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Conferência Nacional dos Bispos do Brasil

“Bendito seja Deus que nos reuniu


no amor de Cristo!”
Ano | - Nº 2

Roteiros Homiléticos para a Páscoa


Ano B — São Marcos

abril/maio 2015

Sições cu?
“Bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristo!”

12 Edição - 2015

2000 aC NADO O O CNAE DECADA NA AO CANA A O On A A AC USAS ES A ANNE Cossacos 0 44

Diretor Editorial: Capa:


Mons. Jamil Alves de Souza Edições CNBB
Coordenação: Projeto Gráfico:
Comissão Episcopal Pastoral para a Liturgia Henrique Billygran
Coordenadora de Revisão e Revisão: Diagramação:
Leticia Figueiredo Lauriana Vinha
scr esse aaa Da a CS nO SDS assa DOC O O EDU Ce NR E ORE EDS O OC Ae OOnaO o e sau a 4 44

ISSN: 2359-1935

As citações bíblicas dos textos da celebração são do Lecionário Dominical, A, B, €, Paulinas, Paulus 1994, Somente
as citações que são para reforçar o sentido do texto foram retiradas diretamente da tradução bíblica da CNBB e
assim já citadas.

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Sumário

APRESENTAÇÃO...

INTRODUÇÃO .............. eee

MISSA VESPERTINA DA
CEIA DO SENHOR
2 de abril de 2015.............ee
res rerração

SEXTA-FEIRA DA PAIXÃO
DO SENHOR
3 de abril de 2015..........eee
erre reraaera

SÁBADO SANTO .......ieesmesesesetas

VIGÍLIA PASCAL
4 de abril de 2015..........e rrenan

DOMINGO DA PÁSCOA NA
RESSURREIÇÃO DO SENHOR
S de abril de 2015.............eee
erre ererreras

2º DOMINGO DA PÁSCOA
12 de abril de 2015 ........... rr errer

3º DOMINGO DA PÁSCOA
19 de abril de 2015........ eee r rena rea error e cera area nado

4º DOMINGO DA PÁSCOA
26 de abril de 2015 ............ee
renan reeda
5º DOMINGO DA PÁSCOA
3 de maio de 2015 ....... renas

6º DOMINGO DA PÁSCOA
10 de maio de 2015......e rr errrrrrerererra
e reae a rr rated

ASCENSÃO DO SENHOR
17 de maio de 2015.......ee erre ar a rraarearacr arcano

SOLENIDADE DE PENTECOSTES
24 de maio de 2015............. rsrsrsr erre r rec re rs resn
APRESENTAÇÃO

A celebração da Morte e da Ressurreição do Senhor é o ápice do


ano litúrgico, pois “Cristo realizou a obra da redenção humana e
da perfeita glorificação de Deus principalmente pelo seu mistério
pascal, quando morrendo destruiu a nossa morte e ressuscitando
renovou a vida” (NUALC, n. 18). Portanto, a celebração pascal é o
cerne da vida da Igreja e da nossa vocação de discípulos missionários
de Jesus Cristo Ressuscitado, fonte e caminho da missão. À Páscoa
de Jesus e sua vitória sobre a morte devem continuar na páscoa da
vida de todos. Para os batizados, a Páscoa é um processo de vida
(cf. Rm 6,3-10). A Páscoa de Jesus se cumpriu e continua a se realizar
em nós e entre nós. “É a Páscoa de Cristo na Páscoa da gente”
(CNBB, doc. 43, n. 300).

A Carta Paschalis Sollemnitatis recomenda que a liturgia do


Tríduo e o Tempo Pascal seja realizada de modo a poder oferecer
ao povo cristão a riqueza dos ritos e das orações. É importante que
seja respeitada a verdade dos sinais, se favoreça a participação dos
fiéis e seja assegurada a presença de ministros, leitores e cantores
(cf. Paschalis Sollemnitatis, n. 93).

Agradecemos aos Irmãos Carlos Gustavo e Eduardo Luiz Haas


que elaboram o presente subsídio para as homilias e para as celebra-
ções do Tempo Pascal. Eles, além de buscarem inspiração na Pala-
vra de Deus, beberam nas fontes da patrística e nos documentos do
magistério da Igreja.
Celebrar a Páscoa de Jesus é celebrar a vida nova q que Ele nos
doa e q que já está presente entre nós. O mistério da Páscoa é fonte de
vida e missão. Que o presente Roteiro Homilético, acolhido com ale-
gre gratidão pascal, auxilie a todos, em especial às equipes de litur-
gia de nossas comunidades, a preparem e realizarem com esmero as
H “Bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristo!”

celebrações. A homilia, com acento pascal, reveste-se de particular


significado nas celebrações do Tríduo e dos domingos de Páscoa.
Auguramos que o presente Roteiro Homilético ajude a todos a pre-
parar e a celebrar a Divina Liturgia com fé e jeito de discípulos mis-
sionários de Jesus, o Ressuscitado.

Dom Armando Bucciol


Bispo de Livramento de Nossa Senhora (BA)
Presidente da Comissão Episcopal Pastoral para a Liturgia da
CNBB.
5 eds À ADIA
mo Cego A RATO

INTRODUÇÃO

“BENDITO SEJA DEUS QUE NOS REUNIU NO AMOR DE CRISTO!”

Bendito seja Deus que nos dá a graça de participar deste Tríduo Pascal
de 2015. “O Tríduo Pascal da Paixão e Ressurreição do Senhor começa
com a Missa Vespertina da Ceia do Senhor, possui o seu centro na
Vigília Pascal e encerra-se com as Vésperas do Domingo da Ressur-
reição” (NUALC, n. 19). A celebração da Morte e da Ressurreição
do Senhor é o ápice do ano litúrgico, pois “Cristo realizou a obra da
redenção humana e da perfeita glorificação de Deus principalmente
pelo seu mistério pascal, quando morrendo destruiu a nossa morte e
ressuscitando renovou a vida” (NUALC, n. 18).
Como dizia o Bem-aventurado Papa Paulo VI, se há uma liturgia
que deveria encontrar-nos todos juntos, atentos, solícitos e unidos para
uma participação plena, digna, piedosa e amorosa, esta é a liturgia da
grande semana. Por um motivo claro e profundo: o mistério pascal,
que encontra na Semana Santa a sua mais alta e comovida celebração,
não é simplesmente um momento do ano litúrgico; ele é a fonte de
todas as outras celebrações do próprio ano litúrgico, porque todas se
referem ao mistério da nossa redenção, isto é, ao mistério pascal.
Acreditamos que será muito oportuno retomarmos uma “cate-
quese” que o Papa Francisco proferiu no dia 27 de março de 2013,
Quarta-feira Santa. É um convite para entrarmos no verdadeiro
e profundo espírito da Semana Santa. Eis os principais destaques
desta catequese:
“O que pode querer dizer viver a Semana Santa para nós? O que
significa seguir Jesus em seu caminho no Calvário para a Cruz e a
Ressurreição? Em sua missão terrena, Jesus percorreu os caminhos
da Terra Santa; chamou 12 pessoas simples para que permanecessem
com Ele, compartilhando o seu caminho e para que continuassem
a sua missão, escolheu-as entre o povo cheio de fé nas promessas
“Bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristol”

de Deus. Falou a todos, sem distinção, aos grandes e aos humildes,


ao jovem rico e à pobre viúva, aos poderosos e aos indefesos; levou
a misericórdia e o perdão de Deus; curou, consolou, compreendeu;
doou esperança; levou a todos a presença de Deus que se interessa
por cada homem e cada mulher, como faz um bom pai e uma boa
mãe para cada um de seus filhos.
Deus não esperou que fôssemos a Ele, mas foi Ele que se moveu
para nós, sem cálculos, sem medidas. Deus é assim: Ele dá sempre o
primeiro passo, Ele se move para nós. Jesus viveu a realidade cotidiana
do povo mais comum: comoveu-se diante da multidão que parecia um
rebanho sem pastor; chorou diante do sofrimento de Marta e Maria
pela morte do irmão Lázaro; chamou um cobrador de impostos como
seu discípulo; sofreu também a traição de um amigo. Nele Deus nos
doou a certeza de que está conosco, em meio a nós. Às raposas — disse
Ele, Jesus — as raposas têm suas tocas e as aves do céu os seus ninhos,
mas o Filho do homem não tem onde repousar a cabeça” (Mt 8,20).
Jesus não tem casa, porque a sua casa é o povo, somos nós, a sua missão
é abrir a todos as portas de Deus, ser a presença do amor de Deus.
Na Semana Santa nós vivemos o ápice deste momento, deste plano
de amor que percorre toda a história da relação entre Deus e a huma-
nidade. Na Última Ceia, com os seus amigos, compartilha o pão e dis-
tribui o cálice “por nós. O Filho de Deus se oferece a nós, entrega em
nossas mãos o seu Corpo e o seu Sangue para estar sempre conosco,
para morar em meio a nós. E no Monte das Oliveiras, como no processo
diante de Pilatos, não oferece resistência, doa-se; é o Servo sofredor pro-
fetizado por Isaías que se despojou até a morte (cf. Is 53,12).
Jesus não vive este amor que conduz ao sacrifício de modo passivo
ou como um destino fatal; certamente não esconde a sua profunda
inquietação humana diante da morte violenta, mas se confia com plena
confiança ao Pai. Jesus entregou-se voluntariamente à morte para cor-
responder ao amor de Deus Pai, em perfeita união com a sua vontade,
para demonstrar o seu amor por nós. Na cruz Jesus 'me amou e entre-
gou a si mesmo' (Gl 2,20). Cada um de nós pode dizer: amou-me e
entregou a si mesmo por mim. Cada um pode dizer este 'por mim.
Roteiros homiléticos para a Páscoa E

O que significa tudo isto para nós? Significa que este é também
o meu, o teu, o nosso caminho. Viver a Semana Santa seguindo Jesus
não somente com a emoção do coração; viver a Semana Santa seguindo
Jesus quer dizer aprender a sair de nós mesmos para ir ao encontro
dos outros, para ir para às periferias da existência, mover-nos primeiro
para os nossos irmãos e as nossas irmãs, sobretudo aqueles mais dis-
tantes, aqueles que são esquecidos, aqueles que têm mais necessidade
de compreensão, de consolação, de ajuda. Há tanta necessidade de
levar a presença viva de Jesus misericordioso e rico de amor!
Viver a Semana Santa é entrar sempre mais na lógica de Deus, na
lógica da Cruz, que não é antes de tudo aquela da dor e da morte, mas
aquela do amor e da doação de si que traz vida. É entrar na lógica do
Evangelho. Seguir, acompanhar Cristo, permanecer com Ele exige um
'sair” sair. Sair de si mesmo, de um modo cansado e rotineiro de viver a fé,
da tentação de fechar-se nos próprios padrões que terminam por fechar o
horizonte da ação criativa de Deus. Deus saiu de si mesmo para vir em
meio a nós, colocou a sua tenda entre nós para trazer-nos a sua misericór-
dia que salva e doa esperança. Também nós, se desejamos segui-Lo e per-
manecer com Ele, não devemos nos contentar em permanecer no recinto
das 99 ovelhas, devemos 'sair”, procurar com Ele a ovelha perdida, aquela
mais distante. Lembrem-se bem: sair de nós mesmo, como Jesus, como
Deus saiu de si mesmo em Jesus e Jesus saiu de si mesmo por todos nós.
A Semana Santa é um tempo de graça que o Senhor nos doa para
abrir as portas do nosso coração, da nossa vida, das nossas paróquias
— que pena tantas paróquias fechadas! — dos movimentos, das associa-
ções, e “sair de encontro aos outros, fazer-nos próximos para levar a luz
e a alegria da nossa fé. Sair sempre! E isto com amor e com a ternura
de Deus, no respeito e na paciência, sabendo que nós colocamos as
nossas mãos, os nossos pés, o nosso coração, mas em seguida é Deus
que os orienta e torna fecunda cada ação nossa.
Desejo a todos viver bem estes dias seguindo o Senhor com coragem,
levando em nós mesmos um raio do seu amor a quantos encontrarmos”!

1 Catequese do Papa Francisco, Semana Santa, 27/03/2013.


MISSA VESPERTINA DA
CEIA DO SENHOR

2 de abril de 2015
“O AMOR É COMO GRÃO, MORRE E NASCE TRIGO. VIVE E MORRE PÃO!”

Leituras: Ex 12,1-8.11-14; SI 115(116);


ICor 11,23-26; Jo 13,1-15

Situando-nos
Iniciamos hoje o Tríduo Pascal da Paixão e Ressurreição do Senhor.
E o ápice do ano litúrgico, porque celebra a Morte e a Ressurreição
do Senhor.
Na narração da Última Ceia, realizada durante a Oração Eucarís-
tica, hoje o Missal Romano pede que o presidente reze (especialmente
quando usa a Oração Eucarística 1): “Na noite em que ia ser entregue,
isto é, hoje, ele tomou o pão...”. “A liturgia de Quinta-feira Santa insere
no texto da oração a palavra “hoje”, sublinhando deste modo a digni-
dade particular deste dia. Foi “hoje” que Ele o fez: deu-Se a Si mesmo
para sempre no sacramento do seu Corpo e do seu Sangue. Este “hoje
é antes de mais nada o memorial da Páscoa de então.
Mas é mais do que isso. O nosso hoje entra em contato com
o seu hoje. Ele faz isto agora. Com a palavra “hoje”, a liturgia da
Igreja quer induzir-nos a olhar com grande atenção interior para o
mistério deste dia, para as palavras com que o mesmo se exprime.
Procuremos, pois, escutar de maneira nova a narração da institui-
ção tal como a Igreja, com base na Escritura e contemplando o
próprio Senhor, a formulou”.?

2 Bento XVI, homilia na Quinta-feira Santa, 2009.


Roteiros homiléticos para a Páscoa
RB

Recordando a Palavra
A Palavra que hoje nos é proclamada nos conduz à plena compreensão
do Mistério Pascal que estamos celebrando. São Paulo, na segunda
leitura, nos transmitiu aquilo que ele próprio recebeu do Senhor, isto
é, a instituição da Ceia como Nova Aliança e como memorial da sua
morte. João, no Evangelho, nos transporta ao mesmo acontecimento
da vida de Cristo e também nos fala, de modo muito peculiar, da
Eucaristia. São Paulo descreve o sinal - o Pão e o Vinho partilhados.
João nos descreve o significado: o amor até o fim de Cristo e o serviço
aos irmãos. Às palavras de Jesus que fecham o trecho evangélico:
“como eu fiz fazei vós também, são outro modo de dizer: fazei isto em
memória de mim!”
“Fazei isto em memória de mim”, pediu Jesus. Cristo instituiu
um memorial que atravessa a história, desde a noite do êxodo (pri-
meira leitura), ponto alto de todas as intervenções de Deus (AT),
até a suprema e definitiva intervenção acontecida com a morte e a
Ressurreição de Cristo (NT).

Atualizando a Palavra
O pão e o vinho são elementos proféticos nas Escrituras. Aparecem
já no livro do Gênesis, quando o sacerdote Melquisedec celebra uma
ceia histórica (cf. Gn 14,18). Mas além do sinal, existe uma ação:
“partir e distribuir”. Depois de o ter abençoado, o Senhor parte o pão e
distribui-o aos discípulos. Partir o pão é o gesto do pai de família que
se preocupa com os seus e lhes dá aquilo de que têm necessidade para a
vida. Mas é também o gesto da hospitalidade com que o estrangeiro, o
hóspede é acolhido na família sendo-lhe concedido tomar parte na sua
vida. Partir-partilhar é unir. Através da partilha, cria-se comunhão.
No pão repartido, o Senhor distribui-Se a Si próprio. O gesto de partir
alude misteriosamente também à sua morte, ao amor até a morte.
Ele distribui-Se a Si mesmo, verdadeiro “pão para a vida do mundo”

3 Cf. Cantalamessa, R.£o Verbo se fez carne. São Paulo: Editora Ave Maria, 2013, p. 803.
“Bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristo!”

(cf. Jo 6,51). O alimento de que o homem, no mais fundo de si mesmo,


tem necessidade é a comunhão com o próprio Deus. Dando graças
e abençoando, Jesus transforma o pão: já não dá pão terreno, mas a
comunhão consigo mesmo. Esta transformação, porém, quer ser o
início da transformação do mundo, para que se torne um mundo de
ressurreição, um mundo de Deus. Sim, trata-se de transformação: do
homem novo e do mundo novo que têm início no pão consagrado,
transformado e transubstanciado.
“Dissemos que partir o pão é um gesto de comunhão, é unir atra-
vés do partilhar. Deste modo, no próprio gesto já se alude à natureza
íntima da Eucaristia: esta é “4gape”, é amor que se tornou corpóreo. Na
palavra “ágape”, compenetram-se os significados de Eucaristia e amor.
No gesto de Jesus que parte o pão, o amor que se participa alcançou a
sua radicalidade extrema: Jesus deixa-Se fazer em pedaços como Pão
vivo. No pão distribuído, reconhecemos o mistério do grão de trigo
que morre e assim dá fruto. Reconhecemos a nova multiplicação dos
pães, que deriva da morte do grão de trigo e continuará até o fim do
mundo. Ao mesmo tempo vemos que a Eucaristia não pode ser ape-
nas uma ação litúrgica; só está completa, quando o “ágape litúrgico” o.

se torna amor no dia a dia. No culto cristão, as duas coisas tornam-se


uma só: ser cumulados de graça pelo Senhor no ato cultual e o culto do
amor para com o próximo. Nesta hora, peçamos ao Senhor a graça de
aprender a viver cada vez melhor o mistério da Eucaristia de tal modo
que assim tenha início a transformação do mundo”.
O que se pede para cada um de nós, hoje, para entrar neste mis-
tério da Páscoa, cuja celebração anual estamos iniciando? Pede-se o
mesmo que se exigiu para os hebreus e para Jesus Cristo: fazer uma
“passagem”. Uma passagem nova e diferente. São Paulo a define como
uma passagem do homem velho ao homem novo, do fermento de malí-
cia para os ázimos de pureza (cf. 1Cor 5,8). Portanto, não a passagem
de um lugar para outro, mas de um modo de viver para outro, do viver
para o mundo e segundo o mundo, para viver para o Pai.

4 Papa Bento XVI, Quinta-feira Santa, 2009.


Roteiros homiléticos para a Páscoa EB

Sim, é preciso “passar”. Ainda somos escravos, como os hebreus


do Egito. Somos escravos das coisas, das comodidades, dos precon-
ceitos, da moda, do consumismo, da intolerância, enfim, presos do
pecado. Deus, a Páscoa, nos chama a sair, a nos rebelar contra tudo
isto, a nos despertar do sono terrível em que estamos imersos, a nos
levantar e a nos colocar a caminho. Por isto o cordeiro pascal se devia
comer assim: “tereis cingidos os vossos rins, vossas sandálias nos pés e
vosso cajado na mão” (Ex 12,11).
Abrir-nos a Deus, encaminhar-nos a ele, talvez seja este o sentido
mais profundo da mensagem pascal. Que os ritos não sejam apenas
ritos, mas tornem-se realidade viva: “E a Páscoa do Senhor!”

Ligando a Palavra com a ação eucarística


Na Eucaristia, nós oferecemos um pão que recebemos da bondade de
Deus, mas que é também fruto de nosso trabalho, ou seja, de nosso
esforço de conversão, de fidelidade à Palavra de Deus e de sofrimento
que constitui a páscoa da humanidade, a sua lenta e extenuante
passagem deste mundo ao Pai (cf. Jo 13,1).
“No pão oferecido, há lugar também para o nosso 'eu. Porém,
é preciso ter a coragem de dizer, junto com Cristo, aos irmãos, que
vivem e trabalham conosco: “Tomai, comei, este é o meu corpo ofere-
cido por vós”. Tomai, pois, o meu tempo, a minha amizade, a minha
atenção, a minha competência, a minha alegria: coloco tudo à vossa
disposição; quero empregá-los não somente para mim, mas também
para vós. “Fazei isto em memória de mim, significa também, “como eu
vos fiz, também vós o façais”. “Nisto temos conhecido o amor: Ele deu
sua vida por nós. Também nós outros devemos dar a nossa vida pelos
nossos irmãos” (cf. 1Jo 3,16)”.
“A Eucaristia nos faz Igreja, comunidade de amor”, cantamos
neste dia. À Igreja é como “espiga crescida” daquele grão caído e morto

5 Cf. Cantalamessa, R. Op. cit., p. 810-811.


6 Cantalamessa, R. Op. cit., p. 805.
"Bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristo!”

por terra e que trouxe muito fruto. E esta a Páscoa da Igreja, com a
qual nos preparamos para celebrar a Páscoa de Cristo e nossa também.
“O amor é como grão, morre e nasce trigo, vive e morre pão”, canta
Gilberto Gil. Apesar de fazê-lo de maneira involuntária, o autor nos
explica em profundidade o mistério que celebramos na missa. Deus é
amor, é o pão que nos alimenta, refaz nossas energias. Tornou-se grão,
um pequenino ser encarnado na natureza humana, aceitou nossas limi-
tações, até mesmo a morte. Renasceu do ventre da terra, como o trigo,
dourado e glorificado, acenando para a luz infinita da seara pronta para
a colheita, o novo povo de Deus remido em sua graça. Era preciso nascer
de novo. É vivo se fez pão, para todos que amou e ama até o fim.

Sugestões para a celebração


1. O tabernáculo deve estar totalmente vazio. Para a comunhão,
hoje e amanhã, consagre-se na própria missa a quantidade de pão
suficiente.
2. O lugar da celebração deve ter o tom de uma refeição festiva:
flores, velas, cor branca nas toalhas e vestes, pão ázimo e vinho.
3. Poder-se-ia usar a Menorá (candelabro com as 7 velas), perto do
altar e do ambão.
4. Preparar bem o gesto do lava-pés, convidando pessoas represen-
tativas de toda a comunidade e escolhendo cantos apropriados.
É um gesto profético que anuncia a morte de Jesus como Servo
Sofredor. É sinal de sua doação total.
5. Durante a procissão das ofertas, enquanto o povo canta o hino
“Onde há caridade e amor”, podem ser apresentados os dons para
os pobres, especialmente os que foram recolhidos no tempo
quaresmal como frutos de penitência.
6. Se em todas as missas deveríamos fazer a comunhão sob as duas
espécies, especialmente, hoje, Quinta-feira Santa, missa da Ceia
do Senhor, não deveríamos medir esforços para que toda a assem-
bleia possa comungar do Corpo e do Sangue do Senhor.
Roteiros homiléticos para a Páscoa TM

7. Deve-se reservar uma capela, nesta noite, para a conservação da


Eucaristia que deve ser ordenada com sobriedade para facilitar
a oração e a meditação. Omitem-se os ritos finais: em seu lugar,
faz-se a trasladação do Santíssimo Sacramento.
8. Os fiéis são convidados a adorarem o Santíssimo Sacramento
durante algum tempo durante a noite. Em sua forma solene, ela é
concluída antes da meia-noite. É bom recordar que a vigília mais
importante é a do Sábado Santo, para a qual devem convergir
todas as atenções.
9. Não se faz a exposição com o ostensório. Quando a procissão
chegar ao local da reposição, o sacerdote coloca o cibório no taber-
náculo. Retiram-se as toalhas do altar e, se possível, as cruzes da
igreja. Convém cobrir as imagens dos santos, com o objetivo de
nos concentrarmos única e exclusivamente nas celebrações deste
Tríduo Santo (cf. Missal Romano p. 253).
10. Durante este tempo de Vigília Eucarística pode-se ler o Evan-
gelho de João, capítulos 13 a 17. Após a meia-noite, a adoração
deve ser feita sem solenidade, já que começou o dia da Paixão
do Senhor.

A noite escura do Monte das Oliveiras

Papa Bento XVI, homilia da Quinta- feira Santa de 2012


(Sugestão para a meditação desta noite de Vigília)

“A Quinta-feira Santa não é apenas o dia da instituição da Santíssima


Eucaristia, cujo esplendor se estende sem dúvida sobre tudo o mais,
tudo atraindo, por assim dizer, para dentro dela. Faz parte da Quinta-
-feira Santa também a noite escura do Monte das Oliveiras, nela Se
embrenhando Jesus com os seus discípulos; faz parte dela a solidão e o
abandono vivido por Jesus, que, rezando, vai ao encontro da escuridão
da morte; faz parte dela a traição de Judas e a prisão de Jesus, bem
como a negação de Pedro; e ainda a acusação diante do Sinédrio e a
entrega aos pagãos, a Pilatos. Nesta hora, procuremos compreender
18 “Bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristo!”

mais profundamente alguma coisa destes acontecimentos, porque


neles se realiza o mistério da nossa Redenção.
Jesus embrenha-se na noite. À noite significa falta de comunica-
ção, uma situação em que não nos vemos um ao outro. É um símbolo
da não compreensão, do obscurecimento da verdade. É o espaço onde
o mal, que em presença da luz tem de se esconder, pode desenvolver-se.
O próprio Jesus — que é a luz e a verdade, a comunicação, a pureza e a
bondade — entra na noite. Esta, em última análise, é símbolo da morte,
da perda definitiva de comunhão e de vida. Jesus entra na noite para a
superar, inaugurando o novo dia de Deus na história da humanidade.
Pelo caminho, Jesus cantou com os seus apóstolos os Salmos da
libertação e redenção de Israel, que evocavam a primeira Páscoa no
Egito, a noite da libertação. Chegado ao destino Ele, como faz habitu-
almente, vai rezar sozinho e, como Filho, falar com o Pai. Mas, diver-
samente do que é costume, quer ter perto de Si três discípulos: Pedro,
Tiago e João; são os mesmos três que viveram a experiência da sua
Transfiguração — viram transparecer, luminosa, a glória de Deus atra-
vés da sua figura humana —, tendo-O visto no centro da Lei e dos Pro-
fetas, entre Moisés e Elias. Ouviram-No falar, com ambos, acerca do
seu 'êxodo' em Jerusalém. O êxodo de Jesus em Jerusalém: que palavra
misteriosa! No êxodo de Israel do Egito, dera-se o acontecimento da
fuga e da libertação do povo de Deus. Que aspecto deveria ter o êxodo
de Jesus, para que nele se cumprisse, de modo definitivo, o sentido
daquele drama histórico? Agora os discípulos tornavam-se testemu-
nhas do primeiro trecho de tal êxodo — a humilhação extrema —, mas
que era o passo essencial da saída para a liberdade e a vida nova, que
o êxodo tem em vista. Os discípulos, cuja proximidade Jesus preten-
deu naquela hora de ânsia extrema como elemento de apoio humano,
depressa se adormentaram. Todavia ainda ouviram alguns fragmentos
das palavras ditas em oração por Jesus e observaram o seu comporta-
mento. Estas duas coisas gravam-se profundamente no espírito deles,
que depois as transmitiram aos cristãos para sempre. Jesus chama a
Deus 'Abbá”, isto significa — como eles adiantam — “Par”. Não é, porém,
a forma usual para dizer 'pai”, mas uma palavra própria da linguagem
Roteiros homiléticos para a Páscoa
EB

das crianças, ou seja, uma palavra meiga que ninguém ousaria aplicar
a Deus. É a linguagem d'Aquele que é verdadeiramente criança”, Filho
do Pai, d'Aquele que vive em comunhão com Deus, na unidade mais
profunda com Ele.
Se nos perguntássemos qual era o elemento mais característico
da figura de Jesus nos Evangelhos, temos de dizer: a sua relação com
Deus. Ele está sempre em comunhão com Deus; estar com o Pai é o
núcleo da sua personalidade. Através de Cristo, conhecemos verdadei-
ramente Deus.
Antes de refletir sobre o conteúdo da súplica de Jesus, devemos
ainda fixar a nossa atenção sobre o que os evangelistas nos referem
a propósito do comportamento d'Ele durante a sua oração. Mateus e
Marcos dizem-nos que 'caiu com a face por terra” (Mt 26,39; cf. Mc
14,35), assumindo por conseguinte a posição de submissão total, como
se manteve na liturgia romana de Sexta-feira Santa. Lucas, por sua vez,
diz-nos que Jesus rezava de joelhos. Nos Atos dos Apóstolos, fala da
oração de joelhos feita pelos santos: Estêvão durante a sua lapidação,
Pedro no contexto da ressurreição de um morto, Paulo a caminho do
martírio. Assim Lucas redigiu uma pequena história da oração feita de
joelhos na Igreja nascente. Ajoelhando-se, os cristãos entram na ora-
ção de Jesus no Monte das Oliveiras. Ameaçados pelo poder do mal,
eles ajoelham: permanecem de pé frente ao mundo, mas, enquanto
filhos, estão de joelhos diante do Pai. Diante da glória de Deus, nós,
cristãos, ajoelhamo-nos reconhecendo a sua divindade; mas, com este
gesto, exprimimos também a nossa confiança de que Ele vence.
Jesus luta com o Pai: melhor, luta consigo mesmo; e luta por nós.
Sente angústia frente ao poder da morte. Este sentimento é, antes de
mais nada, a turvação que prova o homem, e mesmo toda a criatura
viva, em presença da morte. Mas, em Jesus, trata-se de algo mais. Ele
estende o olhar pelas noites do mal; e vê a maré torpe de toda a mentira
e infâmia que vem ao seu encontro naquele cálice que deve beber. É
a turvação sentida pelo totalmente Puro e Santo frente à torrente do
mal que inunda este mundo e que se lança sobre Ele. Vê-me também
a mim, e reza por mim. Ássim este momento da angústia mortal de
= “Bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristo!”

Jesus é um elemento essencial no processo da Redenção; de fato, a


Carta aos Hebreus qualificou a luta de Jesus no Monte das Oliveiras
como um acontecimento sacerdotal. Nesta oração de Jesus, permeada
de angústia mortal, o Senhor cumpre a função do sacerdotes: toma
sobre Si o pecado da humanidade, toma a todos nós e leva-nos para
junto do Pai.
Por último, devemos debruçar-nos sobre o conteúdo da oração
de Jesus no Monte das Oliveiras. Jesus diz: “Pai, tudo Te é possível;
afasta de Mim este cálice! Mas não se faça o que Eu quero, e sim
o que Tu queres” (Mc 14,36). A vontade natural do Homem Jesus
recua, assustada, perante uma realidade tão monstruosa; pede que
isso Lhe seja poupado. Todavia, enquanto Filho, depõe esta vontade
humana na vontade do Pai: não Eu, mas Tu. E assim Ele transfor-
mou a atitude de Adão, o pecado primordial do homem, curando
deste modo o homem. À atitude de Adão fora: “eu mesmo quero ser
Deus”. Esta soberba é a verdadeira essência do pecado. Pensamos que
só poderemos ser livres e verdadeiramente nós mesmos, se seguirmos
exclusivamente a nossa vontade. Vemos Deus como contrário à nossa
liberdade. Devemos libertar-nos d'Ele — isto é todo o nosso pensar
— só então seremos livres. Tal é a rebelião fundamental, que permeia
a história, e a mentira de fundo que desnatura a nossa vida. Quando
o homem se põe contra Deus, põe-se contra a sua própria verdade e,
por conseguinte, não fica livre mas alienado de si mesmo. Só somos
livres, se permanecermos na nossa verdade, se estivermos unidos a
Deus. Então tornamo-nos verdadeiramente “como Deus”, mas não
opondo-nos a Deus, desfazendo-nos d'Ele ou negando-O. Na luta
da oração no Monte das Oliveiras, Jesus desfez a falsa contradição
entre obediência e liberdade, e abriu o caminho para a liberdade.
Peçamos ao Senhor que nos introduza neste 'sim' à vontade de Deus,
tornando-nos deste modo verdadeiramente livres”.
SEXTA-FEIRA DA PAIXÃO
DO SENHOR

3 de abril de 2015
“ATÉ A MORTE, E MORTE DE CRUZ!"

Leituras: Is 52,13-53,12; Sl 30(31);


Hb 4,14-16; 5,7-9; Jo 18,1-19,42

Situando-nos
“Neste dia, em que “Cristo, nosso cordeiro pascal, foi imolado', a Igreja,
com a meditação da paixão do seu Senhor e Esposo e adorando a cruz,
comemora o seu nascimento do lado de Cristo que repousa na cruz, e
intercede pela salvação do mundo todo.
A Igreja, seguindo uma antiquíssima tradição, neste dia não
celebra a Eucaristia; a sagrada Comunhão é distribuída aos fiéis só
durante a celebração da paixão do Senhor; aos doentes, impossibilita-
dos de participar desta celebração, pode-se levar a Comunhão a qual-
quer hora do dia”.
Não estamos reunidos para “recordar” um fato do passado que
aconteceu 20 séculos atrás, mas sim, um mistério. Na celebração “como
aniversário”, explica Santo Agostinho, só é preciso “indicar com uma
solenidade religiosa o dia exato do ano no qual se repete a recordação
do próprio acontecimento”; na celebração como mistério (“em sacra-
mento”), “não só se comemora um evento, mas é realizado de maneira
que se compreenda o seu significado e seja acolhido santamente”.
Isto muda tudo. Não se trata só de assistir a uma representa-
Pp
ção, mas de “receber” o seu significado, de passar de espectadores
para atores. Por conseguinte, depende de nós escolher qual parte

7 Paschalis Sollemnitatis, Carta Circular da Congregação para o Culto Divino, 1988, n. 58-59.
“Bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristo!”

queremos representar no drama, quem desejamos ser: Pedro, Judas,


Pilatos, a multidão, o Cireneu, João ou Maria. Ninguém pode per-
manecer neutro; não tomar posição é tomar uma muito exata: a de
Pilatos que lava as mãos (cf. Mt 27,24) ou a da multidão que de longe
“observava” (cf. Lc 23, 35).
Se ao voltar para casa hoje, alguém nos perguntar: “De onde
vens? Onde estiveste?”, respondamos, pelo menos no nosso coração:
«
No Calvário!”.
EA Pp

Mas tudo isto não acontece automaticamente, só porque partici-


pamos nesta liturgia. Trata-se — dizia Santo Agostinho — de “acolher”
o significado do mistério. Isto acontece com a fé. Não há música onde
não há ouvidos que a ouçam, por mais alto que a orquestra toque; não
há graça, onde não há uma fé que acolha.
Numa homilia pascal do século IV, o bispo pronunciava estas
Pp alavras existenciais: “Para cada homem, (O o P princípio da vida é q que
Cristo foi imolado por ele. Mas Cristo imola-se por ele no momento
em que reconhece a graça e se torna consciente da vida que lhe foi
providenciada por aquela imolação”.
Isto aconteceu conosco, sacramentalmente, no Batismo, mas deve
acontecer conscientemente sempre de novo na vida. Antes de morrer,
devemos ter a coragem de praticar um ato de audácia: apropriarmo-nos
da vitória de Cristo.
Por isso, a Sexta-Feira Santa não é considerada um dia de luto ou
de pranto, mas dia de amorosa contemplação do sacrifício de Jesus,
fonte da nossa salvação. Hoje, a Igreja não faz um funeral, mas celebra
a morte vitoriosa do Senhor.

Recordando a Palavra
O publicano da parábola subiu ao templo para rezar; disse simples-
mente, mas do fundo do coração: “Meu Deus, tem compaixão de

8 Cf. Homilia de Raniero Cantalamessa, Sexta-feira Santa, 2009 e 2012.


Roteiros homiléticos para a Páscoa a

mim, que sou pecador?”, e “(...) voltou para casa justificado” (Lc 18,14),
reconciliado, feito novo, inocente. O mesmo, se tivermos a sua fé e
o seu arrependimento, poder-se-á dizer de nós, voltando para casa
depois desta liturgia. Por isso, entre os personagens da paixão com os
quais podemos nos identificar e, quem sabe, aquele que mais espera
que sigam o seu exemplo: o bom ladrão.
O bom ladrão faz uma completa confissão de pecador, diz ao seu
companheiro que insulta Jesus: “Nem sequer temes a Deus, tu que
sofres a mesma pena? Para nós, é justo sofrermos, pois estamos rece-
bendo o que merecemos; mas ele não fez nada de mal” (Lc 23,40).
O bom ladrão demonstra-se um excelente teólogo. De fato, só Deus
sofre absolutamente como inocente; outro ser que sofre deve dizer:
“sofro justamente”, porque embora não seja responsável pela ação que
me é atribuída, nunca sou totalmente sem culpa. Só o sofrimento
das crianças inocentes se assemelha com o de Deus e por isso é tão
misterioso e sagrado.
Quantos delitos graves permaneceram nos últimos tempos sem
um culpado, quantos casos sem solução! Pensemos nos inúmeros casos
de corrupção e de desvios do dinheiro público em nosso país. O bom
ladrão lança um apelo aos responsáveis: fazei como eu, denunciai-
-vos, confessai a vossa culpa: experimentareis também vós a alegria
que senti quando ouvi a palavra de Jesus: “Hoje estarás comigo no
paraíso!” (Lc 23,43). Quantos réus confessos podem confirmar que
p

foi assim também para eles: passaram do inferno para o paraíso no


dia em que tiveram a coragem de se arrepender e confessar a própria
culpa. O paraíso prometido é a paz da consciência, a possibilidade
de se olhar no espelho ou para os próprios filhos sem sentir desprezo
por si mesmo.

Aos Coríntios, São Paulo escreve em forma de manifesto: “Os


Judeus pedem sinais, como os Gregos buscam a sabedoria. Nós, porém,
proclamamos Cristo crucificado, escândalo para os judeus, loucura
para os pagãos. Mas para os que são chamados, tanto judeus como
gregos, Cristo é poder de Deus e sabedoria de Deus” (1Cor 1,22-24).
À morte de Cristo tem um alcance universal: “O amor de Cristo nos
Ao “Bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristo!”

impele considerando que um só morreu por todos, logo todo, todos e,


portanto morreram” (2Cor 5,14). Sua morte deu um sentido novo à
morte de cada homem e mulher.
Aos olhos de Paulo a cruz assume uma dimensão cósmica. Sobre
ela Cristo derrubou o muro de separação, reconciliou os homens com
Deus e entre si, destruindo a inimizade (cf. Ef 2,14-16). A partir daí a
antiga tradição desenvolverá o tema da cruz como árvore cósmica que,
com o braço vertical, une céu e terra e, com o braço horizontal, recon-
cilia entre si os diversos povos do mundo. Evento cósmico e ao mesmo
tempo personalíssimo: “me amou e se entregou por mim” (Gl 2,20).
Cada homem, escreve o Apóstolo, é um “para aquele por quem Cristo
morreu” (Rm 14,15).
De tudo isso nasce o sentimento da cruz, não mais como castigo,
rejeitando o argumento de aflição, mas glória e louvor do cristão, isto
é, como uma jubilosa segurança, acompanhada pela comovida grati-
dão, à qual o homem se alça na fé: “Quanto a mim, que eu me glorie
somente da cruz do nosso Senhor, Jesus Cristo” (Gl 6,14).

Atualizando a Palavra
Paulo plantou a cruz no centro da Igreja como mastro principal
no centro do navio; tornou-a fundamento e centro de gravidade de
tudo. Fixou para sempre o quadro do anuncio cristão. Os evange-
lhos, escritos depois dele, seguiram o esquema, fazendo do relato
da paixão e morte de Cristo a base sobre a qual tudo está orientado.
Fica-se atônito frente à empresa levada adiante pelo Apóstolo.
Para nós hoje é relativamente fácil ver as coisas nesta luz, depois que a
cruz de Cristo, como dizia Santo Agostinho, “brilhou na terra e brilha
agora sobre a coroa do rei” (S. Agostino, Enarr. in Psalmos, 54, 12).
Quando Paulo escrevia, ela era ainda sinônimo da maior ignomínia,
algo que não se devia nem nominar entre pessoas educadas.
Cristo deu um conteúdo radicalmente novo à ideia de sacrifício.
Nisso não é mais o homem a exercitar uma influência sobre Deus
Roteiros homiléticos para a Páscoa Ra

para que este se aplaque. Bem ao contrário, é Deus a agir a fim de


que o homem desista da própria inimizade contra ele e contra o pró-
ximo. À salvação não inicia com a busca da reconciliação por parte
do homem, mas sim com a busca de Deus: “Deixai-vos reconciliar
com Ele” (cf. 2Cor 5,11-21).
O fato é que Paulo leva a sério o pecado, não o banaliza. O pecado
é, para ele, a causa principal da infelicidade do homem, isto é, a rejeição
de Deus! Isso prende a criatura humana na “mentira” e na “injustiça”
(cf. Rm 1,18 ss; 3,23), condena o próprio cosmo material à “vaidade”
e à “corrupção” (cf. Rm 8,19 ss.) e é a causa última também dos males
sociais que afligem a humanidade.
Fazem-se análises sem fim da crise econômica em ação no mundo e
de suas causas, mas quem ousa meter o machado na raiz e falar do pecado?
O Apóstolo define a avareza insaciável uma “idolatria” (cf. Col 3,5) e
adiciona na desenfreada ganância de dinheiro “a raiz de todos os males”
(cf. 1 Im 6,10). Podemos dizer que está errado? Por que tantas famílias
perderam tudo, massas de operários que permanecem sem trabalho, se
não pela sede insaciável de lucro por parte de alguns? À elite financeira
e econômica mundial se tornou uma locomotiva louca que avançava em
curso desenfreado, sem pensar no restante do trem que ficou parado à
distância sobre os trilhos.
Com sua morte, Cristo não somente venceu o pecado, mas tam-
bém deu um sentido novo ao sofrimento, também aquele que não
depende do pecado de ninguém. Fez-lhe instrumento de salvação, um
caminho à ressurreição e à vida. “Entregue por causa de nossos peca-
dos, ressuscitado para nossa justificação” (Rm 4,25): os dois eventos
são inseparáveis no pensamento de Paulo e da Igreja.
No cálculo humano, o dia inicia com a manhã e termina com a
noite; para a Bíblia começa com a noite e termina com o dia: “E foi
tarde e foi manhã: primeiro dia” (cf. Gn 1,5), recita o relato da cria-
ção. Não é sem significado que Jesus morreu à noite e ressuscita pela
manhã. Sem Deus, a vida é um dia que termina na noite; com Deus é
uma noite que termina no dia, e um dia sem ocaso.
26 8 “Bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristo!”

Cristo não veio, portanto, para aumentar o sofrimento humano ou


a pregar a resignação dessa; veio para dar-lhe um sentido e anunciar
o fim e a superação. O sofrimento se torna um mistério para todos,
especialmente o sofrimento dos inocentes, mas sem a fé em Deus ele
se torna imensamente mais absurdo. Se lhes tiram a última esperança
de resgate. O ateísmo é um luxo que pode ser concedido só aos privi-
legiados pela vida, aqueles que possuem tudo.
Deus é capaz de fazer de seus negadores mais obstinados os após-
tolos mais apaixonados. Paulo é a demonstração disso. Que havia
feito Saulo de Tarso para merecer aquele encontro extraordinário com
Cristo? Em que havia acreditado, esperado, sofrido? É assim que ele
explica seu chamado: “Pois eu sou o menor dos apóstolos, nem mereço
o nome de apóstolo, pois eu persegui a Igreja de Deus. É pela graça de
Deus que sou o que sou. É a graça que ele reservou para mim não foi
estéril; a prova é que tenho trabalhado mais que todos eles, não pro-
priamente eu, mas a graça de Deus comigo” (1Cor 15,9-10).
À cruz de Cristo é motivo de esperança para todos, também para
quem não crê. Antes do rito da adoração da cruz, faremos a Oração
Universal. É uma antiquíssima oração que exprime verdadeiramente
a abertura universal da comunidade, consciente de que a salvação de
Cristo é oferecida para todas as pessoas.

Ligando a Palavra com a ação eucarística


À Igreja inicia a celebração da Paixão do Senhor com o gesto de os
ministros prostrarem-se e todos rezarem em silêncio. É um gesto que
exprime a amorosa contemplação da entrega sem limites de Jesus,
fonte de nossa salvação. Hoje, não celebramos um funeral, mas a
morte vitoriosa do Senhor. Olhando para a cruz, cantamos: “Vitória!
Tu reinarás! Ó Cruz! Tu nos salvarás!”.
O elemento central e universal da liturgia da Sexta-feira Santa é
a proclamação da Palavra de Deus, em que se dedica particular aten-
ção à narrativa da Paixão de Jesus Cristo, segundo João. Da proclama-
ção da paixão de Jesus, brota a oração de súplica a Deus para que, em
sua misericórdia, lembre-se e santifique a Igreja, o Papa, os Bispos, os
Roteiros homiléticos para a Páscoa “BH

Catecúmenos, os judeus, todos os que creem em Jesus Cristo, os que não


acreditam em Deus, os governantes, todos os que sofrem provações.
À atenção da Igreja fixa-se no Calvário. Na solene adoração da
santa cruz, trazida em procissão e apresentada à assembleia dos cris-
tãos, não se adora a cruz em si mesma, mas Aquele que, do lenho, doou
sua vida para nossa salvação. “Eis o lenho da cruz, do qual pendeu
a salvação do mundo. Vinde, adoremos!”. Assim, adoramos, Senhor,
vosso madeiro; vossa Ressurreição nós celebramos. Veio a alegria para
o mundo inteiro, por esta cruz que hoje veneramos!”
O povo adora e aclama a vitória do amor sobre o ódio e a violência;
da verdade sobre a mentira; da justiça de Deus sobre a injustiça dos
poderosos. Beijando a cruz do Senhor, manifestamos nosso compro-
misso solidário com a causa pela qual o Filho de Deus doou sua vida.
Ao comungarmos seu corpo, assimilamos sacramentalmente sua
entrega pela salvação da humanidade, a fim de que possamos viver o
que e como Ele viveu. Por esta razão, após a comunhão, o ministro
reza: “Ó Deus, que nos renovastes pela santa morte e Ressurreição do
vosso Cristo, conservai em nós a obra de vossa misericórdia, para que,
pela participação deste mistério, vos consagremos toda a nossa vida”
(Oração de comunhão da Sexta-feira Santa).

Sugestões para a celebração


1. Hoje é dia de jejum e abstinência.
2. Favorecer, no ambiente, o clima de silêncio e de despojamento.
O altar, no início, está completamente desnudado. Cuidar também
para que os membros da equipe de celebração não fiquem circulando
no presbitério antes da celebração, o mesmo vale para os cantores.
Cuidar para que a instalação dos microfones ou outros materiais já
estejam no seu devido lugar bem antes da celebração. Isso ajudará a
assembleia a penetrar desde logo no espírito da celebração.
3. À celebração divide-se em quatro momentos: liturgia da Palavra,
oração universal, adoração da cruz e comunhão. Não é permitida
a alteração desta sequência.
“Bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristo!”

Neste dia, reveste-se de significação especial o rito da prostração


-

do ministro que preside e de seus ajudantes, em profundo silêncio,


no início da celebração. À comunidade toda pode ser convidada a
se ajoelhar, fazendo profundo silêncio.
O relato da Paixão segundo o evangelista João pode ser prepa-
rado e realizado de forma dialogada, mas ela deve ser bem prepa-
rada e ensaiada.
À oração universal é expressão da solidariedade com todo o povo
de Deus, que brotou do gesto de amor do Cristo na cruz. Hoje, a
comunidade reunida reza pelas grandes necessidades da Igreja e
da humanidade. É importante respeitar a estrutura da oração, na
qual se anuncia a intenção da oração, segue-se um breve momento
de silêncio, concluindo-se com a oração de quem preside.
Solenizar o rito da apresentação e adoração da Santa Cruz; o gesto do
beijo na cruz pode ser acompanhado pelo canto: “Povo meu, que te fiz
eu” (HI 2, p. 158) ou “Fiel madeiro da santa cruz” (HI 2, p. 145-146),
ou “Vitória, tu reinarás” (HI 2, p. 199), ou cantos populares como:
“Bendita e louvada seja no céu a divina luz”? Deve-se usar uma única
cruz para a adoração, tal como o requer a verdade do sinal.
No rito de comunhão, estende-se uma toalha sobre o altar, no qual
é colocado o pão eucarístico. Reza-se o Pai-Nosso, seguindo-se o
convite: “Felizes os convidados...”
Concluída a oração sobre o povo, todos se retiram em silêncio.
10. Uma ótima forma de valorizarmos estes dias do Tríduo Pascal,
especialmente hoje e amanhã, será fazer a celebração comuni-
tária do Ofício das Leituras e das Laudes matutinas da Paixão
do Senhor e também no Sábado Santo. O canto do povo, dos
ministros e do sacerdote celebrante reveste particular importância
na celebração da Semana Santa e especialmente do Tríduo Pascal,
porque está mais de acordo com a solenidade destes dias e também
porque os textos obtêm maior força quando são cantados.

9 Sugerimos que a equipe de liturgia medite o texto Lamentos do Senhor que está o Missal
Romano, p. 261-266.
Roteiros homiléticos para a Páscoa RB

11. Hoje é realizada a Coleta para os Lugares Santos. O Missal


Romano não prevê o momento em que será feita esta coleta. Cada
comunidade pode escolher o melhor momento e quem preside
pode fazer uma motivação para este gesto solidário com nossos
irmãos que vivem nos lugares santos.
12. Pela sua importância pastoral, devem ser valorizados os pios
exercícios, como a Via-sacra, as procissões da paixão e a memória
das dores da Bem-aventurada Virgem Maria. Os textos e os
cânticos destes pios exercícios devem corresponder ao espírito
litúrgico deste dia.
13. É recomendável lembrar que o dia seguinte é o “sábado da espera
da Ressurreição”. Convidar os presentes a viverem este dia em
silenciosa expectativa. É dia também de fazer um encontro com os
que serão batizados na Vigília Pascal. À própria equipe de liturgia
deve reservar um momento para rever toda a celebração.
SÁBADO SANTO

“Durante o Sábado Santo a Igreja permanece junto do sepulcro do


Senhor, meditando a sua paixão e morte, a sua descida aos infernos, e
esperando na oração e no jejum a sua ressurreição. Recomenda-se com
insistência a celebração do oficio da leitura e das laudes com a partici-
pação do povo (cf. IGLH, n. 40). Onde isto não é possível, prepare-se
uma celebração da palavra ou um pio exercício que corresponda ao
mistério deste dia.
Podem ser expostas na igreja, para a veneração dos fiéis, a ima-
gem de Cristo crucificado ou deposto no sepulcro, ou uma imagem da
sua descida aos infernos, que ilustra o mistério do Sábado Santo, bem
como a imagem da Santíssima Virgem das Dores”.!º
Além dos preciosos textos litúrgicos que o Ofício das Leituras da
Liturgia das Horas nos oferece, propomos uma reflexão a partir da
Homilia do Papa Francisco diante do Santo Sudário, em 30 de março
de 2013.

"AMADOS IRMÃOS E IRMÁS,

Juntamente convosco coloco-me também eu diante do Santo Sudário,


e agradeço ao Senhor por esta possibilidade que nos oferecem os
instrumentos de hoje.
Embora realizado desta forma, o nosso ato de presença não é uma
simples visão, mas uma veneração: é um olhar de oração. Diria mais:
é um deixar-se olhar. Este Rosto tem os olhos fechados — é o rosto
de um defunto — e todavia, misteriosamente, olha-nos e, no silêncio,
fala-nos. Como é possível? Por que Motivo quer o povo fiel, como
vós, deter-se diante deste Ícone de um Homem flagelado e crucifi-
cado? Porque o Homem do Sudário nos convida a contemplar Jesus de

10 Paschalis Sollemnitatis, Carta Circular da Congregação para o Culto Divino, 1988, n. 73-74.
Roteiros homiléticos para a Páscoa RB

Nazaré. Esta imagem — impressa no lençol — fala ao nosso coração e


impele-nos a subir o Monte do Calvário, a olhar o madeiro da Cruz, a
mergulhar-nos no silêncio eloquente do amor.

Deixemo-nos, pois, alcançar por este olhar, que não procura os


nossos olhos, mas o nosso coração. Ouçamos o que nos quer dizer,
no silêncio, ultrapassando a própria morte. Através do Santo Sudário,
chega-nos a Palavra única e última de Deus: o Amor feito homem,
encarnado na nossa história; o Amor misericordioso de Deus, que
tomou sobre Si todo o mal do mundo para nos libertar do seu domí-
nio. Este Rosto desfigurado parece-se com muitos rostos de homens
e mulheres feridos por uma vida não respeitadora da sua dignidade,
por guerras e violências que se abatem sobre os mais frágeis... E, no
entanto, o Rosto do Sudário comunica uma grande paz; este Corpo
torturado exprime uma soberana majestade. É como se deixasse trans-
parecer uma energia refreada, mas poderosa, é como se nos dissesse:
tem confiança, não percas a esperança; a força do amor de Deus, a
força do Ressuscitado tudo vence.
Por isso, contemplando o Homem do Sudário, faço minha, neste
momento, a oração que São Francisco de Assis pronunciou diante do
Crucifixo:
Deus altíssimo e glorioso, iluminai as trevas do meu coração. E dai-me fé
reta, esperança certa e caridade perfeita, juíxo e conhecimento, Senhor, para
cumprir o vosso mandamento santo e verdadeiro.

Amém”.
VIGÍLIA PASCAL

4 de abril de 2015
“ELE RESSUSCITOU. NÃO ESTÁ AQUI. VEDE O LUGAR ONDE O PUSERAM"

12 leitura: (Gn 1,1-2,2 ou 1,1.26-3la) À criação


Salmo responsorial: (Sl 104[103], Louvor do Criador/
(Sl 33/32]), A Palavra criadora
Oração: (1/11) Criação e Redenção.

2º leitura: (Gn 22,1-18 ou 22,1-2.9a. 10-13.15-18) Sacrifício de Isaac


Salmo responsorial: (Sl 16[16]), Confiança em Deus
Oração: À promessa feita a Abraão.

32 leitura: (Ex 14,15-15,1) Passagem do Mar Vermelho


Salmo responsorial: (Ex 15,1-2.3-4.5-6.17-18) Cântico de vitória
Oração: (1) Passagem pelas águas do Batismo/ (II) Água da regeneração.

42 leitura: (Is 54,5-14) Renovação das núpcias de Javé com Israel


Salmo responsorial: (Sl 30[29]), Ação de graças pela salvação
Oração: Batismo e plenitude da Aliança.

52 leitura: (Is 55,1-11) O banquete messiânico


Salmo responsorial: (Is 12,2-3.4b-6) Beber da fonte da salvação
Oração: Cumprimento das profecias e progresso no caminho do bem.

6º leitura: (Br 3,9-15.32-38; 4,1-4) Israel deve voltar à fonte de sabedoria, Deus
Salmo responsorial: (Sl 19[18]), Alegria na Lei do Senhor
Oração: Vocação batismal, permanência junto à fonte da Sabedoria.

7a leitura: (Ez 36,16-172.18-28) Dispersão, reunião de Israel; o coração novo


Salmo responsorial: (Sl 42[41]), “Como o-cétvo a procurar a fonte...” /
(Is 12[cf acima, 52 leit.)/ (SI 51[50),
Um coração novo e puro
Oração: O velho se torne novo/(II).: Plenificação de nossa vida. Glória.
Oração do dia: “Suscitai na Igreja o espírito da adoção filial, que
nos destes no Batismo”.
Roteiros homiléticos para a Páscoa RB

82 leitura: (Rm 6,3-11) Batismo: morrer e corressuscitar com Cristo;


o Homem Novo.
Solene Aleluia + aclamação ao Evangelho: (Sl 118[117],1-2.16-17.22-23)
“Aleluia, a mão direita do Senhor levantou-me...”.
Evangelho: Mc 16,1-7 — Ide, dizei a seus discípulos e a Pedro que
ele irá à vossa frente, na Galileia.

Situando-nos e Recordando a Palavra e a Liturgia


À celebração da Vigília Pascal condensa um rico simbolismo. Ela é o
eixo de todo o ano litúrgico. Dela todas as outras expressões celebra-
tivas da Igreja recebem sua luz. Nesta noite santa, a Igreja celebra
exultante, do modo sacramental mais pleno, a obra da redenção e da
perfeita glorificação de Deus, como memória, presença e esperança.
“Toda a vigília pascal seja celebrada durante a noite, de modo
que não comece antes do anoitecer e sempre termine antes da aurora
de domingo. Esta regra deve ser interpretada estritamente. Qualquer
abuso ou costume contrário, às vezes verificado, de se antecipar a hora
da celebração da vigília pascal para horas em que, habitualmente, se
celebram as missas vespertinas antes dos domingos, deve ser reprovado.
A vigília pascal, na qual os judeus esperaram a passagem do
Senhor que os libertaria da escravidão do Faraó, foi por eles observada
como memorial a ser celebrado todos os anos; era a figura da futura e
verdadeira Páscoa de Cristo, isto é, da noite da verdadeira libertação,
na qual Jesus rompeu o inferno, ao ressurgir da morte vencedor.
Desde o início a Igreja tem celebrado a Páscoa anual, solenidade das
solenidades, com uma vigília noturna. Com efeito, a Ressurreição de
Cristo é o fundamento da nossa fé e da nossa esperança, e por meio do
Batismo e da Confirmação fomos inseridos no mistério pascal de Cristo:
mortos, sepultados e ressuscitados com Ele, com Ele também havemos
de reinar. Esta vigília é também espera da segunda vinda do Senhor”!
À liturgia da luz inicia-se fora da igreja, com a bênção do fogo

1 Paschalis Solemnttatis, Carta Circular da Congregação para o Culto Divino, 1988. n. 78-80.
Ao “Bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristo!”

novo e o acendimento do Círio Pascal. O Círio é o símbolo de Cristo


ressuscitado que vence toda a escuridão. À luz, ao ser introduzida
na igreja pelo ministro, deve ser recebida com o canto: “Eis a luz de
Cristo!”. A assembleia aclama: “Demos graças a Deus!”. Os presentes
acendem suas velas no Círio Pascale a nova luz, qual nuvem luminosa,
vai se expandindo até iluminar todo o ambiente.
O canto do Exultet é anúncio feliz da alegria da Páscoa. O céu
e a terra, a humanidade e a assembleia dos cristãos rejubilam-se pela
vitória do Cristo, luz que venceu as trevas da morte. É hino que pro-
clama a ação de graças pelas maravilhas de Deus realizadas ao longo
da História da Salvação, agora completadas pela nova criação. À luz
desta noite santa e feliz, tudo se reveste de novo sentido.
Pela liturgia da Palavra, a Igreja refaz a caminhada libertadora
pela escuta, canto dos salmos e orações. Proclamamos nove leituras:
sete do Antigo Testamento e duas do Novo Testamento. Elas, por
assim dizer, sintetizam a milenar caminhada pascal, da criação, do
Éxodo, do Filho de Deus e do novo Povo. É a aliança de Deus com
seu povo sendo construída, ao longo da história, até ser ratificada no
sangue do Cordeiro imolado. Se, todavia, por razões particulares, as
circunstâncias o exigirem, o número das leituras pode ser diminuído.
Entretanto, é importante que nunca se omita a leitura do Êxodo sobre
a passagem do Mar Vermelho.
Concluída a liturgia da Palavra, inicia-se a liturgia batismal
composta pelo canto das ladainhas de todos os santos, a bênção da
fonte batismal, a renovação das promessas batismais, o Batismo,
preferencialmente de adultos. Nesta noite, todos os fiéis renovam o
Batismo, com velas acesas na mão. Recordamos, assim, o nascimento
para a vida cristã. -
À liturgia eucarística, ponto alto da Vigília Pascal, evoca a ceia
pascal judaica, durante a qual o Senhor instituiu a Eucaristia, memo-
rial de sua entrega total que, por seu sangue derramado, selou a nova e
eterna aliança: “Façam isto em memória de mim!”
Roteiros homiléticos para a Páscoa E

Atualizando e ligando a Palavra


com a ação eucarística
Nas celebrações do Iríduo Pascal ouvimos sempre os mesmos textos
da Sagrada Escritura, independente se estamos no ano À, Bou €.
À exceção acontece apenas para o Evangelho que é lido conforme o
evangelista do ano. Por isso, neste dia, partilhamos três reflexões de
nossos Papas Bento XVI (homilias proferidas na Vigília Pascal de 2009
e 2012) e Francisco (homilia proferida em 2013). São reflexões muito
profundas e que nos levam ao coração do Mistério hoje celebrado.
Marcos narra no seu Evangelho que os discípulos, ao descer do
monte da Transfiguração, discutiam entre si o que queria dizer “ressus-
citar dos mortos” (cf. Mc 9,10). Antes, o Senhor tinha-lhes anunciado
a sua paixão e a ressurreição três dias depois. Pedro tinha protestado
contra o anúncio da morte. Mas agora interrogavam-se acerca do que
se poderia entender pelo termo “ressurreição”.
Porventura não acontece o mesmo também a nós? O Natal, o nas-
cimento do Deus Menino de certo modo é imediatamente compreen-
sível para nós. Podemos amar o Menino, podemos imaginar a noite de
Belém, a alegria de Maria, a alegria de José e dos pastores e o júbilo
dos Anjos. Mas, a ressurreição: o que é? Não entra no âmbito das
nossas experiências, e assim a mensagem frequentemente acaba, em
qualquer medida, incompreendida, algo do passado. À Igreja procura
levar-nos à sua compreensão, traduzindo este acontecimento miste-
rioso na linguagem dos símbolos pelos quais nos seja possível de algum
modo contemplar este fato impressionante. Na Vigília Pascal, indica-
-nos o significado deste dia sobretudo através de três símbolos: a luz, a
água e o cântico novo do aleluia.
Temos, em primeiro lugar, a luz. À criação por obra de Deus
— acabamos de ouvir a sua narração bíblica — começa com as pala-
vras: “Faça-se a luz!” (Gn 1,3). Onde há luz, nasce a vida, o caos pode
transformar-se em cosmos. Na mensagem bíblica, a luz é a imagem
mais imediata de Deus: Ele é todo Resplendor, Vida, Verdade e Luz.
Na Vigília Pascal, a Igreja lê a narração da criação como profecia. Na
“Bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristol”

Ressurreição, verifica-se de modo mais sublime aquilo que este texto


descreve como o início de todas as coisas. Deus diz de novo: “Faça-se
a luz”. À Ressurreição de Jesus é uma irrupção de luz. À morte fica
superada, o sepulcro escancarado. O próprio Ressuscitado é Luz, a
Luz do mundo. Com a Ressurreição, o dia de Deus entra nas noites
da história. À partir da Ressurreição, a luz de Deus difunde-se pelo
mundo e pela história. Faz-se dia. Somente esta Luz — Jesus Cristo — é
a luz verdadeira, mais verdadeira que o fenômeno físico da luz. Ele é a
Luz pura: é o próprio Deus, que faz nascer uma nova criação no meio
da antiga, transforma o caos em cosmos.
Na Vigília Pascal, a Igreja representa o mistério da luz de Cristo
no sinal do Círio pascal, cuja chama é simultaneamente luz e calor. O
simbolismo da luz está ligado com o do fogo: resplendor e calor, res-
plendor e energia de transformação contida no fogo. Verdade e amor
andam juntos. O Círio Pascal arde e deste modo se consuma: cruz e
ressurreição são inseparáveis. Da cruz, da autodoação do Filho nasce a
luz, provém o verdadeiro resplendor sobre o mundo. No Círio Pascal,
todos acendemos as nossas velas, sobretudo as dos neobatizados, aos
quais, neste sacramento, a luz de Cristo é colocada no fundo do cora-
ção. À Igreja Antiga designou o Batismo como sacramento da ilumi-
nação, como uma comunicação de luz e ligou-o inseparavelmente com
a Ressurreição de Cristo. No Batismo, Deus diz ao batizando: “Faça-
-se a luz”. O batizando é introduzido dentro da luz de Cristo. Cristo
divide agora a luz das trevas. NºEle reconhecemos o que é verdadeiro
e o que é falso, o que é o resplendor e o que é a escuridão. Com Ele,
surge em nós a luz da verdade e começamos a compreender.
Uma vez quando Cristo viu a gente que-se congregara para O
escutar e esperava d'Ele uma orientação, sentiu compaixão por ela,
porque eram como ovelhas sem pastor (cf. Mc 6,34). No meio das
correntes contrastantes do seu tempo, não sabiam a quem dirigir-se.
Quanta compaixão deve Ele sentir também do nosso tempo, por
causa de todos os grandes discursos por trás dos quais, na realidade,
se esconde uma grande desorientação! Para onde devemos ir? Quais
são os valores, segundo os quais podemos regular-nos? Os valores
Roteiros homiléticos para a Páscoa

segundo os quais podemos educar os jovens, sem lhes dar normas


que talvez não subsistam nem exigir coisas que talvez não lhes
devam ser impostas? Ele é a Luz. À vela batismal é o símbolo da
iluminação que nos é concedida no Batismo. Assim, nesta hora,
também Paulo nos fala de modo muito imediato. Na Carta aos Fili-
penses, diz que, no meio de uma geração má e perversa, os cristãos
deveriam brilhar como astros no mundo (cf. F1 2,15). Peçamos ao
Senhor que a pequena chama da vela, que Ele acendeu em nós, a
luz delicada da sua palavra e do seu amor no meio das confusões
deste tempo não se apague em nós, mas torne-se cada vez mais
forte e mais resplendorosa. Para que sejamos com Ele pessoas do
dia, astros para o nosso tempo.
O segundo símbolo da Vigília Pascal — a noite do Batismo — é a
água. Esta aparece, na Sagrada Escritura e consequentemente também
na estrutura íntima do sacramento do Batismo, com dois significados
opostos. De um lado, temos o mar que se apresenta como o poder
antagonista da vida sobre a terra, como a sua contínua ameaça, à qual,
porém, Deus colocou um limite. Por isso o Apocalipse, ao falar do
mundo novo de Deus, diz que lá o mar já não existirá (cf. 21,1). É
o elemento da morte. E assim torna-se a representação simbólica da
morte de Jesus na cruz: Cristo desceu aos abismos do mar, às águas
da morte, como Israel penetrou no Mar Vermelho. Ressuscitado da
morte, Ele dá-nos a vida. Isto significa que o Batismo não é apenas um
banho, mas um novo nascimento: com Cristo, como que descemos ao
mar da morte para dele subirmos como criaturas novas.

O outro significado com que encontramos a água é como nascente


fresca, que dá a vida, ou também como o grande rio donde provém a
vida. Segundo o ordenamento primitivo da Igreja, o Batismo devia ser
administrado com água fresca de nascente. Sem água, não há vida.
Que o digam milhares de pessoas que enfrentam racionamento de
água em nosso país. Impressiona a grande importância que têm na
Sagrada Escritura os poços. São lugares donde brota a vida. Junto do
poço de Jacó, Cristo anuncia à Samaritana o poço novo, a água da vida
verdadeira. Manifesta-Se a ela como o novo e definitivo Jacó, que abre
“Bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristo!”

à humanidade o poço que esta aguarda: aquela água que dá a vida que
jamais se esgota (cf. Jo 4,5-15).
João narra que um soldado feriu com uma lança o lado de Jesus e
que, do lado aberto — do seu coração trespassado —, saiu sangue e água
(cf. Jo 19,34). Nisto, a Igreja Antiga viu um símbolo do Batismo e da
Eucaristia, que brotam do coração trespassado de Jesus. Na morte, Jesus
mesmo Se tornou a nascente. Numa visão, o profeta Ezequiel tinha visto
o Templo novo, do qual jorra uma nascente que se torna um grande rio
que dá a vida (cf. Ez 47,1-12); para uma Terra que sempre sofria com a
seca e a falta de água, esta era uma grande visão de esperança. Cristo é
o Templo verdadeiro, o Templo vivo de Deus. E é também a nascente
de água viva. D'Ele brota o grande rio que, no Batismo, faz frutificar e
renova o mundo; o grande rio de água viva é o seu Evangelho que torna
fecunda a terra. Mas Jesus profetizou uma coisa ainda maior; diz Ele:
“Do seu interior, correrão rios de água viva” (Jo 7,38).
No Batismo, o Senhor faz de nós não só pessoas de luz, mas tam-
bém nascentes das quais brota água viva. Todos nós conhecemos tais
pessoas que nos deixam de algum modo restaurados e renovados; pes-
soas que são como que uma fonte de água fresca borbulhante. Não
devemos necessariamente pensar a pessoas grandes como Agostinho,
Francisco de Assis, Teresa de Ávila, Madre Teresa de Calcutá e assim
por diante, pessoas através das quais verdadeiramente rios de água
viva penetraram na história. Graças a Deus, encontramo-las conti-
nuamente mesmo no nosso dia a dia: pessoas que são uma nascente.
Com certeza, conhecemos também o contrário: pessoas das quais
emana um odor parecido com o de um charco com água estagnada
ou mesmo envenenada. Peçamos ao Senhor, que nos concedeu a graça
do Batismo, para podermos ser sempre nascentes de água pura, fresca,
saltitante da fonte da sua verdade e do seu amor.
O terceiro grande símbolo da Vigília Pascal é a entoação do cân-
tico novo: o Aleluia. Quando uma pessoa experimenta uma grande
alegria, não pode guardá-la para si. Deve manifestá-la, transmiti-la.
Mas que sucede quando a pessoa é tocada pela luz da Ressurreição,
entrando assim em contato com a própria Vida, com a Verdade e com
Roteiros homiléticos para a Páscoa EB

o Amor? Disto, não pode limitar-se simplesmente a falar; o falar já não


basta. Ela tem de cantar.
Na Bíblia, a primeira menção do ato de cantar encontra-se depois
da travessia do Mar Vermelho. Israel libertou-se da escravidão. Subiu
das profundezas ameaçadoras do mar. É como se tivesse renascido.
Vive e é livre. A Bíblia descreve a reação do povo a este grande acon-
tecimento da salvação com a frase: “O povo temeu o Senhor e teve
fé no Senhor e em Moisés, seu servo” (Ex 14,31). Segue-se depois a
segunda reação que nasce, por uma espécie de necessidade interior,
da primeira: “Então Moisés e os Israelitas cantaram ao Senhor este
cântico” (Ex 15,1). Na Vigília Pascal, ano após ano, nós, cristãos,
depois da terceira leitura entoamos este cântico, cantamo-lo como
o nosso cântico, porque também nós, pelo poder de Deus, fomos
tirados para fora da água e libertos para a vida verdadeira. À mão
salvadora do Senhor nos sustenta e assim podemos cantar já agora o
cântico dos redimidos, o cântico novo dos ressuscitados: Aleluia!
Olhando para o Evangelho de hoje, escrito por Marcos, evan-
gelista do ano B, encontramos em primeiro lugar as mulheres que
vão ao sepulcro de Jesus levando perfumes para ungir o corpo d'Ele
(cf. Mc 16,1). Vão cumprir um gesto de piedade, de afeto, de amor,
um gesto tradicionalmente feito a um ente querido falecido, como
fazemos nós também. Elas tinham seguido Jesus, ouviram-No,
sentiram-se compreendidas na sua dignidade e acompanharam-
-No até ao fim no Calvário e ao momento da descida do seu corpo
da cruz. Podemos imaginar os sentimentos delas enquanto cami-
nham para o túmulo: tanta tristeza, tanta pena porque Jesus as dei-
xara; morreu, a sua história terminou. Agora se tornava à vida que
levavam antes. Contudo, nas mulheres, continuava o amor, e foi o
amor por Jesus que as impelira a irem ao sepulcro. Mas, chegadas
lá, verificam algo totalmente inesperado, algo de novo que lhes
transtorna o coração e os seus programas e subverterá a sua vida:
veem a pedra removida do sepulcro, aproximam-se e não encon-
tram o corpo do Senhor. O caso deixa-as perplexas, hesitantes,
cheias de interrogações. Porventura não se dá o mesmo também
o “Bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristo!”

conosco, quando acontece qualquer coisa de verdadeiramente novo


na cadência diária das coisas? Paramos, não entendemos, não sabe-
mos como enfrentá-la. Frequentemente mete-nos medo a novidade,
incluindo a novidade que Deus nos traz, a novidade que Deus nos
pede. Fazemos como os apóstolos, no Evangelho: muitas vezes pre-
ferimos manter as nossas seguranças, parar junto de um túmulo
com o pensamento num defunto que, no fim das contas, vive só na
memória da história, como as grandes figuras do passado. Teme-
mos as surpresas de Deus. Queridos irmãos e irmãs, na nossa vida,
temos medo das surpresas de Deus! Ele não cessa de nos surpreen-
der! O Senhor é assim.!?
Irmãos e irmãs, não nos fechemos à novidade que Deus quer
trazer à nossa vida! Muitas vezes sucede que nos sentimos cansa-
dos, desiludidos, tristes, sentimos o peso dos nossos pecados, pen-
samos que não conseguimos? Não nos fechemos em nós mesmos,
não percamos a confiança, não nos demos jamais por vencidos: não
há situações que Deus não possa mudar; não há pecado que não
possa perdoar, se nos abrirmos a Ele.
Nesta Noite de luz, invocando a intercessão da Virgem
Maria, que guardava todos os acontecimentos no seu coração
(cf. Lc 2,19.51), peçamos ao Senhor que nos torne participantes
da sua Ressurreição: que nos abra à sua novidade que transforma,
às surpresas de Deus, que são tão belas; que nos torne homens
e mulheres capazes de fazer memória daquilo que Ele opera na
nossa história pessoal e na do mundo; que nos torne capazes de O
percebermos como o Vivente, vivo e operante no meio de nós; que
nos ensine, queridos irmãos e irmãs, cada dia a não procurarmos
entre os mortos Aquele que está vivo. Assim seja.

12 Cf. Papa Francisco, Homilia na Vigília Pascal de 2013.


Roteiros homiléticos para a Páscoa BH

Sugestões para a celebração"

A estrutura da vigília pascal e a importância dos seus


elementos e das suas partes:
À estrutura dos ritos por ninguém pode ser mudada arbitrariamente.
À primeira parte compreende ações simbólicas e gestos, que
devem ser realizados com tal dignidade e expressividade, de maneira
que os fiéis possam verdadeiramente compreender o significado, suge-
rido pelas advertências e orações litúrgicas.
Na medida em que for possível, prepare-se fora da igreja, em lugar
conveniente, o braseiro para a bênção do fogo novo, cuja chama deve
ser tal que dissipe as trevas e ilumine a noite.
Prepare-se o Círio Pascal que, no respeito da veracidade do sinal,
deve ser de cera, novo a cada ano, único, relativamente grande, nunca
artificial, para poder recordar que Cristo é a luz do mundo. À bênção
do Círio deve ser feita com os sinais e palavras indicados no Missal.
À procissão de entrada do povo na igreja deve ser iluminada uni-
camente pela luz do Círio Pascal. Assim como os filhos de Israel eram
guiados de noite pela coluna de fogo, assim também os cristãos, por sua
vez, seguem o Cristo ressuscitado. Nada impede que, a cada resposta
“Demos graças a Deus!”, se acrescente outra aclamação dirigida a Cristo.
À luz do Círio Pascal passará, gradualmente, às velas que os fiéis têm em
suas mãos, permanecendo ainda apagadas as lâmpadas elétricas.
O diácono faz a proclamação da Páscoa, magnífico poema lírico
que apresenta todo o mistério pascal inserido na economia da salvação.
Se necessário, ou por falta de diácono ou por impossibilidade do sacer-
dote celebrante, tal proclamação seja confiada a um cantor.”

13 Cf. Paschalis Sollemnitatis, Carta Circular da Congregação para o Culto Divino, 1988, n. 81-96.
14 O canto do Exultet, de modo muito discreto, lembra-nos que o material do Cirio é feito pelo
trabalho das abelhas; e, assim, entra em cena a criação inteira. No Cirio, a criação torna-se
portadora de luz. Mas, segundo o pensamento dos Padres, temos aí também uma alusão
implícita à Igreja. Nesta, a cooperação da comunidade viva dos fiéis é parecida com o trabalho
das abelhas; constrói a comunidade da luz. Assim podemos ver, no círio, também um apelo
dirigido a nós mesmos e à nossa comunhão com a comunidade da Igreja, que existe para que a
luz de Cristo possa iluminar o mundo.
A “Bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristo!”

As leituras da Sagrada Escritura formam a segunda parte da vigí-


lia. Elas descrevem os acontecimentos culminantes da história da sal-
vação, que os fiéis devem poder tranquilamente meditar por meio do
canto do Salmo Responsorial, do silêncio e da oração do celebrante.
Temos sete leituras do Antigo Testamento, tomadas dos livros da lei e
dos profetas, já utilizadas com frequência nas antigas tradições litúr-
gicas tanto do Oriente como do Ocidente; e duas leituras do Novo
Testamento, tomadas das cartas dos apóstolos e do Evangelho. Desta
maneira, a Igreja “começando por Moisés e seguindo pelos profetas”,
interpreta o mistério pascal de Cristo. Portanto, na medida em que for
possível, sejam feitas todas as leituras de maneira que se respeite com-
pletamente a natureza da vigília pascal, que exige uma certa duração.
Todavia, onde as circunstâncias de natureza pastoral exigem que
se reduza ainda o número das leituras, leiam-se ao menos três do
Antigo Testamento, a saber, dos livros da lei e dos profetas; nunca se
pode omitir a leitura do capítulo 14 do Êxodo, com o seu cântico.
O significado tipológico dos textos do Antigo Testamento tem as
suas raízes no Novo, e aparece sobretudo na oração pronunciada pelo
celebrante depois de cada uma das leituras; para chamar a atenção dos
fiéis, poderá ser também útil uma breve introdução para que compre-
endam o significado das mesmas. Tal introdução pode ser feita pelo
próprio sacerdote celebrante ou pelo diácono.
Depois da leitura canta-se o salmo com à resposta do povo. Na
repetição destes diversos elementos mantenha-se um ritmo que possa
favorecer a participação e a devoção dos fiéis.
No final das leituras do Antigo Testamento canta-se o Glória a
Deus, tocam-se os sinos segundo os usos locais, pronuncia-se a oração e
passa-se às leituras do Novo Testamento. Lê-se a exortação do apóstolo
sobre o Batismo, entendido como inserção no mistério pascal de Cristo.
Depois, todos se levantam: o sacerdote entoa por três vezes o Í/e-
luia, elevando gradualmente a voz, e o povo repete-o. Se necessário,
o salmista ou um cantor entoa o Aleluia, que o povo prossegue inter-
calando a aclamação entre os versículos do Salmo 117, tantas vezes
citado pelos apóstolos na pregação pascal. Por fim, com o Evangelho é
Roteiros homiléticos para a Páscoa RH

anunciada a Ressurreição do Senhor, como ápice de toda a liturgia da


Palavra. Não se deve omitir a homilia, ainda que seja breve.
A terceira parte da vigília é constituída pela liturgia batismal, A
Páscoa de Cristo e nossa é agora celebrada no sacramento. Isto pode
ser expresso de maneira mais completa nas igrejas que têm a fonte
batismal, e sobretudo quando tem lugar a iniciação cristã dos adultos
ou, pelo menos, o Batismo de crianças. Mesmo que não haja a ceri-
mônia do Batismo, nas igrejas paroquiais deve-se fazer a bênção da
água batismal. Quando esta bênção não é feita na fonte batismal, mas
no presbitério, num segundo momento a água batismal seja levada ao
batistério, onde será conservada durante todo o Tempo Pascal. Onde
não haja a cerimônia do Batismo nem se deva benzer a água batismal,
a memória do Batismo é feita na bênção da água que depois servirá
para aspergir o povo.
Em seguida tem lugar a renovação das promessas batismais, intro-
duzida com uma palavra do celebrante. Os fiéis, de pé e com as velas
acesas na mão, respondem às interrogações. Depois eles são aspergidos
com a água: desse modo, gestos e palavras recordam-lhes o Batismo
recebido. O sacerdote celebrante asperge o povo passando pela nave da
igreja, enquanto todos cantam a antífona Vidi aquam ou outro cântico
de caráter batismal.
À celebração da Eucaristia forma a quarta parte da vigília e o seu
ápice, sendo de modo pleno o sacramento da Páscoa, ou seja, memorial
do sacrifício da cruz e presença de Cristo ressuscitado, consumação da
iniciação cristã e antegozo da Páscoa eterna.
Recomenda-se não celebrar apressadamente a liturgia eucarística;
é muito conveniente que todos os ritos e as palavras que os acom-
panham alcancem toda a sua força expressiva: a oração universal,
mediante a qual os neófitos participam pela primeira vez como fiéis e
exercem o seu sacerdócio real; a procissão do ofertório, com a partici-
pação dos neófitos, se estiverem presentes, a oração eucarística, pos-
sivelmente cantada, com os seus embolismos próprios; a comunhão
eucarística, que é o momento da plena participação no mistério cele-
brado. Durante a Comunhão é oportuno cantar o Salmo 117, com a
FA “Bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristo!”

antífona Cristo, nossa Páscoa, ou o Salmo 33, com a antífona Áleluia,


Aleluia, Aleluia, ou outro cântico de júbilo pascal.
E muito desejável que na comunhão da vigília pascal se alcance a
plenitude do sinal eucarístico, recebido sob as espécies do pão e do vinho.

Algumas advertências pastorais:

“A liturgia da vigília pascal deve ser realizada de modo a poder oferecer


ao povo cristão a riqueza dos ritos e das orações; é importante que seja
respeitada a verdade dos sinais, se favoreça a participação dos fiéis e
seja assegurada a presença de ministros, leitores e cantores.
L

E desejável que, segundo as circunstâncias, seja prevista a reunião


de diversas comunidades numa mesma igreja, quando, por razão da pro-
ximidade das igrejas ou do reduzido número de participantes, não se
possa ter uma celebração completa e festiva. Favoreça-se a participação
de grupos particulares na celebração da vigília pascal, na qual todos os
fiéis, formando uma única assembleia, possam experimentar de modo
mais profundo o sentido de pertença à mesma comunidade eclesial.
Para poder celebrar a vigília pascal com o máximo proveito, con-
vém que os próprios pastores adquiram um conhecimento melhor
tanto dos textos como dos ritos, a fim de poderem dar uma mistagogia
que seja autêntica”.

15 Paschalis Sollemnitatis, n. 93-96.


DOMINGO DA PÁSCOA NA
RESSURREIÇÃO DO SENHOR
S de abril de 2015
A VIDA VENCEU A MORTE!

Leituras: At 10,34a.37-43; Sl 117(118)


Cl 3,1-4 ou 1Cor 5,6b-8
Jo 29,1-9 ou nas Missas Vespertinas: Lc 24,13-35. Na Missa
do Dia pode-se também proclamar o Evangelho da Vigília
Pascal (Mc 16,1-7). Por estarmos no ano B, conduzidos por
Marcos, sugerimos que seja feita esta escolha pelo evangelista
do ano.

Situando-nos
O Senhor ressurgiu! Aleluia! É Páscoa! Festa da vida que venceu a
morte. Neste domingo da Páscoa (primeiro dia da semana), transbor-
dando de alegria pascal, celebramos a Ressurreição do Senhor,
renovados pelo Espírito, ressuscitamos também na luz da vida nova.
Depois de termos vivido quarenta dias de Quaresma, sem cantar
Aleluia, neste domingo de Ressurreição, com todos os nossos irmãos e
irmãs, somos convocados a proclamar com alegria: “Aleluia, o Senhor
Ressuscitou, Aleluia”!
Nossa fé na Ressurreição de Jesus, causa de nossa esperança,
baseia-se na fé dos primeiros discípulos de Jesus que reconheceram o
Crucificado-Ressuscitado! Embora ninguém tenha visto sua ressur-
reição, o agir ressuscitador de Deus atua no silêncio, no segredo e na
intimidade de seu seio. regenerador. A comunidade cristã percebeu
e compreendeu, aos poucos, no encontro com o Senhor e pela ação
do Espírito, que seu Mestre tinha ressuscitado e continuava vivo no
meio deles.
Ra “Bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristo!”

A fé no Ressuscitado nos impulsiona a ir ao encontro dos cruci-


ficados de hoje para partilhar com eles a Boa-Nova de que Deus está
vivo no meio de nós, ressuscitando, libertando da morte e fazendo uma
nova criação.

Recordando a Palavra
O Evangelho da Ressurreição de Jesus Cristo (cf. Mc 16,1-7) começa
referindo o caminho das mulheres para o sepulcro, ao alvorecer do dia
depois do sábado. Querem honrar o corpo do Senhor e vão ao túmulo,
mas encontram-no aberto e vazio. Um anjo majestoso diz-lhes: “Não
vos assusteis!” (Mc 16,6). E ordena-lhes que levem esta notícia aos
discípulos: “Ele não está aqui... Ele irá à vossa frente na Galileia”. As
mulheres se assustam, mas confiam. “Não temais”: essa é uma voz
que encoraja a abrir o coração para receber este anúncio.
Depois da morte do Mestre, os discípulos tinham-se dispersado;
tudo parecia ter acabado: desabadas as certezas, apagadas as esperan-
ças. Mas agora, aquele anúncio das mulheres, embora incrível, che-
gava como um raio de luz na escuridão. À notícia espalha-se: Jesus
ressuscitou, como predissera. E de igual modo a ordem de partir
para a Galileia; duas vezes a ouviram as mulheres, primeiro do anjo,
depois do próprio Jesus: “Partam para a Galileia. Lá Me verão”. “Não
temais” e “ide para a Galileia”.
A Galileia é o lugar da primeira chamada, onde tudo começara!
Trata-se de voltar lá, voltar ao lugar da primeira chamada. Jesus pas-
sara pela margem do lago, enquanto os pescadores estavam a con-
sertar as redes. Chamara-os e eles, deixando tudo, seguiram-No”
(cf. Mt 4,18-22).
“Cristo, o nosso cordeiro pascal, foi imolado” (1Cor 5, 7): ressoa
hoje esta exclamação de Paulo que ouvimos na segunda leitura, tirada
da primeira Carta aos Coríntios. É um texto que remonta apenas há
uns vinte anos depois da morte e Ressurreição de Jesus e no entanto —
como é típico de certas expressões paulinas — já encerra, numa síntese
Roteiros homiléticos para a Páscoa BR

admirável, a plena consciência da novidade cristã. Aqui, o símbolo


central da história da salvação — o cordeiro pascal — é identificado
em Jesus, chamado precisamente “o nosso cordeiro pascal”. A Pás-
coa hebraica, memorial da libertação da escravidão do Egito, previa
anualmente o rito da imolação do cordeiro, um cordeiro por famí-
lia, segundo a prescrição de Moisés. Na sua paixão e morte, Jesus
revela-Se como o Cordeiro de Deus “imolado” na cruz para tirar os
pecados do mundo. Foi morto precisamente na hora em que era cos-
tume imolar os cordeiros no Templo de Jerusalém. O sentido deste
seu sacrifício tinha-o antecipado Ele mesmo durante a Última Ceia,
substituindo-Se — sob os sinais do pão e do vinho — aos alimentos
rituais da refeição na Páscoa hebraica. Podemos assim afirmar com
verdade que Jesus levou a cumprimento a tradição da antiga Páscoa e
transformou-a na sua Páscoa.
À partir deste novo significado da festa pascal, compreende-se
também a interpretação dos “ázimos” dada por Paulo. O Apóstolo
refere-se a um antigo costume hebraico, segundo o qual, por oca-
sião da Páscoa, era preciso eliminar de casa todo e qualquer resto
de P pão fermentado. Por um lado, ) isto constituía uma recordação do
que tinha acontecido aos seus antepassados no momento da fuga do
Egito: saindo à pressa do país, tinham levado consigo apenas foga-
ças não fermentadas. Mas, por outro, “os ázimos” eram símbolo de
purificação: eliminar o que era velho para dar espaço ao novo. Agora,
explica Paulo, também esta antiga tradição adquire um sentido novo,
precisamente a partir do novo “êxodo” que é a passagem de Jesus da
. . GA » 4

morte à vida eterna. E dado que Cristo, como verdadeiro Cordeiro,


sacrificou-Se por nós, também nós, seus discípulos — graças a Ele e
por meio d'Ele —, podemos e devemos ser “nova massa”, “pães ázi-
. 3 c » Mm 2...

mos”, livres de qualquer resíduo do velho fermento do pecado: nada


de malícia ou perversidade no nosso coração.'

16 Cf. Papa Bento XVI, homilia no dia da Páscoa, 2009.


Ao “Bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristo!”

Atualizando a Palavra
“Celebremos, pois, a festa (...) com os pães ázimos da pureza e da
verdade”. Amados irmãos e irmãs, acolhamos o convite do Apóstolo;
abramos o espírito ao Cristo morto e ressuscitado para que nos renove,
para que elimine do nosso coração o veneno do pecado e da morte e
nele infunda a seiva vital do Espírito Santo: a vida divina e eterna.
Na Sequência Pascal, como que respondendo às palavras do Apóstolo,
cantamos: “Cristo ressuscitou verdadeiramente dos mortos”. Sim! Isto
é precisamente o núcleo fundamental da nossa profissão de fé; é o
grito de vitória que hoje nos une a todos. E se Jesus ressuscitou e, por
conseguinte, está vivo, quem poderá separar-nos d'Ele? Quem poderá
privar-nos do seu amor, que venceu o ódio e derrotou a morte?
O anúncio da Páscoa propaga-se pelo mundo com o cântico jubi-
loso do Aleluia. Cantemo-lo com os lábios; cantemo-lo sobretudo com
o coração e com a vida: com um estilo “ázimo” de vida, isto é, simples,
humilde e fecundo de obras boas. “Ressuscitou Cristo, minha espe-
rança/precede-vos na Galileia”. O Ressuscitado precede-nos e acom-
panha-nos pelas estradas do mundo. É Ele a nossa esperança, é Ele a
verdadeira paz do mundo.
Voltar à Galileia significa reler tudo a partir da cruz e da vitória;
sem medo, “não temais”. Reler tudo — a pregação, os milagres, a nova
Cm >) e- .

comunidade, os entusiasmos e as deserções, até a traição — reler tudo a


partir do fim, que é um novo início, a partir deste supremo ato de amor.
Também para cada um de nós há uma “Galileia”, no princípio
do caminho com Jesus. “Partir para a Galileia” significa uma coisa
estupenda, significa redescobrirmos o nosso Batismo como fonte viva,
tirarmos energia nova da raiz da nossa fé e da nossa experiência cristã.
Voltar para a Galileia significa antes de tudo retornar lá, aquele ponto
incandescente onde a Graça de Deus me tocou no início do caminho.
É desta fagulha que posso acender o fogo para o dia de hoje, para cada
dia, e levar calor e luz aos meus irmãos e às minhas irmãs. À partir
daquela fagulha, acende-se uma alegria humilde, uma alegria que não
ofende o sofrimento e o desespero, uma alegria mansa e bondosa.
Roteiros homiléticos para a Páscoa EB

Na vida do cristão, depois do Batismo, há também outra “Gali-


leia”, uma “Galileia” mais existencial: a experiência do encontro pes-
soal com Jesus Cristo, que me chamou para segui-Lo e participar da
Sua missão. Neste sentido, voltar à Galileia significa guardar no cora-
ção a memória viva desta chamada, quando Jesus passou pela minha
estrada, olhou-me com misericórdia, pediu-me para segui-Lo; voltar
para Galileia significa recuperar a lembrança daquele momento em
que os olhos d'Ele se cruzaram com os meus, quando me fez sentir
que me amava.
Hoje, neste domingo, cada um de nós pode interrogar-se: Qual é
a minha Galileia? Trata-se de fazer memória, ir ao encontro da lem-
brança. Onde é a minha Galileia? Lembro-me dela? Ou a esqueci?
Procura e a encontrarás! Ali o Senhor te espera. Andei por estradas e
sendas que me fizeram esquecer. Senhor, ajudai-me! Dizei-me qual é
a minha Galileia. Como sabeis, eu quero voltar lá para encontrar-Vos
e deixar-me abraçar pela vossa misericórdia. Não tenhais medo, não
temais, voltai para a Galileia!
O Evangelho é claro: é preciso voltar lá, para ver Jesus ressuscitado
e tornar-se testemunha da sua Ressurreição. Não é voltar atrás, não é
nostalgia. É voltar ao primeiro amor, para receber o fogo que Jesus
acendeu no mundo, e levá-lo a todos, até os confins da terra. Voltai
para a Galileia sem medo.
“Galileia dos gentios” (Mt 4,15; Is 8,23): horizonte do Ressuscitado,
horizonte da Igreja; desejo intenso de encontro. Ponhamo-nos a caminho!

Ligando a Palavra com a ação eucarística


A Eucaristia é o sacramento da Páscoa, isto é, da morte e Ressurreição
de Jesus Cristo, que o Espírito Santo atualiza na Igreja, em memória
de Jesus Cristo ressuscitado. O Cristo nossa Páscoa, morreu como um
Cordeiro. Seu corpo é nossa oferta, Pão vivo e verdadeiro.
Graças à morte e à Ressurreição de Cristo, também nós, hoje, res-
surgimos para uma vida nova e, unindo a nossa voz à do Ressuscitado,
“Bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristo!”

proclamamos o desejo de permanecer em comunhão para sempre com


Deus, nosso Pai infinitamente bom e misericordioso. Deste modo,
mergulhamos na profundidade do mistério pascal.
Como discípulos missionários do Senhor, a exemplo de Maria
Madalena e dos apóstolos Pedro e João diante do túmulo vazio, nos
tornemos testemunhas da ressurreição e experimentemos sua presença
de Ressuscitado na pessoa de cada irmão, na comunidade reunida na
fé, na Palavra de Deus proclamada e no Pão e Vinho partilhados.

Sugestões para a celebração”


1. A missa do dia da Páscoa deve ser celebrada com grande solenidade.
Em lugar do ato penitencial, é muito conveniente fazer a aspersão
com a água benzida durante a celebração da vigília. Durante a
aspersão, pode-se cantar a antífona Banhados em Cristo ou outro
cântico de caráter batismal. Com essa mesma água convém encher
os recipientes (vasos, pias) que se encontram à entrada da igreja.
2. O Círio Pascal, colocado junto do ambão ou perto do altar, deve
permanecer aceso ao menos em todas as celebrações litúrgicas mais
solenes deste tempo, tanto na missa como nas laudes e vésperas,
até o domingo de Pentecostes. Depois, o Círio é conservado com a
devida honra no batistério, para acender nele os círios dos neoba-
tizados. Na celebração das exéquias o Círio Pascal deve ser colo-
cado junto do féretro, para indicar que a morte é para o cristão a
sua verdadeira Páscoa.
3. À celebração da Páscoa continua durante o Tempo Pascal. Os
cinquenta dias que vão do domingo da Ressurreição ao domingo
de Pentecostes são celebrados com alegria como um só dia festivo,
antes como “o grande domingo”.
4. Os domingos deste tempo devem ser considerados como
“domingos de Páscoa” e têm precedência sobre qualquer festa
do Senhor e qualquer solenidade. As solenidades que coincidem

17 Cf. Paschalis Sollemnitatis, Carta Circular da Congregação para o Culto Divino, 1988, n.
100-108.
Roteiros homiléticos para a Páscoa

com estes domingos-são celebradas no sábado anterior. Às festas


em honra da Bem-aventurada Virgem Maria ou dos santos, que
ocorrem durante a semana, não podem ser transferidas para
estes domingos.
5. Para os adultos que receberam a iniciação cristã na Vigília Pascal,
todo este tempo é reservado à mistagogia. Portanto, onde houver
neófitos, observe-se tudo o que é indicado no Rito da Iniciação
cristã dos adultos, n. 37-40 e 235-239, Deve-se fazer sempre, na
oitava da Páscoa, a oração de intercessão pelos neobatizados, inse-
rida na oração eucarística.
6. Durante todo o Tempo Pascal, nas missas dominicais, os neófitos
devem ter reservado um lugar especial entre os fiéis. Devem
procurar participar nas missas juntamente com os seus padri-
nhos. Na homília e, segundo a oportunidade, na oração universal,
deve-se fazer menção a eles.
7. No encerramento do tempo da mistagogia, nas proximidades
do domingo de Pentecostes, deve-se fazer alguma celebração
segundo os costumes da própria região. Além disso, é muito
oportuno que as crianças recebam a sua Primeira Comunhão
nestes domingos pascais.
8. Durante o Tempo Pascal os pastores instruam os fiéis, que já
fizeram a Primeira Comunhão, sobre o significado do preceito
da Igreja de receber neste tempo a Eucaristia. Recomenda-se,
sobretudo na oitava da Páscoa, que a sagrada Comunhão seja
levada aos doentes.
9. Onde houver o costume de benzer as casas por ocasião das festas
pascais, tal bênção seja feita pelo pároco ou por outros sacerdotes
ou diáconos por ele delegados. É esta uma ocasião preciosa para
exercitar o múnus pastoral. O pároco deve fazer a visita pastoral a
cada família, ter um colóquio com os seus membros e orar breve-
mente com eles, usando os textos contidos no Ritual das Bênçãos.
Nas grandes cidades verificar a possibilidade de reunir mais famí-
lias, para juntas celebrarem o rito da bênção.
“Bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristo!”

10. Segundo a diversidade dos lugares e dos povos, existem muitos


costumes populares vinculados com as celebrações do Tempo
Pascal, que às vezes suscitam maior participação popular que
as mesmas celebrações litúrgicas; tais costumes não devem ser
desprezados, e podem muitas vezes manifestar a mentalidade
religiosa dos fiéis. Por isso, as conferências episcopais e os ordi-
nários do lugar cuidem para que estes costumes, que podem favo-
recer a piedade, sejam ordenados do melhor modo possível com a
liturgia, estejam impregnados do seu espírito e a ela conduzam o
povo de Deus.
11. O domingo de Pentecostes conclui este sagrado período de
cinquenta dias, quando se comemora o dom do Espírito Santo
derramado sobre os apóstolos, os primórdios da Igreja e o início
da sua missão a todos os povos, raças e nações. Recomenda-se a
celebração prolongada da missa da vigília, que não tem um caráter
batismal como a vigília da Páscoa, mas de oração intensa segundo
o exemplo dos apóstolos e discípulos, que perseveravam unânimes
em oração juntamente com Maria, a Mãe de Jesus, esperando a
vinda do Espírito Santo.
12. “É próprio da festividade pascal que toda a Igreja se alegre pelo
perdão dos pecados, concedido não só àqueles que renascem no
santo Batismo, mas também aos que há tempo foram admitidos
no niímero dos filhos adotivos” (Paschalis Sollemnitatis, n. 108).
Mediante uma atividade pastoral mais intensa e maior empenho
espiritual da parte de cada um, com a graça do Senhor, será possível
a todos os que tenham participado nas festas pascais testemunhar
na vida o mistério da Páscoa celebrado na fé.
2º DOMINGO DA PÁSCOA

12 de abril de 2015
“VIMOS O SENHOR!"
Leituras: At 4,32-35; SI 117(118);
Jo 5,1-6; Jo 20,19-31

Situando-nos
À Liturgia da Igreja, nestes dias de Páscoa, não se cansa de falar-nos
da Ressurreição de Cristo. Toda a Palavra de Deus da Missa e da
Liturgia das Horas está organizada para celebrar este mistério. Com
isso a Igreja continua a missão dos apóstolos: “davam testemunho da
Ressurreição do Senhor Jesus” (primeira leitura).
Ressuscitando dos mortos, passando da morte para a vida, Jesus
transformou-se em fonte e meta de nossa caminhada missionária. Fonte
de todos os bens que Ele anunciou em sua pregação. Neste domingo,
indo ao encontro e manifestando-se vivo à comunidade dos discípulos,
Ele retoma o sopro original da criação e transmite-lhe a reconciliação
e a paz, dons de sua Páscoa. Mensagem muito oportuna para o Ano da
Paz, instituído pela CNBB para este ano de 2015. Ilumina também o
Domingo da Misericórdia, instituído por São João Paulo II.
Na celebração deste domingo, acontece para nós a mesma efu-
são do Espírito cujo relato ouviremos no Evangelho. Jesus se torna
presente no meio de nossa assembleia como esteve presente no meio
dos Onze reunidos oito dias depois da Páscoa; chega com as portas
fechadas, porque não vem do exterior, mas do interior; sua presença
nasce aqui no meio de nós, no sinal do pão e do vinho que se tornam
o Corpo e o Sangue do Ressuscitado. Ele nos repete: a paz esteja con-
vosco! Recebei o Espirito Santo.
o. “Bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristo!”

Recordando a Palavra
No primeiro dia da semana, logo após o pôr-do-sol, a comunidade dos
discípulos estava reunida num ambiente bem protegido, por medo das
autoridades dos judeus. No ar, pairavam temor e insegurança. Talvez
a notícia de Maria Madalena tivesse chegado aos seus ouvidos, mas
assim mesmo, estavam atemorizados. Somente a presença de Jesus
poderia restituir alegria e garantir segurança. Superando os limites do
espaço, o Ressuscitado coloca-se no meio deles, desejando a todos a
paz e mostrando-lhes os sinais de seu amor e de sua vitória.
No reencontro, o temor cede lugar à alegria. Superado o medo, o
Senhor os saúda novamente, enviando-os à missão. Sua paz os acom-
panhará no presente e no futuro, em meio às provações do mundo.
Para que deem continuidade à sua missão, Jesus confere aos seus esco-
lhidos o alento de vida, o seu Espírito, que os capacita para a missão. O
resultado será constituir comunidades libertas e reconciliadoras, como
testemunhas vivas do amor gratuito e generoso do Pai. Todavia, haverá
os que manifestarão sua adesão a Jesus e outros que se refugiarão numa
atitude de hostilidade.
Tomé, que era um dos doze, não participara do encontro comuni-
tário com o Ressuscitado. Ele ouve o testemunho unânime de todos:
“Vimos o Senhor!”, mas não acolhe o testemunho como prova sufi-
ciente para acreditar que Jesus esteja vivo. Ao contrário, exige prova
individual e extraordinária. Alguém poderia ver nisto uma atitude de
teimosia. Ocorre que o encontro com o Ressuscitado, que fundamenta
a fé, realiza-se mediante a experiência do amor na comunidade. Tomé
estava ausente! Entretanto, oito dias depois, a comunidade volta a se
reunir e, agora, Iomé está presente. O Senhor reaparece para a ale-
gria da comunidade e em seguida, dirige-se a Tomé revelando-lhe seu
amor nos sinais que traz nas mãos e no lado. O discípulo, sem ape-
lativos, reconhece o Ressuscitado e aceita-O, expressando sua adesão
total. “Meu Senhor e meu Deus!”, É, porém, censurado por não crer
no testemunho da comunidade e exigir uma experiência individual.
Roteiros homiléticos para a Páscoa BH

Na verdade, Tomé invertera a ordem, sem escutar os discípulos e


sem perceber a nova realidade criada pelo Espírito, queria encontrar-se
com o Jesus que conhecera na caminhada. Todavia, encontra-se com o
Senhor na experiência vivenciada pela comunidade de fé. Tomé reco-
nhece em Jesus o servo glorificado, acredita e proclama: “Meu Senhor
e meu Deus”. Porém, felizes serão os discípulos que acreditarão, sem
terem visto (Evangelho).
À experiência de amor da comunidade de fé no Senhor ressus-
citado manifesta-se no espírito de comunhão fraterna e na partilha
dos bens. “Ninguém considerava propriedade particular as coisas que
possuía, mas tudo era posto em comum”. Além disso, “Entre eles nin-
guém passava necessidade”. O encontro com o Ressuscitado requer
ruptura com as práticas egoístas e concentradoras, que geram a exclu-
são, a fome e todo tipo de necessidades. À comunidade, alicerçada
no amor fraterno e na partilha dos bens, constitui-se em testemunho
palpável da presença do Ressuscitado entre os seus discípulos ao longo
dos tempos (primeira leitura).
João sublinha que, pela fé em Cristo, os batizados tornam-se filhos
de Deus e, portanto, irmãos uns dos outros. Não se pode querer amar
a Deus, sem amar aqueles de quem ele é Pai. O sinal que atesta a cari-
dade fraterna (o amor aos irmãos) é a observância dos mandamentos
de Deus (segunda leitura).

Atualizando a Palavra
A exemplo das primeiras comunidades cristãs, reunimo-nos para
escutar a Palavra, rezar, participar da ceia do Senhor. É a comunidade
que tem como centro Jesus Cristo vivo e presente, crucificado e ressus-
citado. Sua presença suscita confiança e segurança. Desta presença,
emerge a força de vida que anima à missão de comunidade reconcilia-
dora, libertando as pessoas de tudo quanto as mantém subjugadas às
forças que geram medo e insegurança.
a “Bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristo!”

Como no P passado, , hoje muitas pessoas vivem de “portas tranca-


das”. Dominadas pelo medo e pela insegurança, aguardam por melho-
res dias de justiça e de paz. “A paz esteja com vocês!”. Assim como a
saudação do Ressuscitado restaurou a paz e a alegria na comunidade
dos discípulos, Ele, hoje, nos torna protagonistas da paz. “Eu tam-
bém envio vocês!”, assim a paz precisa ser conquistada, construída pelo
empenho de todos, no dia a dia, para que ela aconteça.
À comunidade que acolhe e manifesta sua adesão ao Senhor é
enviada pelo Espírito do Ressuscitado a testemunhar o amor do Pai,
isto é, a prolongar, no curso dos tempos, a oferta de vida que, em
Jesus, Deus fez à humanidade. O reino de vida que Cristo veio trazer
é incompatível com as situações desumanas de muitos abandonados,
excluídos e ignorados em sua miséria e dor. Se pretendemos fechar
os olhos diante dessas realidades, não somos defensores da vida do
Reino e nos situamos no caminho da morte: “Nós sabemos que pas-
samos da morte para a vida porque amamos os irmãos. Quem não
ama, permanece na morte” (1Jo 3,14; cf. DAp, n. 358). À aceitação ou
rejeição deste amor é, para a comunidade cristã, critério de discerni-
mento de seu empenho no serviço, na missão recebida de Jesus, para
que todos tenham vida e vida em plenitude.
Neste aspecto, a comunidade reunida contempla a glória do Res-
suscitado e o esplendor de seu amor. “Tocar suas mãos e seu lado” é
estar em comunhão com Ele e d'Ele receber o espírito de vida nova. À
contemplação dos sinais da vitória de Cristo ressuscitado e do amor fiel
pelos seus até o fim, impulsiona a comunidade à missão. As inúmeras
iniciativas na perspectiva da promoção humana, da solidariedade e da
busca de soluções face à realidade desumana em que vivem milhões de
nossos irmãos e irmãs, devem ser animadas pelo amor do Pai que nos fez
todos seus filhos e irmãos, em Jesus Cristo sob a ação do Espírito Santo.
À comunidade eclesial é, portanto, o lugar primordial onde, na fé,
se acolhe e se reconhece a presença e a atuação do Ressuscitado, onde
se manifesta e se irradia seu amor. Tomé é o protótipo daqueles que
não valorizam o testemunho comunitário e são insensíveis aos sinais da
presença do novo, pois estão surdos e indiferentes aos apelos de vida
Roteiros homiléticos para a Páscoa BR

que se revelam na sociedade. Pensam apenas em si mesmos e exigem


demonstrações particulares. Tomé é um exemplo contra o qual é preciso
precaver-se. O mais importante, porém, é que ele supera esta dificul-
dade e é capaz de professar a fé no ressuscitado.
Jesus alerta que a fé nos liberta do isolamento do eu, porque nos
conduz à comunhão. Ser cristão, hoje, requer e significa pertencer a uma
comunidade concreta na qual se pode viver uma experiência permanente
de discipulado e de comunhão. À figura de Tomé é eloquente para os
nossos dias, pois diante da tentação, muito presente na cultura atual, de
ser cristão sem Igreja e das novas buscas espirituais individualistas, afir-
mamos que a fé em Jesus Cristo nos chegou pela comunidade eclesial.
Não há, portanto, discipulado sem comunhão (cf. DAp, n. 156).
O Ressuscitado nos assegura “Bem-aventurados os que não viram,
e creram” (Jo 20,29). Felizes são aqueles que aderem à pessoa de Jesus
no cotidiano da vida e empenham-se totalmente na esperança de um
novo mundo. Crer, na perspectiva do quarto Evangelho, é mais do que
uma atividade intelectual. Crer é entregar-se ao Outro e empenhar-
-se por inteiro à sua causa. Crer é ir até as últimas consequências com
Aquele por quem se optou. Crer é estabelecer com Ele uma relação
pessoal que se transforma em amor. Crer é abrir os olhos para reco-
nhecer no Ressuscitado o sentido da vida: “Meu Senhor e meu Deus!”
Ter fé é vida, é amar, é agir de forma concreta na história a partir
de Jesus Cristo ressuscitado a quem se aderiu como discípulo. Nessa
profunda e viva adesão a Cristo, é que seremos discípulos felizes. Não
vimos, mas cremos! Tomé, rogai por nós.

Ligação da Palavra com a ação eucarística


“Era o primeiro dia da semana”, “A multidão dos fiéis era um só
coração e uma só alma”, O domingo é o dia da reunião da comuni-
dade. Os cristãos, ao longo dos séculos, sempre sentiram esse dia
como o “primeiro da semana”, porque nele se faz memória da novidade
radical trazida por Cristo. Por isso, o domingo é o dia em que o cristão
reencontra a forma eucarística própria da sua existência, segundo a qual
“Bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristo!”

é chamado a viver constantemente: viver segundo o domingo, significa


viver consciente da libertação trazida por Cristo e realizá-la como
oferta de si mesmo, para que a sua vitória se manifeste plenamente a
todos através de uma conduta intimamente renovada (cf. SC, n. 72).
À comunidade de fé edifica-se pela participação daqueles que
creem na presença e aderem ao novo inaugurado pelo Ressuscitado. A
Eucaristia é o lugar privilegiado do encontro dos discípulos com Jesus
Cristo. O Ressuscitado nos atrai para si e nos faz entrar no dinamismo
das relações com Deus e com o próximo.
Em cada Eucaristia, os cristãos celebram e assumem o misté-
rio pascal. Portanto, os fiéis devem viver sua fé na centralidade do
mistério pascal de Cristo através da Eucaristia, de maneira que toda
a sua vida seja cada vez mais eucarística. À Eucaristia, fonte inesgo-
tável da vocação cristã, é, ao mesmo tempo, fonte inextinguível do
impulso missionário (cf. DAp, n. 251). Ela ainda, “impele todo o
que acredita em Jesus ressuscitado a fazer-se 'pão repartido" para os
outros e, consequentemente, empenhar-se por um mundo mais justo
e fraterno” (SC, n. 88).
“Ninguém considerava seu o que possuía, mas tudo era comum
mo . . » ç
entre eles... e não havia necessitados entre eles” (At 4,32.34). À Igreja
como comunidade de amor, nutrida com o pão da Palavra e com o pão
do Corpo de Cristo, além de testemunhar e promover a caridade, deve
denunciar as situações indignas em que vivem milhões de pessoas, as
quais morrem à míngua de alimento por causa da injustiça e da explo-
ração (cf. SC, n. 90).

Sugestões para a celebração


1. Preparar de forma festiva o ambiente, dando destaque ao Círio
Pascal e à pia batismal, com muitas flores e a cor branca ou amare-
lada nas vestes e toalhas.
2. Acolher, com alegria fraterna, os irmãos e irmãs que chegam para
tomar parte na celebração.
3. Aspergir a assembleia, no Ato Penitencial, com a água que foi
Roteiros homiléticos para a Páscoa

abençoada na Vigília Pascal, ajudando a comunidade a aprofundar


sua consagração batismal. No ato da aspersão, a comunidade pode
cantar: “Banhados em Cristo, somos uma nova criatura. Às coisas
antigas já se passaram, somos nascidos de novo. Aleluia p?
4. Solenizar a proclamação do Evangelho, precedido do canto do
Aleluia. Se oportuno, o Evangelho pode ser cantado. O Evange-
liário pode ser incensado:
5. Sublinhar, na procissão dos dons para a Eucaristia, a oferta de
outros dons, como alimentos e roupas para serem distribuídos aos
pobres — “Ninguém considerava propriedade particular as coisas
que possuía, mas tudo era posto em comum”, “Entre eles ninguém
passava necessidade”,
6. Possibilitar a comunhão sob as duas sagradas espécies para todos
os comungantes.

7. Abençoar e enviar os irmãos e irmãs com a bênção final própria


para o Tempo Pascal, conforme Missal Romano, p. 523.
Valorizar o 8 gesto de paz,
paz, neste “Ano da Pp paz”: Somos da Paz!
9. Fazer uma prece especial pela 532 Assembleia Geral da CNBB,
que será realizada de 14 a 25 de abril, em Aparecida (SP) e será
uma Assembleia eletiva, ou seja, haverá a escolha da nova Presi-
dência da entidade para o próximo quadriênio (2015-2019).
Haverá também a revisão das Diretrizes Gerais da Ação Evange-
lizadora da Igreja no Brasil (DGAE).
3º DOMINGO DA PÁSCOA

19 de abril de 2015
“SOU EU MESMO! TOCA! EM MIM E VEDE!”

Leituras: At 3,13-15.17-19; Sl 4;
Jo 2,1-5a; Lc 24,35-48

Situando-nos
O Tempo Pascal nos ajuda a aprofundar o mistério da Páscoa, a entrar
mais profundamente nele. Este já é o terceiro domingo que temos para
fazer essa verdadeira mistagogia.
Como aos discípulos reunidos, hoje o Senhor apresenta-se a nós,
para mostrar a identidade entre o Crucificado e o Ressuscitado: “Vede
minhas mãos e meus pés: sou eu mesmo!” (Lc 24,39).
Uma ênfase da celebração de hoje deve ser a certeza da presença de
Deus, em Cristo, na comunidade e no mundo. “A nossa cultura perdeu
a noção desta presença concreta de Deus, da sua ação no mundo; pen-
samos que Deus Se encontra só no além, em outro nível de realidade,
separado das nossas relações concretas”.!
No dia do Índio, entremos em comunhão com estes nossos irmãos
tão marginalizados pela nossa sociedade.

Recordando a Palavra
No Evangelho de Lucas (24,35-48), temos uma narrativa que ajuda
a compreender a identidade de Jesus Ressuscitado. Ela está situada
após o episódio da caminhada dos dois discípulos para Emaús, donde
voltam correndo para anunciar à comunidade reunida o encontro com
o Senhor vivo.

18 Lumen Fidei. Carta Encíclica do Papa Francisco sobre a fé, n. 21.


Roteiros homiléticos para a Páscoa BH

À própria ressurreição dá a identidade nova de Jesus, que foi difícil


de ser assimilada pela comunidade dos discípulos. Podem-se perceber
dois momentos dessa perícope: os versículos 35-43 tratam da identi-
dade corporal, visível de Jesus; já em 44-48 temos o sentido da identi-
dade plena de Cristo, a partir da sua ressurreição.
Jesus mesmo é quem se revela. Aliás, as aparições do Ressuscitado
não podem ser provocadas, mas elas acontecem sempre por iniciativa
d'Ele. Há uma ênfase em mostrar que Jesus não é um fantasma, como
eles pensavam, já que Ele apareceu inesperadamente. E não esqueça-
mos que há pouco o tinham visto morto e sepultado, o que torna mais
difícil crer que esteja vivo e presente ali entre eles.
Com a finalidade de esclarecer que não é um fantasma, Jesus mos-
tra as marcas da cruz nas mãos e nos pés, o que ainda não dirimiu as
dúvidas. Pediu, então, algo para comer. E comeu um pedaço de peixe
assado que lhe deram. Um fantasma não poderia comer.
Vamos agora ao segundo momento da perícope, onde Jesus revela-
-se como cumprimento das Escrituras (Escrituras são o que nós desig-
namos Antigo Testamento). O que se quer mostrar aqui é que o Mis-
tério Pascal de Cristo é ponto alto para onde se conduz a história do
Povo de Deus. Agora, pelo anúncio da morte e Ressurreição de Cristo
e pela fé em seu nome, acontecem a conversão e o perdão dos pecados.
Um elemento ainda: a destinação da salvação é universal, para todas as
nações, a começar por Jerusalém.
O discurso de Pedro, relatado nos Atos dos Apóstolos, insere-se
na mesma perspectiva. Lembremos que Lucas é o autor também desse
livro, donde a identidade de ótica com o Evangelho de hoje.
Pedro mostra que quem agiu na Ressurreição de Jesus é o Deus de
Israel, e que sua morte e Ressurreição são cumprimento das profecias
antigas. Pedro atenua a culpa do povo, alegando a ignorância com a
qual agiram. E aproveita para o principal: chamar à conversão, donde
resultará o perdão dos pecados. Percebamos que a conclusão é seme-
lhante à do Evangelho de hoje: todos são chamados à conversão.
Ao “Bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristo!”

O Salmo 4 é cantado em perspectiva cristológica: “compreendei


que nosso Deus faz maravilhas por seu servo” (v. 4). Em alusão à Res-
surreição de Cristo, pede-se no refrão que o Senhor faça brilhar sobre
nós o esplendor de sua face.
À segunda leitura, da Primeira Carta de João, exorta a comuni-
dade a corresponder ao amor de Deus em Cristo. Mostra Cristo como
Defensor nosso junto do Pai. Ele que libertou-nos do pecado por sua
morte, intercede por nós ao Pai. O autor recorda que conhecer Deus —
que é praticamente sinônimo de “amar a Deus” — desemboca em viver
os mandamentos de Deus. À verdade está em quem guarda a palavra
de Deus e, vivendo-a, realiza em si o amor.

Atualizando a Palavra
Muitos já devem ter se perguntado: será que tudo o que cremos
a respeito de Jesus não é uma invenção, ilusão ou farsa? Parece que
Lucas, antevendo essa dúvida nossa, escreveu o seu Evangelho. Vale
a pena retomar os versículos 1-4 do primeiro capítulo de Lucas, onde
ele deixa claro que investigou antes de escrever, procurando encontrar
solidez no que vai ensinar. E de onde vem essa solidez? Das testemu-
nhas oculares da vida, da morte e da Ressurreição de Cristo.
À comunidade dos discípulos demorou a crer. Não estava espe-
rando Jesus aparecer. Pelo contrário, quando Jesus aparece, eles per-
sistem na dúvida. Esse elemento é fundamental: o anúncio do Ressus-
citado não parte de uma produção mental, de um transe coletivo dos
discípulos. O anúncio do Ressuscitado parte de uma experiência real
de encontro com Ele. Esse encontro transformou a vida dos Apóstolos
e dos discípulos que estavam com eles.
Outro aspecto forte da Palavra de Deus é que Jesus Ressuscitado
não é fantasma, mas é um ser concreto, embora com uma identidade
material distinta da nossa: não está preso aos limites do tempo e do
espaço e, ao mesmo tempo, não é um fantasma, pois pode ser tocado e
se alimenta, para mostrar sua presença real.
Roteiros homiléticos para a Páscoa

Há muitas experiências de fé que parecem crer num Jesus fan-


tasma, puro espírito, não mais humano. À esse respeito, alerta-nos o
Papa Francisco na Evangelii Gaudium, n. 89: “Mais do que o ateísmo,
o desafio que hoje se nos apresenta é responder adequadamente à sede
de Deus de muitas pessoas, para que não tenham de ir apagá-la com
propostas alienantes ou com um Jesus Cristo sem carne e sem compro-
misso com o outro”.
O Evangelho e a primeira leitura terminam em perspectiva de
futuro, olhando para aqueles que vão crer em Jesus Cristo Ressus-
citado que, pela sua morte, livra-nos do pecado. Aqui cabe falar da
necessidade de não enxergar a ressurreição como um acontecimento
estático, como um fato do passado. Ela é dinâmica, é sempre agora, ela
segue a nos tocar com a graça de Deus que nos renova.

Ligando a Palavra com a ação eucarística


Nossas assembleias litúrgicas se reúnem na certeza da presença do
Cristo Ressuscitado. Contudo, não é fácil crer nessa presença. Nós a
confessamos logo ao início da celebração, bendizendo a Deus por nos
ter reunido no amor de Cristo. Dissemos, também, diversas vezes, que
o Senhor está no meio de nós!
“Com a saudação de bênção, mesmo a mais simples: “O Senhor
esteja convosco”, o celebrante 'anuncia à comunidade reunida a pre-
sença do Senhor (IGMR, n. 36). À liturgia é um mistério de recíproca
presença: o Senhor em meio a seu povo e o povo reunido perante sua
face para servi-lo”.
Essa presença real de Cristo precisa ser sempre reafirmada, para
não fazermos da celebração apenas um encontro nosso para lembrar
de Jesus, e celebrar a Páscoa como se fosse algo do passado. À Euca-
ristia alimenta em nós a certeza da presença do Senhor e da sua
vitória sobre a morte.

19 Boselli, Gofredo. O Sentido Espiritual da Liturgia. Brasília: Edições CNBB, 2014, p. 33.
A “Bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristo!”

Sugestões para a celebração


1. Dia 25 de abril, celebramos o Dia de São Marcos, o evangelista do
ano B, que estamos acompanhando neste ano de 2015. O Evan-
gelho de Marcos, o mais antigo dos evangelhos, tem o modelo do
“primeiro anúncio” (querigma), proclama que Jesus é o Messias,
como mostram suas obras, porém, não segundo as expectativas
preconcebidas das pessoas, mas segundo o pensamento de Deus,
que supera infinitamente as expectativas humanas: Jesus é o
Messias não para dominar, mas para servir e dar a sua vida. Por
isso, em vez de se intitular Messias, ele prefere falar de si como o
“Filho do Homem”.
Aspergir a assembleia com a água, rezando a oração de bênção
conforme o Iempo Pascal (Missal Romano, p. 1002). O rito da
aspersão, que substitui o ato penitencial, ajuda aos batizados a
renovarem e aprofundarem o Batismo. À aspersão deve ser acom-
panhada de um canto adequado.
Dar realce ao gesto da Fração do Pão. Cristo, nossa Páscoa, é o
Cordeiro imolado, Pão vivo e verdadeiro.
Possibilitar a comunhão sob as duas sagradas espécies para toda a
assembleia.
Usar a bênção final própria para o Tempo Pascal, conforme o
Missal Romano, p. 523.
Destacar a oração e o gesto de paz neste ano dedicado à paz:
Somos da Paz!
Fazer uma prece especial pela 532 Assembleia Geral da CNBB,
que será concluída no dia 25 de abril, em Aparecida (SP).
4º DOMINGO DA PÁSCOA

26 de abril de 2015
TENHO O PODER DE DAR A MINHA VIDA E DE RECEBÊ-LA NOVAMENTE!

Leituras: At 4,8-12; Sl 118; 1Jo 3,1-2; Jo 10,11-18

Situando-nos
Os cinquenta dias do Tempo Pascal não são uma celebração cronoló-
gica, em que vamos recordando sucessivamente acontecimentos
distintos (aparições, Ascenção, Pentecostes). É um tempo que quer nos
fazer entender e celebrar melhor o Mistério de Cristo e entrar na sua
Páscoa, que continua viva em nossa história.
A mestra para esse caminho é a própria celebração, com seus textos
bíblicos, orações, cantos, pregação: através de tudo isso o Espírito Santo
vai conduzindo-nos à profundidade da Vida de Cristo, o Bom Pastor.
Nesse 4º Domingo da Páscoa, chamado também de Domingo do
Bom Pastor, olhamos para o Pastor exemplar: Jesus. À partir desse
olhar, percebemos a necessidade de Pastores verdadeiros para a cons-
trução do Reino de Deus. Pastores que cuidem do rebanho e reúnam
as ovelhas que não estão no redil da Igreja. Por isso, rezamos pelas
vocações, especialmente as vocações ao ministério ordenado.
O texto do Evangelho de hoje, proferido por Jesus antes da Pás-
coa, encontra nela sua plena realização: a entrega da vida sem perdê-la!
E o grande mistério da Ressurreição, que só pode ser vivida na fé e no
amor a Deus e aos irmãos.

/
/
Recordando a Palavra
Dentro do capítulo 10, sobre o pastoreio, temos a passagem do
Evangelho de hoje, segundo João. Encontramos três subdivisões nesse
a “Bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristo!”

texto, que Konings intitula “O pastor exemplar (vv. 11-18)”. Vejamos


a estrutura do texto: “a) Eu sou o pastor exemplar e empenho a vida
pelas ovelhas; o assalariado foge e deixa o rebanho dispersar-se (vv.
11-13); b) Eu sou o pastor exemplar e empenho a vida pelas ovelhas,
e reúno as ovelhas também de outros lugares (vv. 14-16); c) O sentido
profundo de empenhar (dar) a vida (v. 17-18)7.2º
Jesus se autoproclama o “Bom Pastor”. Os exegetas afirmam que
a tradução exata do grego não seria “bom”, mas belo, nobre, valente,
adequado, acertado, exemplar, excelente. “Bom” não está aqui no sen-
tido moral, mas no sentido de Jesus ser o pastor exemplar, como devem
ser todos os pastores. Jesus apresenta a diferença que há entre um pas-
tor assalariado e ele: o assalariado não se importa com as ovelhas, por-
que elas não são suas; o pastor-proprietário depende das ovelhas para
viver, não é nada sem elas.
O texto prossegue com a explicação da comunhão que há entre
Jesus e as ovelhas, fundamentada na comunhão anterior: Jesus e o Pai.
É por causa da comunhão com o Pai e com as ovelhas que Jesus empe-
nha — dá, arrisca — sua vida por elas. E continua: o pastor exemplar
não se ocupa apenas com as ovelhas que já estão perto, mas ele quer
abranger todas. Temos, como no domingo passado, o tema do univer-
salismo da salvação.
Fecha-se o texto com o tema do amor, que não é um amor sim-
plesmente sentimental. À fonte do amor de Jesus é o Pai. O Pai ama
Jesus; Jesus ama os que são do Pai ao ponto de entregar a sua vida por
eles. Por isso Jesus fala da entrega livre que faz da própria vida.
O texto dos Atos dos Apóstolos mostra uma leitura em perspectiva
cristológica da passagem de Isaías 28,16: “Por isso diz o Senhor Deus:
Colocarei no monte Sião uma pedra, pedra testada, pedra angular
de valor, para alicerce seguro: quem nela confiar, não ficará abalado”,
Também o Salmo de hoje (117) fala da pedra que os pedreiros rejeita-
ram, e que tornou-se agora a pedra angular (v. 22).

20 KONINGS, Johan. Evangelho segundo João — amor e fidelidade. São Paulo: Loyola, 2005, p. 204.
Seguimos este exegeta na reflexão desta perícope.
Roteiros homiléticos para a Páscoa

Pedro faz o anúncio explícito da morte e Ressurreição de Cristo,


rejeitado por Israel e ressuscitado por Deus. E nele que se encontra a
salvação, e em nenhum outro.
Relacionando a primeira leitura com o Evangelho, vemos que
Cristo, pela sua paixão — vida entregue pelas ovelhas — se torna a pedra
que sustenta a salvação.
Pela fé em Jesus Cristo nos tornamos filhos de Deus. Isso é um
presente de amor recebido do Pai. Além de sermos chamados assim,
o somos de fato! É o que atesta a Primeira Carta de João. O amor de
Deus em Cristo já nos dá uma identidade nova, mas ainda não total-
mente manifesta neste mundo. Na parusia, quando Jesus se manifes-
tar, nos veremos semelhantes a Ele, contemplando-o como Ele é.

Atualizando a Palavra
Aos que vão pregar esta palavra, sugerimos começar pelo confronto
da própria vida com ela. O Papa Francisco recorda que “quem quiser
pregar, deve primeiro estar disposto a deixar-se tocar pela Palavra e
fazê-la carne na sua vida concreta”.*! Devemos nos perguntar se somos
pastores assalariados ou pastores que amam as avelhas a ponto de se
entregar por elas; qual nossa proximidade com as ovelhas? E as que
estão fora do redil, são ainda de nosso interesse?
À atualização da Palavra, neste Domingo do Bom Pastor, parte
sempre da exemplaridade de Cristo: Ele é a referência e nosso critério
de avaliação pessoal, comunitária e eclesial. Todo pastoreio autêntico
precisa nascer do amor e da comunhão com o Pai. Dessa comunhão
passamos à reciprocidade humana no amor. É isso é que impulsionará
à entrega livre da vida pelo outro.
Nosso tempo está saturado de palavras, mas carece de exemplos, de
testemunhos autênticos, motivadores. Corremos a tentação de nos con-
tentar com uma comunidade que seja um pequeno rebanho, desistindo
de ter a esperança da unidade de todas as ovelhas ao redor do Pastor.

21 EG, n. 150.
68: “Bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristo!”

Gastar a vida, entregar a vida no pastoreio é o prolongamento da


missão de Cristo Ressuscitado. Sua Páscoa realiza o que está anunciado
neste Evangelho: entrega da vida para recebê-la novamente. Só uma
confiança inabalável na ação de Deus é que pode motivar a entrega da
vida sem frustração, medo ou reserva.
Nossa ação cristã, como a de Pedro, é dar vida, curar, salvar. E não
por nossa força ou mérito, mas pela graça de Cristo, o Salvador. Nova-
mente o Papa Francisco nos exorta: “A Ressurreição de Cristo produz
por toda a parte rebentos deste mundo novo; e, ainda que os cortem,
voltam a despontar, porque a Ressurreição do Senhor já penetrou a
trama oculta desta história; porque Jesus não ressuscitou em vão. Não
fiquemos à margem desta esperança viva!”.*

Ligando a Palavra com a ação eucarística


À assembleia litúrgica se reúne por convocação de Deus. É Ele que nos
reúne no amor de Cristo. É característica essencial do Cristianismo a
dimensão eclesial: não vivemos a fé sozinhos, mas formamos povo,
Igreja, rebanho. Não é uma coletividade que absorve o indivíduo, mas
lhe dá plena identidade.
“Só há liturgia cristã quando o povo de Deus está reunido. Por-
tanto, condição de possibilidade de cada ação litúrgica é a convocação
do povo. (...) À tal chamado o povo responde, reunindo-se em assem-
bleia: nisso consiste o primeiro ato litúrgico do povo”.%
O rebanho se reúne ao chamado do Pastor. Na Eucaristia, o Pas-
tor exemplar, o Bom Pastor alimenta as suas ovelhas: dá-lhes sua Pala-
vra e seu Pão, dá-se como alimento. O Pai o ama por isso: porque Ele
dá a vida por suas ovelhas.
O presente de amor recebido do Pai é esse: sermos filhos seus, ali-
mentados por Ele. Pedro nos recorda que não há salvação fora de Jesus.
À celebração eucarística proclama a todo o mundo a paixão, morte e
Ressurreição do Senhor, fonte de nossa salvação.

22 EG, n. 278.
23 Boselli, Gofredo. O Sentido Espiritual da Liturgia. Brasilia: Edições CNBB, 2014, p. 100.
Roteiros homiléticos para a Páscoa na

Sugestões para a celebração


1. Lembrar aos fiéis que na próxima sexta-feira celebraremos o
dia de São José Operário e também o Dia do Trabalho e do(a)
Trabalhador(a). Lembrando que São José tem como missão prin-
cipal ser “guardião” de Jesus e Maria, pede-nos o Papa Francisco:
“Queria pedir, por favor, a todos que ocupam cargos de responsabi-
lidade em âmbito econômico, político ou social, a todos os homens e
mulheres de boa vontade: sejamos 'guardiães' da criação, do desígnio
de Deus inscrito na natureza, guardiães do outro, do ambiente; não
deixemos que sinais de destruição e morte acompanhem o caminho
deste nosso mundo! Mas, para “guardar, devemos também cuidar
de nós mesmos. Lembremo-nos de que o ódio, a inveja, o orgulho
sujam a vida; então guardar quer dizer vigiar sobre os nossos senti-
mentos, o nosso coração, porque é dele que saem as boas intenções
e as más: aquelas que edificam e as que destroem. Não devemos ter
medo de bondade, ou mesmo de ternura.
À propósito, deixai-me acrescentar mais uma observação: cuidar,
guardar requer bondade, requer ser praticado com ternura. Nos
Evangelhos, São José aparece como um homem forte, corajoso, traba-
lhador, mas, no seu íntimo, sobressai uma grande ternura, que não é
a virtude dos fracos, antes pelo contrário denota fortaleza de ânimo
e capacidade de solicitude, de compaixão, de verdadeira abertura ao
outro, de amor. Não devemos ter medo da bondade, da ternura!”
(Papa Francisco Homilia na Solenidade de São José, 2013).
Concluída a homilia, renovar as promessas batismais. No lugar
do Credo, a comunidade é convidada a renovar suas promessas
batismais (cf. fórmula da Vigília Pascal, Missal Romano, p. 289).
Caso a aspersão com água benta não tenha sido realizada em subs-
tituição ao ato penitencial, pode ser efetuada, após a renovação das
promessas batismais.
Nas preces da comunidade incluir a oração pelas vocações, em
especial, atendendo ao pedido do Papa Francisco, rezemos pela
vida consagrada, neste ano a ela dedicado.
5º DOMINGO DA PÁSCOA

3 de maio de 2015
"PERMANECE! EM MIM E EU PERMANECEREI EM VÓS!"

Leituras: At 9,26-31; Sl 22; 1Jo 3,18-24; Jo 15,1-8

Situando-nos
Tendo celebrado recentemente o dia de São José Operário, padroeiro
de todos os trabalhadores, seguimos nossa caminhada pascal.
Caminhada esta que nunca se encerra, mas sempre se aprofunda.
À liturgia de hoje, centrada no Evangelho de João, convida-nos
a permanecer em Cristo. Somos os ramos da videira verdadeira, cul-
tivada pelo Pai.
A relação com Deus, contudo, não é uma relação intimista,
fechada. E relação aberta, que resulta em frutos de amor: nisto meu
Pai é glorificado: que deis muito fruto e vos torneis meus discípulos.
Saulo teve dificuldades para ser incorporado ao corpo eclesial.
Precisou conquistar a confiança da comunidade cristã.
À Primeira Carta de João lembra-nos que o amor exige ações,
acolhida, verdade. À prática dos mandamentos decorre de um amor
autêntico.
Assim como Maria, cujo mês a ela dedicado hoje iniciamos,
peçamos que ela nos conduza nos caminhos de seu Filho ressuscitado.

Recordando a Palavra
O texto do Evangelho de hoje (Jo 15,1-8) prosseguirá no próximo
domingo (Jo 15,9-17). “15,1-17 constitui uma meditação sobre o
amor cristão. O ponto de partida é a alegoria da videira (vv. 1-8);
depois, a meditação continua aprofundando o mistério do amor de
Roteiros homiléticos para a Páscoa =

Deus em Jesus Cristo e nossa missão de frutificar no amor fraterno


(vv. 9-17)".24
Estamos diante de uma alegoria. Jesus se apresenta como a videira
verdadeira, e o Pai é apresentado como o agricultor. Há uma ênfase no
termo “verdadeira”. Isso denota que há outras videiras, não verdadei-
ras. Bem sabemos que a videira foi utilizada como imagem do povo de
Israel, em textos do Antigo Testamento. Jesus assume para si a identi-
dade de videira de Deus: nele, e não mais em Israel, está a fidelidade
verdadeira ao Pai.
Há uma diferença notável: o Pai não é apenas o dono da vinha,
mas é o agricultor, aquele que trabalha na vinha, para que produza
frutos. Um desses trabalhos é podar, limpar os ramos. É Jesus mostra,
no v. 3, que é a sua Palavra que “limpa” os discípulos que a ouvem.
Destaque merece também o verbo “permanecer”. Ele aparece 8
vezes; em 7 vezes fala diretamente da relação entre Jesus e os fiéis.
“Permanecer em Jesus” exige da parte do discípulo uma fidelidade que
domina o decorrer do tempo, e o olhar se volta para além, para o fruto
a produzir do qual a união com o Filho é a condição”.? Fica claro que
havia pessoas na comunidade cristã sem toda a firmeza na profissão de
fé em Jesus, a razão da ênfase no permanecer.
Quem não crê de verdade em Jesus é um ramo morto, desligado
do tronco e que, obviamente, não produzirá frutos. Quais são os frutos
esperados? O amor ao próximo (cf. vv. 16-17).
As palavras de Jesus que permanecem em nós significam ele
mesmo presente em quem crê. Essa é a garantia de podermos pedir
ao Pai, porque seu Filho está em nós, presente em sua palavra que
acolhemos com fé.
À primeira leitura fala da integração de Paulo ao grupo dos após-
tolos, em Jerusalém. E isso acontece não sem dificuldades. À leitura
mostra a transformação ocorrida em Saulo devido ao seu encontro com

24 KONINGS, Johan. Evangelho segundo João — amor e fidelidade. São Paulo: Loyola, 2005, p. 282.
25 LÉON-DUFOUR, Xavier. Leitura do Evangelho segundo João III. São Paulo: Loyola, 1996, p. 119.
“Bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristo!”

o Cristo Ressuscitado. De perseguidor a anunciador do Evangelho,


coloca sua vida em risco, porque agora os judeus de língua grega que-
riam matá-lo.
Lucas conclui a narrativa com um resumo: Paulo afastado de Jeru-
salém e o retorno da paz. À Igreja cresce e envolve agora comunidades
da Judeia, da Galileia e da Samaria.
À Primeira Carta de João segue no núcleo central da vida cristã:
o amor que se expressa em ações concretas. O ser humano comparece
diante de Deus de maneira transparente. Não há como mentir ou se ocul-
tar diante dele. Se nós amamos de verdade não há inquietação ou medo.
O princípio motivador do amor é a fé, que nos vincula a Deus.
Como Deus é amor, o fruto da fé é o amor mútuo. Volta o verbo per-
manecer, já presente no Evangelho de hoje. Deus está conosco pelo
seu Espírito. A nossa união com Deus está garantida. Falta enfatizar a
nossa união mútua, consequência da presença de Deus em nós. Cum-
prir os mandamentos é amar.

Atualizando a Palavra
O Tempo Pascal aprofunda a centralidade do Ressuscitado na vida da
Igreja. Todos os que creem estão unidos a ele. Sem isso não é possível
produzir frutos. Há um risco de nós querermos ser videiras desligadas
de Cristo. Atenção para o perigo de colocar alguma pessoa, grupo ou
devoção particular como tronco ao qual nos vinculamos. Não é assim.
A centralidade é de Cristo. É dele que vem a vida.
Outro aspecto da vida eclesial a ser iluminado por essa palavra
pode ser a tão falada e procurada conversão pastoral. À conversão pas-
toral da Igreja é deixar-se limpar e podar pelo divino agricultor. Não
somos uma vinha pronta, perfeita. Precisamos de limpeza e de poda,
o que às vezes dói.
À esse respeito nos exortam os Bispos do Brasil: “A expressão
“conversão pastoral" remete, acima de tudo, a uma renovada conver-
são a Jesus Cristo, a qual consiste no arrependimento dos pecados, no
Roteiros homiléticos para a Páscoa A

perdão e na acolhida do dom de Deus (cf. At 2,38ss.). Trata-se de uma


conversão pessoal e comunitária. Há muitos batizados e até agentes de
pastoral que não fizeram um encontro pessoal com Jesus Cristo, capaz
de mudar sua vida para se configurar cada vez mais ao Senhor”.
Como está nossa pertença a Cristo? Permanecemos nele? Deixa-
mos que sua palavra nos limpe?
A comunidade primitiva não é perfeita. Vemos no texto dos Atos
dos Apóstolos a relutância em aceitar Paulo no seio da comunidade.
Ainda não se estabeleceu uma relação de confiança. Ele, por outro
lado, empenha-se com todo ímpeto no anúncio irrestrito de Cristo,
colocando em perigo a própria vida. Seu caminho se assemelha ao de
Cristo, que põe a vida em risco. Contudo, Paulo foge do conflito, não
por covardia, mas para ser fiel à missão de continuar o anúncio.
Nossas comunidades recebem como as pessoas convertidas, que
fazem experiências marcantes de encontro com o Ressuscitado? Não
há também entre nós desconfiança, resistência, preconceito? É claro
que a fé supõe um amadurecimento, uma inserção comunitária. Con-
tudo, não podemos deixar de acolher. Cuidemos para não criar oposi-
ção entre membros antigos e membros novos na comunidade.
O critério de verificação para a autenticidade de nossa fé é o amor
fraterno; a Primeira Carta de João o evidencia. O amor cristão está
bem presente nas palavras que proferimos, nas músicas que cantamos,
nos textos que escrevemos. Mas não basta! É preciso amar com ações
e de verdade. À Igreja no Brasil fala claramente sobre isso: “O amor
ao próximo, radicado no amor de Deus, é um dever de toda a comu-
nidade eclesial”.?” E, para que não fiquemos com dúvidas sobre como
viver esse amor, as indicações são concretas: “As paróquias precisam
acolher fraternalmente todos, especialmente os que estão caídos à
beira do caminho. Dependentes químicos, migrantes, desempregados,
dementes, moradores de rua, sem-terra, soropositivos, doentes e idosos

26 CNBB. Comunidade de Comunidades: uma nova paróquia. A conversão pastoral da paróquia.


Brasília Ano: 2014. Edições CNBB, n. 52.
27 CNBB. Comunidade de Comunidades: uma nova paróquia. À conversão pastoral da paróquia.
Brasília Ano: 2014. Edições CNBB, n. 282.
“Bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristo!”

abandonados são alguns rostos que clamam para que a comunidade


lhes apresente, concretamente, atitudes do Bom Samaritano”.

Ligando a Palavra com a ação eucarística


A Eucaristia é o canal excelente por onde nos chega a seiva do amor de
Deus, que nutre nossa vida e nos permite produzir bons frutos.
À dinâmica profunda da comunhão eucarística nos ajuda a perceber
como a Eucaristia faz com que permaneçamos unidos a Cristo e, assim,
produzamos os frutos que Ele espera. “São dois corpos colocados aqui
em relação: o corpo eucarístico e o corpo eclesial. Um é direcionado ao
outro: o fim próprio do corpo eucarístico é formar o corpo eclesial, de
modo que a verdade do corpo eucarístico é o corpo eclesial”.?
A Palavra de Deus nos limpa e poda para que possamos frutificar.
A Eucaristia nos nutre com a seiva do amor divino, para que produza-
mos os frutos de Deus no mundo. À celebração vivida autenticamente
nos ajuda a permanecer no amor de Cristo, unidos ao Pai.

Sugestões para a celebração


1. Aspergir a assembleia com a água, rezando a oração de bênção
conforme o Tempo Pascal (Missal Romano, p. 1002). O rito da
aspersão, que substitui o ato penitencial, ajuda os batizados a reno-
varem e aprofundarem sua união vital com Cristo pelo Batismo. A
aspersão deve ser acompanhada de um canto adequado.
2. Solenizar a proclamação do Evangelho, precedida do canto do
Aleluia. Se oportuno, o Evangelho pode ser cantado. O Evange-
liário pode ser incensado.
3. “O tempo pascal não é apenas um período constelado de Aleluia,
no qual a liturgia desenvolve mais profundamente os temas do
mistério pascal; é um tempo diferente dos outros, como um

28 CNBB. Comunidade de Comunidades: uma nova paróquia. À conversão pastoral da paróquia.


Brasília Ano: 2014. Edições CNBB, n. 283.
29 Boselli, Gofredo. O Sentido Espiritual da Liturgia. Brasília: Edições CNBB, 2014, p. 110.
Roteiros homiléticos para a Páscoa

dia celeste, um dia de eternidade, inserido na trama do tempo


terreno; e, durante este dia celeste (cuja duração é de cinquenta
dias terrenos), a Igreja faz a experiência, nos limites do possível,
da vida eterna, da vida glorificada, na qual já penetrou o homem
chamado Jesus, conservando escancarada a sua porta”.
6º DOMINGO DA PÁSCOA

10 de maio de 2015
“DEUS É AMOR!"

Leituras: At 10,25-26.34-35.44-48; SI 98;


Jo 4,7-10; Jo 15,9-17

Situando-nos
Avança o Tempo Pascal. Surge o perigo de deixarmos esmorecer a
alegria da Ressurreição do Senhor. Por isso quem preside, com toda
a equipe de celebração, deve esforçar-se por viver o que pede a oração
do dia: “Dai-nos celebrar com fervor estes dias de júbilo em honra do
Cristo ressuscitado”. E não podemos descuidar da motivação, do ar
festivo da liturgia trazido pelo evento pascal. Ainda mais hoje, que
temos um dos pontos mais altos da missão cristã: a vivência do amor,
animados pelo Espírito Santo.
Neste espírito recordamos Maria, junto com o dia das mães.
Maria, sem nada tirar da centralidade do Senhor, é boa mestra para
celebrar a Páscoa, por sua proximidade a Cristo em seu caminho da
Cruz, Ressurreição e envio do Espírito. Já que foi a melhor discípula,
pode ser boa mestra para a comunidade pascal.

Recordando a Palavra
Continuamos hoje a leitura do Evangelho do último domingo. Depois
da alegoria da videira, temos a meditação sobre o mistério do amor de
Deus em Jesus Cristo e nossa missão de frutificar no amor fraterno.
“Jesus não manda amar a Deus. (...) O Evangelho de João men-
ciona só o mandamento de amar os irmãos. De fato, o amor é um pre-
sente. Ora, um presente não se devolve, mas reparte-se com os outros. É
amando os irmãos que mostramos nossa gratidão pelo amor do Pai que
Roteiros homiléticos para a Páscoa BR

se manifesta a nós em Jesus. É assim levamos esse amor ao seu destino.


Tornamo-nos “aliados” de Deus e de Jesus, na expansão do seu amor”.
Impossível compreender o alcance do amor sem contemplar a cruz.
É por isso que Jesus diz: ninguém tem maior amor do que aquele que
dá a vida pelos amigos. Da contemplação da entrega de Cristo por nós
é que nos vem força para entregar também a nossa vida pelos irmãos.
À única justificativa para o amor é a cruz. Nela é que compreendemos
o sentido da entrega de Cristo. Sem o amor, a cruz revela-se absurda.
O Senhor nos chama de amigos, não mais de servos. Contudo,
mantém sua transcendência. Há diferenças entre uma amizade humana
e nossa amizade com Cristo. Nós não escolhemos ser amigos de Jesus,
foi Ele quem nos escolheu. Do mesmo modo, Jesus fala que nós somos
seus amigos, se cumprirmos sua vontade.
Jesus fala de produzir frutos. À que fruto se refere? O fruto é irra-
diar no mundo a fé e o amor, para que todos cheguem ao conheci-
mento do Filho de Deus.
O resumo do discurso de Pedro, que está na primeira leitura de
hoje, destaca o seu pensamento fundamental: Deus não faz acepção (dis-
tinção) de pessoas; a melhor prova disso é fazer com que os pagãos par-
ticipem dos benefícios de um Pentecostes parecido com o que aconteceu
em Jerusalém. E isso se deu antes de serem batizados! Pedro é levado,
por causa dos fatos, a tomar posição e medidas claras: batizar os pagãos.
O fundamento de tudo está no fato de que Deus é amor. Não seria
exagero dizer que é um dos melhores resumos de toda a Escritura.
“Dado que Deus foi o primeiro a amar-nos (cf. 1Jo 4,10), agora o amor
não é apenas um 'mandamento”, mas é a resposta ao dom do amor com
D » 31
que l/cus vem do nosso encontro .

Ão tratar do texto da Primeira carta de João 4,7-10, é importante


sabermos que ele faz parte da seção que fala das fontes da caridade e da
fé. Falar do amor é sempre um perigo, porque tratamos com uma pala-
vra banalizada. Os cristãos são chamados a amar porque Deus é amor;

30 KONINGS, Johan. Evangelho segundo João — amor e fidelidade. São Paulo: Loyola, 2005, p. 288.
31 DCE,n. 1.
“Bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristo!”

porque esse amor de Deus chegou a nós e nos chamou à existência; por-
que esse amor fez com que Cristo entregasse sua vida na Cruz; porque
esse amor de Deus ressuscitou Jesus e nos faz hoje crer e viver nele.

Atualizando a Palavra
Em nossos dias, percebemos que permanece a separação entre pagãos
e os que creem. À religião é empurrada cada vez mais para o âmbito
privado. Os próprios cristãos correm a tentação de fecharem-se em
pequenos guetos, sem dialogar mais com o mundo, que consideram
perdido. Precisamos novamente de Pedro para reconciliar, para
restabelecer o diálogo, para fazer-nos perceber que a cultura e
a mentalidade não são obstáculo para o anúncio do Evangelho.
Estamos tão amarrados à nossa verdade absoluta que podemos não
mais conseguir dialogar, pois talvez julguemos o diferente como.
errado, pecaminoso, afastado.
Se há algo claro nas leituras de hoje é que para Deus não há acep-
ção de pessoas. Para Deus só há seres humanos aos quais ele ama pro-
funda e totalmente, a ponto de considerá-los filhos seus.
Por outro lado, fica claro que a história da humanidade é uma
história de separados: brancos e negros, ricos e pobres, cultos e igno-
rantes, poderosos e fracos.
Como interpretar isso? Onde está a causa dessa separação toda? À
resposta é simples: na falta de amor. Não somos capazes de amar sem
interesses econômicos, políticos, utilitaristas. Pode parecer desanima-
dor, mas é muito do que se vê.
Cornélio, mesmo sendo pagão, foi acolhido pela comunidade
cristã. E sinal da acolhida que não deve deixar nunca de inspirar nossa
ação pastoral.
O amor de Deus, na Páscoa de Cristo e em Pentecostes, mostrou-
-se universal. Por isso, nosso amor também deve ser universal. Católico
significa universal. Às vezes, parece que restringimos demais nossa
compreensão da própria identidade cristã. Não nos identificamos
Roteiros homiléticos para a Páscoa RB

como católicos para nos separar dos outros, mas para ser sinal de quem
quer acolher, ir ao encontro de todos.
O amor é sempre mais forte do que o ódio. Por isso, a vida triunfa
sobre a morte. Deste modo, a Páscoa de Cristo acontece na força do
amor. Desde o momento em que Cristo desfaz com seu poder os laços
da morte, o amor recebe essa força de ser vencedor da morte. Por isso,
o fruto mais desejável da renovação pascal e sinal maior da presença de
Cristo Ressuscitado é o crescimento do amor entre os irmãos.
Imaginemos todos os cristãos do mundo vivendo o amor. Seria
um impacto formidável, transformador. Nosso problema é que, com
o passar do tempo, perdemos o ânimo, o impulso, a fé, a esperança e,
assim, não vivemos mais o amor.
Ao falar da Evangelização, o Papa Francisco nos ensina: “À pri-
meira motivação para evangelizar é o amor que recebemos de Jesus,
aquela experiência de sermos salvos por Ele que nos impele a amá-Lo
cada vez mais”?

Ligando a Palavra com a ação eucarística


À fé deve levar-nos à vida, e a vida à celebração. O problema é que
damos um salto: passamos logo da fé à celebração, esquecendo-nos da
vivência do amor.
“À união com Cristo é, ao mesmo tempo, união com todos os
outros, aos quais ele se entrega. Eu não posso ter Cristo só para mim;
posso pertencer-lhe somente unido a todos aqueles que se tornaram ou
se tornarão seus. À comunhão tira-me para fora de mim mesmo proje-
tando-me para ele e, desse modo, também para a união com todos os
cristãos. Tornamo-nos “um só corpo; fundidos numa única existência”.
A Eucaristia é o Sacramento do Amor, onde os amigos de Jesus
são alimentados por Ele. Desse amor é que brota o mandato do amor
ao próximo.

32 EG,n. 264
33 DCE,n. 14.
“Bendito sejaj Deus q que nos reuniu no amor de Cristo!”

Sugestões para a celebração


1. Ão final da celebração, antes da bênção final, poder-se-ia fazer
um momento de devoção à Maria, pois dia 13 de maio comemo-
ramos Nossa Senhora de Fátima. Pode-se fazer menção ao Ano
da Paz (Advento de 2014 à festa do Natal de 2015), instituído pela
CNBB para toda a Igreja do Brasil. Trata-se de uma iniciativa
importante fundamentada na urgência de unir esforços para trans-
formar a realidade e lutar, incansavelmente, na promoção da paz,
que é um dom de Deus, entregue aos homens e mulheres de boa
vontade pelo Príncipe da Paz, Jesus Cristo, Salvador e Redentor.
Ão investir na promoção do Ano da Paz, a Igreja, a partir de
sua tarefa missionária de anunciar Jesus Cristo e seu Reino,
empenha-se e busca sensibilizar outros segmentos da sociedade
para enfrentar a violência, que atinge de modo arrasador a vida, a
dignidade humana e as culturas. Trata-se de um percurso longo
a ser trilhado, uma dinâmica complexa a ser vivida, para que o
coração humano torne-se coração da paz. O Papa Francisco, na
sua Exortação Apostólica Alegria do Evangelho, sublinha que,
enquanto não se eliminarem a exclusão e a desigualdade dentro
da sociedade e entre os vários povos, será impossível erradicar
a violência que, venenosamente, consome vidas, mata sonhos e
atrasa avanços.
À vivência do Ano da Paz, ainda que sem impactantes eventos,
é a esperança de que as ações simples e cotidianas de cada pessoa
podem provocar grandes mudanças, especialmente as culturais,
que contribuem para a manutenção da violência.
Criar um ambiente orante no início da celebração. Se oportuno,
cantar o refrão: “Onde reina o amor, fraterno amor. Onde reina o
amor, Deus aí está”.
29

Convidar as pessoas ao abraço do envio missionário e da paz,


como testemunhas do amor, no cotidiano da vida familiar e social.
Quem sabe unir este momento com uma pequena homenagem ou
bênção para as mães.
ASCENSÃO DO SENHOR

17 de maio de 2015
“SUBIU AOS CÉUS, ESTÁ SENTADO À DIRETA DE DEUS PAI TODO-PODEROSO”.

Leituras: At 1,1-11; SI 47; Ef 1,17-23 (ou Ef 4,1-13)


Mc 16,15-20

Situando-nos
O Tempo Pascal vai chegando ao seu ponto alto. Hoje celebramos
a Ascensão do Senhor; no próximo domingo, Pentecostes. Ascensão
e Pentecostes são celebradas distintamente para destacar aspectos
diversos do mesmo mistério, que não cabe em nossas divisões
cronológicas.
Podemos olhar para as semanas precedentes e enxergar o cami-
nho que fizemos de consolidação da fé no Cristo ressuscitado. Vive-
mos a manhã alegre e surpreendente da ressurreição. Sentimo-nos
como Tomé, com alguma dificuldade para crer. Aproximamo-nos
do Senhor, o Pastor Bom, exemplar, que reúne seu rebanho. Como
ramos da videira que é Jesus, nos deixamos limpar pela sua Pala-
vra e alimentar pela seiva do amor de Deus. Fomos percebendo que
Cristo nos chama de amigos, pois nos revela o plano de seu Pai.
Hoje, contemplamos sua subida para o Pai. “Ele, nossa cabeça e prin-
cípio, subiu aos céus, não para afastar-se de nossa humildade, mas
para dar-nos a certeza de que nos conduzirá à glória da imortalidade”
(Prefácio da Ascensão do Senhor, 1).
Maria, a quem é dedicado este mês, acompanha-nos nesse per-
curso, como acompanhou com sua prece a Igreja nascente. Ela é a
mãe da esperança, atitude fundamental dos que creem.
Celebramos hoje o Dia Mundial das Comunicações Sociais.
a “Bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristo!”

Recordando a Palavra
À liturgia da Palavra traz o relato daquilo que consta resumidamente
no Símbolo Apostólico: “Subiu aos céus, está sentado à direita de Deus
Pai todo-poderoso, donde há de vir”.
O período das aparições de Jesus Ressuscitado serviu para reunir os
discípulos na certeza de que Ele não ficou no sepulcro, mas está vivo.
Agora, são enviados em missão. À missão é anunciar a vida de
Jesus aos judeus primeiro, e depois a todos os povos (At 1,8). Antes
de Jesus partir, há um diálogo com os discípulos, que revela o quanto
eles ainda não tinham compreendido o sentido do Mistério Pascal de
Cristo. Eles esperavam o restabelecimento do Reino de Israel. Jesus,
contudo, não quer renovar o reino de Davi. Ele, ao contrário, dá aos
discípulos uma missão e uma promessa. À promessa é o Espírito
Santo, em cuja força realizarão a missão: testemunhar Cristo até os
confins da terra.
Merece destaque na narrativa dos Atos dos Apóstolos a nuvem
que encobriu Jesus. Evoca, claramente, o momento da transfiguração
do Senhor. Além disso, lembramos a anunciação a Maria, quando
lhe foi dito que o poder do Altíssimo a cobriria com sua sombra
(cf. Lc 1,35). No Antigo Testamento, a nuvem é sinal da presença de
Deus e acompanha o povo de Deus em sua travessia do deserto. “A
afirmação sobre a nuvem é claramente teológica. Apresenta o desa-
parecimento de Jesus não como uma viagem em direção às estrelas,
mas como a entrada no mistério de Deus”;
A segunda leitura e o Evangelho falam que Jesus, subindo ao
céu, está agora sentado à direita de Deus, como rezamos no Símbolo
Apostólico. Como compreender isso? “Deus não Se encontra num
espaço ao lado de outros espaços. Deus é Deus: Ele é o pressuposto e
o fundamento de todo o espaço existente, mas não faz parte dele. A
relação de Deus com todos os espaços é a de Senhor e Criador. À sua
presença não é espacial, mas, precisamente, divina. 'Sentar à direita

34 RATZINGER, Josef. Jesus de Nazaré — da entrada em Jerusalém até a Ressurreição. São


Paulo: Planeta, p. 253.
Roteiros homiléticos para a Páscoa EH

de Deus” significa uma participação na soberania própria de Deus


sobre todo o espaço”.*
As leituras enfatizam que a Ascensão não é um distanciamento
que rompe a presença de Deus entre nós. Pelo contrário, ela inaugura
um novo modo de presença. Tanto é verdade que o Evangelho con-
clui afirmando que “o Senhor os ajudava e confirmava sua palavra por
meio dos sinais que a acompanhavam” (Mc 16,20).

Atualizando a Palavra
Às leituras bíblicas, as orações e o prefácio são uma explicação segura e
clara do conteúdo pascal do mistério da Ascensão. Estamos celebrando
a exaltação de Jesus à direita do Pai, como rezamos no Símbolo Apostó-
lico. O Dom do Espírito Santo é que completará todo o percurso que
fazemos com Jesus, passando da morte para a vida.
Com a Ascensão, a comunidade cristã passa a viver numa tensão:
cessam as aparições do Ressuscitado, mas Ele continua presente. Por
isso, Jesus fala que os discípulos receberão o Espírito Santo, para serem
suas testemunhas (cf. At 1,8).
Podemos falar de três abordagens ou atualizações da Solenidade
da Ascensão do Senhor.
À primeira é a significação cristológica da Ascensão: o humilhado
ao extremo é o que foi elevado mais alto: Ele [o Pai] manifestou sua
força em Cristo, quando o ressuscitou dos mortos e o fez sentar-se à
sua direita nos céus, bem acima de toda a autoridade, poder, potência,
soberania ou qualquer título que se possa mencionar (cf. Ef 1,20-21).
O movimento que começou com a Encarnação, culmina agora com a
Ascensão, abrindo a fase da entrega do Espírito Santo.
Uma segunda abordagem pode ser eclesiológica. A oração do dia
fala que a Ascensão de Cristo já é nossa vitória. Isso porque Ele assumiu,
uniu à sua divindade a nossa humanidade. A glorificação da Cabeça

35 RATZINGER, Josef. Jesus de Nazaré — da entrada em Jerusalém até a Ressurreição. São


Paulo: Planeta, p.. 253.
84 “Bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristo!”

— Cristo — é a esperança do Corpo — a Igreja. A Igreja não cresce por


obra humana, como se nós a fizéssemos crescer. Ela cresce pela força de
Cristo: o Dom do Espírito Santo, a pregação dos Apóstolos, a eficácia
sacramental, a graça e a fidelidade no coração dos que creem.
Assim fala o Papa Francisco, na Evangelii Gaudium: “Diz-nos
o Evangelho que, quando os primeiros discípulos saíram a pregar, 'o
Senhor cooperava com eles, confirmando a Palavra” (Mc 16,20). E o
mesmo acontece hoje. Somos convidados a descobri-lo, a vivê-lo. Cristo
ressuscitado e glorioso é a fonte profunda da nossa esperança, e não nos
faltará a sua ajuda para cumprir a missão que nos confia” (n. 275).
Abre-se, por fim, uma terceira perspectiva: a escatológica. Encon-
tramo-la expressa na Oração do Dia: “Fazei-nos exultar de alegria e
fervorosa ação de graças, pois, membros de seu corpo, somos chamados
na esperança a participar da sua glória”. Vivemos agora um tempo inter-
mediário: pela Encarnação, Paixão, Morte, Ressurreição e Ascensão,
Cristo uniu a si a nossa humanidade. Pelo Batismo, estamos incorpo-
rados a Cristo. Vivemos na esperança, aguardando o dia de sua vinda
gloriosa. “A fé no regresso de Cristo é o segundo pilar da profissão de
fé cristã. Ele que se fez carne e agora permanece Homem para sempre,
que para sempre inaugurou em Deus a esfera do ser humano, chama
todo o mundo a entrar nos braços abertos de Deus para que, no fim,
Deus se torne tudo em todos, e o Filho possa entregar ao Pai o mundo
inteiro congregado n Ele (cf. 1Cor 15,20-28). Isto implica a certeza, na
esperança, de que Deus enxugará todas as lágrimas; não ficará nada que
seja sem sentido; toda a injustiça será superada e estabelecida a justiça. A
vitória do amor será a última palavra da história do mundo”.*

Ligando a Palavra com a ação eucarística


A Palavra de Deus nos fortalece na fé de que Cristo, embora junto do
Pai, não afastou-se de nós. À Eucaristia nos faz perceber e saborear sua

36 RATZINGER, Josef. Jesus de Nazaré — da entrada em Jerusalém até a Ressurreição. São


Paulo: Planeta, p. 256-257.
Roteiros homiléticos para a Páscoa 3

presença real entre nós. À oração sobre as oferendas e depois da comunhão


expressam bem a tensão que se estabelece: já convivemos na terra com as
realidades do céu, mas esperamos o dia em que essa comunhão será plena.
Sabemos bem que a Eucaristia é onde o céu e a terra se encontram: a
presença de Cristo glorioso mediante o pão e o vinho.
O mesmo que os anjos disseram aos discípulos que ficaram
olhando para o céu, vendo Jesus subir, vale para nós. Não devemos
esquecer da missão de evangelizar. Na celebração eucarística nos
nutrimos para prosseguir nossa missão. Ao mesmo tempo, trazemos
os frutos de nossa missão e os apresentamos ao Senhor na Eucaristia.
O Papa Francisco pede que sejamos evangelizadores com espírito.
E ele mesmo explica o que significa isso: “Evangelizadores com espírito
quer dizer evangelizadores que rezam e trabalham. Do ponto de vista
da evangelização, não servem as propostas místicas desprovidas de um
vigoroso compromisso social e missionário, nem os discursos e ações
sociais e pastorais sem uma espiritualidade que transforme o coração”.*”

Sugestões para a celebração


1. Hoje é o Dia Mundial das Comunicações Sociais. À celebração é
o único Dia Mundial estabelecido pelo Concílio Vaticano II, por
meio do Decreto Inter Mirifica (1963). Dioceses de todo o mundo
organizam atividades para comemorar este dia, com missas,
encontros de formação, coletivas de imprensa, debates etc. Em
sintonia com a 142 Assembleia Ordinária do Sínodo dos Bispos,
que ocorrerá em outubro de 2015, o tema escolhido para a 49º Dia
Mundial das Comunicações Sociais será “Comunicar a família:
ambiente privilegiado do encontro na gratuidade do amor”.
À reflexão retoma os ensinamentos de São João Paulo II na Fami-
liaris consortio, que trata das mudanças culturais e a família. Diz
o Papa Francisco na sua mensagem para este dia: “O tema da
família encontra-se no centro duma profunda reflexão eclesial e

37 EG, n. 262.
ao "Bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristo!”

dum processo sinodal que prevê dois Sínodos, um extraordinário —


acabado de celebrar — e outro ordinário, convocado para o próximo
mês de outubro. Neste contexto, considerei oportuno que o tema
do próximo Dia Mundial das Comunicações Sociais tivesse como
ponto de referência a família. Aliás, a família é o primeiro lugar
onde aprendemos a comunicar. Voltar a este momento originário
pode-nos ajudar quer a tornar mais autêntica e humana a comuni-
cação, quer a ver a família dum novo ponto de vista”.
2. Inicia-se amanhã a Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos.
Recomendam-se para esta ocasião orações durante a missa, sobre-
tudo na Oração dos fiéis, e oportunamente a celebração da missa
votiva pela unidade da Igreja. “Dá-nos um pouco da tua água”
será o tema desta Semana. Buscará refletir sobre a unidade cristã
e o diálogo entre as religiões. O material publicado é uma parceria
entre Conselho Mundial de Igrejas (CMI) e Pontifício Conselho
para a Unidade dos Cristãos.
O tema da Semana de Oração foi inspirado no Evangelho de João,
que retrata o encontro de Jesus com a mulher samaritana. À cena
propõe reflexão do amor e da acolhida às diversidades de religião,
etnia e cultura. O material foi elaborado pelo grupo de trabalho
do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil (Conic). Ainda,
dentro da perspectiva do tema deste ano, pretende-se debater os
diferentes contextos religiosos do país, abordando, principal-
mente, a intolerância religiosa.
O Conic foi fundado em 1982, com participação de membros das
Igrejas Católica Apostólica Romana, Evangélica de Confissão
Luterana no Brasil (TIECLB), Anglicana do Brasil (IEAB), Pres-
biteriana Unida (IPU) e a Igreja Sirian Ortodoxa de Antioquia
(ISOA). Tem como missão promover e estimular relações ecumê-
nicas entre Igrejas cristãs e o fortalecimento do testemunho em
favor dos Direitos Humanos.
3. Cantar o prefácio que realça, neste dia, o mistério da Ascensão
(Missal Romano, p. 426 e 427). Nas celebrações da Palavra, fazer
Roteiros homiléticos para a Páscoa BH

o momento do louvor com a louvação indicada no Hinário Litúr-


gico 2, da CNBB, p. 103.
4. Usar a bênção final própria para a celebração da Ascensão do
Senhor (Missal Romano, p. 523-524). Movidos pelo Espírito
Santo e pelas bênçãos de Deus, seremos testemunhas até os
confins da terra e realizaremos com as mais diferentes expressões
a missão salvadora de Jesus na sociedade em que vivemos.
5. Destacar o envio que acontece no final da missa: “Ide, levai a
todos a alegria do Senhor Ressuscitado! Ide em paz, e o Senhor
sempre vos acompanhe!”,
6. Convidar a comunidade para a Vigília da festa de Pentecostes.
Há comunidades que costumam celebrar o mistério da vinda do
divino Espírito Santo, com uma Vigília, explicitando, assim, a
unidade entre a Vigília da Páscoa e a de Pentecostes.
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EP

SOLENIDADE DE PENTECOSTES

24 de maio de 2015
“ENVIAL O VOSSO ESPÍRITO, SENHOR, E DA TERRA TODA A FACE RENOVAI!"

Leituras: At 2,1-11; SI 104; 1Cor 12,3b-7.12-13;


Jo 20,19-23

Situando-nos
No dia de hoje vamos celebrar a manifestação daquela Força que tirou
Jesus da morte e lhe trouxe à vida.
Com este domingo se concluem os cinquenta dias da Páscoa, dedi-
cados inteiramente a celebrar a alegria da Ressurreição, a novidade da
vida dos batizados e o começo da Igreja, animada pelo Espírito Santo.
À oração da “coleta” da Vigília de Pentecostes sintetiza bem a
importância do dia de hoje: “Deus eterno e todo-poderoso, quisestes que
o mistério pascal se completasse durante cinquenta dias, até a vinda do
Espírito Santo. Fazei que todas as nações dispersas pela terra, na diver-
sidade de suas línguas, se unam no louvor do vosso nome”. E completa
o Prefácio da Festa de hoje: “Para levar à plenitude os mistérios pascais,
derramastes, hoje, o Espírito Santo prometido, em favor de vossos filhos
e filhas” (Prefácio de Pentecostes. Missal Romano, p. 319).

Recordando a Palavra
O texto dos Atos dos Apóstolos é construído por Lucas com uma finali-
dade teológica bastante específica: estabelecendo um paralelo com o
Pentecostes do povo de Israel, mostrar que a ação de Deus continua
viva agora nos cristãos. À festa judaica de Pentecostes celebrava,
cinquenta dias depois da páscoa, a recepção da Torá no Monte Sinai
(cf. Ex 19,16-20 e Dt 5,4-5).
Roteiros homiléticos para a Páscoa BH

Percebemos também um contraponto ao relato de Babel (cf. Gn


11,1-11): lá, a multiplicidade de línguas gerou confusão; aqui, pela ação
do Espírito de Deus, gerou unidade. À Igreja nasce com uma vocação
universal, evidenciada pelos numerosos povos ali reunidos.
Elementos como o barulho forte, o vento e as línguas de fogo são
teofânicos: expressam a presença de Deus. É essencial perceber que a
comunidade primitiva foi invadida, tomada pelo Espírito, e que toda a
sua atividade posterior se dá pelo influxo deste mesmo Espírito.
O Salmo 103 pede que o Espírito do Senhor seja enviado também
a nós, para que a face da terra seja renovada. Canta a beleza da criação
que, sem o respiro da vida, dado por Deus, volta ao nada de onde saiu.
A unidade de que fala a primeira leitura não anula a diversidade
presente na Igreja. Isso é garantido pelo texto de Paulo aos Coríntios.
É o Espírito Santo que nos permite crer. O essencial é a profissão de
fé em Cristo Ressuscitado: Ele é o Senhor.
A comunidade de Corinto passava por algumas dificuldades por
causa do sincretismo religioso. Diante disso, como discernir o que é, ver-
dadeiramente, obra de Deus do que é puramente humano? Paulo coloca
três critérios importantes: 1. Todos os carismas devem conduzir à mesma
profissão de fé no senhorio de Cristo; 2. Todos os carismas devem ajudar
a concretizar o plano salvífico de Deus; 3. Os carismas servem ao bem
comum e à unidade do Corpo de Cristo, nunca criam divisão.
As diferenças étnicas (judeus ou gregos) e sociais (escravos ou
livres) não podem perdurar na comunidade cristã. A diversidade de
carismas, sim, porque não destroem, mas favorecem a unidade na fé.
O Evangelho se dá no lugar da reunião da comunidade, que, ao
que tudo indica, já tinha estabelecido o costume de se reunir no pri-
meiro dia da semana. Chama atenção que estavam com medo, o que
revela a situação da comunidade de João em relação à Sinagoga.
Jesus entra, mesmo com as portas fechadas, põe-se no meio deles,
os saúda dando a paz. Há controvérsias exegéticas sobre a tradução das
palavras de Jesus. “Paz a vós! Por essas palavras, que são as primeiras
que o Vivente dirige aos seus discípulos reunidos, Jesus não formula
90 “Bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristo!”

uma saudação ordinária, o shalom costumeiro dos judeus. Também não


é um desejo, como erroneamente se traduz: “À paz esteja convosco!”
Trata-se do dom efetivo da paz, em conformidade com o que Jesus
disse no seu Discurso de despedida: “Eu vos deixo a paz, eu vos dou a
minha paz; não vo-la dou como o mundo” (14,27)".8
Depois se apresenta, mostrando a identidade entre o Crucificado
e o Ressuscitado. O resultado dessa visita é a alegria que brota no cora-
ção dos discípulos, que veem o Senhor.
Há uma nova saudação de paz, sinal do início de um novo
tempo. Jesus, o Enviado por excelência, envia agora os seus discí-
pulos. “A missão provém de Deus, que quer dar a vida ao mundo. O
envio dos discípulos implica tudo o que visava o ministério confiado
a Jesus: glorificar o Pai, fazendo conhecer seu Nome e manifestando
seu amor (cf. 17,6.26)”.*º
Temos, agora, um gesto: soprou sobre eles. Este sopro é indicado
com o mesmo verbo que consta em Gênesis 2,7. Faz referência clara
ao ato criador e, agora, inaugura uma nova criação. “Trata-se agora da
nova criação: Jesus glorificado comunica o Espírito que faz renascer o
homem (cf. 3,3-8), capacitando-o para partilhar a comunhão divina.
O Filho que “tem a vida em si mesmo” dispõe dela a favor dos seus
(cf. 5,26.21); seu sopro é o da vida eterna. Mostrando a chaga de seu
lado, não evocou Jesus o rio de água viva que daí saiu, símbolo do
Espírito dado aos que creem (19,34; cf. 7,39)?”.4º
Prestemos atenção ao fato de que João situa esse relato no dia
da Páscoa. Ássim, não é Pentecostes, porque não está a cinquenta
dias da Páscoa, como em Lucas. Contudo, é, sim, o dia do envio do
Espírito Santo, mostrando o laço imediato do dom do Espírito com
o Cristo Ressuscitado.
Sobre o perdão dos pecados, confiado à comunidade, vemos que
“perdoar/manter significa aqui a totalidade do poder misericordioso

38 LÉON-DUFOUR, Xavier. Leitura do Evangelho Segundo João — IV. São Paulo: Loyola, p. 166.
39 Idem p. 169.
40 Ibidem, p. 169.
Roteiros homiléticos para a Páscoa

transmitido pelo Ressuscitado aos discípulos. (...) De acordo com os


profetas, a efusão escatológica do Espírito purificará Israel de suas
manchas e de seus ídolos. Na pregação cristã primitiva, remissão dos
pecados e dom do Espírito vão juntos. O efeito primeiro da criação
nova, que Jesus significou por seu sopro, é o renascimento do ser
(cf. 3,3) e, portanto, o perdão”.*!
Não se deve esquecer de valorizar a Sequência de Pentecostes,
hino ao Espírito Santo, louvando-o e suplicando sua vinda.

Atualizando a Palavra
A melhor atualização da Palavra de Deus é voltar nosso olhar para a
Igreja, para a comunidade cristã. Passaram-se dois milênios. Sabemos
de inúmeros erros, pecados, enganos e infidelidades que os cristãos
cometeram nesse período. Contudo, a força da Ressurreição não se
perdeu, está viva e mantém viva a comunidade dos que creem, daqueles
que têm no centro de sua existência o Senhor Ressuscitado. Em seus
corações arde ainda hoje o fogo impetuoso do Espírito Santo.
O Espírito Santo é a pessoa da Trindade mais próxima de nós, por-
que habita em nosso interior. É Ele que nos move, nos guia, nos sustenta.
Enxergamos hoje nossas comunidades com uma pluralidade de dons, de
carismas, de iniciativas. É, sem dúvida, fruto do Espírito. Há que cui-
dar, contudo, para não esquecer os critérios que Paulo nos apresenta para
que esses carismas ajudem a construir a unidade que Deus quer.
Pentecostes faz com que nossas comunidades se voltem para fora,
enxerguem a enorme missão que está à sua frente. Se existem divisões
internas, brigas por espaço e incompreensões entre grupos, não será
por falta de iniciativa missionária?
“A presença do Espírito Santo garante que a comunidade cristã
não seja reduzida a uma realidade sociológica ou psicológica, como se
fosse apenas um grupo que se reúne para atender às suas necessidades
ou para fazer o bem. Pelo Espírito Santo a comunidade recebe o dom

41 LÉON-DUFOUR, Xavier. Leitura do Evangelho Segundo João — IV. São Paulo: Loyola, p. 172-173
+

“Bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristo!”

da unidade que permite a comunhão das pessoas com Cristo e entre si.
(...) Não há comunidade cristã que não seja missionária. Se ela esquece
a missão, deixa de ser cristã. Por isso, a comunidade vive a comunhão
na diversidade, aberta a acolher quem se aproxima e possibilitar que
muitos participem”.
Assim, Pentecostes não fecha, mas abre a Tempo Pascal para a
história que vivemos. Ele nos permitiu essa experiência profunda de
encontro com o Ressuscitado, que agora nos dá seu Espírito e nos
envia. “O cristão têm a obrigação de manter viva essa tripla dimensão
das 'aparições”. À dimensão vertical da experiência arranca-me da falta
de elevação de uma existência terrena. O reconhecimento do Jesus do
passado me faz tropeçar na questão inquietante: “Para vós, que sou eu?”
E eu me vejo enviado aos homens para lhes comunicar minha alegria e
convidá-los a se amarem uns aos outros. O presente só adquire densi-
dade quando se volta para o passado e se estende para o futuro. Então,
meu presente torna-se presença a Deus e ao mundo”.
Disse o Papa Francisco na solenidade de Pentecostes do ano de
2014: “O dia de Pentecostes, quando os discípulos “ficaram todos
cheios do Espírito Santo', foi o batismo da Igreja, que nasce “em saída,
'em partida' para anunciar a todos a Boa Notícia. A Mãe Igreja, que
parte para servir. Recordemos a outra Mãe, a nossa Mãe que partiu
com prontidão, para servir. À Mãe Igreja e a Mãe Maria: todas as duas
virgens, todas as duas mães, todas as duas mulheres. Jesus foi peremp-
tório com os apóstolos: não deveriam se afastar de Jerusalém antes que
tivessem recebido do alto a força do Espírito Santo (cf. At 1,4.8). Sem
Ele não há missão, não há evangelização. Por isso com toda a Igreja, a
nossa Mãe Igreja católica invoquemos: Vem, Santo Espírito!”

42 CNBB. Comunidade de Comunidades: uma nova paróquia. A conversão pastoral da paróquia.


Brasília: Edições CNBB Ano: 2014. n. 152 e 157.
43 LÉON-DUFOUR. Op. cit. p. 190.
Roteiros homiléticos para a Páscoa EB

Ligando a Palavra com a ação eucarística


Toda a ação eucarística se dá por obra do Espírito Santo. Como em
nenhuma outra ação da Igreja, percebemo-lo presente e atuante.
“A assembleia é o lugar onde o Espírito Santo 'dá fruto”, é a epifania
de todos os dons que o Espírito faz à Igreja. Nela se reúnem todos os
componentes da Igreja: ninguém pode ser excluído, porque o conjunto
dos dons do Espírito existe, só e unicamente, no conjunto dos membros
da comunidade. Portanto, fazer com que a práxis litúrgica se torne prá-
xis eclesial significa, antes de tudo, notar que, assim como na assembleia
litúrgica, ninguém faz tudo para todos, mas cada um age segundo a sua
tarefa, ninguém é expectador, mas todos professam sua fé de modo que se
tornem verdadeiros concelebrantes da mesma fé; do mesmo modo, na vida
concreta da comunidade cristã, ninguém deve fazer tudo para todos, mas
cada um é chamado a colaborar na edificação da Igreja, segundo o dom
recebido e segundo o ministério que lhe foi confiado pela própria Igreja”.

Sugestões para a celebração


1. Seria muito interessante se as comunidades realizassem a Vigília
de Pentecostes. O Missal Romano indica os textos bíblicos e as
orações próprias para este momento. Outras orientações estão no
Diretório da Liturgia 2015, publicado pela CNBB.
2. Preparar o espaço da celebração, destacando o Círio Pascal e a pia
batismal, além da mesa da Palavra e da mesa da ceia eucarística. A
cor litúrgica desta festa é o vermelho.
3. Solenizar o acendimento do Círio Pascal antes da procissão de
entrada.
4. Valorizar, na procissão de entrada, as pessoas que exercem algum
ministério ou serviço na comunidade. Elas receberam do Espírito
a missão de testemunhar a Ressurreição de Jesus Cristo. Onde há
tradição, na procissão pode-se trazer a bandeira do Divino.

44 Boselli, Gofredo. O Sentido Espiritual da Liturgia. Brasília: Edições CNBB, 2014, p. 114.
A “Bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristo!”

Cantar a Sequência: “A nós descei divina luz”. A assembleia ou um


A

grupo de pessoas acende velas no Círio Pascal e as mantém acesas


até o final da proclamação do Evangelho.
Cantar o prefácio que realça, neste dia, o mistério do Pentecostes
(Missal Romano, p. 319). Nas celebrações da Palavra, fazer o
momento do louvor com a louvação indicada no Hinário Litúr-
gico 2, da CNBB, p. 103.
Possibilitar a comunhão sob as duas sagradas espécies para toda a
assembleia, enquanto se entoa um hino adequado.
Usar a bênção final própria para a celebração do Pentecostes
(Formulário 9, Missal Romano, p. 524).
Convidar as pessoas a partilharem o abraço de paz, pois Deus
derramou em nossos corações o seu Espírito que nos enche de
alegria e consolação.
10. Terminado o Tempo Pascal, convém guardar o Círio Pascal,
com veneração, no Batistério, para nele se acenderem as velas dos
batizados.
11. Amanhã reinicia o Tempo Comum com a 8º semana. Retoma-se
o III volume da Liturgia das Horas.

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