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RESUMO
O presente artigo demonstra, por intermédio de técnicas de geoprocessamento e medições
de campo, como a inter-relação de fatores ambientais e antrópicos, influenciam na
temperatura do ar e de superfície em escala microclimática no ambiente urbano. Tendo como
área de estudo uma cidade média da Zona da Mata Mineira, o trabalho busca demonstrar
esse processo crescente em uma escala local, abrangendo três bairros localizados na zona
oeste da cidade de Juiz de Fora - MG. Fazendo uso de dados primários comumente utilizados
em estudos climáticos, como albedo, vegetação, altitude, emissividade, dentre outros fatores,
o artigo teve como finalidade comprovar como as diferentes formas e intensidades da
influência humana no meio são capazes de gerar desequilíbrios energéticos nos sistemas
locais causando alterações climáticas em diferentes escalas. Assim sendo, é exibido no
presente artigo como a combinação desses fatores, aliados às características ambientais e
geomorfo-climáticas locais causam diferenças térmicas e influenciam na criação de diferentes
microclimas dentro da área urbana.
ABSTRACT
This article demonstrates, through geoprocessing techniques and field measurements, how
the interrelation of environmental and anthropic factors influence air and surface temperature
on a microclimatic scale in the urban environment. Having as a study area a medium-sized
city in the Zona da Mata Mineira, the work seeks to demonstrate this growing process on a
local scale, covering three neighborhoods located in the west zone of the city of Juiz de Fora-
MG. Making use of primary data commonly used in climate studies, such as albedo, vegetation,
altitude, emissivity, among other factors, the article aimed to prove how the different forms and
intensities of human influence on the environment are capable of generating energy
imbalances in local systems causing climate change on different scales. Therefore, it is shown
in this article how the combination of these factors, allied to local environmental and
geomorpho-climatic characteristics cause thermal differences and influence the creation of
different microclimates within the urban area
anacarolina.assis@ufjf.estudante.ufjf.br
3 Mestre em Geografia, Universidade Federal de Juiz de Fora, yan.vianna@ufjf.br
4 Professor Associado I, Universidade Federal de Juiz de Fora, fabio.sanches@ufjf.br
5 Professora Titular, Universidade Federal de Juiz de Fora, cassia.castro@ufjf.br
1. Introdução
Em sua obra A urbanização brasileira, Santos (2013) demonstra como a partir da
década de 1940 se compreende a mudança estrutural na habitação da população brasileira.
No intervalo de 1940 a 1980 a taxa de urbanização cresceu 42,51% e a população total do
país também acompanhou esse ritmo, sendo inicialmente aproximadamente 41 milhões de
habitantes e após 40 anos, ultrapassou a marca de 119 milhões (SANTOS, 2013, p. 31-32).
Nessa perspectiva, a variação da população total do Brasil entre os anos 40 e 80 variou
188,43% (SANTOS, 2013, p. 31-32). Foi nesse período que se iniciou a inversão da
localização de moradia da população brasileira, que até antes de 1970 dava-se
majoritariamente no campo. A vista disso, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE), a população urbana no país teve um crescimento de mais de 100 milhões
de indivíduos entre 1970 e 2010 (IBGE, 2010a). Logo antes da segunda década do século
XXI, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios de 2015 (IBGE Educa), o Brasil
apresentava 84,72% da sua população vivendo em área urbana e somente 15,28% em áreas
rurais, destaque para a região Sudeste apresentando taxa urbana ainda maior, de 93,14%.
Na década de 1960, se intensificaram os estudos acerca do clima urbano no Brasil, o
Professor Dr. Carlos Augusto de Figueiredo Monteiro apresentou em 1975 o Sistema Clima
Urbano (S.C.U.), que diz sobre as ações humanas de mudança no meio urbano resultarem
em um clima urbano diferente de áreas não urbanizadas. “O clima urbano é um sistema que
abrange o clima de um dado espaço terrestre e sua urbanização.” (MONTEIRO; MENDONÇA,
2003. p.19).
Para Sorre, o clima é “a série dos estudos atmosféricos acima de um lugar em uma
sucessão habitual.” (1955, p.14). Para Monteiro, o conceito de clima necessitava de um
paradigma mais geográfico. Segundo Vianna (2018), Carlos Augusto Figueiredo Monteiro:
Dessa maneira, o clima é entendido por sua totalidade, seu ritmo, levando também em
consideração extremos que possuem grande importância para a Geografia tendo em vista
que são esses os maiores impactantes na vida humana e no meio.
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2. Metodologia
É fato que a urbanização afeta de forma direta e indireta o clima de diferentes formas,
podendo gerar mudanças em diversas escalas a depender do nível de intervenção humana,
Monteiro (1975) cita:
Seja pela explosão demográfica, seja pela explosão das atividades, os espaços
urbanos passam a assumir o impacto máximo da atuação humana sobre a
organização na superfície terrestre e na deterioração do ambiente. (p. 54).
A cidade de Juiz de Fora se encontra em uma área de clima tropical de altitude, com
relevo de “mares de morro” sendo sua principal expressão geomorfológica (AB ́SABER,
2003). Consiste na quarta maior cidade de Minas Gerais, em relação à população, segundo
o censo de 2010 do IBGE (IBGE, 2010b), perdendo somente para a capital, Belo Horizonte,
Contagem e Uberlândia. É um entremeio urbano entre duas capitais de grande importância
nacional, Belo Horizonte e Rio de Janeiro.
A região estudada se encontra no bairro São Pedro, na zona oeste da cidade. Este
possui um histórico de evolução urbana que se acentua a partir do final do século XX, com a
construção de vias de acesso que facilitam a mobilidade entre as regiões centrais e o mesmo.
Esta área da cidade, também conhecida como Cidade Alta, na qual estão localizados os três
bairros objetos deste estudo, São Pedro, Nossa Senhora de Fátima e Cruzeiro do Santo
Antônio (Figura 1). Bairros estes que apresentaram um grande aumento populacional quando
analisados os dados entre 2000 e 2010, observando-se aumento populacional de 32%,
correspondendo a cerca de 29.300 habitantes, em 2000 e saltando para mais de 38.700 de
habitantes em 2010 (SANGLARD, 2011).
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Altimetria Altitude
Fonte: Adaptado de Ferreira (2014).
O modelo seguido foi proposto por Ferreira (2014) e aplicado por Vianna (2018),
possibilitando através da associação de determinadas variáveis visualizar as características
do ambiente urbano e sua relação com a atmosfera urbana. “O modelo permite identificar
áreas potencialmente quentes ou frias em função de um conjunto de variáveis que
representam as características que contribuem para alteração no campo térmico urbano.”
(VIANNA, 2018, p. 71).
Todo o processo foi feito no ArcMap 10.7.1 com o auxílio do Google Map e Google
Earth Pro para visualização do número de pavimentos e tipo de cobertura das
edificações. Durante o processo de construção de mapas básicos a tabela de atributos do
shape camada de lotes foi utilizado para armazenamento de informações como: tipo de
cobertura e número de pavimentos de cada edificação. Em relação ao número de pavimentos,
não foram considerados pavimentos os terraços com cobertura mas que não possuíam
paredes fechadas.
Posteriormente, foram considerados variáveis de cada lote em consideração, nas
quais: vegetação, albedo, emissividade, massa construída e impermeabilidade foram
inseridas na tabela de atributos. Cada variável possui um peso relacionado a sua capacidade
de aquecimento ou resfriamento.
2.1 Albedo
O albedo, segundo Oliveira e Mendonça (2007), é definido como a capacidade que
os corpos têm de refletir a radiação solar que incide sobre eles, variando de acordo com a sua
cor e constituição, sendo corpos o máximo de albedo e os pretos o mínimo.
Desse modo, o albedo foi utilizado para quantificar a energia que os corpos, da região
estudada, podem absorver. Os valores variam de 0,2 para vegetação arbórea, até 0,57 para
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2.2 Emissividade
Segundo NOVO, et al. (2014), a emissividade é “[...] esta propriedade de re-irradiação
da energia absorvida por um material” (p. 25) e esta, pode variar de 0 a 1, sendo que em 0 o
corpo possui uma reflectância total de energia, portanto não a absorve e não a irradia, e 1
sendo que ele absorve toda a radiação que incide e assim possui um máximo de emissividade.
Conjuntamente, foi utilizado o peso da emissividade, que no trabalho variou nos valores de 1,
2 e 5. (VIANNA, 2018).
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2.6 Permeabilidade/impermeabilidade
O vetor de permeabilidade diz respeito à capacidade de uma superfície de permitir
ou não a infiltração da água em um corpo. No trabalho foram consideradas as seguintes
situações: superfícies impermeáveis onde não há absorção de água sendo áreas asfaltadas
e construídas, superfícies semipermeáveis sendo áreas com existência de vegetação com
seu ao redor cimentado, e por fim, áreas permeáveis com penetração e absorção total da
água sendo tidas como áreas gramadas. Seguindo a proposta de Vianna (2018), os valores
atribuídos aos pesos da impermeabilização foram: impermeável 5, semipermeável 4 e
permeável 0.
2.7 Mapas
Em suma, após utilizar essas variáveis para criar mapas base, todos os elementos
foram transformados em raster por intermédio da ferramenta featuring to raster para que
pudessem ser agregados em um mapa final de potencial térmico, processo esse realizado
mediante a ferramenta raster calculator do ArcMap. A figura 2 ilustra a sequência de mapas
utilizados para a geração do mapa síntese de potencial térmico.
Assim, com o intuito de se compreender essas características díspares que podem
surgir em regiões urbanas, e através de uma série de dados geocodificados, em escala local
da área, que foram disponibilizados pela Prefeitura Municipal de Juiz de Fora para o
Laboratório de Climatologia e Análise Ambiental da UFJF, foi possível a elaboração de
material cartográfico-temático, inicialmente de mapas básicos que possibilitaram a construção
de mapas temáticos que ao fim produziram o mapa final de potencial térmico.
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19/03/2023 21/03/2023 23/03/2023 24/03/2023
3. Resultados e discussão
Após o emprego da metodologia proposta por Ferreira (2014) foi possível afirmar que
a urbanização teve um intenso impacto na criação de diferentes potenciais térmicos dentro da
área de estudo. Nas áreas com maior concentração de construções, maior massa
construídas, extensas áreas impermeabilizadas e pouca vegetação, como é o caso do bairro
Nossa Senhora de Fátima, localizado à leste da área de estudo (Figura 3), apresentou em
sua maior parte, áreas com potencial térmico médio ou alto. Em contrapartida, a região do
bairro Cruzeiro do Sul, à oeste da área de estudo, no qual se localiza a represa de São Pedro,
e que apresenta uma vasta vegetação em comparação aos demais bairros analisados,
apresentou um baixo potencial térmico.
Já no que diz respeito ao bairro São Pedro, que se encontra no entremeio dos outros
bairros, pode-se observar uma maior influência da urbanização e da importância das áreas
vegetadas na determinação do potencial térmico da área. Sendo uma área limítrofe de dois
bairros opostos em questão de potencial térmico, o bairro São Pedro apresenta desde áreas
com potencial muito baixo até muito alto, variando em toda sua extensão a depender da
distribuição dos elementos como vegetação ou áreas mais densamente urbanizadas.
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Como pode ser visto na Figura 3, é possível detectar diferenças nos potenciais
térmicos desses bairros, sendo que o bairro Cruzeiro do Santo Antônio possui os potenciais
térmicos mais amenos. Este bairro apresenta maior cobertura vegetal (82% da área do bairro)
enquanto os demais bairros possuem 51% e 39% de cobertura vegetal, este também possui
outros fatores de amenização de temperatura do ar e de superfície, como é o caso da represa
de São Pedro que é um grande corpo d’água com 3% da área do bairro. Segundo Mascaró e
Mascaró (2005) a cobertura vegetal e os corpos hídricos são importantes mitigadores
térmicos, em função da sua capacidade térmica, albedo e sombreamento, desta forma, uma
maior presença destes elementos no meio, viabilizam uma superfície mais fria e uma
temperatura do ar mais baixa.
Seguidamente, analisando o mapa do bairro de São Pedro, detecta-se que a maior
parte de sua região se situa com potencial médio e baixo, sendo uma região com um maior
número de residências, totalizando quase 4000 moradias, ele possui uma significativa
intervenção antrópica, o que contribui para o aumento da temperatura de superfície no bairro,
todavia, ainda é possível notar um número razoável de áreas vegetadas dentro de seus
limites. Do total de sua extensão (4.152.098 m²) 51% dessa área ainda possui algum tipo de
vegetação, outro fator que corrobora para temperaturas mais amenas, é o fato de não possuir
áreas com uma alta concentração de verticalização, como no bairro que será tratado a seguir.
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O mapa a seguir foi feito à partir dos dados registrados em campo, utilizando as
médias do dia 24 de março de 2023, dos pontos nos bairros São Pedro, Nossa Senhora de
Fátima e Cruzeiro do Sul.
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4. Considerações finais
O Presente artigo apresenta as diferenças de potenciais térmicos entre bairros de
uma mesma região da cidade de Juiz de Fora, apresentando áreas com potencial térmico
muito baixo até áreas com potencial térmico muito alto.
Somado ao mapa de potencial térmico, a coleta de dados de temperatura do ar em
pontos diferentes, da mesma região estudada, contribuiu para a comprovação de diferença
de resfriamento e aquecimento de cada bairro. Sendo, o ponto 6 o que apresentou
temperaturas do ar mais amenas e a região com potencial térmico mais baixo, comparado
aos demais pontos. Já o ponto 2 apresentou as maiores temperaturas do ar e potencial
térmico muito alto.
Dessa maneira, foi possível concluir que áreas mais urbanizadas, com solos menos
vegetados e maior concentração populacional, apresentam maior potencial térmico e maiores
temperaturas do ar. Em contrapartida, a região com maior concentração vegetal e hídrica e
urbanização mais desaceleradas apresentou temperaturas do ar mais amenas e potencial
térmico mais baixo.
O modelo de Ferreira (2014) mostrou grande eficácia nos resultados de potencial
térmico, aliado à escolha coerente das variáveis consideradas em relação à área de estudo.
Além da possibilidade de aglutinação de mais metodologias para uma maior análise dos
resultados.
5. Agradecimentos
O trabalho foi realizado com apoio financeiro do Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), financiamento de projeto e bolsa de
iniciação científica.
O presente artigo foi realizado com o apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de
Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) - Bolsa mestrado.
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IBGE, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Cidades e Estados - Juiz de Fora, 2021.
Disponível em: https://www.ibge.gov.br/cidades-e-estados/mg/juiz-de-fora.html. Acesso em:
18 de mar. 2023.
MASCARÓ, L. R. MASCARÓ, J. Vegetação urbana. Porto Alegre: 4 mais editora 2005. 204p.
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SANGLARD, F. Cidade Alta é a região que mais cresce em JF. Jornal Tribuna de Minas.
Juiz de Fora - MG, 08 de agosto de 2011. Disponível em:
https://tribunademinas.com.br/noticias/cidade/07-08-2011/cidade-alta-e-a-regiao-que-mais-
cresce-em-jf.html#goog_rewarded. Acesso em: 25 de mar. 2023.
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