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Organização:
Revisão:
Belém-Pará
2019
Universidade Aberta do Brasil – UAB
Reitor
Rubens Cardoso da Silva
Vice-Reitor
Clay Anderson Nunes Chagas
Apresentação
Qualquer dúvida, seja de terminologia, seja de campo da pesquisa lingüística, pode ser
resolvida, em parte, com uma adequada consulta a essa obra.
E, para esta disciplina, especificamente, recomendamos, ainda, a leitura das obras
de BAGNO, Marcos (Org.). Linguística da norma. São Pulo, Loyola, 2004 e CÂMARA JR.
Joaquim Mattoso. Estrutura da língua portuguesa. Petrópolis, Vozes, 1989.
Por fim, a tônica desta disciplina incide numa análise da função da Lingüística na
construção de um ensino de línguas mais condizente com os dias atuais, a partir de uma
reflexão de como as suas teorias em ebulição contribuem para o aperfeiçoamento do perfil
do profissional de Letras do século XXI, que exige, cada vez mais, a militância necessária
ao desabrochar de um ensino crítico.
Fundamentar teoricamente a prática da análise linguística, deste profissional, é o
desafio!
Boa leitura!
Profª. Dr. Maria do Perpétuo Socorro Cardoso da Silva
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PLANO DE ENSINO
I – IDENTIFICAÇÃO
Curso: Letras Disciplina: Linguística I
II – EMENTA
CONTEÚDO
1.5 A linguística do século atual
1.6 Tendências recentes em linguística geral
1.7 A diversidade teórica na linguística
1.8 Formalismo X funcionalismo
1.9 A contribuição de Ferdinand de Saussure
CONTEÚDO
2.1 A crítica de Coseriu
2.2 Dicotomia langue/parole
2.3 Dicotomia sincronia/diacronia
CONTEÚDO
3.1 Conceito saussureano
3.2 Princípios da arbitrariedade e da linearidade
3.3 As relações sintagmáticas e correlatas paradigmáticas
CONTEÚDO
4.1 Conceitos: primeira e segunda articulação.
V – METODOLOGIA
Os conteúdos da disciplina serão desenvolvidos por meio de estratégias didático-
pedagógicas diferenciadas, com a inclusão de orientações on line, exposições, fóruns,
slides, atividades práticas e leituras
VI – AVALIAÇÃO
O processo avaliativo ocorrerá de acordo com as regras preestabelecidas pela
instituição e pelo sistema de educação a distância, considerando também a participação, a
presença, o desenvolvimento, o desempenho e o interesse do discente nas atividades
propostas.
VII – REFERÊNCIAS
BÁSICAS
BAGNO, Marcos (Org.). Linguística da norma. São Pulo, Loyola, 2004.
CÂMARA JR. Joaquim Mattoso. Estrutura da língua portuguesa. Petrópolis, Vozes, 1989.
CARVALHO, Castelar de. Para compreender Saussure. Rio de Janeiro, Presença, 1991.
COSERIU, E. Sincronia, diacronia e história. Rio de Janeiro/São Paulo, Presença/EDUSP,
1979.
______.Teoria da linguagem e linguística geral. Rio de Janeiro/São Paulo,
Presença/EDUSP, 1979.
DUBOIS, Jean et alli. Dicionário de lingüística. São Paulo, Cultrix, 1998.
FIORIN, J. L. (Org.) Introdução à linguística-objetos teóricos. São Paulo, Contexto, 2002.
MUSSALIM, F.; BENTES, A C. Introdução à lingüística. São Paulo, Cortez, 2001.
SAUSSURE, Ferdinand. Curso de lingüística geral. São Paulo, Cultrix, 1995.
SILVA, Maria Cecília Pérez de Souza; KOCH, Ingedore G. Villaça. Linguística aplicada ao
português: morfologia. São Paulo, Cortez, 1991.
COMPLEMENTARES
BENVENISTE, Émile. Problemas de linguística geral I. Campinas, SP, Pontes, 1995.
BIDERMAN, Maria Tereza C. Teoria linguística. São Paulo, Martins Fontes, 2001.
BORGES NETO, José. Ensaios de filosofia da linguística. São Paulo, Parábola Editorial,
2004.
LOPES, Edward. Fundamentos da lingüística contemporânea. São Paulo, Cultrix, 1995.
ROBINS, R.H. Pequena história da linguística. Rio de Janeiro, Ao Livro Técnico, 1983.
UNIDADE I
1.1 A LINGUÍSTICA DO SÉCULO ATUAL
[...] Lidamos com a linguagem, que é o
maior empreendimento coletivo de
socialização e produção de conhecimento
da humanidade, e nossa formação
intelectual deveria ser de sensibilidade
para as manifestações lingüísticas
em todas as suas extensões:
artística, estética, científica, filosófica
etc. [...]
(Marcuschi, 2004, p.13).
tentando não usar o termo “ERRO”, e sim diferenças, mostrando adequações para
determinados ambientes e situações.
Devemos ter em mente que a língua não compreende apenas o português ‘culto’,
seu conceito é muito mais abrangente,reúne peculiaridades inerentes às variações
lingüísticas que encontramos em todo país. Essas diferenciações devem ser estudadas e
respeitadas, não tratando a norma ‘culta’ como lei absoluta, descartando as demais e
considerando-as inferior. Enfim, a língua deve ser vista como algo real, dinâmico, mutável.
O ensino deve ser baseado na leitura e produção textual para que se amplie o
discurso e a escrita dos alunos, possibilitando, assim, a assimilação pela prática, não pela
imposição de normas analisadas em frases descontextualizadas. Relacionado a este
aspecto,é função da escola desenvolver habilidades de domínio da língua, e da escrita dela,
posto ser fundamental para a participação social efetiva, pois é por meio dela que o homem
se comunica, tem acesso à informação, expressa e defende pontos de vista, partilha ou
constrói visões de mundo, produz conhecimento, e assim pode exercer plenamente sua
cidadania.
A função da linguística é estudar a língua em seu pleno funcionamento e
desenvolvimento e seus fenômenos ao longo do tempo e do espaço. É visível que a falta de
reflexão acerca da linguagem acarreta defasagem no ensino e na aprendizagem. Para tanto,
é preciso inovar, baseando-se em um estudo crítico e científico da língua e, o mais
importante, colocá-lo em prática. Se limitarmos o ensino a meras adequações a regras
gramaticais, correremos o risco de termos alunos de aprendizados robóticos e limitados.
Não devemos descartar os usos que os jovens fazem da língua, mas fazer deles
um ponto de partida para a assimilação de outras variedades linguísticas, entre essas a
expressa pela norma ‘padrão’, conscientizando o professor a não tratá-la de forma única e
decisiva como trata a Gramática Tradicional. É muito relevante para o professor ter
conhecimento de outras gramáticas como a Gramática Gerativa Transformacional, a
Gramática Descritiva, a Gramática dos Constituintes Imediatos, dentre outras.
Não obstante, um pressuposto a se destacar nos faz considerar o porquê de se dar
aulas de língua materna para seus falantes nativos. Nesse contexto, às nossas dúvidas
podem ser dadas quatro respostas condizentes:
a primeira, desenvolver a comunicação dos alunos/falantes, quer dizer,
possibilitar os usos da língua adequadamente nas mais variadas situações comunicativas;
a segunda, explicar aos alunos/falantes, de forma honesta, a razão pela qual
precisam dominar a norma ‘padrão’ da língua e, consequentemente, ensiná-los a variedade
da escrita da língua;
a terceira, expor o aluno/falante ao conhecimento linguístico;
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Este item pretende apontar perspectivas diferentes sobre uma ciência, e, mais
profundamente, disponibilizar e apresentar aos futuros profissionais de Letras aspectos
desta ciência, ou seja, popularizar e fazer notada uma ciência, mais especificamente, a
Linguística.
Pretende-se,com este texto, apontar diferentes visões que se pode ter sobre um
mesmo objeto – a heterogeneidade. Não objetivamos, certamente, mostrar qual delas é
certa, ou verdadeira. Não é nenhum crime determinar a linguística como ciência dos estudos
da linguagem, nem tão pouco fazer uma crítica de como ela deveria estar se
desenvolvendo, mas sim evidenciar, por meio do resumo do que se apresenta em algumas
discussões, como podemos tomar caminhos diferentes dentro da cientificidade da
linguística. Outra coisa que podemos observar é a linguagem utilizada dependendo da
abordagem adotada. Essa diferença de linguagem e de abordagem do conteúdo do objeto é
que torna qualquer estudo linguístico diversificado, mostrando quanto dessa ciência
encontra-se da mesma forma: diversificado.
Realizando o trabalho de um investigador, percebemos diferenças e semelhanças
de idéias e abordagens, facilidade e dificuldade em organizar colocações, diferença de
linguagem utilizada (fato observado e justificado como uma atitude extremamente
compreensível e válida para um investigador “apaixonado pela linguagem”).
O que é linguística? De Erni Orlandi (1986), a autora faz um breve relato da história
dos estudos lingüísticos e aponta alguns conceitos oportunos para um primeiro
entendimento dessa ciência na atualidade.
Outra característica nem um pouco surpreendente, mas de suma importância a ser
destacada, é que alguns lingüistas conseguem enriquecer seus argumentos e suas
definições com referência a muitos teóricos e, em algumas entrevistas, podemos ter como
referenciados outros entrevistados.
A linguagem é única, isto é, cada um a utiliza de maneira própria. Alguns
conseguem expor seus pensamentos mais clara e didaticamente que outros e isso também
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REFERÊNCIAS
BAGNO, Marcos. Pesquisa na escola: o que é, como se faz. 7. Ed. São Paulo, Loyola,
2001.
BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Parâmetros curriculares nacionais de
língua portuguesa e língua estrangeira moderna – 1º e 2º ciclos. Brasília, MEC/SEF,
1998 e 2002.
BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Orientações Curriculares nacionais do
ensino médio. Brasília, MEC/SEF, 2004.
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UNIDADE II
2.1 A CONTRIBUIÇÃO DE FERDINAND DE SAUSSURE
porque o falante nativo não tem consciência da sucessão dos fatos da língua no tempo.
Para o indivíduo que usa a língua como veículo de comunicação e interação social, essa
sucessão não existe. A única e verdadeira realidade palpável que se lhe apresenta de forma
imediata é a do estado sincrônico da língua.
Atualmente, a maioria das pesquisas linguísticas utiliza-se do estudo sincrônico, ou
seja, a necessidade de o estudo da língua ser prioritariamente sincrônico é um fato. Um
exemplo que pode ilustrar esse caráter sincrônico é o emprego de determinadas palavras no
correr do tempo e a modificação que o mesmo sofre no decorrer dos anos. O substantivo
romaria significava, originalmente, “peregrinação a Roma para ver o Papa”. Hoje, no
entanto, é usado para designar “peregrinação religiosa em geral”, como as em direção a
Aparecida do Norte, no Estado de São Paulo.
A vitalidade do pensamento saussuriano, com o passar do tempo, só tem feito
renovar sua atualidade. Nos últimos anos, tem se multiplicado a bibliografia sobre sua
doutrina, difundida a partir da publicação do livro clássico Curso de Lingüística Geral (CLG).
As repercussões de suas idéias motrizes, assim como as escolas delas decorrentes, criaram
uma metodologia prática e funcional de abordagem dos fatos lingüísticos. Tal metodologia
pode ser aplicada com sucesso ao estudo e ao ensino de português, como demonstra o livro
Para compreender Saussure, hoje na 12ª edição, contendo os fundamentos e uma visão
crítica das iluminadas idéias do genial fundador da Lingüística moderna, além de exercícios
com questões relativas à língua portuguesa.
Neste item, apresentaremos uma síntese de suas célebres dicotomias:
semiologia/lingüística, signo: significado/significante, arbitrariedade/linearidade, linguagem:
língua/fala (norma), sincronia/diacronia, sintagma/paradigma e o corolário de tudo isso: a
noção de valor.
A visão saussuriana da língua como um sistema de valores está intimamente
associada à sua célebre frase: “na língua só existem diferenças”, ou seja, ela funciona
sincronicamente e com base em relações opositivas (paradigmáticas) no sistema e
contrastivas (sintagmáticas) no discurso. Tendo como ponto de partida as idéias motrizes
contidas no Curso de Lingüística Geral, formaram-se várias escolas estruturalistas
(fonológica de Praga, estilística de Genebra, funcionalista de Paris, glossemática de
Copenhague), que deram conseqüência e continuidade ao pensamento infelizmente
inacabado do genial fundador da Lingüística moderna. A visão da língua como um sistema
semiológico, a teoria do signo, com seus dois princípios fundamentais:
arbitrariedade/linearidade, a diferença entre sincronia (funcionamento) e diacronia
(evolução), a distinção fonética/fonologia, fone/fonema, a dupla articulação da linguagem (1ª
= plano do conteúdo ou morfossintaxe; 2ª = plano da expressão ou fonologia), as noções de
morfema e gramema, a tricotomia língua/fala/norma são categorias lingüísticas
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tempo extremamente profícuo. O que é fato da língua (langue) está no campo social; o que
é ato da fala ou discurso (parole) situa-se na esfera do individual. Repousando sua
dicotomia na Sociologia, ciência nascente e já de grande prestígio então, Saussure (p. 16)
afirma e adverte ao mesmo tempo: “A linguagem tem um lado individual e um lado social,
sendo impossível conceber um sem o outro”. Vale lembrar que, para Saussure, a linguagem
é a faculdade natural de usar uma língua, “ao passo que a língua constitui algo adquirido e
convencional” (p. 17). Do exame exaustivo do Curso, depreendemos três concepções para
língua: acervo lingüístico, instituição social e realidade sistemática e funcional. Analisemo-
las à luz do CLG.
A língua, como acervo lingüístico, é “o conjunto dos hábitos lingüísticos que
permitem a uma pessoa compreender e fazer-se compreender” (p. 92). A língua é “uma
soma de sinais depositados em cada cérebro, mais ou menos como um dicionário cujos
exemplares, todos idênticos, fossem repartidos entre os indivíduos” (p. 27). E, com todo o
respeito a Saussure, acrescentaríamos nós: um dicionário e uma gramática, cuja extensão
será proporcional ao conhecimento e à percepção lingüística do falante.
Na condição de acervo, a língua guarda toda a experiência histórica acumulada por
um povo durante a sua existência. Disso nos dá testemunho o latim, símbolo permanente da
cultura e das instituições romanas. Também o português, nos seus oito séculos de
existência, acumulou um rico e notável acervo lingüístico e literário. Importante língua de
cultura, constitui tesouro comum dos povos irmanados pela lusofonia.
Como instituição social, a língua “não está completa em nenhum [indivíduo], e só na
massa ela existe de modo completo” (p. 21), por isso, ela é, simultaneamente, realidade
psíquica e instituição social. Para Saussure, a língua “é, ao mesmo tempo, um produto
social da faculdade da linguagem e um conjunto de convenções necessárias, adotadas pelo
corpo social para permitir o exercício dessa faculdade nos indivíduos” (p. 17); é “a parte
social da linguagem, exterior ao indivíduo, que, por si só, não pode nem criá-la nem
modificá-la; ela não existe senão em virtude de uma espécie de contrato estabelecido entre
os membros da comunidade” (p. 22).
A visão da língua como realidade sistemática e funcional é o conteúdo mais
importante da concepção saussuriana. Para o mestre de Genebra, a língua é, antes de tudo,
“um sistema de signos distintos correspondentes a idéias distintas” (p. 18); é um código, um
sistema onde, “de essencial, só existe a união do sentido e da imagem acústica” (p. 23).
Saussure vê a língua como um objeto de “natureza homogênea” (p. 23) e que, portanto, se
enquadra perfeitamente na sua definição basilar: “a língua é um sistema de signos que
exprimem idéias” (p. 24). Essa concepção da língua como sistema funcional está imbricada
com a noção de valor (v. conclusão).
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unicamente para designar “peregrinação religiosa em geral”. Entre nós, por exemplo, são
muito comuns as romarias a Aparecida do Norte, em São Paulo.
Advirta-se, contudo, o seguinte: Saussure postula a prioridade da sincronia e,
convém lembrar, prioridade não significa exclusividade. De nossa parte, entendemos a
distinção sincronia/diacronia unicamente como procedimentos metodológicos de análise
lingüística. A esse respeito, ouçamos as ponderações, até certo ponto premonitórias, do
próprio Saussure (p. 16): a cada instante, a linguagem implica ao mesmo tempo um sistema
estabelecido e uma evolução: a cada instante, ela é uma instituição atual e um produto do
passado.
A língua, portanto, será sempre sincronia e diacronia, em qualquer momento de sua
existência. O ponto de vista da ciência lingüística é que poderá ser OU sincrônico OU
diacrônico, dependendo do fim que se pretende atingir. E há determinados casos, por
exemplo, em que a descrição sincrônica pode perfeitamente ser conjugada com a
explicação diacrônica, enriquecendo-se, desse modo, a análise feita pelo lingüista. Por
exemplo, podemos descrever o verbo pôr como pertencente à segunda conjugação,
apelando para as formas sincrônicas atuais pões, põe, puseste, etc., além dos adjetivos
poente e poedeira, nos quais o -e- medial aí existente (ou remanescente) funciona
estruturalmente como vogal temática. Ao mesmo tempo, podemos enriquecer a descrição
sincrônica, complementando-a com a explicação diacrônica: o atual verbo pôr já foi
representado pelo infinitivo arcaico poer, que, por sua vez, se vincula ao latim vulgar ponere,
com a seguinte cadeia evolutiva: poněre > ponēre > poner > põer > poer > pôr.
REFERÊNCIAS
BECHARA, Evanildo. Moderna gramática da língua portuguesa, Rio de Janeiro,
Editora Lucerna, 1999, p. 37-44.
CARVALHO, Castelar de. Para compreender Saussure. 12ª ed. Petrópolis, Vozes,
2003.
COSERIU, E. Sincronia, diacronia e história. Rio de Janeiro/São Paulo,
Presença/EDUSP, 1979.
32
UNIDADE III
3.1 CONCEITO SAUSSUREANO
1.Transcrição fonética: símbolos do Alfabeto Fonético entre colchetes [sons da fala], entre barras /sons da
língua/.
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do código têm de ser comuns a uma grande parte de emissores e receptores, aceitos,
compreendidos e mantidos por todos os integrantes da comunidade lingüística.
O tempo, que garante a continuidade da língua, segundo Saussure, também
opera outro efeito sobre o signo lingüístico, é a MUTABILIDADE. Embora contraditória
em aparência, a mutabilidade pode proporcionar alterações no signo lingüístico. Os
fatores de alteração são sempre exteriores à língua e podem ser fonéticos,
morfológicos, sintáticos e lexicais. Assim é que temos várias palavras que chegaram
em nossa língua pelo deslocamento da relação significante/significado, por exemplo:
mácula em latim significava mancha, deu, também origem à mágoa em português.
O signo lingüístico é diferencial e funciona pela sua presença ou pela sua
ausência. O signo [kaʌ significa “caixa” e não “mais ou menos caixa”, funciona
como um signo, antes de tudo o mais por oposição a outros signos. Esse caráter
diferencial dos signos é muito importante, visto que o signo lingüístico pertence ao
sistema constituinte da língua na qual cada signo só tem valor por oposição aos outros
signos. A diferença acústica entre torto e morto é sentida nos segmentos iniciais [t] e
[m], uma diferença opositiva que é suficiente para distinguir os dois significantes e, por
conseguinte, estabelecer oposição entre os dois significados.
O signo lingüístico enquanto sistema se organiza em dois eixos: EIXO
SINTAGMÁTICO, que é o plano da relação linear entre os signos, o plano das
combinações, das relações perceptíveis. “as relações sintagmáticas ocorrem dentro do
enunciado e são diretamente observáveis (relações in presentia). Tais relações
decorrem do caráter linear e temporal da linguagem humana” (KOCH, 2000).
O EIXO PARADIGMÁTICO é a relação que ocorre no eixo vertical, o eixo das
escolhas. São s relações entre unidades com capacidade de figurar num mesmo
contexto, ou seja, um elemento pode figurar em lugar do outro, mão não
simultaneamente. O paradigma, ou modelo, ocorre com os elementos que não estão
presentes no discurso (relação in absentia).
oposição ao significante (plano da expressão), que é sua parte sensível. Por outro
lado, a imagem acústica “não é o som material, coisa puramente física, mas a
impressão psíquica desse som” (CLG, p. 80). Melhor dizendo, a imagem acústica é o
significante. Com isso, temos que o signo lingüístico é “uma entidade psíquica de duas
faces” (p. 80), semelhante a uma moeda.
Mais tarde, Jakobson e a Escola Fonológica de Praga irão estabelecer
definitivamente a distinção entre som material e imagem acústica. Ao primeiro
chamaram de fone, objeto de estudo da Fonética. À imagem acústica denominaram de
fonema, conceito amplamente aceito e consagrado pela Fonologia.
Os dois elementos – significante e significado – constituem o signo “estão
intimamente unidos e um reclama o outro” (p. 80). São interdependentes e
inseparáveis, pois sem significante não há significado e sem significado não existe
significante. Exemplificando, diríamos que quando um falante de português recebe a
impressão psíquica que lhe é transmitida pela imagem acústica ou significante /kaza/,
graças à qual se manifesta fonicamente o signo casa, essa imagem acústica, de
imediato, evoca-lhe psiquicamente a idéia de abrigo, de lugar para viver, estudar, fazer
suas refeições, descansar, etc. Figurativamente, diríamos que o falante associa o
significante /kaza/ ao significado domus (tomando-se o termo latino como ponto de
referência para o conceito).
Quanto ao princípio da arbitrariedade, Saussure (p. 83) esclarece que
arbitrário não deve dar a idéia de que o significado dependa da livre escolha do que
fala, [porque] não está ao alcance do indivíduo trocar coisa alguma num signo, uma
vez esteja ele estabelecido num grupo lingüístico; queremos dizer que o significante é
imotivado, isto é, arbitrário em relação ao significado, com o qual não tem nenhum
laço natural na realidade.
Desse modo, compreendemos por que Saussure afirma que a idéia (ou
conceito ou significado) de mar não tem nenhuma relação necessária e “interior” com
a seqüência de sons, ou imagem acústica ou significante/mar. Em outras palavras, o
significado mar poderia ser representado perfeitamente por qualquer outro significante.
E Saussure argumenta, para provar seu ponto de vista, com as diferenças entre as
línguas. Tanto assim que a idéia de “mar” é representada em inglês pelo significante
“sea” /si/ e, em francês, por “mer” /mér/. Um exemplo bastante representativo da
ausência de vínculo natural entre o significante e o significado é o dos verbos
depoentes latinos. Nestes, a forma é passiva, entretanto, o sentido é ativo: sequor
“sigo” (e não “sou seguido”), utor “uso” (e não “sou usado”). Nestes signos, o grau de
arbitrariedade é extremo, não havendo sequer coerência morfossemântica entre o
significante e o significado. Na verdade, existem dois sentidos para arbitrário:
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REFERÊNCIAS
pensamento não é criar um meio fônico material para a expressão das ideias, mas
servir de intermediário entre o pensamento e o som".
A partir dessa hipótese, Castelar afirma que Saussure “lança fundamentos
para o que hoje é conhecido como a tese da dupla articulação da linguagem”
(Castelar, 2009, p.131), que foi desenvolvida por Martinet. Segundo Saussure (p.131),
"poder-se-ia chamar à língua o domínio das articulações: cada termo lingüístico é um
pequeno membro, um “articulus”, em que uma ideia se fixa num som e em que um
som se torna o signo de uma ideia."
Síntese
46
REFERÊNCIAS
CABRAL, Leonor S. Introdução à lingüística. Rio de Janeiro, Globo, 1990.
KOCH, Ingedore V.; SILVA, Maria Cecília. Lingüística aplicada ao português:
morfologia. São Paulo, Cortez, 2002.