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ISBN 978-85-8073-267-2

Kung Fu
A MILENAR ARTE MARCIAL CHINESA

Por José Augusto Maciel Torres


e Fábio Amador Bueno

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Coleção Artes Marciais • Kung Fu


Capítulo 1 - História e Filosofia 07

Editorial
O Templo Shaolin 11
Após a destruição do Templo Shaolin 21
A história do estilo Wing Chun 25

Sumário
O mestre Yip Man 28
Bruce Lee e o Kung Fu 30
Capítulo 2 - Os estilos de Kung Fu 31
O melhor estilo de Kung Fu 32
O Kati 32
Águia 33
Técnica do Bêbado 40
Louva-a-deus 54
Tai Chi Chuan 64
Tigre 73
Wing Chun 83

Capítulo 3 - O Kung Fu nos dias atuais 93


Agradecimentos 96
Dedicatória e Bibliografia 97
Sobre o autor 98

CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE
SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ
5
T645k

Torres, José Augusto Maciel


Kung Fu : a milenar arte marcial chinesa : águia, bêbado, louva-a-deus, tai chi chuan, tiggre,
wing chu / por José Augusto Maciel Torres e Fábio Amador Bueno. - São Paulo : On Line, 2011.
96p. : il. ; 21 cm (Artes marciais)

Inclui índice
ISBN 978-85-8073-267-2

1. Kung-fu. 2. Artes marciais. 3. Luta (Esporte). I. Bueno, Fábio Amador. II. Título. III. Série.

11-8610. CDD: 796.8159


CDU: 796.855

27.12.11 29.12.11 032295


Capítulo
História e Filosofia
1
O que é Kung Fu?

A
palavra é de origem chinesa e significa tempo de habilidade. Mas, no
ocidente, este termo passou a ser sinônimo de arte marcial chinesa. No
entanto, há uma sutileza importante. O termo Wu Shu é usado na China
para designar arte marcial e Kuo Shu significa arte marcial chinesa. A
principal diferença entre Wu Shu e Kuo Shu é que o primeiro se refere
às artes marciais de uma forma geral, independente de sua origem. Já
o segundo termo se refere às artes marciais de origem chinesa. A China
antiga é cheia de histórias nas quais as artes marciais estão presentes. Num passado de
imperadores tiranos, o povo era estimulado à guerra – fosse para auto-defesa, fosse para
proteger seus superiores. Apesar desse espírito guerreiro, o povo chinês vivia em plena
harmonia com a natureza. Uma das explicações para isso é que eles dependiam da agri-
cultura para sobreviver. Essa proximidade permitiu a criação de uma visão de mundo que
aproximava o homem do universo. Para eles, o homem é uma cópia em miniatura do
universo. É da harmonia entre o microcosmo (homem) e o macrocosmo (universo) que
se conseguiria uma saúde perfeita. A partir dessa filosofia é que surgem alguns conceitos
fundamentais para a compreensão das artes marciais.

Harmonia
Os chineses acreditam na existência de uma energia universal que chamam de “chi”.
No Japão, essa energia recebeu o nome de “ki”. A compreensão da existência dessa ener-
gia, e de como harmonizá-la com o universo, é a base de toda luta marcial originada no
Oriente. Acupuntura, tuinah, moxaterapia, chi kung e shiatsu são exemplos de terapias
orientais que se valem dessa idéia de harmonização do “chi”.
Mas como funciona essa energia vital? De acordo com a tradição oriental, “chi” flui
pelo corpo humano, percorrendo canais existentes chamados, no Ocidente, de meridia-
nos. Essas idéias permitiram aos chineses criar exercícios físicos e respiratórios baseados
nas suas observações da movimentação do “chi” por toda a natureza: tanto nos animais,
quanto nos seres humanos.
O Wu Chinsi, por exemplo, é um antigo sistema de exercícios criado pelo médico
e filósofo Hua To. Para tanto, ele se baseou nas observações dos movimentos de cinco
animais: veado, macaco, águia, urso e tigre. O objetivo desse conjunto de exercícios é a
harmonização da energia nos aspectos psicológico e biológico humanos.
Estilos
Há diversos estilos de lutas marciais surgidos na China. A tal ponto que, em cada lu-
gar do país, foram desenvolvidos sistemas particulares de Kung Fu. As variedades de estilos
se devem ao fato de que as aulas marciais na China antiga eram feitas de pai para filho.
Com o tempo, cada um adaptava o sistema marcial à própria realidade e à utilidade para
defesa pessoal. Em muitos casos, cada família fazia sua adaptação marcial e a ensinava
como correta acreditando que as demais eram falhas.
Na parte norte do país, predominava um maior uso das pernas nos estilos de luta. Já

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no sul, os braços eram privilegiados. É a isso que se refere um conhecido ditado chinês:
“pernas no norte e braços no sul”. Uma explicação para esse fato é que o norte chinês é
montanhoso. Isso teria permitido aos seus habitantes terem pernas fortes e ágeis, devido
às longas caminhadas nas montanhas. Já os habitantes do sul, que viviam nos pântanos
semeando arroz e faziam uso dos barcos para deslocamentos, desenvolveram braços for-
tes para possibilitar uma boa colheita. Apesar dos estilos marciais chineses ser divididos
geograficamente em norte e sul, ambos têm semelhança. É a visão filosófica segundo a
qual os princípios do Tao são acoplados ao Chi. Essa idéia geral é igual em toda a China,
apesar da sua grandeza geográfica.

Oito Imortais Bêbados


Nos primórdios da era Cristã, o Budismo tinha na China uma força política muito
grande, pois a maioria dos líderes budistas tinha cargos públicos de destaque, dados pelos
imperadores chineses. A religião de Buda, apesar de ter sido criada na Índia, era vista na
China antiga como um patamar para a salvação humana. Essa valorização do budismo
pelas autoridades criou ressentimentos nos taoístas (seguidores de Lao Tse) – uma reli-
gião de origem chinesa, ao contrário do budismo, que nasceu na Índia.
Infelizmente, para o Taoísmo, naquela época, a religião criada pelo chinês Lao Tse
não era considerada oficial. Tentando dar um novo status ao Taoísmo para conseguir po-
der político, os seus líderes começaram a criar semideuses para esta religião, objetivando
o seu fortalecimento aos olhos dos imperadores. Surgem, então, os semideuses taoístas
denominados de Imortais, com destaque para os “Oito Imortais Bêbados”, que depois
serviram como base para o estilo de Kung Fu, denominado de Chui Pa Hsien ou simples-
mente “estilo do Bêbado”.
Existe uma grande diferença entre os estilos marciais chineses internos e externos,
originados em suas diferenciações religiosas. Os estilos Taoístas são chamados de Nei Chia
(internos) e os Budistas são denominados de Wai Chia (externos). Os estilos internos são
caracterizados pelos movimentos lentos centrados na respiração profunda e na suprema 9
interiorização energética, tendo como essência o total controle da energia “chi”. O mais
conhecido destes estilos entre nos é o Tai Chi Chuan. Já os estilos externos são caracteri-
zados pelos movimentos rápidos e com finalidades de combate corpo a corpo. Exemplo de
estilo externo é o Wing Chun, praticado pelo imortal Bruce Lee.
O Tao teve origem nos pensamentos do filósofo Fu Hi, que não tinha nenhuma re-
lação com religiosidade, apesar de ser conhecido como Taoísta. Essencialmente, o Tao
(caminho) é voltado para o aspecto espiritual humano. Assim, tem-se O Caminho da
Essência Espiritual.
Os seguidores do Tao tiveram seu afloramento na Dinastia Chou. Muitas pessoas,
revoltadas com as inúmeras guerras existentes na China, iam para as florestas para conse-
guir energia e tentar entrar em contato com o “Chi universal”, tentando encontrar assim a
felicidade. As pessoas agiam assim porque queriam se afastar dos bens materiais, inclusive
do dinheiro. Além disso, também se afastavam da família, passando a viver sozinhas.
Fases Filosóficas
Muito tempo depois, o filósofo chinês Lao Tse ampliou os ensinamentos do Tao de
modo a que se tornassem uma nova religião. Além da fase religiosa do Taoísmo para fazer
frente ao Budismo na China, esta religiosidade teve mais duas fases: a Filosófica (Tao Kia) e
a Mágica-Alquimista (Tao Kiao). Durante a fase mágico-alquimista, houve muita pobreza
dentro do Taoísmo. Seu fundamento era de que existia uma imortalidade e que o homem
deveria encontrar uma erva. Essa erva, acreditava-se, permitiria ao seu possuidor tornar-se
imortal. Procuravam-se nesta fase os gênios da imortalidade, denominados de Hsien.
Na fase filosófica do Taoísmo, a grande inspiração vinha do livro do filósofo Lao-Tse
(604-517 a.C.). É o Tao Te King, ou O Livro do Caminho Perfeito. De acordo com os sinó-
logos (como são chamados os estudiosos da cultura chinesa), este filósofo chinês deixou
os escritos na mão de um guarda após deixar a China e desaparecer. A filosofia contida
neste livro é de uma profundidade metafísica que mantém–se interessante e atual – a
exemplo do que ocorre com outros livros sagrados como a Bíblia e o Bhagavad Gita, o
conteúdo é universal e atemporal.
O Taoísmo e o Tao Te King serviram de inspiração para o surgimento de todas as
técnicas terapêuticas chinesas. O maior incentivo apresentado nesta obra é: fazer o bem
para possibilitar uma maior evolução espiritual, equilibrando o “Chi” e tendo como
resultado a harmonia holística. O desejo de prolongar a vida física fez que no Templo
do Imperador Huang Ti, em 120 a.C., surgisse a acupuntura e desse origem ao livro
Huan Nan Tsu. Tratava-se de uma obra que citava os métodos mais modernos daquela
época para adiar a morte, baseando-se em exercícios físicos fundamentados nos ani-
mais e na energia “Chi”.

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O Templo Shaolin

O
Templo Shaolin teve sua fundação nos primórdios da era Cristã como
um templo budista na montanha de Soong Shan, província de Honan.
Esse templo esteve presente direta e indiretamente nas histórias envol-
vendo artes marciais, política e religiosidade na China, tornando-se
famoso e admirado mundialmente. Nos anos de 1970, o seriado de
TV Kung Fu, com o ator David Carradine, foi pioneiro ao mostrar ao
Ocidente o Templo Shaolin.
Templo Shaolin significa o Templo da Jovem Floresta ou Monastério do Pequeno Bos-
que. Tudo que se refere à marcialidade chinesa dentro dos aspectos espirituais tem uma
ampla relação com este templo. Assim, é quase impossível falar de artes marciais chinesas
sem citar o nome Shaolin.
Os mais de trezentos estilos de Kung Fu existentes na China em sua maioria tiveram
ligações com este templo. O treinamento em Shaolin era bastante rigoroso e sistemático.
O termo usado para as artes de lutas era Shaolin Chua, que, traduzindo, significa: Artes
dos Punhos da Jovem Floresta. O termo Jovem Floresta se deu ao fato de os monges, neste
templo, plantarem muitas árvores frutíferas.
O primeiro templo Shaolin foi construído por volta de 450 d.C. e, nesta época, várias
pessoas se convertiam à religião de Buda, que, havia pouco tempo, chegara da Índia. O ex-
cesso de conversões ao budismo não era em sua maioria pela verdadeira fé do povo, nem
mesmo se devia à procura da paz e da harmonia espiritual. O que realmente queriam era
se ver livres de perseguições e sofrimentos impostos pelos imperadores. Segundo as leis da
China da época, todos estavam ligados aos desejos do Imperador, mas, ao se converter ao
budismo, os chineses deixavam de ser parte do Império Chinês e passavam a ser integran-
tes da espiritualidade, desvinculando-se imediatamente do Imperador, devendo, então,
respeito somente às leis de Buda e da espiritualidade.
Desse ponto de vista, a ordem monástica de Shaolin rapidamente possibilitava o
refúgio espiritual. Com o desenvolvimento da ordem, outros templos Shaolin foram
surgindo, dentre outros o de Honan da província de Fukien, fundado pelo monge cha- 11
mado Tashin Sheng. Segundo os historiadores chineses, cinco templos foram fundados,
mas, quando se estuda a história da China, o que se nota é uma variedade de teorias de
acordo com cada autor estudado. Isso se deve aos múltiplos e variados escritos chine-
ses, segundo os quais as localizações destes templos divergem. Uns dizem que os cinco
templos localizavam-se em: Honan, Funkien, Wotang, Oweishan e Kwantung. Outros
afirmam que as localizações corretas são: Honan, Fukien, Ngor Mee, Wu Tang e Kwang
Tung. Pelo menos, eles concordam que Honan e Fukien fazem parte da localização
exata dos templos Shaolin.
Podemos observar nesta caminhada histórica que, nos momentos iniciais do budis-
mo, os templos Shaolin na China somente objetivavam a espiritualidade, mas já existiam
princípios de marcialidade entre estes monges budistas.
As artes marciais no templo Shaolin
O que se sabe de concreto é que as artes marciais surgem, de fato, no templo Shaolin,
por volta de 520 d.C., graças ao pioneirismo de Bodhidharma, o 28º patriarca do budismo,
conhecido também pelos nomes de Ta Mo, em chinês, e Daruma Taishi, em japonês.
Bodhidharma era filho do rei Sughanda, que pertencia à casta dos guerreiros Kshas-
triya. Apesar de ter se convertido ao budismo muito cedo, o Príncipe Bodhidharma man-
tinha um esquema severo de treinamento marcial aliado aos seus estudos religiosos – es-
quema baseado nas artes de lutas do famoso mestre marcial indiano Prajntara. Pouco a
pouco, o mestre indiano foi se afeiçoando a Bodhidharma e lhe passou todos os princípios
da marcialidade de acordo com a visão interna e externa, transformando-o em um guer-
reiro muito poderoso, possuidor de uma consciência espiritual bastante apurada, graças
aos ensinamentos budistas que o espiritualizaram.
Bodhidharma, ainda na Índia, começou a perceber que a meditação era a base para
evolução espiritual e que de nada adiantaria a técnica marcial sem a espiritualidade. A
marcialidade e a espiritualidade, aliadas, seriam uma “porta aberta’ para outros níveis de
evolução humana. A parte física vai se desgastando com o avanço da idade no homem,
mas, se esta for aliada aos princípios da espiritualidade com raízes na meditação, poderão
condicioná-lo ao pleno equilíbrio – tanto internamente quanto com o universo exterior.
As lutas passam a ser uma maneira para dominar o mundo interior do homem,
levando-o a controlar seus medos. As artes marciais servem, então, como recursos de
luta, tanto para auto-defesa quanto para proteger os mais fracos dos abusos praticados
por outros.
A defesa pessoal contida na marcialidade passa a servir para a autodefesa física, como
último recurso, ou ainda para defender os mais fracos das opressões dos mais fortes. Essa
idéia de justiça estava presente no budismo, ao ensinar que o forte jamais deveria se apro-
veitar da superioridade física para agredir o fraco.
Bodhidharma tinha a missão de difundir o budismo original no máximo de locais
possíveis, pois, em vários países próximos à Índia, o budismo se desenvolvia, mas de uma
maneira errada. Um dos países onde existia um forte desvio do budismo verdadeiro era a
China. Bodhidharma foi até lá para pregar a realidade budista como deveria ser. Andando
pelo território chinês, o patriarca budista dirigiu-se até a corte do imperador Liang Wu Ti,
grande tirano para o seu povo.
No domínio do imperador Liang, o patriarca Bodhidharma entrou em choque com o
soberano, pois este seguia uma linha falaciosa do budismo, com muitos rituais. O certo,
segundo Bodhidharma, é que a essência budista deveria usar basicamente a meditação
para se ter a interiorização e o autoconhecimento. Por causa dessa discórdia, Bodhidhar-
ma teve de se refugiar em um mosteiro Shaolin localizado ao norte da montanha de
Soonh Chan. Assim, evitou que o imperador o tivesse matado. No templo, permaneceu em
meditação durante nove anos, chegando a uma total harmonia interior.
Existem diversas lendas sobre a figura deste patriarca, porque os chineses da Anti-

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guidade centravam seus valores em concepções místicas e em lendas. Deste momento em
diante, Bodhidharma resolveu hipervalorizar a meditação e criou alguns novos conceitos
para os pensamentos budistas, denominando-os de Dhyanna, que em sânscrito significa
meditação. Mas, para os chineses, isso ficou conhecido pelo nome de “Chan”. Posterior-
mente, no Japão, recebeu a denominação “Zen” e, na Coréia, “Sun”. Esta técnica de
meditação fez que muitas pessoas fossem até o templo de Shaolin e lá aprendessem os
métodos “Chan”, passando adiante estas novas concepções da meditação.
No Japão, o “Zen” teve uma grande participação social e filosófica, evoluindo junto à
cultura nipônica. Podemos citar como culturas com enraizamento no “Zen”: a cerimônia
do chá, ikebana, bonsai, e muitas artes marciais. A criação do Bushido, o código de honra
dos samurais, também tem relação direta ou indireta com o “Zen”.
Os treinamentos do templo de Shaolin eram de uma severidade enorme, transfor-
mando o monge em uma verdadeira arma, com pleno conhecimento da luta e completo
domínio da mente sobre o corpo. Neste templo, os monges meditavam diariamente das
quatro da manhã às dez da noite. Havia somente breves interrupções para comer, beber,
defecar e urinar, e para algumas atividades comuns a todos dentro do templo. Isto du-
rava poucas horas, voltando o monge imediatamente à prática meditativa. Havia casos
de monges que desmaiavam e até mesmo morriam durante a meditação, tanto era o
rigor. Percebendo que os monges precisavam de uma atividade física para complementar
a ociosidade das longas meditações, Bodhidharma começou a ensinar movimentos de
luta aos monges, para desenvolver o corpo.
Alguns pesquisadores afirmam que a arte marcial que os monges budistas inicial-
mente treinavam eram o Vajramushti (Vajra= real, Mushti= soco). Esta era uma arte
marcial indiana que, hoje, está praticamente extinta. Devido à dificuldade da pronúncia
do sânscrito, os chineses fizeram mudanças nos diversos nomes relacionados ao budismo,
adaptando os termos à sua língua. Por isso, segundo alguns pesquisadores, o termo vajra-
mushti passou a ser denominado em chinês dentro do templo de Shaolin com o nome de
Lo Han e, posteriormente, Nalo Jan, Arohan e I Jinsin.
13
Os cinco estilos de Kung Fu Shaolin
O monge Kwok Yuen foi famoso por sua influência nas artes marciais chinesas no
templo Shaolin. Este monge nasceu na província de Yen Chou e teve um aprendizado dos
princípios marciais Shaolin com o mestre Hung Yun. Durante a dinastia Ming, Kwok Yuen
andou por toda a China e, depois de pesquisar todos os estilos de Kung Fu existentes na
época, levou-os para dentro do templo Shaolin, adaptando-os às lutas treinadas e conhe-
cidas lá. Houve, portanto, um aprimoramento técnico.
Daí surgiram cinco estilos em Shaolin. São eles: Tigre, Grou, Leopardo, Serpente e
Dragão. Também nesta dinastia, os Manchus (originários da Manchúria, uma zona no
nordeste da China) invadiram a China, obrigando muitos oficiais chineses a fugirem.
Para não ser mortos, refugiaram-se no templo de Shaolin, dado o fato deste ter uma
localização privilegiada, tornando-o impenetrável. O território do templo Shaolin era
considerado neutro politicamente, e os Manchus não o poderiam invadir: as suas terras
eram vistas como divinas.
Os oficiais chineses e os monges budistas dos templos de Shaolin passaram a ensinar
secretamente ao povo uma arte marcial denominada Kung Fu Shaolin, possibilitando a
defesa deste povo contra as atrocidades dos Manchus. O respeito pelo estilo Kung Fu Shao-
lin tomou tamanha dimensão, que passou a ser apresentado nas demonstrações públicas
e nas comemorações do ano-novo, sempre aliadas à dança do Leão.
Os movimentos marciais Shaolin tinham setenta e duas séries de técnicas. Ainda in-
satisfeito com o que aprendera, o monge Kowk passou a pesquisar por toda a China os di-
versos estilos marciais. Seu objetivo era aprofundar os aspectos de combate e de eficiência
na defesa pessoal. De cada mestre que encontrava, durante sua peregrinação, aprendeu
alguns fundamentos da marcialidade, acrescentando-os aos já conhecidos.
Durante sua longa caminhada, o monge Kowk se tornou muito amigo de um mestre
chamado Li Cheng, habitante da cidade de Lanchow. Após o aprendizado com este mestre,
o monge Kowk aumentou seus movimentos marciais originais de setenta e duas para
cento e setenta e duas formas, que em chinês são denominadas de Tchia Dsu, divididas em
cinco grupos diferenciados. Depois, estas formas foram denominadas Katas, em japonês,
e Kihon, em coreano. As Tchia Dsu eram caracterizadas em grupos, sendo que cada um
tinha o nome de um animal.
Assim, as formas do Dragão eram usadas para manter o pleno estado de alerta e a
evolução espiritual. Os movimentos eram feitos sem muito uso da força, preocupando-se
com a respiração correta com movimentos longos, fluentes e continuados, pondo sempre
a direção respiratória para baixo do abdome. Existe uma centralização da energia “Chi”
em todos os setores do corpo humano e da mente, buscando sempre a harmonia com o
cosmo. Já as formas relacionadas ao Tigre eram voltadas para desenvolver e ter o forta-
lecimento dos ossos, músculos e tendões, buscando movimentações curtas e bruscas, ba-
seando-se no pleno fortalecimento do corpo humano. Isso visa a dar ao praticante certas
evoluções corporais que o fariam detentor de um físico bem-preparado para o combate
nas guerras.
Quem praticava as formas relacionadas ao Leopardo objetivava o pleno controle
da força, usando, para tanto, movimentos rápidos com bastante inteligência e precisão.
Quem fazia o estilo Serpente tinha um melhor desenvolvimento da energia vital, o “Chi”,
preferindo nos combates o uso de golpes feitos com as pontas dos dedos, cultivando uma
respiração mais pausada, com lentidão, buscando profundidade e consciência cósmica.
E, por fim, quem preferia os movimentos do Grou tinha como finalidade o encontro
do autocontrole.

A invasão do templo Shaolin


Aos poucos, os Manchus percebiam que o ingresso dos oficiais chineses nos templos
de Shaolin eram uma forma política e não religiosa de se ver livre das batalhas com eles.

Coleção Artes Marciais • Kung Fu


A partir de então, deixaram o respeito religioso de lado e tentaram invadir de várias for-
mas o templo de Shaolin, mas sem sucesso, dada a dificuldade de acesso. Paredes muito
fortes e altas e o perfeito esquema de segurança dos próprios monges impediam qualquer
invasão. Um outro detalhe importante: os monges eram muito sábios e viviam baseados
em uma economia de subsistência. Mantinham enormes plantações de alimentos junto
aos templos, o que lhes permitia ficar anos sem ter de sair dali.
Os governantes Manchus, sabedores da impossibilidade de invadir o templo Shaolin,
resolveram subornar um monge para facilitar a entrada dos seus guerreiros. Este monge
traidor chamava-se Ma Ning Yee e recebeu como pagamento uma grande quantia em
dinheiro e um cargo político de relevância no governo Manchu. Esta traição foi tramada
com o apoio de três generais Manchus: Chan Man Yu, Cheung Ching Chow e Wong Chun
May. O monge traidor colocou veneno nas águas do templo e o incendiou (1733 d.C.).
Enquanto o templo pegava fogo, ele abriu as portas para os guerreiros Manchus que, em
pouco tempo, dominaram o templo e mataram a maioria dos monges. Somente cinco
mestres e quinze discípulos conseguiram fugir da destruição.
Dos discípulos, tiveram destaque na história social chinesa: Hung Hee Kung e Luk Ah
Choy, criadores de estilo Hung Kuen, que, posteriormente, tornou-se famoso com o nome
de Hung Gar; Fong Sai Yuk, responsável pela criação do estilo baseado nos movimentos
dos cinco animais do estilo Shaolin; Tse Ah Fook Weng Chun e Tsung Chin Kum, que se
tornaram lendas vivas do folclore chinês, graças às suas perícias em combates corporais.
O que se tem de relatos sobre o templo de Shaolin está mais baseado na tradição oral
(as histórias contadas de uma geração a outra) e em alguns escritos a respeito da história
da China. A marcialidade chinesa deve muito aos templos e respectivos monges budistas.
Exemplo disso é “O Livro da Transformação Muscular”, em chinês I Chin Ching. Nele,
é relatada a série de exercícios dos monges de Shaolin. O livro teve somente um volume,
sendo que, deste, apenas dois escritos chegaram aos nossos tempos. São denominados em
chinês de Shih Pa Lo Han Sho, que significam: As Doze Mãos de Lo Han.

Os treinamentos no templo Shaolin


Para se tornar discípulo no templo de Shaolin, inicialmente era necessário ter uma 15
relação rigorosa desde os primeiros momentos. As crianças deviam ser levadas por seus
pais até a porta do templo nos primeiros dias da primavera, período de chuva. Deveriam
ficar ali esperando até que fosse aberto. Os monges levavam dias para abrir os portões
do templo, obrigando as crianças a ficar na chuva e ao vento. Desde este momento
inicial, as crianças já eram selecionadas, pois as que ficavam eram poucas. As outras,
por fugirem das primeiras dificuldades, jamais agüentariam os rigorosos treinamentos
do templo de Shaolin.
A idade das crianças variava entre sete e 12 anos. Tendo obtido permissão para
adentrar o templo, elas passavam por outras etapas de seleção. Eram levadas a um
pátio interno e seguiam até uma mesa onde se encontrava um velho monge budista.
Ao sentar à mesa, eram rigorosamente analisadas no comportamento: era proibido
pedir comida. As que assim agiam recebiam os alimentos e, após comê-los, eram dis-
pensadas. As boas maneiras determinavam que se deveria esperar o desejo dos monges
em oferecer comida.
Depois de algum tempo, era dada às poucas crianças que não tinham sido dispen-
sadas uma tigela sem o fundo e uma grande bolacha seca, do tamanho do fundo da
tigela, e depois era servido o chá. Aquelas que não preenchiam o fundo com a bolacha,
fechando a base da tigela, eram dispensadas. Não tinham inteligência suficiente. Mas,
se tomassem o chá antes que o monge idoso terminasse o dele e, então, as autorizasse a
beber, também eram despedidas. O respeito aos mais velhos era obrigatório aos candidatos
a monge Shaolin.
Após esta etapa, vinha a fase do teste de paciência e humildade. Era realizado da
seguinte maneira: dava-se uma vassoura para a criança, e deixando-a alguns dias, ou
meses, varrendo os mesmos
lugares. Devia cumprir as
ordens sem questionar. Além
de varrer, devia fazer outras
tarefas de limpeza: desde a
cozinha até os sanitários.
Independentemente disto, as
crianças tinham que estudar
as doutrinas religiosas bu-
distas ensinadas no templo
e seguir os diversos rituais lá
existentes.
O normal era dormir
pouco e trabalhar muito. O
tempo e o espaço, que segun-
do o budismo não passam de
pura Maya — ou seja: ilusão
—, deveriam ser esquecidos.
Daí, quanto mais tempo de-
dicassem aos estudos budistas,
melhor seriam, pois os anos
são ilusões e nada mais. Por-
tanto, os candidatos a mon-
ges (neófitos) não deveriam
ter quaisquer ligações com
o tempo. O importante era a
dedicação à religiosidade e a
preparação para o autoconhe-
cimento através da meditação.

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Com todas estas humilhações, as crianças, apesar de morarem no templo, ainda não eram
consideradas estudiosas budistas.
Para ser realmente aceitas como discípulas de Shaolin, tinham como última etapa o
início do treinamento do Kung Fu. Teriam que ter muita perseverança, pois, inicialmen-
te, elas eram meros sacos de pancadas dos monges mais velhos, tomando uma série de
surras diárias. Se conseguissem sair desta fase, eram então aceitas como discípulas.
Passavam a mudar as cores das vestimentas e a ter um tratamento melhor, deixando
suas tarefas humilhantes para os novos candidatos.
As demais etapas até a obtenção das vestes amarelas não eram fáceis. Havia uma
variedade de testes marciais e artísticos, que passavam pelos conhecimentos da caligrafia
à poesia, bem como os testes de conhecimentos da doutrina religiosa budista e das terapias
orientais (massagem, moxaterapia, acupuntura). E ainda precisavam saber cozinhar,
plantar e colher, falar, escrever e ler em vários idiomas, inclusive o sânscrito (língua ini-
cial do Budismo). O monge tinha que possuir um ecletismo intelectual que incluía desde
a política até a educação religiosa, para que, ao manter contato com o povo, ele pudesse
agir não somente como líder espiritual, mas como conselheiro para os diversos problemas
sociais existentes em cada local.
Poderíamos afirmar que o verdadeiro monge Shaolin deveria “pensar como um sábio
e agir como um homem simples”, pois, apesar de todos estes conhecimentos, a conserva-
ção da humildade e das boas maneiras ao lidar com as pessoas era de suma importância.
O templo de Shaolin não era somente uma escola marcial. Era uma escola para a
vida espiritual, na qual a marcialidade era o “carro-chefe” da condução para níveis mais
elevados da consciência humana.
Para os monges, o fundamental era a evolução do espírito. Esse desenvolvimento
passava por uma enormidade de detalhes. Tanto que somente com os anos brotaria de
dentro de cada um, levando os seres humanos a perceber que não era preciso ter somente
o domínio físico, pois isto era somente uma parte para se atingir determinados conheci-
mentos essenciais.
Uma das experiências primordiais para ser um monge de Shaolin era o conhecimen-
to da ciência terapêutica tradicional, em que a acupuntura, a tui-nah (massagem chine-
17
sa) e o uso das ervas medicinais eram utilizados para a profilaxia e o tratamento integral.
Em suas andanças pela China junto ao povo, os monges tinham que saber arrumar ervas
para poder tratar os necessitados em qualquer lugar. E, se fosse necessário, recorreriam às
técnicas marciais para a defesa do povo em geral.
Muitos historiadores nos relatam que os monges usavam as massagens como terapia,
evitando sempre o uso da acupuntura, pelo fato de esta técnica requerer a necessidade
de agulhas, que eram muito caras na época. É preciso lembrar que os monges possuíam
voto de pobreza e tratavam de pessoas igualmente pobres. Por isso, faziam massagens nos
mesmos pontos da acupuntura, gerando assim energização e harmonia do homem com
o universo, proporcionando saúde psicobioenergética.
Dentro do templo de Shaolin, as exigências marciais eram tão fortes quanto as de espi-
ritualidade. Após longos anos de treinamentos marciais, o monge deveria lutar e vencer os
cinco lutadores dos estilos de Shaolin. Derrotando-os, o aspirante poderia solicitar a prova
do Corredor da Morte, que consistia em passar por um local onde existiam cento e oito bo-
necos de madeira que eram devidamente preparados e objetivavam derrotar qualquer um
que por ali tentasse passar. O esquema se resumia da seguinte maneira: a cada boneco que
era derrotado imediatamente, outro surgia, obrigando o lutador a ter uma perícia marcial
muito apurada, além de possuir um domínio interior maior ainda, pois teria que ter muita
concentração e percepção a cada novo passo que dava no Corredor da Morte.
Após passar pelo Corredor da Morte, o monge deveria abrir a porta de saída deste.
Mas havia somente um meio de se fazer isso: era erguendo uma pesada urna. Esta urna
era ornada em suas laterais com figuras de animais e era mantida praticamente em
brasa. Para removê-la e abrir a porta, o monge deveria fazê-lo segurando-a com os an-
tebraços. Isso, naturalmente, marcava seus antebraços com as figuras dos animais, feito
tatuagens forjadas a fogo na pele – que ele carregaria para o resto de seus dias.

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Após a destruição
do templo Shaolin

A
pós a destruição do templo de Shaolin, somente cinco mestres
e quinze discípulos conseguiram sobreviver e fugir pela China
adentro. Ao se espalharem, iniciaram seu fortalecimento, criando
grupos secretos, com o objetivo inicial de catequizar e treinar o
povo para derrotar os Manchus e expulsá-los do território chinês.
Para isso, eram feitos treinamentos de Kung Fu, princípios de
meditação e filosofia Shaolin em pessoas escolhidas na multidão.
Elas eram treinadas secretamente pelos fugitivos do Templo Shaolin e pelos seus
discípulos imediatos.
Muitos grupos e associações ocultas de Kung Fu surgiram neste período na
China. Eram entidades com características políticas que faziam do Kung Fu a
base para a preparação do homem para o combate corpo a corpo com os Man-
chus. E o budismo servia para fundamentar a evolução interior dos revolucioná-
rios. Estas entidades eram denominadas de Hung Mun, Hung Tong ou Tríades.
E seus integrantes eram conhecidos pelo povo chinês como Tongs. A cada dia,
aumentava o número de adeptos destas entidades, pois a insatisfação do povo
chinês era muito grande.
Os Tongs eram em sua maioria pessoas cultas e bem-preparadas nas diver-
sas áreas artísticas e culturais, inclusive nos métodos terapêuticos tradicionais
chineses (acupuntura e massoterapia). Podiam atuar como verdadeiros líderes
revolucionários, capazes de doutrinar o povo com suas leis e preparar alguns para
ser peritos em inúmeras técnicas mentais, físicas e sociais.
A Dinastia Ching inteira foi marcada pela presença destes revolucionários que, 19
a cada dia que passava, conseguiam mais simpatizantes. Somente com a Repú-
blica Chinesa em 1912 é que os Tongs obtiveram seus fins. Por isso, a história da
China tem em seus escritos uma enormidade de feitos relacionados a estes revolu-
cionários. Os feitos tinham uma única finalidade: ver a China livre dos tiranos e
exploradores estrangeiros. Inicialmente, a revolta era contra os Manchus, depois
contra outros povos ocidentais (franceses, ingleses, portugueses e espanhóis que
passaram também a explorar o sofrido povo chinês).
Os Tongs usavam os cabelos longos ou cortados à maneira ocidental como
método para demonstrar suas revoltas contra os Manchus, que obrigavam os chi-
neses a usar no cabelo o rabicho semelhante aos Ming.
A Revolta dos Boxers
Um dos fatos históricos marcantes da História Chinesa com grande partici-
pação dos Tongs foi a Revolta dos Boxers. O movimento foi assim chamado por
causa dos ingleses que, não dominando o idioma, referiam-se aos movimentos do
Kung Fu como “arte do boxe” – uma luta popular na Inglaterra.
A História da China é repleta de problemas de atritos políticos e religiosos,
principalmente contra o cristianismo, que era uma religião que representava a
tentativa do domínio ocidental. Daí, todos os chineses que se convertiam ao cris-
tianismo eram vistos com desprezo pela maioria, que tinha uma visão naciona-
lista ligada aos ideais revolucionários pregados pelos Tongs.
As batalhas eram muitas, e os Tongs treinavam dia e noite as técnicas do Kung
Fu, objetivando a expulsão dos estrangeiros orientais e ocidentais do território
chinês. Muitos mestres de renome no Kung Fu iam pouco a pouco se unindo
às causas revolucionárias, todos centrados na idéia de acabar com o domínio
estrangeiro vigente.

A influência dos monges Shaolin


A China possui uma série de fatos históricos que mostram o quanto a influ-
ência dos monges Shaolin foi fundamental em diversos setores. Foram os respon-
sáveis por movimentos políticos e religiosos que serviram como matéria-prima
para muitas definições sociais e popularizaram as milenares terapias chinesas.
Em todo lugar pelo qual estes monges passavam, ensinavam uma variedade de
meios para tratar as doenças. Valiam-se de plantas e ervas medicinais, bem como
de métodos de massoterapia e controle de energia vital, proporcionando a todos
um completo bem-estar físico e mental, causador da harmonização energética.
O Kung Fu era o recurso com o qual chineses podiam contar na luta contra
seus adversários – muitos deles estrangeiros, que invadiam os territórios e se de-
nominavam “donos da China”. Contra essa invasão, os chineses tinham os co-
nhecimentos e práticas de combate corpo a corpo e os instrumentos de trabalho.
Ferramentas que, nas mãos hábeis daqueles guerreiros, se transformavam em
armas brancas. E aqui, novamente, o Templo de Shaolin era o grande inspirador
na técnica de manejo dessas armas.
Na evolução histórica e social do Kung Fu, o budismo teve uma influência
ímpar, em se tratando dos estilos externos. Já os estilos internos, tais como o Tai
Chi Chuan, o Hsing I, o Chi Kung e o Pa Kua sofreram fortes influências taoístas.
Este fato possibilitou aos praticantes dos estilos externos e internos terem uma
essência filosófica centrada em princípios religiosos que observavam as marciali-
dades como “Caminho” para o encontro de si mesmo, responsável pela evolução
interna de todos aqueles que se envolvem com as artes marciais.

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Dez Normas Budistas
O Monge Kwok Yuen criou um código filosófico para ser seguido pelos mon-
ges de Shaolin, composto de Dez Normas Budistas. Seu objetivo era orientar os
monges de Shaolin, de modo que fizessem bom uso do Kung Fu. Abaixo estão as
normas:

1 – Treinar ininterruptamente
O treinamento marcial é eterno para o praticante. Treinando sempre,
deve buscar o máximo de concentração e precisão, como se cada golpe ou
exercício fosse o último a ser dado em sua vida. Por isso, o treinamento é a
base da evolução marcial, favorecendo não apenas o desenvolvimento físico
e técnico, mas também o condicionamento mental e espiritual do praticante
de Kung Fu.

2 – Usar suas técnicas somente para a defesa pessoal


Todos aqueles que praticam e, principalmente, ensinam artes marciais, devem
ter como princípio básico a não-violência. Seus conhecimentos marciais devem
ser usados apenas em último caso para defesa pessoal, quando todos os recursos
pacíficos estiverem esgotados. Deve-se evitar o exibicionismo, como sendo algo
inútil e nocivo. A idéia é ter consciência da própria força, sem necessidade de pro-
vá-la a ninguém. Deve-se seguir o que ensina o antigo provérbio: “forte realmente
é aquele que vence sem lutar, mesmo possuindo o poder de vencer lutando”.

3 – Respeitar os superiores
A importância do respeito aos superiores está bem ilustrada no relato sobre o
processo de seleção, admissão e treinamento das crianças no ingresso no Templo
Shaolin. Explicamos bem sobre respeito quando comentamos acerca da entra-
da das crianças no Templo. Seja mestre ou discípulo, o simples fato de ter mais 21
tempo de treino na prática do Kung Fu fará da pessoa alguém a ser respeitada
por todos os mais novos. Assim, é preservada a hierarquia centrada no respeito
aos mais velhos. Segundo a filosofia marcial dos Shaolins, o idoso é sinônimo de
sabedoria e, por isso, deve ser sempre respeitado.

4 – Ser honesto e sempre demonstrar cordialidade


A amizade e o respeito para com seus semelhantes são de muita importân-
cia para quem pratica o Kung Fu. O praticante deve ter respeito e consideração
por todos os seres vivos do planeta – desde os homens até os animais mais in-
feriores. É dever do praticante respeitar também todos aqueles que têm menos
tempo de treinamento.
5 – Evitar demonstrações de lutas.
É de importância vital evitar desafios e lutas fúteis, que sirvam apenas ao
exibicionismo egoísta e orgulhoso.

6 – Nunca ser agressivo ou demonstrar maneiras rudes


Acima de sua condição física, o homem é um ser moral e social. Por isso, os
praticantes de Kung Fu precisam ter consciência de que, quando o praticamos, a
sociabilidade e as boas maneiras devem estar sempre presentes. Isso quer dizer,
também, que se deve manter afastado de fofocas, de comentários e de pensamen-
tos negativos, preferindo os pensamentos e atos que elevem e proporcionem feli-
cidade a todos.

7 – Jamais comer carne ou provar bebidas alcoólicas


As proibições à ingestão de carne e de bebidas alcoólicas têm origem nas fun-
damentações religiosas budistas existentes no templo Shaolin. Não devemos nos
esquecer de que estas regras foram feitas para os monges budistas. Entre eles, era
estritamente proibido o uso de álcool e de carne. A alimentação deveria observar
o princípio budista de jamais matar – o que inclui os animais de cuja a carne se
pode alimentar. E o álcool era considerado prejudicial porque impede o domínio
da mente e o leva a uma dependência viciosa.

8 – Conter seus impulsos sexuais


É preciso lembrar que as normas foram feitas paras os monges budistas. Neste
caso, em especial, eles não tinham atividades sexuais devido aos votos religiosos.
Atualmente, lembra a necessidade de se tomar cuidado com os excessos sexuais,
que podem ser fontes de muitos problemas.

9 – Jamais ensinar técnicas às pessoas que não são budistas


Esta regra também se aplicava aos monges do mosteiro Shaolin. Partiam do
princípio de que ensinar artes marciais para qualquer um era perigoso, visto que
muitos iriam somente se interessar pelo aspecto externo da marcialidade. E, as-
sim, fariam uso indevido dos golpes, muitos deles mortais. Essa questão ainda
inspira cuidados na atualidade. A facilidade de acesso aos ensinamentos do Kung
Fu trouxe conseqüências positivas e negativas que devem ser ponderadas.

10 – Evitar a cobiça e a agressividade


A humildade é a base da essência do Kung Fu. Um verdadeiro praticante não
se ofende com as críticas, nem se envaidece com elogios.
Tudo isso é passageiro. O equilíbrio está em seguir “pensando como um sábio
e agindo como homem humilde”.
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A história do
estilo Wing Chun
Antes de tratarmos de Bruce Lee, é importante comentar o estilo
marcial chinês Wing Chun ou Ving Tsun, como é chamado por
muitos. Também não se pode esquecer do Mestre Yip Man.

A
história começa com Yim Yee, que foi um dos quinze discípulos
sobreviventes à destruição do Templo Shaolin. Yim Yee havia
se metido em diversos combates marciais e acabou tendo que
se refugiar próximo da montanha Tai Leung, passando a viver
como simples comerciante. Ele tinha uma filha de nome Yim
Wing Chun, que estava prometida em casamento a um próspero
negociante. No local onde residiam, existia um excelente lutador que se apai-
xonou pela jovem Yim Wing Chun e ameaçou a moça para que se casasse com
ele. Caso contrário, a levaria à força. Seu nome era Wong.
O velho Yim Yee já estava com muita idade, ficando assim impossibilitado de
lutar com o pretendente de sua filha.
Então, uma monja de nome Ng Mui estava hospedada no Templo da Garça
Branca, situado nas proximidades. Ela ia constantemente à vila para fazer
compras. Um dia, estava comprando com o velho Yim Yee e notou que ele
estava apreensivo. Ele contou a ela a triste história que o atormentava. Ng Mui
resolveu ajudar a filha do velho comerciante, ensinando a arte marcial a Yim
Wing Chun.
Ng Mui treinou a jovem Yim Wing Chung durante três anos. Graças aos en- 23
sinamentos adquiridos nas aulas, a jovem derrotou o seu pretendente e agressor,
casando-se pouco tempo depois com Leung Bok Chau, a quem tinha sido prome-
tida desde criança, seguindo assim a tradição chinesa.
Leung Bok Chau era lutador de Kung Fu e praticava suas técnicas diaria-
mente. Sua esposa Yim Wing Chun começou a notar e a criticar falhas em suas
técnicas. Certo dia, chateado com suas constantes observações, desafiou-a para
um combate. Leung Bok Chau foi facilmente derrotado. Imediatamente, ele quis
aprender o método marcial de sua esposa Yim Wing Chun, que, posteriormente,
foi denominado Wing Chun, ou seja, Arte dos Punhos de Wing Chun – em home-
nagem à sua esposa.
Muitos anos depois, Leung Bok Chau ensinou a já famosa técnica marcial
Wing Chun para um médico de nome Leung Lan Kwai, que durante muitos anos
preservou em segredo esta arte marcial. Ele a ensinou somente quando velho a
um jovem de nome Wong Wah Bo, que era um ator da ópera chinesa.
Em uma das suas viagens como ator de ópera, Wong Wah Bo encontrou o
mestre marcial Leung Yee Tei, que era um excelente lutador com o bastão lon-
go. Wong Wah Bo e Leung Yee Tei tornaram-se amigos e passaram suas técnicas
marciais um para o outro. Isto possibilitou ao estilo Wing Chun ter acrescido em
suas técnicas marciais o uso do bastão longo, pois neste período já tinha o uso das
espadas borboletas. O treinamento destes dois mestres possibilitou ao estilo Wing
Chun o uso dos métodos do Chi aliados ao bastão, conhecido como Chi Kwun.
Leung Yee Tei ensinou arte do Wing Chun, já bastante evoluída em termos de
treinamentos, para um famoso médico, de nome Leung Jan. Este médico era de
uma família tradicional chinesa, da cidade de Fatshan na província de Kwang-
tung, que, por ironia do destino, era a província em que nascera a mestra marcial
Yim Wing Chun.
Leung Jan era um homem muito culto e proprietário de uma loja especiali-
zada em ervas de nome Jan Sang, além de atuar como médico na região onde re-
sidia. Sua cidade, Fatshan, era um grande centro comercial habitado por pessoas
ricas e de grande prestígio no governo chinês.
A paixão do sábio médico Leung Jan eram as artes marciais e a literatura.
Seu apelido era O rei do Wing Chun. Era obrigado a aceitar o desafio de diversos
lutadores marciais que sempre queriam testar a eficiência do seu estilo. Mas ele
sempre vencia, e sua fama de lutador aumentava. Ele ensinava sua técnica mar-
cial aos seus filhos Leung Tsun e Leung Bik e a alguns discípulos.
Nas proximidades da loja de ervas medicinais de Leung Jan, existia um posto
de trocas de dinheiro de um homem chamado Chan Wah Shun – popularmente
conhecido como Wah, trocador de dinheiro, devido à sua profissão. O grande
sonho de Wah era treinar Wing Chun com o mestre Leung Jan. Mas, porque
pertencia a uma classe social inferior, Wah se sentia constrangido em procurar o
Mestre para tomar aulas de Kung Fu. Ele sentia-se envergonhado e diariamente
ia até a cerca de madeira da loja de ervas do médico e ficava observando as aulas
dos filhos do mestre e demais alunos. Um dia, finalmente Wah tomou coragem
e solicitou ao Mestre que o aceitasse como seu discípulo marcial, mas o mestre
Leung Jan, de forma educada, recusou aceitá-lo como aluno.
Wah, apesar da tristeza, não desistiu e partiu para outra forma alternativa de
aprendizagem desta técnica de Kung Fu. Existia um aluno de Wing Chun do mes-
tre Leung Jan que também se chamava Wah. Era muito forte e, nos treinamentos,
era comum ele quebrar o boneco de madeira, conhecido como Mudjong. Por isso,
seu apelido era Wah, o homem de madeira.
Wah, o trocador de dinheiro, fez amizade com Wah, o homem de madeira, e
conseguiu aprender as técnicas no Wing Chun, pois treinava constantemente.
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Certa vez, enquanto o mestre Leung Jan viajava, Wah, o homem de madeira,
levou o seu novo amigo até a loja de ervas para observar os treinamentos de Ching
Chun. Na oportunidade, falou para Leung Tsun, filho do mestre, que seu amigo
era um perito em Wing Chun e tinha se iniciado somente observando às escondi-
das os treinamentos comandados pelo seu pai.
O filho do mestre desafiou Wah, trocador de dinheiro, para um combate real.
Rapidamente, Wah aplicou-lhe um forte golpe que o jogou contra a cadeira do
seu pai, quebrando-a de imediato. Passado o susto, todos correram para consertar
a cadeira de descanso do mestre. À noite, quando Leung Jan sentou-se para des-
cansar em sua cadeira, esta desmontou. Querendo explicações sobre o que havia
acontecido, ficou sabendo da história de Wah.
Leung Jan acabou solicitando a presença de Wah, o homem de madeira, exi-
gindo que ele contasse o ocorrido. Após isso, pediu que chamasse o outro Wah, o
trocador de dinheiro e, pouco tempo depois, ele já demonstrava o que sabia de
Wing Chun para o mestre Leung Jan. Após ver suas perícias marciais, acabou
aceitando-o como seu aluno.
Wah, trocador de dinheiro, sempre fazia uso das suas técnicas em combates
reais, pois, na sua profissão, era preciso lutar às vezes contra ladrões. Com isso,
possibilitou uma constante reciclagem do Wing Chun em termos de combates
reais. Ele acabou virando um mestre do estilo. Quando estava com mais de setenta
anos, foi convidado para ensinar Wing Chun no templo ancestral da família Yip,
uma das propriedades mais ricas da sua região, e neste local foi mestre de Yip
Man, que futuramente seria mestre de Bruce Lee.

25
O Mestre Yip Man

O
mestre Wah era famoso em sua região pelo fato de cobrar mui-
to caro pelas suas aulas de Wing Chun. Isto favorecia que seu
grupo de alunos fosse muito seleto.
Um dia, ao chegar para dar aulas, ficou surpreso ao encon-
trar o jovem Yip Man, esperando-o com três moedas de prata
na mão, valor que correspondia a um mês de aulas. Yip Man
era filho do dono do templo onde ele ministrava aulas. Este jovem tinha apenas
treze anos. Por isso, Wah foi conversar com seu pai sobre a origem daquele di-
nheiro. O pai do rapaz disse que seu filho estava pagando-o com suas economias,
e que podia aceitá-lo como aluno. Wah, mesmo não acreditando que um menino
rico como Yip Man fosse se dedicar ao Wing Chun, aceitou-o como aluno. Feliz-
mente, com o passar do tempo, o jovem Yip Man passou a mostrar uma grande
dedicação pela prática do Wing Chun, ganhando assim a simpatia do seu mestre,
o velho Wah.
Yip Man treinou com Wah até os dezesseis anos, quando, infelizmente, este
faleceu. No ano do falecimento do Mestre Wah, o pai do jovem mandou-o para
Hong Kong. Ele foi estudar no Colégio Santo Estefano, onde eram adotados os
costumes ingleses, que eram a moda, naquela época, na aristocracia chinesa.
Neste colégio, eram costumeiras as brigas entre colegas e o conhecimento do
Wing Chun logo fez que Yip Man se tornasse respeitado e temido, porque sempre
vencia os combates. Mas tornou-se arrogante.
Certo dia, um colega de Yip Man perguntou a ele se aceitaria lutar com um
homem de cinqüenta anos que era muito bom no Kung Fu. Ele, que era muito
bom de briga e se sentia o grande lutador, aceitou de imediato. Chegando ao local
da luta, seu adversário perguntou o estilo que ele lutava e quem era o seu mestre.
Após responder, iniciou a tecer profundos comentários sobre o estilo Wing Chun.
A ansiedade em vencer a luta cegou Yip Man para alguns detalhes na conversa
com seu adversário. Um detalhe - como era que aquele homem sabia tanto sobre
o estilo que ele praticava?
O adversário de Yip Man o derrotou com facilidade, mas não o machucou.
Depois, Yip Man soube que aquele homem era Leung Bik, um dos filhos de Leung
Jan, o mestre do seu mestre, o Wah.
Dentro da filosofia do Kung Fu, foi um ato imperdoável, pois Yip Man havia

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desafiado um tio dentro da genealogia do Kung Fu. Percebendo a besteira que
havia feito, Yip Man foi até Leung Bik e lhe pediu desculpas, aproveitando para
solicitar que ele o aceitasse como seu discípulo marcial.
Leung Bik acabou aceitando-o como seu aluno, achando inicialmente que Yip
Man era muito arrogante. Porém, com o tempo, Leung Bik percebeu que seu alu-
no era um bom garoto. Suas atitudes emotivas davam-se devido à pouca idade.
Aos vinte e quatro anos, Yip Man retornou para sua terra natal, voltando a
treinar com seus colegas de Wing Chun. Nesta oportunidade, passou a se destacar
mais do que os outros praticantes. Levando-os a achar que durante o tempo que
estava em Hong Kong, havia treinado outro estilo de Kung Fu, sendo isso consi-
derado uma traição perante os costumes marciais chineses. Porém, Ng Chung
So, que tinha substituído o mestre Wah, explicou aos seus colegas que ele havia
treinado com Leung Bik, filho de Leung Jan, mestre de Wah, trocador de dinheiro.
Ficou desde então, tudo esclarecido.
Durante o período de 1937 e 1941, o jovem Yip Man foi para o exército para
ajudar os chineses contra os japoneses, porém o povo nipônico venceu obrigando-
o a retornar mais uma vez para sua terra natal. Após a Segunda Guerra Mundial,
a China entrou em guerra civil, e Yip Man acabou servindo no governo naciona-
lista.Também neste período, morreu sua primeira esposa. Em l949, devido à Re-
volução Socialista na China, Yip Man teve de fugir para Hong Kong, ministrando
aulas de Wing Chun para poder sobreviver.
Primeiramente, Yip Man ministrava aulas de Wing Chun na Associação dos
Trabalhadores de Restaurantes de Hong Kong, e, nesta época, tinha poucos alu-
nos, pelo fato de seu estilo marcial ser muito feio e não possuir os aspectos estéti-
cos existentes em outros estilos de Kung Fu. Passados dois anos, resolveu abrir sua
27
própria academia em outro local mais espaçoso.
No ano de l954, casou-se novamente. Nesta época, começou a ter mais alu-
nos, devido à eficiência do seu estilo em lutas reais e à facilidade no aprendizado
deste estilo marcial. Muitos universitários passaram a ser alunos do Mestre Yip
Man, obrigando-o a se mudar, mais um vez, para uma academia maior. Na atua-
lidade, o estilo Wing Chun é o mais praticado em Hong Kong.
A Associação Atlética Wing Chun de Hong Kong foi fundada em l967. O mestre
Yip Man faleceu em l970.
Bruce Lee
e o Kung Fu

A
história do Kung Fu tem um marco importante em Bruce Lee,
considerado “o rei”. Em parte pelas suas aparições nas telas de
cinema em todo o mundo, em filmes nos quais aparecia lutando
e que, por essa publicidade, se tornou respeitado e imortal.
Graças a ele, o Kung Fu obteve uma adesão admirável no
Ocidente. Antes de Bruce Lee, os filmes chineses de Kung Fu já
eram exibidos no Ocidente e bem-aceitos. Mas foi o Pequeno Dragão, como Bruce
Lee também era conhecido, que iniciou uma revolução nos filmes de luta marcial
chinesa em todo o mundo.
Apesar de sua morte prematura em l973, Bruce Lee deixou-nos uma herança
cultural marcial e de cinema de amplitude inigualável. Graças a este imortal
artista marcial que o “nunchaku” (arma do Kung Fu constituída de dois bastões
curtos de madeira, ligados entre si por corda ou corrente) se tornou conhecido
internacionalmente.
Seus filmes eram sempre centrados no uso das técnicas marciais de origens
chinesas, apesar de Bruce ter o seu próprio estilo marcial, o Jeet Kune Do. Um
estilo que se caracterizava por ser um sincretismo marcial, no qual se faz uso de
diversas técnicas de artes marciais treinadas e testadas por ele mesmo, bem como
na defesa do aspecto da individualização de cada estilo. Ou seja, cada um deve
desenvolver o estilo marcial que melhor se adapte à sua realidade.
O estilo marcial treinado por Bruce Lee foi o Wing Chun, tendo como mestre
Yip Man, ainda quando residia em Hong Kong, sem contar o Tai Chi Chuan, que
ele praticou com o seu pai.
Aos dezoito anos de idade, Bruce mudou-se para os Estados Unidos, sua terra
natal, e lá ministrou aulas de Kung Fu, no estilo Wing Chun. Foi para a televisão
e depois para o cinema, transformando as artes marciais com suas idéias novas
e arrojadas.
Segundo os médicos, Bruce morreu devido a um edema cerebral. Muitos du-
vidam desta versão. De qualquer modo, ele foi um dos grandes divulgadores do
Kung Fu em nível mundial. Eis um grande mérito que inspira as homenagens em
agradecimentos, de parte de todos os amantes das artes marciais.
Exemplo disso é que, recentemente, em Hong Kong, admiradores custearam a
produção e ergueram uma estátua em homenagem a Bruce Lee, o imortal.

Coleção Artes Marciais • Kung Fu


Capítulo

Os estilos de Kung Fu
29
2
O melhor estilo

A
s artes marciais são iguais às religiões. Não é por acaso que a reli-
giosidade chinesa se encontra acoplada à prática marcial, pois to-
dos os mestres e praticantes de arte marcial acreditam cegamente
que seu estilo é o melhor e mais eficiente.
Na verdade, todos os estilos de Kung Fu são bons, cabendo a
cada um escolher o que melhor se adapta à sua realidade, sendo
isto de caráter pessoal e intransferível.
As pessoas fazem as coisas de acordo as suas necessidades e os seus interes-
ses. O importante quando for escolher um estilo de Kung Fu é perceber qual a
finalidade, qual o estilo — se é da linha interna ou externa. Realizando uma
pesquisa sobre suas origens, sua árvore genealógica, seus movimentos, controle
da respiração, daí, então, deve-se procurar saber onde poderá praticar este estilo.
Após a pesquisa e conhecimento do estilo de Kung Fu, visite academias e procure
conhecer o mestre e suas técnicas de aulas. Assim, você poderá ingressar com
segurança no estilo que mais lhe convém.

Tai Chi Chuan

Técnica do Bêbado

Tigre

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O Kati

K
ati é seqüência de movimentos simulando um combate com
adversários imaginários. As técnicas do Tai Chi Chuan, quan-
do executadas através de Kati, têm o objetivo de fazer que o
praticante desenvolva a criatividade, a imaginação, o domínio
do movimento (equilíbrio, coordenação motora, flexibilidade,
tenacidade, força) e, principalmente, a sensibilidade corporal

Wing Chun

Louva-a-deus

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Garra de Águia
através de formas de percepção do Chi (força interior).
Na seqüência, apresentamos os Katis dos respectivos estilos para ilustrar
melhor as características distintas de cada um deles.

Coleção Artes Marciais • Kung Fu


Os estilos
de Kung Fu

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Águia
O
estilo garra de águia faz parte do contexto dos estilos de
Shaolin, e inspira-se nas técnicas de ataque e defesa da
referida ave de rapina. Este estilo se baseia em algumas car-
acterísticas surpreendentes da águia, das quais se destaca a
sua incrível visão capaz de enxergar um minúsculo roedor
há mais de mil metros de altura; a força da águia também
é extremamente considerada, sendo suficiente para levar aos seus ninhos, no
topo das montanhas, presas cujo peso é maior do que o do próprio predador. O
estilo da águia tornou-se muito famoso em virtude da beleza e da eficácia dos
movimentos, além de fazer que o bom praticante obtenha o ganho de muita
força, resistência, velocidade e eficiência.

Principais características para execução do Kati


• Grande velocidade dos movimentos.
• Uso muito acentuado de técnicas com as pontas dos dedos, simulando a garra
de uma águia.
• As técnicas de dedos são usadas para segurar o adversário, esmagar órgãos,
rasgar a pele e os músculos, atingir pontos vitais e outras táticas mais.
• Grande variante de técnicas em posturas altas e baixas, simulando o ataque
aéreo e a aterrissagem do referido animal.
• O direcionamento do olhar e a expressão facial são característicos neste estilo,
que usa inclusive estes recursos e artimanhas para ludibriar o adversário.
• Grande número de saltos, simulando o vôo do pássaro.

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Os estilos
de Kung Fu
Técnica do Bêbado

Coleção Artes Marciais • Kung Fu


E
mbora muitas escolas chamem este segmento de estilo, o
mais adequado é enquadrar este sistema como uma coleção
de técnicas. Logo, as técnicas do Bêbado visam a confundir o
adversário, apresentando inicialmente o praticante como al-
guém totalmente indefeso, desequilibrado, inconsciente o bas-
tante para a proposta de combate físico. A técnica do Bêbado
procura justamente confundir e enganar o adversário, simulando um estado de
embriaguez e descontrole.

Principais características deste segmento:


• O praticante explora totalmente as posturas em estado de desequilíbrio, ou fora
do eixo natural de equilíbrio.
• O praticante também alterna movimentos lentos com outras seqüências de
grande velocidade e explosão.
• O fator surpresa é imensamente explorado neste estilo, ao se desferir golpes
repentinos e em direções a alvos totalmente opostos durante os combates ou as
simulações destes Katis.
• Neste segmento do Kung Fu, o praticante simula o tempo todo estar segurando
um copo e uma garrafa de bebida, a fim de explorar o lado teatral ou folclórico
desta arte.
• Coisas impossíveis para os bêbados também são exploradas neste segmento, tais
como saltos, acrobacias, chutes altos e giratórios, além de seqüências altamente
sincronizadas.
• Outros pontos fortes desta técnica são os diferentes movimentos no solo, em
posição deitada.

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Os estilos
de Kung Fu
Louva-a-deus

Coleção Artes Marciais • Kung Fu


O
Louva-a-deus foi considerado pelos estudiosos do Kung Fu
como o maior predador do reino dos insetos. Com mais de
1000 diferentes espécies que variam de tamanho, cor e força,
o louva-a-deus é um animal que se destaca na natureza por
imobilizar e devorar presas extremamente maiores do que
ele, tais como lagartos, pequenas serpentes, roedores e várias
outras espécies. Com isso, inspirado nos movimentos de ataque e defesa deste
forte e pequeno animal, o estilo louva-a-deus é considerado o mais técnico de
todos os segmentos tradicionais do Kung Fu no mundo. Este estilo, além de usar
muito os movimentos com punhos, palmas e variados chutes, também trabalha
imensamente as técnicas de dedos direcionando tais ataques a pontos vitais e ex-
tremamente frágeis do oponente, tais como olhos, testículos, garganta, axilas etc.
Outro ponto muito importante dentro deste estilo é a existência da velocidade e
da precisão de cada golpe, sempre desferido com muita tenacidade e elasticidade.
As principais características deste estilo, que também possui diferentes escolas por
todo o mundo, estão descritas no gráfico abaixo.

• Grande quantidade de técnicas duplas; dois movimentos de ataque e ou defesa


desferidos simultaneamente.
• Estilo que possui uma gama enorme de técnicas e movimentos.
• Usa pouco a força física, e explora imensamente a precisão nos alvos.
• Preocupa-se em conhecer os pontos vitais e frágeis do adversário, desferindo
golpes sempre preferencialmente nestas regiões.
• Usa defesas como ataque, também.
• As posturas do estilo geram grande força física e interna no
praticante.
• Os movimentos de braço são muito semelhantes aos 55
movimentos do braço do próprio inseto inspirador.
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Os estilos
de Kung Fu
Tai Chi Chuan

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P
or ser um sistema milenar dentro da família do Kung Fu que
valoriza demasiadamente a força interior e o equilíbrio do prati-
cante, o Tai Chi Chuan é considerado um estilo de linha interna.
Com isso, o praticante preocupa-se em desenvolver, através dos
treinamentos deste estilo, o equilíbrio da mente, do corpo e do
espírito através da harmonia e do ritmo dos treinamentos.
O verdadeiro praticante de Tai Chi Chuan, ao executar os movimentos ou
o treino de um Kati, está fazendo muito mais do que exercícios físicos: está
trabalhando em sincronia sua mente através do imaginário e do esforço em perce-
ber os diversos fenômenos físicos e bioenergéticos que ocorrem simultaneamente
neste tempo. Os movimentos de um Kati do Tai Chi Chuan são sempre realizados
preservando algumas características básicas comuns, a saber:

• São realizados de forma bastante lenta.


• Os movimentos são circulares e continuados.
• Não há paradas bruscas nos movimentos do Kati.
• O olhar do praticante é predominantemente direcionado ao horizonte.
• Os ombros permanecem relaxados e as articulações de joelhos e cotovelos
jamais se posicionam forçadas a se alongar em totalidade.
• Há uma atenção maior para a sensibilidade corporal nas mãos, nos pés e na
cabeça (extremos do sistema nervoso).
• Movimentos sempre realizados dentro do eixo de equilíbrio gravitacional do corpo.

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Os estilos
de Kung Fu

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Tigre
O
estilo do tigre faz parte do conjunto de estilos do Kung Fu
Shaolin. Os movimentos do estilo do tigre são inspirados nos
movimentos de ataque e defesa do próprio animal, preser-
vando inclusive algumas características corporais do referido
felino. O estilo do tigre possui, ao redor do mundo, centenas
de diferentes ramificações deste segmento; porém, tantas vari-
antes do mesmo estilo são unânimes em preservar as características mais tradi-
cionais desta arte milenar. O estilo do tigre possui seus primeiros registros logo
nos primórdios da história documentada do Kung Fu, ou seja, há cerca de 5000
anos. As principais características do estilo do tigre durante a prática e o treino
do kati são as seguintes:

• Movimentos rápidos e continuados.


• Uso da força física para propiciar explosão nos movimentos de impacto
(reportando-se à força do próprio animal).
• Uso demasiado das garras, simulando a própria garra do tigre.
• Apesar de usar muito a força física, os movimentos com os dedos são
geralmente direcionados a pontos vitais e extremamente frágeis dos adversários
(olhos, garganta, área genital).
• O tigre raramente se movimenta em linha reta; é um estilo que varia
imensamente os ângulos de ataque.
• O estilo do tigre geralmente aproveita as formas de defesa também como
ataque.
• Os movimentos de mão também são variados entre garras, punhos (socos),
palmas e dorso de mãos.
• É um estilo que aceita a aplicação de qualquer tipo de chute, alto ou baixo.

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Os estilos
de Kung Fu

Wing Chun
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E
ste sistema foi desenvolvido por uma monja que, por ser mulher,
desejava criar um estilo de Kung Fu mais adequado às limitações
fisiológicas femininas. Este sistema de Kung Fu não faz parte do
segmento Shaolin, pois não é inspirado em comportamentos de
ataque e defesa de um animal específico.
Com isso, o Wing Chun mostra-se como um estilo que possui
as seguintes características:

• Movimentos curtos e diretos, objetivando atingir rapidamente o adversário.


• Movimentos extremamente simples, a fim de se obter exclusivamente a eficácia
sem floreios.
• Grande volume de técnicas duplas (ataque e/ ou defesas simultâneas).
• Número de técnicas reduzido.
• Ataques direcionados principalmente para pontos vitais e frágeis do adversário.
• Sistema que permite grande número de adaptações nas técnicas.
• Grande explosão nos movimentos de ataque e defesa.
• Estilo que objetiva definir o combate em frações de segundo.

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Coleção Artes Marciais • Kung Fu
Capítulo

Kung Fu nos dias atuais


93
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a atualidade, no Brasil, o Kung Fu passa por algumas caracte-
rísticas peculiares das diversas artes marciais tradicionais. Uma
delas é exatamente o imediatismo que existe no brasileiro, por-
que, nos tempos atuais, as pessoas querem obter respostas de
imediato. Para muitos, a velocidade no aprendizado é sinônimo
de qualidade do produto.
Algumas pessoas procuram métodos marciais que tenham aprendizado
mais rápido, deixando o Kung Fu de lado devido ao fato de seu aprendizado
ser muito demorado. Além disso, muitos movimentos do Kung Fu são bonitos,
mas inaplicáveis em lutas reais. Dentro do Kung Fu, o estilo Wing Chun é
muito procurado. Apesar de ter posturas feias, tem aplicabilidade prática em
combates reais.
Na verdade, o Kung Fu não se adaptou aos tempos modernos como a maioria
das artes marciais tradicionais, centradas em paradigmas que eram úteis no sé-
culo IX, mas que nos dias atuais na prática marcial real são inúteis. No passado
na China, os movimentos marciais de um Kati eram muito úteis para os monges.
Os monges e as pessoas de uma forma geral tinham tempo ocioso para dedicação
total à prática de um estilo de Kung Fu, bem como para adentrar nos conceitos
filosóficos e metafísicos marciais.
O grande entrave do Kung Fu nos tempos atuais é que, enquanto os alunos
anseiam pelos fundamentos filosóficos desta arte marcial, muitos professores não
estão preparados intelectual e espiritualmente. Vale ressaltar que, com o advento
da internet, filmes e outros meios de comunicação em massa, fica difícil conven-
cer os alunos com respostas sem fundamentos. É fácil hoje em dia pesquisar e
conferir a verdade através dos meios de comunicação. Diferentemente do passado,
quando somente os chineses tinham acesso às leituras sobre Kung Fu, pois eram
possuidores do conhecimento da língua da sua terra natal.
Sabendo que o público do Kung Fu, em sua maioria, é sedento de informações
sobre filosofia e metafísica, o professor deve trabalhar em cima destas necessi-
dades, estando sempre bem-informado sobre novos conteúdos que envolvam os
aspectos filosóficos marciais chineses e afins. Este será o ponto de partida para
conservar a clientela. Ao bom professor de Kung Fu, cabe, constantemente, a pes-
quisa não somente dos aspectos filosóficos, mas também dos conteúdos das for-
mas de lutas. É interessante sempre manter contato com outros professores para
a troca de novas informações.
De acordo as leis atuais, é obrigatório que o professor de Kung Fu e das demais
artes marciais tenha registro no Conselho Regional de Educação Física de sua re-
gião. Isto gerou uma enorme celeuma nacional, porque os marcialistas em geral,
no passado, não se preocupavam com a regulamentação profissional; somente
havia a preocupação com a criação de Ligas, Federações e Confederações.
Coleção Artes Marciais • Kung Fu
Este fato gerou o surgimento de diversas entidades federativas, todas ampa-
radas pelas leis esportivas em vigor em nosso país. O grande problema está inse-
rido no contexto de que muitas Federações, Confederações e Ligas não passam de
academias com outros nomes, pois, em algumas destas entidades, somente são
filiados a sua diretoria e uns poucos alunos do seu presidente.
Não me arrisco a fazer uma previsão do futuro do Kung Fu ou das demais
artes marciais tradicionais; limito-me somente a dizer que é importante que os
professores de Kung Fu tenham a plena consciência de que o mundo mudou e é
necessário, de forma imediata, que se tenha uma nova postura profissional, tendo
como princípios básicos a ética e o constante aprendizado – ou seja, a epistemefi-
lia (episteme= conhecimento e filia= amizade) para, assim, dar mais segurança
e respeito aos seus alunos. Não quero afirmar que devemos eliminar os contextos
do tradicionalismo no Kung Fu, mas, sim, adaptá-los a novos paradigmas. Os
bons resultados virão, com certeza...

Como escolher um bom professor


Na verdade, não existe uma receita ideal para se fazer uma boa escolha de
um professor de Kung Fu ou até mesmo para outra arte marcial, oriental ou
ocidental. Existem algumas dicas essenciais. Primeiramente, saber a origem do
professor, tendo respostas para as perguntas: quem foi seu mestre de Kung Fu? Há
quanto tempo treina Kung Fu? O que acha da filosofia do Kung Fu? Conte-me um
pouco da história e da filosofia do seu estilo de Kung Fu.
Preste bastante atenção nas respostas e depois confirme com amigos que já
praticam Kung Fu e pesquise na Internet. Procure saber com detalhes sobre o
estilo que ele ensina, porque são diversos os estilos de Kung Fu, e cada um tem
uma padronização de golpes diferentes, daí é necessário saber se este estilo é o
ideal para você. Alguns estilos de Kung Fu usam mais os pés, outros mais as mãos.
Estes detalhes são importantes, pois às vezes seu aspecto físico se adapta melhor 95
aos golpes de mãos do que de pernas, ou vice-versa.
Assista a uma aula e pergunte aos alunos mais antigos sobre a filosofia e as
técnicas deste estilo marcial. Observe o relacionamento do professor com os seus
alunos. Não se deixe confundir com excessos de castigo ou de liberdade, pois nem
um nem outro é certo quando feito em excesso. O bom professor de Kung Fu sabe
equilibrar as coisas, gerando respeito sem ofensas.
Observe a academia, procure saber os antecedentes desta entidade e confira
os itens limpeza e higiene. Não confunda simplicidade com sujeira. O local não
precisa ser de luxo, mas a limpeza é fundamental.
Não pense que, pelo fato de o professor de Kung Fu ser chinês, ele está capa-
citado para dar aulas. O simples fato de um indivíduo ser oriental não o capacita
para ser Mestre Marcial.
Agradecimentos
Paulo Cesar de Freitas - Mestre de Kung Fu • Garra de Águia
Marcus Vinicius Gonçalvez Torres Azevedo - Mestre de Kung Fu • Bêbado
Antônio Muller Telles - Mestre de Kung Fu • Louva-a-deus
Alexander Fonseca Leal - Mestre de Kung Fu • Tai Chi Chuan
Paulo Sérgio de Carvalho Barbosa - Mestre de Kung Fu. • Tigre
Carlos de Oliveira Souza - Mestre de Kung Fu • Wing Chun

Garra de Águia Bêbado Louva-a-deus

Tai Chi Chuan Tigre Wing Chun

Coleção Artes Marciais • Kung Fu


Dedicatória
Dedico esta obra a Deus, o Arquiteto do Universo; às minhas esposas, Ingrid Lilian
Kuentzer; aos meus filhos, Marcus Loren Lopes Torres e Marcio Augusto Lopes Torres;
à minhas secretárias, Eva Simone e Laura Jesus Silva; aos meus companheiros da
Universidade Livre de Terapias Psibioenergéticas, professores Franklin
Ferreira de Souza e Stella Souza Santos.
Meus agradecimentos aos amigos: Mestre Li Hon Ki, pela sua grande amizade;
Marco Natali, pelas diversas obras que escreveu e possibilitaram a divulgação do
Kung Fu em nível nacional; Fábio Bueno; Grandmaster Carlos Silva, André Alex
Lima; e Professor Fabio Roberto Silva da Motta.

Bibliografia
GONZALES, Argimiro e GONZALES, Magali: Quem Foi Bruce Lee. Edições de Ouro
RIBEIRO, Sérgio: Conceitos de Bruce Lee. Edição Independente
LEE, Bruce: O Tao Do Jeet Kune Do. Editora Conrad 97
NATALI, Marco: O Soco De Uma Polegada de Bruce Lee. Edições de Ouro
NATALI, Marco: Vajramushti — a arte marcial dos monges budistas. Edições de Ouro
CORCORAN, John e FARKAS, Emil: Martial Arts: traditions, history, people. Gallery
Books/ New York
Sobre o autor
JOSÉ AUGUSTO MACIEL TORRES é natural de Salvador, capital baiana, onde reside, sendo
praticante de Artes Marciais desde a década de 1970; teve seu início marcial na cidade de
Itapetinga, interior da Bahia, no Karatê estilo Shotokan, supervisionado pelo Sensei Joan Lemos.
Atualmente, é faixa preta em karatê, 5º dan, pela Shotokan Karate International (Ski-Brasil) e
diversas outras entidades nacionais e internacionais e praticante de Taekwondo, Hapkido, Jiu Jitsu
e Aikido.
É presidente da Confederação Brasileira de Karatê de Semi-Contato, Federação Baiana de Kung
Fu e Associação Alakija de Taekwondo Tradicional I.T.F. e vice-presidente do Centro Cultural
Brasil/ China.
É assessor de imprensa da Federação de Jiu Jitsu do Estado da Bahia.
Publicou diversas obras relacionadas às artes marciais e ao orientalismo, tais como: Guia Prático
do Orientalismo; Viva sem dores nas costa; Exercícios Chineses para manutenção da saúde;
Manual de Yôga; Filosofia do Kung Fu, Yôga e Massagem Oriental; Guia do Esoterismo; Dicionário
das Artes Marciais etc.
É diretor-fundador e editor do Jornal Bahia Marcial, desde 1996.
Foi colunista da extinta revista KIAI.
É coordenador e criador dos Programas de instrução para Provisionados (PIP) realizados em
níveis de extensão por faculdades e reconhecidos pelo Conselho Regional de Educação Física da
Bahia e de Sergipe (CREF-13) na cidade do Salvador, e destinados a todos os Provisionados do
sistema CONFEF / CREF no Estado da Bahia (profissionais de artes marciais e de atividades físicas
e esportivas em geral, porém não graduados em Educação Física).
É doutor em Psicologia e Filosofia (Cambridge International University - Inglaterra) e Doutor
Honoris Causas em Medicina Tradicional Chinesa pelas Universidade de Los Pueblos de Europa
(Espanha) e Cambridge International University – (Inglaterra) e Ciências (Universidade de Sri-
Lanka).
Apresentou programa na rádio Cultura AM – Salvador/ Bahia – nos anos de 1995 à 1996,
intitulado “Conversando sobre artes marciais”.
Coordenou e foi professor dos cursos de acupuntura, massagem oriental e quiropraxia, em nível
de extensão universitária, das UNIBA / Centro Cultural Brasil-China em parceria com a Faculdade
Montenegro de Educaçao; Faculdade São Salvador e Faculdade de Ciências da Bahia (FACIBA).
Diretor, coordenador e professor de Filosofia e Psicologia em diversas entidades de Ensino Superior
(Graduação e Pós-Graduação) na cidade de Salvador e Lauro de Freitas (Bahia).
Fundador e reitor-presidente da Universidade Livre de Terapias Psicobioenergérticas (ULTEP) e
Diretor-Geral da Escola Pao Zhe Lin de Formação Profissional, sediados em Salvador/ Bahia.

Contatos com o Prof. Dr. José Augusto Maciel Torres: josemtorres@ig.com.br

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