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MODELAGEM COMPUTACIONAL DE TRANSIENTES HIDRÁULICOS EM

SISTEMAS DE RECALQUE

Rodrigo Magalhães Neiva Santos1 Marco Aurélio Holanda de Castro2

Resumo - Neste trabalho desenvolveu-se um programa computacional para a análise do Golpe de


Aríete em adutoras, utilizando-se do Método das Características e das equações características de
equipamentos normalmente encontrados nos sistemas hidráulicos. Procurou-se desenvolver um
programa de fácil utilização e que possibilite o usuário visualizar o comportamento das ondas de
sobrepressão e subpressão decorrentes do fenômeno transitório, além de verificar a influência do
reservatório hidropneumático e da válvula de alívio como dispositivos de alívio do golpe de aríete.
Aplicou-se o modelo computacional nos seguintes casos: Estudo dos transientes hidráulicos em um
sistema provocados pelo desligamento do conjunto moto-bomba; Análise da eficiência do
reservatório hidropneumático e da válvula de alívio como mecanismos de atenuação do golpe de
aríete; Análise da influência do momento de inércia das massas girantes do conjunto moto-bomba
no transitório hidráulico. O programa computacional desenvolvido apresentou resultados bastante
satisfatórios na análise do golpe de aríete, possuindo uma interface de fácil utilização e visualização
dos resultados. Esse fato é fundamental para que os projetistas e estudantes compreendam o
comportamento do fenômeno.

Abstract - The main goal of this research is a development of a computer code for the analysis of
the Water Hammer phenomenon in pipelines caused by a failure in the pumping system. This
failure is common in pipelines specially due to cuts in the eletric power supply. The model
developed using the Visual Basic computer language is easy to use and allows the user to visualize
the dynamic waves of over and under pressures in real time. Besides these features, it allows an
input of water hammer relief mechanisms such as air chamber and safety valve. The final part of
this research consists on applying the computer code developed to real pipeline cases which
involved: Water Hammer caused by the failure of the pumping system; Simulation of the
consequences of the introduction of two relief mechanisms: air chamber and safety valve. Analysis
of the influence of the moment of inertia of the rolling masses of the pumps in water hammer
phenomenon.

Palavras-chave: Modelagem; Golpe de Aríete

1
Universidade Federal do Ceará; Depto de Engenharia Hidráulica e Ambiental; Campus do PICI Bloco 713,
CEP:60000-00; Fortaleza; CE; Brasil; Telefone: (85) 2889623; Fax (85) 2889627; e-mail: neivarodrigo@hotmail.com

2
Universidade Federal do Ceará; Depto de Engenharia Hidráulica e Ambiental; Campus do PICI Bloco 713,
CEP:60000-00; Fortaleza; CE; Brasil; Telefone: (85) 2889623; Fax (85) 2889627; e-mail: marco@ufc.br
INTRODUÇÃO

Os sistemas hidráulicos, constituídos de tubulação com água sob pressão, podem sofrer
alterações nas condições de escoamento caracterizadas pela variação de pressão e de velocidade de
escoamento do fluido em função do tempo, ocasionando regimes variados.
Chama-se transiente ou transitório hidráulico, o regime variado que ocorre durante a
passagem de um regime permanente para outro regime permanente. Assim, qualquer alteração no
movimento ou paralisação eventual de um elemento do sistema dão origem aos chamados
fenômenos transitórios. Após a ocorrência da perturbação, como o desligamento de uma bomba, o
regime permanente presente antes da perturbação é alterado, dando origem a um regime não
permanente que posteriormente passará a um novo estado de permanência.
Durante o transitório hidráulico, as oscilações de pressão ao longo da canalização ocorrem de
maneira brusca, provocando ruídos que se assemelham a pancadas. Por isso, o transitório hidráulico
também é comumente denominado de Golpe de Aríete.
As sobrepressões e subpressões que ocorrem durante o transitório hidráulico podem causar
sérios problemas à tubulação e seus equipamentos, se estes não forem dimensionados para suportar
tais sobrecargas, comprometendo a segurança e o funcionamento do sistema. Desse modo, a
quantificação das pressões máximas e mínimas é de fundamental interesse para o projetista, a fim
de que este possa dimensionar a tubulação e introduzir equipamentos protetores, cuja finalidade é
amortecer as variações de carga, prejudiciais à vida útil da instalação.
A análise do Golpe de Aríete nos sistemas hidráulicos é baseada na equação da continuidade e
na equação da quantidade de movimento. Essas duas equações formam um sistema de equações
diferenciais cuja solução exata não está disponível, sendo necessário utilizar técnicas específicas
para se determinar uma solução aproximada do problema. Desse modo, foram criados diferentes
métodos gráficos e analíticos, baseados em diferentes suposições restritivas. Esses métodos, até
pouco tempo os únicos disponíveis, são pouco precisos e difíceis de serem aplicados a sistemas
complexos.
Apesar dos fenômenos transitórios serem conhecidos desde o início do século, foi somente
recentemente, com o surgimento e aperfeiçoamento dos computadores digitais, que estes fenômenos
puderam ser estudados mais detalhadamente, sem a necessidade de simplificações grosseiras.
Sendo, hoje em dia, ferramenta indispensável no dimensionamento de sistemas hidráulicos.
O estudo do Golpe de Aríete requer o conhecimento das condições iniciais do regime
permanente e das condições de contorno da instalação, que são os pontos onde ocorrem
descontinuidades das grandezas físicas, como pressão e velocidade de escoamento. Como é um
fenômeno complexo, geralmente é muito pouco discutido nos cursos de graduação, principalmente
devido à falta de divulgação e ensino da metodologia numérica apropriada.
Neste trabalho foi desenvolvido um modelo matemático computacional para a análise do
Golpe de Aríete em sistemas de adução de água, utilizando-se do Método das Características e das
equações características dos equipamentos mais comumente encontrados nos sistemas hidráulicos.
Os objetivos principais do estudo são:
- Simular, usando o modelo computacional desenvolvido, o comportamento das ondas de
pressão resultantes do golpe de aríete em decorrência do desligamento do conjunto moto-bomba;
- Analisar a influência do momento de inércia das massas girantes do conjunto moto-bomba
no transitório hidráulico;
- Verificar o comportamento do sistema após a introdução de mecanismos de atenuação do
golpe de aríete: um reservatório hidropneumático e uma da válvula de alívio localizados na seção da
bomba.

MODELAGEM MATEMÁTICA

Para a análise dos transientes hidráulicos deve-se resolver simultaneamente as equações da


continuidade (2) e da quantidade de movimento (1), equações que fornecem a carga e as vazão
numa determinada posição da tubulação em função do tempo. Essas equações formam um sistema
de equações diferenciais parciais do tipo hiperbólico quasi-linear cuja solução analítica exata não é
disponível, contudo, desprezando ou linearizando os termos não lineares, diversos métodos
gráficos, analíticos e numéricos foram desenvolvidos para se chegar a uma solução aproximada.
Em seguida são apresentadas as equações fundamentais que descrevem o fenômeno
transitório segundo CHAUDHRY (1987):

Equação da Quantidade de Movimento:

∂Q ∂H f
+ gA + QQ =0 (1)
∂t ∂x 2 D A

Equação da Continuidade:

∂H c 2 ∂Q
+ =0 (2)
∂t g A ∂x

Atualmente, diversos métodos numéricos são utilizados para analisar os transientes


hidráulicos. Tais métodos, substituíram os métodos algébricos e gráficos, que devido a sua menor
aproximação “não devem ser utilizados para analise de grandes sistemas ou sistemas tendo
condições de contorno complexas” (MENDONÇA, 1986). Dos vários métodos numéricos
atualmente utilizados destacam-se: o Método das Características, Método das Diferenças Finitas,
Método dos Elementos Finitos, Método Espectral e o Método dos Elementos de Contorno.
Os modelos computacionais possuem a vantagem de permitir a análise de sistemas complexos
de engenharia hidráulica, com maior precisão e um menor intervalo de tempo. Assim, é possível
utilizar um maior número de seções de integração, obtendo, conseqüentemente, um aumento de
precisão no cálculo do transitório.
Dentre os diversos métodos, o método das características tornou-se popular e extensivamente
usado. Para a solução de problemas transientes unidimensionais, o método vem mostrando ser
superior aos outros métodos em muitos aspectos. Segundo CHAUDHRY (1987), o método
apresenta correta simulação da propagação de ondas, é eficiente e de fácil programação. Além
disso, as condições de contorno podem ser as mais diversas.

Método das características

As vantagens do Método das Características decorrem do fato do fenômeno transitório seguir


uma lei de propagação de ondas que associa o tempo t com a abcissa x definida ao longo da
canalização através da celeridade c.
De posse da equação da continuidade (2) e da quantidade de movimento (1), equações
fundamentais que modelam os escoamentos transitórios no interior dos condutos forçados, há de se
resolver tais equações para se determinar a carga H e a vazão Q em uma dada seção x como função
do tempo t.
Como comentado, uma solução explícita para estas equações diferenciais não está disponível.
Para obtermos uma solução explícita, as variáveis dependentes Q e H devem ser expressas como
função de quaisquer valores das variáveis independentes x e t. Através de uma solução numérica, a
solução é obtida para valores discretos de x e t (Figura 1).
As equações (1) e (2) podem ser escritas da seguinte forma:

∂Q ∂H f
L1 = + gA + Q Q =0 (3)
∂t ∂x 2 D A
∂Q ∂H
L2 = c 2 +gA =0 (4)
∂x ∂t

Formando-se uma combinação linear dessas duas equações, de modo que:

L = L1 + λ L2 (5)

Assim:

 ∂Q ∂Q   ∂H 1 ∂H  f
 + λ c2  + λ g A + + Q Q =0 (6)
 ∂t ∂x   ∂t λ ∂x  2 D A

Dois valores distintos, reais e diferentes de zero para o parâmetro λ, formam duas equações
diferenciais ordinárias que exprimem as equações originais em termos de H e Q.
Sabendo que a carga H(x,t) e a vazão Q(x,t) são funções da posição x e do tempo t, e
impondo-se uma dependência entre x e t de forma que o parâmetro λ seja dado por:

1
λ=±
c

A equação (6) pode ser expressa por:

dQ dH f
L= +λ g A + Q Q =0
dt dt 2 D A

Assim, a equação acima pode ser escrita, para cada valor escolhido de λ, como:

dQ g A dH f
L*1 = + + Q Q =0 (7)
dt c dt 2 D A

dx
se =c (8)
dt

dQ g A dH f
L*2 = − + Q Q =0 (9)
dt c dt 2 D A

dx
se = −c (10)
dt

Como resultado do Método das Características, foram obtidas as quadro equações diferenciais
ordinárias acima. Já que nenhuma aproximação matemática foi feita durante a transformação das
equações diferenciais parciais originais, essas equações representam o fenômeno hidráulico de
maneira similar as equações (3) e (4), diferenciando-se somente pelo fato de serem válidas apenas
se as equações (8) e (10) forem satisfeitas.
Na realidade, segundo RIGHETTO (1972), as equações (7) e (9) são as mesmas equações
fundamentais, estando a primeira associada com a equação (8) e a segunda associada com a equação
(10).
As equações (8) e (10) representam no plano (x,t) duas linhas retas com declividades ± 1/c,
como se pode observar pela Figura 1. Essas linhas retas são chamadas de linhas características, daí
o nome Método das Características. A reta de inclinação + 1/c é chamada característica positiva e a
reta de inclinação – 1/c é a característica negativa, sendo convenientemente chamada de C+ e C-
respectivamente.
Desta forma, discretizando-se o domínio ∆x e o tempo ∆t em intervalos, uma solução
numérica pode ser obtida.

t O+3 t

t O+2 t P

C+ C-

t O+ t M J
R C S

x x
tO
i-1 i i+1
x

Figura 1 – Linhas Características no plano (x,t)

Convergência e estabilidade

Para se obter uma solução numérica satisfatória para as equações diferenciais parciais, as
aproximações por diferenças finitas devem satisfazer certas condições de convergência e
estabilidade.
Uma solução exata para as equações diferenciais é impossível de ser obtida quando se utiliza
métodos numéricos, já que é finito o número de casas decimais em qualquer computador que se
utilize. Entretanto, uma solução bastante próxima da realidade pode ser obtida quando se utiliza um
esquema de diferenças finitas dito convergente, ou seja, quando se faz tender para zero as
dimensões da malha definidas por ∆x e ∆t.
Ao se reduzir o tamanho da malha, deve-se ter o cuidado de não perder o ganho obtido com a
diminuição do intervalo de discretização com um aumento excessivo do número de operações
aritméticas, e consequentemente, de um aumento do erro computacional embutido nos
truncamentos e arredondamentos do cálculo do transiente.
Segundo CHAUDHRY (1987), um esquema de diferenças finitas é instável quando o erro
acumulado cresce à medida que a solução progride e que, para se obter convergência e estabilidade,
deve-se atender a uma relação entre os intervalos ∆x e ∆t.
Ainda segundo esse autor, critérios para determinação da convergência e estabilidade são
muito difíceis de serem obtidos, contudo, critérios podem ser obtidos linearizando ou
negligenciando os termos não lineares. A adoção de tal critério, segundo esse autor, não acarreta
problemas pois os termos não lineares são relativamente pequenos.
De acordo com LESSA (1984) e CHAUDHRY (1987), para que método das características
seja estável, a seguinte inequação, conhecida como condição de estabilidade de COURANT-
FRIEDRICH-LEWY, deve ser satisfeita:
∆x
≥c (11)
∆t

Geometricamente, esta condição exige que as linhas características positiva e negativa, que
passam por P, interceptem a linha MJ entre MD (R) e JD (S), respectivamente.
CHAUDHRY (1987), STREETER (1978), ALMEIDA (1981) e KOELLE (1983) mostram
que soluções mais acuradas são obtidas quando se faz:

∆x
=c (12)
∆t

Segundo CHAUDHRY (1987) e STREETER e WYLIE (1978), para os casos em que tal
condição não for satisfeita, os valores em R e S podem ser obtidos com a utilização de um processo
de interpolação numérica através das condições conhecidas em M, D e J. Contudo, ainda segundo
os autores, tal procedimento pode provocar a atenuação dos picos transientes e dispersão numérica.

Incremento de tempo para sistemas de dois ou mais tubos

Quando se tem dois ou mais diferentes condutos em um mesmo sistema, é necessário que se
utilize o mesmo incremento de tempo ∆t para todos os condutos. Com isso pode-se utilizar as
condições de contorno nas junções e determinar as incógnitas para um dado instante.
Deve-se então escolher cuidadosamente o incremento de tempo ∆t e o número inteiro de
divisões N de cada canalização. De modo a obedecer a condição de COURANT deve-se ter:

Li
∆t =
ci N i

onde Ni é o número de trechos do conduto i; Li e ci o comprimento e a celeridade da onda no


conduto i.
De acordo com LESSA (1984), para sistemas que possuem condutos de comprimentos
diferentes, um pequeno ajuste na celeridade de propagação de onda, para se garantir a condição da
equação (12), tem produzido resultados bastante satisfatórios. Estes ajustes são aceitáveis já que a
celeridade de propagação das perturbações não é precisamente conhecida.

CONDIÇÕES DE CONTORNO

Um sistema hidráulico complexo é dividido em trechos contínuos os quais são interligados


pelas condições de contorno em cada extremidade. Nas seções desses trechos contínuos, chamadas
seções internas, as funções que relacionam as diversas grandezas não possuem descontinuidades,
sendo seu comportamento descrito pelas equações (7) e (9). Porém, como explicitado
anteriormente, nos contornos apenas uma equação característica é possível de ser utilizada, assim,
uma ou mais equações relacionando Q e/ou H com o tempo devem ser fornecidas para solucionar o
problema.
As equações características positiva (7) e negativa (9) são válidas apenas para as seções
internas do conduto. Portando, para as seções de montante e jusante do tubo, onde apenas uma
equação característica é possível de ser utilizada, uma ou mais equações relacionando Q e/ou H com
o tempo devem ser fornecidas para solucionar o problema. Tal ou tais equações são denominadas
Condições de Contorno ou de Fronteira. Essas condições devem ser expressas por relações
matemáticas que representem, da maneira mais realística possível, o escoamento nessas seções
durante o transiente hidráulico. Assim, qualquer equipamento, acessório ou mudança nas
características existentes são condições de contorno potenciais, devendo ser usadas em conjunto
com a equação característica respectiva para se determinar o transiente hidráulico.
O programa desenvolvido utiliza alguns contornos usualmente encontrados nos sistemas
hidráulicos, como: conjunto moto-bomba, reservatório à montante e à jusante com nível constante,
reservatório hidropnemático, válvula e retenção basculante, junção de dois trechos com
características diferentes e válvula de alívio. O equacionamento desses contornos não são aqui
apresentados devido à extensa formulação matemática envolvida, sendo feito apenas algumas
considerações com relação ao conjunto moto-bomba por acreditarmos ser este um dos dispositivos
mais importantes numa instalação de recalque e que envolve uma formulação mais apurada.

Conjunto moto bomba (sucção curta)

Para se incluir a bomba em um modelo matemático, deve-se obter uma relação entre a vazão
Q e diferença de carga H (carga na saída da bomba menos a carga na entrada da bomba). Como a
vazão Q de uma bomba centrífuga é função da velocidade de rotação N, do torque T e da carga de
bombeamento H, essas quatro variáveis devem ser especificadas para uma correta representação
matemática. Usualmente os fabricantes fornecem a relação entre tais variáveis na forma de curvas,
chamadas de curvas características das bombas.
Segundo CHAUDHRY (1987), quando se deseja estudar os fenômenos transitórios, pouca ou
nenhuma informação está disponível sobre o comportamento dinâmico das bombas. Assim, dados
obtidos de testes em regime permanente (situação normal de bombeamento) são utilizados para a
análise do transiente, mesmo que sua validade não esteja demonstrada. Tentando solucionar esse
problema, BROWN & ROGERS (1980) desenvolveram curvas características completas para
diversos valores de rotação específica Ns = 20,5; 22,1; 24,6; 37,5; 85,2; 147 e 261, as quais foram
usadas no modelo matemático desenvolvido. A rotação específica de uma bomba é definida em
função das condições de máximo rendimento.
Nos casos em que as curvas características completas das bombas não estão disponíveis,
CHAUDHRY (1987) recomenda o uso da característica de uma bomba que tenha rotação específica
próxima àquela em estudo, para uma análise aproximada. Tal procedimento tem sido aplicado com
sucesso e encontra apoio teórico na semelhança dinâmica existente entre duas máquinas hidráulicas
(MARTIN, 1982).
Utilizando-se a metodologia descrita por CHAUDHRY (1987) podemos obter duas equações
algébricas não-lineares com duas incógnitas que relacionam a carga com a vazão. STREETER
(1978) e CHAUDHRY (1987) sugerem o método de NEWTON-RAPHSON como o mais adequado
para a solução do sistema de equações. Segundo AL-KHAFAJI (1986) esse método é
particularmente conveniente quando se conhece aproximadamente o valor da raiz. Assim,
inicialmente estima-se uma solução e, por meios de interações sucessivas, essa solução é refinada
até que se atinja uma aproximação desejada.
Para se evitar um número excessivo de interações, em caso de divergência da solução, um
contador deve ser usado para interromper o procedimento computacional de acordo com um valor
pré-estabelecido. No caso em estudo, permitiu-se que o modelo computacional executasse 30
interações.

RESULTADOS DAS SIMULAÇÕES

As simulações foram feitas com o objetivo de se verificar o comportamento do modelo


computacional no cálculo do transitório hidráulico após a interrupção do funcionamento da bomba,
bem como analisar a influência de alguns equipamentos e acessórios, principalmente com relação
ao conjunto moto-bomba, já que este é, decididamente, o equipamento mais importante no sistema
de recalque e o que mais influencia no cálculo do Golpe de Aríete.
Como forma de validar o modelo computacional desenvolvido, os resultados obtidos foram
comparados com simulações realizadas utilizando-se um software comercial de reconhecida
precisão e performance, denominado Ctran, o qual também utiliza o método das características para
solução das equações que modelam o transiente hidráulico.
As simulações foram realizadas utilizando os dados referentes ao Sistema de Abastecimento
de Água de Paraguaçu-BA. Foram estudadas cinco linhas de recalque compreendendo as adutoras
de abastecimento provenientes das estações elevatórias de maior porte dentro do sistema, as quais
compreenderam:

Tabela 1 – Linhas de recalque utilizadas nas simulações


Linhas de Recalque Extensão
Caso Elevatória Lançamento (m)
1 EE-1* RA** 3.900
2 EE-3 EE-4 24.660
3 EE-4 EE-5 8.060
4 EE-5 EE-6 1.580
5 EE-6 EE-7 2.520
* Estação elevatória EE-1 ** Reservatório Apoiado

Os transientes hidráulicos nas linhas de recalque foram avaliados para o caso de parada do
bombeamento nas estações elevatórias, com o objetivo de analisar o comportamento do conjunto
moto-bomba, válvula de retenção e efeito de volantes. Considerou-se inicialmente que os sistemas
estariam funcionando sem qualquer equipamento de proteção contra o golpe de aríete. Essa
condição constitui-se na mais crítica de funcionamento do sistema, quando são provocadas as
maiores sobrepressões e subpressões nas linhas de recalque.
Após essa análise, procedeu-se à avaliação dos transientes considerando a presença de um
reservatório hidropneumático, localizado na seção da bomba, perfazendo assim um único contorno
para a seção. Em seguida, a mesma metodologia foi adotada considerando-se a presença de uma
válvula de alívio no lugar do reservatório hidropneumático, comparando-se os resultados.
Os dados gerais empregados na análise dos transientes hidráulicos das linhas de recalque do
sistema de Paraguaçú foram fornecidos de projeto.
Os valores da celeridade de propagação da onda foram calculados com base na metodologia
descrita por CHAUDHRY (1987) para cada tipo e classe de tubo. Assim, diferentes condutos de um
mesmo sistema apresentaram diferentes valores para a celeridade de onda.
Utilizou-se, para todos os cinco casos estudados, um intervalo de tempo computacional de ∆t
= 0,05 segundos, observando-se as recomendações descritas anteriormente.
Os momentos de inércia dos conjuntos moto-bomba foram obtidos com base em informações
de catálogo de fabricantes (WORTHINGTON e KSB).
Utilizou-se a simulação realizada no trecho entre a estação elevatória EE-4 e EE-5 (Caso 3)
para visualizar a oscilação da Carga Piezométrica no interior da tubulação e verificar seu
comportamento com o tempo (Figura 2). A seção escolhida do trecho foi a da extremidade de
montante, seção onde localiza-se o conjunto moto-bomba.
750
730
710

Cota Piezométrica (m)


690
670
650
630
610
590
570
550
0 50 100 150 200 250
Tempo (s)

Figura 2 - Oscilação da Carga Piezométrica – Trecho EE-4 a EE-5 (Seção da Bomba)

Pela Figura 2 pode-se observar a ocorrência do transitório hidráulico após a parada do


bombeamento. Observa-se que a variação da pressão na tubulação sofre um decréscimo a medida
que aumenta o tempo de observação do fenômeno, tendendo a zero num tempo mais distante. Como
comentado, isso deve-se ao fato da existência da perda de carga na tubulação e da inelasticidade das
paredes do conduto, fato que amortece as ondas de sobrepressão e subpressão.
Ainda na Figura 2, visualiza-se duas fases distintas da variação da pressão, fase de depressão
máxima e fase de oscilação. Na fase de depressão máxima, que ocorre logo após a parada do
bombeamento, observa-se pequenas flutuações as quais são atribuídas a oscilação da válvula de
retenção.
Objetivando facilitar e homogeneizar a apresentação dos cálculos relativos à análise do golpe
de aríete nas diversas adutoras do sistema, escolheu-se apresentar o comportamento da carga
piezométrica na forma de Envoltórias de Sobrepressões e Subpressões. Essas envoltórias fornecem
as sobrepressões e subpressões máximas ao longo de toda a tubulação, sendo apresentadas em
forma gráfica, o que permite ao analista interpretar seus resultados através de uma simples inspeção
visual, e compara-los com os resultados do programa Ctran. Logo em seguida são apresentadas as
características dos trechos e os resultados da simulações comparados com o Ctran.

Tabela 2 – Características das Elevatórias do Sistema


EQUIPAMENTOS DE BOMBEAMENTO
EE Lançamento Vazão Pot. M.
Vazão Equip. em Alt. Man. Modelo Bomba Efic.
Unitária Adotada Inércia
Total (l/s) Operação (m) /RPM (%)
(l/s) (CV) (Kg.m2)
5UNB-
EE -1 RAP 2.000 178,00 2,00 89,00 145,00 70,00 2 x 500 1,200
13/3.550RPM
EE - 3 EE-4 28,92 1,00 28,92 120,00 70,00 1 x 75 0,583

EE - 4 EE-5 20,91 1,00 20,91 123,00 KSB 65,00 1 x75 0,583


MEGANORM
EE - 5 EE-6 20,91 1,00 20,91 123,00 65-250/3.500RPM 65,00 1 x75 0,583

EE - 6 EE-7 20,91 1,00 20,91 123,00 65,00 1 x75 0,583

Tabela 3 – Momento de Inércia por Conjunto moto-bomba


Momento de Inércia por conjunto
Motor Bomba Total
Modelo
(Kg.m2) (Kg.m2) (Kg.m2)
WORTHINGTON: 5UNB-
0,525 0,075 0,6000
13/3.550RPM
KSB MEGANORM: 65-
0,5272 0,0558 0,5830
250/3.500RPM

Tabela 4 – Resultados em Comparação com o Ctran


Erro Máximo em
Estação Elevatória
Relação ao Ctran
EE-1 a Reservatório Apoiado 5,0 %
EE –3 a EE-4 2,0 %
EE –4 a EE-5 3,5 %
EE –5 a EE-6 1,4 %
EE –6 a EE-7 2,7 %

420

370
Cota Piezométrica (m)

320

270

220

170

120
0 500 1000 1500 2000 2500 3000 3500 4000

Comprimento da Adutora (m)

Terreno Natural Envoltória Máxima - Modelo Envoltória Mínima - Modelo


Envoltória Máxima - Ctran Envoltória Mínima - Ctran Linha Piezométrica Inicial

Figura 3 – Envoltórias Trecho EE-1 RA Sistema sem proteção


700

650

Cota Piezométrica (m)


600

550

500

450
0 5000 10000 15000 20000 25000

Comprimento da Adutora (m)

Terreno Natural Envoltória Máxima - Modelo Envoltória Mínima - Modelo


Envoltória Máxima - Ctran Envoltória Mínima - Ctran Linha Piezométrica Inicial

Figura 4 – Envoltórias Trecho EE-3 a EE-4 Sistema sem proteção

750

700
Cota Piezométrica (m)

650

600

550

500

450
0 1000 2000 3000 4000 5000 6000 7000 8000
Comprimento da Adutora (m)

Terreno Natural Envoltória Máxima - Modelo Envoltória Mínima - Modelo


Envoltória Máxima - Ctran Envoltória Mínima - Ctran Linha Piezométrica Inicial

Figura 5 – Envoltórias Trecho EE-4 a EE-5 Sistema sem proteção


900

850

Cota Piezométrica (m)


800

750

700

650

600
0 200 400 600 800 1000 1200 1400 1600 1800

Comprimento da Adutora (m)


Terreno Natural Envoltória Máxima - Modelo Envoltória Mínima - Modelo
Envoltória Máxima - Ctran Envoltória Mínima - Ctran Linha Piezométrica Inicial

Figura 6 – Envoltórias Trecho EE-5 a EE-6 Sistema sem proteção

1000

950
Cota Piezométrica (m)

900

850

800

750
0 500 1000 1500 2000 2500
Comprimento da Adutora (m)

Terreno Natural Envoltória Máxima - Modelo Envoltória Mínima - Modelo


Envoltória Máxima - Ctran Envoltória Mínima - Ctran Linha Piezométrica Inicial

Figura 7 – Envoltórias Trecho EE-6 a EE-7 Sistema sem proteção

Em seguida utilizou-se o trecho entre a estação elevatória EE-5 e a estação elevatória EE-6
para analisar o comportamento das sobrepressões e subpressões, devido ao desligamento da bomba,
para o caso da presença de um reservatório hidropneumático ou de uma válvula de alívio na seção
da bomba.
O dimensionamento e a escolha dos parâmetros característicos dos acessórios foi feita com
base em algumas simulações, onde variou-se os valores inicialmente adotados até se atingir os
resultados esperados.
Em seguida são apresentados os dados dos acessórios utilizados na análise do modelo
computacional:

Reservatório Hidropneumático:
- Área do Reservatório Hidropneumático = 0,8 m2
- Altura do Reservatório Hidropneumático = 1,5 m
- Porcentagem de Ar no Reservatório Hidropneumático = 40%

Válvula de Alívio:
- Coeficiente de Dascarga = 0,6
- Área do Orifício = 1,8 cm2
- Sobrepressão de Regulagem da Válvula = 160 mca
A Figura 8 mostra as envoltórias de pressão máximas e mínimas sem a presença de
dispositivos de alívio do golpe de aríete e com a presença do reservatório hidropneumático e da
válvula de alívio.
850

800

Cota Piezométrica (m)

750

700

650
0 200 400 600 800 1000 1200 1400 1600
Comprimento da Adutora (m)

Terreno Natural Envoltória Máxima - Res. Hidrop. Envoltória Mínima - Res. Hidrop.
Envoltória Máxima - Val. de Alívio Envoltória Mínima - Val. de Alívio Envoltória Máxima - Sem proteção
Envoltória Mínima - Sem proteção Linha Piezométrica Inicial

Figura 8 – Envoltórias Trecho EE-5 a EE-6 Sistema com proteção

Pelas Figuras 9 e 10 pode-se observar a influência do reservatório hidropneumático e da


válvula de alívio no combate as oscilação de pressão na seção na extremidade de montante da
adutora.
850
830
Cota Piezométrica (m)

810
790

770
750

730
710

690
0 10 20 30 40 50 60

Tempo (s)

Reservatório Hidropneumático Sem dispositivo de alívio

Figura 9 – Oscilação de Pressão com Reservatório Hidropneumático


850
830
Cota Piezométrica (m)

810
790
770
750
730
710
690
0 10 20 30 40 50 60
Tempo (s)

Válvula de Alívio Sem dispisitivo de alívio

Figura 10 – Oscilação de Pressão com Válvula de Alívio


Para mostrar a interferência do momento de inércia do conjunto moto-bomba na resposta do
transiente, foram realizadas simulações novamente referentes ao trecho entre a estação elevatória
EE-5 e a estação elevatória EE-6.
As Figuras 11, 12 e 13 representam os resultados do tempo de anulação da vazão, na seção da
bomba, e da cota piezométrica máxima e mínima para 7 diferentes valores de momento de inércia
do conjunto moto-bomba.
Pela Figura 11 verifica-se a significativa influência do momento de inércia sobre o tempo de
anulação da vazão e por conseqüência, sobre a intensidade dos picos de pressão. Pelas Figuras 12 e
13 observa-se que os picos de pressão máxima diminuem e os picos de pressão mínima aumentam a
medida que se incrementa o momento de inércia, mostrando que é possível a utilização de volantes
de inércia como forma de aliviar os efeitos do golpe de aríete.

2,5
Tempo de Anulação da

1,95
2 1,76
1,45
Vazão (s)

1,5
1,20

1
0,63
0,5 0,32
0,06
0
0,010 0,050 0,100 0,300 0,400 0,500 0,583
Momento de Inérica (Kg.m2)

Figura 11 – Tempo de Anulação da vazão


920
Cota Piezométrica Máxima

902
900 893 891

880
864
857
(m)

860 851
844
840

820

800
0,010 0,050 0,100 0,300 0,400 0,500 0,583

Momento de Inércia (Kg.m 2)


Figura 12 – Cota piezométrica máxima

740
Cota Piezométrica Mínima

720 713
706
699
700 692
675
680 666
(m)

659
660

640

620

600
0,010 0,050 0,100 0,300 0,400 0,500 0,583
2
Momento de Inércia (Kg.m )

Figura 12 – Cota piezométrica mínima


CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES

O presente trabalho permitiu retirar as seguintes conclusões:

1. O modelo computacional desenvolvido apresenta resultados bastante satisfatórios na


análise do golpe de aríete, possuindo uma interface de fácil utilização e visualização dos resultados.
Esse fato é fundamental para que os projetistas e estudantes compreendam o comportamento do
fenômeno, sem que simplesmente aceitem os resultados de programas cujo processo interno de
cálculo não se conhece.

2. A análise do golpe de aríete requer o correto conhecimento das condições de contorno dos
equipamentos do sistema, sob pena de não se obterem resultados condizentes com a realidade.

3. As curvas características das bombas possuem grande influência no cálculo do golpe de


aríete. Deve-se, na medida do possível, sempre utilizar dados fornecidos pelos fabricantes. Quando
tais dados não forem fornecidos, deve-se ter o cuidado de utilizar a curva característica de uma
bomba com características similares.

4. A análise da influência do momento de inércia do conjunto moto-bomba no transiente


hidráulico, mostrou sua significativa influência sobre o tempo de anulação da vazão e nos picos de
pressão máxima e mínima. A utilização de volantes nos conjuntos moto-bomba se apresenta como
uma solução simples e eficiente na atenuação do golpe de aríete, sempre que tais dispositivos não
se tornarem antieconômicos.

5. O reservatório hidropneumático apresentou excelentes resultados na atenuação dos picos de


pressão máximas e mínimas resultantes do transitório hidráulico.

6. A válvula de alívio apresentou resultados satisfatórios na diminuição dos picos de pressão


máxima, contudo, não é um dispositivo eficiente para a atenuação de subpressões.

7. Deve-se ter o cuidado de usar nas simulações o diâmetro interno da tubulação, pois o
transitório hidráulico é sensível a quaisquer variações na seção dos condutos.

8. A análise do golpe de aríete não dever ser feita de forma simplista e usual, tal como se
adota ainda na maioria dos estudos envolvendo a comunidade técnica de consultoria, pois essa
metodologia conduz a resultados bastante imprecisos e contrários à segurança da instalação.

Por fim, considerando as limitações do modelo computacional, recomenda-se:

1. Ampliar o número de condições de contorno do modelo computacional, acrescentando


outros dispositivos de alívio do golpe de aríete, como: ventosas e registros de descarga, chaminés de
equilíbrio e tanques de alimentação unidirecionais.

2. Devido a grande importância das características dinâmicas dos equipamentos hidráulicos na


análise dos fenômenos transitórios, recomenda-se maiores estudos sobre suas características com o
objetivo de melhorar os resultados do modelo.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Practice – Holt, Rinehart and Winston, INC., E.U.A. 1986.

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Doutorado, IST, Lisboa, 1981.

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Tests. Jour. Of Mech. Design, Amer. Soc. of Mech. Engineers, vol 102, 1980.

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Company, New York, 2ª edição,1987.

KOELLE, E. – Transientes Hidráulicos em Instalações de Condutos Forçados. Tese de


Livre Docência, EPUSP, São Paulo, 1983.

LESSA, R. C. – Transientes Hidráulicos em Sistemas Complexos de Adução de Água.


Dissertação de Mestrado. EESC/USP, 1984.

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MENDONÇA, Laura Cruz de. - Estudo dos Transientes Hidráulicos em ma Instalação de


Bombeamento. Dissertação de Mestrado. EESC/USP, 1986.

RIGHETTO, Antonio Marozzi. - Considerações sobre o Golpe de Aríete em Instalações


Hidráulicas. Dissertação de Mestrado. EESC/USP, 1972.

STREETER, Victor L., WYLIE, E. Benjamim - Fluid Transients. McGrawHill Editora,


1978.

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