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Capítulo VI

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ÊNFASE EM POLÍTICA PÚBLICA E
A “NOVA GESTÃO PÚBLICA”
Nos últimos anos, os estudiosos de administração pública foram atraídos para o
campo mais geral da política pública, ou da análise política, como uma forma de entender o
papel das organizações públicas na expressão dos valores sociais. Os especialistas em
estudos políticos que seguiram este caminho vêem que o processo político é central para as
operações governamentais. As políticas são entendidas como resultados da atividade
governamental; por esta razão, a formulação e a implementação da política pública são
vistas como pontos centrais do processo político. Se o trabalho do governo é gerar políticas,
então o estudo peculiar, próprio, do governo é o estudo da política pública. Mas, para
alguns, este estudo da política pública veio a ser visto como abarcando (e talvez até
substituindo) o campo da administração pública como foco de educação e prática. Ele não
só oferece um novo conjunto de categorias para se observar a ação do governo (tipicamente
as categorias associadas à análise de sistemas), como também sugere um novo conjunto de
habilidades a serem requeridas de quem ingressa no serviço público – as mais avançadas
técnicas positivistas de análise e avaliação. O clássico “homem administrativo”, limitado
por sua racionalidade e amplitude de seus interesses, deve ser substituído pelo analista
político, mais moderno, mais racional e mais influente.

Ver as organizações públicas como parte do processo da política pública abre novos
caminhos para as teorias da organização pública. Em primeiro lugar, existe a possibilidade
de que as organizações públicas possam ser consideradas partes integrantes do processo
político. Isto é, em vez de conceber a administração como estando separada da política, a
perspectiva das políticas confirma que os membros das organizações públicas exercem um
papel importante na formulação da política pública, que a influência deles é amplamente
sentida no planejamento ---112--- das políticas e programas e que eles continuam a dar
forma às políticas públicas, por meio de seus esforços de implementação, mesmo depois
que as políticas tenham sido enunciadas pelo legislativo, judiciário e executivo. De acordo
com esta visão, torna-se difícil justificar a dicotomia entre política e administração. Em
segundo lugar, a orientação pela política sugere pelo menos a potencialidade de modelar o
estudo da organização pública por um método de valor crítico, em vez de instrumental.
Como vimos, outras visões de organizações públicas, especialmente as consistentes com o
modelo racional de administração, baseiam-se numa separação de fato e valor e num
interesse pela análise factual do comportamento norteado por objetivos dentro das
organizações. Se as organizações públicas, porém, forem consideradas centrais para o
processo político, então esta visão é, obviamente, restritiva demais. O papel das
organizações públicas como expressão dos valores societários torna-se máximo e, por isso,
é muito mais apropriada uma abordagem às organizações públicas que enfoque e critique a
base axiológica destas organizações.

Infelizmente, a promessa da abordagem de política pública não se cumpriu de forma


plena. Apesar de sua compreensividade, a orientação pela política não alterou, em termos
fundamentais, a nossa abordagem à teoria. Mantiveram-se tanto a emergência renovada da

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dicotomia entre política e administração quanto a continuação ou até extensão da
concepção instrumentalista de organização, pelo menos em alguns trabalhos. Os estudiosos
de política pública fizeram diferenciações entre formulação e implementação de políticas
de uma maneira muito parecida com a que os estudiosos anteriores de administração
pública separaram o seu trabalho do estudo da política. De maneira semelhante, os que
adotaram a orientação pela política pública, em grande parte mantiveram seu compromisso
com a ciência social dominante, incluindo uma visão positiva de ciência e uma concepção
instrumental de organização. Para entender esses argumentos, no entanto, temos que
primeiro examinar o desenvolvimento da orientação pela política pública e duas questões
que foram centrais aos estudos sobre políticas: responsividade e eficácia.

1. DESENVOLVIMENTO DA ORIENTAÇÃO PELA POLÍTICA PÚBLICA

Muitos dos primeiros teóricos de organizações públicas foram críticos da dicotomia


entre política e administração, que, segundo eles, não reconhecia a influência da burocracia
na formação da política pública. Paul Appleby, em Policy and administration (1949),
queixava-se que a tendência de separar política e administração não deixava um papel de
formulação de políticas para os administradores, exceto para o executivo principal. Pelo
contrário, argumentava ele, “os administradores estão continuamente criando regras para o
futuro e estão continuamente determinando o que a lei é, o que ela significa, em termos de
ação” (p. 7). Além deste exercício de discrição, os administradores têm acesso a
informações importantes sobre questões políticas e são, com freqüência, chamados a fazer
recomendações para a ação legislativa. Nesse sentido, dizia Appleby, “a administração
pública é formulação de política” (p. 170).

Em termos semelhantes, escreveu Norton Long (1962, p. 67), “a burocracia está na


política e na política maior para ficar: de fato ... a burocracia será, provável e
diuturnamente, ---113--- a nossa principal fonte de iniciativa política”. Nesta época, não
havia dúvidas entre os estudiosos de administração pública de que as organizações públicas
exerciam um papel importante na definição da política pública. As “iniciativas” dos órgãos
públicos, ademais, requeriam uma base sólida de análise para definir as recomendações que
poderiam ser feitas. Isso significava que o estudo ou a análise das políticas públicas,
sobretudo das conseqüências das políticas propostas, tornara-se altamente importante. Os
estudiosos e profissionais da administração pública tinham, então, razões muito práticas
para se engajar no estudo da política pública”.

“A burocracia está na política e na política maior para ficar: de fato, ... a burocracia
será, em termos prováveis e diuturnos, a nossa principal fonte de iniciativa política”.
– Norton Long

Mas haviam também interesses teóricos, interesses que eram manifestados, de


forma mais clara, pelos cientistas políticos não envolvidos tão a fundo com a administração
pública. Seguindo as tendências da ciência social, em geral, e da ciência política, em
especial, eles cobravam de seus colegas uma visão de estudos políticos mais relevante para
as questões do dia. Quem tinha uma interpretação mais liberal argumentava que os
cientistas políticos haviam negligenciado, anteriormente, os problemas sociais, como a

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pobreza, a decadência urbana e, conseqüentemente, tinham uma certa responsabilidade por
esses problemas. Já os cientistas políticos que se inclinavam por uma interpretação mais
conservadora argumentavam que técnicas cuidadosas e racionais de análise deveriam
oferecer um modelo para o resto do governo e a matéria-prima para uma ciência política
renovada. Em ambos os casos, a ciência política tradicional era atacada por estar
excessivamente preocupada com as instituições de governo e os comportamentos dos atores
governamentais. Argumentava-se que não se fazia uma análise cuidadosa do conteúdo e do
impacto das políticas públicas.

1.1. Visão de política pública dos cientistas políticos

Entre os cientistas políticos existiam pelo menos duas orientações distintas em


relação à emergência da política pública. Bem no início, Harold Laswell e outros
integrantes da abordagem da “ciência da política” (LERNER & LASWELL, 1960) sentiam
que a pesquisa sistemática sobre o processo de formulação de políticas poderia estabelecer
relações entre políticas instrumentais e valores finais. As decisões normativas sobre o rumo
final da sociedade seriam seguidas por recomendações prescritivas que indicassem como
estas metas poderiam ser atingidas. Com um argumento semelhante, Yeheskel Dror (1968,
p. 8) afirmava que a ciência da política visa, principalmente, melhorar “o design e as
operações dos sistemas de formulação de políticas”. Em sua visão, o conhecimento sobre as
políticas específicas deveria estar integrado com o conhecimento sobre o próprio sistema de
formulação de políticas, com o modo pelo qual ele opera e como ele poderia ser melhorado.

De acordo com uma segunda abordagem popular entre os cientistas políticos, os


estudos que tratam de política pública serviriam para gerar conhecimentos de base empírica
sobre o processo político. Thomas Dye (1970), por exemplo, sustentava que se deveria
manter uma distinção clara entre modelos normativos e empíricos e que o estudo da política
pública, embora guiado por interesses normativos, só poderia ---114--- oferecer explicações
empíricas da política pública. “Ao optarmos pelo uso do modelo empírico, nos
comprometemos com a tarefa da explicação, em vez da recomendação” (p. 25).

Na visão de Dye, a política pública é simplesmente “tudo o que os governos


decidem fazer ou não fazer” (1976, p. 1). A análise política, por sua vez, é “descobrir o que
os governos fazem, por que o fazem e que diferença isso faz” (p. 1). O estudo da política
pública pode enfocar tanto as causas das políticas particulares – isto é, as circunstâncias
políticas, sociais ou econômicas que criaram certos tipos particulares de políticas – ou as
conseqüências da política – por exemplo, o efeito que uma política específica terá sobre um
tipo particular de problema. Em ambos os casos, a meta do analista político é a mesma:
oferecer uma descrição e explicação das causas ou conseqüências das várias políticas. Esta
informação pode ser útil para o formulador de políticas; no entanto, este uso é incidental
para o propósito de se construir um entendimento teórico mais abrangente sobre a ação
governamental. O cientista político tem o papel de cientista, não de advogado.

O modelo de sistema político concebido por David Easton foi especialmente


importante para o desenvolvimento de uma perspectiva de ciência política para a política
pública. Easton (1965, p. 110) argumentava que o sistema político consiste nos padrões de
interação dos atores políticos, das pessoas interessadas na “alocação oficial de valores” para

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a sociedade. Do ambiente afluem várias demandas e vários apoios para o sistema, que são
então convertidos em outputs, na forma de políticas públicas. Estes outputs são então
servidos ao ambiente e afetam os inputs futuros do sistema.

1.2. Responsividade e eficácia

Francis E. Rourke (1969) ofereceu ao estudioso de organizações públicas uma


análise cuidadosa da maneira pela qual a burocracia exerce sua influência sobre o processo
político. Rourke defendia que três fatores são centrais para a capacidade de um órgão
público influenciar o sistema. Em primeiro lugar, os órgãos públicos dependem de apoio
externo, do desenvolvimento de grupos de patronagem política que lhes dêem suporte na
promoção de seu ponto de vista. Este apoio pode vir de fora do governo – por exemplo, de
educadores que apóiam o Ministério da Educação ou de conservacionistas que apóiam o
Serviço Nacional de Florestas – ou de outros órgãos de dentro do próprio governo, como no
caso dos projetos interdepartamentais. Em segundo lugar, os órgãos públicos variam em seu
impacto sobre o sistema político, de acordo com o montante de informação ou espertise que
possuem. Esta espertise pode ser exercida, efetivamente, tanto pelos funcionários treinados
e experientes, que têm condições de influenciar os formuladores políticos da decisão
(incluindo os funcionários nomeados dentro da burocracia, como também os legisladores e
outros funcionários eleitos) ou pelos administradores que exercem discrição na aplicação de
sua especialização para a execução das políticas existentes. Em terceiro lugar, as
burocracias diferem em seu impacto, de acordo com as características internas dos órgãos,
especialmente a vitalidade da organização e a eficácia de sua liderança. Este ponto é
especialmente bem ilustrado pelas tradicionais contendas entre o Departamento de Estado e
o Departamento de Defesa, contendas que muitas vezes foram decididas pela habilidade de
um secretário de cobrar a posição de seu órgão. --- 115 ---

O trabalho de Rourke é importante, não apenas por esboçar as formas pelas quais os
órgãos públicos de fato influenciam os resultados das políticas, mas também por chamar a
atenção para as implicações éticas e políticas deste processo. Rourke observou duas
questões que interessam aos estudiosos do processo político: a respondência ou
responsividade, ou até que ponto o sistema “promove correspondência entre as decisões
dos burocratas e as preferências da comunidade ou dos detentores de cargos que presumem
falar pelo público;” e a eficácia, ou até que ponto as políticas propiciam decisões que “têm
mais probabilidade do que outras propostas de fazer acontecer os resultados ... desejados”
(p. 3). Mais tarde, neste capítulo, vamos examinar como cada uma destas questões foi
discutida pelos estudiosos de políticas públicas. No entanto, é importante observar, com
Rourke, que estes dois interesses, muitas vezes, se chocam entre si, e nenhum deles pode
ser tratado de forma isolada. Por exemplo, Rourke observou que o segredo, em matéria de
segurança nacional, potencialmente afeta tanto a responsividade quanto a eficácia. No caso
de John e Carol, apresentados no capítulo I, as questões de responsividade e eficácia eram,
não apenas centrais, mas estavam em aparente oposição. Em última análise, como veremos,
estas duas questões se fundem numa preocupação sobre o quanto os integrantes das
organizações públicas são de fato capazes de administrar processos de mudança voltados a
expressar valores societários. Como tais, estas duas questões estão no coração de toda
teoria de organizações públicas.

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2. RESPONSIVIDADE NA POLÍTICA PÚBLICA

A questão da respondência ou responsividade atraiu a atenção de uma ampla


variedade de acadêmicos e se estendeu a muitos assuntos. Com certeza, se a burocracia
pública influencia de modo substancial a política pública, bastaria considerar formas de se
garantir que as ações da burocracia reflitam os valores da sociedade. Mas o que significa
isso, exatamente? Significa que os integrantes das organizações públicas deveriam limitar
sua própria influência a assuntos de pouco impacto, procurando neutralidade e sempre
deferindo a outros? Significa que eles deveriam tentar corresponder ao humor dos
legisladores, na condição de supostos representantes do povo? Deveria isso ocorrer mesmo
onde o burocrata tivesse informações que lhe mostrassem que os legisladores estão
enganados numa certa questão? Ou deveriam os integrantes das organizações públicas
chegar a sua própria visão do que constitui o interesse público, quiçá a opinião da maioria,
medida por pesquisa de opinião ou outros procedimentos? Ou têm eles a responsabilidade
de liderar, em vez de seguir, de usar o seu conhecimento e especialização para agir em
favor do interesse público, mesmo quando o público não está aparentemente interessado? E
como se estas questões não fossem suficientemente difíceis, bastaria que as políticas
resultantes correspondessem aos valores da sociedade, ou deveria ser democrático o próprio
processo pelo qual elas são desenvolvidas?

2.1. A “moralidade democrática” de Redford

Emmet S. Redford enuncia bem a questão em seu livro Democracy in the


administrate state (1969). Redford argumenta que a moralidade democrática repousa sobre
três --- 116 --- questões-chave, devendo cada uma delas ser examinada à luz do impacto
substancial que têm as grandes organizações administrativas sobre o desenvolvimento da
política pública. Em primeiro lugar, a moralidade democrática supõe que a pessoa, o
indivíduo, é a medida básica de valor humano. É com base na realização da potencialidade
máxima do indivíduo que julgamos o nosso sistema político e social. Em segundo lugar, a
moralidade democrática reconhece que todas as pessoas têm direito total à atenção do
sistema. Diferenças em riqueza ou posição não são razões válidas para se conceder
vantagem indevida a um grupo ou a outro. Todas as pessoas são criadas iguais. Em terceiro
lugar, as demandas individuais podem ser melhor promovidas por intermédio do
envolvimento de todas as pessoas no processo de tomada de decisão, e a participação não é
apenas um valor instrumental, útil para a obtenção de outros fins, mas é essencial para o
desenvolvimento da cidadania democrática. O ideal da participação universal pode tomar
várias formas; no entanto, Redford indica algumas básicas: “Entre elas estão (1) o acesso à
informação, com base na educação, governo aberto, comunicação livre e debate franco; (2)
o acesso direto ou indireto a fóruns de decisão; (3) a capacidade de trazer qualquer questão
ao debate público; 4) a capacidade de expor suas reivindicações, sem medo de retaliação
coerciva; e ( 5) a consideração de todas as reivindicações feitas” (p. 8).

Em contraposição, as organizações grandes e complexas, que tanto dominam a


sociedade moderna, parecem marcadas por pressupostos muito diferentes: que o objetivo da
organização excede o propósito do desenvolvimento pessoal; que o arranjo de cargos
desiguais em forma hierárquica é o que melhor serve aos interesses da organização; e que a
participação tem valor limitado, sendo importante apenas num sentido instrumental, quando

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oferece informações adicionais para melhorar a qualidade da tomada de decisão, ou quando
melhora as possibilidades de uma implementação bem sucedida (DENHARDT, 1981).
Reconhecendo que estas organizações não apenas oferecem o cenário em que a maioria de
nós realiza suas vidas, mas também influenciam de uma maneira muito direta o
desenvolvimento de políticas públicas, poder-se-ia muito bem perguntar: Quais são os
perigos potenciais para a preservação da democracia? Nossos compromissos básicos com a
moralidade democrática foram afetados ou superados? Optamos agora por uma outra
moralidade organizacional? Se não, que medidas precisamos tomar para preservar os
princípios básicos da democracia? Embora estas questões possam (ou devam) ser dirigidas
a todas as organizações, quer tradicionalmente tidas como públicas ou como privadas,
Redford (1969) concentra sua resposta nos órgãos administrativos que formam parte direta
do governo. Estas organizações, afirma ele, foram construídas em torno de uma abordagem
estrutural-funcional, que resultou num sistema governamental de áreas programáticas
especializadas, cada qual com determinadas responsabilidades pela formulação e execução
de políticas, cada uma com especialistas dirigindo sua atenção para um conjunto bem
limitado de questões e cada uma patrocinada por grupos de interesse especializados. Além
disso, dentro destas organizações, nem todas as pessoas têm influência igual sobre as
decisões políticas. Os ocupantes dos cargos mais altos e os detentores de habilidades
profissionais particulares constituem uma pequena minoria que monopoliza o poder da
organização. As políticas, no entanto, raramente são o terreno de um indivíduo isolado, mas
resultam antes da interação de muitas pessoas e, de fato, de muitas organizações. Redford
conclui que “o alcance do ideal democrático, no mundo da administração, depende ... ---
117--- da inclusividade representativa dos interesses no processo de interação entre os
tomadores de decisão” (p. 44). Podemos concluir, juntamente com Redford, que o
crescimento do estado administrativo reestruturou, de fato, o problema da moralidade
democrática, mas não o tornou menos importante. Na medida em que estivermos
comprometidos com o ideal da democracia, o estado administrativo não atingirá jamais a
legitimidade, se não puder demonstrar sua capacidade de incrementar ou promover o valor
individual, a igualdade entre todos os cidadãos e a participação universal. É ao longo destas
linhas que devemos examinar a respondência das organizações públicas e os esforços
teóricos e práticos específicos para assegurá-la.

2.2. Modelação do caráter do (bom) burocrata

Falando em termos bem amplos, os teóricos da organização pública desenvolveram


duas abordagens diferentes para a questão da responsabilidade nos órgãos públicos. Uma
tenta garantir a responsabilidade, influenciando o caráter do burocrata por meio da
socialização, da formação ou de padrões profissionais. A outra, talvez um pouco menos
confiante na boa vontade dos burocratas, sugere mecanismos mais formais, variando de
pedidos para a representação de classe dos burocratas até o afastamento do cargo por justa
causa. Obviamente, estas duas abordagens não são mutuamente excludentes, na teoria ou na
prática. No entanto, as diferenças entre as duas são indicativas das complexidades
envolvidas para se garantir a responsabilidade nos órgãos públicos. Muitas das primeiras
tentativas para especificar o caráter requerido do servidor público tomaram sua deixa de
Appleby, que com freqüência repetia (e, aparentemente, demonstrava com seu exemplo) o
conjunto das qualidades pessoais mais convenientes, ou adequadas, para o serviço do
governo. Appleby (1945, p. 4) ansiava por uma “atitude especial de responsabilidade

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pública”, que seria transmitida aos que ingressassem no campo da administração pública,
quer por meio de seu background ou por sua formação. Esta atitude especial ia além das
qualidades em geral consideradas desejáveis em outros campos da gestão, como a eficácia
interpessoal, a habilidade para delegar, o foco sobre decisão e ação e o dinamismo pessoal.
Antes, ela tinha a ver com o “espírito democrático” – “o ... aliciamento de todas as energias
e capacidades das pessoas de uma organização; a obtenção de sua total e diligente
participação” (p. 46). Este mesmo espírito foi visado por Stephen K. Bailey (1966, p. 24),
para quem o trabalho de Appleby indicava que “os administradores precisam entender a
ambigüidade moral das políticas públicas, reconhecer os paradoxos e prioridades morais do
serviço público e precisam das qualidades morais de: “(1) otimismo; (2) coragem; e (3)
fairness temperada com caridade”. De maneira semelhante, Marshall Dimock (1936, p.
132) “ansiava por ... lealdade, bem como honestidade, entusiasmo, humildade e todos os
outros atributos de caráter e conduta que contribuem para um serviço eficaz e satisfatório”.
Obviamente, estas tentativas de explicitar as características desejadas do servidor público
permaneciam um tanto distantes da prática. Imediatamente surgiram questões e dilemas:
Como podemos garantir estas qualidades em nossos administradores? O que acontece
quando funcionários igualmente movidos por espírito público não se entendem? Para que
sejam significativas, de que modo se pode tornar suficientemente específicas expressões
como “fairness temperada com caridade” (BAILEY, 1966)? Até que ponto podemos confiar
na concepção de interesse público sustentada pelo próprio administrador?
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2.3. Padrões de responsabilidade

As respostas típicas dadas pelos primeiros autores de responsabilidade eram


consistentes com a abordagem da gestão administrativa: o burocrata devia responder
estritamente ao legislativo e ao executivo principal. Os centros específicos de autoridade e
responsabilidade deviam ser definidos e obedecidos. A responsabilidade era importante, era
mesmo central, para o serviço público, e devia ser encontrada “numa cadeia de comando
hierárquica”, explícita, que se estende sem interrupção aos chefes políticos dos órgãos e ao
Presidente, ao Congresso e ao público em geral” (APPLEBY, 1952, p. 250). Embora este
processo tenha se tornado mais difícil, numa grande democracia, pelo aumento dos níveis
de autoridade e responsabilidade, a resposta permaneceu em essência a mesma: a resolução
das questões críticas deve ocorrer numa autoridade central que responde politicamente ao
povo. Outros, no entanto, reconheceram a dificuldade desta abordagem. Para um
administrador particular, os centros concorrentes, e por vezes conflitantes, de poder e
responsabilidade, muitas vezes, desejam ser ouvidos, e podem variar em escopo e intenção
de uma decisão para outra. A questão da responsividade torna-se extremamente complexa e
o administrador pode, de fato, ser deixado a suas próprias preferências na formulação de
decisões políticas. Portanto, não basta apenas argumentar em favor de um conjunto abstrato
de virtudes a serem adotados por todos os “bons administradores”. No mínimo,
esperaríamos que alguma orientação geral fosse dada pela formação do administrador,
pelos padrões da profissão, ou pela referência a certos princípios gerais de justiça.

2.4. Responsabilidade objetiva vs subjetiva

Um debate clássico entre Carl Friedrich e Herman Finer centrou-se em torno de uma
questão semelhante: a diferença entre responsabilidade objetiva ou accountability a uma

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pessoa ou grupo e responsabilidade subjetiva, uma responsabilidade auto-sentida que faz
alguém comportar-se de uma maneira particular. Neste debate, Friedrich (republicado em
1972) tomou a posição de que a complexidade do governo moderno e a necessidade de
soluções criativas e não usuais para os problemas tornaram bem mais difíceis os
mecanismos objetivos específicos de controle. Cada vez mais, os administradores são
chamados a tomar decisões sem base em precedentes ou sem a orientação de uma instância
superior, mas com base em sua própria especialização técnica e sua própria compreensão
do “sentimento popular” (p. 320). Onde este for o caso, muitas vezes torna-se determinante
o próprio senso de responsabilidade do administrador, que John Gaus chamou de
“checagem interns” (p. 321). Felizmente, escreveu Friedrich, a crescente influência dos
profissionais no governo nos permite estar mais seguros, porque são profissionais bem
preparados e imbuídos do espírito de responsabilidade democrática que estarão atentos às
necessidades públicas. No caso especial de profissionais científicos, pode-se contar com a
companhia da ciência para manter um equilíbrio próprio entre competência e interesse.

Este mesmo sentimento foi manifestado mais tarde por Frederick C. Mosher (1968),
que também via que o governo estava cada vez mais entregue às mãos de profissionais. O
background e a formação deles e os padrões que adotavam seriam críticos para o futuro do
governo democrático. Mas como podemos ter certeza, perguntava Mosher, de que os
padrões das profissões são coerentes com os padrões da ---119--- democracia? Afinal de
contas, muitos profissionais tendem a se isolar do público, a se interessar por questões
técnicas em vez de humanas, a se voltar para o interesse próprio em vez de assumir o
espírito público. A resposta de Mosher residia na educação. Os valores dos futuros
profissionais seriam modelados em universidades, especialmente em escolas profissionais.
E, por intermédio de programas mais amplos, mais humanizados de educação profissional
para administradores, “as universidades oferecem a melhor esperança de tornar a profissão
segura para a democracia” (p. 219).

Mesmo supondo que os profissionais de espírito público são a melhor garantia e


esperança para se manter um governo democrático, podemos nos perguntar se as profissões
ou as escolas que preparam os profissionais assumirão de fato a iniciativa de comunicar e
fazer cumprir o senso da responsabilidade democrática. Sem dúvida, muitas profissões
estabeleceram códigos de ética ou padrões semelhantes de conduta profissional; mas ainda
não está claro se estas medidas contemplam os tipos de comprometimento com a
responsabilidade democrática por que esperavam Frederick e Mosher, e se elas são precisas
o suficiente para que sejam cumpridas de uma maneira significativa. De uma forma
semelhante, as universidades, especialmente as escolas de administração pública, estiveram
mais atentas nos últimos anos às questões de ética e responsabilidade em seus currículos.
Mas resta saber se estes esforços são meramente reações de curto prazo a eventos políticos,
como Watergate ou Irã-Contras, ou se terão uma influência mais sustentada sobre o
desenvolvimento dos profissionais do serviço público.

2.5. Estudos de ética

Nas últimas décadas, os estudos sobre ética no campo da administração pública


adotaram duas abordagens. Uma submeteu os estudantes aos tratados filosóficos sobre ética
e depois buscou aplicações para os problemas do setor público. Como foi mencionado no

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capítulo V, por exemplo, o trabalho de John Rawls foi adaptado para dar apoio a uma
preocupação com justiça e eqüidade no serviço público. Embora este trabalho filosófico
tenha a vantagem de uma considerável sofisticação, os estudiosos muitas vezes o rejeitam,
alegando que é obscuro e não tem relevância para os problemas públicos. Entretanto, um
entendimento completo da questão da responsabilidade democrática irá claramente requerer
que os teóricos e profissionais se preparem para se engajar seriamente nas questões éticas
levantadas pelos filósofos. Uma segunda abordagem – mais direta e acessível, embora um
pouco menos rigorosa que a primeira – é apresentada por John Rohr, em seu livro Ethics
for bureaucrats (1978). Rohr argumenta que os burocratas têm a obrigação ética de apoiar
o que ele chama de “valores do regime”. Já que “os burocratas prestaram juramento para
defender a Constituição que criou este regime e continua a defender simbolicamente seu
espírito e sentido”, eles devem buscar orientação na Constituição, ou, de forma mais
específica, nas interpretações que a Suprema Corte faz da Constituição, no exercício da
autoridade discricionária (p. 67). De forma clara, o exame das opiniões da Suprema Corte
daria um sentido mais específico a conceitos abstratos como justiça e igualdade, mas poder-
se-ia perguntar se a própria Suprema Corte sempre reflete as visões gerais dos cidadãos, ou
mesmo se deveria. Além disso, a Corte muda suas visões de tempos em tempos, e ainda que
---120--- o exame das razões destas mudanças seja útil para se entender os vários
argumentos envolvidos numa questão em particular, nem sempre a Corte oferece uma
orientação firme para o administrador. Finalmente, a Corte depende necessariamente de
precedentes, em sua revisão de casos, ao passo que os administradores, como foi observado
acima, muitas vezes, têm que tatear e mapear terreno inexplorado, não consultar ou
depender de precedentes, mas desenvolver abordagens inovadoras para os problemas
públicos. A orientação da Corte não seria especialmente útil nesses casos. Mais
recentemente, em To run a constitution, Rohr (1986) ampliou seu trabalho, mediante um
exame detalhado da legitimidade constitucional do estado administrativo, como prelúdio
para uma teoria normativa da administração pública num contexto constitucional. Para
Rohr, os órgãos de governo estão subordinados aos três poderes de governo, mas ao mesmo
tempo são capazes de contrabalançar os vários interesses aí expressos. Os administradores
públicos, que são atores-chave nesse ato pluralístico de balanceamento, são novamente
solicitados a sustentar a Constituição – a usar o “seu poder discricionário para manter o
equilíbrio constitucional dos poderes em apoio aos direitos individuais” (p. 181). Esta
posição é elaborada no livro mais recente de Rohr, Public service, ethics, and constitutional
practice (1998).

Outras explorações teóricas da ética administrativa variaram em suas abordagens.


Terry Cooper descreve The responsible administrator (1990) como “um prestidigitador que
manipula uma multiplicidade de obrigações e valores concorrentes” (p. 223). Cooper
discute quatro níveis de reflexão e deliberação sobre questões éticas: o nível expressivo,
que é guiado pelas emoções; o nível das regras morais, tomadas da organização ou da
sociedade mais ampla; o nível da análise ética, que envolve princípios morais; e o nível
pós-ético, em que se considera nossos pressupostos básicos sobre a natureza humana, o
conhecimento e a verdade. Perpassando estes níveis, estão questões de conduta responsável,
por um lado, e questões de autonomia individual, por outro. O problema do administrador é
combinar todos estes diferentes componentes de uma maneira que sirva para guiar a ação.
No livro Bureaucratic reponsibility (1986), John Burke explora como se pode tornar as
burocracias (e os burocratas) responsáveis à sociedade que servem. Burke argumenta que

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uma definição formal-legal de responsabilidade é desejável, mas marcada demais por
obediência à hierarquia e ao governo estrito da lei. Embora seja necessária esta orientação,
ela deve ser contrabalançada por “uma concepção de responsabilidade democraticamente
fundamentada” (p. 39). O administrador deve assumir uma postura de responsabilidade
individual que decorra de sua participação num sistema político democrático. Esta visão
pode então ser empregada em instâncias em que outros funcionários executam – ou deixam
de executar – suas obrigações, em instâncias que envolvem escolha política e tomada de
decisão e em instâncias que envolvem sua própria contribuição particular para o processo
político. Katryn G. Denhardt, no livro The ethics of public service (1988), procura colocar a
discussão da ética administrativa no contexto da tradição filosófica da ética, enquanto
sustenta, ao mesmo tempo, que esta orientação também deve fazer sentido para os
profissionais. O conceito dela pode ser enunciado da seguinte maneira: “A ética
administrativa é um processo de submeter padrões de decisão à crítica, de forma
independente, com base em valores sociais centrais, que podem ser descobertos dentro de
fronteiras organizacionais razoáveis e definíveis, sujeitos a accountability pessoal e
profissional” (p. 26). Esta ---121--- abordagem enfatiza o papel da reflexão e do diálogo na
formulação de decisões éticas, e é então discutida em termos das restrições individuais e
das impostas pela organização.

Num dos mais interessantes ensaios recentes sobre ética no serviço público, Patrick
Dobel (1990) sugere que a idéia da integridade pessoal pode reunir diversas justificativas
diferentes para o exercício da discrição – accountability de regime, responsabilidade
pessoal e prudência. No exercício da discrição pública, a accountability de regime tem peso
presumível, mas como as decisões, em última análise, são feitas por indivíduos, a
responsabilidade pessoal e a prudência são necessárias para se obter a accountability. Já
que nenhum dos três domínios será suficiente para todos os casos, o balanceamento e a
interação dos três darão ao administrador individual as orientações para o exercício da
integridade. A partir da sobreposição destes domínios de julgamento, Dobel (p. 363) sugere
à consideração do administrador público os seguintes sete compromissos, que se
sobrepõem: (1) Prestar contas, de forma verdadeira, a autoridades e públicos relevantes. (2)
Dar atenção aos valores públicos do regime. (3) Respeitar e construir instituições e
procedimentos visando atingir as metas. (4) Garantir a participação justa e adequada dos
stakeholders relevantes. (5) Tentar desempenho competente na execução da política e do
programa. (6) Trabalhar em prol da eficiência na operação do governo, o que contribui para
construir a legitimidade do regime, revela-se verdadeiro com os propósitos básicos e a
origem dos fundos públicos e reforça as preocupações de conscienciosidade e competência.
(7) Conectar a política e o programa com o auto-interesse do público e dos participantes, de
modo a não subverter os propósitos básicos.

2.6. Limitações da responsabilidade subjetiva

De qualquer forma, continua a busca por maneiras de garantir que os profissionais


do governo, inclusive os administradores profissionais, mantenham o senso de
responsabilidade democrática. Mas, como meio de garantir o interesse público, esta
abordagem à questão da responsividade tem algumas limitações. O argumento de Finer, de
40 anos atrás, vem à mente: deixar as coisas nas mãos e mentes dos burocratas individuais,
quer profissionais ou não, pouco faz para garantir responsividade à vontade do povo. Com

10
certeza, alguns membros das organizações públicas, talvez até uma maioria, atuarão com o
interesse correto pelas normas da democracia, mas outros podem não fazê-lo. Seja por
razões de vantagem pessoal ou, simplesmente, por um senso mal orientado de suas
obrigações e responsabilidades profissionais, uma minoria pode atuar sem consideração
pelo interesse público e, conseqüentemente, causar dano a este interesse. Para Finer (1972,
p. 328), a questão era simples. “Devem os servidores do público decidir seu próprio curso,
ou deve seu curso de ação ser decidido por um corpo externo a eles?” Ele optou pela
última: deve-se permitir e, de fato, deve-se esperar que os legisladores ofereçam uma
definição precisa de sua intenção, com base numa consideração cuidadosa da evidência
técnica disponível e que exerçam uma freqüente revisão da implementação da política.
Somente por meio da supervisão e do controle da burocracia pelos funcionários eleitos,
pode-se alcançar responsividade para com o eleitorado O senso de responsabilidade
subjetiva pode parecer suficiente, mas, de fato, são necessários meios mais objetivos de
accountability para se preservar os ---122--- interesses da sociedade contra os caprichos
ocasionais de profissionais do governo. Não se questiona a responsabilidade moral na
teoria, mas na prática a responsabilidade política se impõe.

Embora o argumento de Finer seja exagerado, especialmente com respeito à


capacidade do legislativo de lidar com os elementos específicos (ou até mesmo a
desejabilidade de que ele o faça), sua análise sugere que se deva examinar métodos
institucionais mais formais para promover a responsabilidade. Duas dessas abordagens – a
burocracia representativa e a participação pública – receberam atenção especial, em anos
recentes, e servem para ilustrar a importância teórica desta questão. (Dar destaque a estas
duas abordagens, porém, não diminui a importância prática de outras reformas, que podem
variar de programas de ombudsman e comissões de ética a leis de reuniões abertas).

2.7. Burocracia representativa

Os defensores da burocracia representativa, uma expressão aparentemente cunhada


por J. Donald Kingsley (1944), argumentam que as decisões que têm origem nos órgãos
burocráticos chegarão mais perto dos anseios do público, se os funcionários destes órgãos
constituírem um extrato representativo das características demográficas da população geral.
Kingsley esperava que o serviço público britânico, menos elitista e menos avesso a classes,
limitaria a possibilidade da dominação burocrática por parte das classes média e superior do
país. Seria especialmente difícil a situação em que um partido representando interesses de
uma classe inferior chegasse ao poder, mas fosse bloqueado, em seus esforços de reforma
por uma burocracia pública recalcitrante. Como a noção de burocracia representativa foi
aplicada à experiência americana, ela deu maior foco a questões de raça, sexo e background
étnico, embora sugerindo ainda que as pessoas de grupos particulares representariam os
interesses destes grupos na condição de membros de órgãos públicos. Por diversas razões, a
lógica da burocracia representativa parece um tanto falha. Por exemplo, estudos sobre as
preferências políticas do serviço público superior indicaram que é fraca a correlação entre o
background e a atitude. Não se pode supor que as pessoas que procedem de um grupo
particular vão de fato representar os interesses deste grupo. Elas podem representar a
própria burocracia ou os grupos profissionais dos quais eles são parte, em vez dos
interesses de seu grupo demográfico. Por todas estas razões, a questão da burocracia
representativa é bem mais complicada do que, às vezes, parecem se dar conta os seus

11
defensores (por exemplo, KRISLOV, 1974). Embora a burocracia representativa tenha
limitações, como meio de garantir responsividade, não devemos ser levados a questionar a
necessidade de envolver uma ampla extensão de grupos no processo governamental.
Argumentar, como fazem alguns, que os programas de ação afirmativa – que visam a
aliciar, reter e promover minorias e mulheres – não garantem a representatividade da
burocracia não é razão suficiente para restringir estes programas. Em primeiro lugar,
embora estas pessoas talvez não representem os interesses de seu grupo demográfico em
todas as questões, elas podem, na verdade, representar estes interesses em questões-chave,
checando assim os potenciais excessos da maioria. Além disso, o envolvimento dessas
pessoas sinaliza aos outros, de forma simbólica tanto quanto prática, que ---123--- os
centros de tomada de decisão estão acessíveis e – embora não se possa esperar que os
órgãos públicos necessariamente respondam de forma automática aos interesses dos grupos
que antes estiveram em desvantagem – que estes órgãos podem ser influenciados. Pelo
menos alguém deve estar disposto a ouvir.

2.8. Envolvimento do cidadão e implicações da responsividade

Um dos desenvolvimentos mais interessantes no campo da política pública durante as


últimas décadas, foi a abertura do processo de políticas para múltiplos interesses,
organizações e repartições públicas. Se o governo era antes o único e principal ator na
produção da política pública, hoje há muito mais atores envolvidos. Desde pequenas
organizações sem fins lucrativos, de nível local, até grandes organizações multinacionais,
como a Organização Mundial do Comércio (OMC), muitos grupos de organizações se
integraram ao processo político. Isso ocorreu por diversas razões. Em primeiro lugar, o
caráter mais fluido do mercado, e especialmente a globalização do mercado, criaram novos
problemas e novas pressões. Em segundo lugar, houve devolução da responsabilidade por
serviços – que eram tradicionalmente governamentais – para níveis inferiores do governo e
para organizações com e sem fins lucrativos. Em terceiro lugar, os avanços na tecnologia de
informação tornaram as informações mais facilmente disponíveis a um grande número de
grupos e organizações. O governo já não tem mais o monopólio nesta área.

Com estas condições, os mecanismos tradicionais de controle governamental do


processo político já não são mais praticáveis – ou mesmo possíveis. Em seu lugar, houve
uma disseminação do poder entre várias “redes” políticas. Hoje, o governo está envolvido
no processo político lado a lado com muitos outros atores – empresas, associações,
organizações sem fins lucrativos e cidadãos em geral. Por esta razão, faz cada vez mais
sentido falar-se, não apenas sobre governo, mas sobre “governança”. A governança pode
ser definida como as tradições, instituições e processos que têm a ver com o exercício do
poder na sociedade (PETERS, 2001). O processo de governança tem a ver com a maneira em
que as decisões são tomadas na sociedade e como os cidadãos e os grupos interagem na
formulação dos propósitos públicos e na implementação da política pública. Hoje, o
processo de governança envolve muitos grupos e organizações diferentes.

Sob estas circunstâncias, é extremamente importante para os administradores


públicos darem atenção ao envolvimento dos cidadãos na governança. Para lograr a
participação pública foram envidados, obviamente, esforços significativos, no início da
década de 1960. A história do movimento pela “máxima participação viável”, ou a

12
“participação ampla dos cidadãos” foi bem documentada e não precisa ser analisada
extensamente aqui. Embora a idéia da participação pública tivesse alguns precedentes
históricos e uma firme base intelectual, sua incorporação na versão final da Lei de
Oportunidade Econômica de 1964 rendeu um impulso especial à idéia no país. Mas a
prática de envolver os pobres nos esforços antipobreza logo se tornou uma questão
extremamente volátil, sobretudo nos casos em que a participação ativa dos pobres levou a
uma confrontação com as estruturas existentes de poder. Entretanto, quando estes conflitos
foram reconhecidos, o princípio da participação pública parecia bem estabelecido. Outros --
-124--- órgãos já haviam começado a seguir a liderança da Agência de Oportunidade
Econômica e a trabalhar em favor do envolvimento do cidadão. Em 1966, a noção do
envolvimento público no planejamento e na execução de programas foi incorporada ao
Demonstration Cities Act, uma iniciativa, pelo menos em parte, consistente com a
correspondente prática anterior de renovação urbana que contava com o envolvimento
público em termos consultivos. Igualmente, os conselhos locais das escolas começaram a
reconhecer a necessidade da descentralização e do envolvimento de estudantes, professores
e pais na operação dos sistemas escolares. No nível universitário, as demandas estudantis
pelo envolvimento na tomada de decisão das universidades estavam no coração do ativismo
estudantil do final da década de 1960 e início da década de 1970.

Em todos estes casos, no entanto, continuaram a aparecer questões sobre se o poder


real estava sendo mudado para os representantes dos clientes ou se o poder real permanecia
com quem havia controlado anteriormente as atividades da organização. Por exemplo,
formariam os detentores do poder alianças para manter seu controle sobre os representantes
dos clientes, ou as habilidades e o conhecimento técnico de que dispunham permitir-lhes-
iam continuar a dominar os grupos de clientes? Em muitos casos, os representantes dos
clientes – se não estavam politicamente preparados para participar em órgãos de tomada de
decisão – muito rapidamente conquistaram habilidades, a ponto de sua voz ter sido muitas
vezes eficaz, mesmo contra chances avassaladoramente poderososas. Ademais, o poder
destes representantes era provavelmente exagerado. Mas, em muitas casos em que se tentou
a cooptação, os participantes reagiram de maneira tão forte que lhes rendeu poder real e
significativo. (Voltaremos a esta questão do engajamento cívico no capítulo 7).

Caso se busque a responsividade mediante a seleção de tipos particulares de pessoas


que venham a integrar as organizações públicas, ou mediante a imposição de controles
externos sobre seu comportamento, deve-se reconhecer que a questão da responsividade é
central à toda a teoria moderna da organização pública. Se as organizações públicas por
definição tentam expressar valores societários, então seus membros carregam a
responsabilidade de examinar, entender e interpretar os valores públicos ao máximo de sua
capacidade. Além disso, entretanto, poder-se-ia argumentar que os integrantes das
organizações públicas têm a responsabilidade de ajudar o público a articular suas
necessidades, a identificar carências importantes, embora muitas vezes ocultas, e a
expressar o desejo por sua solução. Neste sentido, a noção da responsividade vai além de,
simplesmente, reagir aos valores que são publicamente enunciados; envolve uma certa
força de liderança para trazer à baila questões para exame, debate e possível solução. Mas
nossa discussão sobre a responsividade tem ainda outra implicação: é que a responsividade,
numa sociedade democrática, não envolve apenas buscar fins socialmente desejáveis, mas
fazê-lo de uma maneira que seja consistente com valores democráticos. Esta posição

13
significaria, por exemplo, que não se busque justiça por meios injustos. Também poderia
significar que não se busque fins democráticos por meio de organizações não democráticas
(elitistas, hierárquicas e autoritárias). Para satisfazer todos estes critérios, precisaríamos de
uma teoria de administração democrática muito diferente das que atualmente encontramos
na literatura de administração pública. No entanto, há algumas indicações de trabalhos em
andamento sobre esta teoria; alguns exemplos serão apresentados mais tarde nesse capítulo
e no próximo. Mas, antes, precisamos analisar a questão da eficácia.
---125---
Os integrantes das organizações públicas têm a responsabilidade de ajudar o público
a articular suas necessidades, a identificar carências importantes, ainda que muitas
vezes ocultas, e a expressar o desejo pela solução delas.

3. EFICÁCIA NA POLÍTICA PÚBLICA

Além de seu interesse pela responsividade, os estudiosos de política pública também


estiveram atentos à eficácia das decisões políticas e das ações tomadas para implementar
estas decisões. Esta seção focaliza o campo da análise das políticas como uma abordagem
que propicie melhores decisões políticas; a seção seguinte examina um conjunto especial da
literatura que trata da responsividade e da eficácia, em seu estudo dos processos de
implementação. Não se faz aqui um resumo do trabalho no campo geral da política pública.
Pelo contrário, identificam-se vários temas proeminentes neste campo, temas que parecem
influenciar, da forma mais direta, as teorias de organização pública em desenvolvimento.
Em termos específicos, enfoca-se a política pública, no contexto do sistema político mais
amplo, e as abordagens contemporâneas para a análise e avaliação da política pública.

3.1. “Liberalismo de grupo-de-interesse”, de Lowi

Em contraste com os estudiosos que estimulam processos mais representativos de


administração, Theodore Lowi, no livro The end of liberalism (1969), argumenta que, em
sua essência, a responsividade depende do restabelecimento da eficácia no governo. Lowi
advoga que a vasta expansão do governo, na década de 1960, aconteceu porque o sistema
político sucumbiu aos interesses dos grupos organizados na sociedade, que foram capazes
de impor seus pontos vista ao governo. O governo, por sua vez, assumiu responsabilidade
pelos programas tentados por estes grupos e criou enormes repartições para executar estes
programas. Estes órgãos, afirma Lowi, assumiram um poder discricionário desproporcional,
embora tenham sido capazes de justificar seu poder, alegando que representavam a vontade
popular. Para Lowi, esta situação solapa a formalidade e o direcionamento necessários ao
planejamento efetivo da política; ela exige o desenvolvimento de uma democracia bem
mais legalista ou “jurídica”. Lowi encontra as raízes de nossa abordagem atual ao governo
no início do século 20, numa época em que os valores do capitalismo prevaleciam, a ponto
da exclusão quase total do poder do povo. Embora a industrialização da sociedade tivesse
produzido benefícios materiais para alguns, ela também criou problemas que não conseguiu
resolver. O insucesso do capitalismo, no sentido de garantir a ampla gama de benefícios
sociais que prometera, condenou-o, eventualmente, à morte como filosofia pública. Seu
sucedâneo, que Lowi chama de “liberalismo de grupos-de-interesse” emergiu de duas
fontes relacionadas, alimentando-se uma da outra. A primeira foi o interesse cada vez maior

14
pela racionalidade nos processos sociais e políticos, uma racionalidade modelada pelos
desenvolvimentos na tecnologia e na organização industrial. A racionalização da sociedade,
que Weber ---126---havia discutido, estava bem ilustrada na América Industrial, com sua
ênfase na hierarquia e na divisão do trabalho. Mas a racionalização também significava
controle, a capacidade de regulamentar e ordenar as atividades humanas tanto quanto as
mecânicas. Seguindo esta lógica, o interesse pela prerrogativa individual foi logo
substituído por um interesse pelo controle social. No governo, esta tendência deu apoio a
um papel mais “positivo” para o governo, um papel pelo qual o governo atuaria como
contrapeso para os excessos potenciais da administração e do trabalho, da tecnologia e da
industrialização. Esta nova atitude, chamada estatismo, começou, especialmente no período
do presidente Roosevelt, a dominar o pensamento da maioria dos líderes políticos neste
país. Uma segunda tendência, que afetaria o desenvolvimento de uma nova filosofia
pública, foi a ascensão de muitos grupos organizados concorrentes, cada um promovendo
seu próprio interesse especial. Havia grupos organizados do trabalho e da administração,
mas também grupos raciais e étnicos, associações de comércio, grupos de consumidores e
até organizações religiosas. O próprio governo era um grupo de interesse, talvez o mais
importante, mas mesmo assim apenas mais um entre muitos. E, em todos os casos, a
ascensão da administração ofereceu apoio especial. Todos os grupos tinham em comum um
interesse pela administração e pela organização; todos tentaram impor estruturas e
processos administrativos a suas operações internas e ao máximo que podiam de seu
ambiente. O grupo transformado em organização pela administração tornou-se agora o
centro de atenção; conseqüentemente, a interação dos grupos e organizações tornou-se
muito mais importante. Na verdade, a competição de mercado foi sendo cada vez mais
substitída pela competição dos grupos, ou pluralismo. A combinação destas duas
tendências – o estatismo e o pluralismo – levou à ascensão do liberalismo do grupo-de-
interesse, que Lowi define da seguinte maneira (1969, p. 51): “É liberalismo, porque é
otimista em relação ao governo, espera usar o governo num sentido positivo e expansivo, é
motivado pelos sentimentos mais elevados e possui uma crença forte, segundo a qual o que
é bom para o governo é bom para a sociedade. É liberalismo de grupo-de-interesse, porque
vê que é ao mesmo tempo necessária e boa a agenda política que é acessível a todos os
interesses organizados e não faz julgamento independente de suas demandas”.

3.2. Coerção governamental

Em outro lugar, Lowi (1974) define quatro funções do governo: regulatória, redistributiva,
distributiva e constitutiva. Estes quatro tipos são derivados das diferenças na coercividade
do poder governamental: a coerção pode ser tanto remota quanto imediata; ela pode ser
aplicada diretamente, ou pode funcionar por meio do ambiente. As políticas que envolvem
coerção imediata e direta são chamadas regulatórias. As políticas regulatórias previnem
que os indivíduos ultrapassem limites aceitáveis de comportamento e vão desde leis
criminais que controlam o comportamento individual até proibições federais de práticas de
trabalho injustas e segurança no local de trabalho. As políticas redistributivas aplicam
coerção imediata, mas o fazem por meio do ambiente. Elas implicam, tipicamente, tributar
um grupo, a fim de prover benefícios para outro – por exemplo, por meio de assistência
social, serviço de saúde e política habitacional subsidiada. As políticas distributivas, que
são as mais comuns no governo federal, envolvem coerção remota da conduta individual.
Estas políticas usam receitas gerais de impostos para atender a necessidades individuais,

15
como subsídios agrícolas (que oferecem benefícios, se certas ações forem tomadas),
pesquisa ambiental e seguro governamental (como, por exemplo, seguro contra inundação).
---127--- As políticas constitutivas empregam coerção remota, aplicada por meio do
ambiente. Estas são especialmente difíceis de se definir, indo desde políticas como a
repartição proporcional das verbas – que atingem o cidadão apenas indiretamente – até
políticas como defesa nacional, que vêem o governo como um cliente para o qual as
repartições prestam serviço. Embora os órgãos de governo influenciem todos os tipos de
políticas, seu impacto sobre as áreas cada vez mais importantes da política regulatória e
redistributiva é sentido de forma mais clara onde eles põem informações, expertise e apoios
especiais à disposição dos clientes – isto é, onde eles coletam os recursos principais do
liberalismo de grupo-de-interesse. Mas a coerção requer legitimação, o que o liberalismo de
grupo-de-interesse busca “pela evitação da lei ... pela partilha do poder de formular política
pública com participantes privados” e pela promoção de uma nova ideologia de
representação (LOWI, 1969, p. 44). Esta ideologia procura aplicar noções de papel popular a
um governo mais ativo e mais coercivo e, especialmente, aos órgãos administrativos por
meio dos quais exerce seu poder (p. 63). O legislativo já não é mais o principal órgão de
formulação de políticas; ao invés, o desenvolvimento das políticas foi transferido para os
órgãos de implementação. A regulamentação formal e oficial foi substituída por um sistema
de barganha e negociação. “O liberalismo combateu o privilégio na formulação da política,
apenas para fomentá-lo de um modo bem sistemático na implementação da política” (p.
297). Este governo não pode ser responsivo nem eficaz. A resposta de Lowi é uma nova
ênfase na sanção legislativa e na regulamentação administrativa que codificaria o máximo
possível de relações, eliminando assim a necessidade de discrição e a barganha e
negociação que ela permite. Obviamente, esta solução não faz mais que combater fogo com
fogo; ela exige mais regulamentação sistemática e detalhada (ou racionalização) como cura
para os males da regulamentação (ou racionalização). Além disso, ela afirma o papel do
corpo legislativo, mas o faz de uma maneira que criaria mais outro grupo de interesse, o
próprio legislativo; para atuar segundo a forma compreensiva e detalhada sugerida por
Lowi, o legislativo obviamente necessitaria de muito mais pessoal e apoio administrativo.
Mas estas preocupações são de importância menor do que o endosso implícito dado por
Lowi ao governo da elite, ao governo de uns poucos privilegiados que detêm as rédeas do
poder e enfrentam apenas limitadas restrições institucionais para o exercício deste poder.
Neste sentido, a representação é, na melhor das hipóteses, um fenômeno de ano eleitoral,
menos importante do que o esforço de centralizar e formalizar o poder do governo em
busca de uma maior eficácia governamental. Como os fins do governo e o envolvimento
popular para determinar estes fins acabam sendo tomados como dados e como Lowi se
concentra nos meios para atingir estes fins, ele acaba oferecendo a mesma visão de
sociedade administrada preconizada pelos teóricos da gestão administrativa – uma visão em
que os poderes centralizados procuram não apenas lograr racionalidade, mas, na realidade,
defini-la.

4. DESCOBERTA DA IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS

Da mesma forma que Lowi é crítico do papel dos órgãos governamentais na implementação
de políticas, outros aceitaram este papel como indiscutível e procuraram entender como os
esforços de implementação poderiam redirecionar o curso pretendido da política
governamental. ---128--- Na medida em que os estudiosos do processo político

16
examinavam com mais cuidado a questão da eficácia – isto é, a capacidade da política de
fazer acontecer os resultados desejados – tornou-se claro (como observou Lowi) que não
bastava simplesmente enunciar uma política por decreto legislativo ou por ordem executiva.
Assim como as políticas não são formuladas no vácuo, elas também não são executadas no
vácuo. Pelo contrário, a execução da política pública é afetada por um conjunto complexo
de fatores ambientais. Além disso, mesmo na ausência relativa de influências ambientais,
os órgãos burocráticos encarregados de executar as políticas particulares, às vezes,
simplesmente, não o fazem. Por alguma razão – recursos limitados, estruturas
organizacionais inadequadas, comunicações ineficazes ou coordenação precária – as
políticas dos formuladores de políticas não são postas em prática nos termos pretendidos.
Estes limites à execução da política pública foram discutidos num corpo crescente de
literatura sobre implementação de políticas.

Assim como as políticas não são formuladas no vácuo, elas também não são
executadas no vácuo. Pelo contrário, a execução da política pública é afetada por um
conjunto complexo de fatores ambientais.

Este novo interesse pelos problemas de implementação tem diversas implicações


importantes para o desenvolvimento de uma teoria de organizações públicas: ele sugere
atenção maior para importantes influências ambientais ou interorganizacionais sobre o
trabalho organizacional; e ele coloca o estudo da administração pública num contexto mais
amplo de tomada de decisão pública, reconhecendo assim o papel da burocracia pública na
expressão dos valores públicos. No entanto, por outros caminhos, o estudo da
implementação de políticas representa uma regressão no estudo das organizações públicas:
a distinção entre formulação de políticas e implementação de políticas faz um paralelo
perfeito com a dicotomia entre política e administração, e a aceitação sem crítica desta
distinção por muitos estudiosos do processo político não reconhece o papel da burocracia
como modeladora de valores públicos, como também não lida com as questões da
accountability democrática levantada pela atividade. Além disso, a aparente ingenuidade de
alguns estudiosos da implementação de políticas, com respeito aos desenvolvimentos
ocorridos na administração pública nos últimos 30 a 40 anos, deixa seu trabalho se
parecendo mais com o trabalho dos primeiros estudiosos da gestão administrativa do que
com o trabalho de autores mais recentes e sofisticados.

4.1. Formação e execução de políticas

Um dos primeiros estudos a usar o foco da implementação foi o livro de Jeffrey


Pressman e Aaron Wildavsky, Implementation: how great expectations in Washington are
dashed in Oakland; or, why it’s amazing that federal programs work at all (1973). O livro
Implementation é uma longa descrição e análise de um programa de desenvolvimento
econômico particular na área de Oakland, Califórnia, que, como o título indica, foi algo
menos que um sucesso total. O ponto básico de Pressman e Wildavsky parece ser que uma
relação simples entre ---129--- formação e execução de uma política é enganosa. Por
exemplo, eles concluem que, neste caso, “o que parecia ser um programa simples, revelou-
se uma iniciativa muito complexa, envolvendo muitos participantes, uma grande quantidade
de perspectivas diferentes e um longo e tortuoso caminho de pontos de decisão que tinham

17
de ser esclarecidos” (p. 94). Mesmo os que pareciam programas razoavelmente precisos e
diretos, tinham muitos interesses distintos e competitivos, que representavam pontos de
vista amplamente divergentes sobre muitos tópicos diferentes, ainda que inter-relacionados.
Em muitos pontos, estes interesses minavam o processo de implementação. A resposta de
Pressman e Wildavsky a esta constatação está intimamente ligada a uma discussão algo
confusa sobre a relação entre a formação e a implementação de políticas. Usando uma
linguagem notavelmente semelhante à de Frank Goodnow, mais de 50 anos antes, Pressman
e Wildavsky (1973, p. xix) argumentam que a política e a implementação podem ser
separadas para fins analíticos: “Implementação... significa executar, atingir, cumprir,
produzir, completar. Mas o que é que está sendo implementado? Uma política,
naturalmente”. Mas Pressman e Wildavsky (1973, p. 143) também sustentam que a
implementação não deve ser separada da política e, de fato, que muitos problemas
encontrados no projeto de Oakland poderiam ter sido evitados, se tivesse se evidenciado
uma maior preocupação com a implementação no momento da formulação dos programas
originais: “Como o entendemos, o grande problema é tornar as dificuldades de
implementação uma parte integrante da formulação inicial da política”. Uma maneira de
fazer isso seria estabelecer de saída sistemas que minimizem o número de ingerências no
processo de implementação, por exemplo, reduzindo o número de pontos de checagem
necessários. Uma segunda maneira de incorporar considerações sobre implementação na
formulação original de uma política “seria dar a mesma atenção à criação da máquina
organizacional destinada a executar um programa que a dada a seu lançamento” (p. 144-
145). Em ambos os casos, parece ser necessário que os formuladores de políticas
reconheçam as dificuldades da implementação e tomem medidas para reduzir a
possibilidade de interferência por parte de terceiros que poderiam desejar influenciar o
rumo do programa. Enunciando esse ponto, em termos mais radicais, poder-se-ia dizer que,
contra os caprichos de um sistema aberto (democrático), a melhor proteção é o
enclausuramento. Mas, obviamente, resolver a dicotomia entre formação e implementação,
pela concessão de maior controle aos formuladores de políticas, é uma solução que reduz a
influência dos grupos locais e regionais. E, naturalmente, o que é um fracasso de
implementação para uma pessoa pode ser uma vitória da democracia para outra. Assim
como é inegável o interesse pela implementação efetiva, que está por trás da posição de
Pressman e Wildavsky, da mesma forma é difícil de se ignorar a solução pela gestão
administrativa que eles oferecem. Pôr mais decisões de valor nas mãos dos formuladores de
políticas não supera a dicotomia entre formulação e implementação; apenas muda seus
termos. As decisões são tomadas pelos que são encarregados e são executadas pelos que
são subordinados – apenas mais uma versão da distinção entre política e administração.

4.2. Jogos praticados pelos formuladores de políticas

Um contraste interessante ao interesse de Pressman e Wildavsky pelo controle é


oferecido no livro de Eugene Bardach, The implementation game (1977). Bardach --130--
também está preocupado com os múltiplos interesses representados na combinação de
relações federais, estaduais e locais e com os interesses que ligam o setor público, em todos
os níveis, aos grupos e organizações privados e semi-privados. Ao ver as interações de
todos esses grupos, Bardach reconhece algumas limitações para se tentar encontrar
processos políticos mais efetivos por meio de um maior controle centralizado, e, em vez
disso, recorre à metáfora dos jogos, para descrever o processo pelo qual ocorre a

18
implementação. Seguindo a metáfora “dos jogos que as pessoas praticam”, Bardach analisa
os vários tipos de barganha e negociação que ocorrem no processo de implementação. O
resultado é uma visão mais clara e mais conceitual do processo de implementação e,
especialmente, dos jogos que interferem na execução efetiva das políticas públicas. Por
exemplo, Bardach observa que a política (politics) da implementação, que se diferencia
pela existência de uma política (policy), é por isso altamente defensiva. Mas um parágrafo
final talvez seja o mais revelador. Aqui Bardach coloca o estudo da implementação em
perspectiva, comentando: “Os problemas mais importantes que afetam a política pública
não são, certamente, os da implementação, mas os das teorias política, econômica e social
básicas” (p. 283).

4.3. Fatores políticos e econômicos

Enquanto muitos estudos de implementação de políticas se concentraram nas inter-


relações entre os vários órgãos e interesses representados no processo político, outros
focalizaram as características de órgãos específicos que influenciam sua habilidade para
tornar efetivos os resultados desejados. No livro The political economy of public
organization (1973), Gary Wamsley e Mayer Zald procuram situar as organizações
públicas num contexto político e econômico que lhes seja apropriado, para em seguida
examinar suas operações internas e “as conseqüências da estrutura e do processo
organizacionais para a implementação de políticas” (p. 11). Embora o trabalho deles não
consiga cumprir a pretensão um tanto grandiosa de estabelecer “uma teoria empírica
sistemática de administração pública” (p. 93) – significando, em vez disso, pouco mais que
uma forma conveniente de descrever e categorizar vários aspectos da vida organizacional –
sua diretividade e simplicidade se mostraram bastante atraentes para alguns estudiosos do
processo político. O uso limitado feito por Wamsley e Zald do termo economia política
simplesmente sugere que as organizações, especialmente as públicas, são influenciadas
tanto por fatores políticos quanto econômicos.

Os fatores políticos são, em geral, reconhecidos na tradição pluralista como os


valores estabelecidos a cujo acordo se chegou pela interação do poder e do interesse; os
fatores econômicos são os que focalizam o mercado e sua troca de bens e serviços. Vê-se,
então, que os fatores políticos e econômicos afetam tanto os aspectos internos quanto os
externos de funcionamento da organização. A justaposição das dicotomias de política-e-
economia e de interna-e-externa resulta numa classificação de estrutura e processo
organizacionais, em quatro células, por meio da qual Wamsley e Zald propõem analisar as
operações das organizações públicas. O ambiente político externo é muito parecido com o
discutido em outros estudos sobre implementação de políticas; ele refere-se à interação de
grupos amplamente auto-interessados e órgãos públicos tanto dentro quanto fora do
governo, na medida em que afetam os esforços de qualquer organização particular voltados
a alcançar seus objetivos. O ambiente econômico, ---131--- por outro lado, focaliza as
características de entradas (inputs) e saídas (outputs) da organização: o que ela toma do
ambiente em termos de pessoal, recursos, e assim por diante, e o que ela devolve ou retorna
ao ambiente e à estrutura industrial mais ampla, da qual faz parte (Wamsley e Zald, 1973,
p. 21). A política interna refere-se à estrutura de poder e autoridade institucionalizada
dentro da organização bem como às demandas feitas à esta estrutura de poder. (Anthony
Downs, em seu livro Inside bureaucracy [1967], também detalha este poder

19
organizacional). A economia interna também envolve padrões de autoridade, mas sobretudo
padrões associados à efetivação da tarefa: “Ela enfoca antes os meios organizacionais do
que a definição das metas” (WAMSLEY e ZALD, 1973, p. 22).

5. MÉTODOS PARA ANÁLISE POLÍTICA

Embora Lowi e os teóricos da implementação divirjam em relação a vários assuntos,


eles concordam em dois pontos-chave: a formulação de políticas é crucial para o processo
governamental e deve, portanto, ser centralizada e racionalizada. A moderna análise
política dirige seus esforços para responder a estas necessidades em seu exame da ação
social. Mas, ao longo dos últimos anos, a análise política mostrou-se ser ela mesma uma
força social de certa importância. O movimento da análise de políticas públicas – que, com
suas próprias redes e organizações, revistas e monografias, certamente é um movimento
maior do que jamais aspirou a ser a Nova Administração Pública – representa a
personificação do pensamento sobre política pública neste país. A mensagem do
movimento é clara: a chave para um governo eficaz é a especificação dos meios mais
racionais para se alcançar os objetivos dos órgãos; os métodos da ciência social positiva são
os mais capazes de especificar estes meios; e os indivíduos treinados no uso destes métodos
(analistas políticos, não administradores) serão os mais competentes para orientar o futuro.
Embora muitos, obviamente, vejam com simpatia este desenvolvimento, existem
claramente certos perigos na aplicação da análise política a todas as fases da vida social e
política. Para os nossos fins, há o perigo ainda maior de que o método possa ser elevado ao
status de um modelo ou de uma teoria da organização pública.

Pelo menos três problemas vêm prontamente à mente. Em primeiro lugar, a análise
política promove uma aceitação não crítica das metas existentes. Ao concentrar-se sobre os
meios de atingir os fins dados, a análise política, como outras ciências instrumentais, desvia
a atenção da exploração dos próprios fins. Os valores societários são tomados como certos
e congelados no tempo, em vez de serem tomados como produtos da interação humana.
Este ponto de vista, obviamente, reforça os valores vigentes na sociedade, fazendo com que
a mudança não seja garantida ou até mesmo possível. Mas mesmo que a mudança fosse
possível, não haveria padrões normativos para guiar nossas ações. O mundo do
instrumentalismo não faz provisão para a consciência moral.

Em segundo lugar, a preocupação com a objetificação leva o analista a considerar


apenas os tópicos que podem ser analisados nos termos do próprio método. Por exemplo,
um proeminente analista político (SCIOLI, 1979, p. 42) argumentou em nome de “uma nova
consciência” entre os analistas, uma consciência que lhes permitiria operar em termos de
“objetivos e resultados mensuráveis”. Presumivelmente, as políticas que não podem ser
mensuradas objetivamente não devem ser empreendidas. O resultado ---132--- é que o
método começa a estruturar as relações sociais das políticas, em vez de refleti-las. Este
ponto foi advogado, de forma eloqüente, por Peter DeLeon (1992), que argumenta que a
análise política e a avaliação de programas devem se tornar mais relevantes para a
cidadania, devem se tornar algo que possa ser alcançado somente pela “democratização” da
análise política. “A idéia é aumentar a participação dos cidadãos na articulação e na
formulação dos programas de política pública. Pede-se que os analistas políticos imaginem
e pratiquem ativamente formas de aliciar e incluir visões pessoais dos cidadãos no processo

20
de formulação de políticas” (p. 127). DeLeon parece reconhecer o que os outros estudiosos
de políticas negligenciaram – que a própria legitimidade de sua disciplina está em jogo.

Em terceiro lugar, a análise política procura resolver a dicotomia entre teoria e


prática, forçando a prática a ajustar-se à teoria, em vez de vice-versa. DeLeon desenvolve
seu argumento de forma mais minuciosa em seu livro mais recente Democracy and policy
sciences (1997). Muitos estudiosos abordaram a questão da teoria-e-prática procurando
formas alternativas de conceituar esta relação, um esforço examinado com mais detalhe no
próximo capítulo. Entretanto, se a teoria e a prática divergem, uma outra resposta é
desenvolver uma prática que corresponda à teoria – neste caso, produzir um conjunto de
analistas, em toda parte do governo, que tenham lealdade profissional ao método científico.
Esta parece ser exatamente a intenção do movimento da análise política. O movimento
demanda uma nova profissão de analistas políticos racionais e práticos, que se estende das
universidades e centros de estudos políticos (think tanks) a todas as áreas da burocracia
governamental e até mesmo aos salões do Congresso (ver Meltsner, 1980, p. 249). Os
novos analistas devem ser racionais, no sentido de serem totalmente treinados nas técnicas
da ciência social positiva e na sua aplicação a assuntos humanos. Eles devem ser práticos,
no sentido de corresponderem aos interesses da burocracia (e aceitando, presumivelmente,
sua definição de objetivos e problemas). Se, como disse Waldo, o pensamento instrumental
tende a estender seu poder a todos os domínios da atividade humana, então os modernos
analistas políticos são alguns de seus agentes principais e não tão invisíveis.

6. A CRISE INTELECTUAL

As implicações dessa crítica serão exploradas mais tarde, quando examinarmos o


que veio a ser chamada “a Nova Gestão Pública” (APG). Neste ponto, no entanto, devemos
voltar ao argumento feito no início desse capítulo: de que o estudo da política pública –
embora pregando uma promessa importante de avanços em nosso entendimento da
organização pública – em grande parte deixou de corresponder a sua promessa. Uma
possível exceção a essa avaliação é o trabalho de Vincent Ostrom. Entretanto, mesmo aqui
os resultados são mistos. De um certo modo, Ostrom representa o melhor dos estudos sobre
política pública – ele está interessado nos valores sociais e políticos fundamentais, ele
entende alguma coisa sobre a relação entre esses valores e a organização dos órgãos
públicos e busca uma ampliação das normas democráticas nas operações das organizações
públicas. Ao mesmo tempo, ---133--- seus compromissos metodológicos parecem impedi-
lo de levar sua análise tão longe quanto poderia de outra forma. Mas, levando-se tudo em
conta, Ostrom oferece um material importante para o estudioso da organização pública e
seu trabalho deve ser examinado com certo cuidado.

6.1. Elementos-chave da teoria da opção pública

Ostrom (Ostrom e Ostrom, 1971) procura afastar-se do que ele vê como uma
preocupação com a burocracia na administração pública americana, buscando uma
concepção mais ampla de ação coletiva. Ele sugere que a corrente dominante da teoria de
administração pública, desde Wilson até pelo menos Simon, esteve por demais interessada
na eficiência dos processos administrativos, numa eficiência em geral buscada por meio de
mecanismos de centralização e controle. O resultado foi uma “crise intelectual” na

21
administração pública americana, em que os teóricos e profissionais careciam de um senso
claro de identidade bem como de confiança para lidar com os problemas cada vez mais
difíceis que hoje enfrentam (p. 205). Ostrom busca uma solução para esta crise
contemporânea no trabalho dos teóricos da opção pública. Este trabalho baseia-se em três
elementos-chave, sendo o primeiro o conceito de “individualismo metodológico”, a
presunção de que o indivíduo – isto é, um tomador individual de decisão representativo – é
a unidade básica de análise. Presume-se que o tomador de decisão individual, por ser na
maioria de seus aspectos comparável ao “homem econômico” clássico – é auto-interessado,
racional e procura maximizar suas próprias utilidades. Por “auto-interessado”, Ostrom quer
dizer que cada indivíduo tem preferências distintas que podem diferir das preferências dos
outros; por racional, Ostrom quer dizer que os indivíduos podem ordenar ou escalonar
opções alternativas de uma maneira transitiva; por “maximização”, Ostrom supõe uma
estratégia em que o indivíduo busca o máximo benefício líquido em toda situação de
decisão (p. 205). À semelhança do “homem administrativo” de Simon ou do “homem
econômico” clássico, o tomador de decisão individual de Ostrom não representa o
comportamento de um indivíduo particular, mas é indicativo do que se poderia esperar que
o indivíduo racional (ou predominantemente racional) faria, dadas certas condições.
(Observe que Ostrom não critica este aspecto do trabalho de Simon, mas apenas considera
infeliz que ele não tenha estendido seu conceito para além das fronteiras da organização,
para assim abarcar toda a ação coletiva).

Uma segunda característica da teoria da opção pública está na “conceituação dos


bens públicos como o tipo de evento associado com produção de órgãos públicos” (p. 205).
Os bens públicos se distinguem dos bens privados (os que podem ser medidos,
comercializados), em virtude do fato de serem altamente indivisíveis. Um bem público
oferecido a uma pessoa ou grupo estará disponível para o uso de todos. Por exemplo, uma
vez que se proporcione segurança nacional para alguns cidadãos num país, ela é
proporcionada a todos. Em algum lugar entre os bens públicos e os privados situa-se uma
gama de situações intermediárias, em que a produção e o consumo de bens e serviços
envolvem efeitos excessivos, ou “externalidades”, que não são contidos nos mecanismos
normais de mercado. Em sua busca por estas várias formas de bens ou benefícios, os
indivíduos inventam estratégias diferentes. Entre estas, os indivíduos poderiam, em certas
circunstâncias, formar empresas para se engajarem em uma ação coletiva que, em sua
visão, resultaria em ---134--- benefícios individuais. “Os órgãos públicos não são vistos,
simplesmente, como unidades burocráticas que desempenham os serviços que alguém do
topo os instrui a desempenhar. Pelo contrário, os órgãos públicos são considerados um
meio para alocar habilidades de tomada de decisão, para oferecer bens e serviços públicos
que correspondam (sejam responsivos) às preferências dos indivíduos em diferentes
contextos sociais” (p. 207).

O terceiro traço do trabalho na opção pública é a idéia de que diferentes tipos de


estruturas de decisão (regras ou arranjos de tomada de decisão) terão diferentes efeitos
sobre o comportamento dos indivíduos que buscam estratégias de maximização. Para o
estudioso da organização pública, a questão-chave é: o indivíduo esperaria ter mais
vantagem com uma única estrutura burocrática integrada ou com um arranjo
multiorganizacional? Seguindo a lógica da opção pública, Ostrom opta pela segunda
conclusão: “Caso se possa especificar um domínio relevante para a provisão de um bem ou

22
serviço público de forma que os indivíduos que são potencialmente afetados possam ser
contidos dentro das fronteiras de uma jurisdição apropriada e não transbordem
externalidades sobre outros – então pode-se operar uma empresa pública com substancial
autonomia”, admitindo-se a proibição contra os poderes coercivos usados para privar certas
pessoas de seus direitos (p. 211). Obviamente, esta solução está em desacordo com o que
Ostrom percebe que é a visão dominante na administração pública americana, que enfatiza
a centralização e o controle. Ao contrário, a análise de Ostrom sugere um arranjo
constitucional que retrataria arranjos multiorganizacionais com jurisdições se sobrepondo e
fragmentação de autoridade operando em muitos níveis diferentes de governo. (De forma
interessante, Ostrom encontra amplo apoio histórico para esta visão do sistema federal nas
obras dos fundadores da república (founding fathers), embora ele reconheça que outras
interpretações tenham atribuído um ponto de vista mais centrista).

6.2. Teoria da “administração democrática”

O que Ostrom extrai do trabalho dos teóricos da opção pública é um argumento em


favor do desenvolvimento de arranjos multiorganizacionais no setor público que se
assemelhem a empresas que operam com independência considerável e se baseiem em
grande medida na mobilização do apoio de clientes. Como unidade básica, a empresa
operaria, em seu nível mais baixo, de modo consistente com a natureza de seu trabalho.
Onde externalidades transbordariam sobre outros domínios, poder-se-ia recorrer a um
segundo nível de organização, e assim por diante; os arranjos de tipo transferência ou verba
de ajuda poderiam ser usados para facilitar a relação entre os vários níveis e entre as
unidades interrelacionadas no mesmo nível. Nesta visão, as noções de hierarquia e
centralização – há muito tempo centrais para a administração pública predominante – já não
parecem funcionáveis em todas as situações. De fato, elas já não parecem constituir os
mecanismos mais eficientes para a distribuição de bens públicos. Em seu lugar, Ostrom
(1974, p. 111-112) propõe a teoria da “administração democrática”. Como substituição ao
paradigma wilsoniano, que Ostrom repudia como inconsistente com os ideais da
democracia, uma teoria de administração democrática transferirá a atenção de “um cuidado
com a organização para os interesses pelas oportunidades que os indivíduos podem
perseguir num ambiente multiorganizacional” (1974, p. 132). Apoiado por uma ---135---
nova análise política que enfocaria as limitações dos arranjos organizacionais existentes, a
teoria da administração democrática garantiria, finalmente, a flexibilidade e responsividade
que originalmente foram parte do sonho americano. (Ostrom elaborou sua visão da opção
pública na segunda edição do livro The political theory of a compound republic [1987],
oferecendo um novo exame do pensamento de Madison e Hamilton para apoiar sua tese de
um governo descentralizado e orientado pelo mercado. De forma não surpreendente,
Ostrom descobre que o “sistema administrativo preferido” é o sistema que oferece uma
grande variedade de opções a seus “consumidores” e que é composto, superposto,
fragmentado e competitivo). O trabalho de Ostrom oferece uma justaposição fascinante de
diversos temas importantes na teoria dá administração pública, em certo sentido virando de
ponta cabeça o modelo racional de administração. Ostrom aceita os mesmos pressupostos
da racionalidade clássica, que foram usados nos trabalhos dos teóricos anteriores para
apoiar o poder hierárquico centralizado; no entanto, ao levar a lógica da decisão racional ao
extremo, Ostrom chega a conclusões muito mais democráticas. Neste sentido, sua crítica do
trabalho anterior sobre teoria da administração pública é muito mais radical do que as

23
críticas de muitos teóricos das relações humanas que argumentam em favor de mudanças
cosméticas no estilo de gestão enquanto pouco fazem para mudar a distribuição real do
poder organizacional. De maneira semelhante, enquanto aparentemente aceita o movimento
analítico dos modernos estudos políticos, Ostrom coloca a análise política a serviço da
crítica, e não de justificação, das estruturas organizacionais existentes. Ao fazê-lo desta
forma, ele leva o estudo da política pública de volta a seu papel mais antigo e fundamental
de expressar os valores societários básicos. De maneira muito importante, enquanto
claramente publica dentro da tradição da teoria da administração pública, Ostrom se
movimenta dentro como fora da unidade de análise padrão, a organização, para considerar a
reforma das estruturas sociais por cujo intermédio distribuímos bens públicos e para
descobrir como se se poderia fazer as novas empresas correponderem (serem responsivas)
às preferências dos indivíduos.

6.3. Intercâmbio entre Ostrom e Golembiewski

Apesar de seu apelo científico e ético, o trabalho de Ostrom deixa várias questões
importantes sem resposta. Estas questões, essenciais a uma teoria compreensiva da
organização pública, foram longamente discutidas num intercâmbio entre Ostrom (1977) e
Golembiewski (1977). Embora não seja necessário repetir aqui este debate, cabe resumir
seus pontos principais. O primeiro é empírico: o pressuposto da racionalidade clássica
sacrifica o ator individual por um construto metodológico que até os próprios teóricos da
opção pública admitem que não reflete de forma exata a realidade. Eles argumentam, com
efeito, que se esperaria isto ou aquilo, se as pessoas fossem racionais. Mas as pessoas reais
somente se aproximam da racionalidade de tempos em tempos. Fazer proposições teóricas
dependerem de pressupostos que apenas remotamente correspondem à realidade levanta
sérias questões sobre a validade destas proposições. O que é desenvolvido é uma
progressão lógica com base em hipóteses não testadas e improváveis sobre como o ser
humano realmente se comporta. Norton Long (citado em Golembiewski, 1977, p. 1492)
defende este ponto de forma precisa, concluindo que os teóricos da opção pública
“argumentam com ---136--- lógica elegante e impecável sobre unicórnios”. Em todo caso,
esta abordagem se concentra sobre a racionalidade, com o efeito de excluir as outras
dimensões importantes da experiência humana. Por que não presumir um modelo
normativo e tentar derivar a base moral para a administração democrática? Por que não
focalizar o sentimento ou a intuição, que são aspectos tão importantes da humanidade
quanto a racionalidade? A resposta provavelmente está no pressuposto de um modelo
econômico de decisão e seu foco sobre a maximização de utilidade. Os teóricos da opção
pública nos aconselham a nos concentrarmos sobre a distribuição de mercado dos serviços
e bens econômicos e, por outro lado, sobre a forma como os indivíduos e os grupos
maximizam a busca de seus próprios objetivos. Mas este enfoque tem implicações
importantes. A dependência do modelo econômico não só elimina outras bases de decisão,
como as considerações emocionais ou políticas, mas também presume que os fins que
buscamos estão bem estabelecidos e não sujeitos à mudança. Em suma, o trabalho de
Ostrom é muito menos rígido e estreito do que o trabalho de outros estudiosos que
trilharam a ênfase da política na administração pública. De fato, ele parece nos convidar a
considerar seriamente uma abordagem fenomenológica ou crítica, que é também tão radical
quanto sua inversão do modelo racional. Exatamente esta abordagem despertou o interesse
de um grupo de teóricos que recentemente tentou ir além do modelo racional de

24
administração em suas muitas variantes e construir um entendimento crítico da vida em
organizações públicas. Mas antes precisamos examinar o último desdobramento da
orientação pela política, uma conseqüência que integra análise e implementação.

7. A NOVA GESTÃO PÚBLICA (APG)

O que é hoje chamado de “a Nova Gestão Pública” [ou, no Brasil, Administração


Pública Gerencial (APG)] tem suas raízes em desenvolvimentos práticos na administração
pública de todo o mundo, no conjunto de idéias em geral referidas como a “reinvenção do
governo” e numa ligação conceitual com a política pública e, em especial, com a
perspectiva da opção pública na teoria da administração pública.

Em nível prático, a crise fiscal da década de 1970 levou a uma variedade de


esforços para produzir um governo que “funciona melhor e custa menos”. As medidas de
austeridade fiscal, os esforços para melhorar a produtividade pública e as experimentações
com mecanismos alternativos de prestação de serviços, incluindo terceirização e
privatização – todos podem ser vistos como se estivessem alicerçados no que alguns
chamaram de “racionalismo econômico”, um esforço visando encontrar soluções para os
problemas governamentais com base na análise econômica. Ao mesmo tempo, os
administradores públicos interessados em accountability e alto desempnho começaram a
reestruturar seus órgãos burocráticos, a redefinir suas missões organizacionais, a organizar
fluxos integrados de fluência linear para os processos das repartições e a descentralizar a
tomada de decisão.

O melhor exemplo da Nova Gestão Pública, no contexto internacional, talvez possa


ser visto nas reformas administrativas promovidos pela Nova Zelândia. Tentando lograr
organizações públicas mais eficazes, o governo privatizou funções públicas substanciais,
reconstruiu seu sistema de funcionalismo público para que os executivos superiores fossem
mais orientados para a performance, instituiu um novo processo para mensurar a
produtividade e a eficácia dos órgãos de governo e promoveu a reengenharia ---137--- dos
sistemas departamentais para refletir o comprometimento do governo com a accountability
(Ostrom, 1996). A eficácia da agenda de reforma da Nova Zelândia, assim como o sucesso
de atividades semelhantes no Canadá, Grã-Bretanha e Estados Unidos levaram os governos
de todo o mundo a se darem conta de que em toda a parte se buscava novos padrões e se
estabelecia novos papéis.

Estas idéias foram particularmente bem captadas por David Osborne e Ted Gaebler,
em seu livro Reinventing government (1992; ver também OSBORNE e PLASTRICK, 1997).
Osborne e Gaebler ofereceram dez princípios por intermédio dos quais “os empreendedores
públicos” poderiam realizar uma reforma governamental de peso, princípios que
permanecem no cerne da Nova Gestão Pública:

1. Governo catalisador: Dirigir em vez de remar – Os empreendedores públicos ...


decidem dirigir o barco governamental, reconhecendo ampla gama de possibilidades e
chegando a um equilíbrio calculado sobre recursos e necessidades, ao invés de remar, ou
concentrar-se sobre um único objetivo (OSBORNE e GAEBLER, 1992, p. 35).

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2. Governo da comunidade: Instigar o poder do cidadão em vez de servi-lo – Os
empreendedores públicos ... transferem a propriedade de iniciativas públicas à comunidade.
Eles promovem o poder dos cidadãos, dos grupos vicinais e das organizações comunitárias,
para que sejam as fontes de suas próprias soluções (OSBORNE e GAEBLER, 1992, p. 52).
3. Governo competitivo: Introduzir competição na prestação de serviço – Os
empreendedores públicos (fomentam) competição entre provedores públicos, privados e
não governamentais de serviços. Os resultados são eficiência maior, responsividade elevada
e um ambiente que premia a inovação (OSBORNE e GAEBLER, 1992, p. 80-83).
4. Governo guiado por missão: Transformar órgãos dominados por regras
burocráticas – Os empreendedores públicos primeiramente enfocam a missão do grupo – à
que a organização dedica seu esforço, interna e externamente. Em seguida, planejam
orçamento, recursos humanos e outros sistemas para espelhar a missão geral (OSBORNE e
GABLER, 1992, p. 110).
5. Governo orientado por resultados: Financiar resultados, não recursos – Os
empreendedores públicos acreditam que o governo deve se dedicar a alcançar metas
públicas substantivas, ou resultados, em vez de se concentrar, estritamente, em controlar os
recursos públicos gastos para executar a tarefa. Os empreendedores públicos transformam
estes sistemas para torná-los mais voltados a resultados (OSBORNE e GAEBLER, 1992, pp.
140-141).
6. Governo voltado para o consumidor: Satisfazer o consumidor, não a burocracia –
Os empreendedores públicos aprenderam de seus colegas no setor privado que, a menos
que se ponha o foco no consumidor, o cidadão jamais será feliz (OSBORNE e GAEBLER,
1992, pp. 166-167).
7. Governo empreendedor: Gerar receitas em vez de despesas – Ao introduzir o
conceito do motivo ou propósito de lucro no domínio público – por exemplo, depender de
tarifas ou taxas como contraprestação pelos serviços públicos e de investimentos para
financiar iniciativas futuras – os empreendedores públicos conseguem agregar valor e
assegurar resultados, mesmo em tempos de restrições financeiras (OSBORNE e GAEBLER,
1992, pp. 203-206). ---138---
8. Governo previdente: Melhor prevenir que remediar – Os empreendedores
públicos se cansaram de canalizar recursos para programas destinados a resolver problemas
públicos. Em vez disso, eles acreditam que se deve preocupar acima de tudo com a
prevenção, estancando o problema em sua origem (OSBORNE e GABLER, 1992, pp. 219-
221).
9. Governo descentralizado: Da hierarquia à participação e ao trabalho em equipe –
Os avanços na tecnologia de informação, as melhorias nos sistemas de comunicação e os
aumentos de qualidade na força de trabalho propiciaram uma nova era de organizações
mais flexíveis e baseadas em equipes. A tomada de decisão foi estendida a toda a
organização – confiada àqueles que conseguem inovar e determinar cursos de alta
performance (OSBORNE e GAEBLER, 1992, pp. 250-252).
10. Governo orientado pelo mercado: Induzir mudança via mercado – Os
empreendedores públicos respondem a condições de mudança, não com abordagens
tradicionais, como tentar controlar toda a situação, mas antes com estratégias inovadoras
que visem modelar o ambiente de modo a permitir que as forças de mercado atuem. Assim,
a estratégia deles gira em torno de reestruturar o ambiente, de modo que o mercado possa
operar da forma mais eficaz, assegurando desta forma qualidade de vida e oportunidade
econômica (OSBORNE e GAEBLER, 1992, pp. 280-282).

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Osborne e Gaebler pretendiam que estes 10 princípios servissem como um novo
marco conceitual para a administração pública – um cheklist para transformar as ações do
governo. “O que estamos descrevendo é nada menos que uma mudança no modelo básico
de governança usado na América. Esta mudança está acontecendo em toda a nossa volta,
mas como não estamos olhando para ela – porque supomos que todos os governos devem
ser grandes, centralizados e burocráticos – raramente a vemos. Estamos cegos para as novas
realidades, porque elas não se enquadram em nossas preconcepções” (OSBORNE E
GAEBLER, 1992, p. 231).

Com base na experiência dos governos de todo o mundo e nas diretrizes oferecidas
por Osborne, Gaebler e outros, o governo federal dos Estados Unidos, sob a liderança do
presidente Bill Clinton e do vice-presidente Al Gore, iniciou um esforço pesado para
melhorar a performance do governo no nível federal, por meio do que foi chamado de
National Performance Review. Em muitos governos estaduais e locais, foram empreendidos
esforços semelhantes para tornar mais simples e eficientes as operações de governo, pelo
uso dos princípios da “reinvenção”.

Na medida em que estes eventos foram se desdobrando, desenvolvia-se uma


justificação intelectual mais forte em favor da Nova Gestão Pública (APG). Esta
justificação, como observa Laurence Lynn, em seu excelente resumo do livro Public
management as art, science and profession (1996), em grande parte, veio das escolas de
“política pública”, que se desenvolveram na década de 1970, e do movimento
“gerencialista” em todo mundo. Christopher Pollit identificou cinco crenças essenciais do
gerencialismo (ou Nova Gestão Pública):

1. O principal caminho para o progresso social depende agora da conquista de


aumentos contínuos de, produtividade, em termos econômicos. ---139---
2. Este aumento de produtividade advirá principalmente da aplicação de tecnologias
cada vez mais sofisticadas.
3. A aplicação dessas tecnologias só pode ser lograda com uma força de trabalho
disciplinada de acordo com o ideal da produtividade.
4. A administração é uma função organizacional separada e distinta, uma função que
exerce um papel crucial para o planejamento, a implementação e a mensuração das
melhorias necessárias à produtividade.
5. Para cumprir este papel crucial, deve-se dar aos administradores um “espaço de
manobra razoável” (isto é, “o direito de administrar”) (POLLIT, 1990, pp. 2-3).

Numa descrição ainda mais prática, Linda Kaboolian observa que a Nova Gestão
Pública advoga tecnologias administrativas como o serviço ao consumidor, a contratação
baseada em desempenho, competição, incentivos de mercado e desregulação. Os arranjos
típicos de mercado – como a competição entre as unidades do governo e entre o governo e
os setores externos, com e sem fins lucrativos, os bônus de desempenho e as penalidades –
enfraquecem a franquia ineficiente do monopólio dos órgãos públicos e dos funcionários
públicos” (KABOOLIAN, 1998, p. 190; ver também KETTL, 2000; POLLIT & BOUCKERT,
2000; BARZELAY, 2000; DiIULIO, 1994; KETTL & MILWARD, 1996; LIGHT, 1997; KEARNS,
1996; e PETERS, 2001). Em conseqüência, a Nova Gestão Pública (APG) enfatiza

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abordagens como a privatização, a mensuração do desempenho, o planejamento estratégico
e outras abordagens gerencialistas. Obviamente, há implicações deste movimento para a
eficiência governamental, mas há também implicações para as questões de responsividade.
Christopher Hood escreve que a Nova Gestão Pública se afasta das formas tradicionais de
se legitimar a burocracia pública, tais como ... as salvaguardas contra a discrição
administrativa e a favor da “confiança no mercado e nos métodos dos negócios privados. ...
As idéias ... [são] cunhadas na linguagem do racionalismo econômico” (HOOD, 1995, p.
94). De uma forma semelhante, escreve Donald Kettl, “pode-se dizer, em grandes
pinceladas, que estas reformas tentaram substituir os processos tradicionais, baseados em
regras e dirigidos por autoridade, por táticas baseadas em mercado e dirigidas por
competição” (KETTL, 2000, p. 3). Kettl elabora a agenda com o objetivo de encaminhar as
seguintes questões:

1. Como podem os governos encontrar formas de extrair mais serviços a partir da


mesma base de receita ou de uma base até menor?
2. Como podem os governos usar incentivos de mercado para acabar com as
patologias da burocracia? Como se pode substituir os tradicionais mecanismos
burocráticos de comando-e-controle por estratégias de mercado que mudarão o
comportamento dos gestores de programas?
3. Como podem os governos usar mecanismos de mercado para dar aos cidadãos
(agora, muitas vezes, chamados de “consumidores”) maiores opções de serviço –
ou, pelo menos, estimular o pessoal a servir melhor os consumidores?
4. Como podem os governos tornar os programas mais responsivos? Como podem
descentralizar a responsabilidade para dar aos gestores da linha de frente maiores
incentivos para servir? ---140---
5. Como pode o governo melhorar sua capacidade de conceber e acompanhar política
pública? Como pode o governo separar seu papel como comprador de serviço
(contratante) de seu papel como efetivo prestador de serviço?
6. Como podem os governos focalizar outputs e resultados, em vez de processos ou
estruturas? Como podem eles substituir sistemas hierárquicos governados por
regras por sistemas de baixo-para-cima e voltados para resultados? (Adaptação de
Kettl, 2000, pp. 1-2).

7.1. Algumas limitações da Nova Gestão Pública

O que é importante para nossos propósitos, a respeito do movimento da reinvenção


e de seu sucessor, a “Nova Gestão Pública” (APG), é que estas perspectivas promoveram as
reformas administrativas no governo não apenas pela introdução de novas técnicas (embora
esta tenha ocorrido), mas também pela imposição de um novo conjunto de valores,
especificamente um conjunto de valores em grande parte tomados do setor privado. Como
vimos, existe uma tradição de longa duração na administração pública que defende a idéia
de que “o governo deve ser tocado como um negócio”. De modo geral, esta recomendação
significou que os órgãos de governo devem adotar as práticas julgadas úteis no setor
privado, ou seja, desde a “administração científica” até a “administração da qualidade
total”. O movimento da reinvenção e a Nova Gestão Pública levam esta idéia um passo
adiante, argumentando que o governo não só deve adotar estas técnicas da gestão de
negócios, mas deve adotar também certos valores de negócios.

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Entre estes valores, o movimento da reinvenção e a Nova Gestão Pública
endossaram idéias como o valor da competição, a preferência pelos mecanismos de
mercado para a decisão social e o respeito pelo espírito empreendedor. Ao adotarem estas
idéias, eles se apóiam pesadamente em “primos intelectuais (como) a teoria da opção
pública, a teoria do agente principal e a análise do custo de transação”. E o fazem sem pejo.
Nas páginas da Public Administration Review, John Kamensky, um dos mais perspicazes
arquitetos da National Performance Review, associa o movimento da reinvenção
diretamente à teoria da opção pública, invocando o neozelandês Jonathan Boston, nos
seguintes termos: “O princípio central da abordagem da opção pública é que todo
comportamento humano é dominado pelo auto-interesse” (KAMENSKY, 1996, p. 251). De
forma correta, Kamensky observa que “as teorias da opção pública tendem a rejeitar
conceitos como ‘espírito público’, ‘serviço público’ e assim por diante”. E, no entanto, são
estas as teorias que habitam o coração da “Nova Gestão Pública”.

O movimento da reinvenção e a Nova Gestão Pública argumentam que o governo deve, não só
adotar as técnicas da administração de negócios, mas deve também adotar certos valores dos
negócios – idéias como o valor da competição, a preferência pelos mecanismos de mercado
para a decisão social e o respeito pelo espírito empreendedor.

Vários destes compromissos merecem comentários adicionais. Em primeiro lugar,


segundo Osborne e Gaebler (1992, cap. 10), o modelo de mercado deve ser aplicado
principalmente a prestadores de serviço, não a órgãos de política ou órgãos regulatórios. ---
141--- Sempre que possível, o modelo de mercado aplicado ao governo promoveria
competição entre os setores públicos e privados, competição entre empresas privadas que
concorrem a contratos públicos, competição entre órgãos públicos (por exemplo, entre
escolas públicas) e competição entre unidades governamentais que prestam serviço a
“consumidores” internos. É interessante observar que o modelo de mercado, nos termos em
é entendido aqui, não é um “livre mercado” puro. Na realidade, ele depende de uma
competição administrada ou regulamentada em que o governo retém para si a autoridade e
responsabilidade de estabelecer as regras que governam as transações. Poder-se-ia dizer que
ele é uma conjunção de gestão e mercado.

Em todo caso, subjacente ao modelo de mercado governamental, há um artigo de fé,


uma crença de que o jogo livre das forças de mercado levará os participantes auto-
interessados – indivíduos, grupos sociais, repartições públicas, empresas – a um equilíbrio
que representa, de alguma maneira, o máximo bem social alcançável. Ele implica que os
participantes podem servir ao interesse público simplesmente concentrando-se sobre o
próprio auto-interesse. Mesmo sob condições de regulamentação, a força orientadora é o
auto-interesse, a força segundo a qual os participantes perseguirão seu auto-interesse de
forma competitiva, em vez de tentar descobrir um interesse público geral e colaborar para
atingi-lo. A força básica do mercado, o que Adam Smith chamou de sua “mão invisível”,
opera sem um direcionamento deliberado. De fato, segundo esta visão, não é sequer
necessário para a operação dos mercados que os indivíduos estejam conscientes ou levem
em conta os interesses dos outros. A força motora principal do mercado é vista como
autocorretora e também como a mais provável de lograr resultados societários benéficos.

29
Ninguém pode afirmar que a competição não produz benefícios em algumas
situações. Nos esportes, nos negócios e até na natureza, a competição muitas vezes é
propícia a avanços positivos. Usando lógica semelhante, os defensores da reinvenção
argumentam que os programas governamentais orientados pelo mercado têm muitas
vantagens em relação aos programas convencionais. São descentralizados, competitivos e
sensíveis às condições que são paasíveis de mudança; eles empower os consumidores ao
exercício de opções e associam recursos diretamente a resultados; e eles permitem que os
governos alavanquem seu poder, obtendo mudanças fundamentais pela aplicação
estratégica de incentivos. Quer se aplique à contratação de serviço pelo governo, à escolha
de escola para filhos, ou à seleção de moradia para pessoas de baixa renda, a recomendação
do movimento da reinvenção é consistente – deixar o fluxo da maré do mercado orientar,
não só as decisões individuais, mas, em última análise, o rumo de toda a sociedade.

Em segundo lugar, e intimamente relacionado com a ênfase sobre o modelo de


mercado, o movimento da reinvenção e a Nova Gestão Pública enfatizam a idéia do
“governo voltado para o consumidor”. Segundo Osborne e Gaebler, os governos dirigidos
pelo consumidor devem ouvir atentamente seus consumidores, devem oferecer-lhes opções
de escolha de prestadores alternativos de serviços (isto é, criar competição) e devem
prover-lhes recursos necessários à seleção de seus próprios prestadores de serviço.
Novamente, no entanto, estas idéias vão além de melhorar a qualidade do serviço do
governo e, na verdade, representam uma preferência por um governo que, em última
análise, responde aos auto-interesses de curto prazo de indivíduos isolados (consumidores),
em vez de um governo que apóie a busca de interesses públicos definidos publicamente,
por meio de um processo deliberativo (cidadãos). ---142---

Ninguém, certamente, questionaria a idéia de que o governo deve oferecer a seus


cidadãos o serviço de melhor qualidade, dentro das restrições da lei e dos recursos
disponíveis. Na realidade, os esforços feitos por órgãos individuais e por governos inteiros,
no sentido de melhorar a qualidade do serviço, mostraram-se bastante benéficos. Por
exemplo, uma ordem do executivo federal exigiu que os órgãos federais definissem com
mais clareza quem eram seus consumidores internos e externos e que estabelecessem e
satisfizessem padrões mais elevados de qualidade do serviço. Na Grã-Bretanha, o
movimento da Carta dos Cidadãos, não só exigiu padrões mais elevados de qualidade do
serviço, mas também exigiu “compensação” aos cidadãos, quando estes padrões não eram
atendidos. De maneira semelhante, muitos governos estaduais e locais nos Estados Unidos
e no exterior estão mostrando esforços para melhorar o serviço ao consumidor.

Existem, no entanto, várias dificuldades com a noção de serviço ao consumidor.


Obviamente, as funções variadas do governo não representam produtos uniformes ou
mesmo uma “linha de produtos”, como se pode encontrar nas empresas de negócios. Pelo
contrário, o trabalho do governo é extremamente diverso, na forma em que se origina, na
forma em que é executado, produzido, e na forma em que é recebido. Alguns serviços,
naturalmente, como as notificações de trânsito ou o aprisionamento de alguém, nem sequer
são serviços desejados por seu ‘beneficiário’ imediato. Por estas razões, a relação entre os
integrantes das organizações públicas e seus “consumidores” é muito mais complexa do
que a relação entre quem está atrás de um quiosque de hambúrguer e seus consumidores.

30
De maneira semelhante, a diversidade das atividades governamentais significa que
mesmo o primeiro passo num esforço de melhoria do serviço, como a identificação dos
“consumidores” do órgão, pode ser bastante difícil. Os esforços do serviço ao consumidor
do setor privado, muitas vezes, diferenciam entre consumidores internos e externos, mas o
problema do governo não só inclui esta distinção, mas vai muito além dela. Entre as
categorias daqueles com quem o governo lida poderiam estar os que se apresentam de
imediato (com seus recursos disponíveis) para o serviço, os que podem estar esperando pelo
serviço, os parentes e amigos do beneficiário imediato, os que podem precisar do serviço,
embora não estejam ativamente procurando por ele, a geração futura dos possíveis
beneficiários do serviço, e assim por diante.

Implicando importância teórica ainda maior, alguns cidadãos que abordam o


governo em busca de serviços têm maiores recursos e aptidões que outros para apresentar
suas demandas. Nos negócios, este fato justificaria uma atenção especial, mas no governo,
seguramente não cabe tal consideração. De fato, ênfase sobre “relações com o consumidor”
no governo pode criar um clima em que se poderia conceder, indevidamente, privilégios
especiais. Igualmente, muitos serviços públicos – como a educação, ou a qualidade
ambiental, ou a proteção policial – são criados para propiciar benefício coletivo. Por
exemplo, em geral, supomos que ter uma sociedade mais alfabetizada é uma importante
meta societária geral, que vai além do efeito que tem a educação para um indivíduo em
particular. (Na verdade, o fato de certas questões não poderem ser facilmente
“administradas” ou “comercializadas” é exatamente por que elas fazem parte da esfera
pública, e não da privada). Finalmente, o consumidor de produtos ou serviços empresariais
raramente é o produtor destes serviços ou bens; mas, no setor público, o “consumidor” de
qualquer serviço governamental é quase sempre ao mesmo tempo um cidadão – e, num
certo sentido, o chefe. Como cidadão, o indivíduo tem interesse em todos os serviços que
são prestados, não apenas naqueles que ele consome diretamente – uma característica muito
claramente vista quando ---143--- uma maioria de cidadãos decide limitar o montante de
dinheiro a ser gasto para se prestar um certo serviço, mesmo que seja um serviço desejado
por muitos outros “consumidores”.

Henry Mintzberg, um teórico de gestão canadense, chamou a atenção para a variedade


de relações que o cidadão tem com seus governos – consumidores, clientes, cidadãos e
súditos – e sugere que o rótulo “consumidor” é particularmente restritivo. “Não sou um
mero consumidor de meu governo, obrigado!”, escreve ele. “Eu espero algo mais que uma
traansação distante e fria e algo menos que um estímulo para consumir” (1996, p. 77).
Como cidadãos, esperamos que o governo atue de maneira a não apenas promover o
consumo de serviços (Mintzberg também pergunta: “Queremos, realmente, que nossos
governos ... comerciem mercadorias nas ruas?”), mas também a promover um conjunto de
princípios e ideais que são inerentes à esfera pública.

Um terceiro elemento do movimento da reinvenção e da Nova Gestão Pública é seu


entusiasmo pelo que Osborne e Gaebler chamam de “governo empreendedor”, que eles
definem como o governo que “usa recursos de novas maneiras para maximizar a
produtividade e a eficácia” (1992, p. xix). Mas o empreendedorismo conota mais que a
simples capacidde de recursos. Em termos específicos, ele implica criatividade e inovação,
um foco concentrado sobre fins (resultados, missão), em vez de sobre meios, e uma postura

31
proativa em relação aos problemas (“preveni-[los] antes que surjam, em vez de
simplesmente oferecer serviços para superá-los” [p. 20]). Mas, de modo muito importante,
a idéia do empreendedorismo sugere que o agente individual do governo age com base em
seu próprio auto-interesse (ou do órgão). Para fazer este ponto, recorre-se a um exemplo da
própria experiência de Gaebler: “A idéia era fazê-los pensar como donos: Se este dinheiro
fosse meu, eu o gastaria desta maneira?” (p. 3). Novamente, o ponto de vista representado
aqui é um ponto de vista que enaltece o potencial inovador do indivíduo auto-interessado,
singular, em relação aos poderes dos processos institucionais estabelecidos ou os esforços
grupais mais lentos e mais hesitantes, mas mais envolventes e talvez mais democráticos.

Da mesma forma que acontece com o serviço ao consumidor e os benefícios da


competição, ninguém pode argumentar que “usar recursos de novas maneiras para
maximizar a produtividade e a eficácia” é uma meta sem valor. Mas, embora a atividade
empresarial do governo tenha estes benefícios óbvios, também vale observar – como sabem
os defensores do empreendedorismo do setor privado – que ele também tem obrigações,
exigibilidades. No lado dos créditos do livro razão, os empreendedores criam e inovam; no
lado dos débitos, eles podem assumir riscos em excesso e passar por cima de pessoas e
princípios.

O lado “sombra” do empreendedor caracteriza-se por um foco estreito, uma falta de


disposição para seguir regras e ficar dentro dos limites e uma preferência por ação forte a
ponto de ameaçar a accountability (“É melhor pedir desculpas que pedir permissão”).
Eliminar red tape – ou, como diz Barzelay (1992), “romper com a burocracia” – requer
oportunismo, unidade de propósito e confiança extraordinária em sua própria visão pessoal.
Enquanto o público deseja soluções criativas para os problemas públicos e aprecia as
economias produzidas pelo pensamento inovador (e até por assunções ocasionais de risco),
a noção da accountability também é extremamente importante, um modelo que a maioria
dos eleitores parece defender. Em termos práticos, nas organizações reais, os
administradores empresariais representam ---144--- um problema difícil e de certo risco:
eles podem ser inovadores e produtivos, mas sua determinação, tenacidade e disposição
para infringir regras torna-os muito difíceis de controlar. Eles podem se tornar “canhões
soltos”. Como questão teórica, a noção de administradores públicos agindo puramente
como se o dinheiro público fosse seu próprio dinheiro – isto é, sendo motivados por estrito
auto-interesse – vai contra uma longa e importante tradição de accountability e
responsividade na administração pública democrática. De forma muito importante, ela nega
ao público um papel em determinar o dispêndio de fundos públicos e o design de
programas públicos. Em verdade, tratar o dinheiro do público como se ele fosse, de fato,
dinheiro do público, é um importante princípio de governança democrática (DeLEON e
DENHARDT, 2000, pp. 89-97).

8. CONCLUSÃO

Tendo origem em desenvolvimentos práticos no país e no exterior bem como em


raízes teóricas na economia da opção pública, o movimento da reinvenção e a Nova Gestão
Pública tiveram um impacto significativo sobre o governo neste país e em todo o mundo.
Idéias como serviço ao consumidor, mensuração de desempenho, privatização e modelo de
mercado formam cada vez mais parte da linguagem da administração pública. Mas estes

32
desenvolvimentos levantam importantes questões para os administradores e o público. São
particularmente interessantes as formas pelas quais estas novas abordagens recorrem aos
valores dos negócios, além do recurso à adoção de suas técnicas. E enquanto algumas
técnicas se mostraram proveitosas, a rápida transposição dos valores de negócios para o
setor público levanta questões substanciais e perturbadoras que os administradores públicos
devem considerar com muito cuidado.

A rápida transposição dos valores dos negócios para o setor público levanta questões
substanciais e perturbadoras que os administradores públicos devem considerar com grande
cuidado.

9. REFERÊNCIAS

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