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INFORMAÇÃO TELEVISIVA
A verdade jornalística
A verdade jornalística é resultado de um processo seletivo que se desenvolve, desde
a definição da pauta, a realização da matéria e a interação entre o público leitor e os
jornalistas. Essa verdade transita entre o princípio da correspondência, da coerência e da
utilidade.
Ao afirmar que seu compromisso primeiro é com a verdade, o jornalista estabelece
para si a função de buscá-la. A verdade aqui é a correspondência entre fato, acontecimento e
notícia. A notícia deve ser fiel aos fatos acontecidos. Há uma crença nesse mundo real e na
capacidade da mídia em mostrá-lo. No telejornal, que utiliza a imagem como prova da
existência desse real, isso fica ainda mais evidente. O jornalista não só “fala o mundo”, mas
também o mostra. Sendo assim, os enunciados sobre o mundo correspondem, na concepção
do jornalista, ao próprio mundo.
No entanto, ao fazer a notícia, essa verdade “real” dá lugar à verdade coerente. O que
é narrado, por ser uma visão parcial dos fatos (por mais que se informe, o jornalista não é
onipresente e não tem acesso a todas as informações), deve procurar ser coerente com o
universo de crenças do público alvo, ou, em outros termos, com a uma imagem que o
jornalista faz de seu público. Sendo assim, a linguagem, em seu sentido mais amplo, deve ser
coerente com o que se acredita poder ser verdade em uma determinada comunidade. Assim,
ao falar de extraterrestres, o jornalista adotará quase sempre um tom ficcional, já que esse não
é um conhecimento que faz parte, consensualmente, de nosso universo de crença. Acreditando
estar em função do público e ter o dever de informar, o jornalista cria de si mesmo e para si
mesmo uma identidade utilitária, logo tudo aquilo que ele informar será útil. A prestabilidade
da informação é reforçada pela crença do caráter missionário do jornalista, como já citado
anteriormente: “fornecer informação às pessoas para que estas sejam livres e capazes de se
autogovernar” (Kovach; Rosesntiel, 2003; pi22).
O mundo da informação jornalística tem, em sua concepção, um compromisso com a
realidade fatual. Mas de que natureza é a relação que se estabelece entre o mundo real e a
informação?
Um dos primeiros argumentos que surge para a mídia se autojustificar é de caráter
ético: “nós devemos manter as pessoas informadas, contribuindo, assim, para a formação de
cidadãos conscientes, e eles (vocês) têm o direito de se informar”.
Sendo assim, a mídia extrai a sua legitimidade do fato de que o seu dever é aliado ao
direito do cidadão. “Nós devemos informar e vocês, cidadãos, têm o direito de construir a
verdade”.
Para Charaudeau (1997; pi31), a verdade não existe em si mesma, ela não preexiste à
ação humana; de fato, ela resulta de um julgamento coletivo que representa idealmente a
opinião da maioria, vale para o conjunto da coletividade. E é dessa verdade que a mídia fala, a
verdade da maioria para a maioria.
A informação é essencialmente linguagem e, como linguagem, ela não se refere tão
somente ao sistema de signos internos da língua, mas ao sistema de valor de uso desses
signos, constituindo-se assim em discurso, testemunho da maneira pela qual se organiza a
circulação da palavra em uma comunidade social. Dessa forma informação é assunto do
discurso.
O discurso de legitimação do fazer midiático baseia-se em dois fortes argumentos: o
da complexidade e o da opacidade do mundo.
Sendo o mundo complexo, como um cidadão comum pode compreendê-lo?
Enquanto a ciência procura desvendar os segredos do mundo, a mídia assume para si a função
de explicá-los às pessoas. O grau de complexidade do mundo está relacionado com o
conhecimento que temos sobre ele. Nesse sentido, é verdadeira a aporia socrática quando ele,
Sócrates, diante de todo conhecimento que possuía, achava-se cada vez menos sábio (“Só sei
que nada sei”). É o que acontece com a informação que adquirimos sobre o mundo: quanto
mais informações, mais clara fica essa complexidade. Mas seria realmente a mídia capaz de
explicar a complexidade do mundo? Ao procurar uma forma de adequar suas explicações a
um conceito de verdade que pressupõe o julgamento da maioria, não estaria simplificando
demais o complexo? E, ao simplificá-lo, não estaria mascarando a sua complexidade?
Outro argumento para o discurso de legitimidade é a opacidade. O mundo real é
considerado opaco, e cabe à mídia iluminá-lo para que as pessoas passem a enxergá-lo melhor
e possam chegar às suas próprias conclusões. Charaudeau afirma o seguinte:
E é pela luta para que o exercício do poder não seja obscurecido pelo interesse
político-pessoal dos governantes, que a mídia, em seu papel de desvelador do que está
escondido, legitima de forma pragmática o seu fazer.
Considerando esses dois argumentos o que definiria um fato como pertinente para ser
divulgado? Como se procede a seleção da informação?
A pertinência de uma informação depende das hipóteses que se faz em relação a(o):
O discurso de informação
Para Patrick Charaudeau, o termo discurso pode ser utilizado em dois sentidos.
Primeiramente, discurso está relacionado à “encenação” do ato de linguagem. Essa encenação
deve ser analisada pela sua inserção em dois circuitos: um externo que representa o espaço do
FAZER, espaço psicossocial, também chamado de Situacional, e um espaço interno, que
representa o espaço de organização do DIZER. É importante ressaltar que a encenação
discursiva não se realiza independentemente da outra, no entanto, possui dispositivos próprios
que lhe conferem uma certa autonomia. Pode-se, assim, estudar estratégias discursivas do
discurso político em outras situações como, por exemplo, a midiática.
O discurso pode também se referir a um conjunto de “savoirs partagés” (saberes
partilhados) construído por indivíduos de um dado grupo social. Esses discursos sociais, ou
imaginários, são testemunhos das representações de práticas sociais em um determinado
contexto sociocultural.
O discurso é direcionado para além das regras de uso da língua, ligando as
circunstâncias nas quais se diz algo ao que é dito. As circunstâncias englobam: local,
identidades, relação de intencionalidade e condições físicas da troca. O discurso é uma
maneira de dizer, que é mais ou menos esperada, codificada ou improvisada segundo um
conjunto de condições intencionais que a precedem. Há então, ao mesmo tempo, condições
extradiscursivas e realizações intradiscursivas cuja relação intrínseca produz o sentido.
Informar pressupõe estabelecer um processo pelo qual se deve identificar os seres do
mundo através da nomeação e qualificação, narrar suas ações e argumentar, explicar,
comentar os motivos, no jargão jornalístico, fazer o lead: O quê? Quem? Onde? Quando? Por
quê?
Para Kucinski (1998), os meios de comunicação de massa substituíram as praças
públicas na definição do espaço coletivo da política no mundo contemporâneo; dessa forma
muito da percepção popular de sociedade e de política provém da mídia, principalmente
através do rádio e da TV. Diferentemente da mídia impressa, a TV e o rádio têm adeptos em
todas as classes sociais, uma vez que a sua difusão é mais “eficiente” e a sua linguagem, em
parte por ser oral, mais acessível. Compreender o discurso utilizado pela televisão, no intuito
de “informar” um público tão vasto, é, também, uma forma de compreender um pouco a nossa
sociedade.
As mídias de informação funcionam segundo uma dupla lógica de ação, fator
determinante na transmissão de informações:
i. Econômica – O órgão de informação é uma empresa e como tal tem por finalidade a
fabricação de um produto competitivo no mercado. É ainda o aspecto econômico que
definirá um outro fator de grande relevância na produção da informação: a tecnologia
utilizada.
ii. Semiológica – Todo órgão de informação deve ser considerado como uma máquina
produtora de signos (formas e sentidos).
Assim, a televisão, que nos interessa mais de perto, tem um lado voltado para fora, o
mundo exterior, o mundo dos fatos, da recepção e um voltado para si mesma, para o estúdio e
para as condições de produção de seus programas, como afirma Charaudeau (1998; pi249): “A
televisão não é um conceito. Ela é um objeto empírico do qual é necessário fazer um objeto de
análise, um objeto empírico, heterogêneo e um objeto de análise plural”. Dessa forma,
analisar a informação televisiva implica considerar tanto a dimensão externa, dos fatos,
quanto a interna, do acontecimento midiático. E uma das perguntas mais freqüentes, feitas por
nós, analistas, é como se transforma um fato em notícia, quais os recursos utilizados e quais
os efeitos suscitados? Entre os diversos aspectos que podem ser estudados destacaremos a
seguir, a presença da polifonia nas matérias jornalísticas.
Essas categorias são escolhidas em função da natureza da matéria divulgada, bem como do
material que o editor possui, sendo esse último um fator limitador na construção da notícia.
Não possuir um depoimento importante de alguém envolvido em um fato a ser relatado pode
comprometer os efeitos visados pela matéria.
O texto jornalístico caracteriza-se, então, por ser, em sua essência, polifônico. A inserção
da fala de outrem pode se dar pelo uso da citação (discurso direto) ou do discurso relatado
(discurso indireto).
Discurso Direto
O discurso direto reproduz literalmente a fala das pessoas envolvidas no fato relatado. O
jornalista, ao construir seu texto, reconstrói o passado, produzindo um efeito de
presentificação. O leitor, por sua vez, tem contato direto com a expressão ipsis litteris da fala
do citado, o que aumenta o grau de credibilidade do texto. O reconhecimento desse tipo de
recurso é facilitado,no texto escrito, pelo uso de aspas ou itálico, destacando a fala e a
distinguindo do restante do texto. O recurso da citação é utilizado quando o que foi dito e
quem disse possuem relevância para o cenário em questão. Em um texto acadêmico, por
exemplo, cita-se para, normalmente, referendar o próprio discurso através da posição de
prestígio ocupado pelo citado (citação de autoridade). Já no texto jornalístico, a citação é
usada em prol de três finalidades fundamentais para o discurso de informação midiático:
- autentificação do texto;
- distanciamento do enunciador (dissociação das situações de comunicação);
- garantia do caráter de seriedade do texto.
Na reportagem televisiva, há duas formas de se utilizar o discurso direto. A primeira
seria semelhante a do texto escrito, o jornalista ora repete o que foi dito, identificando a sua
autoria, ora, mostra, através da inserção da imagem de um texto entre aspas, o dito. A segunda
acontece por meio da imagem, mostrando o momento da enunciação do dito, que pode ter
sido provocado pelo próprio repórter (em uma entrevista, por exemplo), ou registrado de uma
outra situação (discurso em uma Assembléia, por exemplo).
Discurso indireto
Enquanto o discurso direto restitui as palavras do outro, o discurso indireto restitui o sentido
do que foi dito. No discurso indireto tem-se apenas uma situação de comunicação - a do
citante (o jornalista responsável pelo que diz). O jornalista enuncia através de sua voz a voz
do outro sem compromisso com a forma do texto original. Esse recurso visa, também,
garantir a credibilidade do texto informativo, no entanto vale ressaltar que o sentido restituído
é sempre mediado pela interpretação do citante (jornalista) . Ao incorporar em seu texto a
fala do outro, o jornalista-enunciador explicita a fonte de origem através de expressões como
de acordo com, segundo, ... ou através de orações subordinadas introduzidas por um verbo de
fala ( disse que... afirmou que... reconhece que...).
No entanto, não podemos perder de vista que a utilização da fala de um terceiro, tanto
em um quanto no outro caso, é fruto de uma escolha diretamente relacionada a uma
intencionalidade comunicativa. Assim, nem sempre, as notícias demonstram a imparcialidade
tão apregoada pelos jornalistas, que só poderia ser garantida pela presença igualitária das
diferentes vozes envolvidas em um determinado “conflito” reportado.
Outro fator relevante é o recorte do texto relatado ou citado. O trecho mostrado,
relatado nem sempre, ou melhor, quase nunca, corresponde à integra do que foi realmente
enunciado. O processo de destacamento e inserção em uma matéria posteriormente editada
constrói uma outra enunciação diferente daquela que lhe deu origem, o que não raro, pode
ocasionar interpretações não desejadas pelo sujeito enunciador primeiro.
A argumentação implícita na informação
Referências