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21/05/2019 LITURGIA: É MESMO NECESSÁRIA?

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LITURGIA: É MESMO NECESSÁRIA?


 Equipe APECOM  21 May, 2019  0 Facebook Tweet Google +

Lições da História da Igreja

Liturgia: É Mesmo Necessária?

A palavra “liturgia” provoca arrepios em muitos evangélicos. Lembra um culto


rígido, engessado, excessivamente formal, carente de espontaneidade e
espiritualidade. No entanto, originalmente o termo não possuía essa conotação
negativa. Ele vem do grego leitourgia (pronuncia-se “leiturguía”) e de início
significava qualquer serviço prestado à coletividade ou a uma pessoa. Na versão
grega do Velho Testamento (a Septuaginta) referia-se ao ministério dos sacerdotes
ou aos atos de culto realizados por eles. No Novo Testamento o substantivo
aparece seis vezes, o verbo três e dois termos correlatos outras seis vezes. Em
geral se referem ao culto da velha dispensação ou à assistência material aos
irmãos (Lc 1.23; Rm 15.27; 2 Co 9.12). Quase metade das ocorrências está na
carta aos Hebreus, aludindo ao ministério de Cristo ou dos antigos sacerdotes
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judeus (Hb 8.6; 9.21; 10.11). Um uso mais especificamente cristão ocorre em At
13.2 e Fp 2.17. No cristianismo antigo, passou a significar o serviço espiritual
prestado a Deus, cuja expressão mais nobre e elevada era o culto público.

Na igreja apostólica, como quase tudo o que se fazia naquele período inicial, o
culto era singelo e informal. O Novo Testamento quase nada diz sobre uma forma
de culto, ou seja, uma seqüência dos atos de adoração. Somente encontramos
informações sobre os elementos cúlticos: leitura do texto sagrado, cânticos,
orações, pregação, celebração da Ceia e invocação da bênção. Um dos
testemunhos mais antigos e valiosos a respeito de uma ordem de culto é
encontrado na Primeira Apologia de Justino Mártir, em meados do 2º século: “No
dia denominado dia do sol há uma reunião de todos aqueles que vivem tanto nas
cidades como no campo. Ali se dá a leitura das Memórias dos apóstolos ou das
Escrituras dos profetas, até onde o tempo permite. Terminada a leitura, o
presidente faz uso da palavra para nos admoestar e nos exortar à imitação e
prática dessas coisas admiráveis. Logo nos levantamos e oramos juntos”. Em
seguida, Justino descreve a celebração da Ceia e o recolhimento de ofertas para
pessoas carentes.

Algumas décadas após o período apostólico, no final do 1º século ou início do 2º,


começaram a surgir formas de culto mais elaboradas. Era natural que isso
ocorresse, à medida que a igreja crescia e se consolidava. Uma das principais
motivações para tal fato era de natureza estética. Entre outras características, o
culto ao Todo-Poderoso devia ser belo e harmonioso, conforme a exortação do
salmista: “Entoai-lhe novo cântico, tangei com arte e com júbilo” (Sl 33.3). A
Didaquê, um manual eclesiástico do início do 2º século, dá testemunho desse fato.
Ao se referir à celebração da Ceia do Senhor, esse documento menciona as mais
antigas orações eucarísticas conhecidas, caracterizadas por seu rico conteúdo
bíblico. Diz o texto: “No tocante à eucaristia, dareis graças desta maneira –
primeiramente sobre o cálice: ‘Damos-te graças, Pai nosso, pela santa vinha de
Davi, teu servo, que nos deste a conhecer por meio de Jesus, teu Servo. A ti seja a
glória eternamente’”. A seguir, vinham as palavras a serem ditas sobre o pão
partido e, por último, a belíssima oração de ação de graças, que assim começava:
“Damos-te graças, Pai nosso, por teu santo nome, que fizeste habitar em nossos
corações, e pelo conhecimento, pela fé e pela imortalidade que nos revelaste
mediante Jesus, teu Servo. A ti seja a glória eternamente”.

Com o passar dos séculos, a liturgia foi se tornando cada vez mais complexa e
ritualística. Foram introduzidos no culto elementos estranhos à Escritura, como
invocações e louvores a Maria e aos santos, o entendimento da Eucaristia como um
sacrifício e a adoração dos seus elementos. Todavia, os reformadores protestantes,
apesar de sua crítica das tradições religiosas sem fundamento bíblico,
reconheceram a importância da liturgia. A tradição reformada foi particularmente
enfática nesse sentido. Embora o culto zuingliano na cidade de Zurique fosse
extremamente sóbrio (“quatro paredes lisas e um sermão”), Calvino teve uma
preocupação diferente. Ele compôs para a Igreja de Genebra belíssimos “modelos
de orações” para o culto dominical, para a celebração da Ceia do Senhor e para as
devoções domésticas. Inspirados pelo exemplo de Genebra, os reformados

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elaboraram sugestivas liturgias na França, Escócia, Inglaterra, Holanda e


Alemanha, que foram utilizadas por muitas gerações de crentes (ver Charles W.
Baird, As liturgias reformadas, Socep). Geralmente essas liturgias estavam
associadas à observância do calendário cristão e às leituras prescritas para todos
os domingos do ano eclesiástico (o lecionário).

Hoje, as ordens de culto praticadas em muitas igrejas presbiterianas são pobres e


pouco criativas. Com freqüência, pessoas não-treinadas anunciam mecanicamente
os atos do programa: “Agora vamos ler em... agora vamos cantar o hino... agora
pedimos ao irmão tal para orar”. Poucos dirigentes de cultos estão conscientes da
grande riqueza litúrgica legada pelo passado. Muitos pastores nem mesmo seguem
os “princípios de liturgia” oficialmente aceitos pela denominação ou as sugestões
do Manual do Culto. É necessário que esse tema seja objeto de estudo, reflexão e
debate, para que o culto público e a celebração dos sacramentos se tornem mais
significativos e edificantes em nossas igrejas, refletindo as convicções bíblicas e
teológicas da tradição reformada, e os bons exemplos da nossa história.

-Alderi Souza de Matos

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