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Capítulo

Infecção do Trato Urinário

25 Reinaldo Martinelli e Heonir Rocha

ASPECTOS GERAIS COMPLICAÇÕES DAS INFECÇÕES DO TRATO URINÁRIO


BACTERIÚRIA SIGNIFICANTE: PROBLEMAS DE Complicações imediatas
NOMENCLATURA EM INFECÇÃO DO TRATO URINÁRIO Complicações supurativas
DIAGNÓSTICO Necrose de papilas renais
Manifestações clínicas Bacteremia
Exames complementares Complicações tardias
Estudos de imagem do aparelho urinário; outros Atrofia do parênquima renal e insuficiência renal crônica
procedimentos diagnósticos Hipertensão arterial
Testes de localização da infecção urinária Litíase urinária
PATOGÊNESE Complicações na gravidez
Agentes etiológicos das ITU Aumento da mortalidade
Fatores de virulência TRATAMENTO DAS INFECÇÕES DO TRATO URINÁRIO
Vias de infecção Padrões de resposta ao tratamento
Mecanismos de defesa do trato urinário e conseqüências Esquemas terapêuticos propostos
da infecção renal Dose única versus dose convencional
MECANISMOS DE AGRESSÃO RENAL Quimioprofilaxia prolongada
SITUAÇÕES CLÍNICAS ESPECIAIS Situações terapêuticas especiais
Infecções recorrentes do trato urinário Dificuldades para erradicação da bacteriúria
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET

tância deste tipo de infecção e justificam a merecida aten-


ASPECTOS GERAIS ção que têm recebido:

Diz-se que existe infecção do trato urinário (ITU) quan- 1) cerca de 5% de pacientes ambulatoriais vistos em hos-
do, além de colonização, microrganismos ali sediados se pital geral apresentam infecção do trato urinário;
multiplicam produzindo ou não manifestações clínicas. 2) as infecções do trato urinário, atualmente, representam
Este conceito engloba não apenas o resultado imediato de o tipo mais comum de infecção hospitalar;
uma infecção, mas também as suas conseqüências, não 3) aproximadamente 30% a 40% das bacteremias por ba-
estando incluídas sob esta designação as infecções sexual- cilos Gram-negativos se originam de infecções do trato
mente transmissíveis que afetam a uretra e a próstata, as- urinário;
sim como a tuberculose do aparelho urinário. 4) infecção do trato urinário pode acelerar a destruição do
As infecções do trato urinário são de elevada prevalên- rim no curso de nefropatia obstrutiva, constituindo-se
cia na prática médica. Alguns fatos demonstram a impor- numa causa significante de estadio final de doença renal;
capítulo 25 491

5) cerca de 20% dos tratamentos com antibacterianos num que justificam um número menor, na vigência da infec-
hospital geral são direcionados ao problema de infec- ção:
ção urinária;
1) uso de antibacterianos no período da urocultura, ou até
6) as infecções do trato urinário são mais comuns na mu-
3 a 4 dias antes da urocultura;
lher grávida e podem causar aumento de abortamento,
2) presença de bactérias com menor poder de replicação
prematuridade e baixo peso;
(Gram-positivos, por exemplo);
7) infecção do trato urinário é causa inconteste de litogê- 3) hiperidratação do doente e colheita de amostra de uri-
nese do trato urinário, com suas conseqüências. De ou- na pouco tempo depois de uma micção (menos de uma
tra parte, urolitíase é fator predisponente de grande
hora da última amostra);
importância para as infecções urinárias;
4) contaminação da urina com detergente utilizado na lim-
8) a associação de pielonefrite à necrose da papila renal no
peza da vagina e região periuretral.
diabético é fato conhecido de há muitos anos. Nestes ca-
sos, existe agravamento do processo e a letalidade é sig- Em situações de uretrite bacteriana inespecífica, uma
nificante; condição diagnosticada mais comumente na mulher (cor-
9) em idosos, tem-se sugerido um aumento de mortalida- respondendo a casos da chamada “síndrome uretral”), o
de em grupo bacteriúrico, quando comparado a outro número de bactérias na urina se situa geralmente entre 102
não-bacteriúrico, não se sabendo ainda como correlaci- e 104 por ml. Estes doentes curam com o tratamento anti-
onar estes achados. bacteriano adequado, dirigido para estas bactérias, geral-
mente enterobactérias. Fala-se, freqüentemente, em infec-
Todos estes dados, já documentados na literatura, atestam
ção do trato urinário sintomática ou assintomática, na depen-
a importância nosológica deste tipo de infecção, que deve ser
dência da existência de sintomas e sinais clínicos acompa-
bem conhecida pelo médico em geral, pela sua alta prevalên- nhando o diagnóstico bacteriológico; aguda ou recorrente,
cia, e pela morbidade e mortalidade que pode trazer. quando se está diante de um caso sintomático inicial (agu-
A epidemiologia das infecções urinárias é bem conhe-
da) ou de outro com surtos repetidos (mais de três surtos
cida: ocorre em, aproximadamente, 1% dos recém-nasci-
no intervalo de um ano) e inequivocamente diagnostica-
dos, sendo mais freqüente, nessa fase, no sexo masculino
do de infecção (recorrente); infecção alta, quando os rins
que no feminino. Após essa fase a infecção urinária é mais
estão envolvidos (pielonefrite), e infecção baixa, quando ela
freqüente no sexo feminino, aumentando a incidência a
se atém à bexiga; infecção complicada, quando existe fator
cada década, com acentuações ao início da atividade sexual obstrutivo (orgânico ou funcional) no trato urinário, e não
e durante a gestação, até alcançar 10% a 15% aos 60-70 anos complicada, quando o trato urinário se apresenta normal à
de idade. Também a bacteriúria assintomática é mais fre-
avaliação clínica rotineira. É importante que se tenha em
qüente no sexo feminino, embora após os 60-65 anos haja
mente não apenas o significado destes termos, mas, e so-
aumento da prevalência no sexo masculino. Aliás, infec-
bretudo, a interação que existe entre eles, o que às vezes
ção urinária e bacteriúria assintomática são infreqüentes
no sexo masculino, na ausência de fatores obstrutivos ou
de instrumentações do trato urinário.
AGUDA
RECORRENTE

BACTERIÚRIA SIGNIFICANTE:
PROBLEMAS DE SINTOMÁTICA
ASSINTOMÁTICA COMPLICADA
NÃO COMPLICADA
NOMENCLATURA EM INFECÇÃO
DO TRATO URINÁRIO
Já é clássico aceitar-se 105 microrganismos/ml de uri-
na como indicativo de infecção do trato urinário. De fato, INFECÇÃO
DO TRATO
a existência deste número de bactérias, quando a urina URINÁRIO
não foi contaminada na sua colheita, indica multiplicação
bacteriana ao nível do trato urinário. Fala-se, neste caso,
de existência de bacteriúria significante. A adoção inflexí-
vel de um limite rígido no número de bactérias na urina
ALTA
para indicar a ausência ou não de infecção é aspecto ques- BAIXA
tionável, que deve ser interpretado levando em conta uma
série de possíveis variáveis em cada caso. Existem situa- Fig. 25.1 Interação das diversas formas clínicas de infecção do
ções que diminuem o número de bactérias na urina ou trato urinário.
492 Infecção do Trato Urinário

dificulta a caracterização mais definitiva do tipo de infec- a criança exibe sinais como dor abdominal, aumento da
ção apresentada pelo doente. A Fig. 25.1 mostra a comple- freqüência de micções porém com pequeno volume uriná-
xa interação destas diversas formas de infecção do trato rio (polaciúria) e mal-estar ao urinar, ou disúria. Nesta fase,
urinário. as infecções urinárias são bem mais freqüentes em meni-
nas. As infecções baixas do trato urinário revelam, freqüen-
temente, disúria, aumento da freqüência de micções, dor
Pontos-chave: ou mal-estar suprapúbico, urgência miccional; às vezes,
• ITU é uma das infecções mais comuns na ocorre dor forte e aguda no final da micção. A urina do
prática, ocorrendo mais freqüentemente no doente se mostra habitualmente turva, às vezes com fila-
sexo feminino que no masculino mentos, e pode ocorrer hematúria terminal. Sem razão cla-
ra, poucos doentes (geralmente do sexo feminino) eviden-
• ITU está associada a elevada morbidade e
ciam hematúria franca transitória, habitualmente com sin-
mortalidade em gestantes, pacientes com tomas e sinais sugestivos de infecção urinária baixa. Nos
processos obstrutivos do trato urinário, casos de infecção aguda do trato urinário alto, o doente
crianças e em idosos manifesta dor lombar uni- ou bilateral (sensação de peso,
• ITU não complicada, embora associada a dor à pressão ou à movimentação, às vezes dor à inspira-
considerável morbidade, na maioria das ção profunda), acompanhada geralmente de febre eleva-
vezes não causa lesão renal da (até 39-40°C) com calafrios. Esta dor é exacerbada à
punho-percussão da região lombar (sinal de Giordano).
Vale assinalar que em pacientes idosos, às vezes, mes-
mo frente a infecções agudas graves, inexistem febre e dor
DIAGNÓSTICO lombar; por outro lado, a freqüência de bacteriúria assin-
tomática neste grupo etário é relativamente elevada. Tam-
O diagnóstico de infecção do trato urinário exige a con-
bém, vale assinalar que muitos doentes com infecção alta
jugação de dados clínicos e laboratoriais. Existem formas
do trato urinário têm, concomitante ou precedente ao sur-
clínicas oligossintomáticas ou assintomáticas que só terão
to, manifestações de disúria, aumento da freqüência das
o diagnóstico se suspeitadas clinicamente em função da
micções, dor ou sensação de peso suprapúbico; outros,
existência de uma associação entre o que o doente apresen-
entretanto, nada evidenciam referente ao trato urinário
ta e uma alta prevalência de ITU. Em recém-nascidos e cri-
baixo.
anças até 2-3 anos de idade, as manifestações clínicas atri-
Em doentes hospitalizados, com outras doenças graves
buíveis ao episódio de infecção do trato urinário pouco ou
associadas, alguns deles cateterizados, pode ocorrer séria
nada têm a ver com o aparelho urinário. Além disso, sin-
infecção do trato urinário e o diagnóstico não ser feito. É
tomatologia que sugere infecção urinária pode ocorrer na
que os sintomas e sinais podem estar camuflados pela
dependência de inúmeros outros fatores, principalmente
importância da doença básica, e, nestes casos, mesmo com
na mulher, tais como colpites, vaginites, uretrites, herpes
múltiplos abscessos de rins, eles não demonstram febre
símplex vaginal, entre outros. Em contrapartida, pode ha-
elevada e, muitas vezes, não têm condições de se queixar.
ver infecção urinária sem piúria associada, particularmente
A suspeita deve ser feita através de valorização da protei-
em crianças. O mais comum, entretanto, é o encontro de
núria (não-nefrótica), piúria e hematúria microscópica não
piúria (mais freqüente em mulheres) sem infecção do tra-
explicadas pela doença básica do paciente.
to urinário. Isto indica que devemos avaliar criteriosamente
sintomas e sinais apresentados pelos doentes e ter o resul-
tado de uma urocultura quantitativa, para firmarmos o Pontos-chave:
diagnóstico definitivo de infecção do trato urinário.
• Na maioria das vezes a ITU se manifesta
por disúria, aumento da freqüência das
Manifestações Clínicas micções, dor ou mal-estar suprapúbico,
É importante destacar que no recém-nascido e na crian-
urgência miccional, sem febre
ça no primeiro ano de vida, estas infecções se manifestam • Ainda que, muitas vezes, as manifestações
por sinais e sintomas inespecíficos para o trato urinário, tais clínicas e o sedimento urinário sejam
como perda de apetite, febre, vômitos e/ou diarréia, irri- sugestivos, o diagnóstico de ITU é feito pela
tabilidade, insônia, perda inexplicada de peso, palidez. Às urocultura
vezes, a mãe observa alteração no ritmo urinário (freqüên- • E. coli e outras enterobactérias são os
cia maior de micções ou retenção urinária) ou no aspecto microrganismos que mais freqüentemente
da urina, que se torna mais turva, com odor “forte” ou causam ITU
“diferente”. Após um ano de idade, com mais freqüência,
capítulo 25 493

Existe um grupo grande de doentes que, apesar da exis- lizado é o teste do nitrito, que se baseia na conversão do
tência de infecção do trato urinário, não apresentam quei- nitrato dietético em nitrito pela enzima nitrato redutase,
xas, ou apenas, quando inquiridos, referem-se a leve disú- produzida pelas enterobacteriáceas e algumas bactérias
ria, polaciúria e/ou noctúria. Estes casos oligossintomáti- Gram-negativas. Embora de alta especificidade, o resul-
cos, assim como os casos assintomáticos, são mais comuns tado negativo não exclui a presença de infecção por serem
em idosos, embora situação semelhante possa ocorrer em necessárias 4 a 6 horas para a bactéria converter nitrato em
crianças e mulheres jovens, mesmo na presença de obstru- nitrito, na urina intravesical, além de não detectar infecções
ção anatômica ou funcional do trato urinário. por Pseudomonas, estafilococos e enterococos. São, ainda,
empregados testes que detectam a presença de piúria,
como o teste para identificação da esterase leucocitária;
Exames Complementares deve ser lembrado que ausência de piúria ocorre em um
O exame sumário de urina é muito importante para a sus- número razoável de pacientes com infecção urinária e pi-
peita diagnóstica de uma infecção do trato urinário. A uri- úria pode estar relacionada a outros processos inflamató-
na deve ser colhida após cuidadosa limpeza da região peri- rios ou a contaminação por fluxo vaginal.
neal, e, de preferência, deve ser examinado nestes casos o Um importante exame, pela simplicidade e pelo nível
jato médio urinário. A presença de piúria (⬎ 8 leucócitos por da informação que dá, é a coloração pelo Gram da urina
campo de grande aumento na mulher, e ⬎ 5 leucócitos nos não centrifugada. Nestes casos, a visualização de bactéri-
homens) sugere inflamação em algum ponto do trato uri- as corresponde a elevado número de bactérias por ml de
nário. Muito mais precisa e significante é a contagem de leu- urina (a visualização de 1 ou mais bactérias em campo de
cócitos por ml de urina. Acima de 8.000 leucócitos por ml aumento 1.000 ⫻ [imersão] em amostra não centrifugada
de urina não centrifugada considera-se anormal. Este é o de urina ou > 5 bactérias em amostra centrifugada corres-
método preferencial para definição de piúria. Não esquecer ponde a número igual ou superior a 105 unidades forma-
que, apesar dos cuidados, o fluxo vaginal de mulheres pode doras de colônias/ml), indicando a existência de infecção
contaminar a urina colhida e resultar disso alguma piúria; (Quadro 25.1). Além disso, informa se se trata de coco ou
no homem, inflamação uretral também é uma causa comum bastonete, Gram-negativo ou positivo. Este é um exame
de piúria, sem bacteriúria associada. Não nos devemos es- pouco realizado na prática, que poderá ser de grande aju-
quecer de que piúria tem sido relatada em cerca de 20% de da mesmo em locais que não disponham de meios para a
pacientes sem haver infecção urinária; de outra parte, infec- realização de uma urocultura. Urocultura quantitativa é o
ção urinária tem sido comprovada em, aproximadamente, exame mais importante para o diagnóstico de uma infec-
30% de casos, sem haver piúria concomitante, sendo esta ção urinária porque não apenas indica a ocorrência de
última situação mais encontradiça em crianças. O encontro multiplicação bacteriana no trato urinário, mas permite o
de cilindros leucocitários, presentes em aproximadamente isolamento do agente causal e o estudo de sua sensibilida-
60% dos pacientes com infecção do parênquima renal, é ines- de frente aos antibacterianos. Habitualmente considera-se
pecífico, pois indica a presença de inflamação intraparen- positiva a presença de número igual ou superior a 100.000
quimatosa e está presente em doenças túbulo-intersticiais e, bactérias ou unidades formadoras de colônias por milili-
também, glomerulares. tro (⬎105 ufc/ml) de urina. É lógico que um limite tão de-
Hematúria é freqüente, ocorrendo em cerca da meta- marcado para uma condição heterogênea, e com uma
de dos casos de infecções do trato urinário, e pode ser até multiplicidade de variáveis, pode gerar distorções, se este
macroscópica. Habitualmente é apenas microscópica, e exame não for interpretado no contexto de cada caso. A
desaparece com o tratamento. A sua persistência requer grande maioria de doentes com infecção do trato urinário,
investigação urológica com o objetivo de afastar outras de fato, evidencia ⬎105 ufc/ml. Entretanto, aceita-se como
causas de hematúria. positiva a urocultura com ⱖ102 ufc/ml em mulheres com
São também utilizados testes químicos que visam diag- disúria, freqüência miccional aumentada, desconforto su-
nosticar a presença de bacteriúria significante. O mais uti- prapúbico e piúria (“síndrome uretral aguda”) ou ⱖ104

Quadro 25.1 Correlação entre a visualização direta de bactérias na urina e bacteriúria quantitativa
Método de Preparação Correlação* Referência

1. Urina não centrifugada ⬎10 /ml


6
KUNIN, C.M. New Eng. J. Med., 266:589-590, 1961.
2. Urina não centrifugada, corada (imersão) ⬎105/ml KASS, E.H. Tran. Ass. Amer. Physicians, 69:56-64, 1956.
3. Sedimento, não corado ⬎105/ml KUNIN, C.M. New Eng. J. Med., 266:589-590, 1961.
4. Sedimento corado (imersão) ⬎104/ml SANFORD, J.P. et al. Amer. J. Med., 20:88-93, 1956.

*Visualização de uma ou mais bactérias ao microscópio.


494 Infecção do Trato Urinário

ufc/ml em pacientes com sintomatologia sugestiva de pi- sua realização, é um método prático e útil e de uso cada
elonefrite (febre, calafrios, dor lombar, com ou sem sinto- vez maior. Além de permitir verificar o tamanho, a forma
matologia baixa). No período pós-tratamento ou durante e o contorno dos rins, indica a existência de fatores obstru-
o uso de antibacterianos, quando o germe é um Gram-po- tivos ao longo do aparelho urinário, assim como a presen-
sitivo (Staphylococcus sp. ou Streptococcus sp.) ou Candida ça de abscesso perinefrético ou intra-renal.
sp., em urina colhida duas horas ou menos após a micção A urografia excretora continua um importante exame
anterior, em urina com baixo pH, quando a urina do jato para nos dar a imagem mais integrada das diversas partes
médio na mulher carreia sabão ou anti-séptico da limpeza do trato urinário (v. Cap. 17). Não apenas mostra bem o
prévia ou em pacientes do sexo masculino, também pode tamanho dos rins, a existência de cicatrizes, a presença de
haver ⬍105 ufc/ml na presença de infecção urinária. obstruções intra- e extra-renais do fluxo de urina no siste-
Na urina obtida através de cateterismo vesical (uma ocor- ma coletor, como é um método que permite a análise da
rência excepcional, reservada apenas a doentes com impos- concomitância de uma cicatriz cortical contígua a dilata-
sibilidade de controle voluntário da micção), a interpreta- ção e deformidade do conjunto pielocalicial adjacente,
ção dos resultados é semelhante à urina do jato médio, em- único aspecto considerado patognomônico de pielonefri-
bora se tenha sugerido considerar positiva a urocultura com te. A tomografia computadorizada (TC) (v. Cap. 17), en-
mais de 50.000 ufc/ml em crianças sintomáticas. Nos casos tretanto, tem substituído a urografia excretora na avalia-
de punção suprapúbica, realizada mais freqüentemente em ção da infecção urinária. Além da opção de poder ser usa-
crianças quando se tem dúvida na interpretação de urina da com ou sem contraste radiológico, identifica anormali-
recolhida pelas técnicas usuais, a presença de mais de 1 bac- dades anatômicas, gerais ou focais, processos obstrutivos,
téria por mililitro de urina sugere infecção urinária. presença de abscesso perinefrético e de alterações intra-
Estima-se que 5 a 10% de urinas colhidas pela técnica abdominais e retroperitoneais. Adicionalmente, comple-
do jato médio estejam contaminadas, evidenciando, geral- menta e aprofunda dados suspeitos e não bem caracteri-
mente, flora mista, incluindo patógenos não habituais do zados em sua extensão pela ultra-sonografia.
trato urinário. Esta cifra é bem mais elevada e pode ofere- A cistouretrografia revela alterações obstrutivas do an-
cer maiores dificuldades de interpretação quando se utili- dar inferior e médio do trato urinário. Em crianças, é mais
za o coletor plástico em crianças (20-30%). Nestes casos usada pela maior prevalência de anomalias congênitas
existe a necessidade de mais rigor e repetição mais freqüen- diagnosticadas nesta fase, particularmente quando existe
te de exames. infecção recorrente do trato urinário. É o método ainda
Nos casos de doentes assintomáticos, sugere-se que a mais usado para a detecção e, em parte, caracterização da
urocultura positiva seja repetida para confirmação diag- intensidade do refluxo vésico-ureteral. Deve ser feito em
nóstica. Urocultura deve ser sempre feita, quando existam con- toda criança com infecção urinária recorrente.
dições. Mesmo quando se deseja iniciar o tratamento ime- A utilização de radioisótopos (v. Cap. 20) permite visu-
diato, empírico, frente a sintomatologia altamente incômo- alizar mais claramente a dinâmica dos rins, a forma e a
da para os doentes, é possível recolher-se a urina em fras- existência de cicatrizes, assim como aspectos da sua funci-
co estéril e colocar-se na geladeira, até que seja processada onalidade. Não permite o diagnóstico seguro de infecção
horas depois, antes de se iniciar o antibacteriano. A per- do trato urinário, mas ajuda muito na avaliação e acompa-
manência da urina na geladeira por até 24 horas não alte- nhamento de suas conseqüências. Os radioisótopos têm
ra significantemente o resultado de uma urocultura. sido utilizados para seguimento de casos com cicatrizes
Mais recentemente, vêm-se utilizando métodos semi- resultantes de refluxo e permitem uma idéia da função de
automatizados e que não envolvem a cultura da urina, que rins com processos obstrutivos, a exemplo das estenoses
utilizam a bioluminescência, turbidimetria, fotometria, de junção pielo-ureteral. Têm sido também utilizados no
microcalimetria, impedância elétrica, entre outros. Embo- estudo do refluxo vésico-ureteral.
ra permitam o diagnóstico de infecção do trato urinário Embora ainda exista alguma discussão sobre quando e
mais rapidamente que a urocultura, a especificidade e a qual método de imagem deva ser utilizado na avaliação do
sensibilidade dos diversos métodos são variáveis, sem paciente com infecção do trato urinário, algumas indica-
identificar o agente causal. ções estão definidas:
1) crianças do sexo masculino com infecção urinária ou
Estudo de Imagens do Aparelho Urinário; crianças do sexo feminino com infecção recorrente ou
Outros Procedimentos Diagnósticos complicada;
2) acompanhamento de crianças com cicatrizes renais;
Estes estudos são de grande importância na detecção de 3) pacientes do sexo masculino;
fatores predisponentes e conseqüências de uma infecção 4) pacientes com suspeita de obstrução ou com resposta
do trato urinário. lenta ou ausente ao tratamento adequado;
A ultra-sonografia, pela simplicidade e inocuidade de 5) mulheres com pielonefrite aguda.
capítulo 25 495

A uretrocistoscopia é reservada para casos de infecção


Quadro 25.2 Métodos para detecção de
recorrente do trato urinário, ou naqueles com hematúria
envolvimento renal em casos de ITU
freqüente inexplicada. Também, quando se suspeita da
existência de válvulas, divertículos, ulcerações ou patolo- 1. Cateterismo ureteral.
gias outras que possam estar simulando as manifestações 2. Anticorpos contra antígenos O da bactéria
das infecções urinárias. Aplica-se mais à situação de dúvi- infectante.
3. Lavagem da bexiga e colheita posterior de amostras
da diagnóstica, quando se presume a existência de lesão
repetidas.
predisponente, ou quando se imagina que as manifestações 4. Determinação de anticorpos recobrindo bactérias.
de infecção urinária baixa decorrem de outra patologia que 5. Proteína C reativa.
não infecção do trato urinário. 6. Determinação dos níveis séricos e urinários da Il-6.
A biópsia renal (v. Cap. 16) não é método de utilidade 7. Determinação de enzimas urinárias.
8. Presença de beta2-microglobulina.
para o diagnóstico de pielonefrite. A doença é focal, e a 9. Anticorpos (IgG e IgA) contra a proteína de Tamm-
probabilidade de se retirar fragmento que não permita Horsfall.
diagnóstico é de 30-40%. Além do mais, as alterações his- 10. Anticorpos contra lípide A.
tológicas verificadas num fragmento de tecido renal são
geralmente inespecíficas.

de proteína C reativa; também, tem mais possibilidade de


Pontos-chave: lesar células tubulares renais (desde que a inflamação tem
• No recém-nascido e nas crianças nos importante componente intersticial), podendo liberar, na
primeiros anos de vida, as manifestações urina, enzimas intracelulares múltiplas (LDH, ␤-glucuro-
nidase, N-acetil-␤-D-glucosaminidase, leucino aminopep-
clínicas de ITU são inespecíficas,
tidase, para citar algumas), assim como proteínas tubula-
requerendo alto índice de suspeita clínica res (beta2-microglobulina). De outra parte, oferece um
para o seu diagnóstico ambiente para que bactérias presentes no processo infla-
• Todas as crianças do sexo masculino e as matório se recubram com anticorpos específicos, localmen-
crianças do sexo feminino com ITU te fabricados ao nível do parênquima renal. Deste modo,
recorrente ou complicada devem ter o trato bactérias provenientes do tecido renal seriam eliminadas
urinário avaliado por imagem na urina recobertas de anticorpos aderidos à sua superfí-
• ITU está associada a cicatrizes renais cie, em contraposição às bactérias provenientes da bexiga,
sobretudo em crianças menores de 5 anos que sairiam sem estarem recobertas de imunoglobulinas.
Deste modo, um teste de imunofluorescência indireta po-
• O retardo no início do tratamento da ITU
deria diferençar bactérias recobertas ou não de anticorpos
pode associar-se a importantes lesões do
na urina, servindo para diferençar uma infecção alta (imu-
parênquima renal nofluorescência positiva) ou uma infecção baixa (imuno-
fluorescência negativa). Este método ganhou muita popu-
laridade pela relativa simplicidade de realização. Não ofe-
Testes de Localização de uma rece bons resultados em crianças; não se aplica à fase inici-
Infecção Urinária al de uma infecção urinária aguda; casos de prostatite, e
também ocasionalmente de cistite, podem resultar em bac-
Na prática clínica, a idéia de localização de uma infec- térias recobertas de anticorpos. Tudo isso serviu para di-
ção urinária é dada pela sintomatologia e pelo tipo de do- minuir a adoção deste método, de modo mais amplo, na
ente que se observa. A ocorrência isolada de manifestações prática médica. A inflamação tissular renal determina res-
urinárias baixas (disúria, polaciúria, urgência miccional, posta de anticorpos mais significante contra as bactérias
peso ou dor suprapúbica no final da micção), sem febre e/ que infectam o doente, demonstrável através de técnicas
ou dor lombar, sugere uma localização baixa da infecção; sorológicas (hemaglutinação); além disso, anticorpos con-
se ocorre febre e dor lombar agravada pela punho-percus- tra a proteína de Tamm-Horsfall indicariam a ocorrência
são, pensa-se em infecção alta do trato urinário. É natural de inflamação intersticial de rins, com penetração desta
que este exercício clínico, lógico e utilizável, não seja tão proteína na corrente sanguínea. Mais recentemente se tem
preciso. E muitos outros métodos complementares têm proposto a determinação dos níveis séricos e urinários da
sido utilizados (Quadro 25.2). Em geral eles se baseiam nos interleucina-6 com o marcador não apenas de infecção agu-
seguintes fatos: uma inflamação do tecido renal, mais que da do parênquima renal, mas, também, como índice de
a inflamação da superfície da bexiga, tem maiores possi- gravidade da infecção.
bilidades de determinar um aumento de proteínas da fase O estudo convencional de imagens do trato urinário
reativa aguda de uma inflamação, explicando a elevação (urografia excretora) já foi abandonado como método de
496 Infecção do Trato Urinário

localização da infecção, sendo substituído pela cintilogra- evidenciar que elas colonizam o intestino inicialmente e,
fia com gálio e, preferentemente, por DMSA (v. Cap. 20). depois, a região perineal e o trato urinário dos indivíduos
O percentual de falso-negativo e falso-positivo, entretan- que se infectam. As cepas de E. coli mais freqüentes em
to, tem limitado o uso desses testes. infecções urinárias, e também encontradas nas fezes des-
Todos estes testes para localizar infecção do trato uri- tes doentes, pertencem aos serotipos: 01, 04, 06, 08 e 075.
nário têm sido utilizados por vários grupos de estudiosos,
mas oferecem considerável número de resultados falso-
positivos quando comparados com métodos mais diretos
Fatores de Virulência
de localização. O cateterismo ureteral diferencial, com re- É possível que a E. coli patogênica para o trato urinário
tirada de urina de cada um dos ureteres e a lavagem da se origine de, apenas, poucos clones, sendo portanto dis-
bexiga, com colheitas repetidas de amostras em períodos tinta das cepas encontradas comumente nas fezes.
subseqüentes, são os métodos considerados mais precisos. São apontados alguns marcadores de uropatogenicida-
A presença de número crescente de bactérias na urina pro- de que caracterizam as cepas de E. coli:
veniente de um dos ureteres, ou na urina da bexiga depois
da lavagem esterilizadora inicial, indicaria uma infecção a) resistência ao soro sanguíneo;
alta, e, no caso de cateterismo diferencial de ureteres, qual b) produção de hemolisinas;
o rim infectado naquele momento. Não esqueçamos que c) existência de determinados antígenos O e K;
estes são métodos cruentos e, o mais das vezes, desneces- d) expressão de adesinas ou fímbrias tipo I (manose-sen-
sários para a condução de um caso clínico. Ainda são mé- sível) e tipo II ou fímbria P (manose-resistentes);
todos para serem utilizados em situações especiais. e) produção de aerobactin.
Existem sugestões indicando que a presença de determi-
nados antígenos O e K habilitam a E. coli a produzir mais fre-
PATOGÊNESE qüentemente pielonefrite.
É possível que a produção de hemolisinas e a de certas
Para o entendimento pleno do problema da infecção do fímbrias seja carreada no cromossomo; enquanto isso, re-
trato urinário, é essencial que se conheçam a origem e os me- sistência ao soro e produção de antígeno K1 são mediadas
canismos de agressão dos agentes etiológicos, o modo como por plasmídeos.
eles invadem o trato urinário do hospedeiro e, sobretudo, Cepas de E. coli sem estas características de virulência
como o hospedeiro reage à penetração e à manutenção des- são as que geralmente provocam cistite e bacteriúria assin-
tes agentes infectantes. Somente assim poderemos entender tomática. Todas as cepas que infectam o trato urinário pro-
melhor aspectos profiláticos, a história natural do processo, vavelmente possuem a fímbria tipo I, que permite coloni-
as recorrências e as perspectivas terapêuticas. zação do períneo e bexiga. A fímbria tipo II, entretanto, está
mais relacionada a infecção do parênquima renal e se cons-
titui no mais importante fator de virulência bacteriana.
Agentes Etiológicos das ITU A maioria das bactérias causadoras de infecção do tra-
to urinário tem a capacidade de aderir a células do epité-
A E. coli e outras enterobactérias (Quadro 25.3) continu-
lio urinário ou à uromucóide. Este fenômeno está associa-
am sendo os agentes infectantes mais comuns do trato uri-
do à existência de fímbrias, que são filamentos protéicos
nário. Em pacientes ambulatoriais com infecções agudas,
observados na superfície de bactérias Gram-negativas. Os
mais de 80% das vezes E. coli é a bactéria isolada, sendo
receptores para estas fímbrias são glicoproteínas ou glico-
menos freqüente em pacientes hospitalizados.
esfingolípides. As glicoproteínas, que servem de receptá-
As cepas de E. coli que produzem infecção urinária pro-
culos para fímbrias tipo I, são encontradas na proteína de
vêm das fezes. A serotipagem 0 destas bactérias permitiu
Tamm-Horsfall, ou nos glucosaminoglicanos que recobrem
a superfície da bexiga; os glicoesfingolípides servem de
receptores para as fímbrias tipo II ou P. Como os glicosa-
Quadro 25.3 Bactérias mais freqüentemente minoglicanos recobrem as células da bexiga e se renovam
isoladas em pacientes com infecção do trato continuamente, e a proteína de Tamm-Horsfall se encon-
urinário.* tra livre na urina da bexiga, a fixação de bactérias a estes
elementos que são excretados na urina serve como meca-
E. coli
Klebsiella sp. nismo de defesa contra a persistência e a multiplicação de
Staphylococcus sp. bactérias no trato urinário. De outra parte, entende-se que
Proteus sp. a destruição desta camada protetora de glicoproteínas pode
Enterobacter sp. facilitar a colonização e a multiplicação de bactérias na
*Laboratório de Bacteriologia/Nefrologia do Hospital Universitário Prof. bexiga, favorecendo penetração no epitélio e conseqüente
Edgard Santos — UFBA. reação inflamatória.
capítulo 25 497

Também, tem-se mostrado que muitas espécies bacte- uretra é fenômeno mais comum do que se imaginava, como
rianas sintetizam uma cápsula de polissacáride ou glico- se pode demonstrar após a utilização mais ampla da pun-
protéica (glicocálice) que pode favorecer o crescimento das ção suprapúbica. A existência de fímbrias P pode propici-
bactérias sob a forma de microcolônias e de fixá-las à mu- ar a colonização da bactéria invasora e suas conseqüênci-
cosa vesical. Este mecanismo de fixação ao trato urinário as; a inexistência destas adesinas resulta na eliminação mais
não está esclarecido plenamente. fácil destas bactérias.
Desde que 95% das hemácias contêm o antígeno P, a A passagem de cateter pela uretra pode levar bactérias
aglutinação de eritrócitos em presença deste antígeno que colonizam a porção distal da uretra até a bexiga. É por
tem permitido afiançar a sua ocorrência. Estas fímbrias isso que, mesmo após um único cateterismo, infecção uri-
P podem ser encontradas em bactérias outras que não nária ocorre em 1-2%. O perigo de infecção cresce, entre-
apenas E. coli, como é o caso do Proteus mirabilis; apenas tanto, na dependência do tipo de doentes (hospitalizados,
o receptor para esta bactéria na célula é diferente daque- hipertensos, pacientes com uropatia obstrutiva) e da natu-
le da E. coli. Outras bactérias que também aderem às cé- reza do procedimento. Se o cateter é de permanência, mes-
lulas superficiais do trato urinário têm outros mecanis- mo com todos os rigores de assepsia, infecção urinária
mos de aderência ainda não plenamente conhecidos. Este ocorre na maioria dos doentes após 7 a 10 dias. Quando o
é o caso da Klebsiella sp. (por fímbrias tipo I), Pseudomo- sistema de drenagem é aberto, infecção ocorre em mais de
nas sp. e germes Gram-positivos. Parece que a combina- 90% após o 4.º ou 5.º dia. Havendo cateterismo de perma-
ção de genes marcando as células para a formação de fím- nência, a bactéria pode também atingir a bexiga através da
brias P, produção de hemolisinas e soro-resistência seja camada de exsudato em torno do cateter, ou ascender pelo
de fundamental importância para o exercício da pato- lúmen do cateter, quando existe manipulação indevida do
genicidade. Interessante é que a maioria das E. coli de coletor de urina. Mesmo nos casos de drenagem fechada,
casos diagnosticados como pielonefrite aguda apresenta e com todos os rigores de assepsia como se procede atual-
fímbrias P. Em crianças, por exemplo, a expressão de fím- mente, infecção urinária surge após 8 a 10 dias e aumenta
brias P ocorre em 81 a 94% de cepas de E. coli de casos de progressivamente, mesmo em doentes usando antimicro-
pielonefrite aguda, enquanto que a freqüência é de ape- bianos.
nas 19% nos casos de cistite e de 14% nos casos de bacte- São inúmeras as demonstrações clínicas e experimentais
riúria assintomática. da importância da via ascendente. Este fenômeno explica
É importante assinalar que a quase totalidade das mu- a grande diferença de suscetibilidade à infecção urinária
lheres evidencia receptores às fímbrias P nas células ure- entre meninas (com conduto uretral curto, próximo ao reto,
terais (99%), e apesar disso poucas (cerca de 15-20%) evi- mais colonizado por bactérias) e meninos (em que a situa-
denciam infecção do trato urinário em suas vidas. Dentre ção é bem diversa e de maior proteção).
os motivos para este fato destacam-se: A via hematogênica explica alguns casos de infecção do
1) colonização fecal é menos freqüente nos casos sem in- trato urinário. É esta a situação de abscessos múltiplos de
fecções urinárias; rins no curso de uma septicemia estafilocócica. Também,
2) existe maior número de receptores nas células uroteliais infecção de rim pode ser ocasionalmente secundária a bac-
de casos que se infectam. Isso tem sido demonstrado teremia por germes Gram-negativos de origem variada. Os
através de várias técnicas. rins se tornam mais suscetíveis a infecção quando existe
obstrução extra- ou intra-renal do fluxo de urina. Este fato
Vale destacar que E. coli com fímbrias P produz pielo- já foi muito bem documentado experimental e clinicamen-
nefrite com freqüência, quando introduzida na bexiga de te, embora ainda não se saiba ao certo o motivo fundamen-
coelhos, ratos e macacos. Provavelmente contribui para isso tal de aumento da suscetibilidade do rim obstruído. Nes-
o poder de multiplicação da bactéria colonizada, e, talvez, tes casos, infecção é importante fator de destruição do pa-
o efeito do lipopolissacáride bacteriano, bloqueando a rênquima renal. Algumas bactérias podem, experimental-
mobilidade ureteral e propiciando a infecção. mente, infectar rins de animais após inoculação venosa
mesmo sem obstrução. Este é o caso do St. faecalis, algu-
Vias de Infecção mas cepas de Ps. aeruginosa, C. renale, e fungos do gênero
Candida, além do Staphylococcus aureus.
A via mais comum de infecção do trato urinário é a as- A via linfática é a de menos clara participação. Tudo in-
cendente. As bactérias da região periuretral adentram a dica que o refluxo pielolinfático é importante na dissemi-
uretra e colonizam as células vesicais. Daí, mesmo sem a nação intra-renal da infecção. É possível que a distribui-
existência de refluxo vésico-uretral, elas podem ascender ção parenquimatosa renal da infecção tenha a ver com a
pelo ureter, provavelmente na porção mais externa do flu- via linfática. Entretanto, a condução através de linfáticos
xo de urina que desce pelos ureteres, onde ocorre turbu- de bactérias do intestino ou do trato urinário baixo para
lência, atingir os rins e determinar pielonefrite em alguns os rins é assunto controverso, porque não suficientemente
casos. A penetração de bactérias até a bexiga através da comprovado.
498 Infecção do Trato Urinário

Mecanismos de Defesa do 2) a camada de glicosaminoglicanos, protegendo a super-


fície da bexiga e dificultando a fixação das bactérias às
Trato Urinário e Conseqüências da células uroteliais; como é renovável, as bactérias que a
Infecção Renal ela se fixam são também eliminadas;
3) os polimorfonucleares, que acorrem ao local da invasão
A urina é um meio de cultura razoável para a maioria do epitélio vesical;
dos patógenos do trato urinário. A sua composição química 4) a existência de agente ou fator antibacteriano produzi-
permite a multiplicação bacteriana, e dificulta a ação de do, talvez, pelas células do urotélio.
mecanismos humorais e celulares de defesa. Sua hiperos-
molaridade inibe a fagocitose e a reatividade do comple- Depois de atingida a bexiga, as bactérias ascendem aos
mento. Entretanto, a urina pode ser inibitória ou bacterici- rins, pela parte de turbilhão no fluxo ureteral da urina (por-
da, devido aos seguintes fatores: ção mais externa). Lá, dependendo do inóculo e de condi-
ções propícias, pode instalar-se uma infecção. No rim, a
a) elevada osmolalidade; medula é muito mais suscetível à infecção do que o córtex.
b) pH baixo; A maior suscetibilidade da zona medular se relaciona à
c) elevada concentração de uréia; elevada concentração de amônia (que inativa o comple-
d) alta concentração de ácidos orgânicos; mento), à elevada osmolaridade (que altera a quimiotaxia
e) presença de secreção prostática no homem, que também de polimorfonucleares), ao baixo pH e ao baixo fluxo san-
pode ajudar o efeito antibacteriano da urina; guíneo (que alteram a função e o número de leucócitos na
f) finalmente, a proteína de Tamm-Horsfall, secretada região). Nesta zona, as bactérias encontram mais facilida-
pelas células tubulares e presente na urina, pode agir de para se multiplicar e iniciar o processo infeccioso. As
como elemento de defesa. Ela é rica em resíduos de cepas de E. coli que atingem os rins evidenciam várias ca-
manose, permitindo a ligação de fímbrias tipo I de E. coli, racterísticas de virulência. Receptores para as fímbrias P
e se elimina na urina com a bactéria a ela fixada. se encontram distribuídos em todo o rim. As E. coli que in-
A região periuretral parece ser de importância. As cé- fectam o tecido renal perdem as fímbrias tipo I, que facili-
lulas desta região, em crianças com infecção recorrente tam a fagocitose, porque os leucócitos polimorfonucleares
do trato urinário, evidenciam sua capacidade maior de dispõem de receptores de manose.
aderência a bactérias infectantes do trato urinário. O mes- Os hospedeiros que são grupo P1 fenotípico negativo
mo parece ocorrer em mulheres com infecção recorrente são menos suscetíveis porque suas células carecem do
do trato urinário. Mais recentemente sugeriu-se a redu- glicoesfin-golípide, que é receptor de fímbrias P1.
ção nos títulos de IgA, na secreção que recobre as célu-
las do intróito vaginal, como uma das causas de maior
facilidade de colonização bacteriana. Estes fatos são ain- MECANISMOS DE AGRESSÃO
da controversos na literatura. Finalmente, o baixo pH do
líquido vaginal dificulta a fixação de uropatógenos des-
RENAL
ta região, mas é curioso assinalar que o pH vaginal é
Estudos realizados em macacos permitiram melhor en-
mais elevado nos casos de infecção recorrente do trato
tendimento das conseqüências renais do processo infecci-
urinário.
oso. No caso da E. coli, a presença de lípide A bacteriano é
Na menopausa, a baixa de estradiol resulta em altera-
um forte estímulo à quimiotaxia, com a atração de leucó-
ções da mucosa vaginal e perineal, decréscimo de L. acido-
citos polimorfonucleares e o resultante processo inflama-
philus responsável pela diminuição do pH da área do ves-
tório e suas conseqüências previsíveis: liberação de enzi-
tíbulo vaginal e mais fácil colonização por Gram-negativos
mas proteolíticas, favorecendo a morte celular, e liberação
entéricos. Este achado se acompanha de infecção recorrente
de citocinas (IL 1 e 2, TNF). O edema local que se estabele-
do trato urinário, que pode reverter com o uso tópico do
ce resulta em anoxia tissular, com aumento transitório de
hormônio e retorno da flora normal.
angiotensina II na veia renal, o que aumenta a isquemia e
Depois da colonização periuretral, as bactérias devem
estimula os fatores relacionados à fibrose. A formação lo-
penetrar a bexiga para que haja infecção, mas a bexiga
cal de radicais livres ocorre e o efeito de prostaglandinas
apresenta vários mecanismos que dificultam o desenvol-
vasodilatadoras favorece a recirculação na área atingida,
vimento de uma infecção:
removendo e redistribuindo os produtos localmente for-
1) a micção é o mais eficaz mecanismo de defesa. O aumen- mados.
to do volume urinário e da diurese é capaz de reduzir A área atingida, dependendo do grau da lesão e de sua
grandemente, embora não completamente, o número de extensão, vai sofrer deposição de fibronectina e de coláge-
bactérias na bexiga. Este importante mecanismo de de- no tipo III e pequenas quantidades de colágeno I e IV, com
fesa é perdido em pacientes com distúrbios da urodinâ- tendência a se transformar em área fibrótica, resultando em
mica; cicatriz maior ou menor.
capítulo 25 499

SITUAÇÕES CLÍNICAS Quadro 25.4 Algumas alterações radiológicas


observadas em mulheres com ITU recorrentes
ESPECIAIS
1. Bifidez pieloureteral.
Nos jovens, a infecção do trato urinário é 20 a 30 vezes 2. Ureterocele.
mais freqüente na mulher que no homem. No idoso (paci- 3. Ptose renal (acentuada).
ente acima de 65 anos), este fato se modifica de modo drás- 4. Divertículo de bexiga.
tico. Mulheres evidenciam bacteriúria em 20%, enquanto 5. Cistocele (pronunciada).
homens a apresentam em 10% de casos. As causas deste 6. Esvaziamento incompleto da bexiga.
fato e da alta prevalência de infecção do trato urinário nesta 7. Cisto pielogênico.
faixa etária são: 8. Estenose pieloureteral.
9. Nefropatia (com ou sem urolitíase).
a) grande freqüência de uropatia obstrutiva, pelo aumen- 10. Urolitíase.
to da próstata;
b) perda da atividade bactericida do líquido prostático;
c) dificuldade de esvaziamento da bexiga;
d) aumento de contaminação com fezes da região periu- rente do trato urinário seja submetido a exploração uroló-
retral, devido à incontinência fecal. gica, que compreende pelo menos ultra-sonografia do tra-
to urinário e, em alguns casos, estudos mais aprofundados,
Também nesta idade existe maior utilização de instru-
incluindo urodinâmica. Somente a correção de um fator
mentação urinária, em ambos os sexos. A existência de
predisponente, quando viável, pode interromper o ciclo de
maior aderência de uropatógenos às células uroepiteliais
infecções.
nestes pacientes ainda é questionável.

Pontos-chave:
Infecções Recorrentes
• ITU recorrente é relativamente freqüente,
do Trato Urinário sobretudo em mulheres jovens
É um dos problemas relativamente freqüentes e de di- • ITU recorrente pode ser causada pela
fícil condução. Alguns doentes apresentam surtos repeti- persistência do mesmo agente infectante ou
dos de infecção do trato urinário, mais de 3 a 4 por ano. por reinfecção por outro microrganismo
Estes surtos, geralmente sintomáticos, representam rein- • No mínimo 50% das mulheres com ITU
fecção na maioria dos casos (70 a 80% das vezes) e se con- recorrente não evidenciam qualquer fator
centram em determinados períodos. Existem, em alguns predisponente clinicamente perceptível
casos, motivos para esta suscetibilidade aumentada à in-
• É recomendável que toda paciente com ITU
fecção do trato urinário, sobretudo em mulheres que não
respondem ao tratamento antimicrobiano adequado ou
recorrente seja submetida a exploração
que experimentam recorrência da infecção imediatamen- propedêutica do TU
te após o tratamento apropriado, ou que apresentam sin-
tomas sugestivos de obstrução do trato urinário, confor-
me se pode ver no Quadro 25.4. Entretanto, no mínimo 50% COMPLICAÇÕES DAS
de mulheres com infecção recorrente do trato urinário não
evidenciam qualquer fator predisponente, clinicamente INFECÇÕES DO TRATO
perceptível. Em muitas delas temos encontrado correlação URINÁRIO
de infecção do trato urinário e atividade sexual. À seme-
lhança do que está relatado na literatura, as infecções nes- A importância clínica das infecções do trato urinário não
tes casos são mais freqüentes após atos sexuais demorados decorre apenas de sua elevada prevalência mas, e sobre-
e/ou freqüentes, depois de período prolongado de absti- tudo, das conseqüências e complicações que podem pro-
nência. duzir. De modo geral, apresentam-se como processos in-
As razões destes surtos recorrentes têm sido buscadas fecciosos relativamente benignos e de curso clínico rápi-
em provável defeito de resistências do hospedeiro, ao ní- do, se se assestam em trato urinário normal. Esta evolução
vel da área de colonização das bactérias na região periure- contrasta com a gravidade do processo quando a infecção
tral, e também, talvez, maior facilidade de aderência em ocorre em trato urinário obstruído. Nesta situação, em bom
função de maior densidade de receptores, além de fatores número de casos, podem advir ou resultar de complicações
obstrutivos intra- e extra-renais. que devem ser bem conhecidas, para o manejo adequado
É recomendável que todo paciente com infecção recor- dos doentes.
500 Infecção do Trato Urinário

Complicações Imediatas medidas gerais como o uso de analgésicos, repouso no lei-


to, suspensório para maior proteção ao testículo envolvi-
COMPLICAÇÕES SUPURATIVAS do e antibacterianos. Em geral, pela gravidade do caso, até
Em casos de pielonefrite aguda, como resultado do pro- que se conheça a flora infectante, usam-se aminoglicosídeos
cesso supurativo que se instala nos rins, formam-se abs- isolados ou associados a antibióticos beta-lactâmicos; ou-
cessos tanto na região medular como na cortical. Absces- tros preferem o uso de quinolônicos fluorados. O proces-
sos corticais podem coalescer e formar um carbúnculo re- so responde bem, não sendo necessário, habitualmente,
nal (principalmente em casos de infecções estafilocócicas), drenagem complementar de algum processo purulento
ou perfurar a cápsula renal drenando para a região perir- formado.
renal. Disso resulta um abscesso perirrenal. Nestes casos,
habitualmente o doente evidencia febre elevada, dor lom- NECROSE DE PAPILAS RENAIS
bar persistente e intensa (acentuada pela punho-percussão) Pode ser uma complicação de pielonefrite em rim obs-
do lado do abscesso, e a intensidade e localização da sin- truído ou em rins de diabéticos, habitualmente já com vas-
tomatologia dependem do grau e do local para onde se culopatia evidente. Tem sido também observada em paci-
distribui a supuração. entes com anemia falciforme e em cirróticos. O tecido pa-
O comum é o abscesso perinefrético desenvolver-se em pilar de ambos os rins, habitualmente várias papilas do rim
rim obstruído que se infectou. As enterobactérias continu- multipapilar do homem, vai sendo atingido, podendo re-
am sendo as mais comumente isoladas destes abscessos, sultar em desgarramento de fragmentos volumosos que
se bem que cresce muito a importância, nestes casos, do podem obstruir os ureteres de um ou de ambos os lados,
Staphylococcus aureus. provocando uropatia obstrutiva de grau variável.
O tratamento nestas circunstâncias inclui, além do uso A papila é a área menos irrigada dos rins e com baixa
bem conduzido de antibacterianos adequados, o emprego pressão parcial de oxigênio; os exuberantes plexos vascu-
de conduta cirúrgica, consistindo em ampla drenagem da lares da área cortical começam a rarear na zona córtico-
coleção purulenta, nos casos que não respondem ao trata- medular, e apenas os vasa-recta são vistos descer na área
mento clínico. interna da medula. Processos inflamatórios, com edema na
Embora nos processos pielonefríticos os dois rins fre- zona da medula, podem resultar em obstrução vascular na
qüentemente estejam envolvidos, a intensidade do proces- área da papila, com necrose e desgarramento.
so em cada rim é variável; às vezes, na vigência de obstru- No animal submetido a pielonefrite experimental não é
ção intra- ou extra-renal do fluxo de urina, a infecção é incomum se encontrar necrose de tecido papilar. No rato,
unilateral. Geralmente estes abscessos são unilaterais. por exemplo, com infecção urinária por E. coli associada a
Em casos de infecção de rim hidronefrótico, pode advir corpo estranho na bexiga, a necrose papilar não é rara.
uma pionefrose, complicação das mais temíveis, porque Talvez seja esta uma das causas da hidronefrose que se
passível de provocar destruição grave e irreversível do rim desenvolve em animais com pielonefrite aguda sem obs-
em poucos dias ou semanas. E na abordagem cirúrgica trução provocada no trato urinário; é verdade que a urina
destes casos, a nefrectomia é freqüentemente a única ati- purulenta, aliada a alterações da motilidade da pelve e
tude terapêutica racional e efetiva. ureteres, sejam, também, importantes fatores obstrutivos
Embora incomum, alguns pacientes desenvolvem orqui- nestes casos.
epididimite no curso de uma infecção do trato urinário ou Esta é uma complicação grave das infecções urinárias.
subseqüentemente a ela. Alguns destes doentes são jovens, Existe, habitualmente, bacteremia nestes casos, e como o
com história compatível com processo de prostatite, não processo de necrose de papilas é, com freqüência, bilate-
se sabendo se a infecção urinária foi uma conseqüência da ral e acompanhado por obstrução, é comum o surgimento
infecção do tecido prostático. Curiosa tem sido a observa- de uremia.
ção experimental de que próstata infectada em ratos pode O tratamento é feito preferencialmente com aminogli-
determinar infecção urinária, com acometimento dos rins; cosídeos associados a antibióticos beta-lactâmicos, em do-
localização e multiplicação de E. coli na próstata também ses a serem ajustadas ao caso, se existe insuficiência renal.
tem sido observada em ratos subseqüente a pielonefrite Em alguns pacientes a eliminação de tecido papilar ne-
experimental, particularmente se a próstata foi previamen- crótico resulta em obstrução urinária, com dor tipo cólica
te lesada. A invasão do epidídimo e dos testículos pode ser renal. Na vigência de diabetes mellitus, não raro se associa
conseqüência da extensão do processo do tecido epididi- processo de acidemia que deve ser convenientemente
mário, provavelmente por via canalicular, com envolvi- manejado; no mínimo, existe necessidade de reajuste do
mento do testículo correspondente. O processo é habitu- regime hipoglicemiante.
almente unilateral e se manifesta com forte dor ao nível da
região escrotal, dor que se exacerba acentuadamente à BACTEREMIA
palpação, com aumento de volume do epidídimo e do tes- O trato urinário infectado continua sendo uma das fon-
tículo, febre elevada e calafrios. O tratamento envolve tes mais importantes de bacteremia por germes Gram-
capítulo 25 501

negativos. Este fato tem sido observado e freqüentemente de refluxo vésico-ureteral ou, talvez, uma forma de agres-
relatado na literatura. Como as infecções urinárias são as são imunológica dos rins (nefrite intersticial imunológica),
mais comuns infecções hospitalares de nossos dias, pode- com destruição progressiva do parênquima renal.
se imaginar a importância deste tipo de complicações, não Tem sido muito difícil, no animal de experiência, indu-
apenas como fonte de morbidade, mas de mortalidade. zir uremia crônica progressiva utilizando modelos diferen-
Bacteremia tem sido observada no curso de invasão do tes de pielonefrite, mesmo introduzindo graus diferentes
tecido renal, em doentes com cateter de permanência e em de uropatia obstrutiva.
doentes infectados (ou não) submetidos a manipulação do Interessante tem sido a observação experimental de que
trato urinário e, mesmo, a litotripsia. Principalmente em rins pielonefríticos perdem a capacidade de desenvolver
doentes idosos e em imunodeprimidos, bacteremia pode hipertrofia compensadora quando se faz a nefrectomia
acompanhar-se de choque e, algumas vezes, de morte. contralateral, independente do grau de lesão do parênqui-
ma ou da existência de bactérias se multiplicando no teci-
do renal. A atrofia do parênquima renal na pielonefrite
Pontos-chave: resulta não apenas do processo inflamatório intersticial,
• Pielonefrite aguda se manifesta por febre, mas pode ser complicada pela obstrução vascular pelo
processo infeccioso.
calafrios, dor lombar ou em flanco, disúria e
aumento da freqüência urinária
HIPERTENSÃO ARTERIAL
• No idoso, às vezes, falta febre e/ou dor
Têm sido muito variáveis os índices de correlação entre
lombar bacteriúria e hipertensão arterial. Para muitos autores, hi-
• Abscessos, renal e perirrenal, e mesmo pertensos têm maior prevalência de bacteriúria do que
necrose de papilas renais são complicações controles não hipertensos. Este fato fica mais notório quan-
relacionadas à pielonefrite, sobretudo do se seleciona o grupo hipertenso que à urografia excre-
quando existe processo obstrutivo tora evidencia alterações passíveis de resultarem de pielo-
• Pielonefrite é uma importante causa de nefrite. A correlação de bacteriúria e hipertensão arterial,
sepse entretanto, pode também refletir a maior suscetibilidade
do hipertenso ao desenvolvimento de infecção do trato
• Pielonefrite é importante causa de cicatrizes
urinário, o que tem sido também destacado na literatura.
renais em crianças Quanto à infecção urinária ser a causa da hipertensão
arterial (v. Cap. 43), estudos de acompanhamento de gru-
pos de pacientes a longo prazo têm demonstrado que o
Complicações Tardias desenvolvimento de hipertensão arterial, nos casos de in-
fecção urinária, é semelhante ao da população geral.
ATROFIA DO PARÊNQUIMA RENAL E Experimentalmente também tem sido difícil demonstrar
INSUFICIÊNCIA RENAL CRÔNICA que pielonefrite pode determinar hipertensão arterial. A
As lesões da pielonefrite destroem áreas do tecido re- variedade de raças de animais utilizados, o modo de in-
nal e se formam cicatrizes. Em processos repetidos e fre- dução da infecção renal, a duração do acompanhamento e
qüentes pode haver destruição considerável do tecido re- a gravidade da infecção têm resultado em respostas mui-
nal. Quando existe obstrução associada, o grau de infec- to contraditórias. Utilizando-se modelo de pielonefrite,
ção é bem maior, e ao lado da destruição resultante do através de inoculação direta de bactérias na medula renal
aumento de pressão se associa a destruição tecidual pelo de ambos os rins de ratos, ou de rins únicos em ratos
processo infeccioso. Como conseqüência, a estrutura ana- Sprague-Dawley, demonstrou-se o desenvolvimento de
tômica e funcional de um ou de ambos os rins pode ser hipertensão arterial até certo ponto relacionado ao grau de
gravemente afetada ou destruída. Cumpre assinalar, en- agressão e destruição do parênquima renal, em animais
tretanto, que é rara a ocorrência de uremia nestes casos sem acompanhados por 3, 6 e 9 meses.
haver obstrução urinária bilateral. Embora séries clínicas
sobre as causas de insuficiência renal crônica se refiram à LITÍASE URINÁRIA
pielonefrite como uma causa importante, o diagnóstico De há muitos anos se conhecem as múltiplas facetas da
baseou-se em dados histológicos, explicáveis pela presen- interação entre infecção urinária e urolitíase (v. Cap. 33):
ça de doenças que acometem a região túbulo-intersticial e
sem documentação de infecção como causa primária da 1) uma pode favorecer o surgimento da outra;
doença renal; em alguns desses casos a infecção parece ter 2) uma pode dificultar o controle da outra;
tido um papel secundário. Os casos da assim chamada 3) uma pode agravar as manifestações clínicas da outra.
“pielonefrite atrófica bilateral”, sem bacteriúria, provavel- A infecção favorece o surgimento de litíase através de
mente representam, na maioria das vezes, a conseqüência uma multiplicidade de mecanismos:
502 Infecção do Trato Urinário

a) degradação da uréia pelo agente bacteriano e elevação dade (morte súbita, inexplicada) do que um grupo com-
do pH urinário, facilitando agregação cristalina; parável de idosos não-bacteriúricos. As razões deste acha-
b) lesão do parênquima renal, com alteração da mucosa do, ainda não suficientemente documentado na literatura,
pélvica, favorecendo o acúmulo de agregados cristalinos; não estão aparentes. Mostrou-se que bacteriúria no idoso
c) a inflamação, com destruição de tecido renal, resulta em pode ser um marcador de saúde mais comprometida.
detritos celulares variegados, podendo formar núcleos
de calcificação;
Pontos-chave:
d) diminuição de fatores estabilizadores na urina, entre
outros. • ITU é a infecção bacteriana mais comum na
De qualquer modo, no animal de experiência, tem sido gravidez e pode manifestar-se como
possível documentar a facilidade de formação de cálculos bacteriúria assintomática, ITU baixa ou
através de indução de diferentes modelos experimentais. pielonefrite
Proteus sp., entretanto, mostra-se a raça bacteriana mais • Os agentes infectantes são aqueles mesmos
capaz de litogênese. Digno de nota, entretanto, tem sido a que causam ITU não complicada
demonstração de que bactérias “infectam” cálculos e po- • ITU em gestação se correlaciona com
dem aí sobreviver, indenes aos efeitos de antimicrobianos, abortamento, prematuridade e baixo peso;
e daí saírem e reinfectarem o trato urinário. 20 a 30% das gestantes com bacteriúria
Este fato é significante porque indica, em casos de rein-
desenvolvem pielonefrite
fecção em pacientes litiásicos, a necessidade de retirada do
cálculo urinário como medida indispensável para aumen-
• O tratamento previne as complicações
tar as oportunidades de esterilização do trato urinário. relacionadas a ITU na gestação
Também reforça a necessidade de se fazer uso de antimi-
crobianos adequados no curso da litotripsia, pelo perigo
da liberação de bactérias no trato urinário obstruído, du- TRATAMENTO DAS INFECÇÕES
rante o procedimento.
DO TRATO URINÁRIO
COMPLICAÇÕES NA GRAVIDEZ O tratamento bem-sucedido das infecções do trato uri-
Sabe-se que a grávida é mais suscetível a desenvolver nário depende essencialmente de:
bacteriúria. É verdade, entretanto, que de 1 a 2% das
1) diagnóstico clínico-bacteriológico correto;
bacteriúrias detectadas na gravidez provavelmente já es-
2) escolha de agente antibacteriano adequado, que deve ser
tavam presentes antes da gestação, como resultado de in-
usado de modo próprio;
fecção urinária adquirida na infância e não totalmente er-
3) acompanhamento do doente para verificar a ocorrência
radicada. Ocorre mais freqüentemente no segundo e no
de recidiva da infecção. Nestes casos, investigar a exis-
terceiro trimestre.
tência de fator predisponente, para a medida terapêuti-
A bacteriúria da gravidez deve ser erradicada ou supressa,
ca adequada.
sob pena de complicações. Pielonefrite aguda, por exemplo,
Como as manifestações clínicas de infecções do trato
desenvolve-se em 20 a 30% de grávidas bacteriúricas, no
urinário são múltiplas, ocorrendo em situações muito va-
período da gestação ou no pós-parto imediato. Além disso,
riadas, a atitude terapêutica também pode e deve ser vari-
já se tem como aceita na literatura uma correlação entre bac-
ada, adequando-se à situação clínica.
teriúria não controlada e baixo peso ao nascer ou prematu-
ridade. Este fato é muito importante porque prematurida-
de, per se, resulta em maior mortalidade perinatal e proble- Padrões de Resposta ao Tratamento
mas de desenvolvimento do concepto. Alguns estudos su-
gerem, além disso, que bacteriúria pode facilitar a ocorrên- É importante que se conheçam os padrões de resposta
cia da toxemia da gravidez, assim como acentuar a anemia terapêutica, para melhor planejar a atitude a ser adotada.
observada no período da gestação. Mais grave, entretanto, Existem quatro respostas possíveis à terapêutica:
embora não estabelecido, tem sido a sugestão de deficiência a. Cura: quando a urocultura se torna negativa e continua
de desenvolvimento intelectual de recém-nascidos de mães negativa pelo período de até seis meses (período con-
bacteriúricas, quando comparados a grupos controle apro- vencional);
priados em acompanhamento a longo prazo. b. Persistência: quando a mesma bactéria existente antes da
terapêutica continua na urina, em número elevado ou
AUMENTO DA MORTALIDADE em pequeno número por ml. Este fenômeno indica ine-
Mais recentemente, tem-se sugerido que pacientes ido- ficácia do antibiótico usado, ou por causa de resistência
sos com bacteriúria apresentam maior índice de mortali- do agente causal, ou pela concentração urinária ina-
capítulo 25 503

dequada do produto. A persistência às vezes reflete um TRATAMENTO COADJUVANTE. Além das medidas
defeito orgânico que torna a bactéria do trato urinário terapêuticas mais diretas, doentes com infecção do trato
inatingível (existência de cálculo, prostatite, entre ou- urinário, na dependência das manifestações clínicas, são
tros). colocados em repouso relativo, com oferta ampla de líqui-
c. Recaída: quando o mesmo organismo reaparece na uri- dos. Existe valor na hiperidratação nestes casos? Parece que
na do doente, depois de ter sido erradicado por uma sim, embora existam argumentos favoráveis e desfavorá-
terapia adequada. Está freqüentemente associada a in- veis a este procedimento. Além do efeito de lavagem do
fecção do parênquima renal e ocorre dentro de duas a aparelho urinário, existe diminuição no número de bacté-
três semanas do término da terapêutica. rias por ml de urina; decresce a hipertonicidade da papila
d. Reinfecção: quando desaparece a bactéria infectante e renal, aumenta a migração leucocitária na medular dos
surge novo agente etiológico. Às vezes este fenômeno rins, assim como a atividade do complemento. Em contra-
ocorre durante a terapêutica, mas o comum é ocorrer de posição, a repleção exagerada da bexiga pode facilitar o
2 a 6 meses do tratamento inicial. Na maioria destes refluxo vésico-ureteral e favorecer a diluição de antibacte-
casos, a infecção é do trato urinário baixo. Quando existe rianos na bexiga. De qualquer modo, parece-nos haver
recidiva com bactéria da mesma espécie, somente a mais pronta resposta sintomática com a hidratação mais
serotipagem permite identificar se se trata de reinfecção ampla do doente, sem haver aparente prejuízo da eficácia
ou recaída. antibacteriana do tratamento.
Em algumas situações, procura-se alterar o pH uriná-
rio para melhorar a eficácia de certos antibacterianos. A
Esquemas Terapêuticos Propostos baixa do pH resulta em maior eficácia do ácido hipúrico,
A infecção do trato urinário continua sendo tratada pelo metenamina e nitrofurantoína; já o aumento favorece a
método convencional, através do uso de antibacterianos, eficácia de aminoglicosídeos e macrolídeos. Apesar de es-
após a identificação do agente infectante e o conhecimen- tes fatos já estarem comprovados, pouco se procura alte-
to da sua sensibilidade aos antimicrobianos, consideran- rar o pH urinário, a não ser nas seguintes condições:
do-se as peculiaridades do hospedeiro. O período do tra- a. nos cálculos de estruvita infectados (sobretudo com
tamento é variável, podendo ter a duração de 3 dias, 7 a 14 Proteus sp.) o pH urinário se eleva e favorece a mais rá-
dias ou, excepcionalmente, ser em dose única. A natureza pida deposição de sais de cálcio. A baixa do pH se con-
do tratamento convencional e empírico está explicitada no trapõe a este efeito e à multiplicação bacteriana;
Quadro 25.5, não necessitando de maiores especificações. b. nos casos de uropatia obstrutiva grave, não passíveis de
correção anatômica e/ou fisiológica, podem-se evitar
DOSE ÚNICA VERSUS DOSE CONVENCIONAL surtos repetidos de infecção urinária sintomática usan-
Desde alguns anos se vem tentando verificar a eficácia do vitamina C (4 g ou mais/dia). Devemos lembrar que
terapêutica de doses únicas de antibacterianos em infec- a baixa prolongada do pH com ácido ascórbico favore-
ções do trato urinário. Resultados relativamente bons têm ce a deposição de oxalatos; de outra parte, a acidifica-
sido relatados por numerosos autores. Este tipo de trata- ção favorece a deposição de ácido úrico.
mento não tem sido muito eficaz em crianças, em mulhe-
O uso de analgésicos e antiespasmódicos está indicado
res grávidas e em outras situações.
nos casos de dor lombar ou suprapúbica, muito incômoda
As vantagens da dose única são as seguintes:
em alguns casos.
1) redução de custos;
2) menor toxicidade; QUIMIOPROFILAXIA PROLONGADA
3) redução na emergência de resistência bacteriana; Nos casos de infecções repetidas (recaídas ou reinfecções
4) identificação mais precoce do doente que necessita de ocorrendo mais de três vezes por ano), o doente deve ser
investigação urológica e tratamento mais prolongado. estudado do ponto de vista urológico. O tratamento, nes-
Apesar dessas vantagens, a dose única não tem grande tes casos, envolve uma fase inicial, com doses habituais do
eficácia na erradicação das bactérias uropatogênicas que antibacteriano escolhido para erradicar a bacteriúria; a
colonizam o trato digestivo e a vagina e, por isso, a recor- manutenção da terapêutica é feita com um antibacteriano
rência é mais alta, muito superior ao observado com três dias (preferentemente um quimioterápico), em dose menor,
de tratamento. Por esta razão, o tratamento por três dias tem dado uma única vez ao dia, preferencialmente à noite. Os
sido preconizado. Deve ser chamada a atenção, entretanto, produtos mais usados para a quimioprofilaxia urinária são:
para que o tratamento de curta duração (dose única e por sulfonamidas, SMZ/TMP, nitrofurantoína, quinolônicos
três dias) não seja aplicado em pacientes do sexo masculino ou menos comumente um beta-lactâmico de espectro mais
ou com sintomatologia maior que sete dias, com pielonefri- reduzido, como a cefalexina. Na vigência de processo obs-
te aguda, com infecção urinária complicada ou em imunos- trutivo, o objetivo é manter a bacteriúria abaixo de 105ufc/
suprimidos. ml, o que interrompe o ciclo de infecções sintomáticas em
504 Infecção do Trato Urinário

Quadro 25.5 Tratamento das infecções do trato urinário (ITU)

Natureza da infecção Antimicrobiano Duração e observações


1. ITU sintomática
1.1. Febril
não complicada Norfloxacina ou 10-14 dias
Fluorquinolonas*
Cefalosporina de 2.ª ou
3.ª geração
Aztreonan
Aminoglicosídeos
ou
complicada Fluorquinolona No caso de suspeita de bacteremia, sobretudo em idosos,
Cefalosporina de 3.ª ou ITU complicada aconselha-se internamento
geração hospitalar e tratamento parenteral. Na grande
Piperacilina/Tazobactan maioria dos casos o tratamento é ambulatorial.
Ampicilina/Sulbactan
Carbapenêmicos
Aminoglicosídeos

1.2. Sem febre Norfloxacina ou 3 dias


Fluorquinolonas Se existe história de ITU recorrente ou complicação
Cefalosporina de 1.ª e 2.ª do trato urinário (fator obstrutivo), tratar por
geração 7 a 10 dias.
Nitrofurantoína
STZ/TMP**
Amoxacilina/Clavulanato
(5-7 dias)
Ampicilina/Sulbactan
(5-7 dias)

2. ITU assintomática Cefalosporina de 1.ª ou 2.ª 7-10 dias


geração Tratar apenas mulheres grávidas, pacientes
Quinolônicos transplantados renais, pacientes neutropênicos
Nitrofurantoína e pacientes que irão se submeter a procedimentos
SMZ / TMP* urológicos invasivos ou a litotripsia.

3. ITU recorrente (mais


de 3 surtos ao ano)
3.1. Não complicada 7-10 dias na fase sintomática; manter 1/2 ou 1/4 da
(sem fator Norfloxacina dose por 6-9 meses.
obstrutivo) Fluorquinolônicos Quando relacionada ou coito, usar dose do
Cefalosporina de 1.ª ou 2.ª antimicrobiano após o ato sexual.
geração
Nitrofurantoína
3.2. Complicada SMZ/TMP*
(com fator Tratar como ITU sintomática por 7 a 10 dias;
obstrutivo) continuar como em casos não complicados

*Moxifloxacina e trovafloxacina não alcançam níveis urinários adequados.


**Com o aumento de resistência da flora infectante do trato urinário ao SMZ/TMP, o uso deste produto perdeu muito de sua eficácia.

alguns casos. Uma situação especial é a da mulher com Situações Terapêuticas Especiais
infecção recorrente pós-coito. Nestes casos, uma dose de
um destes antibacterianos após a relação sexual e o esva- 1) Existem alguns casos de bacteriúria significante que não
ziamento vesical tem-se mostrado bem eficiente. A dura- devem ser tratados. Bacteriúria assintomática em mu-
ção do tratamento profilático nos casos recorrentes é vari- lheres não grávidas, por exemplo, não exige terapêuti-
ável, sendo geralmente inferior a 6-9 meses. Quando exis- ca. Em muitos casos a situação é transitória. Além dis-
te processo obstrutivo não passível de correção, o tratamen- so, a mudança de uma cepa bacteriana por outra, com
to da infecção se prolonga por muitos anos. maiores características de virulência, pode conduzir ao
capítulo 25 505

surgimento de sintomas. E ainda se junta a isso o pro-


blema adicional de reações adversas ocasionais aos an- BIBLIOGRAFIA SELECIONADA
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