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Teologia da Semana Santa – Itinerário Espiritual

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Teologia da Semana Santa – Itinerário Espiritual

INTRODUÇÃO

A teologia compreendida como a fé que procura se aprofundar


encontra um terreno fértil nas vivências e práticas cotidianas do povo
de Deus. Neste sentido, com o intuito de auxiliar aqueles que
procuram refletir a sua fé, e além de participarem dos rituais em suas
comunidades, desejam silenciar e rezar nesses dias especiais,
compartilho este itinerário de oração.
Devo esclarecer que não se trata de um subsídio de celebração
comunitária, embora a parte reflexiva possa ajudar, a intenção visa
aprofundar a oração, a meditação e a contemplação pessoal.
O texto se divide em cinco capítulos que chamei de
movimentos. Cada parte tem o seu item reflexivo, um itinerário
espiritual e uma proposta concreta de oração pessoal. Naturalmente
esta última parte poderá ser adequada conforme a realidade de cada
um.
Por último, auguro que cada um de nós consiga alimentar uma
espiritualidade integrada da Semana Santa, sem privilegiar o
significado espiritual de apenas um dia. O objetivo é apresentar como
proposta espiritual o conjunto, uma vez que os dias, isoladamente, não
mostram toda a possibilidade da espiritualidade cristã. Quero dizer

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com isto, que se a gente privilegiar apenas um dia da Semana Santa,


corremos o risco de perder o todo. Por exemplo, se ficarmos apenas na
espiritualidade da Sexta-Feira Santa ficaremos com a ideia da dor, da
cruz, da morte etc. Portanto, para uma saudável espiritualidade cristã
será preciso a junção dos cinco movimentos da proposta.
Boa caminhada.

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PRIMEIRO MOVIMENTO: O LOUVOR

O ponto de partida é o Domingo de Ramos, cuja celebração


privilegia um acontecimento histórico que se refere à entrada triunfal
de Jesus em Jerusalém. Por ser o tempo da Páscoa, muitos judeus
peregrinavam à Cidade Santa para oferecer as suas orações no
Templo. Chama a atenção o modo como Jesus foi acolhido, é
importante ressaltar, conforme os quatro evangelhos, que é o próprio
Jesus quem prepara a entrada na cidade como um ritual. De modo que
é acolhido como Senhor ou como uma importante autoridade. Era
costume dos poderosos como o rei, o governador, ou um grande
guerreiro, protetor de uma cidade, ingressarem num povoado e serem
recebidos com todas as pompas, gritos, aclamações, aplausos e
cânticos de festa. Esse privilégio correspondia a um personagem, no
mínimo, famoso.
Podemos perceber nos evangelhos sinóticos (Mc, Mt e Lc) a
semelhança na narrativa da cena. Jesus instruiu dois discípulos a
trazerem um burrinho que servisse de montaria. Comparada com as
entradas dos homens nobres, do rei Salomão, por exemplo, ver Jesus
montado num burrinho e umas pessoas à beira do caminho cantando
seus hinos, mais devia parecer uma paródia do que uma entrada real.
Onde já se viu um rei ingressar na cidade e ser recebido como tal,
montado num burrinho? Não se tratava de uma paródia, mas uma
proposta compreensiva do tipo de messianismo de Jesus. Ele não se
apresenta como um messias igual aos outros que vieram com as suas

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forças e confiança no poder e que no fim também sucumbiram e


desapareceram. Jesus se apresenta como um rei diferente, Ele é o
salvador, mas não aquele que restaurará Israel com a força da espada.
O burrinho simboliza a mansidão e a simplicidade. O Reino de Deus
proposto por Jesus, não aceita o poder militar, político, econômico dos
grandes impérios. O Reino de Deus acontecerá, terá visibilidade com
pequenos gestos, quase insignificantes, como a comparação feita por
Jesus, com o que compararemos o Reino de Deus? Com uma semente
ou com o fermento, que da insignificância oferecem transformações
importantes.
A multidão, com ramos nas mãos, brada: “Hosana! Bendito o
que vem em nome do Senhor. Bendito o reino de nosso pai Davi que
chega. Hosana ao Altíssimo”. Eis o canto de reconhecimento do
Enviado, do Senhor, do Messias, do Salvador. Eis o louvor, a beleza
dos cânticos, que são como balbucios de crianças que não chegam a
compreender nada, uma vez que esse mesmo louvor, mais tarde se
converterá em pedido de morte. Bem depressa surgiram as decepções.
O povo, decepcionado, queixou-se, pois esperava um rei diferente.
Pensava que Jesus libertaria Israel do jugo do império de Roma. E
olha como tudo acabou.
A entrada em Jerusalém é revelação, Jesus Cristo é o Filho de
Davi, Ele é o Messias. Ele é o Salvador. Ele provoca a alegria no povo
ao perceber nele uma esperança, e mais que esperança, o cumprimento
da promessa do Senhor. Fazia tempo que Israel aguardava o broto
prometido do tronco de Jessé. O povo que grita à beira do caminho
sabia que finalmente a hora poderia ter chegado.

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ITINERÁRIO ESPIRITUAL DO DOMINGO DE RAMOS

Não cabe dúvida de que a espiritualidade do Domingo de Ramos


é a do louvor. O povo louva Deus porque finalmente enviou o
Messias. O sentido primeiro do Hosana era um pedido de socorro, de
modo que quando o judeu rezava: Hosana ao Senhor, estava pedindo
socorro, mais tarde o termo ficou como uma aclamação.
Gostamos do louvor, parece que faz parte do nosso ser, é muito
provável que assim seja por pertencer ao nosso mundo espiritual onde
cabe o bom cântico, a boa música, a poesia, a oração, a beleza e o
louvor. Louvamos porque não entendemos, assim aconteceu com
aquela pobre gente que gritou à beira do caminho “Hosana ao Senhor”
e depois gritou também “Crucifica-o, crucifica-o”. É importante que a
nossa espiritualidade cristã se alimente constantemente com o louvor,
mas sem ficar apenas nele.
Eis o limite desta compreensão que pretende permanecer apenas
no louvor. Ninguém seria capaz de aguentar louvar o dia inteiro, nem
ouvir poesia vinte e quatro horas por dia. O louvor é fundamental, mas
na dose certa e nos momentos certos. Uma espiritualidade
fundamentada apenas no Hosana hei, Hosana há, precisa ser
complementada. Por enquanto é importante perceber que o Domingo
de Ramos é apenas o início de um itinerário, a seguir veremos os
outros dias e de que modo todos eles vão se complementando.

ONDE VAMOS REZAR? Procure um lugar solitário, pode ser


no seu quarto ou em outro lugar onde não será perturbado. Debaixo de
uma árvore, no quintal da sua casa, no parque ou no lugar onde

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estiver. É importante criar um lugar adequado. Um símbolo religioso


também ajuda; se estiver no seu quarto, coloque um pequeno altar
com uma imagem, uma vela, ou algo que lhe ajude a pensar no amor
de Deus. Se estiver num lugar aberto, ter por exemplo uma imagem
com você será suficiente, até mesmo o terço no seu bolso será
suficiente. Os símbolos religiosos servem para nos ajudar a entrar em
comunhão com o que eles representam.
COMO VAMOS REZAR? Escolher uma das narrativas do
Domingo de Ramos (Mc, 11, 2-11; Lc, 19, 29-40; Mt, 21, 1-11, Jo, 12,
12-19) e após uma pequena invocação ao Espírito Santo, comece a ler
o texto, uma vez em voz alta, para ouvir a sua própria voz, depois em
silêncio, e se achar necessário leia mais uma vez. Depois fique em
silêncio, feche os olhos e comece a respirar pausadamente. Inspire
devagar pelo nariz, sentindo o ar encher os seus pulmões, expire pela
boca bem devagar, repita a mesma operação, mas sempre bem
devagar; sinta o ar entrando em você, imagine que esse ar é a própria
graça de Deus invadindo todo o seu ser. E quando expirar, tire de
dentro de você o que lhe incomoda, a mágoa, a tristeza, a dor,
sentimentos negativos, maus pensamentos, expire bem devagar.
Repita a operação umas cinco a seis vezes. Agora respire lentamente,
mas sem se concentrar na respiração. Com os olhos fechados,
visualize a cena, que você leu, na sua cabeça. Veja Jesus planejando
com os seus discípulos o ingresso à Cidade Santa; estes que vão trazer
o burrinho; Jesus montado sobre o animal. Acompanhe o grupo,
caminhe perto de Jesus, observe como é o seu olhar para as pessoas.
Veja a entrada na cidade, os pórticos, sinta a alegria, a festa que o
povo faz, as palavras dos seus hinos. Veja o rosto dessas pessoas, as

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suas roupas, o que fazem, use a sua imaginação para ver o colorido da
cena. Dê o tempo que for necessário para esse exercício, mantenha
sempre os olhos fechados. Depois desse exercício mental chegou a
hora de rezar.
O QUE VAMOS REZAR? Vamos louvar a Deus. O louvor
em primeiro lugar é reconhecimento de que tudo o que temos vem de
Deus, que tudo na vida é Graça, por isso vamos dizer para Ele o que
desejamos de modo sincero. Em primeiro lugar agradeça pelo que
você é, pelos seus dons, pelo que sabe fazer, pelas coisas boas que
consegue compartilhar com os outros, a sua arte, a beleza que produz,
a partilha singela de seus dons. Agradeça a Deus pela sua vida, ela é
importante para muita gente, muitos amam você, agradeça a Deus pelo
que há no seu interior, os seus sentimentos, o seu amor, a sua fé, a sua
esperança, a sua alegria, a sua confiança. Tudo o que você tem de bom
dentro de você, do seu mundo interior, agradeça por tudo. Depois
agradeça pela sua casa, pela sua família, por cada uma das pessoas que
você ama, pronuncie dentro de você o nome de cada uma dessas
pessoas, visualize o rosto delas, agradeça por elas. Louve a Deus por
essas pessoas que chegaram até você como expressão da gratuidade de
Deus. Agradeça também pelas pessoas que a vida lhe presenteou,
colegas de trabalho, de estudos, a comunidade de fé, as pessoas que
fazem parte da sua vida diariamente, agradeça, agradeça por tudo o
que você quiser. Louve o nome do Senhor, reconheça que Ele é muito
bom com você. Conclua a sua oração com um salmo, com uma música
de louvor, com um poema que lhe lembre a beleza da criação. Repita
algumas palavras, uma oração, as palavras do povo à beira do
caminho: “Hosana! Bendito o que vem em nome do Senhor. Bendito o

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reino de nosso pai Davi que chega. Hosana ao Altíssimo”. Conclua o


seu momento de oração com uma oração diária que você gosta.

SEGUNDO MOVIMENTO: A HERANÇA

O segundo movimento é a Quinta-feira Santa, que é o coração


do conjunto celebrativo da Semana Santa. A centralidade comemorada
é a herança deixada por Jesus a todos os seus seguidores. De que se
trata tal herança? A resposta imediata seria a Eucaristia, o que não
seria um erro, mas devemos lembrar que a Eucaristia será, mais tarde,
a ritualização da última ceia. Conforme os evangelhos a herança de
Jesus na quinta-feira foi uma janta com um significado extraordinário.
Os sinóticos estão de acordo em assegurar que Jesus queria se
despedir dos seus amigos, pediu que fossem até uma casa para
preparar a ceia pascal conforme o costume judaico. A primeira parte
da narrativa é idêntica nos sinóticos. Mas depois cada evangelista
tomou a liberdade de narrar conforme a sua intenção e finalidade da
comunidade à qual era destinada. Lucas, por exemplo, fala de duas
taças, certamente para simbolizar o novo, como fizera São João com o
vinho velho e o vinho novo. Para Lucas (22, 7-20.31-34) a segunda
taça é o símbolo da Nova Aliança, o judaísmo chegou até ali, agora
haverá um novo modo de viver a relação com Deus. Mateus (26,17-
30), assim como Marcos (14, 12-26), é breve na sua narração da
celebração da páscoa, é como se houvesse pressa de sair para o monte
das Oliveiras. Dos três evangelhos devemos destacar pontos em
comum, e o primeiro é o lugar da ceia, não será num lugar religioso
oficial, templo ou sinagoga, mas numa casa. A bela frase que faz

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estremecer é “em tua casa celebrarei a páscoa”. Aqui aparece


claramente o sentido original da eucaristia, dom da vida, ação de
graças que deve nos levar a estar ao redor de uma mesa para nos
reconhecermos irmãos, caminheiros, com um mesmo sonho. A casa é
importante nesta perspectiva, a nossa casa, a nossa vida.
Mas não cabe a menor dúvida de que a narrativa melhor
trabalhada, refletida e vivida seja a do Discípulo Amado, ou seja, de
São João (13, 1-38). Uma autêntica catequese sobre o significado
profundo da herança da Quinta-feira Santa. O evangelho não
especifica o lugar, começa imediatamente com um gesto fundamental
para a compreensão eucarística. Jesus, o Filho de Deus, tira o seu
manto, cinge-se com uma toalha e pega um pouco de água para lavar
os pés aos seus discípulos. Quando chega a vez de Pedro, este começa
a questionar a atitude do Mestre. Parece que Pedro não compreende o
que está acontecendo. E o que está acontecendo? Jesus, que é o
Senhor, está deixando de lado o manto da sua soberania, pois é isso
que significa o manto. Veja que isso fica claro na narrativa. Deixa de
lado a sua grandeza para usar uma toalha, isto é, para ficar de joelhos
e servir. Eis a grandeza da proposta cristã. Entre os cristãos se alguém
quiser ser grande deve colocar uma toalha e começar a servir, somente
assim poderá ser cristão de verdade. E é justamente isso que Pedro
questiona: “Jamais me lavarás os pés”. Em outras palavras, não estou
disposto a aceitar o seu exemplo, não desejo deixar de lado o meu
manto para ficar de joelhos e lavar os pés dos meus irmãos. Pedro
ainda não entende a dinâmica do Reino de Deus proposto por Jesus.
Está confuso, ainda não entrou na dinâmica do discipulado do Amor,

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ele somente no finalzinho compreenderá, quando terá que responder


ás três perguntinhas especiais de Jesus: Pedro, tu me amas?
Quando Jesus terminou de lavar os pés aos seus discípulos,
aconteceu algo muito simples, mas muito bonito. Lembre-se que no
início da narrativa, Jesus tinha tirado o manto e colocado uma toalha
na cintura para o serviço de amor. Agora, no final da narrativa, Jesus
colocou novamente o seu manto, mas não se fala mais da toalha. É
estranho isto, aqui há uma intenção clara. Qual? Para servir e amar é
preciso tirar o manto, ou seja, desprender-se, esquecer-se, abandonar
algo de nós mesmos, colocar uma toalha, isto é, estar disponível para
o serviço mais simples como lavar os pés dos outros. Depois desta
lição, se formos discípulos, podemos até colocar novamente o nosso
manto, pois se você for professor ou professora, médico, médica,
pedreiro ou dentista etc., por ser cristão não deixará de ser o que é,
mas como cristão você nunca mais deverá tirar a toalha da sua cintura.
Veja o caso de Pedro, se ele quiser ser o representante dos doze,
poderá até ter o seu título de representante, mas não poderá deixar
nunca a toalha do serviço. Percebe como é bonito o pequeno detalhe
dessa passagem?
Chama a atenção também que São João não aprofunda o sentido
literal da comida e da bebida, pois para ele a herança maior de Jesus
não consiste apenas no comer e no beber, mas no servir e amar aos
outros. Por isso a pergunta, “compreendeis o que estou fazendo?” Pelo
menos Pedro não tinha compreendido. No final da cerimônia Jesus
completa o sentido da Comunhão. “Eu vos dou um mandamento novo:
Amai-vos uns aos outros. Nisso conhecerão todos que sois os meus
discípulos”. Significa que a identidade cristã, conforme São João, não

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reside tanto nas práticas ritualísticas, mas na capacidade do serviço e


na qualidade do nosso amor aos outros.
Deste modo podemos sintetizar a Herança de Jesus, se
quisermos, na Comunhão, ou como alguns preferem, na Eucaristia. A
comunhão apresenta três dimensões, a saber: o pão comungado (a
comunhão com o nosso Senhor e com todos aqueles que comungam a
mesma esperança), o lava-pés (o serviço aos outros que faz esquecer o
egoísmo, as posições sociais, os títulos) e o mandato novo: amai-vos
uns aos outros. Deste modo afirmamos que a herança que Jesus Cristo
nos deixou é a vivência do Amor com humildade. Humildade que
deve ser compreendida como sabedoria, bom senso e disponibilidade
para ver no outro um irmão.

ITINERÁRIO ESPIRITUAL DA QUINTA-FEIRA SANTA

A espiritualidade que emerge deste dia é, naturalmente, a


espiritualidade eucarística. Creio que estamos de acordo que ela é a
centralidade da nossa fé católica. Ao mesmo tempo surge a
necessidade de purificar aquilo que não condiz com a proposta dos
evangelhos. Infelizmente existe em nosso meio, em relação à
Eucaristia, dois enfoques contraditórios. Por um lado o exagerado
formalismo que beira a idolatria, que enxerga nela algo como uma
força mágica capaz de fazer milagres. Não é dito que a Eucaristia não
possa fazer milagres em nossa vida, mas que tipo de milagres? O que
geralmente as pessoas procuram numa adoração de horas à fio é
encontrar consolo ou solução para seus problemas. Não deixa de ser
um espetáculo deprimente certas celebrações que fazem da Eucaristia

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o centro de adoração, mais do que o centro de amor. Adorar e amar


são duas realidades bem diferentes. Quem ama apenas precisa amar,
quem adora geralmente esconde nesse gesto algo de medo diante do
desconhecido. Mas acontece que o nosso Deus se deixou ver, se
deixou tocar, fato que deveria nos levar à confiança amorosa e não ao
temor. Entendo, no entanto, que frequentemente a questão não passa
de uma confusão de linguagem. Se ao invés de adoração usássemos a
palavra contemplação seria muito mais agradável e coerente com a fé
cristã. A palavra adoração distancia do amor, é como se criasse uma
barreira. Eu prefiro amar a adorar, no entanto, isto pode não passar de
um problema de linguagem.
O que realmente está em jogo aqui é que a Eucaristia precisa ser
compreendida como comunhão. Comungar com os irmãos, como
comunidade caminheira que sonha com um mundo menos entregue à
maldade, à corrupção e à injustiça, que acredita e luta pela
humanidade como lugar abençoado pela graça criativa de Deus e pela
encarnação do Filho que veio dignificar a nossa frágil humanidade.
Devemos comungar na mesma fé, na mesma esperança sem esquecer
o sentido real da Comunhão tal como nos deixou o Mestre: serviço,
lava-pés, partilha e o amor aos outros.
A espiritualidade não pode ser estática, apenas contemplativa,
adorativa, como se a Eucaristia tivesse se transformado num objeto de
veneração deixando de ser a vivacidade transformadora do Amor,
capaz de partilhar, servir e amar. Sabemos que é mais fácil ficar de
joelhos diante do sacrário após a comunhão, ou querer tocar o
ostensório no meio de uma celebração, como se com esse gesto
pudéssemos alcançar algum favor especial. Esquecemos com

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frequência que nós, que comungamos, somos os ostensórios vivos,


que vamos pelas estradas da vida procurando testemunhar a
comunhão.

ONDE VAMOS REZAR? Lembre-se que esta proposta de


exercício de oração é pessoal. Procure um lugar solitário, o seu quarto
ou em outro lugar onde não será perturbado. Quem sabe debaixo de
uma árvore, no quintal da casa, no parque ou no lugar onde achar
melhor. É importante criar um lugar adequado, pois esse será o seu
pequeno lugar sagrado. Para este exercício de oração poderá ajudar
uma jarra com água, uma toalha ou algum objeto que lhe ajude a
interiorizar o tema.
COMO VAMOS REZAR? Para este momento de oração
vamos privilegiar o evangelho de São João (13, 1-38). Após a
invocação ao Espírito Santo, poderá ler o texto, uma vez em voz alta,
para ouvir a sua própria voz, depois em silêncio, e se achar necessário
leia mais vezes. Depois feche os olhos e comece a respirar
pausadamente. Inspire devagar pelo nariz, sentindo o ar encher os seus
pulmões, expire pela boca bem devagar, repita a mesma operação,
mas sempre bem devagar, sinta o ar enchendo o seu interior, imagine
que o ar é a própria graça de Deus invadindo todo o seu ser. Quando
expirar tire de dentro de você o que lhe incomoda, mágoas, tristezas,
dores, doenças, sentimentos negativos, maus pensamentos, expire bem
devagar. Repita a operação umas cinco a seis vezes. Depois continue
respirando lentamente, mas sem se preocupar com a respiração.
Com os olhos fechados, visualize a cena, que você leu, na sua
cabeça. Veja Jesus planejando a festa da páscoa, que ele queria

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celebrar numa casa. Olhe para dentro da casa, acompanhe o grupo,


ocupe um lugar privilegiado para poder ver tudo o que estiver
acontecendo. Olhe bem para Jesus, que tira o manto e o deixa
cuidadosamente de lado, toma uma toalha, uma jarra com água, uma
bacia e começa a lavar os pés dos seus discípulos. Veja as reações dos
discípulos, como olham, como se comportam. Acompanhe a vez de
Pedro que sem entender o que está acontecendo questiona o Senhor.
Veja o rosto dos outros discípulos. Veja agora a Jesus que também se
abaixa diante de você para levar os pés. Olhe para ele, se quiser falar
com Ele fale, o que você diria? O que Jesus lhe diria nesse momento?
Viva isso com calma, sem presa, respirando devagar, mantenha
sempre os olhos fechados, esteja nesse lugar o tempo que achar
necessário. Aproveite da presença carinhosa do Senhor. Respire
profundamente. Depois desse exercício mental chegou a hora de rezar.
O QUE VAMOS REZAR? Vamos agradecer ao Senhor pela
herança que nos deixou. Diga obrigado quanta vezes quiser, pela sua
entrega, pelo seu exemplo, por ter se despido da sua grandeza para
ficar de joelhos e servir, agradeça por ter nos ensinado a partilhar os
momentos importantes da vida, agradeça pelo mandamento novo que
nos deixou: amai-vos uns aos outros. Agradeça pela Eucaristia como
comunhão, que alimenta, anima, cura e salva. Agradeça porque você é
um sacrário vivo do Senhor, agradeça pelas vezes que você
testemunhou a partilha, o serviço e o amor. Agradeça por esse
alimento salutar, pelo Deus conosco, que quis ficar desse modo tão
singelo, sobre uma mesa familiar, numa casa, em forma de comida e
bebida. Agradeça pela graça da Eucaristia, pela Comunhão fraterna.
Agradeça pela sua casa, pela sua família, por cada uma das pessoas

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que você ama, pronuncie dentro de você o nome de cada uma delas,
visualize o rosto delas, pois é com elas que você comunga a vida, a fé
e a esperança. Agradeça a Deus por essas pessoas que chegaram até
você como expressão da graça de Deus. Agradeça também pelas
pessoas que a vida lhe presenteou, colegas de trabalho, de estudos, de
comunidade de fé, pessoas que fazem parte da sua vida diariamente,
agradeça por tudo o que você quiser. Louve o nome do Senhor Jesus,
reconheça que Ele é muito bom com você.
Conclua a sua oração com um salmo, com uma música de ação
de graças, que lembre a herança deixada por Jesus. Repita algumas
palavras, uma oração, por exemplo, “Vem Senhor celebrar a Páscoa
na minha vida, na minha casa”, ou outras que achar propícias. Conclua
o seu momento de oração com uma oração diária que você gosta.

TERCEIRO MOVIMENTO: A CRUZ E O AMOR

Chegamos ao momento dramático da vida de Jesus. Ele é


condenado à morte. Dá-se início a um longo processo, o acusado foi
denunciado pelas autoridades judaicas por perturbar a paz, o que não
seria suficiente para uma condenação. A seguir a denúncia passa ao
âmbito político, Jesus foi acusado de pretender ser o Rei dos Judeus, o
que para o império Romano seria imperdoável, uma vez que para
Roma existia apenas um rei, o Imperador, o César.
Até os nossos dias continuam as discussões sobre a causa da
morte de Jesus, porém o mais evidente é que Ele foi condenado pelo
seu compromisso com a proposta do Reino de Deus. Na verdade, Ele
jamais se autoproclamou “rei dos Judeus”, esses títulos foram usados

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por outros ao se referirem a Ele. O que é possível perceber a partir dos


evangelhos é que Jesus se comprometeu particularmente com aqueles
e aquelas que na época foram preteridos pelo poder religioso judaico e
pelo poder político romano. Havia uma quantidade enorme de pessoas
empobrecidas a partir dos altos impostos cobrados pelo império assim
como pela religião. No âmbito religioso criou-se um grupo de pessoas
consideradas cidadãos de segunda categoria, seja porque pertenciam a
grupos não puros como os samaritanos, doentes, pecadores públicos
como os cobradores de impostos e as prostitutas. A religião, o
Templo, tinha criado um mecanismo de centralizar os recursos, que
recolhia com os impostos e com a venda de produtos destinados à
oferendas. O empobrecimento levou muitas pessoas a exclusões, além
da social, também à exclusão religiosa. Jesus veio apresentar outra
maneira de compreender a Deus, a partir do Amor e da Graça. Não se
cansava de afirmar que as relações entre os seus seguidores não
poderiam ser iguais aos outros, deviam ser diferentes, uma vez que
deveria imperar a fraternidade fundamentada no amor. Chegou a
acolher todas as categorias de pecadores, doentes, mulheres,
samaritanos, cobradores de impostos, prostitutas, empobrecidos.
Chegou a perdoar pecados, o que em outras palavras significava uma
desautorização do Templo. Os pobres acorriam a ele em multidão,
pois ele purificava de graça, não precisava pagar com a moeda do
Templo.
Naturalmente Jesus significou um perigo para o comércio
religioso, assim como para o império que certamente na época não o
considerava pela insignificância do seu grupo. Isso é possível perceber
na reticência de Pilatos em condená-lo, de modo que para ele era mais

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do que suficiente um castigo corporal e público. Foram as autoridades


judaicas que insistiram na condenação e o motivo era mais do que
óbvio.
Começou desse modo a via-crúcis de Jesus, o caminho doloroso
que nada mais foi do que o caminho feito pelos condenados a carregar
a sua cruz nas costas até o lugar da execução. No caminho foi sendo
insultado, torturado pela truculência do poder político encarregado de
executar a ordem da morte.
O evangelho de Marcos (15, 21-47) narra, seguindo o seu estilo
abreviado, alguns aspectos intrigantes, como o grito de Jesus na cruz:
“Deus, meu Deus, por que me abandonaste?”. E a confissão de fé na
boca do centurião, “realmente este homem era filho de Deus”. A
narrativa do evangelho de São Lucas (23, 26-56), fiel à proposta de
apresentar o Jesus universal, que veio para todos os povos e não
apenas à descendência judaica, coloca Jesus no meio de dois ladrões,
dialoga com eles e chega a prometer a um que nesse mesmo dia
estaria com ele no paraíso. Mateus (27, 11-66) muito mais detalhista,
consegue narrar os fatos seguindo o seu esquema, narra a morte de
Judas, aparece a mulher de Pilatos que procura persuadir o seu
marido, mas mesmo assim as autoridades religiosas conseguiram que
Jesus fosse condenado à morte. O evangelista, desse modo,
responsabiliza diretamente aos judeus e suaviza o lado do império que
Pilatos representava. Também escreve sobre o véu do Templo que se
rasga em dois, o tremor da terra e o mais surpreendente, muitos
mortos ressuscitaram, como se o evangelista afirmasse que com a sua
morte, Jesus, conquistou o reino dos mortos. São João (19, 1-42) narra
os fatos seguindo os passos dos evangelhos sinóticos. Obedecendo

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também à sua proposta coloca diante da cruz o discípulo amado,


Maria, a mãe de Jesus, Maria de Cléofas e Maria Madalena. E o
famoso diálogo de Jesus com o discípulo amado acontece nesse
momento: “Mulher, aí está o teu filho”. E dirigindo-se ao discípulo:
“Aí está a tua mãe”. O evangelista conclui afirmando que desde esse
momento o discípulo levou Maria para a sua casa.
A Sexta-feira Santa é o reflexo do amor de Deus. Infelizmente, a
cruz revela muito mais a miséria humana do que a grandeza de Deus.
O sofrimento de Jesus e a sua morte não podem servir de argumentos
para sustentar a salvação dos nossos pecados. Muitos repetem com
facilidade que Jesus morreu pelos nossos pecados. Talvez seja melhor
afirmar que Jesus morreu pela maldade do mundo. Existe na teologia
uma corrente que entende a morte de Jesus como redentora, salvadora,
o que tem sentido, embora seja um argumento bem frágil, uma vez
que o sofrimento, a tortura, a morte não salvam ninguém. O que salva
não é o sofrimento infringido pelos soldados ao Filho de Deus, mas é
o Amor do Pai anunciado pelo seu Filho, o seu compromisso com o
projeto do Pai. Muitos não duvidam em afirmar que Jesus precisava
morrer para nos salvar, o que certamente é um equívoco, pois o que
salva é o Amor e não a morte. Naturalmente, a partir dos fatos,
procuramos compreender a morte de Jesus. Eis o fato que está á nossa
frente, como entender a morte do Filho de Deus.
Como seres humanos compreendemos bem o sofrimento e nos é
caro, pois nos identificamos com o sofrimento, somos especialistas em
sofrer e fazer sofrer os outros. Hoje, infelizmente, muitas pessoas
experimentam a dor muito mais do que uma condenação à cruz,
pessoas que morrem abandonadas nas sarjetas da vida. Não cabe

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dúvida de que devemos nos sentir profundamente tocados pelo gesto


de Jesus, que sendo Deus, submeteu-se à traição e à violência humana.
O que nos revela muito mais o rosto humano da traição, da mentira, da
falsidade, da desonestidade. A morte violenta será sempre execrável,
mas a cruz de Cristo, passa de um instrumento de tortura a um belo
instrumento de salvação. Jesus carregou com as nossas dores, tal e
qual o Servo Sofredor assinalado pelo profeta Isaias. Jesus assumiu a
humanidade na sua totalidade pagando por isso com a própria vida. O
que é maravilhoso no gesto de Jesus não é o fato de ter sido torturado
e morto numa cruz, mas a sua completa entrega à vontade amorosa do
Pai.

ITINERÁRIO ESPIRITUAL DA SEXTA-FEIRA SANTA

A espiritualidade que surge da Sexta-feira Santa é da dor, do


sofrimento, mas ao mesmo tempo é de ação de graças pelo Amor de
Deus que levou Jesus à sua entrega total. A fácil compreensão humana
da dor, permite uma identificação com os sofrimentos de Jesus, esta
data costuma ser de muita participação nas igrejas, especialmente se
houver procissão. Um pouco por tradição e outro pouco por devoção,
as pessoas gostam de acompanhar as horas mais escuras do Senhor
Jesus. O perigo desta espiritualidade reside em supervalorizar o
sofrimento, a dor e a morte. Não devemos esquecer o motivo da morte
de Jesus: “Vim para que a vossa vida seja abundante”. A nossa vida
cristã não deveria ser triste ou desesperada. Deveria ser de confiança,
a morte do nosso Senhor deve nos ajudar a assumir com dignidade os
sofrimentos que surgem e surgirão em nosso caminho humano.

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Teologia da Semana Santa – Itinerário Espiritual

Devemos repensar uma espiritualidade que se concentra demais


na ideia da pessoa como pecadora por excelência, alguém que precisa
sempre de Deus, que o carregue nas costas. Pessoas assim estão
sempre precisando se confessar para poder comungar, pensa que pode
até subornar Deus com algumas atitudes penitenciais como a
promessa de caminhar até um determinado santuário ou deixar de
comer alguma comida da sua preferência ou flagelar-se.
A espiritualidade da sexta-feira santa deveria nos levar a uma
atitude, além da ação de graças, de solidariedade com todos os caídos,
com todos os torturados, com todas as vítimas de violência na
sociedade, todos os que sofrem humilhações. Devemos respeitar a dor,
amar os sofredores, mas não devemos supervalorizar o sofrimento! A
salvação nos chegou através da entrega amorosa de Deus por cada um
de nós, e tal entrega começou desde o momento em que um anjo
visitou uma moça e pediu-lhe se poderia ser a mãe do Salvador. A
entrega começou na Anunciação, passou pela Encarnação e revelou-se
na ressurreição. Eis o caminho do Amor, desse Amor Salvador do Pai.
Infelizmente nesse caminho estava uma morte violenta. A beleza da
morte não reside em si mesma, mas na graça do Amor que a sustentou
e a superou. A morte foi superada.

ONDE VAMOS REZAR? Para este exercício de oração vamos


precisar apenas de uma cruz como símbolo. Mais uma vez procure um
lugar solitário, seu quarto ou outro lugar onde não será perturbado.
Sexta-feira exige muito silêncio, alguém morreu, alguém amou. A
morte como o amor merece reverência.

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COMO VAMOS REZAR? Escolha uma das narrativas da


paixão e morte de Nosso Senhor. (Mc, 14, 43-72. 15, 1-47); (Lc, 22,
47-71. 23,1-56); (Mt, 26, 47-75. 27, 1-66) Jo, 22, 47-71. 23, 1-56) e
após invocar o Espírito Santo, leia o texto em voz alta, para ouvir a
sua própria voz e tomar consciência de que precisa estar ali
completamente, depois leia mais vezes em silêncio. A seguir, feche os
olhos e comece a respirar pausadamente. Inspire devagar pelo nariz,
sentindo o ar encher os seus pulmões, expire pela boca bem devagar.
Repita a mesma operação, sempre bem devagar, sinta o ar entrando
em você, imagine que esse ar é a luz do Espírito Santo de Deus
invadindo todo o seu ser. E ao expirar expulse de dentro de você o que
lhe incomoda, a mágoa, a tristeza, a dor, sentimentos negativos, maus
pensamentos, expire bem devagar. Repita a operação umas cinco a
seis vezes. Depois respire lentamente, mas sem se concentrar na
respiração. Sempre com os olhos fechados, refaça a cena lida na sua
cabeça. Perceba quem são os personagens mais importantes. Jesus, os
apóstolos, Pedro, Maria, a mãe de Jesus, pense nos sacerdotes e
doutores da lei, em Pilatos e no Império Romano. Observe de que
modo Jesus recebe a condenação à morte, pois ele amava tanto a vida,
amava tanto às pessoas, gostava muito da natureza, todos os seus
ensinamentos são carregados de imagens da natureza. Perceba Jesus
diante das autoridades, diante do poder que quase sempre é injusto.
Acompanhe bem de perto a Jesus nessa jornada, observe o olhar das
pessoas vendo o Salvador pelas ruelas carregando uma pesada cruz.
Os encontros que acontecem pelo caminho. Acompanhe a Jesus nessa
subida para o monte do calvário. Veja o suor de Nosso Senhor, o
sangue que goteja da sua fronte. Olhe para Verônica, a mulher valente,

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cujo gesto de amor ainda guardamos com carinho até hoje. Veja o
Simão, o Cireneu, que empresta os seus ombros fortes para o Senhor,
enfraquecido pelas torturas, a fome e a sede. Observe os passos a
seguir, a crucifixão, os dois ladrões do seu lado. O silêncio da morte.
Coloque-se ao lado do discípulo amado, João, de Maria, a mãe, e das
outras mulheres e observe em silêncio. Dê o tempo que for necessário
para esse exercício. Depois desse exercício mental, de meditação,
chegou a hora de você se expressar com palavras.
O QUE VAMOS REZAR? Na verdade, diante da morte a
gente guarda silêncio, mas este ritual pede a nossa profunda ação de
graças. Pois diante do silêncio da cruz podemos lembrar toda a vida
do Senhor Jesus, então podemos agradecer. Agradeça em primeiro
lugar ao Pai do céu que por amor quis enviar o seu Filho para nos
ensinar o seu caminho, ou seja, o caminho do amor. Depois agradeça a
disponibilidade de Maria, o primeiro ser humano a contribuir com o
desejo salvífico de Deus. Ela disse sim ao Arcanjo Gabriel confiando
que as coisas que não compreendia, compreenderia mais tarde.
Agradeça por José, o pai terreno de Jesus, a generosa presença do
homem bom que acolhe na sua vida o projeto de Amor de Deus.
Agradeça pelo nascimento do Menino Jesus, eis o grande mistério
fazendo-se verdade. Agradeça pelo Menino que vai crescendo em
estatura, inteligência e graça. Agradeça pelos amigos adolescentes de
Jesus. Agradeça pelo dia que decidiu sair de casa, da carpintaria, para
seguir a vocação que o Pai lhe encarregou. Agradeça a missão do
anúncio do Reino de Deus. Agradeça a vida de Jesus, por todos os
seus ensinamentos, por devolver a esperança para aqueles que tinham
perdido o sentido do viver no meio de um mundo perverso. Agradeça

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pelo amor do Senhor que o levou, finalmente, à morte. Agradeça por


esse amor mais forte do que a morte. Não deixe de agradecer pela sua
vida, por tudo o que você tem de bom dentro de você, no seu mundo
interior, agradeça por tudo. Agradeça pela sua casa, pela sua família,
por cada uma das pessoas que você ama, pelas pessoas que chegaram
até você como expressão da gratuidade de Deus. Agradeça também
pelas pessoas que a vida lhe presenteou, colegas de trabalho, de
estudos, de comunidade de fé, pessoas que fazem parte da sua vida
diariamente, agradeça, agradeça por tudo o que você quiser. Conclua a
sua oração em silêncio como profunda reverência à morte do Nosso
Senhor.

QUARTO MOVIMENTO: O DESERTO

O Sábado Santo é o dia do silêncio, da ausência, do deserto.


Também é dia de muita atenção, da memória apurada dos gestos,
palavras e atos de Nosso Senhor. É um dia expectante como quando a
gente espera o retorno de uma pessoa amada. É um dia privilegiado
para a contemplação da vida, para o reconhecimento da grandeza do
projeto de Amor de Nosso Deus.
É um dia para nos aproximarmos sem medo do significado da
morte, da perda e das ausências. Adequado para pensarmos em nossos
antepassados que agora estão na presença do maior mistério que é o
Encontro com o Nosso Senhor, que é a nossa fé e a nossa esperança.
Vivemos num mundo que esconde a morte, que tem repulsa dessa
realidade, pois ela não vende, não se adequa ao mercado. E o que
vende? Tudo o que tem a ver com o hoje, o momento e com a

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promessa do porvir, com o futuro. Um corpo jovem, bem cuidado,


saudável, ideal, vende tudo o que possamos imaginar. Já a morte deve
ser escondida, pois ela pode mostrar as mentiras das promessas que o
mercado nos faz.
Devemos nos reconciliar com a ideia da morte, para podermos
viver melhor. Reconhecer que o tempo passa e que cada dia perdido
não voltará nunca mais. Cada dia é uma oportunidade para crescer,
saber um pouco mais, procurar se superar. A ideia da morte não deve
nos apavorar, ao invés disso deve fortalecer a nossa confiança em
Deus, e nos ajudar a viver melhor, reconhecendo que a nossa e a vida
dos outros é o dom maior. A sabedoria nos assegura que vive melhor
quem sabe que vai morrer, que um dia faltará, e por isso não pode
perder tempo com absurdos. A vida é tão preciosa que merece ser
vivida com intensidade sempre. Reconciliar-se com a ideia da morte
nos abre a possibilidade da sabedoria, que é o bom senso para escolher
viver na verdade, na transparência e na honestidade.
Liturgicamente, ao anoitecer do Sábado Santo, acontece a
comemoração mais bonita da Igreja Católica, considerada a mãe de
todas as celebrações. Começa com a benção do fogo novo, que
continuará aquecendo e iluminado a nossa vida, a proclamação de
Jesus como Senhor do Universo inteiro, o Alfa e o Ômega, princípio e
fim. Também é celebrada a escuridão, o templo permanece com as
luzes apagadas, pois a luz do fogo novo, do Senhor Ressuscitado
iluminará tudo com a proclamação do “Eis a Luz Cristo”. Após
quarenta dias, da quaresma, o povo de Deus exulta de alegria, e canta
Glória, como aqueles que acolheram Jesus na entrada a Jerusalém, tais
como os que gritaram afirmando que o Senhor estava vivo. Que tinha

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ressuscitado. Aleluia, o Senhor está vivo! Na liturgia da palavra se faz


memória da ação do Deus criador e do Deus Salvador, que por amor
fez tudo e depois acompanhou o seu povo enviando os seus profetas
para ajudar na caminhada humana no mundo, até que, finalmente,
decidiu enviar o seu próprio Filho, Jesus Cristo.

ITINERÁRIO ESPIRITUAL DO SÁBADO SANTO

Do Sábado Santo se desprende a espiritualidade da esperança


confiante. Da contemplação da cruz, da morte e da ausência. Trata-se
de uma espiritualidade fundamentada na confiança. Mesmo diante da
dor, da cruz, da morte, da solidão, o cristão deve permanecer
expectante. De modo que o sábado de Aleluia precisa ser muito mais
forte do que a sexta-feira de luto, pois a esperança abre a sua porta
para a verdade fundamental da nossa fé: O Senhor está vivo!
Em nossas comunidades as pessoas costumam participar, das
celebrações comunitárias, com mais fervor na Paixão de Nosso
Senhor, no Sábado um pouco menos e o Domingo de Páscoa quase
fica esvaziado. Claro que por trás das participações existe uma
compreensão teológica e uma espiritualidade. Sem dúvida alguma,
nenhum cristão católico deveria faltar na celebração do Sábado de
Aleluia e do Domingo de Páscoa.

ONDE VAMOS REZAR? Este exercício de oração precisará o


máximo de silêncio. Procure um lugar adequado. Se for possível tenha
perto de você a bíblia fechada e uma vela acessa. Hoje é dia de
contemplação.

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COMO VAMOS REZAR? Desta vez não vamos utilizar


nenhum texto, pois vamos contemplar a ausência, o silêncio, a
penumbra, a morte, a cruz vazia, o túmulo. Vamos ter uma atitude de
confiante espera. Invoque o Espírito Santo, desta vez com mais
insistência, peça ao Espírito do Senhor que lhe ajude nesta
contemplação, que lhe auxilie para compreender melhor o mistério do
Amor de Jesus. Pense no Espírito Santo, cuja imagem mais linda é a
do vento suave que invade tudo, que consegue ingressar nos lugares
menos pensados, pois é capaz de invadir todas as realidades humanas.
Ele é o consolador, aquele que ficou encarregado de atualizar
constantemente a memória de Jesus Cristo.
A seguir, feche os olhos e comece a respirar pausadamente.
Inspire devagar pelo nariz, sentindo o ar encher os seus pulmões,
expire pela boca bem devagar. Repita a mesma operação, sempre bem
devagar, sinta o ar entrando em você, imagine que esse ar é a luz do
Espírito Santo de Deus invadindo todo o seu ser. E ao expirar expulse
de dentro de você o que lhe incomoda, a mágoa, a tristeza, a dor,
sentimentos negativos, maus pensamentos, expire bem devagar.
Repita a operação umas cinco a seis vezes. Depois respire lentamente,
mas sem se concentrar na respiração. Com os olhos fechados, crie um
cenário na sua cabeça, veja um deserto imenso. Escute o barulho
suave do vento, sinta o calor do sol, dia radiante, quente, veja a areia
amarelada sem nenhum animal ou ser humano. Eis a solidão do
deserto. Fique contemplando esse cenário. Veja a imensidade daquela
terra formada por areia. Veja perto de você uma sombra, pode ser uma
tenda, procure um lugar ali, se acomode, pode sentar para estar mais
cômodo. Ali no silêncio do deserto observe o seu corpo. Comece

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pelos pés. Como eles estão? Cansados? Já andaram bastante? Quais


foram os lugares onde os seus pés levaram você? Quantos lugares, não
é mesmo? Olhes os dedos dos seus pés, as suas unhas. Como estão os
seus dedos? Bem cuidados, maltratados? Observe agora as suas pernas
esticadas. Sinta o sangue que as recorre, sinta o calor delas. Observe a
sua cintura, os seus órgãos vitais, sinta o ventre, as costelas, o peito, as
costas. Olhe os seus braços, as suas mãos, os seus dedos. Sinta o seu
pescoço, o rosto, a cabeça, sinta os olhos, os ouvidos, a boca, a língua,
os dentes. Sinta o seu coração batendo devagar, bombeando sague
constantemente, sinta os pulmões, os rins, o fígado, sinta tudo
funcionando perfeitamente. Que bom que você está ali, assim como
Deus Pai lhe criou, uma pessoa inteira, perfeita, saudável. Veja que
alguém está se aproximando de você nesse momento. Olhe para Ele, é
Jesus que vem lhe fazer companhia no deserto. Convide Ele a se
sentar do seu lado. Perceba o rosto dele, nenhum sinal de tortura, de
sofrimento, é um rosto luminoso. A presença Dele cria um ambiente
de tranquilidade, de muita paz. Observe as mãos Dele, veja os furos
que os pregos fizeram, veja que ficaram as cicatrizes para nos lembrar
da beleza do Amor capaz de se entregar até as últimas consequências.
Deixe que o Senhor Jesus fale para você o que Ele quiser falar.
Certamente falará de compaixão, de amor, de verdade, de justiça
como fez quando vivia na Galileia. Deixe que fale o que você está
precisando ouvir. Abra bem os seus ouvidos, abra bem o seu coração
para compreender melhor a suas palavras. Não tenha medo, confie
Nele, Ele será compassivo, amoroso, verdadeiro e justo. Deixa Jesus
falar o quanto quiser, você não questione, apenas escute, apenas
contemple. Não tenha pressa, dê o tempo que for necessário para esse

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encontro no deserto. Depois desse exercício mental, de contemplação,


chegou a sua vez de se expressar.
O QUE VAMOS REZAR? Aproveite desse momento no
deserto com o Espírito Santo e com Jesus para falar com Ele o que
estiver em seu coração. Conte para Ele, embora Ele já saiba como está
a sua vida, conte tudo, as suas dificuldades, os seus problemas, as suas
necessidades, as suas conquistas, todas as coisas boas da sua vida.
Aproveite para falar, utilizando as suas palavras, sobre os seus
sentimentos. Fale com Ele como se fosse um amigo que está aí do
lado para lhe ouvir, acolher, amar e perdoar. Confie Nele, não tenha
medo. Fale tudo o que estiver em seu coração, pois essa será a melhor
oração de todas, a que nasce da sua intimidade. Não deixe de
agradecer a Jesus a sua vinda, a sua Encarnação, por tudo o que nos
ensinou, por nos ter mostrado caminhos para uma humanidade sadia.
Por ter nos mostrado o caminho da maturidade humana e cristã que
consiste em acolher e viver a compaixão, a verdade e a justiça.
Agradeça pelo seu maior gesto de Amor que foi não ter evitado a
morte, não ter fugido, ensinando-nos assim o quanto acreditava na sua
proposta do Reino de Deus. Agradeça ao Pai do céu a Ressurreição, a
recriação da Vida, que antecipa a nossa esperança. Agradeça a
disponibilidade de Maria, que ela continue rezando conosco. Não
deixe de agradecer pelo dom da sua vida, pela sua corporeidade, pela
sua espiritualidade. Agradeça pela sua família, por cada uma das
pessoas que você ama, pelas pessoas que chegaram até você como
expressão do Amor de Deus, seus amigos, colegas de trabalho, de
estudos, de comunidade de fé, pessoas que fazem parte da sua vida
diariamente, agradeça, agradeça por tudo o que você quiser. Conclua a

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sua oração repetindo quantas vezes quiser: “Glória, glória, aleluia, Ele
está Vivo no meio de nós”.

QUINTO MOVIMENTO: E VENCEU O AMOR

Chegamos ao último dia do nosso itinerário! Domingo de


Páscoa. Perceba que começamos com o Hosana do Domingo de
Ramos e concluímos com outro louvor, embora neste dia o grito seja
diferente: “Aleluia, o Senhor está vivo!”.
A celebração do Sábado à noite antecipou este último
movimento. Aconteceu na história humana outro fato impensado,
como a própria criação, a libertação do povo de Deus da escravidão do
Egito, o anúncio do Anjo Gabriel, a Encarnação, o nascimento do
menino Jesus, a revelação de que Jesus é o Filho de Deus, a sua morte
e agora esta maravilhosa Boa Nova: Ele ressuscitou.
A ressurreição, diferentemente de outras doutrinas, significa a
recriação da pessoa. Isto é, com a morte o ser humano termina, não há
mais nada que se possa fazer, os antigos gregos, por exemplo,
celebravam a morte com entusiasmo, pois viam nela a possibilidade
de libertação, a alma finalmente ia se libertar da prisão do corpo. Para
a nossa fé, de raiz bíblica, não existe tal possibilidade, o ser humano é
Uno na vida e na morte, de modo que ao chegar a morte, acabou tudo
no âmbito terreno, pois o próximo estágio depende completamente do
Amor Criativo de Deus Pai. Ele pode nos devolver a Vida, a
ressurreição significa ser recriado, de modo que se recupera a
identidade, o ser, o eu. Eis a novidade! Jesus ressuscitou, ele está
Vivo. Perceba que ao aparecer ele não foi reconhecido pelos seus

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amigos e seguidores. O exemplo do encontro no jardim quando Maria


não o reconhece, o fará quando ouve a sua voz, indicando que o
Ressuscitado estava ali com o seu corpo recriado, com o corpo celeste.
São pequenos brilhos que os evangelhos nos deixam como
testemunho, para que possamos acreditar.
Os testemunhos dos evangelhos convergem em alguns pontos
essenciais. Por exemplo, são unânimes em afirmar que as primeiras
testemunhas foram as mulheres; também unânimes em afirmar que
Jesus apareceu aos seus discípulos e que antes de elevar-se para junto
do Pai, os enviou a anunciar o seu nome ao mundo inteiro. Cada um
dos evangelhos têm as suas peculiaridades em alguns pontos,
acrescentando ou ignorando alguns deles.
Marcos (16, 1-20) é breve na sua narração sobre a Ressurreição,
mas não deixa de lado os pontos importantes como as mulheres que
foram até o sepulcro, a dúvida dos apóstolos, e o envio. Porém algo
muito interessante é uma pequena informação que resgato aqui. Os
doze vão reconhecer o Ressuscitado quando estavam à mesa. Este fato
abre espaço para pensarmos sobre a importância que tinha esse lugar
para Jesus e seus amigos, certamente um lugar de encontro e de
gratuidade. Quem sabe indique algo da importância da mesa, do pão
da vida e da comunhão. Lucas (24, 1-53), também começa com o
testemunho das mulheres, Maria Madalena, Maria de Tiago e Joana. O
que resulta diferente neste evangelho é o desenvolvimento da
informação deixada por Marcos, de que Jesus tinha aparecido para
dois deles no campo. O episódio dos discípulos de Emaús (13-35) é
uma bela catequese, pois tenta responder sobre a pergunta daqueles
que não conviveram com Jesus e desejam fazer a experiência do

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Senhor ressuscitado. De modo que esta passagem foi escrita pensando


em cada um de nós. Como podemos experienciar hoje o Ressuscitado
em nossa vida? A narrativa nos indica três modos: o primeiro é ouvir
atentamente o que o Senhor tem a nos dizer. Como? Através da
Sagrada Escritura, que poderá fazer arder o nosso coração; o segundo
modo reside na partilha do pão, que certamente abrirá os nossos olhos;
finalmente o modo privilegiado de fazer a experiência do ressuscitado
consiste em se levantar, refazer o caminho da dúvida e, mesmo “sendo
noite”, testemunhar. A narrativa de Mateus (28, 1-20) não é muito
diferente da dos outros dois sinóticos. O evangelista acrescenta a
informação de que houve um boato de que os discípulos roubaram o
corpo de Jesus, as autoridades teriam pago para que a mentira fosse
propagada entre o povo. O Evangelho de São João também é fiel à
narrativa dos sinóticos no que se refere ao testemunho das mulheres.
Depois continua com a proposta própria do evangelho. As mulheres
contam o que viram, de modo que João, discípulo amado, e Pedro
saem correndo para verificar o fato. Os dois corriam um ao lado do
outro, mas o discípulo amado foi mais veloz e chegou antes de Pedro
no sepulcro. Não se trata naturalmente de uma prova de velocidade,
mas do seguimento do Senhor Jesus, é como se o evangelista nos
dissesse que o amor é sempre mais veloz. A graça é tão veloz que
sempre chega antes.

ITINERÁRIO ESPIRITUAL DO DOMINGO DE PÁSCOA

A espiritualidade que surge do Domingo de Páscoa é a alegria,


da confiança e do louvor. Ele está vivo! Não podemos mais guardar

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essa verdade para nós, devemos testemunhar com a nossa vida.


Devemos assumir para nós a beleza dessa graça, Ele ressuscitou, não
há motivos para tristeza, para culpas, para sacrifícios. Ele está vivo!
Venceu a morte! Podemos gritar Aleluia, Aleluia o Senhor está vivo!

ONDE VAMOS REZAR? Nesta altura você já tem o seu lugar


privilegiado onde costuma rezar. Volte lá, pois deve ser um lugar
adequado. Se for possível tenha perto de você um vaso com flores,
caso não seja possível uma vela acessa será suficiente.
COMO VAMOS REZAR? Vamos escolher a passagem dos
discípulos de Emaús (13-35). Como de costume, invoque o Espírito
Santo para que lhe inspire uma bela contemplação. Peça com alegria e
confiança o Espírito do Senhor ressuscitado. Depois leia em voz alta o
texto escolhido, e depois em silêncio as vezes que quiser para que a
passagem fique na sua memória. A seguir, com os olhos fechados,
comece a respirar pausadamente. Inspire devagar pelo nariz, sentindo
o ar encher os seus pulmões, expire pela boca bem devagar. Repita a
mesma operação, sempre bem devagar, sinta o ar entrando em você,
imagine que esse ar é a luz do Espírito do ressuscitado invadindo o
seu ser. E ao expirar expulse de dentro de você o que lhe incomoda, a
mágoa, a tristeza, a dor, sentimentos negativos, maus pensamentos,
expire bem devagar. Repita a operação umas cinco a seis vezes.
Depois respire lentamente, mas sem se concentrar na respiração.
Com os olhos ainda fechados, crie o cenário na sua cabeça, veja
um caminho à sua frente. Você está caminhando como mais alguém
ao seu lado. Você está retornando para a sua casa, com a cabeça baixa,
triste pelo acontecido, decepcionado com a morte do Mestre. Veja o

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lugar, perceba o seu companheiro que, igual a você, caminha abatido.


Veja nesse instante alguém mais chegar perto de você. Parece alguém
conhecido, mas nem o seu companheiro nem você desejam perguntar
quem é ele. Essa pessoa toma a iniciativa de falar com vocês, pergunta
por que estão desse modo. Você explica para ele o acontecido. Então
Ele com uma sabedoria infinita explica para vocês que tudo isso
estava escrito na Sagrada Escritura. Sinta a voz Dele, a suavidade, o
amor como fala, a paciência. Perceba como fica o seu coração
enquanto Ele vai falando. Surge uma alegria dentro de você, uma
força diferente, como uma ternura infinita. Nem percebem o tempo e
já estão chegando na sua casa. A pessoa fez que ia seguir a viagem.
Então você toma a palavra novamente e faz uma bela oração: Fica
conosco, Senhor! Repita essa palavra dentro de você. Está
escurecendo, fica conosco, Senhor! A seguir vocês estão na casa, à
mesa, tem água e pão. Então, o Senhor toma o pão e o reparte entre
vocês. Nesse momento os seus olhos se abrem. E o Senhor não está
mais com você, mas inexplicavelmente alegria em seu coração
permanece. Não sente medo algum, embora seja noite. Agora você se
levanta e convida o seu companheiro a retornar para contar a
experiência que acabam de ter. Não tenha medo, confie no
Ressuscitado, deixe que Ele guie você. Continue contemplando, veja a
sua vida, o seu testemunho sem medo. Não tenha pressa, se dê o
tempo que for necessário. Depois desse exercício mental, de
contemplação, chegou a sua vez de se expressar.
O QUE VAMOS REZAR? Aproveite para agradecer e louvar
ao Senhor. Veja que voltamos ao ponto de início, ao louvor, à ação de
graças. Louve ao Amor, louve ao Pai que ressuscitou Jesus. Agradeça

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pelo seu amor em sua vida, louve por tudo o que tem, pelo que você é.
Você é uma testemunha do Ressuscitado, você fez a experiência Dele.
Agradeça, louve, cante, não tenha medo de louvar. Confie no Senhor,
não deixe de agradecer a Jesus pela sua Vida, pelo seu projeto do
Reino de Deus, agradeça por tudo. Agradeça ao Pai do céu a
Ressurreição, a recriação da Vida. Agradeça a disponibilidade de
Maria, que ela continue nos animando pelo caminho da nossa vida.
Agradeça pela sua família, por cada uma das pessoas que você ama,
pelas pessoas que chegaram até você como expressão do Amor de
Deus, seus amigos, colegas de trabalho, de estudos, de comunidade de
fé, pessoas que fazem parte da sua vida diariamente, agradeça,
agradeça por tudo o que você quiser. Conclua a sua oração repetindo
quantas vezes quiser: Senhor ressuscitado, fica conosco! Já esta
escurecendo em nossa vida, fica conosco, Senhor!

CONCLUSÃO

Agradeço que tenha chegado até aqui, espero que o texto tenha
ajudado. Este itinerário traz apenas propostas e você poderá adaptá-lo
como achar melhor. Perceba que você poderá utilizá-lo em qualquer
momento do ano, não somente na Semana Santa.
Nos cinco movimentos vivemos os últimos acontecimentos da
vida de Jesus, a entrada triunfal na cidade de Jerusalém, a celebração
da última ceia com os seus discípulos, a sua paixão e morte, e
finalmente a ressurreição. De cada movimento extraímos elementos da
nossa espiritualidade cristã que poderíamos resumir do seguinte modo:
O ponto de partida é o louvor e a ação de graças, depois vem a entrega

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de amor em forma de herança que é a comunhão com as suas três


dimensões: a partilha, o serviço e o novo mandamento que é o amor
aos outros. Depois vem a paixão, a dor, o sofrimento, a cruz. A
espiritualidade não pode ignorar estas verdades, embora não seja lícito
limitar-se a elas, do mesmo modo que o a espiritualidade do louvor
não pode ignorar o sofrimento e a cruz que continuam em nossa
realidade. O ponto de chegada é o louvor e a ação de graças, pois
nosso Senhor ressuscitou.
A teologia da Semana Santa é um convite para centramos a
nossa espiritualidade nesses elementos fundamentais da nossa fé.
Semana Santa é tempo de anúncio, de renascimento e de revelação,
além de ser um apelo a assumirmos a nossa vida com confiante
alegria, pois fomos amados, resgatados e salvos pelo poder infinito do
Amor.
Feliz Páscoa para você e sua família.
(Oscar L. Maldonado)

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