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Os novos mundos altamente

c o n e c t a d o s do t er ce ir o mil ên io

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Os novos mundos altamente
c o n e c t a d o s d o t e rc ei r o m i l ên i o

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Os novos mundos altamente
c o n e c t a d o s d o t e rc ei r o m i l ên i o

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HIGHLY CONNECTED WORLDS Os novos mundos altamente conectados do terceiro
milênio

Augusto de Franco, 2012.

Versão Beta, sem revisão.

A versão digital desta obra foi entregue ao Domínio Público, editada


com o selo Escola-de-Redes por decisão unilateral do autor.

Domínio Público, neste caso, significa que não há, em relação a versão digital desta
obra, nenhum direito reservado e protegido, a não ser o direito moral de o autor ser
reconhecido pela sua criação. É permitida a sua reprodução total ou parcial, por
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na sua forma original ou modificada – copiada, impressa, editada, publicada e
distribuída com fins lucrativos (vendida) ou sem fins lucrativos. Só não pode ser
omitida a autoria da versão original.

FRANCO, Augusto de

A REDE / Augusto de Franco. – São Paulo: 2012.

72 p. A4 – (Escola de Redes; 8)

1. Redes sociais. 2. Organizações. 3. Escola de Redes. I. Título.

Escola-de-Redes é uma rede de pessoas dedicadas à investigação sobre redes sociais e


à criação e transferência de tecnologias de netweaving.

http://escoladeredes.net

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Sumário

Introdução | 9

Inumeráveis interworlds | 11

Highly Connected Worlds | 13

Interworlds | 17

Pessoa já é rede | 23

Gholas sociais | 27

Pessoas são portas | 31

Anisotropias no campo social | 35

Deformando a rede-mãe | 38

Perturbações no campo social | 45

Destruidores de mundos | 49

Hifas por toda parte | 54

A perfuração dos muros | 57

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A construção de “membranas sociais” | 60

Notas e referências | 65

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Introdução

E naquele instante ele viu o planeta inteiro: cada vila, cada cidade,
cada metrópole, os lugares desertos e os lugares plantados.
Todas as formas que se chocavam em sua visão traziam
relacionamentos específicos de elementos interiores e exteriores.
Ele via as estruturas da sociedade imperial refletidas
nas estruturas físicas de seus planetas e de suas comunidades.
Como um gigantesco desdobramento dentro dele,
ele via nessa revelação o que ela devia ser:
uma janela para as partes invisíveis da sociedade.
Percebendo isso, notou que todo sistema devia possuir tal janela.
Mesmo o sistema representado por ele mesmo e o universo.
Começou a perscrutar as janelas, como um voyeur cósmico.

Frank Herbert em Os filhos de Duna (1976)

MUITOS MUNDOS, ISSO MESMO. Não existe um mundo que se possa


dizer o mundo, a não ser por efeito de hierarquização.

Pensar e falar do mundo é tentar impingir um só mundo. Pois os mundos


são muitos. Um só mundo é uma invenção do broadcasting. Broadcasting

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– um para muitos – é, obviamente, centralização, quer dizer, hierarquia.
Tirem as TVs e as rádios, os jornais e revistas, as agências de notícias,
talvez o cinema e não sobrará mais um só mundo. Sem o broadcasting já
teremos múltiplos mundos: cada qual configurado pelas nossas conexões.
Com a internet esses mundos se multiplicam velozmente, mas não por
difusão e sim por interconexão. Desse ponto de vista, interconnected
networks (internet) é, na verdade, interconnected worlds. E fluzz é o vento
que varre esses inumeráveis interworlds (*).

No mundo hierárquico, não há interface para fluzz. Mas quando fluzz for
do regime dos múltiplos mundos interconectados, esses mundos serão os
novos Highly Connected Worlds do terceiro milênio (**).

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Inumeráveis interworlds

Não havendo um mundo isolado dos demais, o tamanho do mundo de


cada um será função do “vento” (fluzz) que varre seus interworlds

PENSE EM UM MUNDO SEM TV E RÁDIO, sem jornais e revistas, sem


agências de notícias, sem editoras e distribuidoras de livros de domínio
privado e sem cinema. Não, não estamos propondo uma volta à Idade
Média. Teremos telefone, Internet, redes P2P, redes Mesh e qualquer
mídia (sobretudo interativa) não baseada no padrão um-para-muitos
(incluído spaming). Neste caso não haverá mais um (mesmo) mundo para
todos. Sem o broadcasting esvai-se a ilusão de um mesmo mundo para
todos em termos sociais. Ficará claro que cada um tem o seu (próprio)
mundo (em termos sociais). Mas ninguém estará aprisionado no seu
mundo, pois poderá se conectar com outros mundos (os mundos das
outras pessoas). Teremos uma rede de mundos: muitos mundos
interconectados. Quanto maior a interatividade de uma rede de mundos,
mais-fluzz ele – o mundo social configurado por essa rede – será.

Mas... atenção! Quanto mais-fluzz for um mundo, menor (não em termos


geográficos ou populacionais e sim em termos sociais) ele será. Mundos
grandes, nesse sentido, quer dizer, com altos graus de separação, são
mundos menos-fluzz. A interatividade reduz o tamanho do mundo e isso

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não é uma função do número de seus elementos (pessoas e aglomerados
de pessoas) e sim dos seus graus de distribuição e conectividade.

Onde fluzz está mais “ativo”, os mundos se contraem. Há um


amassamento. Small-world networks são efeitos de crunching (um
neologismo cunhado a partir da palavra crunch).

Não havendo um mundo isolado dos demais, o tamanho do mundo de


cada um será função do “vento” (fluzz) que varre seus interworlds. Os
interworlds serão inumeráveis; portanto, a rigor, o mundo de cada um é,
potencialmente, uma série de inumeráveis mundos em interação. Sim,
tudo depende da interatividade. O que significa dizer que não depende da
capacidade ou do esforço de cada um de se fazer ver por muitos. Assim,
nos novos Highly Connected Worlds, gente famosa (poderosa, rica, super
certificada ou titulada, admirada por qualquer outra qualidade intrínseca
massivamente reconhecida ou atribuída externamente à interação), tende
a não ser mais tão relevante. Com isso vai também por água abaixo essa
desastrosa idéia de sucesso, que predominou nos séculos passados,
baseada na capacidade de alguém de se destacar dos demais.

Impelido por fluzz, ninguém se deixará desvalorizar facilmente no circo


global montado para selecionar (e apresentar apenas) algumas atrações e
para polarizar sobre elas a atenção dos demais. Cada qual pode ser a
atração no seu próprio mundo e nos mundos conectados a esse mundo.
Uma aldeia global montada para subordinar os vários mundos a apenas
alguns, dando a impressão de que só estes últimos existem, está com os
dias contados. Teremos inumeráveis aldeias globais.

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Highly Connected Worlds

Seu mundo-fluzz é sua timeline

O ESTILHAÇAMENTO DO MUNDO ÚNICO é uma mudança de época jamais


presenciada pelas chamadas civilizações (patriarcais, guerreiras, quer
dizer, hierárquicas). Os padrões de vida e convivência social estão
mudando. Isso significa que você também está mudando. Porque estão
mudando seus relacionamentos recorrentes: sim, seu mundo-fluzz é sua
timeline. Não, por certo, a timeline do Twitter, mas aquela que rola no
espaço-tempo dos fluxos e que não pode ser captada por quaisquer das
ferramentas digitais p-based disponíveis.

Essa mudança é a rede. À medida que aumenta a interatividade da rede


na qual você está imerso, fenômenos surpreendentes começam a
acontecer. Com a queda brusca dos graus de separação, chegará
rapidamente o dia em que você chamará um taxi em uma cidade de dez
milhões de habitantes e o motorista dirá: “O senhor não é o Steven
Strogatz, que investiga redes sociais e que descobriu que o mundo está
ficando pequeno mais rapidamente do que imaginávamos?”.

Isso, é claro, se você for de fato o Steven Strogatz. Mas, de certo modo, se
você é o motorista que se relaciona (ou que se relaciona com quem se

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relaciona, ou que se relaciona com quem se relaciona com quem se
relaciona) com Steven Strogatz, sobretudo se ele (ou quem se relaciona
com ele) está na sua timeline e você (ou quem se relaciona com você) na
dele, você será um pouco Steven Strogatz (na medida inversa do seu grau
de separação dele): eis o ponto! Tal mudança vai muito além do que
imaginávamos porque você está fazendo parte de um organismo capaz de
inteligência e, quem sabe, de outros atributos ou qualidades que sequer
conseguimos imaginar.

Os Highly Connected Worlds tendem a ser organismos humanos coletivos.


Atenção: superorganismos humanos, não organismos super-humanos!
Eles são os campos para o nascimento do ‘indivíduo social’. Steven
Strogatz fará parte de você e você fará parte dele porque ambos farão
parte de um mesmo organismo, não em termos metafóricos, como
quando usávamos a palavra ‘organismo’ para designar o que
imaginávamos que fosse ‘a sociedade’. Não. Trata-se de um organismo
mesmo. E humano.

O indivíduo social está nascendo agora. Mas ele já estava presente, como
prefiguração, desde o início, quando se constituíram os primeiros seres
humanos. Para lembrar a bela Canción Tonta de García Lorca (1924), nós,
os humanos, só o éramos enquanto estávamos “bordados en la
almohada” da rede-mãe (1).

O indivíduo-social não pôde se consumar como humanidade enquanto


algo estava impedindo: a escassez de conexões, uma escassez
artificialmente introduzida por modos de regulação não-pluriárquicos.

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Fluzz não podia passar. Mas fluzz é empowerfulness. Se fluzz não pode
soprar o corpo não se vivifica.

Essa mudança, todavia, é diferente – e única – em cada mundo. Não, não


é sempre a mesma coisa. Depende de “onde” (ou como) o fluxo (o)corre.
Manoel de Barros (1993) inventou “que um rio que flui entre dois jacintos
carrega mais ternura que um rio que flui entre dois lagartos” (2). Pois é.
No limite, você fará seu mundo. Quer dizer, você (ou você e sua timeline –
o que tende a ser a mesma coisa) será o mundo e os mundos serão tantos
quanto as identidades coletivas que forem usinadas por fluzz.

Isso significa que os Highly Connected Worlds tendem a ser inumeráveis,


assim como serão inumeráveis os interworlds, miríades de interfaces
conectando miríades de mundos e “explodindo como uma ramada de
neurônios”, para lembrar um artigo seminal de Pierre Lèvy (1998) (3).

Em termos tecnológico-sociais, o grande desafio hoje, ao contrário do que


reza a metafísica que esse Mark Zuckerberg – o chefe do Facebook – quer
nos empulhar – para torná-la, a sua plataforma proprietária única, a
própria rede e não mais uma ferramenta –, é construir os inumeráveis
interworlds que serão as novas internets.

O Facebook tem 800 milhões de usuários? É ruim. Seria melhor ter 800 mil
plataformas com mil usuários cada uma, conversando entre si... Tudo que
não precisamos agora é reeditar a ilusão hierárquica de um mundo único.
Uma sociedade em rede é uma configuração de miríades de Highly
Connected Worlds interagentes. Essa é a única mudança verdadeiramente

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sustentável: tudo que é sustentável tem o padrão de rede porque rede é
redundância de processos e abundância (diversidade) de caminhos.

A mudança-que-é-a-rede é fractal, não unitária. A mudança não é a


emergência de muitos mundos locais (que, de resto, sempre existiram),
mas os múltiplos caminhos (que não puderam existir nas civilizações
hierárquicas) entre o local e o global. E ela não se consumará sem essas
“zonas de transição” que são interworlds.

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Interworlds

A nova internet – interconnected networks – são os incontáveis


interconnected worlds

COMEÇA ASSIM: NÃO UMA INTERNET: miríades de internets. Bem, agora


já está melhorando. Mas, como? Não estamos correndo o risco de perder
todas as referências – e, com isso, o sentido – com esse estilhaçamento?

A preocupação com a fragmentação é uma herança típica de um mundo


pouco-fluzz. A totalidade não está dada, tem que ser consumada. E serão
sempre totalidades, no plural. Eins und Alles.

Que se dane se você não terá mais uma grande narrativa, um esquema
explicativo geral. Não havendo um mundo (único), para que precisamos
disso? Por certo, você fica incomodado com a fragmentação desses
inumeráveis mundos que se fazem e liquefazem. Mas esse seu mal-estar
baumaniano (de Zygmunt Bauman) é pura falta de Pó de Flu (aquele “Floo
Powder” inventado por Ignatia Wildsmith, da série Harry Potter de J. K.
Rowling, usado para conexão à Rede do Flu); ou seja, é falta de
interworlds. Trata-se de referenciar o bem-estar na (fluição da) relação,
não na (solidez da) coisa.

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Ainda existem vários obstáculos à uma comunicação, por assim dizer,
“isotropicamente distribuída” (capaz de manter as mesmas propriedades
em todas as direções): a centralização da rede em servidores, provedores,
roteadores, cabos, satélites, torres, mainframes transceptores de ondas
eletromagnéticas, geradores de energia, resfriadores, protocolos de
reconhecimento, trânsito e integração de mensagens; a variedade de
línguas e a falta de tradutores-transdutores universais móveis que operem
em tempo real; a falta de programas de busca inteligente e de criação de
ambientes favoráveis à emergência de conteúdo novo por combinação
não-humana (polinização mútua) de mensagens; a separação entre os
dispositivos tecnológicos e o corpo humano; e a insuficiente interação
entre pessoas e não-pessoas (desde a comunicação com outros seres
sencientes ou coletivamente inteligentes, animados e inanimados, até a
parceria simbiótica com uma variedade de seres vivos).

Para começar: fluzz é obstruído pela centralização das comunicações (pela


difusão centralizada um-para-muitos chamada broadcasting), mas
também pela Internet descentralizada. O grande desafio hoje é construir
os interworlds que são as novas internets. Trata-se de um desafio ao
mesmo tempo social e tecnológico.

Rolou por décadas uma discussão fora de lugar sobre as ameaças da


tecnologia. Muitas pessoas tinham medo de que a tecnologia fosse nos
dominar, nos afastar das outras pessoas, prejudicar nossa saúde física ou
mental ou, até mesmo, inviabilizar a vida humana no planeta.

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Mas, em termos sociais, não há nenhum problema com a tecnologia. O
problema é com a tecnologia que introduz artificialmente escassez
centralizando a rede social e ensejando o controle.

Por certo, os sistemas de dominação não teriam podido se manter sem o


controle dos insumos básicos: a terra, a água, os alimentos e as fontes de
energia. Mas a escassez foi introduzida por um tipo determinado de
tecnologia urbana, hidráulica e agrícola: sem essa escassez (programada,
em certa medida) de recursos sobrevivenciais, esses sistemas de
dominação não teriam podido se reproduzir.

Assim, durante milênios fomos submetidos a tecnologias que viabilizavam


o controle. Por exemplo, o modelo hidráulico redistribuidor de água em
canais de irrigação, construídos e controlados pela tecnologia faraônica,
criava o perigo ao adensar povoamentos em locais de risco, em uma
proporção que ia muito além daquela exercida pela natural atração das
terras mais férteis. O objetivo era o controle. Se o povo não vivesse sob a
ameaça (do perigo), como poderia ser recompensado pela sua
aquiescência, sendo salvo do perigo? E como poderia ser castigado por
sua desobediência à ordem, sendo abandonado ao perigo? (4)

Agora precisamos de tecnologia para viabilizar e acelerar a distribuição da


rede social. Quanto menor a possibilidade de comando-e-controle, mais-
fluzz será essa tecnologia. Isso vale para tudo: energia e matéria, átomos e
bits. E vale também para a comunicação.

Assim como fluzz é obstruído pela centralização das comunicações e pela


Internet descentralizada, ele também é obstruído por todas as

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separações: desde aquelas impostas pela barreira da língua (que separa
pessoas que falam idiomas diferentes), passando pela busca burra (que
separa quem procura de quem gera conhecimento), pelos dispositivos
tecnológicos interativos separados do corpo humano e, inclusive, no
limite, pela separação entre pessoas e não-pessoas.

A barreira da língua é uma das principais remanescências do mundo único


hierárquico. É curioso que, mesmo tendo sido imposto um mundo único,
persistam várias línguas (cerca de 7 mil idiomas). Isso porque o mundo
único não é monocentralizado e sim multicentralizado (ou
descentralizado) em algumas identidades imaginárias (que chamamos de
nações, povos ou culturas sócio-territoriais, dominados hoje por menos de
duas centenas de Estados).

A metáfora bíblica sobre isso é esclarecedora. Na mesma Babel – não em


várias – as pessoas não podiam se comunicar umas com as outras. Não era
um problema de saber interpretar um código, de falar a mesma língua. O
que houve em Babel foi a impossibilidade de um conversar, não porque as
pessoas falassem vários idiomas e sim porque não conseguiam coordenar
mutuamente suas atitudes (o linguajear, na expressão de Maturana, que
pressupõe e exige cooperação) e, desse modo, não se entendiam (sem um
acoplamento estrutural não pode haver comunicação). É a pirâmide (a
topologia centralizada da rede social babeliana) que impede esse (assim
como qualquer outro) conversar. Tal problema só tem solução social, não
tecnológica.

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A solução para Babel é a rede social distribuída. No entanto, o problema
da remanescência de várias línguas, entendidas como idiomas, como
códigos que podem ser traduzidos, tem solução tecnológica. Dispositivos
móveis com programas de tradução simultânea, capazes de receber e
emitir dados e voz, são partes (por aproximação, assimilação ou simbiose)
dessas interfaces complexas que chamamos de interworlds.

A falta de programas i-based de navegação inteligente, da busca


(semântica) à polinização (criativa, ensejadora de múltiplos significados),
também é um obstáculo à interação entre os mundos. Mas tal desafio
pode ser superado caso não se insista em recriar monstruosos sistemas de
gerenciamento do conhecimento (top down) e em arquivar significados
únicos de modo centralizado (como faz, por exemplo, a Wikipedia).

Repetindo: toda tecnologia é bem-vinda, inclusive aquela que modifica os


corpos humanos, desde que possibilite mais distribuição. Há muito tempo
estamos modificando nossos corpos: tomamos inibidores seletivos da
recaptação da serotonina (e. g., fluoxetina) e da fosfodiesterase-5 (e. g.,
sildenafila), injetamos insulina transgênica, fazemos implantes (dentários,
auditivos e inclusive de chips capazes de devolver a visão), inserimos
nanopartículas para corrigir rugas na pele, usamos próteses de todo tipo e
instalamos órgãos ou partes de órgãos internos artificiais. Por que não
poderíamos inserir em nossos corpos outros dispositivos capazes de
ampliar e acelerar a comunicação?

Pode-se argumentar que não temos como saber se, no longo prazo, tudo
isso prejudicará a saúde. Mas também não temos como atestar isso em

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relação à maioria dos medicamentos que tomamos ou das intervenções
médicas que realizamos. Todas essas substâncias e procedimentos, em
certa medida, provocam doenças ou desencadeiam novos padrões de
saúde ou ensejam novos reequilíbrios saúde-doença. Sim, saúde não é
ausência de doenças, mas a estabilidade relativa de um sistema que, se
estiver vivo, estará necessariamente afastado do equilíbrio, convivendo,
portanto, com alterações que convencionamos chamar de doenças (e que
só são chamadas assim do ponto de vista de um padrão de saúde,
baseado em indicadores cujos parâmetros de normalidade são variáveis
com época, lugar, cultura, conhecimento). Só seres inanimados estão
livres de doenças (ainda que as infestações de vírus em seres cibernéticos
também possam vir, coerentemente, a ser encaradas como doenças).

Por outro lado, do ponto de vista biológico, já existe a parceria simbiótica


do corpo humano com outros seres vivos. Somos, na verdade, colônias de
bactérias, comunidades de micro-organismos. Somos os planetas onde
vive boa parte dos seres vivos. Tal parceria está presente no interior de
nossa unidade vital: a célula nucleada é o resultado da associação com um
procarionte que passou a compor o novo organismo por endossimbiose.

Mas todas as tecnologias que podem apoiar, vamos dizer assim, o


surgimento das múltiplas internets distribuídas, não são, elas próprias, os
interworlds que conectam os mundos em rede aqui chamados de Highly
Connected Worlds. Esses interworlds são sociais – fundamentalmente, são
redes sociais – não dispositivos tecnológicos. Ou seja, no limite, os
interworlds são pessoas.

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Pessoa já é rede

Em cada pessoa há algo de seu próximo.


Moises Cordovero (1522-1570) em Tomer Dvora (1588)

Toda pessoa é uma pequena sociedade.


Novalis em Pólen (1798)

Uma pessoa é uma pessoa através de outras pessoas.


(“Umuntu ngumuntu ngabantu”: Máxima Zulu)

Você, o indivíduo, é a massa, o resultado da massa. Em nós, como você


descobrirá se entrar nisso profundamente, estão os muitos e o particular.
Jiddu Krishnamurti em Ojai 1st Public Talk (1944).

Todas as pessoas são feitas de todas as outras pessoas.


http://twitter.com/augustodefranco (08/07/10)

Toda pessoa é uma nova porta que se abre para outros mundos.
John Guare em "Six degrees of separation" Peça na Broadway (1990)

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NOS NOVOS MUNDOS ALTAMENTE CONECTADOS do terceiro milênio,
vida humana e convivência social se aproximarão a ponto de revelar os
“tanques axlotl” onde somos gerados como seres propriamente humanos.
Todos compreenderemos a nossa natureza de “gholas sociais”.

Os tanques onde somos formados como pessoas são clusters, “regiões” da


rede social a que estamos mais imediatamente conectados.

Um tipo especial de ghola: não um clone de um indivíduo, mas um “clone”


de uma configuração de pessoas. Toda pessoa, como dizia Novalis (1798),
é uma pequena sociedade; quer dizer, pessoa já é rede! Pessoa é um ente
cultural que replica uma configuração. É um ghola social.

Em um mundo fracamente conectado, os caminhos são individuais. Cada


pessoa vive sua vida, faz suas escolhas, estabelece suas rotinas e toma
suas iniciativas sob a influência das demais, é claro, mas como se fosse
uma unidade separada. Convive, por certo, com as demais, mas essa
convivência é vivida como distinta daquela outra vida, que seria a sua
própria vida. Pode viver a ilusão de que vive sua vida, fazendo suas
escolhas, estabelecendo suas rotinas e tomando suas iniciativas de modo
autônomo. Pode alimentar a crença de que já surgiu no mundo como
pessoa, quer em virtude de uma instância super-humana que assim a
tenha criado, quer por força da genética (o “sangue”) e das experiências
particulares pelas quais passou logo após seu nascimento (o “berço”).

Em mundos altamente conectados tende a se esvair essa separação entre


vida humana e convivência social. Nossas escolhas racionais raramente
são nossas: reproduzimos padrões, imitamos comportamentos e

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cooperamos com outras pessoas sem ter feito individualmente e
conscientemente tais escolhas. Adotamos princípios, escolhemos
carreiras, compramos produtos e priorizamos atividades em função do
que fazem as pessoas que se relacionam conosco ou que estão ligadas a
nós em algum grau próximo de separação, muitas vezes pessoas que nem
conhecemos (como os amigos dos amigos de nossos amigos).

Vivemos então, cada vez mais, a vida do nosso mundo constituído pela
convivência e não apenas a nossa vida individual. Isso ocorre na razão
direta da interatividade do mundo em que estamos imersos. O fluxo da
nossa timeline pode chegar a atingir tal intensidade ou densidade que, no
limite, não podemos mais afirmar inequivocamente que há um eu que
deseja, julga, raciocina, escolhe e almeja de forma autônoma em relação à
nuvem de conexões que nos envolve. Ao mesmo tempo, sentimos e
sabemos que continuamos sendo uma pessoa, única, totalmente
diferenciada. Mas ao viver a nossa vida (a vida humana única dessa pessoa
que somos), vivemos, na verdade, a convivência (social, também única,
desse mundo construído pelo emaranhado de conexões onde estamos
fluindo e que nos constitui como seres propriamente humanos).

O social passa ser o modo de ser humano nas redes com alta tramatura
dos novos mundos-fluzz. Em outras palavras, passamos a constituir um
organismo humano “maior” do que nós. Passamos a compartilhar muitas
vidas, com tudo o que isso compreende: memórias, sonhos, reflexões de
multidões de pessoas, que ficam distribuídas por todo esse
superorganismo humano. Podemos, como nunca antes, ter acesso
imediato a um conjunto enorme de informações e, muito mais do que

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isso, podemos gerar conhecimentos novos com uma velocidade espantosa
e com uma inteligência tipicamente humana (não de máquinas,
computadores ou alienígenas), porém assustadoramente “superior” a que
experimentamos em todos os milênios pretéritos.

E tudo isso pode ocorrer sem a necessidade de termos consciência


(individual) do que está se passando. Ao viver a vida da rede, apenas
vivemos a convivência: não precisamos mais tentar capturá-la e introjetá-
la, circunscrevê-la ou mandalizá-la para conferir-lhe a condição de
totalidade, erigindo um grande poder interior de confirmação para nos
completar da falta dos outros e nos orientar nos relacionamentos com
eles. Tal necessidade havia enquanto podia haver a ilusão da existência do
indivíduo separado de outros indivíduos; ou quando um (ainda) não era
muitos. Toda consciência é consciência da separação, inclusive a
consciência da unidade, da totalidade, ou da unidade na totalidade, é uma
resposta à separação. No abismo em que estamos despencando ao entrar
em fluzz, não há propriamente isso que chamávamos de consciência.

Como epígrafe de um dos capítulos de "Os filhos de Duna", o escritor de


ficção Frank Herbert (1976) colocou na boca de Harq al-Ada, cronista do
Jihad Butleriano (a guerra ludista contra as máquinas inteligentes) (5):

"O pressuposto de que todo um sistema pode ser levado a funcionar


melhor através da abordagem de seus elementos conscientes revela
uma perigosa ignorância. Essa tem sido frequentemente a
abordagem ignorante daqueles que chamam a si mesmos de
cientistas e tecnólogos".

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Gholas sociais

Um ghola não é um borg

NO UNIVERSO FICCIONAL DE DUNA, obra monumental de Frank Herbert


(1965-1985), os tanques axlotl são mulheres tleilaxu que sofreram um
coma cerebral químico induzido, a par de outras intervenções genéticas,
para servir como usinas de gholas (espécies de clones de uma pessoa
morta a partir de seu material genético). Os Tleilaxu (ou Bene Tleilax) são
uma sociedade fechada de religiosos muito avançados tecnologicamente.

No entanto, os gholas são réplicas que não manifestam automaticamente


as qualidades dos originais. Para tanto eles devem passar por um processo
longo de aprendizagem e devem viver certas experiências (sobretudo de
relacionamento íntimo com seus treinadores) para despertar suas
habilidades.

A leitura das diversas camadas da escritura de Herbert (literal, alegórica


ou metafórica, simbólica etc.) permite um paralelo (meramente evocativo
e para efeitos heurísticos) entre o processo biológico-cultural de clonagem
e aprendizagem de um ghola e o processo social de geração de uma
pessoa (que seria, então, uma espécie de “ghola social”).

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Os “tanques axlotl” onde somos gerados como seres propriamente
humanos seriam os clusters onde convivemos com outras pessoas (seres
que já foram humanizados pelo mesmo processo) a partir do nascimento.
De sorte que não somos humanos apenas por força da genética, da
reprodução ou da hereditariedade biológica (que replicamos como
indivíduos da espécie homo) e sim em virtude da rede social em que com-
vivemos, cuja configuração particular replicamos como pessoas, ou seja,
“gholas sociais”. Aquele que é geneticamente humanizável só consuma tal
condição a partir do relacionamento com seres humanizados. Somos
(enquanto entes culturais) filhos da rede social. E não podemos ser
humanos sem esse tipo de relacionamento. Como reza a máxima Zulu,
“uma pessoa é uma pessoa através de outras pessoas”.

Tudo isso é para dizer que um ghola (social) não é um borg. Mas por que é
tão importante dizer isso?

No universo ficcional de Star Trek os Borgs são uma “raça” alienígena de


ciborgues, humanoides de várias espécies assimilados e melhorados com a
injeção de nanossondas e a aplicação de implantes cibernéticos que
alteram sua anatomia e seu funcionamento bioquímico, ampliando suas
habilidades mentais e físicas.

Quando encontram suas presas - quaisquer membros de outras


civilizações, aos quais andam a cata – os Borg recitam, com algumas
variações, a seguinte litania:

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“Nós somos os Borg. A existência como vocês conhecem acabou.
Adicionaremos suas qualidades biológicas e tecnológicas à nossa.
Resistir é inútil”.

Não existe uma rede social Borg, com algum grau significativo de
distribuição, porque não existe pessoa-Borg. Transformados em indivíduos
substituíveis, os borgs são replicados em série por uma estrutura
fortemente centralizada em sua rainha (sim, o regime é monárquico
absoluto), a única que pode pensar livremente (se é que isso é possível
sem o conversar). Seus cérebros são conectados a uma mente coletiva (a
Coletividade Borg) controlada por um hub central (Unimatrix Um). O
objetivo declarado do povo Borg (que só é um povo naquele particular
sentido original da palavra latina ‘populus’: “contingente de tropas”) é
“aperfeiçoar todas as espécies trazendo ordem ao caos”.

Uma interpretação possível para a metáfora é a seguinte: de certo modo


qualquer pessoa, transformada em peça substituível por uma organização
centralizada (hierárquica), é – em alguma medida – um borg.

Sim, o paralelo é mais fértil do que parece. Dizer que um ghola (social) não
é um borg (biotecnológico), seria como colocar na boca do primeiro – no
dealbar de uma época-fluzz – uma paródia da “saudação” borg como a
seguinte:

Nós somos gholas sociais. Novas possibilidades de existência, até


agora desconhecidas de todos nós, estão sendo abertas. Nossas
qualidades biológico-culturais estão se combinando em novos
padrões sociais. É só preciso deixar-ir.

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A rigor, como uma configuração de pessoas está sempre ligada a outras
configurações, todas as pessoas estão de algum modo emaranhadas no
espaço-tempo dos fluxos (quem sabe não era isso que chamávamos de
humanidade, uma prefiguração). Assim, no limite, todas as pessoas são
feitas de todas as outras pessoas.

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Pessoas são portas

“Toda pessoa é uma nova porta que se abre para outros mundos”

PESSOAS SÃO PORTAS. Abrem caminhos. Na verdade, são caminhos.


Atalhos entre clusters. Pontes. É sempre por meio de uma pessoa que
podemos interagir com quem está em outros mundos.

Isso significa que os interworlds são realmente as pessoas, não um novo


ambiente tecnológico, mas um novo ambiente social com novos recursos
tecnológicos. Esta é uma típica compreensão-fluzz: pessoa não é o
individual e sim o social. Surpreendentemente, em mundos altamente
conectados as novas internets são... as pessoas!

Não, não é somente uma imagem poética. É uma nova compreensão das
potencialidades humanas. Pessoas interagindo são seres humanos. A
partir de certo grau de interatividade, são organismos sociais, quer dizer,
superorganismos humanos.

Quando a tecnologia fornecer os meios para manter as pessoas


continuamente conectadas e para acelerar a interação, ela o fará a partir
dessa possibilidade social. Aliás, foi assim que nasceu a velha Internet:
como percebeu Castells, sua estrutura interativa só foi projetada assim

31
porque as pessoas que a projetaram a projetaram assim (6). E as pessoas
que projetaram a Internet só a projetaram assim – com possibilidade de
interatividade – porque havia tal possibilidade social. Da mesma forma
estão nascendo as novas internets: seja com o aperfeiçoamento dos
dispositivos móveis interativos, seja com implantes bioeletrônicos ou
cibernéticos, enquanto a topologia da rede for mais distribuída do que
centralizada não produziremos borgs, mas gholas-sociais.

Há sempre um risco. O risco de ser borg. A fronteira entre um borg e um


ghola-social é móvel, nebulosa e quase sempre invisível. A hierarquia
produz borgs. As redes humanas distribuídas geram gholas-sociais. Mas a
maioria dos padrões de interação se configura no intervalo entre
centralização máxima e distribuição máxima.

Evitar o risco é refugiar-se na vida individual, escolhendo racionalmente as


interações, sendo seletivo nos relacionamentos, fechando-se ao outro.
Esse é o fracasso de todas as chamadas “pessoas de sucesso”. Fecham-se
à interação com o outro-imprevisível e, ao fazer isso, a despeito de serem
muito conhecidas, obstruem conexões com a nuvem que as envolvem,
desatalham clusters (ao se recusarem a servir como pontes), excluem
outras pessoas do seu espaço de vida e simultaneamente se excluem de
outros mundos, isolando-se do superorganismo humano e deixando de
contar com uma parte (justamente aquela parte inusitada, que os
marqueteiros, os políticos profissionais e os psicólogos sociais tanto
procuram e não conseguem encontrar) das imensas potencialidades do
social.

32
São raríssimas as pessoas de sucesso que se deixam abordar por qualquer
um do povo. Seus endereços, e-mails e telefones são mantidos em sigilo.
Seus ambientes de trabalho são protegidos por porteiros, agentes de
segurança, secretários e assessores. Seus sites e blogs são fechados à
comentários ou mediados. Sua participação nas mídias sociais é sempre
para usá-las como broadcast, para fazer relações públicas e propaganda
de si-mesmas (para ficarem mais famosas e auferirem os benefícios
econômicos, sociais e políticos conferidos diferencialmente a quem
alcançou tal condição).

Isso acaba se manifestando no que acreditam que seja sua vida pessoal,
como indivíduos, supostamente autônomos, tão importantes que não
podem ficar vulneráveis aos paparazzi do relacionamento. Como
consequência começam a desenvolver aquela sociopatia mais conhecida
pelo nome de fama. Na verdade ficam doentes por déficit de
interatividade.

Quem não quer ser porta, não acha caminhos. O sucesso é o melhor
caminho para perder caminhos. A perda de caminhos é também uma
medida de não-rede, ou seja, uma expressão do poder. A contraparte de
querer ser muito importante é a falta de importância para a rede (e não
importa para nada se essas pessoas de sucesso têm milhares ou milhões
de followers nas mídias sociais mais frequentadas ou se seu blog tem
milhares ou milhões de pageviews).

E o risco? Bem, nos Highly Connected Worlds a pessoa é compelida a


correr o risco, a fluir com o curso. Não pode se proteger, se sedentarizar

33
em seu mundo, se agarrar às coisas para tentar permanecer como é ou a
ser mais-do-mesmo (do que já é) em vez de surfar nos interworlds,
navegar, ser nômade, fluzz.

“Se não posso achar o caminho farei um”, escreveu Sêneca (7). Nos novos
mundos-fluzz, seria o caso de dizer: como não há caminho, serei um (uma
porta para outros mundos)

34
Anisotropias no campo social

Os deuses eram ventos.


Arturjotaef em Numância (2010)

Ama-gi é uma palavra suméria para expressar alforria...


Traduzida literalmente significa “retorno à mãe” – na medida em que
os ex-escravos eram “devolvidos às suas mães (i. e., libertados)”.
Acredita-se ser a primeira expressão escrita do conceito de liberdade.
Wikipedia (2010)

NÃO HÁ NADA A FAZER. DEIXEM FLUZZ SOPRAR para ver o que acontece.
(Na verdade, dizer ‘deixem fluzz soprar’ é apenas uma maneira de dizer,
pois fluzz já é o sopro).

Quando fluzz soprar, prá que ensino, prá que escola? Quando fluzz soprar,
para que religião, para que igreja? Quando fluzz soprar, para que
corporação, para que partido? Quando fluzz soprar, para que nação, para
que Estado?

35
Oh! É claro que todas essas instituições perdurarão: como
remanescências. Não serão mais prevalecentes. Aliás, como já se
prenuncia, elas se contaminarão mutuamente: nações serão religiões,
escolas serão igrejas, Estados serão corporações... e tudo será, afinal, o
que é – sempre a mesma coisa: programas verticalizadores que “rodam”
na rede social instalando anisotropias no espaço-tempo dos fluxos.

O cordobés Lucius Annaeus Sêneca (c. 3 a. E. C. – 65) escreveu que “se um


homem não sabe a que porto se dirige, nenhum vento lhe será favorável”
(8). Mas é o contrário. Pouco importa onde está Ítaca. É o vento, soprando
livre sobre a superfície das águas, que constitui o não-caminho (ou
desconstitui todos os caminhos).

Como cantou Konstantinos Kaváfis, “se partires um dia rumo a Ítaca, faz
votos de que o caminho seja longo, repleto de aventuras... Melhor muitos
anos levares de jornada e fundeares na ilha, velho enfim, rico de quanto
ganhaste no caminho, sem esperar riquezas que Ítaca te desse. Uma bela
viagem deu-te Ítaca... Tu te tornaste sábio, um homem de experiência, e
agora sabes o que significam Ítacas” (9).

Manobrando o leme para seguir uma rota já traçada não há como viver
em processo de Ítaca. É preciso deixar-se ao sabor do vento.

Quando o sopro não percorre livremente os mundos é porque houve


direcionamento de fluxo. Pré-cursos foram estabelecidos. Velas foram
orientadas para capturar e condicionar o vento. Em geral isso é feito por
essas intervenções antrópicas resultantes do congelamento de fluxos que
chamamos de instituições (hierárquicas): escolas, ensino, religiões, igrejas,

36
corporações, partidos, nações, Estados. São artifícios para exercer a Força,
ou seja, para impor caminhos.

A pergunta é: quando fluzz soprar, para que forçar? Por isso se diz: não há
nada a fazer (quando fluzz soprar). Não há nada a fazer significa que é
preciso deixar-ir. Ter um comportamento fluzz é deixar-ir. Fluzz não é a
força. Fluzz é o curso.

Impor caminhos é deformar um tecido, perturbar um campo. Se pessoas


interagindo com pessoas são redes, o tecido deformado é sempre uma
rede que se tornou mais centralizada ou menos distribuída. Se o campo
social é composto pelo emaranhado de conexões, a perturbação é sempre
um desemaranhar, de sorte que alguns mundos perderão contato com
outros; ou melhor, deixarão de estar sujeitos às mesmas interações. Se
isso acontece é porque interworlds foram aniquilados.

Quando forçamos um caminho exterminamos mundos (para nós, é claro –


mas o que dá no mesmo, se não podemos mais interagir com eles).
Perdemos então as oportunidades – de que fala o belo poema de Kaváfis –
de “entrar pela primeira vez um porto para correr as lojas dos fenícios e
belas mercancias adquirir” ou de peregrinar naquelas “muitas cidades do
Egito... para aprender”.

37
Deformando a rede-mãe

Na ausência do poder as redes tendem a permanecer distribuídas

A INVESTIGAÇÃO DAS REDES SOCIAIS leva-nos a uma nova hipótese


antropológica: uma outra visão da natureza humana (seja lá o que isso
for), que se afasta do que foi concebido como Homo economicus, para se
aproximar – como sugeriram Christakis e Fowler – do que eles chamaram
de Homo dictyous (do latim homo, “humano”, e do grego dicty, “rede”)
(10).

Indivíduos biológicos da espécie humana se tornam Homo dictyous (seres


humanos), quando interagem. Mas quando interagem constituem rede.
Logo, sem essa rede não podemos ser humanos.

Em outras palavras: se, como pessoas, já somos rede – do contrário não


poderia haver a realidade biológico-cultural que chamamos de ‘ser
humano’ – então, para nós, humanos, no princípio era a rede. Isso significa
que somos “filhos” da rede. Logo, podemos dizer que a rede é a nossa
“mãe”. Ou seja, que existe uma rede-mãe.

A interpretação que revela tal sentido é alegórica ou metafórica. Mas a


metáfora da rede-mãe pode revelar mais coisas do que imaginamos. Ela

38
sugere que, deixados a si mesmos, os humanos farão (ou melhor, serão)
redes em vez de se engalfinharem em uma guerra de todos contra todos
transformando sua vida em uma realidade “solitária, miserável, sórdida,
brutal e curta”, como queria o agourento Hobbes (1651) (11).

Os pensadores e os economistas que cunharam e trabalharam com a


concepção do homo economicus simplesmente partiram desse
fundamento hobbesiano para reificar a existência da abstração chamada
indivíduo. Trata-se de uma visão da natureza humana – na verdade quase
uma tara – baseada no egoísmo, para a qual, como escreveu Hobbes, na
ausência de “um poder que domestique os homens... não há sociedade; e o
que é pior do que tudo, [há] um medo contínuo e perigo de morte
violenta” (12). Vivendo nesse “mundo cão brutal em que a preocupação
com o bem-estar dos outros não existe” (13) existiria, entretanto,
paradoxalmente, o indivíduo enquanto unidade isolada dos outros
indivíduos. Evidentemente, diante de tantos atos gratuitos de colaboração
que praticamos e presenciamos no dia-a-dia, essa construção intelectual
só pode se revelar uma perversão. Daí a tara individualista, tão frequente
e inadequadamente denominada de liberalismo (econômico).

Não há nenhuma evidência científica de que os seres humanos


abandonados à sua própria sorte (como se pudesse haver outra sorte...)
poriam fim à sua convivência. As evidências apontam justamente o
contrário. Não havendo motivo para guerrear, as pessoas – seguindo o
fluxo da vida – viveriam sua convivência – ou seja, viveriam em rede.
Como disse Lynn Margulis (1986): “A vida não se apossa do globo pelo
combate, mas sim pela formação de redes” (14).

39
A alegação de Hobbes de que é o poder que evita a destruição coletiva
deve ser invertida. Quando há poder, aí sim, é porque houve motivo para
guerrear e a convivência fica ameaçada.

Na ausência de um poder que as domestique (para insistir na expressão de


Hobbes), pessoas interagindo com pessoas tendem a configurar redes
distribuídas em pequenos grupos, só não o fazendo, em grupos maiores,
em virtude da falta de condições biológicas ou tecnológicas de
interatividade ampliada e à distância. Não haveria motivo para obstruírem
fluxos, separarem clusters ou excluírem nodos dessas redes (que é,
exatamente, o que faz o poder), a menos que queiramos lançar mão de
uma hipótese religiosa para vaticinar que o homem é inerentemente
competitivo (ou em parte competitivo, por sua própria natureza – seja lá o
que isso for). Tal hipótese é absurda neste contexto porque pressupõe
que possam existir seres humanos (entes biológico-culturais) como entes
(biológicos) isolados.

Mas não existe no ser humano nenhum atributo cultural


(comportamental) que se possa dizer inerente. A “natureza” do Homo
dictyous – se é que se pode afirmar que exista uma ‘natureza da cultura’ –
é relacional.

Todo poder acarreta anisotropias no espaço-tempo dos fluxos


(verticalizando a rede). E é por isso que o poder se define como uma
medida de não-rede (em termos de rede distribuída) (15). Na ausência do
poder (centralização) a rede tende a permanecer distribuída. Podemos
dizer que o bios (Basic Input-Output System) pré-gravado lá no firmware

40
da rede-mãe não é um programa verticalizador (centralizador) pelo
simples motivo de que não há qualquer razão para sê-lo. Nesse caso, o
que precisa ser explicado é o processo de centralização, não o estado de
distribuição. São os obstáculos colocados à livre convivência que precisam
ser justificados, não a convivência.

Por certo a rede-mãe não permanece com topologia distribuída na


presença de programas verticalizadores. Aqui é um daqueles casos – mais
comuns do que se pensa – em que o software modifica o hardware (como
quando aprendemos uma língua e alteramos para tanto nossas conexões
neuronais). Programas verticalizadores deformam a rede-mãe, sejam
programas meméticos (como os que chamamos de deuses – quando lhes
atribuímos atributos super-humanos), sejam programas organizacionais
(que rodam comandos de ordem, hierarquia, disciplina e obediência –
como escolas, igrejas, partidos, corporações, Estados e outras instituições
assemelhadas com todos os seus aparatos). No interior e no entorno
dessas organizações hierárquicas o campo social é profundamente
perturbado. O espaço-tempo dos fluxos é deformado obrigando as
fluições a percorrerem caminhos estranhos. A interação é disciplinada
sem qualquer outra razão que a de manter tais estruturas monstruosas
funcionando e se reproduzindo. A imagem da Fig. 2 é aterrorizante.
Lembra à primeira vista aquelas naves de alienígenas predadores do filme
de Roland Emmerich (1996) Independence Day. Talvez não por acaso:
organizações hierárquicas de seres humanos geram seres não-humanos.
Mas se trata apenas de uma outra maneira de representar o diagrama (B)
de Paul Baran (1964) exposto na Fig. 1.

41
Fig. 1 | Diagramas de Paul Baran

Fig. 2 | Organograma de uma organização hierárquica

42
Se o fluxo deixar de ser aprisionado, orientado, conduzido, compelido a
escorrer pelas valetas cavadas para pré-traçar caminhos (eliminando
outros caminhos), a rede-mãe volta à sua topologia distribuída. É curioso
que a primeira expressão escrita do conceito de liberdade – a palavra
suméria Ama-gi – signifique literalmente “retorno à mãe”.

Por isso se diz: quando fluzz soprar, prá que ensino, prá que escola?
Quando fluzz soprar, para que religião, para que igreja? Quando fluzz
soprar, para que corporação, para que partido? Quando fluzz soprar, para
que nação, para que Estado?

Um sinal de que fluzz está soprando é que tais instituições estão se


misturando e se confundindo, quer dizer, está ficando cada vez mais claro
que elas são aspectos das mesmas deformações ou do mesmo tronco de
programas verticalizadores que “rodam” na rede social provocando
anisotropias no espaço-tempo dos fluxos.

É assim que as perturbações no campo social que geram religiões revelam-


se as mesmas que geram nações. De sorte que, nos múltiplos mundos
altamente conectados que estão emergindo, os nômades optarão por essa
ou aquela nação por mera preferência individual, como há bastante
tempo já fazemos com as religiões que professamos quando nos
convertemos depois de adultos. Alguém preferirá ser brasileiro por
simpatia ou por outras razões afetivas, empáticas ou culturais; outro, por
razões análogas, preferirá se identificar com uma região ou cidade: será
californiano ou cidadão-cultural de Lyon.

43
Da mesma forma, ao renunciar a igrejas muitas pessoas retirarão também
seus filhos das escolas (compreendendo que as duas coisas são – na
condição de centros de deformação da rede-mãe ou de fontes de
perturbação no campo social – basicamente a mesma coisa). O
movimento do homeschooling já começou e avançará para o
communityschooling (na linha do unschooling). Comunidades de
aprendizagem em rede tendem a florescer e se multiplicar nos Highly
Connected Worlds substituindo as atuais burocracias do ensinamento
(chamadas de escolas).

Ainda: Estados (nacionais) dividirão com corporações (transnacionais) o


controle dos fluxos econômicos e políticos mundiais globalizados e essa
pulverização (dos 193 exemplares atuais do modelo europeu de Estado-
nação – um anacrônico fruto da guerra, da paz de Westfalia – para
milhares de centros com autonomia crescente), dará margem à
configuração de novos modelos glocais de governança baseados no
localismo cosmopolita de miríades de cidades como redes de
comunidades interdependentes.

É claro que todas as velhas instituições perdurarão vestigialmente, como


remanescências do mundo único. Não serão destruídas, simplesmente se
tornarão inadequadas por não suportarem a fluição de alta intensidade
que atravessará os interworlds dos mundos altamente conectados do
terceiro milênio.

44
Perturbações no campo social

A nuvem que envolve-e-se-move-com uma pessoa conectada tem a


capacidade de “sentir” perturbações no campo social

WALTER ROBINSON (2008), também conhecido por Ritoku – um zen-


budista que dá aulas de filosofia na Universidade de Indiana – escrevendo
“Morte e Renascimento de uma Mente Vulcana”, observa que “Vulcanos
têm “sete sentidos”, que incluem os cinco sentidos conhecidos pelos
humanos e um sexto sentido animal, que é “a habilidade de sentir a
presença de distúrbio em campos magnéticos” (16).

A metáfora, se não cai como uma luva, serve aos propósitos da presente
digressão. Por certo, admitir a hipótese e trabalhar com o modelo de
perturbações no campo social pode ser mais fácil do que sentir essas
perturbações. Não é preciso ir muito longe para saber se um campo social
foi deformado: basta entrar em uma organização hierárquica; por
exemplo, basta visitar uma instituição estatal ou uma grande empresa
para constatar com que intensidade o “campo gravitacional” em torno dos
chefes modifica a estrutura do espaço (no caso, do espaço-tempo dos
fluxos). Os fluxos se abismam nesses buracos negros. Eles são sumidouros,
engolidouros, alçapões de fluxos.

45
Tão forte às vezes é a gravitatem dos hierarcas que a deformação do
campo social sob sua influência alcança até mesmo os stakeholders
externos da organização, transbordando para seu entorno. É por isso que
uma grande empresa ou corporação, em uma pequena localidade na qual
não existam outras organizações de mesmo porte, em vez de – como se
acreditava – impulsionar seu desenvolvimento, faz o contrário: extermina
o capital social local (quer dizer, centraliza a rede social). Existem
exemplos à farta.

Nas organizações altamente centralizadas, as pessoas perdem a


capacidade de ser elas mesmas (à medida que cresce sua porção-borg
diminui a sua dimensão de pessoa, quer dizer, sua porção ghola-social).
Vestem sempre uma espécie de farda; mesmo nas organizações civis que
não usam uniformes elas se uniformizam interiormente. E até
exteriormente: não raro preferem roupas que escondem o corpo e os tons
de cinza para o vestuário. No exercício continuado da servidão voluntária,
autolimitam suas potencialidades escondendo-se na penumbra das
rotinas e optando por não se aventurar na claridade do ato inédito. Fazem
tudo – sobretudo o que delas não é explicitamente exigido, eis o ponto! –
para se submeter ao sistema e aos seus chefes.

E há uma reverência indevida, uma espécie de sujeição, quase uma


genuflexão psicológica quando alguém se dirige a algumas dessas
encarnações de Dario (aquele monstro Darayavahush, um rei-borg que,
após perpetrar um golpe de Estado, dominou os persas entre 521 e 486 a.
E. C. exigindo-lhes prosternação física à sua passagem).

46
Ésquilo (427 a. E. C.), em Os Persas – talvez a primeira obra escrita em que
se menciona a democracia dos atenienses como realidade oposta a
daqueles povos que têm um senhor – descreve bem a deformação do
campo social sob o domínio da sombra de Dario (17). O regime
monstruoso não tinha, ao contrário do que se propagou, grandes
vantagens militares. Os persas foram rechaçados pelos irreverentes,
insolentes e mais livres atenienses e seus aliados na planície de Maratona
(em 490). Sim, mas o que é realmente monstruoso é que tal programa
(que poderia ser chamado, em homenagem a Ésquilo, de A Sombra de
Dario) – instalado quase três milênios antes de Dario – continue a rodar...
quase três milênios depois!

Todavia, essas deformações já começam a ser sentidas. Um sexto sentido


humano-social está surgindo nos Highly Connected Worlds. Não é
propriamente um sentido individual. A nuvem que envolve-e-se-move-
com uma pessoa conectada tem a capacidade de “sentir” perturbações no
campo social. Uma rede altamente distribuída rechaçará de pronto,
mesmo que seus membros não tenham consciência disso, quaisquer
tentativas de comando-e-controle. Eis porque burocratas sacerdotais do
conhecimento ou ensinadores, codificadores de doutrinas, aprisionadores
de corpos, construtores de pirâmides, fabricantes de guerras e condutores
de rebanhos não se dão muito bem em redes sociais distribuídas e, nem
mesmo, nas mídias sociais, quer dizer, nas plataformas interativas que são
utilizadas como ferramentas de netweaving dessas redes. Porque são,
todos, netavoids.

47
Esta é uma das razões – até agora muito pouco compreendida – pelas
quais o comando-e-controle, além de não poder se exercer, também não
se faz necessário em uma rede distribuída (na medida, é claro, do seu grau
de distribuição). Dizer que o emaranhado “sente” quer dizer que ele
detecta distorções. Mais do que isso: primeiro ele encapsula e depois
acaba metabolizando as fontes de perturbações que causam anisotropias
no espaço-tempo dos fluxos. E são esses incríveis seres sociais que
chamamos de pessoas que sentem isso: ainda quando não saibam explicar
os motivos dessa sensação, elas (as pessoas) percebem que “alguma coisa
está errada” quando aparece um daqueles netavoids, ou um arrivista (ou
mesmo um troll, nas mídias sociais).

É a rede-mãe se defendendo. Mas ela nem sempre consegue fazer isso.

48
Destruidores de mundos

Persistimos erigindo organizações que não são interfaces adequadas


para conversar com a rede-mãe

DARAYAVAHUSH É UM DESTRUIDOR DE MUNDOS. Joseph Campbell diria


que ele representa “uma força monstruosa, a força do Império, que se
baseia na intenção de conquistar e comandar” (18). Como aquele Darth
Vader do primeiro episódio da série que veio à luz – Uma Nova Esperança
(1977) –, na decifração de Joseph Campbell (1988), ele não é uma pessoa.
É um programa malicioso que se instalou na rede. Um programa
verticalizador.

Não, não estamos tratando propriamente da figura histórica de Dario, o


homem que governou a Pérsia. Todos os hierarcas – inclusive o próprio
Dario – replicam o mesmo padrão Darth Vader porque estão
emaranhados em configurações deformadas da rede-mãe, com
deformações semelhantes. Qualquer um, inserido em sistemas com tais
configurações, manifestará – em alguma medida – características de
Darayavahush. E será em alguma medida destruidor de mundos. Na
verdade, aniquilará interfaces (interworlds) estreitando o fluxo das
interações, impedindo que pessoas se conectem livremente com pessoas.

49
É por isso que organizações hierárquicas têm tanta dificuldade de gerar
pessoas.

Sim, gerar pessoa é um processo contínuo que não se dá no nascimento e


nem apenas logo após o nascimento, mas prossegue por toda a vida (a
com-vida, quer dizer, aquela ‘vida social’ que se realiza quando vivemos a
convivência). É algo assim como o que certas tradições espirituais
chamaram de formação da alma humana: um veículo para “atravessar a
morte” (em vez de tentar evitá-la, querendo ser imortal: o motivo da
criação dos deuses à imagem e semelhança dos hierarcas) aceitando o
fluxo transformador da vida.

Para continuar com o paralelo, se a alma humana é formada com a


energia da compaixão, obtida nos atos gratuitos de valorizar a vida,
compartilhar o alimento, aliviar os sofrimentos e promover a liberdade,
Darth Vader não tem alma porque, ao invés de formá-la, criou um veículo-
substituto para escapar de fluzz: sua nave-simulacro é feita com a energia
da violência, obtida nos atos instrumentais de tirar a vida, se apoderar dos
recursos vitais, infligir sofrimentos e, sobretudo, eliminar caminhos (pela
imposição da ordem).

Nas organizações hierárquicas, um processo intermitente de


despersonalização é posto em marcha quando obstruímos fluxos,
separamos clusters e excluímos nodos. O resultado de tal processo
poderia ser interpretado, lançando-se mão de nossa metáfora, como uma
perda de contato com a rede-mãe. É por isso que nossas organizações de
todos os setores têm tanta dificuldade de contar com (a adesão voluntária

50
das) pessoas. A reclamação geral é sempre a de que “as pessoas não
participam”. Imaginam alguns que o motivo dessa dificuldade seria a
visão, a missão, a causa da organização ou do movimento, avaliadas então
como incapazes de empolgar mais gente, porém a verdadeira razão está
na deformação da rede. As pessoas sentem – mesmo quando não
conseguem explicitar racionalmente seus motivos – que não lhes cabe
entrar em um espaço já configurado de uma determinada maneira. Não
querem ‘participar’ (tornar-se partes ou partícipes de alguma coisa) nos
termos estabelecidos por outrem, senão ‘interagir’ nos seus próprios
termos. Mesmo assim, persistimos erigindo organizações que não são
interfaces adequadas para conversar com a rede-mãe. Porque
continuamos criando obstáculos à livre conversação entre pessoas.

Pessoas conversam com pessoas. Redes conversam com redes.


Organizações hierárquicas não podem conversar com redes.

Organizações hierárquicas (ou com alto grau de centralização) têm


imensas dificuldades de provocar mudanças sociais no ambiente onde
estão imersas. A rede social que existe independentemente de nossos
esforços conectivos – ou que existiria se tais esforços não fossem
verticalizadores; quer dizer, o que chamamos aqui de rede-mãe – não
recebe bem a influência dessas organizações e continua funcionando mais
ou menos como se nada tivesse acontecido.

É o que ocorre quando ouvimos relatos de organizações sociais


profundamente dedicadas ao trabalho comunitário. Seus dirigentes
reportam que estão lutando há anos, com grande afinco, em uma

51
determinada localidade, mas a impressão que têm é a de que seus
esforços não adiantam muito. O povo não reconhece o seu papel, as
relações não mudam, parece que tudo continua como d’antes...

Se formos analisar as circunstâncias da atuação dessas organizações de


base, veremos que elas terão um alto grau de centralização (ou um grau
de enredamento insuficiente). É um problema de comunicação. A rede
social que existe de fato naquela localidade não está reconhecendo as
mensagens emitidas pela organização. É muito provável que essa
organização esteja estruturada e funcione como uma pequena fortaleza,
um castelinho, uma igrejinha... É muito provável que ela faça parte da
‘nova burocracia das ONGs’, ou seja, que tenha dono, chefe, diretoria – às
vezes até familiar – com baixíssimo grau de rotatividade (menor ainda do
que o dos partidos e organizações corporativas). É muito provável que
seus chefes queiram se eternizar no poder (no caso, um micro-poder, é
verdade, mas todo poder hierárquico, vertical, seja grande ou pequeno, se
comporta mais ou menos da mesma maneira, sempre a partir do poder de
excluir o outro...) porque precisem (ou imaginem que precisem) auferir o
crédito ou obter o reconhecimento social pela sua atuação.

Se essa organização que não consegue boa comunicação com a rede-mãe


for uma corporação ou partido, será bem pior. Ela estará estruturada a
partir de um impulso privatizante, seja com base no interesse econômico,
seja com base no interesse político de um grupo particular que quer
manobrar o coletivo maior em prol de sua própria satisfação. A rede social
não-deformada é sempre pública. Mas as interfaces hierárquicas que
construímos para conversar com ela ou para tentar manipulá-la são

52
sempre privadas, mesmo quando urdimos teorias estranhas para legitimar
a privatização, como aquela velha crença de que existem interesses
privados que, por obra de alguma lei sócio-histórica, teriam o condão de
se universalizar, quer dizer, de universalizar o seu particularismo quando
satisfeitos.

Só há uma maneira de conseguir uma boa comunicação com “a matriz”.


Copiando-a o mais fielmente que conseguirmos; ou seja, construindo
interfaces – redes voluntárias – com o maior grau de distribuição que for
possível. Quanto mais distribuídas forem as redes que construirmos para
copiar a rede-mãe melhor será a comunicação com ela.

Nos novos mundos altamente conectados que estão emergindo ficará


cada vez mais difícil recrutar, arrebanhar, enquadrar ou aprisionar pessoas
em organizações erigidas com base na seleção de caminhos válidos (ou na
normatização de caminhos inválidos). Desde que tenham essa
possibilidade, as pessoas perfurarão os muros, abrirão continuamente
seus próprios caminhos mutantes e – na sua jornada para Ítaca –
peregrinarão para aprender naquelas “muitas cidades do Egito...”

53
Hifas por toda parte

Toda rede miceliana é um clone fúngico,


o filho distante de uma única linhagem genética.
Acima do solo, os fungos produzem esporos que flutuam no ar...
Quando pousam, os esporos crescem onde quer que seja possível.
Fazendo brotar redes tubulares, as hifas...
os fungos produzem quantidades copiosas de esporos,
os quais se disseminam, espalhando sua estranha carne...
Lynn Margulis e Dorion Sagan em O que é vida? (1998)

Jericó estava fechada por causa dos israelitas.


Ninguém saía ninguém entrava...
O Senhor disse então a Josué:
“No sétimo dia... os sacerdotes tocarão as trombetas...
Quando ouvirdes o som da trombeta,
o povo lançará um grande grito;
o muro da cidade virá abaixo, o povo subirá,
cada um à sua frente.
Josué 6: 1-5

54
ENQUANTO ISSO, PORÉM, CRESCEM SUBTERRANEAMENTE AS HIFAS, por
toda parte. Os alicerces das organizações hierárquicas vão sendo
corroídos e seu muros, antes paredes opacas para se proteger do outro,
vão agora virando “membranas sociais”, permeáveis à interação e
vulneráveis ao outro-imprevisível. Pessoas conectadas com pessoas vão
tecendo articulações que estilhaçam o mundo-único-imposto em miríades
de pedaços, não pelo combate, mas pela formação de redes. E outras
identidades – mais-fluzz – vão surgindo nos novos mundos altamente
conectados do terceiro milênio.

Não se decepcione: provavelmente você não vai ver nada mesmo! As hifas
crescem, em geral, abaixo do solo. Os esporos espalham-se pelo ar, mas
são tão pequenos que a gente nem percebe.

Quando você notar as consequências, aí não adiantará mais se


desesperar. Pois se o processo, por enquanto, ainda é lento e invisível (em
parte “aéreo”, em parte “subterrâneo”), seus desfechos poderão ser bem
concretos e fulminantes nos mundos em que ocorrerem.

Nos Highly Connected Worlds não há como fechar nada. Trancar, chavear,
cerrar as fronteiras, isolar por meio de paredes opacas não é a solução
para manter a identidade ou preservar a integridade de nenhum
aglomerado. Quando os fluxos aumentam de intensidade, os muros não
conseguem mais contê-los.

Parece que a vida “sabia” disso: tanto é assim que não encerrou seu
“átomo” (a célula) em nenhuma estrutura fechada, separando-o do meio
com paredes opacas: antes, construiu membranas – uma interface de

55
sustentabilidade, um convite à conexão. Um convite ao sexo, já que
estamos agora explorando um paralelo biológico: nos fungos – que são
“organismos realmente fractais”, como percebeu a bióloga Lynn Margulis
(1998) – o ato sexual (chamado de conjugação) é uma conexão (19).

Muros caindo por toda parte anunciarão “membranas sociais” surgindo


por toda parte. Ou não: o que não virar “membrana social” será
escombro.

O que as hifas – esses filamentos ou tubos finos que formam a estrutura


em rede dos fungos – têm a ver com isso? Ora, tudo. Pois são elas (ou o
processo espelhado, em termos biológicos, pela clonagem fúngica) que
estão operando tal mudança.

56
A perfuração dos muros

Quando a porosidade aumentar, os muros vão começar a ruir

EIS COMO PAREDES OPACAS vão se tornando inadequadas para conter o


fluxo: elas vão sendo perfuradas por hifas. Essa possibilidade existe
concretamente desde que os subordinados em uma organização
hierárquica não podem mais ser proibidos de se conectar com quem está
do lado de fora do muro pelas polícias corporativas (os departamentos de
segurança, os departamentos de pessoal e, inclusive – e hoje
principalmente –, os departamentos de tecnologia da informação).

O aprisionamento de corpos e sua contenção física em prédios fechados,


com salas e andares isolados um dos outros, controlados por portarias ou
por barreiras eletrônicas que não deixam passar quem não tem o código
válido no seu cartão magnético funcional, já não resistem adequadamente
a aglomeração física não-prevista pelos protocolos de segurança; por
exemplo, dos amigos que se encontram após o expediente em bares,
restaurantes, shoppings e em suas próprias casas, ou até mesmo dos
fumantes que são obrigado a se encontrar na rua, do lado de fora das
sedes, por imposição legal. E muito menos é capaz de resistir à
comunicação à distância, por celular, e-mail, pelos programas de

57
mensagens e comunicação instantânea ou pelos sites de relacionamento
na Internet.

É inútil proibir e não há como manter uma vigilância eficaz. Os


departamentos de tecnologia da informação (TI) podem tentar barrar
(como ainda insistem em fazer) o acesso às chamadas mídias sociais e aos
vários serviços de comunicação web na sua própria rede de
computadores, mas qualquer um que tenha um celular (3G, equivalente
ou sucedâneo), ou melhor, um dispositivo móvel de interação conectado à
Internet ou conectável a outros dispositivos por rádio (incluindo bluetooth
quando seu alcance for ampliado) já pode – ao mesmo tempo em que
trabalha (ou finge que trabalha) em uma empresa fechada – desenvolver
outros projetos conjuntos com pessoas de outras empresas fechadas,
inclusive concorrentes (20).

Tudo isso aumenta a porosidade dos muros. À medida que a porosidade


aumentar, os muros vão começar a ruir.

Só então as organizações fechadas se darão conta de que estão


irremediavelmente vulneráveis à interação e correrão desesperadas atrás
das membranas. Aí já poderá ser tarde: uma membrana é um dispositivo
ultracomplexo, que só pode ser construído pela dinâmica de um
organismo vivo em interação com o meio, com outros organismos e partes
de organismos.

Uma empresa que não aprendeu a se desenvolver conversando com as


outras empresas por medo de perder mercado ou de ter roubadas as suas

58
inovações ou seus funcionários, não conseguirá, da noite para o dia, fazer
uma reengenharia de suas, por assim dizer, boundary conditions.

Uma corporação que insistiu em manter intranets mesmo depois de ter


sido inventada a Internet, dificilmente estará preparada para operar, em
tempo hábil, tal mudança.

59
A construção de “membranas sociais”

Deixar a interação pervadir um sistema não significa propriamente fazer,


mas – ao contrário – não-fazer: não proibir, não-selecionar caminhos...

A DERRUIÇÃO DOS MUROS não esperará que os sacerdotes toquem as


trombetas em Jericó (se bem que na saga bíblica de Josué foi o grito em
uníssono do povo que derrubou as muralhas que trancavam a cidade). De
qualquer modo, não há mais tempo para aprender a construir verdadeiras
membranas. Na verdade, membranas não podem ser construídas, stricto
sensu, como um ato voluntário de alguém que segue uma planta, um
projeto, um esquema. As membranas são “construídas” pela interação
biológica, elas surgem em função da autopoese: da produção contínua da
vida por ela mesma.

No caso das membranas celulares (plasmalemas), sua estrutura e


funcionamento complexos dependem da dinâmica de rede, de redes
dentro de redes, com canais proteicos (proteínas de transporte – espécies
de atalhos entre clusters) que atravessam suas camadas, passando por
numerosos arranjos moleculares (21) até chegar, na interface com o
citoplasma, a um emaranhado de “hifas” composto por filamentos e
microtúbulos de citoesqueleto... tudo isso fluindo (imerso em fluido
extracelular). E tudo isso com a função de ser uma porta seletiva que a

60
célula usa para captar os elementos do meio exterior que são necessários
ao seu metabolismo e para liberar as substâncias que a célula produz e
que devem ser enviadas para o exterior (excreções que devem ser
libertadas e secreções que ativam várias funções de seus, por assim dizer,
“stakeholders externos”).

Esse produto de bilhões de anos de evolução biológica funciona, é claro,


como um sistema não-hierárquico, sem-administração, auto-organizado
para permitir o que chamamos de vida e não pode ser substituído por
cancelas corporativas que sigam protocolos alfandegários burros,
destinados a disciplinar a interação.

Seria inútil simular, nas organizações que voluntariamente construímos,


mecanismos semelhantes às membranas celulares. E nem seria o caso de
tentar fazê-lo, abusando do paralelo biológico. O que se deve captar aqui
é o padrão, não reproduzir o mecanismo ou simular o organismo. E o
padrão é o padrão de interação em rede.

“Membranas sociais”, seja o que forem (e como forem), serão sempre


redes (mais distribuídas do que centralizadas), interfaces. A única solução-
fluzz parece ser articular comunidades móveis (no ecossistema composto
pelos stakeholders da organização) e deixar a interação configurar tais
interfaces, esperando que elas cumpram funções equivalentes, no mundo
social, às que são desempenhadas pelas membranas celulares no mundo
biológico.

Na verdade, ao estabelecer contornos, estabelece-se a estrutura e a


dinâmica do que está dentro dos contornos. Membranas são o que são (e

61
como são) porque os meios que elas conectam são o que são (e como
são). Mas tais meios são, eles próprios, constituídos pela interação, quer
dizer, não se constituem como tais antes da interação. A membrana é um
sistema complexo porque é, simultaneamente, uma interseção de
conjuntos, uma zona de transição entre um ser e os outros seres nos quais
se insere (ou, mais genericamente, com os quais interage), uma forma de
ligação ou uma espécie de conjunção.

Ainda não sabemos muito sobre membranas e, sobretudo, sobre


“membranas sociais”. Algumas coisas, porém, já sabemos. Sabemos, por
exemplo, que deixar a interação pervadir um sistema não significa
propriamente fazer, mas – ao contrário – não-fazer: não-proibir, não-
selecionar caminhos (estabelecendo apenas alguns caminhos,
proclamando-os como válidos e exterminando todos os demais caminhos,
decretando-os inválidos); fundamentalmente, não gerar artificialmente
escassez (22).

Sabemos também que as interfaces devem ser sociais stricto sensu e não
organizacionais (em termos das teorias da administração baseadas em
comando-e-controle). Ou seja, devem ser baseadas na livre conversação
entre pessoas e na sua espontânea clusterização e não na designação, ex
ante à interação, de caixinhas departamentais para alocar essas pessoas.
Simples assim? É, mas a conversação é algo bem mais complexo do que
parece. E os novos procedimentos e mecanismos, os novos processos de
netweaving e as novas tecnologias interativas que inventamos para
viabilizar e potencializar a conversação, alteram completamente o
multiverso das interações que chamamos de social.

62
“Membranas sociais” são interworlds. Ao constituí-las multiplicamos os
mundos, dando origem – se quisermos fazer uma comparação
quantitativa para efeitos ilustrativos – a bilhões de organizações (em vez
de milhões que existem atualmente). Uma mesma pessoa participará de
muitas organizações, comporá numerosas empresas, entidades,
movimentos, enfim, redes – pois tudo isso é válido, claro, na medida em
que tudo for rede. Para tanto, não será necessário fazer quase nada
adicionalmente ao que já se faz hoje. Bastará não proibir a conexão, não
querer disciplinar a interação.

Um bom exemplo, hoje, são as plataformas interativas digitais, chamadas


de “redes sociais”. A quantas “redes sociais’” alguém pertence (ou seja,
em quantas mídias sociais está registrado)? O número é grande e só tende
a crescer.

Os emaranhados se adensarão a tal ponto, as timelines ficarão tão


caudalosas, que as identidades organizacionais não se manterão por
muito tempo. Despencaremos da escala de décadas e anos (que é a vida
média da imensa maioria das organizações que ainda temos) para a escala
de meses e dias (ou, quem sabe, de horas e minutos).

Não é bem como disse Andi Warhol (1968) – “no futuro todo mundo será
famoso por quinze minutos” – mas é parecido (23). Não é bem como ele
disse porque ninguém será muito famoso, no sentido de visto por todo
mundo, porque não haverá mais o mundo único forjado pelo
broadcasting. Mas é parecido porque no futuro (um conceito que também
será aposentado, de vez que não haverá mais um futuro único, um mesmo

63
futuro para todos), as organizações serão sempre transitórias, estarão
sempre fluindo para configurarem outras organizações e uma mesma
configuração não poderá perdurar por muito tempo.

É assim porque redes são móveis. Novamente as mídias sociais oferecem


uma boa imagem do que ocorre. Sites de relacionamento e plataformas
interativas nunca são as mesmas ao longo do tempo e a velocidade com
que mudam (em anos, dias ou horas) é função da sua interatividade. O
exemplo mais flagrante é o twiver (as centenas de milhões – que logo
serão bilhões, se considerarmos os sucedâneos do Twitter – de timelines
fluindo no twitter-river).

Onde e quando tudo isso vai acontecer? Vai acontecer nos Highly
Connected Worlds do terceiro milênio. Para aqueles mundos que já estão
no terceiro milênio.

64
Notas e referências

(*) A palavra ‘fluzz’ nasceu de uma conversa informal do autor, no início


de 2010, com Marcelo Estraviz, sobre o Buzz do Google. O autor
observava que Buzz não captava adequadamente o fluxo da conversação,
argumentando que era necessário criar outro tipo de plataforma (i-
based e não p-based, quer dizer, baseada em interação, não em
participação). Marcelo Estraviz respondeu com a interjeição ‘fluzz’, na
ocasião mais como uma brincadeira, para tentar traduzir a idéia de
Buzz+fluxo. Ulteriormente a idéia foi desenvolvida no livro-mãe Fluzz: vida
humana e convivência social nos novos mundos altamente conectados do
terceiro milênio (2011) e passou a não ter muito a ver com o programa
mal-sucedido do Google. Fluzz (o fluxo interativo) é um conceito
complexo, sintético, que talvez possa ser captado pela seguinte passagem:
“Tudo que flui é fluzz. Tudo que fluzz flui. Fluzz é o fluxo, que não pode ser
aprisionado por qualquer mainframe. Porque fluzz é do metabolismo da
rede. Ah!, sim, redes são fluições. Fluzz evoca o curso constante que não se
expressa e que não pode ser sondado, nem sequer pronunciado do “lado
de fora” do abismo: onde habitamos. No “lado de dentro” do abismo não
há espaço nem tempo, ou melhor, há apenas o espaço-tempo dos fluxos. É
de lá que aquilo (aquele) que flui sem cessar faz brotar todos os mundos...
Em outras palavras, não existe uma mesma realidade para todos: são

65
muitos os mundos. Tudo depende das fluições em que cada um se move,
dos emaranhamentos que se tramam, das configurações de interação que
se constelam e se desfazem, intermitentemente”.

(**) Este texto foi originalmente escrito em 2010 e publicado em 2011 no


livro Fluzz: vida humana e convivência social nos novos mundos altamente
conectados do terceiro milênio. São Paulo: Escola de Redes, 2011.

(1) Cf. LORCA, Frederico Garcia (1924). “Canción Tonta” in Canciones


(Obras Completas I). Madrid: Aguilar, 1978.

(2) BARROS, Manoel (1993). Poesia Completa. São Paulo: Leya, 2010.

(3) LÉVY, Pierre (1998). “Uma ramada de neurônios” in Folha de São Paulo:
15/11/1998. Cf. ainda Caderno Mais da Folha de S. Paulo: 15/11/2002 (p.
5-3). O texto está disponível em:

<http://escoladeredes.ning.com/profiles/blogs/uma-ramada-de-
neuronios>

(4) Cf. FRANCO, Augusto (1998). O Complexo Darth Vader. Slideshare [469
views em 23/01/2011]

<http://www.slideshare.net/augustodefranco/o-complexo-darth-vader>

(5) HERBERT, Frank (1976). Os filhos de Duna. Rio de Janeiro: Nova


Fronteira, 1985.

(6) CASTELLS, Manoel (2001). A Galáxia da Internet: reflexões sobre a


Internet, os negócios e a sociedade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2003.

66
(7) Trata-se de uma tradução forçada do provérbio “Viam aut aut faciam
inveniam” cuja localização não foi possível determinar. Cf. a bibliografia de
SENECA, Lucius Annaeus (c. 3 a. E. C. – 65) em:

<http://www.egs.edu/library/lucius-annaeus-seneca/biography/>

(8) SENECA, Lucius Annaeus (c. 3 a. E. C. – 65). Cf. Wikiquote:

<http://pt.wikiquote.org/wiki/S%C3%AAneca>

Não foi possível determinar a localização desta citação. Cf. a bibliografia


de SENECA:

<http://www.egs.edu/library/lucius-annaeus-seneca/biography/>

(9) KAVÁFIS, Konstantinos (1911). Ithaca. Kaváfis não publicou nenhum


livro em vida. Estão disponíveis online as traduções de José Paulo Paes e
Haroldo de Campos em:

<http://www.org2.com.br/kavafis.htm>

(10) CHRISTAKIS, Nicholas e FOWLER, James (2009): Connected: o poder


das conexões. Rio de Janeiro: Elsevier, 2010.

(11) HOBBES, Thomas (1651). Leviatã. São Paulo: Martins Fontes, 2003.

(12) HOBBES: Op. cit.

(13) CHRISTAKIS, Nicholas e FOWLER, James: Op. cit.

67
(14) MARGULIS, Lynn e SAGAN, Dorion (1986). Microcosmos: four billion
years of microbial evolution. Los Angeles: University of California Press,
1997.

(15) Cf. FRANCO, Augusto (2009). O poder nas redes sociais. Slideshare
[1893 views em 23/01/2011]

<http://www.slideshare.net/augustodefranco/o-poder-nas-redes-sociais-
2a-versao>

(16) ROBINSON, Walter (2008). “Morte e renascimento de uma mente


vulcana” in EBERL, Jason & DECKER, Kevin (2008). Star Treck e a filosofia: a
ira de Kant. São Paulo: Madras, 2010.

O sétimo sentido seria “o senso de unicidade com Tudo, isto é, Universo, a


força criativa, ou o que alguns humanos poderiam chamar de Deus.
Vulcanos não veem, contudo, isso como uma crença, seja religiosa ou
filosófica. Eles tratam isso como um simples fato que insistem não ser
mais incomum ou difícil de entender do que a habilidade de ouvir ou ver”
[como escreveu o criador da série Star Trek, Gene Roddenberry (1979)].
Vulcanos chamam essa filosofia de “Nome”, querendo dizer “uma
combinação de uma diversidade de coisas para fazer com que a existência
valha a pena” (Episódio “Por trás da cortina”: The Original Series)”. Cf.
RODDENBERRY, Gene (1979). The Motion Picture. New York: Pocket
Books, 1979.

(17) Em Os Persas, Ésquilo descreve os reveses de Xerxes, filho de Dario. Já


morto na ocasião, Dario vai então aparecer na peça como uma sombra

68
para advertir aos persas que jamais movam novamente uma guerra aos
gregos. Depois de dar adeus aos anciãos e de recomendar que, mesmo
“em meio a desgraças, alegrem-se na fruição do mundo... a Sombra de
Dario esfuma-se no túmulo”.

(18) CAMPBELL, Joseph (1988). O poder do mito (entrevistas concedidas a


Bill Moyers: 1985-1986). São Paulo: Palas Athena, 1990.

(19) MARGULIS, Lynn & SAGAN, Dorion (1998). O que é vida? Rio de
Janeiro: Zahar, 2002.

(20) A quase totalidade dos procedimentos e mecanismos de obstrução de


fluxos, estabelecidos nas organizações a pretexto de segurança, não se
justifica (em mais de 90% dos casos, não há nada de realmente decisivo,
estratégico ou sigiloso que deva ser protegido ou não-compartilhado,
fechado e trancado em vez de permanecer aberto e disponível). Isso vale
para os protocolos de segurança impostos pelas áreas chamadas de
“tecnologia da informação”. Não há qualquer ganho em proibir o acesso
dos funcionários de uma organização ao Youtube ou ao Messenger, ao
Slideshare ou ao 4shared, ao Facebook ou ao Twitter. Não há nenhuma
razão para impor programas de e-mail proprietários, lentos, pesados e
com limitações enervantes de poucos megabytes no lugar de adotar
correios eletrônicos web mais eficazes, rápidos, com alta capacidade e,
além de tudo, gratuitos (como o gmail ou o ymail). Não há nenhum motivo
para editar hierarquias de permissões diferenciais e preferências de
acesso a conteúdos que, se fossem realmente secretos (como listas de
espiões ou processos de fabricação de artefatos de destruição em massa),

69
não poderiam mesmo estar em rede. E não há explicação plausível para a
manutenção de intranets, sobretudo em uma época em que já existe a
Internet.

(21) Por exemplo, cabeças hidrofílicas com caudas hidrofóbicas em


conjugação com fosfolípidos, aglomerados de proteínas globulares,
glicoproteínas, glicolipídios, colesterol, proteínas extrínsecas etc.

(22) Cf. FRANCO, Augusto (2009). A lógica da abundância. Slideshare


[2.172 views em 23/01/2011]

<http://www.slideshare.net/augustodefranco/a-lgica-da-abundncia>

(23) WARHOL, Andi (1968). Cf. “15 minutes of fame” em

<http://en.wikipedia.org/wiki/15_minutes_of_fame>

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Augusto de Franco é escritor, palestrante e consultor. É o criador e um
dos netweavers da Escola-de-Redes – uma rede de pessoas dedicadas à
investigação sobre redes sociais e à criação e transferência de tecnologias
de netweaving. É autor de mais de duas dezenas de livros sobre
desenvolvimento local, capital social, democracia e redes sociais.

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