Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
identificação de indivíduos
Protocolo para coleta de pegadas
Carolyn M. Miller
Wildlife Conservation Society
Gallon Jug
Belize, América Central (2001)
• Introdução
Pegadas são, muitas vezes, a única evidência da presença de mamíferos em uma determinada
área. As pegadas são encontradas em locais úmidos ou lamacentos próximos a recursos hídricos
e fornecem informações a respeito do sexo, da idade, do tamanho aproximado, do
comportamento e da estratégia de forrageio. Apesar de o padrão de pegadas ser uma inestimável
fonte de informação sobre o comportamento e outros aspectos relacionados à identidade do
animal, o objetivo deste estudo é utilizar medidas de pegadas para identificar onças individuais.
Outras características do padrão de pegada e medidas referentes a vários aspectos como a pisada,
a distância entre as pernas, a passada e o modo de andar estão detalhados em Rabinowitz (1997).
Animais furtivos, como a onça pintada, são impossíveis de serem quantificados por observação
direta, em especial nas áreas densamente arborizadas que perfazem grande parte de seu território.
Portanto, as tentativas de estimar números baseadas em métodos de observação direta devem ser
revistas. Venho desenvolvendo uma metodologia para identificar onças individuais, utilizando
para tanto suas pegadas, que tem se mostrado promissora. Até o momento, vários métodos de
medições foram testados em pumas, tigres, snow leopards, antas e rinocerontes com diferentes
níveis de sucesso.
Nesse sentido, desenvolvi uma série de medidas para onças pintadas que funcionaram bem para
identificar indivíduos em grupos teste. Apesar de esta metodologia estar ainda em fase de
desenvolvimento, análises preliminares de função discriminante mostram altos níveis de
discriminação entre indivíduos (95-100%). Para ser estatisticamente defensável testes com
Carolyn M. Miller 2
Convido, portanto, outros pesquisadores a enviarem dados sobre pegadas coletados de acordo
com os protocolos delineados neste trabalho. Esses protocolos têm se mostrado apropriados e me
permitiram medir e analisar centenas de pegadas. Se você quiser contribuir, esse trabalho explica
como coletar as pegadas para medições e análise.
• Vantagens do rastreamento
Armadilhas fotográficas funcionam bem como método não invasivo para "capturar" animais
muito furtivos. Entretanto, elas são caras e podem não ser práticas em todos os locais de estudo.
O rastreamento oferece uma alternativa barata pois em muitas áreas é possível obter pegadas
pelo menos durante parte do ano. Solos úmidos ou muito secos produzem pegadas de ótima
qualidade. Estações para coleta de pegadas podem ser estabelecidas em áreas chave quando o
substrato natural não favorece a impressão das pegadas.
• Desvantagens do rastreamento
O maior problema do uso de medidas de pegadas em felinos consiste na confiabilidade da
identificação individual. O fator chave aqui tem sido a variabilidade. O substrato varia muito e
pode consistir de rochas, folhas, terra fina ou mais grossa, solo úmido ou seco. As condições
climáticas podem transformar o substrato de fino e seco em lamacento em questão de minutos. A
velocidade, o modo de andar do animal e o terreno (por exemplo em subida ou descida)
adicionam variáveis às pegadas dificultando a identificação individual. Um dos problemas
encontrados nesse estudo foi a obtenção de um número suficiente de amostras pois as pegadas de
onças raramente ocorrem em números adequados para a análise (por exemplo, 10 ou mais
Carolyn M. Miller 3
pegadas da pata traseira esquerda ou direita). Isso deve-se, quase sempre, à qualidade do
substrato que permite a impressão ruim das pegadas ou de apenas alguma delas. Outro problema
associado ao rastreamento inclui a dificuldade de distinguir entre as pegadas de onça pintada e as
de puma. Entretanto, aparentemente, programas de computador para medir pegadas podem
ajudar a minimizar alguns desses problemas.
• As medidas
Vários pesquisadores têm investigado o potencial do uso da medição de pegadas para distinguir
indivíduos. Desenhos de pegadas (Panwar, 1979) e medições manuais foram desenvolvidas para
tigres na Índia (Das e Sanyal, 1995). No caso dos pumas, Smallwood e Fitzhugh (1993)
obtiveram 92-100% de discriminação utilizando as patas traseiras e apenas algumas medidas. A
seguir, Grigione e colaboradores (1999) utilizaram as mesmas medidas básicas além da inclusão
das áreas entre os dedos e a palma. Pegadas de 10 pumas equipados com rádio-colares foram
fotografadas e medidas utilizando programas de GIS (Sistema de Informação Global). Medições
adicionais de ângulo foram desenvolvidas para snow leopards e tigres em cativeiro (Riordam,
1998). Pegadas de antas dos Andes colombianos (Lizcano e Cavelier, 2000) e de rinocerontes no
Zimbabue (Jewell et al., 2001) são exemplos de medidas que foram utilizadas para estimar a
densidade populacional.
Apesar de eu tentar determinar quais medidas são consitentemente úteis, diferentes indivíduos
com características peculiares em relação às patas, fazem com que as medidas relevantes variem
de uma análise para outra. Em análises de função discriminante as variáveis que não contribuem
para a análise são eliminas. Algumas medidas eliminadas de uma análise são informativas em
outras. Acredito que isso se deva ao fato de que pequenas anormalidades nas pegadas de certos
indivíduos que não são percebidas pelo olho humano, sejam detectadas e comparadas durante a
análise através das medidas precisas fornecidas pelo programa.
Por exemplo, o dedo 4 quebrou mas já está curado. Apesar de parecer normal ao olho humano, a
área, o ângulo e as medidas de distância relativas a esse dedo desse animal em particular têm
maior importância quando comparadas as do dedo 4 de outros animais. Nos casos em que os
dedos 4 são relativamente uniforme entre os indivíduos, outras medidas serão mais úteis na
identificação individual. Neste caso algumas medidas do dedo 4 poderiam ser eliminadas da
análise. Portanto, por enquanto, recomenda-se que todas as 48 medidas sejam tomadas para a
discriminação potencial ótima.
Se apenas um pequeno conjunto de pegadas for coletado, as medidas de Riordan (1998) podem
ser adequadas. Com os dados disponíveis, estas se revelaram melhores discriminadores (100%)
para onças-pintadas do que as medidas de Smallwood e Fitzhugh (1993) e de Grigione e
colaboradores (1999) sozinhas ou combinadas (88-96%). Apesar de incluir muitos ângulos, as
medidas de Riordan podem ser tomadas manualmente. Se os dados forem ser comparados entre
locais de coletada ou entre períodos distintos de trabalho de campo, onde potencialmente um
Carolyn M. Miller 5
grande número de pegadas pode ser acumulado, é preferível realizar todas as medições do que
confiar em apenas uma parte delas para a obter a melhor identificação individual.
Apesar da maioria das 48 medidas poder ser feita manualmente, esse procedimento consome
muito tempo, é propenso a erros e a medições tendenciosas. Não apenas as áreas dos dedos e da
palma, mas principalmente a distância entre o centro desses polígonos, são difíceis de serem
calculadas manualmente. Entretanto, essas medidas são elementos críticos da análise por esse
motivo recomendo medições completas.
Os grandes felinos geralmente pisam nas pegadas dianteiras danificando-as. Por causa dessa
tendência, as pegadas traseiras são de melhor qualidade e convencionou-se utilizar somente elas
nas medições. Patas direita e esquerda podem ser identificadas observando-se o dedo líder. O
dedo líder é o segundo e mais longo de todos. Se esse dedo estiver à direita a pata é a esquerda.
Da mesma maneira, se o dedo estiver à esquerda a pata é a direita. Compare a Fig. 5, uma pata
direita traseira, com as Figs. 2 e 3.
Carolyn M. Miller 8
O método do desenho é uma alternativa mais barata do que o da fotografia. Apesar de não ter
sido testado no campo até o momento, aparentemente no primeiro há uma maior chance de erro.
Entretanto, fotografias de desenhos de pegadas são prontamente aceitas por programas de
medição.
Carolyn M. Miller 9
• Desenho de pegadas
Alguns pesquisadores usam um retângulo de vidro ou acrílico suspenso logo a cima das pegadas
com o auxílio de parafusos ajustáveis (Panwar 1979) ou apoiado em lápis (Childs 1998). Uma
inovação recente (Rabinowitz, Junho de 2001, conferência) é o uso de varetas de pau com um
lado chato preso por velcro a um retângulo de plexiglas. As varetas têm 1cm em um dos lados e
2cm do outro, facilitando ajustes ao terreno.
Mantendo uma posição vertical firme sobre a pegada, esta é desenhada utilizando-se uma caneta
marcadora de tinta lavável. O contorno da pegada é copiado em folhas de acetato (Panwar, 1979;
Smallwood e Fitzhugh, 1993) ou em sacos plásticos (Childs 1998) e apagado do vidro ou
plexiglas. As folhas de acetato podem ser presas diretamente no plexiglas usando-se atilhos de
borracha de modo que o desenho é feito diretamente nas folhas. Cópias Xerox (1:1 nunca
aumente ou reduza o tamanho!) incluindo informações sobre a coleta podem então ser enviadas
para mim para inclusão no programa de medição e registro no banco de dados de pegadas. Minha
experiência mostra que o desenho não é difícil com alguma prática e cuidado.
• Fotografando pegadas
Com algum cuidado as pegadas podem ser fotografadas no campo e medidas mais tarde. Para
tanto é necessário:
C Câmera 35mm ou digital
Tanto uma câmera 35mm simples ou uma digital são apropriadas, de preferência com lentes
macro ou com ajuste de foco para perto. Máquinas a prova d'água ou de chuva são indicadas.
Tenho usado uma câmera digital (Olympus D400 Zoom) com excelentes resultados. A maior
vantagem de se usar uma máquina digital é poder checar a imagem na hora. As imagens ruins
podem ser apagadas e as pegadas re-fotografadas. Entretanto, uma máquina 35mm simples é
suficiente.
Se a sua máquina não tem ajuste para macro verifique no manual qual é a menor distância de
foco. Ou faça alguns testes fotografando objetos a diferentes distâncias, mantenha um registro
Carolyn M. Miller 10
por escrito das fotos e compare-o com o filme revelado. Use então os ajustes que forneceram
melhores resultados. Se as fotos forem ser tiradas em locais com pouca luminosidade (maioria
das florestas) use um filme, normal ou para slide, mais rápido (400 ou 800 ASA).
rastrear jaguatiricas no Peru. Outros usam areia. Substratos naturalmente úmidos ao longo dos
rios podem ser bons desde que as pegadas não sejam distorcidas por escorregões.
Pegadas recentes são de melhor qualidade do que aquelas sujeitas à erosão por algum tempo. As
pegadas podem ter a sua idade estimada por características como a nitidez das margens e se há
vegetação, gramíneas ou teias de aranha que indiquem a passagem do tempo (Rabinowitz, 1997).
Por outro lado, vegetação amassada dentro da pegada é indicativo de que a mesma é recente.
É difícil avaliar em que ponto a pegada passa a ser tão velha que suas medidas possam estar
degradadas. Isso, sem dúvida, vária com o tipo de substrato e com as condições climáticas. Por
exemplo, uma pegada deixada na lama pode encolher se exposta ao sol por muito tempo. Uma
pegada deixada em substrato seco e poeirento pode ser erodida rapidamente pelo vento. A chuva
pode parcialmente lavar ou amolecer as margens. Experimente fazer uma marca próximo à
pegada. Se a mesma mostrar margens limpas e boa definição em comparação à pegada pode ser
usada como indício da qualidade para medição. Escolha sempre as pegadas mais nítidas.
O ideal é fotografar uma série de pegadas. Uma série é definida como uma seqüência continua de
pegadas produzidas por um animal ao longo de um trajeto. Em alguns casos, pude fotografar
mais de 80 pegadas quando uma onça pintada percorreu umas poucas centenas de metros em
bom substrato (na beira da Estrada, por exemplo). Apenas a pegada traseira esquerda e direita
devem ser fotografadas. Se não tiver certeza se a pegada é da pata dianteira ou traseira fotografe
mesmo assim, a dúvida pode ser tirada mais tarde.
Ser cuidadoso ao fotografar resulta em fotografias de boa qualidade apropriadas para medições.
Fotografe as pegadas em boas condições de luz, o mais próximo possível e permaneça nivelado e
firme. Mantenha em mente que se uma pegada parece incompleta ou de má qualidade ao olho nu,
a fotografia não vai melhorá-la. É melhor fotografar somente as boas pegadas. A seguir são
descritos os detalhes para fotografar pegadas.
Carolyn M. Miller 12
C Uso de flash
A menos que possua um flash separado da máquina fotográfica que fornece iluminação lateral
nunca use flash automático. Os flash automáticos, embora convenientes, saturam a pegada de
luz, achatando-a e inutilizando-a para medições com auxílio do programa de computador. Em
Carolyn M. Miller 13
C Mantenha-se nivelado
Certifique-se de estar fotografando
perpendicularmente à pegada (Figura 6). Uma
fotografia em ângulo significa que as medidas
vão estar distorcidas. Esse problema não pode
ser solucionado pelo programa de
computador.
Figura 7 Uma pegada traseira esquerda de C Inclua nas fotos: régua, local de
onça pintada de boa qualidade e apropriada
para medição coleta e seu nome
Posicione a régua na parte superior da pegada
perpendicular aos dedos. Cuidado para não cobri-los. Escreva a localização das pegadas ou use
as coordenadas fornecidas pelo GPS se possível. Prenda ou coloque o papel perto ou na régua,
cuidando para não cobrir os números (Figura 7).
C O que fotografar
Impressões nítidas de ambas as patas traseiras (esquerda ou direita); 10 fotos de cada pata
traseira em uma série de pegadas é o ideal. Substrato de granulometria fina tanto bem molhado
com bem seco aparentemente fornecem as melhores impressões. Não é necessário fotografar
pegadas "marginais" ou seja aquelas pouco nítidas, ou aquelas resultantes de escorregões ou
ainda aquelas que estejam distorcidas ou incompletas. Se uma pegada parece incompleta ou de
má qualidade ao olho nu, a fotografia não vai melhorá-la. Infelizmente o programa para melhorar
fotografias tem apenas utilidade limitada. A Figura 7 mostra uma pegada traseira esquerda
propriamente enquadrada pela régua e a informação sobre o local. Note que os limites da pegada
Carolyn M. Miller 14
Localize o início da série de pegadas e fotografe cada uma das pegadas traseiras apenas uma vez.
Se cometer algum erro e for necessário re-fotografar uma pegada anote e descarte a pior para
que, mais tarde, a mesma pegada não seja medida duas vezes. Se estiver usando uma máquina
digital delete a errada.
Remova com cuidado os detritos soltos na área perto da pegada. Entretanto, verifiquei que é
melhor não remover pedrinhas, galhos, folhas ou vegetação incrustada para ter uma foto melhor.
Mais tarde é difícil lembrar se a impressão era resultante de algum detrito ou de um machucado
ou cicatriz na pata. Remover itens incrustados geralmente arruina a pegada ao remover também
substrato.
Carolyn Miller
Gallon Jug c/o Box 37
Belize City
Belize, América Central
Fone/fax: +501-220-9002
Email: cmiller@wcs.org
• Agradecimentos
Esse projeto contou com o apoio da Wildlife Conservation Society, da Jaguar Automóveis, da
Fundação Terra e de Bowen & Bowen Ltda. As licenças para pesquisa foram emitidas pelo
Belize Forest Department. Media Cybernetics forneceu o upgrade dos programas de computador
para as medições a partir da versão “expressa”. Bert Castro, Linde Ostro, Scott Silver e Sebastian
Troëng enviaram pegadas. Agradeço a Fenton Kay pela ajuda detalhada e constante na análise
estatística. John Scheibe e Vijay Gupta revisaram e comentaram as análises de função
discriminante. Alan Rabinowitz e Rob Wallace forneceram comentários relevantes para versão
inicial desse manuscrito. Dale Boles, Steve Johnson e a biblioteca da WCS enviram publicações
importante assim que eu as necessitei. Agradeço a Almira Hoogesteyn pela tradução para o
Espanhol e a Daniela Calcagnotto pela tradução para o Português. Sou grata a Bruce Miller pelo
auxílio inestimável no campo e no computador.
! Bibliografia
Aranda, M. 1994. Diferenciacion entre las huellas de jaguar y puma un analisis de criterios. Acta
Zoologica Mexico 63:75-78.
Childs, J. L. 1998. Tracking felids of the Borderlands. Printing Corner Press, El Paso, TX.
Das, P. K. e P. Sanyal. 1995. Assessment of stable pug measurement parameters for
identification of tigers. Tigerpaper 22(2)20-26.
Carolyn M. Miller 16