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INFLUÊNCIA DA CAL E DO FILITO NA CINÉTICA DE HIDRATAÇÃO

DO CIMENTO

Rui Barbosa de Souza, Fádia Simone Silva Lima, Vanderley Moacyr John

Escola Politécnica da Universidade de São Paulo


Avenida Professor Almeida Prado, trav.2, n.º 83, 05508-900, São Paulo(SP)

RESUMO

No Brasil é comum a utilização da cal em argamassas. Atualmente criou-se


uma nova categoria de produto de construção que é comercializado para o mesmo
uso da cal, no entanto, trata-se de minerais naturais, normalmente filitos. Em virtude
deste fato, para entender de que forma estes minerais naturais atuam na hidratação
do cimento, o objetivo deste trabalho é observar a influência da incorporação de
cales, filitos e blendas de cal e filito, na cinética de hidratação do cimento Portland.
Para isso foi utilizada a técnica de calorimetria de condução para 17 composições de
pastas de cimento, água e produto testado, sendo uma composição de referência.
Concluiu-se que as cales alteraram a cinética de hidratação do cimento,
principalmente no período de indução, enquanto que os filitos foram inertes, atuando
apenas como pontos de nucleação na suspensão reativa. Desta forma, estes
produtos minerais naturais não são caracterizados como aglomerantes.

Palavras-chave: cal, filito, calor de hidratação, calorimetria.

ASBTRACT

INFLUENCE OF LIME AND PHYLLITE ON PORTLAND CEMENT HYDRATION


2

There is a new product in the Brazilian construction market, sold for the same
purpose of lime. However, it contains natural minerals, usually phyllites. The
purpose is to observe the influence of the incorporation of phyllites and lime on
Portland cement hydration. For that, the calorimetry technique was used for 17
compositions of cement pastes. The lime altered the hydration of Portland cement,
mainly in the induction period, while the phyllites were inert, just as nucleation points
in the reative suspension. This way, these natural mineral products are not
characterized as binders.

Keywords: lime, phyllite, heat of hydration, calorimetry.

INTRODUÇÃO

A cal é usada na construção desde a antiguidade, para unir e revestir as


alvenarias, devido à plasticidade e durabilidade que conferem às argamassas.
Certamente é o aglomerante mais antigo usado pela humanidade (1). Apesar disso,
trabalhos publicados sobre argamassas com cal são ainda insuficientes para o
conhecimento do efeito deste produto em argamassas mistas cimento:cal (2).
No Brasil é comum a utilização da cal em argamassas, o que representa um
grande mercado para este produto, haja vista o tamanho da indústria da construção
civil nacional (3). Por este motivo, houve época em que, para baratear os custos de
produção, a mistura de cal hidratada com minerais naturais (argilo-minerais, filitos
etc) ocorreu com freqüência no Brasil (2), combatido pelo Programa Setorial da
Qualidade congregado ao PBQP-Hver1 . Em 2004, um percentual expressivo da cal
hidratada era comercializada misturada com outros produtos (4), segundo o IPTver2 .
Cales com incorporação de minerais naturais ainda são comercializadas
atualmente, ou até mesmo o caso extremo de produtos compostos apenas por
minerais, sem qualquer quantidade de cal. No entanto, devido à atuação do setor
produtor de cal por meio da ABPCver3 no combate à mistura destes produtos,
algumas empresas procuraram adequar-se à legislação, retirando o nome “cal

1
Programa Brasileiro de Qualidade e Produtividade do Habitat
2
Instituto de Pesquisas Tecnológicas
3
Associação Brasileira dos Produtores de Cal
3

hidratada” de suas embalagens, mas sem o devido esclarecimento ao consumidor.


Desta forma, uma nova categoria de produto surge no mercado, que são os minerais
naturais (misturados ou não com cal), na maioria das vezes filitos, comercializados
para o mesmo uso da cal. Estes novos produtos possuem menor custo de
produção, o que se reflete em menor preço ao consumidor, no entanto, apesar de
serem comercializados para a mesma finalidade da cal, tratam-se de produtos
diferentes.
A cal é um aglomerante inorgânico (1), composto essencialmente por hidróxidos
de cálcio (Ca(OH)2) e magnésio (Mg(OH)2), frações de óxidos não-hidratados (CaO,
MgO) e contaminantes. As cales em argamassas alteram a cinética de hidratação
do cimento (5); além disso, são reativas, carbonatando a partir de reação com o CO2
do ar, e modificam algumas propriedades mecânicas das argamassas, como a
redução do módulo de elasticidade. Opostamente, os minerais naturais misturados
à cal, ou sozinhos, não são aglomerantes, podendo ser comparados com agregados
de dimensões bastante reduzidas.
Para entender de que forma estes minerais naturais atuam na hidratação do
cimento, o objetivo deste trabalho é observar a influência da incorporação de cales,
filitos e blendas de cal e filito, na cinética de hidratação do cimento Portland.

MATERIAIS E MÉTODOS

Dezesseis produtos comercializados como cal no mercado brasileiro, ou


similares (produtos comercializados para a mesma finalidade da cal), foram
estudados, formando ao todo 17 composições, sendo uma de referência composta
apenas por cimento Portland (CPII E-32) e água, e as demais compostas por
cimento, água e produto (cal ou similar) (Tabela 1). A relação cimento/produto das
composições estudadas foi definida a partir da recomendação dos fabricantes de
cada produto; e a quantidade de água, a partir de estudo reológico onde se manteve
a mesma viscosidade para todas as composições.
Adotou-se que os produtos denominados “cal” são aqueles produzidos a partir
de calcário calcítico ou dolomítico, portanto constituídos principalmente por óxidos,
hidróxidos e carbonatos de cálcio e magnésio, podendo conter impurezas em teores
limitados segundo a norma NBR 7175 (6). Os produtos denominados “filito” são
materiais constituídos de minerais, que possuem elevados teores de sílica, potássio
4

e óxido de alumínio, segundo definição de Souza Santos (1982) (7). Neste contexto,
os produtos denominados “blenda” são aqueles com características de filito, no
entanto, com presença de elevado teor total de CaO e MgO (admitidos neste
trabalho como superiores a 5%). Acredita-se que estas adições são resultados de
misturas, em proporções diversas, de filitos com cal hidratada.
Segundo Souza Santos (1982) (7), estas misturas de argilominerais com o mineral
calcário (denominadas margas calcárias) podem ocorrer na natureza, mas são
relativamente raras.

Tabela 1 – Composições estudadas (unidade de massa)


Tipo de produto  Composição  Cimento CPII E‐32  Produto  Água  água/materiais secos 
C1  1  0,68  0,75  0,45 
Cal  C2  1  0,46  0,75  0,52 
C3  1  0,72  0,75  0,44 
B1  1  0,80  0,71  0,40 
B2  1  0,75  0,75  0,43 
B3  1  0,76  0,75  0,43 
Blenda  B4  1  0,58  0,75  0,48 
B5  1  0,79  0,75  0,42 
B6  1  0,79  0,75  0,42 
B7  1  0,87  0,75  0,40 
F1  1  0,81  0,70  0,39 
F2  1  0,92  0,69  0,36 
F3  1  0,75  0,66  0,37 
Filito 
F4  1  0,76  0,67  0,38 
F5  1  0,77  0,75  0,43 
F6  1  0,75  0,75  0,43 
‐‐‐  Referência  1  ‐‐‐  0,38  0,38 

Calorimetria isotérmica de condução

Para a determinação das diferenças na cinética de hidratação foi realizado o


ensaio de calorimetria isotérmica de condução. Esta técnica consiste na medida do
calor gerado na amostra, devido às reações químicas exotérmicas de hidratação do
cimento.
O ensaio foi realizado em pasta, à temperatura de 23°C, por um período de
72 horas. O equipamento utilizado foi um calorímetro isotérmico da marca
TA Instruments, modelo TAM Air.
5

O procedimento de ensaio adotado está descrito na Figura 1, sendo que o


tempo de mistura foi de 2 minutos, e o tempo entre o instante em que a água entrou
em contato com o cimento e o instante em que o ensaio foi iniciado, de 4 minutos.

(a) (b) (c)


Figura 1 – Ensaio de calorimetria. Seqüência de atividades: (a) colocar aproximadamente 15g de pasta
misturada dentro da ampola de vidro; (b) tampar e lacrar a ampola com ferramenta própria; (c) colocar a ampola
com amostra e a ampola de referência (vazia) nos respectivos canais do calorímetro e iniciar a coleta de dados

Caracterização dos materiais

A caracterização física dos materiais estudados foi composta pelas


determinações da área superficial específica pelo método BET, realizada em um
equipamento Micromeritics ASAP 2010; massa específica real por picnometria de
gás hélio, realizada em um picnômetro de hélio, modelo Multipicnometer
Quantachrome MVP 5DC; e análise granulométrica a laser, efetuada em
equipamento da marca Malvem, modelo Mastersizer S long bed, que permite realizar
medidas de tamanho de partículas no intervalo de 0,05 μm a 3,50 mm. Os
resultados da caracterização física dos materiais estão expostos na Tabela 2.
6

Tabela 2 – Caracterização física das cales, blendas e filitos estudados. Área superficial específica pela técnica
de BET; massa específica real por picnometria de gás hélio. Parâmetros D50 (granulometria média) e D90
(Diâmetro tal que 90% da amostra apresenta diâmetro inferior) de granulometria a laser
  Área superficial  Massa específica real  Diâmetros médios (µm) 
Adição 
específica (m²/g)  (g/cm3)  D50  D90 
C1  15,9  2,45  14,5  65,84 
Cales 

C2  14,4  2,62  6,76  16,87 


C3  10,6  2,60  14,8  95,37 
B1  8,5  2,70  19,6  90,9 
B2  8,8  2,60  8,2  31,7 
Blendas 

B3  5,9  2,62  12,05  46,71 


B4  6,0  2,47  7,8  34,5 
B5  2,9  2,61  20,0  128,9 
B6  4,4  2,67  14,7  170,4 
B7  3,3  2,66  16,5  234,7 
F1  5,6  2,77  18,8  230,5 
F2  13,7  2,80  10,7  58,1 
Filitos 

F3  3,2  2,90  12,0  30,9 


F4  6,9  2,74  18,5  124,3 
F5  4,8  2,77  7,6  39,8 
F6  4,2  2,76  6,8  45,7 

Os materiais estudados foram caracterizados quanto à composição química


quantitativa através da técnica analítica de espectrometria de fluorescência de
raios-X. O equipamento empregado foi espectrômetro Pan Panalytical Magix-Pro.
Adicionalmente foi realizada a medida de perda ao fogo (PF) e de resíduo insolúvel
(RI). A Tabela 3 mostra a análise química quantitativa dos materiais por FRX.

Tabela 3 – Composição química das cales, blendas e filitos estudados, determinada por fluorescência de raios X
  Adição  SiO2  Al2O3+ Fe2O3  MgO  CaO  K2O  PF  RI 
C1  1,62  0,91  27,9  41,5  0,12  28,30  1,89 
Cales 

C2  0,89  0,46  0,37  72,4  <0,10  25,3  6,64 


C3  4,03  0,6  28,1  39,5  0,12  28,20  4,80 
B1  23,2  2,28  13,4  35,2  0,17  13,7  30,2 
B2  41,9  14,21  1,12  24,6  2,65  15,3  54,40 
Blendas 

B3  4,03  0,60  28,10  39,5  0,12  28,20  4,80 


B4  22,3  6,60  5,05  42,8  1,4  21,6  26,7 
B5  56,7  12,8  7,83  9,84  2,74  10,5  70,6 
B6  58,9  12,88  7,05  8,78  2,72  9,73  72,00 
B7  68,8  11,48  5,60  6,93  2,38  8,78  75,70 
F1  73,6  17,13  0,89  <0,10  3,31  3,41  92,00 
F2  68,8  21,75  0,82  <0,10  3,65  4,95  92,00 
Filitos 

F3  60,5  18,2  1,58  0,21  3,79  4,38  92,8 


F4  72,9  18,41  0,82  0,11  3,62  4,11  94,20 
F5  72,8  16,75  1,62  0,10  4,88  3,33  91,9 
F6  74,0  16,91  1,03  0,10  4,79  2,97  92,6 
7

Calculou-se a partir da análise química o teor das fases nos materiais em


estudo. Para o grupo “filitos” o teor de fases não foi calculado, uma vez que os
teores de MgO + CaO na análise química foram inferiores a 5%. Os hidróxidos
Mg(OH)2 e Ca(OH)2 são as fases aglomerantes da cal; fases MgO e CaO são os
óxidos não hidratados, ou óxidos livres, que restam do processo de hidratação da
cal virgem – em contato com água, a fração mais reativa inicia seu processo de
hidratação, ou seja, constituem-se na fração potencialmente aglomerante da cal –.
Fases MgCO3 e CaCO3 são provenientes da calcinação das matérias primas para a
produção de cal virgem, quando não é atingida a transformação completa desses
materiais, ou seja, são a fração inerte da cal, conferindo apenas um efeito físico
durante e após a aplicação devido à sua finura. O teor de cal referido nos resultados
corresponde à somatória das fases hidróxido.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Calor liberado na hidratação do cimento Portland

A curva típica de liberação de calor devido à hidratação do cimento Portland é


composta por 4 picos principais, como mostra a Figura 2. Nos primeiros 30 minutos
de hidratação ocorre uma grande liberação de calor devido à molhagem e
dissolução dos aluminatos e sulfatos. Nos próximos 90 minutos ocorre um período
de dormência na liberação de calor, chamado de período de indução. Com
aproximadamente 2 horas de hidratação inicia a liberação de calor do pico principal,
referente principalmente à hidratação do C3Sver4 para formação de C-S-H 5 e
hidróxido de cálcio. Em seguida, ocorre a formação do monossulfoaluminato a partir
da etringita formada inicialmente. Por último, com mais de 24 horas de hidratação,
ocorre o pico referente à hidratação da fase ferrita.
Quando a água entra em contato com o cimento, ocorre a dissolução das fases
anidras no meio líquido, liberando cálcio. A concentração de Ca2+ aumenta com o
avanço da dissolução até o nível de saturação (Figura 2), a partir do qual começa a
haver precipitação dos primeiros hidratos. Por este motivo é que a adição de cal na
pasta de cimento pode alterar a cinética de hidratação, pois a cal vai fazer com que

4
Silicato tricálcico – 3CaO·SiO2
5
Silicato de cálcio hidratado – xCaO·SiO2·yH2O
8

a concentração de Ca2+ no meio aumente, favorecendo a precipitação de hidratos,


podendo alterar inclusive os tempos de pega.

Figura 2 – Curva típica da liberação de calor devido à hidratação do cimento Portland (adaptado de Quarcioni
(5)
(2008) )

Alterações no período de indução

De modo geral, todas as curvas de fluxo de calor das amostras com


incorporação dos produtos apresentaram maior intensidade com relação à referência
em todo o período de ensaio. A principal alteração observada nas amostras com
produto é a tendência de formação de um pico de calor incomum em hidratação de
cimento Portland, mas comum em resultados de calor de hidratação de pastas de
cimento e cal. Este pico de calor adicional ocorre em torno de 2 horas de
hidratação, no final do período de indução (Figura 3a).
9

(a) (b)
Figura 3 – Calor liberado em (a) 72horas de hidratação e (b) nas primeiras 6 horas de hidratação (ampliação do
gráfico na região do período de indução)

As amostras com uso de cal (C1, C2 e C3) foram as que apresentaram maior
incremento no calor de hidratação no período de indução, indicando maior influência
destes produtos na hidratação do cimento (Figura 3b). Nestas amostras é nítida a
ocorrência de um pico de calor sobressalente na região onde havia o período de
indução.
As amostras de blendas B1, B2, B3 e B4 não apresentaram incremento de
calor tão acentuado, com menor influência na hidratação do cimento. A curva no
período de indução apresenta tendência crescente, no entanto não é possível
visualizar um pico de calor nítido (Figura 3b).
O uso das blendas B5, B6 e B7 também alterou a curva de liberação de calor
das formulações, apresentando tendência crescente. No entanto, a intensidade de
calor no período de indução foi bastante baixa, indicando a baixa alteração na
cinética de hidratação (Figura 3b).
O terceiro grupo de produtos não apresentou nenhuma alteração química na
cinética de hidratação no período de indução. São todos os filitos estudados, cujas
curvas de liberação de calor não apresentaram tendências diferentes da amostra de
referência (Figura 3b). Os resultados apresentados foram normalizados, ou seja, o
sinal coletado pelo equipamento foi dividido pela massa de aglomerante (massa de
cimento). Por este motivo as composições com incorporação de cal, blenda ou filito
apresentaram resultados pouco superiores à amostra de referência, uma vez que
além da massa de cimento, há mais partículas sólidas na pasta, que inferem uma
10

alteração na cinética de hidratação devido ao efeito de nucleação de formação do


C-S-H na suspensão reativa.
A partir das curvas discretas de liberação de calor, calculou-se o calor
acumulado em todo o período de indução, que inicia em 1h e termina no ponto onde
se inicia a liberação de calor do pico principal (segundo pico) (Tabela 4), sendo
observado o final do período de indução entre 2h e 3,35h de hidratação (Tabela 4).

Tabela 4 – Calor acumulado no período de indução

Tipo de produto  Composição  Calor acumulado no período de indução (J/g) 


C1  18,1 
Cal  C2  10,3 
C3  8,6 
B1  6,3 
B2  4,6 
B3  4,0 
Blenda  B4  3,9 
B5  3,2 
B6  3,1 
B7  2,7 
F1  2,3 
F2  2,3 
F3  2,2 
Filito 
F4  2,2 
F5  2,1 
F6  2,0 
‐‐‐  Referência  1,6 

A Figura 4 mostra que o incremento no calor liberado no período de indução


tem correlação direta com a quantidade de cal presente na pasta. Por este motivo
explicam-se os resultados observados na curva de calorimetria (Figura 3b), onde as
blendas B5, B6 e B7 aparecem agrupadas com intensidades inferiores às demais
blendas, pois estes três materiais possuem reduzido teor de cal, variando entre
12,8% e 17,5%.
11

Figura 4 – Correlação entre calor acumulado no período de indução e teor de cal presentes nos produtos

Mesmo sem material reativo, os filitos apresentaram incremento na quantidade


de calor liberado na indução, isso se deve ao efeito físico de nucleação causado
pelas partículas de filito na suspensão reativa; no entanto, apesar do tamanho e da
área específica das partículas teoricamente influenciarem este efeito de nucleação,
não houve correlação entre a área específica das amostras de filito e o acréscimo de
calor (Figura 5). Nas amostras com cal, seja misturada com filito (blendas) (Figura
5), seja pura (Figura 5), houve correlação entre a área específica e o calor
acumulado na indução. Isso ocorre devido ao efeito físico de nucleação, que é
função da área específica dos grãos e, sobretudo, pelo acréscimo de reatividade do
material com o aumento da superfície específica, refletindo em maior alteração na
cinética de hidratação do cimento.
12

Figura 5 – Relação entre o calor acumulado no período de indução e a superfície específica das amostras de cal,
blenda e filito

Posição do pico mais intenso

Passado o período de indução, ocorrem os picos de liberação de calor mais


importantes das reações de hidratação, como mostrado na Figura 2. Nesta região,
todas as curvas de fluxo de calor das amostras com produto apresentaram maior
intensidade com relação à referência (Figura 6). Observa-se que na amostra de
referência ocorrem 2 picos bem definidos nesta região, no entanto, nas amostras
com adição os picos são mais largos e menos definidos.
O pico mais intenso, que na amostra de referência ocorre em torno de 8,7
horas, foi deslocado nas amostras com produto. Observa-se pela Figura 6 que as
curvas em azul e verde (cales e blendas) têm pico mais intenso deslocado para a
esquerda, ou seja, ocorrem em menor tempo com relação às curvas em vermelho
(filitos). Isto pode ser indicativo de aceleração no tempo de fim de pega, no entanto,
para tal afirmação é necessária a realização de algum ensaio que meça a
aglomeração da pasta, como o ensaio com agulha de Vicat, por exemplo. A Figura
6 mostra que este deslocamento é função da quantidade de calor acumulado por
cada produto na indução, ou seja, do nível de influência do produto na cinética de
hidratação do cimento. Apesar da correlação calculada ter sido baixa, com
13

R2 = 0,62, é possível observar a tendência pelo gráfico, onde conforme a adição


apresenta maior reatividade, o pico de maior intensidade ocorre em menor tempo.

Figura 6 – Correlação entre o calor acumulado no período da indução e a posição do pico mais intenso

CONCLUSÕES

As cales alteraram a cinética de hidratação do cimento, principalmente no


período de indução, enquanto que os filitos foram inertes, atuando apenas como
pontos de nucleação na suspensão reativa, como qualquer partícula fina presente no
meio. Desta forma, estes produtos minerais comercializados para o mesmo uso da
cal, não agem da mesma forma durante a hidratação do cimento, não se
caracterizando como um aglomerante. São necessários estudos de desempenho
mecânico e de durabilidade para se avaliar as conseqüências do uso deste material
inerte como sendo aglomerante.
Conclui-se ainda que a técnica analítica utilizada no estudo (calorimetria
isotérmica de condução) é adequada e precisa na indicação da influência da cal
14

dentro de uma suspensão reativa de cimento e água. A técnica foi sensível, a ponto
de medir as diferenças entre blendas e material inerte, apresentando boa correlação
com as quantidades de material aglomerante.

AGRADECIMENTOS

Este projeto foi financiado pela ABPC (Associação Brasileira dos Produtores de
Cal).

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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norma técnica. Rio de Janeiro : s.n., 2003.
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Materiais de construção civil e princípios de ciência e engenharia de materiais. São Paulo:
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172.
SOUZA SANTOS, P. Ciência e tecnologia das argilas. São Paulo: Edgard Blücher, 1992. p.234. Vol.2.

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