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UNIVERSIDADE

CATÓLICA DE

BRASÍLIA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO

STRICTO SENSU EM GERONTOLOGIA

Mestrado

O IMAGINÁRIO SUBJACENTE À CRIAÇÃO / ORGANIZAÇÃO,


DESENVOLVIMENTO ATUAL E PROSPECTIVA DE CONTINUIDADE
DA UnATI/UCB

Autor: Maria da Conceição Batista da Silva

Orientador: Profª Drª Altair Macedo Lahud Loureiro

BRASÍLIA 2005
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Maria da Conceição Batista da Silva

O IMAGINÁRIO SUBJACENTE À CRIAÇÃO / ORGANIZAÇÃO,


DESENVOLVIMENTO ATUAL E PROSPECTIVA DE CONTINUIDADE.
DA UnATI/UCB

Dissertação apresentada ao Programa de Pós


Graduação Stricto Sensu em Gerontologia da
Universidade Católica de Brasília, como
requisito para a obtenção do título de Mestre
em Gerontologia.

Orientadora: Drª Altair Macedo Lahud Loureiro.

BRASÍLIA
Formatado: Centralizado,
Espaço Antes: 1 linha, Depois
2005 de: 1 linha, Espaçamento
entre linhas: 1,5 linha
14

Formatado: Fonte: Não


Negrito, Todas em maiúsculas

S586i Silva, Maria da Conceição Batista da.


O imaginário subjacente à criação, organização, desenvolvimento
atual e prospectiva de continuidade da UNATI/UCB / Maria da
Conceição Batista da Silva. – 2006.

xi, 216 f. : il. ; 30 cm

Dissertação (mestrado) – Universidade Católica de Brasília, 2006.

Orientação: Altair Macedo Lahud Loureiro

Ficha elaborada pela Coordenação de Processamento do Acervo do SIBI – UCB.


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Termo de Aprovação

Dissertação defendida e aprovada como requisito parcial para obtenção do


Título de Mestre em Gerontologia, defendida e aprovada, em 19 de setembro de 2005,
pela banca constituída por:

____________________________________________________

Profª. Drª. Iduina Mont’Alverne Braun Chaves


Examinadora - Universidade Federal Fluminense – UFF/RJ

____________________________________________________

Profª Drª. Maria Liz Cunha de Oliveira- UCB Formatado: Centralizado


Examinadora – Universidade Católica de Brasília - UCB / DF

____________________________________________________

Profª Drª. Lucy Gomes - UCB Formatado: Centralizado


Suplente – Universidade Católica de Brasília - UCB / DF

____________________________________________________

Profª Drª. Altair Macedo Lahud Loureiro - UCB Formatado: Centralizado


Orientadora – Universidade Católica de Brasília - UCB / DF

Brasília
UCB
16

Dedico este Trabalho Acadêmico:

Ao Prof. Renzo Dini (in memorian), ex-Pró-Reitor de Graduação da UCB, que


sempre foi para mim a verdadeira imagem do mestre, aquele que nos conduz ao caminho...

Aos meus pais, Deusdete e Catarina (in memorian), que sempre foram o meu
referencial e onde quer que estejam velam por mim, me iluminando...

Ao meu filho, Marcius Ainon, meu grande amor, que inúmeras vezes abriu mão de
minha presença e compreendeu a significação que este passo (realizar o mestrado ) tem para
mim...

E, em especial, a minha linda e jovem sobrinha/filha, Grace Kelly (in memorian) que
teve retirada a sua oportunidade/direito de envelhecer, de esculpir, com o tempo, os traços
dos anos e da experiência em seu rosto...
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Agradecimentos

A caminhada é árdua e não se consegue trilhar o caminho sozinho.

Agradeço a todos os idosos, freqüentadores da UnATI/UCB, que aceitaram


participar da minha pesquisa e mostraram que, em qualquer idade, é possível redescobrir o
caminho e vislumbrar o futuro.

Agradeço a todos os meus colegas de trabalho e parentes pela amizade e torcida na


caminhada.

Agradeço especialmente:

A amiga Maria Helena R. Saraiva que, gentilmente, disponibilizou suas anotações


das agendas no ano 1995 e 1996, contribuindo para o resgate do histórico da UnATI/UCB.

As amigas Maria Moraes e Lindalva Patrício, professoras de Língua Portuguesa,


que aos 62 e 68 anos, respectivamente, continuam trabalhando, mostrando que a pessoa,
independente de idade, ainda pode produzir, e que gentilmente fizeram a revisão ortográfica
desta dissertação;
Formatado: Cor da fonte:
A Professora Josélia Alencar que abriu as portas da UnATI/UCB acolhendo-me e Automática, Português (Brasil)
Formatado: Fonte: Não
incentivando-me à pesquisa; Negrito, Cor da fonte:
Automática, Português (Brasil)

A minha irmã, Lyndete, pelo incentivo e apoio para prosseguir na árdua caminhada; Formatado: Cor da fonte:
Automática, Português (Brasil)
Formatado: Recuo de corpo
Ao companheiro, Walker, pelo carinho, paciência e por compreender meu objetivo de texto 3, À esquerda, Espaço
Antes: 0 pt, Depois de: 0 pt,
traçado; Espaçamento entre linhas:
simples
Formatado: Fonte: Não
A minha orientadora Profª Drª Altair que acreditou em mim, conduziu-me pela mão, Negrito, Cor da fonte:
Automática, Português (Brasil)
compartilhou de minhas alegrias e tristezas e, sempre que necessário, reconduziu-me ao Formatado: Cor da fonte:
Automática, Português (Brasil)
caminho, com a capacidade de me fazer mergulhar com escamas nos sonhos e emergir com Formatado: Fonte: Não
Negrito, Cor da fonte:
asas após a transformação; Automática, Português (Brasil)
Formatado: Cor da fonte:
A minha ancestral Oyá, deusa guerreira, dona do meu ori, que, tenho certeza, está Automática, Português (Brasil)
Formatado: Fonte: (Padrão)
sempre ao meu lado. Monotype Corsiva, Itálico, Cor
da fonte: Automática
18

“A idade não depende dos anos,


mas sim do temperamento e da saúde,
umas pessoas já nascem velhas,
Formatado: Recuo de corpo
outras jamais envelhecem.” de texto 2, À esquerda, Recuo:
À esquerda: 9.52 cm, Primeira
linha: 0.85 cm, Espaço Antes:
Tyron Edwards 0 pt, Espaçamento entre
linhas: simples
Formatado: Português
19

Resumo

A presente dissertação foi fruto de pesquisa qualitativa realizada no âmbito da


Universidade Aberta à Terceira Idade da Universidade Católica de Brasília – UnATI/UCB,
que visou levantar o imaginário subjacente à sua criação/organização, desenvolvimento atual
e prospectiva de continuidade. No atingimento do objetivo proposto foi escrito o histórico da
UnATI/UCB, tendo presente seus princípios, revendo a dinâmica do seu processo de criação,
implementação e implantação nos registros documentais e mnemônicos dos seus próprios
criadores/organizadores somados/enriquecidos com a fala – escrita - consciente dos seus
alunos e com a experiência vivida pela pesquisadora. Para tal, foram tomados por base os
pressupostos da Teoria do Imaginário de Gilbert Durand, da Complexidade de Edgar Morin e
da Culturanálise de Grupos de Paula Carvalho, bem como as teorias da educação e da teoria
gerontológica, em construção. Foi utilizado em um grupo de 16 alunos-idosos - com idade
entre 60 e 74 anos - e 02 dirigentes, sendo um deles não idoso, o Arquétipo Teste de Nove
Elementos – AT-9, de Yves Durand, intencionando conhecer como essa população
selecionada encara a angústia do passar do tempo e o medo da morte. O grupo se caracteriza
como alunos-idosos de ambos os sexos, residem em diferentes regiões administrativas -
cidades-satélites -, possuem grau de instrução que vai do analfabeto ao especialista,
apresentam a idade, mínima exigida para ingresso, de 60 anos. Este trabalho acadêmico de
dissertação traz no seu todo e, notadamente, no seu final, pistas para uma possível
reorganização: “organizacionalidade antropolítica”1.

PALAVRAS CHAVE: Imaginário, Envelhecimento, Aprendizagem e UnATI.

1
Organizacionalidade significando uma organização sempre se fazendo e refazendo na consideração da
dimensão simbólica. Antropolítica por ser centrada na pessoa humana.
20

Abstract

The following dissertation is the result of a quantitative research undertaken at the


Open University for the Elderly from the Catholic University of Brasília – UnATI/UCB, and
it aimed at identifying the imaginary subjacent to its concept/organization, current activities
and perspectives of continuity. To reach such aim, a history description of UnATI/UCB was
proposed, based on its principles, revealing the steps of its foundation and implementation
processes in the documental and mnemonic reports of the very founders/organizers enriched
with the conscious statements – oral and written – from its pupils and with the experience
from the researcher. With such purpose, the premises from Gilbert Durand’s Imaginary
Theory, Edgar Morin’s Complexity Theory, and Paula Carvalho’s Group Culture-analysis
were adopted, as well as educational theories and gerontology theory, which is still under
development. Yves Durand’s Archetypal test of Nine Elements – AT9 was applied to group of
16 elderly pupils were used, aging between 60 and 74, two coordinators, one of which elderly,
with the goal of learning how the group faces the angst of passing time and the fear of death.
The group has a balanced gender number, with subjects who live in satellite cities around
Brasília, from illiterates to specialists, with a minimum age of 60 years. This academic
dissertation presents throughout the chapters, and most notably at the end, indications for a
possible reorganization: “anthro-political organizationality”¹.

KEY WORDS: Imaginary, Ageing, Learning, UnATI.

______________________
¹ Organizationality meaning an organization always thinking and re-thinking itself in its symbolical dimension.
Antro-political for being human-centered.
21

SUMÁRIO

Introdução: Vislumbre da jornada... ................................................................................ 12

Parte I: Rompendo as barreiras do tempo - Desafiando Cronos .................................... 23


Capítulo 1 – A velhice, o velho e o envelhecimento .......................................................... 24
1.1. Uma visão geral do fenômeno da velhice, das situações do velho e do
processo de envelhecimento .................................................................. 24
1.1.1. A velhice ..................................................................................... 26
1.1.2. O velho ........................................................................................ 31
1.1.3. O envelhecimento ....................................................................... 33
Capítulo 2 – Por uma gerontogogia: uma pedagogia voltada para o Idoso ........................ 36
Capítulo 3 – As Universidades Abertas à Terceira Idade - UnATI .................................... 41

3.1. O surgimento das primeiras Universidades Aberta à Terceira Idade no


mundo .................................................................................................... 43

3.2. As Universidades Aberta à Terceira Idade no Brasil ............................ 47

3.3. A UnATI da Universidade Católica de Brasília - UCB …….….…...... 51

Parte II: O objetivo vislumbrado, a trilha percorrida, os veículos utilizados e seus


passageiros na viagem .................................................................................... 68

Capítulo 4 - Metodologia .................................................................................................... 68

Capítulo 5 – Bases Teóricas ................................................................................................ 70

5.1. Teoria do Imaginário, de Gilbert Durand ................................................. 70

5.2. Teoria da Complexidade, de Edgar Morin ............................................... 77

5.3. Culturanálise de Grupos, de Paula Carvalho ........................................... 81

5.4. AT-9 – Arquétipo Teste de Nove Elementos, de Yves Durand ............... 83


22

Parte III: Retratos do imaginário – O cintilar da alma ................................................... 95


Capítulo 6 – A análise estrutural e os sujeitos-autores ....................................................... 96
6.1 – Apresentação e análise dos Protocolos do Teste AT-9 realizados na
UnATI/UCB ...................................................................................... 97
Protocolo Nº 1 - Gaia ........................................................................ 97
Protocolo Nº 2 - Hefesto ................................................................. 103
Protocolo Nº 3 - Apolo .................................................................... 107
Protocolo Nº 4 - Ulisses .................................................................. 113
Protocolo Nº 5 - Calíope ................................................................. 118
Protocolo Nº 6 - Édipo .................................................................... 123
Protocolo Nº 7 - Aretusa ................................................................. 127
Protocolo Nº 8 - Morfeu .................................................................. 131
Protocolo Nº 9 - Cronos .................................................................. 136
Protocolo Nº 10 - Hebe ................................................................... 141
Protocolo Nº 11 – Métis .................................................................. 145
Protocolo Nº 12 - Hemera ............................................................... 150
Protocolo Nº 13 - Hélio ................................................................... 155
Protocolo Nº 14 - Ártemis ............................................................... 160
Protocolo Nº 15 - Destino ............................................................... 165
Protocolo Nº 16 - Aglaia ................................................................. 169
Protocolo Nº 17 - Láquesis ............................................................. 174
Protocolo Nº 18 - Pandora ............................................................... 178
6.2 – Exposição de Quadros sínteses dos protocolos apresentados .............. 183
6.2.1. – Representações, funções e simbolismos atribuídos aos elementos
do AT-9 ............................................................................... 183
6.2.1.1. – Quadro síntese das representações de imagens
atribuídas aos elementos ..................................................... 184
6.2.1.2. – Quadro síntese das funções/papéis atribuídas aos
elementos ............................................................................ 185
6.2.1.3. – Quadro síntese dos simbolismos atribuídos aos
elementos ............................................................................ 186
23

6.2.2. – Quadro síntese dos protocolos indicando sexo, idade e idéia de


vida e de morte contida nos simbolismos dos elementos
................................................................................................ 187
6.2.3. – Quadro síntese com identificação de sexo, idade e identificação
do micro universo mítico, segundo Yves Durand
................................................................................................ 190
6.2.4. – Quadro síntese demonstrativo das incidências maiores na
representação de imagens, funções/papéis e simbolismos dos
elementos ............................................................................ 191

Parte IV: Pegadas que ficaram na areia - As pistas culturanalíticas ......................... 193
Capítulo 7 – (In) Conclusões ............................................................................................ 193

Parte V: Bibliografia ....................................................................................................... 205


1 – Referências Bibliográficas ........................................................................................ 205
2 – Bibliografia Complementar ..................................................................................... 211
3 – Observações ............................................................................................................... 212

ANEXOS
Anexo 1 - Missão e Visão de Futuro da Universidade Católica de Brasília ..... 214
Anexo 2 - Organograma da DPE/PROEx/UCB, ano 2004/2005 ...................... 215
Anexo 3 – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido ................................ 216
12

O imaginário subjacente à criação/organização, no desenvolvimento atual e prospectiva de


continuidade da UNATI/UCB

Introdução: Vislumbre da jornada...

“Velhice?! Qual?... Não ouço o seu recado.


Eu sinto a vida cada vez mais bela!
E a morte?... Amigos, nem me falem dela!
Morrer não posso. Estou muito ocupado.”
Miguel Russowsky

Percebe-se hoje que a sociedade - em seu discurso - vem se voltando mais para as
questões do fenômeno da velhice e do processo de envelhecimento. Todavia, na prática,
atividades planejadas, organizadas e pensadas com os idosos ainda são incomuns. O
fenômeno da velhice e o processo do envelhecimento, teoricamente, vêm sendo mais
estudados e politicamente tem sido dado a ambos e a condição do velho, um pouco mais de
atenção. Contudo, resta a implementação e a implantação dos estudos realizados, a interação
teoria/prática que resulte em ações. É preciso, de fato, ver o idoso - o ser humano com mais
idade que os outros, o homem mais vivido, o velho -, como cidadão; mas é importante que o
próprio idoso se auto-valorize, que lute por fazer-se valorizar, se engajar nos movimentos e
fazer-se representar nas políticas públicas do país. Para tal é preciso reunir forças, talvez já
um tanto fracas, mas é fundamental ter consciência do seu valor como ser humano,
entendendo a sua velhice, ou o seu processo de envelhecimento como algo natural, próprio da
natureza humana, impregnado da cultura.

Uma sociedade capitalista plena de estereótipos, de idéias pré-concebidas e de mitos


sobre a velhice, faz aceitar, sem mais pensar, que o velho está numa fase de declínio e que é
incapaz de “produzir” e de ainda aprender e de mudar.

Estudiosos da velhice registram, em suas obras, desabafos cheios de preocupação e


reações negativas sobre a sua própria velhice. A idéia da perda – de que o idoso não tem mais
futuro, não tem mais capacidade para produção e está pronto para partir - está presente, por
exemplo, em Gusmão de Moraes (1997) quando intitula sua dissertação, referindo-se à
velhice asilada, como: “A sala de espera da morte”; em Norberto Bobbio (apud LAHUD
LOUREIRO, 1999, p. 81) que, referindo-se à velhice, escreve que, “... por mais que procure,
com todas as forças, ficar na ponta dos pés, consegue ver apenas as primeiras sombras
13

destes tempos”. Faoro (apud BOBBIO, 1998) registra, no prefácio do “Diário de um


século...” (1997, p. VII), que Bobbio, ao falar sobre a velhice, “mantém-se nos limites da
reflexão, numa perspectiva fria, sem cultivar ilusões sobre a velhice” e se refere ao “discreto
halo trágico” que envolve suas anotações biográficas.

No entanto, é o próprio Norberto Bobbio quem escreve, com quase 90 anos, um


livro: O tempo da memória – De senectude e outros escritos autobiográficos. É, portanto,
mais prudente ver, nas palavras de Bobbio, a preocupação por descrever e rever sua vida com
a saudade do passado pontuada na memória e a certeza do incorrigível nela. “Um lugar de
honra está reservado ao depoimento pessoal de Bobbio, com a apaixonada procura de si
mesmo, consumada na velhice, não porque tivesse alçado a inatingível verdade, mas porque
esta é a última verdade que o sentimento da morte iminente lhe permite”. (FAORO, op cit.,
p. XVI).

Cabe aqui lembrar como, poeticamente, Cecília Meireles (1939), ainda jovem - 38
anos - revela sua surpresa e “angústia com o passar do tempo”, ao se perguntar:

“(...)
Em que espelho ficou perdida
A minha face?”

Ao lado deste halo negativo envolvendo a velhice, convém anotar que, como escreve
Excluído:
Lahud Loureiro (1998, p. 21), a velhice é apenas mais uma etapa da vida que tem que ser
Excluído:
vivida; entretanto este viver, apesar das formas fragilizadas, deve e pode, como as demais,
“ser bem vivida, com ainda encantos, apesar dos possíveis desencantos”, mas também com
possíveis “reencantos” ou novos encantos.

Convém, também, ter presente que

“o fenômeno da velhice e o processo do envelhecimento, para ser entendido


precisa ser visto como um composto pluridimensional, com sua face visível,
externa: a dimensão física - o corpo com sua constituição e degenerescência
natural; a constituição biológica do ser humano - com suas heranças genéticas de
saúde e doenças, que nas pesquisas caminham para sua previsão e controle; sua
característica psíquica - com suas idiossincrasias, pecados e culpas; a dimensão
antropológica e cultural vendo o velho como ser da humanidade e cultural
contextualizado no tempo e no espaço, que o faz portador de uma gama de pré-
conceitos, conceitos, mitos, medos e audácias; a dimensão social plena das pressões
e intimações, proibições/interdições direitos e deveres” (LAHUD LOUREIRO,
Sessão de Orientação, 2004).
O envelhecimento é inexorável no seu aspecto bio-fisiológico; porém, com a
evolução das práticas médicas e com o sucesso das novas medidas de saúde pública, entre
outros, tem aumentado a expectativa de vida da população mundial, ocorrendo uma mudança
no perfil epidemiológico.
14

A sociedade não se preparou para a velhice, para ser composta por este batalhão que
cresce, estatisticamente comprovado, de pessoas com mais de sessenta anos. As pessoas, por
sua vez se preparam para, se menino, ser homem e, se menina, ser mulher, mas não para ser
velho, para viver a sua velhice, etapa natural do ciclo da vida. Este não-preparo tem como
pano de fundo uma série de questões de ordem política, econômica, psicológica e cultural.

O ser humano sofre o processo do envelhecimento desde o nascimento e é, portanto,


irreal pensar que só na velhice se envelhece. É comum e mais fácil ver a velhice por um
preconceituoso prisma, como já explicitado acima, que diz que esta etapa é a fase das perdas,
onde se perde o que foi construído, repassando, muitas vezes este preconceito. É possível que
se perca a agilidade do corpo e, em parte, a saúde, porém, a velhice pode, ser uma fase onde
se tenha ganhos, onde ainda é possível construir, usufruir, ter cidadania, viver e aprender. Já
se fala em “gerontologia educacional” ou “gerontogogia” (LAHUD LOUREIRO, Sessão de
Orientação, 2004) ou, como diz Cachioni (2003, p. 27) “gerogogia social”, que, segundo a
autora fomenta a conscientização, “por parte dos próprios idosos sobre seus direitos, sua
qualidade de vida, suas formas de auto-realização e o papel social que podem realizar”. Os
velhos ainda podem incluir em seus desejos e ações a vontade de aprender e de ser solidários
com os demais, praticando a legítima cidadania no respeito recíproco.

Para Lahud Loureiro (1999, p. 84),

“Se ainda há vida, há também direitos e deveres; direitos que precisam ser
reivindicados e deveres que podem ser ainda cumpridos. Direito de ser respeitado
para viver com dignidade e dever de respeitar para a aceitação e pertencimento aos
grupos com menos idade.”
O respeito é uma via de mão dupla nem sempre concretizada na prática dos idosos.

Os idosos, hoje, que integram os programas das Universidades Abertas à Terceira


Idade - UNATI’s, vêm exercitando este salutar respeito reivindicando seus direitos mas, em
contrapartida, assumindo obrigações e deveres no seu pertencimento à ela, o que os identifica
como cidadãos. Encontra-se nos programas das UnATI’s um rol de direitos e deveres, entre
estes últimos, os deveres, registra-se: o cumprimento de horários, a disciplina, a assunção de
suas potencialidades e forças ainda presentes, a participação em atividades programadas, entre
outros. Nestes redutos o velho precisa se integrar com o outro, mesmo que seja para fugir à
sua possível solidão, e assim aprende que é respeitando que se é respeitado. A aprendizagem
acontece, muitas vezes com a dor do “ensaio e erro”, mas também com o “discernimento”,
forma discernida de aprender, vai se produzindo e a criação e transformação saudável, naquilo
que é preciso para viver e sobreviver em paz com qualidade de vida acontece. O ser humano,
15

em todas as idades, é um ser social e como tal precisa conviver em sociedade, respeitando os
limites do outro. É possível, para que esta convivência ocorra de forma harmoniosa, a
necessidade de uma revisão sensata, humana e constante destes direitos a usufruir e dos
deveres a cumprir. Eles podem ser aprendidos ou reaprendidos, modificados ou assumidos
constantemente. Ter direito, lembrar e lutar por esta prerrogativa é fácil para o homem jovem
ou maduro, o que às vezes torna-se difícil para o homem velho. Ecléa Bosi escreve: “o velho
não tem armas, nós é que temos que lutar por eles”. (LAHUD LOUREIRO, 2000, p. 43), mas
o velho saudável tem o dever de propugnar por seu lugar digno nos espaços que habita.
Excluído: ¶
A educação, em sentido amplo, por ter intrínseca a característica de oportunizar a <sp>

transformação, a mudança necessária ou pretendida - a aprendizagem -, é capaz de criar uma


interdependência entre a prática e o discurso e a disseminar uma política, não só voltada para
o idoso, mas construída e pensada com o próprio idoso. A educação, com relação ao processo
de envelhecimento, pode desencadear, com alunos idosos – idosos estudantes - mudanças
salutares, benéficas, mostrando que na velhice, é possível utilizar e desenvolver o raciocínio
cognitivo e não apenas repetir, brincar e dançar. O velho é capaz de aprender, pois o ser
humano aprende até a morte, e como aprendiz, ele pode viver melhor, participando, em grupo,
da construção da aprendizagem de outros, com dignidade, auto-estima elevada, auto-
confiança recuperada ou firmada na busca constante da sua completude. O homem nasce
incompleto e pela vida afora busca a completude que se sabe só se realiza na morte. Esta
busca da perfeição, por vezes, ao lado das ações informais ou não formais, é auxiliada
formalmente, programada nos currículos dos diversos graus de ensino do sistema educacional
do País. Pensa-se mais nos currículos escolares para as fases da infância e da adolescência;
entretanto para a idade madura, notadamente para o mais maduro, o idoso, somente
recentemente, se iniciara ações formais para que esta incompletude fosse aos poucos dando
lugar à completação a este ser humano com mais idade, o velho.

Percebe-se hoje uma tênue, mas esperançosa mudança de paradigma, de visão de


mundo, com relação à velhice, ao velho e ao envelhecimento. E, sendo a educação o
condicionante das grandes transformações, ela pode colaborar para que esta mudança de
paradigma aconteça de forma mais acelerada, marchando à frente do ritmo do crescimento da
população idosa, preparando a sociedade para este desenvolvimento. Somos inclinados a
proferir, sem desconsiderar o valor dos avanços tecnológicos e científicos, que muito ainda se
tem para aprender sobre e com o ser humano, notadamente, com os nossos velhos, antes de
tentar ir a outros mundos - Marte - entre outras aspirações.
16

Os estudos da Psicologia e da Antropologia vêm evidenciando a dificuldade do ser


humano se conhecer, se reconhecer como humano frágil e poroso. Esta porosidade resulta, por
vezes, na assunção de preconceitos, estigmas e esteriótipos. Assim é que conhecer outros
mundos, distantes de nós, pode representar para o homem, uma fuga na qual ele se esconda,
postergue, ou elimine a vontade e capacidade de se desenvolver como pessoa numa perfeição
inatingida. O homem ainda é um mistério. É difícil para a humanidade se conhecer em todas
as suas fragilidades e potencialidades. Por vezes há a fuga para conhecimentos mais distantes
e se deixa de lado o socrático “conhece-te a ti mesmo”.

Vários estudiosos têm buscado aprofundar-se no auto-conhecimento, desafiando


temas, tidos como proibidos, fenômenos e processos complexos como a velhice, a
sexualidade, a aprendizagem na terceira idade, a temporalidade e a finitude humana, e vêm
desenvolvendo métodos e estudos para uma pedagogia voltada para alunos velhos. Lahud
Loureiro, em Sessão de Orientação (2004), fez referência a uma “gerontogogia”. Cachioni,
em concordância com o pensamento de Lahud Loureiro, fala em “‘gerontologia educacional’,
como especialidade da gerontologia” (2003, p. 27) e Lemieux (apud CACHIONI, 2003,
p. 27-28) refere-se à “gerontagogia”, como ciência social que “está mais preocupada com o
ensino/aprendizagem do que com o fato de que os educandos sejam pessoas idosas”.

Os estudos de tais fenômenos e processos, bem como, seus conseqüentes métodos


tornam-se necessários, pois a população no Brasil e no mundo está envelhecendo. De acordo
com o censo do IBGE em 2000, no Brasil,

“(...) o número de pessoas idosas (...) atingiu cerca de 8,6% da população, o


que equivale a 15 milhões de pessoas. Para os próximos 20 (vinte) anos, a previsão
é de que os brasileiros idosos serão de 15% do total da população. (...) O aumento
da expectativa de vida no Brasil se deve, entre outros fatores, ao progresso da
ciência, às melhores condições sociais e econômicas e, por que não dizer, ao rígido
controle demográfico que tem levado à diminuição da taxa de fecundidade nos
últimos anos.” (CNBB, 2002, p. 11 e 16)
No Brasil, a faixa etária que mais cresce é a dos 60 anos em diante. Segundo Costa
2
(2003) a população idosa “cresce aceleradamente e sem uma estrutura para esta demanda”.
Ela enfatiza que o idoso não é o adulto que ficou velho, da mesma forma que a criança não é o
adulto que ainda não cresceu. Cada idade da vida do ser humano tem sua especificidade e
deve ter o desenvolvimento de políticas governamentais voltadas distintamente,
especificamente para cada uma, e não adaptadas, copiando modelos de políticas já lançadas

2
Coordenadora do Programa de Saúde do Idoso, do Ministério da Saúde, no ano de 2003. Excluído: n
17

pelo governo para os outros estágios do desenvolvimento humano, como por exemplo,
adaptar uma política pública da infância/adolescência para o idoso.

Baseada na análise do Diagnóstico da situação do idoso em Curitiba R. C. S. Oliveira


(1999, p. 157), confirma o dito por Costa (op. cit), quando registra que:

“(...) a mudança no padrão demográfico vem-se dando sem que a população


tome consciência desse processo, sem que os governantes e órgãos públicos
definam e implantem efetivamente uma política social mais condizente ao novo
padrão demográfico.”
Embora ainda insipientes, pois que recém iniciadas, as políticas públicas para
atendimento aos idosos, algumas Instituições de Ensino Superior – IES, antecipando-se e
apoiando-se na realidade do fato, vêm oferecendo, há alguns anos3, cursos voltados para
idosos, criando Universidades Abertas para a Terceira Idade ou programas similares com as
mais variadas nomenclaturas. Segundo Martins de Sá (apud CACHIONI, 2003, p. 53) até
1999, estes programas já estavam espalhados por 18 estados brasileiros. Surgiram com os
nomes mais variados. Entre eles: Projeto NovIDADE na Pontifícia Universidade Católica do
Rio de Janeiro; Núcleo Integrado ao Estudo da Terceira Idade – NIETI na Universidade
Federal da Paraíba; Programa Face – Programa para Terceira Idade no Instituto Metodista
Bennett; Núcleo Universitário da Terceira Idade na Universidade do Rio Grande – RS;
Núcleo de Estudos e Pesquisas da Terceira Idade – NEPTI, na Universidade de Brasília e
UNATI na Universidade Católica de Brasília - UCB. Foi na UNATI/UCB que se deu a
investigação que fundamenta esta dissertação.

A Universidade Católica de Brasília – UCB, com sede localizada em Taguatinga –


Distrito Federal - Campus I -, desenvolve, desde 1995, um trabalho “que busca resgatar e/ou
conservar a auto-estima do velho, a sua identidade enquanto cidadão”, com o oferecimento
de várias atividades, como registra a Proposta para Planejamento do Projeto Fênix/U
UnATI da
UCB para o ano de 2002. Desta forma, assim como considera Lahud Loureiro (1999, p. 79), o
projeto Fênix/U
UnATI/UCB “(...) negando o estereótipo da sociedade”, assume que “todo o
ser humano velho, é um velho, mas é um ser humano”, que, como tal, “possui a neotenia,
muda”, quer dizer tem a capacidade de aprender.

3
O capítulo 3 desta dissertação, irá tratar sobre as Universidades Abertas à Terceira Idade e o seu surgimento no
mundo e no Brasil.
18

O velho continua na busca de desafios, se houver oportunidades; e, é esta


oportunidade que as UNATI’s pretendem oferecer e, ao analisar a UNATI/UCB, subjacente a
sua criação e desenvolvimento, se expressa esta oportunidade.

A UCB, através de sua Pró-Reitoria de Extensão, vem construindo, com os idosos do


Distrito Federal e entorno uma parceria; parceria esta, encontrada nos - ainda carentes de
organização - documentos oficiais da instituição, falas dos seus componentes, de ontem e de
hoje e constatadas, de forma mítico-simbólica, nos protocolos do teste – Arquétipo Teste de
Nove Elementos (DURAND, Y., 1988) - utilizados nesta pesquisa.

Esta oportunidade proporcionada aos idosos, pela UnATI/UCB, de ingressarem ou


reingressarem no ensino superior ou de participar de atividades extensionistas no âmbito da
Universidade cria ocasiões de interação entre estes idosos e os alunos mais jovens. O espaço é
aberto aos idosos para o relato das suas experiências, em uma troca intergeracional salutar,
aprendendo com o novo, o que tem comprovado que na velhice é possível ser ainda dinâmico,
ensinar e aprender. Esta dinamicidade interativa, ritualística e espontânea, procura retirar
fronteiras formadas por discriminações e mitos. Afinal, não se deixa de ser um ser humano,
homem ou mulher, por ter adquirido alguns anos a mais de existência, que os demais, ao
longo da vida. Com Lahud Loureiro (1993, p. 93) lembramos que a velhice “é apenas uma
Excluído:
fase diferente da vida; diferente, quem sabe a última (fase), mas ainda vida”.

Nesta recíproca relação geracional positiva, todos saem ganhando: o aluno novo é
capaz de aprender com o aluno velho e o aluno velho é capaz de aprender com o aluno novo.
A rejeição da sociedade estigmatizante para com o idoso começa a se diluir desta forma e a
aceitação e entendimento do valor da velhice e do velho se processa; faz com que o velho se
sinta na sua justa importância sem negar valor às outras idades e tenha sua auto-estima
estimulada, conservada ou recuperada em alta. O jovem é assim conquistado para lutar pelo
velho, pois, como já foi dito, se “o velho não tem armas. (...) temos que lutar por ele”. (BOSI
apud LAHUD LOUREIRO, 1999, p. 43).

Nesta investigação, houve o resgate, nos registros pesquisados, da memória da


organização UNATI/UCB para neles desvendar o imaginário subjacente a sua criação e
existência, objetivando com ele, em uma prospectiva, a possível re-organização,
considerando, nesta nova ou revista organização, a dimensão simbólica. Dimensão simbólica,
como explicitado no capítulo 5, e repetido em sessão de orientação (LAHUD LOUREIRO,
2005) “significando o submerso nas atitudes concretas, a base para qualquer ação humana
individual ou do grupo; o imaginário que caracteriza a postura no mundo”.
19

Buscou-se assim: a) repassar a história da UNATI/UCB - numa pesquisa “ex-pós-


4
facto” -, onde se acham explicitados seus princípios norteadores, observando, no presente
com a escuta e recolha de depoimentos -, a dinâmica do seu processo de implementação e
implantação; b) auscultar ou ler os registros mnemônicos disponibilizados de forma oral ou
escrita pelos próprios criadores/organizadores da UnATI/UCB, enriquecidos com a fala dos
seus alunos idosos que, no passado, ao programa acorreram, se engajaram, participaram e,
ainda hoje nela, procuram viver esta etapa da sua vida, já por muitos anos vivida, existência
envelhecida, mas vida, lembrando, aprendendo, mudando e se desenvolvendo; e c) desvendar
o imaginário do grupo formado pelos alunos idosos, professores e dirigentes (coordenadores)
da UnATI/UCB.

O imaginário, objeto desta investigação - entendido com Gilbert Durand (2001,


p. 18), como o “conjunto das imagens e relações de imagens que constitui o capital pensado
do homo sapiens” e o pressuposto assumido, nesta busca, com Bachelard e G. Durand que o
“imaginário possui potência organizativa”-, encaminha o desvendar de vetores à
“organizacionalidade antropolítica” (PAULA CARVALHO, 1990 a). Organizacionalidade
entendida, com Paula Carvalho (idem) como organização dinâmica sempre se fazendo e
refazendo; antropolítica por ser centrada no ser humano, no caso, no velho. Procurou-se
assim, desvendar esta potência organizativa uma vez que a pretensão foi e será apresentar no
final deste trabalho, pistas para uma possível re-organização da UnATI/UCB.

Assim sendo a pesquisa se caracteriza como qualitativa, culturanalítica (idem), que


privilegia a utilização do Yves durandiano Arquétipo Teste de Nove Elementos – o AT-9 -;
prestigia a Antropologia do Imaginário, de Gilbert Durand; a Teoria da Complexidade, de
Edgar Morin; a Antropologia das Organizações, de Paula Carvalho, assim como a teoria da
Educação e as noções da, ainda em construção, Teoria Gerontológica: da Gerontologia.

Na elaboração da dissertação, em respeito às teorias de base anunciadas, recorreu-se


aos escritos de Gilbert Durand, Yves Durand, Gaston Bachelard, Jean Chevalier, José Carlos
de Paula Carvalho, Maria Cecília Sanches Teixeira e Altair Macedo Lahud Loureiro sobre o
dinamismo organizador do imaginário e a dimensão simbólica das organizações. Em Yves
Durand, Lahud Loureiro e outros autores citados na bibliografia, buscou-se a fundamentação
e orientação para a utilização do AT-9. Para o entendimento maior do fenômeno da velhice,
da situação ou situações do velho nas sociedades, o socorro chegou nos escritos de vários
estudiosos da temática, entre eles a orientadora desta dissertação. Foram consultadas teses de
4
“Ex-pós-facto” tipo de pesquisa onde a avaliação acontece após a ocorrência do fato.
20

doutorado localizadas na linha de pesquisa cultura, organização e educação, iluminadas pela


teoria do imaginário e da complexidade, como as de Helenir Suano (1993), Walter José
Martins Migliorini (1999), este tendo a velhice como objeto de estudo, Iduína Mont’Alverne
Braun Chaves (2000), bem como, dissertações de mestrado, entre elas, a de Orlando Oliveira
Filho (2000), de Vilma Lino Milanez (2002), de Celso Francisco Dias (2002) e de Vito
Ângelo Sequência (2002), estudiosos e pesquisadores do imaginário, da educação e da
velhice. Eles se fazem presentes em transcrições nomeadas e citações, ou alicerçam uma base
para a construção desta dissertação ao lado de outros também relacionados nas referências
bibliográficas.

O despertar para esta pesquisa se deu pelo interesse em responder questões, como:

1) Porque, e baseado em que, uma organização de ensino superior – no caso UCB -


se preocupou em oferecer/organizar e como vem realizando atividades para que a
aprendizagem continue se realizando com alunos idosos?

2) O que move/motiva os idosos a freqüentar aulas teóricas e práticas físicas depois


dos 60, 70, 80 e hoje até 90 anos de idade, apesar dos estereótipos e preconceitos
Excluído: a
comuns na cultura com relação à velhice?

3) Como o grupo de professores dirigentes e alunos da UNATI/UCB encara o medo


da morte e a angústia do passar do tempo, quer dizer, qual é o seu imaginário?

4) Qual é a representação mítico-simbólica – o imaginário -, desta oportunidade de


aprendizagem, no imaginário do grupo de alunos idosos da UNATI/UCB, que se
matriculam e freqüentam suas atividades?

5) Existe um ritual na efetivação das atividades na UNATI/UCB?

6) Em que este imaginário desvendado contribui para a continuidade/reorganização


da UNATI/UCB com os idosos?

Mergulhar na experiência de uma UNATI, especificamente na UNATI/UCB e no


estudo das teorias gerontológicas, ainda em construção, neste novo contexto de re-inserção ou
de não-exclusão do idoso na sociedade, foi, continua e continuará sendo um desafio; desafio
que assumimos, amparados nos autores citados, criadores, estudiosos e pesquisadores das
teorias que conduziram ao desvendar e a compreensão do universo mítico do grupo. Esta
compreensão foi possível ampliada, como já foi dito, na leitura dos trejeitos, expressões,
21

superstições, crenças, cultura, sonhos, formas de enfrentamento da “angústia do passar do


tempo e do medo da morte”.

Segundo Lahud Loureiro (1993, p. 177),

“(...) o pensamento humano é dinâmico e sujeito a influências exteriores. As


realidades observadas, os avanços e retrocessos das sociedades, as necessidades
psíquicas, etc, fazem com que o pensamento do homem se expresse de várias
formas, com atitudes diferentes perante diversos assuntos.”
Assim sendo, apresenta-se daqui em diante o processo e fragmentos imagéticos dos
resultados da pesquisa, tendo presente que é no “trajeto antroplógico” entre o interior e o
exterior que se pode ler o imaginário do grupo. “Trajeto antroplógico” entendido com Gilbert
Durand (2001, p. 41) e com Lahud Loureiro (2003, p. 23) como o

“(...) percurso que realizam as ‘intimações do meio cósmico social’


(externo) e as ‘pulsões interiores’ (interior ativo) de forma simbiótica. Nesse
percurso-trajeto, interior e exterior misturam-se, amalgam-se, formando outra
coisa que não é mais puro interior e nem puro exterior.”

A dissertação foi dividida em 5 (cinco) partes.

Na primeira parte - Rompendo as barreiras do tempo – Desafiando Cronos5 - serão


abordados os temas sobre a velhice, o velho e o processo de envelhecimento. A
“gerontogogia” – uma pedagogia voltada para o idoso; o histórico do surgimento das
Universidades Abertas à Terceira Idade – UNATI no mundo e no Brasil, e a criação da
UNATI na Universidade Católica de Brasília. Embrenhar-se em temas sobre a velhice e
discorrer sobre a possibilidade de aprendizagem nesta fase, bem como saber como o velho se
integra nas atividades proporcionadas pelas Universidades em geral é uma tarefa complexa,
onde é necessário romper barreiras, desfazer mitos, estigmas, preconceitos, considerados
como verdades absolutas por nossa sociedade, e assumidos pelos idosos.

Na segunda parte da dissertação – O objetivo vislumbrado, a trilha percorrida, os


veículos utilizados e seus passageiros na viagem - apresentar-se-á a metodologia utilizada, os
objetivos a alcançar/alcançados, a especificação dos instrumentos utilizados para a pesquisa,
bem como as teorias fundamentais para entender o objeto pesquisado e o encaminhamento das
respostas às questões formuladas neste trabalho para a obtenção dos dados míticos,
considerados no traçado da paisagem mental do grupo no final da dissertação.

5
Na mitologia grega Cronos, considerado como uma divindade primordial, era o mais jovem dos Titãs e
simboliza o tempo.
22

A terceira parte - Retratos do imaginário – O cintilar da alma - contém a reprodução


dos protocolos do Arquétipo Teste de 9 elementos – AT-9, realizados por membros da
UNATI/UCB: 2 professores que pertencem ao quadro docente e 16 alunos-idosos pertencentes
ao grupo6. Na complementação das análises dos registros míticos constantes nos protocolos
do teste, efetuados pelos sujeitos-autores, colocam-se dados advindos da escuta, escuta aqui
entendida como escuta da alma que vai além do dito, ouvido e visto, como na expressão de
Lahud Loureiro, em sessão de orientação (2004) “escutando o inaudível”, “vendo o invisível”
e “percebendo o imperceptível”, impossíveis ao olho nu, aos ouvidos físicos e a percepção
corriqueira.

Na quarta parte - Pegadas que ficaram na areia – As pistas culturanalíticas-, pistas


simbólicas são oferecidas, considerando os dados empíricos e teóricos obtidos.

Na quinta e última parte será apresentada a Bibliografia utilizada. Anexos são


apensados à dissertação com a intenção de complementar o trabalho.

Apresenta-se, assim, distribuídos nas 4 (quatro) primeiras partes da dissertação, o


histórico da UNATI/UCB, o imaginário dos idosos nela inseridos, bem como, pontuadamente
as particularidades que permearam este resgate do passado e o desvendamento das
representações simbólicas para indicar vetores para uma possível re-organização, se
requerida, deste programa extensionista.

6
Ver quadro de Identificação (sexo, idade, grau de instrução) dos sujeitos-autores do protocolo no capítulo 4
desta dissertação.
23

Parte I: Rompendo as barreiras do tempo - Desafiando Cronos

“Que rosto lindo eu vi hoje, rugoso,


Tão fascinante qual o duma criança!
Continha o mesmo brilho radioso,
(...) É como se o amanhã unisse o dia d' ontem
É como se o amanhã fosse a nossa essência!
(...)Pois, uma ruga é prêmio incontestável,(...)”
Eugénio de S. Vicente

Nesta parte da dissertação iremos contextualizar o objeto de estudo que é a


Universidade Aberta à Terceira Idade – UnATI da Universidade Católica de Brasília.

Para falar de um programa universitário voltado para a terceira idade foi necessário
mergulhar em teorias gerontológicas, buscando sentir e aprender mais sobre o tema da
velhice, a situação atual do velho na sociedade, o processo de envelhecimento, situar o velho
no tempo e no espaço, romper barreiras e tentar desmitificar mitos solidificados ao longo dos
anos pela sociedade. Foi preciso falar sobre o surgimento destes programas oferecido pelas
instituições de ensino superior, que por oferecerem atividades de ensino, pesquisa e extensão,
são considerados pequenas universidades temáticas: Universidade Aberta à Terceira Idade.
Seguindo uma cadência de pensamentos, foi proposto uma redução no foco do objeto,
passando pelo histórico das UnATI’s no mundo, no Brasil e em Brasília - DF, até chegar à
Universidade Católica de Brasília, situada em Taguatinga – DF. Para fazer um link entre a
temática da velhice – capítulo 1 - e a temática das UnATI’s – capítulo 3 -, foi necessário falar
um pouco do processo de ensino-aprendizagem, especialmente sobre uma pedagogia voltada
para o idoso, uma gerontogogia – capítulo 2.

Os temas tratados nos 3 (três) capítulos são instigantes a medida que buscam um
novo olhar para o novo paradigma que surge: viver a velhice com qualidade de vida.
24

Capítulo 1 - A velhice, o velho e o envelhecimento

“(...)
Sua vida cheia de histórias
E essas rugas marcadas pelo tempo
Lembranças de antigas vitórias
Ou lágrimas choradas ao vento (...)” Excluído: Lembranças de
antigas vitórias¶
Roberto e Erasmo Carlos Ou lágrimas choradas ao vento¶
Sua voz macia me acalma¶
E

1.1 - Uma visão geral do fenômeno da velhice, das situações do velho e do processo
de envelhecimento.

“Ser velho é sobreviver.”


Ecléa Bosi
Excluído: Meu querido, meu
Dados estatísticos anunciam que a população no mundo inteiro está envelhecendo e velho, meu amigo.¶

que o aumento da expectativa de vida vem se ampliando. Os romanos não viviam, em média,
além dos 18 anos; no século XVII, a média de vida era de até os 25 anos e no século XVIII,
até os 30 anos aproximadamente. Durante muitos séculos, um número muito reduzido de
pessoas chegava aos 60 anos. No início do século XX o número de pessoas com idade
aproximada aos 80 anos dobrou na França. Embora a expectativa de vida tenha aumentado ao
longo dos tempos, este aumento tem sido diferente entre os países desenvolvidos e em
desenvolvimento e/ou subdesenvolvidos. (LAHUD LOUREIRO, 2000, p. 39).

Excluído: Me calando fundo na


De acordo com Fraiman (1995, p. 24), a expectativa de vida para o homem brasileiro alma¶
Meu querido, meu velho, meu
subiu de cerca de, 41 anos, em 1939, para 58 anos, em 1972. Em 1995, nos grandes centros amigo.¶

urbanos, o aumento da expectativa de vida nos homens subiu para 63 anos e nas mulheres, Seu passo vive presente¶
Nas experiências contidas ¶
para 67 anos. Segundo Nóbrega (2003) 7, no mundo, em 1950, existiam cerca de 204 milhões Nesse coração consciente¶
Da beleza das coisas da vida¶
Seu sorriso franco me anima¶
de idosos. Em 1998, este contingente alcançava 579 milhões de pessoas - um crescimento de Seu conselho cert me ensina¶
Beijo suas mãos e lhe digo¶
quase 8 (oito) milhões de idosos por ano. Em 2050, estima-se que a população idosa mundial Meu querido, meu velho, meu
amigo.¶
será de 1,9 bilhões de pessoas idosas. ¶
Eu já lhe falei de tudo¶
Mas tudo isto é pouco¶
Para J. C. Silva (2003, p. 98), os fatores que contribuíram para o envelhecimento da Diante do que sinto¶
<sp>Olhando seus cabelos
brancos tão bonitos¶
população foram a industrialização, a urbanização, os avanços da medicina, da tecnologia e <sp>Beijo suas mãos e digo¶
Meu querido, meu velho, meu
do saneamento básico, os quais proporcionaram a queda dos níveis de fecundidade e amigo.¶

mortalidade, favorecendo o aumento da expectativa de vida da população. Excluído: p.

7
Citação feita por Nóbrega, em 08/09/2003, em aula/palestra sobre “O processo do envelhecimento”, ministrada
na disciplina Tópicos Especiais do Envelhecimento, doPrograma Stricto Sensu em Gerontologia da UCB.
25

O aumento da expectativa de vida é uma vitória. Porém esta vitória é cercada de


desafios e pode também, segundo Debert (2005) estar “mascarando as reais necessidades dos
velhos brasileiros” 8. Para Debert o verdadeiro desafio pode ser tanto para a sociedade, como
para os governos, instituições e para o próprio idoso, pois cresce também, o número de idosos
desvalidos, sem condições de ter qualidade de vida e sem acesso a determinados tipos de
programas para a terceira idade.

Viver muito e bem sempre foi um desejo do ser humano, o que é também um direito.
Desde os tempos mais remotos, por mais que a idéia do envelhecer trouxesse o medo pela
perda da força física, imprevisibilidade do futuro e o temor da morte, sempre houve o desejo
Excluído:
de se viver muito, o que se prova através da célebre frase de saudação: Vida longa ao ... .

O homem prefere o envelhecer apenas como garantia de vida - oposto de morte -,


pois sempre o que buscou, foi a fonte da juventude, seja na realidade ou na ficção e nas
lendas, por meio de histórias mágicas, como as dos 3 (três) desejos pedidos ao gênio da
lâmpada maravilhosa, do elixir dos deuses ou de ervas medicinais. Nos tempos atuais,
algumas pessoas ainda lutam contra a ação do tempo – a velhice -, seja através de plásticas
estéticas, aplicações de substâncias, botox, ingestão de pílulas de enzimas, ou com exercícios,
energizantes, dietas e medicamentos, tentando manter-se, por mais tempo, jovem físicamente,
ligando juventude à qualidade de vida e poder. É o “capital do corpo” em um mundo
moderno, em uma sociedade embebida de hedonismo.

O homem sempre quis viver mais e muito na juventude. Não previu que o viver mais,
expresso nas estatísticas acima, o faria viver mais na velhice, viver mais tempo como velho.
Aspirou viver muito tempo jovem e não velho.

Hoje, o homem continua aspirando a vida longa, mas com qualidade de vida,
entendida no seu sentido mais amplo, não só com a manutenção do corpo. É possível entender
a velhice como uma fase da vida, onde se somam as glórias de todas as fases passadas -
infância, adolescência e idade madura – com a esperança e a construção do futuro que os
aguarda. Como bem expressa Morin, em algum lugar, “é agora no envelhecimento e
rejuvenescimento misturados que sinto em mim todas as idades da vida. Sou
ininterruptamente a sede de uma dialógica entre infância/adolescência/maturidade/velhice”.

8
Citação feita por Guita Debert, em 28/03/2005, em Aula Magna ministrada no Programa Stricto Sensu em
Gerontologia da UCB. Tema: “Desafios e Perspectivas nos estudos sobre a Velhice o Envelhecimento”.
26

O bem viver inclui a aceitação da idade que se tem e a consideração tranquila dos
bordados que o tempo faz em nossas nas faces. Adélia Prado em seu poema, diz:

Excluído: em socorro da minha


“Peço a Deus, (...) me conceda um rosto fraqueza,¶
de velha mãe cansada, de avó boa,
não me importo. Aspiro mesmo
com impaciência (...)”

Mas nem todos as assumem ou mesmo aspiram, como Adélia Prado. Alguns podem
encará-las como esculturas, como desenhos feitos pela ação do tempo, como escreve Lahud
Loureiro (1999, p. 82) ao registrar, “se pudéssemos abrir cada ruga de uma face envelhecida,
quanta história encontraríamos dentro dela”, ou como, Melgarejo (2003), que escreve, cada
ruga ou traço de expressão, “revela um riso, um choro, um orgasmo, um êxtase místico ou
sádico, um momento de suspeita paranóica”. Assim, alguns velhos ao ver refletido no espelho
suas próprias rugas poderão ver o que os autores acima dizem, porém, outros, poderão não ver
da mesma forma e poderão ter sua auto-estima diminuída. Seria prudente não deixar que a
Excluído: a
lâmina de um espelho sirva de barreira que o impeça de viver o presente, preservar o futuro, e
Excluído: perdido
o leve apenas a buscar um passado já vivido. As lembranças são importantes para o velho,
mas ele não pode viver somente de recordações. O ser humano idoso pode criar, viver novas e
inéditas situações, usufruir de novos hábitos, novas atitudes, novas doçuras, aprender e
construir uma vida nova na velha idade. Isto vai depender de múltiplos fatores interligados no
complexo processo do viver e do envelhecer, entre eles, do imaginário de cada um:
imaginário de luta, de acomodação ou de harmonização dos contrários, frente à realidade,
como exprime as estruturas antropológicas do imaginário, identificadas por Gilbert Durand
(2001, p. 241), como heróica (ou esquizomórficas), mísitcas (ou antifrásicas) e sintéticas (ou
dramáticas).

1.1.1. – A Velhice

Excluído: bonitos
“Esses seus cabelos brancos, (...)
Esse olhar cansado, profundo (...)
E esses passos lentos de agora (...) Excluído: Me dizendo coisas
Já correram tanto na vida (...)” num grito¶

Roberto e Erasmo Carlos Excluído: Caminhando sempre


comigo¶
Excluído: Eu, que fui loura e
Normalmente, associamos a velhice às modificações do nosso corpo. As primeiras lírica,¶
não estou pictural.¶
modificações, que denunciam o envelhecimento são o aparecimento das rugas de expressão e
27

dos cabelos brancos. Numa fase bem mais avançada, a marcha se torna mais lenta; a postura
decaí, encurva; e a capacidade auditiva e visual se reduz, como diz a epígrafe citada.
Excluído: Porque sempre há
Todas essas modificações contribuem para a idéia pré-concebida da associação entre quem diga¶
no meio da minha alegria:¶
velhice e feiúra, entre velhice e fragilidade, que motivaram os preconceitos. Como escreve "põe o agasalho"¶
"tens coragem?"¶
Barreto (1992, p. 26), referindo-se a estereótipos atuais, “o ideal estético é erigido sobre um "por que não vais de óculos?"¶
Mesmo rosa sequíssima e seu
perfume de pó,¶
corpo jovem, o velho é feio. (...) O corpo do velho é um corpo frágil.” Nestas circunstâncias, o quero o que desse modo é doce,¶
o que de mim diga: assim é.¶
espelho, na velhice, torna-se indiscreto, torna-se um inimigo, pois mostra uma determinada Pra eu parar de temer e posar pra
um retrato,¶
construção da realidade, uma imagem, como ela é, sem camuflar a ação do tempo. Mas é ganhar uma poesia em
pergaminho.¶
comum na velhice pensar, como cita Lahud Loureiro (1999, p. 84), que é o espelho que já não
reflete bem, que não devolve, no seu refletir, a imagem que se tinha, a imagem esperada e
que, “quem está velho é o espelho”.

Com o aumento da expectativa de vida, a velhice tornou-se uma etapa mais longa.
Quanto tempo dura hoje cada etapa do ciclo de vida do homem? Quanto tempo dura a
infância, a adolescência e a vida madura? Se não tivermos nossa vida interrompida, seremos
Excluído: durant
adultos durante mais tempo, pois a fase da velhice foi prolongada no tempo.

“A velhice é a última fase do ciclo vital e é delimitada por eventos de


natureza múltipla, incluindo, por exemplo, perdas psicomotoras, afastamento
social, restrição em papéis sociais e especialização cognitiva. A medida que o ciclo
vital se alonga, a velhice passa a comportar subdivisões que atendam a
necessidades organizacionais da ciência e da vida social.” (NERI, 2000, p. 102).
Daí dizer-se: terceira idade, quarta idade ou como escreve Pfromm Netto, citado pela
antropóloga Maria Laís Mousinho Guidi (2003), em aula/palestra proferida sobre cultura, que
“a velhice está dividida em 4 (quatro) etapas: dos 50 aos 65 anos → preparação para o
envelhecer bem; dos 65 aos 75 anos → idoso – jovem; dos 75 aos 85 anos → idoso – idoso; e
85 anos ou mais ...” 9 . Já Jean Pierre Guton (apud LAHUD LOUREIRO, 2000, p. 20) divide
a velhice nas seguintes etapas: “Velhice Verde - dos 55 aos 65 anos; Velhice Crua - dos 65
anos até a morte; e Velhice decrépita: quando os homens são (...) inúteis – eles caducam,
bebem, comem e dormem o resto do tempo.”

Embora existam controvérsias em relação tanto a data para entrada na velhice como
para a delimitação das suas fases ou etapas, estas etapas se definem por características
pessoais, sociais e culturais. Elas podem trazer consigo uma situação existencial de crise, em
decorrência de um conflito entre o desejo de amadurecimento, de crescimento, de sapiência e

9
Citação feita por Maria Laís Mousinho Guidi, em 23/08/2003, em uma aula/palestra sobre “Cultura”,
ministrada na disciplina Tópicos Especiais do Envelhecimento, do Programa Stricto Sensu em Gerontologia da Excluído: o
UCB.
28

serenidade e o declínio biológico e social contínuo no passar dos anos e a certeza da morte.
Tal crise, conforme texto base da Campanha da Fraternidade para o ano 2003 (CNBB, 2002,
p. 60).

“(...) se apresenta em três dimensões necessárias para se alcançar a


integridade da personalidade na velhice:
¾ Crise de identidade: necessidade de novas relações consigo mesmo, com
as demais pessoas e com o mundo dos valores. A capacidade de se
aceitar, de estar de bem com a vida, é fundamental para uma vida
saudável.
¾ Crise de autonomia: Ser “dependente”, receber e não poder dar é para
muitos, uma idéia terrível, uma lição difícil de aprender.
¾ Crise de pertença: necessidade de novas relações com a sociedade. À
medida que o indivíduo envelhece, mudam os papéis sociais que
desempenha. É preciso substituir os papéis sociais que vão se perdendo
por outros adequados ao próprio estado de vida, para não cair na
indiferença e na frustração. Daí a necessidade de estratégias de
socialização dos idosos, com a atribuição a eles de um reconhecimento
efetivo e de tarefas valorizadas, inclusive remuneradas.”
Fundamentado nesta realidade, entre outras organizações, surgem as UnATI’s.

Simone de Beauvoir (apud LAHUD LOUREIRO, 2000, p. 21), diz que a velhice é
“uma fase da existência diferente da juventude e da maturidade, mas dotada de um equilíbrio
próprio, deixando aberta ao indivíduo uma ampla gama de possibilidades”. Repetimos com
Lahud Loureiro (1999, p. 79), que a velhice “(...) é apenas mais uma das etapas da vida.
Talvez a última, mas ainda vida, como as demais, que precisa e deve ser vivida com
intensidade; ser bem vivida com encantos e ... ‘reencantamentos’ ”.

Reencantar é possível como escreve Gilbert Durand “a vocação do espírito é


insubordinação à existência e à morte e a função fantástica manifesta-se como o padrão
dessa revolta” (2001, p. 403-404).

A chegada da velhice assusta a muitos, por trazer inserido nela um processo de


Excluído: c
perdas e ganhos, onde as perdas parecem maiores. Durante toda a vida, desde a infância, as
Excluído: c
perdas e ganhos acontecem, mas nossa sociedade encara que, na velhice, perder é Excluído: são

absolutamente normal. Reconhecemos, também, que é na velhice que as perdas são


ressaltadas. Dificilmente os ganhos são reconhecidos. Perdas e ganhos acontecem pela vida
Excluído: é errado
afora. O que confunde é a idéia de velhice, somente com perdas em uma sociedade
Excluído:
estereotipante. É prudente uma revisão dos mitos, conceitos e preconceitos que levarão a uma
reformulação das teorias e definições: remitizar. Daí a busca nesta dissertação pela
compreensão do imaginário do grupo, da sua potência fantástica para possível remitização.
Gilbert Durant (2001, p. 428) considera “(...) precisamos rever, quando se trata de
29

compreensão antropológica, as nossas definições sectárias da verdade. (...)” e que “no seio
do puritanismo racionalista e dessa cruzada para a ‘desmitificação’ a potência fantástica dá
a volta à exclusão objetiva (...)” (ibidem, p. 429).

Embora a velhice esteja sujeita aos seus limites impostos pelas perdas físicas e com a
Excluído: faz-se mister
“mudança de papéis”, a implementação de políticas sociais específicas com o objetivo de
reinserir ou manter o idoso no meio social, é salutar desde que estas respeitem a cultura
específica dos grupos, as possibilidades do lazer e a educação permanente. Como escreve
Salgado, (1998, p. 36).

“É imprescindível a implementação de ações em prol das populações, que


envelhecem com políticas de natureza mais preventiva e menos curativa, mais
promocional e menos assistencial; com ações que incidem sobre os fatores
essenciais da manutenção de sua qualidade de vida; com uma política para o
envelhecimento que, inserida no bojo de uma compreensão social mais ampla,
diminua as desigualdades e invista nos indivíduos ao longo de todo o seu ciclo de
vida.”
Para Gilbert Durand (op. cit., p. 431) “o nosso mais imperioso dever é trabalhar por
uma pedagogia da preguiça, da libertação (dèfoulement) e do lazer.” Após anos de trabalho,
anos de compromisso de horas cumpridas em troca de salário, faz-se necessário, colher os
frutos da árvore que plantou, descansar e usufruir dos encantos da vida, como cita Gilbert
Durand, na “pedagogia da preguiça”. O homem ao alcançar a velhice, pode opinar por
continuar trabalhando ou dedicar-se ao lazer, e este lazer pode incluir o ócio e a preguiça, se
isto lhe dá satisfação.

Em uma reflexão prospectiva dever-se-ia considerar a realidade do desaparecimento


que já se pronuncia com a escassez do trabalho e assim, pensar o ócio, o lazer e a preguiça
tornam-se imprescindível. Tal reflexão poderá se dar em uma outra oportunidade acadêmica.
Deixa-se aqui o alerta.

O que se percebe, hoje, é que o envelhecimento populacional, fenômeno


relativamente recente, não chegou ainda a estabelecer um papel social específico para o idoso.
A sociedade, tão pouco o homem se prepararam para enfrentar este envelhecimento. Em
grande parte da população, especialmente nas mais carentes, o idoso perde todos os seus
papéis sociais. Normalmente o que se vê, hoje, é que o ser humano, ao chegar a velhice, ao
tornar-se velho e perder seus papéis sociais, perde também a sua identidade. Deixa de ser um
profissinal – professor, padeiro, economista, - para ser rotulado apenas como um aposentado
ou o que é pior: um inativo. Tudo que construiu ao longo dos anos de trabalho, perde o valor
30

com a aposentadoria. Além de perder o que construiu, nem sempre lhe é dada a oportunidade
de construir um novo papel social.

A perda de papéis sociais requer criação de novos papéis e/ou modificação dos já
existentes. Os papéis sociais envolvem padrões de comportamento que influenciam os
relacionamentos e servem como base para a percepção que o indivíduo tem de si mesmo, pois
descrevem e identificam quem os desempenha. Não pode ser possível que com a chegada da
velhice, o velho troque todos os seus papéis sociais por apenas um: o de avô. O velho tem sua
própria vida, onde os netos podem ser importantes, mas a sua vida é sua, é única.

Na velhice, o velho ao modificar os seus papéis, não pode assumir apenas o de ser
avô, não pode abandonar tudo o que foi, pois sua experiência, sua história de vida tem muito a
contribuir. Nesta nova condição ele pode não ser mais apenas um produtor de força de
trabalho, mas um produtor de felicidade. Felicidade de ter contribuído com o estabelecido e
felicidade, por agora ser dono do seu tempo, de agir sem as pressões que o meio lhe impõe.

Mesmo numa fase mais avançada da velhice as pessoas continuam estabelecendo


metas em curto, médio ou longo prazo, investindo tempo e energia para alcançá-las. Lutar por
atingir metas requer mudanças e resulta sempre e, continuamente, em modificações nos
indivíduos. Muitas destas tarefas são de ordem particular (individual), e podem se caracterizar
por situações de isolamento. As atividades exercidas pelos idosos podem conferir-lhes maior
ou menor reconhecimento social, que vai influir na imagem e no grau de satisfação que eles
têm da vida. “Na velhice, o indivíduo deve continuar com suas atividades anteriores ou
encontrar outras que as substitua, procurando dessa maneira superar as restrições
apresentadas pelo contexto social” (CNBB, 2002, p. 80). A auto-estima na velhice se
mantém, recupera ou surge em novos desempenhos assumidos, dentro dos limites impostos
pela possível fragilidade física. Estas atividades o colocam outra vez ou mantém no
caleidoscópio da vida social e na satisfação pessoal. É bem verdade que o atual contexto
social faz com que, na velhice, as pessoas se sintam inúteis. Porém o velho não tem que
agradar a sociedade, continuando a ser, como na fábula, a eterna formiga na sua fase ativa.
Ele tem que agradar sim, mas, principalmente, a si mesmo. Este é seu direito.

A velhice nos permite olhar o horizonte que se mostra com o privilégio de ter um
passado já vivido de acertos e possíveis erros e de um futuro que poderá se realizar ou
Excluído:
continuar realizando como ser humano. Convém, então, encarar a velhice com bom humor,
Excluído: É preciso,
com coragem, determinação, liberdade de espírito, e perceber a “esperança” que ela pode
apontar. Existem coisas que podem e devem ser feitas, nesta etapa da vida terrena, além de
31

apenas esperar a chegada da morte. Mas não se pode ficar no discurso exotérico e vazio; por
tal, como gerontólogo, procura-se desvendar cada vez mais as várias dimensões que compõem
o fenômeno da velhice, o processo do envelhecimento e a(s) situação(ções) do ser humano
velho. Dentre estas dimensões, ocupa-se esta dissertação, da dimensão simbólica, dos mitos
que perpassam o fenômeno da velhice, do processo do envelhecimento, assim como do
imaginário do homem velho associando-os a possíveis aprendizagens novas.

1.1.2. – O Velho

“Ser velho é continuar sendo homem.”


Marilena Chauí

A palavra “velho” carrega uma gama de conotações pejorativas, como já se disse,


pois vivemos numa sociedade que idolatra o novo, o belo e o forte; e ser velho, contraria este
padrão. Ser velho significa estar envolvido em um universo preconceituoso, de não aceitação,
de exclusão.

“Ser velho assumiu um significado tão negativo, tão depreciativo e se


incorporou de tal forma às nossas emoções, que todos nós tememos o
envelhecimento. Alguns aceitam com um pouquinho mais de facilidade, mas na
realidade só se aceita a velhice quando não se tem mais condição de escondê-la.
Enquanto é possível escondê-la ‘cortando’, ‘recortando’, ‘plastificando’ o corpo, o
envelhecimento não é assumido. (...) ‘Só o jovem é belo!’ dizem muitos. No entanto,
o corpo tem belezas particulares em todas as idades. (...) Todos nós temos com o
espelho uma relação muito interessante.” (SALGADO, 1999, p. 17-18).
Especialmente no Brasil, o preconceito contra o velho “é mais forte que o
preconceito racial: incorporado sem crítica, envolve toda a sociedade e é aceito pelas
próprias pessoas de idade” (BARRETO, 1992, p. 24). Em grande parte deve-se, este
Excluído: Talvez isto seja
preconceito, à influência do capitalismo, onde só a força do trabalho, da produção, do
Excluído:
mercado, tem valor. O velho, por sua queda de força física, é substituído pelo jovem, com
mais força e vigor. Conta pouco a experiência, o qualitativo; a importância está apenas na
quantidade. Entram nestes fatores as leis de mercado e as de consumo, onde o velho não é
visto como um consumidor de fato. Contudo, percebemos que o idoso já está mudando o
estigma deste novo tipo de consumidor. Hoje vários comércios são voltados para o idoso,
transcendendo as fronteiras das farmácias. Criaram-se novos mercados de consumo e novas
formas de lazer. Tal mudança que, resumidamente, é positiva dá-se, também, em
conseqüência de fatores negativos: desemprego de filhos, filhos divorciados que retornam a
Excluído: d
casa de seus pais, e pais em idade avançada que sustentem a família. Em alguns casos até,
filhos e netos são sustentados pela aposentadoria dos pais/avós. Não podemos negar que esta
32

mudança gera, também, um outro tipo de preconceito: idoso rico x velho pobre. O fato é que a
Excluído: .
sociedade percebe de forma diferente os velhos, e a condição sócio econômica pesa!

Nas culturas mais antigas, assim como nas orientais, o velho era visto como sinônimo
de sabedoria e impunha respeito. Os idosos eram tidos como exemplos de vida; serviam de
conselheiros, ou eram citados como modelos para os jovens, e, sendo os portadores da
memória cultural e das tradições da sociedade, eram tidos como os responsáveis pela
transmissão dos conhecimentos e valores às novas gerações. Porém o “velho sábio”
desapareceu de nossa realidade, permanecendo apenas um conceito abstrato.

“Na sociedade atual, os velhos sofrem enorme pressão para que ajam como
jovens, retirando-lhes o direito de envelhecer, sob pena de serem isolados e até
excluídos. Os que já apresentam deficiências em sua capacidade muscular e
acuidade sensorial são postos de lado, porque o valor do ser humano não se
relaciona com a capacidade psicológica, já que há um intenso culto ao físico.”
(MELGAREJO, 2003).10
O problema está em confundir-se a velhice com a doença. Os escritos têm se
fundamentado mais na emoção da lágrima, do sofrimento, da dor do velho, desprezando a
velhice saudável.

Salgado (1999, p. 20) questiona e a idéia de que nas

“(...) obras literárias, a apoteose está sempre no final, o final é sempre mais
emocionante. Por que na vida seria diferente? Por que a qualidade e o valor da
existência estão apenas na juventude? (...) Certamente deve haver um sentido de Excluído: ¶
vida na velhice, mas que depende da apropriação que cada um faça da sua própria
existência. Temos que descobrir o mistério do envelhecimento e conferir para esse
tempo de vida uma qualidade, senão superior, pelo menos tão simpática, tão
gostosa, tão valorizada como foram as etapas anteriores.”
Esta é uma tarefa também do próprio velho.

O mesmo autor (1998, p. 37) ressalta que cada velho sadio tem que ter o
Excluído: i
compromisso de lutar e conquistar seu espaço e sua dignidade. “Se a sociedade inventou a
velhice, os idosos devem reinventar a sociedade”, transformando-a numa sociedade inclusiva
que reserve lugar para eles; é preciso “reinventar a velhice” Debert (1999). Todavia, apesar
do discurso de Salgado, que o velho tem que lutar, refletimos, com Ecléa Bosi, (1987), que
políticamente assume que “o velho não tem armas, nós é que temos que lutar por eles!”
(BOSI apud LAHUD LOUREIRO, 2000, p. 43). Pode ser que o tempo decorrido entre o
estudo de um autor e do outro modificou a visão sobre a velhice; ou o imaginário, a visão de
mundo de um e de outro se diferenciam, não só no tempo, mas em suas posturas ante o

10
Melgarejo traz a tona a realidade de um dos pólos a considerar na busca pretendida desta dissertação do
imaginário do grupo: a “pressão do meio cósmico social”. Remete-se ao capítulo 5 que vai falar da Teoria do
Imaginário de Gilbert Durand.
33

fenômeno e a situação social/cultural do idoso/velho. No entanto somos levados a crer que


tanto os velhos como a política social do idoso, precisam reagir no enfretamento do problema.
Assim pensando, encontramos nas UnATI’s uma estratégia para tal, um lugar/espaço onde as
políticas institucionais com relação ao idoso se operacionalizam e os velhos se realizam ou
procuram se realizar.

1.1.3. – O Envelhecimento

“(...) cada idade tem o seu prazer e a sua dor


e é preciso que eles escorram entre nós.”
Vitor Hugo

Vitor Hugo, em suas palavras, chama a atenção para a importância de se viver


intensamente cada idade que se tem, pois cada idade tem sua própria dinâmica de
desenvolvimento. O tempo não volta e a “velhice é algo que vai crescendo por dentro, do
jeito mesmo como num jardim cresce uma flor” (RUBEM ALVES apud LAHUD
LOUREIRO, 2004 c, p. 38). Qualquer fase da vida deve ser encarada com naturalidade e
tentar aproveitar da forma mais prazerosa possível as suas vivências, de forma sutil e
tranqüila.

Segundo Neri (2000, p. 102),

“O envelhecimento é o processo de mudanças universais pautado


geneticamente para a espécie e para cada indivíduo, que se traduz em diminuição
da plasticidade comportamental, em aumento da vulnerabilidade, em acumulação
de perdas evolutivas e no aumento da probabilidade de morte. O ritmo, a duração e
os efeitos desse processo comportam diferenças individuais e de grupos etários,
dependentes de eventos de natureza genético-biológica, sócio-histórica e
psicológica.”
Convém lembrar que vai depender da aceitação ou negação desta realidade registrada
pela autora que se pode perceber ou descobrir o imaginário do grupo. Lembra-se aqui a obra
de Lya Luft (2005) onde a autora analisa a realidade sem otimismos vãos nem pessimismos
agudos e assim considera as perdas e os ganhos em toda a vida.

O envelhecimento é um processo abstrato, pessoal, mas também, um processo, de


natureza cultural, pois ocorre de maneira diferente em cada indivíduo, respeitando a sociedade
ao qual está inserido. A velhice física pode ser antecipada, em conseqüência de vários fatores
como dificuldades sócio-econômicas e emocionais. Para Salgado (apud SILVA, J.C., 2003,
p. 99).
34

“(...) é também cercado por determinantes sociais que contribuem para que
esse processo varie de cultura para cultura e de sociedade para sociedade. (...) O
aspecto social do envelhecimento é fundamental, pois significa que a idade social é
determinada por normas e expectativas sociais, que enquadram as pessoas em
termos dos direitos e deveres, atribuindo tarefas a serem desempenhadas dentro das
idades biológica e cronológica.”
Aqui lembramos a obra de Guita Debert intitulada “a reinvenção da velhice” (1999),
onde a autora diz que se a sociedade inventou o velho, o velho agora precisa reinventar a
sociedade; bem como a obra de Jack Messy “a pessoa idosa não existe” (1999), onde este
autor também registra que a velhice foi uma categoria inventada pela sociedade.

Em consonância com o acima dito pelos autores citados, na teoria do imaginário, G.


Durand (2001, p. 41) alude as “pressões do meio cósmico e social”, os entendimentos e
opressões exercidas pelo meio, sociedade e cultura, sobre a humanidade a serem consideradas
na simbiose com os desejos, aspirações, “pulsões individuais” do ser humano, no “trajeto
antropológico”.

O envelhecimento, visto como processo de declínio do ser humano se baseia em


pressupostos duvidosos, em mitos arraigados na sociedade. Boa parte dos idosos vive sua
velhice com tranqüilidade e aceitação, suas vidas não são negativas, dependentes e de
inutilidade, embora este desenvolvimento caminhe em direção oposta aos valores
predominantes da sociedade atual: beleza, força, trabalho, poder econômico e político.
Vivemos em uma sociedade que esteriotipa, mas que diz ser democrática e pluralista. E, neste
pluralismo, é importante que haja espaço para o velho contribuir, com seus conhecimentos,
saberes e experiência, com os mais jovens sem esquecer de também de usufruir.

O Brasil, considerado por até bem pouco tempo um país de jovens, pensa ser, ainda,
este “país jovem” e não se preparou para receber a população que envelheceu, está
envelhecendo e que o transforma em “um país jovem com cabelos brancos” (VERAS, 1994).
Excluído: Talvez o
O Brasil ainda não se deu contas de seus cabelos brancos, pois como escreve Beauvoir (apud
Excluído:
(FEATHERSTONE, 1998, p. 11) a “velhice é algo não realizável, que não entendemos até
Excluído: dizia que
sermos velhos” e como diz Sartre, é um “etre pour outre” (um ser para o outro). É no outro
que percebemos o passar do tempo, as rugas: a velhice. Quem envelhece são os outros!

A sociedade que envelhece pode valorizar os talentos dos velhos/idosos, a


Excluído:
capacidade que ainda possuem. Nossos velhos/idosos representam a história viva de nosso
passado, com suas lembranças, memórias, com poucos direitos legislados, com raras
oportunidades e muitas vezes silenciados pela ideologia dominante, pelas pressões do “meio
35

cósmico e social” (DURAND, G., 2001, p. 41). Como diz Lahud Loureiro, (1994, p. 75) “são
arquivos vivos, a se deixarem, com prazer, folhear (...)”.

“Pensar e agir no que pode e estender a sabedoria e a experiência,


espargindo a doçura da calma conquistada, é a oposição salutar para o velho
desmentir seu desvalor, desvalor considerado, em geral, afobadamente pela
sociedade, sem a parada maior de reflexão sobre o gravado; opinião preconcebida,
cunhada nas cabeças dos ‘sócios’, como idéias formatadas no molde do igual, do
conveniente, necessário para a continuação da situação.” (LAHUD LOUREIRO,
2000, p. 38)
Atualmente, um novo olhar sobre a velhice se faz sentir. A criação do Estatuto do
Idoso normatiza regras que, no entanto, deveriam ser valores intrínsecos no homem, como o
respeito, e o não mal-tratar. Não deveria ser necessária uma legislação para dizer que
devemos respeitar o nosso próximo, este cidadão que já não contribui com os valores
materiais desejados pela sociedade. Não deveriam ser ameaçados castigos para quem não
fosse humano, desprezando seus próprios velhos.

A qualidade de vida para o idoso e esperança para um envelhecer saudável pode se


dar com novas aprendizagens, novas experiências e novas conquistas, que levem o idoso a
reconhecer-se como cidadão consciente de suas responsabilidades e de seus direitos.

Hoje, políticas envolvendo o tema do envelhecimento e da velhice vêm sendo


discutidas e ações positivas já refletem na criação de Centros de Convivência, Núcleos de
Estudos e Pesquisas sobre o envelhecimento bio-psico e social e sobre qualidade de vida.
Instituições particulares se apresentam financiando projetos nesta área e Instituições de
Ensino Superior desenvolvendo programas extensionistas, como é o caso das UnATI’s. Tudo
isto visando o resgate ou a conservação da auto-estima e da auto-imagem dos idosos, visando
o “reencantamento da vida”. Para tanto vem se buscando entender, cada vez mais, o processo
do envelhecimento, o fenômeno da velhice em si e a situação do velho em uma sociedade
capitalista, que cobra a força do trabalho, a assunção de papéis, ainda para o idoso, e a
produtividade quantitativa.

A representação pessimista criada pela sociedade – os preconceitos -, agora, vem


dando lugar para o envelhecimento com qualidade como resposta que convida o idoso a
ocupar o seu lugar numa inclusão ou re-inserção social. As sociedades sempre mudaram no
tempo e continuam mudando, são dinâmicas, e, nesta dinamicidade, se vislumbra a
consideração da velhice, mesmo porque o contingente nesta etapa da vida se alarga
continuamente, apontando, como dito anteriormente, para breve sermos um país com muitos
velhos.
36

Excluído:

Capítulo 2 – Por uma Gerontogogia: uma Pedagogia voltada para o Idoso

“É impossível viver historicamente sem ter um sonho, o projeto do amanhã, a


utopia. Ninguém sonha só. Meu sonho precisa do seu, e o seu precisa do meu para
deixar de ser ilusão e se concretizar.”
Paulo Freire

Há pouquíssimo tempo atrás, os estudiosos que se dedicavam ao desenvolvimento


humano, manifestavam interesse apenas nos estudos voltados para crianças e adolescentes. As
únicas teorias que abordavam o universo adulto eram aquelas que se referiam às patologias. O
interesse pelo desenvolvimento adulto e pelo envelhecimento ocorreu posteriormente, como
conseqüência tanto de aspectos demográficos, quanto dos avanços do conhecimento científico
que resultaram na possibilidade de uma melhoria da qualidade de vida na velhice.

Segundo Neri (1995, p. 17), as informações originadas do século XIX, nas áreas da
Psicologia Experimental, da Psiquiatria, e da Psicometria, confirmavam a noção de que após a
adolescência cessaria o desenvolvimento bio-psíquico. Assim sendo, não cabiam mais à
psicologia estudos nesta área.

Baseados nessa teoria acreditava-se que, com o desenvolvimento acontecendo apenas


na infância e na adolescência, estagnado na fase adulta, na velhice não existia mais
aprendizagem. Tal conclusão era tida pelo fato de a velhice ser sempre associada, apenas, à
velhice não saudável, com a fragilidade do corpo e a perda de memória. Isto deu origem a
alguns mitos como: que o idoso não aprende, que a inteligência enfraquece com a idade, que o
idoso não tem futuro.

Charlotte Bühler (apud NERI, 1995, p. 20), considera o “desenvolvimento como um


processo que se dá em toda a extensão da vida humana (life-span).” Com base nessa teoria e
estando provado que o idoso pode ter uma velhice saudável, perguntamos: É possível haver
educação na terceira idade? É possível aprender na terceira idade? O velho aprende?

De acordo com Osório, (apud OLIVEIRA, R. C. S., 1999, prefácio, p. 7) a visão de


educação sempre foi limitada a “tempo e espaço educativo”. A sociedade brasileira sempre
pensou na educação voltada para as gerações jovens. Nosso sistema educacional só se
compromete com a escolaridade básica obrigatória -. Somente a partir das décadas de 60 e 70,
do século anterior, foi que o panorama começou a se modificar e a se pensar em ultrapassar as
fronteiras geracionais e espaço-temporais.
37

Segundo Arenberg (apud MORAGAS, 1997, p. 66), é possível ao idoso aprender,


pois

“(...) a aprendizagem pode ocorrer em qualquer idade, embora o rendimento


diminua, esta diminuição não é substancial até depois dos setenta anos. Este limite
de idade se baseia em estudos de populações idosas atuais, submetidas a
determinadas experiências educacionais, em que alguns de seus membros não
haviam concluído os ciclos obrigatórios do ensino. (...) O idoso necessita de um
tempo maior e de estímulos motivadores adequados para uma efetiva
aprendizagem.”
A educação de idosos está contida na legislação de ensino na denominada Educação
de Jovens e Adultos – EJA. Seu diferencial resulta, apenas, da comunicação estabelecida na
convivência entre seus pares, com uma comunicação aberta, participativa e estimulada à
oralidade. O imaginário, os sentimentos, as experiências de vida, as emoções, os testemunhos
são encarados e incentivados como veículos de transmissão e produção cultural.

De acordo com autores por vezes citados, transcritos e somados, à experiência da


pesquisadora como professora da Educação de Jovens e Adultos – EJA, afirma-se que ao
encontrarmos idosos menos aptos que os jovens, isto nem sempre se deve a sua maior idade e
sim, acontece, como resultado ou reflexo da carência de oportunidade dispensada a ele pela
sociedade, na sua formação e continuidade, na época regular de educação. Lembremo-nos de
que a aprendizagem é um processo contínuo, seriado e gradual.

A aprendizagem no idoso pode apresentar-se – conforme observação em cursos de


EJA - de forma, por vezes, com rendimento menor. O professor/interlocutor precisa, então, ter
serenidade no acompanhamento do aluno, porque esta morosidade exige que os conceitos,
atitudes, hábitos e destrezas a aprender sejam apresentados e discutidos com os alunos –
idosos e que estes sejam convidados a participar nos exercícios propostos, significando isso o
pertencimento desejável. Como dito acima, “o idoso necessita de um tempo maior e de
estímulos motivadores adequados para uma efetiva aprendizagem.” O que não significa ser
um processo repetitivo, mecânico e sem reflexão, ao contrário, será prestigiado o valor
significativo para aquele aluno, caso contrário, como em todo o processo ensino-
aprendizagem, ele não se sentirá motivado a resolver a tarefa proposta. O idoso não se propõe
a realizar uma tarefa só para atender a solicitação do professor, para receber uma nota
aritmética; o que se constata na prática (EJA) é que ele quer realizá-la com capricho, da
melhor maneira possível, e, para isso, é necessário pensar, comparar, associar, refletir,
criar/responder e julgar sua atitude e progresso na atividade antes de apresentá-la ao
professor. Também acontece de o idoso voltar à educação para o convívio, como diz Pandora,
sujeito-autor do Protocolo Nº 18, “não vou para a escola para aprender (...) quero mais é
38

estar no meio do povo rindo, brincando, e me divertindo (...)11. O aluno idoso, no mais das
vezes, é um aluno zeloso e sua aprendizagem é facilitada pela associação com experiências
anteriores.

Para melhor conhecer tanto as experiências como os desejos atuais do grupo de


alunos-idosos, é que, nesta dissertação procurou-se desvendar a simbiose deste exterior
experiente com este desejo latente – “trajeto antropológico” – quer dizer, levantar-se o
imaginário.

Para que ocorra de fato a aprendizagem é importante o estabelecimento de diálogo,


considerando os contrários, de uma boa relação interpessoal, para melhor compreensão das
atitudes e do potencial de cada aluno idoso o que não difere do processo de educação, mas,
talvez, se acentue na educação dos adultos, no caso do adulto velho. Todos precisam fazer
parte do processo de aprendizagem – alunos, monitores e professores – na condição de
aprendizes, pois nesse ambiente rico de cultura e de experiências, ímpares e variadas, o
professor aprende com o aluno. O professor passa, então, a atuar como orientador, como
facilitador da aprendizagem e não como aquele que tudo sabe e que detém o conhecimento, e
o poder. É preciso ministrar os conteúdos/aulas com consideração, solidariedade, com a
presença do toque, demonstrando carinho e afeto, fazendo com que o aluno se sinta
importante para o grupo e para o professor/facilitador. Isto aumenta a auto-estima, a auto-
imagem dos idosos que se tornam mais criativos e produtivos.

É possível haver educação na velhice, pois pedagogia e educação não se limitam


apenas ao processo de escolarização, eles transcendem a esses muros. De acordo com Libâneo
(1998, p. 71),

“(...) a educação, para além de sua configuração como processo de


desenvolvimento individual ou de mera relação interpessoal, insere-se no conjunto
das relações sociais, econômicas, políticas, culturais que caracterizam uma
sociedade (...) Com base nesse entendimento a prática educativa é sempre a
expressão de uma determinada forma de organização das relações sociais na
sociedade”.
As relações sociais, interpessoais é o que consideramos na UnATI/UCB, nesta
dissertação.

Os conteúdos, os conceitos, as aulas não precisam ser, aplicados dentro das salas de
aula ou limitar-se aos muros da escola; podem ser ministrados em outros locais ou pela mídia,
pois o espaço escolar não se constitui no único reduto de formação. É o que vem acontecendo

11
Ver Capítulo 7, p. 197.
39

no desenvolvimento das atividades extra-classe nas UnATI’s. A formação aqui assumida, na


sua amplitude, pode se dar pela aprendizagem não-formal ou informal, conceitos que aqui não
serão explicitados, mas que são formas de educação que estarão presentes nas UNATI’s.

Com Brandão (apud LIBÂNEO, 1998, p. 18) assumimos que:

“(...) ninguém escapa da educação. Em casa, na rua, na igreja ou na escola,


de um modo ou de muitos, todos nós envolvemos pedaços da vida com ela: para
aprender, para ensinar, para aprender-e-ensinar. Para saber, para fazer, para ser
ou para conviver, todos os dias misturamos a vida com a educação. (...) Não há
uma forma única nem um único modelo de educação; a escola não é o único lugar
em que ela acontece e talvez nem seja o melhor; o ensino escolar não é a única
prática, e o professor profissional não é seu único praticante.”
Convém, então, assumirmos as diversas formas em que esta educação poderá se dar,
como nas UnATI’s onde encontramos a presença de processos não formais. Aqui, “o
pedagógico perpassa toda a sociedade, extrapolando o âmbito escolar formal, abrangendo
esferas mais amplas da educação (...). (LIBÂNEO, 1998, p. 20).

Aliados à concepção da educação, tanto de trajetória de vida quanto de educação


não-formal e informal, estão os quatro pilares da educação; quatro aprendizagens
fundamentais, que serão para cada indivíduo, os pilares do conhecimento: “aprender a
conhecer, aprender a fazer, aprender a viver juntos, e aprender a ser” (DELORS, 2003,
p. 89-102). Tais pilares visam à construção do desenvolvimento humano de forma plena e
integral, durante toda a vida.

Com base na educação permanente e preocupadas com este novo segmento da


população – velhice -, surgem as Universidades Abertas a Terceira Idade – UNATI’s, que se
propõem a promover uma educação permanente por meio da formação e do desenvolvimento
cultural, proporcionando uma arte nova, responsável, consciente e própria de viver essa nova
idade, estudando e investigando os problemas sobre/com a velhice.

O cenário da educação nas UnATI’s passa a ser a revelação do comprometimento


com a sociedade, pois busca desfazer mitos consolidados pela sociedade e possibilitar atitude
democrática, com respeito à eqüidade e à participação de todos os indivíduos, como exercício
da cidadania. A educação nas UnATI’s passa a ser uma catapulta para o fortalecimento da
auto-estima e da integração dos idosos na sociedade, procurando transpor as limitações e os
preconceitos que foram impostos a essa faixa etária.

A idéia de que a educação é um processo constante e que a aprendizagem permeia


durante toda a vida, é resultado não só do seu desenvolvimento histórico, mas, também de
40

uma educação contínua que acolha as situações de mudança e em transformação e ainda


favoreça o crescimento do cidadão.

De acordo com Furter (apud RODRIGUES, N.C., 1993, p. 48) “o homem, por ser
inacabado tende à perfeição; a educação é, portanto, um processo contínuo que só se acaba
com a morte”. Os ditos populares concordam com o autor quando das expressões “vivendo e
aprendendo..., a gente aprende até a hora da morte ...; a gente morre aprendendo ....”.

Os profissionais da educação acreditam ser ela o mecanismo para a transformação da


sociedade e que sua importância se dá como processo ininterrupto, como fator existencial e
sóciocultural, da qual surge a consciência transformadora, crítica, participativa, que opera,
fundamentalmente, na busca da potencialidade do individuo.

Segundo Rita de Cássia Oliveira (1999, p. 239), dentro do enfoque de educação


permanente aliada à consciência da representação extensionista das universidades e do valor
considerado do papel da instituição, como intercessora do desenvolvimento de uma educação
contínua, articulando-se constantemente com a sociedade, buscaram-se a propagação de
conhecimentos e a conversão dos conteúdos em uma força viva capaz de elevar o nível
cultural geral da sociedade.

A partir deste cenário, muitas universidades vêm criando espaços para os idosos,
tendo a oportunidade de consolidar e expandir seu compromisso social, integrando aqueles
que se encontram à margem do processo de desenvolvimento na sociedade – os idosos – a um
novo aprendizado: o do viver a velhice e do envelhecer cidadão, que não caracterizam apenas
o envelhecimento bio-psico-socio-cultural, mas a dinâmica da própria aprendizagem.

Nas leis do processo recíproco do ensino-aprendizagem é fundamental o


conhecimento do sujeito do processo. Conhecer o sujeito velho que ensina e aprende é
imprescindível para que o processo e seus resultados apareçam, e se concretizem.

Quem é o velho que freqüenta as atividades práticas físicas ou não e as salas de aula
formais na busca de novos ou revisitados conhecimentos e descobertas adequadas as suas
capacidades de velho? O que querem aprender ou reaprender? O que precisam mudar ou
adequar a sua nova condição de aluno velho? “Querer ser e dever ser” – o conflito dialético
que impulsiona a ação equilibrada da simbiose dos desejos com as necessidades.

Para tal, o conhecimento do imaginário, neste trajeto, dito antropológico, por G.


Durand (2001, p. 41) é importante. Cada aluno velho porta/apresenta um micro-universo
mítico que evidencia a estrutura antropológica do seu imaginário, que pode ser heróica,
41

quando se decide a lutar para aprender e vencer; pode ser mística, quando se aconchegar na
paz, sem enfrentamento do “monstro”, dos perigos e percalços que surgem na trajetória da
vida; ou ainda sintética quando apaziguador que contrabalança momentos e ações de não
aceitação do pré-estabelecido com atitude de aceitação. As imagens relacionadas entre si, as
constelações de imagens, evidenciam uma maneira de ver, ou carregar o mundo. São estas
imagens, ou melhor, enxames de imagens que nesta pesquisa procuramos desvelar; retiramos
o véu e a mítica – os micro-universos míticos e o universo mítico - emergiu nos protocolos do
teste AT-9 – analisados e registrados no capítulo 6 desta dissertação -, nas falas, silêncios,
emoções, postura e trejeitos do grupo.

Excluído:

Capítulo 3 – As Universidades Abertas à Terceira Idade

“A velhice faz surgir em nós um imenso


sentimento de paz e libertação.”
Platão

Universidade Aberta à Terceira Idade corresponde

“a um curso de extensão universitária, para atualização cultural, educação


continuada, atividades acadêmicas, sócio-políticas, organizativas e ação
comunitária, voltada para um segmento específico da população local e regional de
meia idade e terceira Idade.” (CNBB, 2002, p. 90)
Na educação continuada, a velhice estereotipada dá a vez ao envelhecimento
saudável, ativo, como alternativa que seduz o idoso a reivindicar seu reconhecimento social.
Pode ocorrer em diversos espaços: Grupos de Convivência, Escolas Abertas da Terceira Idade
e em diferentes Projetos Extensionistas de Faculdades e Universidades voltados para a
terceira idade. Cada um deles oferece programas distintos quanto aos seus interesses,
objetivos, propostas e atividades, mas todos têm um só alvo: velhice bem sucedida!

As Universidades Aberta à Terceira Idade - UNATI’s, foco de interesse deste


capítulo, podem oferecer programas ou atividades dirigidas aos idosos ou a pessoas que estão
numa fase pré-terceira idade (50 aos 60 anos) numa atitude preventiva, preparando as pessoas
para o envelhecimento saudável, objetivando, além de uma valorização do indivíduo na
velhice, maior conscientização da sociedade, em geral, a respeito do processo de
envelhecimento da população no país e ampliação das redes sociais, para subsidiar políticas
públicas nessa área.
42

As atividades, nas UnATI’s, relacionadas ao lazer e ao conhecimento são planejadas


e organizadas com a proposta de atingirem objetivos como valorizar experiências de vida e
profissional, especialmente dos aposentados e donas de casa; e possibilitar a atualização
cultural nos aspectos filosóficos, históricos, políticos, econômicos, bio-sócio-psicológicos e
gerontológicos, partindo de conhecimentos específicos sobre as peculiaridades desse grupo,
garantidas pelo seu próprio desenvolvimento e experiências obtidas ao longo de suas vidas,
que lhes atribuem independência para decidir quando, como e o que querem aprender,
tornando o idoso sujeito do seu próprio processo educativo.

Como afirma Salgado (1996, p. 65):

“A questão social dos velhos não pode continuar sendo secundarizada, nem
sendo objeto de políticas tímidas e soluções menores. A existência plena não é
propriedade dos jovens, é um direito de todos os que estão vivos. Os velhos têm
algumas décadas a mais de cidadania do que os jovens. Se isso não lhes confere a
precedência, lhes dá, pelo menos, o direito de lutar por uma melhor qualidade de
vida.”
Com a entrada do idoso no âmbito da universidade, a integração entre gerações
- intergeracionalidade - ocorre, essencialmente, provocando debates, colocando na berlinda
preconceitos e discriminações aceitos pela sociedade e que na verdade se mantém sem
nenhuma sustentação científica. Desta forma, precisam ser rompidos os muros da
universidade, diminuída a distância que existe em relação à sociedade, oportunizando
conhecimentos atraentes e interessantes aos idosos, desenvolvendo um trabalho multi e
interdisciplinar.

É importante priorizar o processo de valorização humana e social da terceira idade,


analisando constantemente a problemática do idoso nos seus diversos aspectos, apontando
novos caminhos – a construir ou a re-construir - proporcionando melhor qualidade de vida e
possibilidades para o exercício da cidadania.

Para participar dos programas oferecidos pelas UNATI’s não é necessário que o idoso
interessado seja graduando, graduado ou ter formação profissional específica. A UNATI deve
ser, um espaço que ampare aos idosos, independente de nível sócio-econômico e grau de
instrução, oferecendo palestras, oficinas, terapias ocupacionais, alfabetização para idosos,
teatro, atividades físicas, lazer, entre outras. É importante que as UnATI’s sejam um espaço
de conversação entre diferentes vozes que se identificam e se unem para a edificação de
ambiente de atuação, sem, no entanto, cada um deixar de ser ele mesmo, conservando, assim,
sua maneira de pensar, seus saberes, e suas experiências de vida. É a mistura de diferentes
idades e de diferentes níveis de escolarização que faz surgir a riqueza dos programas. As
43

UNATI’s surgem como espaço de orientação, de abertura, de criticidade, onde o idoso tem a
oportunidade de não apenas adquirir conhecimentos científicos, culturais, mas de construir
seu aprendizado através de suas experiências, de sua história de vida reconhecendo-se como
cidadão consciente de suas responsabilidades e direitos, tendo a manutenção ou elevação de
sua auto-imagem, considerando-se produtivo, útil, capaz de muito, ainda, colaborar para a
sociedade a qual pertence. Nesta missão, pode iniciar-se a transformação progressiva do lugar
social do idoso, esboçando a possibilidade de reconhecimento do velho como sujeito psíquico
existente e como agente social. Assim o idoso terá a oportunidade de se redescobrir, de Ser -
na verdadeira concepção existencial -, talvez como jamais tenha tido a oportunidade de ter
sido.

3.1. – O surgimento das primeiras Universidades Aberta à Terceira Idade no


Mundo

“O homem atual (...) surge cada vez mais como um ser inacabado. O
inacabamento da formação tornou-se necessidade num mundo marcado pela
subversão permanente das técnicas, o que implica uma educação do mesmo modo
permanente. (...) Nenhum ser humano se humaniza sozinho. Sempre precisa de
outro, aquele que testemunha seu inacabamento. Por isso humanizar o humano é
tarefa que tem um norte, mas não tem fim.” (LAPASSADE apud OLIVEIRA, P.S.,
1996, p. 8-9).
Baseado em pesquisadores do assunto, notadamente Cachioni (2003), Liberato
(1996) e Lahud Loureiro (1993) que citamos e transcrevemos de forma pontual, apresentamos
a seguir, os registros importantes para o desenvolvimento desta Dissertação.

Segundo Cachioni (2003, p. 47), as Universidades Abertas à Terceira Idade –


UNATI’s tiveram origem nas Universidades do Tempo Livre, criadas na França, na década de
60, com o desígnio de “ocupar o tempo livre dos aposentados e favorecer as relações sociais
entre eles".

Somente em 1973, ainda na França, na cidade de Toulouse, houve a primeira


iniciativa de se criar um espaço acadêmico exclusivamente voltado para os idosos e
conseqüentemente para tratar sobre assuntos relacionados ao fenômeno da velhice e do
processo de envelhecimento. O fundador desta iniciativa, de alto valor social, foi o Professor
Pierre Vellas, especialista na área de Direito Internacional.

O Professor Pierre Vellas debruçou-se sobre a teoria, pesquisando diversos temas na


área do envelhecimento, desde programas e conteúdos de cursos, à políticas e organizações
44

internacionais da Europa e América do Norte. Após angariar a base teórica, e até criar novas
teorias, lançou-se à pesquisa de campo, visitando “hospícios, alojamentos e pensões de
aposentados” (ibidem, p. 48) e constatou duas (02) pressuposições: 1ª - o que faltava aos
idosos eram oportunidades, e 2ª - “muitos processos patológicos tinham como origem o
problema da exclusão social” (idem). Vellas fez a “proposição de que a universidade deveria
abrir-se a todos os idosos, indistintamente, para oferecer-lhes programas intelectuais,
artísticos, de lazer e de atividade física para idosos” (idem).

As atividades oferecidas para os idosos, independente de escolarização e nível sócio-


econômico, eram episódicas e abrangiam diversos segmentos do esporte, lazer, cultura e
saúde, bem como atividades de cunho cognitivo levando à debates e reflexões. Somente a
partir de 1974, criou-se um “programa regular com cursos que duravam o ano inteiro”.
(idem).

A idéia foi louvada por diversas instituições de ensino da França. Algumas


instituições simplesmente repetiram o programa; mas, outras fizeram algumas modificações -
sem perder o foco de auxiliar e valorizar os idosos - exclusivamente com o objetivo de criar
um diferencial. A Universidade de Nantèrre possibilitou a oportunidade de pessoas idosas
com apenas o curso primário (quatro primeiros anos do ensino fundamental) freqüentarem
disciplinas junto com alunos de cursos superiores. “Indivíduos com idade e formação
acadêmica diversas relacionavam-se sem qualquer obstáculo”, o que, proporcionava às
pessoas mais segurança para debater e “trocar idéias com a geração anterior. Esse contato
levou à valorização dos idosos pelos jovens”, segundo Attias-Donfut (apud CACHIONI
2003, p. 49).

Com a expansão do programa, devido à expressiva procura por parte dos idosos, e
com interesse de outras IES francesas de, do mesmo modo, direcionar-se para atividades
voltadas para o idoso, as Universidades da Terceira Idade - UTI passaram a dedicar-se,
também, às pesquisas na área gerontológica. Neste novo contexto, tais pesquisas ganharam
sustentáculo institucional e descobriram, nesse ambiente excepcional, um espantoso campo de
investigação, cooperando para a promoção dos níveis de vida e saúde de seus estudantes
idosos, assim como para todos os idosos daquele país e do mundo.

Em 1975, o programa Universidade da Terceira Idade – UTI, entendido em toda a


França, ultrapassa as fronteiras do país e, a partir de então, outros países se interessam pela
idéia, que inédita, mostra um novo prisma às suas sociedades.
45

Os diferenciais apresentados pelos programas da terceira idade, contribuiriam para a


ampliação dos mesmos e foram fundamentados nos segmentos de autonomia, participação e
integração, o que proporcionou riquezas como a criação de “pesquisas feitas para, com e
pelos estudantes idosos” (CACHIONI, p. 49). Pesquisa e atividades foram elaboradas visando
melhor qualidade de vida na terceira idade – para o idoso -, o desenvolvimento da capacidade
motora, cognitiva, da memória, da criatividade, do desenvolvimento dos conhecimentos - com
os idosos – e o despertar para a reflexão, a criticidade e o exercício da cidadania – pelos
idosos -.

Cronologicamente citaremos, ainda com Cachioni (ibidem, p. 49-50) acrescido com


Liberato (1996, p. 14) e Lahud Loureiro (1993, p. 495), algumas Instituições de Ensino
Superior, de vários países, que implantaram o Programa das Universidades para a Terceira
Idade.

Em 1975 a Polônia inaugurou a Universidade da Terceira Idade de Varsóvia e a


Suíça, cidade de Genebra, a Fondation de L’Université Du 3ª Âge – Uni³. Em 1976 no Japão,
cidade de Osaka, surge a primeira Universidade voltada para os assuntos do envelhecimento;
posteriormente, o Instituto Japonês de Investigação Gerontológica, patrocina, em outras
cidades daquele país, outras universidades com o mesmo enfoque. Em 1977 na Áustria, a
Associação Austríaca de Cursos Universitários organizou cursos na área gerontológica nas
Universidades de Viena, Gratz e Salsburg. Em 1979, a Inglaterra criou a Universidade de
Londres e Israel as Universidades de Bar-Ilan e Tel-Aviv; Jerusalém implantou cursos para
idosos na Hebram University de Jerusalém; a ex-União Soviética inaugurou as Universidades
de Saúde e de longevidade; e a Alemanha criou um curso especial para aposentados, sob o
patrocínio do Ministério Federal de Educação e Cultura na Universidade de Hamburgo e, em
Berlim, foi iniciado o curso Voluntários em Investigação Gerontológica, na Universidade
Livre de Berlim. Em 1987, a Universidade de Zurick - Suíça criou a Universidade para
Idosos. A partir destas datas outros países seguiram os mesmos passos, criando suas
Universidades Abertas para a Terceira Idade.

Somente no início da década de 80, chega à América Latina, especificamente no


Uruguai, o Programa Universidade da Terceira Idade. Depois do Uruguai as Universidades da
Terceira Idade estenderam-se por outros países da América Latina como: Argentina, Chile,
México e Brasil (CACHIONI, 2003, p. 50).

Lahud Loureiro, orientadora desta dissertação, teve a oportunidade de, em seu


programa de doutorado, estagiar na Universidade para idosos UNI ³, em Genebra - Suíça e
46

constatou que esta seguiu o mesmo da traçado primeira Universidade Aberta da Terceira
Idade, em Toulouse. Segundo Lahud Loureiro (1993, p. 495), a referida instituição atendia
uma elite de idosos sadios, genebrenses ou não. Seu planejamento incluía atividades como
excursões, grupos e comissões temáticas, cursos universitários e conferências realizadas em
diversas áreas do saber realizadas nos anfiteatros da universidade (ibidem, p. 496-497).

O jornal suiço “Avenirs” ao fazer uma reportagem sobre uma conferência que tinha
como público alvo a terceira idade, cria a seguinte manchete: “Os avós se desenrugam nos
anfiteatros” (apud LAHUD LOUREIRO, 1993, p. 502) e descreve:

“(...) o auditório está atento. Alguns tomam notas, outros escutam (...) Na
aparência nada mais que o banal (...) mas estes estudantes não são como os outros.
Seus rostos testemunham uma vida já bem vivida (gasta). Eles não estão lá para
receber diploma, nem assegurar um futuro profissional. Eles vêm pelo prazer de
aprender. Porque a formação hoje é uma viagem tão longa como a vida (...).”
(idem).
Com a difusão das Universidades da Terceira Idade na França e no mundo, na década
de 70, foi criada, a Associação Internacional das Universidades da Terceira Idade
(L’Association Internaionale des Universités du 3ª Âge – AIUTA), composta por 14 países
(LAHUD LOUREIRO, 1993, p. 496) e, segundo Veras e Caldas (2004, p. 40) em 1980 já
havia sido organizada a União Francesa de Universidades da Terceira Idade. A atuação das
universidades reunidas tinha o objetivo de prezar pela qualidade de vida dos idosos, contribuir
para a continuidade de sua formação, buscar novas pesquisas sobre o tema e prestar serviço à
comunidade. Quase 3 (três) décadas depois esta atuação ainda continua nas UnATI’s,
especialmente, podemos atestar na UnATI/UCB.

A matriz Universidade Aberta de Toulouse, criado por Pierre Vellas, referencial para
todas as instituições voltadas para a terceira idade, foi desdobrada em 2 (dois) grandes
modelos: o modelo francês – original - e o modelo inglês. O modelo francês tem como base
“o sistema tradicional universitário” (CACHIONI, 2003, p. 51). No modelo inglês os
“freqüentadores podem atuar tanto como professores quanto como alunos” e baseia-se no
“ideal de auto-ajuda e na idéia de que a experiência de vida confere aos idosos um cabedal
de conhecimentos que deve ser compartilhado” (idem). Com o passar do tempo ocorreu em
alguns países a junção dos dois modelos – francês e inglês-. No Brasil a predominância é do
modelo francês.

Os programas voltados à terceira idade em universidades, embora com


nomenclaturas diferentes, congregavam o mesmo ideal: 1. promoção da saúde e bem estar; 2.
longevidade; 3. qualidade de vida; 4. participação, autonomia e cidadania; 5. oferta de
47

oportunidades educacionais e culturais; 6. desenvolvimento pessoal e coletivo; e 7. inserção


ou re-inserção social dos idosos.

Excluído: ¶

Excluído: 1
3.2. - As Universidades Aberta à Terceira Idade no Brasil

“(...) a debilidade da infância, a audácia da juventude, a responsabilidade da


vida adulta e a maturidade da velhice. Cada etapa evolui por si só e deve respeitar
Excluído: mundo
seu tempo.” (OLIVEIRA, R.C.S., 1999, p. 80)
No Brasil, antes de passar pelas Instituições de Ensino Superior, este tipo de
educação continuada surgiu com o trabalho social voltado para os idosos, desenvolvido pelo
Serviço Social do Comércio – SESC. Segundo Cachioni (2003, p. 52), na década de 60, o
SESC fundou os primeiros Grupos de Convivência de Idosos. E, em 1977, o SESC de
Campinas-SP, fundou a primeira Escola Aberta da Terceira Idade, nos moldes da
Universidade Aberta da Terceira Idade, existente na França. A Legião Brasileira de
Assistência – LBA, extinta em 1995, a exemplo do SESC, também desenvolveu programas
voltados para a terceira idade oferecendo atividades físicas, artísticas e sócioculturais.

As experiências bem sucedidas não tardaram a chegar às universidades e os projetos


e programas, baseados em modelos das escolas européias, foram implantados em diversas
universidades brasileiras públicas e privadas, por intermédio do segmento da Extensão
Universitária. Procuramos, a seguir, enumerar, cronologicamente, algumas Instituições de
Ensino superior - IES brasileiras que implantaram seus programas voltados para a terceira
idade.

Em 1982 – A Universidade Federal de Santa Catarina fundou o Núcleo de Estudos da


Terceira Idade – NETI, visando assessorar entidades na organização de programas para
idosos, para ampliar o conhecimento da questão social da velhice e manter cursos para a
formação de técnicos na área gerontológica. Em 1990, criou o curso “Monitores da Ação
Gerontológica” que prepara idosos para ação junto à comunidade. (LIBERATO, 1996,
p. 14-15).

Em 1984 – A Universidade Federal de Santa Maria, por meio do seu Centro de


Educação Física, criou o Projeto Grafti – Grupo de Atividades Físicas para a Terceira Idade,
com vistas a reunião de idosos, em grupos, para a prática das atividades físicas, condizentes
com a idade de cada um, no intuito de promover a melhor da condição física e a promoção da
48

saúde do idoso. E, em 1994, o projeto foi ampliado e originou o Núcleo Integrado de Estudos
e Apoio à Terceira Idade – NIEATI. (CACHIONI, 2003, p. 53).

Ainda no início da década de 80, a Universidade de Passo Fundo no Estado do Rio


Grande do Sul, criou a Faculdade da Terceira Idade. (LIBERATO, 1996, p. 15).

Em 1988 – a Universidade Estadual do Ceará cria Universidade sem Fronteiras,


gerando uma série de atividades de extensão com grupos de idosos em bairros, núcleos de
estudos, cursos e seminários na área gerontológica. (CAVALCANTE, apud CACHIONI,
2003, p. 53). Também em 1998, a Universidade Estadual do Rio Grande do Norte, começa as
suas atividades voltadas para a terceira idade. (LIBERATO, 1996, p. 15).

No final da década de 80, a Universidade Estadual do Rio de Janeiro cria um grupo


interdisciplinar: o Núcleo de Assistência ao Idoso – NAI, composto por profissionais
interessados nas questões da terceira idade. Tal núcleo, posteriormente, originou a
Universidade Aberta da Terceira Idade/UERJ. (VERAS e CAMARGO JR., apud
CACHIONI, 2003, p. 53).

Em 1990, a Universidade Católica de Pelotas – RS, formou o Centro de Extensão em


Atenção à Terceira Idade – CETRES, com a finalidade de “refletir sobre o comportamento
dos idosos na sociedade, orientar, elaborar e coordenar ações de promoção à terceira
idade”. (CACHIONI, 2003, p.53). Nesse mesmo ano, a Pontifícia Universidade Católica de
Campinas iniciou as atividades da sua Universidade da Terceira Idade, com conferências,
palestras, grupos de estudos e aulas práticas. (LIBERATO, 1996, p. 15).

Em 1991 – a Universidade Federal de Juiz de Fora - MG, e a Universidade Católica


de Santos - SP, começaram suas atividades com a terceira idade. A Universidade do Vale do
Paraíba, em São José dos Campos/SP, para implantar sua Faculdade da Terceira Idade,
realizou, no mesmo ano (1991), em junho, o Encontro Nacional das Universidades da
Terceira Idade e só após este encontro colocou sua Universidade. (LIBERATO, 1996, p. 15).

A partir de 1991, devido ao aumento da expectativa de vida em nosso país e a


necessidade de desenvolvimento de uma nova política social, rapidamente, as Instituições de
Ensino Superior, voltaram os olhos para a área gerontológica e incorporaram no segmento da
extensão universitária projetos e programas com atividades desenvolvidas para idosos. Entre
1990 e 1999 cresceram para cerca de 140 os programas voltados para a terceira idade,
localizados em 18 estados brasileiros (MARTINS DE SÁ apud CACHIONI, 2003, p. 53).
49

Antes desta proliferação de programas desenvolvidos para a terceira idade nas


universidades, havia uma grande preocupação com os idosos sim, mas na área geriátrica, com
atitudes curativas e não gerontológica, visando a uma melhor qualidade de vida, numa atitude
preventiva.

Brasília – Distrito Federal -, quando ainda uma capital nova, mas tendo já certo
contingente de pessoas aposentadas na idade madura12 - 45/50 anos – também sentiu a
necessidade de adequar-se a essa nova proposta extensionista que acontecia no Mundo e no
Brasil. Em 1993, a Universidade de Brasília - UnB já havia implantado o Núcleo de Estudos e
Pesquisa de Terceira Idade – NEPTI (LAHUD LOUREIRO, 1993, p. 504). E, em 1995, a
Universidade Católica de Brasília – UCB iniciou suas atividades com um Grupo Interno de
Trabalho - GIT indicado para estudar e desenvolver atividades junto à terceira idade. Este
grupo foi o responsável por fecundar o embrião da Universidade Aberta à Terceira Idade da
Universidade Católica de Brasília – UnATI/UCB13. A partir das experiências dessas 2 (duas)
universidades, outras Instituições de Ensino Superior do Distrito Federal – Faculdades e
Centros Universitários – estão desenvolvendo seus programas gerontológicos.

Todas as instituições brasileiras que desenvolvem atividades para a terceira idade


criaram, assim como no mundo, seus programas com diversas denominações e diferentes
formas de organizações, buscando adequar-se aos seus princípios e projetar-se na comunidade
próxima e remota. Contudo, todas tinham como foco a população idosa e a pretensão de
diminuir ou mesmo eliminar “estereótipos e preconceitos com relação à velhice; promover a
auto-estima e o resgate da cidadania; incentivar a autonomia, a integração social (...) e uma
velhice bem-sucedida...” (CACHIONI, 2003, p. 53). Esses programas, mesmo que com nomes
diversos, doravante serão denominados UnATI’s visando facilitar a compreensão do leitor.

A sociedade brasileira não percebeu o envelhecimento de sua população dado ao


crescimento acelerado. Não se preparou para ficar e tão pouco para receber o velho, e muitos
mitos e preconceitos ainda circundam o fenômeno da velhice. Hoje temos, segundo Veras
(1994) “um país jovem de cabelos brancos”. Contudo, como vimos acima, várias Instituições
de Ensino Superior conseguiram perceber esse crescimento e através de seus programas para a
terceira idade, vêm desenvolvendo atividades diversas, tanto na área física quanto pedagógica

12
Na antiga legislação sobre aposentadoria, muitas pessoas se aposentavam com 45-50 anos, após contagem dos
anos trabalhados. Não trataremos aqui este tema por não ser objeto desta pesquisa.
13
O Grupo Interno de Trabalho – GIT designado para estudar e desenvolver atividades voltadas para a terceira
idade na UCB, está citado no histórico da UnATI/UCB, que será tratado, ainda neste capítulo, item 3.3 – A
UnATI da Universidade Católica de Brasília – UCB.
50

Excluído: um
e sócioculturais, proporcionando ao idoso espaço de debate, aprendizagem, convivência e
lazer, e vêm, também, preparando a sociedade para o seu próprio envelhecimento, com
dignidade e cidadania, pois não convém fechar os olhos e desprezar o idoso como ser
pensante, como cidadão.

Os Programas desenvolvidos pelas Universidades Aberta à Terceira Idade – UNATI’s


brasileiras, vêm procurando adequar e criar novos caminhos voltados para o envelhecer sadio
e digno, sobretudo na tomada de consciência da importância de participação do idoso na
sociedade, enquanto sujeito ativo; ganharam força e reconhecimento com o advento da
Campanha da Fraternidade para o ano de 2003 - “Fraternidade e pessoas idosas – vida,
dignidade e esperança”-, pois puderam acordar a sociedade adormecida e mostrar que todos,
independente de raça, cor, credo, grau de instrução e nível sócio-econômico, podem se
preparar para ter uma velhice saudável e bem-sucedida.
Formatados: Marcadores e
As UNATI’s brasileiras possuem como público alvo pessoas com mais de 50 anos, numeração

embora a legislação considere na 3ª idade pessoas acima de 60 anos, pois entende que é
preciso, também, preparar o cidadão para o seu envelhecimento.

Quanto aos objetivos traçados pelas organizações em pauta, após investigação


eletrônica efetuada pela pesquisadora na internet, em 2004, encontramos que eles podem
variar em virtude da origem e do caminho por elas trilhado, mas a maioria possui
vários objetivos comuns. Numa síntese relacional, advinda dos dados obtidos, anotamos:
1. possibilitar ao idoso aprofundar seus conhecimentos nas áreas de seu interesse através de
cursos, palestras, cantos, oficinas, encontros; 2. possibilitar ao idoso trocar experiências e/ou
informações com os mais jovens – intergeracionalidade -; 3. promover estudos, debates,
pesquisas sobre a população idosa; e 4. ampliar o papel social da Universidade. Como se pode
perceber os objetivos buscados pelas UnATI’s brasileiras não difere dos objetivos das
UnATI’s no mundo. Isto indica que há um imaginário subjacente a esta preocupação.

Quanto às atividades propostas, na mesma investigação, na Internet, encontramos que


algumas instituições apresentam uma ou outra atividade que lhe dá o diferencial, mas todas
demonstram a preocupação com a saúde física, mental e o bem estar geral do idoso. Dentre as
atividades oferecidas pelas UnATI’s, enumeradas pelas instituições, algumas, também, são
comuns a todas elas. Na continuidade da síntese relacional apresentamos algumas destas
Excluído: o
atividades: 1. atividades físicas esportivas como: natação, hidroginástica, tai-chi-chuan, ioga;
2. coral; 3. debates, fóruns, seminários, palestras; e 4. informática para iniciantes.
51

As atividades pedagógicas desenvolvidas nas UnATI’s seguem os princípios


pedagógicos de qualquer IES, porém é sempre considerada a visão gerontológica, que levam a
uma gerontogogia, como descrito anteriormente. Estas atividades são planejadas e executadas
com a finalidade de equilibrar e exercitar as funções cognitivas de cada um, tais como:
expressão verbal e não verbal, raciocínio lógico e abstrato, orientação visual e espacial,
estruturação, atenção, concentração, percepção e criatividade. As atividades são propostas em
grupo ou individualmente, evoluindo em graus de dificuldades progressivas e são utilizados
recursos audiovisuais, jogos educativos, material didático variado e outros.

As atividades corporais entre outros objetivos, visam melhorar a capacidade motora


dos idosos, a força muscular, flexibilidade, mobilidade articular e resistência, proporcionando
aos idosos a melhoria da saúde e qualidade de vida. Os exercícios são desenvolvidos de forma
atraente, diversificada e com intensidade moderada. Para que os idosos participem das
atividades físicas é necessário um acompanhamento médico.

Conforme os rápidos traços históricos apresentados sobre as UnATI’s no mundo e no


Brasil e pinceladas nas suas organizações, pensamos ter situado os leitores do futuro e
examinadores de hoje, desta dissertação, nas características mundiais e nacionais para
posteriormente apresentar a UnATI da UCB, objeto do nosso estudo que no tópico a seguir
vamos tratar.

Excluído: 2
3.3. – A UNATI da Universidade Católica de Brasília - UCB

(...) Envelhecer explodindo de vida, alimentando-se de prazer... viver,


gostar, amar, estar, ficar (...)
Nilza da Conceição – Discente UnATI/UCB

Conforme os depoimentos auscultados, os registros consultados e a experiência


rememorada desta pesquisadora, como funcionária desde 1988, vimos que as Faculdades
Integradas da Católica de Brasília – FICB, visando à transformação em Universidade,
percebeu a necessidade de ampliação de seus horizontes, entre eles o do segmento da
Extensão Universitária. Ampliou sua função extensionista e alterou, recompôs, criou e
investiu em novos projetos, voltando-se para a comunidade carente da cidade do Areal –
cidade que circunda a instituição. Fazemos um parêntese para aqui, amparados em Gilbert
Durand (2001), para perceber que esta atitude demonstrou que o grupo de dirigentes da
52

instituição, na época, tinha a presença “diurna” das imagens que encaminha a identificação de
uma “estrutura heróica”.

Dentre os projetos da Extensão Universitária, ganhou relevância o Programa de


Alfabetização de Adultos - PAA, criado em julho de 1993, cuja administração ficava na sede
da instituição, mas que ministrava aulas em vários locais, como nos canteiros de obras,
cemitério e presídio; onde houvesse um grupo de pessoas querendo ser alfabetizado o
programa destinava um supervisor e monitores para ministrar aulas. O Programa de
Alfabetização de Adultos ganhou vários prêmios educacionais dado ao reconhecimento da
sociedade à sua contribuição para o Distrito Federal e cidades do entorno.

Diante do fato dos dirigentes do Programa de Alfabetização de Adultos, perceberem


a quantidade crescente de pessoas idosas que procuravam o programa; da percepção do
envelhecimento populacional; do fato de existirem, na região, pessoas que se aposentavam
com 45/50 anos; e já tendo conquistado o status de Universidade - em 28 de dezembro de
1994, pela Portaria Ministerial Nº 1.827 -, a Universidade Católica de Brasília – UCB,
visando um diferencial extensionista no Distrito Federal, dá início à idealização de um projeto
voltado para a terceira idade. Considerando com Gilbert Durand (2001), ao buscar tal
diferencial, a Universidade Católica de Brasília – UCB deixava transparecer,
inconscientemente, o desejo de lutar contra o pré-estabelecido, o que demonstrou uma atitude
heróica.

Esta pesquisadora teve a oportunidade de, na época, como funcionárioa, perceber


(escuta) que a Instituição estava sensibilizada com a questão do envelhecimento populacional
e reconhecia que precisava investir numa política social que se voltasse para uma perspectiva
de curso de vida, desfizesse preconceitos e, consequentemente, mudasse paradigmas. A UCB
tinha a consciência que, para mudar paradigmas, deveria fazer um trabalho de base, atuando
na comunidade, oferecendo oportunidades de debater temas sobre a velhice, e de abrir as
portas da Universidade para o “velho”, despertando nele a idéia de que, mesmo com mais
idade que os demais alunos, é possível e necessário continuar a ser cidadão e a ser cidadão
crítico, com presença ativa e, principalmente, voz. Mostrar que independentemente de idade,
ainda é possível conjugar o verbo SER. É possível mostrar que o EU de cada um é diferente
dos demais, é ilimitável.

Conforme anotações nas agendas de atividades dos anos de 1995 e 1996 de uma das
fundadoras da UnATI/UCB, ao qual denominou Fragmentos de Memória: criação do
trabalho com a 3ª Idade na UCB - cedida gentilmente -, em 1995 é formada a primeira
53

equipe, composta de 3 professores, com a finalidade de criar um Grupo Interno de Trabalho –


GIT para desenvolver atividades com a terceira idade. Após várias reuniões, no dia 29 de
novembro de 1995, é instalado o Núcleo de Estudos e Prática sobre o Envelhecimento
Humano – NEPEH - embrião da atual UnATI/UCB -. Para a abertura das atividades com os
idosos foi exibido o filme “Conduzindo Miss Dayse” e oferecido um chá de confraternização.
O encontro contou com a presença de 80 idosos. Na avaliação do encontro ficou nítido, para o
grupo de professores do NEPEH, que era preciso um melhor preparo para atender aos idosos.
“O trabalho com idosos carece de fundamentação teórica ao tema a fim de que sejam
adotadas estratégicas e políticas que possam resultar em benefícios para os idosos e a
sociedade” (RODRIGUES, M. H. S., 2004). Em 1996, os trabalhos do NEPEH foram
intensificados, passando a ter reuniões mensais com os idosos e foi criado o Curso de
Contadores de Estórias.

Em decorrência do crescimento de suas atividades o Núcleo de Estudos e Prática


sobre o Envelhecimento Humano – NEPEH, em 27 de março de 1996, transforma-se em
programa e recebe nova nomenclatura: Núcleo de Vivência do Envelhecimento – NUVEN

O Programa Núcleo de Vivência do Envelhecimento – NUVEN, agora composto por


uma equipe de 9 (nove) professores, teve a finalidade atender a Terceira Idade com vários
projetos e ações, com caráter multiprofissional, inter e multidisciplinar, considerando os
determinantes biológicos, sociais, culturais, econômicos e ambientais da saúde, que deveria,
também, promover e apoiar a coesão da família e a solidariedade entre gerações.

Os relatos de professores que participaram da criação do NUVEN, afirmam que o


Programa possuía como objetivo geral “buscar possibilitar ao idoso uma melhor qualidade de
vida, através de ações que valorizam e incentivam a participação em seu meio social e
permitam resgatar o direito de exercer sua cidadania”. Os objetivos específicos eram vários,
entre eles citamos apenas alguns: “1. valorizar a pessoa idosa, incentivando-a nas suas
habilidades e potencialidades; 2. buscar a integração família-sociedade-idoso; e 3. difundir
informações necessárias à promoção da saúde, prevenção e recuperação de incapacidades.”

As propostas do Programa NUVEN e seu antecessor NEPEH antecipavam-se ao que


na época era discutido no “Plano de Ação Governamental Integrado para o Desenvolvimento
da Política Nacional do Idoso”, que buscava

“(...) contemplar estratégias em todos os setores, incluindo desde a concessão


de benefícios de prestação continuada, reformulação de currículos universitários,
readequação da rede de saúde e assistência social para o atendimento integral ao
idoso, criação de instrumentos que permitam a reinserção da população idosa na
54

vida sócio-econômica das comunidades, modernização das leis e regulamentos,


desenvolvimento do turismo e do lazer e formação em todos os níveis, que lidam
com idosos.” (UCB, 1998, p. 2-3)

Ainda pesquisando os registros do programa, escutando pessoas envolvidas no


projeto e rememorando os fatos, registra-se que mesmo diante de todos os esforços do grupo
gestor, na época, nem todas as propostas e ações puderam ser implementadas. Com isto, o
Programa NUVEN que pretendia que a sua criação colocasse a UCB numa “posição de
destaque nacional, tornando-a um pólo gerador de conhecimento científico, aliado à
prestação de assistência a comunidade (...)” (ibidem, p. 3), visando ao cumprimento de sua
Excluído: Durant
Visão de Futuro, não atingiu a sua meta. E, durante algum tempo, por questões internas da
Excluído: d
Instituição, como a falta de definição do trabalho social e filantrópico, o Programa diminuiu a
quantidade e a intensidade de suas atividades.

No ano de 1998, a equipe do Programa NUVEN estava reduzida a apenas 2 (dois)


professores. Mas, mesmo com esta redução, ainda se buscava o

“(...) oferecimento de ações em várias esferas: Educação, visando melhorar


sua capacidade para o auto cuidado e auxílio mútuo, advogar e liderar; Educação e
Formação, para profissionais da área de saúde, tais como fisioterapeutas,
nutricionistas, psicólogos e educadores físicos, gerontólogos e geriátras;
Treinamento, para a família e profissionais da rede de saúde; Saúde, baseado na
orientação quanto aos cuidados básicos de higiene e saúde, bem como através de
oferecimento de atividades curativas e ou reabilitadoras; Educação, para a
população no sentido de dissipar os mitos e esteriótipos.” (UCB, 1998, p. 1)
Formatados: Marcadores e
O Plano de Ação para o ano de 1999, traçado em 1998, também era ousado para a numeração

pequena equipe de trabalho. Para atender às propostas de ação, contidas na Proposta do


Programa de Extensão do Núcleo de Envelhecimento – NUVEN (minuta), pretendeu-se
desenvolver as seguintes estratégias específicas, do qual destacamos:

“1. Recrutar mecanismos para um imenso programa de comunicação para


sensibilizar, conscientizar e politizar o núcleo familiar e a sociedade quanto à
questão do envelhecimento; 2. Desenvolver programas na área da educação que
busquem a melhoria das condições dos idosos; 3. Oferecer cursos de Pós-
Graduação com parcerias nas áreas de geriatria e gerontologia; 4. Estimular e
articular a implantação da Universidade Aberta à Terceira Idade; e 5. Criar
programas e atividades de lazer, esportes e atividades físicas que propiciem a
melhoria da qualidade de vida do idoso e estimule sua participação na sociedade.”
(UCB, 1998, p. 3).

Algumas dessas estratégias não tiveram os resultados esperados em decorrência da


falta de incentivos destinados ao Programa. Contudo, no ano 2000, um novo olhar se voltou
para o Programa NUVEN que foi reorganizado. Suas metas foram revistas e seu nome foi
redefinido para FÊNIX – Projeto FÊNIX - numa alusão à lenda: “aquele que ressurgiu das
55

cinzas”14. E, realmente, o FÊNIX ressurgiu, pois ao redefinir os objetivos e metas do Núcleo de


Envelhecimento, ampliou e solidificou suas atividades, e passou a contar com uma equipe de
3 professores.

O Projeto FÊNIX foi, então, concebido como uma “proposta de educação


permanente, dirigida às pessoas idosas (...), interessada em reciclar e atualizar seus
conhecimentos e que desejam o desenvolvimento integral, a relação afetiva com os outros,
com o mundo e com Deus”. (UCB, 2001, p. 1)
Formatados: Marcadores e
De acordo com a Proposta de Planejamento do Projeto FÊNIX para o ano de 2002, numeração

foram 02 (dois) os objetivos traçados mais relevantes:

“1. possibilitar às pessoas idosas o acesso a Universidade, na perspectiva de


educação continuada, através de atividades de natureza educativa, sociocultural, de
lazer, organizativa e de educação comunitária, visando a Implantação da
Universidade Aberta à Terceira Idade; e 2. desenvolver atividades sistematizadas
que visem à intercomunicação social entre o Programa de Ação Comunitária e os
diferentes setores da Universidade, integrando ensino, pesquisa e extensão.” (UCB,
2001, p. 2).
Foram traçadas, também, ações e metas para atingir os objetivos acima. Porém,
algumas puderam ser atingidas, outras, foram adiadas, como por exemplo, a implantação do
Programa de Pós-Graduação Strito-Sensu em Gerontologia, que só veio a acontecer em março
de 2003 e o Curso Seqüencial de Cuidadores de Idosos, que até a presente data ainda não foi
implantado.

O projeto FÊNIX, inteiramente gratuito, exigia apenas que, para engajar-se nele, o
idoso deveria comprovar ser carente. Suas atividades eram oferecidas em duas (02) áreas:
modalidades físicas e oficinas pedagógicas.

Nas modalidades físicas o projeto ofertava diversas atividades, do qual destacamos:


capoterapia, dança, ginástica localizada, hidroginástica, musculação, natação, tai-chi-chuan,
ioga, dentre outras. Para participar de qualquer uma das modalidades físicas oferecidas, era
necessário apresentar, além da comprovação de carência, um atestado médico liberando o
idoso para a prática das atividades.

No que tange às atividades pedagógicas, o Projeto FÊNIX oferecia oficinas - de


informática e inglês em dois (02) níveis: iniciantes e continuação, sexualidade, saúde mental -

14
Na mitologia antiga, a Fênix habitava os desertos da Arábia e vivia muitos séculos. Era do tamanho de uma
águia, tinha na cabeça uma crista brilhante, as penas do pescoço eram douradas e as outras, de cor púrpura, a
cauda era branca com plumas encarnadas e os olhos brilhantes como estrelas. Diz-se que, quando sentia
aproximar seu fim, fazia um ninho com ramos untados de gomas odoríferas, expunha-o aos raios do Sol, nele se
abrasando. Das suas cinzas nascia um verme, ou um ovo, segundo outras versões, do qual nascia uma nova
Fênix.
56

cursos, palestras, workshop e o coral de vozes dos idosos da UCB. O oferecimento das
oficinas dependia de haver quorum de idosos para formação de turmas e da disponibilidade de
monitores ou voluntários.

As atividades que já estavam sendo propostas pelo projeto Fênix, não foram
suficientes para satisfazê-lo em seu desejo de trazer o idoso à Universidade. Era preciso mais!
Era preciso não só a Extensão lutando pelo idoso, mas, também, a Pesquisa e o Ensino
deveriam dar as mãos nesta empreitada.

O projeto já estava bastante divulgado na comunidade interna e externa da UCB, mas


era preciso atravessar as fronteiras da Extensão. O projeto sentia a necessidade de implantar
não apenas um espaço com o idoso para se reunir com outros idosos na Universidade. Era
necessária a troca de experiências entre velhos e jovens, defrontar duas (02) gerações, não
num conflito, mas proporcionando uma intergeracionalidade benéfica. O jovem aprendendo
com o velho e o velho aprendendo com o jovem, na reciprocidade e troca de experiências. O
velho aprendendo a ser novamente, talvez como nunca tenha tido a oportunidade de ser antes.
Entenda-se ser na verdadeira concepção da palavra, como sujeito, indivíduo, único, integral.

Enquanto isso, num espaço de tempo próximo, numa outra esfera da Universidade,
no segmento ensino, o Conselho de Ensino Pesquisa e Extensão - Consepe, no 2º semestre de
2001, havia feito uma revisão em sua legislação intena e a Pró-Reitoria de Graduação – PRG
implantou, oficialmente, a matrícula em disciplinas isoladas com base no Artigo 50 da Lei de
Diretrizes e Bases - Lei 9.394/96, que diz: “As instituições de educação superior, quando da
ocorrência de vagas, abrirão matrícula nas disciplinas de seus cursos a alunos não regulares
que demonstrem capacidade de cursá-las com proveito, mediante processo seletivo prévio.”

O candidato a disciplinas isoladas não possui um vínculo com o curso. Sua matrícula
está condicionada à existência de vagas ociosas nas disciplinas dos diversos cursos. Esta
medida - vaga em disciplinas isoladas - de alto alcance social e cultural só foi possível ser
implantada na UCB, em virtude do seu sistema acadêmico de matrícula/grades curriculares
ser organizado por crédito - com exceção do Curso de Medicina.

Para cursar a disciplina nessa modalidade, o candidato não precisa ter concluído uma
graduação, o pré-requisito estabelecido é que o requerente tenha comprovante que algum dia
ingressou num curso superior, em qualquer Instituição de Ensino Superior – IES, credenciada
pelo Ministério da Educação e Cultura – MEC e faça uma justificativa para a solicitação.
Todas as solicitações para cursar disciplinas nessa modalidade são analisadas e classificadas
57

conforme normas específicas baixadas pelo Conselho de Ensino Pesquisa e Extensão –


Consepe da UCB. O candidato classificado e matriculado, ao término da disciplina, recebe
uma declaração informando a freqüência e nota obtida na disciplina, bem como o número de
créditos, carga horária, e o conteúdo programático da(s) disciplina(s) cursada(s) com
aprovação. Não é permitido ao aluno cursar mais de três (03) disciplinas.

O projeto FÊNIX, tendo constatado que várias IES ao implantarem suas UNATI’S,
dedicaram-se apenas às oficinas, palestras, seminários, reuniões para troca de experiências,
pretendeu em seu programa, colocar um diferencial. No segundo semestre de 2001
apoiando-se na rotina de matrícula em disciplinas isoladas, já estabelecida nos cursos de
graduação, como dito anteriormente, e com o forte desejo de inserir pessoas da terceira idade
na comunidade acadêmica, num ambiente de graduação, faz um projeto incentivando o idoso
a cursar disciplinas isoladas, respeitando os quesitos exigidos pela legislação interna da UCB,
mas acima de tudo, promovendo o relacionamento intergeracional, nas salas de aulas, nas
atividades acadêmicas. Com este ato, a UCB cria o que ela denomina Universidade Aberta à
Terceira Idade: UNATI/UCB.

Os principais objetivos traçados para a UNATI, foram:

“1. manter atividades interdisciplinares de ensino, pesquisa e extensão; 2.


possibilitar o acesso à educação continuada a pessoas com idade igual ou acima de
50 anos; 3. estimular maior envolvimento e participação do idoso na sociedade,
prestigiando sua contribuição efetiva à comunidade; 4. promover estudos teórico-
práticos, pesquisas e momentos de vivências que permitirão ao idoso o
enriquecimento de suas habilidades e valorização da vida; e 5. resgatar a
identidade do idoso enquanto cidadão, estimulando na expressão e reflexão do seu
cotidiano, como instrumento de auto realização e reinserção social.” (UCB, 2001,
p. 7).
O projeto FÊNIX, na época, percebia a UNATI apenas como um projeto menor onde o
aluno cursava disciplinas num curso de graduação, no caso, disciplinas isoladas. A UNATI
estava hierarquicamente submissa ao projeto FÊNIX.

Os alunos da UNATI eram contemplados com bolsas de estudos, as quais a UCB


denominava como “Bolsa Social” devido aos diversos tipos de bolsa de estudos integrais ou
parciais disponibilizadas pela Instituição. E, como bolsa social de estudos, eram
contabilizados como filantropia para a Universidade Católica de Brasília – UCB.

O público alvo que freqüenta o projeto FÊNIX é heterogêneo no seu grau de instrução:
são pessoas carentes, analfabetas, alfabetizadas, com a conclusão apenas do ensino
fundamental ou do médio, com curso superior completo e alguns casos com especializações.
O que pode parecer um problema passa a ser a riqueza no caleidoscópio do grupo.
58

No ano de 2002, a Pró-Reitoria de Extensão da Universidade Católica de Brasília –


PROEx/UCB, obteve um crescimento acelerado e foi reorganizado. Em decorrência dessa
ampliação, passou a ter um novo redesenho. O projeto FÊNIX continuou a crescer e a ampliar
as suas atividades.

O número de alunos idosos que cursaram disciplinas isoladas nos diversos cursos de
graduação foi crescendo timidamente dentro da UCB. No segundo semestre de 2001 eram
quatro (04) alunos idosos. Em 2002 este número elevou-se para dez (10). Durante este
período a UCB destinou 50% (cinqüenta por cento) de bolsa de estudos sociais para os idosos
que cursavam disciplinas isoladas. No 1º semestre de 2003, o projeto havia ganhado grande
repercussão, devido à assistência dada a esses alunos pelas Direções de Cursos em
concomitância com os coordenadores do Projeto FÊNIX e com o incentivo da “Bolsa Social”,
que havia elevado o percentual para 100% (cem por cento). Nesse semestre o número de
alunos idosos subiu para 64 (sessenta e quatro). Já no 2º semestre de 2003, com mudança da
exigência da idade de 50 para 60 anos, para ingresso no Projeto FÊNIX, este número reduziu-
se a 11 (onze) alunos idosos, todos com mais de 60 anos.

No final do ano de 2003, ao executar o Plano de Ação para o ano de 2004, ocorreram
novas alterações na Pró-Reitoria de Extensão, tanto em estrutura, quanto em nomenclatura e
eliminação de alguns órgãos e coordenações. Nesse novo organograma a UnATI,
praticamente sem definição de atribuições, continua mantendo-se, hierarquicamente, ligada ao
Projeto FÊNIX15.

No primeiro semestre letivo de 2003, o projeto FÊNIX, atingiu sua meta de junto com
a Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa - PRPGP, de instalar o Programa de Pós-
Graduação Stricto Sensu em Gerontologia. E, no 2º semestre letivo de 2003, para viabilizar o
oferecimento da disciplina Estágio Supervisionado de caráter optativo do referido programa
Stricto Sensu, criou junto à Graduação a disciplina Introdução a Gerontologia, de natureza
multi e interdisciplinar. Tal disciplina foi oferecida aos alunos dos diversos cursos de
graduação, ministrado pela UCB, como disciplina eletiva/optativa – não obrigatória -, onde
qualquer discente poderia cursá-la em caráter extracurricular – a turma foi fechada com 26
alunos e a disciplina cursada foi inserida no histórico escolar destes discentes -. Contudo no

15
Para o ano de 2004, o Projeto Fênix iria reduzir a oferta de oficinas, passando as atividades físicas para o
Projeto Geração de Ouro. Sua equipe foi reduzida novamente a 2 (dois) professores, sendo um deles responsável
apenas pela área de atividades físicas e pela intermediação entre as atividades físicas do Projeto Fênix e do
Projeto Geração de Ouro, citado adiante, ainda neste item/capítulo, páginas 63-64.
59

ano de 2004, por falta de divulgação precisa, não houve procura dos acadêmicos graduandos
para cursar esta disciplina e, consequentemente, não foram formadas turmas na graduação.

Paralelo a isto, para o ano de 2004, o projeto FÊNIX, por mudanças de políticas
sociais para oferta de bolsas de estudos deixou de investir nas disciplinas isoladas para os
idosos, o que trouxe bastante pesar, pois cada um desses alunos idosos possuía um projeto de
vida, que almejava alcançar a curto, médio ou longo prazo. Um grande número deles
desejava, após se curarem do temor de enfrentarem os bancos escolares causado pelos anos de
ausência, anos longe da escola, buscavam ingressar num curso de nível superior - de menor ou
maior duração - e graduar-se. E todos que cursaram disciplinas isoladas demonstraram o
prazer e o orgulho de estarem ativos na comunidade acadêmica, tendo assim sua auto-estima
elevada.

Visando resolver o problema do oferecimento da disciplina Introdução à


Gerontologia e realimentar a UnATI, que perdeu seu brilho ao deixar de oferecer as
disciplinas isoladas nos cursos de graduação, o projeto FÊNIX em parceria com a direção do
Programa Stricto Sensu em Gerontologia, vem oferecendo a disciplina aos idosos, ministrada
pelos alunos/estagiários, estudantes do Mestrado em Gerontologia da UCB, sob a
coordenação de professores alocados no referido mestrado, com formação na área de
educação. O grupo de estagiários é bastante diversificado no que tange à formação - são
médicos, fisioterapeutas, psicólogos, fonoaudiólogos, nutricionostas, pedagogos, licenciados
em educação física e muitos outros profissionais -. Os alunos idosos possuem, também,
heterogeneidade no grau de instrução, procedência acadêmica e nível sóciocultural. Tal
inovação proporcionou o enriquecimento da ementa e das atividades propostas pela disciplina.

Além das disciplinas isoladas e da disciplina Introdução à Gerontologia, oferecida no


segmento ensino - da tríade ensino, pesquisa e extensão – a UCB apresentou mais uma
inovação: oficinas Jornalismo. O curso de Comunicação Social possui em seu currículo a
disciplina Jornalismo Regional e Comunitário. Tal disciplina aplica com seus alunos –
discentes da graduação – a arte de desenvolver atividades de rádio, jornal e telejornal, como
oficinas, com membros da comunidade local. A princípio o grupo discente desenvolvia as
oficinas com crianças, mas por iniciativa da professora da disciplina, surgiu a idéia de
desenvolver as oficinas com idosos, integrando o curso de Comunicação Social com o Projeto
FÊNIX, ensino com extensão, jovens com idosos. E, desde o 1º semestre letivo de 2004, vem
sendo realizado este trabalho que, a cada semestre, arrebanha mais idosos para esta nova
60

proposta. O funcionamento da disciplina é realizado respeitando o calendário acadêmico dos


cursos de graduação, seguindo a tramitação descrita a seguir.

No início do semestre, a professora da disciplina apresenta sua proposta de trabalho


aos alunos do curso/disciplina e convida membros da equipe de coordenação do projeto FÊNIX
para ministrar uma palestra sobre o envelhecimento e sobre o trabalho realizado pela UCB
com a terceira idade. Após a apresentação da temática, a professora desenvolve o referencial
teórico específico da área de comunicação social com os seus alunos graduandos enquanto o
Projeto FÊNIX divulga e inscreve idosos interessados em participar das oficinas desenvolvidas
pela disciplina – rádio, jornal e telejornal.

Os idosos interessados em participar desse tipo de oficina compõem um grupo


bastante heterogêneo. São idosos de ambos os sexos; com idade mínima de 60 anos e máxima
sem limite; que se diferenciam no estado civil, grau de instrução e experiência de trabalho
profissional. Normalmente é feita uma dinâmica de grupo para alocar os alunos-idosos,
segundo seus interesses e disponibilidade, nas oficinas oferecidas pelos alunos-graduandos do
Curso de Comunicação Social, matriculados na disciplina Jornalismo Regional e
Comunitário.

Para os idosos, tais oficinas trazem uma nova vivência, se descobrem como pessoas,
sentem sua auto-estima elevada quando são capazes de produzir poesias, dicas de saúde, de
culinária, entrevistas, noticiários e artigos sobre temas diversos e desafiantes dentro da área do
envelhecimento.

Ao término do semestre letivo, o grupo de alunos graduandos, orientadores das


oficinas, apresentam para os demais alunos e público os resultados finais das atividades
desenvolvidas pelos seus orientandos/alunos-idosos, participantes das oficinas, que divulgam
seus trabalhos, relatam suas experiências e fazem uma confraternização.

No relato das experiências, muitos se emocionam e comovem os ouvintes – jovens e


idosos - que recebem, com a história contada, a energia para continuar na luta por seus ideais.
São metas a curto, médio e longo prazo, que começam, recomeçam ou continuam a serem
traçadas, independente da idade. São comuns depoimentos orgulhosos de idosos como: “me
sinto jovem”; “aqui eu renasci”; “sou ao mesmo tempo aluno - quando aprendo a oficina -
e professora - quando passo minhas experiências -”; “estou feliz por participar das oficinas
de jornalismo com jovens maravilhosos, é muito gostoso passar algumas horas com eles
escrevendo (...)”; “temos a oportunidade de nos comunicar, de não ficarmos alheios uns aos
61

outros”. Temos também depoimentos de alunos graduandos como: “eles (idosos) têm a
experiência de vida que eles levaram anos para conquistar, nós temos a parte técnica, que
aprendemos com o Curso (...) isto trouxe o engrandecimento do trabalho”; “o interessante
neste trabalho foi a troca de experiência com o aprendizado da vida”; “é preciso valorizar o
temos ao nosso lado”.

Outros cursos de graduação da UCB também estão voltando o olhar para área do
envelhecimento, ofertando em seus currículos, disciplinas que abordam o tema da terceira
idade. Temos, então, o Curso de Medicina que oferece a disciplina Métodos de Abordagem
em Saúde Comunitária III - que estuda as questões do envelhecimento -, o Curso de
Psicologia que oferece a disciplina Psicologia do Desenvolvimento III - que estuda o
envelhecimento -, o Curso de Nutrição que oferece a disciplina Nutrição na Terceira Idade.
Inserindo o tema da terceira idade nos seus cursos de graduação a UCB tenciona qualificar
recursos humanos para trabalhar na área do envelhecimento e contribuir para o
“desenvolvimento de um saber novo que leve em conta uma perspectiva multidisciplinar
buscando preparar e formar docentes, pesquisadores e profissionais para essa área de
demanda crescente” (UCB, 2004, p. 57).

O Projeto FÊNIX possui um Coral de Vozes que vem se solidificando e realizando


diversas apresentações. Desde uma relevante apresentação no III MERCOSETI – Encontro
Mercosul sobre a Terceira Idade, ocorrido em Brasília-DF, de 11 a 14 de agosto de 2003,
Excluído: as
onde se reuniram diversos estudiosos, pesquisadores, especialistas do assunto, com a presença
Excluído: celebridades sobre o
da Srª. Rosa Tarlovsky de Roisinblit – avó da Plaza de Maio – Argentina, que apresentou o
seu depoimento - até um encerramento festivo da disciplina de Tópicos Atuais do
Envelhecimento, no Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Gerontologia da UCB, no
final do ano de 2003 e o canto do Hino Nacional no Palácio do Planalto no dia em que foi
sancionado o Estatuto do Idoso, na presença do Senhor Presidente da República.

As apresentações feitas por este grupo cantante, tem sido um marco na vida da
maioria dos integrantes do grupo, pois muitos deles são pessoas simples e com pouco grau de
instrução, que jamais tiveram a oportunidade de participar de um momento como este.
Algumas das pessoas que formam o Coral não haviam terminado sequer a 4ª série do Ensino
Fundamental, outras ainda não eram alfabetizadas. Com ingresso no Coral da UCB surgiu
nestas pessoas o desejo de iniciar ou retomar os estudos para melhor fazer a leitura das
partituras musicais.
62

Além das atividades desenvolvidas com os idosos em oficinas, painéis temáticos,


palestras, cursos de extensão e coral, o projeto envolve as suas famílias através das festas
juninas e confraternizações de final de ano e em homenagem ao dia do idoso.

O Projeto FÊNIX desenvolve, também, parcerias internas - com diversos segmentos


da UCB - e externas com vários órgãos do Distrito Federal.

Nas parcerias internas citamos: 1. o Programa de Educação Continuada, que


desenvolve atividades de alfabetização; 2. o Projeto Vida Plena, da Coordenação de Pastoral,
que presta assistência espiritual aos idosos; 3. o curso de Direito, através do seu Núcleo de
Prática Jurídica – NPJ, que disponibiliza orientação jurídica; 4. o Curso de Psicologia que
oferece palestra e oficinas para a comunidade idosa e disponibiliza atendimento psicológico,
através do Centro de Formação em Psicologia Aplicada da UCB; 5. o Curso de Farmácia, que
desenvolve atividades de verificação da taxa de glicemia; 6. o Curso de Odontologia, que
oferece atendimento ambulatorial (prótese total) e palestras com instruções de higiene oral
para idosos; 7. o Curso de Fisioterapia que presta atendimento no Hospital Universitário da
Universidade Católica de Brasília – HUCB, realiza palestra e oficinas para os idosos da
UnATI/UCB e presta atendimento no asilo Lar dos Velhinhos em Taguatinga; 8. o Curso de
Comunicação Social que, além das oficinas de jornalismo, desenvolve o projeto “Me conte a
sua história” realizado em abrigos, com alunos voluntários do Curso de Comunicação Social,
habilitação em Jornalismo, em parceria com a Federação Brasileira da Indústria Farmacêutica
– FEBRAFARMA; 9. o curso de Educação Física que disponibiliza estagiários para atuar nas
diversas modalidades de atividades físicas; 10. o Curso de Medicina que desenvolve o Projeto
de Iniciação Científica com uma pesquisa envolvendo centenários e desenvolve, também, o
Projeto “Apoio a Saúde”, numa parceria com a Casa Transitória de Brasília, desenvolvendo
oficina de Saúde Mental e atendimento geriátrico; 11. Hospital Universitário da UCB –
HUCB que desenvolve um projeto sobre auto-medicação com o apoio de uma assistente
social e atendimento a população idosa feito por alunos-médicos do Mestrado em
Gerontologia e professores da UCB; 12. Mestrado em Gerontologia – parceria natural - que
interage os alunos regulamente matriculados na disciplina Estágio Docente (optativa) com
alunos da UnATI através de aula ministradas pelos mestrandos, e também com o apoio ao
desenvolvimento de pesquisas realizadas com idosos; e futuramente mais 2 parcerias: com o
Curso de Enfermagem, que oferecerá palestras, pesquisas, mini-cursos e o curso de extensão
“Cuidadores de Idosos” e novamente com o Curso de Farmácia, que desenvolverá o Projeto
63

Assistência Farmacêutica e promoção da saúde do idoso, ampliando sua parceria inicial citada
no item 5 deste parágrafo.

Como parcerias externas a UnATI/UCB desenvolve atividades junto com: 1. o


Conselho dos Direitos dos Idosos – CDI do Distrito Federal, onde tem um representante
conselheiro que colabora com todas as ações realizadas, inclusive atuando junto com a
Promotoria de Defesa do Idoso e do Portador de Deficiência do Ministério Público do DF e
territórios, visitando abrigos e na elaboração de legislação própria; 2. a Gerência de
Valorização do Idoso – GVI, órgão da Secretaria de Estado de Ação Social do GDF, onde os
alunos da Graduação e Pós-Graduação realizam pesquisas e promovem atividades diversas
para os idosos, nesta parceria, a UCB colabora, também, na elaboração das políticas públicas
para o DF; 3. Associação Nacional de Gerontologia do DF - ANG/DF, a UCB tem
representação na Diretoria e colabora no planejamento e desenvolvimento das ações para e
com os idosos; 4. Casa Transitória de Brasília, que dispõe de um Centro de Convivência de
Idosos – CCI e de ambulatório geriátrico; 5. Asilo Maria de Madalena – Instituto de
Gerontológico, onde poderão ser desenvolvidas pesquisas; e 6. Centros de Convivência - o
Projeto FÊNIX, colabora prestando consultoria a diversos grupos de convivência, auxiliando na
regulamentação de normas internas e oferecendo apoio para implantação das atividades a
serem desenvolvidas, até que o grupo possa caminhar sozinho.

Paralelo ao Projeto FÊNIX, que desenvolve a gama de atividades descrita acima, a


UCB possui também um outro projeto voltado para a Terceira Idade: o Projeto GERAÇÃO DE
OURO.

O GERAÇÃO DE OURO, como é conhecido, foi criado em outubro de 2000, como


atividade de extensão ligada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação
Física, da UCB, em parceria com o extinto Instituto Nacional de Desenvolvimento do
Desporto/Ministério dos Esportes - nesta parceria o Instituto repassava uma verba para o
projeto -. O objetivo do projeto GERAÇÃO DE OURO era oferecer atividades físicas orientadas,
a população idosa – idosos independentes - acima dos sessenta (60) anos de idade.

Nasceu com o objetivo de direcionar um estudo longitudinal que trouxesse dados


coerentes sobre o “impacto que o exercício físico exerce no envelhecimento”, (UCB –
GERAÇÃO DE OURO, 2001) no que tange ao aspecto social, emocional, psicológico,
biológico e estilo de vida.
64

O projeto GERAÇÃO DE OURO, composto por uma equipe de 3 professores16, trabalha


com idosos com idade compreendida, no momento, até 90 anos. São diversas as modalidades
físicas ofertadas durante a semana e em diversos horários por estagiários/monitores de
diversos cursos de graduação da UCB e por alunos mestrandos em Educação Física. Entre
estas atividades destacamos: natação, hidroginástica, ginástica rítmica desportiva – GRD,
ginástica aeróbica, musculação, yoga e tai-chi-chuan.

Até o 2º semestre de 2003, tanto o projeto FÊNIX quanto o projeto GERAÇÃO DE

OURO desenvolviam suas atividades sem integração entre os dois projetos. Existia apenas uma
consulta para não haver choque de espaços físicos – salas destinadas para atividades físicas -,
tendo em vista que ambos ofereciam atividades físicas para os idosos. Havia, assim, uma
repetição destas atividades que ocupavam o mesmo espaço: instalações do Curso de Educação
Física da UCB, Campus I - Taguatinga, e uma necessidade de contratação de mais estagiários
ou conquista de mais voluntários. Diante deste fato, o projeto FÊNIX enxugou suas atividades
encaminhando seus idosos participantes das atividades físicas, para o projeto GERAÇÃO DE

OURO, criando, então, uma parceria entre os dois projetos e evitando o oferecimento de
atividades sobrepostas.

No ano de 2004, o projeto GERAÇÃO DE OURO, apesar de não receber mais verba do
Ministério dos Esportes, além de receber os alunos das modalidades físicas desenvolvidas
pelo projeto FÊNIX, ampliou seu atendimento aos idosos dependentes asilados do Distrito
Federal, proporcionando-lhes a oportunidade de praticar atividades físicas programadas e
orientadas, tendo em vista que “em pesquisa realizada por professores do Laboratório de
Estudos em Educação Física e Saúde – LEEFS constatou-se que nenhuma instituição
cuidadora de idosos possui um programa de atividades físicas”. (UCB, 2004, p. 13)

Os dirigentes dos Projetos FÊNIX e GERAÇÃO DE OURO perceberam que não só as


atividades físicas estavam sendo sobrepostas, mas alguns objetivos estratégicos dos 2 (dois)
projetos também. Ambos ofereciam acompanhamento em relação à nutrição e saúde bucal,
atendimento geriátrico, atividades sócio-educativas e de lazer, abriam suas portas para
investigadores pesquisarem sobre diversos temas da terceira idade buscando melhor qualidade
de vida.

Diante desta sobreposição de atividades e de objetivos a alcançar; do fato do projeto


GERAÇÃO DE OURO não estar mais recebendo o repasse de verba do Ministério do Esporte

16
Um dos professores tem a função de interação entre o Projeto Geração de Ouro e o Projeto Fênix, conforme
citado na nota de rodapé nº 14.
65

desde julho de 2003, podendo este projeto ser extinto por falta de verba (UCB, 2004 p. 20);
do fato de atenderem a mesma clientela; da percepção de que a hierarquia ao qual a UnATI,
estava desenhada, desde sua concepção parecia bem confusa - pois a UnATI não poderia
limitar-se apenas oferecer disciplinas isoladas realizadas num cursos de graduação -; e que se
a UnATI é uma Universidade Aberta, deve trabalhar com os diferentes segmentos da
universidade - ensino, pesquisa e extensão -, e deve oferecer diversas atividades em diferentes
áreas, ou seja, ela deveria ter uma concepção muito maior que os projetos FÊNIX e GERAÇÃO
DE OURO estavam tendo isoladamente. A UnATI deveria unificar os 2 (dois) projetos. Os
projetos precisavam ser revistos de modos a ficarem coerentes.

Em julho de 2004, foi, então, proposto e posteriormente aprovado pelo Conselho de


Extensão da UCB, que os projetos se fundissem e que passasse a ter nova denominação:
UnATI/UCB. Este novo redesenho, muda apenas o organograma (anexo 02). Na prática não
existem muitas alterações: as atividades físicas ficam sob a coordenação do gestor do
GERAÇÃO DE OURO, que continuará interagindo com o Programa de Pós-Graduação Stricto
Sensu em Educação Física, e as atividades sócio-culturais ficam sob a coordenação do FÊNIX,
com interação com o Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Gerontologia. Apesar
dessa interação de áreas com os Programas Stricto Sensu específicos, não quer dizer que o
Stricto Sensu em Gerontologia não poderá interagir com as atividades físicas, pois por seu
caráter multi e interdisciplinar, seria utópico não fazer este link. Tal medida facilitou, não
somente o enxugamento das atividades duplicadas, e reorganização de turmas oferecidas e
estagiários, monitores e voluntários aderidos, possibilitou uma real concepção e definição das
propostas, metas e atribuições da UnATI, além de criar também uma integração entre os dois
Programas de Pós-Graduação Stricto Sensu citados.

Quanto ao número de idosos atendidos nos projetos levantamos que não existe
registro de atendimento do Programa NUVEN. Somente, a partir de 2000, com o projeto
FÊNIX, é que os atendimentos foram registrados e quantificados. No período compreendido
entre o ano 2000 até o 2º semestre de 2004, foram atendidos 6.500 idosos nas diversas
modalidades do FÊNIX; sendo que, no 2º semestre de 2004, foram atendidos 766 idosos.
Quanto ao projeto GERAÇÃO DE OURO, no ano de 2004, registrou o atendimento de 400 idosos
nas diversas atividades oferecidas.

Diante de toda a história de vida da UnATI/UCB, podemos considerar que a UCB


vem cumprido com a sua Missão de “atuar solidária e efetivamente para o desenvolvimento
66

integral da pessoa humana e da sociedade por meio da geração e comunhão do saber,


comprometida com a qualidade e os valores éticos e cristãos, na busca da verdade.”

Nestas mudanças de nomenclaturas e de manifestação do pensamento dos dirigentes


da UnATI/UCB, ocorridas ao longo de sua história, percebe-se que o heroísmo que desbravou
clareiras perdeu-se um pouco, como se o herói cansado de buscar novos desafios, lute apenas
pelo que lhe é imposto pelas administrações, mas mesmo assim, ainda é capaz de inovar.
Foram anos alimentando idéias, criatividades, inovações sem divulgar o trabalho que se fazia.
Foram anos sempre se buscando e re-buscando sem se concentrar para buscar um ritual. O
que se percebe é que o ritual da UnATI/UCB, é estar sempre na busca de uma completude e
não se sentir completo. Esta incompletude, que está presente nos dirigentes e também nos
alunos, pode ser positiva quando sempre busca o novo, mas pode também ser a fragilidade da
UnATI/UCB.

Não existe no âmbito da UCB um espaço específico para a UnATI. Ela ocupa os
mesmos espaços da graduação, ou melhor, os espaços que sobram dos horários dos cursos de
graduação. Os horários que a UnATI firma para as atividades de natação e de hidroginástica,
desenvolvidas na piscina, são os horários/espaços livre do Curso de Educação Física; o
mesmo se dá em relação a sala ambiente de ginástica e de GRD.

Existem ocasiões em que os idosos não sabem as salas em que serão ministradas
determinadas atividades que estão se inciando (1º dia de aula) e têm que descobrir o local para
que possa assistir às aulas/oficinas que é de importância imensa para si. Eles (idosos)
procuram uns aos outros, e em duplas ou grupos desenvolvem o raciocínio nessa descoberta
de espaço e se movimentam nesta busca. A busca pelo encontro da sala/aula que lhe fará
sentir a sensação de prazer, de renascimento, como dito pelo idoso participante da oficina de
jornalismo.

Os idosos demonstram satisfação em participar de todas as atividades propostas pela


UnATI/UCB porém, de todas as atividades desenvolvidas, demonstram um prazer maior em
freqüentar as oficinas de Jornalismo - por poderem se expressar verbalmente e expor suas
idéias – e em participar das aulas de hidroginástica. Muitos idosos atribuem a estabilização da
pressão, a diminuição dos remédios, a melhora da sua qualidade de vida à quantidade de
atividades desempenhadas na UnATI/UCB, como se a água da piscina resolvesse o problema
da pressão alta, como se o ato de freqüentar a UnATI fosse o bálsamo para as suas doenças.
Não vêem que tudo é um somatório. Que a UnATI proporciona ao idoso a oportunidade de
buscar novos horizontes, realizações, de interagir, fugir da depressão, crescer, aprender,
67

valorizar o outro, ser valorizado, enfim, elevar sua auto-estima. É o somatório de todo um
montante de benefícios, que traz a qualidade de vida e um envelhecer saudável. É na
arquitetura desta Universidade Temática, que o idoso se descobre e se re-descobre, se encanta
e re-encanta. Resignifica esta arquitetura com a sua presença, afetividade e emoção.
68

Parte II: O objetivo vislumbrado, a trilha percorrida, os veículos


utilizados e seus passageiros na viagem

“Se procurar bem você acaba encontrando não a explicação duvidosa da


vida, mas a poesia (inexplicável) da vida.”
Carlos Drummond de Andrade

Na viagem empreendida pelo imaginário tivemos o caminho iluminado pela


Antropologia de Gilbert Durand, pela Complexidade de Edgar Morin e pela Culturanálise de
Grupos de José Carlos de Paula Carvalho. Na travessia valemo-nos das informações advindas
da obra de Yves Durand ampliadas pelos escritos e prática de estudiosos que vêm adotando a
metodologia culturanálitica e nessa a utilização do Arquétipo Teste de Nove Elementos – AT-
9. Na complementação do atingimento do objetivo vislumbrado - explicitado abaixo, no
capítulo 4 - valemo-nos, ainda, da Pedagogia da Escuta, preconizada por Paula Carvalho
(1999, p. 31) colhendo depoimentos em entrevistas não-estruturadas, sem perder de vista as
especificações dos sujeitos que compuseram o universo desta pesquisa, quer dizer os
passageiros que nos acompanharam na viagem: os alunos-idosos da UnATI/UCB.

Capítulo 4 - Metodologia

“Não é no espaço que devo buscar minha dignidade, mas na ordenação de


meu pensamento.
Não terei mais, possuindo terras; pelo espaço, o universo me abarca e traga
como um ponto; pelo pensamento, eu os abarco.”
Pascal, 1973

Esta pesquisa, de cunho qualitativo, se caracterizou como culturanalítica de grupos


(PAULA CARVALHO, 1990a ) e se desenvolveu em uma paradigmática holonômica, na
intenção de conhecer o imaginário subjacente à criação, desenvolvimento e perspectiva
de continuidade da UnATI/UCB, oferecendo pistas para a consideração da dimensão
simbólica na sua possível reorganização.

Para tal, valemo-nos da Pedagogia da Escuta, preconizada por Paula Carvalho (1999,
17
p. 31) escutando e registrando, em entrevistas não-estruturadas a fala de alunos idosos que

17
Para Paula Carvalho (1999, p. 31) “a Pedagogia da Escuta significa que temos que aprender com a lição das
palavras e com a lição dos mestres (...) ‘escuta’ se refere, e envolve, ‘obediência’, (...) ela abre o ‘ouvido
interior’. (...) está logo presente a ‘humildade’, que remete por sua vez a ‘humus’ e a ‘homem’.”
69

aceitaram participar da pesquisa, bem como foi utilizado o Arquétipo Teste de Nove
Elementos – AT-9, de Yves Durand.18, complementando com informações buscadas em
documentos oficiais da Universidade Católica de Brasília – UCB, acrescidos dos registros
mnemônicos da pesquisadora que participou, à época, dos fatos. O universo da pesquisa se
compôs por uma população, aleatoriamente, definida por um grupo de 16 (dezesseis) alunos-
idosos e 2 (dois) sujeitos, gestores atuais do projeto, sendo que um deles informa ter 46 anos.

Quadro de identificação dos sujeitos-autores da pesquisa na UNATI/UCB

População
Identificação Alunos-Idoso Dirigentes
Masculino 2
Sexo
Feminino 14 2
46 anos 1
60 anos 2
61 anos 1
62 anos 3 1
Idade 63 anos 1
64 anos 1
67 anos 1
69 anos 2
71 anos 1
72 anos 3
74 anos 1
Doutoranda 1
Mestre 1
Grau de Superior
4
Instrução
Médio 6
Fundamental 2
( 2ª fase)
Fundamental 4
(Primário e EJA
1º segmento)

Total Geral 16 2
Média de Idade dos alunos-idosos da UNATI/UCB = 66,25 anos

Arrecadou-se, ainda, de maneira informal, dados advindos de depoimentos/fala de


duas pessoas envolvidas na criação e início das atividades da, atualmente, denominada
UnATI/UCB e, como já dito, da memória desta pesquisadora que, presenciou a movimentação
de criação e reorganização dos projetos que embrionaram a referida universidade temática na
Universidade Católica de Brasília - UCB – UnATI/UCB.

18
Os participantes da pesquisa assinaram Termo de Consentimento Livre e Esclarecido com a pesquisa efetuada.
70

Para o atingimento do objetivo proposto, que podemos considerá-lo desdobrado em


dois, - conhecer o imaginário (...) e levantar pistas (...) - anotamos como objetivos específicos
as seguintes ações pontuais:
Excluído: Durant
¾ utilizar o Arquétipo Teste de Nove Elementos, de Yves Durand, na obtenção dos
dados míticos;

¾ auscutar nas histórias/depoimentos contadas/oferecidas pelos sujeitos da pesquisa -


idosos, dirigentes e outros – “a angústia do passar do tempo e o medo da morte”;

¾ resgatar e registrar a história da UNATI/UCB, desde sua criação e antecedentes -


com denominações outras - e seu desenvolvimento atual pontuando nela as
constelações de imagens subjacentes;

¾ ofercer vetores ou pistas prospectivas para a UNATI/UCB para uma possível re-
organização, se requerida, com a consideração da dimensão simbólica.

A seguir, no capítulo 5, apresentamos as teorias de bases da pesquisa: Antropologia


Excluído: Durant
do Imaginário, de Gilbert Durand, da Complexidade, de Edgar Morin; da Culturanálise de
Grupos, de Paula Carvalho, notadamente na heurística do AT-9, de Yves Durand.

Excluído: . ¶

Capítulo 5 - Bases Teóricas

“Tart observa que na comunidade científica, sobretudo no domínio já


instituído do saber, o desconhecimento, a denegação ou a não-tematização dos
quadros paradigmáticos levam as pessoas a falarem uma ‘contra’ as outras, ao
invés de umas ‘com’ as outras...” (PAULA CARVALHO, 1990 a, p. 20)

5.1 - Teoria do Imaginário, de Gilbert Durand

“(...) Durand pensa as estruturas do imaginário em termos de conteúdos


dinâmicos, como meio fundamental para a compreensão das bases míticas do
pensamento humano. Leva em conta a homologia do psíquico, do cósmico, do social
e do biológico, organizados numa significação integrada e segundo uma lógica
constelacional.” (CHAVES, 2000, p. 41)
O homem difere dos outros animais por não possuir uma relação apenas de
estimulo↔resposta. Ele transforma a natureza, acumula conhecimentos, transforma-os e
Excluído: sn
transmite-os. Sua relação com o mundo está pautada em simbolismos, tendo em vista que não
lida diretamente com os objetos, mas sim com os significados atribuídos aos objetos pela
71

cultura à qual ele pertence, “O homem vive num mundo de significados” e isto o torna um ser
qualitativo. “O real não é o objeto, não é o fato, não é a lei. O real é o significado sentido, a
interpretação, o contexto. (...) A realidade cultural é uma construção social”.
(ASSUMPÇÃO, 2003)

O mundo do homem é um mundo simbólico. A razão, as definições conceituais, a


ciência, a arte, a religião, os sentimentos mais íntimos, são “dimensões imaginárias”
(DURAND, G., 2001) de convenções, numa relação interior↔exterior, subjetivo↔objetivo -
pólos interno e externo, latente e patente -, segundo Edgar Morin (1973) e Paula Carvalho
(1990 a).

Segundo Laplantine e Trindade (2003, p. 78) “o imaginário consiste na utilização,


formação e expressão de símbolos”. Apesar de estar contido no campo de representações,
“não é uma tradução reprodutora ou uma transposição das imagens” (ibidem, p. 77). Ele
ultrapassa a representação intelectual, pois está embebido de emoções, de afetividade,
inspiração e de poéticas.

Bachelard (apud DURAND, G., 2001, p. 30) afirma ser fundamental ter presente que

“(...) a imaginação é dinamismo organizador, e esse dinamismo organizador


é fator da homogeneidade na representação. (...) a imaginação é potência dinâmica Excluído:
que ‘deforma’ as cópias pragmáticas fornecidas pela percepção, e esse dinamismo
reformador das sensações torna-se o fundamento de toda a vida psíquica porque ‘as
leis da representação são homogêneas’, a representação sendo metafórica a todos
os seus níveis, e, uma vez que tudo é metafórico, ‘ao nível da representação todas as
metáfora se equivalem’.”
Gilbert Durand, discípulo de Bachelard, entende o imaginário como o “conjunto das
imagens e relações de imagens que constitui o capital pensado do homo sapiens” (2001,
p. 18); diz que este imaginário “aparece-nos como o grande denominador fundamental onde
Excluído:
se vêm encontrar todas as criações do pensamento humano” (idem) e, acrecenta, ainda, que
“o imaginário é esta encruzilhada antropológica que permite esclarecer um aspecto de uma
determinada ciência humana por um outro aspecto de uma outra” (idem). 19

Lahud Loureiro (1993, p. 20), diz que “o movimento organizador da imaginação


encontra-se estruturado e se expressa em representações exteriores, de onde se pode deduzir
a sua dinâmica e perceber a homogeneidade de suas expressões que se repetem em diferentes
momentos.”

19
Conhecendo o imaginário torna-se possível a interação entre as dimensões, disciplinas, diferenciais: permite
ou condiciona a interdimensionalidade condutora à interdisciplinariedade, como na gerontologia.
72

Bachelard (apud ROCHA PITTA, 1979, p. 18) diz que “o símbolo centraliza as
forças que estão dispersas em todos os seres do mundo (...) e o simbolismo aberto nos prova
que o homem tem necessidade de imaginar, que ele tem o direito de imaginar, que ele tem o
direito de aumentar o real”. Lahud Loureiro (op. cit., p. 20) sintetiza que “o símbolo é sempre
produto dos imperativos biopsíquicos pelas intimações do meio (...) e é este produto que G.
Excluído: Durand
Durand chama de Trajeto antropológico”. Afirma, ainda, que:

“(...) o símbolo é a síntese da interação e não algo espontâneo que surge do


nada; ele provém da trama entre os dois polos: interior e exterior. Há coerência e Excluído: e
concordância entre o sentido e símbolo (interior e exterior) o que não quer dizer
confusão porque essa coerência pode afirmar-se numa dialética; o símbolo está Excluído: e
constantemente se alterando e se organizando.” (idem )
Excluído: Segund
O ser humano, apesar de ser indivíduo é também um ser social. “O exterior age como
estímulo motivador da imaginação (...) rompe as amarras do ‘aceito’ para modificá-lo, (...)
podendo trazer o novo (...). O pensamento se reorganiza e altera as acomodações que se
transformam em idéias novas, inovadas num processo neguentrópico20” (ibidem, p. 2-22)

Bachelard in G. Durand (apud LAHUD LOUREIRO, 1998, p. 10) registra que:

“(...) a imaginação na sua potência dinâmica altera as percepções: essa


ação transformadora passa a ser a base de toda a vida psíquica. O movimento
organizador da imaginação encontra-se estruturado e se expressa nas
representações exteriores (...) Além de organizada, viva e pulsante, a imaginação
no seu movimento constante, faz mutáveis suas estruturas, sofrendo influência
exterior, mas tendo também seu próprio movimento.”
Gilbert Durand, seguindo o pensamento bachelardiano, fundamentado ainda em
outros autores e com base na escola reflexológica russa, cria a Teoria do Imaginário, pois
acredita que “existe uma estreita concomitância entre os gestos do corpo, os centros nervosos
e as representações simbólicas” (DURAND, G., apud DURAND, Y., 1988, p. 29), o que
Piaget comprova através de diversas pesquisas.

A teoria do imaginário, de Gilbert Durand (2001, p. 42), considera tanto o aspecto


psicológico – interior -, quanto o cultural – exterior -; preocupa-se com o enfrentamento do
problema da temporalidade, ou seja, “a angústia do passar do tempo e do medo da morte”, e
mostra a simbiose entre interior – latente – e exterior – patente -, como já foi dito, o “trajeto
antropológico”.

Gilbert Durand denomina trajeto antropológico “a incessante troca que existe ao


nível do imaginário entre as pulsões subjetivas e assimiladoras e as intimações objetivas que
emanam do meio cósmico e social” (2001, p. 41).

20
Negüentropia entendida como a negação da entropia. (PAULA CARVALHO, 1990, p. 28)
73

Gilbert Durand define as estruturas do imaginário, apoiando-se na reflexologia


betchereviana, com a noção de “gestos dominantes”, observados em recém nascidos e
posteriormente em Oufland, que estuda o complexo braquial (rãs). Desta forma, ele encontra,
nas 3 (três) “dominantes reflexas”: de posição, de nutrição (Betcherev) e a copulativa
(Oufland), a correspondência respectiva nas estruturas antropológicas do imaginário as quais
denomina esquizomórfas ou heróicas, antifrásicas ou místicas e sintéticas ou disseminatória
do imaginário.

A primeira dominante reflexa, segundo Betcherev, (apud DURAND, G., 2001, p. 48)
é a “de posição”, que coordena os reflexos e ordena as posições do corpo, relaciona-se a
verticalização do corpo, a postura, sendo conhecida como a dominante postural. A segunda
dominante reflexa, ainda com Betcherev, é a “de nutrição”, que está relacionada à deglutição
e à defecação, e é denominada dominante digestiva. A terceira dominante é a de movimento
que corresponde aos esquemas rítmicos, dialético e progressista e é chamada de “dominante
copulativa”.

A partir dos estudos e constatação das 3 (três) dominantes reflexas – descritas


acima - Gilbert Durand afirmou e aprofundou, em seus estudos a concepção de um imaginário
bipartido em regimes, contendo a tripartição das estruturas dinâmicas complexas e
constelares, organizadas no processo de formação e transformação das imagens, dos símbolos
e dos mitos, que permite realizar uma leitura em profundidade de um grupo de indivíduos,
levando a identificação de estruturas antroplógicas do imaginário.

É no processo de organização do imaginário que se localizam os arquétipos. Para


Jung (apud DURAND, Y., 1988, p. 33) “os arquétipos, de caráter universal, são imagens
inatas do instinto e não da inteligência”, o que nos leva a entender que no inconsciente, os
arquétipos não são isolados uns dos outros, enquanto as imagens do instinto “são
psicologicamente um alvo espiritual, para o qual tende a natureza do homem”. (JUNG, apud
DURAND, Y., 1988, p. 35).

Gilbert Durand apresenta, em seus estudos e escritos, a distinção entre arquétipo e


esquema (“Schème”)21. Define “Schème” como

“uma generalização dinâmica e efetiva da imagem, constitui a factividade e


a não-substantividade geral do imaginário; aparenta-se ao que Piaget chama de
“símbolo funcional” e Bachelard de “símbolo motor”. Faz a junção (...) entre os

21
Na tradução do francês para o português, alguns autores fazem a tradução da palavra “schème” como
esquema. Contudo, segundo Danielle Rocha Pitta, não existe uma tradução precisa para esta palavra. “Schème”
significa “(...) o esboço funcional da imaginação” (CHAVES, 2000, p. 41).
74

gestos inconscientes da sensório-motricidade, entre as dominantes reflexas e as


representações. São estes Schèmes que formam o esqueleto dinâmico, o esboço
funcional da imaginação” (apud CHAVES, 2000, p. 41)
Seria o que Lahud Loureiro (1998, p. 16), chama de matriz. “Esta matriz organiza os
indivíduos em grupos, pois ‘pensam’ e vêem o mundo de uma forma homogênea”.

“(...) é no contato com as imagens do meio que os ‘schème’ se


“substantificam” em arquétipo (...) Ligando-se por sua vez a imagens muito
diferenciadas pelas culturas, os arquétipos se atualizam em símbolos.” (DURAND,
Y., 1988, p. 35)
Arquétipo, no entendimento de Yves Durand, é um “um conceito intermediário entre
o ‘Schème’ e o símbolo. Do ‘Schème’ ele conserva o substrato gestual; do símbolo anuncia a
duplicação representativa de uma intencionalidade cultural” (ibidem, p. 35-36).

Para Gilbert Durand (2003, p. 62), na extensão dos ‘Schème’, arquétipos e símbolos
podemos analisar o mito. Esse autor considera que o mito é concebido como “sistema
dinâmico de símbolos, de arquétipos e de esquemas que sob a impulsão de um esquema - ou
de um grupo de esquemas - tende a se compor em narrativa”. (apud DURAND, Y., 1988,
p. 39). E a organização dinâmica do mito, muitas vezes, está ligada à organização estática a
que chamamos de “constelação de imagens”. (DURAND, G., op.cit, p. 63).

Para ele a isomorfia entre os esquemas, os arquétipos e os símbolos presentes no


âmago de sistemas míticos ou constelações estáticas permite-nos confirmar a existência de
certos protocolos normativos das representações imaginárias, claramente definidos e com
relativa estabilidade, que se agrupam em torno dos “schèmes” originais a que denomina
estruturas, as quais, por sua vez, agrupadas quanto a sua proximidade, define o que G. Durand
chama de regime de imagens. (idem).

O regime das imagens é bipartido por Gilbert Durand em: Regime Diurno e Regime
Noturno.

O regime diurno, onde está contida a dominante reflexa postural, é caraterizado, por
G. Durand, pela antítese polêmica das estruturas heróicas ou esquizomóficas, cuja simbólica
se expressa pela distinção e oposição entre os símbolos. G. Durand registra, neste regime, a
teriomorfia - o simbolismo animal -, a nictomorfia – o simbolismo das trevas – e a catamorfia
– representando o simbolismo da queda -. Considera, ainda, os símbolos ascensionais no
regime diurno das imagens – que leva para a luz e para o alto -, os simbolismos espetaculares
– dizendo respeito à luz, ao luminoso -, e os simbolismos diairéticos – símbolos referentes à
separação cortante entre o bem e o mal. “O regime diurno expressa a dialética entre o
75

simbolismo da fuga diante do tempo, e a vitória sobre o destino e a morte: a contraposição


positiva ao negativo (vida x morte)” (LAHUD LOUREIRO, 1998, p. 13-14).

O regime noturno abarca, em si, duas formações ou agrupamentos constelados de


imagens: uma caracterizada pela simbólica da intimidade, do aprofundamento e da penumbra
nas estruturas mística ou antifrásicas, que evita a polêmica e procura a quietude e o prazer, e
outra que concilia intenções de luta e de aconchego, caracterizada pela simbólica progressiva
ou cíclica, das estruturas sintéticas ou disseminatórias. Lembrando as dominantes reflexas
acima referidas, encontramos assim, o regime noturno relacionado às dominantes de nutrição
e copulativas ou de movimento.

Em “As Estruturas Antropológicas do Imaginário” – obra de Gilbert Durand, este


cunhou o que chamou de Quadro Isotópico das Imagens (2001, p. 441) - colocado adiante. O
autor relaciona a dominante postural (1ª dominante reflexa) à estrutura heróica, que aciona o
ideário e o imaginário da purificação, da luta, do combate, da guerra, da análise, representado
pelas armas. A dominante reflexa de nutrição aparece no “quadro” relacionada à estrutura
mística e aciona o ideário e o imaginário do repouso, da intimidade, da união; apela para a
questão da profundidade; a água ou a terra cavernosa e faz alusão aos devaneios da
beberagem e do alimento, à queda e ao esconderijo. A terceira dominante reflexa, a
copulativa, relaciona-se à estrutura sintética. Aciona o ideário e o imaginário do ciclo vital no
progresso ou declínio, que se refere aos gestos rítmos, cíclicos e induz a respostas sintéticas.
76

Quadro Isotópico das Imagens – Gilbert Durand

REGIMES OU
POLARIDADES DIURNO NOTURNO
Esquizomórficas Sintética Mística
(ou heróicas) (ou dramáticas) (ou antifrásicas)
1ª - idealização e “recuo” autístico. 1ª - coincidência “oppositorum” e 1ª - redobramento e preservação.
Estruturas 2ª - diairetismo (Spaltung). sistematização. 2ª - viscosidade, adesividade
3ª - geometrismo, simetria, 2ª - dialética dos antagonistas, antifrásica.
gigantismo. dramatização. 3ª - realismo sensorial.
4ª - antítese polêmica. 3ª - historização. 4ª - miniaturização (Gulliver).
4ª - progressismo parcial (ciclo) ou
total.
Representação objetivamente Representação diacrônica que liga Representação objetivamente
heterogeneizante (antítese) e as contradições pelo fator tempo. O homogeneizante (preservação) e
Princípios de
subjetivamente homogeneizante Princípio de CAUSALIDADE, sob subjetivamente heterogeneizante
explicação e de (autismo). Os Princípios de todas as suas formas (espec. FINAL (esforço antifrásico). Os Princípios
justificação ou lógicos EXCLUSÃO, de CONTRADIÇÃO, e EFICIENTE), funciona de ANALOGIA, de SIMILITUDE
de IDENTIDADE funcionam plenamente. funcionam plenamente.
plenamente.
Dominante POSTURAL com os seus Dominante COPULATIVA com os Dominante DIGESTIVA com os
Reflexos dominantes derivados manuais e o adjuvante das seus derivados motores rítmicos e os seus adjuvantes cenestésicos,
sensações à distância (vista, seus adjuvantes sensoriais térmicos e os seus derivados
audiofonação). (quinésicos, músico-rítmicos, etc.). táteis, olfativos, gustativos
DISTINGUIR LIGAR CONFUNDIR
Esquemas “verbais” Separar ≠ Misturar Subir ≠ Cair Amadurecer Voltar Descer, Possuir, Penetrar
Progredir Recensear
Arquétipos “Atributos” Puro ≠ Manchado Alto ≠ Baixo Para a frente, Para trás, Profundo, Calmo, Quente, Íntimo,
Claro ≠ Escuro Futuro Passado Escondido
Situação das O GLÁDIO (O Cetro) O PAU O DENÁRIO A TAÇA
“categorias” do jogo de
Tarô
A Luz ≠ O Cume ≠ O Fogo- A Roda. O Micro- A Morada.
As Trevas. O Abismo Chama. A Cruz. cosmo. O Centro.
Arquétipos O Ar ≠ O Céu ≠ O Filho. A lua. A Criança, o A Flor.
“Substantivos” O Miasma. O Inferno A Árvore. O Andrógino. Polegar. A Mulher.
A Arma Heróica ≠ O Chefe ≠ O Geme. O Deus Plural. O Animal O Alimento.
A Atadura O Inferior gigogne. A Substância.
O Batismo ≠ O Herói ≠ A Cor.
A Mancha O Monstro A Noite.
O Anjo ≠ A Mãe.
O Animal O Recipiente.
A Asa ≠
O Réptil
O Sol, A Escada de O Calendário, A Aritmologia, a O Ventre, O Túmulo,
O Azul celeste, mão, Tríade, a Tétrade, a Astrobiologia Engolidores e O Berço,
O olho do Pai, A Escada, A Iniciação, O Sacrifício, Engolidos, A Crisálida,
Dos Símbolos aos As Runas, O Bétilo, O “Duas-vezes O Dragão, Kobolds, A Ilha,
Sistemas O Mantra, O Campanário, nascido”, A Espiral, Dáctilos, A Caverna,
As Armas, O Zigurate, A Orgia, O Caracol, Osíris, O Mandala,
A Vedação, A Águia, O Messias, O Urso, As Tintas, A Barca,
A Circuncisão, A Calhandra, A Pedra O Cordeiro. As Pedras O Saco,
A Tonsura, etc. A Pomba, Filosofal, A Lebre, Preciosas, O Ovo,
Júpiter, etc. A Música, etc. A Roda de fiar, Melusina, O Leite,
O Isqueiro, O Véu, O Mel,
A Baratte, etc. O Manto, O Vinho,
A Taça, O Ouro, etc.
O Caldeirão,
etc.
Fonte: DURAND, G., 2001, p. 441.

Compondo internamente os regimes de imagens encontramos a dinâmica das


estruturas antropológicas, expressando, principalmente, a maneira como o ser humano
enfrenta a angústia provocada pelo passar do tempo e o medo da morte. Conforme P. Auger,
77

citado por G. Durand (apud LAHUD LOUREIRO, 1998, p. 15) “a imaginação consola o
homem da fugacidade do tempo”.

Para Lahud Loureiro (ibidem, p. 14-15)

“(...) o homem, numa ambivalência louca, procura o remédio para vencer o


tempo, a angústia da certeza da sua finitude, da sua morte, ao mesmo tempo em que
se acredita imortal. O tempo é medido pela imaginação o que se expressa em mitos,
(...)”
Assim considerando que, nesse movimento constante, as estruturas do imaginário se
alteram, são mutáveis, esta pesquisa investigando o imaginário de um grupo de alunos-idosos
da UnATI/UCB e de seus dirigentes, identifica a sua maneira e a sua capacidade de se
organizar e se re-organizar, como registrado no objetivo explicitado no capítulo 4. Trata-se,
portanto, de indicativos para uma “organicionalidade antropolítica”22. Oferece pistas/vetores
para a possível re-organização, se requerida, da UnATI/UCB, considerando nesta ação a
dimensão simbólica.

Excluído: ¶
5.2 – Teoria da Complexidade, de Edgar Morin Excluído: ¶

“(...) a natureza humana jamais deixou de suscitar a interrogação (...)”


(EDGAR MORIN, 1973, p. 20)
Excluído: ¶
O ser humano, por sua natureza incompleta e neotênica, jamais deixou de levantar
perguntas, de querer descobrir o novo, descobrir o que lhe afeta, o que ainda não entende e o
que o completará. Ele se busca, procurando entender-se no mundo; tenta entender a
complexidade das coisas, complexificando com sua presença as coisas; coisas que o ameaçam
pela desordem, mas que, ao mesmo tempo, lhe são benéficas, pois induzem à possibilidade de
re-organização. A dicotomia ordem-desordem se nutre uma da outra e está fundamentada nos
princípios de organização da vida que são os da complexidade relacional. Nas relações do
homem consigo mesmo e com a sociedade surgem as diferenças e necessidade humana de se
organizar ou re-organizar cedendo e criando; lutando ou se aceitando ou discordando e
acomodando, o que nos remete às estruturas antropológicas do imaginário – heróica, mística
ou disseminatória.

Segundo Edgar Morin (1973, p.138),

22
Organizacionalidade antropolítica, considerada com Paula Carvalho, uma organização sempre se fazendo e
refazendo centrada no próprio homem. (1990, 17).
78

“(...) não há integração nem adequação imediata entre o cérebro e o meio


ambiente com a comunicação entre um e outro, sendo aleatória, turva, submetida
sempre a possibilidade de erro. Nenhum dispositivo no cérebro permite distinguir
os stimuli externos dos stimuli internos, isto é, o sonho da vigília, a alucinação da
percepção, o imaginário da realidade, o subjetivo do objetivo.”
O autor considera (idem) que entre o cérebro humano e seu meio ambiente há um
‘information gap’ que faria do sapiens o animal mais desprovido, se ele não o pudesse
preencher, pelo menos em parte, com vivências e experiência cultural acumulada e com o
aprendizado pessoal.

Afirma, ainda, que

“(...) a ilusão, a desordem, o erro, o ruído vão acompanhar sem interrupção a


atividade pensante do sapiens (...) nenhum sistema de idéias, nenhuma teoria
poderá jamais se voltar a fechar; uma de suas proposições será sempre impossível
de se determinar; aquilo que abre indefinidamente a aventura espiritual.” (ibidem,
p. 139)
Para ele, a ilusão, a desordem, o erro, são ações no pensamento humano que está em
atividade constante e diz que

“(...) o cérebro humano precisa do ecossistema, da cultura, da sociedade, da


práxis, para estabelecer suas verdades, o que o leva a procurar na e pela natureza,
na e pela cultura, na e pela sociedade, na e pela prática, a solução de suas
incertezas.” (ibidem, p. 138).
Daí entender-se que o homem não é apenas razão (racional), ele é também
afeição/emoção. São as recordações, as lembranças e imagens que formam nossa vida interior,
que constrói o logos – discurso -, o pensamento, as palavras, a razão, a ação, no sentido
original e profundo (ibidem, p. 133).

A criação das imagens tidas pelo homem precisa ser, de início, irreal para depois se
tornar real. É satisfatório saborear a realização de uma situação imaginada. Pierre Auger e
Jacques Monod (apud MORIN, 1973, p. 226), consideram que o

“(...) homem é portador de um novo reino, o das idéias (...) as idéias unem-
se em seqüências organizadas, tornando-se mitos ideológicos, seres antropomorfos,
o que as torna ainda mais semelhantes aos seres vivos (....).”
O homem, de acordo com Morin (2003, p. 58) é um ser complexo, pois traz em si, de
modo bipolarizado, caracteres antagonistas: “O homem do trabalho é também o do jogo. O
homem empírico é também o homem imaginário. (...) O homem prosaico é também o da
poesia, (...), da participação, do amor, do êxtase”. Desta forma, o homem não vive apenas de
racionalidade, ele se entrega, se dedica a várias atividades de cunho diferentes. Ele acredita na
vida, é ritualístico, mítico, místico, “crê nas virtudes do sacrifício, viveu freqüentemente para
preparar sua outra vida além da morte” (ibidem, p. 59). Como será que os alunos idosos da
UnATI/UCB percebem, sentem, ... imaginam esta polivalência?
79

O valor que a fantasia e o imaginário possuem para o ser humano é extremo. Morin
(ibidem, p. 20) escreve que;

“(...) as vias de entrada e saída do sistema neurocerebral, que colocam o


organismo em conexão com o mundo exterior, representam apenas 2% do conjunto,
enquanto 98% se referem ao funcionamento interno, constitui-se um mundo
psíquico relativamente independente, em que fermentam necessidades, sonhos,
desejos, idéias, imagens, fantasias, e este mundo infiltra-se em nossa visão ou
concepção do mundo exterior.”
Para Morin (1973, p. 226) o caráter mais original do sapiens está no surgimento
noológico (universo que vai dos sonhos às idéias e das estruturas mitológicas às estruturas
lógicas). “Produto de nossa alma e mente, a noosfera está em nós e nós estamos na
noosfera”. (ibidem, p. 29). Os mitos e as idéias se encorparam,

“tomaram forma, consistência e realidade com base nos símbolos e nos


pensamentos de nossa inteligência. (...) Mitos e idéias voltaram-se sobre nós,
invadiram-nos, deram-nos emoção, amor, raiva, êxtase, fúria. (...) As sociedades
domesticam os indivíduos por meio de mitos e idéias, que, por sua vez, domesticam
as sociedades e os indivíduos, mas os indivíduos poderiam, reciprocamente,
domesticar as idéias, ao mesmo tempo em que poderiam controlar a sociedade que
os controla. As idéias existem pelo homem e para ele, mas o homem existe também
pela idéias e para elas.(...).” (idem).
Segundo Edgar Morin existe complexidade quando elementos diferentes são
inseparáveis, constitutivos do todo e há uma interdependência, interatividade e inter-
retroatividade entre “o objeto de conhecimento e o seu contexto, as partes e o todo, o todo e
as partes, as partes entre si”, (ibidem, p. 38) a complexidade é a união entre a unidade e a
multiplicidade. O homem é um ser complexo e assim o idoso como indivíduo também o é. A
organização é complexa e o idoso, ser humano que vive em sociedade é complexo. Nenhum
homem é uma ilha e assim a relação entre eles complexifica a vida em grupo. A UnATI/UCB
é um grupo formado complexicamente por “diferentes”, “inseparáveis”: dirigentes e alunos
idosos. O homem constitui, ele próprio, um micro-universo mítico, micro-universo que por
sua vez comporá o universo mítico. Morin considera, ainda, que o homem “traz em si
multiplicidades interiores, (...) uma infinidade de personagens quiméricos, uma poliexistência
no real e no imaginário. (...) Cada qual contém em si galáxias de sonhos e de fantasmas ...
(ibidem, p. 57-58).

Repetindo Bachelard, registramos que há “(...) a vontade que sonha e que, ao sonhar
dá um futuro a (...) ação”. Cabe aqui anotar com Andrade, citada por Lahud Loureiro,
(2004a., p. 3) quando escreve: “os velhos (...) parecem manter ou ter acordado para uma
grande capacidade de sonhar”.
80

Diante de tantos conflitos e crises, presentes em nossa sociedade o que agrava a


dificuldade de tratar com essas situações é a maneira como conduzimos o nosso pensamento,
porque estamos embebidos ou submersos na globalidade turbilhonar da sociedade e do
mundo.

“Necessitamos (...) conceber a insustentável complexidade do mundo no


sentido de que é preciso considerar a um só tempo a unidade e a diversidade do
processo planetário, suas complementaridades ao mesmo tempo que seus
antagonismos. O planeta não é um sistema global, mas um turbilhão em movimento,
desprovido do centro organizador.” (MORIN, 2003, p. 64)
Parece-nos, então que a união epistemológica entre natureza e cultura, tanto, no
“trajeto antropológico” de G. Durand quanto na noção de “esfera noológica” ou “anel
recursivo” de Morin, acontece através da função simbólica: mediações simbólicas nas práticas
simbólicas.

O ser humano traz em consigo, desde o nascimento até a morte, as simbologias e a


complexidade; complexidade de pensamento, de organização. Dai a necessidade permanente
de organização e reorganização, com a consideração do imaginário.

Edgar Morin (1973, p. 91) considera que

“o desenvolvimento da complexidade social exige, por parte do cérebro


individual, um conhecimento cada vez mais extenso e preciso do mundo exterior
(meio ambiente) e do mundo interior (sociedade), uma memória cada vez mais
ampla, possibilidades associativas múltiplas, aptidões para tomar decisões e para
encontrar soluções num grande número de situações diversas (...)”
É neste contexto que a educação permanente tem um papel crucial para a sociedade e
para o homem. As UnATI’s podem criar no homem idoso ou no grupo de idosos
possibilidades múltiplas de ampliação de conhecimentos e resgate da cidadania, fazendo com
que o idoso se sinta parte integrante da história, como idealizador, construtor e integrante;
capaz de sonhar, rir, imaginar, lembrar e vislumbrar um futuro.

Os simbolismos estão a mediar as práticas sociais. A educação é uma prática social,


daí a preocupação em conhecer e considerar a dimensão simbólica na organização ou re-
organização de uma UnATI, no caso UnATI/UCB, uma organização dinâmica.
81

Excluído: ¶

5.3 – Culturanálise de Grupos, de Paula Carvalho
Excluído: ¶
(resenhar Edgar Moran)¶
“(...) ¶
E a agulha do real
Nas mãos da fantasia
Fosse borbando ponto a ponto Nosso dia a dia (...)”
Gilberto Gil

Paula Carvalho cria a Culturanálise de Grupos apoiando-se em princípios, hipóteses e


resultados contidos na Teoria da Complexidade, de Edgar Morin e na Antropologia do
Imaginário, de Gilbert Durand indicando uma Antropologia das Organizações (1990).
Desenha uma antropologia das organizações, que levando em conta a Teoria das
Organizações, faz uma crítica a esta notadamente ao paradigma clássico por ela assumido,
propondo uma nova “visão de mundo” na organização voltando-se para a nova sociedade,
novo homem, em uma consideração neguentrópica de organização.
Excluído: ¶
Para Lahud Loureiro (1998, p. 19) a culturanálise

“é um campo de pesquisa, um “objeto” a ser investigado, mas também, “um


instrumento” – ferramenta para conhecer e mapear a cultura do(s) grupo(s)
formado(s) ou em formação: é um elemento de base na descoberta dos indicadores
sociais e antropológicos, um diagnóstico sócio-antropológico da existência do
grupo e, como tal, oferece a possibilidade de acerto ou conserto, da alteração do
rumo das atitudes diárias, constantes e habituais do grupo, se este assim julgar
necessário.”
A representação das reações características do grupo, conhecidas pela culturanálise,
atua como dado, que demonstra a mescla, o ponto de culminância entre a teoria e prática,
entre o eu interior e o exterior, que poderá ser utilizada como intervenção e, se necessário,
poderá gerar mudança de situação. (LAHUD LOUREIRO, 1993, p. 50).

A culturanálise pode ser vista como um “sistema metabólico de trocas” entre os


termos de base e a recíproca alimentação do sistema; “como um sistema que faz comunicar
dialetizando como interação, conservando as diferenças e a pluralidade”. (idem).

Paula Carvalho a partir da análise da cultura e da prática refere-se a uma relação


recursiva – complementar - e uma concorrente e antagonista – que além de buscar a dimensão
simbólica, permite uma análise mais profunda da realidade -. Paula Carvalho (apud LAHUD
LOUREIRO, 1998, p. 19-20), propõe a culturanálise de grupos, como “teoria/instrumento
(sócioantropográfico) de análise da realidade da cultura que, com Morin, entende como ‘um
sistema que faz comunicarem-se – dialetizando – uma experiência existencial e um valor
constituído’: pólos latente e patente.”
82

O pólo patente é evidente, objetivo. Está relacionado com o nível racional, com as
interações grupais, atua como fator de agregação do grupo. É o espaço de ação com diretrizes
solidificadas ou a serem perpetuadas. Na cultura patente todos “(...) olham pela mesma lente,
com a mesma cor, mas que, no fato de nem todos verem da mesma cor e tamanho, apesar da
mesma lente, reside a possibilidade, evidências das emiscões da cultura latente” (LAHUD
LOUREIRO, 1993, p. 51). “É o nível racional de funcionamento do grupo regido pelos
perceptos e pelas funções conscienciais pragmático-reflexivas (...)”, que traduz a organização
do grupo “como uma estrutura racional produtiva”. (PAULA CARVALHO apud LAHUD
LOUREIRO, 1993, p. 51).

No grupo formado pela racionalidade organizacional ocorre que os meios passam a


ser considerados como fins em si mesmo, originando, então,

“a tecnoestrutura e a manipulação protético-instrumental do significado da


ação do grupal; as molduras estruturais constituídas amarram o grupo no
instituído, reificando as atividades na sistematização da cultura e do imaginário do
grupo.” (PAULA CARVALHO apud LAHUD LOUREIRO, 1993, p. 52).
O pólo latente é oculto, subentendido e está relacionado com o subjetivo, com a
emoção, com a imaginária e as fantasmatizações; remete a cultura a um “plasma existencial”
(PAULA CARVALHO, 1990 a, p. 40).

Na fronteira entre os 2 (dois) pólos – patente e latente – podemos perceber o sentido


da culturanálise de grupo, que

“(...) desenvolverá a dialética inter-polos, identificando, no mapeamento da


‘existenciação’ do grupo, as ‘redes’ de termos expostas; (...) desenvolverá o circuito
da ativação – apropriação simbólica, (...) construção simbólica” (PAULA
CARVALHO apud LAHUD LOUREIRO, 1993, p. 55).
Lahud Loureiro (1998, p. 20) considera que

“(...) para desvendar os mistérios do pólo latente, é preciso considerar os


arquétipos que trazem em si as sedimentações de uma cultura patente (...) no
‘trajeto antropológico’ onde se realiza a simbiose do latente e do patente é que
incide a busca do imaginário.”
Percebe-se que a culturanálise, sendo um instrumento, é capaz de identificar a
realidade e a consciência de um grupo, ao mesmo tempo: tanto objetivo quanto
subjetivamente.

Morin (apud PAULA CARVALHO, 1990 a, p. 40) percebe que no campo semântico
a culturanálise está em constante oscilação

“(...) entre uma ‘definição totalizadora’ e uma ‘definição residual’, ou seja,


por um lado o termo oscila entre ‘sentido totalizador’ e um ‘sentido residual’ e por
outro lado, entre o ‘sentido antropo-sócio-etnografico’ e um sentido ético-estético.”
83

Morin (2003, p. 105-106) concebe a complexidade do gênero humano como

“(...) indivíduo/sociedade/espécie são não apenas inseparáveis, mas co-


produtores um do outro. Cada um destes termos é, ao mesmo tempo, meio e fim dos
outros. Não se pode absolutizar nenhum deles e fazer de um só o fim supremo da
tríade; (...) Estes elementos não poderiam, por conseqüência, ser entendidos como
dissociados: qualquer concepção do gênero humano significa desenvolvimento
conjunto das autonomias individuais, das participações comunitárias e do
sentimento de pertencer à espécie humana. No seio desta tríade emerge a
consciência.”
De acordo com Paula Carvalho, a antropologia das organizações que está centrada

“(...) na estruturação e funcionamento da relação cultura


organizacional/personalidades modais, precisará de uma ‘culturanálise’ onde,
junto com a autonomia atribuída ao fator cultural na dinâmica sócio-psico-
organizacional global (Sahlins, Crespi), estará configurado o centro cognitivo-
actancial na noção de ‘esfera noológica’ (Morin) ou ‘imaginário’ (Durand), como
sendo o universo das representações coletivas, das imagens simbólica, em suma,
das práticas simbólicas.” (1990 a, p. 23-24)
Para Gilbert Durand (apud LAHUD LOUREIRO, 1993, p. 66) o imaginário não é
apenas o “capital inconsciente de gestos do sapiens”, é também o “capital de competência
simbólico organizacional”. E, foi na organização da UnATI/UCB que se realizou uma
culturanálise do grupo, mapeando sua cultura para descobrir os desejos do grupo organizado
para traçar sua paisagem mental, a imagem mental da simbiose cultura latente e ação
instituinte. Para tal valemo-nos do Arquétipo Teste de Nove Elementos, de Yves Durand,
teste que a seguir apresentamos na suas bases teóricas e orientação para a sua conseqüente
utilização prática.

Excluído: (resenhar
Cultura – de preferência Laís
5.4 – AT-9 - Arquétipo Teste de Nove Elementos, de Yves Durand Mousinho¶
e Paula Carvalho)¶
Excluído: ¶
“(...) Começamos a compreender hoje algo que o século XIX, não podia nem
mesmo pressentir: que o símbolo, o mito, a imagem pertencem à substância da vida
espiritual, que podemos camuflá-los, mutilá-los, desgradá-los, mas que jamais
podemos extirpá-los.”
Mircea Eliade

O Arquétipo Teste de Nove Elementos, o AT – 9, foi criado por Yves Durand a partir
da sistematização das estruturas antropológicas do imaginário de Gilbert Durand. Seus
resultados validaram a teoria do antropólogo, confirmando a existência das estruturas
imaginárias.

Gilbert Durand trabalha sua Teoria do Imaginário partindo do pressuposto que a


imaginação humana representa simbolicamente “a angústia do passar do tempo e o medo da
morte” – finitude – e que a imaginação tem potência organizativa.
84

O teste AT – 9 consiste na criação de uma dramatização, registrada como um


desenho imaginado sob o estímulo de 9 (nove) elementos, estímulos arquétipos, formando
uma história integrada, que a seguir é contada de forma escrita. Os elementos são: uma
queda, uma espada, um refúgio, um monstro devorante, alguma coisa cíclica (que gira,
que produz ou que progride), um personagem, água, um animal (pássaro, peixe, réptil ou
mamífero), e fogo.

Após a elaboração pictórica, uma narrativa, discurso ou história é relatada por


escrito, ou quando impossibilitado de escrever, o sujeito-autor conta a história que é transcrita
pelo pesquisador, o que veio a acontecer com 4 (quatro) sujeitos desta pesquisa – protocolos
nº 6, realizado por Édipo; nº 16, realizado por Aglaia; nº 17, realizado por Láquesis; e nº 17,
realizado por Pandora -. De forma semântica, as imagens se apresentarão neste discurso
imaginado, que conta a história do desenho, à luz dos elementos evidenciados na consigna do
teste. Faz parte do teste um quadro síntese para a identificação das imagens representacionais
de cada um dos nove elementos, a função, o papel de cada um destes elementos na
dramatização imaginada e como cada elemento foi simbolizado pelo sujeito-autor, que
participa dele como autor da sua história. Um pequeno questionário padronizado no teste
busca informações complementares para auxiliar ou complementar a identificação do
imaginário. A pictografia deverá ser desenhada, a lápis, mas não poderá ser usada a borracha.
É preciso que o sujeito-autor registre sua idéia-primeira sem nenhuma influência de outrem ou
exterior. O tempo para realização do teste é, em princípio, de 30 minutos, mas este poderá ser
estendido.

Segundo Lahud Loureiro (1998, p. 25),

“(...) a escolha dos elementos/estímulos não se deu aleatoriamente. Yves


Durand selecionou os 9 (nove) elementos, considerando seus significados mais
profundos, para servirem de motivação/estímulo ao traçado gráfico e discursivo,
representativos da trama criada pelo sujeito.”
Cada um destes elementos tem um significado, e sua interpretação é feita dentro de
um contexto, pois o imaginário não é apenas o conjunto das imagens, mas sim o conjunto
relacional destas imagens. O símbolo só é entendido quando contextualizado. Ele é variável,
no que difere do arquétipo que é universal. É preciso estar contextualizado o símbolo para
apresentar sentido.

Os 9 (nove) elementos são estímulos arquetipicos que trazem à tona a estrutura


antropológica do imaginário do sujeito-autor da dramatização registrada no protocolo do teste;
85

imaginário pleno das suas angústias, medos, esperanças, desejos e pressões (simbiotizados)
que podem ser lidos, durandianamente, na disposição ou organização dos “enxames” de
imagens (pictóricas e semânticas) em torno de um pólo, nó aglutinador, energia psíquica, que
identifica o regime – diurno ou noturno - das imagens a que pertencem.23

Yves Durand, com o AT-9, busca compreender de que maneira se organiza, o


conjunto das mensagens míticas, considerando os regimes ou polaridades (diurno e noturno) e
os 3 (três) modos de estruturas dos universos míticos (esquizomórficas ou heróicas, mística ou
antifrásicas e sintéticas ou disseminatórias) conforme a teoria do imaginário, de Gilbert
Durand.

Conforme Lahud Loureiro (1998, p. 32), baseada em Gilbert Durand e Yves Durand,
a busca das imagens e a identificação das estruturas acontecem no “trajeto antropológico”
onde nossas ações e palavras não significam apenas nossa vontade nata, elas expressam,
também, influências culturais e sociais numa espécie de simbiose, após uma via de mão dupla,
onde não existe mais o eu interior ou exterior, mas sim um terceiro ponto de identificação.
Este trajeto é dinâmico, silencioso, e apesar de sedimentado na cultura, e muitas vezes no
mesmo contexto, mostra que os indivíduos e os grupos se diferenciam, e se revelam através de
símbolos e de mitos diferentes. Os grupos e a sociedade são controlados por mais mitos do
que eles e ela podem controlar. Existe a força mítica a impregnar as ações, as organizações e
desorganizações.

Lahud Loureiro (1998, p. 32) amparada em Yves Durand registra que o símbolo é o
“termo que comporta sempre a idéia de reunião de um ‘sentido’ e de uma ‘imagem’: de um
aspecto ‘vivido’ (o sentido) de um comportamento ‘espacial’ (a imagem).” Assim sendo, o
teste AT-9, se compõe de um desenho (imagem) e de uma narrativa (sentido).

Segundo Yves Durand (1988, p. 45)

“(...) o princípio constitutivo da imaginação consiste, segundo G. Durand, a


representar, a figurar, a simbolizar as faces do Tempo e da Morte a fim de lhes
dominar. O desejo fundamental consiste em reduzir a angústia existencial ligada a
todas as experiências negativas do tempo ao sujeito, dentre as quais é necessário
anotar particularmente a agressividade devorante, a noite e a água terrificante e a
queda catastrófica.”
Cada um dos 9 (nove) elementos proposto no Arquétipo Teste de Nove Elementos –
AT-9, possui um significado próprio, segundo o seu criador; porém, os elementos “espada”,
“refúgio” e “algo cíclico” são importantes para a identificação da estrutura do universo

23
O regime das imagens está explicitado no capítulo 5, item 5.1, desta dissertação.
86

mítico, se esquizomórficos, místicos ou sintéticos, respectivamente. Os demais elementos,


apenas completam o sentido, deste universo, criado pelo sujeito-autor. Apresentamos, abaixo,
resumidamente, a significação simbólica de cada elemento.
Formatados: Marcadores e
1. Queda – A queda quando representada como sendo do personagem, pode numeração

significar a perda de um ponto de apoio, a perda do equilíbrio, o cair realmente. Ela representa
muito mais que um simples elemento, pode representar um schème fundamental. O elemento
queda para ser representado necessita dar forma à “qualquer coisa que cai” (DURAND, Y.,
1988, p. 147). Segundo Gilbert Durand pode representar a catamorfia, podendo ser positiva ou
negativa. Há a idéia de cair para poder se levantar. Para Lahud Loureiro (1998, p. 25) a queda
pode “designar o erro existencial da angústia humana e representa, mais facilmente, o fim, a
morte, do que a origem, a vida”.

2. Espada – É a arma típica do universo heróico. Pode estar inserida em 3 níveis de


agrupamento diferente, dependendo da representação simbólica, pode significar um combate,
uma defesa (corte, separação) ou características purificadoras, mágicas. Uma espada pode
também se integrar ao universo místico, como função decorativa e qualquer outro objeto,
como bastão, espeto, pode ser usado como função defensiva e representar uma espada. De
acordo com Lahud Loureiro (ibidem, p. 26)

“O gládio e a espada não têm a função de penetrar e sim de cortar, de


separar. Pode a espada representar poder paterno, pureza e pode colocar em
evidência características apolíneas purificadoras, mágicas: espada do herói
mitológico”.
Formatados: Marcadores e
3. Refúgio – Simboliza a proteção, o aconchego. Proteção para o descanso ou para o numeração

esconderijo. Remete ao regime noturno das imagens e à estrutura mística. O simbolismo pode
ser positivo ou negativo.

“A imagem da figura materna representa o refúgio primordial (...). Para o


imaginário heróico o refugio será sempre um lugar de ‘refúgio contra’ o perigo,
enquanto para o imaginário místico ele (...) é uma imagem de recipiente,
simbolizante de bem estar e da vida em paz.” (ibidem, p. 27)
Formatados: Marcadores e
4. Monstro devorante – Representa a “noite inquietante (...) o tempo angustiante” numeração

(ibidem, p. 26). O monstro simboliza a morte. O arquétipo do monstro pode ser representado
de forma bastante variada quanto às imagens, pois pode representar-se em imagens de
animal/zoomorfia (real, pré-histórica e fantástica), antropomorfia (com forma humana real e
fantástica), meio ambiente (natural e produto humano), abstração (redução figurativa) e
imagem não figurada. (DURAND, Y., 1988, p. 156-157). Trata-se do estímulo arquetípico
87

que suscita a idéia de morte, mas também pode, raramente, identificar aspecto positivo no
contexto do imaginado na dramatização.

5. Alguma coisa cíclica (algo que gira, que produz ou que progride) - Induz pensar
em algo prolongado, com movimentos. Pode ser colocado tanto num regime diurno quanto
num regime noturno das imagens. Sugere o imaginário sintético (quando alude ao movimento
rítmico, lembrando a dominante sexual, copulativa, rítmica de movimento), porém, algo
cíclico pode estar presente, também, num imaginário heróico (de acordo com o movimento da
mão do personagem para pegar uma espada) ou num imaginário místico (quando se refere ao
movimento da lua, a ciclo de menstruação). Yves Durand (1988, p. 161), encontrou em sua
pesquisa que

“A iconografia do elemento cíclico se reparte (...) entre os fenômenos


naturais ou atribuídos aos seres vivos – 51% (...) e os objetos construídos pelo
homem – 31% (...). Ela se aplica a vários tipos de movimentos figurados: a) o
movimento cíclico fásico (sol, lua, estações do ano); b) o movimento cíclico
contínuo (moinho, broca); c) o movimento progressivo da tempestade que se
aproxima, da água ou das pedras que rolam da montanha; d) o movimento
evolutivo da expansão (implícito nas respostas tal qual a flor, fruto), e de
reprodução (acasalamento, postura de ovos).”
Formatados: Marcadores e
6. Água – A água é considerada um elemento complementar no teste AT-9. Sua numeração

simbolização é polivalente; dependendo do estado que a mesma se apresenta, se está parada,


se apresentando perigo, se calma, pura, cíclica, ou de outra forma e noutro contexto. Daí
poder ser associada a todos os universos míticos. Segundo Yves Durand (1988, p. 64), a água
esquizomorfa (heróica) está relacionada a limpeza no sentido de purificação. A água mística
se colore e se condensa, se materializa, ao ponto de ser assimilada à substância de uma
imaginação noturna, é dormente, parada, perigosa (água negra e hostil), lembra a fatalidade,
uma viagem sem retorno; pode também ser associada ao líquido amniótico – água protetora
(LAHUD LOUREIRO, 1998, p. 29). A água sintética é representada pelo ciclo da água, da
chuva fertilizante, promessa de crescimento vegetal (DURAND Y., op.cit., p. 65).

7. Animal – Também é considerado um elemento complementar no teste AT-9. Sua


simbolização é polivalente. “À primeira vista, o simbolismo animal parece ser bastante vago
porque demasiado comum (...) pode agregar valorizações tanto negativas (...) quanto
positivas (...)” (DURAND, G., 2001, p. 69). A simbologia animal pode remeter a qualquer
uma das estruturas do imaginário (heróico, místico ou sintético). Pode remeter a estrutura
heróica com a “representação de certos pássaros, aves de rapina, águia (a pomba é mística)”
(LAHUD LOUREIRO, op.cit., p. 30); o acessório da asa é o centro das metáforas do ar e da
ascensão. O elemento animal pode remeter ao místico quando envolve a representação de
88

peixes e pode remeter ao sintético, quando, por exemplo, é desenhado uma serpente, que é o
símbolo da transformação temporal - mudança de pele -, da fecundidade e da perenidade
ancestral. Segundo G. Durand o que identifica a estrutura do imaginário não é o animal em si,
mas sim as qualidades que o animal possui. Nos símbolos teriomorfos, o autor inclui o
polimorfismo do simbolismo animal: agrega valorizações tanto negativas, exemplo aos
répteis, ratos e pássaros noturnos, como positivas, exemplo aos animais domésticos e a
pomba. A função devoradora, negativa, do animal é amplamente expressa na obra “As
Estruturas Antropológicas do Imaginário”, onde encontramos termos como moder, mastigar,
comer, ao se referir ao animal.

Gilbert Durand alerta que

“Quanto mais elevada é a porcentagem de respostas animais, mais o


pensamento está envelhecido, rígido, convencional ou invadido por humor
depressivo. A grande proporção de respostas animais é sintoma de um
bloqueamento da ansiedade. Mas, sobretudo, quando as respostas cinestésicas são
acompanhadas com as de animais, tem-se a indicação de uma invasão da psique
pelos apetites mais grosseiros, acidente normal na criança pequena mas no adulto é
sinônimo de inadaptação e regressão às pulsões mais arcaicas. O aparecimento da
animalidade na consciência é portanto sintoma de uma depressão da pessoa até os
limites da ansiedade.” (DURAND, G., op. cit., p. 73).
Formatados: Marcadores e
8. Fogo – É mais um elemento considerado complementar no teste AT-9. Sua numeração

simbolização também é polivalente. Segundo Lahud Loureiro (1998, p. 30), amparada em


Yves Durand (1988, p. 66)

“O fogo purificador faz parte do simbolismo heróico; o calor, indispensável


à nutrição, é isomorfo da estrutura mística (‘calor doce’, fogo significando calor
sexual, rituais iniciáticos, ou passagem da vida para morte); remetendo à estrutura
sintética, encontramos o fogo epifânico (fogueira de São João), símbolo de Deus,
renascimento, mediador entre a natureza e a cultura; pode contribuir e acentuar
seu semantismo angústiante de destruição, de fim, de morte, quando em forma de
cataclisma: ‘incêndios, vulcões, guerras, seca, sol devorador e tenebroso e
instabilidade do tempo’.”
9. Personagem – É o ator, o agente da história, o protagonista da dramatização, no
qual o sujeito-autor se projeta. Pode aparecer no desenho, como apenas um personagem ou
como mais de um, ser masculino ou feminino, ser representado como bom ou mau, ser
simples, pescador, pastor, cavalheiro medieval, caçador, ser um animal, “n” outros. Pode estar
de pé, sentado, deitado, perto ou longe dos demais elementos solicitados no teste. É todo o
contexto no qual se insere o personagem e a sua postura na história que dará significação
dentro do universo mítico (heróico, místico ou sintético).

Segundo Lahud Loureiro (1998, p. 32), Yves Durand procura compreender como se
dá a organização interna do conjunto das mensagens míticas, considerando os dois regimes –
89

diurno e noturno - e os três tipos de estruturas dos universos míticos - heróico, místico ou
sintético - especificados por Gilbert Durand.

“É sobre o “trajeto antropológico” que incide a busca das imagens e a


classificação das estruturas, pois a permuta entre as exigências exteriores do
social, sedimentado na cultura - que parece querer os homens todos iguais – e os
sonhos - ou ‘loucuras’ internas, intimas e silenciosas, que diferenciam os indivíduos
– se expressam nos símbolos.” (idem)
Lahud Loureiro diz, ainda, que

“A leitura do universo mítico se dará no conjunto, gráfica e semanticamente


registrado no teste, destes nove elementos arquetipicos – considerados estímulos à
imaginação, para representar, de forma adequada ao grau da angústia do passar
do tempo e medo da morte – as imagens simbólicas e posições interligadas,
demonstrativas da estrutura do imaginário, seja heróica, mística, sintética ou
defeituosa.” (ibidem, p. 31)
Pelo próprio fato de ocorrer um “trajeto antropológico”, as estruturas dos universos
míticos não podem ser rígidas e Yves Durand (1998, p. 83-123), no intuito de abarcar mais da
situação mítica em suas nuances, subdividiu cada uma delas.
Formatados: Marcadores e
1. Estrutura Esquizomórficas (Heróica) – Neste micro-universo mítico, a numeração

centralização está na ação heróica do personagem em combate contra o monstro, utilizando


sua espada. Yves Durand (1988, p. 75) afirma que esta estrutura temática se organiza em
torno de três elementos essenciais: o personagem, a espada e o monstro.

“O monstro é geralmente valorizado por seu tipo/tamanho (...) e por sua


goela dentada exprimindo sua agressividade. Sua função consiste em representar
um perigo existencial, uma ameaça para o personagem: obstáculo, perigo para a
vida, para os seus, para sua habitação (...). A morfologia desta espada e o modo de
utilização que é feita pelo personagem vão situar o poder deste último em relação
ao monstro. Também o agrupamento simbólico monstro-espada-personagem é
suscetível de variações segundo as modalidades de relação de antagonismos do
monstro ao personagem.” (idem)
O criador do teste, Yves Durand, subdivide a Estrutura Esquizomórfica (Heróica)
em:
Formatados: Marcadores e
1.1 Super-heróico – A composição é centrada apenas na espada, monstro e numeração

personagem. A representação do monstro é acentuada e existe uma super-


valorização do combate. Os outros elementos são até mesmo
desconsiderados, não se fazendo representar nem no desenho nem no
discurso. Eles não concorrem para a coerência mítica da história.

1.2 Heróico integrado – Todos os nove elementos participam, com perfeita


integração, funcionalmente e/ou simbolicamente.
90

1.3 Heróico impuro – Existe certa “coexistência de um universo heróico


atualizado e de um universo místico mais ou menos potencial” (ibidem, p. 87).

1.4 Heróico descontraído – A ação heróica do personagem é diferente: o herói


não combate efetivamente numa cena representada, ele já combateu ou ainda
vai combater. Atualmente ele é um, guerreiro em descanso (ibidem, p. 91).

A característica comum das quatro categorias do micro-universo mítico heróico

“reside numa força de coesão heróica. Essa força de coesão se manifesta


por um simbolismo para o combate, à separação, o maniqueísmo, a partir de uma
problemática existencial que diz respeito ao personagem-herói confrontado ao
perigo, a uma ameaça figurada por um monstro.” (idem).
Formatados: Marcadores e
2. Estrutura Antifrásica (Mística) – Nos micro-universos situados/pertencentes nesta numeração

estrutura a ação está centralizada numa “atmosfera de descanso, de equilíbrio, de harmonia


dentro do qual se desenrola a vida do personagem” (ibidem, p. 77). O refúgio é o elemento
base desta estrutura, porém, ele não configura uma proteção contra um perigo existencial,
trata-se apenas de um lugar calmo. Contudo, Yves Durand afirma que a “existência do
personagem não é sempre calma” (ibidem, p. 79), pois o refúgio pode perder sua função de
proteção e pode ocorrer um espaço de insegurança devido os perigos múltiplos. A atuação dos
elementos monstro e espada são confusas e a solução da história pictografada/narrada definirá
os subtipos desta estrutura.

Subdivisões da Estrutura Antifrásica (Mística):

2.1. Super mística – Segundo Yves Durand (ibidem, p. 94) neste caso o repouso do
personagem está em torno do refúgio ou de uma paisagem, mas falha o
arquétipo da espada, ou seja, a síntese está incompleta.

2.2. Mística integrada - Os nove elementos participam, com perfeita integração,


funcionalmente e/ou simbolicamente, dentro do tema místico. Neste tipo de
estrutura mística, existe uma atmosfera bem-sucedida, pois os elementos
monstro e espada são eufemizados pela desfuncionalização. Segundo Yves
Durand (ibidem, p. 92-94),

“a principal dificuldade dos sujeitos que escolhem o imaginário místico diz


respeito à integração dos arquétipos monstro e espada, cuja função e o simbolismo
são respectivamente mais adaptados ao imaginário heróico e/ou a uma imaginação
agoniante do que uma vida calma.”
2.3. Mística Impura – Aparece indício do regime heróico, porém os símbolos da
espada e do monstro não estão dinamicamente integrados dentro do
91

agrupamento simbólico, ou seja, eles não têm nenhum papel no desenrolar da


história. “Sua presença será justificada no discurso por uma seqüência sem
relação direta com o tema principal” (ibidem, p. 97).

2.4. Mística lúdica – Caracteriza-se pela participação de mais vida, mais


espontaneidade do que os outros temas místicos. Existe uma integração de
símbolos heróicos sem que o tema central perca sua simbólica mística. Sugere
a ação heróica e até a existência de um combate, mas este aparece como numa
brincadeira.

A característica comum das quatro categorias do micro-universo mítico místico

“reside numa força de coesão mística. Essa força de coesão cristaliza uma
atmosfera de descanso, de calma, marcada em todas as categorias e se atualiza
pela organização dos nove elementos num espaço criado do quadro ao seu
arranjo.” (ibidem, p. 99).
Formatados: Marcadores e
3. Estrutura Sintética (Dramática) – Neste micro-universo “as seqüências heróicas e numeração

místicas são atualizadas como subconjuntos em uma estrutura unificada” (ibidem, p. 102).

São subdivididos em dois tipos: Micro-universo sintético existencial e micro-


universo sintético simbólico. Cada um deles tem nova subdivisão: diacrônico ou sincrônico.

3.1. Micro-universo sintético existencial

3.1.1. Micro-universo sintético existencial diacrônico – Neste tipo de micro-


universo, o personagem vive dois momentos existenciais sucessivos:
“vida pacífica e combate vitorioso (...) ou retorno a uma vida pacífica
após o combate vitorioso. (...) o personagem participa por etapas das
duas polaridades heróica e mística”. (idem)

3.1.2. Micro-universo sintético existencial sincrônico - Aqui o personagem


vive dois momentos existenciais ao mesmo tempo, participando
simultaneamente de duas ações temáticas. Pode ser subdivido em duplo
universo redobrado e duplo universo desdobrado.

3.1.2.1. Duplo universo redobrado – “O personagem vive duas ações,


por exemplo: vive ‘realmente’ um universo existencial místico
e se vê em sonho em um combate” (ibidem, p. 104).

3.1.2.2. Micro-universo desdobrado – Segundo Yves Durand (1988,


p. 107), o personagem se distingue a partir de uma “crivagem
real/imaginária recobrindo, de uma parte a situação ‘real’ na
92

qual ele está engajado existencialmente - em férias sobre uma


ilha deserta – ”, e de outra, a cena ‘imaginária’ expressada
pelo sonho e dependente do universo heróico “(...) com a
solução do tipo desdobrado um personagem pertence ao
universo heróico e o outro ao universo místico”.

3.2. Micro-universo sintético simbólico

3.2.1. Micro-universo sintético simbólico de forma diacrônica – Se subdividem


da seguinte forma:

3.2.1.1. Micro-universo da evolução cíclica – É presenciado aqui uma


“formulação filosófica da angústia humana, diante da tomada
de consciência da heterogeneidade dos dados significantes do
mundo” (ibidem, p. 109) e a uma construção de organismos de
defesa, utilizando contribuições culturais. “As defesas
colocadas em jogo pelo imaginário são destinadas a avaliar o
problema do tempo percebido segundo o trajeto diacrônico da
existência humana” (idem). Existem, então, as fases de um
ciclo que demonstram o eterno retorno.

3.2.1.2. Micro-universo da evolução progressiva – Aqui, diferente da


evolução cíclica, o ciclo não é fechado, não há o eterno retorno,
tendo em vista que há uma progressão.

3.2.2. Micro-universo sintético simbólico de forma sincrônica – Se subdividem


da seguinte forma:

3.2.2.1. Micro-universo do dualismo – Esse tipo de micro-universo,


“configura no espaço estruturado e simbolizado pela situação,
(...) os aspectos opostos e contraditórios dos conjuntos míticos
carregado de dualismo” (ibidem, p. 115). Não existe a
mediação e o universo mítico se torna maniqueísta.

3.2.2.2. Micro-universo de mediação – Aqui o personagem se situa no


ponto de articulação de uma bipolarização mítica, apresentada
como duas perspectivas existenciais que se oferecem a sua
mediação (idem).
93

As estruturas apresentadas até o momento tratam apenas de formas positivas, porém


existem também formas negativas, onde predomina uma angústia mais acentuada e a presença
da morte. São formas negativas das estruturas do imaginário:

1. Micro-universo heróico de forma negativa – O herói é vencido pelo monstro.

2. Micro-universo místico de forma negativa – O personagem quer viver


pacificamente, mas o seu refúgio comporta insegurança acentuada.

3. Duplos universos existenciais de forma negativa – Sincrônico ou diacrônico, são


capazes de “reverter em uma forma negativa – fracasso ou insegurança -, sobre
uma ou outra das polaridades heróica ou mística” (ibidem, p. 129).

4. Micro-universo sintético simbólico de forma negativa – Existe um dualismo sem


saída, que leva à morte; “concepções fatalistas e pessimistas da evolução”.
(idem).

Encontramos, também, que, alguns sujeitos-autores do teste, ao efetuarem-no, não


apresentam seu imaginário confirmado em uma das estruturas propostas acima, pois, seu
imaginário se apresenta em um desenho “explodido”, com os elementos soltos, sem a coesão
necessária à leitura/identificação em uma das 3 estruturas, bem como seu discurso sem
sentido. São identificados por Yves Durand (1988, p. 136) de “estruturação defeituosa” e
denominados como universo da não-estruturação.

No universo da não-estruturação não há ligação entre os elementos, como dito acima,


e se apresentam em 2 (duas) categorias:

1. As não-estruturadas verdadeiras – A pictografia é desenhada de forma separada e


o discurso apenas descreve os elementos. Não existe agrupamento dos elementos
tão pouco a existência de um cenário com composição de uma história.

2. As pseudo-estruturadas – A pictografia é desenhada de forma separada, fazendo


alusão ao não-estruturado, contudo, com a narrativa, percebe-se a existência de
uma história com coerência mítica subjacente ao desenho.

Além da identificação dos micro-universos míticos, Yves Durand encontrou alguns


fatores de diferenciação nos seus dados de pesquisa e aponta o que se segue:

1. Incidência do sexo – Não existe distinção entre sexos. Yves Durand constatou
que não há ligação entre a produção de um tema heróico ou místico e o fato o
sujeito-autor ser homem ou mulher.
94

2. Incidência da idade – Yves Durand verificou a incidência da temática mística e a


estruturação defeituosa, em pessoas mais velhas. “Os protocolos da série heróica
aparece mais em pessoas mais jovens.” (ibidem, p. 137).

3. Incidência do nível mental – Há de se considerar a influência do nível intelectual


do sujeito-autor sobre a realização do teste (ibidem, p. 138).

4. Incidência do contexto sóciocultural – O criador do teste constatou uma


“incidência do ambiente informativo do sujeito-autor sobre a realização de suas
produções imaginárias.” (ibidem, p. 140).

A partir das teorias apresentadas, especificamente nos estudos de Yves Durand, será
aplicado o Arquétipo Teste de Nove Elementos - AT-9 em 2 (dois) dirigentes – um deles
idoso – e 16 (dezesseis) alunos-idosos, dos que compõem o universo da UNATI/UCB e que
aceitaram participar da presente pesquisa, de maneira a que possamos levantar o imaginário
de cada um deles, suas idéias de vida e de morte e o enfrentamento de suas angústias.
Levantando o imaginário de cada um deles, será possível chegar ao imaginário do grupo, o
que está subjacente e sua perspectiva de continuidade.

Acreditamos que no momento da análise de cada um dos protocolos do teste que


compõe a população desta pesquisa, tornar-se-á mais oportuno apresentar as características
míticas de cada uma das 3 (três) estruturas do imaginário propostas por Gilbert Durand, assim
com a suas subdivisões consideradas por Yves Durand.

Lembramos, no entanto, que o mais importante neste trabalho não é uma


classificação ou identificação das estruturas, mas sim a descoberta de como o grupo “carrega
o mundo”, o seu imaginário amalgamado de cultura com seus preconceitos e conceitos e de
aspirações, desejos deste ser agora idoso, quer dizer, que tem uma soma de idade, de anos de
vida maior que as crianças, jovens e adultos. Como diz Morin (1995): “(...) sinto em mim
todas as idades da vida. Sou ininterruptamente a sede de uma dialógica entre
infância/adolescência/velhice” ou, como ainda diz o autor, “na soma destas fases está hoje
feliz ou não com sua vida já vivida, vivendo e ainda a viver.”, ou ainda como escreve
Mannoni (apud MESSY, 1993) “Se carrego comigo a criança que fui e cuja presença sempre
posso evocar, como a do adulto em transformação que sou, não sinto os efeitos do
envelhecimento, nem a velhice”.
95

Excluído: ¶
(resenhar o AT-9)¶
Parte III: Retratos do imaginário – O cintilar da alma Excluído: ¶

Quebra de página
“Acreditamos (...) poder falar de uma imaginação ativista, e (...) de uma
vontade que sonha e que, ao sonhar, dá um futuro à sua ação.”
Gaston Bachelard

“A velhice é necessária pois nela o que sobra é o caráter.”


James Hillman

Como já dito anteriormente, “o homem vive num mundo de significados”. Vivencia,


ao lado de seus sonhos, desejos e aspirações, sua existência - vida, experiências, mundo e
morte - e a representa por meio de imagens, símbolos e mitos. Demonstram, numa simbiose,
seus anseios e desejos misturados ao real por meio das “pressões do meio cósmico e social” -
Trajeto Antropológico de Gilbert Durand.

O teste AT-9, diretamente relacionado à Teoria do Imaginário de Gilbert Durand,


registra nos seus protocolos a maneira de enfrentamento da angústia do passar do tempo e o
medo da morte, quer dizer, trata-se de um

“(...) instrumento da intervenção possível sendo, entretanto, antes de tudo, um


método de pesquisa psicológico, sociológico do Imaginário individual e do
Imaginário grupal, mas prioritariamente um instrumento de pesquisa antropológico.”
(BADIA, 1999, p. 73)
Ao levantar o imaginário do sujeito-autor o AT-9 revela o “eu interior”, a alma. Para
Aristóteles (apud HILLMAN, 2001, p. 40-41)

“(...) a alma é a forma do corpo, ‘o original do movimento dele’, e a meta ou


o propósito final dele. Como ‘substância dos seres vivos’ essa forma chamada
psique ‘influencia’ e ‘comanda’ o corpo, e é ‘mais verdadeiramente uma parte do
animal do que é o corpo’, mas os interesses ‘do corpo e da alma são os mesmos’. A
alma forma o corpo, no entanto ela mesma é sem corpo (...). Por causa da
incorporalidade da alma, ‘a beleza da alma é mais difícil de ser vista do que a
beleza do corpo’. (...) A alma está preocupada com a bondade e a beleza, com a
justiça e a coragem, com a amizade e a lealdade (...) ”.
Para James Hillman, a alma é apenas uma abstração até estarmos de frente com sua
corajosa vontade de viver. Isso o induz a pensar que “viver uma vida longa ajuda na
confecção da alma, ao trazer à vida a espantosa coleção de adjetivos da psique (...). Elas são
a força do caráter” (ibidem, p. 41). O autor considera a alma como “uma terra encantada de
fantasia e sentimentos, de sonhos e devaneios, de estado de espírito, símbolos e vibrações,
uma amabilidade passiva, implacável e vulnerável como uma asa de borboleta” (ibidem,
p. 42).

Nesta parte (Retratos do Imaginário – O cintilar da alma), iremos apresentar 18


protocolos do Arquétipo Teste dos Nove Elementos – AT-9, realizados por 2 dirigentes e 16
96

alunos-idosos da UnATI/UCB. Um dos dirigentes não é idoso, mas achou-se necessário


levantar seu imaginário de maneira a perceber o seu olhar para com os idosos, o olhar das
atividades desenvolvidas UnATI/UCB, visando prospectiva de continuidade.

Cada um dos protocolos apresentados será identificado ficticiamente com o nome de


um personagem da mitologia grego/romana. Embora costumemos relacionar a mitologia dos
deuses, semi-deuses, titãs e outros heróis mitológicos ao heroísmo, temos que lembrar que os
guerreiros possuem momentos de fraqueza, têm o seu “calcanhar de Aquiles”. Não é o fato de
haver uma identificação mitológica que apresentará todos os micro-universos míticos
heróicos. Apenas, houve o cuidado de, para a escolha do nome fictício – personagem da
mitologia - ter algo em comum entre a mitologia greco-romana e algum traço da história
narrada pelo sujeito-autor do protocolo apresentado. Os dois primeiros protocolos (nº 1 e nº 2)
foram realizados pelos dirigentes da UNATI/UCB e os demais (do nº 3 ao nº 18) foram
realizados por alunos-idosos.

Capítulo 6 – A análise estrutural e os sujeitos-atores

Este capítulo será dividido em 2 momentos: no primeiro serão apresentados os


protocolos do Teste AT-9, preenchidos pelos 18 sujeitos da pesquisa, utilizados com uma
população selecionada na UnATI/UCB, bem como suas análises e a escuta interpretada; no
segundo serão apresentados quadros sínteses de forma a resumir e a auxiliar na análise –
estrutural, funcional e elemencial – dos dados míticos de cada um dos protocolos e desenhar o
universo mítico do grupo.
97

6.1 - Apresentação e análise dos Protocolos do Teste AT-9 realizados na


UnATI/UCB

Protocolo Nº 1

1ª Parte:
Identificação:
Nome Fictício: GAIA
Sexo: Feminino
Idade: 62 anos e 7 meses
Grau de Instrução: Superior (Doutoranda)
Profissão: Professora
Reside com: 1 filha
2ª Parte:
a) Pictografia

b) Narrativa

Manuelino foi passear e se perdeu na Montanha Encantada que tem uma linda
cachoeira. Ele parou num dos picos da montanha e quase morre de medo pois estava tendo
um incêndio num dos lados da montanha. Ele pensou em descer a montanha mas ... saiu da
caverna um monstro empunhando uma espada e ameaçando-o! Meu Deus, pensou ele: vou
pular no lago formado pela queda d’água mas ... avistou uma cobra gigantesca!!!
Assustado, Manuelino raciocinou: terei que descer a montanha, pegando outro lado,
que vai dar num lindo vale, cheio de pássaros.”
98

3ª Parte:
Questionário

I - Responda de modo preciso às seguintes questões:

a) Sobre que idéia você centrou sua composição?


(Não respondeu)

b) Você foi eventualmente inspirado? Através de que (leitura, filme, etc)?


“Creio que desenhos animados”

c) Entre os 9 elementos do teste de sua composição, indique:


c. 1) os elementos essenciais em torno dos quais você construiu o desenho;
“a queda, espada, refúgio, monstro, coisa cíclica, personagem, animal: réptil,
fogo.”

c. 2) os elementos que você teria vontade de eliminar. Por que?


“nenhum.”

d) Como acaba a cena que você imaginou?


“o personagem Manuelino encontra uma solução”

e) Se você tivesse que participar da cena composta, onde você estaria? O que faria?
“Faria igual a Manuelino.”

II – No quadro seguinte, você deverá especificar:


1. Por meio de que você representou os 9 elementos do teste (coluna A).
2. O papel, a função, a razão de ser de cada uma de suas representações (coluna B).
3. O que simboliza, para você, cada um dos 9 elementos do teste (coluna C).

Elemento A – Representado por B – Função/Papel C - Simbolizando


Queda Cachoeira movimento Vida
Espada Espada assustar Arma
Refúgio Caverna esconderijo Moradia
Monstro o gigante de um olho só assustar Perigo
Cíclico movimento da água da cachoeira renovação renovação da vida
Personagem Garoto criança levada Criança
Água Lago salvação Vida
Animal Cobra assustar Medo, perigo
Fogo Queimada dificuldade Perigo
99

Análise do Protocolo Nº 1 - Gaia

O sujeito-autor deste protocolo é um colaborador da UNATI, que doravante será


denominado Gaia.24

Analisando o desenho solicitado pelo teste, a pictografia elaborada por Gaia,


percebe-se que, embora o personagem criado não esteja empunhando uma espada, está em
posição heróica (no alto e de pé); porém, aparenta estar com medo: “quase morre de medo...”,
como diz na narrativa.

A espada está em mãos erradas, está desfuncionalizada, pois está na mão do monstro,
e é exageradamente grande (ampliação da monstruosidade/morte).

Com a narrativa vemos que o imaginário do sujeito-autor é pleno de angústia, de


medos e perigos. Existem muitos perigos na história apresentada: a ampliação da espada do
monstro; o refúgio/caverna também desfuncionalizado, pois é do monstro, não permite a paz;
o incêndio de um lado da montanha, verdadeiro monstro que impede o personagem de se
salvar por aquele lado. A cachoeira, que representa vida e a renovação dela, o que poderia ser
uma saída, tem uma cobra gigantesca dentro, representando outro perigo – cobra, com função
de assustar simbolizando negativamente medo e perigo, outro monstro, outra representação
imaginária, desta feita zoomórfica, da morte. Tudo faz com que, nos 4 pontos cardeais, em 3
deles o perigo esteja presente.

Embora a “montanha”, cenário da dramatização imaginada, seja dita, no discurso do


sujeito-autor, “encantada”, ela está cheia de possíveis desencantos. O monstro não é
eufemizado, mas está afastado, ainda não atacou, mas poderá atacar. Gaia o deixa muito
real/representado na sua história: a imagem de “um gigante de um olho só”, que a faz pensar
em fugir: “vou pular no lago formado pela queda d’água”, mas não pula, não concretiza a
idéia, pois existe no seu imaginário outro perigo de vida, a morte representada pela “cobra
gigantesca”. A morte está exacerbada, no superlativo: gigantesca; figura deformada com um
olho só e ainda portando a espada/arma; e fogo/incêndio impeditivo de ação. A angústia está
24
O nome Gaia é uma homenagem a autora do protocolo, que foi um dos membros do Grupo Interno de
Trabalho criado para tratar sobre as questões do envelhecimento, logo após a transformação das Faculdades
Integradas da Católica de Brasília – FICB em Universidade Católica de Brasília – UCB. (Ver capítulo 3, item
3.3. desta dissertação). Desde 1995 o sujeito-autor deste protocolo desenvolve trabalhos, junto a UCB, sobre a
temática do envelhecimento, criando, aprimorando, renovando, gerindo as atividades da UnATI/UB; interagindo,
aconselhando, participando com os idosos. Age como uma grande mãe, daí a alusão ao nome fictício Gaia.
Na mitologia grega Gaia é a personificação da terra. Foi a propiciadora dos sonhos e a protetora da
fecundidade. Segundo Chevalier (2003, p. 879-878) a “terra simboliza a função maternal, (...) simboliza a mãe,
fonte do ser e protetora contra qualquer força de destruição, (...) opõe-se ao céu como o princípio passivo ao
princípio ativo; (...) ela sustenta, enquanto o céu cobre(....)”.
100

no ar, e mesmo com tanto perigo, o personagem não luta, mas foge em busca da vida:
encontra uma solução de aconchego e paz (mística), o seu atrativo.

O universo mítico apresentado é de muita angústia, medos e perigos! O personagem


não luta, foge imaginando refugiar-se/salvar-se num lindo vale cheio de pássaros, que ele sabe
existir (4º lado da montanha). Esta fuga é a solução encontrada para não enfrentar os perigos e
escapar da morte/monstro. O vale, embora ele não tenha identificado no quadro de
representações, é a sua esperança, o seu atrativo. Ao buscar refúgio, desce a montanha em
movimento (andando), o que remete a um traço sintético.

Com a colaboração do questionário e do quadro síntese de especificações dos


elementos (3ª parte do protocolo), vemos que o sujeito-autor inseriu na cena todos os 9
elementos do teste e não gostaria de retirar nenhum deles, o que o torna integrado.

Contudo, numa análise geral, o personagem que tenta fugir para todos os lados, sai
vitorioso. Não enfrenta nenhuma das situações perigosas, não é heróico o seu imaginário
(apesar de existir o personagem, o monstro e a espada desfuncionalizada - potencializada); o
personagem não precisa desgastar-se, ele encontrou a solução para os problemas, encontrou o
seu refúgio/místico imaginado: o lindo vale, cheio de pássaros. O personagem desvencilha-se
de 3 (três) perigos sem lutar. Para que enfrentar os perigos, onde poderá encontrar a morte se
existe um outro caminho que leva ao sossego e a longevidade? (Presença marcante de um
imaginário místico.)

Para o sujeito-autor a vida é como um espaço encantado (“montanha encantada”)


onde ele, projetado em uma criança alegre, se perdeu. É a montanha encantada que se
desencanta. Assim é a vida para Gaia: uma grande/exacerbada angústia, mas apesar disto,
escapa dos monstros (da morte), através da fuga. O sujeito-autor, projetado em uma criança,
para justificar o tamanho do medo, imagina a espada, mas ela não lhe pertence, ele não pode
usá-la; gostaria de refugiar-se, mas o refúgio pertence ao inimigo, ao monstro. Seria ele
heróico? Mais parece uma impureza heróica em um imaginário místico, onde o protagonista
da dramatização deseja se salvar da morte evidente sem enfrentá-la.

A queda expressa não é a do personagem, é da água da cachoeira, que faz o


movimento (algo cíclico), que remete a vida, mas é negativo quando nela um monstro está
acolhido (cobra gigantesca). O personagem está representado no desenho longe do monstro,
mas o monstro, na narrativa, “empunhando uma espada, ameaça”, assusta Gaia, que imagina
a morte ameaçadora ainda longe dela, pois tem apenas 62 anos, mas vê a possibilidade da
101

morte e se apavora, angústia-se com o passar do tempo. Embora não esteja


expresso/representado em imagens pictográficas, existe uma renovação da vida, que é o lindo
vale. É a esperança, mesmo na angústia acentuada.

Ernst Bloch apud Lahud Loureiro (1993, p. 113), referindo-se à esperança, lembra
que “o homem possui em si aquilo que impulsiona para adiante (...). Quando tudo parece ruir
do mais profundo de nós mesmos alguma coisa surge e procura se agarrar, é a tensão (...)
aspiração que se dirige para fora”.

Voltando à Gaia, o personagem tem que descer (andando) para chegar lá. Não se
sabe se o lindo vale o salva, mas é uma possibilidade, a esperança, “a imagem – desejo” e
provavelmente será salvo.

“Um lindo vale, cheio de pássaros”. De acordo com Chevalier (2003, p. 929), o vale
simboliza “o lugar das transformações fecundantes, onde a terra e a água do céu se unem
para dar ricas colheitas, onde a alma humana e a Graça de Deus se unem para dar as
revelações e os êxtases místicos”

Lugar de transformações, diz Chevalier (idem), o que o sujeito-autor confirma


representando o elemento cíclico, como “movimento”, com função de “renovação”,
simbolizando a “renovação da vida”.

O pássaro é a representação da alma que se liberta do corpo, ou apenas o símbolo das


funções intelectuais (inteligência). Embasando-se no Corão, Chevalier diz que “a palavra
pássaro é muitas vezes tomada como sinônimo de destino” e que o pássaro simboliza a
imortalidade, tanto no Corão quanto na poesia (ibidem, p. 688).

Embora a saída citada pelo sujeito-autor nos leve a pensar num vale que expressa
beleza e descanso, o que pode remeter ao místico, o vale é o local de transformações e
colheita, portanto têm movimento e produtividade. Os pássaros simbolizam movimento e
imortalidade, logo, vida.

O personagem é um garoto e Gaia projeta-se num menino para justificar tamanho


medo/ angústia, pois com sua idade não deveria ter tanto medo e se assustar tanto. Embora
seja uma senhora, se projeta num menino que tradicionalmente é mais levado que menina.
Projeta-se, então, num menino travesso. É, uma idosa brincalhona, que associa a história
criada a um desenho animado (Cartoon).
102

Para este sujeito-autor, o lindo vale, ou seja, a solução encontrada/imaginada, apesar


de não explicitamente atualizada/operacionalizada, pode ser a própria UNATI: vale lindo onde
os idosos que estão com sua potência física de vida diminuída, com energias desgastadas,
podem re-encontrar, ou manter a vida.

Por meio da escuta, percebe-se que o sujeito-autor expressa-se como uma pessoa
angústiada, que considera que a pessoa envelhecer é uma benção de Deus, mas pensa/reclama
que “o velho deveria ser mais valorizado na sociedade”. Contesta o preconceito e o descaso
contra os idosos (impureza heróica).

Com base no exposto, poder-se-ia pensar em micro-universo mítico integrado, com a


presença muito marcante da angústia na ampliação do monstro, da monstruosidade, mas o
personagem sai, positivamente, vitorioso. Mas ao encontrarmos o personagem fugindo em
busca da paz, sem lutar, vencendo, positivamente, ou seja: escapa da morte sem lutar cara a
cara com ela/monstro, pode-se ter presente um micro-universo místico, não negativo, pois que
a vitória parece que acontecerá. Daí podermos dizer tratar-se de um Micro-universo Mítico
Místico Impuro. A análise funcional registra 3 simbolismos negativos de morte, ao lado de 6
de vida. Portando não se trata de um imaginário negativo.
103

Protocolo Nº 2

1ª Parte:
Identificação:
Nome Fictício: HEFESTO
Sexo: Feminino
Idade: 46 anos e 2 meses
Grau de Instrução: Superior (Mestre)
Profissão: Professora
Reside com: Marido e 1 filha

2ª Parte:
a) Pictografia

b) Narrativa

“Um homem morava no interior de Minas Gerais, numa área importante para o
ESTADO, pois havia uma Usina hidrelétrica que fornecia energia para grande parte do
ESTADO de MG e do R.J. Ele sentia que era um pouco dono desta área devido aos anos
vividos nela, quantas vezes controlava até o funcionamento da USINA. Um certo dia surgiu
um animal mamífero com uma aparência terrível vindo em sua direção que o fez procurar
por uma arma para se defender e proteger seus filhos que se encontravam em sua casa “Seu
Refúgio”. A única arma existente era uma espada e com ela a utilizou para espantar aquele
animal.
Era noite muito fria e a fogueira já estava pronta a todo vapor esperando pela sua
família para curtir a noite nas montanhas.
Um lugar especial onde conta com a presença da movimentação das águas da
cachoeira proporcionado o ciclo constante de renovação de energias tão importante às
nossas vidas com tantos significados para a nossa Reflexão.”
104

3ª Parte:
Questionário

I - Responda de modo preciso às seguintes questões:

a) Sobre que idéia você centrou sua composição?


“Um pouco sobre a minha infância no interior de M.G.”

b) Você foi eventualmente inspirado? Através de que (leitura, filme, etc)?


“Somente através de lembranças rápidas neste momento.”

c) Entre os 9 elementos do teste de sua composição, indique:


c. 1) os elementos essenciais em torno dos quais você construiu o desenho.
“Da água, ENERGIA, AO AR livre, montanhas ...”

c. 2) os elementos que você teria vontade de eliminar. Por que?


“O animal estranho violento.”

d) Como acaba a cena que você imaginou?


“ESPANTO O ANIMAL MANDANDO-O EMBORA.”

e) Se você tivesse que participar da cena composta, onde você estaria? O que faria?
“EM PARTE ESTOU NA AÇÃO OCORRIDA RESolvendo PROblemas
EM OUTRAS SENDO CONVIDADA PAA PASSAR ALGuns DIAS POR LÁ.”

II – No quadro seguinte, você deverá especificar:


1. Por meio de que você representou os 9 elementos do teste (coluna A).
2. O papel, a função, a razão de ser de cada uma de suas representações (coluna B).
3. O que simboliza, para você, cada um dos 9 elementos do teste (coluna C).

Elemento A – Representado por B – Função/Papel C - Simbolizando


Queda Cachoeira Servir à usina Natureza
Espada O instrumento na mão Defesa Arma
Refúgio A casa onde mora Moradia Sossego
Monstro Animal selvagem Ameaçador Procura de alimento
Atacar o homem
Cíclico A roda da usina Reproduzir energia Movimento da roda
Personagem Um homem Chefe de família Responsabilidade
Água Água de cachoeira Importante à vida Natureza
Animal Peixe Está no seu habitat, Vida
ambiente
Fogo Da fogueira Produzir calor utilidade
105

Análise do Protocolo Nº 2 - Hefesto

O sujeito-autor deste protocolo não é idoso - possui apenas 46 anos- e a partir de


agora será tratado pelo nome fantasia de Hefesto25.

Na pictografia apresentada, desenhada em dois planos, identifica-se, no 1º plano, que


o personagem está no alto, de pé, empunhando uma espada enfrentado/afugentando o
monstro, como é dito na narrativa do teste. A casa/moradia (refúgio) está próxima ao
personagem, mas ele não está dentro dela. Neste primeiro momento, ele não se esconde; o que
neste início remete a presença do heroísmo. No segundo plano o personagem está dentro de
uma canoa dentro d’água.

A imagem parece ser noturna uma vez que existe uma fogueira e luzes elétricas
acesas, apesar de dizer: “um certo dia”.

Desenha antenas que podem estar significando que o personagem está ligado,
antenado ao mundo exterior, o que também faz-nos pensar no heroísmo, assim como aves
voando. Já a queda d’água, que ao cair produz movimento, e o objeto cíclico, que parece
produzir energia, fazem alusão à síntese.

Na narrativa, o personagem espanta o monstro com sua espada, outra evidência


heróica. A fogueira tem a função de aquecer a noite (antifrasia) e, após a vitória (espantar o
monstro), o personagem irá descansar junto com sua família para admirar/usufruir do sossego
da noite, o que faz emergir um imaginário com uma estrutura mística. Estas emergências
míticas remetem a um duplo universo existencial diacrônico, pois é após a vitória heróica que
o personagem usufrui do sossego místico da noite e parece que com sua família.

A cachoeira significa, neste protocolo, renovação de energia, vida. De acordo com o


quadro síntese de especificações (representação, função/papel e simbolismo) dos elementos
(3ª parte do protocolo), verificamos que a queda expressa não é do personagem. Ela é
positiva, pois serve a uma usina elétrica, a produção de energia.

O monstro que é um animal selvagem (zoomórfo) e tem a função de ameaçar e atacar


o homem (personagem), o faz para alimentar-se. Não causa nenhum mal, quando enxotado,
vai embora; mas é o personagem quem heroicamente o afasta, expulsa do seu
refúgio/moradia. O animal simbolizado pelo peixe é decorativo, está em seu habitat e

25
A escolha do nome Hefesto deu-se pelo fato do sujeito-autor, em sua narrativa, falar de usina e produção de
energia. Na mitologia grega, Hefesto é o deus do fogo e foi o responsável pela difusão da arte de usar o fogo e da
metalurgia. Na mitologia romana, Hefesto era chamado de Vulcano e considerado o ferreiro dos deuses.
106

simboliza vida. O fogo é expresso de forma positiva, uma vez que sua função é de utilidade,
serve para produzir calor/aquecer.

Hefesto para produzir sua composição reportou-se a sua infância numa cidade do
interior, levando-nos a pensar que tem saudades (lembranças) de um tempo de outrora. Quer
eliminar o animal, porque prefere o descanso à luta e deixa clara a responsabilidade que tem
como chefe de família e no trabalho.

Vê-se resolvendo problemas e com o poder de controle sentindo-se dono do lugar


pelos anos de trabalho dedicado a empresa/usina, o que demonstra a presença de um
imaginário heróico, mas, ao mesmo tempo, quer ser convidado para lá passear, com imagens
noturnas de desfrute e vida sossegada: o que nos remete à presença de um Duplo Universo
Mítico Sintético do tipo DUEX, com um conjunto de imagens relacionadas ao heroísmo e
outro enxame de imagens no regime noturno, na estrutura mística, o que representa assim a
síntese no regime noturno. Há a presença dos dois nós aglutinadores de imagens que se
disseminam neles.

“Se as águas precedem a criação, é evidente que elas continuam presentes para
recriação (...) A água é o símbolo das energias inconscientes, das virtudes informes da alma,
das motivações secretas e desconhecidas” (CHEVALIER, 2003, p. 18, 21-22). A
movimentação das águas da cachoeira (um dos elementos considerados essenciais pelo
sujeito-autor), que proporciona o ciclo de renovação de energias, leva a pensar no desejo de
não acomodação e vontade de recriar, num intuito de chegar mais próximo à perfeição. Não
deixa de ser um ato de heroísmo, mas o movimento remete a síntese.

Talvez o Hefesto esteja se reportando a velhice. Em seu protocolo o personagem luta


e depois descansa com a família, no calor da fogueira e reflete. Foi percebido na escuta que o
sujeito-autor da dramatização registrada possui sentimentos de preocupação com a velhice
quando fala que “após anos vividos de luta não se tem condições de continuar vivendo com a
dignidade e desfrutar do tempo que ainda se tem para produzir algo, sofrendo e abandonado
pela família e pela sociedade”. Para Hefesto a velhice é “uma etapa da vida podendo ser
agradável em uns momentos quando as saúdes física, mental e social estão em harmonia”. O
sujeito autor nestas palavras deixa emergir a luta e o desfrute, mas tem presente o tempo que
ainda se tem, o que evidencia a síntese.

Após análise, julgo que o sujeito-autor, neste protocolo, deixa emergir um Micro-
universo Mítico Sintético do tipo DUEX - Duplo Universo Existencial Diacrônico.
107

Protocolo Nº 3

1ª Parte:
Identificação:
Nome Fictício: APOLO
Sexo: Feminino
Idade: 60 anos e 11 meses
Grau de Instrução: Superior
Profissão: Professora (Professora de 1º e 2º graus)
Reside com: 1 filho

2ª Parte:
a) Pictografia

b) Narrativa

“Nesta gravura que eu desenhei havia um homem que queria devorar uns peixinhos
mas quando ele viu o papagaio ele ficou com medo porque a espada estava lá no alto e ele
pensou:
Será que atrás da espada tem um outro indivíduo as ocultas e está querendo me
matar?”
108

3ª Parte:
Questionário

I - Responda de modo preciso às seguintes questões:

a) Sobre que idéia você centrou sua composição?


“Várias, como por exemplo, o papagaio, o homem e etc...”

b) Você foi eventualmente inspirado? Através de que (leitura, filme, etc)?


“Sim. Leitura, porque eu já li uma história dos bichos na caverna.”

c) Entre os 9 elementos do teste de sua composição, indique:


c. 1) os elementos essenciais em torno dos quais você construiu o desenho;
“O homem, isto é o pirulito.
O papagaio e os peixinhos, esses foram os principais.”

c. 2) os elementos que você teria vontade de eliminar. Por que?


“Só a espada.”

d) Como acaba a cena que você imaginou?


“Não entrei em detalhes”

e) Se você tivesse que participar da cena composta, onde você estaria? O que faria?
“Numa floresta e faria o seguinte:
Pegava um dos meus cavalos, o mais bonito: o ‘machador’ e ia cavalgar a tarde
inteira até o anoitecer.”

II – No quadro seguinte, você deverá especificar:


1. Por meio de que você representou os 9 elementos do teste (coluna A).
2. O papel, a função, a razão de ser de cada uma de suas representações (coluna B).
3. O que simboliza, para você, cada um dos 9 elementos do teste (coluna C).

Elemento A – Representado por B – Função/Papel C - Simbolizando


Queda Montanha Esconder os personagens montes
Espada Espada Atacar ferimento
Refúgio Papagaio Cantar cantares diferentes
Monstro Pirulito Observar inteligência
Cíclico Estrelas Brilhar céu
Personagem Homem Observar natureza
Água Água Molhar derramamento
Animal Papagaio Peixe belezas
Fogo Fogo Queimar queimada
109

Análise do Protocolo Nº 3 - Apolo

O sujeito-autor do protocolo em tela é uma sexagenária que tem participado


ativamente da UNATI/UCB. A partir deste momento será identificada, ficticiamente, como
Apolo. 26

A narrativa – a parte semântica do teste - feita por Apolo não está totalmente ligada a
sua pictografia.

O desenho faz-nos imaginar o espaço sideral - cometa, estrelas e uma linha no


horizonte demarcando, ou dividindo o espaço da representação deste imaginário -. A imagem
é noturna, se situa no regime noturno das imagens.

Alguns dos elementos não são representados, não têm seus significados expressos
apenas com o desenho (queda, refúgio, fogo, monstro, cíclico). No caso do peixe, está
representado na boca do papagaio. É necessário recorrer ao relato para colher dados para a
análise e identificações.

A história conta que um homem (Pirulito) quer devorar os peixes. O sujeito-autor


demonstra uma vontade de nutrição, mas não fala em comer e sim mais agressivamente em
“devorar”. O homem é o monstro. Na história descrita por Apolo não aparece/não existe o
elemento fogo e nem a luta se realiza, e a cena não tem um final, ela se perpetua no galope do
cavalo. Inclusive, Apolo responde na questão “d” do questionário do teste que “não entrei em
detalhes”.

Segundo Chevalier (2003, p. 211) o simbolismo do cavalo é universal, estende-se aos


2 pólos do Cosmo: ao mundo octônico e ao mundo uraniano. “O cavalo passa com igual
desenvoltura da noite ao dia, da morte à vida, da paixão à ação. Religa os opostos numa
manifestação contínua. Ele é essencialmente manifestação; ele é vida e continuidade, acima
da descontinuidade de nossa vida e nossa morte”.

Em muitas culturas o cavalo está ligado ao mal e a morte. “No apocalipse a morte
cavalga o cavalo esverdeado”. (DURAND, G., 2001, p. 76). Para G. Durand “o cavalo é o
isomorfo das trevas e do inferno”. Mesmo na figura do cavalo solar pode-se fazer uma
correlação com o cavalo octônico, pois o sol não é apenas uma grande luminária para a terra.

26
A escolha do nome fictício de Apolo para o sujeito-autor, deu-se pelo fato de, na mitologia grega, o deus
Apolo ser uma figura complexa e enigmática, que transmitia o segredo da vida e morte. O sujeito-autor da
dramatização demonstra, em sua narrativa certa complexidade e enigma quanto a figura do papagaio, do
monstro, do homem, do medo de existir algum “outro indivíduo as ocultas”, e da dualidade vida-morte.
110

Ele pode ser imperioso e destruidor, causando a fome, a seca, a morte. O cavalo por se ligar
aos grandes relógios naturais (sol / dia – lua / noite) é considerado o símbolo do tempo.
Complementa G. Durand que “primitivamente o cavalo é o símbolo da fuga do tempo, ligado
ao Sol Negro (...). Pode-se, por isso, em geral, assimilar o semantismo do cavalo solar ao
cavalo octônico. O corcel de Apolo não é mais que trevas domadas”. (DURAND, G.,
2001, p. 75-78).

Percebem-se confusões e fusões neste imaginário registrado no protocolo de Apolo.


Tanto a narrativa como o questionário não elucida as dúvidas, ao contrário: deixa. Apresenta-
se confuso o pensamento do sujeito-autor, pois existe uma inversão nas representações,
funções e simbolismos de alguns dos 9 elementos (quadro síntese de especificações dos
elementos).

O monstro é antropomórfico (homem/Pirulito). A espada com função de atacar


simbolizando ferimento, está solta no ar, no desenho. Não há ataque apesar do sujeito-autor
atribuir ao elemento espada a função de ataque, mas não identifica quem ataca, se o monstro
Pirulito que observa e é inteligente - o que pode identificar um fiapo de heroísmo negativo,
pois que do monstro - ou o personagem homem, que também observa, mas observa a natureza
- sem se deter/entrar em detalhes -, com tendência evidente ao místico.

Está clara a presença da angústia - do passar do tempo - e o medo - da morte -, pois o


homem/monstro imagina que pode ter/existir um indivíduo - desconhecido/perigo - querendo
matá-lo. O imaginário da maldade parece estar presente neste micro-universo-mítico, pois
tanto o personagem como o monstro desconhecido, imaginado como perigo oculto que pode a
qualquer momento atacar e ferir com a espada de ninguém, solta para quem puder pegar, pode
fazer o mal aos peixinhos e ao Pirulito assustado. Será que o medo é pelo fato de entender o
homem como símbolo de maldade? Será que o medo é de que seja feito com ele o que ele
queria fazer com outro - ser abatido, assim como queria abater peixeinhos, devorando-os -.

A presença do papagaio, com a sua beleza, fez o monstro (homem) parar para refletir
no que faz, como se nesse momento deixasse de ser monstro para ser humano e passar a temer
o outro - suposto indivíduo que pode estar escondido, pronto para atacá-lo -. É um animal, côo
na idéia inspiradora da dramatização aqui registrada, que simboliza/representa a imagem do
refúgio, quer dizer na beleza da natureza animal, do seu canto e encantos diferentes do
humano, onde ele (o sujeito-autor) encontra um pouco de paz, mas mesmo aí se percebe a
confusão: nunca vi um papagaio cantar a não ser o domesticado!!
111

Apolo se projeta no personagem que ora parece ser o monstro, ora parece ser
humano, o que faz-nos pensar numa possível desestrutura. O medo da
morte/perigo/desconhecido/oculto que o monstro/Pirulito, que também é o
personagem/homem tem e a não conclusão da história: “estaria numa floresta (...) pegava (...)
cavalo (...) ia cavalgar a tarde inteira até o anoitecer”, também nos remete simbolicamente à
angústia de uma idosa que quer viver agitada o entardecer da sua vida, como se porta na
UNATI/UCB, em movimento “a tarde inteira”, até a noite chegar, “até o anoitecer” (seria a
morte?), o que leva a crer numa desestrutura com tendência ao sintético/disseminatório. Quem
comanda a cena é o personagem assustado medroso e o monstro oculto que não ataca na
realidade, mas é imaginado na sua possibilidade de atacar e ferir com a posse da espada ainda
solta no ar - a presença do fiapo de heroísmo negativo -. A confusão e a fusão estão presentes!

Quando o sujeito-autor tem que se posicionar num local da cena composta, alega que
“pegava um dos meus cavalos, o mais bonito, o ‘marchador’ e ia cavalgar a noite inteira até
o anoitecer”. Tal resposta, não tem cadência com o desenho ou narrativa, o que novamente
leva-nos a crer numa desestrutura. Parece que o autor quer desprender-se da história. A alusão
ao cavalo remete à morte, a tarde - fim do dia - e o movimento do galope - fuga do tempo,
corrida - ao sintético/disseminatório/cíclico e o anoitecer ao místico, como se fosse em busca
de algo, de refúgio, de paz. No entanto a desestrutura se evidencia outra vez quando no
quadro do teste representa o elemento cíclico com a imagem das estrelas, com função de
brilhar simbolizando o céu - que por sua vez é comumente relacionado com a morte -,
colocadas no desenho, mas, não mais referidas na história, a não ser forçadamente entendidas
no “até o anoitecer”.

Diante das pontuações feitas acima, julgo que o sujeito-autor apresenta um Micro-
universo Mítico Pseudo-desestruturado que apresenta laivos da estrutura mística, ao lado
de fiapos de heroísmo.

Apolo é uma senhora de 60 anos ativa e inquieta. Já cursou disciplinas isoladas no


Curso de Graduação em Direito da UCB, com excelente desempenho acadêmico, criando
oportunidades de troca de experiências com alunos mais jovens, num ambiente
intergeracional, o que para ela foi bastante gratificante. Atualmente freqüenta as oficinas de
Inglês, Informática e de Rádio Jornalismo Comunitário. É, também, bastante ativa, fora do
ambiente universitário. Procura defender seus direitos de cidadã (heroísmo?). Reclama da
insensibilidade de alguns motoristas de transporte coletivo (ônibus e vans) que não respeitam
112

os idosos. É alegre, vaidosa, e está gostando muito de envelhecer (místico?), pois, segundo
ela, hoje existe muito mais passeios e divertimentos que antigamente (sintético?).

James Hillman no seu livro A força do caráter e a poética de uma vida longa
(2001, p. 108) cita Pascal, em epígrafe no capítulo intulado Inquietação confusa: “Todo mal
humano vem daí, da incapacidade do homem de sentar-se quieto num quarto.”

Hillman diz que “(...) o corpo que vagueia está seguindo as agitações da mente que
vagueia, e criando problemas. (...) As pessoas dizem: ‘Por que é que ele não quer ficar quieto
em casa?’ Não compreendem que ficar quieto nos faz girar ainda mais para dentro da
perturbação da inquietação”. (idem).

Quanto à fusão e confusão o autor diz que “a confusão é resultado de uma fusão.”
(p.109). E, “quando a confusão começa, segue-se a agitação (....) sentimo-nos como um
adulto que está escorregando” (ibidem, p. 110)
113

Protocolo Nº 4

1ª Parte:
Identificação:
Nome Fictício: ULISSES
Sexo: Feminino
Idade: 72 anos e 4 meses
Grau de Instrução: Superior
Profissão: Professora
Reside com: Um filho e um neto de 6 anos

2ª Parte:
a) Pictografia

b) Narrativa

“Certa vez um pescador saiu em seu barco para pescar. Houve uma grande
tempestade que destruiu o barco e a correnteza levou o pescador somente com sua espada.
Numa queda dágua havia uma roda dágua para produzir energia. Coitado do
pescador, quando lá caiu e viu um enorme tubarão foi se escondendo próximo da roda até
que conseguiu chegar à margem da represa. Estafado machucado, quase gelado pela água e
o pavor do acontecido, descansou um pouco, fez uma fogueira e deitou-se para repousar e
dar glória a Deus.”
114

3ª parte:
Questionário

I – Responda de modo preciso as seguintes questões:


a) Sobre que idéia você centrou sua composição?
“Na fé do pescador”

b) Você foi eventualmente inspirado? Através de que (leitura, filme, etc)?


“Em nada, só pelos dados pedido.”

c) Entre os 9 elementos do teste de sua composição, indique:


c. 1) os elementos essenciais em torno dos quais você construiu o desenho;
“Queda da água, personagem, a roda (refúgio), a água, o tubarão, a espada, a
árvore e fogo.”
c. 2) os elementos que você teria vontade de eliminar. Por que?
“A espada , porque sem ela também ele poderia ter sido salvo.”

d) Como acaba a cena que você imaginou?


“O personagem louvando a Deus”

e) Se você tivesse que participar da cena composta, onde você estaria? O que faria?
“Eu estaria no personagem.
Eu me entregava total ao Pai.”

II – No quadro seguinte, você deverá especificar:


1. Por meio de que você representou os 9 elementos do teste (coluna A).
2. O papel, a função, a razão de ser de cada uma de suas representações (coluna B).
3. O que simboliza, para você, cada um dos 9 elementos do teste (coluna C).

Elemento A – Representado por B – Função /Papel C - Simbolizando


Queda rio, queda Destruição morte
Espada Espada construir a fogueira Ajuda
Refúgio a base da roda proteção contra o esteios da roda
tubarão
Monstro Tubarão alimentar-se animal
Cíclico a roda girando produzir energia Roda
Personagem Pescador Lazer Homem
Água Rio Lazer, alimento, causa de destruição
serviço, meio ambiente e morte
Animal Tubarão Terror Devorador
Fogo Fogueira aquecer, salvar vida aconchego, amor
115

Análise do Protocolo Nº 4 - Ulisses

O sujeito-autor do protocolo é uma senhora de mais de 72 anos que participa


ativamente de algumas oficinas da UNATI, como Inglês e o Coral, e que será identificada,
ficticiamente, neste protocolo, como Ulisses27.
Analisando de maneira geral o desenho de Ulisses identificamos que o personagem
está segurando a espada, o que poderia revelar um ato de heroísmo, mas a espada não está em
riste e não é usada para matar o monstro. Vemos, também, um local com muita água, tipo
lagoa ou represa, com um enorme peixe, que provavelmente é o monstro. Uma roda d’água
representando o elemento cíclico, uma fogueira, árvore, e mais 2 pessoas, o mesmo
personagem em movimento e, em outro ato da história admirando a natureza ou descansando
depois de salvar-se.
Lendo a narrativa detectamos que se trata de um pescador que saiu para pescar numa
represa. Após ter seu barco destruído por uma tempestade, refugiou-se numa roda d’água para
fugir de um enorme tubarão - ampliação do monstro zoomórfico real - e posteriormente,
chegou à margem da represa, com a vitória da vida, e agradeceu a Deus.
Ao desenhar a árvore, Ulisses expressa sua relação com o sagrado, com a fé em
Deus. Segundo Chevalier (2003, p. 84) a árvore “é universalmente considerada o símbolo das
relações que se estabelecem entre o céu e a terra”. Suas raízes conectam-se à terra em que se
enterra, seu tronco está em contato com a superfície da terra e seus galhos superiores, atraídos
pela luz, a faz entrar em contato com as alturas. A árvore está sempre se renovando por meio
de seus frutos e sementes que perpetua evolução. É, portanto, símbolo de vida.
O personagem é um pescador, o que remete a pesca e ao peixe. De acordo com
Chevalier (ibidem, p. 703-704), o peixe, “está associado ao nascimento ou à restauração
cíclica”, é “símbolo de reprodução, fecundidade, vida”, devido a sua “prodigiosa faculdade
de reprodução e do número infinito de suas ovas. Símbolo que pode, bem entendido,
transferir-se para o plano espiritual”. O peixe é “ao mesmo tempo salvador e instrumento da
revelação”. O pescador sai para pescar o peixe, que provavelmente lhe servirá de alimento, o
que o torna, dentro de uma cadeia alimentar, o engolidor. Porém depara-se com um peixe
enorme (tubarão/monstro), que poderia tê-lo engolido, caso ele não se escondesse na base da
roda. É, segundo Gilbert Durand (2001, p. 215), o esquema do engolidor engolido.
27
O sujeito-autor, em sua narrativa, fala em uma grande tempestade que destruiu o barco do personagem, que foi
levado pela correnteza. Na mitologia grega, Ulisses também enfrentou uma grande tempestade. O seu mito
transcendeu ao âmbito da mitologia grega. Ao regressar para Ítaca, sua cidade natal, após vencer a guerra de Tróia,
uma tempestade afastou-o de sua rota, iniciando 20 anos de aventuras no Mediterrâneo. Numa alusão ao mito, o
personagem foi batizado ficticiamente com o nome do herói grego.
116

De acordo com Ulisses, o personagem, identificado como pescador, sai para pescar
em seu barco. Embora estar dentro do barco lembre o aconchego, o pescador ‘sai para’, o que
verbaliza movimento. Contudo, está sempre preocupado com o perigo, com a morte. O
universo da angústia está presente, com o medo da morte e certa negatividade.
A tempestade ocorrida é a primeira dificuldade/angústia encontrada. Ela destrói o
barco - mais uma angústia: barco destruído/desproteção - e embora o personagem tenha sido
levado pela correnteza, foi levado com a espada - que não serviu para nada na fuga ou
vitória -. Ser levado pode significar poupar esforços - não luta, se deixa levar - e não derrota,
tendo em vista que não largou a espada - que não usou para se defender e sim para construir a
fogueira -.
Encontra com o monstro – morte (tubarão) –, que novamente coloca-o numa situação
de angústia/medo. Foge refugiando-se numa roda d’água que produzia energia, que simboliza
vida. Em outras palavras, ele vê a morte (tubarão) e refugia-se na vida (roda) que remete a
pólos contrários e complementares que fazem a realidade da vida. Sem vida não há morte.
Sem morte não há vida.
O sujeito-autor da dramatização registrada neste protocolo, quando escutado,
comenta que para ele, um dos encantos da velhice é o fato de que com a idade avançada,
pode-se ter liberdade, fazer o que quer, na hora que quer, “e quando não dá, os outros
perdoam”. Acredita que a velhice não está na idade: existem jovens-velhos e velhos-jovens.
Embora septuagenária, não se acha velha, mesmo tendo limitações na saúde. “Existem jovens
de 20-30 anos que são mais velhos do que uns de 80 anos”. Na verdade, para ela, ser velho é
“quando acabou a vontade de viver”. Na dramatização há bem presente a vontade de viver,
mas sem luta, pois Deus/fé ajuda. Ela eufemiza e despista o perigo, o monstro, sem matá-lo. A
queda expressa é a do rio onde está navegando o pescador, tem função de destruição e
simboliza negativamente morte.
Quando refugiado na roda (vida), o personagem busca o esconderijo, para despistar o
tubarão/monstro e conseguir chegar a margem da represa. Não há luta e sim fuga na busca do
aconchego da fogueira para dormir/deitar. No desenho aparecem imagens do personagem em
três posições; entre elas uma deitada e na resposta da questão “e” do questionário do teste diz
que: “Eu me entregaria total ao Pai”.
Todo o imaginário do sujeito-autor dá a idéia de vontade de se aconchegar, de
passear, de pescar em paz, pois, mesmo com as angústias acentuadas, o que ele quer é
repousar/lazer. Atribui a função de lazer ao elemento personagem/pescador e ao elemento
117

água, acrescido da função de alimento/nutrição. Ele saiu no barco (dentro), aparece a


tempestade, mas no desenho aparece fora do barco com a espada na mão. Ele não espera nada,
não luta, apenas espera em Deus e vive. A espada é apenas um utensílio para auxiliar,
simbolizando ajuda para “construir uma fogueira”.
Valendo-se do quadro síntese de especificações e do pequeno questionário (3ª parte
do protocolo), verificamos que o personagem não usou a espada para se livrar do tubarão
dentro de um rio, atribuindo-lhe outra função que não a de ataque/defesa como Yves Durand a
considerou ao colocá-la no teste como estímulo arquetípico da luta e, gostaria de eliminá-la,
conforme responde na questão nº c. 2 do questionário do teste, mas a usa para construir a
fogueira, aquecer, salvar a vida. Centrou sua composição na fé do pescador. Tinha fé que iria
se salvar, que Deus o salvaria. Projeta-se no pescador que se entrega ao Pai, numa alusão ao
Evangelho.
Confunde função/papel, simbolismo e representação do elemento monstro com o
elemento animal e tem certeza que será salvo, que alguém (Deus) irá acudi-lo. Ele delega a
alguém a função de salvá-lo, ou forma com Deus o par interativo, o coadjuvante actancial.
Na escuta ouvi que ele acredita que para se conviver bem com os filhos e netos, tudo
deve ser preparado com amor - fogo simbolizando aconchego e amor, no quadro do teste -
respeito, solidariedade e participação, e que na velhice “se colhe o que se plantou”. Talvez,
por colher o que se plantou - os frutos da árvore -, é que Ulisses, no teste, tenha tanta fé que
será salvo. É a sua compensação por plantar bons frutos.
O sujeito-autor inicia sua história/dramatização querendo passear/pescar sem luta.
Angustia-se, mas não luta, foge e se entrega nas mãos de Deus. Mesmo que busque amparo
em Deus, existe a presença de uma idéia forte da vida. Na pictografia aparece uma
duplicidade da existência do sujeito; em pé com a espada na mão, mas deitado repousando em
outra parte do desenho. Há uma seqüência de movimentos – actante evolutivo, rumo a
atração, actante atrativo que é lazer, repouso – místico.
Analisando - à luz da teoria durandiana do imaginário e dos critérios propostos na
análise Yves durandiana - o protocolo, qualifico este Micro-universo Mítico como Místico
Impuro, impureza devida a presença do monstro e da espada. Embora possamos confundir
com um duplo universo mítico, vemos que desde o início da narrativa, a idéia do personagem
era de aconchego, em busca de paz e tranqüilidade.
118

Protocolo Nº5

1ª Parte:
Identificação:
Nome Fictício: CALÍOPE
Sexo: Feminino
Idade: 64 anos e 7 meses
Grau de Instrução: Ensino Médio
Profissão: Várias – Nunca ficou parada (empresária, pintora, professora, artesã)
Reside com: 1 filho
2ª Parte:
a) Pictografia

b) Narrativa

“Havia, um homem. Que vivia em uma caverna, em contato direto com a natureza.
Sempre gostava de ficar perto de uma cachoeira que corria, perto do seu
esconderijo.
Ele ficava durante muitas horas olhando aquele espetáculo da natureza, os
peixinhos que desciam pela agua abaixo. Um dia ele acendeu uma fogueira, e apareceu um
urso, que ficou do outro lado da árvore lhe observando, não foi possivel ele usar aquela
espada, pois o animal ficou ali parado perplexo.”
119

3ª Parte:
Questionário

I - Responda de modo preciso às seguintes questões:

a) Sobre que idéia você centrou sua composição?


“A natureza”

b) Você foi eventualmente inspirado? Através de que (leitura, filme, etc)?


“inspirei em minha imaginação própria.”

c) Entre os 9 elementos do teste de sua composição, indique:


c. 1) os elementos essenciais em torno dos quais você construiu o desenho;
“O homem e o fogo, água, peixe etc”

c. 2) os elementos que você teria vontade de eliminar. Por que?


“A espada, não é preciso usar.”

d) Como acaba a cena que você imaginou?


“Suspensa.”

e) Se você tivesse que participar da cena composta, onde você estaria? O que faria?
“no lugar do homem, de frente para a fera.”

II – No quadro seguinte, você deverá especificar:


1. Por meio de que você representou os 9 elementos do teste (coluna A).
2. O papel, a função, a razão de ser de cada uma de suas representações (coluna B).
3. O que simboliza, para você, cada um dos 9 elementos do teste (coluna C).

Elemento A – Representado por B – Função/Papel C - Simbolizando


Queda Água matar a sede de amor
Espada um objeto na mão do homem cortar defender
Refúgio Caverna esconderijo privacidade
Monstro Urso matar instinto
Cíclico o pássaro voando voar leveza
Personagem o homem criatividade livre, arbitro p/ amar
Água a queda da agua que corre alimento, matar sede
Animal Urso selvagem ferocidade
Fogo Fogueira Queima cinzas
alumia
120

Análise do Protocolo Nº 5 - Calíope

O sujeito-autor do protocolo é uma senhora de 64 anos, extremamente ativa na


UNATI/UCB. Freqüenta as oficinas de Inglês, Jornalismo Comunitário e o Coral. A partir de
agora será identificada como Calíope28 (nome fictício).

Observando o desenho elaborado por Calíope, vemos um homem de pé, com uma
espada, mas a espada está direcionada para o chão. Em frente ao homem está posicionado um
monstro zoomórfico (urso). Contudo, entre eles existe um rio que os separa, mantendo o
monstro distante. Esta separação pode nos levar a crer numa divisão de 2 pólos: regime
noturno - lado do personagem com o aconchego (caverna) - e o regime diurno - lado do
monstro (perigo) -. Mas não é bem assim, pois o personagem está de pé, numa postura
heróica. Ele possui uma espada grande na mão, mas ela está abaixada. Contudo, é dito no
quadro das representações, funções e simbolismos atribuídos a cada um dos 9 elementos do
teste que a espada tem função de cortar e simboliza defender. Talvez, pela existência do rio, o
personagem se sinta resguardado e ache desnecessário o uso da espada, mas ela está na mão e
ele poderá usá-la contra o monstro, se necessário. Poderá dar ação àquilo que está, no
momento, sem função aparente.

Com a narrativa vemos uma cena bucólica, de simplicidade e tranqüilidade, com um


homem que vivia em uma caverna, seu esconderijo/refúgio/privacidade. Na história relatada
não existe luta, o monstro não ataca e o homem não usa a espada. A cena termina suspensa,
sem vencido ou vencedor. Não existe movimentação do personagem; o único movimento é o
da água do rio que segue seu curso.

De acordo com o quadro síntese de especificações dos elementos e o questionário (3ª


parte do protocolo), a queda é positiva, tendo em vista que não é do homem e sim da água,
com a função de matar a sede (utilidade). E, o fogo embora tenha a função de iluminar
(também utilidade) queima e simboliza cinzas, o que pode ser negativo.

Identifica como elemento cíclico o pássaro voando, que simboliza leveza. O pássaro,
pelo fato de levantar vôo para o céu, remete ao heroísmo. Porém, segundo Chevalier (2003,
p. 687), a leveza do pássaro carrega em si um aspecto negativo: “São João da Cruz vê nela o
símbolo das operações da imaginação, leves, mas sobretudo instáveis, esvoaçando de lá para

28
Na mitologia Calíope é uma musa, que se dedicou a poesia épica. É filha de Zeus - rei do Olimpo e dos deuses
- e Minemósine - deusa protetora da memória, filha de Urano e Gaia. Em comum com o sujeito-autor, temos que
esta senhora sexagenária, é uma poetiza. Adora criar poesias e recitá-las. Nos encontros das oficinas de
Jornalismo Comunitário não perde a oportunidade de mostrar suas poesias e prosas e falar para os jovens sobre o
amor. É uma eterna apaixonada.
121

cá, sem método e sem seqüência; o que o budismo chamaria de distração ou, pior ainda, de
divertimento”.

Calíope centrou sua idéia na natureza. Como elementos essenciais, identificou


“homem, fogo, água, peixe, etc”. Eliminaria a espada. Percebe-se na história, que muitos dos 9
elementos não têm relevância, como exemplo o próprio monstro e a espada que formam, junto
com o personagem, a tríade do universo mítico heróico. Eles existem potencializados.

Embora o sujeito-autor especifique que a função/papel do homem seja ser criativo,


parece haver uma incongruência tendo em vista que no desenho e na narrativa, o personagem
não tem ação, a cena termina inerte.

Durante a realização do protocolo, Calíope se projeta no homem. Tanto é verídico


que afirma que estaria “no lugar do homem, de frente para a fera”. Estar de frente significa
não fugir - o que ele até poderia fazer, pois o refúgio está do seu lado -, significa enfrentar
- cara a cara -. Mas não é necessário este enfrentamento, pois o rio, formado pela cachoeira,
onde existiam “peixinhos” que “desciam pela água abaixo”, o separava do monstro, da
ameaça, da morte, que na realidade não o ataca. Há uma expectativa de possível luta que não
ocorre no momento.

O peixe, de acordo com Chevalier (ibidem, p. 704), simboliza fecundidade, vida.


Podemos entender, então, que, o que separa o personagem da morte, é a vida, mas a vida
segue seu curso, como o rio que segue para desembocar no mar - “desciam água abaixo”-. O
tempo que passa não angustia o sujeito-autor.

Para o sujeito-autor todos nós temos que ter o nosso esconderijo, nossa privacidade,
nosso canto. Quando da aplicação do protocolo, num momento de informalidade, de escuta,
deixou transparecer que ser velho é “amadurecer com mais consciência”. Consciência esta
que só pode ser adquirida com a reflexão, com o tempo, talvez seja por isto que expresse
“desciam pela água abaixo”. Pensa que só seremos velhos quando não produzirmos mais,
quando vivermos em função do outro e, na vida só podemos ser dependentes de Deus - por
isto não luta, não levanta a espada para o monstro -. Acha que é gratificante viver. Não quer
enfrentar a morte. Acredita que só é duradouro aquilo que se renova como o amor e que a
idade é questão de tempo e não de velho-jovem.

Assim sendo, temos então, na UNATI/UCB uma pessoa que está mais para o lado do
aconchego, do que para a luta, mas que pensa que as pessoas devem ser incentivadas a ter
mais liberdade de sentimentos, da expressão, de pensamento. Pensa que o velho, atualmente,
122

está mais ajudado e que antes, “o velho ficava de pijama em casa” - a espera da morte, diante
do seu monstro -. Agora, o velho continua a viver.

Com base nas observações julgo que Calíope demonstra atitudes de quem possui um
Micro-universo Mítico Místico com Impureza de heroísmo.
123

Protocolo Nº 6

1ª Parte:
Identificação:
Nome Fitício: ÉDIPO
Sexo: Masculino
Idade: 69 anos e 11 meses
Grau de Instrução: 1º Grau
Reside com: Esposa
2ª Parte:
a) Pictografia

b) Narrativa (Ditado pelo sujeito-autor)

“A vida da pessoa, quer queira, quer não, é uma luta.


A luta você pode comparar que seja queda de braço?
O homem imaginando a luta, na casa dele (no refúgio), comendo uma maçã,
olhando a criação (cachorro, pato), que estavam tomando água, que corria da torneira.
Ele imaginou como vencer o aperto que é a vida (parafuso). Para vencer a
luta, o aperto, não será com a espada nem com uma queda de braço, mas sim com
inteligência (cabeça).”

Formatados: Marcadores e
numeração
124

3ª Parte:
Questionário

I - Responda de modo preciso às seguintes questões:

a) Sobre que idéia você centrou sua composição?


“Na atualidade. Imaginando o homem da periferia que tem menor poder aquisitivo.
Para este homem a vida é uma luta.”

b) Você foi eventualmente inspirado? Através de que (leitura, filme, etc)?


“O contato quase diário que tenho com essas pessoas. Eu vejo a realidade.”

c) Entre os 9 elementos do teste de sua composição, indique:


c. 1) os elementos essenciais em torno dos quais você construiu o desenho;
“O homem, a casa, a água e a maçã. São elementos essenciais para a
sobrevivência (nesta ordem).”

c. 2) os elementos que você teria vontade de eliminar. Por que?


“O parafuso, pois só serve para apertar.
A espada.”

d) Como acaba a cena que você imaginou?


“Com o homem sendo um vencedor. Tendo tudo o que tem com melhor qualidade
(casa, água, alimento).”

e) Se você tivesse que participar da cena composta, onde você estaria? O que faria?
“De alguma maneira sou o homem. Estou preso ao governo.
Faria uma carta ao Presidente dando sugestões para que tudo mudasse para
melhor.”

II – No quadro seguinte, você deverá especificar:


1. Por meio de que você representou os 9 elementos do teste (coluna A).
2. O papel, a função, a razão de ser de cada uma de suas representações (coluna B).
3. O que simboliza, para você, cada um dos 9 elementos do teste (coluna C).

Elemento A – Representado por B – Função/Papel C - Simbolizando


Queda Queda de braço União de 2 pessoas A luta pela sobrevivência
Espada Espada Defende A luta
Refúgio Casa Refúgio Abrigo
Monstro --- ---- A somatória da situação.
É viver no limite.
Cíclico --- --- ---
Personagem O homem Lutar pela humanidade
sobrevivência
Água Água caindo da bica Desperdício (água desperdício
contaminada)
Animal Cachorro, pato Amigo do homem Guarda da casa
Fogo --- --- ---
125

Análise do Protocolo Nº 6 - Édipo

O sujeito-autor deste protocolo é um senhor aposentado de quase 70 anos. Freqüenta


a UNATI/UCB há 2 anos e meio. Sendo que o que mais lhe agrada é o calor humano
dispensado pelos colegas e professores. A partir de agora será identificado pelo nome fictício
de Édipo29.

Ao desenhar sua história, Édipo dispôs os elementos soltos, sem conexão, o que
remete, a princípio, a uma possível desestrutura.

Com o auxílio da narrativa notamos que quis enfocar sua história na luta diária de um
trabalhador, comparando-a com uma queda de braço.

Na queda de braço, as mãos se unem não num gesto amigo, de união, mas de
competição, de saber quem será o vencedor e quem será derrotado; quem é o mais forte e
quem cairá: se a situação difícil de vida ou o trabalhador que luta por melhores condições de
vida e de sobrevivência. Contudo, nesta luta não existe combate físico. O homem não
empunha a espada e não sai para a guerra, apenas come uma maçã e olha a criação.

Para Chevalier (2003, p. 572) a maçã é o fruto da “árvore do conhecimento do bem e


do mal: conhecimento unificador, que confere a imortalidade, ou conhecimento
desagregador, que provoca a queda”. Chevalier cita o abade E. Bertrand, que afirma que
comer da maçã significa “abusar da própria inteligência para conhecer o mal, da
sensibilidade para desejar, da própria liberdade para praticá-lo.” Ficar dentro da sua casa
(refúgio) comendo maçã, pode não significar comodismo, mas sim reflexão, pensar em todas
as possibilidades e agir com inteligência, o que, para Édipo, é a grande arma.

O homem come a maçã, reflete em seus pensamentos, busca a melhor arma para
lutar, enquanto olha a criação (cachorro, pato) que tomavam a água que corria da torneira. A
água, purificadora, que é fonte de vida e de morte, com o poder de manifestar o transcendente,
escorre pela torneira, sem nada que a impeça, corre e cria seu curso dando de beber, sendo
fonte de vida para os animais.

Na reflexão o homem entende que a luta imposta pelas dificuldades da vida, não será
vencida pela força ou habilidade física, mas sim “com inteligência (cabeça)”.

29
Para o sujeito-autor o homem vence a luta com a inteligência. Lembra o mito de Édipo que, conta a história,
foi o único homem a vencer o enigma da Esfinge na cidade de Tebas. A Esfinge aterrorizava a todos que
queriam entrar na cidade de Tebas e Édipo venceu-a não com a força física, mas decifrando um enigma que
ninguém, até aquele momento, havia conseguido decifrar.
126

Para o sujeito-autor, o homem, a casa, a água e a maçã são os elementos essenciais,


em torno do qual construiu sua história. Eliminaria a espada e o parafuso, que só serve para
apertar, oprimir. É a figura nítida do homem reflexivo. Projeta-se no homem e faria uma carta
dirigida ao Presidente da República propondo sugestões para melhoria das condições de vida
das pessoas de classes mais humildes (como o personagem) e consequentemente do país.

No quadro síntese de especificações dos elementos do protocolo, Édipo equivoca-se


quando descreve a função/papel da queda de braço como “união de 2 pessoas” que simboliza
“a luta pela sobrevivência”. A função da queda de braço é que o mais forte vença. Nem
sempre a luta pela sobrevivência é igualitária e justa.

Não representou o fogo e o elemento cíclico, mas comenta que o cíclico representa
“uma criança de rua querendo uma fruta. Ela gira para conseguir a fruta. Não sabe se pede,
se rouba, ela gira e fica com fome.”

Quanto ao monstro em nenhum momento foi identificado na narrativa ou no desenho,


mas percebe-se e confirma-se no quadro de especificações, item c – simbolizando -, que é “a
somatória da situação. É viver no limite.” O monstro que o personagem enfrenta a sua moda,
é a luta diária pela sobrevivência.

Analisando de maneira geral o protocolo e com base na escuta, encontro que o


Micro-universo Mítico, que emerge deste protocolo, é um micro-universo Mítico Pseudo-
desestruturado, com algum otimismo, tendo em vista que termina a sua cena com o
personagem vencedor, tendo tudo “com a melhor qualidade (casa, água, alimento)”. O
sujeito-autor termina a dramatização ainda lutando dando sugestões para mudar a situação:
escreveria uma carta.

O personagem, misticamente, dentro da sua casa/refúgio/abrigo, comendo uma maça,


imagina heroicamente uma luta – “a luta pela sobrevivência”, a luta “do homem da periferia
que tem menor poder aquisitivo” - para vencer o monstro do aperto da vida - “viver no
limite”-, se defendendo com a espada da “inteligência (cabeça)”. Não deixa de considerar,
também, o passar do tempo, e o movimento cíclico de criação. Apesar da desestrutura que
emerge no desenho explodido, os “fiapos de coerência mítica” se expressam na tendência da
Síntese Sincrônica do discurso.
127

Protocolo Nº 7

1ª Parte:
Identificação:
Nome Fictício: ARETUSA
Sexo: Feminino
Idade: 62 anos e 7 meses
Grau de Instrução: Ensino Fundamental
Incompleto (Primário)
Reside com: Marido e um filho

2ª Parte:
a) Pictografia

b) Narrativa

“Um certo dia Joãozinho estava ao lado de sua casa admirando os peixes que
estavam nadando nas águas cristalinas do rio, ao mesmo tempo ele observava um pássaro
voando. De repente ele viu um monstro se aproximando, aí ele fez um fogo para afastar o
animal. Como o monstro não teve medo do fogo.
Ele correu para dentro do casebre procurando refúgio. Só assim ele ficou protegido
do monstro.
128

3ª Parte:
Questionário

I - Responda de modo preciso às seguintes questões:

a) Sobre que idéia você centrou sua composição?


“O dia seguinte”

b) Você foi eventualmente inspirado? Através de que (leitura, filme, etc)?


“Da minha memória (inventei).”

c) Entre os 9 elementos do teste de sua composição, indique:


c. 1) os elementos essenciais em torno dos quais você construiu o desenho;
“natureza, monstro, peixe, casebre, etc.”

c. 2) os elementos que você teria vontade de eliminar. Por que?


“Fogo, porque ele destrói as matas.”

d) Como acaba a cena que você imaginou?


“O personagem procurou refúgio”

e) Se você tivesse que participar da cena composta, onde você estaria? O que faria?
“O mesmo que o personagem, procuraria me proteger”

II – No quadro seguinte, você deverá especificar:


1. Por meio de que você representou os 9 elementos do teste (coluna A).
2. O papel, a função, a razão de ser de cada uma de suas representações (coluna B).
3. O que simboliza, para você, cada um dos 9 elementos do teste (coluna C).

Elemento A – Representado por B – Função/Papel C - Simbolizando


Queda D água Natureza Beleza
Espada
Refúgio Casa Refugio Moradia
Monstro um animal
Cíclico
Personagem Um menino Infância Criança
Água Um rio
Animal Um
Fogo Fogueira Destruição
129

Análise do Protocolo Nº 7 - Aretusa

O sujeito-autor do protocolo, doravante denominado ficticiamente por Aretusa30, é


uma senhora com mais de 62 anos. Alega que freqüenta o programa para enriquecer seus
conhecimentos e o que mais lhe agrada é o companheirismo das colegas e a dedicação dos
professores.
O desenho apresentado por Aretusa, parece estar separando a história em 2 pólos: um
onde existe a cena entre o homem e o monstro e uma outra cena que remete à tranqüilidade.
Mas, ao ler a narrativa, constatamos que não é isso. Trata-se de uma única cena; onde o
personagem quis afastar o monstro/morte/perigo, por meio do fogo. Se conseguisse, aí sim,
haveria separação, mas não adiantou. Houve uma tentativa heróica de afastar o mostro. O
fogo foi o instrumento imaginado para livrar o personagem/menino do perigo. O elemento
espada, que é colocado no teste por Yves Durand como possibilidade de ataque ou defesa, não
foi representado nem simbolizado no quadro final do teste. Ele aparece no desenho, mas foi o
fogo o recurso imaginado, pelo sujeito-autor (personagem), para afugentar, sem sucesso, o
monstro. Na verdade o monstro não ataca e não há luta, o que remete à possibilidade da
presença de um imaginário místico, quebrado pela imaginação do uso do fogo como arma
frente ao monstro zoomófico.
O desenho do personagem parece estar com uma espada voltada para o chão, mas
isto não é confirmado nem pela história, nem pelo quadro síntese de especificações dos
elementos (representação, função/papel e simbolização).
Aretusa ao inventar/imaginar a sua história, projeta-se no personagem
menino/criança, assumindo que se estivesse no lugar dele, procuraria se proteger. Talvez
porque, para uma criança, não seja feio ter medo e se esconder.
O quadro de especificações (3ª parte do protocolo), colocado no teste por Yves
Durand (1988) para ajudar na análise do imaginário registrado nos protocolos, não foi
totalmente preenchido pelo sujeito-autor, dificultando a análise. Isto pode estar demonstrando
uma radicalização da antifrasia – super místico -, que não admite imaginar a presença dos
elementos heróicos: ausência dos elementos, espada e cíclico e da representação do elemento

30
O mito de Aretusa lembra um pouco a história narrada pelo sujeito-autor. Na dramatização narrada o personagem
estava nadando nas águas cristalinas do rio, quando de repente viu um monstro se aproximando. Como não conseguiu
afastar o monstro, procurou refúgio. Na mitologia grega, Aretusa foi uma ninfa, que acompanhava Ártemis (ou Diana).
A ninfa adorava andar livremente e admirar a beleza da natureza. Um dia percebeu um rio cristalino e decidiu banhar-
se em suas águas convidativas. Mas, tão logo entrou no rio, percebeu que não estava só, porque o deus desse rio,
Alfeus, ficou enrubescido pela beleza de Aretusa e imediatamente apaixonou-se pela ninfa. Aretusa, no entanto, nada
queria com o passional deus do rio. Aretusa foi perseguida, mas, por fim, ela encontrou refúgio.
130

monstro incompleto. Pode, no entanto, ser que o quadro deixou de ser completado por falta de
tempo ou por desânimo na execução das ordens dadas nas consignas, pois não há desestrutura
e a coerência mítica se evidencia na história bem encadeada e no desenho representativo de
um imaginário estruturado. A desestrutura pode estar no título dado à dramatização
imaginada: “O dia seguinte”, que parece não ter correlação com a mesma. Coloca ao mesmo
tempo como essenciais o elemento queda/natureza, o monstro, o peixe – talvez querendo
referir-se ao elemento animal que não representa, não simboliza, nem lhe atribui função, no
quadro do teste, representando-o, apenas, no desenho e na história -, e o casebre, dito
casa/refúgio/moradia no quadro do teste. Isto pode estar indicando laivos de desestrutura no
imaginário registrado no protocolo.
No inicio da sua história o autor dá ênfase a um ambiente bucólico, cheio de paz,
admirando peixes que nadavam em águas cristalinas ao mesmo tempo em que observava um
pássaro voando.
A água limpa traz vida, força e pureza. É símbolo da sabedoria, da graça, da virtude,
da fertilidade e da fecundidade (CHEVALIER, 2003, p. 15). Tal como a água, o peixe
também traz vida e fecundidade. Ambos remetem à antifrasia/misticismo. Embora o pássaro
remeta ao heroísmo, nesta história ele (o pássaro) fortalece o clima místico, pois simbolizam
“os estados espirituais, os anjos, os estados superiores do ser. (...) Os pássaros são, de algum
modo, símbolos vivos da liberdade divina, eximido das contingências terrestres”
(ibidem, p. 687-688).
O personagem não consegue espantar o monstro, tampouco enfrentá-lo. Foge e
refugia-se no casebre, ficando protegido. A casa, segundo Bachelard, significa o ser interior.
É na pequena casa que o personagem refugia-se do monstro obtendo a vitória: conseguir
salvar-se, o que identifica o imaginário positivo contido neste micro-universo mítico.
O sujeito-autor desenha no céu, além do pássaro voando, nuvens e sol.
Segundo Chevalier (ibidem, p. 648) a nuvem “é o símbolo da metamorfose viva, não
por causa de alguma de suas características, mas em virtude de seu próprio vir a ser”.
O sol é a fonte de luz e de calor. É símbolo da vida e renovação de autoridade de
imortalidade; “está no centro do céu como o coração no centro do ser” (ibidem, p. 837). Por
estar no alto, e ser a própria claridade, remete ao heroísmo, o que neste protocolo representa
uma impureza na estrutura mística configurada.
Julgo, após análise que o Micro-universo Mítico do sujeito-autor é Místico com
impureza de heroísmo, portanto: Místico Impuro.
131

Protocolo Nº 8

1ª Parte:
Identificação:
Nome Fictício: MORFEU
Sexo: Feminino
Idade: 63 anos
Grau de Instrução: Científico
Reside com: Esposo

2ª Parte:
a) Pictografia

b) Narrativa

“Eu via nos meus sonhos uma cachoeira, com uma queda enorme dagua, que
saia um soldado com uma espada, mais na frente tinha uma igreja que era meu refugio,
pois estava muito a Sustada, mais adiante tinha um monstro que queria me devorar. lá
na frente encontrei um carro que me deu bastante alegria que iria me levar a outro
lugar, pois eu sou o personagem fiquei muito alegre, com aquêle belicimo, mar de água,
pois eu ia pescar grandes peixes para minha alegria, ao anoitecer eu vi o sol nascendo
parecia uma toalha de fogo de tão bonito estava, era só aquela imaginação da minha
história.”
132

3ª Parte:
Questionário

I - Responda de modo preciso às seguintes questões:

a) Sobre que idéia você centrou sua composição?


“Seria em uma mata feixada”

b) Você foi eventualmente inspirado? Através de que (leitura, filme, etc)?


“da minha cabeça”

c) Entre os 9 elementos do teste de sua composição, indique:


c. 1) os elementos essenciais em torno dos quais você construiu o desenho;
“refugio - agua, etc.”

c. 2) os elementos que você teria vontade de eliminar. Por que?


“espada, não gosto de luta, guerra etc.”

d) Como acaba a cena que você imaginou?


“ao entardecer”

e) Se você tivesse que participar da cena composta, onde você estaria? O que faria?
“no refugio”

II – No quadro seguinte, você deverá especificar:


1. Por meio de que você representou os 9 elementos do teste (coluna A).
2. O papel, a função, a razão de ser de cada uma de suas representações (coluna B).
3. O que simboliza, para você, cada um dos 9 elementos do teste (coluna C).

Elemento A – Representado por B – Função/Papel C - Simbolizando


Queda Dágua nesecidade paz
Espada Briga-luta luta guerra
Refúgio Igreja Lugar de buscar refugio
Monstro Homem d
Cíclico Carro socorro tirar do lugar
Personagem Eu a procura A busca
Água Tranqüilidade armonia paz
Animal Peixe salvacão
Fogo Entardecer muita paz luz
133

Análise do Protocolo Nº 8 - Morfeu

O sujeito-autor do protocolo, doravante denominada Morfeu31, é uma sexagenária.

Durante o processo de escuta, o sujeito-autor afirmou que necessita muito de ajuda e,


no espaço da Universidade, encontrou a ajuda, pois as oficinas funcionam, para ela, como
uma terapia, principalmente, a de informática e a disciplina Introdução à Gerontologia. A
partir da sua freqüência na UNATI/UCB ela tornou-se uma outra pessoa.

No desenho realizado pelo sujeito-autor, os elementos se apresentam separadamente,


de forma linear (2 linhas horizontais), o que, a princípio faz-nos crer numa possível
desestrutura.

Morfeu criou uma narrativa com os elementos que compõem o AT-9, na mesma
ordem em que foram apresentados para a atividade, demonstrando a preocupação em utilizar
todos, gerando um discurso, a princípio, sem interligação de acontecimentos.

A história é narrada como um sonho. Normalmente o sonho é complexo,


representativo e de certa forma movimenta o nosso emocional. Por ser individual, é a
expressão mais secreta de nós mesmos, onde nos expomos apenas a nós mesmos e às vezes,
nem isto permitimos. Chevalier (2003, p. 844) elogia as palavras de Frédéric Gaussen sobre o
sonho que define como: “símbolo da aventura individual, tão profundamente alojada na
intimidade da consciência que se subtrai a seu próprio criador, o sonho nos aparece como a
expressão mais secreta e mais impudica de nós mesmos”. Cita, também, outras definições,
como de Freud: “o sonho é a expressão, ou a realização, de um desejo reprimido” e de Jung:
“ele é a auto-representação, espontânea e simbólica, da situação atual do inconsciente”.

Morfeu, em seu sonho, vê uma cachoeira com uma queda. Aqui a queda é positiva
por não ser do herói. Desta queda d’água sai um soldado com uma espada, mas esta não é
usada e fica desfuncionalizada. Vê a igreja como um refúgio, mas não entra dentro dela, pois
estava muito assustada. O texto criado não diz que o soldado com a espada perseguia a
personagem. Será que o personagem fugia ou apenas prosseguia na caminhada? Se fugia, de
que ou de quem fugia? Por que não se refugiou na igreja? Se apenas caminhava, por que
estava assustada?

31
A escolha pelo nome de Morfeu deu-se pelo fato do sujeito-autor contar um sonho. Segundo a mitologia grega,
Morfeu é o deus dos sonhos e é filho de Hipnos, deus do sono.
134

A igreja nos faz pensar num local de aconchego para o corpo e para o espírito, onde
se acredita que se pode estar mais perto de Deus e ter a sua proteção – lugar de busca/refúgio.
Segundo Chevalier (ibidem, p. 501) a igreja é considerada como a mãe do cristianismo e pode
ter a ela aplicado todo o simbolismo da mãe. Está sempre pronta para receber a todos
independente de estilo de vida e de pecados. Mas, apesar de assustada, a personagem não
entra no refúgio (igreja) e continua o seu trajeto. Vê um monstro antropomórfico que quer
devorá-la, mas ela encontra um carro (cíclico) que a levará para outro lugar, um lugar
belíssimo, que será o seu refúgio.

O carro só existe em virtude do conjunto de peças que o compõe. Rodas, eixo,


bancos, portas, têm toda uma significação própria, individual, que quando estão em conjunto
formando um único objeto (carro), reforçam suas significações individuais e acrescem a
harmonia da união. São as partes que fazem o carro funcionar, movimentar-se, sem elas, ele
(o carro) inexiste em sua função. Contudo, tão importante quanto o carro é o seu condutor, o
mestre que detém o conhecimento da manipulação da máquina e principalmente do caminho,
o destino. No caso da personagem o carro a auxiliará, conduzindo-a até outro lugar. O carro é
o responsável por tirá-la de um ambiente de tensão e por levá-la para um ambiente tranqüilo,
de paz, com belezas naturais (refúgio), que lhe proporcionará alegria.

O lugar tranqüilo era um “belíssimo mar de água”, com grandes peixes. O mar, por
ter movimento, é o símbolo da dinâmica da vida, é o lugar de transformações. Para Chevalier
(ibidem, p. 592) “o mar simboliza um estado transitório entre as possibilidades ainda
informes das realidades configuradas, uma situação de ambivalência, que é a de incerteza, de
dúvida, de indecisão, e que pode se concluir bem ou mal. (...) o mar é ao mesmo tempo a
imagem da vida e da morte.” Mas, o mar de Morfeu possui vida, pois contém grandes peixes
para serem pescados. É a vida que se tira do mar para servir, provavelmente, de alimento para
uma outra vida (salvação).

Embora o sujeito-autor diga em seu texto que “ao anoitecer eu vi o sol nascendo
parecia uma toalha de fogo”, acredito que houve um equívoco na redação. O sujeito-autor
quis referir-se ao pôr do sol, ao sol que morre em todos os finais de tarde, para no dia
seguinte, nascer novamente, referir-se ao crepúsculo, que, como diz Paula Carvalho (1999,
p. 38) “a imagem do sol mostra que, mesmo em se pondo, no crepúsculo, ele continua (...) sua
morte é aparente, na verdade, mudança de registro, dimensão e hemisfério”.

Chevalier (op.cit., p. 836) registra:


135

“O sol imortal nasce toda manhã e se põe toda noite no reino dos mortos;
portanto, pode levar com ele os homens e, ao se por, dar-lhes a morte; mas ao
mesmo tempo, pode guiar as almas pelas regiões infernais e trazê-las de volta à luz
no dia seguinte”.
No protocolo o sujeito-autor diz que viu sol “parecia uma tolha de fogo de tão bonita
que estava”. Tal expressão (“toalha de fogo”) é uma metáfora usada por Morfeu para
representar a vermelhidão no céu, no local onde o sol irá morrer, para depois renascer (no
lado oposto). A cor vermelha (vermelhidão), num tom claro, parece mais leve, pode
representar a alegria da vida. “É diurno, macho, tônico, incitando à ação, lançando como um
sol, seu brilho sobre todas as coisas, com uma força imensa e irredutível”. Porém, numa
nuance mais escura, torna-se uma cor mais pesada, de amadurecimento, com certo toque de
tristeza, representa o “noturno, fêmea, secreto (...) representa não a expressão, mas o mistério
da vida. Um seduz, encoraja, provoca (...) o outro alerta, detém, incita vigilância e, no limite,
inquieta ...” (ibidem, p. 944). O vermelho representa, então, o mistério da vida (vida, morte e
imortalidade).

Recorrendo às respostas da 3ª parte do protocolo, no que tange ao questionário,


percebe-se como incoerência o fato do tema da composição ser indicado como em uma mata
fechada, quando não existe mata na história. O autor deixa claro o refúgio como essencial, e
eliminaria a espada porque não gosta de luta. Já no quadro síntese das especificações dos
elementos, ele enfatiza a idéia de interiorização (paz, salvação, harmonia e busca).

Embora Morfeu indique, no final de sua narrativa, que tudo aconteceu na imaginação
de sua história, em vários símbolos desenhados percebemos a idéia de vida e de morte. E, na
sintonização da narrativa, vemos que a morte está muito mais presente, porém com o objetivo
de renascimento, de transformação, dedicando-se mais ao amadurecimento, a espiritualidade,
ao aconchego, ao místico.

O desenho apresenta-se explodido remetendo a uma possível desestrutura. Na


narrativa falta uma cadência, evolução para os fatos, mas existem fiapos de coerência mítica,
como diz Lahud Loureiro (em sessões de orientação), o que faz-nos crer que, na verdade, o
universo mítico aqui desvelado não é desestruturado. Numa interpretação mais apurada,
vemos o desejo de busca e de uma vida tranqüila, ao redor do refúgio (natureza), onde se
poderá ter uma vida pacífica. Desta forma julgo que Morfeu possui um Micro-universo
Mítico Pseudo-desestruturado, com forte tendência mística.
136

Excluído: Unati

Protocolo Nº 9

1ª Parte:
Identificação:
Nome Fictício: CRONOS
Sexo: Feminino
Idade: 67 anos e 2 meses
Grau de Instrução: Segundo Grau
Reside com: Só (tem uma filha)

2ª Parte:
a) Pictografia

b) Narrativa

“Era uma vez, um militar do exército, êle queria muito progredir, ter sussesso na
vida, em seu 1º ano de carreira teve uma queda, porém usando uma espada e um relógio
tornou-se um monstro devorante, fez uma roda entrou dentro do mesma como um
personagem da água (peixe) que não gosta de fogo.”
137

3ª Parte:
Questionário

I - Responda de modo preciso às seguintes questões:

a) Sobre que idéia você centrou sua composição?


“A vida de um militar – início de carreira”

b) Você foi eventualmente inspirado? Através de que (leitura, filme, etc)?


“Eventualmente inspirada”

c) Entre os 9 elementos do teste de sua composição, indique:


c. 1) os elementos essenciais em torno dos quais você construiu o desenho;
“queda – refúgio – devorante - progride.”

c. 2) os elementos que você teria vontade de eliminar. Por que?


“queda – devorante - refúgio”

d) Como acaba a cena que você imaginou?


“em fogo”

e) Se você tivesse que participar da cena composta, onde você estaria? O que faria?
“me refugiava”

II – No quadro seguinte, você deverá especificar:


1. Por meio de que você representou os 9 elementos do teste (coluna A).
2. O papel, a função, a razão de ser de cada uma de suas representações (coluna B).
3. O que simboliza, para você, cada um dos 9 elementos do teste (coluna C).

Elemento A – Representado por B – Função/Papel C - Simbolizando


Queda bonecos caindo mostra queda insussesso
Espada boneco e espada Briga ruim
Refúgio 1 relógio compromisso correria
Monstro 1 quadrado homem Insussesso fracasso
Cíclico Roda Rolando vencido
Personagem 1 soldado Submisso ordem
Água forma de chuva coisa boa
Animal Cachorro Defesa amigo
Fogo riscos pra cima Queimar acabar
138

Análise do Protocolo Nº 9 - Cronos

O sujeito-autor deste protocolo é uma senhora de 66 anos que, a partir de agora será
identificada com o nome fictício de Cronos32.
Excluído: Unati
Cronos freqüenta a UNATI/UCB há algum tempo, em várias oficinas. Gosta de todas,
Excluído: Unati
especialmente da hidroginástica. Busca na UNATI a possibilidade de atualização dos seus
conhecimentos.

Examinando a pictografia elabora por Cronos, observamos, a princípio, uma série de


acontecimentos em cadência, que compõe toda a cena; o que se confirma na narrativa.

O militar (personagem) queria progredir, evoluir, mas teve uma queda, o que nos faz
entender que seja de ordem profissional.

O desenho, a narrativa e quadro síntese de especificações dos elementos do teste, em


suas co-relações, apresentam algumas diversidades; como por exemplo, o relógio que no
discurso é o monstro, no quadro de representações é o refúgio, e o monstro é um quadrado
homem que simboliza fracasso.

Cronos centrou sua composição na vida de um militar no início de carreira. Projeta-


se no personagem “soldado submisso”. Eliminaria 3 dos 4 elementos que inicialmente
considerou essenciais - essenciais: queda, refúgio, devorante, progride; eliminaria: queda,
refúgio, devorante -. Faria o mesmo que o personagem: se refugiaria, como registra na
resposta à questão “e” do questionário do teste.

O personagem aspirava progredir, ter sucesso, mas teve uma queda, onde não
sabemos se conseguiu levantar-se. Usando uma espada e um relógio, transformou-se num
monstro devorante. Monstro este, que está concebido como relógio que representa tempo.

O tempo, com seu movimento volvente, traceja o ciclo da vida, contabilizando-a.


Significa um limite entre a vida terrena e a eternidade. O tempo da vida terrena é finito, o da
eternidade é ilimitado, é a negação do próprio tempo.

De acordo com Chevalier (2003, p. 876) para Baudelaire, o tempo é “o inimigo


vigilante e funesto, o obscuro inimigo que nos corrói o coração (Spleem e Ideal)”.

32
A alusão ao nome de Cronos fazendo uma analogia entre o sujeito-autor e o personagem da mitologia grega,
deu-se pelo fato da preocupação com o tempo/relógio.
A mitologia grega identifica Cronos como uma figura enigmática, que simboliza o tempo. É filho de Urano
(Céu) e Gaia (Terra) e pai de Zeus. Excluído:
139

O discurso não deixa claro o porquê do tempo como monstro devorante, no qual o
personagem se transforma. Contudo, no caso deste protocolo, a angústia não está presente
pela infinitude do tempo, mas justamente pelo seu oposto: sua limitação. A sociedade
contemporânea vive numa luta constante contra os limites do tempo. Temos que ter tempo e
espaço para tudo, só não temos tempo para nós mesmos. O tempo é exigente e limitado, o
minuto que se foi não se recupera mais. Tornamo-nos escravos deste deus - tempo -. Deus ou
monstro? Para o sujeito-autor, monstro que devora!

Como o personagem transforma-se no monstro, o refúgio criado é do monstro. Para


esconder-se ele construiu uma roda. A roda tem a forma circular, o relógio (tempo), também.
O centro do círculo do relógio é considerado como “o aspecto imóvel do ser”, e o eixo que
torna possível o movimento dos seres opõe-se a este centro, como a eternidade se opõe ao
tempo (ibidem, p. 876). Talvez, para o personagem o seu refúgio seja a ilimitação do tempo,
onde lá ele terá todo o tempo do mundo para tudo, inclusive para o sucesso profissional.

No quadro síntese de especificações dos elementos, o monstro está representado por


“1 quadrado homem”, que simboliza insucesso. O movimento circular do relógio faz uma
curva que evolui entre o começo e o fim de cada segundo, minuto, hora, ano e assim por
diante, ou seja, qualquer medida que se pense, remete ao tempo. Segundo Chevalier (ibidem,
p. 876), os relojoeiros contemporâneos, inconscientemente, numa tentativa de dominar a
angústia do tempo criou os relógios quadrados, “simbolizando, assim, a ilusão humana de
escapar à roda inexorável e de dominar a terra impondo-lhe a sua medida”. Embora o
quadrado simbolize espaço e não tempo, existe uma co-relação entre eles, que a física pode
explicar. No caso do relógio quadrado, essa mudança de forma, pode nos iludir; mas quanto
ao quadrado, este nos remete a terra, a matéria em oposição à eternidade. Porém, os
movimentos dos ponteiros (eixos) não deixam de ser circulares.

Vemos, então, que as diversidades apontadas no início da análise entre desenho,


narrativa e quadro síntese de especificações dos elementos não são assim tão diversos,
inconscientemente, um completa o outro. O “1 homem quadrado” que simboliza fracasso
pode, mais uma vez, remeter ao monstro relógio (abstração) numa alusão ao tempo.

Percebe-se que Cronos joga com as palavras do teste AT-9 para criar a sua narrativa,
mas, inconscientemente, revela sua angústia: o pavor do tempo e de suas limitações. O
personagem/monstro refugia-se na roda que criou, “como um personagem da água (peixe) que
não gosta de fogo”. Descreve aqui, a água em oposição ao fogo. São dois símbolos
antagônicos, mas cada um deles pode significar vida, morte, renascimento, purificação. Os
140

papéis podem ser invertidos ou aliados, ou simplesmente um dominar o outro. Mas como o
peixe precisa da água para ter vida, é neste contexto, um elemento positivo e o fogo negativo.
São oposições que se completam, numa interdependência, como molhado-seco, “yin-yang”,
bem-mal.
Excluído: Diante das pontuações
Continuando na análise das co-relações entre o desenho, a narrativa e quadro síntese feitas, julgo que o Micro Universo
Mítico do sujeito-autor seja
de especificações dos elementos do teste, percebemos que parece existir, no protocolo, certa Sintético Simbólico de forma
Diacrônica, pois o personagem é
desestrutura: aparece um cachorro no quadro e no desenho que não existe na história um militar o que remete ao
heroísmo, quer vencer, quer ter
sucesso (heroísmo), mas ao
imaginada (narrativa); o militar teve uma queda, mas no desenho esta imagem não se transformar-se no monstro
(tempo), com a ajuda da espada e
confirma, nem no quadro, onde é representado por bonecos caindo/insucesso; usa boneco e do relógio, refugia-se (místico).
Refugia-se na infinitude do tempo
espada/briga/ruim, como representação, função e simbolismo do elemento espada, o que não (eternidade) o que leva a crer que
ele passa a viver num outro
aparece na história nem no desenho; se refugia na correria/compromisso; tornou-se um universo: o de tranqüilidade, sem
cobranças,¶
monstro devorante, um homem quadrado ou um quadrado homem/insucesso/fracasso. Entrou Excluído: uma
Excluído: : a
no cíclico/roda – vencido, como um soldado submisso/ordem entra na água/chuva (como
Excluído: que
quem está na chuva é para se molhar), mas não quer se queimar, correr riscos (hierárquicos Excluído: .
militares), se acabar – não gosta do fogo (riscos pra cima). Prefere ou escolhe cumprir para ter Excluído: . O
Excluído: i
sucesso na vida militar, na ordem estabelecida que no início ele descumpriu.

Diante das pontuações feitas, julgo que o Micro-universo Mítico do sujeito-autor seja
Sintético Simbólico de forma Diacrônica, pois o personagem é um militar o que remete ao
heroísmo, quer vencer, quer ter sucesso (heroísmo), mas ao transformar-se no monstro
(tempo), com a ajuda da espada e do relógio, refugia-se (místico). Refugia-se na infinitude do
tempo (eternidade) o que leva a crer que ele passa a viver num outro universo: o de
Excluído: sem
tranqüilidade, o de não lutar contra o pré-estabelecido, o de submissão, de acomodação.
Excluído: ???Conceição aí é que
Aceita as ordens militares que antes ele descumpriu e por isto se disse em queda. Ao aceitar o ele está submisso, a
Excluído: ando
pré-estabelecido ele se considera um monstro devorante que se o faz é para não ter queda e
Excluído:
sim sucesso na vida militar. Excluído:
141

Protocolo Nº 10

1ª Parte:
Identificação:
Nome Fictício: HEBE
Sexo: Feminino
Idade: 69 anos e 9 meses
Grau de Instrução: 2º Grau
Reside com: Esposo

2ª Parte:
a) Pictografia

b) Narrativa Formatados: Marcadores e


numeração

b) Narrativa
“Era uma vez uma menina chamada Krystal, levada como só ela, brincando ele
levou uma queda na escada, mas não machucou.
Sua imaginação era muito fértil sua brincadeira predileta com seu irmão era o
jogo das espadas, ou então se esconder dentro de um baú, era sua caverna, derepente
ouviu-se um grito, olha uma cobra e saiam correndo.
Em dias de sol forte, enchiam a piscina de plástico, faziam barquinhos de papel e
com os peixes de plásticos, era aquela farra.
Com a chegada da noite todos iam para o quintal sentar-se perto da fogueira,
pediam para contar histórias e a preferida era do Saci-pererê.”
142

3ª Parte:
Questionário

I - Responda de modo preciso às seguintes questões:

a) Sobre que idéia você centrou sua composição?


“O dia de uma criança”

b) Você foi eventualmente inspirado? Através de que (leitura, filme, etc)?


“Sim, através da minha própria imaginação minha memória (inventei).”

c) Entre os 9 elementos do teste de sua composição, indique:


c. 1) os elementos essenciais em torno dos quais você construiu o desenho;
“A criança e ”

c. 2) os elementos que você teria vontade de eliminar. Por que?


“Espada, cobra, porque são elementos nocivos.”

d) Como acaba a cena que você imaginou?


“Da melhor maneira possível, com todos reunidos”

e) Se você tivesse que participar da cena composta, onde você estaria? O que faria?
“Estaria junto à fogueira, e também contando uma bela história.”

II – No quadro seguinte, você deverá especificar:


1. Por meio de que você representou os 9 elementos do teste (coluna A).
2. O papel, a função, a razão de ser de cada uma de suas representações (coluna B).
3. O que simboliza, para você, cada um dos 9 elementos do teste (coluna C).

Elemento A – Representado por B – Função/Papel C - Simbolizando


Queda Uma criança caindo na Ter cuidado Alerta
escada
Espada Um guerreiro Representa desafio Luta
Refúgio Uma caverna p. esconder // ficar só Solidão
Monstro Cobra que é perigo Amedrontar Medo
Cíclico Sol é vida Tudo q. ser humano Luz
precisa
Personagem Saci-pererê Enganador, sagaz Zombedeiro
Água Vida, rios, mares Representa tudo Vida
Animal Peixe símbolo de Cristo Representa vida Amor
Fogo Fogo também é vida Não se vive sem ele Paixão
143

Análise do Protocolo Nº 10 - Hebe

O sujeito-autor deste protocolo é uma senhora de quase 70 anos, que será


identificada, ficticiamente, como Hebe33.

O desenho realizado por Hebe mostra figuras isoladas, a principio, sem conexão
entre elas e com nomes identificando-as. Numa visão inicial, podemos identificar um
imaginário não-estruturado.

Com o auxílio da narrativa, vemos que a história contada tem uma cadência de
pensamentos, onde a personagem principal, no qual o sujeito autor se projeta, é uma menina
levada, que passa o dia brincando.

Hebe inventou sua historia, inspirada no “dia de uma criança”. Uma menina levada,
cheia de energia e de imaginação, que brinca de “faz de conta”, criando situações. A criança é
o símbolo de pureza e espontaneidade. Em sua fase – infância - tudo é inocência e
simplicidade. Não existem pressões com as limitações de tempo, com as cobranças de ordem
profissional ou de demonstrar aquilo que não se sente. Ser criança é ser autentico, é viver cada
minuto da vida, sem se importar com o futuro, viver com toda a intensidade. De acordo com
Chevalier (2003, p. 302), “na evolução psicológica do homem, atitudes pueris ou infantis (...)
assinalam períodos de regressão; (...) a imagem da criança pode indicar uma vitória sobre a
complexidade e a ansiedade, e a conquista da paz interior e da autoconfiança.” Paula
Carvalho (1999) se refere ao par arquetípico puer-senex, como “fundamento da antropolítica
da neotenia humana e da pedagogia do ócio imaginário”.

Essa criança ativa, cheia de energia, cria vários tipos de brincadeiras. Inventa
brincadeiras de esconder, entrando dentro do refúgio/baú/solidão/ficar só, fazendo de conta
que é uma caverna, o que é típico do micro-universo místico. Em dias de sol forte – “tudo que
o ser humano precisa/luz” -, brinca na água da piscina, brinca com a “vida” que “representa
tudo” e com outros tipos de brincadeiras. São dias intensos cheios de alegria. Até mesmo
quando sofre uma queda na escada, não se machuca, quer continuar brincando, fazendo
exercícios físicos, extravasando sua energia. A idéia principal desta dramatização é a
“criança”, que no quadro do teste representa o elemento queda, com a preocupação de “ter
cuidado” simbolizando “alerta”. Mesmo brincando a pessoa idosa se preocupa com as
possíveis quedas e suas conseqüências.

33
A escolha do nome de Hebe para o sujeito-autor deve-se ao fato de na mitologia grega, Hebe ser considerada
como a deusa da juventude e a história narrada contar sobre brincadeiras de criança, momentos de juventude.
144

Após um dia/vida cheio de energia, todos se reuniam perto da fogueira para ouvirem
histórias. Com a noite/velhice, chega à hora das atividades passivas, onde, na “hora do conto”
- rememorizações -, renovam-se as energias para o dia seguinte - para continuar vivendo -. É
um momento de descanso, de aconchego. - Estaria se referindo a sua velhice? -

Hebe tem como temática o dia de uma criança e enfatiza o ato do contar histórias, do
faz de conta. Termina a cena com todos reunidos e, se tivesse que participar da cena, estaria
junto à fogueira contando uma bela história. Provavelmente deixando emergir lembranças.
Talvez esta criança levada simbolize o seu tempo passado, a sua infância, com bastante
energia e agora seja o tempo da tranqüilidade, de repassar suas vivências, suas histórias, para
outros.

Utilizando a “Pedagogia da Escuta” e estando atenta aos comentários de Hebe,


confirmei que ela freqüenta a UNATI/UCB porque tem o desejo de acompanhar o que
acontece no mundo. Gosta de todas as oficinas, inclusive das atividades físicas e do
atendimento médico. Quando pode, participa das atividades desenvolvidas pela escola de seus
netos. Vemos, então, que é uma pessoa ativa, que gosta de estar sempre num grupo, com
amigos e familiares, e que, eufemisa a espada e o monstro, através da brincadeira.

Considero que Hebe, neste protocolo do teste AT-9, deixou emergir um imaginário
com uma Pseudo-desestrutura com tendência a estrutura Mística Lúdica. Trata-se de um
Micro-universo Mítico Pseudo-desestruturado com tendência no Místico-Lúdico, que se
refugia na noite, com os amigos, em volta da fogueira, contando lendas e histórias, mostrando
a idéia de vida em um imaginário pleno do desejo do aconchego, onde os elementos heróicos
são eufemizados em brincadeiras/brinquedos, mas que apresenta um desenho explodido onde
não aparecem conexões entre os elementos.
145

Protocolo Nº 11

Identificação:
Nome Fictício: MÉTIS
Sexo: Feminino
Idade: 71 anos e 9 meses
Grau de Instrução: 2º Grau
Reside com: Sozinha

2ª Parte:
a) Pictografia

c) Narrativa Formatados: Marcadores e


1ª Parte: numeração

b) Narrativa

“As margens do lago; formado por uma bela queda d’agua, Pedro pesca
tranquilamente, o peixe que seria o seu sustento. Pedro mora numa velha
choupana, em companhia de seu cão; o amigo fiel que lhe acompanha há muito
tempo. Pedro, embora seja um pobre pescador, vive feliz no seu rincão; onde pode
contemplar o céu, o sol e os pássaros, em paz total.
Pedro no seu refúgio; está longe da violência (monstro devorante) da
grande cidade”
146

3ª Parte:
Questionário

I - Responda de modo preciso às seguintes questões:

a) Sobre que idéia você centrou sua composição?


“No homem que vive fora da cidade grande (campo)”

b) Você foi eventualmente inspirado? Através de que (leitura, filme, etc)?


“Pedro – É figura típica do homem pobre na qual se cria histórias - eu conheci este
Pedro”

c) Entre os 9 elementos do teste de sua composição, indique:


c. 1) os elementos essenciais em torno dos quais você construiu o desenho;
“personagem – peixe – cão – água (lago) – casa (refúgio) – o pássaro – o sol”

c. 2) os elementos que você teria vontade de eliminar. Por que?


“A espada (arma que Pedro jamais usaria)”

d) Como acaba a cena que você imaginou?


“Na tranqüilidade e na paz do seu espaço”

e) Se você tivesse que participar da cena composta, onde você estaria? O que faria?
“Junto à Pedro na beira do lago.
Procuraria entender sua felicidade diante do simples.”

II – No quadro seguinte, você deverá especificar:


1. Por meio de que você representou os 9 elementos do teste (coluna A).
2. O papel, a função, a razão de ser de cada uma de suas representações (coluna B).
3. O que simboliza, para você, cada um dos 9 elementos do teste (coluna C).

Elemento A – Representado por B – Função/Papel C - Simbolizando


Queda Cachoeira Natureza
Espada --- Arma
Refúgio Casa (choupana) Casa
Monstro Violência (Fig.) Violência
Cíclico O sol Fonte de vida
Personagem Pedro (pescador) Pescador (T.nós)
Água Lago Fonte de vida
Animal Cão – peixe Lealdade / Alimento
Fogo ---
147

Análise do Protocolo Nº 11 - Métis

O sujeito-autor do protocolo é uma septuagenária que freqüenta a UNATI há quase 1


ano. Neste protocolo será identificado como Métis34.

Observando o desenho feito por Métis, vemos um ambiente sossegado, com as


belezas da natureza, uma casa simples e um homem pescando. O personagem está sentado, o
que remete a presença de uma possível estrutura mística.

O discurso confirma a imagem pictórica, onde um homem pobre e feliz pesca o peixe
que será seu alimento.

O peixe, símbolo da vida, é também alimento. Em uma passagem bíblica Cristo fez o
milagre da multiplicação do pão e do peixe para alimentar aos desprovidos. Comeu do peixe e
transformou-o no símbolo do alimento eucarístico.

Um dos apóstolos de Cristo chamava-se Pedro e era pescador. Ao criar o personagem


Pedro, o pescador que pesca o seu alimento, o sujeito-autor, deixa emergir a sua religiosidade.

Métis qualifica Pedro como um pobre pescador que vive feliz. A pobreza, em seu
aspecto positivo, pode ser um símbolo de desprendimento do espírito, do mundo material, o
caminho da exultação a Deus, que leva ao encontro da felicidade.

Na história, o personagem Pedro, tal como o sujeito-autor, vive sozinho. Porém tem a
companhia de seu cão, “amigo fiel que lhe acompanha há muito tempo”. O cão possui
diferentes simbolismos, com aspectos antagônicos de acordo com cada cultura. Segundo
Chevalier a “1ª função mítica do cão, universalmente atestado, é a de psicopombo, guia do
homem na noite da morte, após ter sido seu companheiro no dia da vida”. Em algumas
civilizações o cão era tido como o intercessor, o mensageiro entre o mundo real e o além. E,
por conhecer os 2 mundos, era tido, também, como o herói civilizador, o ancestral mítico. Sua
fidelidade ao seu dono é louvada: “Se um homem não tem irmãos, os cães são seus irmãos. O
coração de um cão assemelhasse ao coração de seu amo.” (2003, p.176-180).

34
Métis, na mitologia grega, era tida como a deusa da prudência. O sujeito-autor em sua narrativa conta a história
de um personagem que vive num local de paz, tranquilidade e serenidade, e transparece prudência em suas
atitudes.
Embora Métis seja a deusa da prudência, houve um momento em que ela não foi prudente. Conta a mitologia
que Métis foi a primeira esposa de Zeus. Após casados, ele foi advertido por sua avó Gaia, que Métis lhe daria
um filho, e que este o destronaria. Amedrontado, Zeus resolveu engolir Métis. Para tanto, utilizou-se de um
fabuloso ardil. Convenceu sua esposa a participar de uma brincadeira divina, na qual cada um deveria se
transformar em um animal diferente. Métis, ingenuamente, se transformou numa mosca e Zeus aproveitou a
oportunidade e a engoliu. Todavia, Métis já estava grávida de Zeus, e continuou a gestação na cabeça do marido.
148

O personagem, ao poder “contemplar o céu, o sol os pássaros, em paz total”, entra


em estado de Graça. O céu simboliza a transcendência, o poder sagrado. “A transcendência
divina se revela diretamente na inacessibilidade, na infinidade, na eternidade” (ibidem,
p. 227). Nele encontra-se o sol, a lua, as estrelas, as nuvens e os pássaros que voam na
imensidão do seu espaço. Tem o poder de fecundar a terra, com a chuva de suas nuvens e o
calor de seu sol. É a morada das divindades e dos bem-aventurados. Simboliza a consciência,
o “lugar possível de uma perfeição do seu espírito, como se o céu fosse o espírito do mundo”.
(ibidem, p. 230). O sol é o iluminador do céu. Simboliza a luz do conhecimento, o intelecto, a
força, o domínio. Nasce e se põe todos os dias, numa atitude de renascimento, nos mostrando
que, também nós homens, somos capazes de nos renovar. Os pássaros simbolizam os estados
espirituais, a liberdade divina. Em algumas culturas arcaicas, era tido como o símbolo da
amizade dos deuses com os homens. Seu vôo faz-nos crer numa relação entre o céu e a terra,
que embora o céu revele-se como inacessível, torna-se tão próximo da terra, das pessoas,
como se Deus estivesse mais próximos de nós.

Métis revela que o local onde Pedro vive, com toda a sua contemplação, é o seu
refúgio contra a violência da grande cidade. Violência esta que é o grande monstro. Talvez o
monstro não seja de fato a violência, mas seja estar sem Deus. A cidade é o grande monstro
que nos devora com as rotinas, afazeres e ocupações. Ficamos sem tempo para pensar em nós
mesmos e apreciar a grande obra da natureza. A violência pode ser apenas fruto de uma
sociedade doente.

O sujeito-autor diz, em seu questionário (3ª parte do protocolo), que conheceu este
Pedro. “É a figura típica do homem pobre na qual se cria histórias.” Nomeia como elementos
essenciais o personagem (Pedro), peixe, cão, água (lago), casa, o pássaro e o sol. Eliminaria a
espada, e garante que Pedro jamais a usaria. Não afirma querer ser Pedro, mas gostaria de
estar ao lado dele na beira do lago. Na representação do personagem, o sujeito-autor se projeta
em Pedro (pescador).

No quadro síntese de especificações - representações / funções / simbolização dos


elementos (3ª parte do protocolo) -, deixa em branco as funções de todos eles. Mas, 2 vezes,
cita na simbolização a “fonte da vida”, no elemento cíclico, sol - que não aparece no discurso,
somente no desenho - e no elemento água/lago, representado imageticamente tanto no
discurso como no desenho. Qual será a fonte da vida? Estar em contato com a natureza? Com
o sagrado? A simplicidade? O desprendimento das coisas materiais? A fé? Talvez seja a
reunião de tudo isto.
149

Beneficiando-me da escuta, percebi que Métis busca na UNATI/UCB a oportunidade


de freqüentar cursos que lhe proporcionem o contentamento de novas aprendizagens. Pretende
adquirir mais conhecimento. Tem o que oferecer e receber nas oficinas, com as trocas de
experiências, pois o que busca, à sua moda, não é apenas o saber formal, é o ganhar com as
relações, é descobrir o mistério do engrandecimento das relações do homem com o homem e
do homem com Deus.

Diante de todas as considerações feitas nas diferentes etapas do protocolo, estamos


diante de um imaginário que emerge com uma estrutura Super Mística. Trata-se, portanto, de
um Micro-universo Mítico Místico, do tipo Super Místico.
150

Protocolo Nº 12

1ª Parte:
Identificação:
Nome Fictício: HEMERA
Sexo: Feminino
Idade: 62 anos e 8 meses
Grau de Instrução: 2º Grau
Reside com: Com o filho

2ª Parte:
a) Pictografia

b) Narrativa

“Uma queda da àgua em um lugar lindo e muintos pessoas na àgua, e um


Homem Com uma espada e se refugiava casa um cachoro devorando um catavento.”
151

3ª Parte:
Questionário

I - Responda de modo preciso às seguintes questões:

a) Sobre que idéia você centrou sua composição?


“sobre a natureso”

b) Você foi eventualmente inspirado? Através de que (leitura, filme, etc)?


“sobre o tempo atual”

c) Entre os 9 elementos do teste de sua composição, indique:


c. 1) os elementos essenciais em torno dos quais você construiu o desenho;
“o elemento água animal e vento”

c. 2) os elementos que você teria vontade de eliminar. Por que?


“eliminar à espada - porque gera violência”

d) Como acaba a cena que você imaginou?


“acena acaba Com o Cachoro destruindo o catavento”

e) Se você tivesse que participar da cena composta, onde você estaria? O que faria?
“estaria numa queda Dagua faria munitas observações”

II – No quadro seguinte, você deverá especificar:


1. Por meio de que você representou os 9 elementos do teste (coluna A).
2. O papel, a função, a razão de ser de cada uma de suas representações (coluna B).
3. O que simboliza, para você, cada um dos 9 elementos do teste (coluna C).

Elemento A – Representado por B – Função/Papel C - Simbolizando


Queda Água dar Banho Limpesa
Espada Arma matar Guerra
Refúgio Casa refugio descanso
Monstro Cachorro devorar catavento uma fera
Cíclico Roda girando uma roda
Personagem Homem defeza Pátria
Água Água Vida Pureza
Animal um cachorro Amigo Animal
Fogo Destrói queimar devorar
152

Análise do Protocolo Nº 12 - Hemera

O sujeito-autor deste protocolo é uma senhora de mais de 62 anos, que de agora em


diante, usará o nome fantasia de Hemera35.

Hemera, atualmente, participa do coral da UNATI/UCB, e, há cerca de 2 anos,


desenvolve outras atividades com o grupo. Inclusive, participou da oficina sobre Contador de
Histórias, onde os idosos tiveram a oportunidade de resgatar suas memórias, suas lembranças
de velho.

A pictografia apresentada por Hemera, mostra várias pessoas de pé, tomando banho
em uma queda d’água, onde aparece destacado, bem acima, um homem em pé, possivelmente,
com uma grande espada perto dele, voltada para baixo. Embora destacado, o homem
encontra-se junto ou bem próximo ao grupo. - O desenho do sujeito-autor (mesmo o original)
está um pouco confuso, dificultando a identificação exata e interpretação -. Ao lado existe
uma casa separando esta ação de prazer de outra onde aparece um cachorro/monstro,
posicionado em sentido contrário às pessoas, demonstrando não ter a intenção de atacá-las,
mas que por brincadeira ou maldade, destrói um cata-vento/roda que gira. Numa primeira
vista, parece-nos que há uma divisão de cena, com 2 situações.

Buscando a narrativa vemos que a cena se passa num lugar lindo, com muitas
pessoas dentro da água, simbolizando pureza, numa queda d’água simbolizando limpeza. E,
ao lado ou próximo, existe uma casa, dita no quadro do teste com função de refúgio,
simbolizando descanso, que parece separar os dois imaginários: a) o do personagem que
observa, como diz o sujeito-autor no quadro de representações do teste: “faria muitas
observações”, quer dizer, estaria em guarda, com idéias/imaginário de defesa - defender a
Pátria matando com a espada/arma simbolizando guerra -, se necessário, o que identifica a
presença de um imaginário heróico, talvez descontraído; e b) um homem, com uma espada,
que se refugia numa casa - na pictografia o homem não é desenhado pelo fato de estar dentro
da casa -, enquanto um cachorro/monstro/fera devora o cata-vento/roda. O perigo/angústia
está assim presente e representado com a imagem do cachorro devorador: medo da morte. Os
elementos que identificam uma estrutura heróica estão presentes, mas a casa/refúgio está ali
simbolizando descanso, o que identifica a presença de duas estruturas de dois universos

35
A escolha do nome Hemera deu-se pelo fato da história narrada estar se passando durante o dia. De acordo
com a mitologia grega, Hemera é filha de Caos e mãe do céu e simboliza o dia.
153

existenciais convivendo sincronicamente, pois enquanto está em guarda, imagina o seu


descanso.

O cachorro que é um animal doméstico devora um objeto (brinquedo). Tal ato pode
representar uma brincadeira do animal ou um instinto destruidor. Contudo, o objeto que é
devorado trata-se de um cata-vento que simboliza a roda36 que gira com vento. Segundo
Chevalier, a roda se refere “ao mundo do vir a ser, da criação contínua, portanto da
contingência e do perecível” (2003, p. 783). Acrescenta, ainda, ser a roda o “símbolo
privilegiado do deslocamento, da libertação das condições de lugar e do estado espiritual
que lhes é correlativo” (idem). Num contexto mais objetivo, “a roda se revela como um
símbolo do mundo.” (idem). Não podemos pensar em mundo, em Cosmos, sem pensar em
tempo. O que realmente o cachorro destrói? Numa brincadeira destrói a roda que gira, o
tempo, como se ele fosse o brinquedo do momento, ou devora, a roda que gira, o tempo, que é
implacável e que nunca é vencido?

Recorrendo ao questionário, encontramos que o sujeito-autor, Hemera, centraliza sua


composição na natureza. A matriz da dramatização é bucólica de prazer, mas se transforma
em perigo iminente, com o cão devorador e a espada/arma para matar simbolizando guerra. A
paz é imaginada, mas, também o perigo e a luta, tudo potencializado: o personagem não
relaxa na queda d’água, pois fica observando, e também não luta, pois o cão não ataca e ele
imagina-se refugiando-se dentro da casa.

O sujeito-autor diz ser elementos essenciais água, animal e vento. O animal,


cachorro, ora é amigo, ora é monstro devorador. O que é essencial para o sujeito-autor? O
animal amigo ou o monstro devorador? Percebe-se que o sujeito-autor confunde o elemento
animal e o elemento monstro. Confunde ou funde estes elementos com simbolismos diferentes
e antagônicos? Seriam eles complementares? Para J. Hillman “a confusão é resultado de uma
fusão”. (2001, p. 109). Embora para Hemera o vento seja um elemento essencial, em nenhum
momento este aparece na narrativa, no quadro de representações ou no desenho, a não ser
como cata-vento.

Ainda de acordo com o questionário, questão “c. 2” o sujeito-autor eliminaria a


espada porque gera violência. Contudo, em nenhum momento houve a necessidade de usá-la.
E na questão “b”, diz ter sido inspirado “sobre o tempo atual”, o que demonstra uma
preocupação com o tempo atual, com a “angústia do passar do tempo”, que tenta controlar

36
A roda já teve uma acepção lunar. Passou a ser considerada um símbolo solar, quando, por razões técnicas foi
munida de raios. (CHEVALIER, 2003, p. 783).
154

dizendo-o “atual”. Termina dizendo (questão “e”) que se tivesse que participar da cena
composta, “estaria numa queda d’água ...” o que remete a limpeza heróica -, “faria muitas
observações”, quer dizer: estaria atento, pronto para lutar, se necessário.

O sujeito-autor poderia estar junto com as outras pessoas se divertindo, mas decide
ser um sentinela e ficar no papel de observador de uma cena que acontece fora daquele
espaço, mas é o que o personagem faz: ele observa uma outra cena que não é a que está
inserido. – o personagem se desdobra, pois na verdade está observando as duas cenas.

O sujeito-autor se projeta no homem/sentinela com a espada (herói) que observa, do


alto da queda, os banhistas, como que protegendo-os, em uma ação/imaginário de possível
defesa/luta pois vê/imagina a morte/monstro/cão devorando a roda/cata-vento e, ao mesmo
tempo, no que se refugia dentro da casa.

De acordo com o quadro síntese de especificações dos elementos (3ª parte do


protocolo) algumas relações entre representação, função e simbolismo dos elementos são
contraditórias. O personagem, homem, tem a função de defender, simbolizando a Pátria.
A história contada remete à responsabilidade/preocupação com o grupo, entendida pelo
sujeito-autor como cidadania. O fogo não aparece no desenho nem na narrativa, mas para o
sujeito-autor, representa de forma negativa a imagem da destruição, com função de queimar e
simboliza devorar. O cachorro é citado 2 vezes: como animal amigo e como monstro
devorador.

O cão/cachorro traz a idéia de morte, de outro plano astral, devido a sua função
mítica de psicopombo. Como pode se constatar no protocolo anterior (Nº 11), realizado por
Métis, o cão pode ser representado como o amigo eterno, mas, pode ser representado,
também, como o maldito, aquele que se deixou levar pelo demônio e traiu a Deus, na missão
de preservar o homem dos encontros com o diabo. O que percebemos, então, é uma dualidade
da simbologia do cão: bem-mal. De acordo com Chevalier, “a figura do cão abarca um
simbolismo de aspectos antagônicos, que nem todas as culturas conseguiram resolver” (2003;
p. 182). Hemera percebe este antagonismo descrito por Chevalier, quando representa o
cachorro como amigo do homem e como monstro destruidor.

Diante das análises feitas nos registros das diferentes etapas do protocolo aplicado no
sujeito-autor, considero que o mesmo possui um Micro-universo Mítico Sintético do tipo
Duplo Universo Existencial Sincrônico.
155

Protocolo Nº 13

1ª Parte:
Identificação:
Nome Fictício: HÉLIO
Sexo: Feminino
Idade: 60 anos e 8 meses
Grau de Instrução: Superior
Reside com: Esposo e 1 filho

2ª Parte:
a) Pictografia

b) Narrativa
“O ataque
Era ao cair da tarde de um lindo verão, o sol no firmamento escondia o clarão,
enquanto uma senhora contemplava o lindo sol, aparece um monstro que se aproximou dela e
vendo a espada caída no chão apressou em apanhá-la. De repente passava voando um lindo
pássaro e o monstro distraiu-se e saiu correndo para pega-lo. Nisso tropeça e cai no
redemoinho que o joga para cima de uma fogueira. Enquanto isso a sra foge e se esconde na
casinha que estava próxima.
O monstro gritava por socorro, mas ninguém apareceu para salva-lo.
Nunca mais ele pode atacar ninguém .”
156

3ª Parte:
Questionário

I - Responda de modo preciso às seguintes questões:

a) Sobre que idéia você centrou sua composição?


“no ataque do monstro”

b) Você foi eventualmente inspirado? Através de que (leitura, filme, etc)?


“só na imaginação”

c) Entre os 9 elementos do teste de sua composição, indique:


c. 1) os elementos essenciais em torno dos quais você construiu o desenho;
“pássaro, monstro, refúgio”

c. 2) os elementos que você teria vontade de eliminar. Por que?


“fogo, é um elemento de destruição ”

d) Como acaba a cena que você imaginou?


“o malvado foi derrotado”

e) Se você tivesse que participar da cena composta, onde você estaria? O que faria?
“seria a senhora, faria o mesmo, fugiria”

II – No quadro seguinte, você deverá especificar:


1. Por meio de que você representou os 9 elementos do teste (coluna A).
2. O papel, a função, a razão de ser de cada uma de suas representações (coluna B).
3. O que simboliza, para você, cada um dos 9 elementos do teste (coluna C).

Elemento A – Representado por B – Função/Papel C - Simbolizando


Queda o pássaro distraiu o monstro Alegria
Espada Defesa Defesa ataque e defesa
Refúgio Casa abrigo, fuga Amparo
Monstro Ataque Ataque Raiva
Cíclico cata-vento Destruição Defesa
Personagem senhora, monstro ataque e defesa ataque, defesa
Água dentro da casa para acalmá-la Alegria
Animal Pássaro Atenção Defesa
Fogo Fogueira Destruição Destruição
157

Análise do Protocolo Nº 13 - Hélio

O sujeito-autor deste protocolo será denominado ficticiamente por Hélio37.

Hélio é uma sexagenária que freqüenta a UNATI/UCB há quase 3 anos. Vem para
Universidade Católica de Brasília na companhia do filho que é aluno da graduação. É a
oportunidade que tem para fazer o que gosta: estudar e relacionar-se com as pessoas. Desta
forma Hélio interage num ambiente com pessoas de várias idades e com diferentes
experiências, é a intergeracionalidade acontecendo.

O desenho elaborado pelo sujeito-autor mostra um ambiente de claridade (sol), com


nuvens e um pássaro. O sol, que não é identificado no quadro síntese das representações, é a
fonte de luz, calor e energia, e remete ao regime diurno. O pássaro, conforme citado em
outros protocolos, faz alusão ao heroísmo. As nuvens podem representar a nebulosidade, o
confuso, mal entendido ou a transformação. A pictografia apresenta, ainda, uma mulher que
enfrenta, com a espada, um monstro - no desenho com aparência humana, um monstro
antropomórfico -, cara a cara e o caminho que ela poderá percorrer até a casa (refúgio).
Embora seja dia, existe uma fogueira, que pode servir para preparar o alimento ou para
esperar a chegada da noite, mas que no discurso é dito fogueira com função de destruição
simbolizando a destruição, que acontece de forma positiva, como um greimaisiano adjuvante
do personagem, um interativo positivo (análise actancial) eliminando/queimando/matando o
monstro.

A narrativa é intitulada por Hélio como “O ataque”. Descreve o cair da tarde de um


lindo verão, mas com o sol ainda presente. Certamente com raios de sol, apenas. “Raios de sol
representam as influências celestes – ou espirituais – recebidas pela Terra” (CHEVALIER,
2003, p. 836). O dia se prepara para o descanso merecido, pois falta pouco tempo para
chegada da noite. O cenário que vimos, antes como diurno, heróico, está na fase de transição,
de mescla com o noturno, com o místico. É o crepúsculo. Novamente, como em outros
protocolos, encontramos aqui a imagem do anoitecer nas representações de pessoas idosas.

O crepúsculo “exprime o fim de um ciclo”. Representa a morte do dia presente que


anuncia a noite que vem (“transformações tenebrosas”), para depois chegar à aurora e o novo

37
“Era ao cair da tarde de um lindo verão, o sol no firmamento (...).” O trecho da narrativa nos faz lembrar o
deus sol, que de acordo com a mitologia grega era chamado de Hélio. Conta a história que este deus, percorria
todos os dias o céu de leste a oeste, num carro flamejante. Em homenagem ao deus sol, o sujeito-autor deste
protocolo será chamado de Hélio.
158

dia. “Reveste-se, (...), da beleza nostálgica de um declínio e do passado, beleza essa que ele
simboliza. É a imagem e a hora da saudade e da melancolia”. (ibidem, p. 300).

Mesmo envolta num ambiente de contemplação à beleza da natureza, a mulher


percebe a presença do monstro antropomórfico e pega a espada que está caída, em uma nítida
atitude de defesa/ataque, para se defender ou para atacar. De repente aparece um lindo pássaro
- outro adjuvante, actante interativo -, que distrai o monstro tornando-se alvo dele. A Senhora
foge, refugiando-se na casa e, o monstro, ao correr atrás do pássaro, cai no rodamoinho e é
jogado para cima de uma fogueira. Grita por socorro, mas ninguém apareceu para salvá-lo. O
final da história não deixa explícito que o monstro morreu, mas é o que concluímos porque o
sujeito-autor termina sua narrativa com a frase: “Nunca mais ele pode atacar ninguém”. A
luta é imaginada, mas não se concretiza apesar da angústia presente frente ao monstro,
possibilidade de morte.

O fogo que destrói, que devora, e que pode ser interpretado como negativo, neste
contexto, torna-se positivo, quando é capaz de devorar o mal (monstro). É a força profunda,
que consome, que aniquila o que é ruim. É também símbolo de purificação, de regeneração,
capaz de nos libertar e nos livrar de certos males, mas como o símbolo só adquire sentido
quando contextualizado, neste drama imaginado por Hélio, o fogo simboliza destruição que
passa a ser positivo.

A história foi inspirada na imaginação de Hélio que centrou sua composição no


ataque do monstro. Para ele os elementos essenciais são: o pássaro, o monstro e o refúgio.
Eliminaria o fogo que é elemento de destruição, mas que na verdade é o que o salva.

No quadro síntese de especificações dos elementos (3ª parte do protocolo) existe


algumas incoerências como: a queda é representada pelo pássaro, quando deveria ser pelo
mostro e simboliza a alegria. Entende-se que o sujeito-autor pensou no pássaro como
responsável pela queda do monstro, o que foi uma alegria, pois representou o começo do fim
do malvado. O monstro é representado pelo ataque, quando sua representação deveria ser o
homem, conforme o desenho. O seu papel/função é que é o de ataque e deveria simbolizar a
maldade, mas como no drama o monstro perde, ele simboliza a raiva.

Somos tendenciados a crer que embora o sujeito-autor se projete na mulher, o herói


da história é o pássaro, que salva a mulher e, de certa forma, leva o monstro para o caminho
da morte, pela purificação, pelo fogo. A mulher, apesar de empunhar a espada para defender-
se e estar disposta a enfrentar heroicamente o monstro de frente, vê que não é necessário tal
159

atitude. Aproveita-se do momento em que o monstro se distrai para esconder-se dentro da


casa: é a saída que o personagem encontra para livrar-se da morte, para positivamente vencer
o ataque. O pássaro deixa de ser um animal pequeno e leve. É desanimalizado. Passa a ser o
protetor da donzela, e o monstro, destruído, recebeu o castigo merecido: a morte.

A morte do monstro é a solução dos problemas definitivamente, pois ele nunca mais
atacará ninguém. Fazendo uma alusão aos contos, o bem sempre vence o mal. Embora, na
vida real, não seja sempre assim.

Analisando todas as etapas do protocolo, percebe-se a existência de 2 momentos


existenciais (estruturas): a) um onde a mulher se arma, com uma espada, para o ataque ou
defesa, e b) onde a mulher foge e se esconde na casinha/casa/abrigo/fuga. No 1º momento
existencial, existe espada e o monstro, elementos do heroísmo. Uma espada que assusta o
monstro e um monstro que não ataca, se distrai com o vôo do pássaro e cai sozinho, sem lutar
no fogo, onde morre queimado. Há a vitória positiva da personagem que não luta, mas está
disposta a lutar se for preciso; foge e se esconde depois de ter se armado para a luta que não
se concretizou, não foi necessária. Temos aqui a presença de uma estrutura heróica, ou seja,
um imaginário esquizomorfo. No 2º momento existencial o personagem se aconchega, deixa o
monstro para lá e a luta também, e vai se abrigar, se amparar na casa. Trata-se de um
imaginário místico/antifrásico. De qualquer forma, a mulher vence o drama com a morte, pois
o monstro que se aproxima dela morre sem que ela precise matá-lo. A esperança insana é que
a morte/monstro nunca mais possa atacar ninguém, pelo menos naquelas paragens, naquela
situação, neste drama imaginado.

Desta forma, estamos diante de um Micro-universo Mítico Sintético do tipo Duplo


Universo Existencial Diacrônico.
160

Protocolo Nº 14
1ª Parte:
Identificação:
Nome Fictício: ÁRTEMIS
Sexo: Feminino
Idade: 72 anos e 2 meses
Grau de Instrução: Superior
(Especialização)
Reside com: Uma filha

2ª Parte:
a) Pictografia

b) Narrativa

“Sandra e sua coleguinha Ana estavam brincando de equilibrista, quando


surgiram 2 homens brigando com uma espada, o que as deixou muito assustadas e
procuraram 1 refúgio. Um monstro passava por perto, quando surgiu um ciclone.
Depois da tempestade, Marilena viu as 2 escondidas e assustadas, conseguiu leva-las
para a marge de 1 rio com lindas praias, pássaros voando e cantando, onde elas se
divertiram.”
161

3ª Parte:
Questionário

I - Responda de modo preciso às seguintes questões:

a) Sobre que idéia você centrou sua composição?


(Não respondeu)

b) Você foi eventualmente inspirado? Através de que (leitura, filme, etc)?


“não”

c) Entre os 9 elementos do teste de sua composição, indique:


c. 1) os elementos essenciais em torno dos quais você construiu o desenho;
“queda, água, animal”

c. 2) os elementos que você teria vontade de eliminar. Por quê?


“monstro fogo”

d) Como acaba a cena que você imaginou?


“O personagem leva as meninas para as praias - paz”

e) Se você tivesse que participar da cena composta, onde você estaria? O que faria?
“no papel do personagem.”

II – No quadro seguinte, você deverá especificar:


1. Por meio de que você representou os 9 elementos do teste (coluna A).
2. O papel, a função, a razão de ser de cada uma de suas representações (coluna B).
3. O que simboliza, para você, cada um dos 9 elementos do teste (coluna C).

Elemento A – Representado por B – Função/Papel C - Simbolizando


Queda desequilíbrio
Espada espada Filme
Refúgio caverna Proteger proteção
Monstro Homem feio Assustar medo / susto
Cíclico redemoinho / ciclone desequilibrar surpresa
Personagem mulher dar paz e tranqüilidade
Água rio tomar banho brincar
Animal pássaro Compor a cena paz / alegria
Fogo mata pega fogo Queimar queimada
162

Análise do Protocolo Nº 14 - Ártemis

O sujeito-autor deste protocolo é uma senhora de 72 anos, sem netos, que freqüenta a
UNATI/UCB há 2 anos em busca de atualização e convivência. Doravante será identificada
com o nome fictício de Ártemis38.

O desenho elaborado por Ártemis, mostra várias pessoas: uma caindo e as demais de
pé. Duas delas refugiadas numa caverna e duas lutando com uma espada. Uma pessoa de
tamanho maior, a personagem, mulher (que pode ser uma adulta ou ter algum diferencial) e o
monstro. Estes 2 últimos possuem formas geométricas, o monstro com mais evidência
(abstração) e a personagem desenhada com muitos corações.

Ártemis narra uma história que parece dividida em 3 atos. Primeiro: 2 coleguinhas
estão brincando, percebem 2 homens brigando com uma espada e procuram refúgio. Segundo
ato: um monstro passava por perto quando surge um ciclone. Terceiro: após a tempestade,
Marilena/mulher - personagem principal, no qual Ártemis se projeta -, que parece ser uma
pessoa mais velha, vê as duas meninas escondidas e assustadas e as leva para a margem de um
rio, com lindas praias, pássaros voando e cantando, onde as meninas se divertem. No quadro
do teste o personagem mulher tem a função de “dar paz e tranqüilidade”, mas não está
simbolizada explicitamente, mas, por dedução contextualizada, é a proteção, amparo ou
socorro. Ártemis se projeta nas meninas para expressar sem culpas, sua angústia e o medo da
morte, mas logo reage e se projeta na Marilena – adulta -, que espera o perigo passar e vai se
divertir.

Na narrativa não existe confronto do monstro com nenhum personagem. Ele não
ataca, não morre. Não se sabe se o ciclone o levou. De certa forma podemos dizer que o
monstro está sem função, apesar de no quadro do teste se encontrar registrado pelo
sujeito-autor, com a imagem do homem feio, com função apenas de “assustar”, simbolizando
medo/susto. O ciclone, dito no quadro do teste, redemoinho, cumpre sua função
“desequilibrar”, fazendo as duas meninas caírem, como se vê no desenho, certamente é a
angústia do medo da morte, da queda/desequilíbrio, do monstro/susto. O elemento cíclico
estimula o arquétipo do tempo que passa e pode desequilibrar Ártemis. Também não é
descrito o que acontece com os 2 homens que estavam brigando com uma espada. Trata-se de
uma cena para assustar o que reforça a monstruosidade, a angústia e o medo, pois apresenta

38
Ártemis, na Grécia Antiga, apesar de ser considerada uma deusa caçadora, era tida como virgem defensora da
pureza. Pelo fato da história narrada pelo sujeito-autor falar da proteção a duas crianças e, por ser a figura da
criança vista por muitos como símbolo de pureza, a autora da dramatização recebeu esta homenagem.
163

crianças inocentes – nas quais Ártemis se projeta inicialmente - que brincam, se assustam e se
escondem. Quem procura a caverna e se esconde são as meninas/coleguinhas e não o
personagem (adulto) salvador que leva as meninas para a margem do rio, para as lindas
praias/paz. A imagem das praias está registrada, no desenho, no discurso e na resposta à
questão “d” do questionário.

A história começa com brincadeiras de criança e termina da mesma forma,


acrescentando ao ambiente, apenas, o tom de paz, harmonia e tranqüilidade sem precisar se
preocupar com qualquer tipo de perigo.

O sujeito-autor transita entre PUER e SENEX, como disse Paula Carvalho (1999),
citado no protocolo nº 10, realizado por Hebe. Como criança brinca eufemizando o monstro
antropomórfico e como idosa/Marilena cumpre a responsabilidade de ainda dar tranqüilidade
e paz aos menores, talvez netas: Sandra e Ana. No questionário, acha essencial a queda –
desequilíbrio -, a água – brincadeira - e o animal – paz e alegria -. A queda não representada
no quadro, é simbolicamente mostrada como o desequilíbrio das meninas, na brincadeira de
equilibrista. A água é representada no discurso pela margem de um rio/praia e no quadro tem
função de tomar banho e simboliza brincar. A ludicidade aqui se expressa como eufemismo
do perigo. Esta água não se apresenta de forma parada, tem movimento. Proporciona
tranqüilidade. “A água é o símbolo das energias inconscientes, das virtudes informes da alma,
das motivações secretas e desconhecidas” (CHEVALIER, 2003, p. 22). O animal,
representado pelos pássaros voando e cantando, também demonstra o ambiente de
tranqüilidade e paz. Ártemis responde o questionário afirmando que tem vontade de eliminar
o monstro e o fogo. De certa forma já eliminou, pois o fogo (“mata pega
fogo/queimar/queimada” - quadro de representações do protocolo) não aparece na história, a
não ser no desenho de forma desconexada das demais imagens que formam a dramatização
imaginada; o monstro passa despercebido, sendo registrado apenas como um homem feio que
passava por perto, mas que não ataca, apenas assusta causando medo/susto.

Se tivesse que participar da cena composta (questão “e” do questionário do


protocolo), o sujeito-autor responde que estaria no papel da personagem, a mulher (Marilena),
em quem se projeta: a mulher quer “dar paz e tranqüilidade”. A história contada nos faz
imaginar Marilena como uma mulher que aparenta ser mais velha, madura, segura e amorosa,
como a deusa Ártemis, capaz de transparecer segurança e amor e de levar as crianças para um
lugar seguro, sem violência. Levar a ela própria sem se desquilibrar.
164

Tanto na narrativa, no desenho e no tempo de freqüência de Ártemis na UNATI,


existe uma incidência do número 2 (dois). De acordo com Chevalier, (ibidem, p. 346) o
número 2 (dois) é um símbolo de oposição, de conflito, de reflexão. Indica o equilíbrio
alcançado ou ameaças latentes. É o símbolo do dualismo sobre o qual repousa toda a dialética.

Analisando durandianamente, de maneira geral, todas as etapas do protocolo, julgo


que Ártemis demonstra ter um imaginário com estrutura Mística com impurezas heróicas que
não são suficientes para caracterizar um micro-universo sintético e sim Místico Impuro. A
espada existe como impureza, mas não está com o personagem; o monstro existe como
impureza, mas não ataca, não há luta; é somente um susto para as meninas e não para o
personagem.
165

Protocolo Nº 15

1ª Parte:
Identificação:
Nome Fictício: DESTINO
Sexo: Feminino
Idade: 74 anos e 7 meses
Grau de Instrução: 1º Grau
Reside com: Sozinha

2ª Parte:
a) Pictografia

b) Narrativa

“era uma vez um Sr. saiu de viagem e subiu 1 montanha encontrou um


lugar que para ele era um monte que dava em outro Lugar de repente chegou fim e ele
despencou, e lá em baixo existia um monstro e ele Levava consigo uma espada ele
pensou não vou lutar com o monstro vou escapar dele naquela casinha porque ele é
mais forte que eu e consegui me Livrar dele lá encontrei um Pé de Laranja e as suas
sementes brotaram nasceram mais pés de Laranja e segui o meu caminho encontrei
um amigo que andava por ali e descemos a um Lago que tinha peixes, e pescamos um
peixes, acendemos fogo e assamos os peixes e assim sai livre sem fome nem sede. Ao
meu destino.”
166

3ª Parte:
Questionário

I - Responda de modo preciso às seguintes questões:

a) Sobre que idéia você centrou sua composição?


“Viagem
Da cabeça”

b) Você foi eventualmente inspirado? Através de que (leitura, filme, etc)?


“todos”

c) Entre os 9 elementos do teste de sua composição, indique:


c. 1) os elementos essenciais em torno dos quais você construiu o desenho;
“todos”

c. 2) os elementos que você teria vontade de eliminar. Por que?


“monstro”

d) Como acaba a cena que você imaginou?


“feliz”

e) Se você tivesse que participar da cena composta, onde você estaria? O que faria?
“na casa de refugio chupando laranja, com o amigo e pescando, e comendo peixe
assado e bebendo água tranqüila.”

II – No quadro seguinte, você deverá especificar:


1. Por meio de que você representou os 9 elementos do teste (coluna A).
2. O papel, a função, a razão de ser de cada uma de suas representações (coluna B).
3. O que simboliza, para você, cada um dos 9 elementos do teste (coluna C).

Elemento A – Representado por B – Função/Papel C - Simbolizando


Queda Personagem caiu do Obstáculo Engano
barranco
Espada E levava na mão Em defesa talvez Defeza ou limpar o
caminho
Refúgio 1 casa que ele avistou Um casa refugiar Na casa refuiar
Monstro Cara feia Destruir Muita feiúra
Cíclico Laranja Alimentar Gostosura
Personagem Pessoas Caminhar Econtro
Água Lagoa com peixes Matar a sede Desedentar
Animal Peixe Peixe / alimentar Alimento
Fogo Fogueira assar os peixes assar os peixes Cozimento
167

Análise do Protocolo Nº 15 - Destino

O sujeito-autor do protocolo é uma senhora septuagenária, que mora sozinha e


freqüenta a UNATI/UCB há quase 2 anos. Será identificada com o nome fictício de Destino39.
Seu desenho mostra a subida de um homem numa montanha com uma espada na
mão. Do outro lado tem um monstro. A casa desenhada está mais próxima do monstro. Existe,
também, além de uma lagoa com peixes, a pictografia de um homem que pode ser uma outra
pessoa, mas pode, também, ser o personagem principal em outro ato da história. No quadro de
representações do teste o sujeito autor considera personagem: pessoas.
O homem, como é registrado na narrativa/história escrita do teste, numa viagem,
sobe uma montanha. Para Chevalier (2003, p. 951) o simbolismo da viagem resume-se na “na
busca da verdade, da paz, da imortalidade, da procura e da descoberta de um centro
espiritual”. Pode expressar uma intenção de ter novas experiências e necessidade de mudança
interior. Já o simbolismo da montanha “é múltiplo: prende-se à altura e ao centro” (ibidem,
p. 616). Pode significar o encontro da terra com o céu, à medida que leva para o alto. Se
alguém está subindo pode significar a escalada de algo, normalmente, a busca pelo
transcendente. Ela exprime, ainda, “as noções de estabilidade, de imutabilidade, às vezes, até
mesmo de pureza” (idem). Na montanha, o homem encontra um monte que dava em outro
lugar. Ao chegar ao fim, ele despencou - a queda não é uma simples queda, o homem
despenca, “o personagem caiu do barranco”-. Não se sabe se o homem entrou neste outro
lugar antes de cair, e exatamente o que é este lugar. Sabe-se apenas que o homem despencou
ao chegar ao fim. O fim de que? Da montanha ou deste novo lugar encontrado?
Após a queda encontrou o monstro (antropomórfico). Embora levasse consigo a
espada preferiu não lutar, pois já sabia que o monstro era mais forte. Conseguiu escapar do
monstro sem enfrentá-lo e encontrou um pé de laranja (árvore frutífera) onde suas sementes
brotavam dando vida a mais pés de laranja - reprodução por meio da germinação da semente-.
Em Chevalier, a árvore é universalmente considerada como o símbolo das relações
que se estabelecem entre a terra e o céu (ibidem, p. 84). Em especial a laranja, com sua
numerosa quantidade de caroços (sementes) significa fecundidade e a perpetuação da espécie.
Na narrativa o sujeito-autor encontra um amigo e juntos descem para um lago para
pescar. Lago é uma extensão de água cercada de terras, que para Chevalier simboliza o olho
da terra. Os lagos podem ser considerados palácios subterrâneos belíssimos que atraem os

39
Recebeu o nome fictício de Destino pelo fato de, ao finalizar sua história, se entregar ao seu destino.
Destino, na antiga cultura grega, representa uma divindade cega, inexorável. É filho de Caos e de Nix (noite).
168

humanos para a morte. Neste contexto tomam a “significação perigosa de paraísos ilusórios”
(ibidem, p. 533). Contudo, o lago descrito na história possui vida, possui peixes que pescados
e assados servirão de alimento, para que os amigos saiam sem fome e sem sede. O lago
produz a vida que abastecerá outro ser vivo proporcionando-lhe o alimento imprescindível
para a sua vida. Alimentado o personagem entrega-se “ao seu destino”, a sua sina. Não se
sabe qual é a sina, mas, certamente, a Deus pertence.
De acordo com o questionário e quadro síntese de especificações dos elementos (3ª
parte do protocolo), o sujeito-autor (Destino) projeta-se no personagem. Se estivesse
participando da história estaria atuando na cena bucólica criada/imaginada e estaria “feliz”,
dentro da casa (refúgio). Acha todos os 9 elementos do teste importantes, mas se pudesse
eliminaria o monstro (a morte/“muita feiúra”, que ele diz no discurso ser “mais forte que eu”).
A queda sofrida, embora acentuada (despencar) simboliza um obstáculo, apenas um engano.
O elemento cíclico representa uma laranja que tem por função/papel alimentar e simboliza
gostosura, que ele feliz gostaria de estar chupando/desfrutando no acabar da cena imaginada.
O elemento fogo tem a função de cozimento do alimento, para assar os peixes pescados com o
amigo. O personagem – “pessoas” - tem a função de caminhar, uma caminhada acompanhada,
juntos, é simbolizado pelo encontro.
Em todos os momentos da narrativa percebe-se que o sujeito-autor não quer lutar.
Com seus 74 anos, vê ou encontra a morte; mas dribla o monstro (a morte), “escapa”, sem
usar a espada, que carrega “talvez” para se defender ou apenas “limpar o caminho”.
Protege-se na idéia de viver com gostosura a vida, talvez na espiritualidade. Gostaria de estar
aconchegada, dentro da casa, num ambiente de tranqüilidade com o amigo (também
personagem, segundo registra no quadro do teste).
Embora Destino comece a história em pé, com a espada na mão e subindo a
montanha/galgando à subida - o que poderia remeter a uma estrutura heróica distendida, é
bom anotar que esta espada carregada, não é usada para defesa e é dita também para limpar o
caminho, o que a transforma em utensílio e não arma. O monstro, outro elemento do teste
característico da estrutura heróica, existe, mas não ataca: apenas faz o personagem considerar
que ele (monstro) é mais forte que ele (personagem). São impurezas heróicas, quer dizer de
um outro regime de imagens, que não são suficientes para identificar um duplo universo
mítico. Escapa para a casinha, refúgio - elemento do teste característico da estrutura mística -,
refúgio avistado e usado pelo personagem que só quer ser feliz. Trata-se, portanto, de um
Micro-universo Mítico Místico, no caso, do tipo Místico Impuro.
169

Protocolo Nº 16

1ª Parte:
Identificação:
Nome Fictício: AGLAIA
Sexo: Feminino
Idade: 72 anos e 5 meses
Grau de Instrução: Cursando o 3º Semestre do 1º Segmento (EJA).
Profissão: Do lar
Reside com: 3 filhos e 2 netos

2ª Parte:
a) Pictografia

b) Narrativa (Ditado pelo sujeito-autor)

“Eu estava passando na mata e vi um homem correndo do monstro com a espada na


mão para se defender. Tinha uma fogueirinha onde ele estava esquentando as mãos, quando
veio o monstro ele saiu correndo. Tinha um bichinho correndo, uma lesma. Ele pisou na
lesma e escorregou e quase caiu, mas ainda afirmou e continuou até chegar aonde ele tinha
que se esconder: sua caverna onde ele se escondia durante o dia. Tinha um poço de água,
tipo grota, onde ele bebia. Tinha um cata-vento perto do esconderijo dele. Nem ele sabia
para que, mas conservava para não estragar.”
170

3ª Parte:
Questionário

I - Responda de modo preciso às seguintes questões:

a) Sobre que idéia você centrou sua composição?


“No interior. Quem é do interior às vezes vê coisas e fica com medo.”

b) Você foi eventualmente inspirado? Através de que (leitura, filme, etc)?


“Quem mora nos matos sempre anda com faca para se defender, pegar uma folha ....”

c) Entre os 9 elementos do teste de sua composição, indique:


c. 1) os elementos essenciais em torno dos quais você construiu o desenho;
“O homem, e a espada, o fogo, o monstro que ele viu. Tudo é importante.
O menos é o monstro. Ele nem sabia se o monstro corria atrás dele.”

c. 2) os elementos que você teria vontade de eliminar. Por quê?


“O monstro, pois é natural do monstro.
Tirava a lesma, pois estava por acaso.”

d) Como acaba a cena que você imaginou?


“Ele se esconde na caverna para descansar.”

e) Se você tivesse que participar da cena composta, onde você estaria? O que faria?
“Eu apenas presenciei. Mas se tivesse que participar, eu ajudaria a ele, pois se está
correndo, está cansado.”

II – No quadro seguinte, você deverá especificar:


1. Por meio de que você representou os 9 elementos do teste (coluna A).
2. O papel, a função, a razão de ser de cada uma de suas representações (coluna B).
3. O que simboliza, para você, cada um dos 9 elementos do teste (coluna C).

Elemento A – Representado por B – Função/Papel C - Simbolizando


Queda o homem escorregando derrubar a pessoa pode
machucar
Espada Espada se defender pensamento de defesa
Refúgio caverna de pedra se esconder morada
Monstro tartaruga procurar alimento bicho perigoso, medo
Cíclico cata-vento girar com o vento o tempo, o vento que
passa, movimento
Personagem Homem andar perdido no mato,
pessoa desesperada
Água grota d’água, nascente dar de beber vida, saúde, limpeza*
Animal Lesma andar uma coisa q/ anda por
andar, nojento
Fogo fogueira para se esquentar, Claridade; vida, pois
clarear a noite com o fogo se alimenta.
* Sem água não vivemos.
171

Analise do Protocolo Nº 16 - Aglaia

O sujeito-autor do protocolo é uma senhora, viúva, de 72 anos. Mora com 3 filhos e 2


netos. Além de freqüentar oficinas da UNATI/UCB, está matriculada numa escola da rede
pública, no Ensino de Educação de Jovens e Adultos - EJA, 1º segmento, 3º semestre
curricular. Doravante será identificada com o nome fictício de Aglaia40.

O desenho de Aglaia foi elaborado com os elementos representados separadamente, o


que pode significar um imaginário desestruturado.

Conforme consta na narrativa, Aglaia apenas presencia a história. O protagonista do


drama, o personagem é representado, no quadro do teste, como “homem” com função de
“andar”, simbolizando “perdido no mato, pessoa desesperada”, o que remete à angústia. Na
narrativa o sujeito autor diz: “eu estava passeando na mata”, quando percebe que um homem,
que esquentava as mãos numa fogueirinha, ao ver um monstro, corre, escorrega em uma
lesma e quase cai; não chegou a existir a queda. Embora o homem estivesse esquentando as
mãos na fogueira, segurava uma espada - o que é expresso na narrativa -; com “pensamento
de defesa”, como é simbolizada a espada no quadro do teste. A dissertação/história
imaginada, em alguns momentos, parece estar sem sentido, leva-nos a crer que o sujeito-autor
intencionava apenas envolver os elementos desenhados na sua história; cumprir as ordens da
consigna, o que reforça a idéia de desestrutura.

Aglaia passeia na mata. A mata pode gerar sentimento de angústia ou tranqüilidade.


Angústia quando não se sabe que perigos nela se escondem e tranqüilidade por ser um
ambiente natural, com várias árvores, que pode ser considerada como uma intermediária entre
a terra e o céu. Nesta mata, vê um homem que, ao correr do monstro e procurar seu abrigo,
pisa num pequeno animal (lesma), escorrega e quase cai. Para a lesma, “simbolizada como
“uma coisa que anda por andar, nojenta”, que certamente foi morta ou ficou bastante
machucada, quando o homem nela pisou, embora sem intenção, o monstro foi este homem. O
paradoxal da violência, que depende do ângulo em que se vê!

Próximo ao abrigo do homem/morada (caverna de pedra) existe um poço de água,


tipo grota (nascente). A grota é simbolizada como “vida, saúde, limpeza”, com função de “dar

40
Do casamento de Zeus com Eurímone, nasceram 3 graças (filhas), que personificam a beleza, o charme e o
encanto. Uma delas foi chamada de Aglaia, que como suas irmãs, estavam sempre cantando, dançando e
espalhando a alegria por toda a natureza e no coração dos homens.
O sujeito-autor deste protocolo é uma senhora franzina, que se apresenta sempre sorrindo, brincando,
contando histórias engraçadas e é admirada pelos colegas, por ter sempre um bom astral e estar disposta a ajudar
a todos, com palavras de amizade e lições positivas. Foi este espírito de alegria contagiante e de positivismo, que
nos fez homenageá-la com o nome de Aglaia.
172

de beber”. É a água que nasce e não se esgota, que sai nua e límpida de dentro da terra, para
servir.

De acordo com o questionário do teste, registrado neste protocolo, o sujeito-autor


centra sua composição numa cena do interior (zona rural). Acha todos os elementos
importantes, inclusive o fogo e a tríade do regime heróico - homem – espada – monstro -, mas
em seguida julga o monstro menos importante. Faz crítica a sua história quando diz - com
risos, percebidos no ato da execução do teste - que não sabe se o monstro, na verdade, corria
atrás do homem (dúvida). Finalizaria a cena com o homem escondido dentro da
caverna/refúgio/morada para descansar. Parece não se projetar no personagem/pessoa
desesperada e, se tivesse que participar da história ajudaria ao homem que está correndo, pois
está cansado. O sujeito-autor é uma mulher com 72 anos e talvez esteja, é o que parece,
cansada, mas não quer assumir o fato e assim se projeta em um homem outro que ela vê – “vi
um homem correndo do monstro”. É uma maneira de eufemizar o perigo da morte jogando-o
para um outro.

Recorrendo ao quadro síntese de especificações dos elementos (3ª parte do


protocolo), vemos que o personagem, representado pelo homem que na narrativa corre (foge)
do monstro, está desesperado, pois está perdido no mato. A água é representada por uma
nascente (grota d’água), simbolizando vida, saúde, limpeza. Enfatiza ainda, que sem água não
vivemos. O monstro que simboliza bicho perigoso é representado por uma tartaruga que
procura alimento (zoomorfia).

A tartaruga, segundo Chevalier (2003, p. 868) “estende-se a todos os domínios do


imaginário. Pela sua carapaça, redonda como o céu na parte superior (...) e plana como a
terra, na parte inferior, a tartaruga é uma representação do universo: constitui-se por si
mesma numa cosmografia. (...) Mas sua massa e sua força, idéia de poder que evocam suas
quatro patas curtas plantadas no solo como as colunas do templo, fazem dela também o
cosmóforo, carregador do mundo”. É, também, associada à longevidade, o que dá a idéia de
imortalidade. É aquela que ao longo dos anos adquiriu conhecimentos. Tão antigo é o animal
tartaruga que parece ter participado da criação do mundo. Para Chevalier (ibidem, p. 871) o
ato de a tartaruga recolher seus membros e sua cabeça para dentro de seu casco é a
significação de alto nível espiritual. O isolar-se de tudo, tal qual eremita, é a verdadeira
sabedoria. O medo da morte e a angústia do passar do tempo está aqui identificado ou
atualizado no imaginário do sujeito-autor.
173

O que se vê na verdade, é que Aglaia não criou o monstro. O homem que corre não
sabe se o monstro (tartaruga) realmente está atrás dele. E se estiver talvez este monstro seja o
conhecimento. Muitas vezes nós nos espantamos diante do conhecimento e do novo, pois
implica em mudança dentro de nós e mudar nem sempre é fácil. Para o personagem é mais
cômodo ficar em seu ambiente, vivendo (refugiando-se, isolando-se) numa caverna/moradia,
sem mudar o que já está estabelecido. A prova é que o cata-vento (símbolo de movimento, do
tempo, do vento que passa) que existia perto de seu esconderijo (morada) ele não sabia por
que estava ali, mas “conservava para não estragar”. Eis aí a angústia do passar do tempo!

Embora esteja expresso que o personagem está cansado e o desejo de descansar, de


não modificar nada, de não lutar contra o que está determinado (cata-vento sempre no mesmo
lugar sem que se soubesse o que fazia ali), Aglaia, em seu desenho, rompe barreiras e
continua seu desenho fora da margem, como se pelo menos na pictografia lutasse contra o
pré-estabelecido.

Por estar freqüentando o EJA há 4 anos, certamente, o sujeito-autor testemunha


exemplos de alunos de todas as idades que matriculam-se e logo, com uma simples desculpa,
evadem das salas de aula, como se temessem o conhecimento que encontrará, pois é mais fácil
permanecer na sua posição do que ousar, lutar e enfrentar o monstro.

Aglaia não acha que a idade a impede de estudar. Pelo contrário, como ela costuma
dizer: “agora chegou a minha vez”. Com seus 72 anos e corpo franzino, desafia o tempo com
sua alegria e vontade de viver. Para ela, a vida é válida. O idoso já passou por muitas coisas,
boas e ruins e aprende-se com isto. Pode-se escutar quando ela diz: “O tempo passa e
amadurecemos. (...) Não importa o que ficou para trás, importa o que vem pela frente.”
Acredita que estamos “engatinhando para o respeito com o velho. (...) Hoje a sociedade, com
o Estatuto do Idoso, está tentando corrigir erros da própria sociedade e especialmente a
família, pois todos vão ficar mais velhos”.

Analisando todo o protocolo e com o auxílio da Pedagogia da Escuta, julgo que o


sujeito-autor deste protocolo, possui um imaginário com estrutura Pseudo-desestruturado,
com traços de heroísmo (positivo).
174

Protocolo Nº - 17

1ª Parte:
Identificação:
Nome Fictício: LÁQUESIS
Sexo: Masculino
Idade: 62 anos e 11 meses
Grau de Instrução: 1ª série do Ensino Fundamental
Profissão: Funcionário Público (Aposentado)
Reside com: Mulher, 2 filhos e 1 neta

2ª Parte:
a) Pictografia

b) Narrativa (Ditado pelo sujeito-autor)

“Tentei desenhar uma pessoa que sofreu muito. Ela ‘veve’ sofrendo pelas ruas,
pedindo a um e a outro. Está procurando um abrigo, uma casinha para se esconder.
O pássaro estava voando e o ‘caboco’ atirou nele e ele caiu sem vida. Hoje o que
mais se vê são crimes ecológicos.
Tentei fazer uma vaquinha para tirar um leitinho para tomar. Usamos os bichinhos
que dão leite para os filhos da nação e depois nós matamos as coitadinhas para comer.
Tentei desenhar uma queda de água. A árvore já está tombada para cair. Seria a
queda da árvore.
Desenhei um peixe-boi que seria a conservação da natureza. Quando você vê é
porque é criado num cativeiro.
Uma espada que as pessoas usam como uma arma fria que usa para sacrificar a
vida dos seres humanos e dos viventes.
Tentei fazer uma roda d’água. Por aqui não se vê uma roda para puxar água.
Eu acho muito esquisito. Nós temos que preservar a natureza, pois necessitamos
dela.”
175

3ª Parte:
Questionário

I - Responda de modo preciso às seguintes questões:

a) Sobre que idéia você centrou sua composição?


“A preservação da natureza, pois dependemos dela. O ‘nego’ acaba com a natureza.
Estamos acabando com tudo.”

b) Você foi eventualmente inspirado? Através de que (leitura, filme, etc)?


“Como sou uma pessoa sofrida, vivida, acho que se tivéssemos mais um pouco de
consciência a vida seria melhor. A Nação seria melhor. Se acabamos com a
natureza estamos tendo um processo de crime.”

c) Entre os 9 elementos do teste de sua composição, indique:


c. 1) os elementos essenciais em torno dos quais você construiu o desenho;
“Para a Nação esconderijo para termos onde morar.
Pássaro, peixe-boi.”

c. 2) os elementos que você teria vontade de eliminar. Por que?


“Espada.”

d) Como acaba a cena que você imaginou?


“Poderíamos terminar pedindo para a nação ter mais consciência, um com o
outro.”
e) Se você tivesse que participar da cena composta, onde você estaria? O que faria?
“Ser este homem.”

II – No quadro seguinte, você deverá especificar:


1. Por meio de que você representou os 9 elementos do teste (coluna A).
2. O papel, a função, a razão de ser de cada uma de suas representações (coluna B).
3. O que simboliza, para você, cada um dos 9 elementos do teste (coluna C).

Elemento A – Representado por B – Função/Papel C - Simbolizando


Queda pássaro que caiu semear a natureza Natureza - floresta
Espada Espada matar arma fria -batalha,
guerra
Refúgio Casa se esconder, morar Nação brasileira
Monstro --- Fazer o que não presta Perigo
Cíclico roda d’água jogar água para as casas lua cheia que é redondo
Personagem homem defender o país - trabalho Jesus Cristo - Somos a
semelhança dele
Água --- matar a sede, limpeza, Perigo (afogamento),
fazer alimento lazer (brincar)
Animal Peixe-boi beleza -----
Fogo Fogo na mata usa para cozinhar perigo e coisas boas
Queima – mata também
176

Análise do Protocolo Nº 17 - Láquesis

O sujeito-autor do protocolo é um senhor de 62 anos, aposentado, que reside com


esposa, filhos e neta. Freqüenta a UNATI/UCB há 18 meses. A partir de agora será
identificado com o nome fictício de Láquesis41.

A pictografia criada por Láquesis, é apresentada com os elementos soltos, sem o


enredo de uma história pictografada, o que, a princípio, remete a uma desestrutura. Algumas
das representações são desenhadas demonstrando negativismo: árvore caindo, espada
posicionada para baixo e animal morto.

Com a narrativa percebemos um ambiente negativo. O homem é um sofredor; no


questionário do teste (questão “b”) o sujeito autor responde: “... sou uma pessoa sofrida.” O
pássaro que voava foi alvejado com um tiro e caiu sem vida. A árvore tombou. Tanto a queda
do pássaro quanto o tombamento da árvore, representam o elemento queda do protocolo do
teste AT-9. O pássaro que, tal como a árvore simboliza as relações entre o céu e a terra, cai;
morre. Morre de morte matada e não de morte morrida. É o sonho de ter uma nação feliz, com
a preservação da natureza, que também morre em conseqüência dos atos dos homens.

A vaca que produz leite é morta para servir de alimento. Afirma Chevalier (2003,
p. 927) que “a vaca produtora de leite é o símbolo da terra nutriz. (...) Ela é a fertilidade, a
riqueza, a renovação”. Contudo a vaca, quando morta, faz de sua carne o último alimento. Ali
ela se acaba. Não existirá mais oportunidade de produção de alimento (leite), de fertilidade
(filhotes), tampouco de renovação. O peixe-boi só sobrevive porque está em cativeiro. A
espada é usada não para defesa, mas sacrificar vidas. A roda d’água não se vê mais. São
vários exemplos que Láquesis utiliza para exprimir a inconsciência dos homens.

O elemento monstro não é desenhado ou narrado, mas é como se em cada idéia


representada pelo autor, houvesse um monstro, a angústia, o perigo, pois é um universo
bastante negativo. Tudo se acaba, tudo é destruído e fica o apelo de preservação da natureza,
pois sem ela, morreremos. Os pequenos monstros apresentados concebem a idéia de um
monstro maior, poderoso e invencível: a morte.

41
Segundo a lenda grega Cloto, Láquesis e Átropos, eram 3 irmãs que determinavam os destinos dos homens,
tanto no aspecto de duração quanto nas designas de atribulação e sofrimento. Cloto, em grego "fiar", segura o
fuso e puxa o fio da vida. Láquesis ("sortear") enrola o fio e sorteia o nome dos que vão morrer e Átropos ("não
voltar", ser inflexível) corta o fio.
A narrativa apresentada mostra um ambiente de negatividade, com a vida por um fio, como se Láquesis
estivesse indicando à Átropos, os que deveriam fazer sua eterna viagem. E esta, implacável, cortasse o fio da via
dos sorteados.
177

Recorrendo ao questionário do protocolo vemos que o sujeito-autor, apesar de


aposentado - ter uma renda financeira, mesmo que mínima -, projeta-se no personagem
- homem que sofreu muito e vive pelas ruas -. Talvez porque a figura do homem de rua seja
de um pedinte, e o que Láquesis quer é pedir, desesperadamente, que as pessoas tenham mais
consciência, que preservem a natureza, caso contrário, muitos serão os sorteados para terem
suas vidas interrompidas. Para o sujeito-autor, cuidar da natureza é ter uma nação mais
desenvolvida.

O sujeito-autor deste protocolo trabalhou num centro de reabilitação de menores


delinqüentes, onde haviam desafetos e rebeliões. Era um universo pessimista de violência e
sofrimento. Talvez por isto a narrativa tenha tantos momentos de perdas. Na escuta, percebi
que ele acha que a sociedade preocupa-se apenas com o presente, não preserva o seu passado
e nem constrói, de fato, o futuro. “Estamos acabando com a natureza praticando crimes
ambientais, não preservamos a nossa espécie, destruímos a nossa nação, não valorizamos o
nosso velho. (...) A sociedade maltrata muito os velhos (...) quem maltrata o velho, não pensa
no dia de amanhã”.

Analisando o conteúdo do protocolo, em todas as suas etapas e por meio da escuta,


percebo que Láquesis já presenciou muito sofrimento. Anseia pela consciência dos homens e
por uma pátria melhor no futuro. Porém, no presente, ronda o monstro que é a destruição e a
morte.

Pelo fato dos elementos do teste se apresentarem explodidos no desenho, estarem


soltos sem cadência - sem início, meio e fim -, de uma mesma história, este protocolo registra
um imaginário com desestrutura. Trata-se, portanto, de um Micro-universo Mítico
Desestruturado, com fortes indícios de negatividade, ou seja, existe a presença, também, de
um micro-universo mítico heróico de forma negativa.
178

Protocolo Nº 18

1ª Parte:
Identificação:
Nome Fictício: PANDORA
Sexo: Feminino
Idade: 61 anos e 9 meses
Grau de Instrução: 2ª Série do Ensino Fundamental
Profissão: Comerciante (Quiosque – salgados e balas)
Reside com: Marido e 5 filhos (Possui 12 filhos e 24 netos)

2ª Parte:
a) Pictografia

b) Narrativa (Ditado pelo sujeito-autor)

“O Presidente, antes de tomar o poder, a cabeça imaginava mais pouco (cabeça


pequena). Quando tomou conta do poder, a cabeça cresceu, está emaranhado. Não sabe o
que faz com a Nação mais. Pensou muito alto. Antes, ele era bom e viu que a coisa não é tão
fácil assim, está num beco sem saída. Não sabe o que fazer.
O peixe representa nós. O homem está acabando com a floresta, a água está
acabando e é assim que vamos ficar: se sufocando.
O pássaro corre com medo do fogo que acaba com nossa floresta.
A caverna é de palha e da mulherzinha. Ela está na praça pública com a mão
estirada pedindo, que é o mundo de hoje que você vê nas praças. É mendiga. Maltrataram ela
em São Paulo.
Esse dragão é aquele que está acabando com nosso salário, está engolindo. E com
isto, nossas crianças estão passando fome.”
179

3ª Parte:
Questionário

I - Responda de modo preciso às seguintes questões:

a) Sobre que idéia você centrou sua composição?


“O País está enrolado e o dono do poder não sabe o que faz com a Nação.”

b) Você foi eventualmente inspirado? Através de que (leitura, filme, etc)?


“A reclamação do povo.”

c) Entre os 9 elementos do teste de sua composição, indique:


c. 1) os elementos essenciais em torno dos quais você construiu o desenho;
“O homem para organizar o Brasil.
A mendiga que morreu (o que dói muito em nosso coração).”

c. 2) os elementos que você teria vontade de eliminar. Por quê?


“A mulher.”

d) Como acaba a cena que você imaginou?


“Vamos conseguir a vitória, com a organização do Brasil. Vamos acabar com a
miséria, com as crianças jogadas na rua, mendigo, dragão (inflação).
O Brasil pode melhorar mais se o Presidente parar de viajar.”

e) Se você tivesse que participar da cena composta, onde você estaria? O que faria?
“No lugar do peixe. Queria viver mais!.”

II – No quadro seguinte, você deverá especificar:


1. Por meio de que você representou os 9 elementos do teste (coluna A).
2. O papel, a função, a razão de ser de cada uma de suas representações (coluna B).
3. O que simboliza, para você, cada um dos 9 elementos do teste (coluna C).

Elemento A – Representado por B – Função/Papel C - Simbolizando


Queda Dragão Dói pobreza
Espada Espada machucar violência
Refúgio caverna de palha Nação que não tem casa pobreza
Monstro Dragão acabando com a Nação inflação
Cíclico a cabeça do Presidente pensa demais, virou teia nosso Brasil
de aranha
Personagem Lula melhorar mais o salário Nação
Água Lago para que o peixe possa vida (pouca)**
viver
Animal Ema correr do fogo nossa vida***
Fogo Fogueira queimar a floresta * representa vida
* Mas não podemos viver sem o fogo. Temos que deixar uma fogueirinha.
** A nossa vida é pouca
*** Quando estamos em perigo, tentamos correr.
180

Análise do Protocolo Nº 18 - Pandora

O sujeito-autor deste protocolo é uma senhora de quase 62 anos. É casada, possui 12


filhos e 24 netos. Atualmente 5 dos seus filhos residem com ela e o marido. Apesar da idade,
trabalha no comércio local (próximo a sua residência) junto com o marido e freqüenta
UNATI/UCB há um ano. Doravante será identificada pelo nome fantasia de Pandora42.

Seu desenho exibe elementos soltos, explodidos, sem vinculação entre eles, o que a
princípio leva-nos a crer que estamos na presença de um imaginário com desestrutura.

Na narrativa há um misto de política43 (econômica, social e ambiental). Parece ser de


um discurso imaginário simbólico. Discorre sobre do Presidente da República do nosso país,
comparando-o antes e depois das eleições. No desenho o personagem Lula é representado
pela imagem de uma cabeça barbuda com cabelos encaracolados “virou teia de aranha”.
Acredita que o Sr. Presidente antes de assumir o poder tinha as melhores intenções para
governar o país, mas na prática esta não é uma tarefa fácil. Retrata o Presidente Lula com uma
grande cabeça, emaranhada e com muitas preocupações.

Chevalier (2003, p. 151) afirma que “a cabeça geralmente simboliza o ardor do


princípio ativo. (...) Simboliza a força e o valor do guerreiro...” É dentro dela que está o
cérebro, responsável pelo intelecto, que nos permite pensar, refletir, ponderar, instruir, gerir,
ordenar, governar... . Afirma ainda, que devido à forma esférica, “a cabeça humana é
comparável, segundo Platão, a um universo. É um microcosmo.”

Para os adeptos do Candomblé (religião afro-brasileira), a cabeça, chamada de “ori”,


tem que estar equilibrada, centrada, caso contrário é preciso fortalecê-la, através de rituais
com oferendas (comidas e sementes sagradas).

A aplicação do teste no sujeito-autor aconteceu por ocasião da chacina de mendigos


em São Paulo, o que certamente influenciou no protocolo. - Um dos personagens criado por
ele é uma mendiga que foi maltratada (morta) nas ruas de São Paulo.

42
Pesquisando a mitologia grega, identificamos Pandora como a 1ª mulher gerada. A lenda de Pandora
atravessou os séculos. Conta a história que ela, inadvertidamente, ao abrir uma caixa que Epimeteu possuía
deixou escapar todos os males. Pandora tentou fechar a caixa e conseguiu impedir que a esperança saísse. Desta
forma, por pior que seja o mal que possa nos abater, não seremos inteiramente desgraçados. Pandora ao abrir a
caixa deixa escapar todos os males, o sujeito-autor, relata esses males em situações atuais. Mas, por mais que
trace um panorama dicífil, percebe-se que, mesmo sem escrever, nas entrelinhas, existe esperança de uma
melhora.
43
Este protocolo foi aplicado no 1º semestre de 2004, onde o cenário político era um pouco diferente do atual
(julho/2005).
181

Pandora fala da miséria - pobreza simbolizando a queda/dragão -, que vemos nas


praças públicas. Atribui a fome, que nossas crianças estão passando, à política salarial e a
inflação que é representada pelo dragão (monstro e queda). Enfatiza que os homens estão
acabando com a água/vida e as florestas/vida. Compara-nos com os peixes que sem água
sufocam-se (morrem), ou seja, o homem arquiteta, inconscientemente, sua própria morte.
Expõe um ambiente triste e negativo, de desesperança politizada.

Com o questionário do protocolo, verifica-se que o sujeito-autor centrou sua


composição na situação pelo qual (segundo ele, negativamente), passa o país. Para ele os
elementos essenciais no protocolo foram a figura do Presidente e da mendiga “que morreu”
(que está desenhada, consta do discurso – “mulherzinha na praça pública com a mão estirada
pedindo. É mendiga”-, mas não aparece no quadro do teste com um simbolismo atribuído pelo
sujeito-autor). A mendiga, por não ter oportunidade de condições melhores de vida, morreu
vítima da violência e da ignorância de um grupo de pessoas, e o Presidente porque ainda não
conseguiu criar oportunidades para todo o povo brasileiro (o que é uma utopia). Mesmo
achando que o desenho da mendiga era essencial, a eliminaria. Talvez por representar a
violência (em particular à mulher), a miséria, a desigualdade social, a injustiça, a ignorância e
acima de tudo, a solidão, a morte. Imagina que a história termine com a vitória, com um país
reestruturado. Projeta-se no peixe que está se sufocando e gostaria de viver.

No quadro síntese de especificações dos elementos (3ª parte do protocolo), representa


a queda como o dragão que simboliza a pobreza. Na mitologia, o dragão pode representar o
bem ou o mal (simbologia ambivalente). Neste protocolo, representa o mal, representa a
queda, não de uma pessoa, mas de várias pessoas, prejudicando toda uma comunidade, estado,
nação. O dragão é a queda e o monstro. Mas a história tem vários monstros: o fogo que
afugenta o pássaro; o homem que inconscientemente ou não está acabando com a floresta e a
água; o homem que conscientemente maltrata, violenta; os problemas de um país; a inflação;
a miséria. Maior que o monstro dragão (zoomorfia fantástica) é o monstro miséria, o monstro
morte.

Com a escuta, percebe-se a indignação de Pandora pela forma como a sociedade trata
o velho. Para ela a sociedade vê o envelhecimento “como um lixo! (...) Eles têm a velhice
como doença.” Gostaria que todos os idosos, independente de classe social, tivessem uma
vida mais digna, pois ser velho é apenas “o tempo que corre”, e ter muita história de vida, é
aprendizagem.
182

Analisando todas as etapas do protocolo, percebemos que a espada está representada


com o papel de machucar, simbolizando violência; o monstro está representado pela imagem
do dragão, com o papel de acabar com a nação, simbolizando a inflação, e um personagem,
com quem se relacionam os elementos citados, com a função de melhorar os salários, quer
dizer, melhorar as condições de vida, simbolizando a Nação. Assim os três elementos que
caracterizam o regime diurno das imagens, estão presentes e formam a base do drama. O
elemento refúgio colocado no teste por Yves Durand para provocar/ estimular o arquétipo da
paz, do aconchego, neste protocolo está representado e simbolizado negativamente, como
caverna de palha e pobreza. Os demais elementos complementares do teste se apresentam:
fogo para queimar, mas simboliza a vida; água para que o peixe possa viver, simbolizando
vida pouca; animal ema para correr do fogo, simbolizando nossa vida de fuga da inflação, da
miséria e da pobreza.

Diante de todas as análises, e por meio da escuta encontramos que há uma coerência
mítica, não no desenho explodido, mas no discurso do sujeito-autor quando simbolicamente
apresenta um drama real. As imagens se aglutinam em torno do descontentamento com o pré-
estabelecido, e isto significa esquizomorfia e não paz. Trata-se de uma jovem velha, ou de
uma velha jovem com quase 62 anos, politizada, ligada ao mundo, crítica e lutadora por seus
direitos. Pandora não se acomoda. Estamos na presença de um Micro-universo Mítico
Pseudo-desestruturado, um imaginário simbólico com traços de negatividade, com forte
tendência ao Heróico.
183

6.2 – Exposição de Quadros sínteses dos protocolos apresentados

6.2.1 - Representações, funções e simbolismos atribuídos aos elementos do


AT-9.

Visando assessorar a análise das representações – análise elemencial -,


funções/papéis e os simbolismos – análise funcional - atribuídos a cada um dos nove
elementos do teste AT-9, apresentamos, a seguir, quadros sínteses de forma a visualizar a
idéia de vida e de morte expressa nos simbolismos de cada um dos elementos dos protocolos
do teste e a incidência nas representações de imagens e funções.

O objetivo dos quadros é a visualização do todo, conduzindo a identificação da


estrutura do imaginário – análise estrutural - da população envolvida nesta pesquisa na
UnATI/UCB.
184

6.2.1.1 – Quadro síntese das representações das imagens atribuídas aos


elementos

A - Representados por
Elementos
Protocolo Queda Espada Refúgio Monstro Cíclico Personagem Água Animal Fogo
Nº 1 cachoeira espada caverna o gigante movimento garoto lago cobra queima-
Gaia de um olho da água da da
só cachoeira
Nº 2 cachoeira o instru- a casa onde animal a roda da um homem água de peixe da
Hefesto mento mora selvagem usina cachoeira fogueira
na mão
Nº 3 Monta- espada papagaio Pirulito estrelas homem água papagaio fogo
Apolo nha
Nº 4 rio, queda espada a base da tubarão a roda pescador rio tubarão fogueira
Ulisses roda girando
Nº 5 Água um caverna urso o pássaro o homem a queda da urso fogueira
Calíope objeto voando água
na mão
do
homem
Nº 6 queda de espada casa --- --- o homem água caindo cachorro, ---
Édipo braço da bica pato
Nº 7 da água --- casa um animal --- um menino um rio --- fogueira
Aretusa
Nº 8 d’água briga – igreja homem carro eu tranqüi- peixe entarde-
Morfeu luta lidade cer
Nº 9 bonecos boneco 1 relógio 1 quadra- roda um soldado forma de cachorro riscos
Cronos caindo e espada do homem chuva pra
cima
Nº 10 uma um uma cobra que é sol é vida saci-pererê vida, rios, peixe fogo
Hebe criança guerrei- caverna p/ perigo mares símbolo também
caindo da ro esconder de Cristo é vida
escada
Nº 11 cachoeira --- casa violência o sol Pedro lago cão – ---
Métis (choupana) (fig.) (pescador) peixe
Nº 12 Água arma casa cachorro roda homem água um destrói
Hemera cachorro
Nº 13 o pássaro defesa casa ataque cata-vento senhora, dentro da pássaro fogueira
Hélio monstro casa
Nº 14 --- espada caverna homem redemoinho mulher Rio pássaro mata
Ártemis feio / ciclone pega
fogo
Nº 15 persona- e levava 1 casa que cara feia laranja pessoas lagoa c/ peixe fogueira
Destino gem caiu na mão ele avistou peixes assar os
do peixes
barranco
Nº 16 o homem espada caverna de tartaruga cata-vento homem grota lesma fogueira
Aglaia escorre- pedra d’água,
gando nascente
Nº 17 pássaro espada casa --- roda homem --- peixe-boi fogo na
Láquesis que caiu d’ água mata
Nº 18 Dragão espada caverna de dragão a cabeça do Lula Lago ema fogueira
Pandora palha Presidente
185

6.2.1.2 – Quadro síntese das funções/papéis atribuídos aos elementos

B - Funções/Papéis
Elementos
Protocolo Queda Espada Refúgio Monstro Cíclico Personagem Água Animal Fogo
Nº 1 movimen- assustar esconde- assustar renova- criança salvação assustar dificul-
Gaia to rijo ção levada dade
Nº 2 servir a defesa moradia ameaçador, reprodu- chefe de importante está no produzir
Hefesto usina atacar o zir família à vida seu calor
homem energia habitat,
ambiente
Nº 3 esconder atacar cantar observar brilhar observar molhar peixe queimar
Apolo os
persona-
gens
Nº 4 destruição construir proteção alimentar- produzir lazer lazer, terror aquecer,
Ulisses a contra o se energia alimento, salvar
fogueira tubarão serviço, vida
meio
ambiente
Nº 5 matar a cortar esconderijo matar voar criatividade que corre selvagem queima,
Calíope sede alumia
Nº 6 união de defende refúgio --- --- lutar pela desperdício amigo do ---
Édipo 2 pessoas sobrevivên- (água conta- homem
cia minada)
Nº 7 natureza --- refúgio --- --- infância --- --- destruí-
Aretusa ção
Nº 8 necessi- luta lugar de --- socorro a procura harmonia salvação muita
Morfeu dade buscar paz
Nº 9 mostra briga compro- insucesso rolando submisso coisa boa defesa queimar
Cronos queda misso
Nº 10 ter represen representa amedrontar tudo q/ o enganador, representa representa não se
Hebe cuidado ta ficar só ser sagaz tudo vida vive
desafio humano sem ele
precisa
Nº 11 --- --- --- --- --- --- --- --- ---
Métis
Nº 12 dar banho matar refúgio devorar girando defesa vida amigo queimar
Hemera cata-vento
Nº 13 distraiu o defesa abrigo, ataque destruí- ataque e para atenção destruí-
Hélio monstro fuga ção defesa acalmá-la ção
Nº 14 --- filme proteger assustar desequili- dar paz e tomar compor a queimar
Ártemis brar tranqüilidade banho cena
Nº 15 obstáculo em uma casa destruir alimentar caminhar matar a peixe / assar os
Destino defesa refugiar sede alimentar peixes
talvez
Nº 16 derrubar se se esconder procurar girar com andar dar de andar para se
Aglaia defender alimento o vento beber esquentar
clarear a
noite
Nº 17 semear a matar se esconder fazer o que jogar defender o matar a sede, beleza usa p/
Láquesis natureza orar não presta água para país – limpeza, cozinhar
as casas trabalho fazer queima -
alimento mata
Nº 18 Dói machu- nação que acabando pensa melhorar mais para que o correr do queimar
Pandora car não tem com a nação demais, o salário peixe possa fogo a floresta
casa virou teia viver *(mas
de aranha não
podemos
viver s/ o
fogo)
186

6.2.1.3 – Quadro síntese dos simbolismos atribuídos aos elementos

C – Simbolizando
Elementos
Protocolo
Queda Espada Refúgio Monstro Cíclico Personagem Água Animal Fogo
Nº 1 Vida arma moradia perigo renovação criança vida medo, perigo
Gaia da vida perigo
Nº 2 natureza arma sossego procura movimento responsabi- natureza vida utilida-
Hefesto de da roda lidade de
alimento
Nº 3 Montes ferimen- cantares inteligên- céu natureza derrama- belezas queima-
Apolo to diferentes cia mento das
Nº 4 Morte ajuda esteios da animal roda homem causa de devorador aconche
Ulisses roda destruição -go,
e morte amor
Nº 5 de amor defen- privaci- instinto leveza livre arbítrio alimento, feroci- cinzas
Calíope der dade p/ amar matar a sede dade
Nº 6 a luta pela a luta abrigo a somatória --- humanidade desperdício guarda da ---
Édipo sobrevi- da casa
vência situação, é
viver no
limite
Nº 7 Beleza --- moradia --- --- criança --- --- ---
Aretusa
Nº 8 Paz guerra refúgio --- tirar do a busca paz --- luz
Morfeu lugar
Nº 9 insucesso ruim correria fracasso vencido ordem --- amigo acabar
Cronos
Nº 10 Alerta luta solidão medo luz zombeteiro vida amor paixão
Hebe
Nº 11 natureza arma casa violência fonte de pescador fonte de lealdade / ---
Métis vida (t. nós) vida alimento
Nº 12 limpeza guerra descanso uma fera uma roda Pátria pureza animal devorar
Hemera
Nº 13 alegria ataque e amparo raiva defesa ataque, alegria defesa destruí-
Hélio defesa defesa ção
Nº 14 desequi- --- proteção medo / surpresa --- brincar paz / queima-
Ártemis líbrio susto alegria da
Nº 15 Engano defesa na casa, muita gostosura encontro desedentar alimento cozimen
Destino ou refugiar feiúra to
limpar o
caminho
Nº 16 a pessoa Pensa- morada bicho o tempo, o perdido no vida, saúde, uma coisa clarida-
Aglaia pode mento perigoso, vento que mato, pessoa limpeza q/ anda de vida,
machucar de medo passa, desesperada por andar, pois
defesa movimento nojento com o
fogo se
alimenta
Nº 17 natureza arma fria Nação perigo lua cheia q/ Jesus Cristo perigo --- perigo e
Láquesis – floresta – brasileira é redondo – somos a (afogamen- coisas
batalha, semelhança to), lazer boas
guerra dele (brincar) também
Nº 18 pobreza violência pobreza inflação nosso Nação vida nossa represen
Pandora Brasil (pouca) vida ta vida
**(nossa ***(quando
vida é pouca) estamos em
perigo
tentamos
correr)
187

6.2.2. – Quadro síntese dos protocolos indicando sexo, idade e idéia de vida e
morte contida nos simbolismos dos elementos

Protocolo Nº 1 - Gaia Protocolo Nº 2 - Hefesto


Identificação Sexo: Idade: Identificação Sexo: Idade:
Idéias de Idéias de
Feminino 62 anos Feminino 46 anos
Vida e de Vida e de
e7m e2m
Morte Morte
Elementos Simbolismos Elementos Simbolismos
Queda vida + Queda natureza +
Espada arma + Espada arma +
Refúgio moradia + Refúgio sossego +
Monstro perigo - Monstro procura de alimento -
Cíclico renovação da vida + Cíclico movimento da roda +
Personagem criança + Personagem responsabilidade +
Água vida + Água natureza +
Animal medo, perigo - Animal vida +
Fogo perigo - Fogo utilidade +
Total 6/3 Total 8/1
Protocolo Nº 3 - Apolo Protocolo Nº 4 - Ulisses
Identificação Sexo: Idade: Identificação Sexo: Idade:
Idéias de Idéias de
Feminino 60 anos Feminino 72 anos
Vida e de Vida e de
e 11 m e4m
Morte Morte
Elementos Simbolismos Elementos Simbolismos
Queda montes + Queda morte -
Espada ferimento - Espada ajuda +
Refúgio cantares diferentes + Refúgio esteios da roda +
Monstro inteligência - Monstro animal -
Cíclico céu + Cíclico roda +
Personagem natureza + Personagem homem +
Água derramamento - Água causa de destruição e -
morte
Animal belezas + Animal devorador -
Fogo queimada - Fogo aconchego, amor +
Total 5/4 Total 5/4
Protocolo Nº 5 - Calíope Protocolo Nº 6 - Édipo *
Identificação Sexo: Idade: Identificação Sexo: Idade:
Idéias de Idéias de
Feminino 64 anos Masculino 69 anos
Vida e de Vida e de
e7m e 11 m
Morte Morte
Elementos Simbolismos Elementos Simbolismos
Queda de amor + Queda a luta pela -
sobrevivência
Espada defender + Espada a luta +
Refúgio privacidade + Refúgio abrigo +
Monstro instinto - Monstro a somatória da situação; -
é viver no limite
Cíclico leveza + Cíclico ---
Personagem livre arbítrio p/ amar + Personagem humanidade +
Água alimento, matar a sede + Água desperdício -
Animal ferocidade - Animal guarda da casa +
Fogo cinzas - Fogo ---
Total 6/3 Total 4/3
188

Protocolo Nº 7 – Aretusa * Protocolo Nº 8 - Morfeu *


Identificação Sexo: Idade: Identificação Sexo: Idade:
Idéias de Idéias de
Feminino 62 anos Feminino 63 anos
Vida e de Vida e de
e7m
Morte Morte
Elementos Simbolismos Elementos Simbolismos
Queda beleza + Queda paz +
Espada --- Espada guerra -
Refúgio moradia + Refúgio refúgio +
Monstro --- Monstro ---
Cíclico --- Cíclico tirar do lugar +
Personagem criança + Personagem a busca +
Água --- Água paz +
Animal --- Animal ---
Fogo --- Fogo luz +
Total 3 / --- Total 6/1
Protocolo Nº 9 - Cronos * Protocolo Nº 10 - Hebe
Identificação Sexo: Idade: Identificação Sexo: Idade:
Idéias de Idéias de
Feminino 67 anos Feminino 69 anos
Vida e de Vida e de
e2m e9m
Morte Morte
Elementos Simbolismos Elementos Simbolismos
Queda insucesso - Queda alerta -
Espada ruim - Espada luta +
Refúgio correria - Refúgio solidão -
Monstro fracasso - Monstro medo -
Cíclico vencido - Cíclico luz +
Personagem ordem - Personagem zombeteiro -
Água --- Água vida +
Animal amigo + Animal amor +
Fogo acabar - Fogo paixão +
Total 1/7 Total 5/4
Protocolo Nº 11 - Métis * Protocolo Nº 12 - Hemera
Identificação Sexo: Idade: Identificação Sexo: Idade:
Idéias de Idéias de
Feminino 71 anos Feminino 62 anos
Vida e de Vida e de
e9m e8m
Morte Morte
Elementos Simbolismos Elementos Simbolismos
Queda natureza + Queda limpeza +
Espada arma + Espada guerra -
Refúgio casa + Refúgio descanso +
Monstro violência - Monstro uma fera -
Cíclico fonte de vida + Cíclico uma roda +
Personagem pescador + Personagem pátria +
Água fonte de vida + Água pureza +
Animal lealdade / alimento + Animal animal +
Fogo --- Fogo devorar -
Total 7/1 Total 6/3
189

Protocolo Nº 13 - Hélio Protocolo Nº 14 - Ártemis *


Identificação Sexo: Idade: Identificação Sexo: Idade:
Idéias de Idéias de
Feminino 60 anos Feminino 72 anos
Vida e de Vida e de
e8m e 10 m
Morte Morte
Elementos Simbolismos Elementos Simbolismos
Queda alegria + Queda desequilíbrio -
Espada ataque e defesa + Espada ---
Refúgio amparo + Refúgio proteção +
Monstro raiva - Monstro medo / susto -
Cíclico defesa + Cíclico surpresa -
Personagem ataque, defesa + Personagem ---
Água alegria + Água brincar +
Animal defesa + Animal paz / alegria +
Fogo destruição - Fogo queimada -
Total 7/2 Total 3/4
Protocolo Nº 15 - Destino Protocolo Nº 16 - Aglaia
Identificação Sexo: Idade: Identificação Sexo: Idade:
Idéias de Idéias de
Feminino 74 anos Feminino 72 anos
Vida e de Vida e de
e7m e5m
Morte Morte
Elementos Simbolismos Elementos Simbolismos
Queda engano - Queda a pessoa pode machucar -
Espada defesa / limpar o caminho + Espada pensamento de defesa +
Refúgio na casa, refugiar + Refúgio morada +
Monstro muita feiúra - Monstro bicho perigoso, medo -
Cíclico gostosura + Cíclico o tempo; o vento q/ passa; +
movimento
Personagem encontro + Personagem perdido no mato, pessoa -
desesperada
Água desedentar + Água vida, saúde, limpeza +
Animal alimento + Animal uma coisa q/ anda por -
andar, nojento
Fogo cozimento + Fogo claridade; vida, pois com o +
fogo se alimenta
Total 7/2 Total 5/4
Protocolo Nº 17 - Láquesis * Protocolo Nº 18 - Pandora
Identificação Sexo: Idade: 62 Identificação Sexo: Idade:
Idéias de Idéias de
Masculino anos Feminino 61 anos
Vida e de Vida e de
e 11 m e9m
Morte Morte
Elementos Simbolismos Elementos Simbolismos
Queda natureza – floresta + Queda pobreza -
Espada arma fria – batalha, guerra - Espada violência -
Refúgio Nação brasileira + Refúgio pobreza -
Monstro perigo - Monstro inflação -
Cíclico lua cheia q/ é redondo + Cíclico nosso Brasil -
Personagem Jesus Cristo – somos a + Personagem Nação +
semelhança dele
Água perigo (afogamento), lazer - Água vida (pouca) -
(brincar)
Animal --- Animal nossa vida +
Fogo perigo e coisas boas tbém - Fogo representa vida +
Total 4/4 Total 3/6
Idéia de Vida = + (positivo) – expressa no numerador
Idéia de Morte = - (negativo) – expressa no denominador
* Os sujeitos-autores dos protocolos assinalados deixaram o quadro de simbolismo incompleto, o que dificultou, um
pouco, as análises das idéias de vida e de morte.
190

Eis, na tabela abaixo, o micro-universo mítico de cada um dos participantes da


pesquisa realizada na UnATI/UCB, autores dos protocolos.

6.2.3 - Quadro síntese com identificação de sexo, idade e identificação do micro-


universo mítico, segundo Yves Durand

Protocolo Sexo Idade Grau de Instrução Micro-universo Mítico


Nº1 Feminino 62 anos e Doutoranda Místico Impuro
Gaia 07 meses
Nº2 Feminino 46 anos e Mestrado Duplo Universo Mítico Existencial
Hefesto 02 meses Diacrônico
Nº3 Feminino 60 anos e Superior Pseudo-desestruturado
Apolo 11 meses Com tendência ao sintético
Nº4 Feminino 72 anos e Superior Místico Impuro
Ulisses 04 meses
Nº5 Feminino 64 anos e Médio Místico Impuro
Calíope 07 meses
Nº6 Masculino 69 anos e Fundamental Pseudo-desestruturado,
Édipo 11 meses Com tendência da síntese sincrônica
Nº7 Feminino 62 anos e Fundamental - Místico Impuro
Aretusa 07 meses Primário
Nº8 Feminino 63 anos Científico Pseudo-desestruturado
Morfeu 00 meses Com tendência mística
Nº9 Feminino 67 anos e Médio Sintético simbólico de forma
Cronos 02 meses diacrônico
Nº10 Feminino 69 anos e Médio Pseudo-desestruturado
Hebe 09 meses com tendência no místico - lúdico
Nº11 Feminino 71 anos e Médio Místico do tipo super-místico
Métis 09 meses
Nº12 Feminino 62 anos e Médio Duplo Universo Mítico Existencial
Hemera 08 meses Sincrônico
Nº13 Feminino 60 anos e Superior Duplo Universo Mítico Existencial
Hélio 08 meses Diacrônico
Nº14 Feminino 72 anos e Superior Místico Impuro
Ártemis 02 meses
Nº15 Feminino 74 anos e Fundamental Místico Impuro
Destino 07 meses
Nº16 Feminino 72 anos e Fundamental Pseudo-desestruturado
Aglaia 05 meses Fase I (3º semestre) Com traços de heroismo
Nº17 Masculino 62 anos e Fundamental Desestruturado
Láquesis 11 meses Fase I (1º semestre) Com traços da estrutura Heróica de forma
negativa
Nº18 Feminino 61 anos e Fundamental Pseudo-desestruturado,
Pandora 09 meses Fase I (2º semestre) Com tendência ao heróico
191

Na tabela abaixo, iremos apresentar as incidências de cada um dos nove estímulos


propostos nos testes para tentarmos levantar o imaginário do grupo participante da pesquisa
realizada.

6.2.4 - Quadro síntese demonstrativo das incidências de representações de


imagens, funções/papéis e simbolismos

Elemento Representado por Função / Papel Simbolismo


(Imagem)
Queda Água (08) Utilidade (07) Natureza (04)
Perigo (05) “Sentimentos” (05)
Espada Espada (09) Lutar / defender (09) Luta / defesa (07)
Refúgio Casa / Caverna (14) Refúgio(11) Moradia / proteção (12)

Monstro Animais (06) Assustar / (03) Perigo / Medo (06)


Observar / alimentar-se (03) Instinto (05)
Cíclico Roda (05) Movimento (08) Movimento (05)
Renovação da vida (02)
Personagem Ser Humano (16) Variados (18) Valores (05)

Água Água – corrente (12) Utilidade (08) Vida (05)

Animal Peixe (06) Defesa / amizade (04) Perigo (03)


Cachorro (04) “Sentimento” (07)
Fogo Fogueira (08) Quiemar / Destruição (08) Destruição (06)
Queimada (03) Utilidade (07) Utilidade (03)
“Sentimento” (04)

No quadro acima vemos alguns elementos cujas representações se repetiram com


mais intensidade, bem como funções/papéis e simbolismos.
Nas incidências das imagens, vemos que houve um destaque da imagem da água
representando o elemento queda, com papel de utilidade e simbolizando a natureza, os
sentimentos, o aconchego; o que demonstra ser o elemento queda representado e simbolizado
de forma positiva por não ser do personagem e remete ao regime noturno das imagens: a
estrutura mística. O elemento espada, com a função de lutar/defender, simboliza a
luta/defesa, o que demonstra indícios de heroísmo. A representação do elemento refúgio mais
comum foi a da casa, com a função de oferecer refúgio, simbolizando proteção. Segundo
Bacherlard (apud Chevalier, 2003, p. 197) “a casa significa o ser interior, (...) seus andares,
porão e sótão simbolizam diversos estados da alma. (...) A casa é também um símbolo
feminino, com o sentido de refúgio, de mãe, de proteção, de seio maternal.” O elemento
Monstro teve maior representação com a imagem do animal, com a zoomorfia real/atual, com
empate nas incidências das funções: assustar e observar/alimentar-se, simbolizando perigo,
medo e instinto animal. O elemento cíclico, representado pela roda, com função de
movimento e simbolizando o movimentar para a renovação da vida. O elemento personagem,
192

está representado na forma de ser humano, simbolizando valores. A maior incidência de


representações para a água foi como água corrente, com a função de ser útil para a vida,
simbolizando vida. De acordo com Chevalier, (ibidem, p. 15-22) “as águas trazem vida, força
e pureza, tanto no plano espiritual quanto corporal (...) é o símbolo (...) da sabedoria, da
graça e da virtude; (...) das energias inconscientes, das virtudes informes da alma, das
motivações secretas e desconhecidas (...)”. Os animais mais representados foram o peixe e o
cão. Para Chevalier (ibidem, p. 704) o peixe é, também, “símbolo de vida e de fecundidade,
em função de sua prodigiosa faculdade de reprodução (...)” e o cão, embora com simbologia
antagônica, ser tido como “psicopombo”, é tido pela cultura popular como o amigo fiel. O
elemento fogo, foi representado com maior incidência como fogueira, com o papel de
utilidade e simbolizando utilidade e sentimentos.
Com base nas incidências das representações das imagens, função/papel e
simbolismos encontram-se a presença de um universo mítico místico com impureza (de
heroísmo). A população envolvida nesta pequena pesquisa na UNATI/UCB, demonstra a
vontade de ter proteção, segurança, aconchego, de fazer novos amigos, de interagir com o
outro. Poderão lutar, mas se necessário for, pois no momento, o que é prezado é um ambiente
de calma e de traquilidade.
193

Parte IV: Pegadas que ficaram na areia - As pistas culturanalíticas


“Todos os dias quando acordo,
Não tenho mais o tempo que passou
Mas tenho muito tempo:
Temos todo o tempo do mundo”
Renato Russo

Em uma caminhada há sempre a possibilidade das marcas dos pés e rodas serem
deixadas, gravadas, fortes ou suaves no caminho percorrido. No caminho seguido nesta
pesquisa, sedimentada nas teorias adotadas e na experiência vivida, vislumbram-se as pegadas
dos seus transeuntes, o seu imaginário. Rastros delicados deixados, na suavidade decorrente
da característica dos não corriqueiros instrumentos/veículos usados na trajetória – o AT-9 e a
escuta -, bem como do nível – mestrado – onde se inclui esta dissertação. Mas brechas
ficaram abertas para futuros aprofundamentos do estudo, em outros níveis.

Capítulo 7 - (In)Conclusão
“Não é preciso consenso (...)
Nem beleza ou idade: (...)
A vida pode florescer
Numa existência inteira.
Mas tem de ser buscada, tem de ser
Conquisatada.”
Lya Luft

Ao final desta dissertação ratificamos que a educação transcende aos espaços das
salas de aula e que é um conceito mais amplo e mais abrangente que o ensino. Significa um
processo contínuo de aprendizagem, um “aprender a aprender”44 (DELORS, 2003, p. 101)
que não termina com os níveis, etapas e graus de ensino previsto no Sistema Educacional de
Ensino; que não termina na adolescência ou na idade madura, é um eterno “vir-a-ser” (Freire,
1989, p. 51); que cada fase pode e deve ser vivida na intensidade do constante aprender como
diz Lahud Loureiro (Sessão de orientação, 2005).

Envelhecer já não é um privilégio de poucos. A população local, regional, nacional,


mundial está envelhecendo e esta é uma conquista.

44
Segundo o Relatório da UNESCO - Educação um tesouro a desconrir (...), 2003 -, a educação deve estar
alicerçada em 4 pilares, Aprender a conhecer – aprender a aprender -, aprender a fazer, aprender a viver juntos -
conviver - e aprender a ser.
194

Podemos perceber como o olhar sobre a velhice, em suas múltiplas dimensões, vem
se ampliando e a dimensão educacional não pode ficar de fora; ela vem se alterando e se
expandindo no tempo e no espaço, com prenúncios de consideração à longevidade entendendo
a necessidade das novas gerações de começarem a entender a velhice, o processo de
envelhecimento e a consideração não preconceituosa do idoso bem como oferecer
possibilidade de educação continuada aos mais velhos.

O ser humano velho, como todo ser humano, e em qualquer idade, sonha, imagina, se
conflitua, prevê conquistas que ainda poderão ser obtidas, deseja, ama, lembra, relembra suas
histórias. Histórias de alegria, de amor, medo, de espera, de prazer, de indiferença, histórias
que explodem no peito de dor, de felicidade, de esperança, de inquietação, de saudade... .
Histórias contidas em cada ruga, como diz Lahud Loureiro (1999, p. 82), histórias que ainda
podem levar o idoso a querer construir, querer viver, querer renovar-se. Daí o papel e a
importância da existência das UnATI’s.

Nesta pesquisa nos referimos especialmente à UnATI/UCB, considerando e


acreditando que ainda existe tempo e vida para construir e usufruir; tempo e vida para
aprender, para ensinar, para ensinar-aprender; buscar, resgatar, se encontrar; buscar, resgatar
construir a auto-estima, a cidadania.

A UnATI/UCB, com suas diversas atividades, proporciona ao velho a oportunidade


de continuar a desenvolver, em seu ritmo e capacidade, agora talvez mais lentos e menos
visíveis, o seu pensamento analítico e abstrato, a flexibilidade física e de raciocínio para
entender e agir na administração de situações novas; compreender/entender as complexidades
existentes na sociedade, propugnar pela manutenção ou recuperação, dar independência e
continuar participando em tomadas de decisão. Convém lembrar que na sua ação, a
UNATI/UCB trata com idosos autônomos.

A Universidade Católica de Brasília, por sua UnATI, investe no campo da Educação


Continuada, consolida o compromisso social e político da UCB com a sociedade e cumpre sua
missão de “atuar solidária e efetivamente para o desenvolvimento da pessoa humana e da
sociedade (...)”

Podemos constatar “in loco” que, dentre as múltiplas atividades oferecidas na


UnATI/UCB, o aluno-idoso tem demonstrado preferência pela hidroginástica e natação.

O idoso gosta de ficar dentro d’água, remetendo a possibilidade desejada por ele de
um retorno ao saudoso e já distante útero materno, o que remete ao místico, ao aconchego, ao
195

ato/situação de estar dentro. Percebe-se desde aqui que o seu imaginário se encaminha para
uma estrutura mística45, pois eles dizem procurar uma “renovação da vida”46, “tirar o
pijama”47 e vir para a UnATI, mas não lutam e sim aceitam as “ofertas” da UNATI/UCB,
pode também estar representando o medo da queda – catamorfia48 – daí procurarem o
fortalecimento de seus ossos e musculatura, dentro da água evitando traumatismos, o que
demonstra um indício de impureza heróica49 num universo mítico místico.

Da análise de cada protocolo, com a conseqüente identificação da estrutura do


imaginário contido em cada micro-universo mítico, chegamos à identificação/caracterização
durandiana do universo mítico do grupo.

Segundo Oliveira Filho (2001, p. 174)

“(...) as respostas arquetipicas, as imagens colhidas nos protocolos do teste


AT-9 são as matrizes do imaginário deste grupo. Surgidas no trajeto antropológico
– entre as “pulsões subjetivas e assimiladoras’(...) seus sonhos, suas vontades e
desejos e “as intimações” do ambiente objetivo – elas fornecem pistas para a
compreensão profunda do seu modo de sentir, pensar e agir – visão do mundo – e
seus reflexos na organização.”
São, portanto, estas pistas que deixamos explicitadas para a adoção, na re-
organização da UnATI/UCB, se requerida pelo grupo.

Da análise dos protocolos do teste desta pesquisa, resulta a presença de micro-


universos míticos diferentes expressando individualidade e complexidade emergida em cada
protocolo. James Hilmam diz que “a individualidade da pessoa torna-se um caleidoscópio
mutável, cada um de nós nos tornamos mais único, instável e complexo (...) com o aumento
da idade há um aumento na variação entre os indivíduos” (2001, p. 215). Constatamos, nos
protocolos analisados, a presença de:

9 07 Micro-universos Míticos Místicos, (6 impuro e 1 super-místico);

9 04 Micro-universos Míticos Sintéticos, (03 DUEX Diacrônico e 01 Simbólico de


Forma Diacrônica); e

9 07 Micro-universos Míticos Não-Estruturados, (01 desestruturado verdadeiro –


com traços do heróico de forma negativa – e 06 pseudo-desestruturados – sendo
02 com traços místicos, 02 com traços heróico e 02 com traços sintético - ).

45
Ver capítulo 5, item 5.4., página 90-91.
46
Como dito por Gaia – protocolo nº 1.
47
Como dito por Calíope – protocolo nº 5.
48
Ver capítulo 5, item 5.1., página 74.
49
Ver capítulo 5, item 5.4., página 89-90.
196

Com isso podemos dizer tratar-se de um Universo Mítico Místico Impuro,


considerando as dicas míticas encontradas nos protocolos do teste.

Com base no histórico da UnATI/UCB, buscado na análise de documentos, na escuta


de ex-integrantes do Núcleo de Estudos e Prática sobre o Envelhecimento Humano – NEPEH
e do Núcleo de Vivência do Envelhecimento – NUVEN, e em reminiscências, expressas no
capítulo 3, item 3.3 desta dissertação, podemos afirmar que no período de sua criação, ela
apresentou um universo de luta, de desbravamento de barreiras impostas pelos monstros
preconceitos e esteriótipos. Esteve com a espada em riste, buscando os idosos fora dos Campi
da UCB e aconchegando-os na UnATI; mostrando para o idoso que era preciso lutar por
condições melhores, por igualdade social, por qualidade de vida. Tal heroísmo manteve-se
presente nos primórdios da organização da UnATI/UCB. Hoje a UnATI/UCB, demonstra,
ainda, pequenos indícios de heroísmo. Mostra um ambiente mais calmo, onde os idosos se
sentem mais a vontade como se estivessem em suas casas. Eles se sentem aconchegados,
fortalecidos e protegidos e em determinadas falas percebemos até o sentimento de gratidão.
Para Chevalier a figura da casa significa “um símbolo feminino, com o sentido de refúgio, de
mãe, de proteção de seio maternal.” (2003, p. 197). Isto confirma a tendência ao universo
místico, no momento.

Yves Durand (1988, p. 138) considerou, à luz das suas pesquisas, que nas pessoas
mais velhas verifica-se a tendência de um imaginário com estruturação defeituosa ou mística
e, nos mais jovens, existe uma tendência maior ao universo heróico. Com esta consideração,
ele coloca em xeque a credibilidade da utilização do teste em pessoas idosas. Todavia Paula
Carvalho (apud LAHUD LOUREIRO, 2004 b, prefácio) escreve que com a aplicação do AT-
9 nas pesquisas conduzidas e orientadas por Lahud Loureiro, em grupos de idosos, tal
hipótese foi eliminada e reconsiderada pelo próprio Y. Durand. As pesquisas de Lahud
Loureiro possibilitaram que outros pesquisadores, valendo-se do AT-9, comprovassem a
validade do teste nesta fase da vida. No capítulo 5, item 5.4, explicitamos, com Yves Durand
(1988, p. 138-140) os fatores de diferenciação. Entre eles, anotamos, ao lado da idade e do
sexo, o nível mental e o contexto sóciocultural, considerados e a considerar nas pesquisas com
a utilização do AT-9, com idosos, a influenciar nos resultados das pesquisas.

Nesta pesquisa constatamos a ausência da estrutura heróica do imaginário, no grupo e


a presença marcante da estrutura mística, e de acordo com Yves Durand, a não-estruturação
do imaginário. Mas há que se considerar, no caso da presença do micro-universo mítico
místico, que os alunos freqüentam oficinas (ofertadas) e os que freqüentam cursos de
197

graduação não o fazem para adquirir um diploma ou para obterem ascensão profissional, mas
por prazer interior, o que confirma o imaginário da antifrasia.

Como constatamos nesta pesquisa, assim como Yves Durand encontrou em suas
pesquisas, são 07 os micro-universos míticos místicos ao lado de outros 07 protocolos onde se
evidenciam a não-estruturação. Somente 04 protocolos registram a estrutura sintética do
imaginário (nº 2, realizado por Hefesto; nº 9, realizado por Cronos; nº 12, realizado por
Hemera; e nº 13, realizado por Hélio).

As estruturas místicas e não-estruturadas se apresentam em igual medida. Porém, 2


(dois) dos protocolos não estruturados apresentam uma tendência ao místico (nº 8, realizado
por Morfeu e nº 10, realizado por Hebe).

Refletindo sobre a consideração apresentada por Yves Durand sobre a idade, como
fator de diferenciação e até de não validade na utilização do AT-9 entre idosos, com Lahud
Loureiro (2005, sessão de orientação) acreditamos tratar-se mais da influência do contexto
social e situação econômica, tal diferenciação, e não da idade.

Nesta pesquisa, os alunos-idosos – participantes situam-se numa faixa etária de 60 a


74 anos e possuem diferentes graus de instrução – de nível superior a EJA (alfabetizando)50 -.
Nela constatamos que os micro-universos da não-estruturação - desestruturados ou pseudo-
desestruturados - são de idosos, em sua maioria, ainda na velhice verde51, seus sujeitos-
autores tem graus diferenciados de instrução, mas todos possuem baixa renda. São eles:
Apolo, protocolo nº 3 (60 anos, sexo feminino, nível superior, pseudo-desestruturado); Édipo,
protocolo nº 4 (69 anos, sexo masculino, nível Fundamental, pseudo-desestruturado);
Morfeu, protocolo nº 8 (63 anos, sexo feminino, nível médio – científico-, pseudo-
desestruturado); Hebe, protocolo nº 10 (69 anos, sexo feminino, nível médio, pseudo-
desestruturado); Aglaia, protocolo nº 16 (72 anos, sexo feminino, nível Fundamental – EJA,
1º segmento, 3º semestre -, pseudo-desestruturado); Láquesis, protocolo nº 17 (62 anos, sexo
masculino, nível Fundamental – EJA, 1º segmento, 1º semestre -, desestruturado); e Pandora,
protocolo nº 18 (61 anos, sexo feminino, nível Fundamental – EJA, 1º segmento, 2º semestre-,
pseudo-desestruturado). Ressaltamos que 3 (três) destes sujeitos-autores, fora da UnATI,
estão num processo contínuo de alfabetização, frequentando a Educação de Jovens e Adultos,
no período noturno ou vespertino, sem interrupção de semestres. São eles: Aglaia, que
freqüenta o curso a 10 semestres; Láquesis, que freqüenta o curso a 04 semestres; e Pandora

50
Ver quadro com identificação de sexo, idade e grau de instrução, no capitulo 4 desta dissertação.
51
Ver capítulo 1, item 1.1.1 – a velhice, que discorre sobre a divisão das etapas da velhice.
198

que freqüenta o curso a 06 semestres. Estes três assumem que possuem dificuldades de
aprendizagem, mas, de acordo com palavras de Pandora, “não vou para a escola para
aprender, pois tenho problemas de cabeça, vou para disparecer a cabeça das coisas do dia-
a-dia (...) quero mais é estar no meio do povo rindo, brincando, e me divertindo (...)”.
Embora Pandora diga que não vai para a escola para aprender, percebemos em sua fala e no
seu protocolo que é uma pessoa crítica e participativa. Ela desenha o personagem da sua
história imaginada como uma cabeça (protocolo nº 18).

Convém anotar que nesta pesquisa na UnATI/UCB os 7 sujeitos com estrutura


defeituosa – não-estruturado verdadeiro e pseudo-desestruturado – apresentam-se com
formação diversificada quanto ao nível de instrução: 1 possui nível superior (5,55%), 2
possuem nível médio (11,11%) e 4 possuem nível fundamental (22,22%). Numa análise
geral – com todos os 18 protocolos do teste – temos: 2 com pós-graduação (11,11%), 4 com
nível superior (22,22%), 6 com nível médio (33,33%) e 6 com nível fundamental (33,33%);
quer dizer, o nível imintelectual não foi aqui fatror de diferenciação no imaqginário
emergente.

O fator sexo também não condicionou diferenciação nos resultados do teste. Dos 18
(dezoito) protocolos – utilizados em alunos-idosos e dirigentes -, apenas 2 (dois) são do sexo
masculino e os 02 (dois) apresentam a não-estruturação (100%), mas 5 (cinco) dos demais
protocolos, realizados por mulhres, também apresentam desestrutura (31,25%).

Anotamos, ainda, que os idosos da UNATI/UCB possuem uma baixa situação sócio-
econômica, pois um dos quesitos para freqüentar a UNATI/UCB é a comprovação de
carência.52

Registramos aqui, que os idosos que freqüentam a UnATI/UCB, apesar de alguns


terem ncessidade de acompanhamento médico, são considerados saudáveis e autônomos; não
estão hospitalizados, se locomovem com independência e não estão impedidos de freqüentar
as aulas/oficinas.

Nos protocolos da pesquisa a complexidade está expressa em cada um deles. Os


alunos-idosos da UNATI/UCB, como qualquer ser humano, temem a morte; mas na maioria
fogem, ignoram, ou convivem com ela. “A angústia do passar do tempo e do medo da morte”
é o grande monstro, por muitos eufemizado – daí a estrutura mísitca -. No protocolo nº 1,
realizado por Gaia, no meio de várias situações difíceis, talvez por presenciar em seu trabalho

52
Para verificar o grau de carência é realizado um cáculo da renda per-capita familiar.
199

administrativo na UNATI/UCB alguns idosos com desesperança, ela dribla a morte achando
uma saída, um refúgio: “um lindo vale, cheio de pássaros”, o que caracteriza seu imaginário
com estrutura Mística Impura. O protocolo nº 2, realizado por Hefesto, após espantar o
monstro - ameaças, dificuldades no trabalho -, descansa ao lado de sua família protegida;
“(...) é o retorno a uma vida pacifica, após o combate (...)” (DURAND, Y., 1988, p. 102); o
imaginário deste sujeito-autor se apresenta como um Duplo Universo Mítico Sintético
Existencial do tipo Diacrônico. No protocolo nº 3, realizado por Apolo, aparece de forma
marcante a angústia, o medo da morte e percebe-se “fusões e confusões” como citado por
Hilman (2001, p. 109-110). Tais fusões, confusões e angústias influenciam no registro da
Não-Estruturação Mítica, do tipo Pseudo-desestruturado com tendência ao Sintético. O
protocolo nº 4, realizado por Ulisses, apresenta um Micro-Universo Mítico Místico Impuro.
Em toda a história percebemos a idéia do personagem em buscar a paz, o aconchego e a
tranqüilidade. Apesar da presença do monstro e da espada, o personagem não precisa lutar e
ambos os elementos esquizomorfos são apenas uma impureza de heroísmo, tendo em vista
que eles não são suficientes para determinar a presença da estrutura sintética. No protocolo
nº 5, o monstro também não precisa ser enfrentado e a espada fica desfuncionalizada,
podendo ser usada por Calíope – sujeito-autor -, se necessário, o que determina a impureza
contida no Micro-Universo Mítico Místico do protocolo. O sujeito-autor que denominamos
ficticiamente por Calíope é uma poetiza que não perde a oportunidade de falar do amor
fraternal, da paixão, da família. No protocolo nº 6, realizado por Édipo, emergiu um Micro-
Universo Mítico “Defeituoso”, do tipo Pseudo-desestruturado. Os desenhos foram
pictografados soltos e a história tenta buscar coerência. Existem “fiapos” de coerência mítica
que se expressam na tendência à síntese sincrônica do discurso, quando o sujeito-autor, no
momento em que come, místicamente, uma maçã, imagina heróicamente uma luta: “a luta
pela sobrevivência”. O protocolo de Aretusa, nº 7, apresenta um garoto que tenta espantar o
monstro, mas ao falhar, refugia-se, protegendo-se dentro do casebre. A tentativa de afugentar
o monstro não é o suficiente para caracterizar um micro universo sintético, trata-se de um
Micro-Universo Mítico Místico Impuro. No protocolo nº 8, Morfeu, apresenta uma
pictografia explodida, sem conexão, o que remete a uma da Não-Estruturação, tipo Pseudo-
desestruturado; apresenta cada “elemento desenhado separadamente (...) não exprimindo
cenário algum, nenhum agrupamento de elementos” (DURAND, Y., op.cit., p. 132), mas sua
narrativa tenta dar coerência mítica aos desenhos, formando uma história estruturada. Morfeu
não enfrenta o monstro: as situações difíceis do dia-a dia e foge. Apesar de apresentar um
Micro-Universo Mítico Pseudo-desestruturado, nele existe a presença de uma forte tendência
200

Mística. O protocolo nº 9, realizado por Cronos, conta a história de um militar que queria
progredir, mas teve uma queda e com sua espada e seu relógio transformou-se num monstro
devorante. Buscou refúgio numa roda, no cíclico, que simboliza a mudança, no caso a
mudança para o sucesso na carreira. O Micro-Universo Mítico emergido foi o Sintético
Simbólico de Forma Diacrônica. O protocolo nº 10, identificado ficticiamente pelo nome de
Hebe, apresenta o Micro-Universo Mítico da Não-Estruturação, do tipo Pseudo-
desestruturado com tendência no Místico Lúdico, pois apesar de apresentar os desenhos de
forma solta, sem conexão entre eles e denominando cada figura apresentada, possui uma
narrativa com certa coerência, relatando brincadeiras de criança. O sujeito-autor eufemiza o
monstro na brincadeira, ou seja, sugere a ação heróica e até a existência de um combate, com
um jogo de espadas, mas não passa de uma brincadeira. No protocolo nº 11, realizado por
Métis, observamos a presença do Micro-Universo Mítico Místico, do tipo Super Místico, pois
aqui o estímulo arquetipico espada falha e o monstro não ataca. O personagem está vivendo
no seu refúgio, longe do monstro: “a violência da cidade”. No protocolo nº 12, realizado por
Hemera, verificamos que o personagem ao mesmo tempo em que está num local, praticando
uma determinada ação, imagina outra ação, onde ele também está presente. Trata-se da
presença de um Micro-Universo Mítico Sintético do tipo Duplo Universo Existencial
Sincrônico, pois o personagem vive 2 momentos ao mesmo tempo: “vive num universo
existencial místico e se vê (...) em um combate” (ibidem, p. 104). O protocolo realizado por
Hélio, nº 13, apresenta um Micro-Universo Mítico Sintético do tipo Duplo Universo
Existencial Diacrônico, pois após a iniciativa de enfrentar o monstro, foge e se esconde na
casa. O combate com o monstro – a morte – não é necessário, pois ao acaso, o pássaro que
aparece, tira a atenção do monstro que acaba sendo vencido. O protocolo nº 14, Ártemis, não
enfrenta o monstro e vai com 2 meninas para a margem de um rio. Deixa emergir um Micro-
Universo Mítico Místico, do tipo Impuro, pois a espada não está com o personagem, o
monstro não ataca e não existe luta. O susto é para as crianças e não para o personagem. O
protocolo nº 15, realizado por Destino, nome fictício do sujeito-autor, apresenta um
personagem que foge do monstro, pois o considera mais forte. Com 74 anos foge do monstro
- morte - e encontra um pé de laranjeira onde “suas sementes brotaram, nasceram mais pés de
laranjas”; o tempo está muito presente com a idéia do cíclico, da renovação da vida, onde as
sementes darão novas árvores e novos frutos e transforma a vida numa “gostosura”. Seu
imaginário foi caracterizado como Místico Impuro, pois no início da história existem indícios
de heroísmo. O protocolo nº 16, realizado por Aglaia, apresenta o imaginário da Não-
Estruturação, do tipo Pseudo-desestruturado. Na persistência de encontrar “fiapos” de
201

coerência para a história, encontramos uma tendência heróica. Embora o monstro - tartaruga -
simbolize bicho perigoso e medo para o sujeito–autor, este demonstra traços de heroísmo,
quando luta contra o pré-estabelecido. Aglaia com seus 72 anos busca ampliar seus
conhecimento freqüentando uma escola pública – EJA – todas as noites e a UNATI/UCB
durante algumas tardes. O protocolo nº 17, realizado por Láquesis, apresenta-se num
universo negativo. Em cada fato da história narrada, a negatividade, o monstro, está presente.
O único ponto onde traz resquícios de otimismo é quando responde a pergunta sobre como
acaba a cena imaginada e, condicionalmente, diz: “poderíamos terminar pedindo para a
Nação ter mais consciência um com o outro”. Existe a presença de um Micro-Universo
Mítico Heróico de forma Negativa, pois a morte sempre vence, porém maior é a presença da
Não-Estruturação Verdadeira, tendo em vista que os desenhos são apresentados de forma
explodida e a história é fragmentada, com frases soltas, de acordo com a ordem dos elementos
apresentados. Não existe ligação entre a dramatização dos elementos. O protocolo nº 18,
realizado por Pandora está caracterizado como o Micro-Universo Mítico da Não-
Estruturação, do tipo Pseudo-desestruturado. Na história pictografada os desenhos são
explodidos, apresentam-se sem ligação entre si. Na narrativa os males já estavam soltos, a
caixa de Pandora já havia sido aberta e nela ficado apenas a esperança; esperança de que o
Brasil possa melhorar. Embora haja uma desestrutura no micro-universo mítico do
sujeito-autor, com traços de negatividade, também aparece uma tendência heróica, pois no
questionário do teste, Pandora responde que “vamos conseguir a vitória, com a organização
do Brasil. Vamos acabar com a miséria, com as crianças jogadas nas ruas, mendigos, dragão
(inflação)” – desejo, pulsão interior -.

O grupo pesquisado na UnATI/UCB apresentou, mais idéias de vida do que de morte


(91 idéias de vida – 56,17% -, 56 idéias de morte – 34,57% - e 15 sem resposta – 9,26%),
conforme quadro 6.2.2 – dos simbolismos atribuídos a cada um dos nove elementos do teste -.
Isso demonstra a vontade de querer viver e de querer ainda participar dos processos sociais,
sejam eles de re ou inclusão dos papéis sociais, ensino-aprendizagem, ou qualquer outro, o
importante é estar inserido, é estar participando e ainda contribuindo com o que pode
oferecer, e este poder oferecer foi alforriado dos valores materiais e deram a vez a sabedoria,
experiência e vivências, o que remete mais uma vez a estrutura mística encontrada, com
laivos de heroísmo, o que caracteriza a impureza da estrutura mística.

Com a investigação e análise dos 18 protocolos apresentados, chegamos à constatação


do imaginário do grupo: Universo Mítico Místico, com Impureza de Heroísmo, o que nos
202

mostra que apesar da ação do monstro, do personagem e da função da espada, descritas nos
diversos protocolos, existe a idéia do aconchego, do descanso: Lutar só se for necessário, mas
enquanto não é preciso lutar, é bom ficar na paz e na tranqüilidade, mas sem perder a
esperança de um mundo melhor, de uma velhice respeitada, de uma velhice com voz e
cidadania, e acima de tudo, com qualidade de vida e com o desejo de ainda poder contribuir
para novas gerações, contribuir com a sociedade.

Lahud Loureiro considera que, na velhice,

“O poder dar e receber, na reciprocidade constante do viver, saudável e


digno; o ter esperança de ainda ser feliz, sem esquecer de fazer feliz, de ser ainda
um elo necessário na corrente do sorrir e do viver em paz consigo mesmo e com os
demais; o ser ainda produtor , mas produtor de felicidade, é o possível pretendido
para uma categoria etária de homens não mais jovens, mas ainda não mortos.”
(2000, p. 36)
A realização desta pesquisa, teve entre suas intenções, a de contribuir com a
UnATI/UCB no resgate do seu memorial, registrando a história ex-pós-facto; com o
desvendamento do imaginário do grupo pretendeu contribuir em sua continuidade e re-
organização (se requerida) com a consideração da dimensão simbólica aqui evidenciada,
significando o planejamento conjunto das atividades na consideração das realidades patente e
latente dos idosos. A elaboração/previsão das atividades com os dados imagético-simbólicos
aqui explicitados, acontecerá não com os idosos tratados como clientes e sim como seres
humanos idosos pertencentes, mais que participantes; quer dizer, atividades realizadas não
para os idosos, mas sim com os idosos, no diálogo que prestigia a voz do velho, aluno/parte
da instituição.

Ao levantar o imaginário dos alunos-idosos da UNATI/UCB fica evidente que a busca


pela completude do ser humano é infinita, independente de idade. Os idosos, tal qual qualquer
ser humano, independente de estar numa instituição de ensino, buscam seu aperfeiçoamento,
sua completude; cabe a educação organizada, favorecer esta busca.

O interesse é que a UNATI/UCB seja, não como um gueto a abarcar, através da


extensão, os idosos que a sociedade ainda marginaliza, mas seja também, um celeiro de
pesquisa. Hoje sabemos que alguns alunos de vários cursos de graduação já se interessaram
pelo tema do envelhecimento e escreveram Monografias e Trabalhos de Conclusão de Curso
(TCC) ligados ao tema, porém urge, ao lado da pesquisa acadêmica e sobre elas ações reais
com o pertencimento dos idosos da UnATI/UCB.

Uma vez que o imaginário tem potência organizativa, a UNATI/UCB, no exercício da


sua função de pesquisa e com profundo entendimento das possibilidades contidas no seu
203

imaginário, poderá re-organizar-se com as pegadas aqui deixadas no sentido de


conjuntamente e sempre, com o grupo realizar a organizacionalidade antropolítica53,
reconhecendo a importância de escutar, tomar conhecimento das reais necessidades, desejos e
aspirações do grupo de idosos pertencentes à ela.

Como educadora, agora gerontóloga, não podemos nos furtar de apresentar, algumas
sugestões neste final de dissertação, após os dados obtidos sobre imaginário da população da
UNATI/UCB e sobre a organização da própria UnATI.

Nas diversas UnATI’s do Brasil, que foram documentalmente pesquisadas para


embasar esta dissertação, verificamos que elas têm uma estrutura de acordo com qualquer
universidade, já que abarca o ensino, a pesquisa e a extensão. As UnATI’s, por sua variedade
e complexidade de atividades, não podem ser apenas um projeto, como o é na UnATI/UCB
elas são muito mais que isso: são programas ou diretorias, que além de um grupo maior de
professores atuantes, grande parte delas possui um diretor e um vice-diretor ou assessor. Fica
o alerta desta realidade a UNATI/UCB.

A UNATI/UCB, realiza um trabalho sóciocultural com os idosos. Pelo visto numa


comparação entre as IES, a UCB é uma das instituições brasileiras que mais investe na área
do envelhecimento - haja visto este mestrado em gerontologia, um dos apenas 4 (quatro) do
país -, mostra que seu trabalho está embasado na mesma linha que a de Toulusse-França. Falta
a ela se organizar e divulgar o trabalho que realiza, para a concretização do desejado
diferencial e mostrar reconhecimento nacional, conforme pretendido em sua Visão de Futuro.

Como descrito no início desta dissertação, a população idosa cresce aceleradamente


sem que a sociedade esteja preparada para esse crescimento. Seria interesssante introduzir nos
cursos de licenciatura disciplina(s) voltadas(s) pra a área do envelhecimento, como Introdução
à Gerontologia, de maneira a ter gerontólogos, preparando profissionais das diversas áreas do
saber e professores para o futuro, para disseminar na educação básica a consideração com o
velho, o desmanche de preconceitos solidificados ao longo dos anos, e para atender ao
estabelecido no Capítulo V da Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003 – Da educação,
cultura, esporte e lazer, artigo 2254 - É preciso considerar o jovem pois ele é o futuro da

53
Ver Introdução, página 19 desta dissertação.
54
Art. 22 - Nos currículos mínimos dos diversos níveis de ensino formal serão inseridos conteúdos voltados ao
processo de envelhimento, ao respeito e à valorização do idoso, de forma a eliminar o preconceito e a produzir
con conhecimento sobre a matéria. (Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003, Capítulo V – Da educação, cultura,
esporte e lazer).
204

Nação, mas é necessário, também, considerar o velho, que ainda pode ser produtivo com
qualidade de vida, de trabalho e experiência. Como escreve Lahud Loureiro o velho pode
ainda ser um produtor, mas um produtor de felicidade. (1994, p. 75).

Em conclusão, ainda uma vez com Gilbert Durand (2001, p. 138), lembramos que
todo este trabalho de classificação/identificação da estrutura imaginária do grupo, não
representa o mais importante para o autor, o que importa “é a maneira de carregar
universalmente (...) com um sentido segundo, como um sentido que seria a coisa do mundo
mais universalmente partilhada (...)”.
205

Parte V: Bibliografia

1 – Referências Bibliográficas

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_______ . Proposta de fusão dos 2 projetos Fênix/Geração de Ouro, na forma de


Universidade Aberta à Teraceira Idade – UnATI/UCB. Brasília. Programa de Educação
Continuada/Diretoria de Programas de Extensão/Universidade Católica de Brasília-UCB
(Documento Interno). Anexos Projeto Fenix e Projeto Geração de Ouro. Brasília/DF. 2004 a.
211

_______ . Manual para apresentação de monografias, dissertações e teses da Universidade


Católica de Brasília. Organizadora Leila Baros Cardoso Oliveira. Editora Universa. 2ª Edição
revisada. Brasília. 2004 b.

VERAS, Renato Peixoto. País jovem com cabelos brancos: A saúde do idoso no Brasil. Rio
de Janeiro. Editora Relume-Dumará. 1994.

_______ e CALDAS, Célia Pereira. UnATI-UERJ – 10 anos: um modelo de cuidado integral


para a população que envelhece. Rio de Janeiro. Editora: UERJ/U
UnATI. 2004.

2 – Bibliografia Complementar

ALENCAR, Raimunda Silva d’. Ensinar a viver, ensinar a envelhecer: desafios para a
educação de idosos. Revista: Estudos interdisciplinares sobre o envelhecimento. Universidade
Federal do rio Grande do sul. Vol. 4. Jan/2002.

BALTES, M; SILVERGERG, S. A dinâmica da dependência – autonomia no curso de vida.


In A. L. Neri (org.). Psicologia do envelhecimento. Editora Papirus. Campinas - SP. 1995.
(p. 73-110).

BEAUVOIR, Simone de. - A velhice. Tradução: Maria Helena Franco Monteiro. Rio de
Janeiro. Editora Nova Fronteira. 1990.

DINIZ, Elvécio. Os conflitos entre o direito e os efeitos da senectude sobre o espírito


humano. Artigo impresso pela gráfica da Universidade Católica de Brasília-UCB.
Brasília/DF. 2003.

FREIRE. Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. São


Paulo. Editora Paz e Terra. 1996.

FREITAS, Elizabete Viana de. et.al. Tratado de Gerontologia e Geriatria. Rio de Janeiro.
Editora Guanabara Koogan S.A. 2002.

MINISTÉRIO PÚBLICO DO DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIOS – Promotoria de


Justiça de Defesa do Idoso e do Portador de Deficiência. Cartilha do Idoso. Brasília/DF.

NERI, Anita Liberalesso. Envelhecer num país de jovens: significados de velho e velhice
segundo brasileiros não idosos. São Paulo. Editora da Unicamp. 1991.
212

_______ e YASSUDA, Mônica Sanches (orgs). CACHIONI, Meire, (colab.). Velhice bem-
sucedida– aspectos afetivos e cognitivos. São Paulo. Editora Papirus. Coleção Vivaidade.
2004.

NOVAES, Maria Helena. Psicologia da terceira idade: conquistas possíveis e rupturas


necessárias. 2ª Edição aumentada. Rio de Janeiro. Editora NAU. 2000.

OLIVEIRA, Rita de Cássia da Silva. Velhice: teorias, conceitos e preconceitos. Revista A


Terceira Idade. Volume 13. Nº 25. Agosto/2002. p. 37-50.

ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Plano de ação internacional para o


Envelhecimento. Organização das Nações Unidas. Tradução: Arlene Santos. Brasília/DF.
Secretaria dos Direitos Humanos. Série Institucional em Direitos Humanos. Vol. 1. 2003.

SILVA, Terezinha Maria Nelli. A construção de uma pedagogia para o idoso. Revista A
Terceira Idade. Volume 13. Nº 25. Agosto /2002, p. 63-73.

3 – Observações

Algumas informações sobre as UnATI’s e programas similares foram obtidas em


diversos site’s de Instituições de Ensino Superior disponibilizadas na Internet.

Na pesquisa, foram consultadas aproximadamente 47 IES brasileiras e procurou-se


verificar a realidade atual.

Excluído: ¶
213

Anexos
214

Anexo 01

Missão da UCB
A Universidade Católica de Brasília
tem como missão
atuar solidária e efetivamente
para o desenvolvimento integral da pessoa
humana e da sociedade,
por meio da geração e comunhão do saber,
comprometida com a qualidade
e os valores éticos e cristãos,
na busca da verdade.

Visão de Futuro da UCB


Ser reconhecida nacionalmente
pela qualidade do seu ensino,
pela relevância de sua pesquisa
e pela efetividade de sua extensão,
formando cidadãos de acordo
com os princípios humanísticos
e cristãos.
215

Anexo 02

Organograma da DPE/PROEx/UCB,
ano 2004/2005
Pró-Reitoria de Extensão / Diretoria de Programas de Extensão / Educação Continuada

UCB

PROEX

Excluído: ¶
DIRETORIA DE PROGRAMAS
DE EXTENSÃO – DPE

Comunidade Empreendedorismo Cidadania e Direitos Ação Solidária


Educativa Social EDUCAÇÃO Humanos
CONTINUADA

UNATI

Programa Stricto Sensu Programa Stricto Sensu


FENIX GERAÇÃO DE
em Gerontologia em Educação Física
OURO
216

Anexo 03

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Por meio deste termo, eu ______________________________________________,


concordo em participar como voluntário da pesquisa O imaginário subjacente à
criação/organização, no desenvolvimento atual e prospectiva de continuidade da
UnATI/UCB.
Estou ciente de que participarei do Arquétipo Teste dos 9 elementos - AT9, teste
projetivo elaborado por Yves Durand, criado com base na Teoria do Imaginário de Gilbert
Durand, que tem por objetivo levantar as imagens individuais e/ou do grupo da UnATI e que
para sua realização é necessário compor um desenho, uma narrativa (relacionada ao desenho),
um quadro síntese das representações de cada um dos 9 elementos e um pequeno questionário
que ajudará a identificar/elucidar os simbolismos dos elementos desenhados.
Estou ciente, também, que poderão ser feitas perguntas que visem estabelecer um
diálogo sobre a questão do fenômeno da velhice e do processo de envelhecimento.
Fatos históricos sobre a UnATI/UCB, poderão ser resgatados na memória dos
envolvidos nesta pesquisa, contudo, os dados colhidos serão utilizados apenas como
elucidativos de um passado histórico no qual estiveram presentes.
A intenção com a escuta deverá ser de uma análise crítica construtiva, uma vez que
temos como objeto a construção da UnATI/UCB, se requerida.
É de meu conhecimento que os protocolos do teste e alguns comentários colhidos
subsidiarão a Dissertação de Mestrado da aluna Maria da conceição Batista da Silva, discente
do mestrado em Gerontologia da UCB, e que poderão ser divulgados nos meios científicos,
preservando minha identidade e submetidas às normas do sigilo profissional.
Estou ciente de que não corro riscos em relação a minha saúde em participar desta
pesquisa, e mesmo que haja qualquer possibilidade de riscos, com o reavivamento de
memórias e/ou fatos desagradáveis, a pesquisadora estará disposta a prestar todo o apoio
cabível; e a qualquer momento poderei retirar o meu consentimento, sem qualquer prejuízo à
minha participação.
Estou ciente de que a qualquer momento posso perguntar sobre qualquer assunto
relativo a esta pesquisa e que terei sempre solucionadas as minhas dúvidas.

Taguatinga – DF, ________ de _________ de 200___. Excluído: Termo de


Consentimento Livre e Esclarecido ¶

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