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Estado e políticas públicas

Professora Cibele Cheron


Sobre a Professora
• Bacharela em Ciências Jurídicas e Sociais
(UFRGS, 2002);
• Mestra em Ciências Sociais (PUCRS, 2006);
• Doutora em Ciência Política (UFRGS, 2015);
• Pós-doc junto ao Programa de Pós-
Graduação em Educação (PUCRS).
Programa da aula

• Proteção Social
• Políticas Sociais.
• Políticas de Saúde no Brasil.
• Sistema de Saúde no Brasil.
Panorama de desenvolvimento
das políticas sociais
• Século XX, keynesianismo: Estado
provedor e garantidor.

• 1980, Escola Neoclássica de


Desenvolvimento: Discussão sobre o
papel do Estado na atividade
econômica
I
n
t
e
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n
a Fortalecimento
c
Encolhimento Diminuição
Modelo de acumulação
do papel
Enfraquecimento das
Reestruturação
dos direitos instituições
doligados
flexível
Estadoao trabalho
produtiva
sociais,
da iniciativa
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privada, busca da maximização do lucro
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Norberto Bobbio d
o
Estrutura da
John Rawls Democracia
Constitucional • Determina o
•Direitos Sociais: funcionamento
direitos com das instituições
caráter • Ideia de justiça sociais, em
econômico social cooperação e
• Diminuição das articulação
Garantias de diferenças
trabalho, • Justiça como Onde os Direitos
remuneração, equidade Sociais são
segurança relevantes, as
econômica, acesso instituições
ao mercado em trabalham para
condições dignas diminuir
desigualdades
Política Social
Liberal: as situações de pobreza, desamparo, exclusão
social, são assuntos privados, produto de uma ordem natural
das coisas.
• Necessidades humanas: associadas a estados
subjetivos (desejos, preferências, interesses...).
• Não podem ser satisfeitas de forma coletiva, por
políticas públicas.
• Mercado: mecanismo mais adequado para satisfazer
esse tipo de demanda – é o mais “democrático”, não
interfere na liberdade de escolha e de ação dos
indivíduos.
• Grande premissa: ordem espontânea das coisas, que
sustenta o modelo de sociedade livre, baseado no
mercado, e define a liberdade como algo que nega a
proteção do Estado e das políticas públicas.
Política Social
Democrática: as necessidades humanas, a
política e os direitos estão imbricados e, só podem
ser entendidos no contexto dessa relação.
• Duas dimensões:
• Física: saúde
• social e ética: autonomia.
• A saúde e a autonomia são necessidades básicas,
objetivas e universais. O seu não atendimento
repercute na qualidade de vida humana, tornando-
a sub-humana.
• Estado: dever de atender às necessidades, por
meio de políticas públicas, para assegurar direitos
sociais e a liberdade dos cidadãos.
Política Pública
• Política Social é uma espécie do gênero
Política Pública.
• Requer a participação ativa do Estado e
o controle da sociedade no
planejamento e execução de ações para
a satisfação de necessidades sociais.

• Caráter público – compromete:


• o Estado na garantia de direitos
• a sociedade na defesa da
institucionalidade legal dessa Política.
Política: Pública  Social  de Saúde
• Saúde como direito
Proteção • Estado de Bem-Estar Social
Social • Aspectos conceituais: proteção x risco
• Aspectos históricos: proteção x capitalismo
• Saúde como espaço de acumulação
Econômico- • Estado capitalista
Industrial • Tecnologia e trabalho
• Indústrias e mercados
• Saúde como objeto de conflito
Política • Estado democrático
• Atores, interesses, relações de
poder
• Pontos de veto e coalizões de apoio
(Freeman e Morgan, 2002)
Dimensões da Proteção Social
• Ação de:
– proteger indivíduos contra os
riscos inerentes à vida
– assistir necessidades geradas em
diferentes momentos históricos e
relacionadas com múltiplas
situações de dependência
• Riscos relacionados a:
– fatores naturais e/ou ambientais
– fatores econômicos, políticos e
sociais
Modelos de proteção social
• Modelos de proteção diferentes - processo histórico de
constituição de direitos sociais :
• Assistência social:
– Distribuição de benefícios para camadas
específicas da população; Ações são do tipo
focalizado, residuais e seletivas;
•Seguro social:
– Benefícios distribuídos a categorias ocupacionais
específicas (geralmente trabalhadores do
mercado formal de trabalho)
• Seguridade social:
– Distribuição de benefícios a todos os cidadãos
ASSISTÊNCIA Saúde: sistema de mercado
DENOMINAÇÃO Residual
Ideologia Liberal
Princípio Caridade
Efeitos Discriminação
Status Desqualificação
Finanças Doações
Atuária Fundo
Cobertura Alvos - focalizada
Benefícios Bens/serviços
Acesso Teste de Meios atestado pobreza
Administração Filantrópica
Organização Local
Referência EUA
Cidadania Invertida
SEGURO SOCIAL Seguro social de saúde
DENOMINAÇÃO Meritocrático-corporativo
Ideologia Corporativa/conservador
Princípio Solidariedade de grupo
Efeitos Manutenção
Status Privilégio
Finanças % Salário
Atuária Acumulação
Cobertura Ocupacional
Benefícios Proporção Salarial
Acesso Filiação
Administração Corporativa
Organização Fragmentada
Referência Bismarck
Cidadania Regulada
SEGURIDADE SOCIAL
DENOMINAÇÃO Institucional-redistributivo Serviço nacional de saúde
Ideologia Social-democracia
Princípio Justiça
Efeitos Redistribuição
Status Direito
Finanças Orçamento público
Atuária Repartição
Cobertura Universal
Benefícios Mínimo Vital (máximo social)
Acesso Universal/ necessidade
Administração Pública
Organização Central
Referência Beveridge
/ países escandinavos
Cidadania Universal
O que é sistema?
 Sistema: conjunto de processos inter-relacionados e
interdependentes que objetivam atingir determinado
fim. 
 Sistema de saúde: combinação de recursos,
organização, financiamento e gerenciamento para
prestação de serviços de saúde.
• respostas sociais organizadas a necessidades, demandas e
representações.
• conjunto de todas as atividades que objetivam promover a
saúde, garantir melhoria de condições, cuidar das pessoas e
aliviar sofrimento.
• concepção abrangente – saúde em sentido amplo:
manifestação objetiva das condições de vida de uma
população, resultante da ação intersetorial e de articulação de
políticas econômicas e sociais
Sistema de saúde
• Parte da dinâmica social.
• Proteção mais ampla: saúde
como problema coletivo;
• Processo histórico:
– resultam de um emaranhado
de iniciativas, nem sempre
coerentes
– efeitos de difusão de
experiências para outros
Sistema de saúde
• Modalidades de intervenção estatal :
– serviços nacionais de saúde
– seguro social de saúde
– sistemas de mercado
• três modelos básicos:
– Cobertura universal (modelo Beveridge),
– Seguros sociais obrigatórios (modelo Bismarck),
– Com seguros privados (modelo Adam Smith ou de
soberania do consumidor)
Sistema de saúde
Tipo de instituição responsável pelas demandas
de saúde ( Estado, empregadores, planos
privados de saúde)
Modo de organização da oferta da assistência (o
lugar dos hospitais públicos e privados, o papel da
atenção primária, a prática dos profissionais de
saúde, dos médicos)
Prioridades assumidas: universalidade,
manutenção da medicina liberal, espaço dado ao
mercado, regulação estatal.
Desafios: sociais (garantir o acesso a todos);
organizacionais (melhorar a eficiência do
sistema);
Atividades Integrativas
• Dimensão coletiva: ações próprias do
Estado:
– Prevenção, promoção e controle de ações que
tem impacto sobre o conjunto da população:
– Vigilância Epidemiológica; Vigilância Sanitária;
Controle ambiental
• Atenção individual: serviços públicos e
privados:
– Pode variar. Em geral, todos os sistemas possuem:
– serviços ambulatoriais; hospitais; de atenção a
doenças específicas e de atenção de longa
Rede de Serviços
• Serviços coletivos
• Serviços de assistência
médica/ individual
• Em parte dos sistemas, os
serviços são organizados
em níveis de atenção
– Rede básica
– Rede especializada
Marcos Históricos
Década de 70
• Crítica ao modelo centrado na assistência
médica e no hospital;
• Medicina Social: ciências sociais na
análise dos problemas e das intervenções
em saúde;

Década de 80
• Movimento da Reforma Sanitária
• 1986 – VIII Conferência Nacional de
Saúde; Carta de Ottawa
• 1986-1988 – Constituinte com
participação do Movimento da Reforma
Sanitária; Constituição Federal: 1988;
Marcos Históricos
Década de 90

• Organização dos Conselhos de Saúde em


todos os níveis:
 controle social formal;
 composição paritária Estado/Sociedade Civil;
 representação intersetorial;

• 1992 – Cúpula da Terra: Agenda 21


• 1995 – Plano Nacional de Saúde e Ambiente
no Desenvolvimento Sustentável
• 1995 – Programa de Agentes Comunitários
de Saúde; Programa de Saúde da Família
Marcos legais
CF/88, Art. 196: “A saúde é um direito de todos e dever do
Estado, garantido mediante políticas sociais e
econômicas que visem à redução do risco de doenças e
outros agravos e ao acesso universal e igualitário às
ações e serviços para sua promoção, proteção e
recuperação”.

Lei 8.080/90 (art.2º): “A saúde tem como fatores


determinantes e condicionantes, entre outros, a
alimentação, o saneamento básico, o meio ambiente, o
trabalho, a renda, a educação, o transporte, o lazer e o
acesso a bens e serviços sociais; os níveis de saúde da
população expressam a organização social e
econômica do país (par. 3º).
Controle Social
• Conselhos Nacional, Estaduais e Municipais de
Saúde
• Composição paritária Estado – Sociedade
• Aprovação da Política e dos Planos de Saúde
• Funcionamento regular, com efetividade
variada
• Conferências de Saúde
• Nacional e de outras instâncias, a cada 4 anos,
também com composição paritária
SUS
• “Conjunto de ações e serviços de saúde prestados
por órgão e instituição Publicas Federais, Estaduais
e Municipais, da Administração Direta e Indireta e
das Fundações mantidas pelo Poder Público e
complementarmente pela iniciativa privada.”
• Mecanismo de promoção da igualdade no
atendimento das necessidades de saúde da
população.
• Oferta de serviços com qualidade adequados às
necessidades, independente do poder aquisitivo do
cidadão.
Por que Sistema Único?
• Segue a mesma doutrina e princípios em
todo território nacional;
• Sob a responsabilidade das três esferas
de governo;
• Não é um serviço ou instituição, é um
conjunto de unidades, de serviços e ações
que interagem para um fim comum;
• Realiza atividades de promoção, proteção
e recuperação da saúde.
SUS
• Universalidade
• Gratuidade
• Integralidade: promoção, prevenção, assistência e reabilitação; assistência
farmacêutica
• Descentralização
• Direção única em cada esfera de governo
• Controle social
• Financiamento público
• Participação complementar da iniciativa privada: público + privado na prestação
dos serviços
• Regulação: ANVISA; ANS
Universalidade

Garantia de
atenção à saúde a
todo e qualquer
cidadão pelo SUS.
Integralidade
• Atendimento integral,
priorizando as atividades
preventivas, sem prejuízo
dos serviços assistenciais;
• Conjunto de ações e
serviços de saúde
preventivos e curativos,
individuais e coletivos nos
diversos níveis de
complexidade do sistema.
 
Três sentidos do princípio da integralidade

(1) Atributos dos profissionais de saúde, associado à


atitude, ou seja, a boa prática médica, independente ela
se dar no âmbito do SUS
(2)Organização dos serviços e práticas de saúde;
(3)Integralidade e políticas voltadas para grupos
específicos, como respostas governamentais aos
problemas de saúde.

Mattos (2006, p. 44-63)


Equidade
O acesso aos serviços em seus
variados níveis de complexidade
deve ser adequado à necessidade
específica de cada cidadão.
Descentralização
• Redistribuição das responsabilidades
quanto às ações e serviços de saúde
nos vários níveis de governo, federal,
estadual e municipal, tornando a
gestão mais próxima do cidadão
usuário.
• ações e serviços que atendem a
população de um município devem
ser municipais, as que alcançam
vários municípios devem ser
estaduais, e aquelas dirigidas a todo
território nacional devem ser federais
Regionalização
• Definição de espaço territorial e
população a ser atendida.
• Como essa população tem direito a
ter acesso a todo tipo de recursos
assistenciais, o conceito envolve
também a articulação intermunicipal
de recursos à saúde que garantam
esse direito.
Hierarquização
• Serviços organizados em níveis de complexidade
tecnológica crescente (são especialidades,
centros de referência, hospitais).

ATEN
ÇÃO
HOSPI
TALA
R
PRONTO-SOCORRO
PRONTO ATENDIMENTO
ESPECIALIDADES

ATENÇÃO BÁSICA
Hierarquização
• Governo Federal elaborar as regras gerais
de organização do sistema e participar do
financiamento.
• Governo Estadual elaborar políticas
pautadas na realidade do estado
especialmente, na regionalização que visa a
garantia do acesso a serviços de média e alta
complexidade, na educação permanente, e
no financiamento.
• Governo Municipal garantir o acesso aos
serviços de saúde, com funções diferenciadas
segundo o porte populacional e as
características regionais.
Financiamento
• CF, art. 195: “A seguridade social será financiada por toda a
sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei,
mediante recursos provenientes dos orçamentos da União,
dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios”.
• Fontes:
– Públicas: impostos e contribuições sociais;
– Privadas: gasto direto das famílias e gasto das empresas;
• Vinculação Constitucional de Receitas:
– Estados - 12% da receita de impostos e transferências constitucionais
e legais;
– Municípios - 15% da receita de impostos e transferências
constitucionais e legais;
– União - o montante aplicado no ano anterior corrigido pela variação
nominal do PIB.
POLÍTICAS PÚBLICAS EM CONJUNTURAS RECENTES NO BRASIL

Principais políticas públicas implicadas com a


promoção da saúde no atual cenário:

• Habitação
• Saneamento básico: água, esgoto e lixo;
• Segurança alimentar; políticas de alimentação e
nutrição;
• Educação: analfabetismo; universalização do
ensino básico;
• Renda mínima.
Desafios do SUS
• Aumento das despesas e do custo da assistência à saúde
• Limites à expansão dos gastos
• Limites à melhoria das condições de saúde
• Sistemas ineficientes e com baixa resolutividade
• Queda na qualidade dos serviços
• Maiores exigências dos usuários
• Alteridade ou austeridade?
Referências
• BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal,
Centro Gráfico, 1988.
• BRASIL. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Secretários Municipais de
Saúde. O SUS de A a Z: garantindo saúde nos municípios. Brasília: Ministério da
Saúde, 2005.
• BRASIL. Ministério da Saúde. Programa Nacional de DST e Aids. Plano Estratégico
do Programa Nacional de DST/Aids - 2004/2007. Brasília: Ministério da Saúde,
2004.
• BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Políticas de Saúde. Políticas de Saúde:
Metodologia de Formulação. Brasília: Ministério da Saúde, 1998.
• BRASIL. Presidência da República. Lei n. 8.080 de 19 de setembro de 1990.
• BURAU V; BLANK, RH. Comparing Health Policy: An Assessment of Typologies of
Health Systems. Journal of Comparative Policy Analysis: Research and
Practice,2006; 8(1): 63-76.
• CASTRO, JA. Política social e desenvolvimento no Brasil. Econ. soc.,  Campinas,  v.
21, p. 1011-1042,  Dec.  2012.  
Referências
• CHAVES, HLA; GEHLEN, VRF. Estado, políticas sociais e direitos sociais: descompasso do
tempo atual. Serv. Soc. Soc.,  São Paulo ,  n. 135, p. 290-307,  ago.  2019 .  
• CHERNICHOVSKY, D. Health systems reforms in industrialized democracies: an
emerging paradigm. Milbank Q, 1995; 73(3):339–372.
• FIELD, MG. The health system and the polity: A contemporary American dialectic. Soc
Sci Med, 1980; 14(5):397-413,
• FLEURY, Sonia. Reforma sanitária brasileira: dilemas entre o instituinte e o instituído.
Ciênc. saúde coletiva, Rio de Janeiro , v. 14, n. 3, p. 743-752, June 2009 .
• LOBATO, L.V.C. Políticas sociais e modelos de bem-estar social: fragilidades do caso
brasileiro. Saúde em Debate. 2016, v. 40, n. spe
• MACHADO, CV; LIMA, LD; BAPTISTA, TW. Políticas de saúde no Brasil em tempos
contraditórios: caminhos e tropeços na construção de um sistema universal. Cadernos
de Saúde Pública. 2017, v. 33, n. Suppl 2
• MARSIGLIA, RMG.; SILVEIRA, C; CARNEIRO JUNIOR, N. Políticas sociais: desigualdade,
universalidade e focalização na saúde no Brasil. Saude soc.,  São Paulo ,  v. 14, n. 2, p.
69-76,  Aug.  2005 .  
• OECD. Financing and Delivering Health Care: A comparative analysis of OECD

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