Você está na página 1de 20

Bichos, de Miguel Torga

Escrito em 1940, Bichos é um clássico da literatura portuguesa. O grande escritor português -


também poeta, teatrólogo, contista e memorialista - Miguel Torga, inventa um mundo de
bichos humanizados.

São catorze contos, onde o mistério da vida nos aparece no seu esplendor, perfilando bicho,
homem e natureza numa comunhão fraternal, em que todas as peças são necessárias ao
puzzle da vida.

Bichos é, também, o retrato fiel do viver trasmontano; uma vida de suor e lágrimas, por entre
escolhos e lobos, mas sempre repleta daquela alegria que só o sofrimento pode justificar: a
alegria de ser, de viver em comunhão total coma natureza, em fusão permanente com os
elementos.

Miguel Torga fez desta obra um testemunho impar da união natural entre os Homens e os
Bichos – a simbiose da vida. No meio dos dois, a terra, o traço que lhes dá vida. No trabalho,
nas paixões e nas dores, os bichos compartilham com os homens as esperanças e as desgraças.

Curiosa a palavra: “bichos” e não “animais”. Bichos são, talvez, os animais humanizados,
irmanados com o homem na mesma luta; na vida.

A rudeza das torgas, a aspereza das montanhas, a magreza das terras e a solidão do tempo,
misturam-se num universo, cantado em poesia por um mestre que foi apenas um homem. Um
homem que viveu e lutou contra um mundo ainda mais agreste, ainda mais hostil: o mundo da
ditadura.

São Bichos animais e Bichos homens que se entrelaçam nas páginas deste livro de contos.
Bichos personagens, mas sentindo e agindo como se de humanos se tratassem, tornando o
leitor seu cúmplice.

Amizade, traição, amor, ódio e ambição desfilam pelo livro, sendo tratados como uma lição
essencial de vida.

Linguagem
A linguagem, simples mas cuidada é uma das mais belas expressões da cultura popular: um
vocabulário fidelíssimo à realidade trasmontana. Quem conhece aquelas terras, reconhece-se
em Torga. Mas a poesia latente por detrás destas estórias não é de Torga. É da terra. Por isso,
este livro não é só uma criação do seu autor; é muito mais do que isso: é uma emanação da
terra. E neste conceito de “terra” podemos englobar os homens e os seus irmãos “bichos” – os
três elementos constituem um todo, um cosmos único onde Torga participa como mensageiro,
personagem e intérprete.

Livro simples, transparente, honesto e sentido. Um grito amargo e profundo da terra que
encerra os homens. Uma fusão total entre a terra e o ser humano, como se tudo emergisse de
uma amálgama onde terra, bichos e homem fossem a pasta de onde nasceu a ordenação
universal das coisas e dos seres.

Enredo

É através dessa pequena arca de Noé, feita de bichos e gente, que Torga aponta as injustiças
do dia-a-dia, trazendo novos modos de olhar. Esta coletânea constitui um marco do conto em
Portugal. Encontramos na obra, um Miguel Torga paradoxal, contraditório, inexplicável, que
mistura o sagrado e o profano, que é simultaneamente fruto e espelho das fragas maternas.

Animais com sentir humano ou seres humanos vestidos de animais. Ou uma irmandade de
animais e homens. Tudo numa argamassa de vida. O cão Nero, o galo Tenório, o jerico
Morgado, o Ladino, o Ramiro. E a Madalena, caminhando na contra mão da contradição entre
cultura e vida. A salvação do Homem e da Humanidade reside, para Miguel Torga, num
regresso às origens e ao seio da Natureza-Mãe, “dama de grande senhoria” que dignifica tudo
o que vive na sua intimidade, para que ela devolva ao Homem a naturalidade, a grandeza, a
verticalidade e a natureza instintiva que caracterizam os animais íntegros e monolíticos que
povoam a coletânea Bichos. É também impossível não observar o papel da natureza e do
espaço amplo do campo na vida dos personagens.

Conto escolhido:

Mago
Mago respirou fundo. Abriu o nariz e encheu o peito de ar ou de luar, não podia saber ao
certo, porque a noite era clara como o dia e parada como uma montanha. Mas fosse de
frescura ou de luz a onda que bebera num trago, de tal modo o inundou, que em todo o corpo
lhe correu logo um frêmito de vida nova. Esticou-se então por inteiro, firmado nas quatro
patas, arqueou o lombo, e deixando-se ficar assim por alguns instantes, só músculos, tendões
e nervos, com os ossos a ranger de cabo a rabo. Arre, que não podia mais! Aquele mormaço da
sala dava cabo dele. Deixava-o sem ação, bambo, mole e morno como o cobertor de papa
onde dormia. A que baixezas a gente pode chegar! Ah, mas tinha que acabar semelhante
degradação! Não pensasse lá agora a senhora D. Maria da Glória Sância que estava disposto a
deixar-se perder para sempre no seu regaço macio de solteirona. Não faltava mais nada! E, se
lhe restavam dúvidas, reparasse no que estava a acontecer naquele momento: ela a ressonar
sozinha, na cama fofa, enquanto ele enchia os pulmões de oxigênio e de liberdade. É certo que
a deixara primeiro adormecer, e só então, brandamente, deslizara de seus braços para o
tapete e do tapete para a rua, através do postigo da cozinha. Uma questão de delicadeza,
apenas. Porque, afinal, não havia vantagem nenhuma em fazer as coisas à bruta e ofender
quem só lhe queria bem... Que diabo, sempre a senhora D. Maria Sância, a que até um fio de
oiro lhe comprara para o pescoço! Que, considerando bem, por essas e por outras é que
chegara àquela linda situação...

- Ouvi dizer que já nem sardinhas comes?!

- Essa agora! É todos os dias...

- E que nunca mais caçaste?

- Ainda esta manhã...

Piadinhas do Lambão. É claro que os mimos de D. Sância lhe haviam deformado o gosto...
Metia-lhe os petiscos ao focinho, tentava-se! E havia por onde escolher, de mais a mais!
Quanto a ratos, que necessidade tinha de perder o tempo, debruçado três horas sobre um
buraco, sem mexer sequer a menina dos olhos, à espera dum pobre diabo qualquer que
ressonava lá no fundo? Deixá-los viver! As coisas são o que são. Em todo o caso, ainda comia a
sua pescada crua e deitava honradamente a mão a uma ou outra borboleta branca, sem falar
nas andorinhas novas e nos pardalecos que filava por desfastio na primavera. Que demónio!

- Mas que não saias de casa, sempre agarrado às saias...


Na verdade, saía pouco. Outros tempos, outros hábitos. Banqueteava-se e ficava-se pelas
almofadas... Digestões difíceis, vinha-lhe um migalho de sonolência... Às vezes tentava reagir.
Mas o raio da velha, mal o via pôr o pé na soleira da porta, perdia a cabeça! Parecia uma
sineta!

- Mago! Mago! Bicho, bichinho!

Regressava aos lençóis, claro. Contrariado, evidentemente. Mas quê! Era o pão... O pãozinho
na boca! Que remédio senão torcer caminho e, com as unhas discretamente recolhidas,
continuar as carícias de algodão em rama no cachaço da dona...

- E que deixaste a Faísca!...

- Eu?

- Que anda metida com o Zimbro... Pelo menos é o que consta. Que teve até cinco pequenos
dele...

- Meus! Muito meus! Do meu sangue!

Pantominice. Um triste chanato na honra do convento. Paleio de chavelhudo manso... a


ninhada pertencia inteirinha ao Zimbro. Até pela pinta se via. Todos com o mesmo olhinho
remelão... O que ele era era um parrana, um infeliz, embora o não confessasse. Os mimos de
D. Sância tinham-no desgraçado. Ah, mas a coisa ia mudar de figura! Estava farto de ser
desfeiteado. Ainda há pouco... chegara-se ao pé da mulher, disposto a impor sua autoridade.

- Ouve lá: disseram-se que mos andas a pôr para aí com todo mundo?

E recebe esta pelas ventas:

- Bem haja eu!


- Bem hajas tu?!

- Nunca guardei respeito a maricas!

Só a tiro! Mas a verdade é que a Faísca tinha razão. Lá de ano a ano é que vinha procurá-la, e
isso de gado fêmeo quer assistência.

Além disso, pesadão, desconsolado. E até esquecido dos ganidos dessas horas... Uma
vergonha!

- Aparece logo à noite, pelo Tinoco... Há reunião. E adeusinho...

- Adeus, Lambão.

Foi no quintal, à tarde, quando a D. Sância dormia a sesta. O Lambão, empoleirado no muro,
rondava a cozinha da vizinhança, onde assavam carapaus. Por acaso chegara à janela nesse
momento, vira-o e fizera-lhe sinal. E o outro, de boa ou má fé, abrira o saco. Mas há males que
vêm por bem. Depois da conversa, pensara maduramente no caso, e ali estava agora disposto
a ressuscitar daquela vida perdida em que o destino o metera.

Sim, ali estava, a dois passos do Tinoco, o clube da gataria de meia-idade. Bem situado, com
saída para dois bairros da cidade, fora fundado pelo maior valdevinos da geração: o Hilário. Era
um telhado corrido, quase plano, amplo, alto, mas de onde se podia cair de qualquer maneira
numa aflição. Um achado. Como a casa servia de armazém, o Hilário viu de relance as
condições do local. E logo no outro dia, os beijos, as mordedelas, os arranhões e os queixumes
do cio foram ali.

Bons tempos esses! Namorava então a Boneca, uma gatinha borralheira de a gente se perder.

- Ora viva!
- Miiau...

- Seja bem aparecida, a minha bonequinha!

- Miiau...

Mimo da cabeça aos pés. Mas um rebuçadinho! Depois enrodilhara-se com a Moira-Negra, um
coiro velho, curtido e batido. Cada guincho que abria a noite!

- Cala-te lá com isso, mulher!

Isso calava ela! Acabou por se aborrecer. Por fim veio a lambisgóia da Perricha... Uns
trabalhos. Ciúmes, fraqueza, dores de cabeça, o diabo!

- Matas-te, filho, arruinas-te...

Palavras sensatas da mãe.

- Muda de vida, homem! Essa excomungada leva-te à sepultura.

Mas quê! O vício pode muito.

Até que a mãe morreu de velhice e desgosto, a Perricha desapareceu do bairro e ele foi cair
por acaso no quintal da D. Sância.

- O bichinho está doente. Se calhar é fome...

E a ternura da senhora nunca mais o largou. A princípio ainda tentou reagir, mas, por fim, o
corpo, o miserável corpo, acostumou-se ao ripanço. A parva da santanaria cuidava que era
amor correspondido. Palerma! Amizade sincera não é com gatos. Simplesmente, quem brinca
aos afogados, afoga-se. Com o andar do tempo, a moleza foi tomando conta dele... E pronto.
Quando reparou, estava perdido. Às vezes tinha tentações do inferno. Infelizmente, as vidas
iam ruins. Virava-se um balde de restos, e não se aproveitava uma espinha. Que remédio, pois,
senão contemporizar... Mas cara aposentadoria! Considerando bem, melhor fora que o
estafermo de solteirona nunca lhe tivesse aparecido. Mais valia andar pelado e a cair de fome
e ser capaz de responder ao pé da letra aos sarcasmos que agora lhe atiravam.

- Olha o Mago!... Olha o milionário!...

O patife do Tareco. Era de o derreter logo ali! A desgraça é que não podia passar da mansa
indignação que o roía. Nem forças, nem coragem para mais. E, logo por azar, com o clube à
cunha! Parecia de propósito. Raios partissem a D. Sância, e mais quem lhe gabava as
almofadas! Por causa delas, pouco faltava para lhe cuspirem na cara!

- Com que então de visita aos bairros pobres? Obra de assistência ao desvalidos, não?

Até o bandido do Zimbro. Vejam lá! O engraçado! Não contente de lhe roubar a mulher, de lhe
pregar um par deles do tamanho duma procissão, vinha ainda com provocações à vista de toda
a gente. Ah, mas estava redondamente enganado, se cuidava que não recebia o troco devido.

- O cavalheiro seja mais delicado...

- Reparem nas falinhas dele... A tratar os amigos por cavalheiros!

- Amigos? Eu não tenho amigos da sua laia!

- Pesam-lhe na testa, coitado!

Desembestou. Cego da cabeça aos pés, atirou-se ao abismo. Infelizmente as ensanchas do


Zimbro eram outras. Tinha raiva, tinha dentes, tinha unhas e fôlego. Contra tais armas, que
podia a simples indignação dum pobre mortal, gordo e lustroso? Servir de bombo da festa... É
que nem a primeira acertou! Ágil e musculado, e com a maleabilidade de uma cobra, o inimigo
furtou-se à sua fúria, e ripostou a valer ao golpe esboçado. Depois, foi o bom e o bonito! A
seguir, uma saraivada de investidas traiçoeiras, meia dúzia de navalhadas de liquidar um
homem. Só visto! No fim da luta, quando já não podia mais e se confessou derrotado, sangrava
e gemia tanto, que até um polícia, em baixo, na rua estreita, se comoveu. O clube, esse,
parecia doido de alegria. A Faísca rebolava-se no chão, de contente.

Fugiu desvairado pelos telhados. A lua, cada vez mais branca lá no alto, olhava-o com desdém.
A cidade, adormecida, parecia um cemitério sem fim. Da torre duma igreja, saía um pio
agoirento.

Jogara naquele lance o resto da dignidade. E perdera. Dali por diante, seria apenas uma
humilhação, sem esperança. Ele, que tivera nas mãos possantes e nervosas o corpo fino e
submisso da Boneca, ele, o escolhido da Moira-Negra, ele, o companheiro de noitadas do
Hilário, ele, Mago, relegado definitivamente para o mundo das pantufas e dos tapetes!
Proibido para o resto da existência de pensar sequer numa baforada da úmida frescura que
agora lhe atravessava as ventas e lhe deixava cantarinhas no bigode... Condenado para sempre
ao bafio da maldita sala de visitas da D. Sância! Negra sorte! E tudo obra do coirão da velha...
Se não fosse ela, em ver de ir ali esquadrilhado e a mancar da mão esquerda, estaria no Tinoco
a soltar ganidos com os outros, depois de ter feito o Zimbro em pedaços... Assim, arrastava-se
penosamente por aquele caminho de desespero, tal e qual um moribundo a despedir-se da
vida... Miséria de destino! Vexado, vencido, retalhado no corpo e na alma...E tudo obra do
estupor da sanataria!

Vinha rompendo a manhã. Um sino ao longe deu cinco horas. Abriam-se as primeiras janelas.
Grandes laivos avermelhados anunciavam a chegada próxima do sol.

Parou. Lambeu a pata doente e sacudiu-se, num arrepio. Uma lassidão profunda começava a
invadi-lo. Maldita D. Sância! Se nunca tivesse conhecido a tal sujeita...

Olha, olha, a enevoar-se-lhe a vista! Queriam ver que ia desmaiar?!

Encostou-se a uma chaminé, e ficou algum tempo sem dar acordo de si, a arfar penosamente.
Até que uma onda de energia o trouxe de novo ao mundo. Arregalou os olhos. Estava melhor,
felizmente! Já enxergava claro outra vez. Podia continuar.
Em que trabalhos o metera o raio da senhoreca! E louvar a Deus safar-se com vida da
brincadeira... Coça valente... Por um triz que não se ficava... Muita resistência tinha ele ainda!

A alguns metros apenas do jardim da casa, cuidou que tornava a desfalecer. E só então é que
reparou: deixava um rastro de sangue por onde passava...

Fez das tripas coração e lá conseguiu equilibrar-se e chegar ao pequeno muro que vedava o
paraíso da sua perdição. Saltava? Não saltava? Que infâmia, regressar aos mimos da D. Sância!
Que nojo! Que ordinarice!

Mas a que propósito vinham agora as perplexidades e as recriminações? Sim, a que propósito?
Fartinho de saber que nem sequer lhe passara pela cabeça a idéia de resolver o caso doutra
maneira! Ao menos fosse sincero! De resto, que esforço concreto fizera para se libertar?
Nenhum. Ainda não havia uma dúzia de horas, ouvira a voz de Lambão como um eco da
própria consciência... E, afinal, ali estava outra vez! E viera de livre vontade... Ninguém o
obrigara... Já roído de remorsos? Ora, ora! Outro fosse ele, nem aquela casa encarava mais. E
voltara! Sim, voltara miseravelmente... E à procura de quê? Da paz podre, dum conforto
castrador... Que abjeção! Que náusea!

E, sem querer, sem poder aceitar a sua degradação, Mago entrou pelo postigo da cozinha e
foi-se deitar entre os braços balofos da D. Sância.

Resumo«Os Bichos» – Miguel TorgaUm livro de contos, cada um dos quais referindo seres
diferentes do reino animal. Nesses contos, Torga apresenta indiferenciadamente homens e
animais, unidos pelos mesmos instintos primários de sobrevivência, atribuindo a estes
sentimentos humanos e retirando àqueles a solidariedade. Todos assim sob a mesma batuta:
bichos. Apenas em «Jesus» poderemos encontrar o que consubstancia a essência humana: a
noção de felicidade, o amor, a ternura, o encantamento, a ingenuidade, a pureza, o respeito.
Nero, no fim da vida, já surdo e meio cego, mordido pelo reumatismo, recorda os seus tempos
de jovem perdigueiro alegre e folgazão, a aprendizagem do ofício com o filho da casa - quase
sempre ausente mas que ele sentia como seu verdadeiro dono -, as caçadas pelos montes, o
seu amigo Fadista, seu filho que herdara da mãe a impetuosidade, excessiva para a caça, a
mão calejada do velho dono, os mimos e carícias da filha mais nova da casa: a sua menina,
essa, a única em que viu lágrimas dos olhos por si, à hora em que fechou os seus para sempre
e entregou a alma ao criador.Mago, o gatarrão farto e pesado, sofrendo toda a sorte de
humilhações dos seus pares, as ironias sobre as namoradas, a comida, a sua falta de virilidade.
Ainda lhe provocavam um arrepio as lembranças da juventude pelos telhados fora, os ciúmes,
os gritinhos de amor, mas a verdade é que o corpo acostumara-se à boa vida e, sempre que
tentava regressar aos velhos tempos, só passava indignidades junto da vizinhança ágil. Lá para
as tantas, desistiu de vez e regressou aos braços fofos da sua dona. Madalena, a rapariga da
aldeia que, pelo S.Martinho, tropeçara em castanhas e vinho e acabara rolando na palha com
um homem, calcorreava agora, em pleno Verão, as penedias da serra para levar até ao fim o
segredo que conseguira manter só seu. Saíra de casa de madrugada, sabendo que chegara a
hora de nascer o fruto daquele tropeção que lhe manchara a pureza. Não queria descer na
consideração que por ela tinham na aldeia e decidiu procurar ajuda do outro lado da serra.
Mas as dores apertavam cada vez mais e ela teve de parar, sob um sol escaldante. Ali pariu o
seu filho e descansou finalmente. Quando deu acordo de si, a criança jazia morta no chão e ela
respirou de alívio. Limpou-se, largou os trapos sujos e enterrou o filho. Depois, regressou à
aldeia. Morgado era o macho alegre e diligente de um almocreve que, anos a fio, cumpria as
suas tarefas sem reclamar, sempre uma manta ao fim do dia a resguardar dos resfriados e a
manjedoura cheia de bom milho. Só que aquele dia começara mal; o dono acordara de mau
modo, e ele largou apreensivo quando este lhe anunciou seis léguas de serra. Na verdade,
chegou a noite e Morgado não mais viu o dia, que o dono alegre e bonacheirão, em hora de
aperto com os lobos, para safar a própria vida entregou a dele, sem pejo, ainda clamando
pelas dezassete libras que deras por ele na feira, há seis anos atrás!Bambo era o sapo que
acabou com uma estaca espetada nas costas pelo filho do caseiro novo. Conhecia como
poucos o quintal do tio Arruda que o cumprimentava pelas manhãs gostosas ou nos encontros
pela noite em que cantava, largo e reluzente, à lua. Quando o tio Arruda morreu, chegou
aquele pequeno malvado que o deixou morrer esperneando ao sol de pernas para o ar.Do
reino das aves, Tenório, o galo, acabou na panela como qualquer galo, prevendo este fim
desde o momento em que ouviu, pela primeira vez, a patroa chamar-lhe galo velho, mal o filho
começou a erguer a sua voz pelas manhãs claras e a ser mais lesto nas suas obrigações junto
das frangas.Ladino, o pardal que honra o nome, desde o ninho revelou suas fraquezas pela boa
cama e bom trato, sem um pingo de solidariedade pelas mães que penavam à procura de
sustento ara os seus. Já para a idade, alguns atreviam-se a perguntas do género «quando é
esse funeral, ti’Ladino?» ao que ele retrucava, sem rebuço, que só quando acabasse o milho
em Trás-os-Montes! Farrusco, o melro jovial que consolava a moça casadoira a quem o cuco
agoirava anos sem fim de solteira e, finalmente, Vicente, o corvo negro que enfrentou a fúria
diluviana de Deus, postado no último reduto ainda não coberto pelas águas, frente ao temor
de Noé e de todos os habitantes da Arca.Ainda a história de Miura, o touro, rei da campina,
enfrentando com lealdade a covardia dos homens escudados em seus cavalos, em farpas, em
lanças, que entrega o seu corpo à âmina que se lhe oferecia.Finalmente o Sr. Nicolau, o
entomologista incompreendido, morto entre os seus insectos catalogados, ele também quieto
e pronto a entrar na sua caixa. E Ramiro, árido como a aridez do Marão, bicho entre os bichos,
da sua boca apenas o assobio e a raiva incontida por uma ovelha morta traduzida pela cabeça
de um homem cegada por sua foice.
Mais sobre: Bichos

O livro que li neste primeiro período tem o nome de “Bichos”, do autor Miguel Torga.

Antes de começar a apresentar o meu livro e expor a minha opinião sobre este, vou fazer uma
breve referência ao autor.

Miguel Torga é apenas um pseudónimo, sendo, o verdadeiro nome do autor: Adolfo Correia da
Rocha. Este nasceu na região de Trás-os-Montes e viveu cinco anos no Brasil. Miguel Torga
tentou poetizar em grupo, com as revistas “Sinal” e “Manifesto”, acabando por desistir, pois
considerava que a poesia era algo demasiado sublime e que exigia o máximo de puresa e
fidelidade pessoal em relação ao poeta.

David Mourão-Ferreira, cita: “Torga é a reencarnação de um poeta mítico por excelência –


daquele que vive na intimidade das forças elementares (terra, sol, vento, água) para celebrá-
las com o seu canto – e alto exemplo de constante rebeldia, numa atmosfera que pretende
asfixiá-lo”.

Algumas das obras deste aclamado autor: “Bichos”; “Os contos da Montanha”; “Diário”;
“Rampa”.

Prosseguirei, então à apresentação do livro.

Título: “Bichos”.

Livro escrito no ano de 1940.

A ideia principal deste livro centra-se numa contradição entre a vida e a cultura de uma
sociedade, através da apresentação de animais com sentir humano e vice-versa; uma
irmandade entre homens e animais.
Cada capítulo desta obra possui um diferente protagonista.

§ Nero: pequeno cão que, enquanto era pequeno, era adorado e querido por todos; mal
cresceu, nunca mais ninguém quis saber da sua existência e acabou por morrer de solidão.

§ Mago: gato ao qual lhe foi tirada a liberdade, por uma senhora; consequência: desdém por
parte dos amigos de Mago.

§ Madalena: humana grávida que, farta da vida que tinha, tentou fugir da sua aldeia, acabando
por abortar pelo caminho.

§ Morgado: burro de carga que, quando ficou velho, perdeu grande parte da sua força e
rapidez e, por tal razão, foi abandonado.

§ Bambo: sapo charmoso que se achava muito entendedor da vida.

§ Tenório: galo que, enquanto jovem, cantava bem e era galado por todos; na velhice: serviu
de jantar!

§ Jesus: menino que roubou um pintassilgo do seu ninho e ficou com ele.

§ Cega-rega: formiga temerosa do Inverno.

§ Ladino: pardal manhoso e matulão, mas que, inicialmente, tivera medo de voar.

§ Ramiro: cordeiro que mata a ovelha amada, despropositadamente.

§ Farrusco: melro vivente de dias agitados, mas assim que se aproximava o lusco-fusco,
adormecia logo.
§ Miura: mais um touro protagonista da desgraçada morte que esta raça animal sofre nas
touradas.

§ Senhor Nicolau: homem que coleccionava, estudava e embalssamava insectos; já em criança


os adorava.

§ Vicente: corvo que conseguiu alcançar a liberdade.

Depois desta apresentação de cada personagem deste livro, prentendo, agora, dar a conhecer
a minha opinião sobre esta linda obra de Miguel Torga.

A verdade é que quando comecei a ler este livro, logo desde início, gostei, mas pensava para
mim: “Então, mas o livro é mesmo assim? Vou estar a ler, cento e tal páginas, uma breve
história de diferentes animais?! Afinal, qual é o objectivo disto?”. Mas sempre com enorme
interesse, continuei a ler o livro e quando cheguei ao último capítulo (“Vicente”), é que percebi
toda esta obra.

Admitindo que Deus criou o mundo, bem como todas as espécies nele existentes e, admitindo
que Jesus é visto na figura de Deus, vamos pensar no capítulo “Jesus”. Como já referi
anteriormente, neste capítulo lê-se a história de um menino que rouba um pintassilgo do seu
ninho, para ficar com ele. Se Deus criou o mundo, era suposto os animais serem todos livres e
usufruírem dessa mesma liberdade, mas, como Jesus cometeu este terrível erro, a liberdade
dos animais acabou nesse mesmo momento, no momento em que tirou um animal do seu
habitat, tirando-lhe a completa liberdade.

Cito os três últimos parágrafos do último capítulo (“Vicente”):

“Noé e o resto dos animais assistiam mudos àquele duelo entre Vicente e Deus. E no espírito
(...) de cada um, este dilema, apenas: ou se salvava o pedestal que sustinha Vicente, e o
Senhor preservava a grandeza do instante genesíaco – a total autonomia da criatura em
relação ao criador -, ou, submerso o ponto de apoio, morria Vicente, e o seu aniquilamento
invalidava essa hora suprema. (...) ninguém mais dentro da Arca se sentia vivo. Sangue,
respiração, seiva de seiva, era aquele corvo negro, molhado da cabeça aos pés, que, calma e
obstinadamente, pousado na derradeira possibilidade de sobrevivência natural, desafiava a
omnipotência.
Três vezes uma onda alta, num arranco de fim, lambeu as garras do corvo, mas três vezes
recuou. A cada vaga, o coração frágil da Arca, dependente do coração resoluto de Vicente,
estremeceu de terror. A morte temia a morte.

Mas (...) se tornou evidente que o Senhor ia ceder. (...) nada podia contra aquela vontade
inabalável de ser livre.

Que, para salvar a sua própria obra, fechava, melancolicamente, as comportas do céu.”

Através desta citação, deste duelo entre Deus e um corvo que queria alcançar a sua própria
liberdade, se percebe a grande mensagem desta obra. Lendo todos os tristes capítulos
referentes à atrocidades que os homens cometem para com os animais e, chegando a este
último capítulo, ficamos a entender como os animais perderam a sua liberdade.

Na minha opinião, este livro sensibiliza bastante o leitor, conjugando uma realidade nos dias
que hoje correm, com a sua causa /o que levou a essa mesma, de uma maneira não tão
directa, mas eficaz, de modo a emocionar quem o lê..

nairsantospereira

Ditongo

Resumo«Os Bichos» ? Miguel TorgaUm livro de contos, cada um dos quais referindo seres
diferentes do reino animal. Nesses contos, Torga apresenta indiferenciadamente homens e
animais, unidos pelos mesmos instintos primários de sobrevivência, atribuindo a estes
sentimentos humanos e retirando àqueles a solidariedade. Todos assim sob a mesma batuta:
bichos. Apenas em «Jesus» poderemos encontrar o que consubstancia a essência humana: a
noção de felicidade, o amor, a ternura, o encantamento, a ingenuidade, a pureza, o respeito.
Nero, no fim da vida, já surdo e meio cego, mordido pelo reumatismo, recorda Os seus tempos
de jovem perdigueiro alegre e folgazão, a aprendizagem do ofício com o filho da casa - quase
sempre ausente mas que ele sentia como seu verdadeiro dono -, as caçadas pelos montes, o
seu amigo Fadista, seu filho que herdara da mãe a impetuosidade, excessiva para a caça, a
mão calejada do velho dono, os mimos e carícias da filha mais nova da casa: a sua menina,
essa, a única em que viu lágrimas dos olhos por si, à hora em que fechou os seus para sempre
e entregou a alma ao criador.Mago, o gatarrão farto e pesado, sofrendo toda a sorte de
humilhações dos seus pares, as ironias sobre as namoradas, a comida, a sua falta de virilidade.
Ainda lhe provocavam um arrepio as lembranças da juventude pelos telhados fora, os ciúmes,
os gritinhos de amor, mas a verdade é que o corpo acostumara-se à boa vida e, sempre que
tentava regressar aos velhos tempos, só passava indignidades junto da vizinhança ágil. Lá para
as tantas, desistiu de vez e regressou aos braços fofos da sua dona. Madalena, a rapariga da
aldeia que, pelo S.Martinho, tropeçara em castanhas e vinho e acabara rolando na palha com
um homem, calcorreava agora, em pleno Verão, as penedias da serra para levar até ao fim o
segredo que conseguira manter só seu. Saíra de casa de madrugada, sabendo que chegara a
hora de nascer o fruto daquele tropeção que lhe manchara a pureza. Não queria descer na
consideração que por ela tinham na aldeia e decidiu procurar ajuda do outro lado da serra.
Mas as dores apertavam cada vez mais e ela teve de parar, sob um sol escaldante. Ali pariu o
seu filho e descansou finalmente. Quando deu acordo de si, a criança jazia morta no chão e ela
respirou de alívio. Limpou-se, largou os trapos sujos e enterrou o filho. Depois, regressou à
aldeia. Morgado era o macho alegre e diligente de um almocreve que, anos a fio, cumpria as
suas tarefas sem reclamar, sempre uma manta ao fim do dia a resguardar dos resfriados e a
manjedoura cheia de bom milho. Só que aquele dia começara mal; o dono acordara de mau
modo, e ele largou apreensivo quando este lhe anunciou seis léguas de serra. Na verdade,
chegou a noite e Morgado não mais viu o dia, que o dono alegre e bonacheirão, em hora de
aperto com os lobos, para safar a própria vida entregou a dele, sem pejo, ainda clamando
pelas dezassete libras que deras por ele na feira, há seis anos atrás!Bambo era o sapo que
acabou com uma estaca espetada nas costas pelo filho do caseiro novo. Conhecia como
poucos o quintal do tio Arruda que o cumprimentava pelas manhãs gostosas ou nos encontros
pela noite em que cantava, largo e reluzente, à lua. Quando o tio Arruda morreu, chegou
aquele pequeno malvado que o deixou morrer esperneando ao sol de pernas para o ar.Do
reino das aves, Tenório, o galo, acabou na panela como qualquer galo, prevendo este fim
desde o momento em que ouviu, pela primeira vez, a patroa chamar-lhe galo velho, mal o filho
começou a erguer a sua voz pelas manhãs claras e a ser mais lesto nas suas obrigações junto
das frangas.Ladino, o pardal que honra o nome, desde o ninho revelou suas fraquezas pela boa
cama e bom trato, sem um pingo de solidariedade pelas mães que penavam à procura de
sustento ara os seus. Já para a idade, alguns atreviam-se a perguntas do género «quando é
esse funeral, ti?Ladino?» ao que ele retrucava, sem rebuço, que só quando acabasse o milho
em Trás-os-Montes! Farrusco, o melro jovial que consolava a moça casadoira a quem o cuco
agoirava anos sem fim de solteira e, finalmente, Vicente, o corvo negro que enfrentou a fúria
diluviana de Deus, postado no último reduto ainda não coberto pelas águas, frente ao temor
de Noé e de todos os habitantes da Arca.Ainda a história de Miura, o touro, rei da campina,
enfrentando com lealdade a covardia dos homens escudados em seus cavalos, em farpas, em
lanças, que entrega o seu corpo à âmina que se lhe oferecia.Finalmente o Sr. Nicolau, o
entomologista incompreendido, morto entre os seus insectos catalogados, ele também quieto
e pronto a entrar na sua caixa. E Ramiro, árido como a aridez do Marão, bicho entre os bichos,
da sua boca apenas o assobio e a raiva incontida por uma ovelha morta traduzida pela cabeça
de um homem cegada por sua foice.
Miguel Torga, pseudónimo de Adolfo Correia Rocha, (São Martinho de Anta, 12 de Agosto de
1907 — Coimbra, 17 de Janeiro de 1995) foi um dos mais importantes escritores portugueses
do século XX, considerado, por alguns, o poeta português mais importante do século XX.

Índice [esconder]

1 Biografia

2 A origem do pseudónimo

3 A obra de Torga

3.1 Prosa

3.2 Peças de teatro

3.3 Traduções

4 Prémios

5 Ligações externas

[editar] Biografia

Oriundo de uma família humilde de Sabrosa, era filho de Francisco Correia Rocha e Maria da
Conceição Barros. Em 1917, aos dez anos, foi para uma casa apalaçada do Porto, habitada por
parentes da família. Fardado de branco, servia de porteiro, moço de recados, regava o jardim,
limpava o pó, polia os metais da escadaria nobre e atendia campaínhas. Foi despedido um ano
depois, devido à constante insubmissão. Em 1918 foi mandado para o Seminário de Lamego,
onde viveu um dos anos cruciais da sua vida. Estudou Português, Geografia e História,
aprendeu latim e ganhou familiaridade com os textos sagrados. Pouco depois comunicou ao
pai que não seria padre.

Emigrou para o Brasil em 1920, ainda com doze anos, para trabalhar na fazenda do tio,
proprietário de uma exploração de café. Ao fim de quatro anos, o tio apercebe-se da sua
inteligência e patrocina-lhe os estudos liceais, em Leopoldina. Distingue-se como um aluno
dotado. Em 1925, na convicção de que ele havia de vir a ser doutor em Coimbra, o tio propôs-
se pagar-lhe os estudos, como recompensa dos cinco anos de serviço, o que levou a regressar
a Portugal. Em dois anos acaba os estudos liceais.

Em 1928 entra para a Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra e publica o seu


primeiro livro de poemas, Ansiedade. Em 1929, com vinte e dois anos, deu início à colaboração
na revista Presença, folha de arte e crítica, com o poema Altitudes. A revista, fundada em 1927
pelo grupo literário avançado de José Régio, Gaspar Simões e Branquinho da Fonseca, era
bandeira literária do grupo modernista e era também, bandeira libertária da revolução
Modernista. Em 1930 rompe definitivamente com a revista Presença, por «razões de
discordância estética e razões de liberdade humana».

É bastante crítico da praxe e das restantes tradições académicas, e chama depreciativamente


«farda» à capa e batina, mas ama a cidade de Coimbra, onde viria também a exercer a sua
profissão de médico a partir de 1939 e onde escreve a maioria dos seus livros. Em 1933
concluiu a licenciatura em Medicina, com apoio do tio do Brasil. Começou a exercer a profissão
nas terras agrestes transmontanas, de resto, o pano de fundo de grande parte da sua obra.

Casou-se com Andrée Crabbé em 1940, uma estudante belga que, enquanto aluna de Estudos
Portugueses, com Vitorino Nemésio em Bruxelas, viera a Portugal fazer um curso de verão na
Universidade de Coimbra. O casal teve uma filha, Clara Rocha, nascida a 3 de Outubro de 1955,
e divorciada de Vasco Graça Moura.

[editar] A origem do pseudónimo

Em 1934, aos 27 anos, Adolfo Correia Rocha autodefine-se pelo pseudónimo que criou,
"Miguel" e "Torga". Miguel, em homenagem a dois grandes vultos da cultura ibérica: Miguel
de Cervantes e Miguel de Unamuno. Já Torga é uma planta brava da montanha, que deita
raízes fortes sob a aridez da rocha, de flor branca, arroxeada ou cor de vinho, com um caule
incrivelmente rectilíneo.

A sua campa rasa em São Martinho de Anta tem uma torga plantada a seu lado, em honra ao
poeta.

[editar] A obra de Torga

A obra de Torga tem um carácter humanista: criado nas serras trasmontanas, entre os
trabalhadores rurais, assistindo aos ciclos de perpetuação da Natureza, Torga aprendeu o valor
de cada homem, como criador e propagador da vida e da Natureza: sem o homem, não
haveria searas, não haveria vinhas, não haveria toda a paisagem duriense, feita de socalcos nas
rochas, obra magnífica de muitas gerações de trabalho humano. Ora, estes homens e as suas
obras levam Torga a revoltar-se contra a Divindade Transcendente a favor da imanência: para
ele, só a humanidade seria digna de louvores, de cânticos, de admiração: (hinos aos deuses,
não/os homens é que merecem/que se lhes cante a virtude/bichos que cavam no
chão/actuam como parecem/sem um disfarce que os mude).
Para Miguel Torga, nenhum deus é digno de louvor: na sua condição omnisciente é-lhe muito
fácil ser virtuoso, e enquanto ser sobrenatural não se lhe opõe qualquer dificuldade para fazer
a Natureza - mas o homem, limitado, finito, condicionado, exposto à doença, à miséria, à
desgraça e à morte é também capaz de criar, e é sobretudo capaz de se impor à Natureza,
como os trabalhadores rurais trasmontanos impuseram a sua vontade de semear a terra aos
penedos bravios das serras. E é essa capacidade de moldar o meio, de verdadeiramente fazer a
Natureza mau grado todas as limitações de bicho, de ser humano mortal que, ao ver de Torga
fazem do homem único ser digno de adoração.

Considerado por muitos como um avarento de trato difícil e carácter duro, foge dos meios das
elites pedantes, mas dá consultas médicas gratuitas a gente pobre e é referido pelo povo como
um homem de bom coração e de boa conversa.

Torga era conhecido popularmente nos meios intelectuais de Coimbra como o rei dos chatos.

[editar] Prosa

1931 - Pão Ázimo.

1931 - Criação do Mundo.

1934 - A Terceira Voz.

1937 - Os Dois Primeiros Dias.

1938 - O Terceiro Dia da Criação do Mundo.

1939 - O Quarto Dia da Criação do Mundo.

1940 - Bichos.

1941 - Contos da Montanha."Diário I"

1942 - Rua.

1943 - O Senhor Ventura. "Diário II"

1944 - Novos Contos da Montanha.

1945 - Vindima.

1946 - "Diário III".

1949 - "Diário IV".

1951 - Pedras Lavradas. "Diário V".


1953 - "Diário VI".

1956 - "Diário VII".

1959 - "Diário VIII".

1964 - "Diário IX".

1968 - "Diário X".

1973 - "Diário XI".

1974 - O Quinto Dia da Criação do Mundo.

1976 - Fogo Preso.

1981 - O Sexto Dia da Criação do Mundo.

1982 - Fábula de Fábulas.

[editar] Peças de teatro

1941 - "Terra Firme" e "Mar".

1947 - Sinfonia.

1949 - O Paraíso.

1950 - Portugal.

1955 - Traço de União.

[editar] Traduções

Livros seus estão traduzidos para diversas línguas, algumas vezes publicados com um prefácio
seu: espanhol, francês, inglês, alemão, chinês, japonês, croata, romeno, norueguês, sueco,
holandês, búlgaro.

[editar] Prémios

O Wikiquote possui citações de ou sobre: Miguel Torga1969 - Prémio do Diário de Notícias.

1976 - Prémio Internacional de Poesia de Knokke-Heist.

1980 - Prémio Morgado de Mateus, ex-aecquo com Carlos Drummond de Andrade.

1981 - Prémio Montaigne da Fundação Alemã F.V.S..

1989 - Prémio Camões.

1991 - Prémio Personalidade do Ano.


1992 - Prémio Vida Literária da Associação Portuguesa de Escritores.

1993 - Prémio da Crítica, consagrando a sua obra.

Você também pode gostar