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INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA

DO CEARÁ
CURSO SUPERIOR EM MECATRÔNICA INDUSTRIAL

CÉLULAS A COMBUSTÍVEL A HIDROGÊNIO: ESTUDO DE


CASO COMPARATIVO COM UM MOTOR A COMBUSTÃO

JOÃO GASPAR BEZERRA FILHO

FORTALEZA
2008
JOÃO GASPAR BEZERRA FILHO

CÉLULAS A COMBUSTÍVEL A HIDROGÊNIO: ESTUDO DE


CASO COMPARATIVO COM UM MOTOR A COMBUSTÃO

Trabalho de final de curso apresentado e


julgado adequado para aprovação na sua
forma final pelos professores do Curso de
Graduação em Tecnologia Mecatrônica
do Instituto Federal de Educação, Ciência
e Tecnologia Ceará.

Orientador:
Prof. Cícero Roberto de O. Moura, MSc.

Contato: johnfla_@hotmail.com / jgasparbf@hotmail.com

FORTALEZA
2008
DEDICATÓRIA

Dedico esta monografia a todas as pessoas que acreditam e


lutam a cada dia por tecnologias sustentáveis não agressoras ao meio ambiente,
que se preocupam com o mundo e mostram, até para os mais pessimistas, que o
homem pode utilizar os recursos do planeta respeitando-o.
AGRADECIMENTOS

Em primeiro lugar, agradeço a Deus, em quem encontrei a força maior para


realizar este projeto.
À minha família, em especial aos meus pais, pela paciência e pelo apoio
que têm me dado até hoje.
Aos professores que ajudam a fazer com que o CEFET Ceará tenha cada
vez mais credibilidade perante o sistema de ensino do país.
À empresa Brasil H2 Fuel Cell Energy, que muito me ajudou, através de e-
mails, tirando algumas dúvidas a respeito do tema desenvolvido.
Aos colegas que me ajudaram e superaram comigo momentos difíceis
durante o curso, momentos que foram fundamentais para nossa aprendizagem.
"A decomposição da água em seus elementos primitivos, naturalmente se
dará através da eletricidade, que tornar-se-á uma poderosa força manejável.
Acredito que o hidrogênio e o oxigênio proporcionarão uma fonte inesgotável
de calor e luz."
JÚLIO VERNE
RESUMO

Esta monografia discorre sobre as células combustíveis a hidrogênio, dispositivos


eletroquímicos que utilizam o hidrogênio para gerar energia elétrica que pode ser
utilizada em várias aplicações, desde o funcionamento de aparelhos portáteis, nos
meios de transporte e até mesmo em estações de energia. Abordar-se-ão
informações atuais sobre essa tecnologia que se desenvolve rapidamente devido
a altos investimentos de empresas e instituições renomadas em todo o mundo.
Através de um estudo de caso comparar-se-á a célula a combustível a um motor
a combustão interna utlizando o etanol, destacando assim, as vantagens da
primeira, no que diz respeito à eficiência e aos benefícios ambientais.

PALAVRAS-CHAVES: energia renovável, célula combustível, hidrogênio,


tecnologia.
ABSTRACT

This monograph talks about the fuel cells to the hydrogen, electrochemical devices
that use hydrogen to generate electricity, which can be used in various
applications, from power stations or even on handheld devices or means of
transportation. Are shown to the reader current information on this technology,
which is developed quickly due to high investment of renowned companies and
institutions around the world. Through of a case study are made comparisons
between the fuel cell and a internal combustion engine that uses ethanol,
highlighting the advantages of the first, on efficiency and environmental benefits

KEY WORDS: energy renewable, fuel cell, hydrogen, technology.


LISTA DE FIGURAS

Figura 2.1a: Densidade de energia por massa em kWh/kg.................................. 14


Figura 2.1b: Formas de Produção de Hidrogênio................................................. 14
Figura 2.2: Turbina eólica..................................................................................... 18
Figura 2.3: Funcionamento básico e Reações de uma célula a combustível ....... 30
Figura 2.4: Pilha de célula a combustível............................................................. 32
Figura 2.5: Sistema de Célula a Combustível da Ballard Power Systems ........... 38
Figura 2.6: AUTOnomy da GM............................................................................. 39
Figura 2.7: Início da produção em larga escala do FCX Clarity no Japão............ 43
Figura 2.8: Posco Power - Usina de Energia através de célula combustível na
Coréia do Sul........................................................................................................ 45
Figura 2.9: Célula Combustível híbrida da Sony .................................................. 46
Figura 2.10: Laptop de célula combustível a Metanol Direto da Lg...................... 47
Figura 2.11: Veículo militar GM equipado com sistema de célula combustível .... 48
Figura 2.12: (PEMFC) Célula Combustível de Membrana de Troca de Prótons .. 49
Figura 2.13: Célula a Combustível de Metanol Direto (DMFC) ............................ 51
Figura 2.14: Nova membrana desenvolvida pela MTI .......................................... 52
Figura 2.15: Célula a Combustível de Etanol Direto. Biocélula que funciona com
etanol ou água e açúcar....................................................................................... 56
Figura 2.16: Cronograma das prioridades do Roteiro Brasileiro para Estruturação
da Economia do Hidrogênio no Brasil .................................................................. 57
Figura 3.1: Energia útil fornecida por um motor a combustão interna utilizando 1
litro de álcool. ....................................................................................................... 61
Figura 3.2: Energia útil fornecida por uma célula a combustível que recebeu
hidrogênio obtido através da reforma de 1 litro de etanol. ................................... 61
LISTA DE TABELAS

Tabela 2.1: Preços estimados para viabilidade das células combustíveis ........... 40
Tabela 3.1: Unidades de Energia e Conversão.................................................... 59
Tabela 3.2: Valores de matéria e energia ............................................................ 60
Tabela 3.3: Comparação entre veículos a hidrogênio e a combustão.................. 63
Tabela 3.4: Comparação entre a eficiência anual de um veículo a célula
combustível mais reformador e um veículo com motor a combustão interna....... 64
Tabela 3.5: Comparação entre as emissões de CO2 da gasolina e do álcool
(etanol) ................................................................................................................. 65
SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ................................................................................................. 11

2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ....................................................................... 13

2.1 Hidrogênio .................................................................................................... 13

2.1.1 Propriedades ............................................................................................... 13


2.1.2 Produção ..................................................................................................... 14
2.1.2.1 Eletrólise................................................................................................... 16
2.1.2.2. Reforma a vapor...................................................................................... 18
2.1.2.3 Outras formas de produção.................................................................... 221
2.1.3 Armazenamento .......................................................................................... 22
2.1.4 Distribuição.................................................................................................. 24

2.2. Célula a Combustível .................................................................................. 26

2.2.1 Definição e conceitos .................................................................................. 27


2.2.2 Composição ................................................................................................ 27
2.2.3 Princípio de funcionamento ......................................................................... 29
2.2.4 Sistema de célula a combustível ................................................................. 33
2.2.5. Vantagens das células combustíveis ......................................................... 36
2.2.6. Aplicações .................................................................................................. 40
2.2.7. Tipos de células a combustível .................................................................. 48
2.2.8. Projetos no Brasil e no mundo ................................................................... 56

3. ESTUDO DE CASO ......................................................................................... 59

3.1. Considerações iniciais................................................................................... 59


3.2. Reforma do etanol na plataforma Unicamp x combustão interna do etanol .. 60
3.3. Comparação entre um veículo a combustão de etanol e um veículo a célula
combustível a hidrogênio...................................................................................... 62

4. CONCLUSÃO .................................................................................................. 67

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................... 69


11

1. INTRODUÇÃO

Algumas das maiores preocupações da humanidade, presentes


diariamente em manchetes e noticiários nos meios de comunicação, estão
relacionadas às crises energéticas, problema muito grave no mundo, que envolve
várias complexidades. Dentre estas preocupações, pode-se citar a poluição do
meio ambiente, pois se as emissões de gases tóxicos não forem bruscamente
reduzidas, há grandes possibilidades de o mundo ficar inabitável nos próximos
anos.
Outro fator associado às crises energéticas é a escassez de combustíveis
fósseis em grandes partes do mundo, tendo como conseqüência o aumento dos
preços desses combustíveis. Pesquisadores acreditam que as reservas mundiais
de petróleo estarão escassas em 30 ou 40 anos. Diante disso, as próprias
empresas produtoras de petróleo já investem em outras fontes de energia, ou
seja, já se preparam para uma nova era de energias renováveis, com as células
combustíveis a hidrogênio.
Neste trabalho, é mostrada uma possível solução tecnológica para o
problema energético ambiental, que são as chamadas células a combustível, ou
células combustíveis, as quais, já estão sendo aplicadas em diversos setores
industriais (eletro-eletrônicos, portáteis, veículos) e energéticos, e vêm se
desenvolvendo dia após dia com o investimento de grandes empresas.
A célula a combustível é uma tecnologia que compreende um processo
eletroquímico que tem como princípio de funcionamento gerar energia elétrica
através da reação dos gases hidrogênio (H2) e oxigênio (O2), expelindo para o
meio ambiente apenas água e calor. Essa reação chama-se hidrólise, que é o
processo contrário ao da eletrólise. Logo, com a célula combustível é possível
diminuir as emissões de gases poluentes ao meio ambiente, além da diminuição
da poluição sonora e dos lençóis freáticos.
Consciente disso, tentar-se-á mostrar nesta pesquisa, os vários meios de
se extrair o hidrogênio, alguns mais viáveis, outros nem tanto, mas, que ao longo
do tempo, alcançarão sua viabilidade econômica, destacando-se alguns meios
mais poluentes e outros que podem chegar a uma poluição mínima.
12

Segundo Gomes Neto, diretor da empresa Brasil H2 Fuel Cell Energy, os


custos dessa tecnologia têm caído 25% nos últimos anos, e especialistas
acreditam que entre o ano de 2030 e 2045, comece uma nova era da energia no
mundo.

1.1. Objetivos

Abordar os diferentes tipos e aplicações das células combustíveis, mostrando


suas perspectivas de ser a principal tecnologia para geração de energia do
mundo.
Expor soluções aplicáveis das células combustíveis em aparelhos portáteis,
geração de energia estacionária, automóveis, dentre outros, para diminuir
problemas ambientais como o aquecimento global.
Trazer um estudo de caso, com números baseados em aplicações reais, que
confirmam as vantagens ambientais e energéticas das células combustíveis,
utilizando as fontes de energia de uma maneira mais adequada, em especial o
etanol, já que essas podem ser transformadas em hidrogênio, o combustível das
células.

1.2. Estrutura do trabalho

O Capítulo 1 corresponde à introdução, onde são apresentados o tema, as


justificativas e objetivos da pesquisa.
O Capítulo 2 traz uma fundamentação teórica, expondo o funcionamento, as
aplicações, vantagens e perspectivas das células combustíveis.
No Capítulo 3, abordar-se-á um estudo de caso que mostra números
comparativos entre a energia gerada por 1 litro de etanol diretamente em um
motor a combustão interna, e também de 1 litro de etanol, do qual foi extraído o
hidrogênio, este utilizado em uma célula combustível. Seu objetivo é realizar uma
comparação que mostre, em números aplicáveis, as vantagens de rendimento de
uma célula combustível perante um motor a combustão.
13

2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1 Hidrogênio

Este subcapítulo trata do hidrogênio, o combustível das células


combustíveis. Na realidade, esse gás não é uma fonte primária de energia, mas
sim, um vetor energético, pois ele não é encontrado livre na natureza, sendo
necessário produzi-lo a partir de tal fonte primária.
O hidrogênio pode ser produzido através da eletrólise da água, utilizando
energia procedente de hidrelétricas, energia eólica, solar, etc. Também pode ser
produzido a partir da reforma de combustíveis fósseis ou biocombustíveis, e
ainda, através do biogás presente nos lixões e esgotos.
Será abordado, ainda, os meios de armazenamento do hidrogênio, e as
formas de sua distribuição para chegar até o consumidor e ser empregado nas
células combustíveis.

2.1.1 Propriedades

Segundo Gomes Neto (2005, p.87), o hidrogênio é o elemento mais


abundante de todo o Universo. Compondo 90% das moléculas existentes, como
por exemplo, a água (H2O), ele não é encontrado em sua forma elementar, ou
seja, sempre está combinado com outros elementos, formando as moléculas.
Em condições ambientes de temperatura e pressão, o hidrogênio é um gás
incolor, inodoro, insípido e bem mais leve que o ar. Caso esteja no estado líquido,
possui um volume 700 vezes menor que no seu estado gasoso, mas para isso é
preciso armazená-lo sob a temperatura de -253 °C. Outra forma de diminuir seu
volume é comprimindo-o quando está na forma de gás.
De acordo com Almeida (2005, p.04), o hidrogênio tem cerca de 2,4 vezes
mais energia que o gás natural por unidade de massa, e cerca de 1100 vezes
mais que uma bateria ácida. Sabendo-se que 1 watt equivale a 3600 joules, ver
figura 2.1a.
14

Figura 2.1a: Densidade de energia por massa em kWh/kg. Fonte: (ALMEIDA, 2005.)

Apesar de o hidrogênio possuir esse alto grau de energia por massa, ele
precisar ser utilizado sob altas taxas de compressão, já que em pressão
ambiente, tende a se expandir bastante.

2.1.2 Produção

A figura 2.1b mostra as principais formas de produção do hidrogênio,


comentadas posteriormente.

Figura 2.1b: Formas de Produção de Hidrogênio. Fonte: o Autor

De acordo com a empresa Arkitel apud Marques (2004, p.8), a produção


mundial de hidrogênio atualmente é de 500 bilhões de metros cúbicos por ano.
15

Aparentemente um número alto, porém, equivale a apenas 10% da produção de


petróleo no mundo. Em relação à fonte de obtenção do hidrogênio, este pode ser
classificado como: “Green Hydrogen”, o hidrogênio limpo, extraído de fontes de
energia limpas e renováveis, como solar, eólica, a partir de biocombustíveis, etc.
ou “Black Hydrogen”, quando o hidrogênio é extraído de fontes fósseis de energia,
como o petróleo ou o gás natural.
Atualmente, a maior parte da produção de hidrogênio provém de fontes de
energia poluentes convencionais fósseis. Em alguns anos, isso deve mudar, já
que países como o Brasil e Argentina apostam em fontes alternativas para
obtenção de um hidrogênio limpo.
“Estima-se que haja cerca de 750 milhões de veículos pelo mundo,
alimentados por combustíveis fósseis. Isso não é nada bom se
considerarmos que os gases expelidos por esses veículos são
responsáveis por 17% das emissões de CO2, um dos gases que causam
o efeito estufa. O número de veículos deve dobrar nos próximos 25 anos”
(BOTO, 2007).
Cada país ou região deverá produzir seu hidrogênio para células
combustíveis de acordo com suas reservas ambientais ou como for mais viável
para sua economia.

2.1.2.1 Eletrólise

A produção de hidrogênio através da eletrólise é uma das mais


conhecidas, devido às experiências de ciências desenvolvidas na escola. Estima-
se que no futuro deverá ser uma das formas mais comuns de se produzir
hidrogênio, já que é o método menos poluente. Porém atualmente é um dos
meios menos viáveis de se produzir hidrogênio.
De acordo com Marques (2004, p.12), apenas 2% do hidrogênio produzido
no mundo se dão através da eletrólise. Isso devido ao custo elevado da
eletricidade que equivale a 2/3 (dois terços) do custo operacional da produção do
hidrogênio. Porém, com uso de fontes alternativas de energia, como a eólica e a
solar, isso pode ser viável, como ocorre na Alemanha.
Essa produção se dá através da quebra da molécula de água (H2O) em
seus átomos constituintes, o hidrogênio (H) e o oxigênio (O), por meio de uma
16

corrente elétrica que passa por dois eletrodos, atravessando uma solução
aquosa.
De acordo com Gomes Neto (2005, p.115), o processo mais conhecido
comercialmente chama-se eletrólise alcalina, é empregado na produção em larga
escala de hidrogênio. Para quebrar a molécula de água em seus constituintes, é
necessário ser aplicada uma tensão maior que 1,23 volts, que, na prática, aplica-
se 1,5 volts, a tensão de uma pilha comum. Essa tensão será aplicada entre os
eletrodos da solução descrita de água e cloreto de sódio.
Segundo Silveira (2006, p.7), para se produzir 1 m3 de hidrogênio através
de um eletrolisador com 80% de eficiência, gasta-se 4,4 kWh de energia elétrica.
Sabe-se que a densidade do hidrogênio é de 0,0899 kg/m3, com esses dados
obtém-se que 1kg de hidrogênio ocupa 11,123 m3. Multiplicando esse último valor
pela quantidade de kWh necessária para se produzir 1 m3, (4,4 kWh), conclui-se
que para se produzir 1kg de hidrogênio, são gastos 48,94 kWh, com uma
eficiência de 80%.
Com os dados anteriores, chega-se à conclusão de que a viabilidade da
eletrólise vai depender da forma de produção da energia elétrica utilizada. Por
exemplo, não é viável produzir hidrogênio no horário de pico das hidrelétricas, se
for utilizada essa forma de energia elétrica na eletrólise. Mas pode ser bastante
viável produzir hidrogênio a partir de eletrolisadores que utilizam a energia solar,
ou eólica, ou até mesmo a das próprias hidrelétricas. Nesse último caso,
produzindo o hidrogênio no horário da madrugada, quando o consumo de
eletricidade é baixo, a própria companhia, como é o caso de Itaipu, pode
comercializar o hidrogênio, como apontam alguns projetos.

a) Energia solar
Sabe-se que uma rica fonte de energia renovável e não poluente é a
energia solar, liberada pelo núcleo do sol.
Assim sendo, existem dois modos de produzir eletricidade a partir do sol:
por células fotovoltaicas, que convertem diretamente a luz do sol em corrente
elétrica ou por centrais termo-solares, que utilizam o calor radiado pelo sol para
produzir a eletricidade.
O primeiro modo utiliza painéis fotovoltaicos, convertendo os fótons em
elétrons. De acordo com Marques (2004, p.17), são recomendados para
17

aplicações que não ultrapassem 1MW na capacidade de produção. Logo, para se


produzir eletricidade em larga escala, esta não é a melhor opção, sem esquecer
da principal desvantagem, o elevado preço do equipamento.
Já as centrais termo-solares, que utilizam o calor radiado pelo sol para
gerar eletricidade através de refletores parabólicos e torres solares, são mais
viáveis para produção em grande escala. Segundo Marques (2004, p.17), os
refletores parabólicos possuem uma capacidade de geração de 30-80 MW,
enquanto as torres solares podem constituir centrais com capacidade na ordem
dos 200 MW, atingindo temperaturas na faixa dos 1000 °C.
Ambos os modos não são poluentes e se beneficiam pelo fato da energia
solar ser gratuita, além da vantagem de se produzir hidrogênio em casa ou em
centros produtores finais de distribuição ou postos de combustíveis, eliminando
perdas de distribuição. Com o desenvolvimento de materiais semicondutores, a
sua eficiência tende a aumentar.

b) Hidrelétricas
Embora haja dificuldades para se produzir hidrogênio através da eletrólise,
existem iniciativas a nível nacional para superá-las, como a de Itaipu em parceria
com a Unicamp, Ford e Daymler-Chrysler.
O diretor técnico da Itaipu Binacional, Antônio Otelo Cardoso, afirma que
há solução para esses dois casos. Ele revela que há uma grande quantidade de
água desperdiçada de madrugada, quando o consumo é menor. Então, a
produção de hidrogênio seria nesse horário e, além disso, com a vantagem de
possuir extensas linhas de transmissão elétrica, a fábrica poderia ser instalada
mais próxima de grandes centros consumidores, como São Paulo, minimizando o
custo com o transporte do hidrogênio, já que acima de 200 quilômetros, o custo
de transporte torna-se complicado economicamente. O então diretor da Itaipu
ainda acredita que projetos como esse podem ser desenvolvidos em outras
hidrelétricas do país.
18

c) Energia eólica
De acordo com Marques (2004, p.16), o vento representa uma das fontes
de energia que mais crescem a nível mundial, com a capacidade de cerca de 20
GW em todo o mundo. Os países que mais investem na energia eólica são a
Alemanha, a Dinamarca, os Estados Unidos, Índia e Espanha.
A energia eólica é uma forma limpa de energia renovável. No Brasil, esta
tecnologia ainda está em crescimento, destacando-se o estado do Ceará que,
segundo Pinheiro (2007), foi feito um levantamento com 160 mil consumidores.
Em outros locais como Paraná, Santa Catarina, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Ilha
de Marajó e Pernambuco, também já foram feitos levantamentos que apontaram
um potencial de 20,3 MW das turbinas de médio e grande porte. A energia eólica
é uma das alternativas para viabilizar a produção de hidrogênio através da
eletrólise. A seguir, na figura 2.2 é mostrada uma turbina eólica.

Figura 2.2: Turbina eólica.

2.1.2.2. Reforma a vapor

A reforma a vapor é uma forma de produção de hidrogênio a partir de um


processo térmico que envolve a reação de um combustível com o vapor de água.
Esse combustível tanto pode ser fóssil como um biocombustível. Ao final da
reação são produzidos hidrogênio e dióxido de carbono.
Para que essa reação ocorra, é misturado o combustível a ser reformado
com água e catalisadores, dentro de um tanque de 450 a 500 °C de temperatura
19

informada por Gomes Neto (2005, p.157). Logo, para alcançar tal temperatura,
parte do combustível utilizado na reforma deve ser queimada, aquecendo o
tanque. Então, pode-se concluir que a reforma a vapor é mais poluente do que a
eletrólise, porém, como afirma o próprio Gomes Neto (2005, p167), a reforma do
metano (gás natural) expele em média 50% menos dióxido de carbono do que um
motor a combustão.
No caso da reforma do metano, por exemplo, o processo é realizado em
duas etapas. Na primeira, ocorre a reação entre o metano e o vapor de água na
presença de um catalisador, como o níquel, numa elevada pressão e temperatura,
produzindo hidrogênio e monóxido de carbono (CO). Então, na segunda fase do
processo, o monóxido de carbono produzido anteriormente é combinado com o
vapor de água, produzindo dióxido de carbono (CO2) e ainda mais hidrogênio
(H2). As reações são mostradas na equação 2.1.

Equação 2.1: Reação da Reforma a vapor

Ao final da reação fica: CH4 + 2H2O  CO2 + 4 H2. Ou seja, uma molécula
de metano e duas moléculas de água produzem quatro moléculas de hidrogênio e
uma molécula de dióxido de carbono.
Segundo Marques (2004, p.9), a reforma do metano é um dos processos
com maior eficiência para se produzir hidrogênio, alcançando 70 a 80% de
rendimento. A capacidade de produção de hidrogênio em larga escala pode
chegar a 100 mil metros cúbicos por hora.
Apesar de que, no ponto de vista ambiental, esse método não seja o mais
favorável, pelo fato do dióxido de carbono (CO2) ser poluente, contribuindo para o
aumento do efeito estufa, ainda é mais adequado reformar esses combustíveis
fósseis em hidrogênio do que queimá-los diretamente em um motor a combustão,
processo de baixa eficiência e mais poluente.
Existem projetos com o intuito de se fazer pequenos reformadores para
produção de hidrogênio em residências, indústrias e postos de hidrogênio.
20

a) Fontes fósseis
A maior parte do hidrogênio produzido no mundo é originada de fontes
fósseis como o petróleo, o gás natural e o carvão. Segundo Gomes Neto (2005,
p.114), a maior parte da produção anual de hidrogênio se dá pelo carvão
gaseificado (90 bilhões de m3), gás natural (240 bilhões de m3), reforma de
petróleo (150 bilhões de m3).
Apesar de poluentes, ainda poluem menos, quando são reformados e
usados para produzir hidrogênio para ser utilizado em células combustíveis, do
que se fossem usados diretamente em um motor a combustão. Isso porque as
células a combustível possuem um elevado rendimento, diminuindo a quantidade
de combustível necessária para proporcionar uma mesma quantidade de potência
de uma aplicação a combustão, conseqüentemente, diminuindo a emissão de
gases como o dióxido de carbono (CO2). Além disso, alguns gases tóxicos como
o NOX e o SOX (óxido de nitrogênio e óxido de enxofre) só são liberados pela
combustão, o que não acontece nas células combustíveis.

b) Biocombustíveis
O biocombustível é uma forma de energia renovável e bem menos
poluente do que os combustíveis fósseis. O Brasil tem um altíssimo potencial para
explorar esse meio de extração de hidrogênio para células a combustível.
Os biocombustíveis são extraídos a partir do lixo em aterros sanitários, da
gaseificação da biomassa e do excremento de animais. Também são
considerados biocombustíveis o álcool produzido através do milho ou da cana-de-
açúcar e o biodiesel extraído de outros vegetais.
A seguir serão comentados o etanol e a gaseificação da biomassa por já
terem alcançado certo desenvolvimento prático para se produzir hidrogênio.

b1) Etanol
O etanol é o álcool produzido através da cana-de-açúcar ou do milho,
também conhecido como álcool etílico. No Brasil, é muito utilizado no setor de
transportes, sendo extraído da cana-de-açúcar. Já nos EUA, o etanol é extraído
do milho. Esses países são os maiores produtores mundiais desse combustível.
21

De acordo com Gomes Neto (2005, p. 74), aproximadamente 75% do


álcool produzido no Brasil é proveniente do caldo da cana-de-açúcar e o restante
(25%) do melaço resultante da produção de açúcar.
Em março de 2008, o Laboratório Central da Toyota, no Japão,
desenvolveu uma forma para produção de hidrogênio a partir do etanol, duas
vezes mais eficiente que os sistemas convencionais. Utiliza-se uma mistura de
água e etanol, que passa por todo um procedimento, alcançando uma eficiência
de 80%.
O etanol tanto pode ser utilizado diretamente em uma célula combustível
chamada DEFC (Célula a Combustível de Etanol Direto), como também pode ser
reformado em hidrogênio externamente à célula combustível, sendo utilizado em
uma célula do tipo PEMFC (Célula a Combustível de membrana por troca de
prótons).

b2) Biomassa
Considerar-se-ão biomassa, os resíduos agrícolas como os do bambu, o
bagaço da cana-de-açúcar e a lenha. A biomassa tem sido uma fonte especial de
geração na indústria de energia. Ela pode ser convertida em biogás, em
combustível líquido, e também em hidrogênio.
Segundo o Inbambu apud Gomes Neto (2005, p.107), “de todos os tipos de
biomassa, o bambu é a planta mais eficiente para obtenção de hidrogênio”.
O biogás proveniente da biomassa possui menos metano que o biogás
produzido pelo lixo urbano, mas, ainda assim, é uma fonte de hidrogênio.

2.1.2.3 Outras formas de produção

Ainda existem outras maneiras de se produzir hidrogênio, como por


exemplo, através do biogás de lixões e esgotos, e ainda, a partir de bactérias
estudadas em laboratório. A seguir será abordado o primeiro método por já ser
colocado em prática por alguns países.

a) Lixo urbano
Os gases produzidos pela ação de bactérias, no lixo orgânico das cidades,
contêm metano (CH4), dióxido de carbono (CO4) e nitrogênio, além de hidrogênio
22

e oxigênio em menores quantidades. A maior parte desse gás produzido a partir


do lixo orgânico contém metano, que é rico em hidrogênio. Segundo Gomes Neto
(2005, p.117), o metano é o maior causador do efeito estufa, sendo 23 vezes mais
perigoso que o dióxido de carbono (CO2), por isso muitos aterros sanitários
preferem queimá-lo, emitindo gases poluentes, a liberá-lo diretamente à
atmosfera. Logo, ao utilizar o metano como fonte de extração de hidrogênio,
ameniza-se um grande problema ambiental. Como o hidrogênio produzido pelo
gás do lixo urbano não é totalmente puro, ele precisa ser filtrado para que não
prejudique os componentes da célula combustível.
De acordo com o Ministério do Meio Ambiente apud Gomes Neto (2005, p.
130), “o potencial energético dos aterros sanitários em 91 cidades brasileiras é de
344 megawatts, e em 2015, estima-se 440 megawatts, o que daria para atender
uma cidade de 8 milhões de habitantes.”

2.1.3 Armazenamento

O maior desafio no projeto de tanques de hidrogênio é o de se poder


armazenar a maior quantidade de hidrogênio possível em um tanque de
combustível que ocupe o menor espaço, peso e custo.
O hidrogênio pode ser armazenado de várias maneiras, onde as principais
são em estado gasoso (GH2), comprimido em cilindros a temperatura ambiente e
no estado líquido (LH2), em tanques criogênicos, que não trocam temperatura
com o meio externo.
A autonomia dos veículos ou de outras aplicações está diretamente
relacionada com a capacidade de armazenamento dos tanques de combustível,
fazendo com que se destaque a importância desse tópico. Os desafios são
inúmeros. Na sua forma gasosa, é importante garantir que os tanques
proporcionem certa segurança em relação à pressão que possam suportar. Já
para o hidrogênio líquido, os cuidados são em relação aos tanques criogênicos,
que devem assegurar temperaturas abaixo de – 252,8 °C, que é a temperatura de
ebulição do hidrogênio (quando ele deixa de ser líquido passando a ser gás).
Existem também outras formas de se armazenar o hidrogênio, como o
armazenamento em metais, em microesferas e nanofibras de carbono,
23

tecnologias promissoras, mas pouco empregadas, por isso, serão apenas citadas
neste trabalho.

a) Hidrogênio comprimido
A melhor e mais utilizada forma de armazenar o hidrogênio em seu estado
gasoso é através da compressão. Para isso, são necessários alguns
equipamentos, como compressores, cilindros de armazenagem e pistolas de
enchimento. Os projetistas tentam, cada vez mais, armazenar mais hidrogênio em
menos espaço possível, o que acarreta na utilização de matérias cada vez mais
resistentes a pressão, para que não ocorra nenhum risco.
De acordo com Marques (2004, p.25), as pressões mais típicas dos
cilindros variam entre 350 a 700 bar. As empresas automotivas desejam utilizar
nos seus veículos, cilindros de 700 bar. Na prática, estes já superaram o teste de
explosão para 1620 bar, isso devido à margem de segurança que deve haver
para seu uso comercial.
Os materiais utilizados, além de resistentes, devem ser leves, por isso, são
adotados materiais plásticos e de fibra de carbono ultra-resistentes, que chegam
a ser 5 vezes mais leves que os cilindros metálicos. Eles podem ser ainda de
alumínio com fibra de carbono ao seu redor, de modo que resistam a maiores
impactos.
Também, devem ser tomados cuidados em relação à temperatura, tendo
em vista que altas temperaturas podem aumentar a pressão no cilindro em 10%
ou mais, devido à dilatação do hidrogênio.

b) Hidrogênio líquido
O hidrogênio líquido também pode ser uma boa alternativa de
armazenamento, tendo em vista os desafios do hidrogênio gasoso. A vantagem é
que não é preciso armazenar o hidrogênio comprimido em altíssimas pressões,
porém, para deixá-lo no estado líquido será necessária a utilização de tanques
criogênicos, que não trocam calor com o ambiente externo. O hidrogênio líquido
ocupa 700 vezes menos espaço do que em seu estado gasoso, em temperatura
ambiente. Para utilizá-lo posteriormente em sua forma gasosa, ele deve ser
pressurizado através de uma bomba criogênica.
24

Os tanques de armazenamento criogênicos devem manter o hidrogênio


líquido a - 253 °C, e isso gasta bastante energia. De acordo com Marque (2004,
p.27), 30 a 40% da energia do hidrogênio é gasto para armazená-lo no estado
líquido. Mesmo assim, como o hidrogênio é uma substância muito energética,
essa alternativa de armazenamento também pode valer a pena.
Gasta-se mais energia para armazenar o hidrogênio líquido do que para
armazená-lo em estado gasoso. Porém, um tanque de LH2 equivale
energeticamente a 10 tanques de GH2 já pressurizado. Sendo assim, conclui-se
que para grandes distâncias a serem percorridas por caminhões tanque, entre a
central de produção, se for o caso, e o consumo final, será mais viável armazenar
o hidrogênio em seu estado líquido.
Geralmente, os tanques criogênicos são construídos em formato esférico,
sendo revestidos por uma parede isolante, para que não ocorra troca de calor
com o ambiente externo. Entre a parede do tanque e o material isolante há um
espaço de vácuo, para tornar o tanque ainda mais térmico.

2.1.4 Distribuição

Várias são as maneiras de distribuir o hidrogênio para os usuários da


tecnologia de células combustíveis. O hidrogênio pode chegar aos postos por
meio de tubulações de gás, por caminhões ou até ser produzido no próprio posto.
De acordo com Gomes Neto (2005, p. 124), em 2005 foram construídos
cerca de 25 a 50 postos de hidrogênio em todo o mundo. Alguns desses postos
são capazes de abastecer cerca de 1 a 5 veículos por dia, já que a demanda
ainda é baixa. O ano de 2008 foi marcado pelo início da comercialização do
hidrogênio em maior quantidade e do aumento do número de postos.
A Califórnia, nos EUA, é um dos estados do mundo que mais está
implantando a tecnologia de células combustíveis, construindo vários postos. De
acordo com Gomes Neto (2005, p.133), até 2010 são previstos de 150 a 200
postos de hidrogênio nesse estado. Já no Brasil, a primeira estação experimental
de hidrogênio foi desenvolvida em 2006, na Universidade Estadual de Campinas
(Unicamp). O hidrogênio deve ser produzido no próprio posto através da reforma
do etanol (álcool).
25

“Entre 2003 e 2004, a maior parte dos postos de hidrogênio instalados em


todo o mundo (91%) forneceu este combustível no estado gasoso, pois é mais
fácil e barato armazená-lo” (Gomes Neto, 2005, p. 126). Vale destacar que
existem inúmeras empresas que já trabalham com outros tipos de gases
comprimidos, logo, suas experiências podem ajudar bastante a viabilizar o
desenvolvimento do armazenamento desse novo combustível.
A seguir, detalhar-se-ão algumas opções de distribuição de hidrogênio.

a) Hidrogênio comprimido em caminhões-trailer


Essa opção consiste em utilizar um caminhão equipado com um trailer de
hidrogênio comprimido para transportar o hidrogênio da fábrica até o posto. O
trailer utiliza um compressor para descarregar o hidrogênio em um pequeno
gasoduto que o leva até a bomba. Então, quando esse trailer de cilindros de alta
pressão estiver prestes a ficar vazio, será substituído por outro. A capacidade
total de cada trailer é de 280 kg de hidrogênio em pressões que variam entre
2.400 a 3.100 libras (168 a 217 bar), que pode abastecer uma considerável
quantidade de veículos por dia.

b) Hidrogênio comprimido em cilindros unitários


Essa segunda opção é semelhante à primeira, porém, cada cilindro unitário
só armazena cerca de 4,3 kg de hidrogênio a 3.000 libras (210 bar). Cada cilindro
é capaz de abastecer uma media de 1 a 2 veículos, sendo aconselhável para
postos ainda em fase de testes.

c) Hidrogênio líquido em caminhões com tanques criogênicos


De acordo com Marques (2004, p.28), no estado liquido, o hidrogênio
ocupa cerca de 10 vezes menos espaço do que se estivesse no estado gasoso
comprimido. Isso trás uma vantagem considerável para o transporte desse
combustível a longas distâncias. Um caminhão equipado com tanque criogênico
pode armazenar de 10.000 a 15.000 kg de hidrogênio, cerca de 10 vezes mais do
que um caminhão trailer com hidrogênio comprimido. Após o transporte, o
hidrogênio pode ser convertido e comprimido, para ser utilizado na bomba na
forma gasosa.
26

d) Gasodutos
Utiliza-se gasodutos para o transporte do hidrogênio até os postos. Para
isso, seria necessária a construção de vários gasodutos de hidrogênio em todo o
mundo, já que, ao contrário do gás natural, existem poucos desses gasodutos no
planeta, o que exigiria ainda muitos investimentos. A vantagem dessa opção é a
de se eliminar gastos com transportes via caminhões ou outros.

e) Produção local por eletrólise da Água e produção local através da reforma


do gás natural ou do biogás
Para se obter hidrogênio a partir da eletrolise no próprio posto, é
necessário uma máquina, o eletrolisador. Esse sistema de produção tem a
vantagem de não precisar de transportes para trazer o hidrogênio da fábrica ao
posto, cortando, assim, alguns custos.
Segundo Gomes Neto (2005, p. 129), um eletrolisador com 100% de
eficiência utiliza uma quantidade de energia elétrica de 33 kW por hora para
produzir 1 kg de hidrogênio nessa mesma quantidade de tempo. Geralmente, as
eficiências dos atuais eletrolisadores variam entre 60 a 90%.
Quanto ao gás natural, já comentado anteriormente, através de
reformadores, certas cidades que já possuem redes canalizadas de gás, poderão
utilizar essa infra-estrutura para produzir o hidrogênio no próprio posto.

2.2. Célula a Combustível

A seguir, tentar-se-á oferecer uma visão geral das células combustíveis, a


tecnologia que utiliza o hidrogênio para gerar a energia elétrica que pode ser
utilizada em inúmeras aplicações.
Após a definição e conceitos, serão mostrados os componentes básicos de
uma célula a combustível e, em seguida, seu princípio de funcionamento.
Posteriormente, comentar-se-á como funciona, na prática, um sistema de várias
células combustíveis.
Enumerar-se-á, ainda, neste subcapítulo, algumas vantagens das células
combustíveis em relação a outras tecnologias de geração de energia. Em
seguida, destacar-se-ão as aplicações e os tipos de células combustíveis. E, para
finalizar, serão expostos alguns projetos desenvolvidos no Brasil e no mundo.
27

2.2.1 Definição e conceitos

De acordo com Gomes Neto (2005, p. 93), “a célula combustível é uma


tecnologia que utiliza a combinação química entre os gases oxigênio (O2) e
hidrogênio (H2) para gerar energia elétrica, energia térmica (calor) e água”.
A célula combustível é uma tecnologia bastante antiga, tendo sido
desenvolvida em 1839, pelo físico inglês William Grove, que conhecia o princípio
da eletrólise da água – ao passar corrente elétrica através da água, era possível
isolar seus constituintes, hidrogênio e oxigênio. Por isso, ele pensou em fazer o
reverso dessa reação e, ao combinar esses dois elementos, obteve água e
energia elétrica. Entretanto, naquele tempo, não havia muita aplicação para o seu
projeto. Mesmo assim, em 1889, os cientistas Ludwing Mond e Charles Langer
criam o nome célula a combustível.
Essa aplicação só viria no século seguinte, quando o inglês Francis
Thomas Bacon desenvolveu a célula combustível de eletrólito alcalino. E em 1959
ele fez uma demonstração, ao colocar em funcionamento uma máquina de solda
de 5 kW.
Assim, a célula combustível foi adotada pela Agência Espacial dos EUA, a
NASA, levando-a para o espaço nos projetos Gemini e Apollo.
Atualmente, existem pelo menos seis tecnologias de célula a combustível,
as quais possuem praticamente o mesmo principio de funcionamento. De um lado
da célula entra o hidrogênio e do outro, o oxigênio. Entre esses eletrodos há o
eletrólito e o catalisador, responsáveis pela reação que acarretará no
funcionamento do processo.

2.2.2 Composição

Cada extremidade da célula combustível possui um eletrodo, totalizando


dois, que devem ser porosos para que ocorra a passagem dos gases até a fatia
do meio da célula, o eletrólito.
O eletrólito é revestido pelos catalisadores. Esses catalisadores, que
podem ser, por exemplo, a platina ou o níquel, têm a função de acelerar as
reações no eletrólito e quebrar as moléculas de hidrogênio (H2).
28

a) Eletrodo do hidrogênio
Esse é o terminal negativo da célula a combustível, chamado de ânodo.
Nesse eletrodo, entra o gás hidrogênio, passando por canais desenhados em sua
placa. O ideal é que o hidrogênio entre em contato com toda a superfície do
eletrodo, que está revestido pelo catalisador. Eles são feitos de grafite misturado
com resinas, ou são confeccionados com metais, como o aço inoxidável, isso
porque precisam conduzir corrente elétrica.

b) Eletrodo do oxigênio
Através desse eletrodo, terminal positivo da célula a combustível (cátodo),
passa o gás oxigênio, ou o próprio ar atmosférico para chegar até o eletrólito
revestido com o catalisador.

c) Catalisador
Como foi dito, o catalisador reveste o eletrólito para que as reações
aconteçam de forma mais rápida e para quebrar a molécula de hidrogênio (H2) em
íons (H+) e elétrons. Após os gases entrarem pelos eletrodos e passarem pelos
canais desenhados na placa de fluxo de gases, eles entram em contato com mais
partículas de platina, ou com outro catalisador. O custo dessa platina é muito alto,
por ser um metal nobre, por isso, é recomendável utilizar a menor quantidade
possível. Para isso, tenta-se diminuir o tamanho de suas partículas ao máximo,
permitindo uma maior área de contado com menos material (platina).
Atualmente, a nanotecnologia está revolucionando a viabilidade das células
combustíveis, permitindo otimizar o uso dos catalisadores e aumentando o
rendimento dessa tecnologia.
Alguns tipos de células combustíveis, consideradas de alta temperatura,
não necessitam de um catalisador tão eficiente como a platina, pois em altas
temperaturas, as reações ocorrem mais rápidas, logo, um catalisador mais barato
como o níquel já é de bom tamanho.
Segundo Gomes Neto (2005, p.108), nos últimos dez anos, as empresas
automobilísticas conseguiram diminuir o uso de platina em cada veículo em 10%,
estando agora em 2 gramas. O objetivo é chega a apenas 0,2 gramas por veículo.
O custo da platina equivale a 3% de todo o sistema de célula a combustível, que
também inclui sensores e outros componentes básicos.
29

Em síntese, é possível reciclar até 98% da platina utilizada em uma célula


a combustível que teve sua vida útil terminada.

d) Eletrólito
É no eletrólito, chave de todo o processo, onde ocorrem as principais
reações da célula a combustível. Ele pode ser líquido, sólido, ou em forma de
uma membrana e sua função é permitir que apenas os íons positivos (H+), os
chamados prótons, atravessem-no, indo ao encontro das moléculas de oxigênio
no eletrodo oposto da célula. O eletrólito é construído quimicamente para ter essa
propriedade e função. Já os elétrons (e-) que não conseguem atravessar o
eletrólito, passam por um circuito externo, onde será aproveitada a energia
elétrica.

2.2.3 Princípio de funcionamento

Apesar de existirem vários tipos de células a combustível, todas possuem


um princípio de funcionamento bem parecido. Sendo assim, será mostrado o
principio básico da célula combustível, que é usado na célula mais estudada e
que mais se desenvolve atualmente no mundo, além de ser a menos poluente: a
Célula Combustível de Membrana de Troca de Prótons (PEMFC).
Eis o princípio: quando o gás hidrogênio pressurizado entra no lado do
ânodo, terminal negativo da célula combustível (fig.2.4), ele passa por canais de
fluxo desenhados (placa de fluxo de gases), chegando ao catalisador, que separa
a molécula de hidrogênio (H2) em íons positivos (H+), (que são também chamados
de prótons) e em elétrons (e-). Isso é representado como:

H2  2H+ + 2e-

Mas, como para cada molécula de oxigênio (O2) é preciso duas moléculas
de H2 para formar água, a reação do hidrogênio será representada duplicada,
assim:

2H2  4H+ + 4e- (1)


30

Dessa maneira, os elétrons (e-) são conduzidos pelo eletrodo, passando


pelo circuito externo e formando uma corrente elétrica no sentido do terminal
negativo (ânodo) para o cátodo (positivo). Essa é a corrente gerada pela célula a
combustível, que será empregada na devida aplicação. Enquanto isso, os gases
de hidrogênio (H2) que não foram quebrados pelos catalisadores serão
realimentados até serem quebrados também em prótons e elétrons (H+ & e-).
Já no lado oposto da célula a combustível (cátodo), é o gás oxigênio que é
bombeado contra o mesmo, até chegar ao catalisador que envolve o eletrólito. Aí
chegando , a molécula de oxigênio (O2) combina-se com os prótons de hidrogênio
(H+), que atravessaram a membrana (eletrólito), e com os elétrons que chegam
pelo terminal positivo (cátodo), formando água, de acordo com a reação abaixo:

O2 + 4H+ + 4e-  2 H2O (2)

Observe todo o processo na figura 2.3:

Figura 2.3: Funcionamento básico e Reações de uma célula a combustível. Fonte: internet
31

Além dos componentes básicos para o funcionamento da célula a


combustível, já descritos, existem outros componentes importantes para essa
tecnologia.
Entre os demais componentes das células combustíveis, estão os coletores
de corrente, as placas de fluxo de gases e os backings layers. Ver figura 2.3.

a) Backing layers
Os eletrodos da célula combustível, ânodo e cátodo, são envolvidos pelos
backing layers, camada de materiais condutores, como o carbono, para que os
elétrons consigam passar do ânodo para o cátodo pelo circuito externo.
Além de condutores, os backing layers devem ser porosos, de forma que
permitam a difusão dos gases, ou seja, estes devem fluir de fora para dentro da
célula combustível.
Para que a célula combustível funcione corretamente, ela precisa estar a
um nível de umidade adequada. A membrana precisa estar úmida, mas não
encharcada, caso contrário, fica difícil a entrada dos gases hidrogênio e oxigênio.
Os backing layers têm mais uma importante função na célula combustível: ajuda a
regular a quantidade de água ideal para o funcionamento da célula, permitindo,
inclusive, a eliminação da água produzida no cátodo.

b) Placa de fluxo de gases e coletora de corrente


Nas extremidades da célula combustível, pressionadas contra os backing
layers, existem duas placas iguais, com as funções de distribuir os gases e coletar
a corrente elétrica gerada na membrana (eletrólito). Geralmente composta por
metais ou grafite, essas placas devem ser, além de leves e resistentes,
impermeáveis aos gases.
No lado da placa que fica pressionado contra o backing layer existem
canais desenhados para levar os gases até o local onde vão ocorrer as reações.
Esses desenhos devem ser feitos de modo que os gases cheguem ao catalisador
e à membrana de forma uniforme, além de permitir a entrada e a saída de água
na membrana.
Os elétrons produzidos na quebra das moléculas de hidrogênio (H2) são
conduzidos do ânodo (-), passando pelo backing layer e pela placa de fluxo de
32

gases e coletora de corrente até chegar ao circuito externo e, em seguida,


voltando à célula combustível pelo cátodo.

c) Pilha de célula combustível com placa bipolar


De acordo com Gomes Neto (2005, p.101), uma célula combustível ideal
seria capaz de fornecer uma tensão por volta de 1,16 volts em circuito aberto
(sem passagem de corrente elétrica), porém, como na prática é impossível
alcançar um rendimento de 100%, só se alcança cerca de 0,9 volts por unidade
de célula combustível.
Como a tensão fornecida por uma unidade de célula combustível é muito
baixa para ser usada em várias aplicações, como em um motor elétrico de um
automóvel, que requer tensões acima de 200 volts, a solução é obter uma maior
tensão através de conexões entre várias células individuais. Essas conexões
formam as chamadas pilhas de células a combustível.
Para se conectar várias unidades de células combustíveis, não basta
apenas colocá-las lado a lado, pois assim, ânodo e cátodo de células distintas
também estariam lado a lado. Para contornar isso, utiliza-se a placa bipolar, como
mostra a figura 2.4 em verde. Essa placa distingue-se da placa de fluxo de gases
e coletora de corrente por apresentar desenhos para o fluxo de gases em ambos
os lados. Ver figura 2.4.

Figura 2.4: Pilha de célula a combustível. Fonte: Santos, 2004


33

Uma pilha de células a combustível pode ter dezenas ou centenas de


células conectadas em série. E várias pilhas de células a combustível podem ser
associadas em série ou paralelo a fim de se obter a potência desejada.

d) Membrana de troca de prótons


No centro da célula combustível, o eletrólito e o catalisador funcionam
como a principal lógica do processo. Uma das tecnologias de células
combustíveis mais pesquisadas e em desenvolvimento em todo o mundo é a
PEMFC (Célula a Combustível de Membrana de Troca de Prótons), a preferida
para uso em automóveis. Nessa tecnologia, o eletrólito é uma membrana plástica,
revestida pela platina em pó, como catalisador.
O rendimento das células a combustível aumenta devido ao
desenvolvimento do eletrólito.
Geralmente, o material usado na membrana plástica de células
combustíveis PEMFC é um polímero chamado Nafion, semelhante no Teflon.
Essa membrana é produzida pela fábrica DuPont.
Quando em contato com água, a membrana absorve esse líquido e
possibilita que os íons positivos presentes na mesma possam se mover e
atravessar de um lado para o outro da célula combustível. Já os íons negativos
ficam presos à estrutura da membrana, permitindo que sejam conduzidos por um
circuito externo, gerando corrente elétrica, ou seja, na presença da água os
prótons ganham mobilidade, enquanto os elétrons ficam presos à membrana.
Apenas íons positivos (prótons) conseguem transitar na membrana.
Segundo a empresa Brasil H2 Fuel Cell Energy, atualmente, estão
chegando ao mercado novas membranas, além do Nafion. Membranas essas,
que devem aumentar o rendimento de algumas células a combustível em 50%, o
que viabiliza cada vez mais essa tecnologia no mercado.

2.2.4 Sistema de célula a combustível

O sistema de célula a combustível consiste no módulo de células


individuais com sua devida potência, associado juntamente com todos os seus
dispositivos periféricos. Esse módulo pode estar associado a outros demais para
34

uma maior potência. Já os dispositivos incluem sensores de temperatura,


pressão, compressores, controladores, etc.

a) Módulo de célula a combustível


O Módulo de célula a combustível é um agrupamento de várias células
individuais, gerando uma determinada potência. Ainda há a possibilidade de se
conectar vários módulos.
É no módulo da célula a combustível onde os gases reagentes são
injetados para fornecerem energia elétrica para uma determinada aplicação.
Ainda nesse módulo estão presentes diversos componentes eletrônicos para
controlar as condições de funcionamento das células combustíveis.

b) Distribuidor de energia
O Distribuidor de Energia recebe a eletricidade do módulo e a transmite
para a aplicação, como por exemplo, para um motor elétrico, além disso, ainda
fornecem energia para todos os componentes e atuadores do próprio sistema de
célula a combustível. Ventiladores, compressores e todos os equipamentos
periféricos recebem a eletricidade diretamente do distribuidor.
Em uma aplicação automotiva, o distribuidor apresenta também, a
importante função de gerenciar a energia transmitida para o ultra-capacitor ou
bateria nas frenagens regenerativas de um automóvel, aumentando o rendimento
do veículo.

c) Processador de combustível
O combustível pode chegar ao módulo de célula combustível de duas
maneiras: a primeira e mais simples consiste em injetar, por meio de um
compressor, os gases hidrogênio e oxigênio no módulo, isso, se a célula operar
com o hidrogênio já reformado. Já para células que aceitam combustíveis não
reformados, como gás natural, biogás ou etanol, será necessário um Processador
de Combustível. Esse processador possui um reformador para extrair o
hidrogênio, associado a um purificador, que vai retirar as impurezas do hidrogênio
para então chegar ao compressor.
35

d) Módulo do sistema
O Módulo do Sistema tem a função de entregar os gases hidrogênio e
oxigênio ao Módulo de Célula Combustível, já com a temperatura, umidade e
pressão adequadas. Para isso, ele dispõe de um compressor de ar, um
umidificador e outros dispositivos eletrônicos.

e) Unidade de controle
A Unidade de Controle é responsável pelo monitoramento de todo o
Sistema de Célula a Combustível, de forma computadorizada, fazendo com que
os módulos troquem informações com o restante dos componentes para que o
sistema receba comandos ou solicitações, como o fornecimento adequado de
energia para o funcionamento de atuadores, etc.
Veja na figura 2.5 um sistema de célula a combustível que incorpora os
componentes citados.

Figura 2.5: Sistema de Célula a Combustível da Ballard Power Systems. Fonte: Internet
36

2.2.5. Vantagens das células combustíveis

A seguir, serão apresentadas algumas vantagens das células combustíveis


no tocante a outros meios de se utilizar energia, como geradores a diesel ou
baterias convencionais.
Os tópicos seguintes se referem a várias aplicações energéticas, como
geração de energia estacionária, transporte e aparelhos portáteis.

a) Geração de energia descentralizada (distribuída)


De acordo com Gomes Neto (2005, p.76), entre 10 a 20% da eletricidade
que trafega pelas linhas de transmissão até chegar às residências dos
consumidores é perdida, principalmente, na forma de calor. Isso ocorre porque a
produção de energia elétrica é centralizada longe da maioria dos consumidores.
Além das perdas, gasta-se uma parte da energia produzida para que a mesma
trafegue pelas linhas de transmissão.
Para contornar o problema da geração centralizada há a alternativa da
geração de energia distribuída ou descentralizada. Esse tipo de geração consiste
em produzir a eletricidade nas proximidades das residências e centros urbanos,
evitando perdas com distância e gastos com transporte.
A geração distribuída também pode ser utilizada como backup de energia
em grandes centros comerciais, hospitais e indústrias, em caso de problemas
com a linha de transmissão convencional.
Há várias maneiras de se produzir eletricidade a pouca distância ou no
próprio local de consumo. Por exemplo, em locais isolados, podem-se usar
células a combustível que utilizem diretamente o gás natural, o metano, ou o
etanol, como já ocorre em uma pequena comunidade no Brasil chamada Pico do
Amor, em Mato Grosso.
Eletrolisadores acoplados a células fotovoltaicas também podem ser uma
boa alternativa. Durante o dia, esse sistema faz uso da a energia solar,
produzindo eletricidade para ser utilizada pelo consumidor e, ainda, produz
hidrogênio através da eletrólise, que será armazenado em tanques cilíndricos
para que, à noite, quando as células solares são inúteis, o hidrogênio estocado
entre em ação numa célula a combustível e produza eletricidade para ser
consumida.
37

Outra forma de produção estacionária de energia elétrica é a que se dá


através dos automóveis a célula a combustível. No ano de 2008 se deu início à
produção em série de veículos com essa tecnologia e várias montadoras já se
manifestam em relação ao início de suas produções. Com uma potência em torno
de 100 kWh, um automóvel abastecido com hidrogênio pode muito bem abastecer
uma residência com eletricidade, quando necessário.

b) Diminuição das partes móveis (Maior confiabilidade, diminuição da


poluição sonora e freática)
Um motor a combustão possui diversas partes móveis, como por exemplo,
os pistões e o sistema de transmissão.
Essas partes móveis produzem o ruído característico dos motores a
combustão, a chamada poluição sonora, que causa um desconforto aos ouvidos
da população, principalmente, nas grandes cidades. Além disso, várias peças se
movimentando constantemente durante o funcionamento de um motor a
combustão aumentam a probabilidade de uma pane, diminuindo a confiabilidade
do sistema. Por isso, é preciso que se façam manutenções com mais freqüência.
Ressalta-se ainda, o problema da poluição do meio ambiente, uma vez que o óleo
lubrificante utilizado nas partes móveis do motor, quando descartado, polui os
lençóis freáticos.
Em suma, um sistema de célula combustível, alimentando um motor
elétrico, traz as vantagens de não emitir ruídos, de reduzir as partes móveis do
motor e utilizar menos óleo lubrificante.

c) Comparação entre o motor elétrico e o motor a combustão


O funcionamento de um motor elétrico é bastante diferente de um motor a
combustão. Enquanto o primeiro converte a eletricidade obtida através da energia
química (caso das células combustíveis) em energia mecânica, o segundo, por
sua vez, converte a energia química em calor através da combustão. Após essa
conversão, o calor será utilizado para gerar uma expansão de gases, envolvendo
várias partes móveis do motor para gerar energia mecânica. Porém, durante a
combustão, parte do calor a ser convertido para energia mecânica é perdido para
o meio externo, deixando o sistema pouco eficaz, processo chamado de ciclo de
Carnot.
38

Quanto maior for a diferença entre a temperatura da fonte de energia (T1) e


a temperatura ambiente (T2), maior será a eficiência do motor a combustão, como
é mostrado na equação 2.2:

Equação 2.2: Máxima eficiência de uma máquina térmica.


Fonte: (GOMES NETO, 2005)

As células combustíveis convertem energia química diretamente em


energia elétrica, assim, não há conversão de energia térmica em mecânica, não
obedecendo ao Ciclo de Carnot.
Segundo Gomes Neto (2005, p.137), o rendimento de um motor a gasolina
está na faixa de 13% a 25%, enquanto o motor a diesel fica entre 30% a 35%.
Uma célula a combustível, no entanto, atinge 48% a 60%, podendo chegar ainda
a 80% caso o calor liberado na reação seja aproveitado para aquecimento de
água geradora de vapor. Um motor elétrico alcança o rendimento de 95%, como
esse motor será empregado juntamente com a célula a combustível, somam-se
as duas eficiências para obter a eficiência total do sistema.
Além do melhor rendimento, o motor elétrico apresenta outras vantagens
em relação a um motor a combustão: a primeira é o fato de ser silencioso,
enquanto o motor a combustão é barulhento e necessita de lubrificantes
(poluidores do ambiente) devido ao grande número de peças móveis, o que
dificulta e encarece a manutenção.
Por outro lado, com o motor a eletricidade, tem-se a possibilidade de
utilizar a frenagem regenerativa, que nada mais é do que armazenar nas baterias
ou ultracapacitores dos veículos a energia gerada pelo motor durante as
frenagens do automóvel, uma vez que durantes esses momentos o motor elétrico
funciona como gerador.
Com as células a combustível, espera-se utilizar um motor elétrico em cada
roda, como mostra o projeto do AUTOnomy da GM, eliminando, assim, os
sistemas de transmissão e aumentando consideravelmente o espaço interno do
veículo, ou deixando-o mais compacto. Ver figura 2.6:
39

Figura 2.6: AUTOnomy da GM. Fonte: General Motors

Enfim, como prejuízo maior, a queima de combustíveis que ocorre com o


motor a combustão acaba expelindo grandes quantidades de dióxido de carbono
(CO2), além de combustíveis não queimados, como monóxido de carbono e até
mesmo fuligem e dióxido de enxofre.

d) Comparação entre a célula combustível e uma bateria


Comparando-se a célula combustível a uma bateria, nota-se que tanto a
célula combustível quanto a bateria convencional realiza reações eletroquímicas
para produzir eletricidade. A diferença principal entre esses dispositivos é que as
baterias armazenam seu combustível necessário para gerar eletricidade
internamente, enquanto as células combustíveis utilizam o combustível advindo
do meio externo, que é o caso dos tanques de hidrogênio. Com isso, a célula
combustível apresenta a vantagem de poder ser reabastecida depois de
consumido todo o seu tanque externo de combustível, porém, uma bateria
convencional, ao fim de seu combustível interno, é descartada.
A célula a combustível ainda leva a vantagem de ser mais leve e ter uma
capacidade de armazenamento de energia maior que as baterias. Porém, essas
últimas não devem ser desprezadas, pois em projetos de carros híbridos –
utilizando-se as duas tecnologias – é possível alcançar uma grande autonomia e
aumentar bastante a vida útil tanto da célula a combustível, quanto da bateria.
40

2.2.6. Aplicações

Gradativamente, as células combustíveis com suas várias aplicações


ganham espaço no cenário energético mundial. Aplicações dessas aplicações já
estão disputando vaga no mercado com tecnologias conhecidas, enquanto outras
estão em fase de testes.
Dentre as principais aplicações com o uso das células a combustível,
destacam-se as serventias em transporte, geração de energia estacionária,
proveito em portáteis e aplicações militares.
A tabela 2.1 expõe os preços estimados dos equipamentos relacionados às
suas potências e aplicações para que sejam viáveis comercialmente. Por
exemplo, se um veículo, que é uma aplicação de transporte, fornece 100 kW de
potência, para saber se o preço é viável basta multiplicar 100 por 50, obtendo-se,
assim, $5.000, preço estimado para um sistema de célula combustível veicular
economicamente viável, em dólares.

Aplicação Preço ideal para viabilidade comercial (Dólar)


Transportes $50 por kW
Residências $300 a $500 por kW
Centros Comerciais, Hotéis, Hospitais $1.200 a $3.000 por kW
Estações de Energia $1.000 a 1.500 por kW
Portáteis $5.000 a $10.000 por kW
Tabela 2.1: Preços estimados para viabilidade das células combustíveis. Fonte: (GOMES NETO,
2005)

a) Transportes
As células combustíveis podem ser empregadas vastamente no setor dos
transportes, seja terrestre, marítimo ou aéreo, em aplicações como nos
automóveis, motocicletas, transportes coletivos, barcos, empilhadeiras, aviões e
trens, podendo, assim, substituir um motor a combustão.
Entre os anos 2008 e 2009, a previsão é de que sejam produzidos em
maiores escalas. Desde a década passada já são produzidos e testados vários
protótipos, sendo que a previsão das próprias montadoras é de que em 2015
esses automóveis já ocupem uma boa parcela no mercado mundial.
41

Em relação aos transportes públicos, já circulam há alguns anos, em


projetos experimentais, vários ônibus movidos a hidrogênios em cidades dos
EUA, Japão, China, Austrália, Islândia, Alemanha, Espanha, Portugal e outros
países. No Brasil, tais projetos também já foram lançados, envolvendo as cidades
de São Paulo e Rio de Janeiro, com uma estimativa de que estejam nas ruas
entre 2008 e 2009.
Contudo, para que as células combustíveis se tornem definitivamente
viáveis ao setor dos transportes, precisam alcançar ou melhorar algumas
características, a começar pelo preço, que vem diminuindo em torno de 25% ao
ano de acordo com a empresa Brasil H2 Fuel Cell Energy. Até poucos anos
atrás, a autonomia de um veículo a célula a combustível chegava a 100 ou 200
quilômetros, o que hoje já chega a 700 km, sendo ainda mais compactas.

a1) Veículo híbrido


Os veículos a células combustíveis adotam uma combinação híbrida para
gerar eletricidade com alto rendimento e autonomia. Para isso, são utilizados
ultracapacitores ou baterias de lítio-íon dando suporte à célula combustível.
Durante algumas ocasiões, nas estradas ou ruas, os carros passam por
situações em que é necessária uma alta demanda de potência, como ocorre nas
acelerações. Assim sendo, essas situações pedirão mais potência e a célula a
combustível teria que produzir mais energia elétrica. Essas variações de potência
prejudicariam a vida útil da célula. Para contornar isso, os automóveis adotam
sistemas híbridos.
Quando o veículo elétrico utiliza apenas uma bateria para gerar energia,
esse veículo apresenta uma baixa autonomia. Por outro lado, ao utilizar várias
baterias, o automóvel apresenta uma maior autonomia, mas, além da sobrecarga
de peso, a vida útil dessas baterias continua sendo menor do que em um sistema
híbrido, pois passam por maiores descargas, é o que afirma a empresa Brasil H2
Fuel Cell Energy.
O funcionamento de um veículo híbrido consiste em gerar eletricidade a
partir de uma célula a combustível e estocá-la em uma bateria ou ultra-capacitor
para, então, alimentar um ou mais motores elétricos. Desse modo, é possível
utilizar células combustíveis de menores potências, diminuindo os custos, visto
42

que a bateria ou ultra-capacitor suprirá o veiculo com a potência necessária em


momentos de variação brusca de aceleração.
Assim, tanto a célula a combustível terá uma maior vida útil, pois não
sofrerá grandes variações de potência, quanto a bateria, que estará sempre
alimentada pela célula, não sofrendo fortes índices de descarga.
Além disso, a bateria ou ultra-capacitor proporcionará ao veículo a
chamada frenagem regenerativa. Isto é, em momentos de frenagem, o motor
elétrico funciona como um gerador, carregando a bateria e poupando combustível
da célula a combustível.
E, para finalizar, a utilização de uma bateria ou ultra-capacitor em um
veículo de célula a combustível permite que este seja abastecido diretamente na
tomada de casa, numa situação de emergência, caso haja dificuldade de se
encontrar postos a hidrogênio, o que é bastante comum hoje e durante os
próximos anos na maior parte do mundo.

a2) Montadoras
Aproximadamente vinte empresas estão desenvolvendo automóveis
movidos por células a combustível, em parcerias com órgãos governamentais,
indústrias ou outras fábricas em todo o mundo. Na União Européia, EUA,
Austrália, Japão, China, inclusive no Brasil, existem 12 empresas desenvolvendo
ônibus a células a combustível.
A Honda foi a primeira empresa a obter um certificado para uso diário de
um veículo movido por célula a combustível. Hoje, conta com o FCX, que teve sua
primeira versão em 1999 e que em 2002 recebeu a aprovação da Agência de
Proteção ao Meio-Ambiente nos EUA, para utilização do referido veículo que
apresentou emissão zero de poluentes. Seu princípio de funcionamento consiste
numa célula a combustível que produz energia elétrica para carregar uma bateria
de lítio-íon, garantindo uma potência adequada para acelerações e
ultrapassagens, além de dar suporte à frenagem regenerativa, ajudando a
economizar combustível. Nesse caso, o hidrogênio é armazenado em tanques no
seu estado gasoso em alta compressão.
De acordo com a Honda, o novo modelo, FCX Clarity, armazena pouco
mais de 4 kg de hidrogênio gasoso comprimido a 500 psi, alcançando uma
autonomia de 460 km, 20% a mais que seu antecessor. O sistema de célula
43

combustível mais a bateria diminuiu 65% em tamanho. Com uma potência elétrica
de 100 kW, equivalente a 134 CV, sua velocidade máxima chega a 170 km/h e
possui um torque maior do que muitos veículos convencionais de potência
equivalente.
Esse veículo começou a ser produzido em larga escala no Japão no dia 16
de junho de 2008 (fig.2.7). A Honda espera entregar ao mercado consumidor dos
EUA 200 veículos até 2010 a um custo de US$ 21.600, preço incentivador, graças
a subsídios do governo americano.

Figura 2.7: Início da produção em larga escala do FCX Clarity no Japão. Fonte: Carplace

Além da Honda, muitas empresas pretendem lançar seus veículos a célula


combustível no mercado entre 2012 e 2015. Pode-se citar, por exemplo, a
General Motors, empresa que mais investe em células combustíveis automotivas;
a DaimlerChrysler/Mercedes-Benz, com uma grande frota de veículos e ônibus já
em testes ou comercializados; a Ford Motors; a Volkswagen; a Audi; a BMW; a
Nissan; a Peugeot; a Fiat; a Hyundai.

b) Geração de energia estacionária


Segundo Gomes Neto (2005, p.145), é considerada geração de energia
estacionária aplicações acima de 5 kW, as quais são empregadas em grandes
centros industriais, hotéis e residências, onde, nessas últimas, são utilizadas
células combustíveis de baixa temperatura, como a PEMFC, também utilizada em
44

veículos. Para as demais aplicações estacionárias são utilizadas células de alta


temperatura. Essas aplicações estacionárias podem funcionar abastecendo um
local de maneira contínua ou apenas em emergência e back-up.
Cidades como Curitiba, Rio de Janeiro e São Paulo já vêm utilizando essa
tecnologia em grandes centros comerciais, indústrias, hotéis, hospitais e
empresas de telecomunicações, concorrendo com os geradores a diesel e bancos
de baterias.
Aqui no país, na cidade de Curitiba, a empresa Brasil H2 Fuel Cells Energy
está colocando no mercado uma linha de células a combustível tanto estacionária
como móveis na faixa de 12 watts até 5 kW de potência. Segundo o diretor da
empresa, o engenheiro Emilio Hoffman Gomes Neto, é surpreendente a evolução
dessa tecnologia, seja na compactação quanto no desempenho. Há dois anos,
uma célula de 1,2 kW que pesava 13 kg está no mercado com a mesma potência
pesando apenas 5 kg e com um terço do preço anterior.
Além de serem mais compactas do que as células combustíveis anteriores,
apresentando melhor desempenho e maior vida útil, as células combustíveis
estão caindo de preço em torno de 25% ao ano.
Uma das maiores usinas de energia a células a combustível do mundo
encontra-se na Coréia do Sul. Recentemente, a Posco Power, empresa
energética desse país, anunciou a compra de uma planta de células combustíveis
de 25,6 MW da FuelCell Energy com um custo de 70 milhões de dólares. Como
essa empresa de energia, anteriormente, já havia adquirido algumas células a
combustível, sua potência totalizará 38,2 MW de potência instalada, tornando se
uma das maiores.
Esse país acredita que as células a combustível ajudarão a diminuir os
gases poluentes e causadores do efeito estufa e outros problemas ambientais.
Segundo Brasil H2 Fuel Cell Energy, a emissão de óxidos de nitrogênio e enxofre
(NOX e SOX), que causam problemas respiratórios, e a chuva ácida, chegam a
ser 99% menor com a utilização da célula combustível do que se fosse utilizada a
queima de combustíveis.
Um dos pontos fortes dessa tecnologia é a possibilidade da utilização de
diversas fontes de energia, o que acontece na Coréia. A energia utilizada pela
Posco Power (fig.2.8) é proveniente do gás natural, do biogás, do lixo urbano e do
esgoto, sendo aproveitada por células combustíveis de carbonato fundido (MCFC)
45

que apresentam um rendimento entre 47 e 53%, superando outros métodos de


utilização das formas de energia em questão em torno de 30 a 35% (geradores a
combustão e turbinas). Esse rendimento da célula combustível poderá chegar aos
80%, caso se utilize o calor residual da célula.

Figura 2.8: Posco Power - Usina de Energia através de célula combustível na Coréia do Sul.
Fonte: Brasil H2 Fuel Cell Energy

c) Portáteis
Aplicações de células a combustível em portáteis podem estar presentes
em qualquer aparelho eletrônico que utilize uma pilha ou bateria, como o caso dos
laptops, mp3 players, telefones celulares, sendo ainda possível a geração de
energia de forma remota, como em um deserto ou acampamento.
Essas aplicações podem atingir uma potência média de 3 kW, utilizando
fontes de energia ricas em hidrogênio para gerar energia elétrica, como o
metanol, o etanol e até água com açúcar.
O combustível mais usado nesse caso é o metanol, um álcool com grande
teor energético, que abastece uma célula combustível do tipo DMFC (Célula
Combustível de Metanol Direto). Nessas aplicações portáteis, o metanol muitas
vezes é utilizado dissolvido em água.
A Sony afirma que aplicações de células a combustível em portáteis, já
tenha alcançado a viabilidade comercial. Tais aplicações ocorrem por meio de um
46

novo sistema híbrido portátil que associa a célula combustível alimentada com
metanol ao uso de uma bateria secundária de lítio, alcançando uma potência de 3
kW. Com isso, os engenheiros da empresa acreditam que alcançaram o nível
necessário para produção e comercialização viáveis de portáteis com
microcélulas combustíveis (fig. 2.9). A autonomia de um aparelho celular, por
exemplo, que utiliza essa tecnologia já atinge 14 horas ininterruptas de utilização,
com apenas dez mililitros (10 ml) de metanol. A tendência é de que se atinja uma
autonomia ainda maior.

Figura 2.9: Célula Combustível híbrida da Sony. Fonte: Internet

Várias empresas eletrônicas desenvolvem laptops alimentados com célula


a combustível com o objetivo de aumentar a autonomia desses aparelhos e
ganhar mercado. Entre elas, pode-se mencionar a Samsung Eletro-Mechanics,
possuidora de um projeto de um laptop que alcança uma autonomia de até um
mês de uso. Nesse caso, o tamanho da célula combustível ainda é elevado, mas
já existem aparelhos com uma autonomia de até 15 horas, que são mais
compactos. A Nec, por exemplo, espera alcançar 40 horas de autonomia em seus
laptops de célula a combustível. A seguir é mostrado um exemplo de Laptop a
célula combustível na figura 2.10.
47

Figura 2.10: Laptop de célula combustível a Metanol Direto da Lg. Fonte: Internet

d) Aplicações militares
Muitas tecnologias, antes de chegarem ao mercado, são desenvolvidas
para aplicações militares, como aconteceu com a internet e o GPS. O mesmo
ocorreu com as células combustíveis. Na década de 60, o exército americano já
utilizava essa tecnologia em aplicações remotas.
Por possuírem um alto rendimento e autonomia, as referidas células são
ideais para aplicações militares, pois geram energia para os transportes, ao
mesmo tempo em que diminui a quantidade de combustível necessária para
percorrer grandes distâncias e produzem água potável que pode ser ingerida
pelos soldados. Além disso, por serem mais silenciosas que um gerador a diesel
ou um motor a combustão, proporcionam um maior desempenho nas missões. A
figura 2.11 mostra um veículo militar equipado com célula combustível.
48

Figura 2.11: Veículo militar GM equipado com sistema de célula combustível. Fonte: Internet

2.2.7. Tipos de células a combustível

Além da Célula a Combustível de Membrana por Troca de Prótons


(PEMFC), citada anteriormente, existem vários outros tipos de células, todas
trabalhando em torno do princípio de se obter eletricidade através do hidrogênio.
Abordar-se-ão a seguir: PEMFC, DMFC, SOFC, MCFC, PAFC e DEFC.
Essas células combustíveis se diferenciam pelo tipo de combustível, pelo
eletrólito que utilizam e pela reação química que ocorrerá através deste último.
Além disso, as células combustíveis podem se dividir de acordo com a faixa de
temperatura que operam: de alta temperatura ou baixa temperatura. Sendo assim,
cada célula é utilizada para o tipo de aplicação que seja mais adequado. Por
exemplo, células combustíveis de alta temperatura, como a SOFC (Célula a
Combustível de Óxido Sólido), que opera em até 1000 °C são utilizadas na
indústria, onde a demanda de potência é alta. Porém, em um portátil isso não
seria possível, nesse caso, é mais cotada a DMFC (Célula a Combustível de
Metanol Direto), que opera em baixa temperatura, 50 a 200 °C, e além disso, o
metanol é fácil de transportar.
49

a) PEMFC – Célula a Combustível de Membrana de Troca de Prótons (Proton


Exchange Membrane Fuel Cell)
A célula a combustível de membrana de troca de prótons foi desenvolvida
pela empresa General Electric nos anos 50 e utilizada pela NASA nos projetos
espaciais Gemini e Apollo na década de 60, segundo Marques (2004, p.33). Hoje
representa a tecnologia de célula a combustível mais cotada para substituir os
motores de combustão interna nos veículos motorizados do futuro. Isso, pelo fato
de proporcionar um alto valor de potência por unidade de massa e ser uma célula
de baixa temperatura, não necessitando atingir elevadas temperaturas para
funcionar, o que proporciona um arranque rápido. Dessa maneira, várias
montadoras investem nesse tipo de célula.
Seu princípio de funcionamento, já comentado anteriormente, é bastante
simples. Utiliza-se um eletrólito em forma de membrana polimérica, que permite a
passagem somente dos íons positivos de hidrogênio do ânodo, os prótons que
por sua vez, ao atravessarem a membrana, combinam-se com moléculas de
oxigênio, no lado oposto, no cátodo, e com os elétrons provenientes de um
circuito externo, formando água. Esses elétrons trafegam do ânodo até o cátodo,
não pela membrana, mas por um circuito elétrico externo, do qual será
aproveitada a corrente elétrica para a aplicação desejada. Como na figura 2.12:

Figura 2.12: (PEMFC) Célula Combustível de Membrana de Troca de Prótons. Fonte: Marques,
2004
50

A seguir, serão abordadas as reações que ocorrem nesse tipo de célula a


combustível (Equação 2.3):

Equação 2.3: Reações em uma célula a combustível do tipo PEMFC. Fonte: Marques, 2004

Para quebrar a molécula de hidrogênio (H2) é necessária a presença de um


catalisador que também tem como função acelerar a reação, principalmente a
baixas temperaturas. Como a PEMFC é uma célula de baixa temperatura,
operando entre 60 a 100 °C, torna-se necessário um catalisador bastante
eficiente, que seria a platina, utilizada nos eletrodos e no revestimento da
membrana, o eletrólito.
A referida célula exige um hidrogênio altamente puro, que sendo extraído
através de reforma de outro combustível, como o gás natural ou o etanol, ainda
deverá ser filtrado para eliminar possíveis contaminações de gás carbônico ou
enxofre, que danificam o catalisador e a membrana polimérica.
Para que todas essas reações ocorram, a célula deverá estar úmida o
suficiente para a troca iônica, porém, não encharcada, sob pena de o hidrogênio e
oxigênio não conseguirem penetrá-la, comprometendo a reação. Em locais com
temperatura abaixo de zero, haveria o risco de a água congelar, criando
pequenos cristais de gelo, que rasgariam a membrana. Por esses e outros
motivos, são necessários vários sistemas de controle monitorando, por exemplo,
a entrada dos gases e a temperatura da água no sistema. Esse monitoramento é
imprescindível não apenas na PEMFC, mas em todos os tipos de células
combustíveis.
Na visão de Gomes Neto (2005, p.157), o rendimento dessa célula
combustível pode alcançar 55%, devendo aumentar em breve, devido às novas
membranas desenvolvidas ultimamente.
Nas aplicações de transportes, essa célula tem alcançado uma vida útil em
torno de 4.000 horas, o que equivale a um motor de combustão rodar mais de
170.000 km. O objetivo atual é de se chegar a uma faixa entre 5 a 8 mil horas de
51

vida útil. Ao fim dessa vida útil, pode-se recuperar até 98% da platina empregada
na célula.
Esse tipo de célula é empregado também em aplicações estacionárias, em
indústrias e em residências localizadas em lugares de difícil acesso, a exemplo do
que já ocorre em algumas regiões do Brasil. Nesses casos, a vida útil ideal de
uma PEMFC seria de 40.000 horas, atualmente, ultrapassando as 20 mil horas.

b) DMFC – Célula a Combustível de Metanol Direto


A célula a combustível de metanol direto ou DMFC (Direct Methanol Fuel
Cell) também é uma célula combustível que utiliza uma membrana ao modo da
PEMFC. É também uma célula de baixa temperatura, operando entre 50 a 220
°C, sendo muito utilizada em aplicações portáteis.
A célula em estudo utiliza diretamente o metanol como combustível. O
metanol é um tipo de álcool inserido no ânodo da célula após diluído em água em
baixas concentrações de 30%. Na presença do catalisador, esse metanol se
dissocia em hidrogênio e dióxido de carbono, isso devido à platina. Deste modo, a
célula combustível permite apenas a passagem do hidrogênio pela membrana,
liberando água e dióxido de carbono (CO2). Este último é eliminado no próprio
ânodo, enquanto a água, formada no cátodo, é eliminada no mesmo. Ver figura
2.13:

Figura 2.13: Célula a Combustível de Metanol Direto (DMFC). Fonte: Internet


52

A reação global fica: CH3OH + 3/2 O2  CO2 + 2H2O.


O fato de o metanol ser encontrado no estado líquido, sob condições
normais de pressão e temperatura, faz com que ele seja capaz de armazenar
mais hidrogênio em sua estrutura em um dado volume, do que se fosse utilizado o
próprio hidrogênio no estado gasoso. Isso permite a praticidade no seu transporte,
por isso, o metanol é uma das melhores opções de aplicações em portáteis, ao
lado do etanol, com finalidade de aumentar consideravelmente a autonomia de
aparelhos como, por exemplo, laptops, celulares e mp3 players.
Afirma Gomes Neto (2005, p.156) que o rendimento dessa célula estaria
entre 40 a 50%, mas de acordo com a Dra. Paula T. Hammond, integrante do
Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MTI) apud Brasil H2 Fuel Cell Energy,
esse rendimento tende a aumentar em 50% no ano de 2009, devido a uma nova
membrana desenvolvida pelos engenheiros do MTI, para atuar como eletrólito,
substituindo o Nafion, atual membrana utilizada. Ver figura 2.14:

Figura 2.14: Nova membrana desenvolvida pela MTI. Fonte: Internet

Segundo a Dra. Paula T. Hammond, a nova membrana a que nos referimos


anteriormente além de apresentar um maior desempenho que as convencionais,
sua fabricação traz um menor custo. Isso faz com que as células de metanol
estejam a um passo de entrarem no mercado dos portáteis. O desenvolvimento
de novas membranas poliméricas também pode beneficiar outras células que
utilizam esse tipo de eletrólito, como a PEMFC e a DEFC.
53

c) PAFC – Célula a Combustível de Ácido Fosfórico


Embora as células do tipo PEMFC sejam as mais pesquisadas no
momento, a Célula a Combustível de Ácido Fosfórico ou PAFC (Phosphoric Acid
Fuel Cell) é a tecnologia mais avançada comercialmente, como diz Gomes Neto
(2005, p.156). Atuando na área de geração estacionária de energia elétrica como
nos centros comerciais, escolas e aeroportos, essa tecnologia possui cerca de
300 unidades espalhadas pelo mundo, inclusive no Brasil, a exemplo de Curitiba e
Rio de Janeiro.
Suas reações e esquema de funcionamento podem ser representados
como aqueles mostrados para a PEMFC. Apresentando a diferença de que o
eletrólito não é uma membrana, mas o ácido fosfórico líquido (H3PO4). Esse ácido
tem a propriedade de ser um ótimo condutor a partir de certas temperaturas,
entretanto, a 40 ºC ele se solidifica. Por isso, essa célula atua em temperaturas
entre 150 a 220 °C, como afirma Marques (2004, p.34).
Mesmo operando nessa temperatura, a PAFC ainda é uma célula de baixa
temperatura e utiliza a platina como catalisador, embora apresente uma vantagem
em relação à célula PEMFC é o fato de ter maior tolerância a impurezas no
hidrogênio utilizado, como o CO e o enxofre, pelo fato do seu eletrólito não ser
uma membrana, mas um ácido. Desse modo, é possível utilizar a reforma de
vários tipos de combustível para adquirir o hidrogênio, necessitando apenas de
um purificador para retirar o excesso de impurezas.
A eficiência dessa célula é menor se comparada às outras tecnologias de
células combustíveis, pelo fato de ser uma célula de baixa temperatura que utilize
combustíveis reformados. Sendo assim, o calor gerado pela célula, vapor de água
por volta de 200 °C, não é capaz de reformar um combustível como o biogás ou
gás natural, que necessitam de pelo menos 450 a 500 °C, como afirma Gomes
Neto (2005, p.157). Por isso, torna-se necessária a queima de uma maior parte
desse combustível, externamente à célula, para reformá-lo, deixando a célula
combustível com uma eficiência entre 35 a 47%, maior ainda do que se fosse
queimado todo o combustível em um motor a combustão, além de ela ser menos
poluente.
De acordo com Gomes Neto (2005, p.157), a potência gerada por cada
sistema de célula do tipo PAFC chega a 200 kW, o que pode ser expandido
agrupando vários sistemas de células combustíveis.
54

d) SOFC – Célula a Combustível de Óxido Sólido


A célula combustível de óxido, ou SOFC (Solid Oxide Fuel Cell), distingue-
se das demais células principalmente pelo seu eletrólito, um material cerâmico e
sólido a base de óxido de zircônia e de ítrio
A célula citada utiliza diretamente combustível como o gás natural, o biogás
e o etanol, sendo reformados dentro da mesma. Para que isso ocorra, utiliza-se o
calor liberado por ela e uma pequena parte oriunda da queima de combustíveis.
É uma célula de alta temperatura, indicada para aplicações residenciais,
que apresentam potências de 5 a 10 kW, e para aplicações industriais, que
utilizam célula de 250 a 500 kW.
Opera em temperaturas entre 600 a 1000 °C, de acordo com Marques
(2004, p.35), logo, não há necessidade do melhor catalisador para ajudar a
aumentar a velocidade das reações químicas, uma vez que a alta temperatura
desempenha essa função. Assim, um metal nobre como a platina, pode ser
substituído pelo níquel para desempenhar o papel de catalisador, diminuindo
custos. Além do mais, o níquel é mais resistente a contaminações com monóxido
de carbono (CO) do que a platina, tornando possível o uso direto de combustíveis
como gás natural, biogás ou etanol dentro da célula.
Faz-se necessário queimar parte do combustível para aquecer a célula no
início do seu funcionamento, o que faz com que a célula atinja uma alta
temperatura. Após isso, as próprias reações que acontecem na célula produzirão
calor, ocorrendo a vantagem de se poderem reformar os combustíveis com o
próprio calor da célula, o que não acontece com a célula do tipo PAFC (célula de
baixa temperatura).
A SOFC elimina dióxido de carbono CO2, posto que a reforma dos
combustíveis é realizada integrada à célula. Apesar disso, no dizer de Gomes
Neto (2005, p.158), a emissão de CO2 ainda é 50% menor do que se os
combustíveis em questão fossem utilizados totalmente em máquinas térmicas. E
o rendimento varia entre 50 a 60%, podendo chegar até 85%, caso se utilize o
calor eliminado pela célula para alimentação de uma turbina ou para aquecimento
de água, por exemplo.
55

e) MCFC – Célula a Combustível de Carbonato Fundido


Operando em altas temperaturas, que variam entre 600 a 800 °C, a célula
a combustível de carbonato fundido ou MCFC (Molten Carbonate Fuel Cell) é
indicada para aplicações acima de 1 MW, como em usinas energéticas.
Embora apresente algumas características semelhantes à SOFC, como a
reforma interna de combustíveis, a utilização do níquel como catalisador e a maior
resistência a monóxido de carbono (CO), a MCFC difere da SOFC por apresentar
um eletrólito composto por sais de carbonato, como o carbonato de sódio, lítio ou
potássio.
Como a célula em estudo também é de alta temperatura e, na qual, ocorre
a reforma interna de combustíveis, a exemplo da SOFC, ela também aceita
utilizar diretamente combustíveis como o gás natural, o biogás e o etanol.
Ainda a exemplo da SOFC, essa célula de carbonato fundido também
alcança uma eficiência elétrica entre 50 e 60%, chegando a 85% caso se utilize o
calor gerado, de acordo com Gomes Neto (2005, p.158).

f) DEFC – Célula Combustível de Etanol Direto


A exemplo da DMFC (Célula a Combustível de Metanol Direto) a célula a
combustível de etanol direto ou DEFC injeta seu combustível, o etanol,
diretamente. Embora ainda não tenha chegado ao mesmo patamar de
desenvolvimento da DMFC, já existem várias pesquisas e projetos em andamento
que almejam empregar a DEFC em aplicações portáteis, automotivas e até
residenciais em locais de difícil acesso.
Não se deve confundir uma célula de etanol direto (DEFC) com a célula de
membrana de troca de prótons (PEMFC), que utiliza hidrogênio puro, já extraído
do etanol reformado.
A reação global da reforma do etanol pode ser dada na equação 2.4:

Equação 2.4: Reação Global da Reforma do Etanol. Fonte Godoy, 2006

O etanol é misturado com vapor de água, produzindo hidrogênio e dióxido


de carbono.
56

A empresa Brasil H2 Fuel Cell Energy, em Curitiba, comercializa células a


combustível de etanol, as biocélulas a combustível, para demonstração. (fig.2.15).
A biocélula converte diretamente o etanol em eletricidade, acionando um pequeno
motor. De acordo com o diretor da empresa, Emilio Hoffmann Gomes Neto, o
hidrogênio obtido a partir do álcool ou biodiesel, usado em automóveis com
células a combustível, pode apresentar uma eficiência até 3 vezes maior do que o
atual rendimento dos carros a combustão de etanol.

Figura 2.15: Célula a Combustível de Etanol Direto. Biocélula que funciona com etanol ou água e
açúcar. Fonte: Brasil H2 Fuel Cell Energy

2.2.8. Projetos no Brasil e no mundo

a) Estradas do hidrogênio
A estrada do hidrogênio chamada, HyNor( Hydrogen Road of Norway), está
sendo construída ao Sul da Noruega com uma extensão de quase 650
quilômetros, passando de Oslo até Stavanger, e terá cinco postos de hidrogênio
em 2009. Esse país possui uma infra-estrutura voltada para veículos limpos,
movidos a hidrogênio produzido através da eletrólise.
A Califórnia, EUA, é um dos principais incentivadores da economia do
hidrogênio e de outras energias renováveis. Esse estado também possui um
projeto de estradas do hidrogênio, que espera colocar mais de 25 postos em
funcionamento.
De acordo com Gomes Neto (2005, p.133), até 2010 a Califórnia pretende
possuir um posto de hidrogênio a cada 32 quilômetros, totalizando 150 a 200
postos, um investimento de 75 a 200 milhões de dólares. Além disso, a Toyota
57

pretende construir quinze postos e a BMW, cinco. Cada posto tem o custo
avaliado entre 300 a 500 mil dólares.
Outros 14 estados americanos já possuem postos de hidrogênio para
receber a futura era desse combustível.

b) Roteiro de estruturação da economia do hidrogênio no Brasil


O Ministério de Minas e Energia (MME), juntamente com alguns órgãos de
pesquisa e desenvolvimento do Brasil, lançou o Roteiro de Estruturação da
Economia do Hidrogênio no Brasil. Segundo Gosmann (2006, p.5), com esse
projeto, o MME espera planejar e desenvolver ações que conduzam à utilização
do hidrogênio em complemento à matriz energética renovável que o Brasil Possui.
O documento traça metas para que em 2020 o Brasil mostre em sua matriz
energética a produção de hidrogênio no país, tendo como a fonte primária
prioritária desse gás, é o etanol, extraído da cana-de-açúcar. Em segundo lugar,
fica produção de hidrogênio através da eletrólise, que utiliza a energia secundária
advinda das hidrelétricas nos períodos de baixo consumo das residências
(período da madrugada). Veja o cronograma previsto, na figura 2.16.

Figura 2.16: Cronograma das prioridades do Roteiro Brasileiro para Estruturação da Economia do
Hidrogênio no Brasil. Fonte: Gosmann, 2006
58

O etanol foi escolhido fonte prioritária para a produção de hidrogênio no


Brasil porque o país domina tecnologias para plantio e cultivo da cana-de-açúcar,
produção do álcool, distribuição e utilização. Sua conversão e utilização na célula
a combustível possuem uma alta eficiência, superior à eficiência da combustão do
próprio etanol. Segundo o MME, o etanol é excelente para armazenamento e
transporte do hidrogênio, em especial para regiões isoladas do Brasil, de difícil
acesso às redes elétricas. Juntamente com o etanol, encontra-se no topo das
prioridades energéticas para produção de hidrogênio, a gaseificação da
biomassa, já comentada anteriormente.
Como segunda alternativa para a produção de hidrogênio, está a eletrólise
a partir das hidrelétricas, como já foi abordado, uma vez que o Brasil tem um alto
potencial de produção de hidrogênio no período da madrugada.
O gás natural, meio de obtenção de hidrogênio para geração de energia
mais utilizado do mundo, ganha o terceiro lugar como prioridades no projeto do
MME. A reforma desse gás apresenta uma grande vantagem em relação à sua
combustão direta, pois a célula a combustível produz bem menos gases
poluentes como o CO e o NOX, eliminados em grande quantidade na queima de
combustíveis fósseis.
Dentre as políticas e diretrizes do MME estão a inclusão social, o respeito
ao meio ambiente, a redução de combustíveis fósseis com um maior uso dos
renováveis, o fortalecimento da base tecnológica e o desenvolvimento da indústria
nacional de bens e serviços.
Enfim, a geração de energia distribuída e o atendimento em áreas isoladas
deverão ocorrer de forma prioritária.
59

3. ESTUDO DE CASO

A seguir, serão apresentados alguns dados e comparações feitas entre as


células combustíveis automotivas abastecidas a hidrogênio reformado a partir do
etanol e os motores a combustão interna que utilizam esse mesmo combustível.
Com base em informações retiradas de outros trabalhos, como o é o caso da
plataforma de produção de hidrogênio a partir do etanol da UNICAMP estudada
em Godoy (2006) e informações das próprias montadoras, como é o caso da
Honda, foram feitas as respectivas tabelas de comparações a seguir.
Os cálculos das reformas expostos neste capítulo estão de acordo com as
informações que aparecem ao longo dessa monografia e mostram resultados
favoráveis à utilização das células combustíveis em detrimento do uso de um
motor a combustão interna. Veja na tabela 3.1 algumas conversões de energia e
calor.

1 cal (caloria) 4,187 J


1 Wh 3.600 J
Tabela 3.1: Unidades de Energia e Conversão

3.1. Considerações iniciais

O poder calorífico é a quantidade de energia contida em uma determinada


quantidade de combustível, logo, quanto maior for o seu poder calorífico, maior
será a quantidade de energia que esse poderá proporcionar.
Existe o poder calorífico superior e o poder calorífico inferior. O primeiro é a
quantidade de energia liberada na forma de calor mais a quantidade de energia
gasta para a formação de água no estado líquido, em casos de combustíveis que
contenham hidrogênio em sua composição. Já o poder calorífico inferior é apenas
a quantidade de energia liberada na forma de calor por um combustível. O poder
calorífico inferior é utilizado para representar o potencial energético de um dado
combustível.
A tabela 3.2 mostra alguns dados de diferentes combustíveis:
60

Poder Quantidade Quantidade de


Densidade Calorífico de energia energia por
Inferior por massa volume
0,0899 28.555
Hidrogênio 119,56 MJ/kg 10,75 MJ/m³
kg/m³ kcal/kg

6.750
Etanol 0,7894 kg/l 28,262 MJ/kg 22,31 MJ/l
kcal/kg

Metano 0,722 12.054 50,473 MJ/kg 36,845 MJ/m³


kg/m³ kcal/kg
10.400
Gasolina 0,742 kg/l 43,544 MJ/kg 32,30 MJ/l
kcal/kg
Tabela 3.2: Valores de matéria e energia. Fonte: Elaboração própria. Alguns dados retirados de:
(MME, 2004). Internet.

A quantidade de energia por massa, quarta coluna da tabela 3.2, foi


calculada convertendo-se o poder calorífico, que é dado em calorias por
quilograma, para joules por quilograma. Para isso, foi usado o dado da tabela 3.1,
a qual informa que uma caloria equivale a 4,187 joules. Já para se obter os
valores de quantidade de energia por volume, expostos na quinta coluna, bastou
utilizar-se os dados da quantidade de energia por massa (quarta coluna) e as
densidades (segunda coluna) para se deter uma relação entre massa e volume.

3.2. Reforma do etanol na plataforma da Unicamp x combustão interna do


etanol

A reforma do etanol será, em longo prazo, a principal fonte de hidrogênio


na matriz energética brasileira, como expõe o Ministério de Minas e Energia. Isso
devido à supremacia do país em técnicas de plantação e colheita da cana-de-
açúcar.
Para se comparar a eficiência da reforma com a combustão do etanol,
serão usados alguns dados de um protótipo de reformador de etanol utilizado pela
Unicamp, com base nos dados informados por Godoy (2006) e ainda por dados já
conhecidos e fornecidos anteriormente neste capítulo.
A seguir, será feita uma breve comparação entre a eficiência de um motor
a combustão interna a etanol em um veículo e um automóvel a célula
combustível. A idéia é saber qual das duas tecnologias gera mais energia com 1
litro de etanol.
61

Segundo Godoy (2006, p.6), um motor a combustão interna alcança um


rendimento de apenas 20%, perdendo 80% da energia fornecida em 1 litro de
etanol, calculada a partir do poder calorífico inferior desse combustível. Com base
nessas informações é apresentada a figura abaixo (fig.3.1):

Figura 3.1: Energia útil fornecida por um motor a combustão interna utilizando 1 litro de álcool.
Fonte: Cálculos próprios, baseado em Godoy, 2006.

A tabela 3.2 mostra que 1 litro de etanol é capaz de fornecer 22,31 MJ de


energia, no entanto, levando-se em consideração um motor de combustão interna
com um rendimento de 20%, essa energia diminui para 4,462 MJ.
O reformador de etanol da Unicamp obteve uma eficiência de 69%,
enquanto que uma célula combustível do tipo PEMFC alcança uma eficiência de
55%, porcentagens adotadas nos cálculos a seguir. Segundo Godoy (2006, p.4),
cada litro de etanol do reformador gera 1,596 m³ de hidrogênio em condições
normais de pressão. A eficiência de 69% já inclui o fato de ser preciso queimar
parte do etanol no reformador para fornecer calor ao etanol que será reformado.
Ver figura 3.2:

Figura 3.2: Energia útil fornecida por uma célula a combustível que recebeu hidrogênio obtido
através da reforma de 1 litro de etanol. Fonte: Cálculos próprios, baseado em Godoy, 2006.

A figura 3.2, a exemplo da 3.1, apresenta a quantidade de energia gerada


por um litro de etanol, agora, porém, esse gás passará por um reformador de
combustível que converte o etanol em hidrogênio com uma eficiência de 69%,
hidrogênio que será utilizado em uma célula combustível do tipo PEMFC com um
rendimento de 55%. De acordo com Gomes Neto (2005. p.137), a eficiência de
conversão de eletricidade em movimento por um motor elétrico pode ultrapassar
62

os 95%. Sendo assim, o rendimento global é de 36%, produto dos demais


rendimentos, e a energia útil de 1 litro de etanol alcança 8,043 MJ.

a) Diferença entre os dois sistemas de geração de energia:


Diferença = 8,043 – 4,462 = 3,581 MJ

b) Aumento de eficiência:
4,462 MJ (motor a etanol)  100%
3,581 MJ (diferença entre os sistemas) X
X= (3,581/4,462) * 100 = 80,25%

Para calcular o aumento de eficiência no item b, foi feita uma regra de três,
onde é admitido que a energia útil de um motor a combustão de etanol (4,462 MJ)
equivale a um inteiro (100%) e que a diferença entre as tecnologias comparadas
(3,581 MJ) representa o aumento de eficiência, em relação a esse valor inteiro,
chegando ao resultado de 80,25%.
Esses cálculos mostram que, quando se faz uso do sistema de célula
combustível que utiliza hidrogênio produzido a partir da reforma a vapor do etanol,
consegue-se aumentar a eficiência em 80,25% em relação a um motor a
combustão que utilize etanol.
Por fim, vale observar que, apesar de que essa monografia adote o
rendimento da reforma do etanol em 69%, de acordo com Brasil H2 Fuel Cell
Energy a Toyota já desenvolveu um novo método de reforma do etanol que
alcança um rendimento de 80%, o mesmo alcançado pela reforma do gás natural.
Essa tecnologia ainda está em fase de testes sendo muito bem vinda na área das
células a combustível.

3.3. Comparação entre um veículo a combustão de etanol e um veículo a


célula combustível a hidrogênio

O próximo passo deste estudo de caso é mostrar uma comparação feita


entre dois veículos de uma mesma montadora, que apresentam potências
equivalentes e são alimentados com 1 litro de etanol. A diferença entre ambos é
de que o primeiro utiliza o etanol diretamente em um motor a combustão interna,
63

enquanto o segundo, que utiliza uma célula a combustível, terá o hidrogênio


produzido a partir de 1 litro de etanol.
A partir de dados fornecidos pela montadora Honda, expõe-se, através da
tabela 3.3., uma comparação feita entre um veículo a combustão interna
convencional e um veículo a célula combustível.

Honda Civic 2008 1.8 Honda FCX Clarity


Motor Combustão interna 1.8i- Motor Elétrico Síncrono
Torque 128 lb - ft @ 4300 rpm 189 lb - ft @ 0 - 3056 rpm
Potência 140 cv / 138 cv @ 6300 rpm 134 cv / 100 kW
Combustível Álcool / Gasolina Hidrogênio Comprimido
Velocidade 190 km/h 170 km/h
Consumo 8,4 km/l 110 km/kg
Tabela 3.3: Comparação entre veículos a hidrogênio e a combustão. Fonte: Honda

Nessa comparação foi utilizado o modelo Honda Civic 1.8, uma vez que
esse possui uma potência muito próxima a de um Honda FCX Clarity. Percebe-se
que, apesar de o Honda FCX alcançar uma velocidade máxima um pouco inferior
a do Honda Civic, ele possui um torque maior, característico do motor elétrico,
que proporciona uma elevada aceleração e maior conforto para quem vai dirigi-lo.
Com base nos dados anteriores, foram feitos alguns cálculos para se
construir a tabela 3.4, apresentada adiante, indicando a diferença de rendimento
entre as tecnologias discutidas no capítulo.

a) Motor de combustão interna:


1 litro de etanol (faz percorrer)  em média 8,4 km em um Honda Civic 1.8 - 2008

b) Sistema de reforma + célula combustível:


Se:
1 litro de etanol (produz)  1,596 m³ de Hidrogênio
Densidade do hidrogênio: 0,0899 kg/m³
Logo,
1 litro de etanol (produz) 0,143 kg de hidrogênio.
E se:
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1 kg de hidrogênio (faz percorrer) 110 km em um Honda FCX Clarity 2008

Admitindo-se que esse hidrogênio foi produzido a partir de 1 litro de etanol:

1 litro de etanol reformado em H2 (0,143kg) (faz percorrer)  15,73 km em um


Honda FCX Clarity 2008.

Como de pode observar, os resultados estão à margem do que prevê


Gomes Neto (2005), quando diz que o etanol reformado em hidrogênio e utilizado
na célula combustível pode oferecer uma eficiência até três vezes superior àquela
fornecida por um motor a combustão interna movido a etanol.
Essa diferença de eficiências poderá vir a ser ainda maior, pois além da
existência do novo sistema de reforma com eficiência de 80%, novos eletrólitos
mais eficazes já estão sendo desenvolvidos para as células combustíveis.
Admitindo-se que um veículo novo percorra algo em torno de 20 mil
quilômetros por ano, veja os cálculos apresentados na tabela 3.4:

Quilômetros Quilômetros Consumo de Consumo


rodados por rodados por etanol anual* energético
litro ano anual**
Célula Comb. 15,73 km 20.000 km 1.271 litros 28,356 GJ
+ reforma por veículo
Motor a 8,4 km 20.000 km 2.380 litros 53,097 GJ
combust. por veículo
interna
Diferença 7,33 km 0 1.109 litros 24,741 GJ
entre as (aumento de por veículo
tecnologias 87,26% de
eficiência)
Tabela 3.4: Comparação entre a eficiência anual de um veículo a célula combustível mais
reformador e um veículo com motor a combustão interna. Fonte: Dados e cálculos próprios
baseados no modelo de Godoy, 2006.

Observações para a tabela 3.4: *Considera-se que a célula a combustível


faz 15,73 km/l de etanol e que o motor a combustão interna faz 8,4 km/l de etanol.
**Sabe-se que 1 litro de etanol tem um potencial energético de 22,31 MJ.

c) Diferença entre os dois sistemas de geração de energia:


Diferença = 15,73 – 8,4 = 7,33 km
65

d) Aumento de eficiência:
8,4  100%
7,33  X
X= (7,33/ 8,4) * 100 = 87,26%

Na comparação entre a reforma de 1 litro de etanol e a utilização do


mesmo em um motor a combustão interna, foi mostrada que a tecnologia a célula
combustível obteve um aumento de 87,26% de eficiência em relação àquela
outra. Isso faz com que mais da metade do etanol necessário para movimentar
um automóvel seja poupada, implicando na redução do dióxido de carbono que
seria emitido na queima do etanol, ajudando, assim a reduzir o aquecimento
global.
A tabela 3.4 ainda mostra que ao utilizar o Honda FCX com hidrogênio
produzido a partir da reforma do etanol na UNICAMP, em vez de se utilizar o
Honda Civic com motor a combustão de etanol, é economizado em um ano, 1.109
litros de etanol por veículo.
Já na tabela 3.5 é mostrado que a combustão de 1000 litros de etanol
libera 260 quilogramas de dióxido de carbono (CO2) para a atmosfera. Logo, por
regra de três, 1.109 litros de etanol liberam 288,34 quilogramas de CO2, ou seja, a
substituição de apenas 1 veículo com motor a combustão por um veículo a
hidrogênio, onde esse gás foi produzido a partir da reforma do etanol, livra a
atmosfera de 288,34 quilogramas de dióxido de carbono anualmente.

Tabela 3.5: Comparação entre as emissões de CO2 da gasolina e do álcool (etanol). Fonte:
(SOUSA, 2008)

Ainda alia-se ao veículo de célula a combustível, o fato de ser silencioso e


de não possuir peças móveis, dando maior confiabilidade ao veículo e diminuindo
a utilização de óleos lubrificantes que poluem os lençóis freáticos, ao contrário
dos veículos convencionais.
66

Para outras aplicações não automotivas, como em geradores a célula


combustível em indústrias, residências, hospitais ou centros de comunicação, o
rendimento da célula combustível chega a 85%, em células industriais do tipo
SOFC e MCFC. Nesse método, como já foi citado, é utilizando o vapor liberado
pela própria célula combustível de alta temperatura para movimentar uma turbina
a vapor ou proporcionar aquecimento de água.
Portanto, as células combustíveis também são uma solução muito
adequada para usinas termoelétricas, que podem substituir a combustão de
certos combustíveis, como o gás natural, o biogás ou o próprio etanol, pela
reforma desses gases em hidrogênio, o qual será utilizado em uma célula
combustível com um rendimento muito mais alto.
67

4. CONCLUSÃO

Foi mostrada a tecnologia das Células Combustíveis a Hidrogênio, desde o


seu principio de funcionamento até os tipos de Células Combustíveis e suas
aplicações, seja nos transportes, nos portáteis e em geração de energia
distribuída, buscando destacar suas qualidades e vantagens em relação a outras
formas de aproveitar as fontes de energia, como o caso de um motor a
combustão.
Registrou-se um estudo de caso evidenciando-se a vantagem de se utilizar
um determinado combustível, no caso o etanol reformado em hidrogênio em uma
célula a combustível, em vez de se utilizar a mesma quantidade desse
combustível em um motor a combustão. Para se comprovar esses fatos foram
utilizados dados de outros trabalhos, de experimentos e projetos aplicáveis.
Desse modo, justificou-se a possibilidade de a célula combustível trazer
benefícios para o meio ambiente, além de sanar crises energéticas e ambientais,
simplesmente pelo fato de se poder utilizar uma mesma quantidade de
combustível de uma turbina ou motor a combustão para gerar muito mais
potência, racionalizando as fontes primárias de energia e diminuindo
consideravelmente as emissões de gases poluentes.
Salientou-se que o estado do Ceará tem a possibilidade de utilizar vários
recursos renováveis para se obter hidrogênio, como a energia eólica, solar e a
biomassa.
Registrou-se ainda que as células combustíveis para geração estacionária
em centros comerciais já estão chegando ao mercado brasileiro e, em questão de
tempo, chegarão a todos os estados do país.
Procurou-se sugerir que a tecnologia das Células Combustíveis é
democrática, pois cada país ou região produz o hidrogênio da maneira como lhe é
mais conveniente e viável.
Mostrou-se que ainda há necessidade de aperfeiçoamento, já que essa
tecnologia é emergente, porém, vem se desenvolvendo e alcançando a
viabilidade com uma grande velocidade.
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Falou-se ainda que os aperfeiçoamentos são alcançados a partir da


redução de custos e com a iniciativa do Governo de cada país, inclusive, no Brasil
existem projetos para que isso aconteça.
Com isso espera-se despertar o interesse de instituições e pesquisadores
para a área das energias renováveis, em especial, para as células combustíveis a
hidrogênio, a exemplo do que acontece em alguns estados do Brasil
Espera-se, ainda, que o assunto, como aqui foi tratado, esclareça o leitor a
contento sobre a necessidade de se proteger o meio ambiente, quebrando-se
maus hábitos que já estão ficando ultrapassados, como o de se ter que poluir
para produzir.
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Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra, 2005.

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<http://br.geocities.com/sousaraujo>. Acesso em: 19 dez. 2008.

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