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INSTITUCIONALIZAR MINHA VIDA OU COMO CONTÊ-LA

Márcio Braz*

A sociedade brasileira tem se visto assaltada em todos os seus direitos, dos mais básicos

aos complexos, um túnel sem por onde enxergar um fim. As instituições brasileiras, dos três

poderes e mais a mídia, tem-se empenhado em favor deste ou daquele lado da força na tarefa de

negligenciar os direitos políticos e cidadãos do povo brasileiro e atender aos seus próprios

anseios.

Neste jogo, a arte foi o que nos restou e nunca nos abandonou em toda a história da

humanidade, com suas limitações intrínsecas e seu desejo de não institucionalizar-se; a arte se

tornou a ponta de lança e elemento de vibração quando posto em confronto com as contradições

do mundo nacional e global. O teatro, por exemplo, sempre foi responsável por denunciar estes

desmandos do mundo político, só lembrar da famosa cena dos atores em “Hamlet”. No Brasil,

peças como “Puzzle (d)” de Felipe Hirsch e “Projeto Brasil” da Cia Brasileira de Teatro

procuraram intensificar esses debates refletindo sobre nossa natureza, origem e herança.

O professor Wolfgang Bader criou duas categorias para exemplificar melhor o que

estamos dizendo: o primeiro, onde o Estado seria o representante da ordem, em sua tentativa de

institucionalizar ao máximo o que antes era livre em convicções e criação; de outro, a liberdade,

onde a arte seria uma de suas expressões.

Dá pra se viver só com o Estado? A resposta é não! E só com a liberdade total?

Também não. As duas são um perigo ao agirem em separado, com suas vontades e metodologia.

A liberdade total onde se faz o que quer e quando quiser geraria um estado de beligerância e

conflitos civis sem precedentes, assim como um Estado totalitário, que já nos deu muitas provas

no século 20 de sua feição cruel e castradora.

O ideal seria encontrarmos um meio termo entre as categorias, que fizesse o cidadão se

sentir protegido e não ameaçado em seus direitos. O que deve ser institucionalizado no âmbito

da política pública para a cultura? Quem tem esse direito? Como cultura é um tema complexo,
de muitos conceitos, onde seria impossível tomar um só para servir de guia (cf. Zygmunt

Bauman) o melhor seria deixar a vida dos indivíduos fruírem restando às cidades o direito de

permitir a fruição, estimulá-la, incitando as trocas entre bairros, comunidades, grupos culturais

enfim, permitir que as pessoas possam escolher seus próprios fins em cultura. Na Alemanha não

há um ministério da cultura justamente por compreenderem que a cultura só existe dentro de

uma cidade devendo-se, portanto, fortalecer as cidades, pois é lá que as pessoas exigem seus

direitos, o direito à cidade, à moradia, ao transporte, à saúde etc. E à cultura.

*ator, diretor, cientista social e especialista em Gestão e Políticas Culturais.

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