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Surpresa porém: examinamos nossas vidas nos últimos anos e temos a sensação quase
oposta. O tempo foge às mãos, a condução do dia a dia parece se tornar mais e mais
complexa, mais agitada e ansiosa ! É um paradoxo, afinal de contas com tantas
ferramentas potentes e muito mais meios para coordenar e controlar nossas atividades
do que tínhamos quem poderia supor que fossemos terminar nesse corre-corre
alucinado da vida moderna ?
Há vinte e cinco anos, ainda sem celular, internet e computador pessoal em nossas
mãos, tudo de fato tinha ares mais suaves. Nós, por exemplo, autores deste texto,
trabalhávamos então ambos em um instituto de pesquisas durante o dia e à noite,
eventualmente, dávamos aulas em cursos de pós-graduação no Rio de Janeiro. Era
frequente irmos ter com os amigos após a jornada de trabalho em um bar ou chegar em
casa com o dia ainda claro, aproveitando a luz do horário de verão e a beleza da
paisagem carioca.
Olhadas retrospectivamente, estas imagens e sensações simples nos dão certa nostalgia.
Parecem já distantes, como se tudo houvesse virado às avessas nesse curto período.
Sem que tivéssemos planejado isso, paulatinamente cruzamos o perímetro da cidade e
passamos atuar em todo o estado, depois na região sudeste, então nos quatro cantos do
país. Hoje, na condução de uma pequena empresa de base tecnológica, desenvolvemos
projetos e cursos em quase todos os estados brasileiros e atuamos em outros países da
América Latina e Europa. Mais dia menos dia haveremos de estar fazendo algo na África
ou no oriente !
Com efeito mesmo empresas “ícones” da produção em massa não podem mais
concentrar seus recursos na produção em um único ou poucos SKUs1. Pergunte a um
leigo quantos diferentes produtos são envasados pela empresa líder de refrigerantes no
mundo? Talvez ele diga: cinco, sete, dez ou algo assim. Pois saiba: são mais que 200
variantes entre marcas tradicionais, marcas locais que foram adquiridas, sucos,
energéticos, chás e muitos outros; sem dizer das opções: normal, diet, light; dos tipos
de vasilhame: vidro, lata, PET e; das alternativas de volume e amarração.
Sim, variedade e variabilidade costumam andar juntas. Palavras parecidas, mas com
significados diferentes. Ministre várias vezes um mesmo curso para um mesmo único
público-alvo. Agora, ministre esse mesmo curso para diferentes públicos, ou ainda para
o mesmo público-alvo, mas em diferentes regiões do Brasil. Você se surpreenderá ao
perceber como a execução e o resultado são diferentes. Experiência própria: se a cultura
local não é exatamente a mesma, as expectativas e desejos pessoais também tendem a
variar. O curso é percebido pelos alunos de forma diferenciada. O mesmo acontece se
você apresenta um mesmo conteúdo para estudantes de graduação, de especialização,
de um MBA executivo ou de um mestrado acadêmico. Serão aulas bem diferentes,
mesmo se os slides e dinâmicas forem parecidos.
De modo análogo, em uma empresa, se você faz vários produtos com um mesmo
fornecedor, o grau de controle do processo é mais determinado. Se você já o conhece, a
introdução de um novo produto trará questões novas, é claro, mas sendo o
relacionamento com o canal maduro você pode presumir ou conter mais facilmente a
variabilidade.
Por outro lado, se o aumento da oferta de variedade para o seu mercado traz consigo
fornecedores, processos, materiais ou consumidores não típicos, é plausível, e bastante
provável, que você se depare com variações que não conhece bem ainda, processos não
estabilizados e flutuações imprevistas de desempenho.
Some-se a esse tipo de turbulência, a existência de variáveis aleatórias, fatos que fogem
ao nosso domínio ou à previsão humana. No nível pessoal: a morte, a paixão, os
1
SKU – stock keeping unit, unidade que identifica um item específico de armazenagem ou venda.
Há uma terceira razão para o mundo das operações, no dia a dia, parecer de pernas para
o ar: tudo se comunica muito rapidamente, velocidade meteórica!
Citamos há pouco nossa memória de há vinte cinco anos atrás. Pois, embora em uma
perspectiva histórica esse seja um período irrisório, o fato é que naquela altura a
comunicação era ainda dominada por carta e telex. A ligação telefônica era cara, o
aparelho de telefone era um bem (listado como um ativo na declaração do imposto de
renda). Ligar da rua dependia de encontrar um “orelhão”2. Computadores pessoais
tinham custo elevado. Para nós, por exemplo, era ainda um item inacessível ao nosso
orçamento pessoal. Entre pergunta e resposta o tempo parecia passar mais devagar e
ninguém ficava aflito se a resposta a uma carta demorava dias e não minutos. Havia
mesmo um romantismo nessa espera: imaginar o interlocutor abrindo o envelope, lendo
sua carta, preparando a resposta!
2
Gíria popular que identifica no Rio de Janeiro e em outras cidades brasileiras os telefones
públicos.
O que mais surpreende é que a novidade dura pouco! Pouquíssimo ! O produto entra
hoje na vitrine principal e dois meses depois já é deslocado para um lugar de menor
destaque. Montadoras de automóveis, computadores, celulares, periféricos, automóveis e
cosméticos; produtores de software, fabricantes e prestadores de serviço, praticamente
todos, em todos os segmentos da sociedade, competem em um ritmo frenético de
invenção e moda, fazendo modificações ou mudando por completo o pacote de valor
ofertado em períodos que se contam em meses ou, em alguns mercados, já em semanas
ou dias.
E observe que a fonte de pressão não é só seu cliente ávido por novidade. É dura, meu
amigo, a vida de quem inventa algo ! Você investe em pesquisa e desenvolvimento, arca
com esses custos e “dez minutos depois” é seguido por concorrentes que atalham o
processo e sem arcar com os mesmos custos copiam seus produtos colocando-se par e
passo na competição. Por exemplo: nós como consultores testemunhamos recentemente
uma situação em que uma empresa, líder em seu mercado, teve que adotar como
política alterar continuamente as peças de seus produtos apenas para impedir que a
concorrência as copiasse. É que sua rede de concessionárias espalhada por todo o
território nacional é uma de suas grandes vantagens competitivas e estava sendo usada
predatoriamente pelos concorrentes que para tanto fabricavam produtos com peças
idênticas às suas.
Tempos existem na produção e no fluxo entre os elos da cadeia como, por exemplo,
entre o sistema e seus fornecedores ou entre o sistema e seus clientes. À esse respeito
observe que quando os lead-times3 dos processos logísticos são longos, mais expostos
3
Lead-time é o termo em inglês que refere o tempo total de atravessamento de um material em um sistema
de produção ou de um cliente em um sistema de serviço. De forma simplificada pense no tempo que decorre
entre você entrar em uma loja e sair após compra de um produto; ou o tempo entre a encomenda de um
material até o instante em que você o recebe em sua casa; ou o tempo entre o processo receber uma
requisição de serviço e o entregar.
Quando a cadeia de suprimento reúne processos que estão distantes uns dos outros; ou
são muito turbulentos; ou quando a gestão dos fluxos é conduzida sob o estresse de
relações de poder desbalanceadas – em lugar de parcerias ganha-ganha – tende a haver
ações defensivas de proteção, seja com estoques ou com antecipações de tempo. A
consequência é que a fluidez desejada fica obstaculizada por eficiências locais; a
complexidade cresce e com ela a chance de erros.
Interessante é notar que se de um lado o alto volume traz complexidade de outro não
menos complexo é a situação de quem produz volumes baixos ou unitários. Quem faz
algo irregular ou unitariamente tem menos possibilidade de padronizar ou fazer ganhos
de escala tende a ver-se às voltas com mais incertezas e variabilidade.
Se, porém, o processo é dominado por processos automatizados, com ativos caros,
temos aí mais um dado de complexidade e tensão. Pois, se a demanda cresce
gradualmente, a capacidade de máquina tende a ser provisionada em patamares e
precisa ser providenciada com antecipação.
Isto é, suponha que você tem uma máquina cara com capacidade para processar 100
produtos em certo período. Considere também que você tem uma demanda de 95
produtos que a consome quase que integralmente. Se a sua demanda avançar para 120,
o que você faz? Compra outra máquina? Meio arriscado, não é? Ativos caros significam
um risco a mais para a gestão!
Bem, quanto ao “amargo problema” nem é preciso dizer que grande tensão haverá se
ativos caros ficarem subutilizados. Provavelmente a ineficiência e o baixo aproveitamento
do capital imobilizado deixará o acionista de “cabelo em pé”.
Em tese, procurar calma e conforto diante da complexidade parece sensato, mas se tudo
a volta segue mudando e se transformando manter-se na mesma posição pode,
contrariamente ao propósito, significar estresse elevado. Diz-se que uma causa
recorrente de afogamento no mar é nadar contra a maré. Por outra, se você nadar em
sintonia com a corrente, suavemente, aproveitando o ritmo e sentido das ondas, com
calma e menor esforço chegará à praia são e salvo.
O que nos faz não querer mudar? Por que manter a posição? Uma causa é a que
mencionamos: a hipótese (na maioria das vezes falaciosa) de que onde estamos é a zona
de maior conforto. Outra possibilidade (talvez um pouco menos honrosa) é a de estarmos
tomados pela vaidade, seduzidos pelo próprio ego, encantados com escolhas que fizemos
no passado (e porventura nos trouxeram recompensas). Tais fatos e sucessos muitas
vezes nos iludem, contribuindo para uma certa cegueira de paradigma que nos retém,
paralisa. E quando despertamos, em geral tardiamente, vemos que em lugar do
conforto almejado estamos é “perdendo o barco” e elevando assim a ansiedade à sua
máxima potência.
Investigamos aqui algumas das causas que estão por trás da complexidade das
operações no mundo contemporâneo. Listamos 7+1 aspectos da realidade que em
combinação trazem grande dificuldade para a gestão articular, consistentemente, as
decisões e ações locais do dia a dia com o nível estratégico, os planos e resultados
desejados pela corporação. A figura 1 resume as fontes de complexidade aqui
identificadas.
A COMPLEXIDADE
O QUÊ CARACTERIZA? INDICADOR DE REFERÊNCIA
AUMENTA QUANDO O
(de quê?) (no sistema de produção)
INDICADOR:
Nº de diferentes recursos /
2 VARIABILIDADE (de) PROCESSOS fornecedores usados para a mesma
operação / o mesmo insumo
AUMENTA ( )
Embora, em tese, quando se consolida e se integra diferentes sistemas num único o que
se busca seja exatamente produzir sinergias tais que proporcionem economias globais e
eliminação de atividades anteriormente feitas de modo redundante, por outro lado, o
aumento do número global de recursos e a necessidade de operá-los de maneira
harmônica traz aos sistemas de produção e serviços um crescimento de complexidade
que tende a ser combinatorialmente explosivo. A consequência é que comumente tem-
se dificuldade de ver o todo com nitidez e, muitas vezes sem perceber, induz-se
comportamentos que terminam hostis aos próprios interesses e estratégias competitivas.
Há até mesmo razões matemáticas que explicam isso. Pode-se provar por exemplo que
a complexidade de solução de um problema de programação da produção aumenta muito
mais que proporcionalmente quando o escopo de análise cresce. Com efeito, agendar
quatro clientes em dois recursos, de forma integrada, oferece uma gama de alternativas
muitíssimo superior que o dobro das existentes para o agendamento integrado de apenas
dois clientes nesses mesmos dois recursos4.
Tomemos um exemplo típico do campo da Gestão das Operações. Suponha que uma
empresa, por uma definição estratégica, quer ter a pontualidade como seu diferencial
competitivo. Mas, claro, está também preocupada com o uso racional e a rentabilização
dos seus caros ativos. Imagine ainda que, neste instante, há três produtos em carteira
4
O universo de possibilidades de agendamento de dois clientes em dois recursos é da ordem de 2!2, que é igual
a 4; enquanto o universo de possibilidades de agendamento de quatro clientes nesses mesmos dois recursos é
dado por 4!2, que é igual a 576, muito mais que o dobro das 4 existentes na situação com dois clientes. Isso
ocorre porque o sequenciamento de n atividades em m recursos é da ordem de n!m, o que configura um
problema de natureza combinatória explosiva.
que devem ser preparados para hoje. Considere que para passar de um serviço para o
outro perde-se cerca de duas horas preparando e ajustando a máquina para o
processamento do novo pedido.
Admita agora que, face à dimensão do sistema, o objetivo estratégico (“ser pontual”)
não tenha sido claramente comunicado ou percebido pela célula de produção local. Ou
pior, ao invés disso, a alta direção tenha decidido medir o desempenho do gerente local
de acordo com a utilização da máquina que processará estes pedidos. Ora, qual será a
provável consequência desse estímulo ao uso eficiente dos caros ativos?
Possivelmente, o chefe local se guiará pela forma como é medido. Para apresentar alta
utilização da máquina ele tenderá a manter em processamento o mesmo produto durante
todo o dia. De fato, se não gastar tempos improdutivos, trocando o produto que está em
processamento, conseguirá o melhor resultado possível de utilização do ativo e ficará
“bem na foto”. Porém, os outros dois produtos que não foram priorizados para
processamento ficarão para o dia seguinte. Ou seja, o objetivo estratégico da
pontualidade acabará traído pelo comportamento local.
Quais são as principais anomalias que dificultam nossa visão? Poderíamos fazer um
paralelo com as dificuldades que tão frequentemente assolam a gestão da produção e
serviços, obstruindo a visão global do desempenho dos sistemas?
PRODUTIVIDADE
ESFORÇOS
EFICIÊNCIA
Os recursos de produção são limitados !
Produtividade é uma relação entre resultados obtidos por um sistema e os esforços feitos
para alcançá-los. É uma conta de dividir. Pode-se aumentar a Produtividade de duas
formas: potencializando-se os outputs (o numerador da fração) ou reduzindo-se os
inputs (o denominador da fração). Na linguagem de “operações”, o aproveitamento das
oportunidades de negócio, os objetivos, o aumento dos resultados, é o campo da
eficácia; já a desafio pela racionalidade e a economicidade no uso dos meios, a redução
dos esforços, é o campo da eficiência.
Examinemos essas alternativas. Lutar por reduzir o denominador da conta (os esforços
realizados para se obter o resultado) parece ser uma solução atraente e relativamente
simples. Veja: os recursos de produção estão sob controle direto do gestor, estão “perto
dos olhos, perto do coração”. Talvez por isso reduzir os custos de utilização dos recursos
é para muitas empresas o primeiro caminho, a solução mais imediata (e talvez a mais
fácil).
Uma razão que de algum modo explica essa distorção é a propriedade cumulativa que
tem o custo. Com efeito, um real de custo tem o mesmo valor, seja gasto com o
cafezinho ou com a máquina mais importante da empresa. Se você quer uma redução
global de 10% basta comandar uma redução de 10% em cada departamento, e se todos
localmente cumprirem o estabelecido a redução global será de 10%.
Já quando se fala de resultado ou de ganho a conta não fecha assim de forma tão fácil.
Um real gasto em um recurso com folga de capacidade pode não significar nada no
resultado, talvez apenas mais ociosidade nesse recurso. Já um real gasto em uma área
“gargalo” tem impacto global. Enquanto o custo se acumula de forma aditiva, o ganho
requer um entendimento mais apurado da cadeia de valor para sua potencialização.
Além disso, como entre a tomada de decisão e a passagem da informação tende a haver
defasagem de tempo, a turbulência não só se amplifica, mas também se defasa, fazendo
Por exemplo: imagine que por algum motivo o mercado se aqueceu. Essa informação é
passada pela ponta de venda ao supridor e assim por diante. A cada elo da cadeia, a
tendência de nos protegermos do desconhecido, faz com que as reações se amplifiquem.
Além disso, como há um tempo entre o estímulo e a resposta, a cada passo vai também
se estendendo mais e mais a defasagem em relação ao fato original. No fim das contas,
frequentemente, a onda inicial já começou a se inverter (por exemplo, o mercado
começou a cair) e a ponta oposta da cadeia de suprimentos está ainda reagindo ao
primeiro impulso, como se o mercado ainda estivesse aquecido.
Outro dano decorrente de uma postura nervosa em relação às oportunidades diz respeito
à dificuldade dos processos amadurecerem. A constante mudança de foco nas prioridades
dificulta o aprendizado e a estabilização dos processos.
Você tem um tino apurado para as oportunidades, fareja as chances mesmo aquelas que
parecem distantes e competentemente alavanca com agilidade os resultados – o
numerador da conta. Mas, não percebe claramente os custos globais que decorrem
dessa ação e produzem turbulência em toda a cadeia. Tampouco estrutura
adequadamente os processos que reincidem em erros de forma grosseira e ineficiente. O
numerador da conta da produtividade aumenta mas o denominador cresce também mais
que proporcionalmente e o pobre quociente, em lugar do esperado aumento, despenca.
De novo, o feitiço vira contra o feiticeiro. Pense bem: se em uma fração o numerador
(receitas do sistema, por exemplo) é maior que o denominador (despesas do sistema,
por exemplo) e você soma uma unidade a cada uma dessas parcelas, o que acontece
com o quociente? Ele cai, não é mesmo? Se o aumento do resultado for neutralizado
pelo aumento do custo global o ganho de resultado pretendido vira uma miragem.
5
Na literatura de “Gestão de Operações” esse fenômeno é conhecido como “efeito chicote”.
QUALIDADE
SATISFAÇÃO DE TODOS
Governo
Sociedade
Ora, o que seria então o “astigmatismo gerencial”? A resposta é exatamente a que está
no dicionário! É quando a visão global não consegue focar o olhar uniformemente em
todas as direções.
6
Stakeholders são os “os interessados” em um determinado sistema de produção, nomeadamente: clientes,
acionistas, colaboradores, parceiros, fornecedores, governo e sociedade.
Foram aqui discutidas três típicas distorções comumente incorridas por empresas no
enfrentamento da complexidade inerente à gestão dos sistemas de produção e serviços
nos dias de hoje. Metaforicamente, foram conceituadas a “miopia gerencial”; a
“hipermetropia gerencial” e o “astigmatismo gerencial”. A figura 5 resume brevemente
esses três conceitos.
São tantas as armadilhas no dia a dia; tantas as chances de, no enfrentamento das
questões locais, perdermos a visão do todo que precisamos pensar: o que fazer para
lidar com a complexidade das operações e não perder o rumo?
O mundo está rápido e complexo? Estou perdendo a visão global e tudo parece
fragmentado? Como recuperar a percepção do todo e enfrentar a velocidade e a
complexidade? Ora, quem tem capacidade de velozmente processar uma extensa
massa de dados? Elementar, meu caro! O computador, é claro!
A empresa comprou várias plantas, em diferentes lugares, cada uma faz vários produtos,
relaciona-se com diferentes clientes. Que tal comprar um sistema computacional
integrado e padronizar os processos de gestão? Colocar sensores nos equipamentos para
capturar seu desempenho em tempo real e acioná-los automaticamente? Etiquetar
produtos e materiais com “tags eletrônicos” inteligentes para que revelem sua localização
e se relacionem autonomamente com os recursos de produção sem intervenção humana?
Aproximar-se do cliente com sistemas inteligentes que armazenam informações sobre
seus hábitos de consumo e interesses, de forma a tentar adivinhar a sua necessidade? E,
porque não integrar estas várias informações em uma base de dados centralizada,
calculando-se perdas e ganhos, e disponibilizar no notebook que fica na mesa do
presidente da empresa o resultado global de todo o sistema atualizado, em tempo real?
Que tal (re)integrar os sistemas usando a tecnologia?
7
Em inglês, Supply Chain Management.
8
No mundo os sistemas integrados de gestão mais difundidos são o SAP e o ORACLE. No Brasil merece
destaque entre outros a TOTUS que integrou as experiências bem sucedidas da MICROSIGA, RM, DATASUL e
LOGIX, dentre outros.
Para além do cenário ilustrado na figura 69, tal abordagem evolui hoje a passos rápidos,
no caminho da integração, também, de toda a cadeia de valor, abrangendo
verticalmente as estruturas de suprimento, desde a fonte de matérias-primas até a
distribuição (o fornecedor do meu fornecedor e o cliente do meu cliente), e incluindo a
experiência do consumo pelo cliente final na ponta final da cadeia de valor e a logística
reversa de reciclagem até de volta a origem dela.
A gestão das operações com foco nas restrições (e a Teoria das Restrições10)
O mundo está rápido e complexo? Você sente-se perdendo a visão do todo? Que tal,
antes de sair automatizando tudo, entender melhor seus próprios processos? Separar o
importante do desimportante: o trigo do joio. Sim, se você não faz isso corre o risco de
integrar e acelerar processos ineficientes.
Suponha que para lidar com a complexidade no nível pessoal, em lugar de notebook e
celular, você resolvesse aplicar seu dinheiro em psicanálise. Resolvesse entender melhor
seus mecanismos mentais, seus comportamentos; optasse por concentrar-se em
descobrir as questões que lhe paralisam, lhe retêm; e como gerenciá-las, concentrando
seus esforços nas questões realmente críticas. Será que é mesmo tudo no entorno que
está complexo ou há algo segurando você? Algo que, se você compreendesse e
9
CRM – Consumer relationship management (gerenciamento do relacionamento com o consumidor).
CAD – Computer aided design (projeto do produto apoiado pelo computador).
CAM – Computer aided manufacuring (fabricação apoiada pelo computador).
CAPP – Computer aided process planning (planejamento da produção apoiado pelo computador).
RFID – Radio frequency identification (identificação eletrônica por rádio frequência).
DRP – Distribution requirement planning (planejamento das necessidades de distribuição).
ERP – Enterprise resource planning (planejamento dos recursos da empresa).
SCM – Supply chain management (gestão integrada da cadeia de suprimentos).
10
Em inglês Theory of Constraints.
gerenciasse melhor, desanuviaria e faria fluir melhor todas as suas demais questões e
relações.
Para entendermos melhor, tomemos um exemplo corporativo fictício (mas como algumas
tintas bem reais). Suponha um grande sistema de produção e logística que de forma
integrada são executados três grandes processos: (i) a extração de um metal precioso no
interior de um país; (ii) o transporte do produto por linha férrea e (iii) a exportação
através de um porto no litoral. Onde está a riqueza?
Um leigo tenderá a dizer: a riqueza está na mina, claro! Mas, vamos supor que a
capacidade de produção da mina neste instante supera a capacidade de transporte da
linha de férrea, e que esta é, por seu turno, mais restrita que a capacidade de embarque
do porto. Nessa hipótese, quem limita a geração de riqueza do sistema é a estrada de
ferro, certo? Pois não é possível faturar nenhum real a mais que o referente ao minério
transportado na linha. Não é possível vender o minério se ele não for transportado até o
porto ! E pouco adianta uma grande capacidade de embarque no porto se não houver
minério para exportar.
Se a eficiência da mina aumentar e mais minério for extraído por hora, qual será o
impacto disso no resultado global? O que acontecerá com o material excedente que
porventura vier a ser disponibilizado pela mina para transporte, mas não tiver como ser
transportado imediatamente? Haverá faturamento adicional ou, muito ao revés, o que
haverá será o aumento das despesas operacionais para extrair o minério e para
armazená-lo até que chegue a sua vez de transporte?
O mundo está rápido e complexo? Estou perdendo a visão do todo? Que tal, em lugar do
computador ou da psicanálise, rever nossas escolhas e tornar a vida mais simples?
Driblar os “Vs” da complexidade. Ora, se a complexidade vem da variedade e do volume
de coisas processadas no “continente”, porque não dividir o problema em pequenas
“ilhas”? Problemas menores, complexidade menor. “Small is beautiful!”, dizem com
propriedade os ingleses.
11
Em inglês, Lean Thinking.
Alguém dirá: ilusão! Nossa mão de obra é despreparada, não há como delegar o desafio
gerencial. E, ainda, na linha da contra-argumentação: o que precisamos é de gerentes
sagazes, capazes de liderar com competência o processo de solução de problemas. E
ademais, responsabilidade não se delega!
Será de fato que um adulto que gerencia sua própria vida, que providencia alimento,
residência e escola para os filhos não é capaz de resolver um pequeno problema cuja
solução já é conhecida? Será que a causa-raiz desse distanciamento é de fato ele, o
operador, ou sou eu, o gerente, que o confino num papel meramente operacional e
reativo? Será que não é mesmo possível motivá-lo para o processo de solução de
problemas? Será que não é possível organizar previamente planos de contingência e
treiná-lo para a execução desses planos quando pequenas questões ligadas ao seu posto
de trabalho porventura ocorrerem?
Tomemos um exemplo simples para pensar: um jogo de futebol! O time A, mais forte
tecnicamente, está pressionando o time B, mais fraco, há uma hora, sem fazer gols.
Domínio total, mas nada de gol.
Então, finalmente, um tento. Um a zero, passa a dizer o placar. De repente tudo muda.
O time B, inferiorizado no escore avança e inverte as posições, parte para cima. O time A
que estava com controle do jogo recua. É algo um tanto incrível, são os mesmos onze de
cada lado, o mesmo campo, a mesma bola. Mas, de repente, o jogo parece outro. O que
mudou? O placar! O time B, mesmo sendo mais fraco, sabe que agora está atrás do seu
objetivo, sabe o tempo que lhe resta, tenta recuperar o terreno perdido sem que
ninguém lhes sopre isso no ouvido. Instintivamente, os jogadores correm atrás do
prejuízo. Acontece todos os dias.
E ainda: se, logo abaixo do placar, o chefe houvesse preparado e afixado ali um plano de
contingência do tipo “se” acontecer isso “então” faça aquilo “ou” alerte alguém, será que
o operador não estaria apto a transformar-se de fato no grande personagem da solução
rápida dos problemas que assolam o cotidiano, deixando assim de ser mera “mão de
obra” e tornando-se uma autêntica “cabeça pensante”?
12
Uma descrição detalhada do Pensamento Lean é feita no capítulo 3
Bem, quando pensamos num sistema de produção e serviços de pronto nos vêm a
cabeça dois personagens ! E junto com eles um enredo, um objetivo. O objetivo
poderia se dizer que, em sentido amplo, é atender uma necessidade ou agregar valor
para alguém. Esse é o real significado da palavra Produção nos dias de hoje, como
ressalta a figura 10.
Figura 10: O conceito atual de produção que abarca além da produção de bens
também a prestação de serviços
PRODUÇÃO
Conceito Tradicional:
É a atividade pela qual os recursos,
fluindo dentro de um sistema definido,
são reunidos e transformados de uma forma
controlada, a fim de agregar valor de acordo com
os objetivos empresariais.
Conceito Atual:
Gerar ou aumentar a UTILIDADE ou VALOR
de um bem ou serviço
TRABALHO nem sempre leva a PRODUÇÃO !
?
TRABALHO PRODUÇÃO
A resposta mais imediata a essa pergunta que tende a vir a nossa mente são os
materiais, insumos, coisas assim. Talvez porque lá atrás no tempo o imaginário da
Revolução Industrial tenha deixado gravado no nosso inconsciente a associação entre
produção e transformação de materiais. Isso de fato se revela no conceito
tradicionalmente atribuído ao termo “Produção”, muito referido aos setores primário e o
secundário da economia como é descrito também na figura 10. Mas repare que hoje, de
algum modo, participamos de inúmeros sistemas que não processam exatamente
materiais.
Você dá a um contador, por exemplo, uma série de comprovantes de débito e crédito. Ele
processa estes dados e lhe devolve um balancete, a consolidação em um resultado
financeiro. A um arquiteto você descreve qualitativamente o que quer e ele traduz em
desenhos, projetos. A um advogado você passa argumentos, sua visão dos fatos e ele
com base nas leis prepara sua linha de defesa ou de acusação.
Nigel Slack [1], pesquisador inglês, que organizou com clareza esta discussão, propõe
um modelo simples que abrange os diversos tipos de produção e serviços. Considera-se
que são quatro os tipos de processamento ou OPERAÇÕES presentes no mundo
contemporâneo:
1. Transformação de itens em outros de maior valor;
2. Comercialização deles;
3. Distribuição entre pontos de suprimento, produção e venda ou consumo, e;
4. Armazenagem de itens e valores para posterior distribuição e venda.
Por seu turno, a operação de distribuição trata da mudança do local onde está o bem.
Porém, não apenas as características que determinam o estado do bem devem ser
preservadas, como também agora a propriedade do mesmo é mantido.
Por fim, a operação de armazenagem é o processo que zela por conservar intactas as
características do bem, seu local e propriedade.
Figura 11: Mapa geral dos sistemas de produção categorizados pelo posicionamento na matriz
“Itens processados x Tipo de operação dominante”
PSICOLÓGICA
FISIOLÓGICA
FÍSICA
fatura •Banco •Clínica / Hospital
TRANSFORMAÇÃO •Mineração •Teatro / Cinema
•Analista / Consultor •Restaurante
•Refeições Industriais
•Centro de Pesquisa •Parque Temático
•Cemitério •Escolas / Cursos
•Arquiteto
•“Motel”
•Serviço Postais •Transporte Aéreo
•Frete •Serviço de Notícias / •Navio
DISTRIBUIÇÃO •Embarque de “Containers” Reuters •Trem
•Distribuidora de Gás / •Taxi
Eletricidade •Telecomunicações
•Metrô
•“Head‐Hunter”
•Operações de Varejo •Empresário de esportista
VENDA •Pesquisa / Marketing. profissional
•“Agiota” •Detetive Particular •Agenciador de artistas
•“Paparazzi”
Observe-se que seguramente muitos dos exemplos dados poderiam ser também
representados em outros quadrantes, pois dentro de um mesmo sistema tendem a
conviver diferentes tipos de operação e diversos elementos sendo processados. A
exemplificação baseou-se no que a nós parece ser o processo dominante em cada
situação. Pense no processamento dominante no seu sistema ou num sistema de
produção e/ou serviços que você conheça bem. Faça um exercício: tente classificá-lo na
tabela.
O que é uma operação? É um dos elementos básicos de um sistema que almeja alcançar
um objetivo.
A operação está para um sistema assim como o átomo está para a substância, um gene
para um ser vivo.
Cadeia de valor é uma cadeia de suprimentos em que a entrega de cada elo para o
próximo não se restringe ao suprimento de materiais mas inclui uma cesta de valor que
pode ser composto de itens tangíveis e intangíveis.
Rede de suprimentos é uma expressão que vem sendo mais e mais utilizada atualmente
em função dos múltiplos arranjos que tornam-se cada dia mais frequentes e incluem, por
exemplo, a colaboração de elos concorrentes e fluxos reversos ao longo da cadeia.
A transformação da sociedade nas últimas décadas, entretanto, trouxe para o centro das
discussões, os Serviços, que cada vez mais passaram a ser valorizados como uma oferta
de valor em si ou como uma componente que se soma a itens tangíveis valorizando-os
numa cesta de valor mista a ser ofertada ao cliente.
Por exemplo, um campo de pesquisa claro e instigante, mas ainda pouco explorado diz
respeito aos processos de consumo em si, a chamada “Engenharia do Consumo”. Trata-
se de tomar a perspectiva do cliente em lugar do olhar do provedor e pensar o fluxo de
valor na perspectiva do consumidor. Em muitas situações, ao fazermos o mapeamento
dos tempos despendidos no processo de consumo com esta perspectiva, somos
Você que trabalha num banco, que gerencia um restaurante, um posto de gasolina, uma
clínica, uma loja, um armazém, uma frota, ou você que colabora numa fábrica ou na
agroindústria, você tem um papel nesta discussão: o de criador, o de alguém que
analisa os “remédios” existentes, compõe o diagnóstico e depois propõe os
medicamentos mais adequados para aquele paciente singular, que é o seu sistema de
produção!
Veja: ninguém hoje oferta apenas bens ou só serviços! Em quase todos os sistemas
compõe-se uma cesta de valor para comercialização que inclui tanto bens quanto
serviços. Há infinitas possibilidades de compor essa “cesta” e infinitas formas de
administrá-las. É claro que dependendo da circunstância a balança pesa mais para um
lado ou para outro, mas é importante entendermos que a satisfação do consumidor não
se esgota na fabricação do produto em si mas passa pela nossa competência no
gerenciamento de todo a cadeia de suprimentos, incluindo a armazenagem, distribuição
venda no varejo e pós-venda (talvez mesmo a reciclagem).
Neste texto foi apresentada uma primeira categorização dos diferentes sistemas de
produção e serviços. Foi assinalada a existência de semelhanças e diferenças entre a
produção e serviços. Especificamente mostrou-se que sistemas de produção e serviços
utilizam ambos recursos de produção para prover uma oferta de valor e utilidade para os
seus clientes (e demais stakeholders), oferta esta que cada vez mais é formada por um
composto de itens tangíveis e intangíveis.
Pacote de valor
Materiais
Materiais Pessoas
Pessoas Controle Informação
Informação Dinheiro
Dinheiro
• Transformação - muda o atributo > Impressora 3D
Impactantes
Tecnologias
• Venda - muda a posse > Internet
• Tipos
• Transporte - muda o local > Drones
• Armazenamento- não muda o atributo,
> RFID / “Cloud”
a posse e o local
compõem
PACOTES DE VALOR
“STAKEHOLDERS” percebidos pelos
(as partes interessadas)
OS QUE ATUAM
NA OPERAÇÃO quem são?
OS DETERMINANTES!
Clientes, Acionistas,
Colaboradores Internos (Funcionários),
Colaboradores Externos (Fornecedores),
Governo e Sociedade
OS QUE LEGITIMAM A OPERAÇÃO
Como na fábula da "Galinha dos Ovos de Ouro" – onde o dono mata a ave que lhe traz
riqueza para retirar o ouro que supunha existir em sua barriga – muitas vezes, na vida
real, a ânsia de maximizar resultados deixa de lado alguns dos aspectos mais estruturais
das questões.
Uma boa estratégia de marketing não será capaz de garantir o sucesso estável de uma
empresa no mercado se não estiver sintonizada com as forças e limitações do sistema
produtivo existente. Do mesmo modo, aplicações especulativas de alta rentabilidade
podem aumentar a lucratividade de uma empresa em certo momento, mas não
necessariamente garantem a sua posição competitiva no tempo.
O lugar onde de fato ocorre a geração de valor, na sua dimensão primária e essencial, é
a fabricação, venda, distribuição ou armazenagem de bens e serviços no mercado. E por
mais adversas que sejam as condições macroeconômicas ou por mais sedutoras que
sejam as oportunidades de curtíssimo prazo, é gerenciando o chão-de-fábrica com uma
visão estratégica que se encontram alguns dos elementos mais decisivos para a
competitividade no mundo de hoje.
De fato, a partir dessa constatação muitas empresas líderes em seu ramo de negócio têm
reformulado e concebido estratégias bem sucedidas de competitividade que valoram as
Operações como fonte de vantagens competitivas. Chama atenção, por exemplo, o caso
das firmas japonesas, chinesas e coreanas que penetraram em mercados já existentes
com produtos melhores e mais baratos, alcançando esses resultados, fundamentalmente,
a partir do uso de modernas tecnologias de gestão de chão-de-fábrica.
13
Chão-de-fábrica (shop-floor, em inglês, gemba, em japonês) é usado aqui como uma metáfora para o “lugar
onde as coisas acontecem”, onde o processo de agregação de valor de fato se dá. Na fábrica, o posto de
trabalho; no salão, a cadeira do cabeleireiro; na escola, a sala de aula. Em todo o texto, a menos que frisado o
contrário, usaremos sempre o termo “chão-de-fábrica” tomado assim nessa perspectiva ampla incluindo os
sistemas de serviços.
explorados e a capacidade de produção era ainda muita restrita. Praticamente tudo o que
se fabricava, vendia-se14.
Desde então muita coisa mudou ! Terry Hill [3], pesquisador inglês, que está entre os
pioneiros da “Estratégia de Manufatura” (em inglês, Manufacturing Strategy), registra o
que se passou em seguida. Em meados do século XX, a busca de novos mercados e a
disputa dentro dos já existentes trouxe ao centro da cena empresarial as funções de
Marketing, como consequência da relação demanda/capacidade que se tornava mais
exigente. Em muitos casos, os diretores de Marketing vieram a se tornar os diretores das
empresas e a tomada de decisão estratégica passou a se vincular diretamente a essa
função.
Paradoxalmente, após ter ficado durante tantos anos relegada a um papel apenas
reativo, desde a segunda metade do século passado, e particularmente nas duas últimas
décadas quando a competição nos mercados mundiais tornou-se mais acirrada, a função
Produção voltou a ser paulatinamente recolocada na ordem do dia.
No Brasil, essa mudança de atitude ganhou força a partir da década de 1990 com a
abertura da economia e a consequente necessidade de competir em mercados regulados
pela lógica e padrão internacional. Passadas já quase três décadas, em alguns
segmentos produtivos, como os sistemas baseados em Serviços, e especialmente no
contexto da pequena e média empresa, o “chão-de-fábrica” encontra-se frequentemente
14
Sobre esse cenário e o domínio da função Produção no contexto estratégico das corporações do início do
século XX é emblemática a famosa frase de Ford que dizia: “faço qualquer carro desde seja o modelo T”.
Entenda-se: modelo “T” era o modelo fabricado pela Ford e o mercado era tão comprador que se alguém não
quisesse comprá-lo outro alguém o faria. O desafio de FORD era um desafio típico de Operações naquele
momento: fazer muito com os escassos recursos que tinha em mãos. Não a toa Henri Ford, cuja atuação
marcou aquela época, era um homem de fábrica.
É uma constatação surpreendente, pois são muitas as evidências que sugerem que a
performance competitiva de uma empresa, em especial no que se refere aos fatores
relacionados à qualidade, pontualidade, rapidez, preço e flexibilidade, é diretamente
afetada pelas decisões e escolhas relacionadas aos sistemas de gestão da produção. De
fato, no ambiente de competição acirrado que estamos vivendo o conteúdo estratégico
das decisões de curto prazo não pode de fato ser negligenciado.
A questão-chave que precisa ser respondida aqui é portanto: em que medida o sistema
de gestão reforça ou enfraquece a posição competitiva de sua empresa? E, tendo por
base, as estratégias definidas e as oportunidades de mercado existentes, como dever
estruturada a gestão das operações?
Com efeito, cada uma das diversas partes ou módulos de um sistema de planejamento e
controle e execução das operações (gestão do fluxo, da capacidade, de materiais, de
atividades, de pessoas, parcerias e fornecedores, dentre outros pontos de decisão)
precisa ser avaliado e projetado tendo em mente as necessidades estratégicas e
operacionais da estrutura de produção em questão.
O ponto de partida para essa análise é o mercado. Entender os critérios que levam um
cliente típico a escolher uma marca em lugar de outra ou a encomendar um serviço a um
fornecedor em detrimento de outros. Sem pretender fazer uma análise exaustiva do
assunto, a figura 16 enumera uma série de razões que influenciam essa decisão.
Observe que dependendo do negócio em questão, a forma como cada um dos fatores de
competitividade influi na decisão de compra do cliente é diferenciada. Há mercados onde
o baixo preço tende a ser o fator decisivo como, por exemplo, na comercialização de
bens de consumo popular. Já em outras situações, como na produção de automóveis de
luxo, por exemplo, o preço é relativamente menos importante e a qualidade intrínseca do
produto ganha força como um aspecto decisivo no comportamento do cliente.
Figura 16: Fatores que afetam a escolha de um produto (ponto de vista do consumidor)
Um exemplo bem simples: em uma concorrência entre duas lojas de “fast-food” com
produtos similares, se o público-alvo é o profissional liberal que deseja fazer um lanche
rápido na hora de almoço, a presteza do atendimento tende a ser mais decisiva do que
pequenas variações no preço e na própria qualidade do sanduiche para efeito da escolha
feita pelo cliente. Saliente-se que se o pão é ruim ou o preço do sanduiche é o mesmo de
um jantar sofisticado, a loja nem será lembrada quando o cliente decidir fazer seu
lanche. Isto é, o preço e a qualidade qualificam a loja para a concorrência contudo, é o
tempo de atendimento que, provavelmente, determinará a escolha final, nesse caso, a
rapidez de entrega atua como o fator ganhador.
A figura 17 apresenta um quadro que serve como referência para a reflexão sobre a
contribuição que cada área funcional tem a dar na melhoria de performance dos vários
elementos de competitividade. Dois aspectos devem ser notados:
1. as linhas da matriz contêm os fatores identificados como relevantes para o
negócio em questão;
2. nem todos os fatores relevantes são igualmente “potencializáveis” pelas várias
funções da empresa.
Por exemplo, tomando-se para análise a função Produção e analisando objetivos como
baixo preço e qualidade do produto, pode-se supor que a contribuição dessa função para
a performance global da empresa é, diante desses objetivos, clara e decisiva.
A MATRIZ DE COMPETITIVIDADE
Uma forma de usar essa matriz: debata com sua equipe qual a percepção que
têm em relação aos fatores que diferenciam a oferta de valor de sua empresa
daquela feita pelos concorrentes. Determine assim as linhas da matriz. Inclua
também linhas para fatores que hoje não são decisivos mas talvez devessem
ser.
Num primeiro momento pense o sistema como ele é. Em seguida pense como o
sistema deveria ser numa situação ideal. Comparando os graus atribuídos a
cada célula em cada um dos dois cenários identifique os “gaps” e estabeleça a
partir daí seu plano de ação para potencializar seus diferenciais competitivos.
Observe que se o sistema se em análise fosse uma loja a categorização seria outra pois
15
Com respeito à flexibilidade deve-se ressaltar que o conceito pode ser desdobrado em
várias categorias distintas, quais sejam::
i. a flexibilidade de produto, que trata da capacidade de introduzir novos produtos
ou de modificar aqueles em produção;
ii. a flexibilidade de “mix”, que se refere a capacidade de mudar a variedade de
coisas que está sendo produzida em um determinado período;
iii. a flexibilidade de volume, relacionada à alteração do nível agregado de produção,
e;
iv. a flexibilidade de entrega, cuja ideia está associada à capacidade de refazer os
planos para acomodar novas prioridades ou datas de entrega.
Henrique Correa [4], autor brasileiro com várias publicações no campo da Gestão de
Operações, acrescenta ainda para cada tipo de flexibilidade duas dimensões de análise,
a saber:
i. velocidade de mudança, que descreve o quão rápido a empresa é capaz de mudar
o que é feito, e;
ii. amplitude da mudança, que descreve a magnitude da alteração
Com efeito, há uma série de decisões e escolhas de longo, médio e curto prazo, relativas
ao sistema de produção, que afetam diretamente a posição competitiva da empresa no
mercado. São questões que vão desde a localização das instalações, identificação da
tecnologia do processo mais adequada e do arranjo físico dos recursos, passam pela
filosofia de acionamento da produção, pela definição da política de recursos humanos e
dos sistemas de suprimentos, qualidade e manutenção até alcançar o planejamento de
estoques e a programação de atividades.
Tal complexidade faz, inclusive, com que muitas empresas prefiram adotar estratégias de
produção focadas, visando reduzir a dimensão do problema e, assim, favorecer um
Figura 18: Algumas das decisões de longo, médio e curto prazo no contexto da manufatura
HARDWARE
Onde localizar a fábrica ?
Qual o porte da planta ?
Quais processos utilizar ?
Que tipos ou famílias de produtos fabricar ?
Qual o nível de automação ?
Com que equipamentos fabricar ?
Qual o nível de verticalização ?
Desenvolver fornecedores ?
Fazer horas-extra ?
Subcontratar tarefas ?
Tais questões, embora, intrinsecamente sejam de natureza tática e/ou operacional, são
vistas como pertinentes à definição de uma Estratégia de Produção, porque o efeito
cumulativo das muitas pequenas decisões envolvidas faz com que a sua eventual
reversão seja tão lenta, difícil e dispendiosa quanto as estruturais.
Esta seção procurou responder uma pergunta-chave: como é possível que a função
Operações, que reúne a vasta maioria dos recursos humanos, materiais e financeiros da
empresa e que, em última análise, é a maior responsável pela geração da riqueza
produzida pela companhia, não seja chamada a compartilhar o processo de tomada de
decisão sobre a estratégia da corporação?
Figura 19: “O ovo em pé” - roteiro de reflexão para subsidiar o projeto estratégico do sistema de
controle
Existe um vácuo entre as estratégias decididas nos níveis mais altos das corporações e
as decisões que são tomadas diariamente no “chão-de-fábrica”.
Cientes disso, grande parte das empresas industriais e de serviços, líderes em seus
ramos de negócio, cada vez mais têm priorizado programas de Organização e
Responsabilização (OR), Gestão semi-autônoma (GSA), Empowerment, Gestão cotidiana
da performance, Resposta rápida, dentre outros. São programas e metodologias voltadas
a criar esta ponte entre as decisões do dia a dia e o nível estratégico a partir do
envolvimento de todos com o negócio da empresa.
Neste capítulo, nosso objetivo não é debater sobre tais metodologias de desdobramento
de metas, padrões e especificações, mas sim contribuir para que a escolha dos
indicadores que serão desdobrados na Operação através destes métodos seja feita de
forma balanceada tendo em perspectiva uma reflexão madura sobre os diferentes
ângulos da saúde operacional.
Como sabemos, um mesmo barco pode descobrir o caminho para as Índias Orientais ou
seguir no rumo do Brasil, dependendo da orientação que lhe for dada ou – ainda mais
precisamente – da orientação que for percebida pelo navegador.
UNIFORMIZANDO A LINGUAGEM
Não se preocupe com quem está certo ou errado (talvez esse texto lhe dê uma
guia para esta resposta – veja o quadro no final desta seção – mas não é a
resposta certa o que mais importa aqui).
UM PEQUENO DESAFIO
Uma linha de produção operou durante um mês (ou mais precisamente 20 dias,
sendo 8 horas por dia). Nesse período esteve parada 8 horas para manutenção
corretiva. Além disso, por dia a linha ficou parada 30 minutos para reuniões
regulares, lanches e manutenção preventiva.
Ao longo do mês, foram produzidos 6.000 produtos. Destes 10% não estavam
de acordo com as especificações e foram devolvidos pelos clientes, os demais
foram faturados e aceitos.
Quanto eficaz foi o sistema? Quanto eficiente ele foi? Qual foi a qualidade do
processo? Qual foi a produtividade? E a efetividade?
Não sabemos ao certo quem primeiro propôs esta alteração bem humorada no dito
popular, mas uma coisa é certa: o autor acertou em cheio! Indicadores de desempenho
são decisivos no comportamento e podem ser os responsáveis pelo sucesso ou o fracasso
de um sistema de produção.
Vimos no capítulo 1 as várias razões que têm feito com que a complexidade das
operações de produção e serviços venha se tornando significativamente maior do que a
que estávamos acostumados. Com efeito, diante de realidade tão complexa e
desafiadora, mister é saber delegar e descentralizar o processo decisório evitando a
lentidão e a ineficiência de uma tomada de decisão excessivamente centralizada e
hierárquica. Compartilhar a gestão do dia a dia com todos os colaboradores e, ter em
todos os setores da empresa, a capacidade de decidir rápida e competentemente: eis o
sonho dourado de todos os gestores ! Uma empresa onde todos estão preparados,
maduros e municiados para “agir localmente, pensando globalmente”, que tal?
Agora preste atenção: indicadores de desempenho não são elementos neutros. Muito ao
contrário, eles induzem comportamento. E isso pode acontecer tanto para o bem quanto
para o mal.
Observe qual seria a consequência se você medisse o desempenho deste mesmo sistema
estimulando o programador da produção a nortear sua ação por um indicador também de
atraso, mas sutilmente diferente: o atraso máximo, por exemplo. Provavelmente, ele
reagiria de forma oposta, tenderia a repartir o problema por todos os pedidos
“democratizando” os atrasos e evitando que o ônus de uma sobrecarga recaísse sobre
um só cliente. Neste caso a consequência seria: muitos clientes um pouquinho
atrasados, um pouquinho chateados com você, mas ninguém “mortalmente ferido”.
Não se trata aqui de apontar qual a melhor estratégia – quem sabe disso é o dono do
negócio. O ponto a registrar é: um mesmo sistema pode desempenhar suas atividades
de maneiras inteiramente distintas apenas em função do indicador escolhido para medi-
lo.
Ora, não há dúvida que a boa gestão de um processo, seja ele a própria vida ou um
empreendimento comercial, começa por uma boa definição de objetivos. São tantas
hoje as opções diante de nós e tantas as possibilidades e caminhos que aquele que
consegue manter os olhos e ouvidos abertos, aquele que capta no ar, percebe e
seleciona com clareza no infinito de possibilidades existentes, aquelas mais promissoras,
aquelas que – protegidas de grandes ameaças – potencializam seus pontos fortes e
equilibram os fracos, este tem claro diferencial favorável neste mundo turbulento, veloz e
competitivo a que estamos submetidos.
Não obstante isto seja inconteste, a “visão” é só parte da cena. Pense em você e no seu
processo estratégico íntimo. Imagine-se no dia do seu último “réveillon”. Possivelmente,
você fez belos e consistentes planos para o ano que começava, mas isso é lá garantia de
conseguir realizá-los ? Será que na dinâmica do dia a dia, diante do fluxo intenso de
novas (e sedutoras) oportunidades que se apresentam a toda hora e das pendências (em
geral, não tão sedutoras) que lhe assolam, você de fato conseguirá facilmente conduzir
seus resultados na direção planejada? E se conseguir, será que o custo e esforço para
alcançá-los será compensador?
Mesmo que você seja competente o suficiente para realizar esses objetivos como
planejado e com um esforço aceitável, será possível afirmar, sem sombra de dúvidas,
que tais realizações realmente farão você feliz? E ainda: se estas suas conquistas lhe
deixarem de fato ocasionalmente satisfeito e realizado, será que esse sentimento de
completude será sustentável ou permanente? Lá vem Sêneca de novo: “toda a felicidade
é incerta e instável”.
A definição dos grandes objetivos está no campo estratégico. Mas uma vez definida a
direção é preciso saber levar o barco pelo percurso. Você não será feliz só porque fez um
plano brilhante. Você será feliz pelo bom plano, mas também – e talvez até mais – pela
forma como encaminha suas relações no dia a dia e pelo modo como lida com as pessoas
que estão do seu lado.
Categoria de
Propósito
indicador
Indicadores de Verificam se o sistema está cumprindo a missão para o qual foi criado,
EFETIVIDADE se estamos conseguindo prover um VALOR SUSTENTÁVEL adicional a
todos os stakeholders garantindo, assim, a competitividade e
longevidade do empreendimento.
Aproveitar a vida, inovar, criar, crescer… viver a vida! Claro, este é o ponto de partida.
Se sua empresa tem o mesmo lucro todo ano, meus parabéns! Mas quero lhe dizer algo:
abra o olho, você está com um problema. Sim, porque a cada ano seus funcionários se
desenvolverão, casarão, terão filhos, mais responsabilidades, desejarão ganhar mais
para satisfazer suas necessidades crescentes. Se o seu lucro se mantiver estável, você
terá dificuldade em satisfazê-los.
A boa notícia é que, embora as ambições e sonhos do ser humano sejam sempre
crescentes e pareçam mesmo infinitas, do outro lado, as oportunidades para satisfazê-los
também o são.
Por exemplo: neste instante, você está lendo este texto, mas poderia estar viajando com
a sua família, namorando, trabalhando, vendo um jogo de futebol, assistindo um filme no
cinema ou curtindo um bom vinho num restaurante.
Você fez uma opção (será que foi mesmo a melhor ?) motivado, provavelmente, por
algum plano seu. Suponho que o seu plano interior seja algo como ser feliz e fazer os
outros felizes, mas é difícil governar seus dias e tomar suas decisões do dia a dia tendo
objetivo tão amplo quanto esse em perspectiva.
Você está lendo este texto agora, porque está cursando uma disciplina do curso em que
se matriculou e, possivelmente, faz isso porque deseja graduar-se e assim obter o
diploma; ou porque acredita que com esta experiência se tornará um(a) profissional ou
uma pessoa melhor e isto lhe trará melhor empregabilidade, um excelente salário ou um
emprego novo. O que, por seu turno, tornará possível gerar para si, e para os seus,
condições de realizar alguns sonhos que o deixarão provavelmente feliz. Veja: a leitura
deste texto tem a ver com a sua felicidade! Tomara que assim seja!
Observe-se que estas metas não são as oportunidades em si, são normalmente
interpretações delas. Uma empresa pode ter uma possibilidade de vender um milhão de
reais, mas nem por causa disso estabelecerá necessariamente este alvo como meta. Na
definição das metas é preciso considerar a possibilidade real de progresso; é preciso
analisar onde se está e até onde pode-se ir.
Os números gerados pela comparação das metas com os resultados caracterizam o que,
no campo da Gestão de Operações, chamamos de EFICÁCIA.
Essa comparação pressupõe um período de análise: pode ser um mês, uma quinzena,
uma semana. Cada vez mais, porém, as empresas procuram estreitar esse tempo
propondo ao colaborador que a monitoração do seu resultado operacional se faça bem
Em suma, indicadores de EFICÁCIA são obtidos pela divisão dos RESULTADOS OBTIDOS
pelas METAS PLANEJADAS, certamente mensuradas com a mesma unidade de medida.
Este quociente traduz-se assim em um valor percentual que representa a medida em que
o sistema foi capaz de alcançar as metas e, por extensão, de aproveitar as oportunidades
existentes (ou, pelo menos, aquelas que na percepção da gerência poderiam ter sido
apropriadas no período). É o que registra a figura 21.
EFICÁCIA
Mede o grau de atingimento das
METAS PROGRAMADAS
Resultados
Alcançados
“METAS ATINGIDAS” x 100 %
METAS PROGRAMADAS
Observe que metas não têm que ser, necessariamente, relacionadas a alvos de
resultado. Você pode, certamente, estabelecer metas de economia, de desenvolvimento
de um processo, de satisfação de clientes ou a meta que lhe parecer mais pertinente no
momento.
Sonhar não custa nada! Porém, pessoas, máquinas, materiais e tempo custam. E como!
Falamos, por exemplo, sobre a sua escolha com relação a ler este texto. Suas
alternativas eram ilimitadas. Já o tempo que você dispõe para lê-lo…
O seu dia tem 24 horas (exatamente como o meu) e isso não é uma escolha minha, nem
sua. Tivesse o dia mais de 24 horas, possivelmente seríamos ainda mais felizes.
Contudo, esta não é uma escolha nossa, é um dado da realidade e uma limitação do
sistema que temos que administrar.
A Terra leva 24 horas para uma rotação em torno do seu eixo; leva 365 dias, 6 horas e
alguns minutos para uma órbita em torno do Sol. É uma restrição para a gestão de
nossas vidas, fora do nosso arbítrio. Como o tempo, o dinheiro, a capacidade de
máquina, as competências humanas disponíveis, todos esses elementos são também são
recursos limitados que restringem nosso campo de ação.
ativos (para não desperdiçá-los). Assim como preciso monitorar minha eficácia no dia a
dia, a minha eficiência também precisa ser monitorada. Esta é uma dimensão
fundamental na gestão de sistemas que sobrevivem a duras penas em ambientes
competitivos.
Mas como saber se estou sendo racional? Se estou sendo econômico? Vimos que para
verificar nossa eficácia devemos comparar nossos resultados com as metas. E para
verificar se estou sendo racional, devo me comparar com o quê?
Ora, se você está procurando uma referência para melhorar, possivelmente, o indicado é
tomar em conta o melhor carro, o carro ideal desta categoria ou deste modelo.
Isso posto, reflita: onde está escrito quanto deve gastar de combustível um carro
novinho em folha, deste mesmo modelo que o seu? No manual, não é mesmo ? E quem
escreve o manual do carro? Você que é o motorista, o dono do carro ou o fabricante?
Reflita sobre a figura 23 para fixar a diferença entre uma meta e um padrão.
EFICÁCIA EFICIÊNCIA
META PADRÃO
EXTERNA INERENTE
AO PROCESSO AO PROCESSO
( por exemplo, estabelecida ( por exemplo, estabelecido
pelo usuário do recurso ) pelo fabricante do recurso )
tende a variar tende a não
no tempo variar no tempo
Uma META é uma definição do motorista do carro, é um “olhar para o mundo”, para onde
se quer ir. É algo que nos“puxa”, que desejamos alcançar ou mesmo superar. Já um
PADRÃO é uma definição relativa à tecnologia de processo, à máquina, uma referência
definida pelo fabricante, um “olhar para o umbigo”. É algo que nos limita. Meta e
Padrão são ambos referências, mas são coisas bem diferentes.
Se do ponto de vista gerencial, para desafiar as equipes para os resultados nos valemos
de metas, para mobilizar as equipes à racionalidade e economicidade valemo-nos de
padrões, benchmarkings e recordes.
Note que nessas três palavrinhas, está implícita uma referência de racionalidade, de
limite, de máximo (ou mínimo) alcançável.
Padrões são referências normalmente extraídas de estudos de engenharia.
Benchmarkings são referências extraídas de estudos da concorrência.
Recordes são referências extraídas do passado.
Seja como for, para o cálculo da EFICIÊNCIA, normalmente, utilizamos como referência
algo que expresse o melhor caso de utilização do recurso, seu uso mais econômico ou
racional.
EFICIÊNCIA
Mede o grau de acerto
(racionalização ou economicidade) na
UTILIZAÇÃO DOS RECURSOS EMPREGADOS
ENTRADA PADRÃO x 100 %
ENTRADA CONSUMIDA
valor percentual que representa a medida em que o sistema foi capaz de utilizar
racionalmente os ativos disponíveis.
Você pode, por exemplo, analisar se o seu carro está sendo eficiente verificando o
consumo de combustível que é necessário para percorrer certa distância ou verificando a
distância que o seu carro é capaz de percorrer com uma dada quantidade de
combustível.
Pensando com números: suponha que no manual do seu carro é dito que se o mesmo for
dirigido corretamente ele deverá consumir 1 litro para percorrer 20 quilômetros. Imagine
ainda que o seu carro, no momento, esteja consumindo 1 litro para andar cada 10
quilômetros (ou 2 litros para cada 20 quilômetros).
AS DUAS CORRIDAS
Ocorre que na raia do lado está ninguém mais ninguém menos que o Michael
Phelps. Você nem o encara para não se intimidar. Começa a prova. Você
mergulha e dá tudo de si. De fato, faz a melhor prova de sua vida. Para sua
sorte, Michael está em um dia péssimo, parece inteiramente fora de forma.
Fim da prova. Quem ganhou? Michael sobe ao pódio e recebe a medalha de ouro.
Você fica em oitavo dentre os oito!
Mas veja o que sucede em seguida. Michael sai de cabeça baixa, sob os olhares
reprovadores de seu técnico inconformado com tão baixa performance. Você, ao
contrário, é recebido com festa pelos seus familiares que comemoram o
inimaginável recorde pessoal que você acaba de bater.
Você foi eficaz? Não, absolutamente, você perdeu a prova, saiu sem medalha.
Seu objetivo era vencer e não foi dessa vez. Mas está feliz por ter sido eficiente.
Nunca antes, na sua história de nadador, havia feito 100 metros em menos de 30
segundos. E hoje fez esse percurso em 25 segundos. Você nunca usou tão bem
este “ativo” (seu corpo)!
E o Michael? Michael foi eficaz, levou para casa a medalha de ouro. Sua decepção
não é uma questão de eficácia, é uma questão de eficiência, a utilização que fez
do seu “ativo” foi abaixo dos padrões, muito acima do tempo recorde que sabe
poder obter.
16
Não se preocupe muito com esta questão. Para saber se você fez a conta certa ou errada basta
verificar o resultado. Como o padrão deve, por definição, revelar a condição de uso ideal, se a sua
conta de eficiência resultar mais de 100%, das três uma: (i) você trocou as bolas e fez a conta
invertida; (ii) o seu padrão merece ser revisto por estar ultrapassado; (iii) o desempenho foi obtido
de modo artificial, utilizando o ativo fora das condições regulares. Em princípio, não faz sentido
uma eficiência maior que 100%.
Quando fazemos o cálculo da eficiência pensando nas saídas proporcionadas pelo sistema
é comum referirmo-nos a este tipo de indicador como sendo um “rendimento” ou uma
“utilização”. A figura 25 ilustra esta observação e figura 26 elenca exemplo de
indicadores de eficiência
EFICIÊNCIA
Em sistemas com variadas entradas, a EFICIÊNCIA
também pode ser medida na saída.
RENDIMENTO
(no caso de uma máquina)
Há ainda uma terceira dimensão da “felicidade operacional” que não pode, de modo
algum, ser posta à margem desta nossa reflexão. Qual é ela? Bem, deixe que eu lhe faça
uma pergunta.
Admita que você esteja indo muito bem. Seus objetivos têm sido atingidos, sua Eficácia é
nota dez! O dinheiro e o tempo estão sob controle, sua Eficiência também está acima de
qualquer suspeita! Isso garante que você estará feliz? Claro que isso ajuda, mas será que
é suficiente ?
Sejamos realistas: mesmo que você seja o sujeito (ou a empresa) mais realizado e
sensato do mundo, ainda assim, a felicidade (ou a competitividade) é algo mais amplo,
depende de muitos outros aspectos. Para além da objetividade expressa nas metas e
padrões, precisamos considerar também um mundo de subjetividades ligadas à
satisfação dos vários personagens que estão a sua volta e interagem com você no
sistema.
Focalizando, por analogia, o contexto empresarial: ainda que a sua empresa tenha tido
um resultado financeiro atraente; ainda que você tenha produzido mais do que nunca e
gastado menos do que sempre; ainda assim, se alguns de seus clientes estão de “nariz
torcido” para seus produtos e serviços; ou se os seus colaboradores estão insatisfeitos
com a forma como são premiados; se os seus fornecedores acham-se injustiçados ou
desconsiderados; se o governo supõe ter sido lesado pela glosa de impostos que
deveriam ter sido pagos; se a sua operação polui ou prejudica o meio-ambiente; por
qualquer destes fatos, a competitividade da sua empresa ficará ameaçada.
Sim, embora uma boa mediação dos seus sonhos e limitações seja fundamental, é
preciso zelar também pela satisfação de todos que, de algum modo, estão conectados (e,
portanto, são interessados) na sua operação. No jargão de business, estes interessados
são os stakeholders, nominadamente: clientes, acionistas, colaboradores, fornecedores,
parceiros, governo e sociedade.
Do mesmo modo como o gerente define metas e padrões para compartilhar o desafio da
eficácia e eficiência com sua equipe no dia a dia, também é importante medir e gerenciar
e desafiar a equipe para a satisfação de todos os envolvidos na sua operação.
FOCO
Q QUALITATIVA ADEQUAÇÃO AO USO NO
U SENTIMENTO
Pleno Atendimento ?
C
L
A
das Expectativas,
Necessidades e Desejos I
do E
L OK CLIENTE N
T
I
CONFORMIDADE
QUANTITATIVA com as especificações E
D E
A
X
T
AMPLA
D
SATISFAÇÃO DE TODOS E
R
E
FOCO nos acionistas, no FOCO nos N
governo, na sociedade colaboradores
internos/externos
O
ESTABILIZAÇÃO DO PROCESSO DE
IMPLANTAÇÃO DA QUALIDADE
Note a sutil diferença das palavras meta, padrão e especificação. Todos três são
referências que usamos para guiar nossos passos no curto prazo. Mas observe que,
reforçando o que já discutimos neste texto, metas dão conta da percepção dos
GERENTES em relação a oportunidades existentes; padrões de economia dão conta
das limitações relativas aos ATIVOS escassos disponíveis, enquanto especificações
traduzem expectativas, necessidades e desejos dos CLIENTES.
17
Veja a esse respeito, no Anexo 1, os itens “Expectativas, Necessidades e Desejos” e
“Gerenciando os componentes do sentimento em Serviços”
Cabe notar que, em alguns contextos, o termo QUALIDADE é usado de forma ainda
mais ampla, incorporando, de algum modo, os conceitos que neste texto
preferirmos caracterizar como EFICÁCIA e EFICIÊNCIA.
Por seu turno, em alguns contextos prover o “produto certo, na hora certa, na
quantidade certa, no lugar certo” é tratado como “Qualidade do produto”,
incorporando neste sentido elementos do que aqui estamos preferindo destacar
como EFICÁCIA.
Ocorre que, no mundo de hoje, com a velocidade dos fatos e a complexidade dos
sistemas já citados, as decisões têm que ser tomadas muito rapidamente e,
frequentemente, sem que haja informações precisas sobre a questão. É aí que mora o
perigo!
Faça um teste com você mesmo: análise o “Quadro A” abaixo. Suponha que os três
números apresentados referem-se ao faturamento de uma empresa. Possivelmente, não
lhe tomará mais que um segundo para escolher a empresa com resultado mais atraente,
não é?
13 17 21
Quadro A
Se, porém, forem colocados diante de você – como no “Quadro B” – três subtrações,
13 - 5 17 - 6 21 - 8
Quadro B
Ponha-se, agora , diante das expressões apresentadas no “Quadro C”. Suponha que o
numerador revele os resultados obtidos em um certo período (ex.: a quantidade de
produtos fabricados) e o denominador expresse os esforços realizados para obter tais
resultados (ex.: as despesas operacionais no período). Qual das expressões expressa a
mediação mais atraente?
13 / 5 17 / 6 21 / 8
Quadro C
O que deve ter percebido é que uma conta de divisão traz consigo uma complexidade
intrínseca. Mesmo diante de três expressões bastante simples você tem que parar e
calcular os quocientes para tomar uma decisão segura e consistente.
Agora, análise o dilema da gestão de operações expresso na figura 29 e veja como pode
ser complexo mediar metas, padrões e especificações no dia a dia.
Suponha que esteja em jogo aceitar ou não um novo pedido, atender ou não a um
cliente alterando as prioridades anteriormente combinadas com a produção.
MUNDO / MERCADOS
Oportunidades ilimitadas
Recursos limitados
SISTEMA DE PRODUÇÃO E SERVIÇOS
Por seu turno, a Produção está mais próxima das máquinas do que do mundo. Diante da
mesma cena talvez tenda a ser um pouco mais cautelosa; talvez considere esta mudança
de prioridade algo nocivo, algo que ameaçará a racionalidade no uso dos recursos
disponíveis.
É bem provável que a produção se questione: de que forma aceitar esta prioridade se
isso significa parar de fazer o que estou fazendo? Será necessário preparar a máquina
para o novo serviço, isso desperdiçará capacidade e, provavelmente, haverá perdas de
material e problemas com a qualidade !
Ocorre que, como vimos, calcular o quociente de uma divisão rapidamente, quando esta
conta reflete um sistema complexo e o valor global agregado pelas parcelas não é claro,
pode ser um baita desafio. Requer um olhar muito maduro e apurado. É por isso que
mesmo tendo o mesmo objetivo (”ganhar dinheiro”), as áreas Comercial e de Produção
vivem “batendo cabeça” no dia-a-dia das organizações.
São muitas as decisões tomadas localmente no curto prazo, onde esta mediação global é
requerida. Um exemplo: fazer hora extra ou não? Se faço tenho um custo local adicional
bem definido e um benefício imediato no serviço atendido nesse horário. Mas note que
deveríamos também incluir na conta o benefício global relativo às várias outras ordens
que estavam na fila, talvez pagando multas por atraso, e que agora serão beneficiadas
porque a fila diminuiu no horário extra.
Essa dificuldade de avaliar o impacto da decisão local no resultado global é que nos
remete a necessidade de incluirmos no nosso modelo de diagnóstico operacional
indicadores para verificar o custo/benefício das decisões tomadas cotidianamente. No
contexto deste texto nos referimos aqui aos indicadores de PRODUTIVIDADE.
Com efeito, mesmo guiados por boas metas, padrões e especificações não teremos
nunca a certeza de termos feito a melhor mediação entre estas referências que
frequentemente são conflitantes. O jeito é acompanharmos, em um prazo mais longo
(semana ou mês, por exemplo) a resultante global derivada das nossas escolhas.
Como registra a figura 30, indicadores de PRODUTIVIDADE são obtidos pela divisão dos
resultados obtidos (as SAÍDAS geradas) pelos esforços realizados (as ENTRADAS
consumidas) num certo período.
PRODUTIVIDADE
EFICÁCIA SAÍDA
GERADA
SAÍDAS GERADAS
ENTRADAS CONSUMIDAS
EFICIÊNCIA ENTRADA
CONSUMIDA
Observe que no cálculo de produtividade não há metas definidas pela gerência nem
padrões definidos pela engenharia, o que há é a comparação entre dois desempenhos da
produção: o de resultado e o de esforço.
Qual a unidade de medida da
PRODUTIVIDADE ?
A PRODUTIVIDADE pode ter diversas
unidades de medida.
Pode até ser adimensional .
Com efeito, a noção de local e global é subjetiva cabendo ao gerente a reflexão sobre o
perímetro de análise que dará a cada indicador. Isto é, uma seção é um perímetro local
se pensamos na empresa, mas é global se pensamos nos postos de trabalho
individualmente. A figura 32 ilustra esta reflexão.
um país
uma região
uma empresa
um sistema em um dado
um processo PERÍODO
um recurso
uma operação
uma pessoa
Mesmo que as metas sejam distintas e as tecnologias heterogêneas, ainda assim pode
fazer sentido comparar índices de PRODUTIVIDADE, tal como “Produtos vendidos”
dividido por “Reais gastos” (já que esta conta permite comparação mesmo que os
produtos tenham sido obtidos com máquinas distintas).
Há pouco tempo atrás, havia uma máxima do mundo da QUALIDADE que dizia: “para
ganhar um cliente você tem que atender suas expectativas ou mesmo superá-las”.
Nos dias de hoje, embora esta afirmação continue válida ela parece não ser mais
suficiente. Ocorre que, com a globalização, são tantos os ofertantes de valor que mesmo
o seu cliente mais fiel pode facilmente se encantar por uma novidade ou uma inovação
trazida por um novo concorrente.
Tal qual você cada vez mais haverá outros: brasileiros, latino-americanos, americanos,
europeus, asiáticos, africanos, todos ávidos por seduzir o seu cliente fiel. O fato de o
cliente gostar de você não garante que lhe escolherá novamente. Não se iluda, sua
vantagem de qualidade pode facilmente virar pó diante de uma inovação de valor trazida
por alguém que nem estava no seu radar.
Outra reflexão: você tem uma máquina de última geração e está utilizando-a a pleno
vapor. Eficiência melhor impossível: consegue tirar dela tudo o que ela pode dar. Para
manter toda esta eficiência antecipa demandas futuras (previstas, mas que ainda não
foram confirmadas), de modo a deixá-la sempre alimentada com material.
Agora o outro lado da moeda: por fazer esta produção antes da hora do consumo você
tem que despender grande energia, movimentando estas peças antecipadas para uma
área de estocagem (note que a se a produção não houvesse se antecipado ao consumo
essa armazenagem talvez não fosse necessária). Aliás, você precisará de alguém para
controlar os estoques, quem sabe um sistema computacional. Possivelmente, terá que
ter um analista para manter o sistema, pessoal no RH para contratá-lo e assim por
diante.
Não se iluda ! Analise em detalhe: sua maravilhosa EFICIÊNCIA local pode estar lhe
trazendo grande dano global, justamente no quesito economicidade e racionalidade.
Agora, focalizemos as ilusões que podem lhe trazer uma alta e, aparentemente, bem
sucedida EFICÁCIA.
Pode acontecer que um sistema cumpra as suas metas, mas não necessariamente
aproveite consistentemente as oportunidades existentes. Por que? Porque as metas
podem, simplesmente, estar erradas.
Todas as dimensões da
qualidade e
EFETIVIDADE competitividade
mantidas no LONGO
PRAZO.
Procura medir se está realmente “valendo a pena” ter
qualidade no dia a dia, sendo eficaz, eficiente, produtivo,
lucrativo e competitivo.
18
Observe que para este tipo de medição uma atividade gerencial que ganha grande importância é o
“Acompanhamento Pós-vendas”.
Indicadores de EFETIVIDADE são obtidos pela divisão dos resultados úteis pelos
resultados alcançados, mensuradas com a mesma unidade de medida. Este quociente
traduz-se por um valor percentual que dá conta da qualidade das metas, padrões e
especificações, representando a sustentabilidade e a orientação do sistema na direção da
missão para o qual foi planejado. A figura 35 apresenta esse conceito e a figura 36 traz
exemplos de indicadores de efetividade.
EFETIVIDADE
Mede o grau de utilidade das “RESULTADOS ALCANÇADOS”
Seria muito bom se houvesse um indicador único capaz de sintetizar todos os aspectos
da saúde. Um número mágico, uma média ponderada de vários aspectos, como:
temperatura, pressão sanguínea, colesterol, hemácias, glóbulos brancos etc. Faríamos a
média disso tudo, então acordaríamos de manhã e diríamos para nós mesmos: ah que
bom, hoje estou 18! Seria ótimo, mas afinal o que isso quereria dizer? Nada, não é
mesmo?
Assim como não existe um remédio único para todos os males, também não existe este
número mágico da saúde. Então o que fazem os médicos para elaborarem seu
diagnóstico? Categorizam os vários aspectos da saúde, analisam diferentes exames que
lhes dão informações sobre estas várias dimensões do problema (exame clínico, sangue,
urina, fezes etc.), observam o paciente e, com base em um diagnóstico rico e embasado,
definem suas prescrições.
Igualmente ocorre no mundo das operações. Maravilhoso seria fazermos o que era para
ser feito, certo da primeira vez, com o menor custo, gerando a satisfação de todos e de
forma duradoura. Porém, como este objetivo é muito amplo e cheio de interelações
talvez seja mais sensato desenvolver um sistema de indicadores que aproprie e integre
estas várias óticas em vários “exames clínicos”, cada qual dando conta de um aspecto da
saúde operacional.
Embora os nomes dessas categorias possam variar de uma empresa para outra, ou
mesmo difiram de acordo com o campo acadêmico onde se situa a discussão,
propusemos aqui os termos que nos parecem ser os mais difundidos no meio produtivo
para descrever cada uma destas cinco dimensões, isto com o objetivo de sintonizar
percepções e vocabulário. Respectivamente, são eles:
EFICÁCIA para designar quanto o sistema aproveitou das oportunidades
percebidas;
EFICIÊNCIA para indicar quanto o sistema aproveitou dos ativos instalados;
QUALIDADE para mostrar a satisfação proporcionada pelo sistema junto aos
clientes, acionistas colaboradores e demais stakeholders;
PRODUTIVIDADE para apontar a relação custo/benefício entre os esforços feitos e
os resultados gerados, e;
EFETIVIDADE para definir a sustentação do negócio no longo prazo.
do processo
EFICIÊNCIA
QUALIDADE DO
Fluxo de Lucro Lucro NEGÓCIO Retorno sobre
Caixa Líquido Econômico Investimento
padrão (de economia)
Horizonte de Tempo
19
Muitas empresas hoje dispõem de quadros hora a hora que, colocados na frente de cada posto
de trabalho, buscam desenvolver a responsabilidade do operador em relação a metas, padrões e
especificações pertinentes àquele perímetro de atuação.
Descrevemos, abaixo, as que nos parecem ser as melhores respostas para o desafio
apresentado no início deste capítulo, tomando como referência para solução o
modelo conceitual proposto.
Enunciado:
Uma linha de produção operou durante um mês (ou mais precisamente 20 dias,
sendo 8 horas por dia). Nesse período esteve parada 8 horas para manutenção
corretiva. Além disso, por dia, a linha ficou parada 30 minutos para reuniões
regulares, lanches e manutenção preventiva.
Ao longo do mês foram produzidos 6.000 produtos. Destes 10% não estavam de
acordo com as especificações e foram devolvidos pelos clientes. Os demais foram
faturados e aceitos.
Solução:
Muitas vezes, aflitos com as demandas do dia a dia nas empresas, damos pouco
valor aos modelos conceituais. Entretanto, quanto mais vivemos, mais nos
deparamos com situações onde somos “promovidos”, em função do bom
desempenho na gestão de uma determinada área, para o desafio de gerenciar
outra que pouco conhecemos.
2. EFICIÊNCIA: Com que ativos posso contar? Que pessoas disponho para cada
função? Que equipamentos e instalações estão disponíveis? Qual o meu
orçamento? Quais os padrões racionais de funcionamento desses recursos?
5. EFETIVIDADE: Para que este sistema existe? Ele cumpre a sua missão? Os
pacientes aqui atendidos de fato ficam bons das suas mazelas? Uma vez
atendidos, não retornam porque ficaram de fato saudáveis (ou porque
morreram)?
Quanto ao desempenho:
Produtos bons manufaturados: 5.400 no mês
Total de produtos manufaturados (bons + defeituosos): 6.000 no mês
As categorias descritas na seção anterior são tipos de indicadores. Para cada categoria
cabe ao gestor definir qual indicador faz sentido para o seu caso. A escolha correta
sobre o quê e como medir varia de empresa para empresa.
(i) “Gargalos”
(ii) “Não gargalos”;
(iii) Estoque em processo;
(iv) Giro de estoque;
(v) Tempo de atravessamento (ou ciclo do produto);
(vi) Tempo de ciclo do processo;
(vii) Lote de produção
(viii) Lote de transferência;
(ix) “Empurrar a produção”
(x) “Puxar a produção”
A ideia é definir esses pontos, compreender como eles se relacionam com a melhoria da
produtividade e os trade-offs20 que embutem.
Repare que descrevemos pra cada processo a sua capacidade de produção em um certo
período (por exemplo, o centro B tem capacidade de produzir 240 unidades por hora; o
centro C tem capacidade de produzir 100 por hora e assim por diante).
20
Trade-offs é uma expressão de língua inglesa muito usada no campo da gestão de operações.
Diz respeito aos custos e benefícios de uma decisão particularmente quando estão em jogo
objetivos que podem ser conflitantes.
A B C D E F
Capacidade 300 Cap. 240 Cap. 100 Cap. 250 Cap. 300 Demanda 300
° °
° °
° °
° °
°
° °
°
Agora reflita sobre a vazão deste sistema. De nada adianta a torneira A ser capaz de
liberar 300 lts por hora, se apenas 100 lts por hora passam na seção C, concorda? Do
mesmo modo superdimensionadas estão as capacidades de B, D e E. Com efeito os
centros D e E jamais processarão mais de 100lts por hora se quem os abastece está
limitado a liberar 100lts por hora. Pouco importa se têm capacidade a mais. Quanto à
torneira A e ao centro B até poderiam processar mais que 100lts por hora mas isto seria
um desperdício pois nenhum ganho haveria para o sistema como um todo se
funcionassem a todo vapor.
Vê ? A vazão de um sistema é dominada pela vazão do seu recurso mais restritivo. Por
isso dizemos que no sistema da figura 38 o centro C é o “gargalo” de capacidade. E em
correspondência todos os demais são ditos “não gargalos”.
Estoque em processo
Agora pensemos na água que está dentro do cano. Com o passar do tempo esse volume
dentro da tubulação aumenta, se reduz ou permanece inalterado? Lembre-se de você
regando seu jardim. O volume de água dentro da mangueira se altera com o passar do
tempo?
A resposta é não, não é mesmo? Numa situação de regime regular, a água no tanque
se acumula, mas o volume de água dentro do cano permanece inalterado. Não é a
mesma água, mas o volume total segue o mesmo dentro do cano, pois há uma
renovação constante e estável (sai água por uma ponta, entra pela outra).
Observe que esta água é de alguma forma imprescindível para viabilizar o fluxo. Na
manufatura, por exemplo, algum estoque em processo é necessário para manter a
produção em regime. Se não houver material em processo ocorrerá o seguinte cenário:
quando o centro C precisar de material só aí o centro B irá providenciá-lo, então o centro
C terá que ficar esperando B fazer seu serviço para que possa iniciar o seu. O sistema
andará “aos soluços”.
Por outro lado repare que embora necessário para o fluxo este estoque é um dinheiro
parado. Sim, se o volume de água (ou o dinheiro imobilizado em estoque) segue
inalterado na sua quantidade total e se esse estoque vale dinheiro, então do ponto de
vista econômico há ali um dinheiro imobilizado (que poderia estar gerando valor em
outro lugar, por exemplo, em uma aplicação financeira). Ou, se quem está parado é
um cliente ou um processo, provavelmente há um cliente chateado com você.
Em suma, a água que está no tanque revela o RESULTADO e a água que está no cano dá
conta de um ESFORÇO. Então, conceitualmente, a divisão destes dois valores revela a
PRODUTIVIDADE do sistema no que toca ao processamento da água (ou dos estoques).
Suponhamos por exemplo que no tanque após oito horas haja 800 lts de água e que no
sistema B-C-D-E tenhamos a qualquer instante 400lts em média. Ora, se dividirmos o
resultado 800 lts pelo esforço 400lts obteremos o quociente 2. Mas o que expressa de
fato este número? Qual o significado do resultado desta conta?
GIRO DE ESTOQUE
(nº de vezes / período)
Nº de vezes que todo o volume de líquido na tubulação se
renova em um dado período
(nº de vezes / período)
Nº de vezes que todo o estoque se renova
em um dado período (normalmente 1 ano)
Sim, veja! Em um sistema que produz 800 unidades de um certo item (resultado no
período) e que, para viabilizar isso, imobiliza 400 unidades (investimento médio em
estoque no período) então o quociente 2, resultado da conta, indica que o estoque se
renova duas vezes nesse período, ou que o estoque “gira” duas vezes nesse período.
Este é o significado físico do giro ou rotatividade de estoques.
Observe, porém que se você optar por fazer a conta com base em custo o mais correto é
“imunizar” as parcelas da conta retirando dela aspectos que nada têm a ver com a
eficiência operacional. Repare: em lugar de faturamento a sugestão é utilizar o custo de
material relacionado à produção vendida. Isto porque o faturamento é influenciado por
variáveis de outra natureza, não operacionais, como por exemplo, margem de lucro e
impostos, fatores que se considerados no cálculo podem lhe iludir fazendo supor que seu
sistema está mais rápido do que de fato está.
GIRO OU ROTATIVIDADE DE ESTOQUE NO ANO
Produção vendida no ano .
Estoque médio ao longo do ano
Custo de material do produto vendido no ano
Custo do estoque médio ao longo do ano
De modo análogo, o mais preciso é tomar para cálculo o custo de aquisição dos materiais
evitando assim que interfiram no cálculo do giro os rateios de custos fixos como mão de
obra ou despesas de processamento.
Bem, isto é o mais preciso, mas é claro que os indicadores são para servir ao gerente,
não para escravizá-lo. Se o custo de obter a informação precisa for maior que o
benefício decorrente de apurá-la, não é errado usar o valor impreciso, desde que você
saiba a imprecisão que está cometendo e como ela afeta o resultado.
Agora me diga: se algo se renova duas vezes ao ano quanto tempo fica com você? Seis
meses, certo? E se a renovação se dá quatro vezes ao ano? Três meses, você dirá.
Percebe? Por trás da ideia de giro está implícito um tempo de atravessamento do
sistema.
FAÇA O CÁLCULO
?
PERMANÊNCIA = 1 .
GIRO
PERMANÊNCIA = 1 .
150 vezes / ano
PERMANÊNCIA = 1 ano .
150 vezes
= 365 dias .
150 vezes
= 2,43 dias por vez
Ciclo do processo
Podemos estimar este tempo do caixa de duas formas: observando vários atendimentos,
cronometrando-os e fazendo a média do tempo. Ou, podemos estimar este tempo
dividindo a jornada de trabalho pelo número de atendimentos realizados, como
apresentado na figura 43.
Por outro lado se você quiser que a conta do ciclo expresse de verdade o ritmo em que o
sistema funcionou, isto é a velocidade real do processo, então você terá que considerar
também os itens que foram rejeitados pois mal ou bem foram feitos e roubaram tempos
do sistema. Com efeito, será dividindo a jornada útil pela produção total feita no período
(bons mais defeituosas) que teremos entendimento sobre o Ciclo do Processo.
Observe ainda que o alvo da melhoria esperada pode ser também expresso por uma
conta de Ciclo. No caso deveríamos dividir a jornada pela meta de produção. Nessa
hipótese teríamos o Ciclo da demanda21, o ciclo desejado, na direção do qual a gestão
tentará convergir o ciclo do faturamento e o ciclo do processo.
O que pode ser feito para reduzir os tempos de atravessamento? Para responder essa
pergunta analisemos na figura 44 os componentes de tempo que usualmente compõem o
percurso do cliente, material ou informação através de um sistema de produção ou
serviço.
O tempo de atravessamento
Obtenção Transporte até Espera em Preparação Processa‐ Formação Entrega
dos local do fila de máquina mento de lote para o
insumos processamento cliente
Ora, conforme discutimos qualquer agilização neste percurso é bem vinda. Seja no
processo, de obtenção dos insumos, no transporte, na produção ou na distribuição
quanto mais direto e eficiente for o fluxo mais satisfeito ficará o cliente, mais rentável
será o processamento. Entenda, porém algumas armadilhas que você vai encontrar pelo
caminho.
Comecemos pela figura 45. Vamos supor que os recursos responsáveis pela fabricação
dos itens Haste, Suporte e Conjunto ali referidos e da etapa Teste são rápidos, levam 1
unidade de tempo para realizar a tarefa relativa a cada produto ou serviço. Já o recurso
que faz a Base é mais lento; cada produto lhe toma 2 unidades de tempo. Observe ainda
21
No contexto do “Lean” (Produção Enxuta) este ciclo da demanda é denominado “Takt-time””
que a Haste e a Base são feitos em paralelo não havendo pré-requisito entre eles, porém
a produção de ambos se acopla na fabricação do Suporte seguindo os materiais a partir
daí então juntos como um produto único.
Base
Suporte
Conjunto
Teste
Nesse exemplo inicial os recursos sempre que vão produzir o fazem num lote de
produção (também referido na literatura como lote de processamento) equivalente a 4
produtos. A razão pode ser, por exemplo, alguma economia de esforço na preparação da
máquina ou na requisição de materiais ao almoxarifado. Fazer de 4 em 4, sempre que a
máquina começa a produzir caracteriza o que chamamos de lote de produção. Note,
entretanto, que você pode fazer de quatro em quatro, mas passar para o próximo
estágio de 1 em 1. Se você fizer isso, seu lote de produção será 4, mas seu lote de
transferência (também referido na literatura como lote de transporte) será 1. Veja
agora o que ocorre quando se reduzem os lotes de transferência?
Tomemos para análise a figura 46. Vemos que o tempo de atravessamento será
composto de 8 unidades de tempo para a Base preparar seus 4 produtos; mais 4
unidades de tempo para o Suporte, outras 4 para o Conjunto e ainda mais 4 para o
Teste. Resultado: 20 unidades de tempo (já que as 4 relativas à Haste correm em
paralelo).
Base
Suporte
Conjunto
Teste
Tempo
Diz-se que a produção é empurrada quando os recursos trabalham visando a sua máxima
eficiência local sem estar diretamente orientados pela necessidade imediata do seu
cliente interno. Esse comportamento é normalmente incentivado por uma ideia
subliminar que nos sopra aos ouvidos: “não se pode deixar um ativo caro parado”! Ora
de fato é importante remunerar o investimento do acionista. Se uma máquina cara foi
comprada é porque esperava-se que ela com sua produção amortizasse esse
investimento no ritmo pretendido. Se, porém, ela faz menos que o previsto o tempo de
amortização se alonga e o acionista pode ficar muito chateado.
Em oposição, diz-se que uma produção é Puxada quando quem a comanda não é um
aspecto interno ao recurso (como a sua própria capacidade), mas sim a demanda
corrente do seu cliente imediato. Isto é, na produção puxada é o cliente imediato de um
processo quem dá o sinal de que é hora de ressuprir. Se este sinal não chega o recurso
não deve ser ativado.
Por este motivo, associamos a ideia de produção puxada ao acionamento pela “data mais
tarde”. É comum também estar associado a esta ideia o termo Kanban e a abordagem
“Just-in-time” que implementam tal conceito. Especificamente, Kanban é o sinal que o
cliente interno de um processo utiliza para avisar ao seu supridor que é hora de
ressuprir.
Porém, a aposta deste sistema de acionamento é que haverá benefícios globais que mais
que compensarão esta ineficiência local. Estes benefícios estariam diretamente ligados à
agilidade e flexibilidade na oferta de valor aos clientes e na redução dos custos de
estocagem. E derivariam do fato de que nesse modelo os produtos não são feitos antes
da hora do consumo. Portanto, os custos de manuseio e a estrutura relacionada à
transportar, controlar e armazenar em depósitos intermediários seriam minorados.
Reflita sobre o seguinte: se não há demanda qual a vantagem de manter uma máquina
na sua plena utilização? Se não há pedido, nenhum impacto positivo no numerador da
produtividade será alcançado pela decisão de manter o recurso na sua máxima utilização.
E pior, o denominador da produtividade aumentará, pois os materiais excedentes à
demanda que porventura forem produzidos nessa circunstância terão que ser mantidos
em estoque, para lá levados e depois trazidos de volta, quando chegar a hora de serem
aproveitados. Além desse impacto nocivo no custo haverá, ainda, a formação de filas que
obstruirão a desejada passagem rápida dos produtos.
Para você guardar: o lead-time ou tempo de atravessamento embute sempre uma ideia
de percurso. Já quando falamos de ciclo no campo das Operações o que se quer revelar é
uma ideia de ritmo, de cadência.
Por outro lado, garantir o fluidez através dos recursos não críticos (por exemplo, via
produção puxada e transferência em pequenos lotes) é fundamental para cumprir
rapidamente o percurso.
Percebe? Queremos que esses dois tempos de produção sejam pequenos, mas a
repercussão dessa agilidade é diferente.
E o que significa um Tempo de Atravessamento baixo? Significa que para obter o que
queria o cliente despendeu pouco tempo, fez pouco ESFORÇO (o denominador da
produtividade).
PRODUTIVIDADE
CICLO DO SAÍDA
PROCESSO GERADA
RESULTADOS
ESFORÇOS
TEMPO DE ENTRADA
ATRAVESSAMENTO CONSUMIDA
Com efeito, ganhos impressionantes têm sido relatados na literatura (e podem ser
verificados empiricamente) relacionados à implantação do LEAN e a consequente
diminuição dos tempos totais de atendimento, redução dos índices de falhas, aumento da
rotatividade de estoques e baixa dos custos de produção, dentre outros indicadores de
produtividade e qualidade.
O termo LEAN não é uma sigla, é uma palavra da língua inglesa, quer dizer magro. Em
português a tradução mais difundida para o “Lean” é “Enxuto”. Inicialmente visto como
uma proposta para a gestão do chão-de-fábrica hoje é percebido como uma filosofia de
gestão, o Pensamento Enxuto (em inglês, “Lean thinking”).
São cinco ideias bastante simples mas que mexem com paradigmas muito consolidados.
Neste texto vamos analisá-las uma a uma para compreender o que essas ideias têm de
transformador na forma tradicional de ver e de atuar da Produção.
Faça um teste. Pense em um sistema industrial ou de serviços que você conhece bem.
Avalie como as tarefas de produção ou atendimento são executadas no sistema. Verifique
aquelas que são úteis de fato para o cliente e as que são realizadas, não em favor dele,
mas em benefício das economias de escala dos próprios ativos do sistema e eficiências
locais relacionadas ao seu uso. Ou ainda as que são executadas da forma que são em
função de hábitos históricos ou pelo simples conforto em realizá-las de um modo
aparentemente mais tranquilo.
Tomemos como exemplo o transporte aéreo. O senso comum não hesitaria em chamar
de desperdício um grande avião viajando com poucos passageiros. Em correspondência,
uma aeronave voando com seus assentos ocupados tende, normalmente, a ser visto
como um resultado gerencial positivo (bom aproveitamento dos ativos).
E sejamos justos: é mesmo! Afinal, o avião voando significa faturamento para empresa
aérea! Portanto, faz todo sentido – para melhorar a utilização deste – analisar o tempo
que o mesmo perde parado em solo e, quem sabe, desenvolver ideias para que esse
“desperdício” se reduza.
Mas, e se, para gerenciar bem o sistema e maximizar o seu ganho a companhia aérea
resolve reduzir o espaço entre os bancos? Ou, obrigar os passageiros a percorrer várias
escalas entre a sua origem e o seu destino ou, ainda, manter os passageiros
“armazenados” durante horas dentro do avião em solo, em filas ou em salas de
embarque, para que o mesmo esteja voando o mais rápido possível, que sentimento
terão estes passageiros com respeito ao gestor da companhia aérea?
Como, então, conciliar estes dois objetivos aparentemente conflitantes, mas ambos vitais
para o negócio: proporcionar valor para o cliente e utilizar apropriadamente os ativos
existentes?
A proposta Lean é rever o processo. Quem sabe, por exemplo, substituir os grandes
aviões, que induzem a formação de “lote de passageiros”, por aeronaves menores, que
permitam voos diretos com pequenas lotações, menos esperas, maior conforto, em
resumo: uma experiência mais valiosa para o cliente.
Entenda a aposta Lean descrita na figura 48: volumes altos e ganhos de escala permitem
ratear os custos fixos, mas esses ganhos de escala só serão sustentáveis se houver
demanda. E, em um mundo de competição crescente, é improvável que a demanda se
sustente se o valor ofertado ao cliente degrada-se.
É um raciocínio simples. Cada dia que passa o cliente tende a ter mais alternativas de
escolha. Se para garantir a rentabilidade de um negócio o provedor submete o cliente a
contínuos desconfortos é bastante provável que logo os concorrentes, ou os novos
ofertantes de serviço, se aproveitem e posicionem pacotes de valor mais atraentes (voos
diretos e confortáveis, por exemplo). Clientes insatisfeitos não hesitarão em trocar de
fornecedor, deixando os grandes e eficientes aviões do nosso exemplo “às moscas”.
OS 7 DESPERCÍDIOS LEAN
Estocar desnecessariamente
Você fez algo antes da hora do consumo? Muito bom, só que agora você precisa de um
lugar para guardar. Esse lugar, foi o cliente que pediu pra você tê-lo? Não? Então, esse
lugar bem como o esforço de armazenagem é um desperdício Lean. Provavelmente há
razões racionais para você ter decidido fazer antecipadamente essa produção, por isso
chamar isso de desperdício vai incomodar. Mas essa é a mesmo a ideia!
Esperar desnecessariamente
Você fez um lote econômico de um certo item para aproveitar bem o seu ativo? Muito
bom ! Mas e quanto às outras coisas que há por fazer. Ficaram esperando? Se quem
espera é um item entenda que há aí um “dinheiro” do acionista esperando para se
remunerar. E um cliente, esperando para receber o que pediu? Não seria mais valor para
ele ser atendido prontamente? Essa espera não é interesse do cliente. Então, temos aí
mais um desperdício Lean.
A máquina está parada? Por que? Falta material, falta energia, falta operador, falta
pedido ? Esse custo será cobrado do cliente mas seguramente ele não está nada
interessado em pagar por isso. Não é do interesse dele? Desperdício!
Movimentar-se desnecessariamente
Você foi fazer sua operação e a ferramenta está no armário. Por que não está ao alcance
da sua mão? Você foi fazer o serviço e o material não está ali. Por que só providenciar
isso agora que você e a máquina já estão ali prontos para trabalhar? Esse custo do
recurso perdendo tempo com atividades que não agregam valor e a lentidão daí derivada
provavelmente não agradará seu cliente. Desperdício!
Agora você já tem o parâmetro adequado para discernir quais atividades de produção
que, de fato, agregam ou não valor para o cliente. Considere o cliente como juiz do
valor. Lápis, papel e borracha no mão, desenhe um fluxo representando as atividades
comumente realizadas. Caso trabalhe com diferentes serviços ou produtos selecione o
fluxo relacionado àquele que seja mais relevante para o resultado do sistema. No jargão
Lean esta atividade é referida como “Mapeamento do Fluxo de Valor”22.
Analise como o cliente (ou o material) e a informação percorrem este fluxo. Ao fazer
este mapeamento anote para cada recurso o tempo de ciclo do processo (isto é, em
quanto tempo ele libera um produto). Registre também informações relevantes para a
análise e melhoria. Por exemplo: quantos colaboradores trabalham no processo; qual a
jornada de operação; os tempos de preparação de máquina; as políticas de lote, etc.
De posse do seu mapa com a situação atual, faça a projeção de como idealmente deveria
se dar este fluxo. Não se apegue ao que já existe. Pense no que deixaria seu cliente
encantado. Não comece o seu raciocínio pelas escolhas que você fez no passado.
Lembre-se da ideia central: se preparar para o futuro em um mundo competitivo e em
permanente mudança. As limitações (de máquinas, pessoas, dinheiro, tempo) fazem
parte da vida e é necessário, na gestão do dia a dia, que lidemos com elas. Porém, se o
seu raciocínio começar por estas restrições sua visão de ideal tenderá a ser
conservadora. E como dizia Einstein: “nenhum problema pode ser resolvido pelo mesmo
padrão de raciocínio que o criou”.
Cogite livremente o sistema ideal, ainda que ele seja inalcançável nas condições
presentes. Não perca nenhuma chance de chamar de desperdício os tempos, obstáculos
e retenções do fluxo que atrasam a entrega dos produtos e serviços ao cliente, ainda que
seja impossível removê-los no momento. Filas23, retrabalhos, inspeções, controles,
armazenagens, dentre outros, podem ser necessidades do sistema como ele existe, mas
não interessam em nada ao cliente que poderia perfeitamente viver sem tais atividades,
desde que o produto ou serviço lhe fosse entregue prontamente e de acordo com as
especificações desejadas de qualidade e preço.
Atente também para o fato de que, ao menos no seu mapa ideal, nenhum dos seus
processos pode ter um ciclo atividade superior ao takt-time (ciclo da demanda). Se isso
acontecer seu sistema não conseguirá aproveitar a oportunidade de mercado existente,
será ineficaz.
A visão de um alvo ideal dará norte e gás ao processo de melhoria contínua. Após
preparar o mapa do fluxo atual e o mapa do fluxo ideal, defina o mapa de fluxo possível
diante das condições existentes. Procure envolver sua equipe nesta análise, pois muito
mais do que simples “mão de obra” as pessoas da linha de frente têm, em geral, ótimos
22
Se você tiver interesse em se aprofundar nessa ou em outras técnicas do Lean, o Instituto Lean do Brasil [1] é
um boa referência com uma série de ótimas publicações elaborados por gente com muita experiência prática e
maturidade conceitual.
23
Se as esperas nos seus sistema forem muito longas e difíceis de medir você pode estimar a duração delas
contando quantos itens há na fila e multiplicando esse quantidade pelo ritmo da retirada solicitada pelo mercado.
Reflita: se em frente ao caixa do banco há uma fila de dez pessoas e em média cada cliente leva três minutos
para ser atendido então a espera provável é aproximadamente meia hora, certo?
“insights” de melhoria. Além disso eles ficarão felizes e orgulhosos de terem suas ideias
aproveitadas. A participação da equipe contribui também para gerar um senso de
coautoria, favorecendo a consolidação posterior da mudança.
Hoje entretanto reconhece-se que há um oitavo desperdício, que talvez seja o mais
relevante de todos pois se eliminado pode criar as condições para a eliminação dos
demais. Trata-se de:
Estão ali ao seu lado e gerenciam suas vidas. Por que chamá-los de mão-de-obra
se têm muito mais que mãos e você os tem ali bem perto, “cabeças pensantes”
que poderiam ser fundamentais para o aprimoramento e a resposta rápida aos
problemas.
Cansado do ano, logo após o ano-novo, fui com a família passar as férias em Cuenca no
Equador.
Comprados os tickets aéreos partimos animados. É verdade que o horário do voo não
era muito atraente: 6 da manhã! Ainda mais porque sendo um voo internacional
recebemos a instrução para estarmos no aeroporto 2 horas e meia antes do embarque.
Pois assim foi. Às 2 da manhã, do dia 3 de janeiro, começamos a nos preparar para
sair. Às 3h00 estávamos no taxi e às 3h30 chegamos pontualmente na fila do check-in
que estava fechado e só abriu às 4h00.
Como éramos os primeiros da fila, fomos rapidamente atendidos entre 4h00 e 4h05,
quando então seguimos para o controle de passaportes da Polícia Federal, que estava
também fechado! Só abriu às 5h00.
Às 7h10 desembarcamos em São Paulo e seguimos para uma sala de trânsito onde
ficamos esperando o embarque para o nosso voo. Às 8h50, após um pequeno atraso e
uma espera em pé numa sala completamente lotada, embarcamos em um ônibus que
nos levou até a aeronave estacionada no pátio. Então, finalmente, às 9h30 levantamos
voo para... Lima. Puxa, Lima não é no Peru? Eu quero ir para o Equador!!
Três da tarde no Brasil, 13h em Lima, dia de sol, ainda bem. Será preciso fazer hora,
pois não há voos diretos para Cuenca a partir de Lima. É necessário seguir para Quito,
a fim de fazer a conexão. Mas de Lima para Quito só há voo às 21h50. Então,
aguardamos oito horas de espera em Lima, com as malas.
A ENGENHARIA DO CONSUMO
Como você, sentimos falta do tempo. Adoraríamos que tivéssemos mais tempo. Nós,
você, todo mundo hoje sente falta do tempo que parece tornar-se a cada dia um recurso
mais e mais precioso. Por isso nos intriga quando vamos numa loja, percebemos que um
investimento significativo de propaganda foi feito para que ali estivéssemos; que um
segundo investimento foi feito para que acessássemos o produto rapidamente e, com o
produto já nas mãos, na hora de pagar, diante de tanta fila e desatenção, nos vemos
pondo o produto de lado e desistindo da compra.
Chega a ser ridículo. Nosso ponto de vista é claramente negligenciado. Como se acessar
o produto ou o serviço fosse nosso objetivo e não a experiência do consumo em si, como
um todo. Você almoça rapidamente e leva horas para pagar; entra numa loja de
departamentos, obtém o produto e tome fila; acessa um lindo site na internet para
comprar e gasta horas para terminar a transação; liga para um prestador de serviço e
repete mil vezes a mesma informação.
Para quem tem um restaurante, por exemplo, o ciclo de atendimento do cliente na mesa
tende a ser um aspecto muito sensível. Afinal o faturamento é limitado pelo número de
mesas que cabe no espaço. Se cada cliente leva meia hora na mesa o restaurante faz
dois faturamentos por hora ! Se o atendimento tornar-se mais eficiente, por exemplo,
20 minutos, o impacto no faturamento é imediatamente percebido, ele passa a multiplicar
a mesa por três a cada hora.
Mas, se atendem mais clientes e mantêm a mesma e única pessoa no caixa a espera no
momento de pagar aumenta. Parece que não afeta o faturamento mas, no fim das
contas eu desisto de ir lá!
Um aluno nosso em seu projeto final de curso resolveu por o “dedo na ferida”. Dono de
um pequena gráfica, pediu a uma amiga que ligasse para sua empresa e anonimamente
solicitasse a impressão de um folheto. A amiga tomou nota de todos os tempos e esforços
que fez para conseguir o serviço, desde a consulta ao site, a negociação sobre o serviço, as
provas antes da impressão, até a produção em si. Parou de anotar só quando teve o
produto em mãos. Do tempo total de atendimento menos de 5% referiu-se ao tempo que
o folheto passou nas máquinas de impressão. Conclusão: energia demais melhorando os
processos de produção e energia de menos melhorando os processos de consumo.
Em oposição, há o “doce problema”. A situação em que mercado não lhe falta, você tem
à vista um mundo de oportunidades, mas à noite, quando põe a cabeça no travesseiro,
se pergunta como fará para aproveitá-las enquanto cumpre os compromissos já
assumidos.
Momento um: início do século, Ford, Taylor, Fayol e a Administração científica. O período
pós-primeira guerra encontra os sistemas de produção europeus e de todo mundo
fragilizados. Nos Estados Unidos, porém a classe média americana está capitalizada,
ávida por opções de consumo. Pouca oferta, muita demanda, “doce problema”. Ford
assume: faço qualquer carro desde que seja o meu carro preto modelo T. O desafio é o
volume e o uso eficiente dos limitados recursos disponíveis. O mercado é comprador. O
artesanato dá de vez lugar à ciência na administração: estudos de tempos e
movimentos, divisão de trabalho, a hora e a vez das linhas de montagem e das
economias de escala.
Momento dois: anos 70. A euforia com os anos de reconstrução após o pós-segunda
guerra cessa. Os “anos dourados” em que o homem vai a lua e se crê dono do universo
dão lugar a realidade nua e crua dos recursos escassos. Crise do petróleo, crise
ambiental, crise energética, degradação do meio ambiente. Os mercados se retraem,
capacidades ociosas, “amargo problema”. Com menos oportunidades de venda, os
sistemas de produção voltam-se para a redução do custo, para o uso racional e
econômico dos recursos.
Momento três: dois mil e quinze, aqui estamos nós. Mercados globais, um mundo de
oportunidades, literalmente! Sem dúvida: um “doce problema”. De outro lado, porém,
“concorrência global”. Uma miríade de concorrentes. Um deslize, um clique de mouse e o
seu mais fiel cliente muda de malas e bagagens para a lista de clientes do seu mais
aguerrido concorrente. Cuidado: o “amargo problema” bate a porta.
Você precisa reformar o seu sistema, se preparar para esse novo cenário “acre-doce”!
Mas como fazer isso?
Primeiro lhe convido a pensar sobre a ideia de “lote-econômico”. Talvez você não o
conheça por este nome, mas certamente o pratica.
Dá trabalho levar um cliente ou a coisa de um lugar ao outro? Então, porque não levar
logo vários de uma vez? Preparar uma máquina para o processamento de um
determinado item toma muito tempo? Então, quando ela estiver preparada processe logo
vários itens de uma vez. É muito trabalhoso encomendar um certo serviço ao fornecedor?
Por que você não aproveita e contrata logo vários de uma vez?
Essa ideia de compensar um custo que temos com uma quantidade homogênea de
produção ou serviço é a alma do “lote econômico”. É um conceito consolidado em nossas
vidas. Dizem que remonta ao tempo dos primeiros agricultores que premidos pela
natureza e suas safras acostumaram-se a antecipar a produção em relação ao consumo,
fazendo grandes lotes e ensilando para preservarem-se do inverno hostil.
Ora, enquanto você faz muito de uma mesma coisa você não está fazendo as outras que
o cliente talvez esteja querendo (mesmo que só um pouquinho) e é possível (até
provável) que o cliente não esteja disposto a lhe esperar e prefira adquirir esse produto
logo, em algum outro lugar. Além disso, como você produziu o seu produto antes da
hora do consumo, provavelmente, você há de ter se pautado em previsões. Há, portanto,
um bom risco de que, neste mundo em permanente mutação, suas previsões de vendas
falhem e você se veja com o produto errado na mão, tendo gasto seu recurso na
confecção do produto que o cliente não quer mais. E o pior, sem tempo agora de fazer o
produto que o cliente diz querer!
Veja se você já não viveu essa cena: você tem um desejo claro, sabe onde está o seu
produto ou serviço desejado. Então, se dirige ao local, mas lá tem que entrar em uma fila
de triagem, é deslocado para um setor de cadastro, segue para uma fila de serviço,
eventualmente para um segundo estágio de serviço e, por fim, tem que enfrentar outra
fila no setor de pagamento e uma ainda mais para o embrulho.
Submetido a tal sorte de infortúnios, o que poderia ser uma compra rápida se torna um
tormento e justamente o seu tempo – que para todos nós é hoje uma das coisas mais
preciosas que há – é tratado pelo prestador de serviço como se não valesse
absolutamente nada.
Um detalhe, porém: quando se faz tingimento o lote deve ser homogêneo, de uma
mesma cor. Em consequência, os ganhos de volume de produção tiveram como
contraponto a confecção de grandes lotes de itens de mesma cor.
Produzidos de uma vez (para aproveitar a máquina), mas antes da hora exata do
consumo, tal produção passou a demandar algumas das seguintes transações e
instalações que antes não eram tão necessárias:
Para piorar: crianças mudam de interesse como quem muda de brinquedo. Quer algo
mais volátil do que moda infantil? As previsões de venda feitas no início da estação
comumente não se verificavam. Consequentemente, os volumes homogêneos de um
mesmo item feitos no início da estação, para viabilizar o processamento eficiente nas
máquinas de tinturaria, frequentemente tornavam-se obsoletos no final da estação.
Os lotes estão em toda parte, mesmo dentro da nossa casa. Veja abaixo três situações
que talvez lhes sejam familiares. Reflita sobre elas e pense nas consequências que
algumas economias de escala locais podem trazer:
I. Tempo de resposta
Outro dia, ao me vestir, percebi que estava sem nenhuma meia na gaveta. Pensei:
puxa, tenho que comprar mais meias! Então, resolvi fazer um investimento e dupliquei
os “estoques”.
Passaram-se duas semanas e qual não foi a minha surpresa quando me deparei
novamente com mesma cena. Fui verificar o que estava acontecendo e descobri que a
moça que me ajuda com a lavagem de roupas seguia o seguinte processo:
1º. Para ganhar eficiência na lavagem ela esperava que se acumulasse roupa
suficiente para encher toda a máquina. Como esta era grande isso significava na
prática um ciclo de lavagem por semana.
2º. Para evitar manchas ela fazia um lote de roupas claras e depois outro de roupas
escuras. Na prática, a consequência é que, se o ciclo da semana fosse de roupas
claras, uma roupa escura poderia ficar aguardando a sua vez quase quinze dias.
Ora, como quase todas as minhas meias eram escuras, a gaveta só não ficaria
vazia se eu tivesse “estoques” para quinze ou vinte dias!
II. Custo
Quando eu era pequeno minha mãe tinha o hábito de fazer compras mensais. Eu
gostava de ir com ela. Enchíamos o carrinho com mantimentos e (viva!) muito biscoito!
Em casa tínhamos uma arca só para os biscoitos. Com a disponibilidade farta de
guloseimas às vezes comíamos mais que o razoável (pelo menos os de chocolate
tendiam a acabar logo na primeira metade do mês)! Não era raro, também, que um
menos votado ficasse sempre para trás, no fundo da arca, e acabasse estragando.
Hoje, lá em casa, as compras são feitas pela internet. Como não nos custa muito
encomendar fazemos as compras semanalmente. Compramos só o que necessitamos
para uma semana (não para um mês). A consequência é que apenas uma prateleira
parece suficiente para armazenar todos os mantimentos. E não me faltam os biscoitos!
III. Qualidade
Abra aquela gavetinha onde você guarda os remédios e confira a validade. É quase certo
que você terá o que jogar fora. Por quê? Porque quando precisou daquele
anteinflamatório você foi obrigado a comprar a quantidade da embalagem, não apenas o
que necessitava. Você guardou para usar um dia, mas o tempo passou e agora que você
foi usar...
Para estabelecer o fluxo contínuo, você terá que enfrentar os lotes e as especializações,
mas não se iluda, eles não estão lá por acaso. Possivelmente, foram criados
(possivelmente, por nós mesmos) para compensar custos e restrições reais e existentes.
E assim como o lote econômico que têm a seu favor no próprio nome a justificativa da
racionalidade diante de restrições de processamento existentes, também a ideia de que
um recurso dedicado e especializado numa tarefa simples é mais eficiente que um
polivalente realizando uma tarefa mais complexa encontra respaldo em mais de cem
anos de historia e aprendizado. Questionar uma tolice é fácil. Mas esteja atento, quando
a pauta é lote econômico e especialização estamos pensando os “contras” de ideias que
têm de fato muitos “prós”.
Portanto, se você crê que com lotes pequenos e focados caminharemos na direção do
“valor para o cliente”, precisa alterar as razões que lhe fazem trabalhar com lotes
grandes: é preciso usar a cabeça para minimizar o custo de troca, tornando
paulatinamente cada vez menos importantes as economias de escala locais.
O tal benefício, entretanto, teria seu preço. Seria necessário ir a uma repartição para
requisitar a benesse. Com a lembrança na memória de tantos maus atendimentos no
passado, meu colega chegou a pensar que talvez um ano de trabalho a mais não
fosse assim tão mau, mas, movido por um senso de pragmatismo, respirou fundo e
decidiu-se a percorrer os corredores e filas da burocracia.
Quando chega a vez do meu amigo, irresistível é perguntar ao cidadão quem é ele
que salva o tempo aos velhinhos, os atende com presteza e flexibilidade. Para sua
surpresa total, a resposta é a seguinte: o tal senhor é simplesmente o gerente da
repartição. Em lugar do ar condicionado de sua sala, aflito com o desconforto
cotidiano daquela gente em busca de ajuda, percebeu que, sendo o mais experiente
da repartição, era ele próprio quem melhor tinha tino para triar o que era “valor”
para o seu cliente. Resolveu, então, trabalhar em pé no saguão abreviando, com
essa decisão, as longas e tradicionais esperas por atendimento.
Veja o resultado: em meia hora meu amigo saiu da repartição com o seu processo
instruído e eu estou aqui falando deste gerente para vocês agora!
Observe a figura 49 e imagine que uma linha de produção L tenha sido concebida
para processar X1, X2 e X3, modelos semelhantes de um mesmo produto X.
Suponha que com o tempo o mercado passou a demandar os também os produtos Y
e Z, nos modelos Y1, Y2 e Y3, além de Z1 e Z2.
Ora, se X, Y e Z forem diferentes será trabalhoso fazê-los todos nesta mesma linha,
pois o sistema talvez vá demandar ajustes expressivos ou tempos de preparação
cada vez que o produto em processamento for trocado. Além disso, se o mercado
quiser todos os produtos todos os dias será complicado atender esta demanda
eficientemente, pois quando um produto esta passando na linha toda a força de
trabalho está empenhada nisso. Perceba que se todos estão ocupados com X quem
vai atender Y e Z? Provavelmente, será necessário dispor de estoques de todos os
produtos para atender as diferentes demandas.
LINHA L ‐ Produção de x1, x2, x3, y1, y2, y3, z1 e z2
S
M u
e p
r ri
Estação Estação Estação Estação Estação Estação Estação Estação
c m
8 7 6 5 4 3 2 1 e
a
d n
o t
o
c
CÉLULA X : Produção de x1, x2 e x3
Estação Estação Estação Estação S
4 3 2 1 u
M p
e CÉLULA Y : Produção de y1, y2 e y3 ri
r Estação Estação Estação m
c 3 2 1 e
a n
d CÉLULA Z : Produção de z1 e z2 t
o o
Estação
1 c
Que tal, então, dividir a linha em pequenas células e dedicar uma parte dos recursos
a cada família de produtos. Essa é a proposta do arranjo celular. Com essa
organização o arranjo segue por produto na célula, ganhando flexibilidade de mix,
pois pode-se processar vários produtos ao mesmo tempo sem necessidade de
estoques. Registre-se, porém, que a divisão em células traz ao operador um
conteúdo de trabalho maior. No cenário original o operador realizava 1/8 da
operação total e na situação celular essa fração aumenta. Além disso, o arranjo
celular pode significar também a necessidade de mais recursos. Imagine, por
exemplo, que uma certa ferramenta é usada na linha original, talvez seja necessário
dispor de três delas para migrar para o arranjo celular.
LINHA L ‐ Produção de x1, x2, x3, y1, y2, y3, z1 e z2
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Estação
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Minha filha perdeu o celular e resolvi apoiá-la na compra de um novo. Agoniado com a
perspectiva de dispendermos muito tempo com essa atividade combinei com ela que
iríamos na loja no fim do dia quando presumidamente tudo estaria mais tranquilo. Ledo
engano !
O tempo total que gastamos nesse singelo percurso foi de uma hora e quarenta minutos.
Para piorar, quando esperávamos na fila para atendimento as pessoas estavam um tanto
nervosas e por pouco um conflito irrompeu na loja entre dois clientes que disputavam a
atenção de um funcionário.
Quando chegou nossa vez comentei com o senhor que nos atendeu sobre nosso
desconforto com o clima da loja e a espera. O atendente fez o seguinte diagnóstico: “as
pessoas estão loucas, mal-educadas, trabalhei anos em banco e as pessoas esperavam
na fila de forma ordeira, aqui não, sempre todo mundo reclamando, ninguém quer
esperar”.
Na percepção dele a “culpa” era do cliente. Mas não quero ser injusto, meu atendente
era muito cordato e atencioso! A conversa seguiu , tomei coragem e perguntei: “mas
afinal de contas, o que é que tanto você faz aí, estive observando ali da fila, cada cliente
que senta aqui fica cerca de 40 minutos no atendimento!”
Sabe o que ele me disse? Que esta lentidão se devia ao fato dos clientes não saberem o
que queriam: “o cliente chega aqui me pede um aparelho, vou lá dentro, trago, ele olha,
olha e não quer; vou lá dentro pego outro; ele não gosta; e assim vai o tempo !”
Fiquei pasmo: de novo “a culpa novamente era do cliente”.
Confirmei com ele: “você está me dizendo que metade do seu tempo é gasto com a
escolha do cliente?”. Vejam: este atendente que falava comigo não era um recurso
qualquer, ele era bem preparado, era o “gargalo” do sistema.
Pensei alto: estive 50 minutos esperando numa cadeira exatamente na frente de uma
estante onde estavam todos os telefones à mostra. Uma espera que não me agregou
valor algum. Por que não me deram acesso aos telefones durante essa espera? Se
assim fosse eu não perceberia esse tempo como inútil e eles se aliviariam de metade do
tempo de atendimento do recurso que, no processo deles, era o “gargalo”. Para mim
seria muito mais valor e eles poderiam atender o dobro de pessoas!
Ou... poderiam ao invés de atender mais pessoas aproveitar esse tempo que ia sobrar e,
considerando que o telefone já está ali na mão do vendedor, poderia me cobrar e me
entregar o produto? Se assim fosse eu não teria que esperar na fila de pagamento e do
embrulho!
(segue)
Será mesmo mais custoso? Entre numa loja modelo da Apple no exterior e veja se
não é exatamente assim que ocorre. Todo o seu tempo na loja agrega algum
valor. E todo o tempo dos atendentes é produtivo. Fique de olho, em geral o
problema não são as pessoas, elas são exatamente como nós. Geralmente o
problema é a gestão e a percepção de valor.
Se essa é a má notícia, há também uma boa informação para lhe dar: se conseguir
transformar o seu sistema, eliminando os desperdícios, passando a produzir em lotes
menores, em um fluxo contínuo ou próximo disso, estará prestes a simplificar sua vida.
Porque de agora em diante poderá simplesmente prescindir (ou depender menos) das
previsões para disparar a sua produção.
Se você for veloz no atendimento de uma demanda, então ao invés de tentar adivinhar o
que vai acontecer amanhã e estocar produtos previamente (coisa que terá que fazer se o
seu cliente quer o produto em um tempo menor do que você é capaz de produzir),
poderá se dar ao luxo de esperar a chegada do pedido e só assim disparar a produção.
Mas como ser veloz? Lembra-se das discussões que fizemos? Trabalhando em conjunto
a “Produção Puxada” e a “transferência em pequenos lotes” podem trazer a aceleração
que você precisa. Com essa lógica de acionamento seu time mantém com muito mais
facilidade o foco e a concentração em gerar valor para o cliente e, se a “aposta Lean”
estiver certa, isto vai, no fim das contas, gerar muito valor para você (os acionistas, sua
equipe, seus parceiros, todo o sistema).
Em um mundo de constante mudança isso não é pouca coisa. Significa uma vantagem
competitiva irresistível: leveza para atender imediatamente os desejos do cliente. Não
seja ingênuo porém. Também aqui há uma grande mudança de paradigma envolvida.
Mudar a lógica tradicional de “produção empurrada” para “produção puxada” pode ser
muito mais difícil do que parece, particularmente se estão em jogo ativos caros que
estimulam a cultura da eficiência local. Isto é: se você pagou muito por uma máquina é
natural que aspire vê-la em pleno uso. A “produção puxada” entretanto coloca esse
desejo primário em xeque quando sugere que os recursos terão seu acionamento
comandados pela demanda do recurso subsequente e não pelo seu próprio potencial.
Você já ouviu falar do termo “sunk cost”? Quer dizer “custo afundado”. O que tem
isso a ver com Lean? E com a produção puxada? Tudo a ver!
Suponha que você resolveu comprar uma bicicleta. Ela está ali na vitrine da loja:
duas prestações, R$200 a vista no ato da compra e R$400 para pagar daqui a 30
dias. Você está decidido, realiza a compra, paga os R$200 da entrada e só em
seguida verifica que no contrato, em letras pequeninas, está dito lá: “a entrada não
será devolvida em nenhuma hipótese”. Mas tudo bem, você quer mesmo a
bicicleta, não é seu plano desistir do negócio.
Só que ao sair da loja você comete um erro crasso. Você olha para o lado e na loja
vizinha (não é possível!) lá está a mesmíssima bicicleta a venda por R$390. E mais,
a oferta é sem entrada e para pagar em 30 dias. O que você faz? Finge que não
viu? Chora? Começa a pedalar desesperadamente para que a mente esqueça o
assunto?
Nada disso, seja racional! A decisão na verdade é bastante simples. Você tem que
voltar na loja e devolver a bicicleta que acabou de comprar. Por que? Porque os
R$200 que você pagou fazem parte do passado, não têm nada a ver com a decisão
que você tem a sua frente.
O que isso tem a ver com a “produção puxada”? Puxar a produção, como preconiza
o Lean, às vezes significa utilizar um ativo abaixo do seu potencial instalado. E
quando esse ativo é caro, essa ineficiência forçada costuma dar “dor de cotovelo” em
quem o comprou. Mas seja qual for a decisão tomada no passado, você tem que se
concentrar nas opções que tem a sua frente e escolher a que adiciona mais valor no
presente e no futuro.
O SISTEMA KANBAN
O kanban pode ser um espaço de estocagem desenhado no chão que quando fica
vazio significa que é o momento de repor; um cartão associado ao estoque de
acabados de um processo que quando destacado do material que segue para
consumo sinaliza ao fornecedor que é era de ressuprir; pode ser o próprio
contenedor esvaziado pela retirada de um produto para atender o cliente; o espaço
numa prateleira de supermercado; uma sirene que toca, algo assim.
O kanban pode ser usado para acionar um processo de produção, mas também um
processo de transporte, manutenção, ou outro qualquer. A figura 51 apresenta uma
situação genérica onde postos de trabalho distantes se comunicam através deste tipo
de sinalização. Observe que para cada setor há definido um estoque de entrada e um
de saída.
Figura 51
Para entendimento dos fluxos descritos no desenho da figura 4 imagine que para
atender uma loja um certo item foi retirado do estoque de acabados (canto direito da
figura). Suponha que este produto estava num contenedor que, por consequência do
consumo, ficou vazio.
Imagine que esse contenedor (ou um cartão correspondente a ele) seja então enviado
ao estoque de saída do Processo 2. Ao chegar aí duas coisas acontecem: a primeira,
o contenedor vazio é preenchido com produtos já previamente produzidos no
processo 2 sendo então enviado de volta para restaurar a posição no depósito. A
segunda: o contenedor onde estavam os produtos usados para “pagar” o pedido do
depósito fica vazio e então o contenedor (ou um cartão correspondente a ele) é
enviado ao estoque de entrada do Processo 2 sinalizando que é hora de produzir para
repor o estoque de saída do Processo 2 que ficou temporariamente desfalcado.
Buscar a perfeição pode parecer uma frase solta no vazio, mas quanto mais vivemos
mais aprendemos que o sucesso das coisas depende fundamentalmente das pessoas.
Womack e Jones [5], que estudaram durante anos o sistema Toyota de Produção e mais
adiante cunharam o termo LEAN MANUFACTURING, registram sobre sua experiência de
anos juntos às empresas que seguiram este caminho: “à medida que as organizações
começam a especificar valor com precisão; identificam o fluxo de valor total; à medida
em vão transformando o seu sistema na direção do fluxo contínuo e deixam que o cliente
puxe a sua produção, algo muito estranho começa a ocorrer. Ocorre aos envolvidos que
o processo de redução de esforço, tempo, espaço, custo e erros é infinito.”
Trocar o pneu de um carro para mim toma de 10 a 15 minutos. Se eu fosse disputar uma
corrida jamais colocaria a troca de pneus na minha estratégia. Eu iria tentar preservar
os pneus, reduzir antes das curvas para evitar o desgaste. Essa minha decisão seria
sensata não fosse o fato de que, hoje, na fórmula 1 ninguém ganha a corrida se não
parar nos boxes para trocar os pneus. O desgaste é muito grande e a baixa aderência,
depois de um tempo, torna o carro incontrolável.
Nos encanta, em geral, o belo, a grande “sacada”, o nível estratégico, mas são as
pequenas questões cotidianas do nível operacional que frequentemente destroem o
resultado final.
Figura 52: Resposta rápida aos problemas e seu impacto no desempenho global
Agora reflita: quantos gerentes há na sua empresa? Um, cinco, dez ou algo assim. E
quantos colaboradores de linha de frente há? Dez ou, às vezes, cem vezes mais! Quem
pode rapidamente responder e solucionar os milhares de problemas cotidianos: os mil
colaboradores, que estão ao lado do problema, ou os dez chefes, que estão assoberbados
com os grandes e difíceis problemas? Parece óbvio, não é?
Típicas mobilizações em grupo são os “mutirões kaizen” organizados pela gestão para, de
forma participativa, reformar o leiaute de uma área, melhorar a produtividade ou a
qualidade de uma célula, reduzir o tempo de preparação de uma máquina, ou coisas
assim. Em particular, quando o foco é a redução de “set-up” o termo SMED (do inglês,
single minute exchange of die) é comumente associado a esse tipo de projeto de
melhoria. Na verdade trata-se de uma remissão a um famoso trabalho feito nos anos
1950, numa fábrica japonesa, quando Shigeo Shingo, famoso engenheiro japonês,
considerado um dos pais da moderna gestão industrial, foi capaz, com um grupo de
colaboradores, de reduzir o tempo de troca numa prensa de dias para minutos (uma
duração que fosse representada num dígito, isto é, menos do que nove minutos).
Delegar não é fácil. É desafiador do ponto de vista emocional. Um líder inseguro pode
confundir delegação com perda de poder. Entretanto, um gestor com mais visão
saberá que seu sucesso duradouro está ligado ao resultado e valor proporcionado, não
simplesmente ao poder local que ocasionalmente detém. Diante de um resultado
medíocre, esse poder vai se mostrar efêmero e não terá vida longa em um mundo tão
exigente quanto o que estamos vivendo.
DEVE SER
Operações ELIMINADO T TEMPOS INTERNOS
que IMEDIATAMENTE R
agregam A • retirada de ferramenta Atividades que só podem
DESPERDÍCIO
valor N • remoção de rebarbas ser executadas durante o
S • acoplamento de ferramenta processo de fabricação
AÇÕES DO
OPERÁRIO
F
Operações O
sem valor R
M
A
R TEMPOS EXTERNOS
OPERAÇÕES
• transporte de ferramenta Atividades que podem
ser executadas
Precisam ser feitas pelas • organização da área antecipadamente ou em
condições presentes de • busca de materiais auxiliares paralelo ao processo de
atuação do operário fabricação
A FERRAMENTA A3
O que há de interesse numa folha em branco? Por que no mundo Lean usa-se mais
o A3 do que editores de texto potentes e softwares de apresentação?
Vamos ser um pouco mais precisos: o A3 é mais que uma folha em branco!
Embora varie de empresa para empresa essa folha em geral é previamente
subdividida em áreas que simplificadamente destinam-se a: no quadrante 1, a
formulação do problema, indicadores da situação atual e objetivos; no quadrante
2, a análise da causa-raiz; no quadrante 3, plano de ação ou a melhoria
pretendida e no quadrante 4, acompanhamento para consolidação da ideia.
O POTENCIAL DA FERRAMENTA A3
Na Toyota e várias empresas que apostam na filosofia Lean, quem quer que seja
que vá levar uma ideia para alguém o faz através do A3. Veja as vantagens
potenciais associadas a essa prática:
Empresas que trabalham com a cultura Lean costumam ter bem estruturados os
processos de gestão do cotidiano das operações. Tipicamente trata-se de um conjunto
de práticas gerenciais que se repetem rotineiramente no chão-de-fábrica de forma
padronizada e participativa. Consistem de visitas aos postos de trabalho, reuniões
com a linha de frente, reuniões transversais entre departamentos e reuniões da
equipe de direção que se repetem todos os dias, nos mesmos horários, de forma
integrada (os resultados do nível mais baixo alimentando as discussões do nível
imediatamente superior) com debates e ações sempre apoiadas em indicadores e
valorizando a gestão visual.
Bússola para
Bússola para
desdobramento dos indicadores
desdobramento dos indicadores
no dia-a-dia do chão-de-fábrica no dia-a-dia do chão-de-fábrica
EFICÁCIA Eficácia: aproveitamento das oportunidades
Produção: volume; mix; pontualidade
Qualidade: satisfação dos stakeholders
Qualidade cliente: reclamações, defeitos
QUALIDADE EFICIÊNCIA
Eficiência: racionalidade, economicidade
Utilização de máquinas, gastos, perdas
Boas práticas: organização do posto
Efetividade e responsabilidade social
RESPONSABILIDADE
Segurança colaborador: acidentes, riscos
(SEGUE)
Por exemplo, suponha que um processo é dominado por uma máquina contínua e
que o operador tenha pouca ação sobre a performance da máquina em si. Num caso
como esse pode ser indicado selecionar como indicador de eficácia o tempo de
preparação de máquina versus uma meta para essa troca. Embora o que se deseja
é maximizar a produção do processo, se a possibilidade de interferência do operador
no tempo de preparação é real enquanto na performance da máquina é desprezível,
então incentivar o operador a controlar seu tempo de troca pode trazer mais
mobilização que controlar a produção da máquina em si.
Após esse giro pelo setor o chefe reúne as equipes em frente aos murais de setor
para reuniões rápidas que buscam analisar o desempenho do dia anterior e
consensar como grupo de colaboradores e equipes de suporte a prioridade de ação.
Neste momento também, para os problemas que exigem estudos, são abertos A3s
para exame dessas questões.
Por fim, no nível do departamento reuniões periódicas são executadas à frente dos
murais que revelam o desempenho mês a mês e, conforme a evolução dos
resultados as metas são revistas.
CÉLULA I
P esso as Capacidade M eta P ro dução M eta P ro dução Esto que Lead-time P ro blemas Total P ro blemas e Soluçõ es
máxima planejada realizada acumulada acumulada pro cesso atravessamto (descrição ) Qt. pro d. (descrição )
5
P erío do
64 48 4 40,0 0,0%
0a1 8 6 6 6 6 3 34 0 6
1a2 8 6 6 12 12 3 36 0 6
2a3 8 6 7 18 19 4 34 0 7
3a4 8 6 6 24 25 5 44 Estoque alto 0 6 Respeitar kanban
6a7 8 6 7 42 39 3 30 0 7
7a8 8 6 8 48 47 3 31 0 8
64 48 47 3,6 36 6,5% 31
Note também que as linhas do gráfico num intervalo horário buscam provocar o feed-
back frequente e a resposta rápida aos problemas.
Até a terceira hora tudo vai bem mas na quarta hora o kanban não é respeitado, a
produção é desnecessariamente antecipada e quando o operador registra o status da
hora percebe um estoque em processo acima do padrão. Ele então reage
imediatamente procurando corrigir sua ação.
De fato na próxima hora o estoque entra nos eixos mas ocorre então um problema
de qualidade e a produção da quinta hora não alcança a meta.
Segundo: (i) ciente de que está atrás de sua meta; (ii) ciente de que sua
capacidade lhe permite recuperar o atraso e (iii) incomodado com o vermelho no
seu quadro de produção, o operador instintivamente tenta recuperar o atraso na
sua performance (como no futebol faz o time que está perdendo).
A construção Lean
O Lean, tomado em sentido mais amplo, como uma filosofia de gestão pode ser
entendido como um construção. Com efeito, não gratuitamente, a Toyota costumava
representar seu sistema através de uma casa. Nesta metáfora, como assinala a figura
56 as fundações estariam relacionadas a algumas crenças bem enraizadas na cultura
Lean, quais sejam:
a) No mundo contemporâneo devemos estar preparados para atender prontamente
uma variedade de demandas. Os mercados do mundo globalizado serão mais e mais
competitivos e exigirão pronta resposta com qualidade e custo competitivo.
Precisamos portanto estar organizados para atender tudo todos os dias, num modelo
de produção nivelada;
b) A demanda por variedade trazida pelo mercado não se contrapõe ao aprendizado
histórico relativo à padronização de processo. Ao contrário a padronização dentro de
uma organização celular é o segredo para o atendimento eficiente e eficaz da
variedade de pedidos colocada pelo mercado;
c) Não é a “grande sacada” mas sim o envolvimento de todos da organização com o
aperfeiçoamento contínuo dos processos que leva perfeição.
Sobre estas “fundações” filosóficas duas colunas devem ser erigidas. Uma refere-se às
práticas industriais voltadas à agilização do fluxo de materiais e de trabalho. Esta coluna
é genericamente referida pelo termo JUST-IN-TIME.
JUST-IN-TIME JIDOKA
A hipótese é que com esta construção será possível prover uma proteção ante os ataques
da concorrência. Essa proteção seria o desenvolvimento de vantagens competitivas
Figura 57: a construção Lean (baseado na enunciação original do Sistema Toyota de Produção)
Por seu turno a coluna JIDOKA relaciona-se com o 5S, o CCQ24, ferramentas da
qualidade25, o TPM, o Seis Sigma, os métodos de solução de problemas, o A3, o Kaizen,
os programas de sugestões, a gestão visual, a gestão da performance cotidiana, dentre
outras abordagens, técnicas e práticas conceitualmente relacionadas com a melhoria da
qualidade e envolvimento dos colaboradores com a resposta rápida de problemas.
24
CCQ refere-se aos Círculos de Controle de Qualidade, grupos de colaboradores organizado voluntariamente e
treinado para o desenvolvimento da qualidade e produtividade nas suas organizações.
25
As sete ferramentas da Qualidade: diagramas de Pareto; diagramas de causa-efeito; histogramas; folhas de
verificação; gráficos de dispersão; cartas de controle e fluxogramas.
Os 5Ss
Imagine que três produtos A, B e C semelhantes são fabricados numa célula de trabalho.
Essa célula é alimentada por três outras que fabricam respectivamente componentes
para A, B e C.
Tomemos inicialmente a figura 58 que ilustra a opção em lotes. Nesta hipótese a ideia é
produzir todos os produtos de um tipo (na ilustração o tipo A). Depois de fazer todos os
As aí então a linha seria preparada para outro produto (por exemplo os Bs) e por fim
para os Cs.
Figura 58: A produção em lotes - Adaptado de apostila de aula do prof. Fujita San
Essa estratégia é voltada para a eficiência da linha, deseja-se ao trabalhar com lotes
econômicos minimizar o número de preparações maximizando a utilização do recurso.
Figura 59: A produção nivelada (heijunka) - Adaptado de apostila de aula do prof. Fuijta San
Neste segundo modelo todos os tipos de produtos são feitos simultaneamente na linha
principal. A vantagem é que neste formato podemos atender (e nos adaptar) à
variedade de demanda exigida pelo mercado sem a necessidade de grandes estoques.
Um outro aspecto positivo relaciona-se com a estabilização de todo o processo que passa
a funcionar numa cadência relativamente constante. Observe que na primeira hipótese
quando só o produto A era feito na linha principal apenas a sub-linha que fabricava
componentes para A era solicitada. Já no modelo Heijunka todas as linhas trabalham de
forma cadenciada tornando simples o dimensionamento e a gestão dos recursos ao longo
da cadeia de suprimento.
Um exemplo numérico
Considere que uma célula fabrica três produtos similares: X, Y e Z. E que a área
Comercial fez a seguinte previsão para o mês: vender 4.800 Xs, 2.400 Ys e 1.200 Zs
conforme ilustra a figura 60.
Imagine que diante desse desafio a gerência de produção optou pelo modelo de produção
em lotes visando proteger a eficiência da célula. Conforme ilustrado na figura 61,
segundo o plano, nos quinze primeiros dias do mês a célula se dedicará a produzir os
4.800 Xs, em seguida a célula será preparada para fazer Y e produzirá os 2.400
referentes a previsão de vendas. Por fim, nos últimos dias do mês fará os produtos Zx.
Com este planejamento a linha só parará três vezes no mês para troca (uma para passar
de X para Y, outra de Y para Z, e um última para voltar a de Z a Y).
Veja: segundo o comercial há uma previsão de vender 4.800 Xs no mês. “No mês” não é
“na primeira quinzena”, não é verdade? Ora, se produzirmos como planejado na figura,
todos os 4.800 Xs nos primeiros quinze dias do mês, cerca 2.400 deles terão que ser
estocados para atender a venda da segunda quinzena.
Adicionalmente se nossa célula está dedicada a fazer Xs (e só Xs) nos quinze primeiros
dias do mês como faremos para atender a demanda de Ys e Zs na primeira quinzena?
Vê? Teremos que ter estoques de Y e de Z também. Em suma, teremos que ter estoques
de tudo.
É certo que não se está aqui defendendo o uso ineficiente da máquina. Apenas
ressaltando que a ineficiência da máquina é mais fácil de perceber que o custo total de
carregar estoques. Com efeito, como já comentamos, em muitas situações industriais, o
custo de armazenar, mover para o armazém, controlar, securitizar, trazer de volta para a
planta, além do risco de perda e obsolescência e do custo econômico do dinheiro parado
podem, quando agregados serem mais nocivos para o resultado que uma perda local de
eficiência. Cabe portanto refletir sobre a pergunta contida na figura 62.
Figura 62: o trade-off entre eficiência no uso do recurso versus custo de carregar estoques
Será mesmo ?
E os CUSTOS relativos a guardar os
Xs feitos na primeira quinzena e
vendidos só ao longo do mês ? E
como atender a venda de Y e Z na
primeira quinzena sem estocar?
Que prazo você pode prometer a um novo cliente que lhe traz uma oportunidade de
negócio? O tempo de fazer um produto? Ou o intervalo de tempo entre acionamentos da
produção desse produto? Veja, se você só produz uma vez por mês uma certa coisa,
caso a oportunidade comercial chegue e você já tenha feito esse produto o tempo de
resposta terá que ser: entrega no outro mês!
Figura 63: o trade-off entre eficiência no uso do recurso versus tempo de resposta ao cliente
Será mesmo?
E se justo após virar a
máquina para Y o cliente
quiser mais um X? Com que
VELOCIDADE responderei?
O impacto na qualidade
Você está produzindo um certo produto e tudo está indo bem. De repente você muda
para um outro produto. O que estava estável se desestabiliza. Vê? O proponente da
produção em lotes tem um bom argumento para defender sua racionalidade quando o
critério de análise é a Qualidade do produto.
Mas será mesmo? Vamos pensar por outro ponto de vista. Você está produzindo um
certo produto e tudo está indo mal. Você está fazendo um lote deles, não percebe o erro,
quando acaba e o envia para seu cliente, o erro é finalmente percebido. Se o lote é
grande são menos os pontos de controle, há uma boa chance dos erros se propagarem.
Já se o lote é pequeno e a liberação de faz amiúde, logo o erro será percebido (na pior
das hipóteses pelo cliente do processo) e poderá ser sanado antes que se propague.
Há uma expressão inglesa que diz: quanto menor o “set-up”, melhor o “set-up”, pois
nenhum tempo de preparação chega a ser pequeno sem que um trabalho engenheirado
tenha sido feito para isso. Quando o tempo de preparação é pequeno é porque
provavelmente todas as atividades de organização foram transferidas para fora do ciclo,
passando a ser feitas de véspera. E no “set-up” em si restou apenas aquilo que pelo
menos aparentemente é impossível fazer por antecipação. Há portanto muito menos
chance para o azar. Reflita sobre a pergunta contida na figura 64.
Figura 64: o trade-off entre eficiência no uso do recurso versus qualidade do produto ou serviço
Será mesmo?
E se ao fim da produção do
grande lote de X for
descoberto um problema de
QUALIDADE?
O impacto na flexibilidade
O plano que o comercial passou para a produção era uma previsão, não era pedido firme.
Suponha que neste mês em questão o comercial tenha feito uma boa previsão. De fato
ele vendeu exatamente os 7.400 produtos que havia previsto. Um único detalhe apenas:
uma pequena oscilação no mix, serão só 4.700 Xs mas em compensação foram vendidos
1300 Zs. Essa informação nos chega no dia 20 do mês.
Veja, dois problemas pela frente, não é? Primeiro: no afã de garantir o bom
aproveitamento da máquina fizemos logo um lote de 4.800 Xs na primeira quinzena. E
agora vamos ficar com 100 deles parados em estoque.
E pior, o problema mais grave: não haverá capacidade para fazer os 1.300 Zs pois
consumimos a capacidade disponível fazendo o produto errado e agora não temos
máquina para fazer o produto certo.
Quem vai explicar isso para o comercial? Como assim não dá para fazer? Você não
concordou que podíamos vender 7.400 no mês? Você não sabe usar a sua capacidade!
É, acho que cabe a sua reflexão sobre a figura 65.
Figura 65: o trade-off entre eficiência no uso do recurso versus flexibilidade de mix
Será mesmo?
E se a previsão de vendas não se
confirmar ? Se eu descobrir na
última semana que vou precisar
só de 4700 X e 1300 Z? Qual a
minha FLEXILIDADE?
Pode ser. Pelo menos isso é o que está firmemente fundeado nas nossas cabeças
ocidentais. Mas veja, se faço X, Y e Z e depois X, Y e Z e depois X, Y e Z e assim por
diante, este não é também um trabalho repetitivo especializado?
Não há dúvida que fazer X, Y e Z deve ser mais difícil que fazer só X. Se pensarmos na
curva de aprendizado fazendo só X chego rapidamente na maturidade Se faço um
conjunto maior de tarefas, ainda que de forma repetitiva, demoro mais a alcançar a
maturidade. Mas aí é que está o ponto. Demoro a alcançar mas quando alcanço o
patamar de estabilidade fico por lá. Já se me dedico só a X na primeira quinzena, Y
depois por um semana, depois Z, volto a fazer X só no mês que vem é provável que
quando eu volte a fazer X tenha que subir de novo a curva de aprendizado. A figura 66
ilustra essa reflexão.
CICLO DE APRENDIZAGEM
Produção em Lotes
QT
TEMPO
Aprendizado
Aprendizado
Declínio
Declínio
Maturidade
Maturidade
O nivelamento da produção
Vamos admitir que você decidiu trabalhar de forma nivelada. Como então comandar a
produção?
Para que isso seja possível esteja consciente entretanto que algumas questões precisam
ser trabalhadas. Por exemplo, uma variedade de coisas feitas em pequenos lotes exige
tempos de preparação bem reduzidos. Portanto você tem que ter a redução destes
tempos como uma questão central.
Por fim, considere que mesmo que haja um “set-up” significativo irremovível nas
condições presentes, criar uma inclinação no sentido de diminuí-lo pode lhe trazer
benefícios. Mesmo que não seja possível a condição ideal, qualquer redução de “set-up”
já permite que você reduza um pouco seus lotes, aumente um pouco a frequência de
produção e obtenha, por consequência, ao menos um pouco dos ganhos mencionados
neste texto.
REFERÊNCIAS
A seguir listamos alguns autores, trabalhos e instituições, citados nestes textos, que
deram (e seguem dando) relevantes contribuições para o desenvolvimento das modernas
tecnologias de gestão da produção.