Estabelecida a “ anom alia” da reli­ anos, se tem reunido em Belo Horizonte, São Paulo,
gião, surge a questão de se toda manifestação anô­ Campinas, Brasília, Jo ão Pessoa, Curitiba, Porto
mala pode ser dita religiosa e, em segundo lugar, se Alegre e, proximamente, Cuiabá. Esses Seminários
a anomalia de certas expressões ligadas à religião têm contado cada vez mais com a participação de
pode ser religiosa. Como a anomalia está na origem especialistas do exterior, como Antoine Vergote
da busca científica, nem toda anomalia é religiosa, (Leuven), Kevin Ladd (South Bend), Kenneth
a menos que se estenda indefinidamente a noção Pargament (Bowling Green), M ario Aletti (Milão),
de religião, confundindo-a com a espiritualidade, Jeremy Carrette (Canterbury), Denise Jodelet,
como acontece com grandes cientistas em suas in­ (Paris, EHESS), Raymond Paloutzian (Westmont
cursões filosóficas. As religiões concretas, de ou­ College). O Seminário tem publicado, depois de
tro lado, apresentam vários fenômenos anômalos. cada evento, um livro com a temática apresenta­
Mediunidade, visões e aparições, estigmatização, da: Diante do mistério; Entre necessidade e desejo;
incorporações de espíritos, talvez passes espíritas Psicologia e espiritualidade; A representação na re­
ou o johrei da religião messiânica, são conhecidos ligião; Temas em psicologia da religião; Psicologia
fenômenos anômalos, que se afastam da vivência da religião no mundo ocidental contemporâneo:
cotidiana e despertam admiração. Esses fenômenos desafios da interdisciplinaridade; M orte, psicolo­
podem ser religiosos, não por serem anômalos mas gia e religião; Psicologia da religião no Brasil e, em
por estarem intencionados para o sobrenatural ou breve, Enfrentamento (coping) religioso e saúde.
o divino, geralmente dentro de uma tradição reli­ O Instituto de Psicologia da Universidade de São
giosa. Por vezes tais fenômenos são denominados Paulo oferece, na Graduação e na Pós-Graduação,
místicos, numa acepção imprecisa de misticismo. A disciplinas ligadas à psicologia da religião, e seu
psicologia tem-se interessado por eles, desde seus Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social
primórdios, em razão exatamente de sua fuga ao tem produzido dissertações, teses e pesquisas de
comportamento dito normal. Entre nós, Zangari, pós-doutorado nessa especialidade. O Instituto
M achado, M araldi e M artin39’40 têm escrito acerca de Psicologia também mantém o Laboratório de
dos primeiros estudiosos dessas manifestações, ini­ Psicologia Social da Religião, que tem produzido,
cialmente ditas simplesmente psíquicas (psychical com o auxílio do CNPq, importantes pesquisas,
researcb), a seguir parapsicológicas e atualmente dentre as quais um levantamento crítico da produ­
anômalas. Vergote41 tem estudado as visões e apari­ ção em psicologia da religião no Brasil, de 1956 a
ções; Marianeschi,42 a estigmatização; M arrach de 2 0058 e, em curso, ampla pesquisa, apoiada pela
Albuquerque,43 o passe e o johrei. Todas essas são Fapesp, com os docentes e pesquisadores das prin­
manifestações psíquicas, com possíveis componen­ cipais Universidades brasileiras acerca das relações
tes psicossomáticos, que podem ser religiosas, se entre ciência e religião. Além da USP, outras insti­
tencionadas para o sobrenatural, ou simplesmente tuições universitárias têm oferecido a disciplina, em
psicológicas, se ausente essa intenção. ritmo constante ou intermitente: São Paulo (PUC e
Mackenzie), Brasília (UCB e UnB), Curitiba (PUC-
Psicologia da religião no Brasil PR), Jo ão Pessoa (UFPb), Campinas (PUC), Belo
N o Brasil, existem muitos núcleos de pesquisa Horizonte (UFMG e PUC), Fortaleza (Ceuma),
e docência em psicologia da religião. O núcleo de Cuiabá (FACC-MT). São Leopoldo (EST), Goiânia
maior participação nacional é o Grupo de Trabalho (PUC), Aracaju (UFS), Pernambuco (UFPE), Juiz de
(GT) “ Psicologia Sc Religião” , da Associação Fora (UFJF), Rio de Janeiro (PUC). Outros estudio­
Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em sos em psicologia, ligados a diversas instituições,
Psicologia (ANPEPP). O GT foi fundado em 1988 dedicam-se a temas da psicologia da religião, e pu­
e desde então tem-se expandido, do núcleo de São blicam na área: dentre eles, Edênio Valle (PUC-SP),
Paulo, para o Distrito Federal, Paraná, Rio Grande Adriano Holanda (UFPR), Karla Daniele Maciel

66
C apítulo 6 - Princípios de P sicologia da Religião

Luz (Univasp), Ricardo Torri de Araújo (PUC-Rio), ponto de vista psicossocial, a teoria da identidade,
Francisco Lotufo Neto (USP). de Tajfel;47,48 do ponto de vista da personalidade, os
conceitos de imaginário e de simbólico, propostos
Derivações dos princípios - pesquisas por Lacan.49 Qualquer identidade, com efeito, esta­
em psicologia da religião belece-se a partir da inserção em um grupo social e
da elaboração personalizada dos critérios dessa in­
Equilíbrio e harmonia em ministros religiosos serção. Foram entrevistadas 38 brasileiras, jovens e
da Instituição Perfeita Liberdade e da Igreja adultas, sem ascendência japonesa, que, de cristãs e
Católica44 católicas, filiaram-se à Seicho-no-ie e à Instituição
A tendência ao equilíbrio entre conhecimentos Religiosa Perfeita Liberdade (PL). A análise das
e afetos foi proposta por R Heider45 como princípio entrevistas revelou vários níveis e modalidades de
organizador da cognição. Essa tendência foi estuda­ transformação da identidade religiosa. Algumas
da experimentalmente em Assistentes de Mestre, da passaram por uma mudança consumada de perten­
Instituição Religiosa Perfeita Liberdade, e Agentes ça e de simbólico; outras se encontravam de mu­
Pastorais católicos. Após entrevista voltada para dança em curso na pertença e no simbólico; outras
as atividades concretas de cada um, foram criadas, pertenciam a mais de um grupo com o respectivo
com esse material, situações triádicas desequilibra­ simbólico; finalmente, outras se encontravam em si­
das reais. Foram também apresentadas situações tuação ambígua em relação à pertença e ao simbó­
triádicas desequilibradas fictícias. A partir das so­ lico. N o primeiro caso, constatou-se a inserção no
luções que os participantes ofereceram a essas si­ novo grupo religioso, a aquisição de um novo sim­
tuações, verificou-se que os Assistentes de Mestre, bólico e, quase sempre, a manutenção de elementos
significantemente mais do que os Agentes Pastorais, da antiga filiação, sob forma do imaginário. Nesse
tendiam a soluções equilibradas nas situações de caso, verifica-se mudança de identidade. N a mu­
vida reais. N as situações fictícias ambos os grupos dança em curso, encontra-se a transição habitual de
tiveram o mesmo resultado. N a solução das tría­ uma identidade para outra: há paulatino distancia­
des desequilibradas, o equilíbrio pode ser alcança­ mento do grupo de origem e paulatina absorção do
do tanto tornando negativa uma relação positiva novo simbólico. N a pertença a mais de um grupo e
como transformando em positiva uma relação ne­ no acréscimo de mais um simbólico, não há trans­
gativa. Verificou-se que os Assistentes ofereceram, formação da identidade, pois grupos e simbólicos
significantemente mais que os Agentes Pastorais, não dizem respeito à esfera religiosa. Finalmente,
soluções harmoniosas, isto é, aquelas em que as re­ no caso de ambiguidade de pertença e de simbólico,
lações são ambas positivas ou ambas negativas. A a pessoa permanece indefinida, frequentando am­
razão das diferenças foi encontrada na forte ênfase bos os grupos e mantendo ambos os simbólicos. Um
da Perfeita Liberdade na harmonia, menos presente resultado inesperado, e significativo, da pesquisa foi
nos Agentes Pastorais, que viviam uma época em a convergência, em todos os casos, da dimensão
que o conflito era a tônica da teologia da liberta­ psicossocial com a dimensão pessoal da identidade.
ção, e na ênfase no real concreto, em face de situa­ Essa convergência confirma a mútua complementa­
ções simplesmente imaginadas. ridade do psicossocial e do pessoal.

Identidade religiosa de brasileiros filiados Conflitos psicológicos entre ciência e religião


a novas religiões japonesas 46 na Academia 30
“N ovas religiões” japonesas são formas de re­ O conflito entre ciência e religião é um lugar-
ligião surgidas no Jap ão nas primeiras décadas do comum, e, como todo lugar-comum, foge à crítica.
século X X , não oriundas do budismo, do xintoísmo Para examinar a ocorrência desse conflito, ao qual
e, mesmo, do cristianismo. A adesão de católicos se aludiu acima, em ciência e religião, foram pes­
brasileiros às novas religiões e a suas instituições quisados 26 professores e pesquisadores avançados
foi pesquisada do ponto de vista da mudança da da Universidade de São Paulo, das áreas de ciências
identidade religiosa. Duas grandes referências teó­ exatas (físicos), biomédicas (zoólogos) e humanas
ricas foram utilizadas para examinar o tema: do (historiadores).30 O interesse maior da pesquisa não

67
Parte I - C onceitos Fundam entais

eram as relações epistemológicas entre ciência e re­ As referências à religião serão juntadas às fei­
ligião, objeto da filosofia, mas as relações psicoló­ tas à Igreja, que foi a real matriz da religião para
gicas dos pesquisadores em termos de conflito no os entrevistados. As acusações à Igreja sugerem
trato simultâneo da ciência e da religião. Para tanto que a rejeitaram enquanto portadora de caracte­
foi utilizada a teoria de campo, de Lewin, para o ní­ rísticas paternas, e ao mesmo tempo rejeitaram
vel consciente, e a abordagem freudiana, na leitura o Deus paterno que ela veicula. Inversamente, os
de Vergote,50 para o nível pré-consciente ou incons­ entrevistados não rejeitaram as características ma­
ciente. O instrumento consistiu em entrevistas de ternas de Deus em sua história pessoal igualmente
profundidade, com um roteiro que incluía a histó­ veiculadas pela Igreja, e as colocaram em um Deus
ria de vida dos participantes, sua interação com os de uma religião sem Igreja, íntima, fusionai. Há
colegas acadêmicos, seu modo de lidar com o sofri­ claros indícios de que o Deus que não corresponde
mento e o mal, seu interesse pela relação entre ciên­ aos entrevistados é aquele que estabelece a lei: cer­
cia e religião, seus valores na educação dos filhos. to e errado, bem e mal, pecado e culpa. Vingança,
Os resultados da pesquisa foram de duas naturezas. opressão, rigidez, autoritarism o vêm à baila quan­
N o nível consciente não se verificou conflito, por
do o assunto é a Igreja e seu Deus. Esse é um deus
várias razões: alguns não incluem a religião em seu
paterno. Ao contrário, o deus que atende à ideia e
espaço de vida, pois não a consideram portadora
às aspirações desses entrevistados é um deus ínti­
de potencialidade epistêmica; um segundo grupo
mo, sem vinculação social externa, até mesmo sem
abriga em seu espaço vital referência a regiões de
limites com a Humanidade e a Natureza. Esse deus
terceiros, que mantêm ciência e religião, mas as
que preenche as estruturas psicológicas de unidade
consideram irrelevantes para seu próprio mundo
é um deus materno. À luz dos resultados, pode-
psicológico; há quem separe topologicamente ciên­
se concluir que o conflito entre religião e ciência
cia e religião, não estabelecendo relação entre es­
sas regiões; finalmente, outros articulam ciência e ou, mais psicologicamente, entre atitude religiosa
religião, tornando-as complementares. Desses últi­ e atitude científica é muito mais um conflito com­
mos a maior parte não identifica religião com ins­ partilhado pelos seres humanos do que um confli­
tituição, e define a religião com contornos menos to específico dos cientistas.
históricos e mais próximos da consciência moder­
na de energia cósmica, de expansão psicológica da Representação social da religião
realidade humana ou de necessidade da ética. N o em acadêmicos 44
nível inconsciente, os conflitos que podem opor o Após a pesquisa mencionada anteriormente
homem à religião resumem-se na relação com Deus acerca das relações entre ciência e religião envol­
como pai. N a concepção da psicologia, parece fun­ vendo professores avançados da Universidade de
damental o núcleo do conflito edipiano: a recusa São Paulo, discutiu-se a existência ou inexistência
do pai, o desejo de tornar-se seu próprio pai e sua de uma representação social da religião nos parti­
própria origem, a autonomia com rejeição da hete­ cipantes. São quatro as condições de uma represen­
ronomia. N as entrevistas, o “ terceiro ouvido” de tação social: (a) um grupo caracterizável (os acadê­
que fala Theodor Reik51 permitiu captar micos), (b) que compartilhe um conjunto de ideias,
[...] indicadores valiosos dos processos in­ valores e práticas relativas a um objeto social, (c)
conscientes, tais como pausas, vacilações, re­ que permita às pessoas estabilidade no trato com
tardamentos e acelerações, risos, repetições, seu mundo e (d) facilidade na comunicação com as
acentuações tônicas, composições híbridas de pessoas de seu grupo. Verificou-se que quase todas
palavras, irrupções súbitas, mais ou menos as condições de uma representação social estavam
deslocadas, de temas como culpa, pecado, cas­ presentes, com exceção da condição (b). Com efei­
tigo. Essas irrupções, que não acontecem com to, embora os acadêmicos, em sua maioria, não te­
todos e raramente se referem diretamente a nham expressado conflito entre ciência e religião,
Deus, concentram-se ao redor da Igreja, quase inclusive por não atentarem para a relação entre
sempre a católica, que é dita cínica, violenta, elas, não se descobriu neles uma representação so­
hipócrita, opressiva, voltada para o pecado, cial da religião precisamente pela ausência de con­
dominadora, e que quase todos rejeitam.30 versação que tenha a religião como objeto.
C apítulo 6 - Princípios de Psicologia da Religião

Ideias religiosas e eficácia ritual segundo um poder especial a pessoas, procurando a expli­
a psicologia cognitiva da religião 52 cação dos acontecimentos em causas não pessoais.
A atual psicologia cognitiva da religião investi- Os resultados sugerem que a própria ideia de que
í ga as condições pré-culturais dos conceitos religio­ as pessoas dotadas de poder especial são universal­
sos e das ações religiosas. Deus e a eficácia divina mente julgadas como particularmente capazes de
têm sido estudados no quadro da contraintuição produzir efeitos contraintuitivos requer maior con­
e da eficácia ritual. Alguns estudos revelaram que firmação intercultural.
as pessoas de diferentes culturas tendem a atribuir
uma origem sobre-humana a concepções e acon­ Religião, enfrentamento e cura:
tecimentos que contrariam a percepção intuitiva e uma discussão conceituai54
ôs recursos humanos, e sugerem que é necessária N a discussão do lugar da religião no processo
uma pesquisa intercultural a fim de garantir uma de enfrentamento, um nome de incomparável relevo
base mais confiável para essas atribuições. Dois es­ é o de Kenneth Pargament. Ele destaca que a reli­
tudos feitos no Brasil confirmaram parcialmente os gião, graças a seu caráter “ abstrato, simbólico e mis­
resultados obtidos em outros países. N o primeiro terioso” ,55 permite sua invocação em qualquer situa­
estudo, 79 estudantes universitários, a quem foi ção. Ela é portadora do sagrado, que é “ um fim em si
apresentada uma série de afirmações, avaliaram, mesmo, não subordinado ao social ou ao psíquico, e
em uma escala Likert de 5 pontos, as proposições se encontra na ligação com os antepassados, no mis­
contraintuitivas como relacionadas com o campo tério, no sofrimento, na esperança, na finitude, na
religioso, e as proposições intuitivas como não re­ entrega, no propósito divino, na redenção” ,55 e com
feridas a ele. Exemplos: “ Os índios Airumá pensam isso acrescenta “ algo além do que é fornecido pelo
que a onça é perigosa; A imagem de madeira da mundo secular” .56 Ressurge nesses textos a questão
igreja de Urucum chorou ao ouvir a triste história do sagrado e do religioso. N a percuciente análise de
de Zeca” . Os resultados confirmaram os estudos Vergote,26 já citada, o sagrado se define como “ rea­
anteriores (p < .0000; alpha 5% ). N o segundo es­ lidades que representam valores essenciais e ideais,
tudo, os mesmos estudantes avaliaram, em uma das quais o homem se vê beneficiário e garante” , e
escala Likert de 7 pontos, 12 pequenas descrições “ comportam o interdito de transgressão, porque sua
intuitivas e contraintuitivas, e julgaram a probabi­ violação destruiria o próprio sentido de existência,
lidade de uma ação ritual ser eficaz. As descrições solidário desses valores” .57 Pátria, família, humani­
foram traduzidas do estudo de Barrett e Lawson.53 dade, são exemplos do sagrado localizados na esfera
Exemplos: Uma pessoa especial soprou um pó co­ do humano. A religião, ao contrário, implica rela­
mum no campo, e o campo produziu uma boa co­ ção com o transumano, isto é, com alguma forma
lheita; Uma pessoa especial soprou um pó especial de realidade sobrenatural. O sagrado poderia, por­
no campo, e o campo produziu boa colheita; Um tanto, com Vergote,57,4 ser reconhecido como um do­
rato comum soprou um pó comum no campo, e o mínio transicional, do profano para o religioso, pois
campo produziu boa colheita. Estudos anteriores que, realidade essencialmente humana, está aberto
encontraram que associados à probabilidade de para algo sobre-humano. Com essa distinção con­
eficácia da ação ritual eram, nesta ordem, (a) um ceituai pode-se distinguir no sagrado de Pargament
agente especial + um instrumento especial; (b) um elementos sagrados e elementos religiosos, na verda­
agente especial; (c) um instrumento especial; (d) de cristãos, provavelmente fornecidos pelos sujeitos
agente/instrumento não especiais. Os resultados das pesquisas. Da ordem do sagrado são “ fim em
do estudo brasileiro apontaram para uma diferen­ si mesmo, ligação com os antepassados, mistério do
te ordenação: (a) instrumento especial; (b) agente sofrimento e da finitude” . Porém, “ propósito divino,
especial + instrumento especial; (c) agente especial; entrega, esperança, redenção” , são qualificações re­
(d) agente/instrumento não especiais. A principal ligiosas e, mesmo, cristãs. Essa distinção leva à ques­
discrepância, com p = 0,002, pode ser explicada tão de se a psicologia, como ciência empírica, que
considerando que a amostra brasileira, composta exclui metodologicamente o transcendente, é capaz
em sua maioria por estudantes que se declaravam de, no tópico do enfrentamento, estabelecer a eficá­
sem religião, pode ter-se inclinado a não atribuir cia do propriamente religioso. A eficácia do sagrado

69
Parte I - C onceitos Fundam entais

é, contudo, certamente, alcançada pela psicologia. 5. Spilka B, H o o d JRW , H unsberger B, G orsuch R . The
Em resumo, “ a questão da eficácia singular do en- psychology o f religion: an em pirical ap p roach , 3rd
ed. N o va York, G uilford Press: 2 0 0 3 .
frentamento religioso como tal não pode ser ava­
6. Joh n son PE. Psicologia d a religião. S ão Paulo, ASTE
liada [pela Psicologia], embora [a Psicologia] possa (A ssociação de Sem inários T eológicos Evangélicos):
avaliar a eficácia do sagrado, inclusive do sagrado 1964.
que possibilita ao homem a inserção no religioso” .54 7. R o sa M . Psicologia da religião. R io de Jan eiro, C asa
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8. Paiva G J, Z an gari W, V erdade M M , Paula JR M ,
Considerações finais Faria D G R , G om es D M et al. Psicologia da re­
A psicologia da religião certamente não é uma ligião no Brasil: a p rod u ção em periódicos e livros.
Psicologia: Teoria e Pesquisa. 2 0 0 9 ;2 5 :4 4 1 -6 .
área necessária ao entendimento e à atividade profis­
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sional do psicólogo. A psicologia acumulou em sua religião: princípios, enfoques, aplicações. Valle E
existência mais que centenária um saber teórico am­ (translator). A parecida, Ideias & L etras: [2010].
plo e uma prática segura. Como profissional, o psi­ 10. Paiva G J. O que o p sicólogo precisa saber da psi­
cologia da religião. In: A guirre Antúnez A E, Safra
cólogo dispõe de informações sólidas e de recursos
G , organizers. Psicologia clínica: da grad u ação à
de ação experimentados. A religião, contudo, é uma p ós-grad uação. S ão Paulo, Atheneu: 2 6 7 -7 2 , 2018.
referência na vida de muitas pessoas, e problemas 11. G odin A. Santé m entale et vie chrétienne: im portance
pessoais e sociais surgem também em conexão com et com plexité des recherches scientifiques. Archiv für
R eligionspsychologie. 1 9 6 2 ;7 :2 2 4 -3 7 .
a religião. Dessa consciência dá testemunho, como
12. 12. C asan o v a J. Public religions in the m odern world.
lembrado, o DSM IV. O psicólogo terá ocasião de C hicago, The University o f C hicago Press: 1994.
cuidar da pessoa nessas circunstâncias. Agirá como 13. A nna-M aria R izzuto (1 9 7 9 ; 1991)
psicólogo, isto é, lidando com o psíquico no religio­ 14. Oser, Reich e Bucher (1994)
so, e não como ministro ou conselheiro religioso, e 15. Rican PR. Spirituality: a story o f a concept. International
Association for the Psychology o f Religion (IAPR).
muito menos como adversário da vivência religiosa Conference Proceedings, Glasgow, 2003a.
de quem o procura. Dada a multiplicidade e especi­ 16. R ican PR. Spirituality: a concept in context. Studia
ficidade das religiões existentes no Brasil, é impossí­ Psychologica. 2 0 0 3 b ;4 5 (3 ):2 4 9 -5 7 .
vel conhecê-las todas ou grande parte delas. Porém 17. R ican PR. Spirituality: the story o f a concept in psy­
chology o f religion. Archive for the Psychology of
é imprescindível que, ao atender uma pessoa com
R eligion. 2 0 0 4 ;2 6 :1 3 5 -5 6 .
problema psicorreligioso, o psicólogo conheça com 18. Solom on R C . Espiritualidade para céticos: paixão,
certa profundidade a religião envolvida no processo verdade cósm ica e racionalidade no século X X I. 2003.
psicológico de seu consulente. Daí a conveniência, 19. Parsons W B. (2018) Being spiritual but not religious:
p ast, present, future(s). A bingdon, O xo n /N ew York,
senão a necessidade, de alguma familiaridade com
R outledge: 5 ,7 , 2 0 1 8 .
a psicologia da religião10 em um estudo que trata da 2 0 . Stifoss-H ansen H . Religion and spirituality: w hat a
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C apítulo 6 - Princípios de Psicologia da Religião

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