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Copyright © 2023 EVELYN SANTANA

Todos os direitos reservados à autora. Nenhuma parte deste livro pode ser
utilizada ou reproduzida sob quaisquer meios existentes sem autorização da
autora. A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na lei n°
9.610/98, punido pelo artigo 184 do Código Penal.

Esta é uma obra de ficção. Seu intuito é entreter as pessoas. Nomes,


personagens, lugares e acontecimentos descritos são produtos da
imaginação da autora. Qualquer semelhança com nomes, datas e
acontecimentos reais é mera coincidência.
Age gap. Gravidez inesperada. Bebê secreto.
Maria Clara sonha em conhecer mais do mundo e ter sua própria
família, mas como não sabe quem é o próprio pai, tem em mente que esta não é
a realidade que ela deseja para um filho seu, portanto, ser mãe solo não está nos
seus planos.
Rodrigo Marinho é um bilionário pragmático de trinta e cinco anos
que nunca se deixou ser enlaçado pelo amor, por não acreditar que nasceu
para ele. Preza sua solteirice e não lhe atrai a perspectiva de pertencer a uma
única mulher.
Até que seu caminho cruza com o de Maria Clara, quando ele vai a
negócios a Ilha do Sol.
Seu jeito doce de menina mulher e suas curvas tentadoras fazem com que
Rodrigo não descanse até tê-la rendida em sua cama.
Uma gravidez inesperada, no entanto, muda tudo e coloca as
verdadeiras intenções de Maria Clara em xeque.
Seria possível que ela estivesse tentando dar o golpe da barriga em um
bilionário?
Prólogo
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Epílogo
Prólogo

O Universo só podia estar de brincadeira comigo, era a única


explicação.
Encarei as duas linhas no meu teste de gravidez, que indicavam o
resultado positivo, e lágrimas de puro desespero banharam o meu rosto.
Não devia ser possível, eu só tinha vinte e três anos e, apesar de ter
ajudado minha irmã mais velha, Maria Alice, a cuidar de sua filha, eu
deveria ser um pouco mais esperta e me prevenir melhor.
Eu era a terceira filha de uma mãe solo, e a terceira também a
engravidar não estando em um relacionamento sério.
— Maria Clara, será possível que você vai morar nesse banheiro? —
Maria Alice perguntou, batendo com o punho na porta e fazendo com que
eu me sobressaltasse.
Apertei os olhos com força por um momento, tentando controlar o
pequeno pavor que se formara no meu peito.
As últimas semanas ao lado de Rodrigo foram tão bonitas e, pela
primeira vez, eu me permiti o deslumbramento, mesmo sabendo que ele iria
embora.
Como meu pai fora depois de ter engravidado minha mãe.
— Já estou indo — assegurei à minha irmã, me livrando do teste no
cesto de lixo e encarando meu reflexo no espelho.
Eu estava parecendo um caco, mas não havia tempo para me
recuperar quando Maria Alice estava do lado de fora, afoita para entrar.
Abri a porta do banheiro, e encontrei minha irmã de punho erguido
para bater nela outra vez, de modo que me encolhi, meio assustada.
— Você está passando mal? — ela quis saber, preocupada, e sacudi a
cabeça de um lado para o outro.
— Não — neguei, mas a voz estava extremamente embargada e meus
olhos queimavam com as lágrimas teimosas que não entendiam que aquele
não era o momento de chorar.
— Maria Clara? — ela chamou, ciente de que eu mentira, e foi
impossível conter as lágrimas. — Oh… — emitiu, me fazendo adivinhar
que ela sabia exatamente o que eu vinha fazendo no banheiro.
Provavelmente deveria ter reconhecido meu olhar de vergonha e desespero.
O mesmo que ela deve ter mantido no rosto quando descobriu que estava
esperando Maria Vitória.
Seus braços me apertaram forte, e ela depositou um beijo no topo da
minha cabeça, acariciando meus cabelos.
— Vai ficar tudo bem, não se culpe — murmurou. — Ninguém nesta
casa vai te julgar por isso, se acalme.
Concordei com um aceno de cabeça, meus braços apertando a cintura
de Maria Alice em busca de conforto.
— Não conte pra mamãe ainda — pedi —, nem pra Maria Flor. Ainda
não estou pronta pra que ninguém saiba.
— Tudo bem — ela concordou, me abraçando mais forte e me
fazendo sentir cuidada e protegida como sempre tinha sido desde que
éramos pequenas, diminuindo o pânico que crescia dentro de mim por não
ter ideia de quais seriam meus próximos passos.
Semanas antes
Capítulo 1
Rodrigo
Ela estava agachada ao lado da cama, de quatro, a cabeça escondida
enquanto procurava alguma coisa, a bunda empinada para mim.
Eu sorri, como não fazia há dias, talvez meses. Aquele era o último
cenário que eu esperava encontrar quando chegasse ao duplex que tinha
alugado para a minha estadia de negócios em Ilha do Sol.
Pendi a cabeça, analisando o modo como a barra do vestido verde
quase subia pela bunda redonda da estranha no meu quarto. Cocei a barba,
sabendo que espiar aquela mulher, fosse ela quem fosse, não era o correto e
muito pouco cavalheiro da minha parte. Mas algo sobre as panturrilhas
bronzeadas e o jeito engraçado como parecia procurar algo debaixo da
cama, alheia à minha presença, fazia com que fosse impossível parar de
observá-la.
Não para sempre, claro.
— Perdeu alguma coisa? — a minha voz preencheu o silêncio do
quarto de uma vez, e a estranha quase pulou naquela posição. Ouvi o
barulho oco e vi quando ela bateu a cabeça na cama, saindo de lá
imediatamente, procurando pelo invasor do quarto quando, na verdade, ela
era a invasora.
Seus olhos castanhos quentes pairando em mim e se arregalando.
Eu fiquei encantando daqueles olhos.
— Meu Deus do céu, eu sinto muito — ela murmurou, as bochechas
tingindo-se de vermelho, tornando todo o contexto ainda mais atrativo. Os
cabelos castanhos de aparência macia dançaram sobre o decote do vestido
que era o meio terno exato entre mostrar de menos ou de mais. O tipo que
atiça a imaginação.
Um sorriso de lado se formou nos meus lábios sem que eu permitisse.
Eu gostei do que vi. Havia algo de encantador e sexy nela, tudo ao mesmo
tempo.
— Me perdoe pelo susto — voltei a falar, umedecendo meu lábio
inferior e apreciando quando os olhos dela desceram para conferir o
movimento — Acabei de chegar, achei que o duplex estaria vazio. Você é a
antiga locatária?
Minha pequena invasora preferida demorou um tempo para
responder, sua cabeça balançando-se efusivamente em seguida.
— Não, claro que não... — ela falou em um fôlego só e eu achei graça
do seu embaraço. — Minha mãe é dona da empresa de limpeza que cuidou
de deixar o duplex pronto para o senhor. Eu só estava checando se tudo
estava em ordem.
Era local e tinha um emprego, minha mente automaticamente
computou, acostumada com o andar racional das coisas no trabalho. Eu
gostava de saber das coisas, de ter todas elas sob o meu controle, mas,
naquele momento, apesar de querer entender todos os detalhes que levaram
aquela mulher para dentro do meu quarto, eu gostava da novidade.
Na minha rotina cronometrada pela agenda havia bem pouco espaço
para pequenos interlúdios como aquele.
— Você é realmente minuciosa na conferência da limpeza —
provoquei, apontando com os olhos para debaixo da cama —, ou devo me
preocupar que esteja grampeando o meu quarto para colher informações
para a empresa concorrente?
Ela deixou escapar uma risadinha encantadora, tão leve e solta, que
me fez dar dois passos para mais perto dela. Então seus olhos se
arregalaram.
— O senhor está brincando, né? Quer dizer, não, eu não sou de
nenhuma empresa concorrente. — Com um gesto tímido ela abriu uma das
mãos, me mostrando um colar dourado. — O fecho está frouxo, ele caiu
enquanto eu fazia a vistoria.
Aquiesci, colocando minhas mãos no bolso da calça como se assim
pudesse diminuir a vontade estranha que eu sentia de tocar nela.
— Qual é o seu nome, pequena invasora?
Suas bochechas coraram mais uma vez, e ela trouxe aqueles olhos
lindos para mim, piscando com os cílios longos, pouco ciente de que
parecia uma maldita feiticeira.
— Maria Clara — ela declarou, e o nome imediatamente ficou
grudado no fundo da minha cabeça. — Você deve ser o senhor Marinho.
— Rodrigo — corrigi, erguendo uma sobrancelha. — Você pode me
chamar de Rodrigo.
Ela assentiu uma vez, como se considerasse a opção.
— Rodrigo — ela ecoou, e eu tentei refrear a sensação de imaginá-la
dizendo meu nome de outro jeito. Tentei impedir meus olhos de conferirem
a boca bonita dela, sem sucesso. — Desculpe pelo inconveniente, pensei
que só chegaria amanhã. De qualquer forma, eu já tinha acabado, já vou
indo.
Ah, mas eu tinha outros planos.
Ela tentou passar por mim, trazendo um cheiro fresco e floral que
atacou os meus sentidos. Meu sorriso se alargou. Havia algo na forma como
ela se expressava, algo que me atraía. Sem me dar a chance de racionalizar
sobre aquilo, a segurei pelo pulso, impedindo sua fuga.
Gostei mais do que deveria da sensação daquela pele macia contra os
meus dedos.
Seus olhos subiram até os meus, surpresos, e eu a encarei de volta.
— Maria Clara — dancei com seu nome pela minha língua, e por um
momento seus olhos se arregalam ainda mais.
— Sim? — ela devolveu, num tom suave e trêmulo que, não deveria,
mas me deixava maluco.
— Me deixa colocar em você. — Não era um pedido. Eu não estava
acostumado a pedir por nada na vida. Maria Clara, contudo, pareceu
aturdida, sem entender o que eu queria dizer. Cedi a ela o meu melhor
sorriso enigmático, aquele que as revistas julgavam ser o verdadeiro motivo
de eu ser um solteiro cobiçado, no lugar da minha conta bancária. — O
colar. Eu coloco em você.
Ela hesitou, os olhos fugindo para a correntinha delicada em suas
mãos, surpresa estampada em seu rosto.
— Não precisa. — Ela sacudiu a cabeça.
— Eu faço questão — devolvi, procurando seus olhos e me
embebendo deles.
Ela mordeu o lábio inferior, nada ciente do perigo que corria ali, em
um quarto sozinha comigo.
— Rodrigo — sua boca teimosa começou uma contestação, mas eu
dei mais um passo para perto dela.
— Não pode vencer essa discussão comigo. Não quando acabou de
invadir o meu quarto.
Ali estava, a coloração vermelha nas bochechas mais uma vez. Eu
ergui a sobrancelha, como se o gesto fosse o suficiente para que ela me
obedecesse. Por um minuto eu achei que Maria Clara fosse insistir, mas no
final ela me estendeu a correntinha e eu a peguei entre os dedos.
— Vira para mim — pedi.
Assim ela o fez, afastando o cabelo e revelando a pele delicada do
pescoço, o cheiro característico do seu perfume me atingindo outra vez.
Parecia absurdo que eu desejasse uma estranha que conhecia há cinco
minutos porque a vira de quatro no meio do quarto em que eu dormiria
pelas próximas semanas. Mas algo sobre o conjunto Maria Clara era
diferente, me atraía sem que houvesse lógica para isso, eu sentia como se
pudesse tocar a tensão que o ar tomara com os meus dedos.
Tensão sexual.
Eu conhecia bem demais aquela sensação, apesar de nunca ter
vivenciado uma conexão tão forte e instantânea com tão pouco.
Meus dedos roçaram suavemente pelo pescoço de Maria Clara
enquanto eu colocava o colar com uma lentidão exagerada. Sorri no exato
momento em que notei seus poros dilatados por toda a extensão do braço,
um claro arrepio.
Fechei o colar em seu pescoço, minhas mãos descendo pelos braços
arrepiados, ao passo que minha boca se inclinava até o ouvido direito de
Maria Clara.
— Pronto. Perfeita.
Ela olhou para mim por cima do ombro, seus olhos pesados, sua boca
perto demais da minha.
— Obrigada.
Então piscou, se afastando de mim logo em seguida, seus lábios
carnudos parecendo umedecidos e suculentos.
— Tenho que ir agora, foi um prazer, Rodrigo. Bem-vindo a Ilha do
Sol.
Coloquei minhas mãos nos bolsos, fingindo uma casualidade que eu
não sentia.
— O prazer é todo meu — afirmei, deixando-a desconcertada mais
uma vez.
A partir daquele instante, eu sabia que a temporada de negócios não
seria a única coisa promissora em minha vida enquanto estivesse na Ilha do
Sol.
Eu veria Maria Clara de novo.
E ela seria minha.
Capítulo 2

Ele era tão bonito que parecia um artista de cinema. Mais que isso,
uma verdadeira obra de arte.
A voz de barítono, o jeito como se movimentava, confortável no
ambiente… em sua própria pele. E o que dizer do toque que mais parecia
ter feito com que chamas se alastrassem pela minha pele?
— Sonhando acordada, Maria Clara? — Patrícia, minha melhor
amiga e colabora na empresa de faxina que eu tocava com minhas irmãs me
perguntou, e eu percebi que estava amassando o lençol de elástico entre os
dedos, em vez de dobrá-lo delicadamente, como treinava as colaboradoras
da empresa para fazer. Se minha mãe visse aquilo, me bateria com um
chinelo até eu recobrar o juízo.
— Eu estava repassando algumas coisas na minha cabeça — menti
em minha defesa, colocando o lençol de lado para que fosse passado
novamente.
Eu não colocava a mão na massa com frequência, mas em períodos de
alta temporada, graças a Deus e ao serviço de qualidade que mamãe sempre
fez questão de prestar, nós tínhamos bastante demanda e precisávamos
arregaçar as mangas para tocarmos o barco.
— Sei… — Patrícia murmurou, desconfiada, estreitando os olhos em
minha direção. — Você está meio avoada desde ontem, o que aconteceu?
Rodrigo Marinho aconteceu. Grande, forte, com olhos azuis intensos,
cabelos macios e toque gentil. Ele aconteceu e desde então eu sentia meu
estômago se revirar em ansiedade e minha boca seca só de pensar naqueles
lábios de aparência macia me beijando.
Era impossível negar que ele me atraía. Mais do que qualquer outro
homem com quem eu já estive. Como isso era possível quando trocamos
poucas palavras e ele apenas abotoou minha correntinha de volta no lugar?
— Trabalho demais — optei por dizer. Outra mentira, mas eu jamais
daria o braço a torcer e admitiria para Patrícia o que de fato povoava meus
pensamentos. Seria tolice.
Nós devíamos ser mais espertas do que isso. Eu devia ser mais
esperta. Além do mais, Rodrigo era uma turista, como o meu pai era. Logo
ele terminaria quaisquer que fossem seus assuntos em Ilha do Sol e voltaria
para a sua vida, e eu ficaria ali, com as outras Marias.
— Se você diz. — Patrícia sacudiu os ombros, dando-se por satisfeita,
e eu soltei o ar que nem notara ter prendido nos pulmões.
Rodrigo não era parte da minha realidade, jamais seria, e quanto antes
eu parasse de pensar nele, melhor.
Ainda com esse pensamento em mente, senti quando meu celular
vibrou no bolso da minha calça, anunciando a chegada de uma mensagem, e
eu pensei em ignorá-la e apenas continuar com o meu trabalho, mas podia
ser urgente, algo da própria empresa, apesar de minhas irmãs sempre
optarem por telefonar, nesses casos.
Colocando a ponderação sobre o que poderia ser de lado, decidi
checar por mim mesma, e quase tive um ataque cardíaco quando li a
mensagem.

“Querida Maria Clara,


Não consigo tirar você nem nosso encontro da cabeça, e adoraria vê-
la de novo.
Será que tenho permissão para convidá-la para um jantar?”

Meu coração deu um solavanco no peito, e eu ofeguei, olhando de um


lado para o outro, buscando as câmeras dos responsáveis por aquela
pegadinha de mau gosto.
Entretanto, tudo o que encontrei foram os olhos arregalados de
Patrícia, me encarando de onde ela estava.
— Agora, sim, você está me deixando assustada — ela disparou,
correndo até mim. — Tá tudo bem?
Acenei em concordância diversas vezes, e então um sorriso bobo
surgiu nos meus lábios sem que eu lhe desse permissão.
— Tá tudo bem — afirmei, considerando que talvez eu não precisasse
esquecer Rodrigo, já que ele também não me esquecera.
Capítulo 3

— Você não está confortável, está? — perguntei a Maria Clara


quando ela mal encostou no seu prato principal.
Eu escolhi levá-la ao Country Club, por ser o lugar mais badalado de
Ilha do Sol, mesmo que tivesse preferido chamá-la até meu duplex e
contratar um bom chef de cozinha para preparar nosso jantar. Entretanto, a
última opção parecia íntima demais, e eu não queria assustar a moça, ainda
que meu olhar insistisse em focar no seu decote em V, que valorizava seus
seios redondos.
— Fiz alguma coisa errada? — apressou-se em perguntar, os olhos de
chocolate arregalando-se no processo. — Sinto muito, eu não costumo
frequentar restaurantes como esse, eu deveria ter dito não ao convite.
Ela murchou os ombros, agora nada interessada em continuar
comendo.
— Eu ficaria desolado se você recusasse o convite — assegurei,
estendendo uma de minhas mãos sobre a mesa, com a palma virada para
cima, um claro convite para que Maria Clara pousasse a sua ali, o que ela o
fez depois de um segundo de hesitação.
— Homens como você não ficam desolados tão facilmente — ela
murmurou. — De qualquer modo, foi muito gentil da sua parte me
convidar. O que eu quis dizer é que, diferente de você, não pertenço a
lugares como esse. — Maria Clara deu de ombros, como se o que dissera
fosse óbvio.
Eu estreitei os olhos em sua direção, sem saber a que ela se referia.
— Acho que não entendi — confessei, apertando sua mão delicada
entre a minha, meu polegar fazendo círculos na pele macia do dorso.
Maria Clara encarou o gesto por alguns segundos, os dentes perfeitos
prendendo o lábio inferior entre eles, antes de ela enfim dizer:
— Nós somos de mundos bem diferentes — começou. — Você é um
homem com dinheiro, que aluga um duplex suntuoso para passar uma
temporada, e eu sou só a pessoa que se certifica de que tudo vai estar limpo
e arrumado pra quando você chegar.
— Isso não quer dizer que somos de mundos diferentes, apenas que
exercemos funções distintas em um mundo caótico onde algumas pessoas
dão valor às outras pelo que elas têm, e não pelo que elas são — contrapus,
assistindo a um sorriso se formar nos lábios de Maria Clara.
— E você não faz parte desse grupo de pessoas, faz? — ela quis
saber, com um olhar esperançoso fazendo com que seus olhos cor de
chocolate ficassem ainda mais bonitos e brilhantes.
— Tenho pavor desse tipo de pessoas — confessei, e seu sorriso se
abriu mais, os ombros parecendo relaxar conforme ela assentia, parecendo
aliviada.
E, se possível, eu me senti ainda mais atraído por ela. Por não ter se
deslumbrado com o restaurante estrelado, por estar disposta a conversar
comigo e de fato me conhecer. Eu não sabia que estava tão ansioso para
aquele encontro até ver Maria Clara usando um vestido florido que a
deixava ainda mais bonita do que ela já era.
Ela gostava de vestidos floridos, notei, porque quando nos
conhecemos ela usava um de estilo parecido, porém curto. O desta noite era
longo, com alças finas e um decote que me fazia querer afundar o rosto bem
do meio dele e me refestelar com os seios macios de Maria Clara.
— Por que não vamos embora daqui? — ofereci, e ela acenou em
concordância com uma animação admirável.
— Você não se importa mesmo? — ela quis se certificar, mesmo já
pegando sua bolsa que descansava no encosto da cadeira. — Porque eu
conheço um lugar que serve um cachorro-quente dos deuses, e podemos
pedir um algodão doce de sobremesa. Tudo por minha conta, é claro.
Eu sorri, admirado de sua beleza e animação ao falar de coisas
simples das quais gostava, tomando nota de que ela era a primeira pessoa
em muito tempo — mais do que eu conseguia me lembrar — que não
estava feliz e disposta por arrancar cada centavo que pudesse de mim.
— Me levando pra jantar e bancando tudo? Assim vou pensar que
você está tentando me seduzir? — fiz troça, assistindo em deleite às suas
bochechas ficarem coradas como dois tomates maduros.
Capítulo 4

O sexo com Rodrigo era o melhor que eu já experimentara em toda a


minha vida, e as noites que vinha passando em sua cama eram
simplesmente sublimes.
Não que eu fosse lá muito experiente, mas eu sabia que poucas coisas
no mundo eram melhores do que a nossa conexão, do que sentir as mãos
dele passeando por cada recôndito do meu corpo, como faziam justo agora.
— Me diga a quem você pertence, Maria Clara — ele sussurrou ao pé
do meu ouvido, fazendo meus dedos dos pés se embolarem de excitação.
— A você e ninguém mais. — Não adiantava negar. Meu corpo e suas
reações de prazer pertenciam todas a Rodrigo Marinho. Eu poderia mentir
com palavras, mas ele sempre extrairia a verdade de mim através da
resposta do meu corpo traidor.
Era um caminho sem volta, pensei, deslizando minhas unhas curtas
pelas costas de Rodrigo enquanto ele se abaixava para enterrar o rosto no
ponto de necessidade entre minhas pernas.
Eu já estava mole e entregue desde o momento que entrei em seu
duplex suntuoso, mas nada se comparava a estar dentro daqueles braços
fortes.
— Mais, por favor — pedi timidamente. Dando o meu melhor para
que minha timidez não atrapalhasse a experiência que apenas Rodrigo era
capaz de me proporcionar.
Ele me encarou sob seus longos cílios, antes de esboçar um sorriso de
canto que só poderia significar que ele estava pronto para atender meu
pedido.
Sua língua morna passou desde a minha entrada, circulando as
terminações nervosas do meu clítoris e então o mordiscou e reivindicou
para si num chupão que afundou suas bochechas e fez miséria com a minha
intimidade.
Cegamente, agarrei seus ombros, à procura de algum tipo de
equilíbrio que fosse, mas não consegui nada além da sensação de que algo
crescia no meu baixo-ventre e precisava ser liberto.
Meu gozo veio forte enquanto eu gritava o nome de Rodrigo a plenos
pulmões, ao mesmo tempo que ele se embebia dos resquícios do meu
prazer.
— Pede pra eu meter na sua boceta apertada — demandou com a voz
rouca, livrando-se dos seus jeans e da sua boxer, as únicas peças de roupas
que ainda o cobriam.
Eu soltei um riso nervoso de constrangimento.
— Você sabe que não sei falar sujo assim — emiti numa voz fraca,
quando seus dedos longos me acariciaram languidamente.
— Você sabe que gosto de te ouvir implorar do seu jeito — retrucou,
me penetrando com dois de seus dedos e me fazendo arfar de deleite e
surpresa.
— Me faça sua — pedi em um sussurro, erguendo meus quadris para
o contato de sua mão. — Por favor.
E ele o fez, me penetrando e me fazendo sentir completa de uma
forma que só ele era capaz de fazer conforme um som gutural saía de seus
lábios.
Suas mãos percorreram minhas coxas nuas, espalmadas em minha
pele que fervia de excitação, e fechei minhas pernas em torno de sua
cintura, fazendo com que Rodrigo fosse mais fundo em mim.
— Você é tão gostosa — sussurrou ao meu ouvido, iniciando
estocadas curtas e ferozes que faziam meu sangue ferver nas veias.
Não tive nem mesmo tempo de responder, pois logo sua boca estava à
procura da minha, encontrando-a em um beijo afoito e, por mais que fosse
difícil admitir, apaixonado.
Eu não deveria me apegar a Rodrigo Marinho, mas algo nele tornava
impossível não fazer justamente o oposto. Ia além de seu corpo forte e bem
trabalhado, dos olhos azuis e do sorriso arrebatador. Havia algo em sua
personalidade forte, no modo confiante com que ele se movia… algo que,
por mais que eu não pudesse nominar, me fizera rendida por ele.
— Goza pra mim — pediu em um sussurro rouco quando seus lábios
deixaram os meus para respirarmos, e, obediente, meu corpo sucumbiu
novamente ao prazer intenso que só descobri quando aquele homem entrou
na minha vida para virá-la de cabeça para baixo.
Capítulo 5

Maria Clara era como uma brisa fresca em meio ao deserto


escaldante. A calmaria após a tempestade.
— Acha que é prudente se envolver com uma garota tão mais jovem e
tão diferente de você? — Omar, meu melhor amigo e sócio, perguntara
assim que soube do meu envolvimento com Maria Clara.
A resposta para aquela pergunta era não, e eu sabia disso muito bem.
Maria Clara tinha apenas vinte e dois anos, enquanto eu, tinha trinta e
cinco. Quanto ao fato de ela ser muito diferente de mim… oras, aquilo era o
que eu mais gostava nela. Sua simplicidade e capacidade de ver grandes
coisas em momentos simples.
Como agora, que ela estava de olhos fechados na proa da embarcação
que aluguei para que fizéssemos um passeio. Ela usava um biquíni que
deixava pouco para a imaginação, em especial para a minha, que já tinha
me esbaldado em suas curvas sinuosas e me enterrado em seu corpo
deslumbrante.
Ela tinha uma vivacidade incrível que eu jamais encontrei antes, e
isso me atraía.
— Você está tão calado hoje — ela observou, olhando para mim sobre
o ombro logo depois de afastar os óculos de sol e depositá-los no topo da
cabeça. — Olha só essa vista… — Fez um gesto com a mão, indicando o
mar. — Como você pode não se apaixonar e escrever sonetos sobre ela?
— Não sou bom em me apaixonar, muito menos em escrever sonetos
— admiti, e seus ombros se encolheram no processo, como se a resposta
tivesse um efeito negativo sobre Maria Clara, mas ela logo tratou de
melhorar a expressão, estreitando seus olhos cor de chocolate para mim.
— Se continuar dizendo essas coisas, vou acabar acreditando no que
seu amigo falou sobre você não ter um coração — emendou, fazendo
menção ao pequeno diálogo que ela e Omar tiveram certa vez.
Eu me levantei da espreguiçadeira para ir até ela, abraçando-a por trás
e enterrando minhas narinas na curva de seu pescoço.
Respirei seu cheiro, que era uma mistura feminina e delicada de algo
floral, doce e o cheiro do mar límpido à nossa frente.
— Posso não ter um coração, mas você sabe que tenho um pau que é
louco por você — sussurrei ao seu ouvido, mordendo o lóbulo de sua
orelha.
Ela gargalhou, jogando a cabeça para trás, e eu tinha certeza de que o
rubor em suas bochechas estava se intensificando, e não era apenas pelo sol.
Maria Clara ficara tímida com meu comentário, eu sabia disso por mais que
ela não quisesse demonstrar.
As duas semanas que passei com ela eram tudo de que eu precisava
para conseguir lê-la com propriedade e entender as pequenas mudanças de
seu corpo.
— Você é incorrigível — murmurou, virando-se dentro do meu
abraço até ficar de frente para mim, seus braços passando pelo meu
pescoço. — Mas eu gosto.
Eu também gostava dela, e como não era bom com palavras, me
inclinei para beijar sua boca bem-feita e atrativa, me deliciando com o gosto
intrínseco ao seu beijo, com sua entrega sem precedentes e com o corpo
curvilíneo grudado ao meu.
Viver um interlúdio sexual era a última coisa que eu esperava da
minha ida a Ilha do Sol. Eu era um investidor, minha intenção era apenas
conhecer o local e entender o apelo que vinha fazendo com que se tornasse
tão atrativo para a nata da sociedade.
Inegavelmente, era um lugar bonito e com riquezas naturais que
mereciam ser preservadas, porém foi apenas quando conheci Maria Clara e
ela me mostrou o lugar sob seu ponto de vista que percebi quão
deslumbrante Ilha do Sol poderia ser.
Nós nos demos muito bem de imediato, apesar do meu gênio dos
infernos, o que era uma surpresa, porque me abrir com alguém não era
corriqueiro. Contudo, assim que meus olhos avistaram Maria Clara em seu
vestido florido que a deixava ainda mais linda do que já era, o desejo foi
instantâneo, e eu sabia que precisava tê-la para mim, sob mim… em todas
as posições possíveis.
E, como o homem de negócios que eu era, não desisti até conseguir o
que queria.
Semanas depois
Capítulo 6

— Coragem, Maria Clara — sussurrei para o meu reflexo no espelho


do meu quarto, puxando uma longa respiração em seguida.
Eu estava grávida. De um bebê de ninguém menos que Rodrigo
Marinho, um bilionário, mesmo que eu não soubesse muito bem como isso
foi acontecer.
Nós sempre usamos proteção, ele era muito atencioso quanto a isso.
Então como? Só podia ser o destino me fazendo pagar por ter sido uma
adolescente metida a rebelde que julgava secretamente a própria mãe por ter
tido uma filha de um homem desconhecido.
Agora ali estava eu, seguindo o mesmo rumo que ela.
Uma pequena batida na porta me tirou dos meus devaneios.
— Tia Maria Clara… — minha sobrinha, Maria Vitória, proferiu, sem
nem esperar permissão para adentrar o quarto.
Zeus, o labrador caramelo da família, vinha logo atrás dela, junto com
minha irmã do meio, Maria Flor.
— O que foi, pestinha? — perguntei, tocando na trança perfeita que
Maria Vitória trazia no cabelo.
— A tia Maria Flor, o Zeus e eu vamos no parque comer cachorro-
quente. Você quer vir junto?
Ah, como eu queria.
Nunca quis tanto algo em minha vida. Mas a barriga redonda de
Maria Flor, indicando seus cinco meses de gravidez, me lembrava de que
havia outro lugar onde eu precisava estar.
— Infelizmente eu tenho outro compromisso — respondi, murchando
os ombros um segundo antes de Zeus se aproximar e exigir que eu lhe
fizesse um carinho.
Maria Flor então tampou os ouvidos de Maria Vitória com suas
palmas, fazendo minha sobrinha rolar os olhos.
— Você vai sair com aquele bonitão de novo? — ela quis saber em
um sussurro, com os olhos brilhando de puro romance.
Pelo amor de Deus, ela tinha se envolvido com um príncipe de
verdade, não precisava de migalhas dos meus encontros furtivos.
— Nós conversamos quando eu voltar — prometi, afinal de contas,
Rodrigo não era o único que precisava saber que eu estava esperando um
bebê. — Até mais tarde, e me desejem sorte.
— Boa sorte — minha irmã e sobrinha murmuram em uníssono, e eu
dei um beijo em cada uma delas antes de perder a coragem e sair do meu
quarto, rumo ao duplex onde Rodrigo estava hospedado, pronta para dizer a
ele que seria pai.
Eu deveria saber que a boca daquele homem na minha e suas mãos no
meu corpo seriam minha ruína desde o primeiro toque.
Rodrigo era um homem de negócios, acostumado a ter tudo o que
queria, e eu me permiti ser mais uma de suas conquistas. Quando ele estava
por perto, como agora, me beijando como se estivesse prestes a me devorar,
eu não conseguia me arrepender, no entanto.
A vontade de saber mais da vida e conhecer o mundo lá fora sempre
estivera comigo, porém foi só quando Rodrigo entrou em minha vida que
tive um vislumbre do que tudo isso significava.
Ele não era como meus casinhos sem importância com garotos locais,
que mal sabiam o que estavam fazendo. Ele era um homem feito, dono de
si, de seu destino, e isso me atraía de um modo que não podia ser saudável
para o meu coração.
— Espera um minuto… — pedi quando ele enfiou a mão sob meu
vestido, alcançando a lateral da minha calcinha, prestes a puxá-la.
Minha respiração estava acelerada pelos nossos beijos, e eu adoraria
continuar o que estávamos fazendo, entretanto precisávamos conversar.
— Não quero esperar nem mesmo um segundo — ele admitiu, a boca
acariciando a pele sensível do meu pescoço.
Soltei um gemido que era um mix de deleite e desespero, porque a
verdade era que eu tampouco queria parar. Suas mãos em mim… sua boca
na minha… eu sabia que precisava lutar contra meu próprio desejo se
quisesse que Rodrigo parasse um minuto para me ouvir.
— Eu estou grávida — deixei escapar em meio a um arquejo,
apertando os olhos em desgosto um segundo depois.
Não era assim que eu planejava dar aquela notícia, eu literalmente
ensaiei as palavras em frente ao espelho antes de ir até ali, apesar de
nenhum enunciado ter soado bom o bastante. De qualquer modo, eles eram
melhores do que as palavras cruas que despejei no colo de Rodrigo para que
ele lidasse com elas.
Ele me segurou pelos ombros, afastando-me de seu corpo apenas o
bastante para olhar nos meus olhos.
— Grávida? — ecoou, como se não pudesse acreditar em seus
ouvidos, e eu acenei positivamente com a cabeça, mordendo o lábio em
apreensão, sentindo o latejar da minha pulsação nos ouvidos.
Rodrigo soltou meus ombros, dando um passo atrás para longe de
mim, e então outro, sua cabeça balançando-se levemente num claro sinal de
negação.
— Não pode ser… nós sempre usamos proteção — ele me lembrou, e
eu rompi a distância que ele colocara entre nós dois.
— Nenhum método é cem porcento seguro — comecei, porque eu
mesma já tinha repassado na minha cabeça todas as vezes em que
transamos. Rodrigo jamais esquecera o preservativo, por mais entregue que
estivesse ao momento. — A camisinha tem cerca de dois por cento de
chance de falhar, eu sei que parece improvável, mas…
— Impossível, você quer dizer — ele me cortou instantaneamente,
seu rosto transformando-se em uma expressão que, mesmo tentando muito,
não consegui ler. — Não sou um adolescente imaturo que começou a vida
sexual ontem, Maria Clara, não venha com essa pra cima de mim.
Estreitei meus olhos em sua direção, sem entender o significado real
por trás de suas palavras.
— O que está querendo dizer? Que não estou grávida?
Ele soltou uma risada seca, sacudindo a cabeça de um lado para o
outro.
— Estou querendo dizer que talvez você esteja, sim, grávida, mas
que, se for esse o caso, esse filho não é meu.
Um arquejo de puro horror saiu pelos meus lábios, e eu tapei a boca
com uma das mãos, como se isso fosse capaz de disfarçar meu queixo caído
em surpresa.
O que aquilo significava? Que Rodrigo me achava uma qualquer, que
saía por aí transando com o primeiro cara que aparecia pela frente e nem
mesmo sabia quem era o pai do filho que estava esperando? Ou ele achava
que eu…
Não, Deus, por favor, não…
Que Rodrigo não achasse que eu era uma golpista tentando arrancar
dinheiro dele.
— Retire o que disse — exigi entre dentes, nada disposta a aceitar
que ele me humilhasse daquele modo.
— Foi tudo calculado? — ele quis saber, e meu rosto se transformou
em pura confusão. — O fato de você estar aqui quando cheguei —
explicou, diante do meu desentendimento. — Foi tudo calculado ou você
apenas aproveitou a oportunidade quando ela bateu à sua porta?
Dei dois passos atrás, sentindo como se as palavras de Rodrigo
fossem bofetadas doloridas. Meus olhos arderam com as lágrimas, mas eu
não me permitiria chorar na frente dele.
Que estúpida eu era! Uma completa idiota, isso sim! Como fui capaz
de acreditar que algo de bom viria daquele diálogo?
Minhas irmãs estavam certas quando decidiram não contar aos pais de
seus bebês sobre a gestação, e, claro, a única imbecil era eu por achar que
algo de bom viria de Rodrigo ao saber que seria pai, que meu bebê merecia
a chance que eu jamais tive de conhecer seu genitor.
Que tola eu fui, porque alguém como Rodrigo jamais acreditaria que
engravidei por algum outro motivo que não fosse arrancar-lhe dinheiro.
Foi quando me veio à cabeça o que a avó de Maria Vitória fez com
Maria Alice. A humilhação que minha irmã passou, assim como o conselho
de mamãe, que dissera à minha irmã para contar o dinheiro oferecido pela
senhora Cesarini, a fim de saber quanto a filha valia para eles.
— E se tiver sido tudo calculado? — lancei para Rodrigo, mágoa
tingindo meu tom. — O que você vai fazer sobre isso? Me oferecer
dinheiro?
— Não ouse fazer um escândalo na mídia — ele alertou em uma voz
baixa, ameaçadora. Mas eu não tinha medo dele.
— Então você vai me oferecer dinheiro — constatei para mim mesma
em voz alta, sem saber como era capaz de me decepcionar ainda mais,
depois de tudo. — Quanto? — eu o questionei, recebendo uma risada
amarga como resposta imediata.
Sua mão esquerda esfregou a barba por fazer, e seus olhos azuis
prenderam os meus quando ele disse, decidido:
— Um milhão de dólares — declarou, e algo dentro de mim se
retorceu.
Para Rodrigo, nosso bebê valia um milhão de dólares, nem um
centavo mais do que isso.
Um nó se formou em minha garganta, e meus olhos arderam mais
intensamente com a vontade de chorar, mas eu não permitiria que Rodrigo
as testemunhasse.
— Pegue esse dinheiro — comecei, controlando o tremor em minha
voz — e o enfie onde o sol não bate.
Cega de raiva, procurei pela minha bolsa no quarto espaçoso,
encontrando-a jogada logo na porta, porque Rodrigo me tomou nos braços
assim que adentramos o cômodo, suas mãos mal podendo esperar até me
tocarem.
Agora, elas estavam longe de mim, como sempre estariam a partir de
agora.
Segurei minha bolsa com fúria contra o peito, marchando para fora
daquele duplex suntuoso, jurando a mim mesma que nunca mais colocaria
os pés ali, como também jamais voltaria a pôr os olhos em Rodrigo
Marinho.
Capítulo 7

Acelerei o máximo que podia o velho fusca alaranjado da minha mãe,


as lágrimas turvando minha visão e mal me deixando ver a estrada.
Mas eu precisava daquilo. Precisava me afastar de Rodrigo e do que
sua presença significava pelo resto da minha vida. Era a única forma.
Batendo com força no volante pela minha burrice, cheguei em casa
em tempo recorde, desejando não encontrar nenhuma outra Maria pelo
caminho até o meu quarto. Eu precisava de um pouco de solidão para
colocar as coisas sob perspectiva, mas claro que eu não teria a opção mais
fácil ao meu dispor.
Assim que pus os pés dentro de casa, dando o meu melhor para não
fazer um único ruído sequer, a luz do abajur da sala foi acesa, e eu não
precisava ser um gênio para saber de quem se tratava.
— Maria Clara? — a voz de mamãe chamou com suavidade, e apertei
os olhos como sempre fazia quando criança e era pega no flagra fazendo
alguma traquinagem.
— Oi, mãe — devolvi, dando o máximo para que minha voz soasse
animada. — Estou indo para o meu quarto.
Por favor, por favor, deixe-me ir…
— Pode vir aqui um instante, antes disso? — Apesar de seu tom
calmo, não era um pedido, e eu já estava calejada o bastante para saber a
diferença.
Com um suspiro, fiz o caminho até a sala da casa que mamãe
conseguiu construir para nós com tanto esforço, me sentindo tola e ingrata
por ter desejado algo além daquilo. Se o mundo lá fora fazia com que as
pessoas se tornassem frias e incrédulas como Rodrigo parecia, então eu não
queria mais ser parte dele.
— Hoje não é um bom dia — sussurrei para mamãe quando a
alcancei, esperando que isso a fizesse mudar de ideia e simplesmente me
deixasse subir as escadas e me enterrar nos meus travesseiros, onde poderia
chorar minhas amarguras e pensar o que diabos eu faria da vida com um
bebê a caminho e nenhum pai para ele.
Verdade fosse dita, eu não tinha nem a metade da força da dona Maria
do Rosário, que criou três filhas sozinha e nunca nos deixou passar
necessidade. Vivemos, sim, muitos períodos de crise, mas sempre com um
teto seguro sobre nossas cabeças e uma comida quentinha na mesa.
— E eu estou magoada por você não confiar em mim o suficiente
para me contar que está esperando mais uma Maria — devolveu, e o choro
que eu vinha prendendo da melhor forma possível se tornou impossível de
segurar.
Antes de que eu pudesse me dar conta, minhas vistas embaçaram, e só
pude ver o vulto de mamãe se levantando. Em seguida, senti seus braços me
apertando forte, como se segurasse todos os meus pedaços que queriam se
quebrar em cacos. Aquele abraço me fez inteira de novo, e um soluço me
acometeu enquanto eu abraçava mamãe pela cintura e sentia seu cheiro que
sempre tinha o poder de me acalmar.
— Parabéns, mamãe — sussurrou ao meu ouvido, depositando um
beijo em minha têmpora. Apesar de suas palavras, eu me sentia não mais do
que uma simples garotinha dentro de seu abraço, me debulhando em
lágrimas e demandando consolo para se sentir bem.
— Maria Alice? — balbuciei, em meio a um soluço, querendo
perguntar se minha irmã mais velha tinha dado com a língua nos dentes,
mas não consegui.
— Ninguém me contou nada — apressou-se em dizer —, sou eu
quem conheço as minhas Marias como a palma da minha mão.
Concordei com um aceno de cabeça meio desajeitado, escondendo o
rosto na curva do pescoço da minha mãe.
— Eu queria ter contado antes, mas… — Um novo soluço. — Eu
estava assustada, e ainda havia… ainda havia o pai do bebê, eu precisava
contar a ele, mas ele acha que sou uma interesseira que queria dar um golpe
da barriga — despejei em um só fôlego, tomando uma lufada de ar quando
terminei.
— Shhhh — dona Maria do Rosário chiou em meu ouvido,
acariciando meus cabelos como se eu ainda fosse apenas uma garotinha. —
Nós não precisamos de um homem babaca pra cuidar de nenhuma de nós —
ela me lembrou. — Você vai ter um bebê muito amado e paparicado, saiba
disso, e nada vai faltar pra nossa mais nova Maria.
Eu me afastei dela apenas o suficiente para olhar em seus olhos, e ela
enxugou meu rosto molhado pelas lágrimas de desespero e tristeza.
— Co-como pode ter certeza de que o estoque de Marias na-não
acabou? — gaguejei a pergunta, verdadeiramente curiosa.
Mamãe abriu um sorriso lindo e acolhedor, os polegares traçando
minhas sobrancelhas em um gesto que ela sabia ser capaz de me acalmar.
— Porque as cartas me disseram, ué — respondeu simplesmente, e eu
rolei os olhos, não querendo entrar naquele mérito. — Agora, vamos, me dê
um sorriso pra eu ter certeza de que você está bem.
Forcei um sorriso para ela, que não convenceu nada.
— O que aquele canalha fez com você, minha menina? — ela quis
saber, segurando meu rosto entre as mãos. — Ele te ofereceu dinheiro? —
Sacudi a cabeça em afirmação, novas lágrimas se formando, e vi seu olhar
endurecer. — Não importa, nós não precisamos dele, não é?
Fiz que não com a cabeça, por mais que por dentro meu coração
estivesse destroçado, assim como minha autoestima.
— Me perdoa por ser covarde e não ter te contado a verdade antes —
murmurei. — Juro que, a partir de agora, não quero mais olhar na cara de
um turista nunca mais.
Ela sorriu tristemente, colando os lábios na minha testa em um beijo
maternal e de compreensão.
— Eu te amo, Maria Clara, você é um presente e não me arrependo de
ter tido você nem por um momento. Juro que você vai se sentir da mesma
forma quando tiver sua Maria nos braços, está bem? É uma promessa de
mãe.
E, como não havia outra escolha, eu acreditei.
Capítulo 8

Desde que Maria Clara saiu do duplex onde eu estava hospedado, não
conseguia pensar em outra coisa que não fosse nossa conversa e na forma
desastrosa como ela se deu.
E era tudo minha culpa.
Meu gênio dos infernos nublou o meu bom-senso e eu fui muito mais
áspero do que Maria Clara merecia, do que eu mesmo pretendia.
Nós precisávamos conversar. Se ela estava mesmo grávida e afirmava
que o filho era meu, só podia ser porque aquilo era verdade, ainda que eu
tivesse sido cauteloso em todas as vezes que transamos. Maria Clara podia
ser jovem e até mesmo ingênua, mas não era burra. Ela sabia que uma
mentira assim não se sustentaria sob o escrutínio de um exame de DNA,
então por que se dar ao trabalho?
Certamente não era no intuito de ficar com o dinheiro que ofereci
pelo seu silêncio temporário, porque sua reação à oferta não poderia ter sido
pior.
Esfreguei meu rosto com ambas as mãos, decidindo que o melhor a
fazer era procurar Maria Clara assim que eu tivesse a oportunidade, no fim
do dia. Mas antes disso, precisava focar nos negócios que tinha em Ilha do
Sol, não podia negligenciá-los de tal modo. Sendo assim, dei meu café da
manhã por encerrado e me levantei do meu assento, apenas para ver as
portas do elevador privativo se abrindo assim que pus os pés na sala de
estar.
Por um segundo, achei que pudesse ser Maria Clara, mas a visão era
de uma senhora com cabelos dourados, vestido florido e uma expressão
determinada no rosto. Eu não precisava de uma apresentação para saber
quem ela era, porque a descrição que sua filha me fizera dela não poderia
ter sido mais certeira.
— Senhora Almeida, em que posso ser útil? — perguntei à mãe de
Maria Clara, usando meu tom mais polido e pulando a parte em que eu a
questionava sobre como entrara ali.
Ela era dona da empresa responsável por deixar os imóveis brilhando
de tão limpos, claro que tinha um rosto conhecido e acesso livre a eles.
— Que bom que perguntou — ela respondeu de pronto, sem a menor
hesitação. — Vim exigir que você fique longe da Maria Clara e nunca mais
volte a procurá-la.
Pisquei, incrédulo por ela ser tão direta, sem saber de imediato como
responder àquilo.
— Como disse?
— O que você ouviu — disse com firmeza. — O que quer que você
tenha tido com Maria Clara, acabou no momento em que você a humilhou.
— Eu não a humilhei, apenas…
— Poupe o fôlego — ela me cortou, e ergui uma sobrancelha em
surpresa. Não era todos os dias que alguém tinha a audácia de me
interromper sem nem ao menos pestanejar. — Eu sei muito bem o que
dizem de mim nessa cidade. Que sou uma mulher fácil, não é? — Ela riu
amargamente. — Por ter tido três filhas de pais diferentes. Mas mesmo que
isso fosse verdade, não é justo julgar a minha filha pelos meus erros.
— Não julguei Maria Clara por sua causa, acredite em mim —
admiti, escondendo o fato de que a julguei por erros de outras pessoas, sim,
mas não de sua mãe.
Um homem em minha posição sabia o bastante sobre o mundo e
pessoas que eram bajuladoras em troca de favores financeiros. Eu já perdera
as contas de quantas vezes uma mulher tentou me enredar usando de
artimanhas vis, e não me orgulhava por ter cogitado, mesmo por um
instante, que Maria Clara era uma delas.
— Não me interessa o que sai pela sua boca — Maria do Rosário
devolveu, nem um pouco intimidada. — A única coisa que quero deixar
clara é que minha filha não é uma vigarista e que nunca foi a intenção dela
dar um golpe da barriga. O que aconteceu foi que ela se deixou levar pela
sua lábia e foi vítima de um falso positivo.
Eu pensei mil coisas diferentes em um milésimo de segundo, e não
conseguia fazer sentido de nenhuma delas.
— O quê? — perguntei, deixando transparecer a minha confusão. —
O que quer dizer com falso positivo?
— Maria Clara não está esperando um bebê seu — ela disse cada
palavra com cuidado, mas com uma força em sua voz que a sensação era de
que eu tinha levado um soco bem no estômago. — Pode comemorar, se
quiser, não é como se fosse me chocar com essa atitude — continuou em
desdém, quando eu não disse nada, e por mais atordoado que eu estivesse
no momento, seu tom e atitude já estavam me cansando.
— Com todo respeito, dona Maria do Rosário, mas o que aconteceu
entre mim e Maria Clara só diz respeito a nós dois e…
— É aí que você se engana — ela tornou a me interromper. Mas será
possível que aquela mulher não me deixaria concluir um único
pensamento? — Tudo que envolve as minhas Marias me diz respeito, e não
vou assistir sentada e impassível enquanto você machuca minha filha mais
nova.
— Essa nunca foi a minha intenção, eu…
— Não vim à procura de desculpas nem explicações — atalhou
novamente —, guarde todas elas pra você e fique longe da minha Maria
Clara. Você já causou danos o suficiente, não acha?
Sim, eu achava. Porém isso não significava que eu gostava de ter a
verdade sendo esfregada na minha cara de forma tão crua. Eu não estava
acostumado à petulância vindo de alguém que não fosse eu, então estava
longe de me sentir confortável naquela conversa. Mas dona Maria do
Rosário tinha razão quanto ao meu relacionamento com Maria Clara.
Depois de nossa discussão na noite anterior, eu não via como
poderíamos retomar o que tínhamos antes. E, mesmo se houvesse um modo
de fazê-lo, em dois dias eu iria embora de Ilha do Sol e voltaria para os
meus negócios e para a minha vida cronometrada, nossos momentos juntos
transformando-se apenas numa lembrança bonita — mas que agora estaria
completamente manchada graças ao meu modo impossível e arrogante de
ser.
Nesse caso, havia apenas uma coisa da qual eu precisava me
certificar.
— Ela realmente não está grávida? — perguntei, percebendo um tom
de ansiedade que não me era típico e que eu esperava que dona Maria do
Rosário não percebesse.
— Ainda que estivesse — respondeu amargamente. — Pior do que
criar um filho sem pai é fazer isso com um homem frouxo ao lado.
E simples assim, tão de repente quanto chegou, ela me deu as costas e
desapareceu elevador adentro, deixando meu ego e meu orgulho feridos de
uma forma que eu não sabia ser possível.
Dias atuais
Capítulo 9

Acordei sentindo uma respiração no meu rosto, um carinho na minha


barriga e um corpinho quente aconchegado a mim.
Nem mesmo precisava abrir os olhos para saber que se tratava de
Maria Vitória, a pessoa mais animada com a chegada de Maria Elisa na face
da Terra.
Depois do período turbulento, o apoio das minhas Marias foi o que
me fez ter certeza de que eu poderia ser uma boa mãe para o meu bebê e de
que jamais estaria sozinha, porque havia um time formado pelas minhas
irmãs, sobrinha e mãe prontas para me ajudar no que eu precisasse.
Com o passar dos dias, o medo foi se transformando em coragem e
agora havia uma ansiedade gigantesca para a chegada de Maria Elisa. Mais
uma menina, assim como mamãe previra. Eu precisava admitir que aquele
lance de cartas funcionava com ela.
Abri um único olho, sem querer dizer adeus à letargia, e espiei Maria
Vitória fazendo carinho em sua prima — era o que ela dizia estar fazendo
sempre que acariciava minha barriga. Com o coração transbordando de
amor, depositei um beijo na testa da minha sobrinha, agarrando-a o máximo
que era possível com minha barriga de trinta e oito semanas entre nós duas.
No mesmo instante, ela abriu seu par de olhos azuis para mim.
— Achei que a senhora não fosse acordar nunca mais. — Ela revirou
os olhos, demonstrando impaciência, sentando-se na cama de pronto.
Um bocejo me escapou, e eu me espreguicei na cama, lançando um
olhar em direção à minha janela, para medir a altura do sol, apenas para me
dar conta de que já não havia nenhum. O verão era só uma lembrança
agora, o que significava que os dias eram mais curtos, e que eu dormira a
tarde inteira.
— Que horas são, pestinha? — perguntei a Maria Vitória, que quicou
na cama, ansiosa.
— Hora de ir passear e comer cachorro-quente, porque é sábado e eu
posso. — Ela bateu palminhas, animada. — Anda, se arruma logo, tia. Eu
vou colocar a guia no Zeus e te encontro lá embaixo.
Ela pulou da cama e saiu correndo, mas mudou de ideia no meio do
caminho, então voltou para depositar um beijo estalado em minha barriga,
como adorava fazer.
Eu ri do gesto, me sentindo especialmente preguiçosa agora que tinha
uma barriga imensa para carregar aonde quer que eu fosse.
Olhei para baixo, para a minha barriga, fazendo um carinho em Maria
Elisa e sussurrando para ela:
— Mamãe não vê a hora de te pegar no colo, meu tesourinho.
Beijei as pontas dos meus dedos, depositando-os em seguida sobre
minha barriga para, então, me levantar para vestir algo que não fosse meu
pijama velho. Se eu demorasse muito mais, Maria Vitória e Zeus viriam me
buscar a reboque para ir para a rua.

Eu assisti, sentada em um dos bancos da orla, a Maria Vitória e Zeus


brincando na areia. Não estávamos em alta temporada, mesmo assim havia
um número considerável de turistas. E claro que minha sobrinha não
demorou a fazer amizade com uma garotinha da mesma idade que ela.
Maria Vitória era a criança mais linda, sorridente e alegre que eu
conhecia, e isso me trazia um conforto inenarrável. Era fora criada sem pai,
mas com amor de sobra, e eu admirava Maria Alice por ter sido a mãe
incrível que ela era. Só me restava esperar que esse dom fosse herdado da
dona Maria do Rosário e que eu fosse ao menos metade das mães
extraordinárias que elas eram.
— De onde essa menina tira tanta energia? — Maurício perguntou,
referindo-se a Maria Vitória, sentando-se ao meu lado no banco e me
estendendo meu segundo algodão doce da noite.
Depois de ter dormido a tarde inteira e de ingerir tanto açúcar, logo,
logo eu teria tanta energia quanto minha sobrinha.
— Ela é ligada no duzentos e vinte — comentei, puxando parte do
meu algodão doce e levando-o à boca, oferecendo também para Maurício.
— Quer dividir? — Ele fez que não com a cabeça, e eu dei de ombros. —
Sobra mais pra mim.
Ele riu da minha gula, limpando fosse lá o que eu tinha no canto do
lábio, e então me encarou da forma fixa e profunda como fazia às vezes e
que sempre me deixava sem graça.
Maurício chegou à Ilha do Sol na metade do último verão, depois de
ter saído de um relacionamento tóxico. Ele tocava uma agência de turismo
que vinha fazendo muito sucesso nos últimos meses e proporcionava
passeios incríveis para os visitantes da ilha, até mesmo para os moradores
locais, que agora podiam explorar nossas belezas e recursos com um preço
camarada.
Nós meio que juntamos nossas tristezas e decepções e nos tornamos
melhores amigos, apesar de as coisas terem evoluído um pouco nos últimos
meses.
Eu não era uma menina boba e alheia aos desejos da carne, apesar da
minha pouca experiência, e às vezes Maurício me olhava como se quisesse
me beijar, era essa a verdade. E, como se não bastasse, eu não tinha sido a
única a perceber.
Maria Alice e Maria Flor achavam o mesmo, e ficavam me
atazanando para que eu desse uma oportunidade a Maurício. Uma que ele
nunca pediu, diga-se de passagem. Além dos olhares e dos toques que às
vezes pareciam significar demais, nós nunca falamos sobre um
envolvimento amoroso. Nem falaríamos, no que dependesse de mim.
Eu estava grávida de outro homem. Um que bagunçou a minha
cabeça e autoestima, deixando zero espaço para um romance. Em poucas
semanas eu teria um ser humano inteiro para tomar conta, que dependeria
de mim para as tarefas mais básicas.
Romance não estava no meu futuro próximo. E, se eu fosse ser
honesta, nem mesmo em um distante. Depois de Rodrigo, homens estavam
fora de cogitação para mim, porque ele me fez sentir desejada, linda e
especial, só para depois me fazer sentir como a pior das mulheres. Eu tinha
aprendido minha lição, da forma mais dolorosa possível, sim, mas jamais
me esqueceria disso, porque por mais apoio que eu tivesse, suas palavras e a
forma como me julgou ainda doíam, e eu jamais daria a ninguém a
oportunidade de me machucar tão profundamente da forma que Rodrigo
Marinho o fizera.
Capítulo 10

Eu estaria de volta a Ilha do Sol em alguns dias e mal podia conter a


ansiedade que me assolava. Parte de mim estava ciente de que eu fizera a
coisa certa ao deixar Maria Clara em paz, mas havia outra que dizia que eu
lhe devia um pedido de desculpas e uma despedida digna. Uma que não
envolvia nós dois nus e suados numa cama, por mais que o sexo com ela
fosse incrível.
O que eu estava pensando, afinal de contas, quando decidi me
envolver com ela? Maria Clara era apenas uma menina sonhadora que
aproveitava que minuto com intensidade, eu não tinha o direito de seduzi-la
quando sabia que não poderia fazer promessas e, consequentemente,
quebraria seu coração. Mas não pude resistir.
Dona Maria do Rosário tivera razão em me chamar de frouxo, porque
era isso que eu era. Um homem incapaz de dominar o tesão que sentia por
uma mulher não podia ser outra coisa, senão frouxo.
— Eu conheço essa cara — Omar murmurou ao abrir a porta do meu
escritório, onde eu analisava o projeto do novo hotel que construiríamos em
Ilha do Sol com ajuda do mais novo paisagista da moda. — Pelo visto, você
já recebeu a notícia que eu vim te dar.
— De que vamos voltar à Ilha do Sol? — devolvi, como se não fosse
nada de mais. — Acabei de ver a proposta — admiti, e ele acenou em
concordância.
— Você não precisa ir. Sabe que posso cuidar disso sozinho.
Soltei uma risada seca.
— Se eu não te conhecesse melhor iria achar que você está com medo
de que eu vá.
Ele bufou, rolando os olhos antes de se sentar à minha frente, com a
mesa de mármore entre nós.
— Eu só acho que você poderia ficar aqui, longe de problemas,
enquanto eu resolvo as coisas por lá — explicou. — Se for algo impossível
de lidar, eu vou ser o primeiro a pedir sua ajuda para resolver qualquer
problema que seja.
Recostei-me melhor na minha cadeira, pegando uma caneta sobre a
mesa e girando-a entre meus dedos.
— Não vou voltar correndo pros braços de Maria Clara assim que
colocar os pés na ilha, feito um garoto inconsequente — lancei para ele,
apesar de esconder o real motivo de por que faria aquilo.
Omar era meu amigo desde a época da faculdade, e nós nos dávamos
muito bem desde sempre. No entanto, quando meu envolvimento com
Maria Clara foi por água abaixo e levei um belo sermão da mãe dela, eu não
lhe contei o motivo de nada disso ter acontecido, dando-lhe uma desculpa
genérica de que o relacionamento já estava fadado à distância, então por
que insistir?
Ao que parecia, ele não comprou meu argumento barato, se estava
ansioso para me manter longe da ilha. E eu, tão ansioso quanto para
retornar.
Meses haviam se passado sem que eu tivesse notícias de Maria Clara
e, como esperado, ela não me telefonou para uma nova conversa. Tudo o
que ela tinha a dizer foi dito na noite fatídica em que insinuei que ela estava
tentando me dar o golpe da barriga.
E ela nem mesmo estava grávida!
Meses depois do ocorrido, eu ainda não tinha certeza de como me
sentia a respeito. Dona Maria do Rosário me disse para comemorar o fato
de que não seria pai, e por mais que isso fosse o que eu deveria fazer, não
pude. Eu não sabia o que aquilo significava, apenas que havia um
sentimento de perda dentro de mim.
Talvez a perda de Maria Clara. Ou do bebê que de fato nunca
existiu…
— Eu nunca vou ganhar essa discussão, vou? — Omar quis saber,
sem nem mesmo se preocupar em argumentar um pouco mais. — Nesse
caso, o melhor a ser feito é poupar meu fôlego para conversarmos um
pouco mais sobre o projeto — ele mudou de assunto, fazendo meu corpo
relaxar instantaneamente.
Falar em Maria Clara ainda deixava meus nervos aflorados, mesmo
tanto depois, e a percepção não era nada prazerosa.
Capítulo 11

— Você não precisava estar aqui. Sabe disso, não sabe? — Patrícia
perguntou assim que colocamos os pés no duplex.
Com a ida de Maria Flor para o exterior e minha barriga crescendo
como se não houvesse amanhã, o trabalho se acumulara, e eu vinha
treinando minha melhor amiga e colaboradora para fazer a vistoria dos
imóveis que tínhamos que limpar, e ela estava fazendo um ótimo trabalho.
Apesar disso, eu insistia em trabalhar enquanto me sentisse bem o bastante
para isso, como mamãe e Maria Alice fizeram.
Mas não era por isso que Patrícia estava preocupada, e eu sabia muito
bem.
O lugar trazia mais lembranças do que eu gostaria de admitir, porque
era onde Rodrigo se hospedara na primeira e última vez em que estivera em
Ilha do Sol. Depois disso, aquela era a segunda vez que tivemos que limpar
o imóvel, mas eu não participei da vistoria anterior, porque tudo parecia
muito recente e eu não sabia se estava pronta.
Agora eu estava. Tinha que estar. Pelo bem de Maria Elisa, porque ela
precisava de uma mãe forte e destemida quando chegasse, não de uma
garotinha chorona com o coração partido.
— Você se importa de checar o segundo andar? — desconversei,
tocando minha barriga de leve. — Está cada dia mais difícil subir as
escadas.
Ela sorriu para mim, acenando em concordância.
— Você é teimosa feito uma mula, Maria Clara — soltou antes de
subir as escadas, me deixando sozinha no andar de baixo.
Suspirei, ignorando o tremor que perpassou minha espinha quando o
pensamento de dar início à vistoria me abateu, mas aquele era meu trabalho,
e eu não deixaria a lembrança de Rodrigo me assombrar por toda a vida.
Com isso em mente, sacudi os ombros, como se o gesto fosse capaz de me
dar forças, e coloquei a mão na massa.

Patrícia e eu terminamos o trabalho em tempo recorde. Era o último


do dia, de modo que pudemos ir para casa logo depois, o que, para mim,
significava que eu poderia ir mais cedo caminhar com Maria Vitória e Zeus.
Minha sobrinha e o labrador da família tinham muita energia para
queimar, e eu gostava de não precisar ficar sozinha com os meus
pensamentos e observá-los brincar, em vez disso. Então foi exatamente o
que eu fiz.
E, como acontecia naturalmente, não demorou para que Maurício se
juntasse a mim no banquinho da orla, me estendendo um algodão doce.
— Obrigada — agradeci, já puxando um punhado do doce e levando-
o à boca. — Você me mima demais.
— Quem disse que estou fazendo por você? — brincou. — Agradeça
a Maria Elisa, logo, logo vai ser ela ganhando algodão doce, e não você.
Sorri, olhando para a minha barriga redonda e acariciando-a.
— Mal vejo a hora de conhecer minha pestinha número dois —
admiti, e logo senti uma das mãos de Maurício em minha barriga também,
acariciando-a, o que fez com que meu corpo se retesasse instintivamente e
que meus olhos corressem à procura dos seus.
— Aposto que ela vai ser linda e encantadora como a mãe…
Minha boca se abriu para que eu pudesse dizer algo, mas eu parecia
ter me esquecido de como formar palavras, porque nada me vinha à mente.
— Espero não estar interrompendo o momento em família — uma
voz forte de barítono que eu conhecia muito bem soou, e meu coração deu
um solavanco no peito.
Meus olhos foram imediatamente em direção ao som, e meu queixo
pendeu em puro espanto.
Rodrigo…
Seu nome ecoou em meus pensamentos, mas eu estava catatônica
demais para dar voz a ele, que era um misto de reconhecimento e
incredulidade na minha cabeça.
— Podemos ajudar em alguma coisa? — Maurício perguntou ao meu
lado, e eu engoli em seco, ansiosa pela resposta, por ouvir a voz de Rodrigo
outra vez e ter certeza de que era mesmo ele ali, não uma alucinação fruto
da minha imaginação doentia.
— Me disseram que eu o encontraria aqui e que você era a pessoa
com quem eu deveria falar sobre os melhores passeios oferecidos pela ilha.
— Ele estendeu a mão, firme, forte, do alto de seus quase dois metros de
altura. — Rodrigo Marinho. Vai ser um prazer fazer negócios com você.
Capítulo 12

Eu rolei na cama de um lado para o outro, sem conseguir pregar os


olhos, e nada tinha a ver com a quantidade de açúcar ingerido.
Rodrigo estava de volta a Ilha do Sol, provavelmente hospedado no
duplex cuja limpeza eu conferira mais cedo. Será que em algum momento
estivemos prestes a esbarrar um no outro? Seria a única forma de nós nos
encontrarmos, se ele não tivesse cismado de ir procurar por Maurício na
orla.
Eles conversaram de negócios na minha frente e o maldito agiu como
se não nos conhecêssemos, como se eu não estivesse esperando um bebê
dele… a menos que não acreditasse que fosse esse o caso.
Mas é claro!
Ele se desculpou por interromper o momento em família, o que só
poderia significar que ele acreditava que Maurício e eu estávamos juntos.
Mas que belo cafajeste! Quem ele achava que eu era? Como ousava pensar
isso de mim, quando meses antes eu lhe disse que estava esperando um
bebê seu?
Frustrada e sem conseguir dormir, com o relógio marcando quase
meia-noite, pé ante pé, fui até o quarto de Maria Alice, torcendo para que
minha sobrinha não tenha escolhido justo esse dia para dormir com a mãe.
Certificando-me de que estava sozinha no corredor, bati na porta.
— Pode entrar — sua voz veio de lá de dentro, e eu abri a porta,
colocando apenas minha cabeça pela fresta.
— Oi — murmurei timidamente, me certificando de que Maria
Vitória não estava ali.
— Algum problema? — minha irmã quis saber, e eu adentrei o
cômodo, fechando a porta às minhas costas.
— Não, só não consigo dormir — admiti em um suspiro. — Está
ocupada? Eu queria ficar um pouquinho aqui com você.
Ela bateu no espaço vazio na cama ao seu lado, e, como criança, e o
melhor que minha barriga me permitia, eu engatinhei no colchão até estar
juntinho de Maria Alice. Seus braços logo me apertaram contra si, os dedos
fazendo um carinho fraternal nos meus cabelos.
— Eu o vi hoje — sussurrei depois de alguns segundos, quando um
grama de coragem me acometeu.
— Quem? — ela perguntou, franzindo as sobrancelhas, e eu ergui
meu olhar para o seu, ainda sem resposta. Mas ela era boa em ler meus
silêncios. — Oh… — deixou escapar quando a percepção a acometeu, uma
das mãos tapando a boca aberta em um perfeito “o”. — E como foi? — quis
saber, mudando sua posição na cama e assumindo uma postura de ioga
como se estivesse prestes a meditar, quando na verdade só estava à espera
de uma boa fofoca.
— Ele acha que Maurício e eu estamos juntos, então pelo menos
pareço ter dado a volta por cima. — Dei de ombros, tentando empregar um
tom de voz descontraído, porém Maria Alice me conhecia bem demais para
cair naquela encenação meia-boca.
— E você achou melhor não desfazer o mal-entendido, é claro — ela
adivinhou, e eu concordei com um aceno de cabeça, prendendo o lábio
inferior entre os dentes para impedi-lo de tremer.
Até ali eu conseguira segurar o choro, entretanto não sabia por quanto
tempo mais poderia fazer isso.
— Não, porque ele não tem nada a ver com a minha vida, nem com a
da Maria Elisa — escolhi responder.
— E você se sente bem com isso?
Talvez eu devesse. Isso diria a ele que não ficara chorando por ele
quando foi embora, que segui em frente e que minha vida já estava
perfeitamente ajustada, que eu o havia superado. Mas não era assim que me
sentia, e sim humilhada, indefesa com apenas sua presença.
— Quando você estava esperando a Maria Vitória… — comecei, em
vez do meu desabafo — ficou pensando que as coisas seriam mais fáceis se
você tivesse o pai dela do lado?
— Claro que sim. — Ela tocou os meus cabelos, colocando uma
mecha atras da minha orelha. — Mas sabe o que realmente foi decisivo? —
Fiz que não com a cabeça. — Saber que eu daria conta do recado, com uma
rede de apoio de milhões.
Eu sorri, porque sabia que eu teria aquela rede de apoio de milhões,
mesmo com Maria Flor vivendo a um oceano de distância.
— Você acha que Maurício gosta de mim, não acha? — eu quis saber,
e Maria Alice anuiu. — E se… — Hesitei, ainda me decidindo sobre o uso
de palavras. — E se nós fôssemos, de fato, um casal?
— Como assim? — minha irmã perguntou de pronto, com o cenho
franzido.
— E se ele fosse o pai do qual Maria Elisa pode precisar? — Mordi o
lábio, esperando por sua resposta, depois de jogar em seu colo o
pensamento que vinha me agoniando.
Não, eu não era apaixonada por Maurício, mas isso realmente
importava? Eu me apaixonei por Rodrigo e nada veio de bom disso tudo.
Nada além da minha Maria Elisa, crescendo na minha barriga.
— Você acaba de dizer que o pai dela está de volta — Maria Alice me
lembrou. — Talvez tudo não tenha passado de um mal-entendido, como
entre mim e Miguel — ela disse, referindo-se ao pai de Maria Vitória, e eu
sacudi a cabeça furiosamente em uma negativa, porque as coisas não
poderiam ser mais diferentes.
— Miguel não colocou um preço na sua filha, Rodrigo sim. Eu não o
quero por perto, de jeito nenhum — assegurei, obstinada, mal podendo
acreditar nas palavras de Maria Alice ao reduzir minha conversa com
Rodrigo a um mal-entendido, lágrimas teimosas transbordando dos meus
olhos e banhando o meu rosto.
— Tudo bem, tudo bem… — ela concordou, tomando meu rosto
entre suas mãos e depositando um beijo em minha testa, depois de enxugar
minhas lágrimas. — Fica calma, pelo bem da nossa menina. — Maria Alice
tocou minha barriga protuberante, acariciando-a como gostava de fazer, e,
como soubesse que era a tia ali, Maria Elisa se mexeu preguiçosa dentro da
minha barriga, arrancando um sorriso de mim e da minha irmã.
— Como eu vou cuidar dela se não passo de um bebê chorão? —
externei a dúvida, olhando no fundo dos olhos bonitos de Maria Alice.
— Você é tão forte por não ter desistido dessa criança, como pode não
ver isso?
— Eu queria ser forte como você — admiti, porque eu admirava tanto
minha irmã mais velha.
— Não seja boba, nem se sinta impotente. — Ela abanou uma das
mãos, como se não fosse nada de mais. — Isso é carência, porque você sabe
que muito em breve outra pessoinha vai ser o centro das atenções.
Eu ri, já imaginando um time de Marias paparicando a mais nova
integrante do grupo.
— Mas, irmã — ela retomou, a voz assumindo um tom sério —, se eu
puder te dar um conselho… não minta pro Rodrigo, nem tente usar
Maurício como tábua de salvação. Faça isso pela minha sobrinha, confie no
que estou te dizendo. Maria Vitória poderia ter tido um pai esse tempo todo,
se eu tivesse vencido meu orgulho e conversado com Miguel. Talvez o
destino esteja dando uma nova chance pra Rodrigo de ser o pai que Maria
Elisa precisa.
Então ela me abraçou, dando o assunto por encerrado, e agora eu
tinha novas palavras para ficarem martelando na minha cabeça.
Capítulo 13

De algum modo, Maria Clara tinha conseguido ficar ainda mais linda
do que minhas lembranças me diziam que ela era.
E estava grávida, com um homem ao seu lado tocando a barriga
avantajada onde o bebê de Maria Clara crescia aparentemente saudável.
Girei a cabeça de um lado para o outro, alongando bem o pescoço,
como se isso fosse capaz de amainar a onda de estresse que eu sentia por
flagrá-la naquela situação, mas tudo o que eu conseguia quando fechava os
olhos era vislumbrar sua barriga de grávida. Gravidez que deveria ter
acontecido quando ainda estávamos juntos, ou pouco tempo depois.
Mas que diabos!
Era coincidência demais. E eu era um homem de negócios,
acostumado com lógica e matemática, não com acasos absurdos. Pedir que
eu acreditasse por um único instante que depois de mim Maria Clara teria se
envolvido com o tal Maurício e engravidado era um completo absurdo.
Não havia a possibilidade real de ele ser o pai daquele bebê. Eu me
recusava a acreditar. Precisaria ser uma distância muito ínfima entre o falso
positivo e a nova gravidez, e eu tinha certeza de que Maria Clara não estava
com ninguém além de mim, durante nosso período juntos. Eu era um
completo idiota por ter insinuado o contrário com base nas minhas
experiências passadas, porque sempre soube que Maria Clara não era como
as outras mulheres que tentavam gastar meu dinheiro em toda oportunidade
que tivesse.
A mãe dela me dissera com todas as letras que Maria Clara fora
vítima de um falso positivo, que não estava esperando um bebê meu nem
estava interessada no meu dinheiro. De todas essas afirmações, agora eu
sabia que apenas a última era verdade, e eu não conseguia parar de remoer a
culpa que me assolava ao pensar em Maria Clara sozinha durante os últimos
meses, sem o meu apoio, tendo que lidar com uma gravidez que foi
ocasionada por nós dois.
Mas que ela escolhera esconder de mim. Com ajuda da própria mãe.
Quem poderia culpá-la quando eu ofereci um milhões de dólares pelo
meu herdeiro?
Como fui um filho da puta com ela!
Mas ela também foi, quando escolheu mentir sobre a gravidez.
Que bom que eu tinha uma cama gigantesca na qual poderia me deitar
e remoer os erros do passado.
Depois de ponderar sobre o que deveria fazer, cheguei à conclusão de
que havia uma única forma de agir, daquele momento em diante. Sendo
assim, bati à porta da casa de Maria Clara logo cedo pela manhã, para que
pudéssemos conversar e tirar aquela história a limpo.
Foi ela quem me atendeu, usando um vestido florido que acentuava
sua barriga arredondada, e os olhos de chocolate se arregalaram de pura
surpresa ao me fitarem.
— O que você está fazendo aqui? — ela perguntou de imediato, meio
gaguejante, e eu precisei de todo meu autocontrole para não a beijar ali
mesmo, quando ela passou a língua pelos lábios volumosos.
Eu tinha que focar no que fora fazer ali.
— Você está grávida — apontei o óbvio, porque foi a primeira coisa
que me ocorreu dizer, minhas palavras saindo num tom acusatório.
Maria Clara engoliu em seco, empinando o nariz como se não
quisesse se deixar intimidar.
— E você é muito perspicaz — soltou ironicamente. — Fora daqui.
— Ela tentou fechar a porta, mas coloquei o pé entre ela e o batente,
impedindo o movimento, e adentrei o hall da casa de Maria Clara pela
primeira vez na vida.
Ela deu passos para trás, recuando.
— Esse bebê é meu, não é? — inquiri de pronto, sem tempo ou
paciência para rodeios. — Não minta pra mim, Maria Clara — exigi com o
maxilar trincado em pura cólera, quando ela pareceu prestes a negar. —
Não deixe que a raiva ou qualquer rancor que você possa ter de mim
nublem o seu bom-senso. Esse filho é meu.
Eu não sabia por que tinha tanta certeza disso, mas tinha. Parecia
inegável que Maria Clara estivesse grávida do meu bebê, e, como se para
provar minha teoria, ela virou o rosto para o outro lado, o olhar fugindo do
meu logo após ela ter engolido em seco, parecendo avaliar suas opções.
— É uma menina — foi o que ela escolheu dizer, e por algum motivo
desconhecido algo se aqueceu dentro do meu peito. — Maria Elisa —
continuou, voltando seu olhar duro para mim. — E nós não precisamos de
você antes, certamente não precisamos agora.
Seus punhos estavam fechados ao lado de seu corpo, e eu neguei com
um meneio de cabeça, porque aquilo estava longe de ser a verdade.
— Como pôde me esconder isso? — eu quis saber, ignorando sua
provocação. — Perdeu o juízo?
Ela bufou, e foi sua vez de sacudir a cabeça de um lado para o outro,
como se mal pudesse acreditar no que acabara de ouvir.
— Você que parece ter perdido o juízo e a memória — acusou —, ou
já se esqueceu de quando contei que estava grávida você insinuou que eu
era uma golpista e me ofereceu dinheiro pra sumir?
Havia tanta mágoa em seu tom de voz, que Maria Clara conseguiu
despertar em mim um sentimento que não era comum: remorso. Eu me
envergonhava de ter duvidado dela a esse ponto, mesmo que fosse por um
mísero segundo, porque deveria conhecer melhor seu caráter e saber que ela
jamais seria capaz de um golpe baixo como aquele.
— Não te ofereci dinheiro pra sumir, não diga besteiras! — retorqui,
porque era a verdade. — O que eu queria era comprar o seu silêncio, porque
tenho um nome a zelar.
— Pois então vá zelar do seu nome bem longe de mim e da minha
filha! — berrou, apontando para a porta logo atrás de mim, mas eu não iria
simplesmente sumir da sua vida em um passe de mágica.
Aquele tinha sido meu erro do passado, e eu não estava prestes a
repeti-lo quando me arrependia amargamente.
— Você precisa da minha ajuda, não seja intransigente. Eu posso
oferecer dinheiro e…
— Não sou uma morta de fome, não preciso do seu dinheiro pra criar
minha filha! — ela gritou, exasperada, com uma nota de ultraje banhando
seu tom.
— Nossa filha! — fiz questão de frisar. — A filha que você escolheu
esconder de mim. Será que não consegue ver a gravidade da situação?
— Foi você quem foi embora sem nem olhar pra trás — acusou,
apontando um dedo em riste para mim. — Você, e não eu! Depois de ser
humilhada, o que queria que eu fizesse? Que te procurasse e mendigasse
atenção? — perguntou, mordaz, o rosto inteiro tomado por fúria e
deixando-o num tom escarlate.
— Sua mãe foi me procurar. Saiu em sua defesa como uma leoa
protegendo o filhote. Não sabia disso? — Estreitei os olhos, medindo sua
reação às minhas palavras. — Foi ela quem me mandou ficar longe.
Foi ela quem disse que você não estava grávida.
— E claro que, como o bom menino que é, você obedeceu —
retrucou com escárnio, balançando a cabeça de um lado para o outro
furiosamente. — O que espera receber? Uma medalha de bom
comportamento?
— Estou só tentando provar que não estive longe por minha culpa, a
sua mãe se meteu na nossa história — devolvi em minha defesa, porque as
coisas não eram cem por cento culpa minha.
Entretanto, minhas palavras causaram tanta revolta em Maria Clara
que ela explodiu ainda mais, saindo totalmente do controle.
— Dobre a língua pra falar na minha mãe, ouviu? — Suas mãos
agarraram as lapelas da minha camisa, quando, na verdade, eu sabia, o que
Maria Clara desejava era me trucidar. — Você é um homem feito que não
deve satisfação a ninguém, se não veio me procurar foi porque não quis,
não coloque a culpa em outra pessoa.
Como se tivesse sido invocada, dona Maria do Rosário surgiu das
escadas, descendo os degraus apressadamente para então apoiar as mãos no
ombro da filha, puxando-a em sua direção.
— O que são todos esses gritos? — ela quis saber, abraçando a filha,
que tremia de pura raiva, as mãos rumando para o seu cabelo logo em
seguida, na tentativa de acalmá-la.
E eu me senti um merda. Vendo-a ali, tão nervosa, com a barriga linda
e redonda servindo de casa para a nossa filha.
— Vá embora, Rodrigo — foi a resposta de Maria Clara, um sussurro
débil e trêmulo quando seu corpo começou a se sacudir, indicando que ela
chorava. — Eu não quero te ver, por que você teve que voltar?
— Eu…
— Talvez seja melhor terminar essa conversa em um outro momento
— dona Maria do Rosário interrompeu, me lançando um olhar firme, e eu
meneei a cabeça numa negativa. — Pelo bem do bebê, Maria Clara precisa
se acalmar — emendou antes que eu pudesse protestar, e aquele argumento
ganhou a discussão.
Maria Elisa… minha filha.
Ela era o motivo de eu estar ali, não era? Não fazia sentido tomar uma
atitude que pudesse prejudicá-la, eu jamais me perdoaria se algo
acontecesse a ela… ou a Maria Clara.
Eu tinha que colocar a porra da minha cabeça no lugar.
Sendo assim, concordei com um aceno de cabeça, mesmo que a
contragosto.
— Esta conversa ainda não acabou — eu disse antes de lhes dar as
costas e sair dali.
Capítulo 14

Sorvi um pouco mais da água que minha mãe me oferecera no


momento que Rodrigo fora embora, como forma de me acalmar.
Meu coração ainda parecia prestes a sair pela boca, tanto por sua
presença quanto por nossa discussão. Ele não podia mesmo achar que tinha
o direito de me cobrar nada depois do nosso último encontro, era mesmo
inacreditável que ele se achasse na posição de me acusar quando ele foi o
estúpido de toda a história.
— Se sente melhor, filha? — mamãe perguntou ao meu lado,
apertando minha mão no sofá de casa e depositando um beijo nos meus
cabelos, antes de colocar uma mecha atrás da minha orelha.
Anuí com um gesto de cabeça, ainda que eu não soubesse dizer muito
bem se aquilo era verdade ou não.
— Por que não me disse que a senhora foi procurar Rodrigo? —
perguntei, já que a dúvida me corroía desde o momento que ele deixara
escapar aquela informação.
— Porque você me disse que ele ofereceu dinheiro em troca de pôr
um fim à gravidez, e eu não queria que você sofresse ainda mais. Por isso
eu o procurei e disse que não tinha bebê nenhum e exigi que ele te deixasse
em paz.
Meus olhos se encheram de lágrimas, e não tive coragem de fazer as
próximas perguntas que tinha em mente.
Ela de fato dissera para Rodrigo ficar longe de mim e que eu não
estava grávida? Isso realmente importava? Depois de tudo o que vivemos
juntos, eu não acreditava que simples palavras da minha mãe fossem
capazes de definir como ele iria se portar. Como eu lhe disse, ele sempre se
mostrou muito dono de si para simplesmente obedecer à dona Maria do
Rosário. Não era como se ela o tivesse ameaçado severamente ou algo
assim, era?
Mas se ele acreditava que eu não estava grávida... isso mudava as
coisas um pouco de perspectiva.
— Fiz o que fiz tentando te proteger — mamãe falou ante o meu
silêncio, e meus olhos correram para sua expressão consternada. — Meu
intuito não foi simplesmente me meter na história de vocês e arruinar tudo,
preciso que acredite nisso.
— Eu acredito — murmurei, apoiando minha cabeça em seu ombro,
conforme puxava as pernas para cima do sofá, apertando o copo com mais
força entre minhas mãos. — Não foi culpa sua — emendei, acreditando
veementemente em cada palavra.
Não era sua culpa que Rodrigo tivesse escolhido simplesmente ir
embora sem se despedir, ou sem o pedido de desculpas que eu tinha certeza
de que merecia, com ou sem bebê. Mamãe pode até ter lhe dito para ficar
longe de mim, que eu não estava mesmo grávida ou o que quer que fosse.
Mas foi ele quem decidiu que iria embora de Ilha do Sol sem voltar a me
ver e acertar as coisas entre nós.
E, se eu fosse ser sincera, com a chegada tão próxima de Maria Elisa,
eu não poderia culpar mamãe nem que quisesse, porque eu sabia que não
havia nada que eu não fosse capaz de fazer para assegurar o bem-estar da
minha filha.
— O que eu faço agora? — inquiri a minha mãe, sem saber como agir
em seguida.
Eu não contava com a volta de Rodrigo, muito menos com o fato de
que, aparentemente, ele não parecia ávido para encarar minha gravidez
como um problema. Ele seria um bom pai, se eu lhe desse a chance?
— O que você acha que deve fazer agora? — mamãe devolveu, e
esbocei uma careta que a fez rir, não me sentindo apta para tomar tal
decisão, sem saber como me comportaria se Rodrigo voltasse disposto a
terminar a conversa que ele mesmo disse não ter acabado.
Talvez Maria Alice estivesse certa e eu devesse engolir o meu orgulho
em prol do bem-estar do bebê que eu estava prestes a trazer ao mundo.
Talvez o choque da informação inicial tenha sido o responsável por Rodrigo
ter reagido tão mal à notícia da gravidez, o que não mudava em nada como
eu me sentia sobre aquela discussão.
— Eu só quero me deitar na minha cama e não precisar tomar
nenhuma decisão importante — admiti, e mamãe depositou um beijo
demorado em minha cabeça, me arrancando um suspiro.
— Então é isso o que nós vamos fazer — decretou, e eu esbocei um
sorriso quando ela se levantou, me estendendo uma das mãos.
Imitei o gesto, então depositei meu copo com água sobre a mesa de
centro e me deixei ser rebocada escada acima, ciente de que eu não
aguentaria repetir o gesto muito mais vezes se Maria Elisa demorasse
semanas mais para nascer.
Capítulo 15

Maria Clara estava sentada no sofá do meu duplex alugado em Ilha do


Sol, comigo logo ao seu lado.
Dois dias depois de nosso encontro pouco amistoso em sua casa, ela
me mandou uma mensagem dizendo que precisávamos conversar, e desde
aquele momento eu vinha contendo a ansiedade.
Eu era pai do bebê que Maria Clara estava esperando e sentia que já
havia perdido tempo demais, tendo estado longe durante a maior parte da
gravidez. Cada segundo agora era mais do que precioso, de modo que eu
vinha pensando sobre como seria nosso arranjo, e havia uma única forma de
eu me sentir satisfeito quanto a isso.
Nós deveríamos nos casar, era o único modo.
Eu não pretendia perder nada do que aconteceria a partir de ali com
Maria Clara e Maria Elisa. Não fui útil e talvez nem mesmo necessário nos
últimos meses, mas eu jamais permitiria que minha filha fosse criada por
outro homem, e havia um que parecia a postos para assumir o posto que era
meu por direito.
Maurício, o suposto amigo de Maria Clara, apesar de eu conhecer o
bastante de segundas intenções masculinas para reconhecer as dele, que
queria bem mais do que amizade.
Mas agora eu estava de volta a Ilha do Sol, e de modo algum deixaria
outro homem assumir o lugar que me pertencia, fosse na vida de Maria
Clara ou da nossa filha.
Maria Clara era minha, só minha, desde o primeiro momento que eu
coloquei meus olhos nela.
— Você tem algo em específico que gostaria de me dizer? — Maria
Clara perguntou, porque não consegui ser aquele que quebrava o silêncio.
Havia muitas coisas que eu precisava e queria dizer a Maria Clara,
todas elas se atropelando na minha cabeça, de modo que eu não sabia muito
bem por onde começar.
— Acho que, antes de mais nada, um pedido de desculpas — eu me
decidi, e seus olhos se arregalaram brevemente ante a surpresa. Até mesmo
eu estava surpreso, já que acreditava que aquela era a primeira vez que eu
me desculpava com alguém. — Eu te julguei extremamente mal porque fui
pego de surpresa com a notícia, mas sei que isso não pode justificar o meu
comportamento, por isso eu sinto muito.
Maria Clara engoliu em seco, acenando em concordância logo em
seguida, o olhar caindo para o seu colo.
— Suponho que seja normal que um homem da sua posição desconfie
de alguém da minha — ela considerou, dando de ombros como se não fosse
nada de mais. — Desculpas aceitas.
— Os últimos meses não devem ter sido nada fáceis — observei, e
seus lindos olhos chocolates se levantaram para os meus. — Mas eu
pretendo compensar todo o tempo em que estive longe, espero que saiba
disso.
— Minha mãe me contou que vocês conversaram antes de você ir
embora — murmurou —, só que eu não a culpo por você ter escolhido me
dar as costas.
Trinquei os dentes, porque aquela não era minha visão das coisas.
— Eu achei que fosse o melhor pra você, pra que não se machucasse
ainda mais por minha causa.
— E não considerou que simplesmente me dar as costas doeria ainda
mais do que uma despedida? — bufou, incrédula, e recebi suas palavras
com o mesmo prazer que teria recebido um soco no estômago.
— Sinto muito — admiti, sem saber o que mais poderia dizer, apesar
de ciente de que algumas palavras, por mais verdadeiras e cheias de
significado que fossem, não seriam capazes de apagar os últimos meses.
Mas ações talvez fossem o suficiente para no mínimo me redimir, e
era isso o que eu faria.
— A partir de agora eu vou estar sempre por perto para o que quer
que você precise, está bem? — Toquei o rosto de Maria Clara com os nós
dos meus dedos, sentindo sua pele macia em contato com a minha pela
primeira vez depois de todo o tempo em que estivemos separados, e a
sensação era mil vezes melhor do que eu me lembrava.
Ela sentira falta do contato tanto quanto eu, se seu inclinar de cabeça
em direção à minha mão fosse algum indicativo, porque nem mesmo o
tempo distante era capaz de eclipsar quão bons nós éramos juntos.
Havia uma diferença de idade de mais de dez anos entre nós dois, o
que significava que comecei minha vida sexual muito antes de Maria Clara,
mas nunca antes encontrei uma mulher tão entregue e apaixonada quanto
ela era, e isso me deixava louco, ávido por sentir de novo a explosão
eletrizante de quando dividíamos uma cama… ou qualquer outra superfície.
— Não vim aqui à procura de promessas — ela murmurou, ajeitando-
se melhor em sua posição, colocando um fim ao nosso contato físico. —
Nem estou atrás do seu dinheiro — apressou-se em emendar. — Só aceitei
conversar porque você pareceu querer ser um pai presente pra Maria Elisa,
e eu não vou tirar isso dela.
Ela empinou o nariz, mostrando quão geniosa era e sua aversão por se
mostrar vulnerável, algo em sua personalidade que apenas me fazia querer
protegê-la e cuidá-la ao máximo.
— Um pai muito presente — corrigi, esticando minha mão rumo em
sua barriga, deixando-a parar no ar. — Posso? — perguntei, e ela mordeu o
lábio, como se considerasse as opções, antes de acenar em concordância.
Pela primeira vez, pousei minha mão sobre a barriga de Maria Clara,
e, como se me desse as boas-vindas, minha filha mexeu para mim, um
movimento discreto que fez uma onda de felicidade irradiar pelo meu peito
de uma forma que nunca experimentei antes daquele momento.
Eu nunca sonhei em ser pai ou mesmo constituir uma família, porque
a minha própria nunca foi das melhores. Dinheiro foi sempre a única coisa
que eu sempre tive, então nunca pensei que amor e sentimentalismos eram
para mim. Mas, sendo honesto comigo mesmo, eu precisava admitir que o
contato com a barriga de Maria Clara, onde crescia um fruto do nosso
envolvimento e da química explosiva, faziam uma emoção inédita pulsar
pelas minhas veias e aquecer o meu peito.
Aquilo era tudo o que eu mais queria no momento, as duas, mãe e
filha, ao meu lado, para que eu pudesse ser para elas o porto seguro que
jamais senti ter quando criança.
— Tem uma coisa que preciso te perguntar — eu disse, e os olhos
brilhantes de Maria Clara saíram do contato de minha mão com sua barriga
para focarem no meu rosto. — Você quer ser minha esposa?
Ela piscou, estupefata, como se não acreditasse nos seus próprios
ouvidos, o rosto com uma careta adorável quando ela finalmente conseguiu
articular algo.
— Como disse? — ela meio que gaguejou de volta para mim, a mão
apoiando-se na minha, ainda sobre sua barriga.
— Eu quero saber se você aceita ser minha esposa — repeti, por mais
súbita que pudesse parecer a proposta.
Eu havia tido tempo mais do que suficiente para pensar sobre aquilo
desde que vi Maria Clara na orla da praia, com uma barriga gigantesca que
só podia significar uma única coisa: ela estava grávida, e eu estava prestes a
ser pai. Eu soube, ali, que gostaria de fazer parte daquele cenário, que
jamais abandonaria minha filha e herdeira — até então perdida — pelo que
quer que fosse.
— Você só pode estar louco — Maria Clara murmurou, atônita,
levantando-se do sofá e andando de um lado para o outro, em um gesto que
demonstrava toda sua exasperação. — Primeiro acha que estou tentando te
dar o golpe da barriga, depois me pede em casamento… — Ela parou no
meio de sua ponderação, os olhos fixos em mim denotando surpresa. — É
isso, não é? O casamento é uma forma de me controlar, porque no fundo
você tem medo de que eu queira mais dinheiro do que você está disposto a
oferecer…
Neguei com um meneio de cabeça, levantando-me e indo para junto
dela, segurando suas mãos delicadas entre as minhas, beijando-lhes o dorso
no intento de acalmá-la.
— Estou disposto a oferecer qualquer quantia que você queira, por
mais exorbitante que possa parecer — admiti, pegando até a mim mesmo de
surpresa.
Pela primeira vez em muito tempo não era sobre o dinheiro para mim.
Era sobre algo muito mais importante e potente.
— Não quero ser apenas um suporte financeiro pra você e pra nossa
filha — emendei. — Eu disse que estava disposto a estar ao seu lado a cada
minuto, e falo sério. Quero estar ao seu lado a cada minuto — corrigi —, e
acho que podemos ser a família que Maria Elisa merece, nós temos tudo pra
dar certo.
— Nós não temos amor — contrapôs, e por algum motivo aquilo me
incomodou, a ponto de me fazer franzir o cenho.
— Amor é superestimado — devolvi mesmo assim —, mas nós temos
tesão um pelo outro e uma filha a caminho, isso é muito mais do que posso
dizer da maioria dos casais que conheço.
Ela abriu a boca, provavelmente para contestar, no entanto, antes que
uma única palavra pudesse sair daqueles lábios deliciosos e atrativos, seu
rosto se franziu, e seu olhar correu para o espaço entre nós dois, mirando a
poça de água discreta aos nossos pés, e eu não precisava ser um gênio para
saber o que aquilo significava.
— Não, não, não… — Maria Clara repetiu sacudindo a cabeça de um
lado para o outro, uma nota de choro banhando seu tom antes de seus olhos
arregalados recaírem sobre mim. — Isso não está certo, é muito cedo —
soltou em um gemido sofrido. — Eu preciso ir até um hospital, preciso que
ligue pra minha mãe, isso não está certo — chorou, e eu voei pelo
apartamento, à procura das chaves do meu carro alugado.
— Vai ficar tudo bem — assegurei, colocando o máximo de certeza
que conseguia sentir em minha voz. — Vou ligar pra sua mãe no caminho
até o hospital, agora nós precisamos ir, nosso bebê está chegando.
Capítulo 16

Ter Maria Elisa em meus braços era como segurar meu mundo todo
entre eles. Ela era tão pequena — apesar de seus três quilos e cinquenta
centímetros -, tão macia e delicada. Fazia com que meus instintos de
proteção fossem acionados no mais alto nível.
Sua mãozinha se fechou em torno do meu dedo indicador, e o meu
coração se derreteu inteiro por ela.
Eu a amava, de uma forma que jamais ser possível e que não sabia
explicar, mas minha filha mal chegara ao mundo e já me tinha rendido por
ela.
Minha filha. Eu era pai. De uma garotinha encantadora e de pulmões
fortes, se seu choro estridente ao nascer fosse algum indicativo.
— Você sabe que pode colocá-la no berço pra descansar os braços,
não sabe? — a voz de Maria Clara soou às minhas costas, alertando que ela
havia acordado de seu cochilo depois de alimentar nossa filha.
Eu me virei para ela, e, apesar das últimas horas, onde deu à luz o ser
humano mais lindo de todo o mundo, o alívio de saber que Maria Elisa era
um bebê forte e saudável lhe fez muito bem, porque ela ainda era a mulher
mais linda em quem já pus os olhos.
— É você quem precisa se preocupar em descansar, não eu —
apontei, lembrando-me de seus gritos de dor durante o parto. Maria Clara
merecia o mundo e eu estava disposto a dar-lhe exatamente isso, se fosse o
que ela queria.
— Eu estou bem — murmurou através de um bocejo, batendo no
ínfimo espaço na cama ao seu lado. — Traga ela aqui — pediu, arrumando
sua posição na cama.
Eu me aproximei, sentando-me ao seu lado, e Maria Clara colocou
uma mecha do próprio cabelo atrás da orelha antes de se inclinar e depositar
um beijo na cabecinha de Maria Elisa.
— Ela é tão linda — disse em um suspiro, a mão esquerda traçando o
contorno dos traços perfeitos da nossa filha. — E tem os seus olhos —
observou, ainda que Maria Elisa estivesse de olhos fechados, ressonando
tranquilamente em meus braços.
Meu peito se encheu de orgulho e regozijo, e eu anuí com um gesto
de cabeça.
— Mas o resto é todo seu — apontei. — Por isso ela é tão perfeita,
porque se parece com a mãe.
Maria Clara corou, demonstrando visivelmente seu desconcerto ante o
elogio sincero.
— Onde estão minha mãe e minha irmã? — mudou de assunto.
— O médico as convenceu de que o melhor era ir pra casa, a fim de
desencasarem um pouco. Como você só pode ficar com um acompanhante e
eu me recuso a ir embora… — Dei de ombros, como se não fosse nada de
mais, quando na verdade nada poderia me separar da minha Maria Elisa tão
cedo.
— Você também precisa descansar — retrucou. — E cuidar dos seus
negócios, porque não está aqui a passeio.
— Bobagem. Omar pode tomar conta de tudo, ele até mesmo achava
desnecessária minha presença em Ilha do Sol. Nada é mais importante pra
mim do que estar com você e Maria Elisa.
E era mesmo a verdade. Pela primeira vez em muito tempo os
negócios não eram o que me movia, e sim minha vida pessoal.
— Se você diz… — Maria Clara deu de ombros, parecendo tímida.
— Nós temos um assunto inacabado — eu a lembrei, recebendo um
olhar desconfiado em resposta. — Eu te pedi em casamento quando Maria
Elisa decidiu que sua chegada ao mundo era mais importante do que
qualquer outra coisa. Não que eu discorde disso.
Maria Clara sorriu, um gesto bonito e verdadeiro que me fez ficar
apaixonado pelo fato de ser o responsável por colocar aquele sorriso nos
seus lábios.
— Eu já disse que você está louco se acha que casamento é a resposta
— respondeu com um suspiro.
— Por quê? — eu quis saber, franzindo o cenho por não entender sua
recusa. — Nós temos tudo pra dar certo.
— Nós temos uma filha juntos — contrapôs. — Um casal precisa de
bem mais que isso pra dar certo.
— Maria Clara…
— Esse não é o momento — ela me interrompeu, pousando o
indicador nos meus lábios para calar o meu protesto. — Nós dois estamos
com as emoções à flor da pele, não é justo pensarmos em decidir algo tão
importante assim nesses termos.
Assenti num meneio de cabeça, entendendo seu argumento por mais
que discordasse dele. De qualquer forma, se tempo era o que Maria Clara
precisava para entender que nós pertencíamos um ao outro, eu seria
paciente e lhe daria o que ela estava me pedindo.
Capítulo 17

Maria Elisa demonstrava toda sua força na mandíbula enquanto


sugava o meu seio, e eu toquei seu narizinho arrebitado enquanto ela
soltava um longo suspiro de contentamento.
— Ela é linda demais, tia Maria Clara — Maria Vitória falou
empoleirada na poltrona de amamentação junto comigo, apoiando sua
cabeça na minha enquanto uma das mãos acariciava a roupinha da prima
mais nova.
— Ela é, não é? — perguntei com um suspiro, pegando a mãozinha
da minha filha e levando a boca.
A sensação de estar de volta em casa, com minha filha saudável e fora
de perigo e meu time de Marias a postos para me mimar era indescritível.
Até mesmo Maria Flor tinha dado uma pausa em sua vida de rainha para
conhecer a sobrinha, e eu não poderia estar mais feliz. Como se não
bastante, meu medo de que minha filha cresceria sem pai era a última coisa
que se passava pela minha cabeça, porque Rodrigo vinha se mostrando
presente e prestativo ao extremo.
Não era apenas sobre o dinheiro dele e as coisas pelas quais ele podia
pagar. Ele de fato me ajudava nas tarefas do dia a dia, mesmo que eu jamais
tivesse imaginado, antes, que o veria trocar fraldas e medir a temperatura da
água do banho do nosso tesourinho.
Ele vinha se mostrando um pai incrível e incansável, o que não me
ajudava a tirar sua proposta de casamento da cabeça, mesmo que eu
soubesse que um bebê não deveria ser o motivo por trás da união de duas
pessoas. Certo?
Eu achava que sim, mas minha certeza vacilava a cada vez que
Rodrigo estava por perto. Ele vinha se mostrando tão ótimo pai, e seria
mentiroso da minha parte negar que a atração que eu sentia por ele ainda
existia, tão poderosa e forte como nunca.
A pior parte é que eu não poderia falar disso com meu time de
Marias, por medo de elas acharem que eu estava considerando o pedido de
casamento por culpa de um ataque de carência. E verdade fosse dita, talvez
fosse isso mesmo. Eu não sabia o que era intimidade entre homem e mulher
desde minha última vez com Rodrigo, e sua presença não ajudava a acalmar
meus hormônios bagunçados pela gravidez e pelo parto recente.
— Deixa que eu coloco minha neta pra arrotar — mamãe falou assim
que minha filha soltou o bico do meu seio, já de barriguinha cheia.
— Não é justo, a senhora está monopolizando a Maria Elisa — Maria
Alice protestou, cruzando os braços em frente ao peito como forma de
demonstrar sua indignação.
— Eu deveria ter mais tempo com ela, porque logo vou embora —
Maria Flor emendou, e eu sorri satisfeita por ver o quanto meu tesourinho
era amado e disputado.
Não demoraria muito até que Rodrigo voltasse para reclamar seus
direitos de pai.
Depois de muita insistência, ele finalmente deu o braço a torcer e foi
ajudar Omar com o projeto do novo hotel que eles construiriam em Ilha do
Sol, mas eu tinha certeza de que ele não iria demorar.
Depois das últimas noites de nossa volta para casa, em que ele dormia
sentado na poltrona de amamentação, apenas para não ficar longe de Maria
Elisa, seria preciso mais que um simples hotel para manter aquele homem
afastado da filha recém-nascida.
Capítulo 18

Dois meses haviam passado desde o dia em que Maria Elisa chegou
ao mundo, e mesmo que os compromissos fora de Ilha de Sol insistissem
em me chamar, eu sempre dava um jeito de voltar para o local onde meu
coração batia fora do peito.
Minha filha era linda, e a mãe dela era uma mulher incrível e forte, o
que só fazia a necessidade de tomar conta delas crescer dentro do meu peito
até que ameaçasse explodir.
Eu as queria comigo, aonde quer que eu fosse, e os momentos longe
delas apenas tornava essa certeza inabalável. Talvez fosse o momento de
voltar a tocar no assunto casamento com Maria Clara, apesar de não parecer
momento cabível dentro de nossa rotina para tal abordagem. Por isso eu a
convidei para jantar, como modo de ter um momento apenas entre nós dois
no qual pudéssemos falar de algo além de troca de fraldas e amamentação.
Seria a primeira vez de Maria Clara fora de casa sem a presença de
Maria Elisa, de modo que eu gostaria de que fosse algo especial, o que
significava que o country club estava fora de cogitação. Maria Clara ainda
não fizera as pazes com o lugar, e eu jamais poderia culpá-la. A vida não se
mostrara fácil para a terceira filha de uma mãe solo, e as pessoas não
pareciam ter evoluído em nada.
Assim sendo, decidi que o melhor a se fazer era contratar um
excelente chef de cozinha para preparar o jantar para mim e Maria Clara.
Nossa filha ficaria sob os cuidados das demais Marias e Zeus, e não havia
ninguém no mundo em quem eu confiasse mais para a tarefa.
— Você não precisa deixar de beber só porque eu não posso — Maria
Clara murmurou já sentada à mesa, quando lhe servi um bom suco de uva
integral, no lugar do vinho.
— Estamos nessa juntos, lembra? — devolvi, erguendo minha taça
para ela, para que pudéssemos brindar. — À nossa filha, que é a coisa mais
preciosa que possuímos.
Seus olhos enterneceram, e ela tocou sua taça com a minha, sorvendo
um gole de seu suco e devolvendo a taça à mesa.
— Será que ela está dando trabalho pra minha mãe e Maria Alice?
Faz tempo que elas não sabem o que é ter um bebê de total responsabilidade
delas.
A preocupação era notável em seu tom, e eu abri um sorriso de
apreciação, orgulhoso pela mãe maravilhosa que ela se mostrava ser a cada
dia.
— Tenho certeza de que elas estão bem — assegurei, e eu gostei do
fato de Maria Clara confiar em mim a ponto de seus ombros relaxaram
instantaneamente.
— Claro que você acha isso, já que se aliou a elas pra me tirar de
casa. — Ela rolou os olhos, fingindo exasperação. — Espero que saiba que
você não precisa se dar ao trabalho. Eu ia sair sozinha… eventualmente —
emendou, sob meu olhar de ironia.
— Maria Elisa nasceu, mas isso não significa que você tenha que se
apagar como mulher. Tenha isso em mente.
Ela mordeu o lábio, como se tentasse decidir se faria ou não a
próxima pergunta.
— Você acha que estou fazendo isso? — quis saber, inclinando-se de
leve sobre a mesa que nos separava. — Que estou me apagando como
mulher?
Considerei a pergunta, bebendo mais um gole do meu suco de uva e
pousando a taça sobre a mesa.
Maria Clara nunca me parecera tão atrativa quanto agora, mesmo que
seu intuito nem de longe fosse seduzir. Mas seu corpo ganhara curvas mais
generosas, durante a gravidez, e, como se quisessem provar um ponto, meus
olhos focaram na depressão profunda de seu decote que, deveria ser
inofensivo, mas não era.
Seus seios estavam mais avantajados, graças à amamentação, e eu
soube, desde que pus os olhos em Maria Clara depois dos últimos meses
sem vê-la, que sua beleza florescera de modo exorbitante e que me deixava
tonto de tesão sempre que eu pensava nela e me lembrava dos nossos
momentos juntos.
— O que eu sei — comecei, me levantando do meu assento para que
pudesse ir até ela, apoiando o quadril na borda da mesa — é que você me
deve uma resposta.
Suas sobrancelhas se franziram, e ela me encarou, confusa.
— Do que está falando?
— Você aceita ser minha esposa? — murmurei, levando uma de
minhas mãos para brincar com uma mecha de seu cabelo sedoso,
enrolando-a entre meus dedos e me lembrando como aquela massa castanha
ficava ainda mais bonita completamente revolta sobre os meus travesseiros.
— Achei que tivéssemos superado esse assunto — ela soltou entre
dentes, levantando-se também e, de tal modo, colocando um fim ao meu
toque e mais distância entre nós.
— Eu não vou superar enquanto não receber um sim — alertei,
içando minha sobrancelha em desafio, e ela bufou.
— Então não vai superar nunca, porque isso não vai acontecer, nunca
vou dizer sim — soltou, revoltada, cerrando os punhos aos lados do corpo.
— Por que não? — eu quis saber, uma carranca mal-humorada
tomando conta das minhas feições.
Não era todos os dias que eu precisava praticamente implorar para
que o meu desejo se tornasse realidade.
— Porque isso sim seria me apagar como mulher e me resumir a
apenas mãe da sua filha! —Maria Clara devolveu, exasperada. — Será que
você não vê que a proposta chega a ser ultrajante?
— Ultrajante? — ecoei, deixando transparecer em meu tom o quanto
eu achava aquela acusação sem sentido. — Estou te pedindo pra ser minha
esposa, não uma amante qualquer.
— Como é possível que você não entenda a problemática disso? Não
quero me casar apenas porque engravidei, pra cumprir um papel que a
sociedade espera de mim. Se um dia eu me casar, quero que seja por amor,
paixão, cumplicidade… — enumerou, e eu segurei seu rosto bonito entre as
mãos, olhando no fundo de seus olhos.
— Mais cumplicidade do que existe entre nós dois? — eu quis saber.
— Mais paixão? Mais desejo?
Aquilo era impossível, porque não tinha como existir uma química
maior do que a que Maria Clara e eu possuíamos. Eu ainda conseguia me
lembrar do gosto de seu beijo, da entrega de seu corpo, dos seus gemidos de
prazer ao meu ouvido… e sentia falta de todas essas coisas.
— Não estou falando de um caso tórrido de verão, e sim de algo pra
vida toda. — Seus olhos brilharam em pura emoção. — Quando ou se eu
me casar, eu quero que seja pra sempre.
— É isso que estou propondo.
— Não. — Ela sacudiu a cabeça de um lado para o outro, em uma
negativa. — Você está propondo algo de conveniência, porque não quer
ficar longe da sua filha. Não tem nada a ver comigo.
Ponderei por um instante. Ela tinha razão?
Claro que não.
A resposta veio alta e clara na minha cabeça, uma resolução
incontestável.
Sim, eu queria Maria Clara e era conveniente que ela fosse a mãe da
minha filha, mas esse não era o único motivo pelo qual eu a queria. Maria
Elisa era a força motriz por trás de muitas coisas, mas não do meu desejo
por sua mãe.
Ela era fruto de tal desejo, verdade fosse dita. Da minha incapacidade
de resistir a Maria Clara, à sua personalidade extraordinária e à forma como
ela me fazia sentir vivo por dentro.
— Se acha que eu faria essa proposta pra outra mulher que não fosse
você, perdeu o juízo de vez — declarei, sentindo no fundo do peito a
verdade por trás de cada uma de minhas palavras.
Eu jamais daria as costas a um filho meu e seria o melhor pai possível
sob quaisquer circunstâncias, mas, em se tratando de Maria Clara… eu mal
podia esperar para ouvir os sinos da igreja soando e conseguia até mesmo
vislumbrar seu rosto bronzeado adentrando a nave da igreja para ser
indubitavelmente minha.
— E o que acontece quando a magia do momento acabar? —
questionou. — Quando você estiver de volta à sua vida, cercado por
mulheres deslumbrantes se batendo pra estarem na sua cama?
— Eu vou dizer a elas que já existe alguém em minha cama: você —
respondi de pronto, sem precisar de um único instante para pensar a
respeito.
Não havia mais ninguém que eu pudesse querer se tivesse Maria
Clara nos meus braços.
— Isso até eu perder a graça e você desejar me substituir — soltou
amargamente, sacudindo a cabeça de um lado para o outro.
— Não tem como substituir você, acredite em mim, eu tentei.
Seu rosto bonito se transformou em uma expressão insultada ao
mesmo tempo que ela cerrou os punhos e acertou meu peito repetidas vezes
com ele, a um único passo do histerismo. E, eu precisava admitir, ela tinha
total razão em reagir daquele modo.
— Mas que cretino! — ela bradou, furiosa, ainda me golpeando, até
que segurei seus pulsos e a puxei contra meu corpo, arrancando-lhe um
arquejo de surpresa.
— Não tem uma forma bonita de dizer isso, okay? — admiti entre
entes. — Sinto muito, mas é como me sinto. Posso provar, se palavras não
forem o suficiente — ofereci, ciente de que, no momento que ela baixasse a
guarda e me deixasse mostrar o quanto me deixava louco, não haveria
dúvidas quanto às minhas intenções.
— Não preciso que me prove nada — devolveu em um chiado, depois
de engolir sem seco, e eu me inclinei em sua direção, resvalando meu nariz
contra o seu brevemente.
— Tem certeza? — desafiei. — Não é uma tarefa difícil.
Minhas mãos, que antes seguravam os seus pulsos, passearam por
seus braços, e eu senti sua pele ficando arrepiada em resposta, o que
mostrava que eu não era louco e que aquele desejo que sentia por ela não
era, de jeito nenhum, unilateral.
— Rodrigo… — ela chamou com uma voz pesada. — Não ouse.
— O que eu não devo ousar?
— Você sabe — devolveu com a voz trêmula, quando meus lábios
alcançaram seu ombro nu, graças ao vestido de alças que ela usava.
— Sei? — eu quis testar, meus lábios deslizando languidamente até
seu pescoço, fazendo com que Maria Clara soltasse uma respiração ainda
mais pesada.
— Não ouse me beijar… — alertou, porém seu corpo entregue a voz
difícil pareciam implorar o extremo oposto, de modo que tornava a situação
impossível de resistir.
— Por que não? — provoquei. — Por acaso você já me substituiu?
Uhm? — instiguei, quando ela não me respondeu imediatamente, mas a
mera possibilidade já era um inferno de imaginar, porque a imagem de
Maurício e do modo como ele parecia à espreita para roubar minha mulher
assolou meus pensamentos.
— Isso não é da sua conta — Maria Clara escolheu dizer.
— É cem por cento da minha conta, já que estou tentando te seduzir e
te fazer minha de uma vez por todas.
Sua boca linda e suculenta se abriu para que ela pudesse me
responder, mas eu fui mais rápido, roubando aqueles lábios deliciosos em
um beijo voluptuoso e escutando os gemidos de prazer que emitimos,
juntos, e demonstravam o quanto sentimos falta um do outro.
Reconhecendo o caminho, minhas mãos agarraram a bunda redonda
de Maria Clara, dando-lhe impulso para que eu pudesse sentá-la na mesa e
me encaixar entre suas pernas, o que fiz em questão de segundos, já que não
encontrei resistência.
Havia apenas desejo, nu e cru, e eu estava prestes a provar para
aquela mulher que nenhum outro homem jamais a faria gritar de tesão como
eu era capaz de fazer.
Capítulo 19

Qualquer lógica desapareceu do meu corpo no instante em que as


mãos de Rodrigo desceram sobre ele.
Meses longe dele apenas me tornaram mais suscetível à sua presença,
de modo que cedi às suas investidas e perdi completamente o controle. De
repente, as ponderações sobre quão degradante sua proposta de casamento
era desapareceu, deixando em seu lugar apenas um desejo insano que não
me deixava raciocinar muito bem. E, de uma hora para outra, o tempo longe
não significava absolutamente nada, porque tudo em que eu conseguia
pensar era no fato de que Rodrigo me beijava e me apertava contra si, me
fazendo sentir sexy e desejada outra vez.
Me fazendo sentir mulher.
Minhas mãos correram para os seus cabelos, sentindo a textura macia
deles, para logo então correr por sua nuca, seus bíceps, costas…
Rodrigo não tinha o corpo de um homem que se sentava o dia inteiro
atrás de uma mesa para analisar contratos… cada pequeno músculo sob
minhas mãos era trabalhado e atrativo demais para apenas estar ali por
acaso.
E, como se quisesse provar seu condicionamento físico, ele me pegou
nos braços, me carregando para longe da mesa em direção ao que eu sabia
ser o quarto, e eu deixei, porque não havia muito mais que eu pudesse fazer.
Durante os meses em que ele esteve fora, eu li e ouvi relatos de
mulheres que tinham o desejado sexual completamente eclipsado pelos
desconfortos da gravidez, e, sendo sincera, eu esperava que esse fosse o
meu caso. Para o meu próprio bem como mãe solo, eu não queria desejar
algo que não poderia ter. De algum modo, ir para a cama com um homem
estando grávida de outro me parecia errado, e me conhecendo como eu
conhecia, imaginava que não haveria espaço para romance tendo a
responsabilidade de criar outro ser humano.
Quando eu achava que tinha aceitado meu destino e encontrado todas
as respostas, Rodrigo ressurgiu na minha vida, apagando todas as minhas
certezas e deixando uma porção de interações em seu lugar.
Algo dentro de mim dizia que eu não deveria estar prestes a ir para a
cama com o pai da minha filha, mas essa vozinha tinha uma opinião
insignificante perto do barulho estrondoso que o desejo que se apossara de
mim reverberava.
Um lapso de bom-senso e insegurança me ocorreu, no entanto, porque
Rodrigo transara com outra Maria Clara. Uma que não tinha cicatrizes de
estrias por causa da gravidez e medidas menores. Que não estava em
processo de amamentar ou mesmo um parto recente.
Meu corpo mudara, e muito, desde a última vez em que Rodrigo e eu
estivemos juntos, o que me fez desconcertada em sua presença, sem saber
como agir. Talvez fosse melhor parar as coisas no início, antes de que ele
me visse realmente e rejeitasse a mulher que eu havia me tornado.
— Maria Clara… — ele murmurou ao meu ouvido, mordendo meu
lóbulo assim que chegamos à suíte e me colocando de volta sobre os meus
pés. — Pare de ficar remoendo o que quer que seja, somos só você e eu
aqui, agora.
Um protesto começou a se formar nos meus lábios, apesar de eu não
saber o que poderia dizer depois de Rodrigo ter praticamente lido a minha
mente.
Será que ele sabia que eu estava insegura quanto ao meu corpo?
Deus, por favor, não…
Antes que eu pudesse murmurar o que quer que fosse, contudo, sua
boca encontrou a minha, me convidando para um beijo regado a luxúria, ao
qual cedi, porque meu corpo traiu minha consciência e eu simplesmente não
tinha forças para pará-lo.
Mãos grandes e fortes tocaram meus seios pela primeira vez em
meses, e foi como se um choque poderoso tivesse percorrido toda a minha
espinha e se concentrasse entre as minhas pernas. Um segundo depois,
Rodrigo me prensava contra o colchão macio, no meio das minhas coxas,
pressionando a ereção nada sutil contra mim.
Eu me senti sexy e poderosa outra vez, meus quadris se movendo
sutilmente em direção ao contato, querendo mais dele. Rodrigo deixou
minha boca por um instante para que pudéssemos respirar, a sua traçando
uma trilha de beijos até o decote do meu vestido florido, enterrando o rosto
ali apenas para afastar o tecido logo depois e capturar um de meus mamilos
com a boca.
Minhas costas se arquearam em resposta, e eu agarrei os lençóis sob
mim com tanta força que tive certeza de que os nós dos meus dedos
estavam brancos.
— Rodrigo… — murmurei, perdida nas sensações, minha voz saindo
rouca demais até mesmo para os meus próprios ouvidos.
Em resposta, ele sugou meu seio com mais força, até ele sair de sua
boca com um estalo, selando meus lábios com os seus demoradamente.
— Estou aqui — sussurrou de volta para mim, as mãos encontrando o
caminho sob meu vestido, levantando-o até a altura do meu estômago. — E
estou morrendo de vontade de devorar você — emendou, fazendo meu
sangue borbulhar nas veias e uma onda de prazer percorrer todo o meu
corpo.
Sua boca voltou para a minha, e minhas mãos afoitas buscaram os
botões de sua camisa azul-marinho, arrancando alguns deles na tentativa de
retirá-los de suas respectivas casas.
— Desculpe — soltei em um suspiro, tentando controlar minha
respiração descompassada e minha ansiedade.
Em resposta, Rodrigo se ajoelhou da cama, livrando-se da camisa
arruinada, as mãos passando por minhas coxas e me fazendo engolir em
seco em pura expectativa.
— Nunca mais volte a me pedir desculpas, entendeu? — questionou,
levando as mãos até as laterais da minha calcinha e forçando o tecido para
baixo.
Minha respiração ficou presa na garganta, ainda assim, ergui os
quadris, facilitando o movimento e assistindo ao olhar de Rodrigo escurecer
na expressão que, eu sabia, significava desejo.
— Meu corpo não é mais como você se lembra dele — eu me peguei
dizendo, ainda que tenha ficado mortificada depois e corado desde a base
do pescoço até a raiz dos cabelos.
Então o sorriso matador de Rodrigo tomou seus lábios, e meu senti
derreter um pouco mais sobre os lençóis de seda.
— Preciso concordar — ele respondeu, e eu me recriminei por ter
sentido uma pontada no peito que tinha gosto de decepção. — Seu corpo
parece bem mais apetitoso do que era — emendou, e, sem aviso prévio,
caiu de boca em minhas dobras molhadas, fazendo minhas costas formarem
um arco perfeito ao passo que um gemido de puro prazer irrompia pelos
meus lábios. — Gostosa — Rodrigo chiou com a boca ainda perdida na
minha intimidade, a língua hábil golpeando meu clitóris e me lambendo
como se eu fosse a coisa mais deliciosa de todo o mundo.
E era como eu me sentia.
A excitação cresceu dentro de mim, acumulando-se em meu baixo-
ventre e fazendo minhas coxas tremerem ao redor do rosto de Rodrigo.
Enfiei minhas mãos em seus cabelos macios, não querendo que ele saísse
dali. Mas, se seu empenho fosse algum indicativo, ele não parecia disposto
a abandonar minha intimidade, que implorava por novas arremetidas de sua
língua.
Então, quando a mistura de boca me consumindo e mãos percorrendo
cada recôndito do meu corpo se tornou demais, eu explodi em um orgasmo
alucinante, sentindo meus músculos internos tremendo em pura emoção e o
coração a ponto de sair pela boca. Era como se eu tivesse saído de órbita, e
a sensação não podia ser mais prazerosa.
— Céus, como você é linda — Rodrigo soltou com a respiração
descompassada, e, por mais que eu quisesse fechar os olhos e apreciar o
momento, eu não queria perder um único segundo de sua performance
enquanto ele ficava nu para mim.
Por isso assisti, ansiosa, a ele desabotoar sua calça jeans, livrando-se
da peça apenas para dar ao meu vestido o mesmo destino, logo em seguida.
Estendi minhas mãos para tocar os músculos de seu abdômen, sentindo os
gominhos sob as pontas dos dedos, mal acreditando que aquele homem
delicioso queria estar comigo e era capaz de me fazer sentir a mulher mais
sexy do mundo.
— Me beija — pedi em um sussurro débil, e ele sorriu para mim,
inclinando-se para que seu rosto pairasse logo acima do meu.
— Espero que não se importe, mas eu pretendo fazer bem mais que
apenas beijar. — Então me lançou uma piscadela, seus lábios tomando os
meus para si e me embalando em um beijo arrebatado de tesão, um segundo
antes de eu sentir sua glande deslizando por entre minhas dobras. — Eu vou
foder você e te fazer minha de novo. O que acha disso?
Fabuloso, concluí em pensamento, me sentindo duplamente possuída
quando fui beijada e penetrada ao mesmo tempo, minhas paredes se
alargando para receber Rodrigo em seu interior, os músculos pulsando ao
redor dele com o contato delicioso do qual eu sentira tanta falta.
Aquele homem seria minha perdição.
Capítulo 20

Eu me esgueirei para fora da cama de Rodrigo no meio da


madrugada.
Na minha cabeça, eu disse a mim mesma que era por Maria Elisa e
porque eu tinha que cuidar dela, mas no fundo eu sabia que aquela era
minha tentativa de evitar a conversa que nós precisaríamos ter sobre o que
havíamos acabado de fazer.
Ele me pedira em casamento, pelo amor de Deus! E talvez minhas
intenções tivessem dado a entender que eu aceitara o pedido, quando aquilo
não podia estar mais longe da verdade.
Sim, aquela noite provara que Rodrigo me queria, mas por quanto
tempo? Ele não me amava, não estava apaixonado… e era disso que eu
precisava me lembrar, não de seus beijos avassaladores e do modo como ele
me fazia sentir uma mulher linda e desejada.
Lancei uma olhadela em sua direção, ressonando tranquilamente na
cama, e fui pé ante pé para fora dali, tentando, sem sucesso, colocar os
pensamentos no lugar durante o trajeto de volta para casa.
Quando cheguei, o ambiente já estava escuro, dando a entender que
todas as outras Marias já estavam dormindo. Soltei um suspiro de alívio,
porque pelo menos eu não precisaria explicar a ninguém, naquele momento,
porque demorei tanto na casa de Rodrigo. O combinado era que fosse
apenas um jantar, no entanto, meu estômago estava roncando de fome, já
que eu fui o prato principal.
Um sorriso involuntário moldou os meus lábios com a lembrança, e
eu me repreendi quase instantaneamente pelo ato, fazendo meu caminho
escadas acima e indo até o quartinho de Maria Elisa, para dar um beijinho
em sua bochechinha gorda antes de enfim ir dormir.
Eu só não esperava encontrar mamãe de plantão, embalando minha
filha nos braços sob a luz do abajur de unicórnio que tinha sido um presente
de Maria Vitória.
Senti o coração quase sair pela boca, vergonha tingindo minha pele
desde a base do pescoço até a raiz dos meus cabelos, e engoli em seco,
como uma adolescente rebelde sendo pega fazendo algo errado.
— Como foi o jantar? — mamãe perguntou baixinho, seu corpo
balançando levemente de um lado para o outro com Maria Elisa nos braços.
— Foi bom — eu me limitei a dizer, mas então o ronco alto do meu
estômago faminto rompeu o silêncio, e meus olhos se arregalaram ante a
surpresa. — Acho que comi menos do que deveria — emendei quando
mamãe ergueu uma de suas sobrancelhas em minha direção, ironicamente.
— Sei… — respondeu, depositando um beijo no topo da cabeça da
neta. — Tem um sanduíche natural pronto na geladeira, caso você esteja
com muita fome.
— Não, está tudo bem. — Eu me aproximei, levando minha mão para
tocar o pijama cor-de-rosa da minha filha. — Ela deu muito trabalho?
Mamãe balançou uma das mãos no ar, fazendo pouco caso e
aninhando Maria Elisa ainda mais em seu abraço.
— Maria Elisa é boazinha sem limites. Uma verdadeira princesa da
vovó — murmurou, beijando a orelhinha da minha filha e me fazendo rir.
Eu me inclinei, afundando meu nariz em suas costas e sentindo o
cheiro de bebê intrínseco ao meu tesourinho, o melhor de todo o mundo.
— Obrigada por ter cuidado da minha mini Maria pra mim hoje.
— Você sabe que estou disponível sempre que precisar — devolveu, e
assenti com um sorriso. — Por falar nisso, sabe quando vai ser o próximo
convite pra… uhm… — Ela hesitou, como se estivesse buscando a palavra.
— … jantar? — decidiu.
Engoli a saliva com dificuldade, desconfortável sob seu escrutínio,
balançando a cabeça de um lado para o outro, quase envergonhada.
— Acho que não vamos mais fazer isso. — Não quando eu sabia que
as intenções de Rodrigo eram outras, pelo menos.
Nós havíamos desenvolvido uma boa relação, nos últimos dias, e
mesmo ele tendo se mostrado galante, eu sabia que no fundo aquilo era
parte de sua personalidade, em especial pelo modo como ele tratava minha
mãe, irmãs e sobrinha.
Mas eu precisava preservar meu coração, porque agora ele pertencia a
Maria Elisa. Era diferente de quando me envolvi com Rodrigo pela primeira
vez, ciente de que teríamos apenas um caso. Eu queria curtir, viver o
momento e guardar todas as lembranças bonitas que pudesse armazenar.
Agora, contudo, tínhamos um bebê para criar, e eu já tinha me
apaixonado por Rodrigo uma vez para saber qual devastadora sua ausência
poderia ser, eu não me colocaria naquela situação de novo.
— Rodrigo tem se mostrado um excelente pai — opinou, terminando
de ninar Maria Elisa e depositando-a com cuidado no berço. — Eu sinto
muito por ter me metido na história de vocês e ter causado tanta confusão.
Ele parece um bom homem.
— Sim — concordei. — Ele é. — Estreitei os olhos em sua direção.
— Falando assim, a senhora até parece gostar dele. Quando exatamente isso
aconteceu?
— Digamos que ele cresceu muito no meu conceito desde que vi sua
postura como pai. — Deu de ombros, como se não fosse nada de mais. —
Apesar de parecer que esse não é o único posto que ele deseja ocupar.
— Como assim? O que quer dizer? — perguntei com certa ansiedade
na voz, dando um passo involuntário em sua direção.
— O jeito como ela olha pra você e arruma qualquer desculpa pra te
tocar é diferente. Ou vai me dizer que nunca percebeu?
Abri a boca para protestar, mas mamãe foi mais rápida.
— Só estou dizendo que parece ter alguma coisa ali, mas longe de
mim me meter de novo na história de vocês dois, porque da última vez fiz
uma bela bagunça.
Então ela beijou meus cabelos, seu polegar acariciando minha
bochecha enquanto ela me encarava daquele jeito amoroso que só dona
Maria do Rosário era capaz de fazer.
— Eu te amo, filha. Só quero que você seja feliz.
Ela beijou meu rosto, afastando-se rumo à porta e me deixando
sozinha com a bagunça de sentimentos que eu trazia no peito.
Capítulo 21

Se ter saído mais cedo de uma reunião só para encontrar as duas


mulheres da minha vida em um passeio pela orla da praia com Maurício não
era traição, eu não sabia o que mais poderia ser.
Eram os nossos passeios pela orla. Era a hora de Maria Elisa
aproveitar o sol do fim de tarde e de Maria Clara ficar ainda mais
irresistível com os raios do pôr do sol tocando sua pele macia e convidativa.
Mas, ao contrário de ser eu, ao lado dela, aproveitando e memorizando cada
segundo, ali estava Maurício.
Querendo o meu lugar de direito.
Contive a raiva e a vontade intempestiva de ir até eles e acabar com o
momento, como o perfeito homem das cavernas. Eles não estavam de todo
sozinhos, já que ao longe Maria Vitória corria pela areia, contudo, ela não
era exatamente garantia de manter Maurício afastado da minha mulher e da
minha filha.
Cerrei os pulsos, assistindo quando Maria Clara entregou Maria Elisa
para ele, minha pequena bebê sorrindo de orelha a orelha, mostrando as
gengivas lindas que deveriam ser guardadas para mim, mesmo que
Maurício a segurasse da forma mais desengonçada possível.
Dei um passo até eles, querendo consertar Maria Elisa e me assegurar
de que o modo sem jeito com que Maurício a segurava não machucaria
minha filha. Mas ela estava feliz, seus olhos, os meus olhos, brilhando para
Maurício. Eu mal podia acreditar em tamanha traição.
Voltei minha atenção para Maria Clara, que também exibia um dos
seus sorrisos deslumbrantes.
Ela escolhera estar ali, com Maurício.
E pela primeira vez eu me perguntei o quanto aquele homem
influenciava na sua decisão de dizer não ao meu pedido de casamento. O
quanto ele influenciava no fato de que, depois da nossa noite de paixão
tórrida, Maria Clara fugia dos meus toques como se eu fosse o próprio
demônio.
Apertei os olhos, ignorando o incômodo no meio do meu peito. E
então dei meia volta para o duplex, um sentimento que eu não soube
nomear queimando pelas minhas veias.

Maria Clara chegou com Maria Elisa depois das sete horas da noite.
Eu nem precisei olhar duas vezes para saber que a minha garotinha estava
desmaiada em seus braços. Eu estendi minhas mãos mesmo assim, e Maria
Clara me passou nossa filha com cuidado.
Eu suspirei quando senti seu peso característico, sua respiração
compassada saindo pelo pequeno narizinho, o calor do corpo dela
aquietando o meu coração só um pouco. Quase me fazendo sorrir, como só
a dona do meu coração podia.
— Tive que passar em casa e não consegui deixar o banho para você
— Maria Clara esclareceu, e foi o suficiente para que eu colocasse aquilo
na conta do passeio da praia com Maurício. — Maria Elisa estava prestes a
cair no sonho.
— É claro que estava — retruquei, inamistoso, enquanto me dirigia
ao berço do meu tesourinho. — É o que acontece quando ela tem um dia
agitado.
Eu queria ignorar Maria Clara, porque foi ela quem aceitou aquele
passeio na praia, mas aquela mulher era minha ruína e meus olhos traidores
nunca conseguiam se manter longe dela. Arrisquei observá-la, só para
encontrar suas sobrancelhas levemente franzidas.
— Como sabe que o dia dela foi agitado? — ela perguntou, parecendo
genuinamente confusa e curiosa. Por mais que a expressão a deixasse mais
linda, a confissão indireta de que Maurício monopolizara o tempo, a energia
e atenção delas, me deixou ainda mais puto. — Rodrigo — ela me chamou
outra vez, me trazendo de volta para a realidade. — Como sabe que...
— Terminei a reunião mais cedo — esclareci, a interrompendo —, fui
até a sua casa, mas vocês já tinham saído para a praia.
Com a porra do Maurício!
Maria Clara sorriu, é claro que sorriria, alheia a como eu estava
prestes a explodir.
— E por que você não foi até lá?
Por que eu não fui até lá?… Ela queria um passeio com Maurício,
Maria Elisa e eu?
— Porque vocês estavam muito ocupadas com Maurício — devolvi,
inamistoso, em um sussurro mal contido para não perturbar o sono de Maria
Elisa. — Apesar de ele nem sequer saber como se carrega a minha filha
direito.
Maria Clara girou os olhos e, com cuidado, eu coloquei Maria Elisa
em seu berço, me assegurando de cobri-la com a manta vermelha.
— Rodrigo...
Suspirei, impaciente, acariciando a testinha da minha filha e deixando
o quarto à meia-luz.
Balancei a cabeça em direção ao corredor e Maria Clara me seguiu.
— Ele é desengonçado com ela — apontei o óbvio, todo o meu corpo
se virando para Maria Clara. — Não é possível que você não consiga ver
que ele não tem jeito nenhum para carregar um bebê.
Eu esperava uma risadinha de confirmação, ou mesmo um balançar
de cabeça que me indicasse que ela percebera e concordava comigo. Não
foi o que eu ganhei, no entanto. No lugar disso, Maria Clara cruzou os
braços na frente do corpo, a expressão de confusão se acentuando em sua
testa.
— Você está muito estranho.
Não, eu só estava fervendo de ódio.
— É por causa dele, não é, Maria Clara? — eu me vi dizendo, antes
que pudesse me controlar.
— Por causa dele o quê? — ela perguntou, um tom de cautela
pintando a confusão na sua voz, o suficiente para que eu ficasse ainda mais
fora de mim.
— É por causa dele que você disse não ao meu pedido de casamento!
— esbravejei, balançando a cabeça, aturdido com o sentido repentino que
aquela conclusão trazia. Aterrorizado com aquela possibilidade.
Os olhos de Maria Clara se arregalaram.
— Rodrigo, pelo amor de Deus, a gente já conversou sobre isso…
É claro que ela tentaria contornar as coisas, e a verdade é que eu mal
a escutava já que uma possibilidade terrível passou pela minha cabeça.
— Vocês tiveram alguma coisa? — interrompi.
Toda a expressão calma de Maria Clara se transformou em uma
máscara de incredulidade, eu até mesmo pude ouvir a respiração saindo em
um jato pelo seu nariz.
— Claro, eu tive muito tempo enquanto desfilava por aí, grávida de
você.
Eu grunhi. Não precisava de ironias disfarçadas de uma boa resposta.
Eu precisava escutar com todas as letras, como ela não entendia isso?
— Mas você quer? Quer pensar em dar a ele alguma chance e por
isso...
Maria Clara ergueu a mão, dando vários passos para perto de mim, os
olhos chocolates lindos e consternados. Deveria ser proibido por lei alguém
ser tão bonita em qualquer situação como ela era.
Inferno, ela era a mulher mais bonita de todo o mundo.
— É melhor parar — avisou, me deixando atordoado por um
momento. — A última vez que você insinuou algo parecido, nós ficamos
meses sem nos vermos e você quase perdeu o nascimento de Maria Elisa.
Só a perspectiva de eu perder as duas de novo acabava comigo. Mas
será que Maria Clara não conseguia ver? Seria que não conseguia entender
o que é que eu estava dizendo?
— Ele gosta de você! — esbravejei. — Vai mentir para mim que não
consegue enxergar isso?
Maria Clara soltou um riso incrédulo.
— E daí? Você está com ciúmes, por acaso? — ela provocou.
— Sim — respondi sem pensar, no automático.
O silêncio perdurou por vários segundos entre nós dois, enquanto
meus olhos se embebiam dos dela e mil coisas pareciam passar por aquela
cabecinha teimosa. Dentro de mim, a fúria incontida pareceu finalmente ter
encontrado vazão.
Eu estava com ciúmes dela.
Era óbvio, claro como água, e apesar da minha racionalidade como
homem de negócios me fazer querer passar por cima de determinados
sentimentos, a lógica da situação não me permitia ignorar o que claramente
acontecia.
— Sim? — ela testou, e eu não vacilei. — Você não precisa ter
ciúmes de Maria Elisa.
Eu soltei um bufar incrédulo.
— Não estou falando de Maria Elisa, apesar de que sim, ela se
mostrou uma bebê sorridente sem um pingo de consideração pelo coração
do pai dela.
As duas seriam minha ruína. Tal mãe, tal filha.
— Rodrigo... — Maria Clara começou um protesto.
— Eu estou com ciúmes de você — eu a interrompi, me recusando a
amainar a situação. — É o que você quer ouvir?
Ela balançou a cabeça incontáveis vezes.
— Você não pode estar falando sério.
Ah, mas eu estava. Acho que eu nunca tinha falado tão sério em toda
a minha vida.
Dei um passo em direção a Maria Clara.
— Você foi minha desde o momento em que te encontrei agachada no
meio do meu quarto — afirmei, minha voz firme e clara alcançando o
caminho até ela.
Maria Clara recuou um passo e eu dei outro.
— Eu não fui sua, a gente se separou por meses.
Suas costas alcançaram a parede e eu sorri, chegando mais perto dela
como se não sentisse pressa alguma, quando na verdade meu coração batia
descompassado dentro do peito, correndo atrás dos passos que eu ainda iria
dar.
— E esse tempo não foi o bastante para que você deixasse de ser
minha. Eu não tenho o direito de exigir que você sinta a mesma coisa,
Maria Clara, mas você é minha. Sempre vai ser. E eu jamais poderia
simplesmente aceitar te ver nos braços de outro homem.
Eu a alcancei, nossos olhos presos na nossa conexão única e incrível.
Minhas mãos subiram pelos seus braços, roçando sua pele macia.
Maria Clara engoliu em seco.
— Eu não estou nos braços de outro homem…
Eu sorri, o som das palavras trazendo um prazer quase sexual para
mim. Contudo, esse não era o ponto.
— Mas se recusa a cair nos meus, foge dos meus toques, diz não ao
meu pedido de casamento... Eu jamais te forçaria a admitir que é minha,
Maria Clara, mas estaria mentindo se dissesse que não fico louco por ter tão
pouco controle da situação.
Os olhos chocolate vislumbraram a minha boca, e meus lábios
coçaram pelos dela.
— Você não precisa ter o controle sobre tudo — ela sussurrou, a voz
baixa, sem a intenção de ser sedutora, mas que tinha todo o poder de
acordar a minha cabeça de baixo.
— Eu nunca tive controle com você — confessei.
E então nossos lábios se encontraram.
Sorvi daquela boca gostosa, minha língua sugando a dela.
Minha. Minha. Minha.
Agarrei os quadris de Maria Clara, enquanto forçava a pélvis contra a
barriga dela, o calor e o toque daquela mulher me fazendo soltar um gemido
de satisfação só de imaginar suas dobras macias apertando o meu pau.
Queria foder, sim. Mas sobretudo reivindicá-la para mim.
Minha por direito, como deveria ter sido desde sempre.
Contudo, o choro alto de Maria Elisa, reverberando pelo corredor,
quebrou nosso momento. Nossas bocas se separaram, as testas se
encontrando, as respirações sôfregas e desesperadas.
— Essa conversa não acabou, Maria Clara.
Capítulo 22

— Você prometeu que não iria atrás de Maria Clara assim que
chegássemos à Ilha do Sol, e olha só tudo o que aconteceu — Omar me
lembrou já de volta em casa, depois de ter partido da ilha há várias
semanas, uma vez que havíamos resolvido as pendências para a construção
do novo hotel.
— Eu não esperava encontrá-la grávida de um bebê meu — apontei, o
que para mim era o óbvio.
Por acaso ele esperava que eu só desses as costas a Maria Clara e à
minha filha e voltasse a ser um homem cem por cento movido por
negócios?
— Entendo seu posicionamento, mas não há muito que possamos
fazer. Você precisa voltar pra casa, pra empresa. Seu período de férias
acabou.
— Não estou tirando férias, e sim uma licença paternidade —
protestei. — Minha filha precisa de mim durante esse tempo.
Claro que ela precisava. Se eu não estivesse por perto, nos braços de
quem ela tiraria seu cochilo da tarde? Quem ajudaria Maria Clara com as
trocas de fraldas e buscaria Maria Elisa para que pudesse ser amamentada,
no meio da noite?
Não vinha sendo um período fácil, longe disso, cuidar de um bebê se
mostrara bem mais difícil do que administrar meus negócios e, ainda assim,
um milhão de vezes mais prazeroso e satisfatório, em especial quando o
sorriso banguela da minha filha se abria para mim e ela segurava meu dedo
indicador com sua mãozinha fechada.
Tão pequena e preciosa. Nosso tesourinho, como Maria Clara gostava
de chamá-la, e não poderia estar mais certa na descrição.
— Sua filha tem um time de Marias pra cuidar dela — Omar apontou,
e eu trinquei o maxilar do ouro lado da linha de forma automática.
— Mas eu sou indispensável — retruquei, frisando a palavra para que
ele entendesse. — Não é como nos negócios, que qualquer um com
competência pode assumir o meu lugar. Maria Elisa tem um único pai, e,
para a minha sorte, esse homem sou eu.
— Sinto muito que o conselho pense de uma forma diferente — Omar
devolveu em tom conciliatório —, mas você precisa voltar para analisar os
projetos que temos em São Paulo. Você pode resolver tudo em poucos dias
e então voltar para Ilha do Sol, se for o que deseja, mas não seja
intransigente.
Eu odiava admitir, mas Omar tinha razão, o que significava que eu
precisaria me ausentar de Ilha do Sol e deixar Maria Clara suscetível às
investidas de Maurício, que não era capaz de disfarçar o desejo que sentia
por minha mulher. Como se não bastasse, pegava minha filha nos braços da
forma mais desajeitada possível e ficava arrancando risadinhas dela que não
eram nem de longe tão lindas quanto as que ela destinava a mim.
Como eu poderia viajar tranquilo quando um abutre só estava
esperando que eu saísse para tentar se apossar da minha família?

Peguei minha filha no colo, enterrando minhas narinas em seu


pescocinho para sentir o cheiro de bebê que tinha o poder de me acalmar e
me fazer pensar que eu conseguiria fazer até mesmo o impossível.
Ela era tão pequenininha, cheirosa, macia, delicada… e minha. Minha
filha. Para amar, cuidar e proteger. E como eu a amava, de um modo que
jamais pensei que fosse ser possível.
Eu não tinha o melhor relacionamento com a minha família, e jamais
sonhei em formar a minha própria, mas segurar Maria Elisa no colo me
dava a sensação de que nenhuma outra conquista jamais se equipararia a ser
pai daquela preciosidade que detinha em suas mãozinhas todo o meu amor e
devoção.
— Eu vou morrer de saudade de você em cada minuto que estiver
fora, o papai promete — sussurrei para ela, pegando a mãozinha que
segurava meu indicador e levando-a aos lábios para depositar um beijo ali.
— Você é o que tenho de mais importante na vida, isso nunca vai mudar.
Um pigarro vindo da porta chamou minha atenção, e eu me virei para
ver Maria Clara, com algumas roupinhas de bebê recém-lavadas nos braços
e em um dos ombros.
— Estou interrompendo alguma coisa? — ela gracejou, mas algo na
minha expressão fez com que a dela se tornasse séria. — Algum problema?
Neguei com um meneio de cabeça, ainda que para mim aquilo não
estivesse mais longe da verdade. Eu estava prestes a ficar dias sem sentir o
cheirinho da minha filha, seu peso entre meus braços e a sensação de prazer
e orgulho que me enchia o peito sempre que eu via aquele rostinho redondo
e lindo.
— Nós precisamos conversar — eu disse a Maria Clara, e ela
concordou com um aceno de cabeça. — Omar me ligou, estão precisando
de mim em São Paulo, pelo menos por algumas semanas. Vou ter que voltar.
— Oh… — foi sua resposta surpresa, um segundo antes de ela pegar
as roupinhas que trazia de Maria Elisa e colocá-las sobre a cômoda branca
com detalhes em cor-de-rosa da nossa filha. — E quando você vai?
— Em dois dias — exalei, sem conseguir acreditar que em tão pouco
tempo eu estaria longe da Ilha do Sol e de todas as coisas boas que aquele
lugar me fazia sentir. — Venha comigo — pedi, pegando a nós dois de
surpresa, e os olhos de chocolate de Maria Clara se arregalaram enquanto
ela me encarava, boquiaberta.
— Ir com você? — ecoou, parecendo de fato considerar a
possibilidade. No entanto, um raio de praticidade pareceu recair sobre ela
outra vez, levando-a a sacudir a cabeça de um lado para o outro, sorrindo
como se eu tivesse perdido a razão. — Não posso fazer isso, não seja bobo.
— Por que não? — eu quis saber. — Você ainda não voltou a
trabalhar, então não tem nenhum compromisso inadiável pelo qual não
possa deixar a ilha, certo?
— Minha irmã e minha mãe estão aqui — ela me lembrou. — Minha
rede de apoio. Não posso simplesmente…
— Eu sou sua rede apoio — fiz questão de lembrá-la, e Maria Clara
assentiu com uma expressão condescendente no rosto.
— Claro que é — confirmou. — Mas vai estar atolado demais em
trabalho pra ter tempo pra qualquer outra coisa. Além do mais, não é como
se você estivesse indo embora pra sempre… é? — testou, com uma
pontinha de medo na voz que reverberou dentro do meu peito.
Ela não queria que eu fosse, era isso? Sentiria minha falta?
— Eu vou voltar. — Ela respirou, aliviada, abrindo um de seus
sorrisos lindos para mim. — Mas, de qualquer modo, não tenho certeza de
quanto tempo isso vai levar e não quero ficar longe de Maria Elisa ou de
você.
Ela engoliu em seco, os dedos remexendo-se nervosamente uns contra
os outros.
— Mesmo que eu pudesse ir agora — considerou —, não é um
arranjo que vá durar, porque logo eu começo a trabalhar, e então… — Ela
deu de ombros, sem se preocupar em terminar a frase.
Ela não precisava.
O que Maria Clara estava tentando dizer é que aqueles momentos
durante o puerpério eram roubados e não configurariam nossa realidade no
dia a dia, certo?
Uma vez que a vida real batesse à nossa porta, nossos dias dedicados
apenas a Maria Elisa chegariam ao fim.
Havia, contudo, uma forma de fazer a magia durar, mas Maria Clara
parecia cada dia mais longe de aceitar minha proposta de casamento, e eu,
cada vez mais frustrado.
Mesmo tendo se rendido a mim há algumas semanas, ela foi minha
por apenas uma noite e então se esgueirou para longe de mim enquanto eu
dormia, recusando meus beijos e carícias desde então. Exceto pelo beijo
roubado que tivemos quando eu assumi que estava morrendo de ciúmes,
mas que só serviu para que Maria Clara corresse ainda mais dos meus
toques depois disso.
— As coisas não precisavam ser assim — murmurei para ela, em um
tom quase ressentido.
— Não posso me casar com você apenas porque seria mais
conveniente pra sua rotina de homem de negócios — devolveu no mesmo
tom, e eu travei o protesto a meio caminho da boca, porque não sabia muito
bem o que ele significava.
Mas não era apenas sobre minha rotina, era? Não, eu sabia que não.
Era sobre a presença de Maria Clara também, sobre tê-la por perto, onde eu
poderia tocá-la e abraçá-la livremente, fazê-la minha todas as noites.
Era sobre sermos uma família no sentido exato da palavra, porém
claro que eu não lhe diria isso, porque denotava fragilidade, e ela jamais iria
querer um homem frouxo, como sua mãe uma vez dissera que eu era.
Capítulo 23

Rodrigo tinha ido embora de Ilha do Sol há pouco mais de uma


semana e eu já sentia sua falta. Sendo sincera comigo mesma, eu já havia
começado a sentir saudades desde o dia em que soube que ele precisaria
partir.
Eu amava passar os dias em sua companhia, ver o pai maravilhoso
que ele era para Maria Elisa e poder assistir ao sorriso da minha garotinha
para o seu papai babão.
Todas essas coisas eram apenas memórias, agora, e eu me embalava
em um choro baixo todas as noites, antes de dormir, que se o gesto tolo
fosse capaz de suprir a falta que Rodrigo me fazia. Mais do que da sua
ajuda no meio da noite para pegar Maria Elisa em seu berço e trazê-la para
mamar, eu sentia saudade de seus dedos longos colocando uma mecha do
meu cabelo atrás da minha orelha, de seus trocadilhos que me faziam rir e
do modo como seus gestos pareciam aquecer meu coração.
— Sem algodão doce hoje, pestinha, ainda é sexta-feira — eu disse a
Maria Vitória assim que ela abriu a boca para formular o pedido.
Nós estávamos em um de nossos passeios na orla, com Zeus como
companhia e Maria Elisa, alegremente brincando com seu ursinho de
pelúcia no carrinho.
Minha sobrinha fechou a cara, cruzando os braços sobre o peito em
sua melhor expressão contrariada.
— Mas, tia, sexta-feira é quase sábado! Só por causa de um diazinho?
— protestou, enumerando o tempo que dissera com um dos dedos, e eu
rolei os olhos para ela.
— Sem me fazer chantagem, hein, mocinha? — Eu tinha que ser
firme. Afinal de contas, agora eu tinha um ser humano para criar também, e
se quisesse que Maria Alice não mimasse minha filha além da conta, eu
precisava puxar as rédeas da dela de vez em quando também.
— Em minha defesa, eu não sabia que as regras vinham sendo
tratadas de forma tão ferrenha por aqui — Maurício atalhou, surgindo com
um algodão doce azul em uma das mãos, que eu sabia que ele tinha trazido
para Maria Vitória.
Minha sobrinha arregalou os olhos azuis idênticos aos da minha irmã
mais velha, praticamente quicando no lugar de tanta felicidade.
— Ai, tia, não faz maldade comigo — ela implorou, juntando as mãos
em frente ao corpo em forma de prece, e eu não poderia negar seu pedido
sem parecer uma vilã digna de novela mexicana.
— Só dessa vez — eu me decidi, e Maurício lhe estendeu o algodão
doce, por fim.
— Eu te amo — Maria Vitória declarou, depositando um beijo
estalado na minha bochecha antes de sair saltitando com Zeus rumo à areia
fofinha.
Como eu iria manter os níveis de açúcar daquela pestinha em
equilíbrio quando ela fazia aquele tipo de coisa comigo?
— Desculpe pelo algodão doce, vi vocês de longe e não resisti —
Maurício murmurou assim que ficamos a sós, apontando com a cabeça para
o carrinho de Maria Elisa. — Posso?
Aquiesci brevemente, mordendo o lábio quando ele mergulhou os
braços no carrinho para pegar o meu tesourinho no colo. Rodrigo tinha
razão ao dizer que Maurício parecia meio desengonçado no manejo com
bebês, porque algo no modo como ele segurava Maria Elisa no colo não
parecia certo.
Ou talvez fosse só minha mente me pregando peças, me fazendo
comparar Rodrigo e Maurício de um modo que não fazia o menor sentido,
porque não se tratava de uma competição, apesar de Rodrigo às vezes se
comportar como um moleque de cinco anos quando meu amigo estava por
perto. Era até cômico vê-lo agir todo ciumento e territorial, como se fosse o
dono de todos os sorrisos da nossa bebê e não estivesse disposto a dividi-los
com ninguém.
Deus, como eu sentia falta daquele homem!
— Pensamento longe, Maria Clara? — Maurício perguntou, quando
eu não disse nada, me arrancando do meu devaneio.
— Não é nada importante — menti. — Só pensando na bronca que
vou levar da Maria Alice quando ela descobrir que deixei a filha dela ligada
no duzentos e vinte com açúcar.
Ele riu, e imitei o gesto, relaxando os ombros instantaneamente.
— Senti falta dos nossos passeios, sabia? No caso, de ficar sentado
aqui com você vendo a pestinha brincar com Zeus.
Não deveria, mas culpa me abateu, porque, se eu fosse ser sincera, eu
não sentira falta daquilo.
Meus passeios pela orla ainda eram frequentes, apesar de eu ter
ajustado o horário para que Maria Elisa pudesse tomar banho de sol. Em
todos eles, eu tinha a presença de Rodrigo, que sempre agia como um pai
orgulhoso ao guiar nossa princesa junto comigo por aí.
Aqueles se tornaram nossos momentos, e deles sim eu sentia falta.
Isso podia fazer de mim uma péssima amiga, eu sabia, mas eu não podia
mudar meus sentimentos à força.
— Achei que você estivesse ocupado demais pra passeios na orla —
desconversei, da forma mais educada que pude.
— Era você quem parecia ocupada demais — rebateu — com o pai da
sua filha sempre planando ao seu redor como se não quisesse deixar que
ninguém se aproximasse. — Maurício hesitou, os olhos brilhando em minha
direção conforme ele balançava Maria Elisa levemente no colo. — Acha
que ele se sentia intimidado por mim?
Engasguei com a própria saliva, tendo uma crise de tosse que fez com
que Maurício desses leves tapas nas minhas costas, na tentativa de me
ajudar a me recuperar.
— Claro que não! — praticamente berrei segundos depois, sacudindo
furiosamente de um lado para o outro como se isso fosse capaz de fazer
Maurício enxergar o absurdo que acabara de dizer. — De onde tirou isso?
Ele deu de ombros, os lábios tocando o topo da cabeça de Maria Elisa
em um gesto carinhoso.
— Um cara pode sonhar, não? — brincou, e uni minhas sobrancelhas,
sem entender.
— Sonhar com o quê? — instiguei.
— Com você — ele disse simplesmente, e eu quase fui acometida por
uma nova crise de tosse.
Eu parecia estar demonstrando sintomas alérgicos àquela conversa.
— Maurício…
— Eu sei que demorei tempo demais pra falar alguma coisa — ele me
cortou. — Mas nunca parecia o momento certo. Então, de uma hora pra
outra, o pai da Maria Elisa chegou e eu jurei que qualquer chance que eu
tinha havia acabado. Mas com ele fora de cena…
— Ele não está fora de cena — atalhei, sem nem mesmo me dar conta
do que dissera. — Quer dizer… — Hesitei, à procura de palavras mais
assertivas, mas nada pareceu bom o bastante.
— Não acha que, se ele tivesse reais intenções com você, estaria aqui,
agora? — Maurício perguntou, com expressão carrancuda, soando quase
malvado ao fazê-lo.
No mesmo instante, me senti idiota por um dia ter cogitado que ficar
com ele era uma opção. Carente e desesperada, vi em Maurício uma tábua
de salvação que parecia fácil demais para que eu pudesse resistir, mas por
sorte havia resquícios o suficiente de bom senso em mim para me impedir
de cometer tamanha loucura.
— Não sei o que você espera que eu diga — confessei entre dentes
trincados, e ele abriu um sorriso, desfazendo a expressão mal-humorada.
— Não precisa me dizer nada agora, só pense nisso, okay? Não é
segredo que eu sou louco por você, Rodrigo não é sua única opção e você
não deve ficar com ele só porque têm uma filha juntos.
Maurício tinha razão, naquele ponto. Maria Elisa não deveria ser o
motivo de Rodrigo e eu ficarmos juntos.
Em contrapartida, eu conseguia pensar em mil razões pelas quais ele
parecia ser o homem certo para mim e, sobretudo, o único que eu desejava e
ao qual eu gostaria de pertencer.
Capítulo 24

Eu estava longe de Ilha do Sol há pouco mais de três semanas,


comparecendo a mais reuniões do que poderia contar e me sentindo um
animal enjaulado.
Os dias longe de Maria Clara e Maria Elisa vinham se provando um
verdadeiro martírio, e eu precisava me lembrar a todo momento de que o
trabalho era importante e eu precisava me manter firme no que estava
fazendo.
Em um intervalo e outro, peguei meu celular no bolso, indo direto
para minha conversa com Maria Clara e vendo a última foto que ela havia
me mandado da nossa filha.
Na imagem, ela usava um macacão amarelo, sapatinhos e laço
combinando, além de um sorriso que fazia meu coração derreter um pouco
mais a cada segundo.
Depois de passar longos minutos preso àquela imagem e com um
sorriso no rosto, abri a foto de perfil de Maria Clara, dando zoom para
admirar melhor seu rosto bonito e o sorriso amplo para a câmera.
Santo Deus, como eu sentia falta dela! Como queria beijá —la e
abraçá —la depois de um dia repleto de reuniões exaustivas e ouvi-la contar
sobre o seu dia.
Desde que ficamos juntos no meu apartamento alugado em Ilha do
Sol, eu não havia dormido com mais ninguém, e a falta de sexo estava
quase me fazendo subir pelas paredes. Mas eu não queria outra mulher que
não fosse Maria Clara.
A ideia de outra boca, outro corpo… nada me atraía. Tudo em que eu
conseguia pensar era nas curvas exuberantes e no beijo gostoso da mãe da
minha filha.
Uma batida na porta, no entanto, me arrancou daquela linha de
pensamento, e a cabeça de Omar apareceu através da abertura da porta da
sala do meu escritório.
— Mais uma última reunião e então você pode ir pra casa — avisou, e
eu tentei sufocar o pensamento de que eu gostaria ir correndo para os braços
de Maria Clara ao sair dali, não para o meu insípido apartamento de
solteiro.

— Senhor Marinho — Gemma, minha governanta, chamou assim que


coloquei os pés em casa. — O senhor tem visitas.
— Desmarque o que for — atalhei, mal-humorado. — Estou exausto,
não quero ver ninguém.
— Nem mesmo o seu tesourinho, papai? — a voz de Maria Clara
surgiu, a versão que ela usava para se dirigir a Maria Elisa. E uma sensação
de prazer inenarrável se apossou do meu corpo.
Elas estavam mesmo ali?
Girei meu tronco de uma vez, apenas para vislumbrar a imagem linda
de Maria Clara segurando a nossa filha, que usava um vestido de festa e
uma calcinha bordada.
Eu me precipitei até elas, agarrando as duas como podia, ainda sem
acreditar que elas estavam logo ali à minha frente, para que eu pudesse
beijar e paparicar o quanto quisesse.
— Não acredito que vocês estão mesmo aqui — confessei, tomando o
rosto de Maria Clara entre as mãos e depositando um longo beijo em seus
lábios, ao qual ela não resistiu. Em seguida, peguei Maria Elisa nos braços,
sorvendo seu cheirinho de bebê e assistindo ao seu sorriso lindo se abrir
para mim.
— Se Maomé não vai até a montanha… — Maria Clara murmurou.
— Como é possível que Maria Elisa tenha crescido tanto em apenas
algumas semanas? O que eu perdi?
— Nada — Maria Clara assegurou. — Nós estamos aqui agora pra
que as coisas continuem assim, pra que você não perca nada.
— Você é a melhor mulher do mundo, Maria Clara. Espero que saiba
disso.
— Bobagem. Eu só gostaria de descansar um pouco da viagem, pode
me mostrar o quarto onde podemos ficar?
— Mas é claro — concordei, ainda meio atordoado. — Vocês devem
estar exaustas. Descansem e nós nos vemos no jantar, está bem?
— Parece ótimo — Maria Clara aquiesceu, quando coloquei a mão na
base de sua coluna para guiá-la até o meu quarto, onde ela descansaria pelo
tempo que você.
Capítulo 25

Maria Clara e Maria Elisa estavam ali, sob o mesmo teto que eu, e era
impossível conter a emoção que começava no peito e culminava em
lágrimas nos meus olhos.
Três longas semanas se passaram, e agora meus amores estavam ali, à
distância de um simples toque. Eu era um filho da puta sortudo.
— Ei… você está chorando? — Maria Clara quis saber adentrando o
quarto que eu havia preparado para Maria Elisa. Ainda não estava todo
equipado, mas era bonito e combinava com ela.
— Claro que não. — Estalei a língua, como se a simples dúvida fosse
absurda, quando na verdade meus olhos estavam sim, marejados, de
emoções que eu não conseguia conter.
— O que houve? — Maria Clara quis saber, não tendo acreditado na
minha mentira. — Chegamos num momento ruim?
Sacudi a cabeça de um lado para o outro repetidas vezes, em negação.
— Ver Maria Elisa assim, de surpresa, depois de semanas… — Não
havia palavras no mundo capazes de descrever o que sentira. — Eu não
estava preparado pra quão mais linda e esperta ela está. E ainda tem você.
— O que tem eu? — Maria Clara perguntou, preocupada, lançando
uma olhadela para onde estava Maria Elisa, confortavelmente em seu berço.
— Senti sua falta todos os dias durante o tempo em que estivemos
longe — admiti, porque já não havia motivos plausíveis para nada a atração
sem limites que Maria Clara me fazia vivenciar. — Nós temos um elo
inquebrável. Uma cumplicidade esmagadora. Ficar longe de você foi uma
das piores partes de ter deixado Ilha do Sol, porque tudo o que eu queria era
seu abraço, sentir seu cheiro depois de um dia ruim. Me diga que sentiu o
mesmo, pelo bem da minha sanidade.
— E-u — ela gaguejou, atordoada. — É complicado.
— Não. Não é — neguei, segurando seu rosto bonito entre minhas
mãos. — Complicado é ter que aprender sobre amor depois dos trinta, como
eu tive que fazer. Sou fruto de um golpe da barriga, Maria Clara. Meu pai
sempre foi ausente e minha mãe… só queria os pagamentos gordos que
caíam em sua conta bancária. Eles nunca me ensinaram a esperar afeto de
ninguém ou mesmo como funcionava essa coisa complicada chamada amor.
Mas você nasceu em um lar amoroso. Entende mais disso do que eu, não é?
Porque você me ensinou tudo o que eu sei sobre amor, afeto e
cumplicidade.
— Rodrigo… — ela chamou, desconcertada, sem parecer certa do
que quiser;
— Consegue entender então que eu te amo? — perguntei, com todas
as letras, sem medo, para que não houvesse a menor dúvida sequer. —
Entende que me apaixonei por você durante esse tempo que passamos
juntos e que a vida longe de você e da nossa filha é um caos completo que
já não faz o menor sentido pra mim e o do qual não quero participar?
Seus olhos encheram-se de lágrimas, e ela tapou a boca com as duas
mãos, atordoada demais para que pudesse fazer qualquer outra coisa.
— Eu te amo com tudo o que eu tenho e, mesmo assim, morro de
medo de não ser o bastante para você.
— É o bastante para mim. — Ela cortou a distância entre nós dois,
segurando minhas lapelas e se colocando nas pontas dos pés. — Muito mais
do que eu sempre sonhei. Você é o bastante, nunca duvide disso, okay?
Nunca duvide que também sou completamente apaixonada por você.
Capítulo 26

Não era minha intenção ter Rodrigo se declarando para mim quando
deixei Ilha do Sol a fim de levar Maria Elisa para que pudesse ver o pai. De
qualquer forma, assistir àquele quase dois metros de homem chorando de
emoção ao observar a filha mexera com mais coisas dentro de mim do que
eu poderia medir em palavras. De tal modo, quando todas as palavras certas
pareceram sair de sua boca e ela desceu sobre a minha, não havia nada que
eu pudesse fazer além de deixar um arquejo arrastado irromper bem no
fundo da minha garganta.
Rodrigo me faria dele outra vez, eu soube disso no momento que ele
me pegou em seus braços fortes e me levou para o seu quarto — onde eu
passara as últimas horas descansando da viagem até São Paulo. Contudo,
algo parecia diferente em seus toques… em seus beijos.
Como se houvesse mais urgência. Mais paixão, lascívia… amor.
A palavra bonita fez com que meus olhos se enchessem de água, para
combinar com a intimidade já úmida entre minhas pernas e que clamava
pelo contato com Rodrigo.
Ele tirou nossas roupas com calma deliberada, expondo nossa nudez
por completo antes de me levar para a cama e encontrar espaço entre
minhas pernas abertas de pura ansiedade.
— Como é possível que você fique ainda mais linda a cada vez que
eu te vejo?
Suas palavras fizeram uma onda de calor generosa se espalhar por
todo o meu corpo, e eu podia apostar que havia corado.
— Você é muito bom com palavras — observei através da minha
respiração entrecortada, levando minhas mãos para espalmá-las no
abdômen trincado daquele homem delicioso e que a partir de agora seria só
meu.
Uma onda de regozijo me invadiu, me fazendo sentir corajosa o
bastante para tocar sua ereção indisfarçável, arrancando um gemido gutural
de Rodrigo, que jogou a cabeça para trás e moveu os quadris.
— Você é minha perdição, Maria Clara — ele murmurou com voz
rouca, prendendo meus pulsos que o agradavam para levar cada um deles
aos lábios, sentindo ali minha pulsação acelerada, antes de me tomar em um
beijo voluptuoso que fez toda minha cabeça rodar.
Meu corpo nu prensado entre Rodrigo e o colchão fazia com que
meus mamilos turgidos resvalassem contra seu peito, e a sensação era
aterradora.
— Preciso de você dentro de mim — admiti, afoita, ciente de que nós
teríamos muito tempo para preliminares depois dali, mas agora eu precisava
senti-lo nu e cru dentro de mim, para aplacar a saudade que sentia dele.
— Você pode ter tudo o que quiser de mim, gostosa — ele murmurou
um segundo antes de me penetrar com tudo, me deixando cheia dele… me
fazendo sentir completa de um modo que só era capaz quando ele me
tomava assim.
Um sorriso involuntário surgiu nos meus lábios quando Rodrigo
estocou em mim com precisão, os quadris chocando-se contra os meus e
fazendo miséria com o meu clitóris.
— Você gosta assim? — ele quis saber ao pé do meu ouvido, com
uma arremetida melhor do que a outra. — Me diz como você gosta,
princesa…
— Eu gosto forte — eu me peguei dizendo, tomada pelo momento
lúbrico. — Você sabe melhor que ninguém de como eu gosto — eu lembrei,
o que pareceu servir de combustível para suas arremetidas, que se tornaram
mais curtas e implacáveis.
— Você é minha, entendeu? — ele chiou após um beijo no meu
pescoço, e eu assenti em resposta.
Porque sim, eu era dele. Corpo, alma e coração.
Para sempre.
Epílogo

Maria Clara estava resplandecente em seu vestido com flores


amarelas. Em meus braços, Maria Elisa usava um vestido que a fazia
parecer uma verdadeira princesa, com um laço na cabeça e um sorriso lindo
que agora exibiam alguns dentes.
Era seu aniversário de um ano, e eu mal conseguia acreditar em
quanto tempo havia se passado desde que ela chegara às nossas vidas e
mudara todas as minhas certezas.
Sua mãozinha gorducha foi para o nó da minha gravata, simplesmente
porque ela parecia fascinada por ele, e eu me perguntei se era impróprio da
minha parte me sentir tão apaixonado por cada pequena ação da minha
filha.
Se dependesse de mim, ela seria o bebê mais mimado da história.
— Pronto pra cantarmos os parabéns? — Maria Clara perguntou, se
aproximando e tocando as minhas costas com sua mão espalmada. Então
ela se inclinou nas pontas dos pés, para selar meus lábios com os seus
brevemente, e eu a encontrei na metade do caminho.
— Você está de tirar o fôlego, senhora Marinho — sussurrei para ela,
vendo seu rosto corar levemente mesmo através da pouca maquiagem que
usava.
Há três meses, ela finalmente aceitará meu pedido para ser minha
esposa, fazendo de mim o homem mais feliz de todo o universo.
Nós nos casamos em uma cerimônia simples, na praia, com um time
de Marias como testemunha e nosso tesourinho no altar com a gente.
Eu jurei, na ocasião, que amaria Maria Clara por todos os dias da
minha vida, mesmo já sabendo ali que aquela não seria uma tarefa difícil de
executar.
Ela me trazia vida, fazia com que meu mundo monocromático
vibrasse com cores alegres, e não havia nada no mundo que eu não fosse
capaz de fazer para ver sua felicidade.
Até mesmo concordei em me mudar para Ilha do Sol. Assim como
Maria Clara, eu gostaria que nossa filha tivesse contato com sua família
bonita e amorosa, então contratei um CEO competente para cuidar dos
negócios para mim em São Paulo.
Eu ainda trabalhava todos os dias, mas ser um homem de negócios já
não era mais minha prioridade, e sim ser um bom marido e um bom pai.
Modéstia à parte, eu estava recebendo um ótimo feedback.
— Você também não está nada mal, senhor meu marido — ela
devolveu, depositando um beijo rápido em meus lábios mais uma vez, antes
de enterrar as narinas nos cabelinhos de Maria Elisa e inspirar fundo.
Ninguém resistia ao cheiro de bebê da minha filha.
— Antes de irmos cantar os parabéns — Maria Clara começou,
mordendo o lábio como se estivesse meio incerta. — Maria Flor pediu pra
avisar que nós vamos ficar responsáveis por assoprar as velas, já que nossa
filha ainda não consegue fazer isso sozinha. Então pensei que, nesse caso,
nós poderíamos fazer um pedido também, no lugar dela.
— E o que você quer pedir? Porque nada me vem à mente, já que
literalmente eu tenho tudo.
Ela rolou os olhos em falsa exasperação.
— Você é impossível.
Abri um sorriso convencido.
— Obrigado — agradeci.
Ela uniu as sobrancelhas.
— Não foi um elogio.
— Ah, tá — devolvi de cenho franzido, sem saber o que dizer. —
Mas isso não responde minha pergunta sobre o que você gostaria de pedir.
— Pensei em pedir um parto menos conturbado, da próxima vez. O
que acha?
Ela mordeu o lábio inferior, me encarando sob os cílios longos,
esperando que minha ficha caísse para que enfim eu pudesse entender o
significado por trás de suas palavras.
— Vamos ter mais um bebê? — balbuciei, pelo que me parecia ser a
primeira vez na vida, e Maria Clara, minha amiga e esposa, sorriu para mim
amplamente, anuindo.
Meu coração parecia prestes a sair pela minha boca, socando forte
minhas costelas no processo.
— De acordo com a minha mãe, teremos uma nova Maria — ela
enfim murmurou, e enfiei meus dedos nos cabelos de sua nuca, puxando
sua cabeça para um beijo apaixonado que também era de agradecimento por
toda a felicidade que aquela mulher me fazia sentir.
— Eu te amo tanto — murmurei contra seus lábios, afastando-me
apenas para ver seu rosto bonito. — Ouviu isso, tesourinho? — perguntei a
Maria Elisa, que soltou um gritinho. — Você vai ter uma irmãzinha com
quem brincar.
— Ou um irmãozinho — Maria Clara considerou, e neguei com um
meneio de cabeça.
— Vai ser menina — eu disse com firmeza. — Minha sogra nunca
erra.
Maria Clara concordou com um aceno de cabeça e um sorriso amplo,
e eu me inclinei para provar aqueles lábios que eram só meus mais uma vez.
— Te amo — repeti, porque não me cansava de dizer aquilo.
— Também te amo — Maria Clara devolveu, segurando meu rosto
entre suas mãos para um novo baixo, passando o braço pelo meu ao se
afastar. — Agora vamos assoprar as velinhas do nosso tesourinho número
um.
Sobre a Autora

EVELYN SANTANA

Autora de protagonistas resilientes, planos perfeitos que dão errado,


finais felizes aparentemente impossíveis e que aquecem o �� .

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Vou adorar conversar com você! <3

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