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A Herdeira Perdida Do Bilionari - Evelyn Santana
A Herdeira Perdida Do Bilionari - Evelyn Santana
Todos os direitos reservados à autora. Nenhuma parte deste livro pode ser
utilizada ou reproduzida sob quaisquer meios existentes sem autorização da
autora. A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na lei n°
9.610/98, punido pelo artigo 184 do Código Penal.
Ele era tão bonito que parecia um artista de cinema. Mais que isso,
uma verdadeira obra de arte.
A voz de barítono, o jeito como se movimentava, confortável no
ambiente… em sua própria pele. E o que dizer do toque que mais parecia
ter feito com que chamas se alastrassem pela minha pele?
— Sonhando acordada, Maria Clara? — Patrícia, minha melhor
amiga e colabora na empresa de faxina que eu tocava com minhas irmãs me
perguntou, e eu percebi que estava amassando o lençol de elástico entre os
dedos, em vez de dobrá-lo delicadamente, como treinava as colaboradoras
da empresa para fazer. Se minha mãe visse aquilo, me bateria com um
chinelo até eu recobrar o juízo.
— Eu estava repassando algumas coisas na minha cabeça — menti
em minha defesa, colocando o lençol de lado para que fosse passado
novamente.
Eu não colocava a mão na massa com frequência, mas em períodos de
alta temporada, graças a Deus e ao serviço de qualidade que mamãe sempre
fez questão de prestar, nós tínhamos bastante demanda e precisávamos
arregaçar as mangas para tocarmos o barco.
— Sei… — Patrícia murmurou, desconfiada, estreitando os olhos em
minha direção. — Você está meio avoada desde ontem, o que aconteceu?
Rodrigo Marinho aconteceu. Grande, forte, com olhos azuis intensos,
cabelos macios e toque gentil. Ele aconteceu e desde então eu sentia meu
estômago se revirar em ansiedade e minha boca seca só de pensar naqueles
lábios de aparência macia me beijando.
Era impossível negar que ele me atraía. Mais do que qualquer outro
homem com quem eu já estive. Como isso era possível quando trocamos
poucas palavras e ele apenas abotoou minha correntinha de volta no lugar?
— Trabalho demais — optei por dizer. Outra mentira, mas eu jamais
daria o braço a torcer e admitiria para Patrícia o que de fato povoava meus
pensamentos. Seria tolice.
Nós devíamos ser mais espertas do que isso. Eu devia ser mais
esperta. Além do mais, Rodrigo era uma turista, como o meu pai era. Logo
ele terminaria quaisquer que fossem seus assuntos em Ilha do Sol e voltaria
para a sua vida, e eu ficaria ali, com as outras Marias.
— Se você diz. — Patrícia sacudiu os ombros, dando-se por satisfeita,
e eu soltei o ar que nem notara ter prendido nos pulmões.
Rodrigo não era parte da minha realidade, jamais seria, e quanto antes
eu parasse de pensar nele, melhor.
Ainda com esse pensamento em mente, senti quando meu celular
vibrou no bolso da minha calça, anunciando a chegada de uma mensagem, e
eu pensei em ignorá-la e apenas continuar com o meu trabalho, mas podia
ser urgente, algo da própria empresa, apesar de minhas irmãs sempre
optarem por telefonar, nesses casos.
Colocando a ponderação sobre o que poderia ser de lado, decidi
checar por mim mesma, e quase tive um ataque cardíaco quando li a
mensagem.
Desde que Maria Clara saiu do duplex onde eu estava hospedado, não
conseguia pensar em outra coisa que não fosse nossa conversa e na forma
desastrosa como ela se deu.
E era tudo minha culpa.
Meu gênio dos infernos nublou o meu bom-senso e eu fui muito mais
áspero do que Maria Clara merecia, do que eu mesmo pretendia.
Nós precisávamos conversar. Se ela estava mesmo grávida e afirmava
que o filho era meu, só podia ser porque aquilo era verdade, ainda que eu
tivesse sido cauteloso em todas as vezes que transamos. Maria Clara podia
ser jovem e até mesmo ingênua, mas não era burra. Ela sabia que uma
mentira assim não se sustentaria sob o escrutínio de um exame de DNA,
então por que se dar ao trabalho?
Certamente não era no intuito de ficar com o dinheiro que ofereci
pelo seu silêncio temporário, porque sua reação à oferta não poderia ter sido
pior.
Esfreguei meu rosto com ambas as mãos, decidindo que o melhor a
fazer era procurar Maria Clara assim que eu tivesse a oportunidade, no fim
do dia. Mas antes disso, precisava focar nos negócios que tinha em Ilha do
Sol, não podia negligenciá-los de tal modo. Sendo assim, dei meu café da
manhã por encerrado e me levantei do meu assento, apenas para ver as
portas do elevador privativo se abrindo assim que pus os pés na sala de
estar.
Por um segundo, achei que pudesse ser Maria Clara, mas a visão era
de uma senhora com cabelos dourados, vestido florido e uma expressão
determinada no rosto. Eu não precisava de uma apresentação para saber
quem ela era, porque a descrição que sua filha me fizera dela não poderia
ter sido mais certeira.
— Senhora Almeida, em que posso ser útil? — perguntei à mãe de
Maria Clara, usando meu tom mais polido e pulando a parte em que eu a
questionava sobre como entrara ali.
Ela era dona da empresa responsável por deixar os imóveis brilhando
de tão limpos, claro que tinha um rosto conhecido e acesso livre a eles.
— Que bom que perguntou — ela respondeu de pronto, sem a menor
hesitação. — Vim exigir que você fique longe da Maria Clara e nunca mais
volte a procurá-la.
Pisquei, incrédulo por ela ser tão direta, sem saber de imediato como
responder àquilo.
— Como disse?
— O que você ouviu — disse com firmeza. — O que quer que você
tenha tido com Maria Clara, acabou no momento em que você a humilhou.
— Eu não a humilhei, apenas…
— Poupe o fôlego — ela me cortou, e ergui uma sobrancelha em
surpresa. Não era todos os dias que alguém tinha a audácia de me
interromper sem nem ao menos pestanejar. — Eu sei muito bem o que
dizem de mim nessa cidade. Que sou uma mulher fácil, não é? — Ela riu
amargamente. — Por ter tido três filhas de pais diferentes. Mas mesmo que
isso fosse verdade, não é justo julgar a minha filha pelos meus erros.
— Não julguei Maria Clara por sua causa, acredite em mim —
admiti, escondendo o fato de que a julguei por erros de outras pessoas, sim,
mas não de sua mãe.
Um homem em minha posição sabia o bastante sobre o mundo e
pessoas que eram bajuladoras em troca de favores financeiros. Eu já perdera
as contas de quantas vezes uma mulher tentou me enredar usando de
artimanhas vis, e não me orgulhava por ter cogitado, mesmo por um
instante, que Maria Clara era uma delas.
— Não me interessa o que sai pela sua boca — Maria do Rosário
devolveu, nem um pouco intimidada. — A única coisa que quero deixar
clara é que minha filha não é uma vigarista e que nunca foi a intenção dela
dar um golpe da barriga. O que aconteceu foi que ela se deixou levar pela
sua lábia e foi vítima de um falso positivo.
Eu pensei mil coisas diferentes em um milésimo de segundo, e não
conseguia fazer sentido de nenhuma delas.
— O quê? — perguntei, deixando transparecer a minha confusão. —
O que quer dizer com falso positivo?
— Maria Clara não está esperando um bebê seu — ela disse cada
palavra com cuidado, mas com uma força em sua voz que a sensação era de
que eu tinha levado um soco bem no estômago. — Pode comemorar, se
quiser, não é como se fosse me chocar com essa atitude — continuou em
desdém, quando eu não disse nada, e por mais atordoado que eu estivesse
no momento, seu tom e atitude já estavam me cansando.
— Com todo respeito, dona Maria do Rosário, mas o que aconteceu
entre mim e Maria Clara só diz respeito a nós dois e…
— É aí que você se engana — ela tornou a me interromper. Mas será
possível que aquela mulher não me deixaria concluir um único
pensamento? — Tudo que envolve as minhas Marias me diz respeito, e não
vou assistir sentada e impassível enquanto você machuca minha filha mais
nova.
— Essa nunca foi a minha intenção, eu…
— Não vim à procura de desculpas nem explicações — atalhou
novamente —, guarde todas elas pra você e fique longe da minha Maria
Clara. Você já causou danos o suficiente, não acha?
Sim, eu achava. Porém isso não significava que eu gostava de ter a
verdade sendo esfregada na minha cara de forma tão crua. Eu não estava
acostumado à petulância vindo de alguém que não fosse eu, então estava
longe de me sentir confortável naquela conversa. Mas dona Maria do
Rosário tinha razão quanto ao meu relacionamento com Maria Clara.
Depois de nossa discussão na noite anterior, eu não via como
poderíamos retomar o que tínhamos antes. E, mesmo se houvesse um modo
de fazê-lo, em dois dias eu iria embora de Ilha do Sol e voltaria para os
meus negócios e para a minha vida cronometrada, nossos momentos juntos
transformando-se apenas numa lembrança bonita — mas que agora estaria
completamente manchada graças ao meu modo impossível e arrogante de
ser.
Nesse caso, havia apenas uma coisa da qual eu precisava me
certificar.
— Ela realmente não está grávida? — perguntei, percebendo um tom
de ansiedade que não me era típico e que eu esperava que dona Maria do
Rosário não percebesse.
— Ainda que estivesse — respondeu amargamente. — Pior do que
criar um filho sem pai é fazer isso com um homem frouxo ao lado.
E simples assim, tão de repente quanto chegou, ela me deu as costas e
desapareceu elevador adentro, deixando meu ego e meu orgulho feridos de
uma forma que eu não sabia ser possível.
Dias atuais
Capítulo 9
— Você não precisava estar aqui. Sabe disso, não sabe? — Patrícia
perguntou assim que colocamos os pés no duplex.
Com a ida de Maria Flor para o exterior e minha barriga crescendo
como se não houvesse amanhã, o trabalho se acumulara, e eu vinha
treinando minha melhor amiga e colaboradora para fazer a vistoria dos
imóveis que tínhamos que limpar, e ela estava fazendo um ótimo trabalho.
Apesar disso, eu insistia em trabalhar enquanto me sentisse bem o bastante
para isso, como mamãe e Maria Alice fizeram.
Mas não era por isso que Patrícia estava preocupada, e eu sabia muito
bem.
O lugar trazia mais lembranças do que eu gostaria de admitir, porque
era onde Rodrigo se hospedara na primeira e última vez em que estivera em
Ilha do Sol. Depois disso, aquela era a segunda vez que tivemos que limpar
o imóvel, mas eu não participei da vistoria anterior, porque tudo parecia
muito recente e eu não sabia se estava pronta.
Agora eu estava. Tinha que estar. Pelo bem de Maria Elisa, porque ela
precisava de uma mãe forte e destemida quando chegasse, não de uma
garotinha chorona com o coração partido.
— Você se importa de checar o segundo andar? — desconversei,
tocando minha barriga de leve. — Está cada dia mais difícil subir as
escadas.
Ela sorriu para mim, acenando em concordância.
— Você é teimosa feito uma mula, Maria Clara — soltou antes de
subir as escadas, me deixando sozinha no andar de baixo.
Suspirei, ignorando o tremor que perpassou minha espinha quando o
pensamento de dar início à vistoria me abateu, mas aquele era meu trabalho,
e eu não deixaria a lembrança de Rodrigo me assombrar por toda a vida.
Com isso em mente, sacudi os ombros, como se o gesto fosse capaz de me
dar forças, e coloquei a mão na massa.
De algum modo, Maria Clara tinha conseguido ficar ainda mais linda
do que minhas lembranças me diziam que ela era.
E estava grávida, com um homem ao seu lado tocando a barriga
avantajada onde o bebê de Maria Clara crescia aparentemente saudável.
Girei a cabeça de um lado para o outro, alongando bem o pescoço,
como se isso fosse capaz de amainar a onda de estresse que eu sentia por
flagrá-la naquela situação, mas tudo o que eu conseguia quando fechava os
olhos era vislumbrar sua barriga de grávida. Gravidez que deveria ter
acontecido quando ainda estávamos juntos, ou pouco tempo depois.
Mas que diabos!
Era coincidência demais. E eu era um homem de negócios,
acostumado com lógica e matemática, não com acasos absurdos. Pedir que
eu acreditasse por um único instante que depois de mim Maria Clara teria se
envolvido com o tal Maurício e engravidado era um completo absurdo.
Não havia a possibilidade real de ele ser o pai daquele bebê. Eu me
recusava a acreditar. Precisaria ser uma distância muito ínfima entre o falso
positivo e a nova gravidez, e eu tinha certeza de que Maria Clara não estava
com ninguém além de mim, durante nosso período juntos. Eu era um
completo idiota por ter insinuado o contrário com base nas minhas
experiências passadas, porque sempre soube que Maria Clara não era como
as outras mulheres que tentavam gastar meu dinheiro em toda oportunidade
que tivesse.
A mãe dela me dissera com todas as letras que Maria Clara fora
vítima de um falso positivo, que não estava esperando um bebê meu nem
estava interessada no meu dinheiro. De todas essas afirmações, agora eu
sabia que apenas a última era verdade, e eu não conseguia parar de remoer a
culpa que me assolava ao pensar em Maria Clara sozinha durante os últimos
meses, sem o meu apoio, tendo que lidar com uma gravidez que foi
ocasionada por nós dois.
Mas que ela escolhera esconder de mim. Com ajuda da própria mãe.
Quem poderia culpá-la quando eu ofereci um milhões de dólares pelo
meu herdeiro?
Como fui um filho da puta com ela!
Mas ela também foi, quando escolheu mentir sobre a gravidez.
Que bom que eu tinha uma cama gigantesca na qual poderia me deitar
e remoer os erros do passado.
Depois de ponderar sobre o que deveria fazer, cheguei à conclusão de
que havia uma única forma de agir, daquele momento em diante. Sendo
assim, bati à porta da casa de Maria Clara logo cedo pela manhã, para que
pudéssemos conversar e tirar aquela história a limpo.
Foi ela quem me atendeu, usando um vestido florido que acentuava
sua barriga arredondada, e os olhos de chocolate se arregalaram de pura
surpresa ao me fitarem.
— O que você está fazendo aqui? — ela perguntou de imediato, meio
gaguejante, e eu precisei de todo meu autocontrole para não a beijar ali
mesmo, quando ela passou a língua pelos lábios volumosos.
Eu tinha que focar no que fora fazer ali.
— Você está grávida — apontei o óbvio, porque foi a primeira coisa
que me ocorreu dizer, minhas palavras saindo num tom acusatório.
Maria Clara engoliu em seco, empinando o nariz como se não
quisesse se deixar intimidar.
— E você é muito perspicaz — soltou ironicamente. — Fora daqui.
— Ela tentou fechar a porta, mas coloquei o pé entre ela e o batente,
impedindo o movimento, e adentrei o hall da casa de Maria Clara pela
primeira vez na vida.
Ela deu passos para trás, recuando.
— Esse bebê é meu, não é? — inquiri de pronto, sem tempo ou
paciência para rodeios. — Não minta pra mim, Maria Clara — exigi com o
maxilar trincado em pura cólera, quando ela pareceu prestes a negar. —
Não deixe que a raiva ou qualquer rancor que você possa ter de mim
nublem o seu bom-senso. Esse filho é meu.
Eu não sabia por que tinha tanta certeza disso, mas tinha. Parecia
inegável que Maria Clara estivesse grávida do meu bebê, e, como se para
provar minha teoria, ela virou o rosto para o outro lado, o olhar fugindo do
meu logo após ela ter engolido em seco, parecendo avaliar suas opções.
— É uma menina — foi o que ela escolheu dizer, e por algum motivo
desconhecido algo se aqueceu dentro do meu peito. — Maria Elisa —
continuou, voltando seu olhar duro para mim. — E nós não precisamos de
você antes, certamente não precisamos agora.
Seus punhos estavam fechados ao lado de seu corpo, e eu neguei com
um meneio de cabeça, porque aquilo estava longe de ser a verdade.
— Como pôde me esconder isso? — eu quis saber, ignorando sua
provocação. — Perdeu o juízo?
Ela bufou, e foi sua vez de sacudir a cabeça de um lado para o outro,
como se mal pudesse acreditar no que acabara de ouvir.
— Você que parece ter perdido o juízo e a memória — acusou —, ou
já se esqueceu de quando contei que estava grávida você insinuou que eu
era uma golpista e me ofereceu dinheiro pra sumir?
Havia tanta mágoa em seu tom de voz, que Maria Clara conseguiu
despertar em mim um sentimento que não era comum: remorso. Eu me
envergonhava de ter duvidado dela a esse ponto, mesmo que fosse por um
mísero segundo, porque deveria conhecer melhor seu caráter e saber que ela
jamais seria capaz de um golpe baixo como aquele.
— Não te ofereci dinheiro pra sumir, não diga besteiras! — retorqui,
porque era a verdade. — O que eu queria era comprar o seu silêncio, porque
tenho um nome a zelar.
— Pois então vá zelar do seu nome bem longe de mim e da minha
filha! — berrou, apontando para a porta logo atrás de mim, mas eu não iria
simplesmente sumir da sua vida em um passe de mágica.
Aquele tinha sido meu erro do passado, e eu não estava prestes a
repeti-lo quando me arrependia amargamente.
— Você precisa da minha ajuda, não seja intransigente. Eu posso
oferecer dinheiro e…
— Não sou uma morta de fome, não preciso do seu dinheiro pra criar
minha filha! — ela gritou, exasperada, com uma nota de ultraje banhando
seu tom.
— Nossa filha! — fiz questão de frisar. — A filha que você escolheu
esconder de mim. Será que não consegue ver a gravidade da situação?
— Foi você quem foi embora sem nem olhar pra trás — acusou,
apontando um dedo em riste para mim. — Você, e não eu! Depois de ser
humilhada, o que queria que eu fizesse? Que te procurasse e mendigasse
atenção? — perguntou, mordaz, o rosto inteiro tomado por fúria e
deixando-o num tom escarlate.
— Sua mãe foi me procurar. Saiu em sua defesa como uma leoa
protegendo o filhote. Não sabia disso? — Estreitei os olhos, medindo sua
reação às minhas palavras. — Foi ela quem me mandou ficar longe.
Foi ela quem disse que você não estava grávida.
— E claro que, como o bom menino que é, você obedeceu —
retrucou com escárnio, balançando a cabeça de um lado para o outro
furiosamente. — O que espera receber? Uma medalha de bom
comportamento?
— Estou só tentando provar que não estive longe por minha culpa, a
sua mãe se meteu na nossa história — devolvi em minha defesa, porque as
coisas não eram cem por cento culpa minha.
Entretanto, minhas palavras causaram tanta revolta em Maria Clara
que ela explodiu ainda mais, saindo totalmente do controle.
— Dobre a língua pra falar na minha mãe, ouviu? — Suas mãos
agarraram as lapelas da minha camisa, quando, na verdade, eu sabia, o que
Maria Clara desejava era me trucidar. — Você é um homem feito que não
deve satisfação a ninguém, se não veio me procurar foi porque não quis,
não coloque a culpa em outra pessoa.
Como se tivesse sido invocada, dona Maria do Rosário surgiu das
escadas, descendo os degraus apressadamente para então apoiar as mãos no
ombro da filha, puxando-a em sua direção.
— O que são todos esses gritos? — ela quis saber, abraçando a filha,
que tremia de pura raiva, as mãos rumando para o seu cabelo logo em
seguida, na tentativa de acalmá-la.
E eu me senti um merda. Vendo-a ali, tão nervosa, com a barriga linda
e redonda servindo de casa para a nossa filha.
— Vá embora, Rodrigo — foi a resposta de Maria Clara, um sussurro
débil e trêmulo quando seu corpo começou a se sacudir, indicando que ela
chorava. — Eu não quero te ver, por que você teve que voltar?
— Eu…
— Talvez seja melhor terminar essa conversa em um outro momento
— dona Maria do Rosário interrompeu, me lançando um olhar firme, e eu
meneei a cabeça numa negativa. — Pelo bem do bebê, Maria Clara precisa
se acalmar — emendou antes que eu pudesse protestar, e aquele argumento
ganhou a discussão.
Maria Elisa… minha filha.
Ela era o motivo de eu estar ali, não era? Não fazia sentido tomar uma
atitude que pudesse prejudicá-la, eu jamais me perdoaria se algo
acontecesse a ela… ou a Maria Clara.
Eu tinha que colocar a porra da minha cabeça no lugar.
Sendo assim, concordei com um aceno de cabeça, mesmo que a
contragosto.
— Esta conversa ainda não acabou — eu disse antes de lhes dar as
costas e sair dali.
Capítulo 14
Ter Maria Elisa em meus braços era como segurar meu mundo todo
entre eles. Ela era tão pequena — apesar de seus três quilos e cinquenta
centímetros -, tão macia e delicada. Fazia com que meus instintos de
proteção fossem acionados no mais alto nível.
Sua mãozinha se fechou em torno do meu dedo indicador, e o meu
coração se derreteu inteiro por ela.
Eu a amava, de uma forma que jamais ser possível e que não sabia
explicar, mas minha filha mal chegara ao mundo e já me tinha rendido por
ela.
Minha filha. Eu era pai. De uma garotinha encantadora e de pulmões
fortes, se seu choro estridente ao nascer fosse algum indicativo.
— Você sabe que pode colocá-la no berço pra descansar os braços,
não sabe? — a voz de Maria Clara soou às minhas costas, alertando que ela
havia acordado de seu cochilo depois de alimentar nossa filha.
Eu me virei para ela, e, apesar das últimas horas, onde deu à luz o ser
humano mais lindo de todo o mundo, o alívio de saber que Maria Elisa era
um bebê forte e saudável lhe fez muito bem, porque ela ainda era a mulher
mais linda em quem já pus os olhos.
— É você quem precisa se preocupar em descansar, não eu —
apontei, lembrando-me de seus gritos de dor durante o parto. Maria Clara
merecia o mundo e eu estava disposto a dar-lhe exatamente isso, se fosse o
que ela queria.
— Eu estou bem — murmurou através de um bocejo, batendo no
ínfimo espaço na cama ao seu lado. — Traga ela aqui — pediu, arrumando
sua posição na cama.
Eu me aproximei, sentando-me ao seu lado, e Maria Clara colocou
uma mecha do próprio cabelo atrás da orelha antes de se inclinar e depositar
um beijo na cabecinha de Maria Elisa.
— Ela é tão linda — disse em um suspiro, a mão esquerda traçando o
contorno dos traços perfeitos da nossa filha. — E tem os seus olhos —
observou, ainda que Maria Elisa estivesse de olhos fechados, ressonando
tranquilamente em meus braços.
Meu peito se encheu de orgulho e regozijo, e eu anuí com um gesto
de cabeça.
— Mas o resto é todo seu — apontei. — Por isso ela é tão perfeita,
porque se parece com a mãe.
Maria Clara corou, demonstrando visivelmente seu desconcerto ante o
elogio sincero.
— Onde estão minha mãe e minha irmã? — mudou de assunto.
— O médico as convenceu de que o melhor era ir pra casa, a fim de
desencasarem um pouco. Como você só pode ficar com um acompanhante e
eu me recuso a ir embora… — Dei de ombros, como se não fosse nada de
mais, quando na verdade nada poderia me separar da minha Maria Elisa tão
cedo.
— Você também precisa descansar — retrucou. — E cuidar dos seus
negócios, porque não está aqui a passeio.
— Bobagem. Omar pode tomar conta de tudo, ele até mesmo achava
desnecessária minha presença em Ilha do Sol. Nada é mais importante pra
mim do que estar com você e Maria Elisa.
E era mesmo a verdade. Pela primeira vez em muito tempo os
negócios não eram o que me movia, e sim minha vida pessoal.
— Se você diz… — Maria Clara deu de ombros, parecendo tímida.
— Nós temos um assunto inacabado — eu a lembrei, recebendo um
olhar desconfiado em resposta. — Eu te pedi em casamento quando Maria
Elisa decidiu que sua chegada ao mundo era mais importante do que
qualquer outra coisa. Não que eu discorde disso.
Maria Clara sorriu, um gesto bonito e verdadeiro que me fez ficar
apaixonado pelo fato de ser o responsável por colocar aquele sorriso nos
seus lábios.
— Eu já disse que você está louco se acha que casamento é a resposta
— respondeu com um suspiro.
— Por quê? — eu quis saber, franzindo o cenho por não entender sua
recusa. — Nós temos tudo pra dar certo.
— Nós temos uma filha juntos — contrapôs. — Um casal precisa de
bem mais que isso pra dar certo.
— Maria Clara…
— Esse não é o momento — ela me interrompeu, pousando o
indicador nos meus lábios para calar o meu protesto. — Nós dois estamos
com as emoções à flor da pele, não é justo pensarmos em decidir algo tão
importante assim nesses termos.
Assenti num meneio de cabeça, entendendo seu argumento por mais
que discordasse dele. De qualquer forma, se tempo era o que Maria Clara
precisava para entender que nós pertencíamos um ao outro, eu seria
paciente e lhe daria o que ela estava me pedindo.
Capítulo 17
Dois meses haviam passado desde o dia em que Maria Elisa chegou
ao mundo, e mesmo que os compromissos fora de Ilha de Sol insistissem
em me chamar, eu sempre dava um jeito de voltar para o local onde meu
coração batia fora do peito.
Minha filha era linda, e a mãe dela era uma mulher incrível e forte, o
que só fazia a necessidade de tomar conta delas crescer dentro do meu peito
até que ameaçasse explodir.
Eu as queria comigo, aonde quer que eu fosse, e os momentos longe
delas apenas tornava essa certeza inabalável. Talvez fosse o momento de
voltar a tocar no assunto casamento com Maria Clara, apesar de não parecer
momento cabível dentro de nossa rotina para tal abordagem. Por isso eu a
convidei para jantar, como modo de ter um momento apenas entre nós dois
no qual pudéssemos falar de algo além de troca de fraldas e amamentação.
Seria a primeira vez de Maria Clara fora de casa sem a presença de
Maria Elisa, de modo que eu gostaria de que fosse algo especial, o que
significava que o country club estava fora de cogitação. Maria Clara ainda
não fizera as pazes com o lugar, e eu jamais poderia culpá-la. A vida não se
mostrara fácil para a terceira filha de uma mãe solo, e as pessoas não
pareciam ter evoluído em nada.
Assim sendo, decidi que o melhor a se fazer era contratar um
excelente chef de cozinha para preparar o jantar para mim e Maria Clara.
Nossa filha ficaria sob os cuidados das demais Marias e Zeus, e não havia
ninguém no mundo em quem eu confiasse mais para a tarefa.
— Você não precisa deixar de beber só porque eu não posso — Maria
Clara murmurou já sentada à mesa, quando lhe servi um bom suco de uva
integral, no lugar do vinho.
— Estamos nessa juntos, lembra? — devolvi, erguendo minha taça
para ela, para que pudéssemos brindar. — À nossa filha, que é a coisa mais
preciosa que possuímos.
Seus olhos enterneceram, e ela tocou sua taça com a minha, sorvendo
um gole de seu suco e devolvendo a taça à mesa.
— Será que ela está dando trabalho pra minha mãe e Maria Alice?
Faz tempo que elas não sabem o que é ter um bebê de total responsabilidade
delas.
A preocupação era notável em seu tom, e eu abri um sorriso de
apreciação, orgulhoso pela mãe maravilhosa que ela se mostrava ser a cada
dia.
— Tenho certeza de que elas estão bem — assegurei, e eu gostei do
fato de Maria Clara confiar em mim a ponto de seus ombros relaxaram
instantaneamente.
— Claro que você acha isso, já que se aliou a elas pra me tirar de
casa. — Ela rolou os olhos, fingindo exasperação. — Espero que saiba que
você não precisa se dar ao trabalho. Eu ia sair sozinha… eventualmente —
emendou, sob meu olhar de ironia.
— Maria Elisa nasceu, mas isso não significa que você tenha que se
apagar como mulher. Tenha isso em mente.
Ela mordeu o lábio, como se tentasse decidir se faria ou não a
próxima pergunta.
— Você acha que estou fazendo isso? — quis saber, inclinando-se de
leve sobre a mesa que nos separava. — Que estou me apagando como
mulher?
Considerei a pergunta, bebendo mais um gole do meu suco de uva e
pousando a taça sobre a mesa.
Maria Clara nunca me parecera tão atrativa quanto agora, mesmo que
seu intuito nem de longe fosse seduzir. Mas seu corpo ganhara curvas mais
generosas, durante a gravidez, e, como se quisessem provar um ponto, meus
olhos focaram na depressão profunda de seu decote que, deveria ser
inofensivo, mas não era.
Seus seios estavam mais avantajados, graças à amamentação, e eu
soube, desde que pus os olhos em Maria Clara depois dos últimos meses
sem vê-la, que sua beleza florescera de modo exorbitante e que me deixava
tonto de tesão sempre que eu pensava nela e me lembrava dos nossos
momentos juntos.
— O que eu sei — comecei, me levantando do meu assento para que
pudesse ir até ela, apoiando o quadril na borda da mesa — é que você me
deve uma resposta.
Suas sobrancelhas se franziram, e ela me encarou, confusa.
— Do que está falando?
— Você aceita ser minha esposa? — murmurei, levando uma de
minhas mãos para brincar com uma mecha de seu cabelo sedoso,
enrolando-a entre meus dedos e me lembrando como aquela massa castanha
ficava ainda mais bonita completamente revolta sobre os meus travesseiros.
— Achei que tivéssemos superado esse assunto — ela soltou entre
dentes, levantando-se também e, de tal modo, colocando um fim ao meu
toque e mais distância entre nós.
— Eu não vou superar enquanto não receber um sim — alertei,
içando minha sobrancelha em desafio, e ela bufou.
— Então não vai superar nunca, porque isso não vai acontecer, nunca
vou dizer sim — soltou, revoltada, cerrando os punhos aos lados do corpo.
— Por que não? — eu quis saber, uma carranca mal-humorada
tomando conta das minhas feições.
Não era todos os dias que eu precisava praticamente implorar para
que o meu desejo se tornasse realidade.
— Porque isso sim seria me apagar como mulher e me resumir a
apenas mãe da sua filha! —Maria Clara devolveu, exasperada. — Será que
você não vê que a proposta chega a ser ultrajante?
— Ultrajante? — ecoei, deixando transparecer em meu tom o quanto
eu achava aquela acusação sem sentido. — Estou te pedindo pra ser minha
esposa, não uma amante qualquer.
— Como é possível que você não entenda a problemática disso? Não
quero me casar apenas porque engravidei, pra cumprir um papel que a
sociedade espera de mim. Se um dia eu me casar, quero que seja por amor,
paixão, cumplicidade… — enumerou, e eu segurei seu rosto bonito entre as
mãos, olhando no fundo de seus olhos.
— Mais cumplicidade do que existe entre nós dois? — eu quis saber.
— Mais paixão? Mais desejo?
Aquilo era impossível, porque não tinha como existir uma química
maior do que a que Maria Clara e eu possuíamos. Eu ainda conseguia me
lembrar do gosto de seu beijo, da entrega de seu corpo, dos seus gemidos de
prazer ao meu ouvido… e sentia falta de todas essas coisas.
— Não estou falando de um caso tórrido de verão, e sim de algo pra
vida toda. — Seus olhos brilharam em pura emoção. — Quando ou se eu
me casar, eu quero que seja pra sempre.
— É isso que estou propondo.
— Não. — Ela sacudiu a cabeça de um lado para o outro, em uma
negativa. — Você está propondo algo de conveniência, porque não quer
ficar longe da sua filha. Não tem nada a ver comigo.
Ponderei por um instante. Ela tinha razão?
Claro que não.
A resposta veio alta e clara na minha cabeça, uma resolução
incontestável.
Sim, eu queria Maria Clara e era conveniente que ela fosse a mãe da
minha filha, mas esse não era o único motivo pelo qual eu a queria. Maria
Elisa era a força motriz por trás de muitas coisas, mas não do meu desejo
por sua mãe.
Ela era fruto de tal desejo, verdade fosse dita. Da minha incapacidade
de resistir a Maria Clara, à sua personalidade extraordinária e à forma como
ela me fazia sentir vivo por dentro.
— Se acha que eu faria essa proposta pra outra mulher que não fosse
você, perdeu o juízo de vez — declarei, sentindo no fundo do peito a
verdade por trás de cada uma de minhas palavras.
Eu jamais daria as costas a um filho meu e seria o melhor pai possível
sob quaisquer circunstâncias, mas, em se tratando de Maria Clara… eu mal
podia esperar para ouvir os sinos da igreja soando e conseguia até mesmo
vislumbrar seu rosto bronzeado adentrando a nave da igreja para ser
indubitavelmente minha.
— E o que acontece quando a magia do momento acabar? —
questionou. — Quando você estiver de volta à sua vida, cercado por
mulheres deslumbrantes se batendo pra estarem na sua cama?
— Eu vou dizer a elas que já existe alguém em minha cama: você —
respondi de pronto, sem precisar de um único instante para pensar a
respeito.
Não havia mais ninguém que eu pudesse querer se tivesse Maria
Clara nos meus braços.
— Isso até eu perder a graça e você desejar me substituir — soltou
amargamente, sacudindo a cabeça de um lado para o outro.
— Não tem como substituir você, acredite em mim, eu tentei.
Seu rosto bonito se transformou em uma expressão insultada ao
mesmo tempo que ela cerrou os punhos e acertou meu peito repetidas vezes
com ele, a um único passo do histerismo. E, eu precisava admitir, ela tinha
total razão em reagir daquele modo.
— Mas que cretino! — ela bradou, furiosa, ainda me golpeando, até
que segurei seus pulsos e a puxei contra meu corpo, arrancando-lhe um
arquejo de surpresa.
— Não tem uma forma bonita de dizer isso, okay? — admiti entre
entes. — Sinto muito, mas é como me sinto. Posso provar, se palavras não
forem o suficiente — ofereci, ciente de que, no momento que ela baixasse a
guarda e me deixasse mostrar o quanto me deixava louco, não haveria
dúvidas quanto às minhas intenções.
— Não preciso que me prove nada — devolveu em um chiado, depois
de engolir sem seco, e eu me inclinei em sua direção, resvalando meu nariz
contra o seu brevemente.
— Tem certeza? — desafiei. — Não é uma tarefa difícil.
Minhas mãos, que antes seguravam os seus pulsos, passearam por
seus braços, e eu senti sua pele ficando arrepiada em resposta, o que
mostrava que eu não era louco e que aquele desejo que sentia por ela não
era, de jeito nenhum, unilateral.
— Rodrigo… — ela chamou com uma voz pesada. — Não ouse.
— O que eu não devo ousar?
— Você sabe — devolveu com a voz trêmula, quando meus lábios
alcançaram seu ombro nu, graças ao vestido de alças que ela usava.
— Sei? — eu quis testar, meus lábios deslizando languidamente até
seu pescoço, fazendo com que Maria Clara soltasse uma respiração ainda
mais pesada.
— Não ouse me beijar… — alertou, porém seu corpo entregue a voz
difícil pareciam implorar o extremo oposto, de modo que tornava a situação
impossível de resistir.
— Por que não? — provoquei. — Por acaso você já me substituiu?
Uhm? — instiguei, quando ela não me respondeu imediatamente, mas a
mera possibilidade já era um inferno de imaginar, porque a imagem de
Maurício e do modo como ele parecia à espreita para roubar minha mulher
assolou meus pensamentos.
— Isso não é da sua conta — Maria Clara escolheu dizer.
— É cem por cento da minha conta, já que estou tentando te seduzir e
te fazer minha de uma vez por todas.
Sua boca linda e suculenta se abriu para que ela pudesse me
responder, mas eu fui mais rápido, roubando aqueles lábios deliciosos em
um beijo voluptuoso e escutando os gemidos de prazer que emitimos,
juntos, e demonstravam o quanto sentimos falta um do outro.
Reconhecendo o caminho, minhas mãos agarraram a bunda redonda
de Maria Clara, dando-lhe impulso para que eu pudesse sentá-la na mesa e
me encaixar entre suas pernas, o que fiz em questão de segundos, já que não
encontrei resistência.
Havia apenas desejo, nu e cru, e eu estava prestes a provar para
aquela mulher que nenhum outro homem jamais a faria gritar de tesão como
eu era capaz de fazer.
Capítulo 19
Maria Clara chegou com Maria Elisa depois das sete horas da noite.
Eu nem precisei olhar duas vezes para saber que a minha garotinha estava
desmaiada em seus braços. Eu estendi minhas mãos mesmo assim, e Maria
Clara me passou nossa filha com cuidado.
Eu suspirei quando senti seu peso característico, sua respiração
compassada saindo pelo pequeno narizinho, o calor do corpo dela
aquietando o meu coração só um pouco. Quase me fazendo sorrir, como só
a dona do meu coração podia.
— Tive que passar em casa e não consegui deixar o banho para você
— Maria Clara esclareceu, e foi o suficiente para que eu colocasse aquilo
na conta do passeio da praia com Maurício. — Maria Elisa estava prestes a
cair no sonho.
— É claro que estava — retruquei, inamistoso, enquanto me dirigia
ao berço do meu tesourinho. — É o que acontece quando ela tem um dia
agitado.
Eu queria ignorar Maria Clara, porque foi ela quem aceitou aquele
passeio na praia, mas aquela mulher era minha ruína e meus olhos traidores
nunca conseguiam se manter longe dela. Arrisquei observá-la, só para
encontrar suas sobrancelhas levemente franzidas.
— Como sabe que o dia dela foi agitado? — ela perguntou, parecendo
genuinamente confusa e curiosa. Por mais que a expressão a deixasse mais
linda, a confissão indireta de que Maurício monopolizara o tempo, a energia
e atenção delas, me deixou ainda mais puto. — Rodrigo — ela me chamou
outra vez, me trazendo de volta para a realidade. — Como sabe que...
— Terminei a reunião mais cedo — esclareci, a interrompendo —, fui
até a sua casa, mas vocês já tinham saído para a praia.
Com a porra do Maurício!
Maria Clara sorriu, é claro que sorriria, alheia a como eu estava
prestes a explodir.
— E por que você não foi até lá?
Por que eu não fui até lá?… Ela queria um passeio com Maurício,
Maria Elisa e eu?
— Porque vocês estavam muito ocupadas com Maurício — devolvi,
inamistoso, em um sussurro mal contido para não perturbar o sono de Maria
Elisa. — Apesar de ele nem sequer saber como se carrega a minha filha
direito.
Maria Clara girou os olhos e, com cuidado, eu coloquei Maria Elisa
em seu berço, me assegurando de cobri-la com a manta vermelha.
— Rodrigo...
Suspirei, impaciente, acariciando a testinha da minha filha e deixando
o quarto à meia-luz.
Balancei a cabeça em direção ao corredor e Maria Clara me seguiu.
— Ele é desengonçado com ela — apontei o óbvio, todo o meu corpo
se virando para Maria Clara. — Não é possível que você não consiga ver
que ele não tem jeito nenhum para carregar um bebê.
Eu esperava uma risadinha de confirmação, ou mesmo um balançar
de cabeça que me indicasse que ela percebera e concordava comigo. Não
foi o que eu ganhei, no entanto. No lugar disso, Maria Clara cruzou os
braços na frente do corpo, a expressão de confusão se acentuando em sua
testa.
— Você está muito estranho.
Não, eu só estava fervendo de ódio.
— É por causa dele, não é, Maria Clara? — eu me vi dizendo, antes
que pudesse me controlar.
— Por causa dele o quê? — ela perguntou, um tom de cautela
pintando a confusão na sua voz, o suficiente para que eu ficasse ainda mais
fora de mim.
— É por causa dele que você disse não ao meu pedido de casamento!
— esbravejei, balançando a cabeça, aturdido com o sentido repentino que
aquela conclusão trazia. Aterrorizado com aquela possibilidade.
Os olhos de Maria Clara se arregalaram.
— Rodrigo, pelo amor de Deus, a gente já conversou sobre isso…
É claro que ela tentaria contornar as coisas, e a verdade é que eu mal
a escutava já que uma possibilidade terrível passou pela minha cabeça.
— Vocês tiveram alguma coisa? — interrompi.
Toda a expressão calma de Maria Clara se transformou em uma
máscara de incredulidade, eu até mesmo pude ouvir a respiração saindo em
um jato pelo seu nariz.
— Claro, eu tive muito tempo enquanto desfilava por aí, grávida de
você.
Eu grunhi. Não precisava de ironias disfarçadas de uma boa resposta.
Eu precisava escutar com todas as letras, como ela não entendia isso?
— Mas você quer? Quer pensar em dar a ele alguma chance e por
isso...
Maria Clara ergueu a mão, dando vários passos para perto de mim, os
olhos chocolates lindos e consternados. Deveria ser proibido por lei alguém
ser tão bonita em qualquer situação como ela era.
Inferno, ela era a mulher mais bonita de todo o mundo.
— É melhor parar — avisou, me deixando atordoado por um
momento. — A última vez que você insinuou algo parecido, nós ficamos
meses sem nos vermos e você quase perdeu o nascimento de Maria Elisa.
Só a perspectiva de eu perder as duas de novo acabava comigo. Mas
será que Maria Clara não conseguia ver? Seria que não conseguia entender
o que é que eu estava dizendo?
— Ele gosta de você! — esbravejei. — Vai mentir para mim que não
consegue enxergar isso?
Maria Clara soltou um riso incrédulo.
— E daí? Você está com ciúmes, por acaso? — ela provocou.
— Sim — respondi sem pensar, no automático.
O silêncio perdurou por vários segundos entre nós dois, enquanto
meus olhos se embebiam dos dela e mil coisas pareciam passar por aquela
cabecinha teimosa. Dentro de mim, a fúria incontida pareceu finalmente ter
encontrado vazão.
Eu estava com ciúmes dela.
Era óbvio, claro como água, e apesar da minha racionalidade como
homem de negócios me fazer querer passar por cima de determinados
sentimentos, a lógica da situação não me permitia ignorar o que claramente
acontecia.
— Sim? — ela testou, e eu não vacilei. — Você não precisa ter
ciúmes de Maria Elisa.
Eu soltei um bufar incrédulo.
— Não estou falando de Maria Elisa, apesar de que sim, ela se
mostrou uma bebê sorridente sem um pingo de consideração pelo coração
do pai dela.
As duas seriam minha ruína. Tal mãe, tal filha.
— Rodrigo... — Maria Clara começou um protesto.
— Eu estou com ciúmes de você — eu a interrompi, me recusando a
amainar a situação. — É o que você quer ouvir?
Ela balançou a cabeça incontáveis vezes.
— Você não pode estar falando sério.
Ah, mas eu estava. Acho que eu nunca tinha falado tão sério em toda
a minha vida.
Dei um passo em direção a Maria Clara.
— Você foi minha desde o momento em que te encontrei agachada no
meio do meu quarto — afirmei, minha voz firme e clara alcançando o
caminho até ela.
Maria Clara recuou um passo e eu dei outro.
— Eu não fui sua, a gente se separou por meses.
Suas costas alcançaram a parede e eu sorri, chegando mais perto dela
como se não sentisse pressa alguma, quando na verdade meu coração batia
descompassado dentro do peito, correndo atrás dos passos que eu ainda iria
dar.
— E esse tempo não foi o bastante para que você deixasse de ser
minha. Eu não tenho o direito de exigir que você sinta a mesma coisa,
Maria Clara, mas você é minha. Sempre vai ser. E eu jamais poderia
simplesmente aceitar te ver nos braços de outro homem.
Eu a alcancei, nossos olhos presos na nossa conexão única e incrível.
Minhas mãos subiram pelos seus braços, roçando sua pele macia.
Maria Clara engoliu em seco.
— Eu não estou nos braços de outro homem…
Eu sorri, o som das palavras trazendo um prazer quase sexual para
mim. Contudo, esse não era o ponto.
— Mas se recusa a cair nos meus, foge dos meus toques, diz não ao
meu pedido de casamento... Eu jamais te forçaria a admitir que é minha,
Maria Clara, mas estaria mentindo se dissesse que não fico louco por ter tão
pouco controle da situação.
Os olhos chocolate vislumbraram a minha boca, e meus lábios
coçaram pelos dela.
— Você não precisa ter o controle sobre tudo — ela sussurrou, a voz
baixa, sem a intenção de ser sedutora, mas que tinha todo o poder de
acordar a minha cabeça de baixo.
— Eu nunca tive controle com você — confessei.
E então nossos lábios se encontraram.
Sorvi daquela boca gostosa, minha língua sugando a dela.
Minha. Minha. Minha.
Agarrei os quadris de Maria Clara, enquanto forçava a pélvis contra a
barriga dela, o calor e o toque daquela mulher me fazendo soltar um gemido
de satisfação só de imaginar suas dobras macias apertando o meu pau.
Queria foder, sim. Mas sobretudo reivindicá-la para mim.
Minha por direito, como deveria ter sido desde sempre.
Contudo, o choro alto de Maria Elisa, reverberando pelo corredor,
quebrou nosso momento. Nossas bocas se separaram, as testas se
encontrando, as respirações sôfregas e desesperadas.
— Essa conversa não acabou, Maria Clara.
Capítulo 22
— Você prometeu que não iria atrás de Maria Clara assim que
chegássemos à Ilha do Sol, e olha só tudo o que aconteceu — Omar me
lembrou já de volta em casa, depois de ter partido da ilha há várias
semanas, uma vez que havíamos resolvido as pendências para a construção
do novo hotel.
— Eu não esperava encontrá-la grávida de um bebê meu — apontei, o
que para mim era o óbvio.
Por acaso ele esperava que eu só desses as costas a Maria Clara e à
minha filha e voltasse a ser um homem cem por cento movido por
negócios?
— Entendo seu posicionamento, mas não há muito que possamos
fazer. Você precisa voltar pra casa, pra empresa. Seu período de férias
acabou.
— Não estou tirando férias, e sim uma licença paternidade —
protestei. — Minha filha precisa de mim durante esse tempo.
Claro que ela precisava. Se eu não estivesse por perto, nos braços de
quem ela tiraria seu cochilo da tarde? Quem ajudaria Maria Clara com as
trocas de fraldas e buscaria Maria Elisa para que pudesse ser amamentada,
no meio da noite?
Não vinha sendo um período fácil, longe disso, cuidar de um bebê se
mostrara bem mais difícil do que administrar meus negócios e, ainda assim,
um milhão de vezes mais prazeroso e satisfatório, em especial quando o
sorriso banguela da minha filha se abria para mim e ela segurava meu dedo
indicador com sua mãozinha fechada.
Tão pequena e preciosa. Nosso tesourinho, como Maria Clara gostava
de chamá-la, e não poderia estar mais certa na descrição.
— Sua filha tem um time de Marias pra cuidar dela — Omar apontou,
e eu trinquei o maxilar do ouro lado da linha de forma automática.
— Mas eu sou indispensável — retruquei, frisando a palavra para que
ele entendesse. — Não é como nos negócios, que qualquer um com
competência pode assumir o meu lugar. Maria Elisa tem um único pai, e,
para a minha sorte, esse homem sou eu.
— Sinto muito que o conselho pense de uma forma diferente — Omar
devolveu em tom conciliatório —, mas você precisa voltar para analisar os
projetos que temos em São Paulo. Você pode resolver tudo em poucos dias
e então voltar para Ilha do Sol, se for o que deseja, mas não seja
intransigente.
Eu odiava admitir, mas Omar tinha razão, o que significava que eu
precisaria me ausentar de Ilha do Sol e deixar Maria Clara suscetível às
investidas de Maurício, que não era capaz de disfarçar o desejo que sentia
por minha mulher. Como se não bastasse, pegava minha filha nos braços da
forma mais desajeitada possível e ficava arrancando risadinhas dela que não
eram nem de longe tão lindas quanto as que ela destinava a mim.
Como eu poderia viajar tranquilo quando um abutre só estava
esperando que eu saísse para tentar se apossar da minha família?
Maria Clara e Maria Elisa estavam ali, sob o mesmo teto que eu, e era
impossível conter a emoção que começava no peito e culminava em
lágrimas nos meus olhos.
Três longas semanas se passaram, e agora meus amores estavam ali, à
distância de um simples toque. Eu era um filho da puta sortudo.
— Ei… você está chorando? — Maria Clara quis saber adentrando o
quarto que eu havia preparado para Maria Elisa. Ainda não estava todo
equipado, mas era bonito e combinava com ela.
— Claro que não. — Estalei a língua, como se a simples dúvida fosse
absurda, quando na verdade meus olhos estavam sim, marejados, de
emoções que eu não conseguia conter.
— O que houve? — Maria Clara quis saber, não tendo acreditado na
minha mentira. — Chegamos num momento ruim?
Sacudi a cabeça de um lado para o outro repetidas vezes, em negação.
— Ver Maria Elisa assim, de surpresa, depois de semanas… — Não
havia palavras no mundo capazes de descrever o que sentira. — Eu não
estava preparado pra quão mais linda e esperta ela está. E ainda tem você.
— O que tem eu? — Maria Clara perguntou, preocupada, lançando
uma olhadela para onde estava Maria Elisa, confortavelmente em seu berço.
— Senti sua falta todos os dias durante o tempo em que estivemos
longe — admiti, porque já não havia motivos plausíveis para nada a atração
sem limites que Maria Clara me fazia vivenciar. — Nós temos um elo
inquebrável. Uma cumplicidade esmagadora. Ficar longe de você foi uma
das piores partes de ter deixado Ilha do Sol, porque tudo o que eu queria era
seu abraço, sentir seu cheiro depois de um dia ruim. Me diga que sentiu o
mesmo, pelo bem da minha sanidade.
— E-u — ela gaguejou, atordoada. — É complicado.
— Não. Não é — neguei, segurando seu rosto bonito entre minhas
mãos. — Complicado é ter que aprender sobre amor depois dos trinta, como
eu tive que fazer. Sou fruto de um golpe da barriga, Maria Clara. Meu pai
sempre foi ausente e minha mãe… só queria os pagamentos gordos que
caíam em sua conta bancária. Eles nunca me ensinaram a esperar afeto de
ninguém ou mesmo como funcionava essa coisa complicada chamada amor.
Mas você nasceu em um lar amoroso. Entende mais disso do que eu, não é?
Porque você me ensinou tudo o que eu sei sobre amor, afeto e
cumplicidade.
— Rodrigo… — ela chamou, desconcertada, sem parecer certa do
que quiser;
— Consegue entender então que eu te amo? — perguntei, com todas
as letras, sem medo, para que não houvesse a menor dúvida sequer. —
Entende que me apaixonei por você durante esse tempo que passamos
juntos e que a vida longe de você e da nossa filha é um caos completo que
já não faz o menor sentido pra mim e o do qual não quero participar?
Seus olhos encheram-se de lágrimas, e ela tapou a boca com as duas
mãos, atordoada demais para que pudesse fazer qualquer outra coisa.
— Eu te amo com tudo o que eu tenho e, mesmo assim, morro de
medo de não ser o bastante para você.
— É o bastante para mim. — Ela cortou a distância entre nós dois,
segurando minhas lapelas e se colocando nas pontas dos pés. — Muito mais
do que eu sempre sonhei. Você é o bastante, nunca duvide disso, okay?
Nunca duvide que também sou completamente apaixonada por você.
Capítulo 26
Não era minha intenção ter Rodrigo se declarando para mim quando
deixei Ilha do Sol a fim de levar Maria Elisa para que pudesse ver o pai. De
qualquer forma, assistir àquele quase dois metros de homem chorando de
emoção ao observar a filha mexera com mais coisas dentro de mim do que
eu poderia medir em palavras. De tal modo, quando todas as palavras certas
pareceram sair de sua boca e ela desceu sobre a minha, não havia nada que
eu pudesse fazer além de deixar um arquejo arrastado irromper bem no
fundo da minha garganta.
Rodrigo me faria dele outra vez, eu soube disso no momento que ele
me pegou em seus braços fortes e me levou para o seu quarto — onde eu
passara as últimas horas descansando da viagem até São Paulo. Contudo,
algo parecia diferente em seus toques… em seus beijos.
Como se houvesse mais urgência. Mais paixão, lascívia… amor.
A palavra bonita fez com que meus olhos se enchessem de água, para
combinar com a intimidade já úmida entre minhas pernas e que clamava
pelo contato com Rodrigo.
Ele tirou nossas roupas com calma deliberada, expondo nossa nudez
por completo antes de me levar para a cama e encontrar espaço entre
minhas pernas abertas de pura ansiedade.
— Como é possível que você fique ainda mais linda a cada vez que
eu te vejo?
Suas palavras fizeram uma onda de calor generosa se espalhar por
todo o meu corpo, e eu podia apostar que havia corado.
— Você é muito bom com palavras — observei através da minha
respiração entrecortada, levando minhas mãos para espalmá-las no
abdômen trincado daquele homem delicioso e que a partir de agora seria só
meu.
Uma onda de regozijo me invadiu, me fazendo sentir corajosa o
bastante para tocar sua ereção indisfarçável, arrancando um gemido gutural
de Rodrigo, que jogou a cabeça para trás e moveu os quadris.
— Você é minha perdição, Maria Clara — ele murmurou com voz
rouca, prendendo meus pulsos que o agradavam para levar cada um deles
aos lábios, sentindo ali minha pulsação acelerada, antes de me tomar em um
beijo voluptuoso que fez toda minha cabeça rodar.
Meu corpo nu prensado entre Rodrigo e o colchão fazia com que
meus mamilos turgidos resvalassem contra seu peito, e a sensação era
aterradora.
— Preciso de você dentro de mim — admiti, afoita, ciente de que nós
teríamos muito tempo para preliminares depois dali, mas agora eu precisava
senti-lo nu e cru dentro de mim, para aplacar a saudade que sentia dele.
— Você pode ter tudo o que quiser de mim, gostosa — ele murmurou
um segundo antes de me penetrar com tudo, me deixando cheia dele… me
fazendo sentir completa de um modo que só era capaz quando ele me
tomava assim.
Um sorriso involuntário surgiu nos meus lábios quando Rodrigo
estocou em mim com precisão, os quadris chocando-se contra os meus e
fazendo miséria com o meu clitóris.
— Você gosta assim? — ele quis saber ao pé do meu ouvido, com
uma arremetida melhor do que a outra. — Me diz como você gosta,
princesa…
— Eu gosto forte — eu me peguei dizendo, tomada pelo momento
lúbrico. — Você sabe melhor que ninguém de como eu gosto — eu lembrei,
o que pareceu servir de combustível para suas arremetidas, que se tornaram
mais curtas e implacáveis.
— Você é minha, entendeu? — ele chiou após um beijo no meu
pescoço, e eu assenti em resposta.
Porque sim, eu era dele. Corpo, alma e coração.
Para sempre.
Epílogo
EVELYN SANTANA