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º ano)

Ficha 1 – Sermão de Santo António, de padre António Vieira (11.º ano)

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Vindo pois, irmãos, às vossas virtudes, que são as que só podem dar o verdadeiro louvor, a primeira que
se me oferece aos olhos, hoje, é aquela obediência, com que chamados acudistes todos pela honra de vosso
Criador e Senhor, e aquela ordem, quietação e atenção com que ouvistes a palavra de Deus da boca de Seu
servo António. Oh, grande louvor verdadeiramente para os peixes, e grande afronta1 e confusão para os
5 homens! Os homens perseguindo a António, querendo-o lançar da terra e ainda do mundo, se pudessem,
porque lhe repreendia seus vícios, porque lhe não queria falar à vontade e condescender com seus erros, e no
mesmo tempo os peixes em inumerável concurso acudindo à sua voz, atentos e suspensos às suas palavras,
escutando com silêncio, e com sinais de admiração e assenso2 (como se tiveram entendimento) o que não
entendiam. Quem olhasse neste passo para o mar e para a terra, e visse na terra os homens tão furiosos e
10 obstinados, e no mar os peixes tão quietos e tão devotos, que havia de dizer? Poderia cuidar que os peixes
irracionais se tinham convertido em homens, e os homens não em peixes, mas em feras. Aos homens deu Deus
uso de razão, e não aos peixes; mas neste caso os homens tinham a razão sem o uso, e os peixes o uso sem
a razão. Muito louvor mereceis, peixes, por este respeito e devoção que tivestes aos pregadores da palavra de

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Deus, e tanto mais quanto não foi só esta a vez em que assim o fizestes. Ia Jonas, pregador do mesmo Deus,
15 embarcado em um navio, quando se levantou aquela grande tempestade; e como o trataram os homens, como
o trataram os peixes? Os homens lançaram-no ao mar, a ser comido dos peixes, e o peixe que o comeu levou-
-o às praias de Nínive, para que lá pregasse e salvasse aqueles homens. É possível que os peixes ajudam à
salvação dos homens, e os homens lançam ao mar os ministros da salvação? Vede, peixes, e não vos venha
vanglória, quanto melhor sois que os homens. Os homens tiveram entranhas para deitar Jonas ao mar, e o
20 peixe recolheu nas entranhas a Jonas, para o levar vivo à terra.
Padre António Vieira, Sermão de Santo António,
Porto, Porto Editora, 2020, pp. 11-12

Notas
1 afronta – insulto, desfeita.
2 assenso – acordo.
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1. Identifica as duas características dos peixes que o orador destaca no início do excerto e explica o modo como
estas os distinguem dos homens.

2. Explica a importância da referência ao episódio de Jonas enquanto estratégia oratória.

3. Clarifica o duplo sentido da palavra “entranhas”, nas duas ocorrências das linhas 19 e 20.

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Soluções

11.º ano

EDUCAÇÃO LITERÁRIA

Ficha 1 – Sermão de Santo António, de padre António Vieira


1. No início do excerto, o orador destaca a “obediência” (l. 2) dos peixes, que prontamente responderam quando foram chamados. Além
disso, refere também a “ordem, quietação e atenção” (l. 3) com que ouviram a doutrina pregada por Santo António. Deste modo, ao
elogiar as virtudes dos peixes, Vieira condena veemente o comportamento dos homens, a quem faltam valores morais (“ […] os peixes
irracionais se tinham convertido em homens, e os homens não em peixes, mas em feras”, ll. 10-11).

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2. A referência ao episódio de Jonas constitui uma forma de ensinar (docere) e, ao mesmo tempo, de criticar comportamentos
reprováveis. Com efeito, a passagem informa os ouvintes acerca da ação de um pregador de Cristo, mas concretiza uma crítica
àqueles que se predispõem a maltratar e a perseguir os que pregam a “palavra de Deus”.

3. Na primeira ocorrência, a palavra “entranhas” tem um sentido figurado, apontando para o carácter dos homens e para a sua
inconsciência ao atirar “Jonas ao mar” (l. 19). Na segunda ocorrência, o vocábulo remete para a ideia de cavidade, de ventre,
sublinhando o modo como o peixe transportou o pregador no seu interior para o salvar.

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