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Comissão Nacional da

Verdade
O compromisso com o Direito a Memória e a
Verdade Histórica.
Profª Maura Leal – Doutoranda em História (UNB)
Por que investigar?
O direito a memória, verdade e justiça.
• “ Morte Inconclusa”
• A categoria “desaparecido” simboliza, uma tripla condição: “a
falta de um corpo, a falta de um momento de luto e a falta de uma
sepultura”. Nesse sentido, a ausência do corpo e de um ritual
fúnebre perpetua a dor, já que o corpo “condensa e domestica a
morte. Torna-a concreta, definitiva, presente, individual,
identificada”. Assim sendo, o desaparecimento, de certa forma,
mata a própria morte.
“Minha mãe só enterrou o meu pai (...) quando recebeu o atestado de
óbito, em 1995. E essa é a diferença entre quem tem um morto pra
enterrar e o que não tem. Nós descobrimos recentemente que cada
um de nós enterrou meu pai num ano diferente. (...) Porque você
decidir que morreu é matar de
novo. Eu já tinha matado o meu pai antes, mas pra ela foi só nesse
ano”.
Vera Paiva

Depoimento concedido ao projeto “Marcas da Memória: História Oral da


Anistia no Brasil”
(Equipe do Rio de Janeiro — UFRJ). Rio de Janeiro, 17 de fevereiro de
2012.
“O Estado está agora diante de mim se curvando e me tratando
desse jeito, que coisa linda!”. (...) No final, o Paulo Abrão (atual
presidente da Comissão da Anistia), de pé leu a sentença, (...) foi
quando ele disse que o Estado brasileiro me pedia perdão, foi
quando eu desabei, eu me senti muito recompensada, foi uma
coisa muito bonita mesmo que a gente saiba que, claro, não
apagou as coisas do passado, mas você sente que finalmente a
cidadania chegou nesse país. (...) Foi um momento muito lindo da
minha trajetória”.
Dulce Pandolfi

Depoimento concedido ao projeto “Marcas da Memória: História


Oral da Anistia no Brasil”
(Equipe do Rio de Janeiro — UFRJ). Rio de Janeiro, 25 de maio de
2011.
Comissão Nacional da Verdade ?
• Comissões de Verdade, no contexto da Justiça de Transição, têm basicamente como
objetivo estabelecer uma verdade sobre graves violações de direitos humanos
ocorridas na vigência de regimes autoritários.
• Diz respeito, na passagem de regimes autoritários para a democracia, pelas distintas
formas por meio das quais uma sociedade lida com um passado de repressão.
• Justiça de Transição, na modalidade das Comissões de Verdade, tem sido parte da
agenda latino-americana e igualmente da africana, em especial da África do Sul,
cuja Comissão da Verdade e Reconciliação logrou encerrar o apartheid, associando
verdade, perdão e anistia.
CNV, um breve histórico
CNV, um breve histórico
• A Comissão Nacional da Verdade tem antecedentes na
experiência brasileira, cabendo lembrar que o marco zero da
memória organizada sobre o legado da repressão foi o
desdobramento das atividades da Comissão de Justiça e Paz da
Arquidiocese de São Paulo, respaldadas com destemor
inigualável em tempos sombrios de encolhimentos do espaço
público, pelo Cardeal D. Paulo Evaristo Arns e que levou ao
Relato, publicado em 1985,Brasil: Nunca Mais.
CNV, um breve histórico
• A Comissão da Verdade representa a continuidade do prévio esforço na
lida com um passado de violação de direitos humanos. Tem, assim,
antecedentes institucionais. São eles: (i) Comissão Especial sobre Mortos
e Desaparecidos (lei9.140 de 1995) e (ii) a Comissão de Anistia (lei
10.559 de novembro de 2002), que vem propiciando, várias medidas
indenizatórias de reparação a pessoas atingidas por atos arbitrários
cometidos antes da promulgação da Constituição de 1988.
• E emblemático o abaixo-assinado de 975, firmado por 35 presos políticos
de SP, mais conhecido como “Bagulhão”, destinado ao Presidente do
Conselho Federal da OAB, Caio Mário da Silva Pereira.
Qual é a natureza e o papel desta verdade
que cabe à Comissão apurar?
• Não é a verdade jurídica que caracteriza a judicialização de processos políticos. É,
para recorrer ao ensinamento de Hannah Arendt, a verdade factual dos fatos e
eventos, que é a verdade da política. Esta se caracteriza porque o seu oposto não é
o erro, a ilusão ou a opinião mas sim a falsidade de ocultação ou a mentira na
manipulação dos fatos. Por isso os seus modos de asserção não são os de evidência
da verdade racional, mas sim o desvendamento dos fatos pelo testemunho e pelo
acesso à informação escondida, que a lei 12.527 sobre o seu acesso, de 18 de
novembro de 2011 propicia. A função da Comissão Nacional da Verdade é, assim, a
de impedir o esquecimento por apagamento de rastros da violação de direitos
humanos.
Relatório – CNV
I Volume
Relatório – CNV
II Volume
Relatório – CNV
III Volume
Recomendações
• No relatório final, a CNV compilou uma lista de 29 recomendações às autoridades,
sendo a maioria delas voltada à responsabilização civil e criminal. Além disso, o
documento propôs mudanças que gerariam grande impacto na área de segurança
pública, como a desmilitarização da polícia e reformas no sistema carcerário.
• Das quase 29 recomendações, 17 são medidas institucionais, oito são iniciativas de
mudanças de leis ou da Constituição e quatro são medidas para dar seguimento às ações
da CNV
• Foram listados também os nomes de 377 pessoas apontadas como responsáveis por
crimes durante esse período, incluindo tortura, assassinato, desaparecimento forçado e
ocultação de cadáver.
Medidas institucionais
•1 - Responsabilização das Forças Armadas
•2 - Fim da prescrição e da anistia dos crimes cometidos
•3 - Ressarcimento
•4 - Proibição de comemoração do golpe de 64
•5 - Valorizar direitos humanos na seleção de membros das Forças Armadas
•6 - Mudança nos currículos das academias militares e policiais
•7 - Retificação de causas de morte
•8 - Exclusão de informações sobre registros de perseguição política
•9 - Criar mecanismos de prevenção e combate à tortura
•10 - Desvincular IMLs e órgãos de perícia criminal das SSPs
•11 - Fortalecimento das defensorias públicas
•12 - Melhoria do sistema prisional e do tratamento dado aos presos
•13 - Instituição legal de ouvidorias externas no sistema penitenciário
•14 - Fortalecimento de conselhos da comunidade
Mudanças em leis e propostas de continuidade
•8 - Revogação da Lei de Segurança Nacional
•19 - Tipificar crime contra a humanidade e de desaparecimento forçado
•"20 - Desmilitarização das polícias militares estaduais
•"21 - Extinção da Justiça Militar estadual
•22 - Exclusão de civis da jurisdição da Justiça Militar federal
•"23 - Suprimir, nas leis, referências discriminatórias das homossexualidades
•24 - Fim dos autos de resistência à prisão
•25 - Introdução da audiência de custódia
•26 - Criar órgão para dar continuidade ao trabalho da CNV
•27 - Continuidade da busca de desaparecidos
•28 - Preservação da memória das violações
•29 - Continuidade à abertura dos arquivos militares
As recomendações da comissão são "pertinentes e consentâneas com os parâmetros
constitucionais e internacionais a respeito do assunto".

O MPF vem já vem encaminhando ações penais contra esses agentes desde 2011. De lá
para cá foram instaurados 290 procedimentos de investigação criminal e
ajuizadas 12 ações penais, envolvendo 24 agentes civis e militares, que
estariam "envolvidos em sequestros, homicídios, ocultação de cadáveres, transporte de
explosivos, associação criminosa armada e fraude processual".

As ações do MPF estão relacionadas à decisão da Corte Interamericana de Direitos


Humanos, que, em 2010, condenou o Brasil no julgamento de uma ação
envolvendo os mortos e desaparecidos na Guerrilha do Araguaia, ocorrida na
década de 1970. Uma das recomendações feitas na sentença é para que o País
responsabilize os agentes de Estado.
O corpo do líder camponês maranhense Epaminondas Gomes de Oliveira
Quem controla o passado,
controla o futuro.

George Orwell
http://www.cnv.gov.br/

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