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HISTÓRIAS FLUMINENSES

UM BAILE NA FAZENDA SÃO BERNARDINO


EM IGUASSÚ
GUILHERME PERES

CASA DA FAZENDA SÃO BERNARDINO - ÓLEO SOBRE TELA: GUILHERME PERES

Construído por Bernardino José de Souza e Mello, casado com


Cipriana Maria Soares e Mello, filha de Francisco José Soares, português,
patriarca de numerosa família de iguaçuanos, destacou-se com seu prestígio
no panorama político e social da Vila de Iguassú, sendo eleito presidente da
Câmara Municipal, durante cinco legislaturas a partir de 1837.
Em 1848, D. Pedro II fez uma visita a essa Vila, tendo "condigna
acolhida" na residência do então tenente Francisco José Soares, ocasião em
que o Imperador fez um donativo de "um conto de réis, para as obras do
chafariz".
Bernardino, que sucedeu seu sogro nos negócios, demonstrou grande
operosidade no comércio do café, e ampliou o patrimônio, construindo vários
trapiches no porto, com a firma Soares & Mello.
O Porto dos Saveiros, localizado na parte mais larga do Rio Iguaçu,
permitia embarcações de até 40 toneladas, e concentrava o maior número de
tropas de muares, que desciam a Estrada do Comércio, atravessando a Serra
do Mar.
A história da Fazenda São Bernardino começa em 1862, quando
Bernardino José de Souza e Mello adquire o sitio Bananal, “com benfeitorias e
onze escravos”, anexado mais tarde ao "Sítio do Cachimbau, então

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propriedade de Francisco José Soares, sogro de Bernardino, anteriormente
também comprado por ele por três contos de réis".
Iniciada pouco depois dessa anexação, e terminada em 1875, a
construção desse palacete foi efetuada sobre uma elevação, estendendo-se à
sua frente, em nível inferior, uma alameda de palmeiras imperiais até uma
parada da estrada de ferro com a denominação de São Bernardino.
Na entrada, uma escada dupla, protegida por gradil, era coberta por um
pálio em folha de cobre e estrutura metálica. No beiral, as telhas de louça azul
portuguesas complementavam o visual.
As janelas, divididas em duas partes, mostravam-se ornamentadas com
um rico desenho de vidraçaria colorida com flores de lótus. “À direita do
compartimento”, diz o prof. Ney Alberto de Barros, “ficava o grande salão de
música”. A capela interna da São Bernardino ficava à esquerda, vizinha à "sala
dos cachimbos". Ainda neste primeiro conjunto ficava a "alcova imperial" com
enorme cama de metal, para a estadia de hóspedes ilustres.

VISITA DO CONDE D´EU À IGUASSÚ, PUBLICADA NO


“NOVO E COMPLETO ÍNDICE CRONOLÓGICO DA HISTÓRIA DO
BRASIL” 1877.

VISITA DO CONDE d`EU


Luís Filipe Maria Fernando Gastão, o conde d'Eu, era neto do rei Luís
Filipe I da França, tendo renunciado aos seus direitos à linha de sucessão ao
trono francês em 1864, quando do seu casamento com a última princesa
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imperial do Brasil, D. Isabel Cristina Leopoldina de Bragança, filha do
último imperador do Brasil, Dom Pedro II.
Em junho de 1877, o “Índice Chronológico da História do Brasil”,
publicou uma referência sobre a visita do conde d´Eu, esposo da princesa
Isabel, feita à fazenda São Bernardino: ao saltar na estação de Machambomba,
vindo pela Estrada de Ferro D. Pedro II, “partiu para a fazenda de S.
Bernardino, propriedade do comendador Bernardino de Mello, acompanhado
de grande número de pessoas. Depois de almoçar seguiu para Iguassú, e ali
visitou as escolas, a Câmara Municipal e a Igreja, regressando para a fazenda
onde foi servido um jantar.

O BAILE

À noite, feericamente iluminada com as luzes dos lampiões, a São


Bernardino conheceu seus dias de glória. O conde deslumbrou-se com a
chegada de liteiras trazendo famílias abastadas da região, que ainda
saboreavam a riqueza do café. Uma banda alemã especialmente contratada, fez
com que muitos convidados rodopiassem no amplo salão ao som das valsas
vienenses e modinhas brasileiras. Os serviçais se atropelavam entre damas de
vestidos longos e leques rendados, ao servirem as taças de vinho francês, em
homenagem ao conde, que ali pernoitou.
“No dia 6 seguiu para afazenda do Tinguá, propriedade do capitão Pinto
Duarte” onde jantou, e depois de assistir um sarau, recolheu-se aos aposentos
até o outro dia. Na manhã do dia 7 seguiu pela Serra do Comércio em visita as
fazendas da região.

AGONIA DO VELHO SOLAR


O almanaque do “Correio da Manhã”, publicação anual oferecida aos
assinantes desse Jornal editado no Rio de Janeiro, publicou no ano de 1947
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um artigo sobre a sede da fazenda São Bernardino, assinado pelo jornalista
Cardoso de Miranda, em que este descreve sua visita feita naquele ano a essa
antiga mansão.
“A casa da Fazenda São Bernardino em Iguassú, que foi do comendador
José Bernardino Soares de Souza e Melo (sic), é um magnífico exemplar
arquitetônico desses palácios rurais, que a aristocracia do Império erigia e que
ainda hoje atestam melancolicamente, na grandeza de suas ruínas evocativas,
o fausto duma época que findou”.
Lamentando o falta de registros históricos desses palacetes construídos
durante o ciclo do café, Cardoso de Miranda afirma que: “os solares
fluminenses mereciam ter quem lhes recolhessem a crônica sentimental e o
ciclo econômico das terras circunvizinhas, estereotipado no apogeu e na
decadência dos latifúndios”.
Lastimando a decepção por esse rico patrimônio ter caído em mãos
especulativas, Miranda prossegue descrevendo que “O palácio da Fazenda de
São Bernardino está nas mãos de imigrantes, a cuja insensibilidade alienígena
não pode falar aquelas paredes. Devera ter possuído esse paço rural na época
remota de seu fastígio, um grande requinte europeu de conforto”.
Vemos em seguida que o autor ainda presenciou a fonte de mármore do
pátio interno do solar, e promessas “pagas” no oratório oferecido por moças
casadoiras em agradecimento ao padroeiro:
“O estuque dos tetos, os três lances da escadaria interna, coroada por
uma cúpula graciosa, o pátio, onde há cem anos a água canta na fonte de
mármore, os móveis vetustos (a que o longo uso deu quase uma expressão
humana, como diria Eça), a decoração das salas, a capela, onde a imagem do
orago tem aos seus pés duas coroas de noivas, emurchecidas pelo tempo e
pela saudade..., de tudo emana um aroma de guardados antigos em armários
de pau-santo. Tudo revela uma perspectiva suave do passado, no meio de tudo
divaga as belezas das coisas mortas”.
“Das sacadas se descortina um panorama de silencio, árvores e luz. Os
renques de palmeiras imperiais enchem o terreiro calçado de lajes e as
muralhas já se esmaltaram na patina do século”.
O cheiro de mofo desprendido das grossas cortinas de damasco que
descem até ao assoalho resguardando o silêncio, despertam saudades que
inspiram nosso visitante:
“Está isolada a casa sobre o planalto como imagino que deveriam ser
isoladas as casas assim, afastadas do contato exterior, orgulhosa de seus
pergaminhos, do seu aconchego fidalgo, ciosas de que não lhe macule os
sonhos, os romances, as crenças, e os princípios à incompreensão da turba”.
O escritor revela e existência em um dos salões, de um quadro pintado a
óleo de corpo inteiro do comendador Bernardino, “com o peito constelado de
veneras” tendo ao fundo o Paço Municipal.
Finaliza lastimando como um prenúncio de abandono, à que ficaram
entregue esses patrimônios: “Todas essas construções, porém, salvo
raríssimas exceções, estão relegadas ao abandono pelos seus proprietários.
Solares fluminenses, rude concepção heráldica de senhores rurais, cheios de
traços de inspiração portuguesa dos nossos antepassados”.
“Sonho de pedra que brotou do chão lavrado pelo esforço de muitas
gerações. Eles dizem em sua mudez, o que foi durante a riqueza do café: a
“velha Província”.

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FONTES BIBLIOGRÁFICAS;

BARROS, Ney Alberto Gonçalves de – “De Iguassú a Iguaçu” Apostila - 1993


FORTE, José Mattoso Maia – “Memória da Fundação de Iguassú”
Jornal do Comércio – 1933 – RJ
PEREIRA, Waldick – “A Mudança da Vila” Arsgráfica – 1970 – RJ
TEIXEIRA, José Luiz – “Apontamentos para a História de Nova Iguassú”
Revista “Patrimônio” – Fev. 2000.
“Novo e Completo Índice Chronológico da História do Brasil” - 1877 - RJ

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