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Galileu Ed 382 - Jan 24
Galileu Ed 382 - Jan 24
DO MAL:
COMO
FREAR O USO
CRIMINOSO DA
INTELIGÊNCIA
ARTIFICIAL
GENERATIVA
PAÍSDA
ENERGIA?
DESTAQUE NA COP28 EM DEBATES
SOBRE TRANSIÇÃO ENERGÉTICA,
BRASIL É LÍDER NA ADOÇÃO DE FONTES
RENOVÁVEIS — MAS ENFRENTA
DESAFIOS E CONTRADIÇÕES
COMPOSIÇÃO
JANEIRO DE 2024
03
CAPA
CONSIDERADO
POTÊNCIA
ENERGÉTICA,BRASIL
PRECISA AVANÇAR
EM ACESSO E
DESCARBONIZAÇÃO
37
TECNOLOGIA
USO DA IA GENERATIVA
PARA FINS CRIMINOSOS É
REALIDADE. O QUE FAZER?
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QUER QUE EU DESENHE?
CAPA
TEXTO Marília Marasciulo EDIÇÃO Luiza Monteiro ILUSTRAÇÃO Ana Kozuki DESIGN Flavia Hashimoto
PAÍS DA ENERGIA?
Mas falar em matriz energética vai muito além da energia que chega
aos interruptores quando acendemos a luz ou apertamos botões de
liga e desliga. Envolve também o que o país consome para abaste-
cer desde o setor de transportes, que inclui tanto os caminhões que
levam nossos alimentos quanto os carros que usamos para nos lo-
comover nas cidades, até a indústria. E aí o país tem um longo cami-
nho a percorrer: as fontes não renováveis de energia correspondem
a 52,6% da nossa matriz, com 35,7% vindo de petróleo e derivados.
Além de precisar reestruturar todo o setor de transportes, maior
consumidor e emissor de carbono, o Brasil tem que lidar com al-
gumas contradições internas — por exemplo, a pobreza energética,
condição que atinge 11% das famílias brasileiras — e externas, como
a insistência na exploração de petróleo para exportação.
LARGADA PROMISSORA
Se hoje temos uma posição confortável no abastecimento elétrico
com fontes renováveis, isso é fruto da nossa posição geográfica e de
escolhas feitas desde a época do Império. Em 1876, Dom Pedro II co-
nheceu Thomas Edison na Exposição Mundial da Filadélfia, nos EUA.
O monarca então convidou pessoalmente o inventor estadunidense a
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DESVIO DE CAMINHO
Além de buscar soluções para a pobreza energética, principalmente
no caso da eletricidade, o Brasil deve prestar atenção especial ao
setor de transportes, que consome 33% da energia do país, pouco
à frente das indústrias, com 32%. Só que, enquanto as indústrias
emitem 76,7 milhões de toneladas de dióxido de carbono (CO2), os
transportes lançam 210,4 milhões de toneladas de CO2 na atmos-
fera, conforme o Relatório Síntese do Balanço Energético Nacional
de 2023, feito pela EPE. Em 2022, o consumo de energia do setor
aumentou 5% em relação ao ano anterior, com queda de 1% de fon-
tes renováveis na matriz. “Nossa matriz rodoviarista e a insuficiência
de transporte coletivo nas cidades levam ao uso forte de gasolina e
diesel. Teríamos que incentivar veículos com emissão zero, como os
elétricos. Tudo isso vai ser um processo de transformação pelo qual
o mundo já está passando”, aponta Suely Araújo.
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Mesmo assim, nem tudo poderá ser substituído por fontes reno-
váveis. “Tem usos que são difíceis, especialmente os que envol-
vem carga pesada”, afirma. Nesses casos, criar o que ele chama
de “corredores azuis” — rotas com infraestrutura para garantir o
abastecimento de veículos movidos a gás natural (a cor azul reme-
te à chama gerada pelo combustível) — ou substituir derivados do
petróleo pelo gás natural veicular (GNV) já traria ganhos significa-
tivos neste momento de transição.
23,7%
10,5% 9% 3,5% 9,8%
NA RETA FINAL
Apesar dos desafios e das contradições, os especialistas veem com
bons olhos o processo de transição da matriz energética brasileira.
“Os desafios são grandes, mas as oportunidades também. Nós te-
mos vantagem na parte elétrica e uma fronteira de expansão que
também é renovável, com fontes mais competitivas como a eólica
e a solar, além da biomassa da cana”, aponta Lisbona. Para ele, a
energia é uma commodity que pode vir a ser exportada pelo país,
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ENTREVISTA
“A ilegalidade de algumas
substâncias produz muita
doença social”
COM Sidarta Ribeiro POR Marília Marasciulo
Em novo livro, neurocientista
aplica o rigor científico para
abordar história, cultura e
depoimentos pessoais em uma
tentativa de desmistificar
o consumo da maconha
N
Na pré-adolescência, no início dos anos 1980, o
hoje neurocientista Sidarta Ribeiro e seu irmão,
Júlio, prometeram à mãe que não usariam maco-
nha — mas que, se algum dia sentissem vontade de expe-
rimentar, fariam isso em casa, junto com ela. Aos 17 anos,
Júlio decidiu cobrar o compromisso da mãe. Ela titubeou e
recuou com o combinado, dando início a uma crise familiar
que levou à expulsão de Júlio de casa. Anos se passaram
até que a família entendesse que a culpa da ruptura não era
da maconha, e sim do proibicionismo em torno da erva.
OOLADO
LADOSOMBRIO
SOMBRIODADAIAIA
DEEPFAKES EM ELEIÇÕES, CLONES MALICIOSOS DO CHATGPT, NUDES FALSOS
COMO PORNOGRAFIA DE REVANCHE: OS MAUS USOS DA INTELIGÊNCIA
ARTIFICIAL GENERATIVA DESPERTAM PREOCUPAÇÃO. ENTENDA O QUE
ESTÁ SENDO FEITO PARA EVITAR ESSES E OUTROS PROBLEMAS
E
Em novembro de 2020, um conhecido apareceu
de surpresa na casa de Helen Mort, em Sheffield,
na Inglaterra. O visitante tinha um aviso urgente:
ele reconhecera o rosto de Helen, uma poetisa e
mãe, num site de conteúdo adulto. Mas isso pa-
recia impossível: a escritora nunca havia compar-
tilhado fotos íntimas com ninguém, justamente
porque temia se tornar uma vítima de porno-
grafia de vingança algum dia. Por isso, quis ver
com seus próprios olhos as imagens de que seu
conhecido estava falando. “Era meu rosto, meu
olho, minha franja... Parecia a minha mandíbula,
mas não era a minha boca. A pele da pessoa, da
mulher, era bem mais bronzeada do que a mi-
nha. E essa mulher tinha exatamente a mesma
tatuagem que eu”, relata Helen no documentário
My Blonde GF, lançado pelo jornal britânico The
Guardian em outubro.
E não são só vídeos, imagens e sons falsos que têm gerado inquieta-
ção. Rakesh Krishnan, pesquisador independente de cibersegurança
e analista de ameaças online baseado na Índia, descobriu anúncios
de versões maliciosas de modelos de linguagem grande (LLMs, na si-
gla em inglês). Esse é o nome dado a IAs capazes de gerar e traduzir
textos e outros conteúdos, além de diversas atividades de proces-
samento de linguagem natural (PLN). Esses serviços “do mal” – ba-
tizados de “WormGPT” e “FraudGPT”, em clara referência ao famoso
ChatGPT – estavam sendo vendidos em fóruns na dark web, uma
parte da internet que só pode ser acessada por programas espe-
ciais (nada de Google Chrome ou Mozilla Firefox) e na qual usuários
conseguem se manter anônimos. Enquanto o ChatGPT tem barrei-
ras éticas que impedem usuários de pedir certas tarefas, o anúncio
do “FraudGPT” que Krishnan encontrou prometia uma ferramenta
capaz de “escrever código malicioso”, criar “malware indetectável” e
“ferramentas para hackear”, entre outras práticas ilícitas.
cita dois serviços que procuram identificar textos gerados por IAs:
SMODIN e GPTZERO. Mas eles não prometem ser infalíveis. O pri-
meiro, inclusive, recomenda que usuários o vejam como “medida
preventiva” contra problemas como plágio. “Certifique-se de veri-
ficar o texto antes de publicá-lo ou enviá-lo, em vez de confiar na
ferramenta como uma solução após o fato”, diz o site.
A ideia de Krause é que seu sistema seja adaptado para outras lín-
guas e seus fonemas específicos. Ele também projeta que celebrida-
des, por exemplo, passarão a buscar sistemas de detecção de víde-
os falsos desenvolvidos especialmente para seus traços físicos. “Daí
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A REGULAMENTAÇÃO DA IA JÁ ESTÁ EM
DEBATE EM DIVERSOS PAÍSES. NO INÍCIO DE
2024, A UNIÃO EUROPEIA DEVE VOTAR O “AI
ACT”; E O BRASIL, O PL 2338/2023
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sociedade civil quanto por cientistas por ser genérico, sem “esta-
belecer responsabilidades” e “concretizar ações”, conforme explica
a advogada Tainá Aguiar Junquilho, professora de Tecnologia, Ino-
vação e Direito no Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento
e Pesquisa (IDP). “Ele foi aprovado em regime de urgência, e é um
tema que precisa e merece um tempo de maturação”, pondera Jun-
quilho, que é doutora em Direito com ênfase em Inteligência Artifi-
cial pela Universidade de Brasília (UnB).