Índice O autor Influências do contexto renascentista O desconcerto do mundo Mudanças constantes O sofrimento amoroso Neoplatonismo e amor platônico O autor Camões é tido como um dos maiores (às vezes o maior) poeta da língua. Imortalizou o povo português, cantou sofrimentos amorosos e existenciais. Destaca-se por sua obra épica: o poema “Os Lusíadas” canta, em estilo solene, os feitos heroicos do navegador Vasco da Gama, que lança Portugal na era das grandes navegações. Utilizando o gênero dos poemas épicos gregos, o poeta alça o povo lusitano ao status de mito. Não deixa, porém, de fazer críticas à época: as grandes navegações sacrificam portugueses pobres e glorificam e enriquecem a coroa e a burguesia. POESIA ÉPICA POESIA LÍRICA temas históricos temas individuais feitos heroicos sentimentos O renascimento Resgate de temas da antiguidade clássica (cultura greco-romana): figuras da mitologia, narrativas heroicas; Resgate de formas da antiguidade clássica: versos com métrica nobre (dez ou doze sílabas), rimas regulares. Retomada da lógica: obras de Aristóteles e de Platão. Visão de mundo antropocêntrica: o humano como medida e centro das coisas (ruptura com a visão teocêntrica medieval, em que Deus era o centro). Camões canta a Modernidade (grandes navegações em Os Lusíadas), mas conserva um tema medieval e clássico: o amor idealizado. O desconcerto do mundo Correm turvas as águas deste rio, Em alguns sonetos, Camões Que as do céu e as do monte as enturbaram; Os campos florescidos se secaram, busca demonstrar que aquilo Intratável se fez o vale, e frio. que é observado não Passou o Verão, passou o ardente Estio, corresponde necessariamente Úas cousas por outras se trocaram; à realidade; Os fementidos Fados já deixaram Do mundo o regimento, ou desvario. Desconcerto é a falta de lógica, o equívoco: a análise fracassa e Tem o tempo sua ordem já sabida; O mundo, não; mas anda tão confuso, o eu-lírico é levado ao Que parece que dele Deus se esquece. sofrimento. Casos, opiniões, natura e uso Fazem que nos pareça desta vida Glossário: Natura: natureza Que não há nela mais que o que parece. Enturbaram: agitaram. Uso: costume. Fementidos: enganosos, ilusórios. Fados: destinos. Mudanças constantes Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades, muda-se o ser, muda-se a confiança; todo o Mundo é composto de mudança, tomando sempre novas qualidades. O mundo é dinâmico; Continuamente vemos novidades, Ser humano e natureza estão diferentes em tudo da esperança; sujeitos a constantes do mal ficam as mágoas na lembrança, modificações. e do bem (se algum houve), as saudades.
Mudanças na natureza têm ritmo O tempo cobre o chão de verde manto,
previsível (como estações do que já coberto foi de neve fria, ano); e, enfim, converte em choro o doce canto. Mudanças humanas não seguem E, afora este mudar-se cada dia, uma “lei”: possibilidade de outra mudança faz de mor espanto, tristeza e sofrimento. que não se muda já como soía. O sofrimento amoroso Conflito entre o material (profano, carnal) e o amor idealizado (puro, espiritualizado), capaz de conduzir o indivíduo à realização plena.
DESEJO -> MATÉ RIA CONTEMPLAÇÃ O -> IDEIA
Quando o sentimento é a Quando o sentimento amoroso é expressão de um desejo, a espiritualizado, a mulher é mulher é caracterizada como idealizada como absolutamente impiedosa, cruel, que se satisfaz perfeita. A contemplação é com sofrimento daquele que a suficiente para purificar o eu- ama. lírico. No amor idealizado, espiritualizado, o eu-lírico não almeja materializar sua relação, isto é, torna-la carnal. Isso corromperia esse amor. A caracterização camoniana desse amor idealizado, oposto ao profano, reproduz uma filosofia resgatada da Antiguidade Clássica e redefinida no Renascimento: o neoplatonismo. Nesse contexto, esse tipo de amor idealizado, isto é, que só ocorre “no mundo das ideias”, também é chamado de amor platônico. Neoplatonismo e amor platônico
Segundo Platão, a amor verdadeiro é capaz de purificar o ser humano,
permitindo que ele se desprenda de realidades ilusórias e contemple o belo em si, o mundo das essências. Como esse amor é somente uma ideia, não busca realização física. Toda manifestação idealizada do sentimento amoroso passou a ser chamada de platônica. No Renascimento, alguns filósofos procuraram conciliar o amor platônico com os valores cristãos. Da fusão dessas duas visões surge, então, o neoplatonismo amoroso, uma forma de amor tão idealizada que não deseja a realização carnal, libertando o ser humano da escravidão dos desejos e aproximando-o de Deus. Transforma-se o amador na coisa amada, Identidade entre pessoa que ama e que é amada. Por virtude do muito imaginar; Não tenho, logo, mais que desejar, A imaginação sacia, vence o desejo. Pois em mim tenho a parte desejada.
Se nela está minha alma transformada,
Que mais deseja o corpo de alcançar? Tendo a ideia, é desnecessária a carne. Em si somente pode descansar, Pois com ele tal alma está liada. A união ideal, metafísica entre eu-lírico e amada Mas esta linda e pura semideia, resulta numa alma única e Que, como o acidente em seu sujeito, perfeita. Assim como a alma minha se conforma, *ideal: relativo à ideia; ao mundo das ideias, que Está no pensamento como ideia; Amor platônico: união só existe em ideal sem interferência pensamento. E o vivo e puro amor de que sou feito, das necessidades físicas Como a matéria simples busca a forma.