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Arlequim e Colombina - a peça se passa numa carroça... Tudo indica que será uma
apresentação de atores da Comédia Dell’Art, e é. Só que os bastidores mostram a relação
pessoal entre o ator e a atriz, eles são tão amigos que ao longo do tempo o ator se descobre
apaixonado pela atriz, que o tem como um irmão, e isso se transforma numa relação de
amor e ódio. Eu quero que mostre mais as apresentações para o público, e como essas
apresentações vão mudando ao longo dessa relação, até que chega o clímax do espetáculo.
O momento em que o ator mata a atriz em cena. Na verdade é um drama dentro da
Comédia Dell Art.
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ARLEQUIM E COLOMBINA
CENA 1
ARLEQUIM - Ainda é mais bela enquanto adormecida! Ó bela minha! Se soubesses o que
esconde meu coração... Poderia lhe contar agora já que não pode me ouvir!(abre os braços).
Ah! Eu te amo! Vida de minha vida! Amor...É isso que sinto! Por que não adivinhas? Sim!
Adivinhas minha bela Colombina! Não posso imaginar uma vida na eternidade sem você a
meu lado...(ela vai acordando/ esfrega as mãos nos olhos/ vê Arlequim). Ah...Acordou
enfim!(aborrecido). Precisamos ensaiar e você só pensa em dormir! Faça o favor!
COLOMBINA - Do que estava falando? Pude ouvir sua voz...Pensei que estava sonhando.
COLOMBINA (levanta e começa a vestir uma roupa enquanto Arlequim fica de costas) – E
você? Não dorme nunca?
ARLEQUIM - Vamos com isso, temos espetáculo esta noite e esta é a primeira cidade onde
conseguiremos um dinheiro a mais.
Música
De uma bolsinha, Colombina começa a jogar confete por toda parte e Arlequim pára
extasiado a olha-la.
COLOMBINA - Arlequim! Hei! O ensaio! No que pensa homem? Olhe, se não te amasse
como a um irmão já teria ido para outra companhia.
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ARLEQUIM - Irmão?
ARLEQUIM (dirigindo-se a platéia) – Festa! Carnaval! Dancem! Eis a hora em que o povo
manifesta suas amarguras por trás de suas máscaras.(pega uma máscara de pierrô). Que
poderia ser como uma dessas...(triste).
ARLEQUIM - Ora! Assim não será possível! A noite se aproxima e você diz que se
lembra de alguém por causa de uma máscara? Pelo cavalo de tróia! Haja paciência!
COLOMBINA - Você!
ARLEQUIM - Eu?
ARLEQUIM - E zombas disso!(dirige-se à platéia) Todo aquele que ama está à mercê de
zombarias e é ridicularizado. E amar pode ser uma sentença de morte. Estaremos
condenados?
COLOMBINA (pega uns adereços em forma de borboletas) – Eu sonhei que viajava nas
asas de uma borboleta. E eu voava e voava... No silêncio.(olha fixamente para o movimento
que faz com os adereços). Sabia que lá em cima só tem silêncio? O silêncio dos ventos que
não venta; do mar sem ondas. Sabia que lá do alto o mar não tem ondas e que a praia não
tem areia? Tudo é água... Mar é calmaria. De repente...
ARLEQUIM - Me diga uma coisa: em que momento você acorda pra gente continuar o
ensaio?
COLOMBINA (aborrecida) – Acabo de acordar. E quer saber do que mais? Não vou
ensaiar. Chega. Todo dia é a mesma coisa. Meia dúzia de gatos pingados pra nos assistir.
ARLEQUIM - Como assim? Isso não importa. Somos artistas e nos apresentaremos para
um ou para um milhão! Quando veio comigo sabia disso.
COLOMBINA - Quando eu vim com você não! Porque eu me uni a uma companhia,
éramos uma companhia de teatro, éramos seis! Mas você foi estragando tudo com esse seu
mau humor e seu ciúme! Sim! Eu ainda quero entender que ciúme besta é esse! Ninguém
mais agüentava as apresentações medíocres que fazíamos por causa do seu mau humor,
sim!
COLOMBINA - Claro... O seu amor impossível, não é?(grita) Eu vou beber água (afasta-
se).
ARLEQUIM (fala consigo mesmo) - Tonta. Você é o meu amor e meu humor, mas às vezes
é meu ódio e meu desamor.(Colombina volta).
Música.
ARLEQUIM - Sim, senhores! Senhoras! É festa onde todos podem soltar seus demônios!
COLOMBINA (indignada) - Espera aí... Isso não está no texto. Não esta palavra.
ARLEQUIM - Você disse bem: uma palavra. Que mal faz uma palavra no meio das outras?
Demônio...Que é que tem? Não me irrite Colombina!
Música.
ARLEQUIM (levanta-se aos pulos/ salta/ brinca com bolas e petecas) – Ele não pense em
matar ou morrer. É carnaval!
Olham-se fixamente.
ARLEQUIM - Ela sempre sabe. Você acha que as mulheres sempre sabem tudo.
COLOMBINA - Sabe que não tenho mais para onde ir; meus pais não me receberiam de
volta...Não tenho mais ninguém. Era isso que queria?
ARLEQUIM (andando de um lado para o outro) – Falam de sua beleza pelos quatro cantos.
Por que acha que ainda temos platéia?
Silêncio profundo.
Música suave.
ARLEQUIM - Eu sei.
COLOMBINA - Sabes.
ARLEQUIM - Disseram por lá...naquela cidadezinha infeliz que mataram ele. Era desse
tipo de homem que gosta da mulher dos outros, principalmente se é carnaval.
ARLEQUIM - Sim.
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ARLEQUIM - Quando planejava fugir com ele, não foi? Você ia me trair, me deixar
sozinho!
COLOMBINA - Mentira!
ARLEQUIM - Pois eu digo! (pega uma faca/ olha pra ela/ a faca dança em suas mãos).
Uma faca como esta foi cravada bem no coração dele.
COLOMBINA - Não...(chorosa)
COLOMBINA - Confessa!
COLOMBINA - Eu sou a sua loucura! Ama-me como amaria uma mulher! Quando sempre
te vi como amigo e irmão!
COLOMBINA - O quê?
ARLEQUIM - Que amor possível que nada...Deitaria-se com ele! Isso é coisa de mulher da
vida! Essa sua pose de santa me cansa!
COLOMBINA - Me liberta.
ARLEQUIM - Nunca.
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COLOMBINA - Seu amor não serve pra mim e nem pra você.
COLOMBINA - Tente me impedir! (vai de encontro a Arlequim que lhe segura e a faca
entra em seu corpo/ Colombina cai). Colombina... O que fez?(nervoso) Levanta! Isso é uma
ordem! (agacha-se/ a segura em seus braços). Fala... Fala suas asneiras, fala.
COLOMBINA (morrendo) - Morro pela mesma arma que mataste meu amor.
Silêncio profundo.
ARLEQUIM - Senhoras e senhores! Venham todos! (chora) O espetáculo não pode parar!
(abre os braços).
Música.
FIM
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