Eu bem que não queria ir, alguma coisa estava me avisando. Vai ser muito tumulto, vai ter muita gente... Mas,
como vivo meus dias em função do amor impossível por Paulinha Toller, não poderia nunca deixar de ir ao show do
Kid Abelha na Concha Acústica* naquele dia. E lá fomos - a tropa toda mesmo eu achando que em programa de filho
não deve meter o bedelho. Primeiro porque você tem que se mancar pra não ficar indo numa praia que não é a sua, e
segundo porque pode ter surpresas desagradáveis, como aconteceu comigo nesse dia.
Quando chegamos na creche -quer dizer, na Concha -, foi o maior barato. Meu fascínio pela Paulinha não me
permitia enxergar mais nada. Que voz, que rosto, que corpo! (Seu único defeito é ela nem saber que eu existo.) Fiquei
tão ligado que comecei a dançar junto com a galera, até perceber que o pessoal todo estava fora do ritmo, menos eu.
Achei melhor ficar só ouvindo as músicas, e me concentrei de novo naquele louro objeto do desejo. Nem observei o
que se passava à minha volta, e esse foi o meu erro.
Já quase no final do show foi que notei que meus filhos não estavam ao meu lado. "Tudo bem", pensei, "devem ter
ido comprar algum refrigerante, ou estão por aí." (Não me lembro a partir de que momento na vida eles deixaram de
avisar aonde vão.)
Na hora de ir embora, saio catando um por um, mas só encontrei uma fi lha e meu filho. Cadê a outra? A irmã diz
logo: "Ah, eu vi quando ela tava indo pro bar, já deve estar voltando. É melhor vocês esperarem aqui que eu vou lá
chamar". Percebi no ar um quê de cumplicidade, e pensei: "Aí tem!" E disse: "Não, não, vamos procurar jun tos!"
Depois de descer alguns degraus, sinto que minhas pernas estancam, meu olhar vacila e meu queixo cai com a cena:
minha própria filha sendo imprensada no muro por um sujeitinho qualquer, no maior amasso, e ela, em vez de
empurrá-lo, ainda o estava abraçando! E gostando!
Nunca imaginei (sempre imaginei! ... ) que esse dia fosse chegar! Ali, na minha frente! "Quem é esse rapaz?" (a
gente sempre os chama de "rapaz"), perguntei à outra filha. "É um menino aí com que ela ficou na Lavagem da Praia
do Forte, encontrou aqui hoje, e ficou de novo."
Até aí tudo bem (tudo bem uma ova!). 0 pior foi quando ela me notou e veio toda sem graça pra me apresentar o
"rapaz". Tive que apertar aquela mão mole, e ainda sorrir pro sujeito... E ainda dei carona até o carro dele, que estava
longe! E ainda falei "tchau"! E ainda tomei esporro porque fui "frio" ("Meu pai, você não tem jeito mesmo, né? Custava
ser um pouquinho mais gentil com o menino?")!!!
Nivaldo Lariú . Confissões de um pai de adolescente. Rio de janeiro, Relume Dumará, 1996.
*Trata-se de um teatro a céu aberto em Salvador.
1 . Qual o tema central do texto?
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b) Que expressão presente no título faz referência ao narrador e o inclui na situação narrada no texto?
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c) Ao se incluir nessa situação, o que é possível inferir sobre a maneira de o pai lida com esse fato?
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3. Releia o parágrafo em que o narrador conta como se sentiu e o que fez ao chegar ao local do show.
a) Que tipo de linguagem predomina: formal ou informal? Retire do trecho expressões que exemplifiquem esse tipo
de linguagem.
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b)Ao empregar esse tipo de linguagem, qual o tom - de seriedade ou de humor –que o narrador-personagem da aos
fatos narrados?
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4. Dos itens abaixo, qual deles permite ao leitor elaborar a imagem do narrador-personagem?
a)"Eu bem que não queria ir, alguma coisa estava me avisando. Vai ser muito tumulto, vai ter muita gente..."
b) "Fiquei tão ligado que comecei a dançar junto com a galera, até perceber que o pessoal todo estava fora do ritmo,
menos eu.”
Agora responda: De que maneira a linguagem empregada possibilita construir uma imagem do narrador
-personagem?
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5. O trecho "Nunca imaginei (sempre imaginei! ... ) que esse dia fosse chegar! Ali, na minha frente!" identifica o
momento em que o narrador-personagem se depara com a filha e o namorado.
a) De que o narrador-personagem se dá conta nesse momento?
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c) O que o emprego dos parênteses no trecho ressalta sobre esse momento vivido pelo narrador- personagem?
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6.Na sua opinião, o que faz com que esse momento narrado no texto seja inesquecível para um adolescente e para o
pai de um adolescente?
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mau, mal, mais, mas b) mal, mau, mas, mas c) mau, mau, mas, mais d) mal, mau, mas, mais
14. Explique a diferença de sentido entre as frases a seguir e classifique sintaticamente os termos destacados:
a) A confiança nos amigos ajudou-o a superar o problema.
b) A confiança dos amigos ajudou-o a superar o problema.
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a) “Por que o papai tem que sair todo dia pra trabalhar “ ? __________________________________
b) “Porque ele precisa de dinheiro pra cuidar da gente, passear, dar-lhe uma boa educação, vestir , comer...
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c) “... e ter um pouco de sossego!” _______________________________________________________