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2.

Como aprendemos sobre saúde do corpo na rede social Instagram durante a


pandemia do COVID-19: alguns delineamentos sobre o corpus de pesquisa

Começaremos este capítulo explicando o motivo pelo qual optamos em


trocar nosso projeto inicial. Devido nosso calendário letivo não ter começado na
data prevista, em decorrência da pandemia do COVID-19, realizamos alguns
estudos e leituras que nos levaram a possibilidade de pesquisar algo mais
recente, com maior relevância para o período atual, um momento atípico e
marcante que estamos vivenciando. Assim, escolhemos como temática de
pesquisa o investimento sobre a saúde do corpo que vimos emergir nas mídias,
especialmente nas redes sociais, como abordaremos aqui. Assim, neste
capítulo, procuramos delinear o percurso que nos levou a escolha do material
empírico e a sua relevância no cenário pandêmico que assola o mundo desde
o final do ano de 2019, com os primeiros casos na cidade de Wuhan, na China.
Primeiramente, gostaríamos de esclarecer ao leitor que coronavírus1 e COVID-
192 não são palavras sinônimas. Coronavírus são um tipo de determinado
vírus, enquanto a COVID-19 é a doença causada pelo vírus SARS-CoV-2. Vale
ressaltar que a página do Ministério da Saúde 3 conta com informações como:
“vacinometro”, “o que é a covid-19?”, “como é transmitido?”, “sintomas”, “como
se proteger”, “diagnóstico”, dentre tantas outras informações disponíveis na
plataforma para acesso.
Diante disso, durante as orientações e levando em consideração o
atual momento enfrentado pela sociedade, alteramos o problema de pesquisa
inicial que era pensado a partir da seguinte pergunta: Que modos de ser e de
se relacionar com o corpo são fabricados nos discursos veiculados no
programa “A Fazenda”?. No decorrer das orientações, surgiu um problema que
compreendemos ter bastante relevância para o momento atual da sociedade,
além de ser uma temática de nosso interesse e que nos atravessa de modo
muito potente. Assim, o problema que estamos propondo é de que modo
1
Os coronavírus são uma grande família de vírus comuns em muitas espécies diferentes de
animais, incluindo o homem, camelos, gado, gatos e morcegos. Raramente os coronavírus de
animais podem infectar pessoas e depois se espalhar entre seres humanos como já ocorreu
com o MERS-CoV e o SARS-CoV-2. Até o momento, não foi definido o reservatório silvestre do
SARS-CoV-2. Acesso em 21 set 2020.
2
A Covid-19 é uma infecção respiratória aguda causada pelo coronavírus SARS-CoV-2,
potencialmente grave, de elevada transmissibilidade e de distribuição global. Acesso em 20 abr
2021
3
Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/coronavirus Acesso em 20 abr 2021.
funcionam alguns discursos sobre a saúde do corpo na rede social
Instagram durante a pandemia do COVID-19. Consideramos que o corpo tem
sido alvo de diferentes abordagens veiculadas nos meios de comunicação,
especialmente durante a pandemia temos percebido uma ênfase ao corpo,
mais especificamente, à saúde do corpo, assim construímos as seguintes
questões de pesquisa para nortear o estudo:
1) Quais (alguns) discursos que emergem na rede social Instagram
sobre saúde do corpo durante a pandemia do COVID-19?
2) Como esses discursos constituem modos de ser sujeito e de se
relacionar com o corpo durante a pandemia?
3) Quais estratégias de objetivação do corpo são acionadas no
Instagram durante a pandemia do COVID-19?
Convém dizer que não procuramos responder a essas questões, elas
se situam mais, portanto, como caminhos que pretendemos percorrer para dar
conta minimamente do problema de pesquisa.
Temos compreendido que as mídias são o meio de comunicação que
nos permitem estarmos mais perto das pessoas durante a pandemia,
passamos a viver ainda mais conectados, aprendendo novas formas de nos
relacionar, de trabalhar, de estudar, etc. Além disso, partimos do entendimento
que não há somente um modo de ensinar, e que principalmente este modo não
se encontra apenas na escola, na relação aluno/professor. Na perspectiva dos
Estudos Culturais, compreendemos que os modos de ensinar/aprender
atravessam os muros da escola. Assim, aprendemos por todas Instituições que
passamos, mas não somente nelas. Dessa maneira compreendemos que
existem diferentes pedagogias funcionando em nossa sociedade e nesse
sentido não há coerência em usar o termo pedagogia no singular, mas no
plural, visto que

[...] a pluralização tem a ver com as formas do olhar. O “real”, a


“realidade”, não é um dado apreensível de uma forma única, mas
cambiável a partir de cada modo de olhar. A cada olhar a
apresentação da realidade tende a variar. Com isso as pedagogias se
pluralizam frente às tentativas de ler, interpretar e apreender a
realidade. (CAMOZZATO, 2012, p. 129)

Consideramos que essa pluralização não é só no âmbito escolar, mas


em tantos outros lugares, que ensinam, educam, governam, conduzem e
produzem efeitos. Quando olhamos para o Instagram, e o YouTube, por
exemplo, percebemos o quanto estes espaços ensinam desde muito cedo,
basta ter um smartphone ou notebook e se conectar com a internet em
qualquer lugar. Muitas aprendizagens são acionadas através dessas redes
sociais.

Figura 1 – Dependência Tecnológica


Fonte: Instagram: @filosofia_cetica – Acesso em: 28 set 2020.

Na Figura 1, percebemos o quanto há um discurso recorrente de que


nós, sujeitos deste tempo, vivemos conectados, é muito difícil passarmos um
dia sem celular, é quase como passarmos um dia sem nos alimentarmos ou
dormirmos, ou seja, estar sempre conectado já teria se tornado uma
necessidade de sobrevivência, e isso é um discurso que muitos de nós
“compramos”, aceitamos e assumimos como verdade4.
Durante a pandemia do COVID-19 e devido ao distanciamento social
que se fez necessário para reduzir a disseminação do vírus, a forma das
pessoas se relacionarem parece ter mudado bastante, talvez os meios de
comunicação online tenham favorecido o processo de comunicação, o qual foi
se intensificando através do uso das mídias sociais5.

4
Compreendemos que as verdades são fabricadas em determinado período na história, que vão sendo
naturalizadas e reafirmadas por diversas instâncias sociais. Tal conceito será adensado no capítulo 3
desta dissertação.
5
Será abordado no decorrer deste capitulo, a partir da perspectiva de Martino (2018).
O Instagram, que compõe essa pesquisa, é uma rede social online e
interativa entre usuários, permite o compartilhamento de vídeo e de imagens
em tempo real. O aplicativo pode ser acessado tanto por desktops6 quanto por
tecnologia mobile7.
O Instagram8 atualmente possui 1.082 bilhões de usuários, e apresenta
múltiplas possibilidades de conteúdos que podem ser consumidos. Interessa-
nos, nesse estudo, olhar para as múltiplas possibilidades e modos de se
relacionar com a saúde do corpo, que tem sido um discurso recorrente e que
parece ter sido intensificado no período de distanciamento social. A escolha da
mídia foi por compreendê-la enquanto um lugar de aprendizagem para diversos
sujeitos e que durante a pandemia tornou-se um dos meios viáveis para
comunicação devido ao distanciamento social9.

Figura 2 – Rede social Instagram


Fonte: Autoras

O aplicativo carrega em sua tela inicial, os storys (1) de usuários


seguidos pelo perfil x. Storys são publicações que duram o espaço tempo de
24h ficando disponíveis apenas aos seguidores do perfil quando é configurado
6
Conhecido também como “computador de mesa”, só é possível acessar em um lugar fixo.
7
É aquela que permite o deslocamento do usuário em tempo real na rede por meio de
dispositivos moveis, exceto quando não há conexão com internet. Exemplos dessa tecnologia
são: smartphones, tablets, iPad, iPhone, notebooks.
8
Disponível em: https://www.oficinadanet.com.br/post/16064-quais-sao-as-dez-maiores-redes-
sociais. Acesso em: 02 nov 2020.
9
De acordo com o Parecer do CNE (Conselho Nacional de Educação) 5/2020 “A OMS declarou
em 11 de março de 2020, que a disseminação comunitária da COVID-19 em todos os
Continentes a caracteriza como pandemia”. E por este motivo o IFSul publicou Instruções de
Serviço prorrogando o retorno as aulas, disponíveis em: http://www.ifsul.edu.br/instrucoes-
normativas-2?start=10 Acesso em 25 mar 2020.
como privado, ou ainda, ao público quando o perfil é configurado como aberto.
Os storys são postagens efêmeras e que o usuário não quer adicionar ao seu
perfil. Na parte inferior dos storys localiza-se o feed (2). O feed é responsável
por organizar as publicações em ordem cronológica de tempo do mais atual
para o mais antigo, os storys seguem essa mesma regra. O feed do perfil
@minsaude organiza as publicações de sua página mapeando questões
relacionadas a área da saúde. Tais publicações serão nosso objeto de análise.
Pretendemos extrair as publicações atreladas ao nosso tema de pesquisa e
compor um álbum para organização de nosso material empírico.

Figura 3 – Algumas funcionalidades Figura 4 – Organização do feed


Fonte: Autoras Fonte: Autoras

As postagens de fotos/vídeos no feed é sinalizada pelo número de


publicações de cada perfil na parte esquerda da tela. O processo de interação
dos usuários acontece através de três processos: i) likes (3): são a primeira
opção à esquerda na postagem, caracterizado por um símbolo de coração; ii)
comentários (4): são a opção central na postagem, caracterizado pelo símbolo
de uma nuvem no chat e o iii) compartilhar (5): adiciona publicações do próprio
perfil quanto de outros ao story, caracterizado por um avião, pode ser
compartilhado no story ou via direct10, é a opção a direita da postagem. Para as
publicações na rede, o aplicativo dispõe de uma série de filtros e para além
disso outras funcionalidades: localização (permite marcar o local atual em que
a publicação foi postada), menção de outros perfis (permite mencionar outros
perfis em uma postagem), #hashtag (são utilizadas para colocar um
determinado assunto em evidência na rede), enquete (estratégia muito utilizada
por perfis de celebridades para produção de material, ocorre por meio da
interação com o público), dentre outras.

Figura 5 – Outras funcionalidades


Fonte: Autoras

A hashtag é um símbolo bem disseminado nas redes sociais, estratégia


muito utilizada em programas de televisão tal como reality show, como o BBB
(Big Brother Brasil), Power Couple Brasil, coloca em evidência nas redes
sociais o assunto mais comentado no momento de determinado programa a
partir da # e na sequência sua identificação. Ao longo do tempo, as
funcionalidades vão aparecendo, desde a pandemia percebemos que “COVID-
19: Central de Informações” possui alguns fatos sobre a doença que se
instaurou no mundo, a partir da OMS11.

10
São conhecidos como bate-papo privado nas redes sociais, servem tanto para bate-papo único quanto
em grupo.
11
Organização Mundial da Saúde.
Figura 6 – Percurso para Figura 7 – Fatos sobre a Figura 8 – Publicações que
Informações sobre COVID-19 COVID-19 direcionam a página da Figura 7
Fonte: Autoras Fonte: Autoras Fonte: Autoras

Nestes tempos de pandemia, percebemos o engajamento de indivíduos


nas redes sociais, pode-se citar como exemplo o perfil do Instagram @juliette,
participante do BBB21 que após a sua estreia em janeiro de 2021 até o seu
final em maio de 2021, conquistou um total cerca de 28 milhões de seguidores.
Para além do engajamento dos administradores e do público na rede, o BBB21
trouxe com a convivência dos confinados uma série de discussões que
envolviam pautas de assuntos considerados relevantes para a sociedade
contemporânea. Segundo o resultado da pesquisa do Opinion Box 12 “a rede é
realmente muito popular, já que 84% entram no Instagram pelo menos uma
vez por dia.” Diante do alcance da mídia, entendemos que o aumento de sua
utilização na pandemia constitui-se como importante elemento para nosso
estudo. Ainda de acordo com a Opinion Box, alguns dados apontados referem-
se aos tempos de distanciamento social, “durante a pandemia o uso aumentou
bastante. 72% passaram a usar mais o Instagram na pandemia e, além disso,
59% passaram tempo assistindo lives também durante a pandemia.”
Segundo Martino (2018) “Procura-se entender de que maneira as
mídias se inserem o tempo todo no cotidiano das relações sociais, e do mesmo
12
Pesquisa: https://blog.opinionbox.com/pesquisa-instagram/ Acesso em: 02 mai 2020.
modo, como a vida social se articula com a presença dos meios de
comunicação” (MARTINO, 2018, p. 201). As mídias em tempos pandêmicos se
inserem cada vez mais nas relações sociais, como as lives ofertadas por
cursos, além das ferramentas tecnológicas utilizadas voltadas ao ensino.
Buscamos por meio da tecnologia conteúdos que são diariamente produzidos
sobre diversos temas, sendo um deles e que consideramos produtivo para esta
pesquisa, o modo como nos relacionamos com a saúde do corpo.

A sociedade em rede nasce dentre outras coisas da sofisticação dos


sistemas de controle social, ou seja, de poder. Cada um agora deve
ordenar a si mesmo: de baixo para cima o poder disciplinar controla
os corpos por meio da pedagogia, da medicina, e cada vez mais por
meio das notícias, dos conteúdos compartilhados, dos discursos, das
mídias. O poder se manifesta cada vez mais por meio do discurso
que cada um adota como verdade. (MOSÉ, 2018, p. 80)

Percebemos que na contemporaneidade vivenciamos diariamente um


deslocamento expansivo de métodos e de maneiras que nos conduzem a
realizar determinadas práticas para alcançar um corpo tido como saudável.
Nessa constante busca, experimentamos diversos modos de constituirmos este
corpo: a busca por dietas milagrosas, a cirurgia plástica, treinos extenuantes,
anabolizantes, dentre outros, desde que nos possibilite chegar cada vez mais
perto do ideal de corpo saudável que foi sendo construído ao longo da história.
Compreendemos que esses modos de relacionamento com a saúde do corpo
se tornam potentes nas redes sociais, por alcançar um público amplo, pela
rápida circulação e pelo forte potencial de reverberação que tais ditos
apresentam. Assim, consideramos o Instagram como uma potente instância
educativa que nos educa para diferentes questões, dentre elas questões
atreladas ao corpo.
Como os termos mídias sociais e redes sociais ainda geram alguns
desdobramentos sobre sua compreensão, vamos apresentar o nosso
entendimento sobre as mesmas.

De certa maneira, quando se fala “a mídia”, no singular, a referência


costuma ser o conjunto dos meios de comunicação – não por acaso,
em livros de comunicação publicados em Portugal é comum encontrar
a expressão “os media” ou mesmo “os média”. Nesse sentido, como
mídia já é plural, parece ser uma redundância falar “as mídias” – mas,
de qualquer modo, o uso corrente no português falado no Brasil
consagrou “a mídia” ou “as mídias” para designar os meios de
comunicação. (MARTINO, 2018, p. 186)

Ao considerar o termo mídias, apontado por Martino (2018),


consideramos as redes sociais como uma parte das mídias, na qual acontecem
as interações entre usuários, nesta perspectiva

O termo “redes sociais” cobre um vasto espectro de agrupamentos


sociais online dedicados a todo tipo de atividade. Na medida em que
as redes se caracterizam pela existência de laços firmados a partir de
interesses comuns, é possível verificar a formação de todo tipo de
agrupamento para troca de informações, ideias e materiais, gerando
não apenas uma interação entre os participantes no sentido de
compartilhar conhecimentos, mas também o engajamento em
questões políticas, sociais e culturais. O poder de mobilização
exponencial das redes sociais as torna um fator relevante para se
pensar elementos da vida fora da internet. (MARTINO, 2018, p. 58)

Como já anunciamos a rede social que nos debruçaremos a pesquisar


é o Instagram, optamos por ela, porque a considerarmos uma pedagogia
cultural potente que atinge um alto número de usuários. Temos observado uma
crescente preocupação com o tema da saúde do corpo, especialmente no
período pandêmico, isso se faz por reportagens, chamadas em propagandas,
seja na tv, no rádio e nas redes sociais de modo geral. Há um discurso
circulando e recorrente que remete aos cuidados necessários e redobrados
com a saúde do corpo, especialmente na relação com a pandemia do COVID-
19. Um exemplo de tais estratégias é o próprio perfil do Ministério da Saúde,
@minsaude, que através de seu feed propaga uma série de condutas
saudáveis em relação ao corpo durante este cenário pandêmico. Como
podemos perceber nas imagens abaixo.
Figura 9 – Hábitos Saudáveis Figura 10 – Coronavírus
Fonte: Instagram: @minsaude Fonte: Instagram: @minsaude
Acesso em: 6 abr 2020 Acesso em: 29 ago 2020

Ao analisarmos os papéis que as mídias desempenham na nossa


sociedade atualmente, gostaríamos de destacar os efeitos que elas são
capazes de produzir nos sujeitos. Assim, olhamos para o Instagram na
tentativa de compreender de que modo os perfis operam, como os discursos
sobre a saúde do corpo produzem efeitos em tempos de pandemia e, desse
modo, subjetivam os sujeitos a certas práticas. Abaixo apresentamos duas
imagens para pensarmos sobre tais processos.

Figura 11 – Sou Livre


Fonte: Instagram: @enfimfit - Acesso em: 06 out 2020.
O ser visto, os likes cada vez mais fazem parte da vida cotidiana das
pessoas, principalmente aquelas que participam de tais redes sociais. Ao
olharmos para a Figura 11, buscamos compreender o discurso no que ele
produz em termos de efeitos nos sujeitos. Quando na Figura 11 a esquerda diz
“sofri” e na Figura 11 da direita diz “sou free”, ou seja, “sou livre”,
compreendemos através de uma perspectiva foucaultiana, o quanto a
discursividade circulante afirma que um corpo considerado saudável e
esteticamente bonito pode estar associado a ideia de ser livre. Consumimos
diariamente as postagens em perfis, que versam discursos sobre a saúde do
corpo. O quanto esta imagem nos incita a adquirir um estilo de vida tido como
saudável. O quanto o “ser livre” é convidativo a termos um determinado tipo de
corpo. E que por mais sacrificante que este processo seja, por mais que tenha
sofrimento, no final ser livre é o objetivo que foi alcançado. Segundo essa
lógica, o sofrimento por mais contraditório que possa ser, pode trazer uma
sensação de felicidade. E a tal felicidade só é almejada quando empreendemos
um processo de transformação sobre nós mesmos para alcançarmos ou
chegarmos mais próximo possível de um padrão corporal considerado como
bom, belo, desejável. Gostaríamos de ressaltar que nesta perspectiva não
apontaremos quais modos de relação com a saúde do corpo são certos ou
errados, mas pretendemos tensioná-los, entender de que modo tais discursos
acionam modos de ser na atualidade.
Para Deleuze (2008), a sociedade da disciplina, conforme discorrida
por Foucault, começa a passar por deslocamentos, tais deslocamentos vão
dando contorno e espaço a uma sociedade de controle. A sociedade de
controle funciona “por controle contínuo e comunicação” (DELEUZE, 2008,
p.216) passa a nos controlar nos mais ínfimos detalhes da nossa vida diária, no
qual vemos o outro e estamos “sempre” sendo vistos também pelo outro.
Desse modo, acabamos por exercer um controle ininterrupto sobre nós
mesmos, como estamos entendendo que acontece com as questões atreladas
a saúde do nosso corpo, mas para além de nossa saúde com diversos
aspectos de nossa vida. Percebemos que vamos sendo convidados, não
exclusivamente, a busca pelo corpo saudável, mas, articulado a isso, o quanto
precisamos dar visibilidade a esse corpo e, desse modo, nos tornamos também
objetos de consumo para os outros.
Somos bombardeados diariamente por diversas informações nas redes
sociais, somos convidados e interpelados por diferentes práticas e discursos que
consumimos, os quais sustentam uma ideia de “verdade” sobre a saúde do corpo.
Parece que a mídia se torna um artefato cultural moderno ainda mais potente no
período de pandemia, visto que as pessoas acompanham as notícias relacionadas aos
mais diversos segmentos principalmente através desse espaço.
Assim, vai se construindo por meio das redes sociais, espaço potente
para veiculação de discursos, novos modos de se relacionar com a saúde do
corpo. Não estamos dizendo que a mídia é uma instância maquiavélica, mas
do quanto é nitidamente uma forma de persuasão muito potente para conduzir
as nossas condutas e nos ensinar formas de nos relacionarmos com nosso
corpo. Nesse mesmo viés, tanto a educação quanto a pedagogia se direcionam
para um fim mútuo, ensinar o sujeito. As redes sociais por sua vez também se
ocupam desta competência, buscando conhecer o sujeito nos seus mais
ínfimos detalhes, para traçar estratégias pelas quais ele poderá ser persuadido,

O que tento dizer é que considerar que a educação e a pedagogia


estão no cerne do que nos tornamos – uma vez que atuam para dirigir
e governar nossas condutas – implica reconhecer que a sociedade
tem se reconfigurado e que qualquer pretensão de atuar sobre os
sujeitos implica tanto reconhecer esse processo quanto analisá-lo
para, exatamente, conseguir interpretar e assim melhor atuar sobre
as pessoas. (CAMOZZATO, 2015, p.517)

Nas redes sociais, as postagens geralmente remetem a uma ideia de


felicidade e sucesso. Assim, tais redes ajudam a propagar determinados
discursos e modos de viver considerados como os melhores, de mais sucesso
e que devem ser perseguidos. Aqui olhamos com desconfiança para tais
máximas, entendendo que elas produzem efeitos subjetivantes na vida dos
sujeitos.
Consideramos a mídia um espaço potente para disseminação de
discursos sobre as questões referentes a saúde. Nesta perspectiva,
destacamos que o Instagram seleciona os conteúdos de acordo com o que
mais visualizamos, curtimos, salvamos. Então torna-se produtivo compreender
que participamos de tais processos, cada escolha que fazemos, cada like e
comentário distribuídos também são integrantes dessa rede de reverberação
de determinados discursos.
Um dos primeiros movimentos realizados foi dar início a coleta de
materiais veiculados no Instagram que estariam na composição de nosso
álbum.
O período de coleta na rede social especificada anteriormente
compreendia o período de agosto de 2020 à março de 2021. No momento
inicial, não havíamos delimitado páginas específicas de onde seria coletado o
material, o olhar estava mais pulverizado, selecionando publicações pelas
quais estávamos sendo atravessadas. Após a coleta, optamos por delimitar um
recorte específico do objeto a ser analisado, a rede social: Instagram e o perfil
@minsaude13.
O álbum será construído a partir do recorte que fizemos no perfil
@minsaude do Instagram e será elaborado no Prezi14. Analisaremos os
discursos, naquilo que eles produzem hoje em termos de efeitos nas esferas
sociais, culturais e educacionais. Não nos cabe e nem pretendemos dizer se
são bons ou ruins, certos ou errados, melhores ou não, os discursos que
emergirem sobre a saúde do corpo durante a pandemia, mas sim analisar os
discursos naquilo que eles produzem em termos de efeitos. Para tanto, a partir
do próximo capítulo nos debruçaremos em alguns conceitos/ferramentas que
consideramos potentes para essa pesquisa. Ressaltamos que extraíremos, tais
conceitos da “caixa de ferramentas” do filósofo francês Michel Foucault e que
eles nos serão produtivos tanto em termos de referencial teórico quanto como
método de pesquisa.

13
Perfil oficial do Ministério da saúde na plataforma do Instagram.
14
Software utilizado para criação de apresentação, comporta a modalidade em nuvem e pode
ser disponibilizado a partir de um link.

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