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Essa é uma tradução não oficial do livro

“The director's craft a handbook for the


theatre” de Katie Mitchell. Ela foi feita no
âmbito das disciplinas Direção I, II e III do
curso de Teatro da UEA – Universidade do
Estado do Amazonas ministradas pelo
professor Humberto Issao Sueyoshi com o
auxílio pontual de um estudante do curso de
História do Teatro Brasileiro nos capítulos
10 e 12, como atividades complementares
da disciplina com vista a auxiliar os
estudantes no seu desenvolvimento poético
e acadêmico. Sua circulação se restringe
aos estudantes do curso de teatro sem
nenhuma finalidade lucrativa, não devendo
ser distribuído sem a autorização expressa
da Autora original da obra. Os tradutores
estão identificados no início de cada
capítulo, mas a revisão de todo o conteúdo
foi feita pelo professor das disciplinas entre
os anos de 2014 e 2015. Ele deve conter
erros de tradução e mesmo após a revisão
erros são esperados. É necessário reiterar
que o texto não deve ser citado oficialmente
pois não é uma tradução oficial.
2
Índice
A arte do Diretor.........................................................................................................................8
APRESENTAÇÃO por Nicholas Hytner ................................................................................9
INTRODUÇÃO .........................................................................................................................11
PARTE 1 - PREPARAÇÃO PARA OS ENSAIOS ................................................................17
1. Capítulo - Organizando as primeiras respostas do texto ...........................................19
1.1 Usando listas de fatos e perguntas .......................................................................20
1.2 Organizar informações sobre o que existe antes da peça começar .................20
1.3 Pesquisa ...................................................................................................................23
1.4 Respondendo a perguntas difíceis sobre o texto ................................................27
1.5 Lugar .........................................................................................................................28
1.6 Biografia dos Personagens ....................................................................................32
1.7 Lista de verificação de todo o trabalho feito neste capítulo ...............................38
2. Capítulo - Organizando informações sobre cada cena ..............................................39
2.1 Circunstâncias imediatas ........................................................................................39
2.2 O que acontece entre as cenas ou atos ...............................................................44
2.3 Tempo........................................................................................................................47
2.4 Lista de verificação de todo o trabalho feito neste capítulo ...............................50
3. Capítulo - Investigando as grandes ideias da peça ...................................................51
3.1 O escritor e o texto dramático ................................................................................51
3.2 As ideias que sustentam o texto ............................................................................54
3.3 O gênero ou estilo da peça ....................................................................................56
3.4 Lista de verificação de todo o trabalho feito neste capítulo ...............................58
4. Capítulo - Analisando a cena .........................................................................................60
4.1 Preparando a composição do seu texto de direção ............................................60
4.2 Atribuindo um nome a cada ato ou cena ..............................................................61
4.3 Eventos .....................................................................................................................62
4.4 Intenções ..................................................................................................................69
4.5 Preparando um texto pronto para os atores ........................................................72
4.6 Lista de verificação de todo o trabalho feito neste capítulo ...............................73
5. Capítulo - Aprofundando o trabalho nos personagens ...............................................75

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5.1 Os pensamentos dos personagens sobre si mesmos ........................................75
5.2 Relacionamentos .....................................................................................................77
5.3 Preparando improvisações .....................................................................................79
5.4 Uma lista de verificação de todo o trabalho feito neste capítulo .......................81
6. Capítulo - Construindo relacionamentos com a sua equipe de produção ...............82
6.1 Cenografia ................................................................................................................83
6.2 Iluminação ................................................................................................................91
6.3 Som ...........................................................................................................................92
6.4 Música .......................................................................................................................94
6.5 Vídeo .........................................................................................................................97
6.6 Voz .............................................................................................................................99
6.7 Movimento ..............................................................................................................102
7. Capítulo - Selecionando atores e testando os pontos de partida para os ensaios
105
7.1 Seleção de elenco .................................................................................................105
7.2 Oficinas ...................................................................................................................109
8. Capítulo - Preparando o ambiente de ensaio ............................................................ 113
8.1 Trabalhando com a direção de palco ..................................................................113
8.2 Seleção de salas de ensaio .................................................................................115
8.3 Estabelecendo estruturas de comunicação ....................................................... 117
8.4 Preparando a sala de ensaio ...............................................................................119
PARTE 2 - ENSAIOS ............................................................................................................120
9. Capítulo - Os primeiros dias de ensaio ......................................................................123
9.1 Organizando seus pensamentos sobre atores ..................................................123
9.2 Doze regras de ouro para trabalhar com atores................................................125
9.3 Estabelecendo a linguagem do seu processo ...................................................131
9.4 Como dar retorno aos atores sobre o seu trabalho ..........................................134
9.5 Como sentar-se na sala de ensaio......................................................................139
9.6 Apresentando o texto para os atores ..................................................................139
9.7 O primeiro dia de ensaio....................................................................................... 140
9.8 Maquete ..................................................................................................................144
9.9 Som, figurinos, adereços, móveis, luzes e elementos cênicos para o processo
de ensaio ............................................................................................................................ 146
10. Capítulo - Construindo o mundo da peça............................................................... 148
10.1 Como dividir o seu dia de ensaio ........................................................................149

4
10.2 Introduzindo os fatos e as questões ...................................................................150
10.3 Pesquisa .................................................................................................................152
10.4 Locais ......................................................................................................................155
10.5 O autor e o gênero ................................................................................................ 157
10.6 Trabalho prático em idéias ...................................................................................159
10.7 Trabalho prático sobre emoções .........................................................................163
10.8 Biografias dos personagens .................................................................................166
10.9 O primeiro trabalho prático sobre a personagem e o ritmo dela .....................170
10.10 Relacionamentos ............................................................................................... 171
10.11 Como configurar improvisações com os atores ............................................174
10.12 Como usar os exercícios de visualização ......................................................176
10.13 Como fazer tudo isso com um período curto de ensaio ............................... 177
11. Capítulo - Trabalhando nas cenas da peça ........................................................... 180
11.1 A análise da ação do peça com os atores.......................................................... 181
11.2 Delimitando os espaços das cenas .....................................................................183
11.3 Improvisando o evento gatilho e as circunstâncias imediatas ......................... 184
11.4 Como estruturar o ensaio .....................................................................................185
11.5 Ensaiando uma cena pela primeira vez.............................................................. 186
11.6 “Desenho de cena”( Blocking), ou fazendo a ação clara para o público ........190
11.7 Os segundos e os terceiros ensaios de uma cena ...........................................193
11.8 Passadão ................................................................................................................197
11.9 Como organizar os dias finais na sala de ensaio ..............................................200
11.10 Trabalhando no cenário, figurinos, som, iluminação e músicas durante os
ensaios 201
11.11 Como fazer tudo isso com um período de ensaio curto ............................... 204
PARTE 3 - ENTRANDO NO TEATRO E A TEMPORADA ...............................................208
12. Capítulo - Ensaios técnicos e o ensaio geral ......................................................... 211
12.1 A programação para a montagem no teatro e os ensaios técnicos................211
12.2 Como gerir a transição da sala de ensaios para o teatro junto aos atores ...212
12.3 Como trabalhar com a sua equipe criativa durante os ensaios técnicos .......215
12.4 A afinação da luz ...................................................................................................217
12.5 Afinando o som e a música antes do ensaio técnico começar........................ 219
12.6 Ensaios técnicos ....................................................................................................221
12.7 O ensaio geral ........................................................................................................223

5
13. CAPÍTULO - As apresentações públicas ............................................................... 226
13.1 As primeiras apresentações públicas .................................................................226
13.2 Apontamentos depois das apresentações ......................................................... 228
13.3 Os ensaios durante as suas primeiras apresentações públicas ......................231
13.4 Apresentação para a imprensa ............................................................................231
13.5 A temporada: após o dia da apresentação para a imprensa até a última noite
da temporada. ....................................................................................................................233
13.6 Analise o seu trabalho quando a temporada acabar ........................................235
14. Capítulo - Como eu aprendi as habilidades que o livro descreve .................................238
14.1 Stanislavsky............................................................................................................238
14.2 Lev Dodin ensina direção na Rússia...................................................................240
14.3 Aulas particulares de direção no Reino Unido...................................................243
14.4 Investigação sobre a biologia das emoções ......................................................244
GLOSSÁRIO .......................................................................................................................... 245

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Para Edie

7
A arte do Diretor
(Tradução de Janaína Siqueira - Revisão Humberto Issao)

O processo de dirigir uma peça se estende desde o primeiro texto de


leitura para a última noite de apresentação, e quem se propõe a fazer este
jornada encontra em 'A arte do Diretor' um guia inestimável.

Este livro explica as ferramentas chave da prática que um dos diretores


mais respeitados do Reino Unido usa para harmonizar seu trabalho, não só
com atores e equipes de produção, mas também como próprio texto.

Katie Mitchell aborda temas tão diversos como:

As ideias que sustentam o texto de uma peça


Preparando improvisações
Doze regras de ouro para trabalhar com atores
Gerenciando a transição da sala de ensaio para o teatro
Analisando o seu trabalho depois que as apresentações terminaram

Cada capítulo termina com um resumo de seus pontos-chave, tornando


este um ponto de referência ideal para aqueles que desejam melhorar áreas
específicas de seu ofício, bem como iniciantes, em busca de um mapa passo-
a-passo do papel de um diretor.

Katie Mitchell dirigiu peças para a Royal Shakespeare Company, o Royal


National Theatre, a Corte Real, Young Vic e o Donmar Warehouse. Fora do
Reino Unido, ela dirigiu no Royal Dramatic Theatre, na Suécia, o The Cologne
Schauspielhaus, na Alemanha e no Piccolo Theatre, na Itália. Seu trabalho
inclui produções para Welsh National Opera, Glyndebourne Festival Opera e
English National Opera. Ela recebeu dois Time Out Awards e um Evening
Standard Award de Melhor Diretor.

8
APRESENTAÇÃO
por Nicholas Hytner
(Tradução de Janaína Siqueira - Revisão Humberto Issao)

Ainda acontece no teatro britânico que a maioria dos diretores tornam-se


diretores, dizendo: 'Eu sou um diretor!' e mantêm a esperança de que alguém
vai acreditar neles. Alguns foram atores, alguns foram contrarregras, mas a
maioria hoje em dia saiu da universidade explodindo com ideias, porém mais
ou menos sem saber o que fazer. Se tiverem sorte, serão dadas a eles as
oportunidades de descobrir como são sem noção; se eles são sábios, eles
começam a perceber um esboço de como o teatro realmente funciona; se eles
são talentosos, é uma faca de dois gumes, pois eles se encontram no centro
das atenções muito antes de calcularem como implantar seus talentos de forma
útil. Eles são incentivados a pensar em si mesmos como artistas, mas ainda
tem que aprender a arte de dirigir.
Aqui, enfim, é o livro que coloca tudo para fora, partindo do momento em
que o diretor começa a pensar em uma peça até a noite da última
apresentação. Existem muitos livros maravilhosos sobre a atuação (alguns dos
melhores escritos por diretores) e muitos livros de inspiração sobre o propósito
do teatro. Há livros sobre a palavra falada, manuais sobre iluminação e som, e
histórias do figurino. Eu nunca antes me deparei com um livro que de forma tão
clara e tão rigorosamente insiste nas necessidades práticas de um trabalho que
exige que seu fazedor lidere uma equipe em que todos são mais peritos em
seu ofício particular do que ele próprio.
Quando fui nomeado diretor do National Theatre, essa foi uma das
minhas primeiras prioridades para torná-lo um lar para Katie Mitchell. As suas
produções sempre me incitaram a casar uma seriedade de propósito e
intensidade emocional a um conhecimento (know-how) teatral inigualável. Nem
sempre concordei com ela sobre as peças, mas eu nunca fui menos que
arrebatado (gripped: agarrar com firmeza/compreensivo) pela forma como ela
as trouxe à vida. Ao longo dos anos, tenho observado sua jornada contínua
com admiração ilimitada; e não me surpreende que a minha admiração seja
compartilhada, sobretudo por jovens diretores que iniciam sua vida no teatro.
Eles a citam como sua luz guia mais do que ninguém (assim como a minha
geração citou Peter Brook), e isso não é só porque ela dedica mais de seu
tempo ao ensino do que qualquer outro diretor comparável. Suas produções
nunca deixaram qualquer dúvida de que o que você vê é a consequência tanto
de uma profunda reflexão quanto de uma atenção feroz aos detalhes. Sua vida
criativa é marcada por uma ligação apaixonada com as ilimitadas
possibilidades expressivas do teatro. É maravilhosamente encorajador que
tantos jovens diretores queiram ser como ela.
Seu livro vai ajudá-los, uma vez que irá esclarecer a quem quer saber
algo sobre o processo de levar uma peça de teatro para o palco. Ela cobre
mais ou menos tudo. É detalhada e provocante em suas descobertas sobre
como inspirar e guiar os atores. É inflexível sobre como todos os trabalhos
preparatórios de um diretor devem ser, severo em suas exigências sobre

9
aqueles que querem realizá-lo. Ele oferece conselhos sobre tudo, desde o
fornecimento de chá e café na sala de ensaios para a realização de ensaios
técnicos, e insiste na necessidade de autoanálise impiedosa no final de cada
peça. Acima de tudo, revela que há habilidades essenciais que todo diretor
tem que aprender. Ideias são fáceis de encontrar; todo mundo as tem. Sua
ênfase é sobre o que é necessário para fazê-las viver no palco. Katie usa 'A
Gaivota' de Chekhov como estudo de caso, e é uma marca do rigor de sua
abordagem em seus processos que você poderia aplicar em seu próprio
processo dessa mesma peça e chegar a uma produção completamente
diferente da dela, que estava no National, em 2007. O que não seria diferente é
a integridade com a qual ela insiste que você se aproxime do trabalho de dirigir.
Este livro deve tornar-se um guia essencial para os diretores do teatro
de língua inglesa.
Nicholas Hytner
Teatro Nacional, junho de 2008

Endgame by Samuel Beckett

10
INTRODUÇÃO
(Tradução de Janaína Siqueira - Revisão Humberto Issao)

As primeiras tentativas de dirigir podem fracassar porque os diretores


não têm certas ferramentas simples. Sem essas ferramentas, dirigir se torna
um processo baseado no acaso ao invés da habilidade. As ferramentas deste
livro vão ajudar você a fazer acontecer o mais próximo daquilo que você quer
ver - ou que você imaginou em sua cabeça. Ele também irá incentivá-lo a
pensar sobre direção como um ofício/trabalho, com habilidades que podem ser
aprendidas e acumuladas ao longo do tempo.

Existem duas grandes escolas de pensamento sobre a formação de


diretores. Alguns pensam que dirigir é um talento inerente que só pode evoluir
no chão da sala de ensaio, durante o processo de fazer apresentações. Outros
pensam que é como uma habilidade que pode ser aprendida ao longo do
tempo em um contexto educacional. Eu sou dessa última opinião e acho que
estranho que a maioria dos atores, pelo menos no Reino Unido, passam por
uma formação estruturada, enquanto os diretores não. Lamento por não terem
me ensinado e sinto que a arte de dirigir, como a de atuar, só pode melhorar se
realizada a partir de um período de treinamento preliminar. Muitos diretores nos
estágios iniciais de suas carreiras estão sobrecarregados com a expectativa de
que eles são, de alguma forma, obrigados a levantar e entregar uma direção
brilhante. Algumas habilidades básicas podem fazer toda a diferença para a
sua confiança e capacidade de dirigir de forma coerente. Ao selecionar os
exercícios e conselhos contidos neste livro, eu tentei pensar nas ferramentas
que eu precisava quando eu estava começando. No entanto, é importante
diferenciar as produções que eu faço e as ferramentas que este livro descreve.
Se dez diretores diferentes usassem essas ferramentas, os resultados seriam
radicalmente diferentes. No entanto, há certas habilidades básicas que têm de
ser postas em prática em qualquer produção, seja qual for a visão, voz ou
interpretação do diretor. São essas habilidades que eu estou tentando isolar e
descrever.

O livro descreve as habilidades práticas essenciais e necessárias em


cada fase do processo de produção teatral, desde a escolha de um texto até a
performance final. A ênfase principal está no trabalho com os atores. No
entanto, o livro inclui também etapas chaves na construção de uma produção
com os membros da equipe criativa. Isto inclui o trabalho em equipe, figurino,
iluminação, sonoplastia, movimento, voz e música. A única relação que não é
abordada é a com um escritor vivo. Eu trabalho principalmente em peças de
autores mortos, e, portanto, tenho pouca experiência de trabalhar com
dramaturgos de novas peças. Há diretores, como Max Stafford Clark e James
Macdonald, que são especialistas nesta área e que são peritos na reflexão e
escrita de novas peças.

A maioria das ferramentas descritas neste livro vêm de ensinamentos de


Konstantin Stanislavski, mediada por um intérprete secundário e, em seguida,
posta em teste no meu próprio trabalho. Outros vêm de minha pesquisa
recente em Biologia das Emoções. O resto é resultado do senso comum e de

11
duras lições aprendidas no chão da sala de ensaio. Eu tenho usado uma peça
específica - 'A Gaivota', de Anton Chekhov - para ilustrar e descrever o
processo que eu passo ao fazer uma produção. A peça é traduzida por Michael
Frayn e publicada pela Methuen (1998), em uma coleção de quatro peças de
Chekhov ('A Gaivota' é sobre os amores e perdas de um grupo de amigos
próximos e familiares que vivem em uma propriedade rural na Rússia).
Contudo, as tarefas no livro podem ser aplicadas em qualquer material - seja
realismo Chekhoviano, textos abstratos de autores como Beckett e Pinter, ou
novas peças - ou até mesmo em trabalhos altamente estilizados, como óperas
do século XVIII.

Você pode entrar e sair deste livro para resolver problemas imediatos em
seus ensaios ou você pode estudar 'A Gaivota' com maior profundidade - e,
assim, extrair uma visão mais abrangente do processo. Alternativamente, você
pode escolher e misturar elementos do livro com os ingredientes de sua
preferência - possivelmente usando ideias do livro para guiá-lo através de
novos desafios ou fortalecer os pontos fracos em seu próprio processo.
Dependendo do estágio que você alcançou em sua evolução como diretor, ele
pode ajudar você anotar uma lista dos pontos fortes e fracos do seu trabalho
antes de começar a ler. Isso pode dar a você um senso de propósito ao ler o
livro. Além disso, tente as tarefas de preparação nas peças que você está
trabalhando ou pensando em dirigir, para ver se as tarefas ajudam a aprofundar
a sua compreensão do material. Também não é necessário aceitar todos os
aspectos do processo que eu delinear. Se um exercício não faz sentido para
você, talvez seja melhor não levá-lo para a sala de ensaio. Se você usar um
exercício em que apenas metade é digerida ou entendida, há uma chance real
de que ele vai acabar confundindo ou frustrando os atores. Isso poderia minar
a sua confiança e o respeito deles por você.

O livro assume que você está interessado em construir um mundo


imaginário para os atores habitarem, usando ingredientes da vida real e as
circunstâncias sugeridas pelo próprio texto. Ele também assume que dirigir é
um trabalho que exige consideração e preparação cuidadosa antes dos
ensaios começarem. Os próprios ensaios são fundamentais, mas você pode
poupar uma grande quantidade de tempo se preparando de forma eficiente.
Preparação detalhada irá assegurar que você use o processo de ensaio de
forma muito mais econômica. Preparação minuciosa não funciona contra a
criatividade ou a contribuição dos atores nos ensaios; em vez disso, alimenta,
concentra e inspira o trabalho dos atores. Preparação também faz você mais
confiante como diretor e, por sua vez, promove a confiança dos atores em
você.

A Parte I deste livro aborda o trabalho que você faz em si próprio antes
de começar a ensaiar. Incluindo conselhos sobre a construção das relações
com todos os envolvidos na produção teatral, além dos atores. A Parte II
descreve o processo de ensaio, e a Parte III leva você através de ensaios
técnicos, ensaios gerais e a maneira pela qual você pode trabalhar sobre a
apresentação da peça, durante a sua execução. A Parte IV descreve a
evolução da minha relação com o trabalho e o legado de Stanislavski.

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Primeiro, aqui estão algumas sugestões sobre como você deve proceder
sobre a leitura de um texto ou quando você está pensando em dirigir ou
quando você está começando a trabalhar com ele. Antes que você possa
interpretar uma dramaturgia escrita, você deve saber exatamente do que se
trata. Resista ao desejo de correr para o material apressadamente com suas
próprias ideias e recue, a fim de avaliar as ideias do dramaturgo e o que está
realmente nas páginas a sua frente.

Ao ler um texto que pretende dirigir, muitas vezes você vai achar que as
batidas do seu coração aumentam e sua temperatura corporal também. É uma
sensação semelhante a se apaixonar. Você pode se sentir animado e, como
resultado, você nem sempre vai ler o texto com muito cuidado ou lentamente.
Em vez disso, os olhos escorregam e patinam sobre as palavras, e sempre se
concentram em uma seção que você particularmente gosta. Você salta sobre
as seções que não lhe interessam imediatamente. 'Eu vou separá-los mais
tarde', você diz para si mesmo. Se você fosse dirigir a peça com base nessas
leituras iniciais, a apresentação refletiria o seu entusiasmo instável e ela seria
desnivelada.

Quando eu estava dirigindo 'A Orestéia', de Ésquilo, eu estava


particularmente interessada na história do sacrifício de Efigênia. 'A Orestéia' é
uma trilogia de peças de teatro e a história do sacrifício de Efigênia é o motor
da primeira peça. Não é o motor da segunda peça e mal se apresenta na
terceira. Além da história de Efigênia, o meu interesse no texto foi esporádico e
essa falta de interesse foi por fim legível na apresentação. A apresentação
tornou-se menos focada conforme a noite avançava, o público ficou mais
agitado e os personagens que não tinham relação direta com a história de
Efigênia foram negligenciados. Minha inclusão de um fantasma que
representou Efigênia e vagou por meio da ação da trilogia foi, em última
análise, confusa para o público. A apresentação foi um reflexo preciso da minha
primeira leitura super-animada e inconstante do texto, mas não foi uma
representação muito precisa da peça que Ésquilo tinha escrito.

Por isso, é importante ler o texto com cuidado e lentamente, a fim de


verificar se você está realmente lendo todas as suas cenas e não apenas
algumas delas. Aprender a fazer isso com a cabeça limpa também irá ajudá-lo
a tomar uma decisão sobre se você realmente quer dirigir a peça.

Outro obstáculo para a leitura clara de um texto dramático é uma


afinidade que pode ficar no caminho de sua compreensão do texto, muito
parecido com a estática de um rádio que interfere com a recepção de um
programa que você está ouvindo. Afinidades são as coisas que você desenha
na peça, pois se referem à sua própria vida ou de como você olha para o
mundo. A afinidade pode ser ao mesmo tempo útil e um tanto limitativa. É útil
na medida em que pode lhe dar uma percepção privilegiada sobre um aspecto
do texto ou de um personagem que você não teria de outra forma. Por
exemplo, você pode decidir dirigir uma peça ambientada em um consultório
médico. Se o seu pai é médico na vida real, então você vai saber muito sobre a
profissão, tanto em público como em particular, e isso pode ajudá-lo a dirigir a
peça. Mas a mesma afinidade que lhe dá uma visão especial sobre a vida de

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um médico poderia encorajá-lo a fazer a ação muito próximo ao do centro
cirúrgico de seu pai ou poderia impedi-lo de ver outros aspectos da peça.

Você pode ver esse mesmo problema de interferência com o trabalho do


ator. Por exemplo, a atriz que interpreta Arkadina (que também é uma atriz), em
'A Gaivota', pode ser atraída para a personagem porque a atriz tem uma
afinidade óbvia com a profissão da personagem e as emoções associadas com
ela. No entanto, isso não é tudo o que Chekhov requer para a atriz na peça.
Arkadina também é uma mãe que se encontra em um relacionamento com um
homem mais jovem. Grande parte da ação na peça relaciona-se com esses
papéis, tanto quanto - se não mais do que - a sua profissão. A situação é
igualmente verdadeira para um diretor. Um diretor pode ter uma afinidade com
os aspectos teatrais da peça, mais uma vez, pela razão óbvia de que é a sua
profissão. Isto significaria que os outros temas da peça - o amor não
correspondido, sonhos destruídos e família - iriam ser negligenciados. A
apresentação seria desequilibrada.

Quando você está imaginando uma peça em sua cabeça ou a lê


completamente, é possível que você esteja realmente só imaginando o que os
personagens que tem fala estão fazendo ou onde eles poderiam estar. Em uma
peça com um grande número de personagens, isso significa que você não
imagina todos no palco. Por isso, quando chega a hora de dirigir a cena, você
não sabe o que fazer com os personagens que não falam. Esta falta de
atenção para os personagens que não usam a palavra será legível para o
público. Então, você precisa preparar o texto, imaginando cada personagem
em cada momento, independentemente do quanto eles têm a dizer. Mesmo
que seja um papel menor, sem qualquer texto, como uma camareira ou um
garçom, esses personagens estarão presentes no palco e o que eles estão
fazendo deve ser claro. Na primeira cena de 'A Gaivota', por exemplo, você
pode esquecer que há também operários presentes como Masha e
Medvedenko. Eles estão por trás da cortina do palco improvisado, trabalhando.
Quando você preparar a cena, você pode só trabalhar no que Masha e
Medvedenko estão fazendo. Você vai então chegar para os ensaios e os três
atores que fazem os trabalhadores estarão prontos para ensaiar e você vai só
olhar para eles inexpressivamente, sem saber o que fazer. Então você vai ter
que vir com uma solução apressada, que pode não ser tão completa como é o
seu trabalho quando elaborado previamente.

Aprender a manter toda a imagem do que o público vai ver em sua


cabeça, enquanto você lê o texto, é fundamental. Faça isto executando a ação
da peça em sua cabeça como se fosse uma fatia de cinema naturalista.
Imagine o que o público vai olhar quadro a quadro. Não invente uma complexa
sequência de imagens; em vez disso, faça das sequencias as mais simples
possíveis. Lembre-se, este exercício não é sobre descobrir exatamente como
você vai dirigir cada cena - que é uma tarefa que você vai abordar muito mais
tarde no processo. Pelo contrário, é sobre captar todos os elementos que você
precisa atender ao dirigir a peça.

Visualizar a ação assim também irá lembrá-lo de manter uma imagem


consistente de lugar em sua mente. Quando você lê um texto, você pode

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facilmente esquecer de uma peça do mobiliário, ou de um local, como um lago,
que está permanentemente presente e visível em uma cena. Você imagina
esses objetos e detalhes geográficos quando alguém fala sobre eles, mas você
pode esquecê-los quando o assunto da conversa muda. Posteriormente, você
pode não dirigir os atores para reagir com precisão e de forma consistente ao
seu ambiente. Em uma parte da cena, um personagem pode mencionar que
está quente, então todo mundo nessa parte começa a atuar no calor. Cinco
minutos depois, o calor não será mais discutido no texto, se todo mundo parar
de atuar nele - com eles permanecendo exatamente no mesmo lugar e sem
mudança alguma no clima. Isso vai confundir o público.

Por fim, lembre-se que você está lendo o peça, a fim de chegar a tarefas
concretas para os atores. Então, você precisa praticar traduzir o seu
entendimento intelectual do material em tarefas específicas para os atores
executarem. Se você conversar com os atores usando uma linguagem de
crítica literária ou ideias abstratas, eles vão lutar para responder às suas
instruções de forma rigorosa e, como resultado, seu trabalho será vago. É claro
que a maioria dos atores são perfeitamente capazes de manter uma conversa
intelectual sobre o texto dramático, mas não é para isso que eles estão na sala
de ensaio. O trabalho deles é escorregar para dentro da pele de um
personagem e encarnar emoções, pensamentos e ações críveis. O seu
trabalho é colocá-los dentro dessa pele. Pense em como você pode dar
instruções a alguém para uma viagem de carro. Se você der instruções da
paisagem que estão procurando, e se esquecer de dizer-lhes sobre um
entroncamento na estrada, ou de falar com eles sobre o fim de sua jornada,
eles vão se perder. O motorista necessita de informações precisas, com pontos
de referência claros sobre estradas, sinais e marcos. Quanto mais clara as
instruções são, mais rápido o motorista vai chegar ao seu destino. Acontece o
mesmo com os atores. A Parte I deste livro vai mostrar como extrair
informações do texto que irão ajudá-lo a moldar tarefas concretas para os
atores fazerem.

15
Easter de August Strindberg

16
PARTE 1 - PREPARAÇÃO PARA OS ENSAIOS

Endgame by Samuel Beckett

PREPARAÇÃO PARA OS ENSAIOS


(Tradução de Janaína Siqueira - Revisão Humberto Issao)

Essa parte do livro descreve tudo o que você precisa fazer para preparar
seus ensaios. O objetivo dessa preparação é extrair as informações do texto
que irão ajudar os atores a interpretar os personagens e situações da peça.

Quando você observa uma situação na vida, você percebe que o


comportamento dos indivíduos é determinado por um conjunto complexo de
fatores. Lembre agora da ultima vez que você viu um casal discutindo. Você
notou se a temperatura de onde eles estavam estava quente ou fria? Você
notou se estava ventilado ou abafado? Você notou se estavam numa casa ou
num apartamento? Você notou a hora do dia? Você conseguiu projetar o que
as pessoas fariam em seguida? Você imaginou imagens dos eventos no
relacionamento que foram determinantes para a presente discussão? Você foi
capaz de perceber qualquer uma dessas coisas, mesmo que as palavras que
as duas pessoas estavam dizendo um ao outro não citassem qualquer um
desses assuntos diretamente? Você notou o que cada um queria da outra
pessoa? Será que eles querem ser perdoados ou compreendidos?

Muitas dessas informações podem ser lidas nas ações físicas do casal -
você será capaz de ler informações pela forma como eles se sentam, como se
movem, como espalham a manteiga no pão ou colocam seus casacos quando
estão saindo. Por exemplo, se está frio, as duas pessoas vão fazer gestos

17
involuntários e voluntários para se manterem aquecidos. Se uma pessoa está
atrasada, suas ações serão mais rápidas do que as da outra pessoa. Outras
informações emergirão do jeito como eles se comunicam um com o outro, seja
rapidamente ou lentamente, em silêncio ou em voz alta. As informações que
este casal transmite sobre eles mesmos e sua relação são, portanto, verbais e
físicas. E se é verbal, o tom de como eles falam é tão significativo quanto o
conteúdo do que eles estão dizendo.

Quando você lê um texto dramático, é uma boa ideia procurar


informações sobre todos os fatores que criam ou afetam o comportamento dos
personagens na ação da peça (ou os fatores que determinam as mudanças em
seu comportamento). Se esses fatores não são explicitamente indicados, você
pode precisar ler as cenas cuidadosamente para inferir precisamente as
circunstâncias em que os personagens se encontram. Os fatores que você
precisa procurar podem vir sob os seguintes títulos:

Local: O ambiente em que os personagens estão.


Biografias dos personagens: os eventos no passado que moldaram os
personagens.
Circunstâncias imediatas: As 24 horas que antecederam a ação de cada
cena ou ato.
Tempo: O ano ou estação, ou hora em que a ação ocorre, ou o efeito da
passagem do tempo entre atos ou cenas.
Eventos: As mudanças que afetam o comportamento dos personagens.
Intenções: As imagens do futuro que impulsionam a ação presente dos
personagens.
Relacionamentos: Os pensamentos que uns tem sobre os outros, para
calibrar o comportamento dos personagens.

Há, claro, outras preparações que você precisa fazer antes de dirigir a
peça e estas preparações serão investigadas nos capítulos que se seguem.
Mas identificar os fatores que determinam o comportamento e as ações dos
personagens deve estar no cerne do seu trabalho preparatório.

18
The Maids by Jean Genet

1. Capítulo - Organizando as primeiras respostas do texto


(Tradução de Janaína Siqueira - Revisão Humberto Issao)

Este capítulo é sobre como organizar suas respostas iniciais ao texto e


construir o mundo que existe antes do início da ação da peça. Ele tem seis
passos:

1.1 - Usando listas de fatos e perguntas


1.2 - Organizar informações sobre o que existe antes do início da ação da
peça
1.3 - Pesquisa
1.4 - Respondendo a perguntas difíceis sobre o texto
1.5 - Lugar
1.6 - Biografias de personagens

Assumir estes passos irá garantir que você tenha uma relação objetiva
com o texto dramático. Sua objetividade irá ajudá-lo a construir um mundo que
é específico e, mais tarde, ela irá ajudá-lo a falar sobre a peça de uma forma
que os atores vão achar útil.

19
RESUMO
Use lista de fatos e perguntas para organizar as suas respostas para o
texto

1.1 Usando listas de fatos e perguntas

Quando você começa a trabalhar em um peça, você precisa encontrar


uma maneira simples de organizar suas descobertas e respostas. Listar
informações na forma de fatos e questões irá ajudá-lo com isso. Os fatos são
os elementos inegociáveis do texto. Eles são as principais pistas que o escritor
lhe dá sobre a peça. Em 'A Gaivota' são incluídas coisas como 'Arkadina tem
um filho chamado Konstantin' ou 'Medvedenko é um professor' ou 'Estamos na
Rússia'. As perguntas são uma forma de apontar as partes do texto que são
menos claras ou que você simplesmente não tem certeza. Faça perguntas
sobre qualquer coisa que não é simples ou clara. As perguntas podem incluir
coisas como 'O que aconteceu com o pai de Konstantin?', ou 'Estamos em que
estação do ano?', ou 'Onde está o espólio de Sorin na Rússia?'. Sempre
escreva fatos e perguntas em frases simples e objetivas. Como regra geral, se
você não tem imediata certeza de que o que você identificou é um fato,
transforme-o em uma pergunta.

Organizar informações desta forma incentiva você a manter uma relação


objetiva com o material e inibe tentativas prematuras para interpretar o texto
dramático. Listas de fatos e perguntas serão utilizadas nos exercícios descritos
neste capítulo e no Capítulo 2, quando trabalharmos com a ação na peça.

1.2 Organizar informações sobre o que existe antes da peça


começar

Organizar as informações do texto sobre o que existe antes que ação da


peça comece, o ajudará a mapear certos laços físicos, geográficos e temporais
da peça - criando uma imagem do passado de cada personagem. Nenhum
processo de ensaio ocorre sem que os atores façam perguntas sobre o que
aconteceu antes da ação da peça, e, portanto, é extremamente vantajoso ter
essas informações amarradas. Isso permitirá que você esteja apto a lidar com
perguntas simples sobre o lugar como: 'De onde eu acabei de vir?', ou
questões mais complexas sobre eventos passados na vida dos personagens
como: 'Quando eu encontrei Trigorin pela primeira vez?'.

Use o formato de fatos e questões para coletar informações sobre tudo o


que existe ou aconteceu antes que a ação da peça se desenrolasse. Faça duas
listas: uma de fatos e uma de perguntas. Eu chamo essas listas de 'histórias
passadas'. Os fatos incluem coisas como 'Arkadina é casada Gavril Treplev' ou
'Estamos na Rússia' ou 'a mãe de Nina está morta'. Todos os fatos devem ser
escritos - porém resumidamente. Pode ser apenas um evento breve e
aparentemente irrelevante, como a descrição de Sorin de como um dos seus
adjuntos disse que sua voz era desagradável, ou o fato de que a escrita de
Trigorin é traduzida para outros idiomas, mas cada um desses assuntos
importa quando se trata de construir os eventos passados da vida de um
20
personagem. Perguntas incluem coisas como 'O que aconteceu com o pai de
Konstantin?', Ou 'Onde está o espólio de Sorin na Rússia?', Ou 'Quando e
onde Arkadina interpretou A dama das Camélias?'.

Lembre-se, se você não tiver certeza se algo é um fato ou uma


pergunta, coloque-a como uma pergunta. Por exemplo, você pode querer
colocar 'Arkadina interpretou Gertrude em Hamlet' como um fato porque ela cita
a obra de Shakespeare no ato, mas não há nenhuma evidência direta de que
ela interpretou Gertrude por isso é melhor escrever como pergunta 'Será que
alguma vez Arkadina interpretou Gertrude em Hamlet?'. Às vezes, você vai
descobrir que as perguntas que você faz no início da tarefa são respondidas
mais tarde, na ação. Quando isso acontece, risque a pergunta e adicione a
resposta para a lista de fatos. Lembre-se, no entanto, de não listar todas as
informações sobre os eventos entre as cenas ou qualquer coisa que acontece
durante a ação da peça.

Aqui estão os primeiros fatos apurados pela leitura do PRIMEIRO ATO


de 'A Gaivota'.

Estamos na Rússia.
Existe uma propriedade rural, que pertence a Sorin.
Existe um parque.
Há uma ampla avenida de árvores que levam ao parque.
Há um lago.
Existe uma plataforma, que bloqueia a vista para o lago.
Há alguns arbustos.
Há algumas cadeiras e uma mesa de jardim.
Há uma cortina e está abaixada.
Masha tem usado preto desde que Medvedenko a conheceu.
Medvedenko ganha 23 rublos por mês, menos deduções de sua pensão.
O pai de Masha é um gerente da fazenda.
Há mendigos.
Medvedenko tem uma mãe doente, duas irmãs e um irmão mais novo. Ele
sustenta sua família financeiramente.
Konstantin está apaixonado por Nina.
Medvedenko vive a 4,82 quilômetros de distância da fazenda.
Medvedenko declarou seu amor a Masha.
Medvedenko é um professor.
Existe rapé.
Masha tem uma caixa de rapé contendo rapé.
Fica perto.
É noite.

Aqui estão as primeiras perguntas estabelecidas pela leitura do Primeiro


Ato.

Em que ano estamos?


Onde está a fazenda de Sorin na Rússia? (É baseado num lugar real que o
escritor conheceu?)
Qual o tamanho da propriedade?

21
Qual era o tamanho normal de um imóvel naquele tempo na Rússia?
Que tipo de árvores alinham a avenida?
Qual é o tamanho do lago?
Que tipo de arbustos existem lá?
Por que Masha usa preto?
Quanto custa 23 rublos em reais hoje?
Quanto era a pensão de um professor naquele tempo?
Quanto um gerente de fazenda ganhava naquele tempo?
Será que Masha tem um emprego?
Que doença a mãe de Medvedenko tem?
Quais são os nomes e as idades de todos os integrantes da família de
Medvedenko?
O que aconteceu com o pai de Medvedenko?
Onde Medvedenko vive com sua família?
Onde é que Medvedenko ministra aulas?
Como era a vida dos professores na zona rural russa naquela época?
Quando Medvedenko declarou seu amor a Masha e o que ela respondeu?
Quão comum o rapé era na época, para mulheres e homens? (Como você
reagiria? Qual o efeito que teria sobre você? Qual é o tamanho e o tipo de folha
em que estaria guardada?

Listar esses fatos e perguntas irá ajudá-lo com qualquer tipo de texto,
seja ele moderno ou antigo. Aqui está um exemplo dos primeiros fatos e
questões de 'Eu Não' de Samuel Beckett.

Há uma mulher.
Há alguém ouvindo a mulher.
A mulher nasceu prematuramente, um mês antes do esperado.
Ela foi criada em um orfanato religioso.
Em que ano estamos? 1972?
Quem está ouvindo a mulher?
Há quanto tempo essa pessoa tem escutado a mulher?
Qual é o seu objetivo em escutar a mulher?
Qual é o sexo da pessoa que está ouvir?
O que é um djellaba?
Quem usa djellabas e em que os países são usados?
Por que os pais da mulher a abandonaram depois que ela nasceu?
Qual a idade da mulher agora?
Quando se imaginou pelos campos esperando a primavera ? Recentemente ou
no passado distante?
Qual é a denominação religiosa do orfanato?

Você pode estar assustado com o número de fatos e questões que


emergem das primeiras cenas ou atos. Não entre em pânico. A lista vai ficar
mais curta à medida que a peça avança (a menos que a sua peça opere fora
do padrão de tempo linear). Se o sua peça não está escrita de forma linear, a
lista pode ajudar a cortar e colar as cenas juntas em ordem linear antes de
embarcar nesse exercício.

22
No final deste processo, você tem duas longas listas: uma de fatos e
uma de perguntas. Leia novamente cada uma das listas e considere como sua
imagem da peça foi alterada, assim como seu resultado. A lista de fatos vai
fazer você se sentir seguro e confiante sobre as certezas anteriores à ação da
peça. Ela lhe dará uma imagem do mundo em que a peça se desenrola. As
perguntas vão fazer você se inquietar com a quantidade de trabalho que você
tem que fazer para responder a todas elas. Em vez de se preocupar com isso,
tente ver as perguntas como um meio de aprofundar a sua compreensão do
material e antecipar as preocupações que os atores terão sobre seus
personagens ou o mundo da peça. Se algo no texto provoca um
questionamento em você, você pode ter certeza que um ator vai fazer a mesma
pergunta nos ensaios. Veja este processo, portanto, como uma ferramenta que
permite que você pense em uma possível resposta antes que o ator lance a
questão, ou como uma forma de poupar tempo nos ensaios.

Até o final de sua preparação, você irá responder a todas as perguntas


desta 'lista mestra de história passada'. As diferentes tarefas que você encontra
ao longo dos próximos capítulos irão ajudá-lo a responder essas perguntas.

RESUMO

Faça duas listas - uma de fatos e uma de perguntas - sobre tudo o que
existe ou acontece antes do início da ação da peça. São listas da
'"história passada"'.
Não liste todas as informações sobre o que acontece entre as cenas ou
atos ou durante a ação do jogo.
Leia as listas novamente e veja como sua imagem da peça se alterou.
Não se preocupe com o tamanho da lista de perguntas. Veja-a como uma
ferramenta útil de antecipação de questões que irão surgir na sala de
ensaios e como um aprofundamento da sua compreensão do material.

1.3 Pesquisa

A pesquisa ajuda você a conhecer melhor a peça, esclarece o mundo


que você está construindo e faz você se sentir mais seguro como diretor. É um
processo longo, mas realmente vale a pena fazer. Vai enraizar a sua
compreensão do texto em um forte senso do período histórico em que o peça
está ambientada - seja ela na Rússia do século XIX ou em Londres do século
XXI. Você vai se sentir mais confortável com muitos detalhes minúsculos do
texto que estavam opacos na primeira vez que você se deparou com eles. Uma
boa pesquisa irá ajudá-lo a responder a uma proporção substancial de
perguntas da sua lista de '"história passada"'. Lembre-se, no entanto, que você
não está fazendo uma pesquisa para apresentar uma reconstrução histórica de
um período (como aquelas velhas salas exibidas em museus, com manequins

23
de plástico que representam pessoas). Em vez disso, você está coletando
informações que irão ajudar os atores a dizer e fazer tudo o que eles têm a
dizer e fazer na execução da peça.

Em primeiro lugar, leia todas as perguntas da sua lista mestra de


'"história passada"' e grife todas as perguntas que precisam ser pesquisadas.
Aqui está um exemplo do tipo de perguntas que você deve destacar:

Em que ano estamos?


Onde está a fazenda de Sorin na Rússia? (É baseada num lugar real que o
escritor conheceu?)
Qual era o tamanho normal de um imóvel naquele tempo na Rússia?
Quanto custa 23 rublos valor em reais hoje?
Quanto era a pensão de um professor naquele tempo?
Quanto um gerente de fazenda ganhava naquele tempo?
Como era a vida dos professores na zona rural russa naquela época?
Quão comum o rapé era na época, para mulheres e homens? (Como você
reagiria? Qual o efeito que teria sobre você? Qual é o tamanho e o tipo de folha
em que estaria guardada?

Agora realize a pesquisa necessária para responder cada questão.


Dessa forma, você só vai pesquisar o que é essencial para uma compreensão
adequada da peça. Se você tem uma tendência a se distrair na pesquisa, ao
perceber que você está prestes a tomar um desvio lembre-se de responder a
pergunta que está na sua frente. O ideal é usar as bibliotecas ou livros para
responder todas as suas perguntas. Se você usa a Internet certifique-se de
verificar todos os fatos a partir de fontes impressas confiáveis. Sempre use
pelo menos duas fontes e certifique-se que não são copiadas uma da outra.

Aqui estão alguns exemplos de respostas para algumas das perguntas


de pesquisa.

Em que ano estamos? Chekhov escreveu a peça em 1895 e a ação da peça


acontece em dois anos. Ele não estipula que a ação tem lugar no futuro, a
leitura mais simples é que os Atos Um, Dois e Três ocorrem no verão 1893 e o
quarto ato acontece no outono de 1895.
Onde é a fazenda de Sorin na Rússia? Em julho 1895, Chekhov viajou para
ver seu amigo, o pintor Levitan, que estava hospedado na propriedade rural
distante de sua amante, chamada Gorki. Esta propriedade estava as margens
de um lago de 804 quilômetros de Bologoe e a meio caminho entre Moscou e
São Petersburgo. Este parece ter sido o cenário que Chekhov decidiu por na
peça 'A Gaivota'. Bologoe fica a 321 quilômetros de Moscou.
Quanto custa 23 rublos valor em libras hoje? Na década de 1890, um rublo
valia 3 xelins e 2 pence no Reino Unido e foi avaliado em aproximadamente £
11,01 em 2002, o que significa que Medvedenko estaria ganhando £ 253. 23
por mês, Arkadina teria cerca de £ 770.000 no banco e Dorn gastaria £ 22,000
no feriado italiano entre os Atos três e quatro.

No final deste processo, você terá algumas datas em que eventos


históricos específicos ocorreram. Coloque esses eventos em ordem

24
cronológica. Isso será útil mais tarde, quando você estiver trabalhando nas
biografias de seus personagens. Essas datas irão permitir que você veja a
relação entre eventos históricos e os acontecimentos na vida de um
personagem. Aqui está um exemplo de alguns dos fatos e evento histórico para
'A Gaivota'.

1812: o exército de Napoleão é derrotado


1820-1880: Idade de Ouro da Literatura na Rússia
1840: nascimento de Zola.
1850: nascimento de Maupassant.
1852: Primeira apresentação de A dama das Camélias
1859: nascimento de Eleonora Duse.
1861: Emancipação dos Servos.
1865-1869: Tolstoi escreve Guerra e Paz
1875-1877: Tolstoi escreve Anna Karenina
1879: A luz elétrica foi introduzida nos teatros, substituindo luzes a gás e velas
1880s: Inicio do colapso dos estados e das terras
1881: Assassinato do Czar da reforma, Alexander II, e a sucessão autocrática
de Alexander III
1888: Tolstoi comemorou seu aniversário de 60 anos
1889: Torre Eiffel terminada.
1890s: empresa francesa desenvolve um monopólio sobre a produção e venda
de enxofre. A Suíça é a líder mundial na produção de relógios de. Rise of a
Escola Decadente
1892: Maupassant tenta o suicídio.
1893: Maupassant morre.
1894: Sucessão do Czar Nicolau II, 26 anos.

Tome nota das tarefas de pesquisa que você acha que são
particularmente úteis para determinados atores fazerem e livros que podem ser
úteis para leitura. Em 'A Gaivota', a atriz que interpreta Masha pode pesquisar
o rapé, o ator que interpreta Konstantin pode pesquisar a resposta de
Maupassant para a Torre Eiffel, e as atrizes que interpretam Arkadina e Nina
podem ler o livro 'Mulheres no Teatro Russo: A Atriz na Era de Prata' por
Catherine Schuler , que descreve como as mulheres trabalhavam no teatro na
época. Se você tem um período de ensaio curto, selecione uma peça-chave de
pesquisa para cada personagem e peça aos atores para pesquisarem.

Você também vai se deparar com fotografias, pinturas e, por vezes,


referências a filmes. Colete todo esse material para mostrar aos atores.
Imagens fixas ou animadas podem ser uma maneira muito eficiente de
comunicar um senso de lugar, período ou atmosfera. Muitos atores pensam
visualmente e podem responder mais às imagens do que às palavras. Este
material também pode ajudar a alimentar o processo de trabalho com um
cenógrafo.

Mesmo se você estiver trabalhando com um texto dramático recente,


você vai descobrir que existem tarefas de pesquisa para fazer. Em 2000, eu
dirigi 'O País', de Martin Crimp, que foi criada no mesmo ano. Um dos
personagens era um médico que tomava heroína regularmente. Questões de

25
pesquisa que surgiram incluíam coisas como 'Qual é o efeito da heroína?', 'Que
efeito isso tem sobre você?' e 'Como um médico pode conseguir heroína sem
que ninguém perceba?'. Havia também referências às ruínas romanas na área
onde os personagens viviam. Isso deu origem a perguntas como 'Quando os
romanos ocuparam o norte da Inglaterra?' e 'Por que eles constroem estradas
retas? Todas estas perguntas necessárias para uma investigação aprofundada.

Mesmo que você pretenda alterar o palco da peça para outro período,
que não o momento que o escritor pretendia, é importante a realização de
pesquisas sobre o período em que o escritor tinha em mente ao escrever o
texto dramático. A pesquisa que você realizar sobre o período vai ajudar você a
saber quais armadilhas ou problemas existem ao fazer a transição de uma
época para outra. Então você terá que fazer uma nova pesquisa para o novo
período definido na peça. Quando eu dirigi Women of Troy, escrita no século V
aC, eu estabeleci a ação em um armazém contemporâneo. Antes de tomar
essa decisão, no entanto, realizei uma pesquisa histórica detalhada em três
períodos de tempo específicos. Isso significa ler sobre os acontecimentos
históricos reais em Tróia, descrições dos mesmos eventos na Ilíada de Homero
e, finalmente, as informações sobre o período de Eurípides. Apoiada por esta
pesquisa, eu era capaz de navegar pelos atores através das seções do texto
onde houve grande tensão entre a verdade histórica e a situação moderna - e
nós partimos de três períodos históricos para criar um mundo imaginário
coerente.

Se possível, faça excursões a lugares onde a ação está definida. Estas


viagens oferecem uma experiência sensorial do mundo da peça que você não
pode obter a partir de leitura de livros ou da internet. Em 1993, eu fiz uma
viagem de campo para a Noruega com o cenógrafo Vicki Mortimer como
preparação para dirigir a peça de Ibsen, Fantasmas. Visitamos Oslo, Bergen e
Skien, onde Ibsen nasceu. Tiramos fotos, coletamos flores e folhas, e ainda
fizemos gravações do canto dos pássaros. As impressões que tivemos da luz,
cor e do clima nos informaram como a apresentação seria iluminada,
concebida e dirigida. Ela também forneceu material visual útil para compartilhar
com os atores para que eles pudessem imaginar onde os personagens
viveram.

No final destas tarefas você terá respondido muitas das perguntas da


sua lista de "história passada". Agora você estará pronto para responder as
perguntas remanescente sobre o lugar, mas, antes de seguir, você precisa
descobrir como responder a perguntas difíceis sobre a peça.

26
RESUMO
Anote todas as questões da sua lista mestra de "história passada" que
precisa ser pesquisada.
Use bibliotecas ou livros para responder as perguntas. Seja cauteloso
sobre o uso da Internet e verifique todas as informações a partir dessa
fonte.
Coloque todas as datas históricas que você descobrir em ordem
cronológica.
Liste tarefas de pesquisa que são úteis para personagens específicos.
Recolha todo o material visual ou filme que você se deparar enquanto faz
a pesquisa.
Se possível, faça viagens de campo a todos os locais mencionados no
texto, todos os que você conseguir.

1.4 Respondendo a perguntas difíceis sobre o texto

Quando você responde as perguntas da sua pesquisa você terá sempre


uma resposta factual clara e satisfatória. No entanto, as questões pendentes
em sua lista de "história passada" não vão ser tão fáceis de responder,
especialmente os eventos no passado dos personagens para os quais o texto
não dá qualquer informação precisa. Como, quando e onde, por exemplo, que
Trigorin e Arkadina se conheceram? Quando e onde Nina e Konstantin se
apaixonaram? O texto não descreve esses eventos. Nestes casos, você terá
que confiar em suas impressões sobre o texto para inferir elementos de fato
sobre os eventos passados.

O processo de inferir informações factuais a partir de conversas que não


contenham fatos é o que fazemos na vida. Aparentemente o diálogo humano
banal pode conter uma grande quantidade de informações, se for lido
corretamente. Mesmo se estamos ouvindo duas pessoas em um café
conversando sobre uma série de banalidades, como compras ou o tempo, aos
poucos informações sobre seu passado cristalizam-se em nossa mente.
Podemos perceber se eles são amigos há vários anos ou se acabaram de se
conhecer.

Use a sua impressão sobre o texto para responder as questões


pendentes em sua lista de "história passada". Essas perguntas precisam ser
respondidas para que os atores tenham imagens claras do que aconteceu no
passado para a construção de seu personagem e os relacionamentos dele. O
relacionamento na vida real é um resultado de vários eventos compartilhados
entre duas pessoas durante um período de tempo. Atores precisam construir
relações entre os personagens de uma peça de forma semelhante, inventando
imagens compartilhadas de eventos passados que determinam a relação que
eles têm na peça.

27
Uma 'impressão' é o termo que eu uso para me referir a informações que
derivam da leitura de uma linha ou uma seção de um texto dramático que não
contém fatos óbvios. Você pode usar essas 'impressões' para reunir
informações sobre os personagens e o mundo que habitam. Ler o texto com
atenção para a mais simples ou clara impressão do que o escritor pretende é
uma habilidade importante para se desenvolver como diretor. Quando você
tenta pela primeira vez, pode ser como olhar através de uma névoa espessa
para um marco. Seus olhos podem enganá-lo e você pode ver marcos onde
não existem ou descobrir que eles estavam bem na sua frente o tempo todo.
Tente levar o tempo que precisar para cumprir essa tarefa e não se apresse
para resolver as coisas. Continue lendo cada pedaço relevante do texto até que
o nevoeiro se disperse e que um possível significado ou significados sejam
revelados. Essencialmente, você deve se focar na leitura mais simples ou mais
lógica do texto, mais do que a mais complexa. Isso ocorre porque o significado
mais simples ou mais lógico é muitas vezes o que o escritor propôs e, por isso,
é que plateia está mais propensa a ouvir. Por exemplo, não há nenhuma
questão decidindo se Nina sabe como Trigorin parece e se o acha atraente
antes do início da peça porque no Primeiro Ato, ela pergunta para Konstantin
'Ele é jovem?', e na simplicidade da fala o público ouvirá que ela não sabe a
idade de Trigorin ou como ele é.

RESUMO
Pratique a leitura do texto para inferir informações factuais que não estão
diretamente indicados pelo escritor.

1.5 Lugar

O Lugar, como o tempo, afeta o modo como nos comportamos. Há uma


diferença entre ter uma conversa quando estamos de pé em um campo aberto
e ter uma conversa de pé em um escritório abafado em uma torre. A
construção de uma imagem completa do local ou locais em que a ação da peça
ocorre, ajuda o ator a entrar e acreditar no mundo em que sua personagem
existe. Organizar as suas próprias imagens do lugar antes dos ensaios vai
fazer você se sentir como se estivesse construindo um ambiente que é sólido e
real, e, portanto, irá prepará-lo para ajudar os atores a imaginarem
completamente o mundo da peça. Isso lhe dará confiança em lidar com o
mundo fora do palco durante os ensaios e irá ajudá-lo a superar todos os
problemas que você pode ter ao fechar a cena. 'Fechar' é o termo usado para
descrever como você faz a ação ficar clara para o público. Escrevo mais sobre
isso no Capítulo 11.

Quando falamos em lugar muitas vezes usamos a frase 'a quarta


parede'. Se você fosse fazer um projeto tradicional de uma sala em um
proscênio haveria três paredes visíveis para o público. A frase 'quarta parede'
refere-se ao muro imaginário que compõe o resto da sala, mas não está

28
fisicamente presente. A frase implica que o ator só precisa imaginar o que é ou
está além do plano que separa a ação do público. O ator precisa imaginar que
é rodeado por todos os lados. Se o ator tivesse que ficar no meio do palco e
virar 360 graus, ele deve ser capaz de dizer o que o seu personagem pode ver
ao seu redor, como uma vista através de uma janela, onde uma determinada
porta leva ou como é o sótão acima deles. Se o ator fosse fazer isso no
primeiro ato de 'A Gaivota', seu personagem iria ver o lago, os edifícios
agrícolas, a casa e o parque (incluindo o campo de croquet) e do céu. O
público vai ver apenas um fragmento desses pontos de vista manifestados no
projeto. Talvez eles vão ver um pouco do lago, o lado da casa e uma fatia do
parque. A única maneira que eles podem ver todas as outras coisas é através
dos atores. Se um personagem se comporta como se as coisas estivessem
realmente lá, isso vai permitir que a imaginação do público veja esses lugares
também.

Às vezes, quando você está assistindo uma apresentação, você pode


suspeitar que os atores têm apenas uma visão parcial do lugar em que a cena
está ocorrendo. Personagens entram em uma sala e você pode ver que eles
têm uma imagem de onde eles vieram pela maneira que mantêm seus corpos
ou a poeira sobre suas calças ou como esfregam as mãos. Mas então eles vão
vigiar a janela do quarto e parecem não ter ideia do que eles estão olhando.
Estas lacunas na imagem do ambiente circundante levar os atores para fora do
mundo imaginário do peça por alguns segundos, ou mesmo minutos. Eles
podem, então, se trair, e trair também a apresentação, preenchendo as lacunas
com ações ou gestos artificiais e inseguros.

Prepare a geografia da peça, colocando todos os fatos sobre o lugar na


sua lista de "história passada" em uma folha de papel separada. Em 'A
Gaivota', foram incluídos os seguinte itens.

Estamos na Rússia.
É uma propriedade rural, que pertence a Sorin.
Há uma casa; há uma sala de jantar.
Existe um parque.
Há uma ampla avenida de árvores que levam ao parque.
Há um lago.
Há alguns arbustos.
Medvedenko vive a 4,82 quilômetros de distância da fazenda.
Há cinco fazendas abandonadas ao redor do lago.
Há Paris.
Há Odessa.
Há Kiev.
Há Moscou.

Tendo completado sua investigação, esta lista passa a incluir novos


fatos, tais como o tamanho médio de uma propriedade na Rússia na época. Em
seguida, transfira as questões restantes sobre o lugar para outra lista. As
perguntas 'lugar' em 'A Gaivota' incluem coisas como o seguinte.

Qual o tamanho da propriedade?

29
Que tipo de árvores se alinham a avenida?
Qual é o tamanho do lago?
Que tipo de arbustos existem lá?
Onde Medvedenko e sua família vivem?
Onde é que Medvedenko ministra aulas?
Qual a distância da cidade a partir da propriedade rural?
Por que existem cinco fazendas abandonadas ao redor do lago?
Onde está Odessa?
Que universidade Konstantin frequentou?

Em seguida, responda todas as perguntas com uma pesquisa adicional


ou lendo o texto, as palavras lhe darão uma impressão mais simples. No final
deste processo, você terá uma longa lista de fatos sobre o lugar. Vai combinar
fatos antigos com os novos.

A propriedade fica a cerca de 24 acres quadrados.


Árvores de lima alinham a avenida.
O lago tem 16 quilômetros de comprimento e 1,6 quilômetros de largura.
O matagal é de campim-dos-pampas.
Medvedenko e sua família vivem oito quilômetros em uma aldeia onde
Medvedenko também ministra aulas.
A cidade fica a oito quilômetros da propriedade.
As cinco outras propriedades rurais ao redor do lago estão abandonadas por
causa de falência ocasionada por problemas econômicos vividos pela
aristocracia rural a partir da década de 1880 em diante.
Odessa está 321,8 quilômetros para o sul.
Konstantin foi para a universidade em Moscou.

Você vai ver que há cada vez mais círculos sobre o lugar, como as
ondulações feitas por uma pedra jogada em uma piscina. Em 'A Gaivota' os
círculos de lugar são os seguintes.

A casa em si.
As imediações da casa e da propriedade, incluindo o lago.
O município, incluindo a cidade, a estação ferroviária, a escola e a casa de
Medvedenko.
O Império Russo, incluindo os lugares mencionados na peça, tais como
Kharkov, Moscou, São Petersburgo e Poltava.
O mundo fora da Rússia, que inclui países como a Itália e a França, que são
citados na peça.

Cada peça que você ler terá uma série de círculos de lugar como estes.

Desenhe uma série de mapas grosseiros de cada um destes círculos de


lugar. Esses mapas devem ser feitos sem ter o público em mente, como se
fossem planos de lugares reais que existiam em tempo real. Por exemplo,
desenhe a planta da casa de Sorin, combinando fatos no texto com pesquisa
em casas rurais da época. Ou desenhe um mapa da propriedade em que a
casa está inserida. Ou encontre um mapa moderno da Rússia e marque nele
todos os lugares mencionados no texto. Em seguida, encontre fotos desses

30
lugares. Se os locais referidos são imaginários, então encontre as imagens que
poderiam representar esses lugares. Por exemplo, em A Tempestade, você
pode encontrar algumas fotos de uma ilha real, que tem todos os elementos
geográficos que o texto da peça descreve. Os mapas e imagens dos círculos
mais próximos do lugar, como a casa ou a propriedade em 'A Gaivota', servirão
de base para o processo de planejamento. Os mapas dos círculos mais amplos
de lugar, como o Império Russo, irão fornecer aos atores uma imagem dos
lugares citados na ação, mas que o público não vê. Na vida, quando falamos
de uma cidade ou lugar que conhecemos, a imagem aparece em nossa mente.
Se eu disser 'Birmingham', eu tenho uma imagem de Spaghetti Junction, ou se
eu disser 'Moscou', eu tenho uma imagem de neve em uma cúpula de igreja
em forma de cebola. Quando você observa alguém falar sobre um lugar, você
vai notar que eles estão vendo a imagem que têm dele enquanto falam. Isto é
evidente em seu tom de voz, na sua linha de olho, o ângulo de sua cabeça e a
forma como eles mantêm seu corpo. Este é o caso, seja qual for a postura que
eles têm para com o lugar. Da mesma forma, personagens de uma peça tem
as imagens em suas cabeças quando eles mencionam lugares como Kharkov
ou o seu próprio celeiro. O ator deve ter uma imagem em sua cabeça para
todos os lugares que seus personagens falam ou ouvem - de perto e de longe.
Se eles veem o lugar em sua mente, então eles vão ajustar o seu tom de voz e
corpos de acordo. O público terá, então, a impressão de que eles estão se
referindo a lugares reais.

Trabalhar o lugar não é útil apenas para peças antigas. Novos textos
dramáticos também se beneficiarão enormemente. Se você está trabalhando
em uma peça, faça perguntas ao dramaturgo sobre o local para esclarecer
onde ocorre cada cena, ou debata sobre os locais que são citados na peça
mas que não são vistos. Em 'O País', Martin Crimp não especificou no texto
onde a peça ocorre ou a cidade de onde os personagens vieram. Quando eu
perguntei a ele sobre isso, ele disse que imaginou o casal originalmente
vivendo no norte de Londres e se mudando para Northumberland. Depois, eu
pesquisei novamente os dois lugares, a pesquisa desses lugares me ajudou a
orientar os atores no mundo da peça.

Você precisa fazer esse trabalho sobre o lugar para todas as peças,
sendo elas realistas ou em estilo simbolista. Mesmo se você está trabalhando
em um peça surreal, como 'Dream Play' de Strindberg, você ainda vai precisar
construir imagens concretas do lugar. Nos sonhos, os lugares são muitas vezes
feitos de fragmentos de vários locais reais colocados juntos em uma
combinação inesperada - nós experimentamos o lugar tão claramente em um
sonho, como fazemos na vida. Mesmo em uma ilha imaginária, como em 'A
Tempestade', os personagens experimentam onde eles estão como um
ambiente real.

Agora você tem uma noção clara de onde ocorre a ação e os locais
falados no texto, você está pronto para estudar quem está na ação e como eles
foram moldados por eventos passados.

31
RESUMO

Pegue todos os fatos e perguntas sobre o lugar e coloque-os em uma


folha separada.
Responda a todas as perguntas em novas pesquisas ou lendo o texto para
uma impressão mais simples.
Desenhe mapas ou planos de todos os 'círculos de lugar'.
Procure imagens ou fotos para cada círculo de lugar.

1.6 Biografia dos Personagens

Diretores muitas vezes evitam preparar informações sobre os


personagens em uma peça, eles sentem que este é o território do ator e,
portanto, um aspecto do texto que não pode ser explorado antes que os
ensaios comecem. No entanto, a preparação cuidadosa de biografias de
personagens vai garantir que você oriente os atores na direção certa e, ao
mesmo tempo, evita que você perca tempo em becos sem saída. Sempre
meça suas suposições sobre o passado em relação ao que o personagem faz
e diz na ação presente da peça. Não há nenhum sentido em construir um
passado extraordinário para um personagem e em seguida, descobrir que essa
pessoa colorida não pode de forma crível dizer e fazer tudo o que ele diz e faz
no decorrer da peça. Preparar uma biografia com isso em mente irá ajudá-lo a
fazer um ator parar de inventar tocador de tuba, ex-patinador de gelo, maníaco
depressivo a partir do zero para fazer o seu desempenho 'interessante'. O
trabalho que você faz em seu próprio eu não está escrito em pedra. Detalhes
vão mudar em resposta às necessidades e percepções dos atores em ensaios.
Mas você terá um lugar para começar. Trabalhar através das biografias de
cada personagem também permite que você veja a peça como cada ator vê -
através dos olhos de uma pessoa. Essa perspectiva prepara para as
preocupações e os interesses de todos os atores na sala de ensaio. Ele
também coloca você na pele de cada personagem e você para de fazer juízos
de valor simplistas. Da mesma forma, ele ajuda você a ver a lógica entre o
modo como personagens interagem no passado e como eles se relacionam
entre si na apresentação da peça. Se você tem a imagem segura do que
aconteceu no passado, isso vai fazer com que os personagens sejam precisos
na apresentação. Por exemplo, em 'A Gaivota', se os atores que interpretam
Trigorin e Arkadina têm uma visão clara e compartilhada de como eles se
conheceram e começaram o relacionamento, isso vai ajudá-los a interpretar
suas cenas juntos. Se eles não têm uma imagem compartilhada, ou se eles
têm imagens diferentes em suas cabeças, o relacionamento e a interação no
peça em si será, na melhor das hipóteses, confusa e, na pior das hipóteses,
inverossímil. Elaborar o que aconteceu no passado é, portanto, o primeiro
passo que você dá para dirigir a encenação.

Trabalhe nos personagens na ordem em que estão listados na dramatis


personae1. Dessa forma, suas afinidades não lhe influenciarão ao analisar o

1
DRAMATIS PERSONAE Literalmente, "personagens do drama" em latim. No texto para teatro, é posto
nas páginas iniciais a fim de listar os personagens principais da obra dramática. Em geral, uma coluna do

32
seu personagem favorito primeiro e negligenciar os outros personagens em
que você está menos interessado. Certifique-se de estudar todos os
personagens com detalhes, mesmo aqueles com poucos detalhes, como uma
empregada ou garçom. Certifique-se de que você parta das impressões mais
simples e lógicas do que aconteceu no passado de cada personagem.

Comece com o primeiro personagem e retorne à sua lista de "história


passada" de fatos e perguntas. Coloque todos os fatos sobre esse personagem
em uma folha separada. Aqui está a lista de fatos sobre Arkadina.

O filho de Arkadina é chamado Konstantin e seu irmão é chamado de Sorin.


Arkadina é uma atriz e interpretou uma peça chamada A dama das Camélias.
As pessoas escrevem sobre Arkadina e Trigorin nos jornais.
Arkadina tem 70.000 rublos em um banco em Odessa.
Arkadina tem 43 anos.
Arkadina tinha 18 anos quando deu à luz a Konstantin.
Arkadina está em um relacionamento com um escritor chamado Trigorin.
Arkadina era casada com um famoso ator, vindo originalmente de uma loja de
manutenção de sua família em Kiev
Em 1873, na feira de Poltava, Arkadina fez uma performance. Ela tinha 23
anos e seu filho tinha 5 anos.
Arkadina costumava trabalhar para o Teatro do Estado e vivia naquele tempo
em um bloco de apartamentos com um pátio. Houve também uma lavadeira
que também habitava no bloco. Um dia, a lavadeira foi tão espancada que a
encontraram inconsciente. Arkadina continuou indo para vê-la, levou-a medico
e deu banho nos filhos dela no tanque de lavar roupa. Havia também duas
bailarinas vivendo no bloco de apartamentos, elas costumavam vir e tomar um
café com Arkadina. Elas eram religiosas.
Arkadina e Trigorin vivem em Moscou.
Arkadina costumava jogar cartas, Lotto, com seu irmão e sua mãe quando ela
era uma criança na propriedade rural, no Outono.

lado esquerdo relaciona os nomes das personagens e uma coluna do lado direito relaciona suas funções,
respectivamente. Pode-se dizer que seu equivalente no cinema e em outras mídias é a lista de elenco, ou
os créditos, com o diferencial de que esta apresenta os nomes definitivos dos respectivos atores que
interpretaram cada personagem, enquanto que no teatro, como se sabe, os personagens são
interpretados por atores diferentes ao longo dos tempos. O dramatis personae também já foi usado em
outros meios literários, notavelmente no romanceInto Thin Air (1997) por Jon Krakauer, cuja proposta
principal era a de que o leitor o lesse como um drama e não um diálogo de viagens. Para o crítico
literário russo Vladimir Propp (PROPP, 1968), o termo serviu como meio de citar o papel dos
personagens nos contos de fadas da Rússia, especialmente aqueles registrados por Alexander Afanasyev
(1826-1871). Mesmo o múltiplo poeta Fernando Pessoa (1888 -1935) definia cada um dos seus mais de
oitenta heterônimos como dramatis personae inter-relacionadas em um "drama em gente" (SIMÕES,
1983, p.138).
Bibliografia
PROPP, Vladimir. Morphology of the Folktale (capítulo 2: The Function of The Dramatis Personae), 15 de
junho de 1968 (publicado pela primeira vez em 1928). University of Texas Press.
SIMÕES, João Gaspar. Fernando Pessoa: breve história da sua vida e da sua obra. DIFEL, 1983.
Fonte: http://www.edtl.com.pt/index.php?option=com_mtree&link_id=1178:dramatis-
personae&task=viewlink

33
Em seguida, coloque esses fatos em ordem cronológica grosseiramente.
Haverá pouquíssima informação diretas sobre as datas e prazos, exceto coisas
como as idades, que lhe darão as datas de nascimento. Por exemplo, o ATO I
de 'A Gaivota' acontece em 1893, quando Arkadina tem 43 anos e Konstantini,
25. A partir daí pode-se calcular que Arkadina teve Konstantin em 1868,
quando ela tinha 18 anos. Pode haver a menção ímpar de datas reais, mas
isso é raro (embora em 'A Gaivota', há a menção do desempenho de Arkadina
na feira em Poltava, em 1873). Sua pesquisa vai lhe dar algumas pistas. Ao
estabelecer a idade em que os jovens foram para a universidade e a duração
média de um curso de graduação, você será capaz de descobrir que
Konstantin foi para a universidade em 1886, quando ele tinha 18 anos. No
entanto, ainda haverá áreas onde você terá que contar com a leitura das
impressões no texto. Nesta fase, vai ajudar muito se você decidir sobre a
versão mais lógica dos acontecimentos. Por exemplo, você pode ter que decidir
quando a relação entre Trigorin e Arkadina começou, embora nenhuma data
seja mencionada no texto. Esta é a primeira visita de Trigorin à propriedade,
então a conclusão mais simples que se chegou foi que o relacionamento deles
era relativamente novo (começando menos de um ano atrás, em 1892) e que
esta foram as suas primeiras férias de verão como um casal propriamente.

Aqui temos um exemplo de uma ordenação simples dos eventos.

1850 Arkadina nasceu. Ela tem um irmão mais velho, chamado Pyotr. Joga
peças de cartas, Lotto, com a mãe e o irmão nas noites de outono. Conhece
Gavril Treplev, um conhecido ator, que veio originalmente de uma loja de
manutenção de sua família, em Kiev. Casa-se com Gavril Treplev.

1852 Estreia da A dama das Camélias, na França.


1859 Eleonora Duse nasceu.
1868 Konstantin nasceu.
1873 Performance numa feira em Poltava, 23 anos. Seu filho tem cinco anos
de idade. Trabalha no Teatro do Estado e mora em um bloco de apartamentos
junto com uma lavadeira e a bailarinas
Executa em A dama das Camélias.
Abre uma conta bancária em Odessa e começa a guardar dinheiro.
1886 Konstantin vai para a Universidade de Moscou.
1890 Konstantin sai da Universidade de Moscou, sem terminar a sua
licenciatura.
1891 Konstantin vai viver com seu irmão na propriedade rural.
1892 Ela conhece Trigorin e começa um caso. Ela começa a viver com
Trigorin. Os jornais escrevem sobre seu relacionamento.
1893 Leva Trigorin para as férias de verão na propriedade de sua família.

Você vai notar que eu também acrescentei alguns fatos que me deparei
em minha pesquisa, como a estreia de A dama das Camélias e o nascimento
da atriz italiana Eleonora Duse.

Agora anote todas as dúvidas sobre o personagem que estão em sua


lista de "história passada". Abaixo está um exemplo da minha lista de
perguntas para Arkadina em 'A Gaivota'.

34
Por que Arkadina coloca seu dinheiro em um banco em Odessa? É um paraíso
fiscal?
Por que Arkadina não deseja compartilhar seu dinheiro?
O que as pessoas escrevem sobre Arkadina nos jornais?
Quão famosa é Arkadina e pelo o que ela é famosa?
Quando Trigorin e Arkadina se conheceram?
Quando terminou o relacionamento com Gavril Treplev? Ele estava vivo ou
morto, em 1893?
Que tipo de celebridades visitam a casa de Arkadina?
Como Arkadina conheceu Gavril Treplev e onde eles se conheceram?
Como Arkadina se tornou uma atriz?
Será que Arkadina teve um caso com Dorn?
Arkadina interpretou Gertrude em Hamlet?
Quando Arkadina começou a fumar?
Arkadina foi criada na propriedade?
Quantas vezes Arkadina saiu em turnê e ficou em hotéis? Para onde a turnê
foi? Será que Trigorin foi com ela?
Quantas vezes Arkadina vinha para a fazenda? Só nas férias de verão? A que
eventos ela se referiu quando afirmou que era insultada a cada verão?
Quanto Arkadina paga por suas roupas?
Onde era o Teatro do Estado que Arkadina trabalho quando ela estava vivendo
no bloco de apartamentos?
Quantos anos tinha Arkadina e seu irmão quando eles jogavam Lotto com sua
mãe?
Quando os pais de Arkadina morreram?

Em seguida, responda a todas as perguntas. Às vezes, você não será


capaz de identificar datas precisas, então escreva as primeiras e as últimas
datas entre as quais o evento poderia ter ocorrido.

Por exemplo, o texto que descreve Arkadina jogando Lotto com a mãe
dá a impressão de que ela era uma menina, mas não nos diz exatamente
quantos anos ela tinha. Eu escolhi a data deste evento, como acontecido
quando Arkadina estava entre 5 e 12 anos de idade. Você pode decidir sobre
uma data precisa para o peça de Lotto com os atores, mais tarde, nos ensaios.
Às vezes você pode ter que inventar as datas ou anos, quando certos eventos
ocorreram. Leia o texto com cuidado para garantir que suas decisões se
conciliem com as impressões do texto e sempre escolha a resposta mais
lógica. Lembre-se que é impossível tomar decisões sobre um único
personagem, sem se referir às biografias de outros personagens. Certifique-se
de que você cruza fatos de referência entre as biografias de vários
personagens para que você tome decisões que irão funcionar para todos. Use
estas respostas para criar o primeiro esboço da biografia do personagem. Aqui
está um primeiro esboço da biografia de Arkadina depois que este processo foi
concluído.

1850 Arkadina nasceu em uma propriedade perto de um lago. Ela tem um


irmão mais velho, chamado Pyotr.
1852 (Estreia de A dama das Camélias)
1855-1862 Joga Lotto com a mãe e o irmão nas noites de outono.

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1859 Eleonora Duse nasce.
1866 Sua mãe morre.
1867 Ela conhece Gavril Treplev (45 anos) um ator famoso que veio
originalmente de uma loja de família, em Kiev. Ela o viu atuar em uma peça no
teatro na cidade Bologoe, perto da propriedade. Ela foge de sua família.
1868 Idade de 18, casa-se com Gavril e sua família a deserda. Konstantin
nasce. Gavril a ajuda a começar sua carreira de atriz, interpretando pequenos
papéis nas produções que ele está estrelando.
1872 Gavril morre, deixando-a sem nada.
1873 - Idade de 23 anos, realiza uma performance na feira agrícola em
Poltava. Konstantin tem cinco anos.
1874/5 - Idade de 24/25, trabalha no Teatro do Estado, em Moscou. Mora em
um cortiço; cuida de uma lavadeira espancada. Duas bailarinas vem
regularmente para o chá. Ela é pobre.
1877 Seu pai, Nikolay, morre e seu irmão, Sorin, herda a propriedade. Ela e
seu irmão se conciliam.
1878 Konstantin e Arkadina começam a visitar a propriedade a cada ano para
as suas férias de verão. Ela conhece o Dr. Dorn e tem um breve romance com
ele.
1880 Sua carreira começa a decolar com um desempenho de A dama das
Camélias e ela começa a economizar dinheiro em uma conta bancária em
Odessa. É um paraíso fiscal. Ela recebe um belo apartamento em Moscou, e
começa a ter amizade com artistas de teatro, músicos e pintores. Ela começa a
fumar. Ela tem que pagar entre 300 e 400 rublos por cada figurino..
1880s Inicio do colapso de muitas propriedades pertencentes à aristocracia
rural.
1886 Konstantin vai para a universidade em Moscou.
1890 Konstantin deixa Universidade de Moscou, sem terminar a sua
licenciatura.
1890 Ascensão da Escola decadentista.
1891 Konstantin se muda para a fazenda onde vive permanentemente.
Arkadina se recusou a cuidar dele em Moscou, porque ele não conseguiu
concluir o curso universitário que ela tinha pago.
1892 Ela conhece Trigorin (com 30 anos) depois de uma apresentação de
Hamlet, no qual ela interpretou Gertrude. Ele está à procura de uma nova atriz
para sua peça. Eles começam um caso. Ela estrela com êxito a nova peça de
Trigorin em Moscou. Os jornais começam a escrever artigos de fofocas sobre
ela e sua relação com Trigorin.
Outono - 1892 Trigorin vai morar com Arkadina em seu apartamento, dessa
forma consagram a sua relação.
1893 Arkadina convida Trigorin para ficar com ela na propriedade de sua
família para as férias de verão.
Esta é a biografia esboço que será a base de seu trabalho com os atores
na sala de ensaio. Repita o mesmo exercício para cada personagem na peça.

Personagens sobre os quais existe pouca informação sobre o passado


requerem um pensamento cuidadoso. Se há seções em branco em suas
biografias, existe o perigo de que o diretor ou o ator inventem informações que
não vão ajudar o ator a interpretar a peça. Em vez disso, você pode tentar
encontrar a maneira mais simples de preencher as lacunas. É particularmente

36
difícil de escrever uma biografia para o personagem de Trigorin em 'A Gaivota'.
Não há informações no texto sobre seus antecedentes familiares, a sua
educação, ou como ele se tornou bem sucedido como escritor. Tome algumas
decisões simples. Suponha que ele é educado e tem um diploma universitário.
Saiba algumas informações básicas sobre a educação russa do século XIX,
como a idade que as crianças começaram a escola primária ou começam um
curso universitário, e adicione a biografia de Trigorin. Então leia como a
carreira de Tchekhov como escritor se desenvolveu e dê a Trigorin os mesmos
passos básicos. Finalmente, dê-lhe um fundo de classe um pouco diferente,
para que possamos vê-lo. Uma das razões mais simples para as pessoas
reterem informações sobre os seus antecedentes é que eles vêm de uma
classe diferente. Chekhov veio da classe de lojinhas de manutenção, então
tomemos a mesma decisão sobre Trigorin.

Você também precisa trabalhar em personagens que não aparecem na


ação da peça, mas estão fortemente presentes nas mentes de todos ou de
alguns dos personagens no palco. Esses personagens são chamados
personagens indiretos e sua existência afeta o que o personagem diz ou faz na
ação da peça. Há pessoas mencionadas em 'A Gaivota' (listados abaixo), que
se apresentam fortemente na vida de certos personagens; é importante
construir uma imagem clara deles.

Nikolay Sorin
Mrs Sorin
Gavril Treplev
A mãe de Nina
O pai de Nina
A madrasta de Nina
O pai de Medvedenka
A mãe de Medvedenko
Duas irmãs de Medvedenko
O irmão de Medvedenko

Como você está trabalhando em cada um dos personagens da peça,


faça uma anotação com fatos e perguntas sobre os personagens indiretos.
Depois de terminar a construção de uma biografia para os personagens no
palco, comece a construir as biografias dos personagens indiretos utilizando o
mesmo processo. Depois de ter passado por todos os personagens vistos no
palco e indiretos, faça uma lista mestra de dados que combina histórias
passadas de todos os personagens. Isto irá lhe fornecer uma visão geral de
suas vidas.

A construção da biografia de cada personagem antes de começar os


ensaios também vai ajudá-lo quando você estiver se preparando para dirigir
uma nova peça. Se o escritor estiver disponível, você pode trabalhar junto com
ele para construir essas biografias juntos. Você pode trabalhar da mesma
forma nas personagens de peças que são mais abstratas ou estilizadas, tais
como aquelas escritas por Beckett ou Pinter. Quando eu dirigi 'Eu não' de
Beckett, eu construí a biografia para o personagem 'Boca' exatamente da
mesma forma que eu teria feito com um personagem de uma peça de

37
Chekhov. Eu também uso esse processo ao trabalhar com cantores de óperas.
Mesmo que uma ópera tenha uma forma altamente estilizada, com estruturas
musicais repetitivas, as biografias dos personagens podem realmente ajudar a
firmar os cantores.

Ao final deste processo, você terá separado uma biografia-esboço para


cada um dos personagens da peça. Você também terá respondido a maioria
das perguntas sobre seu histórico de lista de "história passada" de fatos e
perguntas. As questões pendentes serão respondidas em seu trabalho sobre
circunstâncias imediatas no Capítulo 2. O Capítulo 5 descreve como
aprofundar o trabalho sobre os personagens, ao considerar os relacionamentos
e improvisações.

RESUMO
Liste todos os fatos sobre cada personagem em folhas separadas e
coloque cada um deles em uma ordem cronológica grosseira.
Liste todas as perguntas sobre cada personagem em folhas separadas e
as responda.
Transfira as respostas para as suas perguntas sobre as biografias
individuais dos personagens.
Trabalhe sobre as biografias de todos os personagens indiretos.
Combine todas as biografias em uma lista principal.

1.7 Lista de verificação de todo o trabalho feito neste capítulo

Uma listra mestra sobre o passado com fatos e perguntas: a lista de


"história passada"

Uma lista de respostas para todas as questões da pesquisa

Uma cronologia dos acontecimentos históricos relevantes

Uma lista de todas as tarefas de investigação para os personagens


específicos

Uma coleção de material visual ou filme

Documentos de quaisquer viagens de campo

Uma lista de fatos sobre o lugar

Uma série de mapas grosseiros de cada 'círculo de lugar '

Uma série de imagens ou fotos de cada um dos 'círculos de lugar '

38
Uma biografia-esboço para cada personagem no palco

Uma biografia-esboço para os personagens indiretos

Uma lista mestra que combine todas as biografias

2. Capítulo - Organizando informações sobre cada cena


(Tradução de Janaína Siqueira - Revisão Humberto Issao)

Este capítulo trata de como organizar as informações sobre cada cena


para que você tenha alguns pontos de partida simples para os ensaios. As
conclusões que você faz podem ser anotadas em folhas de papel A4 e entrar
em seu texto antes da cena em questão. Ele tem três etapas:

2.1 Circunstâncias imediatas


2.2 O que acontece entre as cenas ou atos
2.3 Tempo

2.1 Circunstâncias imediatas

'Circunstancias imediatas' são os eventos que aconteceram nas 24


horas que antecederam a cena. Eles podem incluir o que aconteceu alguns
minutos antes da cena começar ou algo que ocorreu na noite anterior. Estes
eventos têm um impacto direto sobre a ação e imediatamente dão algo
concreto para os atores trabalharem.

Ao escrever sua lista de "história passada" de fatos e perguntas sobre 'A


Gaivota', você vai notar que há uma diferença entre as coisas que estão lá há
muito tempo, como um lago, e adições recentes, como o palco
apressadamente improvisado. Você também vai notar a diferença entre os
eventos no passado distante que formam os personagens (como o casamento
de Arkadina com Gavril Treplev) e dos acontecimentos recentes que acabaram
de acontecer (como a caminhada que Masha e Medvedenko haviam acabado
de realizar no primeiro ato) . Eventos recentes ou adições à paisagem, como o
palco improvisado e a caminhada, constituem as circunstâncias imediatas do
primeiro ato.

Considerando que você já respondeu a maioria das perguntas da sua


lista inicial de "história passada" através de uma cuidadosa pesquisa ou por
receber impressões simples do texto, sua lista conterá agora apenas as
circunstâncias imediatas para a primeira cena ou ato. Aqui está uma lista das
circunstâncias imediatas para o Ato um de 'A Gaivota'.

Há um palco que foi montado apressadamente.


Existe uma plataforma bloqueando a vista para o lago.
Há uma cortina e está fechada.
Masha e Medvedenko saíram para uma caminhada.

39
O tempo está fechado.
Está úmido.
É crepúsculo.
Ontem à noite Sorin foi para cama às 22 horas e acordou 9 da manhã
Houve jantar.
Sorin adormeceu na hora do almoço.
A performance da :peça começa em 20:30 e não vai durar mais do que meia
hora.
Existem bastidores na parte lateral da plataforma.
Não há cenário.
O cão uivava na noite passada e na noite anterior. Arkadina reclamou com
Sorin sobre isso.
Nina teve que sair depois de meia hora, às 21h.
O Pai e madrasta de Nina tinham saído.
O céu está vermelho.
Ontem à noite, Dorn sentou na varanda e conversou com Arkadina.
Oito pessoas foram convidadas para assistir a peça.
Há uma grande pedra na plataforma.

Aqui está uma lista das perguntas relacionadas a esses fatos.

Quando a plataforma foi colocada e por quem? Por que foi apressadamente
montada?
Onde estão os trabalhadores e o que eles fazem normalmente na propriedade?
Como é a cortina e como ela funciona?
Que dia da semana é hoje?
Por que Masha e Medvedenko saíram para uma caminhada e há quanto tempo
eles têm andado?
A que horas foi o jantar e quem estava comendo? O que eles comeram?
Quem convidou a todos para ver a peça e quando eles foram convidados? O
que Konstantin disse a Arkadina sobre a peça?
Quando Trigorin chegou na propriedade?
Como Konstantin tem sido atacado por Arkadina desde que chegou?
Quando Arkadina falou a Sorin sobre o cão uivando?
Em que estação do ano estamos?
O cão manteve mais alguém acordado no meio da noite?
Por que o cão uiva?
Será que Konstantin sabe que Nina tem que sair às 21 horas antes dela dizer a
ele?
O Pai e a madrasta de Nina saíram tarde e esta é a razão de seu atraso?
Ou existe outra razão?
Para onde os pais de Nina foram?
Yakov ensaiou os efeitos técnicos com Konstantin? Se sim, quando?
Sobre o que Dorn e Arkadina falavam ontem à noite na varanda? Onde estava
todo mundo?
A que horas Dorn saiu ontem à noite? Quando ele chegou esta noite?
O que Nina estava vestindo ao interpretar a peça? Quem fez o figurino ou o
montou? Ela trouxe o traje com ela ou ele estava na casa esperando por ela?

40
Quando a pedra branca foi colocada na plataforma? Por quem? Quão grande
ela é?

Em seguida, use suas impressões sobre o texto para inferir informações


concretas com as quais poderá responder às perguntas. Em seguida, elabore
um esboço cronológico do que aconteceu antes da cena ou ato começar. Aqui
está o meu primeiro rascunho cronológico para o Ato 1.

Meados de agosto
Sexta-feira
No final da tarde: Konstantin e Nina fizeram o ensaio final da peça. Nina o
deixou saber que ela estaria livre para fazer uma performance amanhã das
20:00 às 21:00. O peça é executada em pouco menos de meia hora.
Na noite anterior: Dorn e Medvedenko vieram para o jantar. Na mesa,
Konstantin convidou Sorin, Arkadina, Dorn, Shamrayev, Polina, Masha e
Medvedenko para assistir a peça na noite seguinte. Ele disse que era um
pouco de entretenimento com duração de menos de uma hora. Sorin foi para
cama as 22 horas. Arkadina brincou com ele sobre isso e Konstantin disse a
ela de forma bastante acentuada para não ser má. Dorn ficou com Arkadina na
varanda, conversando até tarde, observados por Polina, que estava
supervisionando o planejamento da refeição e os preparativos para o café da
manhã. Todo mundo tinha ido para a cama ou para casa. Eles foram
apanhados em outras vidas desde que eles se viram no verão passado e, em
particular, Dorn atualizou Arkadina sobre como o pai de Nina havia se casado
novamente e tirou-a do testamento. Dorn saiu logo após a meia-noite. Depois
do jantar, Konstantin e Yakov trabalharam com efeitos especiais pela primeira
vez. Eles conseguiram o enxofre e o álcool de Shamrayev e Dorn. Os pontos
vermelhos são criados por Yakov segurando lanternas com máscaras de papel
vermelho, no barco que ele remou silenciosamente para o lago. O cão acordou
Arkadina novamente.
Sábado
06:00: Shamrayev e os operários se levantaram para começar a trabalhar nos
campos.
09:00: Sorin acordou.
No café da manhã: Arkadina reclamou com Sorin sobre um cão uivando na
segunda noite. Konstantin disse a ela para não exagerar. O cão guarda o
painço porque existem ladrões (como resultado da fome). Ninguém mais ficava
acordado pelos uivos do cão porque todos estavam acostumados a ele.
O dia todo: Todos os domésticos da casa estavam ocupados se preparando
para a chegada de Trigorin na hora do chá.
Depois do almoço: Sorin adormeceu.
15:00: O operário começou a construir a plataforma e colocar o mecanismo
para a cortina operar com um sistema de polias simples. Eles incluem Yakov;
que é um doméstico, e dois servos foram fazer a colheita. Eles foram liberados
tarde, porque o tempo mudou para pior e cada um tinha que trabalhar mais
para obter o máximo de colheita antes da chuva chegar.
No final da tarde: O tempo tem fechado cada vez mais com o estranho
barulho do trovão a distância. Polina termina o traje de Nina e entrega para
Konstantin. A pedra branca foi alavancada para a plataforma.
16:00: Shamrayev e Arkadina vão buscar Trigorin da estação.

41
17:00: Trigorin chega na propriedade.
18:00: Dorn chega e eles servem carneiro ensopado para o jantar. Sorin,
Konstantin, Trigorin, Arkadina, Dorn, Pofina, Masha e Shamrayev comem. Está
espessa e viscosa. Uma tempestade se aproxima. O pai e a madrasta de Nina
saíram atrasados para uns drinks na casa de um vizinho.
19:30: Masha e Medvedenko foram para uma caminhada. Medvedenko não foi
convidado para o jantar e chegou cedo, assim Masha teve que se levantar da
mesa de jantar e levá-lo para um passeio.

Quando você tiver terminado sua cronologia para a primeira cena ou ato,
trabalhe sobre as circunstâncias imediatas de cada cena ou ato que seguem.
Não haverá qualquer informação da sua lista de "história passada" para traçar
as circunstâncias imediatas das cenas seguintes. Isso ocorre porque essa lista
de "história passada" não continha informações sobre o que acontece entre as
cenas; ela só estava olhando para o que existia antes que a ação da peça
começasse. Assim, para as cenas posteriores você terá que ler cada cena e
elaborar duas listas novas sobre as circunstâncias imediatas: uma lista de fatos
e uma de perguntas. Depois, responda às perguntas e elabore um esboço de
cronologia das 24 horas que antecederam a ação de cada cena. Certifique-se
de que as afinidades não irão se intrometer neste processo - significa não se
concentrar apenas no que acontece com os personagens-chave em vez de em
todas as pessoas envolvidas na ação.

No final deste processo, você terá uma cronologia das circunstâncias


imediatas para cada cena ou ato. Anote seus primeiros rascunhos para cada
cena em folhas separadas de papel A4 e desloque-as em seu texto antes da
cena a ser utilizada. Dessa forma, quando você for trabalhar em cena, você
pode facilmente encontrar os seus apontamentos. Adicionar esta informação
para o seu texto também irá ajudá-lo a compreender o material mais
precisamente, quando você ler a peça novamente como um todo. As
circunstâncias imediatas - e, mais tarde, o seu trabalho sobre os eventos que
acontecem entre as cenas - ajudarão você a entender a ação da peça como
uma série de elos de uma cadeia mais longa de eventos. Alguns desses
eventos serão vistos pelo público nas cenas da apresentação e alguns não
serão vistos (porque eles acontecem fora do palco ou antes que a ação da
peça comece). No entanto, para a peça funcionar todos os eventos devem ser
totalmente imaginados.

A cronologia pode ser alterada mais tarde com as resposta às


observações feitas pelos atores nos ensaios. Se eles não concordam com
alguma coisa, então você pode facilmente fazer alterações - enquanto a lista de
questões relacionadas às circunstâncias imediatas de cada cena é atendida,
ajustada e encenada até o final de ensaios.

Faça observações para os atores sobre a maneira como eles estão


representando as circunstancias imediatas. É uma das maneiras mais
eficientes de alterar o que eles fazem na cena. Aprender a esmerar a ação de
uma cena indiretamente é uma das mais finas habilidades de direção - e pode
ser facilmente negligenciada. Diretores podem tender a fazer observações
repetidamente durante uma determinada cena sem que essas observações

42
promovam qualquer repercussão sobre o que os atores estão fazendo - ou
sem a criação de uma ação ou comportamento crível. Mas uma aparentemente
pequena observação sobre a hora do dia ou o que os personagens fizeram
imediatamente antes da ação começar pode alterar o tempo, temperatura e
tom de toda a cena e fazê-la, de repente, ganhar vida. Observações indiretas
como essas levam os atores a fazerem escolhas de atuação que duram por um
longo período de tempo. Se, por exemplo, você diz para um ator acelerar o que
esta fazendo, a nova velocidade vai durar duas performances e então
provavelmente você vai ter que fazer uma observação novamente. Se, por
outro lado, você der uma instrução concreta sobre as circunstâncias imediatas
(como 'lembre-se que Nina precisa sair às 09:00), ele irá acelerar essa cena e
somente essa. Isso pode acontecer porque é mais proveitoso atuar diante de
uma circunstância imediata, do que por uma observação solta sobre o ritmo.
Tente tornar-se mais consciente da relação entre as circunstâncias imediatas e
como a cena vai se desenrolar. Verifique se o seu primeiro esboço da
cronologia das circunstâncias imediatas levará a cena na direção que você
quer que ela vá. Se você der a Nina, Konstantin e Yakov vários ensaios da
peça de Konstantin nos poucos dias antes do Ato I, então o desempenho que
acontece na ação da peça será suave e os personagens terão um olhar
confiante. Se, por outro lado, você der-lhes apenas um ensaio, então, o
desempenho será irregular e todos eles vão estar mais tensos. Observe como
essas decisões irão ajudá-lo a dar os primeiros pequenos passos para
interpretar o material.

Por fim, tome nota dos eventos nas circunstâncias imediatas que seriam
úteis para improvisar antes de ensaiar a cena.

RESUMO
Escreva uma lista de todos os fatos e perguntas sobre circunstâncias
imediatas relativas a cada cena ou ato.
Responda as perguntas para cada cena ou ato, em seguida, coloque
todas as circunstâncias imediatas para cada cena ou ato em ordem
cronológica.
Ponha a sua proposta sobre as circunstâncias imediatas de cada cena ou
ato em folhas separadas de papel A4. Coloque as folhas em seu texto,
no ponto relevante, antes de cada cena ou ato.
Observe as circunstâncias imediatas que pretende improvisar.

43
2.2 O que acontece entre as cenas ou atos

Todos nós sabemos como a passagem do tempo se grava em nossos


corpos e muda nosso comportamento. Podemos pensar que parecemos com a
mesma pessoa que éramos a dois anos mas, quando encontramos alguém que
não tenha nos visto por um tempo, eles podem apontar uma série de
diferenças sutis em nosso tom de voz ou como nos portamos. Se
experimentamos um evento difícil durante esses dois anos (como Nina que
perdeu seu filho nos dois anos entre os atos Três e Quatro) nos encontramos
alterados, tanto física quanto emocionalmente. O efeito dessas mudanças
podem ser negligenciados pelos atores e por algumas produções, por
consequência, dão a impressão de que as cenas do texto, que deveriam
acontecer ao longo de vários anos, estão todos acontecendo no mesmo dia.
Isso quando os atores não têm imagens concretas dos acontecimentos que
tiveram lugar entre as cenas e sobre como esses eventos mudaram seus
personagens.

As circunstâncias imediatas somente abrangem as 24 horas que


antecederam a uma cena ou ato. Em muitas peças mais de 24 horas se
passam entre as cenas e você precisará, portanto, elaborar outra lista para
cobrir esses eventos. Essa lista contém os eventos que reformulam os
personagens no decurso de um longo período de tempo, como os dois anos
que se passam entre os Atos Três e Quatro em 'A Gaivota'. Os atores devem
ter imagens claras desses eventos e de como eles os afetaram antes que eles
comecem a atuar nas circunstâncias imediatas que os levaram à cena. Anote
esses eventos usando a ferramenta de fatos e perguntas. Aqui, por exemplo, é
uma lista de informações sobre o que aconteceu entre os Atos Três e Quatro.

Dois anos se passaram.


A sala foi transformada em um escritório para Konstantin trabalhar.
Konstantin tem a chave de uma das portas.
Ninguém desmontou a plataforma temporária construída para Konstantin atuar
dois anos antes.
Masha e Medvedenko se casaram e tiveram um filho. Masha está vivendo com
Medvedenko e eles contrataram uma ama de leite chamada Matryona.
Konstantin publicou seu trabalho em revistas literárias. Ele escreve sob um
pseudônimo. Sua mãe não leu a sua obra.
Foi assegurado a Medvedenko que ele seria transferido para ensinar em outro
distrito.
Dorn gastou suas economias em férias na Itália. Sua cidade favorita era Genoa
e ele ficou em um hotel.
Nina fugiu de casa para Moscou, onde ela teve um caso com Trigorin. O Pai e
madrasta de Nina a deserdaram. Ela ficou grávida e teve um menino, que
morreu.
Trigorin voltou para Arkadina.
Nina fez sua estreia como atriz em um teatro de verão fora de Moscou. Ela,
então, foi para as províncias. Konstantin a seguiu, observando seu trabalho.
Nina conseguiu grandes papéis, mas atuou grosseira e vulgarmente com um
monte de grandes gestos e fala ruidosa. Nina se recusou a ver Konstantin
sempre que ele foi aos bastidores no final das apresentações. A camareira não

44
o deixou entrar. Depois de um tempo, Konstantin parou de vê-la no palco e
voltou para casa.
Nina começou a enviar cartas para Konstantin assinando como 'A gaivota'.
Shamrayev teve a gaivota de pelúcia.
A saúde de Sorin diminuiu gradualmente.
Aqui está a lista de perguntas sobre os eventos que ocorrem entre Atos
Três e Quatro de 'A Gaivota'.
Em que mês estamos? E, precisamente, quanto tempo se passou desde o final
do terceiro ato?
Quando a sala de estar se transformou em um escritório para Konstantin? O
que mudou? O que foi adicionado e o que foi retirado?
Por que ninguém retirou a plataforma na qual a peça foi encenada?
Onde está guardada a chave para uma das portas? Por que ele só tem a chave
para uma das portas?
Quando Masha e Medvedenko se casaram? Quando eles tiveram seu bebê?
Quando Konstantin publicou em revistas literárias? Em que revistas ele
publicou? Quanto ele recebeu? Qual é seu pseudônimo? Por que ele escreve
sob um pseudônimo?
Quando Medvedenko obteve sua transferência e onde ele está indo? Quem
iniciou essa operação? Medvedenko tomou ciência dos sentimentos de Masha
por Konstantin? Se sim, como?
Quando Dorn foi para Gênova? Durante quanto tempo? Por que ele fez acabou
com todas as suas economias neste feriado? Sua doença piorou?
Quando Nina fugiu da casa de sua família? Quando e por que sua família a
deserdou?
Quando o caso com Trigorin começou? Quando ela engravidou? Quando ela
teve o bebê? Quando e como o bebê morreu? Quando Trigorin voltou para
Arkadina?
Quando Nina faz sua estreia como atriz no teatro de verão fora de Moscou?
Quando e por quanto tempo, ela estava em turnê pelas províncias? Por quanto
tempo Konstantin a seguiu? Quando ele parou com isso? Quando e por que
ela escreveu para ele? O que as cartas contêm?
Quando Shamrayev teve uma gaivota de pelúcia?
Quais foram as fases de declínio do Sorin ou não houve nenhum?

Quando você responder a estas perguntas, você pode elaborar um


esboço da cronologia dos eventos. Aqui está a cronologia dos eventos que
ocorrem entre os atos três e quatro.

1893
Setembro: Nina foi a Moscou no dia seguinte ao que Arkadina e Trigorin
deixaram a propriedade rural de Sorin. Ela foi até o hotel que Trigorin sugeriu e
reservou um quarto. Ela levou algumas das joias de sua mãe, que ela
penhorou para conseguir algum dinheiro para se manter. Trigorin então pagou
as contas. Trigorin veio e ficou com ela na segunda noite e eles começaram um
caso. Konstantin seguiu Nina até Moscou. A partir de agora Trigorin divide seu
tempo entre Nina e Arkadina, tentando esconder isso de ambas as mulheres. O
pai e a madrasta de Nina a deserdaram.

45
Início do outono: Trigorin conseguiu para Nina um pequeno papel em uma
produção em um teatro perto de Moscou. Konstantin foi ver a produção. Ele foi
aos bastidores após a apresentação mas, Nina se recusou a vê-lo. Shamrayev
tinha uma gaivota de pelúcia.
Outubro: Masha e Medvedenko casaram. Masha se mudou para a casa de
Medvedenko com sua mãe doente, duas irmãs e um irmão bebê.
Novembro: Nina fica grávida.
Temporada de inverno: Nina passou atuar nas províncias. Ela conseguiu
alguns grandes papéis. Konstantin a seguiu. Trigorin criticou repetidamente sua
atuação, fazendo Nina perder a confiança no que estava fazendo.
1894
Junho: Nina parou de atuar agora que ela estava grávida de sete meses.
Konstantin descobriu sobre a gravidez e parou de segui-la. Ele começou a
escrever contos dedicadamente. Ele escreve sob um pseudônimo.
Agosto: Nina teve um menino.
Setembro: Nina voltou a atuar e uma ama cuidava da criança, as expensas de
Trigorin. Konstantin publicou sua primeira história em uma revista, em Moscou.
Outubro: Masha dá a luz um bebê.
Dezembro: O bebê de Nina morreu de disenteria com idade entre quatro
meses. Trigorin deixou Nina e voltou para Arkadina. Nina teve um colapso.
1895
Janeiro: Nina começou a trabalhar novamente nas províncias. A carreira de
escritor de Konstantin começou a decolar. Nina começou a enviar cartas para
Konstantin, em que ela assinava 'A Gaivota'.
Julho: O bebê de Masha nasceu e eles contrataram uma ama de leite.
Agosto: Dorn foi de férias para a Itália durante dois meses e meio. Ele visitou
cidades como Gênova. Konstantin transformou a sala de jantar em seu
escritório. Isso significava que ele poderia facilmente ir para o jardim. A carreira
de atriz de Arkadina entrou em decadência.
Setembro: A saúde de Sorin começou a se deteriorar.
Temporada de inverno: Arkadina percorreu atuando para um público de
estudantes em cidades como Kharkov. Estava previsto que Nina iria começar a
atuar em um teatro provincial em Yeletz.
Novembro: A ação da peça se inicia.

Escreva uma cronologia para o que ocorreu entre cada cena ou ato. Em
seguida, coloque cada cronologia em uma folha de papel A4 e agregue ao seu
texto, colocando antes da cenas em questão. Depois de ter feito isso, leia
novamente as cronologias e escolha os eventos que podem ser úteis para
improvisar no período de ensaio. Por exemplo, pode se útil para os atores fazer
uma improvisação entre Nina e Trigorin no momento imediatamente após o
nascimento do filho deles para dar aos dois atores uma imagem clara do que
deu errado com seu relacionamento e por que deu errado. Da mesma forma,
pode ser útil fazer uma improvisação da conciliação entre Trigorin e Arkadina,
para que ambos os personagens tenham uma visão clara de como e por que
eles reataram o relacionamento.

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RESUMO

Escreva uma lista de todos os eventos que ocorrem entre cada ato ou
cena.
Escreva uma lista de perguntas sobre esses eventos.
Responda as perguntas e elabore uma cronologia do que aconteceu
entre cada cena ou ato.
Coloque cada cronologia em uma folha separada de A4 e agregue ao seu
texto no local relevante.
Elabore uma lista de eventos para fazer improvisações.

2.3 Tempo

O tempo tem uma influência poderosa sobre o nosso comportamento.


Há, por exemplo, uma diferença entre passar roupa ao meio-dia e às 3 horas
da manhã. Ao meio-dia você estará mais calmo e mais focado do que às 3 da
manhã, quando você pode muito bem estar sofrendo de insônia. Da mesma
forma, há uma diferença entre andar por um lago na chuva de outono e estar
sentado perto do lago num dia de sol no verão. Na chuva, você pode andar
mais rápido e reparar menos na vista em comparação com o ritmo de uma
caminhada em uma tarde de verão, quando há também muito tempo para ficar
de pé apreciando a vista. Há também uma diferença entre sentar e conversar
quando você tem todo o tempo do mundo e quando você tem um trem para
pegar em meia hora. Essas diferenças afetam o modo como nos sentimos
emocionalmente, mentalmente e fisicamente. O tempo na peça é, muitas
vezes, negligenciado. Você vê cenas em algumas produções em que o escritor
propõem que os personagens falem enquanto estão sob a pressão do tempo e
um ator consegue atuar nessas circunstâncias e outro não ou então nenhum
dos atores consegue. Essa situação transmite informações conflitantes para o
público, que pode ficar confuso sobre o porquê de um personagem parecer
estar com pressa, enquanto o outro parece ter todo o tempo do mundo. A
decisão sobre o momento em que cada cena é definida ajuda a evitar esse tipo
de problema. Isso também conecta todos os atores juntos no mesmo mundo e
dá ao público uma compreensão clara do que está acontecendo.

Seu trabalho sobre as circunstâncias imediatas incluem descobertas


sobre o tempo. O tempo inclui detalhes sobre a ano, mês, dia da semana, hora
do dia e a época em que a cena é reproduzida. Informações sobre o tempo
fornecem ao diretor alguns pontos de partida simples que podem ser passados
para os atores dando a eles informações concretas para trabalhar. Isto pode
acontecer porque o clima tem um impacto físico sobre eles. Ou porque eles
têm uma ação para ser feita em um período de tempo específico, assim a
pressão do tempo afeta a forma como eles se comportam. Por exemplo, no
primeiro ato de 'A Gaivota' a combinação dos fatos noite, em agosto, o tempo
está fechado e que uma tempestade se aproxima, imediatamente fornece aos
atores algo para fazer durante a ação. Podem sentir picadas de mosquitos ou
discretamente enxugar o suor. O grau com que eles farão isso dependerá de
sua saúde, vestuário e resistência a insetos. No terceiro ato a ação começa ao
meio-dia. Os cavalos são chamados para o transporte às 13 horas para levar

47
Trigorin e Arkadina para a estação, onde eles vão pegar o trem das 13:55 para
Moscou. A influência do tempo seria fortemente sentida em todo o ato e
afetaria os personagens mais intensamente conforme a ação avança. Os
personagens iriam começar a verificar os seus relógios com frequência,
apressando o que eles estavam dizendo, ou olhando pela janela para ver o
transporte que se aproxima. A decisão sobre o tempo também afeta o ritmo da
sonoplastia da peça e, portanto, mais um pequeno passo para a definição do
resultado final que o público vai ver. No primeiro ato de 'A Gaivota' sabemos
que a peça de Konstantin começa às 20:30. Se você escolhe começar a cena
às 20:10, o ritmo da cena será lento. Se você iniciá-la às 20:20, será rápido.
Quando você tomar decisões sobre o tempo, comece a pensar no seu impacto
sobre a velocidade das cenas ou atos da peça.

Monte um cronograma para toda a peça, combinando fatos do escritor


(sabemos que a apresentação da peça de Konstantin começa às 20:30) com
as coisas você supôs ou inventou a partir do texto, como a decisão de que o
trem de Trigorin chega 06:00 no quarto ato, ou que a cena do primeiro ato
começa em 20:10. Quando você fizer isso, lembre-se que as decisões sobre o
tempo irão ajudá-lo a influenciar o ritmo das cenas individuais, o tempo
completo que transcorre na peça e o ritmo da apresentação. Observar o tempo
é outra forma indireta de determinar a ação - como você descobriu nas
circunstâncias imediatas.

Aqui está o meu cronograma para os quatro atos de 'A Gaivota'. Coloquei em
negrito tudo o que eu inventei dentro desses atos.

Primeiro Ato
Estamos é 1893.
É Agosto.
É sexta-feira.
É crepúsculo.
A ação começa logo após 20:10.
A performance começa às 20:30.
Nina tem que sair por 21:00. Seus pais devem voltar às 21:30. Demora 15
minutos para andar de sua propriedade para a de Sorin.
Fica perto.
Está úmido.
Há uma tempestade chegando.
Ato um para Ato dois
Uma semana se passou.
Segundo Ato
É agosto.
É uma sexta-feira.
A cena começa ao meio-dia
O almoço será 12:30.
O almoço está atrasado. Normalmente é servido ao meio-dia.
Está muito quente.
Segundo ato para Terceiro ato
Uma semana se passou.
Terceiro Ato

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É Setembro.
É sexta-feira.
A ação começa ao meio-dia.
O trem sai às 13:55. É pouco menos de uma hora de viagem para a estação.
Sorin ordenou os cavalos para 13:00. A pedra fundamental do novo prédio
do governo será posta 14:30, na cidade.
Está chovendo e está nublado. Às vezes fica tão escuro que você tem que
ligar as luzes da interior.
O médico deveria chegar às 10 horas.
Terceiro ato para o Quarto ato
Dois anos e dois meses se passaram.
Quarto Ato
Estamos em 1895.
Estamos em novembro.
É domingo.
Está anoitecendo.
Há uma tempestade lá fora, com vento fortes e chuva. O vento é tão forte que
faz ondas no lago e ruídos nas chaminés.
O trem de Trigorin chega às 18 horas. Ele deve estar de volta a estação
por volta das 19 horas.
A cena começa às 18:45.

Este cronograma prevê episódios que poderiam resultar em


performances lentas, precipitadas, ou entediantes. Por exemplo, o inicio do
quarto ato poderia se arrastar até a entrada da Arkadina e Trigorin -
especialmente levando em conta a quantidade de exposição que existe na
cena. Portanto, no cronograma de Trigorin e Arkadina temos justos 15 minutos.
Essa decisão irá adicionar margem e ritmo para a ação dos atores e, portanto,
para manter o público envolvido.

Um escritor como Chekhov presta muita atenção ao tempo. Este não é o


caso para todos os escritores ou todos as peças. Se a sua peça não tem
quaisquer referências ao tempo, então tome decisões sobre quando as cenas
ocorrem antes de começar a ensaiar.

Agora coloque todas as informações sobre o tempo de cada cena em


uma folha de papel e coloque-a no seu texto antes de cada cena relevante.

RESUMO
Liste todos os fatos que se relacionam com o tempo para cada ato ou
cena.
Liste todos os fatos que se relacionam com o tempo entre cada cena ator.
Responda a todas as perguntas que se relacionam com o tempo, fazendo
deduções simples sobre o texto.
Mapeie todas as decisões sobre o tempo cena por cena.

49
2.4 Lista de verificação de todo o trabalho feito neste capítulo
Esboço de cronologia das circunstâncias imediatas para cada cena ou ato
Lista de circunstâncias imediatas para improvisação
Esboço de cronologia dos eventos ocorridos entre cada ato ou cena (se
o tempo que passou for mais do que 24 horas)
Lista de improvisações dos eventos que ocorrem entre os atos ou cenas
Cronograma para cada cena

Three Sisters by Anton Chekhov

50
3. Capítulo - Investigando as grandes ideias da peça
(Tradução de Janaína Siqueira - Revisão Humberto Issao)

Este capítulo olha em perspectiva a relação do escritor com o material


dramatúrgico, sobre o que é a peça e como identificar seu gênero. Ele tem três
etapas:

3.1 O escritor e o texto dramático


3.2 As ideias que sustentam o texto
3.3 O gênero ou estilo da peça

3.1 O escritor e o texto dramático

Se você estiver trabalhando com um texto dramático mais antigo, escrito


por um autor que já morreu, primeiro descubra os fatos básicos sobre o autor e
pergunte: 'Como é que estes fatos podem lançar luz sobre a peça' Por
exemplo, aqui estão alguns fatos importantes sobre Chekhov.

Ele era médico.


Ele era um contista.
Ele era um dramaturgo.
Ele era dono de uma propriedade chamada Melikhovo.
Ele teve tuberculose no fim com 20 anos.

Aqui está como você pode usar esses fatos para lançar luz sobre 'A
Gaivota'.

Um dos personagens da peça, Dorn, é um médico, então você pode


assumir que tudo na peça que se refere à profissão dele é minucioso. Da
mesma forma, você pode assumir que todas as referências a medicina, a
doenças e as ciências estão corretas. Por exemplo, os sintomas físicos de
Dorn e condições de Sorin serão precisamente desenhadas, assim como as
causas psicológicas do alcoolismo de Masha e sua possível depressão. É claro
que qualquer escritor que quer incluir uma doença específica em sua peça irá
pesquisar essa condição bem, mas sempre haverá uma diferença entre a
investigação e a experiência real. O ator que interpreta Dorn pode ler mais
detalhes sobre como, onde e por quanto tempo Chekhov treinou e trabalhou
para ajudar a construir a biografia anterior a peça desse personagem. A
biografia do escritor também dará a esse ator uma ideia clara de como era
trabalhar como médico na época.

Como contista, Chekhov teria entendido as dificuldades de escrita -


problemas para começar (como no caso de Konstantin) e manter os padrões
elevados mais tarde, em uma carreira (como no caso de Trigorin). Em 1895,
ele era famoso, principalmente por escrever contos, logo ele também entendia
o impacto da fama em gente como Arkadina e Trigorin. Os atores que
interpretam Trigorin e Konstantin podem estudar sua biografia para obter

51
informações sobre como começar uma carreira como escritor, o quanto se
recebe e assim por diante.

Como dramaturgo, Tchekhov seria capaz de falar sobre teatro com


autoridade e compreender as dificuldades da busca de novas formas. Como
Konstantin, ele experimentou uma estreia bem sucedida com sua primeira
peça, 'Ivanov', e seria útil para o ator que interpreta esta papel, ler sobre a
origem e a recepção dessa primeira peça de Tchekhov.

Como proprietário de um imóvel, como Sorin, ele foi atormentado com a


ineficiência na gestão dos seus interesses agrícolas. No entanto, como um
proprietário mais prático que Sorin, ele também poderia ser solidário com as
tentativas de Shamrayev de economizar dinheiro e proteger o celeiro. Os dois
lados da moeda serão desenhados com precisão na peça. Os atores que
interpretam Sorin e Shamrayev poderiam estudar como Chekhov gerenciou sua
propriedade rural para entender mais sobre a agricultura naquele momento.

Como alguém com uma doença terminal, o pensamento de Chekhov


sobre a morte será maior do que de outros escritores. Seu pensamento sobre a
morte é, obviamente, presente durante as cenas das duas tentativas de
suicídio de Konstantin, o morte gradual de Sorin e a morte do bebê de Nina. No
entanto, ele também está lá, de forma oculta, no número de mortes que
precedem a peça e em referências menos óbvias à morte durante a peça. Os
pais de Arkadina e Sorin estão mortos, assim como o marido de Arkadina. A
mãe de Nina morreu há relativamente pouco tempo, assim como o pai de
Medvedenko. Polina e Shamrayev só tem uma criança que, levando em conta
o período de tempo e a ausência de uma contracepção eficaz, resulta em uma
complicação médica no nascimento de Masha, ou mais tarde, o aborto ou
morte da criança. Durante a peça, a preocupação de Polina com a saúde do
Dorn, quando ele se expõe a umidade do ar, sugere que ele tem algum tipo de
doença - possivelmente tuberculose - o que talvez explique porque ele acaba
com todas as suas economias em um feriado italiano. O tema da morte em si
também é falado algumas vezes. A presença deste tema pode ser
negligenciada quando você ler a peça pela primeira vez, mas, numa segunda
leitura, a frequência dessas referências não pode simplesmente ser ignorada
devido a altas taxas de mortalidade na época. O fato de que o escritor estava
lidando com uma doença terminal deve ter incentivado-o a escrever o texto
com isso em mente.

Em seguida, olhe para todos os detalhes da vida do escritor que falam


especificamente sobre a peça. Isso pode incluir pessoas reais em que os
personagens são baseados, ou eventos que aconteceram ao escritor e que
ocorrem na peça. Encontre-os lendo uma biografia. Em 'A Gaivota', por
exemplo, vários dos personagens são referência a pessoas que Chekhov
conhecia. Nina é baseada em uma de suas namoradas (Lika) e Trigorin é
baseado em um amigo (Potapenko, que afastou Lika de Chekhov). Um
medalhão gravado foi dado a Chekhov por uma atriz, enquanto que o suicídio
tentado se baseou na tentativa real de seu amigo, o pintor Levitan.

52
Então olhe para o que estava acontecendo na vida do escritor no
momento em que escreveu a peça. Isto pode lhe dar uma ideia sobre o porque
a peça foi escrita. Por fim, tome nota de tudo o que o autor diz sobre o peça,
seja em livros, artigos de jornal ou gravações. No entanto, é aconselhável se
aproximar de suas palavras com cuidado, pois sempre haverá uma diferença
entre a peça que o escritor afirma ter escrito e o material real. Essa diferença
ficou clara para mim quando eu estava trabalhando com Martin Crimp na peça
'Attempts on Her Life'. Eu listei as imagens que apareceram na peça e contei o
número de vezes que cada uma foi usada. Inesperadamente, a imagem mais
recorrente foi de crianças. Quando perguntei a Martin que imagem ele pensava
ser a mais comum na peça, ele disse confiantemente que era a guerra, então
cinzeiros e, finalmente, aviões. Quando eu lhe disse que eram as crianças, ele
colocou as mãos sobre o rosto e baixou a cabeça. Este resultado nunca lhe
havia ocorrido conscientemente, mas, assim que foi apontado, ele sabia que
tinha posto a experiência das crianças no centro da peça.

Há obviamente uma enorme diferença entre a realização de pesquisas


sobre um escritor morto e trabalhar com um escritor vivo, e, como escrevi na
introdução, a relação com um escritor vivo não está dentro do propósito
principal deste livro. Na minha limitada experiência, você pode perguntar aos
escritores vivos questões sobre a relação entre a sua vida e a ação da peça,
mas você deve estar preparado para não receber uma resposta direta ou
resposta alguma. Alguns escritores não irão revelar as motivações pessoais ou
particulares por trás de seu trabalho, o que é compreensível. Ou eles podem
não ser conscientes dessas motivações. Respeite a privacidade deles.

Lembre-se que a tentativa de criar uma espécie de imagem da pessoa


que escreveu a peça - e porque o escreveu - é essencial, mesmo que, como
Shakespeare, pouca informação comprovada é conhecida sobre o escritor.
Basta uma hora ou mais pensando nos pequenos fragmentos de informações
conhecidas sobre um escritor morto há muito tempo para lançar luz sobre o
texto. Se nenhuma informação existe, imagine a pessoa que poderia ter escrito
a peça e onde sua paixão repousa, não será tempo perdido.

Por fim, gostaria de aconselhar que sou contraria a leitura de qualquer


literatura crítica sobre a peça ou o escritor, a menos que o escritor tenha um
firme apego no processo pelo qual o teatro é feito. A crítica literária pode
incentivar generalização e imprecisão em seu pensamento sobre a peça. Há
sempre exceções a esta regra e alguns artigos ou livros podem ser uma valiosa
fonte de informação sobre uma peça ou um escritor. Eu encontrei biografias de
escritores mortos que podem ser úteis tanto para ceder informações sobre a
pessoa que escreveu a peça como para ajudar os atores a construir a biografia
de seus personagens.

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RESUMO

Faça uma lista dos fatos mais simples sobre a vida do escritor.
Pergunte a si mesmo como esses fatos lançam uma luz sobre a peça.
Olhe para todos os detalhes da vida do escritor que falam mais
especificamente sobre qualquer coisa na peça.
Descubra o que estava acontecendo na vida do escritor na época a peça
foi escrita.
Esteja preparado para não receber respostas diretas de um escritor vivo
sobre sua vida pessoal.
Leia com cuidado qualquer literatura crítica sobre o escritor ou a peça.

3.2 As ideias que sustentam o texto

As ideias que sustentam o texto determinam tudo o que é dito e feito


durante as cenas, por isso você deve ter uma firme compreensão sobre eles.
Há, no entanto, uma diferença entre identificar essas ideias e chegar a um
conceito de como você vai interpretar uma peça de teatro. Um conceito é algo
que o diretor impõe a uma peça. Uma ideia é no que o escritor está focado
enquanto escreve a peça - consciente ou inconscientemente. Apesar disso,
uma palavra de advertência: não confunda a busca das ideias que sustentam o
texto como uma licença para voltar à crítica literária ou se envolver em debates
discursivos abstratos. O processo é mais simples.

A maioria das peças contem entre três e quatro grandes ideias. Procure-
as lendo o texto dramático devagar e repetidamente se perguntando: 'Sobre o
que é essa peça?'. Responda a pergunta com frases simples como: 'A obra fala
sobre a passagem do tempo' ou 'A peça é sobre a morte'. Evite respostas
prolixas e complexas. Anote todas as respostas em um pedaço de papel. No
final do processo você terá entre cinco e dez respostas possíveis. Uma ideia
deve ter uma relação com quase todos os personagens da peça e grandes
partes da ação da peça devem se preocupar em investigar essa ideia. Meça
cada uma de suas ideias possíveis contra os personagens e a ação da peça.

Quando comecei a ler 'A Gaivota' fiquei impressionada com quantos


personagens foram infelizes no amor. Eu queria ver se isso era uma ideia
possível e foi assim que eu notei minha investigação.

Arkadina: O fato de que ela e Gavril não estão mais juntos poderia ser
resultado de uma infelicidade em seu relacionamento. Na peça, seu amor por
Trigorin é infeliz por causa de seu romance com Nina.
Konstantin: Seu amor por Nina não é correspondido.
Sorin: Seu amor por Nina não é correspondido.
Nina: Seu amor não é correspondido por Trigorin depois que seu caso inicial
terminou.
Shamrayev: Talvez o seu amor por Polina seja, de alguma forma, infeliz por
causa de seu amor por Dorn e a possibilidade de que Masha não é sua filha.

54
No entanto, não há nenhuma evidência no que ele diz ou faz para sugerir que
ele pensa assim.
Polina: Ela é infeliz em seu relacionamento com Dorn, que a ama.
Masha: Seu amor por Konstantin não é correspondido.
Trigorin: Seu amor por Nina esgota no Ato três e quatro e você tem que
perguntar se ele está feliz em seu relacionamento com Arkadina depois disso.
Dorn: Existe a possibilidade de que seu amor por Arkadina não é
correspondido. Além disso, com 50 anos ele ainda está solteiro, o que pode
sugerir alguma infelicidade nesse aspecto de sua vida. Seus casos que
aconteceram quando ele estava na casa dos 40 anos, provavelmente
causaram alguma infelicidade para outras pessoas.
Medvedenko: Seu amor por Masha não é correspondido com uma força
equivalente aos seus sentimentos por ela, mesmo quando ela se casa com ele.
Eles são claramente um casal infeliz no Ato Quatro.
Yakov: Não há nenhuma evidência de que ele é infeliz no amor.

Oito em cada 11 personagens são infelizes no amor e mais dois (Dorn e


Shamrayev) são possivelmente infelizes - embora isso não seja declarado
explicitamente no texto. Na ação da peça, vemos repetidamente pessoas
apaixonadas, se apaixonando e sendo infelizes no amor. Porque isso afeta
tantos personagens, e pelos impactos sobre a ação da peça, eu decidi que a
infelicidade no amor foi definitivamente uma ideia.

Você pode testar o tema da morte/doença por causa do seu trabalho


sobre a vida do escritor.

Arkadina: Ela possivelmente perdeu o marido, e sua mãe e seu pai estão
mortos (embora há algum tempo).
Konstantin: Ele tenta o suicídio por duas vezes, a segunda vez com sucesso.
Sorin: Ele está doente durante todo a peça e tem um ataque cardíaco no
quarto ato, o que sugere que ele está perto da morte.
Nina: Sua mãe morreu antes que a peça começasse e seu bebê morre durante
a peça.
Shamrayev: Ele era um soldado e foi, portanto, possivelmente envolvido em
uma ação militar, onde viu as pessoas morrerem. A ausência de um segundo
filho pode sugerir um problema de fertilidade.
Potina: Ela tem apenas um filho, o que teria sido estranho na época. Talvez
ela perdeu as outras crianças?
Masha: Ela veste preto como se estivesse de luto.
Trigorin: Durante a ação da peça, ele perde seu filho bebê.
Dorn: Seu trabalho o coloca em contato com a morte e doenças.
Medvedenko: Seu pai morreu antes da peça começar.
Yakov: Não há nada que o ligue com o tema morte ou doença.

Kanstantin, Sarin, Nina, Trigorin, Dorn e Medvedenka têm experiências


diretas com morte e doenças. Os outros personagens podem ter experiências
diretas de morte e doença, mas isso não é uma prova concreta. Porque a ideia
não afeta todos os personagens, você pode optar por incluí-la ou não.

55
As quatro ideias que eu isolei para uso em minha própria sala de ensaio
foram: sonhos destruídos, infelicidade no amor, família e arte. Observe como
essas descrições reduzem as grandes ideias para frases simples e concretas
que os atores podem facilmente compreender. No entanto, não penso sobre
este processo como um redutor que simplifica um quadro mais complexo. Ao
contrário, o vejo como uma forma de mapear de forma eficiente a estrutura
intelectual por trás da ação. No final do processo, pergunte-se com qual das
ideias que você tem mais afinidade. Então, no resto do processo não se
esqueça de trabalhar em todas as ideias e não somente nessa.

Em seguida, selecione a ideia mais importante que você identificou. Isso


vai ajudar você a entender sobre o que é a peça. Às vezes, a ideia-chave vai
se destacar muito claramente das outras. Se isso não acontecer, volte para a
peça e a leia novamente com todas as ideias em mente. O estudo da ação da
peça normalmente irá orientá-lo para a resposta. Por exemplo, em 'A Gaivota',
eu decidi que a ideia mais importante são os sonhos destruídos. Se você reler
a peça e ainda estiver lutando para selecionar uma ideia central, o título pode
ajudar. Passe por todas as referências e vá para o título da peça e veja se
todas elas apontam na direção de uma ideia central. Por exemplo, se você
passar por todos os momentos em que a gaivota é mencionado você vai
descobrir rapidamente que ele não está associado apenas com Nina. É
também um símbolo dos sonhos ou ideais e, durante a ação, é baleado
crescendo e recheando a peça como um símbolo de sonhos que são
destruídos.

Se você diagnosticar as ideias corretamente, o processo leva-o


profundamente dentro da cabeça do escritor e é crucial para honrar essas
ideias - por mais que você interprete o material. O Capítulo 10 irá ajudá-lo a
usar as ideias de uma forma prática e concreta com os atores.

RESUMO

Anote as ideias que sustentam o texto.


Verifique a exatidão de suas escolhas ao ver se a maioria dos
personagens têm uma relação com essas ideias e que grandes
fragmentos da cena estão preocupados em explorá-las.
Isole a ideia com a qual você tem maior afinidade.
Selecione a ideia mais importante da peça, a fim de descobrir do que ela
trata.

3.3 O gênero ou estilo da peça

Estilo e gênero definem o mundo que o público vê e a maneira pela qual


os personagens interagem nesse mundo. Descobrir o gênero ou estilo da peça

56
que você está prestes a dirigir vai ajudar você a se comunicar com precisão
com o material. Cada gênero - do simbolismo à sátira, do humor negro à farsa -
tem sua própria história e sua própria lógica. Por exemplo, se o gênero é o
realismo (como no 'Look Back in Anger', de John Osborne) os personagens vão
obedecer a lógica de comportamento da vida real com a precisão de um filme
documentário. Se o gênero é surrealismo (como 'A Dream Play', de August
Strindberg, ou o 'Caught by the Tail' , de Pablo Picasso), os personagens vão
obedecer a lógica dos sonhos, onde o banal e o fantástico podem coexistir no
mesmo lugar sem contestação.

Realismo e naturalismo são os gêneros dominantes no teatro europeu


ocidental. Estes termos descrevem coisas muito diferentes na pintura e na
literatura, mas no teatro, as palavras são intercambiáveis. Lembre-se que os
atores do Ocidente irão aplicar automaticamente as regras de realismo a um
texto, a menos que você os oriente em uma direção diferente. Saiba, no
entanto, que os atores são mais do que capazes de trabalhar com vários
gêneros - desde que você seja claro sobre as regras do peça, desde o início.

A decisão sobre o gênero não deve permanecer como uma nuvem


intelectual que flutua vagamente acima da produção ou apenas pairando em
sua cabeça; deve ser traduzida em ações concretas para o público assistir.
Comece a pensar em como fazer isso. Por exemplo, eu decidi dirigir 'A Gaivota'
com simbolismo; esta decisão precisou ser manuseada com cuidado em cada
etapa da performance. Há, por exemplo, uma encenação no quarto ato no qual
Konstantin abre a janela e uma rajada de vento sopra para o quarto. Em uma
produção realista isso seria um pequeno e imperceptível momento, mas em
uma produção simbolista é um evento que deve ser apresentada fortemente
para que todos os personagens e, por sua vez, o público experimente a
estranha perturbação premonitória do que Chekhov pretende. Se você tivesse
que citar o evento, você poderia descrevê-lo sem rodeios, como: 'O escritor nos
permite saber que Konstantin vai morrer em breve.' Eu trabalhei em um
mecanismo para a janela, para que, depois de aberta, ela continuasse a bater.
Nós colocamos uma grande máquina de vento por trás da janela para que as
cortinas tremulassem. Uma bandeja com copos caiu da mesa, como resultado
da explosão de vento e os papéis de Konstantin voaram pela sala. Se este
fosse o realismo, você não iria apresenta-lo desta maneira; seria um momento
mais discreto, em que uma janela se abriria numa segundo e talvez um pedaço
de papel flutuasse até o chão.

Você também pode considerar a elaboração de uma lista de diretrizes


concretas sobre o gênero para os atores. Por exemplo, sobre o surrealismo
você poderia anotar a seguinte lista.

É como estar em um sonho. Coisas estranhas podem acontecer, mas as


pessoas podem não comentar sobre elas, como fariam na vida real.
Você busca o que você quer com intensidade.
Você é muitas vezes incompreendido pelas pessoas que você está falando.
Os objetos podem assumir um significado fora de proporção em relação a sua
importância.
As leis físicas do universo podem estar sujeitas a alterações.

57
Às vezes, não será possível fixar o ponto do gênero com precisão
categórica. Você pode, por exemplo, ler uma cena de 'A Gaivota' e achar que é
realista, em seguida, ler outra e ter a impressão de que é simbolista. O que
importa é que você leia a peça com as duas possibilidades em mente e veja o
que de concreto é evidenciado na cena para os dois pontos de vista - e, em
seguida, tome uma decisão clara que você siga exaustivamente durante toda a
produção.

Lembre-se também que você pode aplicar as tarefas descritas nos


capítulos anteriores e seguintes para qualquer gênero de peça. Mesmo que o
ator esteja interpretando 'Big Foot' em uma peça de Picasso, ele precisa saber
a cujo pé ele pertencia, como ele se tornou independente e o que ele quer em
cada etapa da peça.

RESUMO

Descubra o gênero da peça que você vai dirigir.


Tenha cuidado para não dirigir toda peça como se fosse realismo.
Traduza a ideia intelectual do gênero em coisas que podemos ver os
atores fazerem ou que impliquem numa mudança concreta no
ambiente.
Elabore uma lista de orientações concretas para a aplicação do gênero.

3.4 Lista de verificação de todo o trabalho feito neste capítulo

Uma lista dos fatos básicos sobre o escritor e breves notas sobre a forma
como esses fatos esclarecem o texto dramático

Documentação de como a vida de um escritor morto informa a peça

Uma lista de ideias que corroboram o texto

Uma nota sobre o gênero

Uma lista de orientações concretas para a aplicação do gênero

58
Ivanov by Anton Chekhov

59
4. Capítulo - Analisando a cena
(Tradução de Janaína Siqueira - Revisão Humberto Issao)

Este capítulo trata da preparação do texto e análise da cena.

Tem cinco etapas:

4.1 Preparando a composição do seu texto de direção


4.2 Atribuindo um nome a cada cena ou ato
4.3 Eventos
4.4 Intenções
4.5 Preparando um texto pronto para os atores

4.1 Preparando a composição do seu texto de direção

Até agora você não escreveu nada no seu texto. No entanto, em pontos
específicos do seu texto, você colocou sorrateiramente várias folhas de papel
que lhe dão informações sobre coisas como as circunstâncias imediatas.

Assim que começar a analisar o texto, você vai escrever nas páginas de
seu texto pela primeira vez. Antes de fazer isso, pense sobre como estruturar
seu texto de forma a ter espaço suficiente para escrever tudo com clareza, e
para que você possa, ao folhea-lo, pegar todas as informações necessárias de
forma rápida e fácil quando você está sob pressão, na sala de ensaios.
Lembre-se, também, que um texto limpo e cuidadosamente definido irá ajudá-lo
a dirigir de forma mais precisa e vai dar aos atores a impressão de que você é
organizado.

Se você estiver trabalhando com um texto clássico, nunca trabalhe com


o livro em que o texto é impresso, porque não há espaço suficiente para
escrever notas claras. Em vez disso, tire uma cópia e aumente um pouco o
tamanho da impressão. Coloque-o em um arquivo. É melhor não fotocopiar o
texto em ambos os lados da folha A4. Em vez disso, mantenha a parte de trás
de cada folha em branco. Você pode então usar a página em branco oposta ao
texto fotocopiado para escrever notas sobre sua análise da peça. Deixe uma
margem grande o suficiente no lado direito das páginas do texto para realizar
anotações. Novas peças costumam ser estruturadas com bem espaçadamente
e com páginas em branco opostas às páginas impressas. Se este não for o
caso, pergunte ao dramaturgo se você pode alterar a diagramação.

RESUMO

Se você estiver trabalhando com um texto clássico, tire cópia do texto e


aumente um pouco o tamanho da impressão. Não tire cópia nos dois
lados da folha de papel A4. Se você está trabalhando em uma nova
peça, e o texto é um pouco pequeno ou bem definido, pergunte ao
dramaturgo se você pode alterar a diagramação e o espaçamento.
60
4.2 Atribuindo um nome a cada ato ou cena

As palavras 'primeiro ato' ou 'cena uma' não dão nada específico para o
ator fazer em uma cena; na verdade, eles sublinham o fato de que o ator está
em uma peça, não em uma situação real. Em vez disso, invente um novo título
para cada ato ou cena que descreva o que realmente acontece durante a cena
e que imediatamente dê ao ator algo de concreto para trabalhar.

Os títulos devem se relacionar com o que todos fazem no ato ou na cena


e devem descrever o que acontece durante todo o ato ou cena, não apenas um
momento. Tente certificar-se que o título é escrito com uma simples frase.
Comece a frase com um substantivo e não o nome de um personagem. Dessa
forma, todos podem ter uma relação com o título em vez de apenas um
personagem. Mais importante ainda, os títulos devem dar imediatamente algo
para os atores se focarem e fazerem. Por exemplo, em 'A Gaivota', renomeie
Ato um 'A apresentação da peça de Konstantin'. Todo mundo sabe como é se
preparar para assistir a uma peça, porém de forma amadora e improvisada.
Você verifica o seu relógio, pega a programação ou olha para os outros
membros da audiência. Ao nomear o Terceiro Ato 'A preparação para a partida
de Arkadina e Trigorin para Moscou', você vai garantir que todo mundo tenha
algo a fazer: eles podem pegar ameixas para a viagem, adquirir a assinatura
De Trigorin em livros, procurar o momento certo para dizer adeus, ajudar a
fazer ou a levar as malas, ou verificar os seus relógios.

Tenha cuidado para não nomear o ato, referindo-se apenas ao evento


que mais lhe interessa. Por exemplo, você pode nomear o segundo ato de 'A
Gaivota', 'Trigorin e Nina terminam seu relacionamento', mas nenhum dos
outros personagens estarão a par disso na cena em que isso acontece, então
eles não podem trabalhar com esse título. Em vez disso, chame de 'o
entretenimento dos hóspedes famosos'. Isso descreve o que todo mundo está
fazendo durante o ato, inclusive na cena entre Nina e Trigorin. Tente não
nomear o ato descrevendo o efeito que você quer na execução, como 'há
fragmentação e disjunção', isso é muito abstrato para os atores responderem
em um nível prático. Da mesma forma, não use uma ideia isolada para nomear
uma cena, como 'Todo mundo mostra quão são infelizes apaixonados', Isto é
demasiado vago e geral, e vai transparecer essa imprecisão e generalização
na atuação.

Encontrar um título preciso para cada ato nem sempre é simples, assim
como pode ser difícil ver o que está acontecendo na cena. Você deve sempre
olhar para uma descrição mais simples possível e que possa ser relacionada a
cada personagem. Esteja ciente de que o título irá orientar os atores a
interpretar o ato ou cena de uma certa forma. A escolha é, portanto, como dar
uma observação de direção e que enriquecerá o trabalho dos atores em cena.

Aqui estão os meus títulos para cada ato de 'A Gaivota'.

Primeiro ato: 'A apresentação da peça de Konstantin'


Segundo ato: ' O entretenimento dos hóspedes famosos '
Terceiro ato : ' A preparação para partida de Arkadina e Trigorin para Moscou'

61
Quarto ato: 'A Reunião para dizer as despedidas finais para Sorin'

Depois de escolhidos os título risque as palavras 'Primeiro ato' do seu


texto e substitua pelo seu novo título. O título é útil para você e para os atores
lembrarem do que está acontecendo. É fácil se perder na densidade de
detalhes que uma cena ou ato contém e se esquecer desta simples ideia.

RESUMO

Dê um nome simples para cada ato. Um que descreva o que acontece


nele. No seu texto, substitua 'Ato um', etc, com os seus novos títulos.

4.3 Eventos

Um evento é o momento da ação em que ocorre uma mudança e essa


mudança afeta todos os presentes. 'Evento' é realmente apenas uma palavra
simples para algo que acontece regularmente na vida. Nos encontramos
constantemente tentando conseguir uma coisa quando acontece outra coisa
que muda o que queremos alcançar. Isso pode acontecer quando estamos
sozinhos ou quando estamos com outras pessoas. Por exemplo, um casal está
no sofá alegremente comentando sobre um filme que acabaram de ver. De
repente, o homem coloca a cabeça no colo da mulher, e diz: 'Eu não posso
continuar assim'. A mulher congela por um segundo e toma um gole de vinho.
Ela então se levanta e empurra a cabeça do homem de seu colo. 'Eu acho que
você deve ir', diz ela. 'Eu sinto muito', diz o homem. O evento é o momento em
que o homem coloca a cabeça no colo da mulher e diz: 'Eu não posso
continuar com isso', e altera radicalmente o que eles tanto queriam.
Inicialmente ambos queriam ter uma noite agradável. Após o evento, a mulher
quer que o homem saia e o homem quer que a mulher o perdoe.

Os eventos têm uma variedade de formas diferentes: podem ser súbitos


(como alguém que peçau uma pedra em uma janela durante uma refeição de
família) ou gradual (como quando um grupo de pessoas numa edifício distante
percebem lentamente que existe um perseguidor observando-os lá fora) . Este
evento 'gradual' pode começar com o quase inaudível som de passos no
cascalho lá fora e acabar com o som definitivo de alguém que tenta abrir o
cadeado da porta da frente. As respostas que as pessoas têm para esses
eventos pode ser lentas ou súbitas, fortes ou fracas.

Em um nível mais simples, uma peça de teatro é uma série de


mudanças que ocorrem entre um grupo de pessoas. Para qualificar o status de
'evento', a mudança deve afetar todos na cena de alguma forma tangível. Um
exemplo simples de evento em 'A Gaivota' é quando Konstantin para a
apresentação de sua peça no meio. Todo mundo é claramente afetado por sua
ação - sejam com ações verbalizadas ou não.

62
Analisar um texto é a procura onde essas mudanças acontecem. Passe
por toda a peça e isole todos os eventos. Muitas vezes, é difícil encontrar
eventos e é preciso algum tempo para praticar. Tenha certeza de que todas as
entradas e saídas são eventos. Isto irá lhe fornecer um ponto de partida. Não
se preocupe se você não pode ver todos os eventos logo no inicio. O
importante é que você começou a olhar para as mudanças na cena. Isso pode
ajudar a estudar os eventos da vida real e começar a perceber como a
mudança ocorre e como isso afeta o que as pessoas fazem.

Uma vez localizados, os acontecimentos equipam você com um jeito de


dividir o texto em seções menores para trabalhar. Quando eu comecei a dirigir
eu queria dividir o texto em pequenos pedaços, mas eu não tinha a habilidade
para fazê-lo. Arbitrariamente, eu cortei o texto uma vez a cada duas ou três
páginas. Chamei essas seções de 'unidades' ou 'pedaços' e as ensaiei assim.
Mas o lugar onde cortei o texto não era lógico ou útil para os atores. Às vezes
era francamente um obstáculo, pois criou uma falsa interrupção do fluxo da
cena na mente dos atores. Somente quando Tatiana Olear me ensinou sobre
os eventos que, de repente, eu percebi como dividir o texto usando eventos
como suportes de cada seção. Por exemplo, a minha primeira seção de ensaio
começará na entrada da Masha e Medvedenko e durará até a entrada de
Konstantin.

Eventos não apenas alteram o que os atores fazem, eles também


afetam o que o público vê e muitas vezes alteram o andamento do que
acontece. Usando eventos para estruturar uma peça de teatro, portanto, torna
as coisas claras para o ator e, em igual medida, para o público. Eles são a mais
essencial ferramenta de direção em todo este livro - determinam a variedade,
forma e vida na estrutura global da apresentação. Quando Tatiana me
apresentou a eles, em 2000, foi uma completa revelação e minha capacidade
de estruturar e moldar meu trabalho melhorou imensamente. Esta forma de
analisar uma peça, também provou ser útil para os atores, pois se baseia em
um processo simples e facilmente observável, que acontece o tempo todo na
vida.

Use apenas lápis quando você for delimitar um evento no texto. Mais
tarde, nos ensaios, os atores podem apontar erros sutis que você cometeu e
você pode precisar alterar o posicionamento do evento - ou até mesmo
adicionar mais alguns eventos.

O texto sempre contém pistas pequenas e sutis que apontam para onde
o evento está localizado. No exemplo abaixo, você vai notar que o primeiro
evento (Masha diz a Medvedenko que ela não o ama) é emoldurado por duas
ações relacionadas com rapé: a primeira é Masha fuma um pouco para criar
coragem antes de dizer a Medvedenko que não o ama mais; o segundo é um
gesto conciliatório de oferecer-lhe um pouco de rapé para tentar reparar o dano
que ela causou. Depois, há o fato de que o personagem tagarela, Medvedenko,
para de falar completamente logo após o evento. Finalmente, há uma pausa
cuidadosamente posicionada após o evento. Essas pistas devem ajudá-lo a
identificar com precisão o local do evento.

63
Este é o jeito de como o texto pode parecer com os dois primeiros
eventos marcados.

Ato um
Medvedenko: Por que você sempre se veste de preto?
Masha: Estou de luto pela minha vida. Eu sou infeliz.
Medvedenko: Por que? [reflexiva] Eu não entendo. Você tem a sua saúde. Seu
pai pode não ser rico, mas ele não é tão pobre. Eu tenho uma vida mais difícil
do que a sua. Recebo 23 rublos por mês ao todo - menos deduções para a
pensão - e eu não circulo por aí de luto.
[Eles se sentam]
Masha: Não é uma questão de dinheiro. Mesmo um mendigo pode ser feliz.
Medvedenko: Teoricamente. Na prática, tudo se resume a isto:. Minha mãe e
eu, além de minhas duas irmãs e meu irmão mais novo - e apenas 23 rublos
por mês. Quer dizer que não temos que comer e beber? Não há necessidade
de chá e açúcar? Não há necessidade de tabaco? Eu não sei como gerenciar
isso.
Masha: [olhando em volta no palco improvisado] O show vai começar em
breve.
Medvedenko: Sim. A peça escrita por Konstantin, e a Nina dele estará atuando
nela. Duas pessoas apaixonadas, e hoje as almas deles irão se fundir assim
como eles se esforçam para criar uma única impressão artística. Considerando
que minha alma e a sua não tem nenhum ponto em comum. Eu amo você - Eu
não posso ficar em casa, eu desejo muito te ver - eu ando três milhas aqui e
três milhas de volta todos os dias - e tudo o que eu tenho de você é
indiferença. Bem, é compreensível. Eu não tenho dinheiro - Eu tenho uma
grande família ... Quem quer casar com um homem que não consegue nem se
sustentar?
Masha: Oh, violino.
[Fuma um trago de rapé]
_______________________________________________________________
Estou muito emocionada que você me ama, mas eu não posso dizer o mesmo
em troca, e isso é tudo que existe sobre isso.
EVENTO
______________________________________________________________

[Oferece-lhe a caixa de rapé] Tem uma pitada.


Medvedenko: Não é para mim.
[Pausa]
Masha: Tão perto. Nós provavelmente vamos ter uma tempestade durante a
noite. Se você não está filosofando, você está falando sobre dinheiro. Você
parece pensar que a pior coisa que pode acontecer a qualquer um é a pobreza,
mas eu acho que é mil vezes mais fácil andar por aí em trapos e mendigar por
pão do que isso ... Bem, você não entenderia ...
_______________________________________________________________
[Entrada, direito, Sorin e Konstantin]
EVENTO
_______________________________________________________________

64
Tenha cuidado para não confundir uma mudança de assunto com um
evento. Por exemplo, quando Masha diz Medvedenko, 'O show vai começar em
breve', você pode pensar que este era um evento, mas eu discordo. É uma
intensificação da intenção de Masha: para distrair Medvedenko do assunto de
sua recente proposta. Seu trabalho sobre as biografias de personagens
também irá impedi-lo de cometer erros. Por exemplo, você poderia confundir as
palavras de Medvedenko, 'eu te amo' como o evento. Um estudo claro das
cenas para os eventos que precedem irá ajudá-lo a perceber que Medvedenko
já disse a Masha que a ama e pediu-lhe para casar com ele antes do início das
cenas da peça. Masha não respondeu nem a declaração, nem a proposta.
Desde a proposta que ele tem andado para vê-la todos os dias, à espera de
uma resposta. Suas palavras: 'Estou muito emocionado que você me ama, mas
eu não posso dizer o mesmo em troca, e isso é tudo que existe sobre isso' - o
evento é a primeira resposta concreta que ele teve desde a proposta.

Depois de ter identificado um evento dê a ele um nome simples e limpo,


como: 'Masha informa Medvedenko que ela não o ama'. Use palavras
interessantes como 'informar', porque você não quer colorir ou influência como
o ator pode escolher atuar neste momento - ou, de alguma forma, prejulgar os
personagens. Note também que esta cena entre Masha e Medvedenko tem
outros personagens - os operários batendo por trás da cortina. Quando você
prepara os eventos e as intenções para esta cena, você também terá de
considerar o que eles estão fazendo, como estão atuando, e como ela irá
apoiar a sua análise do evento. Ela pode ajudar, por exemplo, a decidir se eles
irão mudar sua atividade quando o evento ocorrer, talvez mudando de bater
para lixar. Você também vai precisar tomar uma decisão simples sobre quem
pode ouvir o que, como isso vai afetar todos na cena e a reação ao evento.
Anote o nome do evento a lápis, bem na linha que você desenhou através da
página para delimitar o evento. Mais uma vez, a sintaxe precisa do nome pode
muito bem alterar-se ligeiramente quando você passar o texto com os atores,
mais tarde, nos ensaios.

Nem todos os eventos permitem que você marque uma linha limpa e
arrumada ao longo da página. Alguns podem começar no meio de uma fala ou
numa observação de direção de palco e terminar a meio de outra fala. Você vai
ter que desenhar um rabisco em torno das palavras relevantes no texto ao
invés de uma linha. O que importa é que as palavras e ações dentro do evento
estejam precisamente delimitados.

Aqui está uma lista dos eventos no primeiro ato de 'A Gaivota'. Se você
quiser praticar encontrar os eventos, você pode parar de ler por aqui e você
mesmo pode ir até o texto original e depois comparar os seus resultados com
a seguinte lista.

Masha informa Medvedenko que ela não o ama.


Sarin e Konstantin são ouvidos se aproximando do auditório.
Konstantin e Sorin veem Masha e Medvedenko no auditório, e Konstantin
manda Masha e Medvedenko para dentro. (A visão de Masha e Medvedenko e
dizer-lhes para ir embora acontece em uma fração de segundo, por isso é um
evento.)

65
Masha e Medvedenko deixam o auditório e vão para dentro.
Yakov informa Konstantin que ele e os trabalhadores vão sair para um
mergulho.
Yakov e os trabalhadores saem para ir nadar.
Sorin pergunta a Konstantin porque Arkadina está adoentada
Konstantin e Sorin ouvem passos.
Konstantin reconhece que os passos são Nina.
Nina entra.
Konstantin informa Nina e Sorin que 'é hora de começar'. Sorin volta para
dentro da casa para buscar todos.
Nina e Konstantin se beijam.
Eles ouvem passos.
Yakov informa Konstantin que ele está por trás da cortina.
Yakov vai preparar os efeitos especiais para o desempenho.
Konstantin e Nina ouvem as pessoas se aproximando (eu adicionei este evento
como razão para Nina e Konstantin saírem).
Konstantin e Nina saem.
Polina e Dorn saem de casa para assistir a peça.
Polina questiona Dorn sobre seus sentimentos por Arkadina.
Eles ouvem as pessoas se aproximando.
Arkadina, Sorin, Trigorin, Shamrayev, Medvedenko e Masha chegam.
Konstantin sai detrás do palco improvisado.
A buzina soa atrás do palco improvisado.
A cortina sobe.
A iluminação do brejo aparece (elas são operadas por Yakov e os
trabalhadores).
Yakov e os trabalhadores fazem duas luzes vermelhas aparecerem no lago
para anunciar a aproximação do Diabo na apresentação, juntamente com a
liberação do enxofre.
Konstantin para a apresentação (este evento só se completa quando a cortina
é abaixada).
Konstantin sai.
Eles ouvem alguém começar a cantar sobre o outro lado do lago.
Arkadina lembra todo mundo sobre Konstantin.
Masha vai procurar Konstantin.
Nina surge de trás da cortina.
Dorn sugere que a cortina está levantada.
Yakov levanta a cortina.
Shamrayev conta uma piada grosseira.
Nina anuncia sua partida.
Nina sai.
Sorin sugere para eles irem para dentro porque está úmido.
Todos, exceto Dorn vai para dentro.
Konstantin entra.
Konstantin percebe que Nina foi embora.
Masha entra.
Konstantin diz para Masha não segui-lo.
Konstantin vai procurar Nina.
Dorn joga a caixa de rapé de Masha nos arbustos.
Masha pede que Dorn fique

66
Masha revela seu amor por Konstantin para Dorn.

Em seguida, descubra qual é o evento mais importante em cada ato e


designe-o como o 'evento principal'. Isolar os principais eventos ajuda você e
os atores a saber como medir o valor e o peso de todos os eventos em cada
ato. Aqui estão os principais eventos de 'A Gaivota'.

Primeiro ato: O cancelamento da peça


Segundo ato: A recusa dos cavalos
Terceiro ato: O anúncio da chegada dos cavalos
Quarto ato: A chegada de Trigorin com Arkadina da estação

Você vai notar que eu mudei a maneira que nomeei o principal evento do
primeiro ato de 'Konstantin para a apresentação' (o fraseado que usei na longa
lista de Eventos do primeiro ato) para 'O cancelamento da peça'. Reformulei o
evento para que ele comece com um substantivo em vez de um nome de
personagem, assim todo mundo pode ter uma relação com o que você está
descrevendo. Escolha grosseiramente, se o evento principal foi descrito com
uma frase que começa com o nome 'Konstantin', os outros dez ou mais
personagens podem pensar que este evento foi ' o momento' de Konstantin, e
não considerar plenamente as possíveis respostas de seus personagens. O
evento só funciona se todos os personagens atuarem de forma integral e clara.

Se você está trabalhando em uma peça moderna que é estruturada em


uma sequencia de cenas (em vez de atos), tente olhar para o movimento global
da cena antes de selecionar os principais eventos. Desenhar um evento acima
do resto em um ato ou uma sequencia de cenas começa a ajudá-lo a esculpir a
forma geral da performance. Uma das armadilhas nas primeiras tentativas para
dirigir é um nivelamento superficial, em que a todos os momentos da cena são
tidos com igual valor pelos atores. Em vez disso, oriente tanto os atores como a
plateia para os eventos mais importantes da cena.

Por fim, cada peça tem um evento que ocorre antes que a cena comece
e que inicia uma reação em cadeia que leva aos eventos que ocorrem na peça.
Este é o chamado 'evento de gatilho'. Em 'A Gaivota', o evento de gatilho é o
anúncio da chegada de Trigorin e Arkadina na propriedade. Este momento é o
da chegada da carta na propriedade vinda de Moscou dizendo a todos a notícia
da visita. Ele dispara o seguinte curso dos acontecimentos:

Konstantin decidiu escrever uma peça de teatro; ele convidou Nina para estar
nela; Arkadina chegou; o auditório foi construído; Nina conheceu Trigorin, etc,
etc

Se Trigorin e Arkadina não tivessem decidido passar as suas férias na


fazenda, Konstantin não poderia ter escrito a peça, Trigorin não teria conhecido
Nina, Konstantin não teria matado a gaivota, Nina não teria fugido para Moscou
e assim por diante.

67
Ao isolar o evento de gatilho, dedique alguns minutos para documentar
os eventos que aconteceram como resultado e a ordem em que eles
aconteceram. Aqui está um exemplo desse processo em 'A Gaivota'.

Uma quinzena atrás: Arkadina convence Trigorin a ir com ela tirar férias na
propriedade de sua família.
Há quinze dias: a carta de Arkadina diz que ela trará Trigorin com ela para
suas férias de verão e chegará na propriedade na hora do almoço.
Konstantin começa a escrever sua peça.
Medvedenko propõe casamento a Masha.
Há uma semana: Konstantin convida Nina para atuar em sua peça.
Há três dias: Arkadina chega na propriedade.
Konstantin conversa com Shamrayev sobre os trabalhadores que serão
necessários para a construção da plataforma do palco.
Primeiro ensaio de Konstantin com Nina na peça..

Depois de ter feito isso, coloque uma estrela nos eventos que você acha
que podem ser uteis para as improvisação.

Lembre-se de que não existem respostas definitivas e que você está


trabalhando apenas com suas impressões sobre o texto. Você poderia, por
exemplo, defender um evento de gatilho diferente, como 'Konstantin decide
escrever a peça'. A questão é se isso irá criar um peça mais dinâmico das
cenas que se seguem e se faz sentido com as ações de cada um; é um
julgamento que você tem que fazer. Escolher o evento de gatilho direito ajudará
os atores a entrar na peça pelo lugar certo. O evento de gatilho também é um
ponto importante para colocar em sua lista de improvisações.

Os eventos podem ser muito úteis quando você está planejando uma
peça de teatro. Em vez de pensar em termos das tramas de uma história, o
foco fica no planejamento das mudanças que irão ocorrer. Organize seu
material em torno desses marcos. Eles também ajudam quando você está
dirigindo óperas. Em particular, a escolha dos principais eventos em cada ato
ajuda os cantores no que eles estão fazendo.

No final desta tarefa você deve ter um texto com todos os eventos
delimitados e nomeados. Estas divisões vão fragmentar o texto em seções
menores para você ensaiar. Eu descrevo como elaborar a sua agenda de
ensaios dessas seções no Capítulo 11.

Agora você está pronto para começar a trabalhar as intenções.

RESUMO
Vá até o texto e isole todos os eventos ou mudanças que ocorrerem.
Escreva uma frase simples para descrever cada evento.
Selecione os eventos principais em cada ato ou cena.
Isole o evento anterior a peça que define a movimentação das cenas da
peça (evento gatilho).
Destaque os eventos que podem ser úteis para as improvisações.68
4.4 Intenções

'Intenção' é a palavra que descreve o que um personagem quer e de


quem ele quer. Neste processo, as intenções dos personagens só mudam nos
eventos e a análise das intenções, portanto, evolui naturalmente no seu estudo
de eventos. Antes de começar os ensaios, tente descobrir exatamente o que
cada personagem quer entre cada evento da peça - e de quem.

Quando você está tentando identificar as intenções dos personagens,


tente ver além da superfície das palavras, nos pensamentos ou desejos que
estão motivando essas palavras (ou ações, no caso de indicações de palco).
Identificar intenções é como tirar um raio-X em que você vê a estrutura óssea
sob a pele.

Se um personagem não falar numa cena entre os eventos, mesmo


assim você precisa encontrar uma intenção para eles. Muitas vezes as pessoas
podem usar o silêncio de uma forma muito ativa, de forma a ter um forte
impacto sobre os outros.

Eu sempre achei a preparação de intenções uma tarefa extremamente


difícil e muitas vezes eu procrastinei ao fazer isso. Isso é porque eu sei que a
capacidade de diagnosticar a intenção está no cerne do trabalho que fazemos
com os atores. O trabalho sobre as intenções ajuda a responder às perguntas
mais difíceis que um ator pode fazer: 'Por que meu personagem faz isso?' e
'Por que a minha personagem diz isso?' Se eu não preparar as intenções, eu
sei que vou perder um tempo precioso nos ensaios debatendo a motivação do
personagem. É claro, que preparar as intenções não descarta o debate
inteiramente, mas definitivamente vai limitá-lo a algo mais útil e gerenciável.

Aqui estão algumas dicas sobre o seu trabalho sobre as intenções.

Em primeiro lugar, tenha cuidado para não confundir uma mudança de


assunto com uma nova intenção. Os personagens podem mudar de assunto
várias vezes, a fim de alcançar uma intenção. Por exemplo, na cena de
abertura de 'A Gaivota', Masha muda de assunto quando ela diz: 'O show vai
começar em breve', mas esta é apenas mais uma tática em sua intenção geral
para distrair Medvedenko do assunto sobre o amor.

Em segundo lugar, lembre-se que as intenções tem que partir da lógica


da situação. Às vezes um lembrete rápido do título do ato ou da cena de
repente pode ajudá-lo a ver as intenções dos personagens mais distintamente.

Em terceiro lugar, esteja ciente de que as cenas funcionam melhor


quando elas contêm um conflito simples. Assim, garanta que as intenções se
contradigam, ou interajam de forma dinâmica, uma com a outro. Por exemplo,
se você for pedir para o ator que interpreta Masha a intenção de guiar
Medvedenko para fora do assunto de sua proposta de casamento, então talvez
seja interessante dar ao ator que interpreta Medvedenko a intenção de
influenciar Masha a dar-lhe uma resposta para sua proposta de casamento.
Não dê a todos em uma cena as mesmas intenções.

69
Em quarto lugar, se você está lutando para identificar uma emoção,
pergunte-se que imagem o personagem tem na cabeça dele do resultado
desejado da intenção. Esse resultado, ou imagem do futuro, deve sempre
envolver uma mudança no que o outro personagem ou personagens fazem ou
dizem. O personagem, por exemplo, quer que a pessoa que eles estão falando
faça algo especial, como sentar-se, ir para dentro ou para parar de corar?
Quando Konstantin para a performance de sua peça no primeiro ato, ele quer
que o público sente-se silenciosamente e se sinta mal? Ou será que ele quer
eles se levantem e façam um escândalo sobre isso, xingando-o? Se for o
primeiro, então sua intenção é: fazer com que todos se sintam envergonhados.
Se for o último, então a sua intenção é: fazer com que todos se sintam
frustrados.

Finalmente, lembre-se que o personagem não pode ser sempre


consciente do que está sendo interpretado e isso vai tornar a tarefa de
diagnosticar a intenção mais difícil. Escrevo mais sobre este assunto no
capítulo 11, quando eu descrever como trabalhar com atores em suas
intenções. Se você ainda está encontrando dificuldade para encontrar as
intenções, pode ajudar pular para o capítulo mais a frente agora e ler a seção
sobre o primeiro ensaio de cena no capítulo 11.

Lembre-se que você pode praticar o diagnostico de intenções


observando pessoas na vida real. Observe como elas interagem e descubra o
que elas querem por trás das palavras que estão dizendo ou tente perceber
quais são suas intenções quando você interage com os outros.

Ao isolar uma intenção, anote-a. Não se preocupe em fazer frases


bonitas. Use palavras simples e não formais -, sem emoção, tal como fez ao
nomear os eventos. Você irá aprimorar a sentença mais tarde, quando for
trabalhar com os atores. Certifique-se de escrever as intenções a lápis para
que você possa facilmente fazer alterações durante os ensaios no que você
escreveu. Lembre-se que as intenções só mudam quando um evento acontece:
você terá que encontrar uma intenção para cada personagem no palco para
cada cena da peça. Em 'A Gaivota', aqui estão as intenções do primeiro trecho
entre Masha e Medvedenko.

Masha: Guiar Medvedenko fora do assunto de sua proposta.


Medvedenko: Obter uma resposta de Masha sobre sua proposta.
O evento: Masha informa Medvedenko que ela não o ama.
Masha: Fazer Medvedenko sentir-se melhor.
Medvedenko: Convencer Masha que ele não é afetado pela rejeição.

Em seguida, olhar para a forma como cada personagem tenta conseguir


o que quer. Você vai notar que os personagens usam toda uma gama de
diferentes táticas. Certifique-se de que você não se confundem entre o que o
personagem querem - a intenção - e como alcançá-lo - a tática ou os meios.
Não é essencial anotar as táticas do personagem antes de começar os
ensaios, mas anote algumas que se destaquem em particular.

70
'Mas como eu trabalho as intenções, se houver apenas uma pessoa no
peça?', Você pode perguntar. Primeiro, esteja ciente de que será muito raro um
personagem falar diretamente com 'o público' que está realmente observando a
peça. Então, se você está dirigindo um monólogo, simplesmente pergunte a si
mesmo o que o personagem está falando. Eles estão falando para si ou para
outra pessoa ou outras pessoas? São essas pessoas ou essa pessoa real ou
imaginária, vivo ou morto? Onde estão essas pessoas ou essa pessoa? Depois
de ter respondido a estas perguntas, você pode perguntar o que o personagem
quer de quem ele está falando. Então, quando você estiver ensaiando a cena,
o ator terá que praticar imaginando essa pessoa ou essas pessoas.

Esta forma de trabalho terá um refinamento final sugerido pelos atores


com que trabalho regularmente. Eles disseram que não deve haver intenções
dentro de muitos dos eventos, especialmente quando os eventos ocorrem ao
longo de várias linhas. Os atores apontou que, se o evento é uma súbita
aparição de um pistoleiro armado, não há tempo para jogar uma intenção
durante a mesma, mas se o evento é a divulgação gradual de um segredo
(como Masha dizendo a Dorn sobre seus sentimentos por Konstantin), os
atores têm tempo para jogar uma intenção separada 'dentro' do evento. A
ausência de uma intenção mais um evento com duração de várias linhas
significa que os atores não têm nada a interpretar e sentir, que eles estão
apenas em pé esperando para traçar sua próxima intenção. Quando você usa
pela primeira vez esta forma de trabalhar, eu sugiro que você só prepare as
intenções entre os eventos, mas se existem eventos que acontecem ao longo
de várias linhas ou alguns segundos, você pode gostar de identificar uma
intenção dentro do evento.

No final deste exercício seu texto agora conterá os eventos e as


intenções que ficaram entre esses eventos (assim como algumas intenções
que acontecem 'dentro' desses eventos).

RESUMO
Vá até o texto para identificar e descrever as intenções entre os eventos.
Não confunda uma mudança de assunto com uma nova intenção.
Lembre-se do título do ato ou cena, se você está lutando para identificar
uma intenção.
Certifique-se de que as intenções que você selecionar irão interagir de
forma dinâmica uma com a outra.
Pratique o diagnóstico de intenções, observando as pessoas na vida real.
Anote intenções em frases sem emoções e com simplicidade.
Comece a perceber as 'táticas' que cada personagem usa para por em
prática suas intenções.

71
4.5 Preparando um texto pronto para os atores

Preparar o texto do ensaio é fazer um documento que seja fácil de ler e


usar para os atores - e inclui espaço para escrever notas, eventos e intenções.
Lembre-se que um texto publicado e impresso de uma peça foi feito daquele
jeito para as pessoas lerem e não para serem usados como uma ferramenta de
ensaio. Considere isso quando escolher que edição de uma peça clássica você
vai usar. Se você decidir fotocopiar um texto publicado, pense sobre aumentar
o tamanho da impressão ou deixar páginas em branco para anotações.

A outra decisão que você precisa tomar sobre o texto é o que manter e o
que cortar em termos de direções de palco e descrições sobre como os
personagens devem dizer suas falas. Alguns diretores cortam todas as
direções de palco do texto, porque eles podem predeterminar os movimentos e
ações dos personagens. Eles também removem todos os adjetivos que
antecedem as falas, como 'raiva' ou 'em prantos', porque estas palavras podem
colocar o ator sob a pressão de entregar sentimentos generalizados. Outros
preferem que cada encenação, vírgula, ponto e adjetivo que veio da pena do
escritor seja mantido no texto. Alternativamente, você pode preferir remover
informações do texto que estão em desacordo com sua interpretação da peça,
ou o seu processo. Por exemplo, eu tirei a palavra 'audiência' do primeiro
estágio de direção de 'A Gaivota', porque eu não queria que os atores
pensassem em uma audiência - eu queria que eles pensassem mais sobre o
personagem que eles estavam interpretando e a situação em que estavam. Eu
também removi as referências ao 'palco direito' e 'palco esquerdo' por razões
semelhantes. Lembre-se, porém, que você só deve fazer alterações no texto de
um escritor vivo se ele estiver de pleno acordo.

No processo de ensaio que este livro descreve, os atores nunca vão


ensaiar uma cena segurando um texto em suas mãos, então você não tem que
se preocupar em fazer um texto que seja fácil de segurar quando uma pessoa
está andando. No entanto, se você quer que os atores mantenham os textos
enquanto ensaiam, considere a melhor diagramação e insira no texto, de modo
a fazer isso de forma eficiente. Lembre-se, no entanto, que muitos atores irão
torna-los eficientes com seus próprios sistemas.

Certifique-se de que esse texto seja enviado para todos os atores antes
de começar os ensaios para que eles possam passar mais tempo absorvendo
o texto que você quer que eles trabalhem. Atores, muitas vezes, prepararam
seus textos para os ensaios, destacando todas as suas linhas ou colocando
notas ou perguntas ao lado das cenas do texto. Se você apresentá-los com um
texto novo no primeiro dia com as mudanças na paginação ou o layout, eles
podem precisar de um tempo para transferir as informações de um texto para o
outro.

Finalmente, certifique-se de que todos na sala tem o mesmo texto. Às


vezes, com um texto antigo, as pessoas trazem diferentes versões ou
traduções. Se a paginação variar de texto para o texto, o tempo dos ensaios
será desperdiçado procurando por diferentes folhas para encontrar a página
certa.

72
RESUMO

Organize um texto para os atores que seja fácil de ler e em que haja
espaço para anotar as coisas.
Remova quaisquer direções de palco do texto que estão em desacordo
com sua interpretação da peça ou seu processo.
Considere se você quer remover quaisquer instruções ou informações de
palco do escritor sobre como as falas devem ser ditas.
Se você quer que os atores mantenham seus textos nos ensaios, pense
em como você vai diagramar os seus textos.
Se for trabalhar com o texto de um escritor vivo, consulte-o
cuidadosamente sobre as alterações que você pretende fazer no texto
de ensaio.
Considere diferentes formas de diagramação do texto para que ele possa
ser usado como partitura de performance para os atores e envie sua
versão do texto antes do inicio dos ensaios.

4.6 Lista de verificação de todo o trabalho feito neste capítulo


No final deste capítulo o seu texto contém:
Um nome para cada ato ou cena
Linhas marcando cada evento e frases simples que descrevem cada
evento
Anotações dos principais acontecimentos de cada ato
Frases simples que descrevam as intenções dos personagens entre cada
evento
Uma diagramação com a qual você esteja feliz
Uma decisão sobre a possibilidade de manter ou cortar direções de palco
e descrições de como dizer as falas.

73
The Mysteries by Edward Kemp

74
5. Capítulo - Aprofundando o trabalho nos personagens
(Tradução de Frank Kitzinger - Revisão Humberto Issao)

Esse capítulo é sobre um aprofundamento mais amplo no trabalho nos


personagens e uma introdução à improvisação. Ele tem três etapas:

5.1 Os pensamentos dos personagens sobre si mesmos


5.2 Relacionamentos
5.3 Preparando improvisações

5.1 Os pensamentos dos personagens sobre si mesmos

O Capítulo 1 descreve a construção de uma biografia para cada


personagem. Uma biografia permite que você realize uma observação do lado
de fora do personagem enxergando o que eles fizeram em suas vidas. Agora
você precisa entrar no personagem e observar o mundo através dos olhos
dele. Para fazer isso você precisará trabalhar nas estruturas de pensamentos
dele.

Nossos pensamentos existem como uma coleção de sentenças ou fotos


em nossas cabeças; essas sentenças e imagens entram em nossas cabeças
como pontos identificáveis de nossas vidas. Alguns de nossos pensamentos
são relativamente novos, alguns são antigos e outros são contraditórios.
Portanto eles definem de forma diferente nosso comportamento. Nossa coleção
de pensamentos está constantemente se remodelando em resposta a novos
estímulos ou acontecimentos em nossas vidas. Esses pensamentos definem
como respondemos aos eventos que ocorrem em nossas vidas. Imagine-se,
por exemplo, observando a resposta de dois diferentes motoristas ao serem
cortados por um outro motorista em um cruzamento. O primeiro motorista vira-
se para o passageiro sentado ao seu lado e diz “Que frustrante. Eu queria que
as pessoas aprendessem a dirigir corretamente.”, e depois começa a dirigir de
maneira errada também. O segundo motorista presencia exatamente a mesma
situação e vira-se para o passageiro sentado ao lado e diz “Pobre homem. Eu
aposto que ele estava atrasado para uma consulta urgente no hospital ou
precisava resolver uma emergência em casa”, e o modo como ele conduz o
veículo não é afetado. A resposta para o mesmo acontecimento revela as
diferentes estruturas de pensamento que os dois motoristas possuem: o
primeiro motorista possuí o tipo “A vida é frustrante” e o segundo motorista
possuí o tipo “A vida é simples”. Você pode descobrir as estruturas de
pensamento dos personagens em peças, assim como você pode observa-los
em operação na vida real. Fixar os pensamentos-chaves poderá ajudar você a
guiar os atores a construir personagens mais precisos com respostas
consistentes aos acontecimentos.

Os primeiros pensamentos que devem ser observados, antes do início


da peça, são aqueles que os personagens possuem sobre si mesmos. Faça
uma lista sobre tudo o que o personagem tem a falar sobre si mesmo.
Certifique-se de citar o texto na íntegra e colocar o número da página ao lado
de cada citação, caso você queira checar alguma coisa depois. Ações revelam
os pensamentos das pessoas tanto quanto suas palavras, então adicione

75
qualquer informação relevante a partir das direções de palco (se você pretende
usá-las). Evite possíveis afinidades que atraem você para um personagem em
detrimento de outro, começando no topo da personae dramatis (lista de
personagens) para baixo. Algumas vezes você irá achar difícil saber o que
incluir ou deixar de fora. Se você está em dúvida sobre a importância de uma
citação, inclua-a do mesmo jeito. Aqui está uma lista de citações para Arkadina.

Ato Um
Por uma questão de diversão, estou preparado para sentar-me com os
devaneios do delírio. Por que eu trabalho, eu estou viva para o mundo ao redor
de mim. Estou sempre ocupada; ao passo que você está sempre se arrastando
na lama, você não sabe viver... Eu também faço disso uma regra, não olhar
para o futuro. Eu nunca paro pra pensar sobre a velhice, eu não paro pra
pensar sobre a morte. O que tem que ser, será.
Ato Dois
Ó, o que poderia ser mais entediante do que esse encantador país aborrecido.
Quente, acolhedor, ninguém quer fazer nada, todos filosofando por aí. É bom
estar com você, meu amigo, é um prazer ouvir você, e ainda mais... estar
sentado em um quarto de hotel em algum lugar aprendendo suas falas –
poderia alguma coisa ser melhor do que isso?
Ato Três
Supostamente eu deveria estar arrumando mais dinheiro para as roupas [para
Konstantin], do que para viajar para fora. Não, no momento eu não consigo
nem mesmo o dinheiro para as roupas. [Decisivamente] Eu não tenho dinheiro!
[Sorin solta uma gargalhada] Eu não tenho!
[À beira das lágrimas] Eu não tenho dinheiro! Certo, eu tenho dinheiro, mas
acontece que estou na profissão teatral – minhas vestimentas por si só quase
me arruinaram...
Eu não tenho nenhum dinheiro. Eu sou uma atriz, não um gerente de banco.
Sou uma mulher como qualquer outra - você não pode falar comigo assim.
Eu sou tão velha e feia assim que você pode falar comigo sobre outras
mulheres sem sequer pestanejar?
[Abraça e o beija] Essa última página da minha vida!
[Ajoelha] Minha alegria, meu orgulho, meu deleite... [Agarra os joelhos dele]
Deixe-me por apenas uma hora e eu não vou sobreviver, eu vou enlouquecer,
meu homem extraordinário, meu homem magnífico, meu senhor soberano...
Ato Quatro
Três cestas de flores, duas guirlandas, e isso. [Arranca o broche sob seu peito
atirando-o na mesa] Eu estava usando uma roupa maravilhosa. Entre muitas
coisas, eu sei como me vestir.
[Ela está alarmada com o som do tiro] Ó, isso me assustou! Isso me lembrou
quando... [Coloca as mãos sob o rosto] Por um momento eu achei que estava
prestes a desmaiar...

Agora transforme essas citações em uma serie de substantivos e


adjetivos que podem complementar a sentença “Eu sou...” Faça isso se
questionando: Quais são os pensamentos que uma pessoa tem sobre si
mesma ao dizer isso? Faça essa pergunta para cada citação que você
escreveu e depois encontre uma palavra que sirva como resposta precisa. Por
exemplo, na página 42 da peça, você pode observar o tremor de Arkadina

76
quando Trigorin diz que quer sair com Nina e ter a impressão de que “eu estou
envelhecendo” é um dos pensamentos de Arkadina sobre si mesma. Você
deve acabar com uma lista de quatro ou cinco "pensamentos" chave para cada
personagem. Os pensamentos de Arkadina poderiam ser: Eu sou uma mãe
ruim, uma sobrevivente, envelhecida, uma grande artista, sem valor, pobre.
Tente evitar pensamentos que são juízos de valor que alguém de fora possa
fazer sobre eles. Em vez disso, tente entrar na cabeça do personagem e faça
um julgamento a partir de seu ponto de vista. Comece a usar os tipos de
palavras que eles usam.

Se você está tendo dificuldades para identificar os pensamentos do


personagem sobre si mesmo, olhe para trás, para o esboço e a biografia e
busque em eventos na vida dos personagens que podem gerar esses
pensamentos. Por exemplo, centrando-se sobre as dificuldades que Arkadina
enfrentou no início de sua carreira ao performar na feira agrícola em Poltava
em 1873 e, mais tarde, quando ela morava em um cortiço em Moscou, torna-se
evidente que o pensamento "Eu sou pobre” deve figurar fortemente em como
esse personagem entende a si mesma.

RESUMO

Liste tudo o que o personagem diz sobre si mesmo durante o desenrolar


da peça.
Reduza a lista de citações a simples substantivos e adjetivos que
completam a frase “Eu sou...”
Se você está tendo dificuldades para identificar os pensamentos do
personagem sobre si mesmo, olhe para trás, para o esboço
biográfico, em busca de eventos na vida dos personagem que pode
ter gerado esses pensamentos

5.2 Relacionamentos

Antes de começar os ensaios, vale a pena descobrir o que cada


personagem pensa a respeito do outro, antes da execução da peça. Essa
tarefa vai ajudar você a olhar para o texto como uma rede interligada de
relacionamentos entre os personagens e impede você de dirigir a peça a partir
de um único ponto de vista de um personagem.

Comece a partir da personae dramatis (lista de personagens) e trabalhe


através de cada personagem, anotando tudo o que eles dizem sobre todos os
outros personagens. Transfira a lista de citações para páginas diferentes e
organize-as sob diferentes tópicos, como por exemplo:

Pensamentos de Arkadina a respeito de Konstantin


Pensamentos de Arkadina a respeito de Sorin

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Pensamentos de Arkadina a respeito de Nina... e assim por diante.

Lembre-se de adicionar a página referências a cada citação. Tenha


certeza que você está olhando para todos os relacionamentos, incluindo as
relações entre os personagens principais e os personagens menores como os
criados. Se o personagem não disser nada ou quase nada a respeito de outro
personagem, estude as cenas em que eles contracenam juntos no palco e veja
se você pode encontrar qualquer informação adicional. Alternativamente você
pode tomar nota da mais simples impressão que o texto lhe passar a respeito
desse relacionamento, antes de adicioná-lo a sua lista. Novamente, lembre-se
que não há uma combinação definitiva de citações para cada relação a ser
tomada como objetivo; essa lista sempre vai variar de diretor para diretor.

Quando você tiver terminado esse processo, reduza tudo a simples


substantivos ou adjetivos que complementem as sentenças: “Konstantin é...”,
“Sorin é...”, “Nina é...” e assim por diante. Esse tipo de anotação de
pensamentos ajudará você a permanecer dentro da cabeça do personagem.
Faça isso com cada personagem. Aqui estão alguns pensamentos de Arkadina
sobre um ou dois personagens.

Sorin é meu irmão, malvado, morrendo, fracassado.


Konstantin é um fardo, indigente, desempregado, parasita, meu filho querido.

Note que personagens, assim como as pessoas na vida real, possuem


contradições em suas mentes a respeito de outros; esse certamente é o caso
de Arkadina e seu filho. Tente não eliminar essas contradições porque elas
podem, por exemplo, ajudar o personagem a tecer um comportamento
inconsistente.

Algumas vezes a interação dos personagens em uma peça é breve ou


inexistente. Nesses casos é difícil identificar os pensamentos que cada
personagem possuí a respeito um do outro. Seja simples e liste as coisas mais
óbvias que eles poderiam estar pensando. Por exemplo, em 'A Gaivota', Polina
e Arkadina mal interagem e ainda assim Arkadina deve ter pensamentos sobre
Polina. Pelo menos ela deve pensar que Polina é a governanta, esposa de
Shamrayev e sua contemporânea. Na ação Arkadina vai até a cidade com
Polina no Ato Dois, e esquece de pegar as ameixas que Polina dá a ela para a
jornada. Aqui está um exemplo de como você pode resumir tudo isso a uma
simples sentença:

Polina é uma criada, uma péssima mãe, uma velha amiga, velha, atormentada,
aborrecida.

RESUMO

Componha uma lista sobre o quê cada personagem pensa a respeito do


outro. Reduza a lista de citações a simples substantivos ou adjetivos.

78
5.3 Preparando improvisações

O objetivo das improvisações é construir quadros do passado, que irão


ajudar no que é dito e feito no presente pelo personagem, durante a ação da
peça. Em 'A Gaivota', Masha e Medvedenko precisam de uma memória
compartilhada sobre o pedido de casamento recente feito por Medvedenko
antes de atuarem na primeira cena, e por trás disso, eles precisam de uma
memória do seu primeiro encontro. Na mesma cena, Medvedenko precisa ter
uma visão clara da vida familiar da qual ele fala, bem como uma imagem das
circunstâncias da morte ou desaparecimento do pai. Da mesma forma,
Konstantin precisa de imagens do passado de sua mãe para sustentar sua
longa conversa sobre ela com Sorin no Ato Um. Ele precisa de uma imagem
dela recitando Nekrasov, ministrando aos doentes e atuando. As improvisações
que você faz devem reconstruir esses eventos e, assim, apresentar uma
imagem duradoura e concreta do que aconteceu nas mentes dos atores -
quase como se fosse uma memória real. Estas imagens, em seguida,
determinam como seus relacionamentos são reproduzidos na ação da peça ou
como os personagens falam sobre o passado. Você pode usar improvisações
durante a ação que ocorrem entre as cenas para abastecer cenas
subsequentes.

Seu trabalho sobre as biografias dos personagens, o evento gatilho, as


circunstâncias imediatas e eventos entre as cenas irão fornecer-lhe uma lista
de todas as coisas que podem ser úteis para as improvisações. Em um mundo
ideal, você teria um período de ensaio relativamente longo onde você seria
capaz de improvisar tudo em sua lista. Em um período de ensaio mais curto,
você pode ter que selecionar apenas os principais eventos; este é o momento
para fazer essa seleção. Se você tem pouco tempo, concentre-se apenas no
evento gatilho, isso pode lhe oferecer bastante material para as improvisações.
Se você estivesse trabalhando no evento gatilho de 'A Gaivota', você poderia
improvisar os seguintes eventos (ou uma seleção desses eventos).

Em Moscou, Arkadina convida Trigorin para passar as férias de verão com ela.
A carta de Arkadina anunciando a sua chegada e de Trigorin na propriedade é
entregue e discutida por Polina, Sorin, Shamrayev, Konstantin e Masha no café
da manhã.
Konstantin senta-se no estúdio e começa alguns esboços para uma peça a ser
apresentada quando Trigorin e Arkadina chegarem.
Konstantin convida Nina para a sua peça e eles fazem uma leitura do texto.
Polina, Masha e os servos planejam os preparativos a serem realizados antes
da chegada de Trigorin e Arkadina.
Konstantin pede a Shamrayev para ajuda-lo a construir um palco para a sua
peça. Arkadina chega na propriedade.

A melhor maneira de dirigir uma improvisação é estrutura-la bem.

Quando eu comecei a dirigir eu dei muito poucas instruções.


Consequentemente, as improvisações eram muito longas: nada aconteceu e
muito dos atores escapavam regularmente dentro e fora do personagem. Evite
esse tipo de resultado pelo planejamento de improvisações como se fossem

79
cenas de uma peça, dando aos atores circunstâncias imediatas, eventos,
intenções e um claro senso de lugar e tempo. Quanto mais concretas as
informações que você pode fornecer para cada improvisação, melhor - e
lembre-se que os atores podem lidar com mais informações do que você acha
possível. Se você estruturar suas improvisações claramente, você também vai
reduzir a diferença entre fazer improvisações e atuar dentro da peça. Quando
você ensaia as cenas, elas irão acontecer como improvisações.

Aqui está o plano para a improvisação do pedido de Medvedenko para


Masha.

Local: A biblioteca na propriedade de Sorin.


Data: 1893, agosto. Domingo. 11h. Está muito quente.
Circunstâncias imediatas: Medvedenko está devolvendo um livro que ele
emprestou de Masha no dia anterior. É o Hamlet de Shakespeare. Medvedenko
veio de sua casa, andou três milhas em seu melhor terno. Ele está se sentindo
um pouco quente e suado. Sua família espera que ele volte para o almoço.
Nesta manhã, ele teve uma discussão com sua mãe sobre o serviço de limpeza
semanal. Ela estava particularmente irritada por causa de seus gastos com
cigarros. Masha está lendo Schopenhauer na biblioteca, a fim de impressionar
Konstantin com o seu conhecimento - ele trouxe esse volume do filósofo na
noite anterior. Ela tem a janela aberta por causa do calor. Ela tem uma hora
antes de ter que ajudar a mãe com o almoço. Konstantin está longe a manhã
toda, atirando, Shamrayev está trabalhando nos campos de preparação da
colheita, Polina está na cozinha e Sorin está escrevendo cartas em seu
estúdio.
Primeira intenção de Masha: Divertir-se com Medvedenko.
A intenção de Medvedenko: Preparar-se para o pedido que irá fazer a Masha.
O evento: Medvedenko pede a mão de Masha em noivado.
Segunda intenção de Masha: Que Medvedenko dê-lhe mais tempo para
pensar sobre a pedido.
Segundo a intenção do Medvedenko: Receber uma resposta clara e imediata
de Masha.
Você também pode programar improvisações muito simples, como por
exemplo, uma que vá ajudar Nina em seu relacionamento com Trigorin.
Local: o quarto de Nina.
Data: 1892, de março, 04:30 da tarde
Circunstâncias imediatas: Sua madrasta e pai acabaram de sair para ir às
compras na cidade, o que lhe dá a oportunidade de trabalhar em seu álbum de
recortes de Trigorin. Esta manhã, ela recebeu uma revista mensal literária de
Moscou com uma nova história de Trigorin chamada 'In the Summer Moonlight',
sobre um caso de amor impossível nas estepes russas. Ela leu a história no
café da manhã e agora ela está recortando-a da revista para colá-la em seu
álbum de recortes de Trigorin. O quarto está bastante frio.
Primeira intenção de Nina: Entreter a si mesma.
O evento: A cola se espalha toda sobre a página de recortes.
Segunda intenção de Nina: Impedir-se de entrar em pânico.

Esta improvisação planejada não é tão dinâmica quanto a cena de uma


peça pode ser (e pode até ser um pouco maçante de assistir), mas ela pode

80
oferecer ao ator uma imagem clara do que Trigorin escreve, o seu status e
como ele é importante para ela. Como resultado, isso vai ajudá-la quando ela
diz suas falas no Ato Um, como por exemplo ‘Essas histórias maravilhosas que
ele escreve' e ‘Eu não me importo com sua mãe, eu não tenho medo dela', e
'Trigorin está aqui ...’ Isso também irá ajudá-la a interpretar a cena em que ela
o conhece pela primeira vez.

Prepare todas as improvisações que você decidiu fazer exatamente da


mesma maneira. Lembre-se que uma improvisação bem organizada pode levar
dez minutos para ser feita, ao passo que uma conversa nos ensaios sobre o
mesmo acontecimento pode levar meia hora. Tenha isso em mente quando
você está decidindo como improvisar muitos eventos. Coloque cada
improvisação planejada em uma folha de papel A4 e organize-os em ordem
cronológica.

RESUMO

Selecione as improvisações que você é capaz de fazer no tempo que


você tem para ensaiar. Prepare o conteúdo de todas as
improvisações e estruture-os como se fossem cenas de uma peça.
Coloque os planos para cada improvisação em folhas separadas de
papel A4 para que você possa encontrá-los facilmente quando você
estiver nos ensaios.

5.4 Uma lista de verificação de todo o trabalho feito neste capítulo

Uma lista de palavras que descrevem pensamentos de cada personagem


sobre si mesmos.

Uma lista de pensamentos de cada personagem sobre todos os outros


personagens.

Uma lista de todos os eventos que você pretende improvisar.

Uma série de planos para cada improvisação dispostos em ordem


cronológica.

81
6. Capítulo - Construindo relacionamentos com a sua equipe de
produção
(Tradução de Marlon Bruno e Thaís Vasconcelos {a partir da página 91} - Revisão
Humberto Issao)

Este capítulo descreve como construir todas as relações com todos os


envolvidos em fazer a produção que não seja o atores.

Tem sete passos:

6.1 Cenografia
6.2 Iluminação
6.3 Som
6.4 Música
6.5 Vídeo
6.6 Voz
6.7 Movimento

Não se intimide se a sua própria equipe de criação é menor do que o


descrito, ou se você não tem dinheiro ou tempo para construir as relações que
eu vou descrever. Há sempre maneiras de manter altos padrões na construção
de equipes, mesmo se você estiver com um orçamento apertado. O que
importa é que você aspira encontrar pessoas para todas essas funções e, no
início de sua carreira, estar preparado para aceitar compromissos em termos
de disponibilidade a fim de arranjar alguém para fazer o trabalho bem feito - ou
para fazer o trabalho em si.

Certifique-se de estabelecer uma linguagem comum com as pessoas em


sua equipe criativa antes de começar a trabalhar em uma peça específica. Isso
significa passar o tempo juntos, compartilhando imagens, sons ou músicas. A
confusão surge muitas vezes entre diretores e cenógrafos por causa de mal-
entendidos sobre a mais simples das palavras (como "vermelho") ou palavras
complexas descrevendo atmosfera (como "sombrio" ou "brilhante"). Ao ir para
exposições ou filmes juntos ou compartilhando imagens do seu pintor ou
fotógrafo favorito, você vai construir uma clara linguagem para falar sobre a
informação visual. Gaste algum tempo com seu iluminador olhando filmes com
conceitos de iluminação que apelam a ambos ou passar por reproduções de
fotógrafos que apresentam um forte uso de luz e sombra. Com o designer de
som (ou compositor) ouça músicas ou sons que interessam aos dois, e analisar
por que certas peças têm mais impacto e significado para vocês do que outras.
Estas reuniões e discussões gerarão um atalho que fará seus relacionamentos
de trabalho mais suaves e mais eficientes. Claro que, quando você está em um
ponto no início de sua carreira, você pode encontrar-se trabalhando com
designers ou compositores experientes que não terão o tempo para conversas
como esta com você. Neste caso, tente encontrá-los para um bate-papo e uma
xícara de café, e lembre-se de usar imagens ou música e não palavras para
comunicar o que você gosta ou quer.

82
Sempre que possível, compartilhe os resultados de seu trabalho
preparatório com sua equipe de criação. Se você estivar com pouco tempo, o
mais importante ingrediente para comunicar a todos são os eventos em torno
do qual as ações serão estruturadas. Num mundo ideal, as luzes, som, música,
movimento, cenografia e figurino vão todos trabalhar para afiar ou sublinhar
estes pontos de mudança. Trabalhe com o seu cenógrafo para garantir o
máximo de alteração no quadro do palco depois de um evento e discuta como
os personagens que entram nos principais eventos em cada ato devem estar
vestidos de uma forma particular ou com uma cor, de modo que os olhos sejam
sutilmente atraídos por eles. O cenógrafo Vicki Mortimer e eu decidimos mudar
o local da ação do segundo ato de 'A Gaivota' de um jardim para uma sala de
jantar, onde o almoço estava sendo servido. Queríamos maximizar a mudança
na imagem do palco no evento principal do ato: a recusa dos cavalos. Antes do
evento todos estavam sentados, o primeiro prato de sopa tinha acabado de ser
servido na mesa e as pessoas estavam começando a comer. Shamrayev
anunciou de repente a notícia sobre os cavalos. Imediatamente as pessoas
pararam de comer, colheres foram colocadas em meados de fluxo, pratos de
sopa cheias voltaram para a cozinha por funcionários, e os convidados
gradualmente se levantaram. Arkadina saiu da sala e em breve servos foram
vistos passando através de malas prontas para ela fazer as malas para voltar
para Moscou. Como resultado, as imagens visuais foram alteradas ao mesmo
tempo que o evento: a mudança era forte e garantiu que a imagem do palco
estivesse cheia de vida. A decisão também deu aos atores muitas atividades
físicas que permitam responder ao evento, como dobrar guardanapos, estojos
de transporte, deixar os quartos e assim por diante. No mesmo tempo em que
ocorreu o evento, o designer de iluminação Paule Constable sutilmente
alterava o estado da iluminação, e o sala escurecia como se uma nuvem
passasse na frente do o sol. O designer de som, Gareth Fry, acrescentou um
ronco baixo quase imperceptível para sublinhar as ações como resultado do
evento.

Não comece a trabalhar em cenografia, figurinos, iluminação, música ou


som até que você tenha estudado a peça com cuidado. Dessa maneira você
vai evitar cometer erros críticos - como acabar com uma cenografia que
trabalhe com um modelo de caixa, mas que não vão funcionar para os artistas
nem como eles trabalham nos detalhes de cada cena, ou decidir sobre um
anacronismo ousado como levar a ação de uma peça do século XIX para o
século XX sem pensar cuidadosamente nas consequências dessa decisão.

6.1 Cenografia

A cenografia tem três funções principais:

Para comunicar tempo e lugar;


Para ajudar a focalizar a atenção do público sobre a ação-chave ou narrativa;
Para apoiar os atores na transmissão de ideias e de gênero da peça.

O trabalho do diretor com o cenógrafo pode ser dividido em três fases:


antes dos ensaios até a maquete ser feita; durante os ensaios; e no teatro.

83
Esta seção cobrirá o primeiro passo. Os segundo e terceiro passos são
descritos em nos capítulos 9, 11 e 12.

O processo pelo qual um projeto evolui não segue uma narrativa linear.
Em vez disso, há várias tarefas que são realizadas simultaneamente e que,
finalmente, se fundem em um forma coerente. Lembre-se também que o
processo descrito é ideal tendo lugar ao longo de um par de meses. Se você
tem menos tempo do que isso para trabalhar com o seu desenhista, tenha
certeza de que você ainda pode cobrir muitas das tarefas enunciadas no texto
a seguir.

Em primeiro lugar, passe um tempo com o cenógrafo para explorar a


peça em detalhes sem trabalhar em soluções para cenas específicas. Por
exemplo, você pode percorrer a lista de "história passada" de fatos e
perguntas. Isto irá permitir que você se concentre em pequenos dados relativos
ao material e fornecerá material para pesquisas separadas com tarefas clara
para cada um. Você pode pesquisar as coisas que dizem respeito às biografias
dos personagens, enquanto o cenógrafo estará pesquisando as questões sobre
arquitetura ou os móveis. É particularmente importante compartilhar
informações sobre o lugar, o tempo, circunstâncias imediatas, os títulos dos
atos e eventos (incluindo os eventos "principais" de cada cena), porque o
projeto precisará servir a estas decisões de forma muito precisa. O
compartilhamento dessas informações vai jogar muitos minúsculos detalhes
que terão que ser incorporados no desenho ou no conceito cenográfico como
um todo. Por exemplo, o cômodo no quarto ato de 'A Gaivota' é frio, então será
preciso uma decisão sobre onde o aquecimento é e por que ele não está
funcionando, ou uma investigação sobre as bengalas no século XIX que irá
revelar que elas eram amplamente adotadas como acessórios de moda; esso
determinará a escolha de bengala para Sorin. Se o seu tempo for limitado,
ainda assim é importante comunicar as informação essenciais de sua
preparação e pesquisa (você deve ser capaz de fazer isso em uma intensa
sessão de três horas).

Em seus ensaios você terá que responder a perguntas dos atores tais
como: "Para onde esta porta vai?", "De onde eu vim?' e "O que eu posso ver, lá
fora, desta janela? " É muito mais fácil resolver ou até mesmo responder a
estas perguntas, quando se trabalha na criação cenográfica. Se você deixar
para responder a essas questões nos ensaios é provável que algumas
decisões não se encaixam nos mínimos detalhes no que os atores tem que
fazer e dizer na ação - se você tem um período de ensaio curto, você poderia
facilmente perder um tempo valioso resolvendo esses detalhes. Mesmo se
você estiver trabalhando em um gênero como o surrealismo, ou uma ópera do
século XVIII, os artistas terão perguntas sobre a lógica de por que eles usam
uma entrada em oposição a outra (ou de onde eles vieram, ou para onde vão),
então você precisa ter pensado isso em detalhe. É também importante que o
público compreenda a lógica de onde a peça está se passando ou eles podem
passar o tempo durante o espetáculo fazendo-se perguntas sobre o de onde as
pessoas vêm - ou se preocupando com questões maiores, como: "Onde nós
deveríamos estar?”

84
No capítulo 1, eu descrevi como você pode desenhar planos dos círculos
de lugares descritos no texto. Mostre os esboços dos locais onde ocorrem as
ações da peça para o cenógrafo. Neste ponto, lembre-se que você não está
decidindo sobre a cenografia final que o público verá; em vez disso, você está
começando a pensar em cada cena como se fosse um lugar real. Em 'A
Gaivota', dois dos atos (atos três e quatro) acontecem em salas diferentes da
mesma casa: um em um estudo com vista para o lago e outro em uma sala de
jantar. Eu e o cenógrafo passamos todas as entradas e saídas para cada
cômodo nos mínimos detalhes, bem como tudo o que foi dito sobre de onde as
pessoas estavam vindo e para onde partiam. Por exemplo, no quarto ato de 'A
Gaivota', Masha, Polina e Medvedenko estão procurando Konstantin a pedido
de Sorin. Atores e público precisam de um imagem crível de onde Sorin esta e
de onde eles pensam que Konstantin pode estar; a disposição das salas
precisa cumprir a lógica da busca de todos a procura de Konstantin. Nós
tentamos criar uma lógica de sentido de onde cada cômodo se encontrava para
os dois atos localizado-os em relação aos outros cômodos (que o público não
veria) e em relação aos arredores da casa.

No final deste processo, você terá vários mapas detalhados do local


onde ocorre a ação do peça, embora o cenógrafo provavelmente não vai tê-los
traduzidos em quaisquer decisões sobre a cenografia.

Em seguida, considere o ângulo em que o público olhará para o local ou


locais onde ocorrem as ações. Quando o cenógrafo Vicki Mortimer e eu
trabalhamos no projeto para 'A Gaivota' traçamos um plano detalhado da
relação entre o lago, a casa, o palco improvisado e o resto do estado. Nós
decidimos que a plateia assistindo a peça de Konstantin estaria sentados de
costas para a casa e estariam em direção ao palco improvisado e do lago atrás
do palco. Nós, então, traçamos uma linha sobre o plano entre o palco e a casa,
e esta linha marca a posição do arco do proscénio. Isso significava que o
público real no 'National Theatre' observava a ação como se estivessem
sentados na lago: eles podiam ver as costas de Nina e, atrás dela, os rostos
dos personagens assistindo o peça com a casa no fundo.

No entanto, nem sempre será possível traçar uma linha puro através da
qual um plano realista é estabelecido de forma a colocar o público em um lado
e a ação do outro. Teatros podem ter muitas formas diferentes e muitas vezes
você vai ter que alterar os seus planos realistas para se ajustar a área real do
palco. Do mesmo modo, nem sempre é possível resolver o desenho de uma
cena trabalhando a partir de um plano real de uma geografia circundante. Em
alguns casos, você terá que trabalhar com outra perspectiva: pode ser
necessário projetar uma solução cênica para encaixar a posição do palco onde
você está trabalhando antes de decidir sobre uma lógica para o ambiente
realista. No entanto, pense na cenografia como se fosse um lugar real (ou
lugares) o que fornecerá um ponto de partida útil para o trabalho. No entanto,
você precisará chegar a um projeto final, que devera emergir do processo com
uma ideia clara do que rodeia o local ou locais onde a ação está definido, por
isso que os atores podem habitar os quartos ou ambientes do público ver como
se fossem reais.

85
Nesta etapa do processo, pense a frente em como as personagens
utilizarão o cenário ou locações evento por evento, e como tudo naquele local
(inclusive móveis e objetos cênicos) estão dispostos. É particularmente
importante pensar sobre onde acontecerão os eventos chaves e mesmo os
principais. Lembre-se que decisões sobre o cenário e objetos cênicos são
também os primeiros passos tomados pelo diretor, seguido da disposição dos
atores para que o público possa ver o que se passa – indiretamente, você já
está começando a dirigir a peça. Cheque se a disposição dos móveis faz com
que as ações estejam bem em foco e visíveis e se são usadas de maneira
lógica pelas personagens na situação. Na minha experiência, o melhor é
instruir os atores, nos ensaios, sobre onde se posicionar etc. e a maneira de
fazer isso é estar sempre um passo a frente. Dessa forma, os atores podem
simplesmente usar seu espaço de maneira lógica sem se preocupar se suas
ações são lógicas ou visíveis. Claro, sempre haverão exceções - momentos em
que você vai ter trapacear uma posição ou uma entrada. Eu escreverei mais
sobre isso na seção sobre "desenho de cena" no capítulo 11.

O cenógrafo a partir deste momento estará lhe mostrando ideias sobre


as cenas – seja na forma de desenhos ou em modelos feitos em cartolina
branca (white card model - WCM). Há dois tipo de modelos: modelos de
cartolina branca (que é um esboço tridimensional da estrutura das decisões
sendo consideradas); e o modelo final (uma réplica precisa do design que o
público verá, com as paredes e superfícies com acabamento perfeito).
Eventualmente, o designer apresentará um modelo do cenário em uma caixa
preta que normalmente inclui ambos cenário e auditório. Em teatros maiores o
modelo final é o que vai para as oficinas e é usado como ponto de referencia
para quem vai construir e pintar o cenário. O modelo em cartolina branca é
mais fácil e barato de fazer e alterar, enquanto os modelos finais são caros e
trabalhosos. Nem sempre é possível fazer o modelo final se você está
trabalhando em uma companhia pequena. Não se preocupe com isso, o
modelo em cartolina branca consegue comunicar as informações essenciais
para um pintor ou para quem vai construí-lo, desde que acompanhados com
referências visuais bem específicas. Quando você olha para o modelo em
cartolina branca, se pergunte sobre diferentes possibilidades. É relativamente
fácil para o designer inserir e recortar seções do modelo para possibilitar-lhe
visualizar o cenário com outra porta ou uma parede diferente. Eu também acho
muito útil ter modelos em miniatura dos móveis, dessa forma eu posso ver
maneiras diferentes de arranjar as coisas e as pessoas para cada cena.

Certifique-se de que tens um modelo preciso do teatro, e se possível,


peça ao seu designer para marcar no modelo o plano do chão. O plano do
chão é um plano de como o cenário se encaixa no espaço do tablado do teatro.
'Linha de visão' descreve uma linha invisível no ambiente que marca o limite da
área que cada membro da audiência pode ver. Eu estou recentemente
trabalhando em uma nova opera e tenho tido um problema real com a linha de
visão. Ensaios começam e cenários são desenhados – de fato, seções que
ocorrem nas salas de ensaio (como é normalmente praticado por muitas
companhias de ópera). Estou trabalhando da minha maneira, cena por cena, e
finalizei definindo tudo na penúltima semana de ensaio. Então o gerente da
locação me perguntou, muito educadamente: „Você acha que é sábio colocar a

86
ação tão no fundo? – Por quê? Eu perguntei, pensando que havia sido uma
decisão tomada nos ensaios. – Porque, não será visto por metade da casa. Ele
retrucou. A palavra casa descreve a audiência. Eu chamei o designer e para
nosso horror, logo percebemos que algumas linhas de visão não foram
desenhadas no plano do chão. Fizemos muitas alterações inesperadas e
repentinas no espaço físico das cenas num estranho momento do processo. É
o tipo de situação que se quer evitar.

Um entendimento firme de algumas leis visuais que determinam como


nós olhamos para o que acontece no palco irá ajudar você no seu trabalho. Se
você está trabalhando na configuração de frente do palco, há uma diferença
entre entrar pelo lado esquerdo ou entrar pelo lado direito. Falando de maneira
crua, se uma personagem entra pelo lado direito irá parecer mais forte e larga
do que se entrar pelo lado esquerdo, e se alguém se mover entre as duas
entradas, sua escala parecerá mudar. Como os atores andam pelo palco do
lado direito para o esquerdo, eles parecerão para a audiência estar diminuindo,
de outra maneira se o ator anda da esquerda para a direito do palco parecerão
crescer um pouco, ficando um pouquinho maiores. É uma ilusão de ótica criada
porque nós lemos da esquerda para a direita. Algum conhecimento sobre as
leis visuais irão lhe possibilitar tomar decisões sobre se quer que entradas e
momentos chaves sejam fortes ou fracas.

No quarto ato de 'A Gaivota' você pode decidir se quer Nina entrando
pelo lado esquerda ou pela direita. Esta decisão é crucial para a interpretação
da cena: você pode tanto fazê-la parecer mais vulnerável desde o começo
fazendo-a entrar pelo lado esquerdo ou decidir por fazê-la estar no controle,
entrando pela direita.

O cenógrafo Vicki Mortimer e eu decidimos fazê-la entrar pela esquerda


na nossa produção. Lembre-se, também, que os atores irão experimentar a
sensação de serem diminuídos (vulneráveis) ou levemente maiores
(poderosos) dependendo do lado do palco que eles entram. Eles
experimentarão, entrando pela esquerda e se dirigindo ao centro do palco,
como se estivessem subindo uma ladeira. Entrando pela direita sentirão como
se estivesse descendo a ladeira. Novamente note como você está começando
a dirigir indiretamente por decisões que você toma já nesta etapa do processo.
Claro, se você está trabalhando com a travessia do palco ou palcos de
formatos diferentes, lembre-se que o significado disso será diferente para a
audiência em cada lado

Em seguida, comece a discutir o gênero do peça e as ideias que você


identificou, eles vão determinar como você trata o local ou locais onde ocorrem
as ações. Se, por exemplo, a gênero é surrealismo você pode decidir
posicionar o quarto onde a ação ocorre em um ângulo precário ou dar-lhe um
inclinação acentuada, ou, se for o simbolismo (como em 'A Gaivota', você pode
decidir criar a estranha sensação de mau agouro, com o ambiente
descascando e toda a desordem normalmente associada com o período e
revelando o as paredes nuas e rachadas da casa deteriorada. Se uma das
ideias da o peça é o abuso de poder (como em 'As Troianas' de Eurípides),
você pode optar por definir a ação em uma enorme industrial que vai

87
literalmente fazer os personagens ficarem como anões de forma que eles
pareçam pequenos pontos em um ambiente mecânico muito maior. Quando
você estiver trabalhando nas ideias e no gênero da peça ajudará se vocês,
cenoógrafo e você, olharem para outras referências visuais (como filmes,
exposições de arte, reproduções de pinturas ou fotografias) para identificar
exatamente o que você quer dizer quando falar sobre estas preocupações mais
cerebrais.

Vá e sente-se no auditório do teatro vazio com o cenógrafo. Fale sobre


as armadilhas e benefícios da configuração que você está trabalhando. Por
exemplo, se você estiver trabalhando em uma cena em que vai precisar manter
a ação e movimento, evite colocar móveis demais em torno das bordas que
possam propiciar aos atores se sentar por longos períodos de tempo. Lembre-
se que não há um assento perfeito para ver a ação. Vá e sente-se em
diferentes lugares. Pense sobre como fazer com que suas ideias visuais
cheguem a todos na plateia. Este não é apenas sobre a 'linha de visão', trata-
se de reconhecer que toda a plateia se sentará em uma relação ligeiramente
diferente para a apresentação e olhará para o trabalho a partir de um ângulo
ligeiramente diferente. Claro que é crucial que todo mundo veja partes das
ações chaves tanto quanto os principais eventos. Para o resto do tempo, é
importante que todo mundo olha para as coisas que os levará para o mundo e
as ideias da peça. Encontre uma maneira de criar imagens interessantes para
todos, especialmente as pessoas sentadas nos diferentes extremos da plateia.
Em 'Ifigênia em Aulis' o cenógrafo Hildegard Bechtler e eu decidimos estender
o a cenografia para fora do palco tanto para a esquerda quanto para a direita
por alguns de metros. Em cada lado, o mundo do edifício onde a ação ocorreu
continuou, mas era visível apenas para o público imediatamente a frente.
Temos a certeza de que havia algo interessante visualmente para cada seção
do público. Por exemplo, o público sentado a esquerda podia ver um espelho
antigo longo pendurado na parede e um sofá cor de ferrugem puído no palco
ao fundo da direita. Este não era visível para o público no palco direita. No
entanto, o público da direita viu detalhes igualmente interessantes no palco
esquerda: a porta e o pequeno lobby com vista para uma colina. Considere a
acústica do teatro também. Se você está em um teatro pequeno, então será
possível para todos ouvir tudo o que for dito, mesmo que seja um sussurro. No
entanto, se você estão na 'Lyttelton', uma vez que você se mova mais do que
dois metros para trás você literalmente terá que gritar para ser ouvido pela
casa cheia. O cenógrafo pode ajudar com problemas como este. Por exemplo,
você pode decidir usar apenas o primeiro metro e meio de um grande palco (o
proscênio) para todas as ações-chaves, em seguida, usar o resto do palco para
criar uma impressão de uma paisagem distante ou de um prédio desabado.
Alternativamente, você poderia colocar um teto em uma sala para ajudar a
acústica.

Até agora o cenógrafo vai trabalhar no sentido de finalizar um modelo.


Normalmente, você vai ver este modelo em diferentes estágios do seu
desenvolvimento, e cada vez que você vê-lo, você terá que confirmar as
escolhas arquitetônicas que você já fez, decidindo, aprimorando pequenos
detalhes e debatendo o tratamento das superfícies ou paredes. Não é comum

88
mudar completamente de ideia neste ponto, embora existam casos em que
isso acontece.

Este é também o momento para considerar como diferentes opções de


iluminação poderão enriquecer a cenografia. Pense sobre o local de onde a luz
natural virá e se é necessário adicionar janelas, portas ou outras aberturas
através das quais a luz pode entrar. Esta luz vai determinar qual é a hora do
dia. Como alternativa, considere o ângulo e a altura pelos quais você quer que
a luz entre no cômodo e, portanto, o tamanho do espaço na coxia necessário
para que o iluminador possa instalar os refletores. Pense sobre como e onde
colocar luzes práticas para as cenas que acontecem à noite. Luzes práticas
são as luzes da cenografia (como lustres ou lâmpadas-padrão ou luzes de
mesa). Convide o iluminador para uma breve reunião para saber seu retorno
sobre as direções que vocês decidirem. Não vale a pena construir um cenário
que não seja iluminado de forma eficaz. Muitas vezes, a entrada do iluminador
ocorre tarde no processo quando as mudanças não podem mais serem feitas.
Isso gera problemas quando você vai para o teatro. Por exemplo, o iluminador
pode não conseguir colocar um refletor atrás de uma janela porque o cenário
está muito próximo da parede do teatro, ou você construiu um teto que não tem
nenhuma abertura pela qual a luz possa entrar.

Quando terminar a cenografia você pode começar a trabalhar nos


figurinos. Você já terá falado sobre figurinos quando as biografias das
personagens foram discutidas nas primeiras conversas. Agora você vai
trabalhar nos detalhes sobre cada personagem, pensando justamente sobre o
que será vestido em cada cena, coisas como classe social, biografia e trabalho
podem dizer muito sobre o que vestir. Ao mesmo tempo, você terá que pensar
sobre a relação entre figurino e cenário, e como você equilibra cor, tonalidade e
textura das roupas com esses elementos da cenografia. No final deste
processo, você poderá receber os croquis dos figurinos individuais ou apenas
referências de revistas com amostras de material - dependendo de quanto
tempo o figurinista tem e como ele gosta de trabalhar.

Eu sempre tento atrasar decisões sobre figurino até que eu tenha


passado pelo menos uma semana na sala de ensaio com os atores. Isso
ocorre porque o trabalho dos atores nas biografias dos personagens
mergulham em pequenos detalhes que nem o diretor nem o figurinista
consideraram anteriormente na sua preparação; esses detalhes podem ter um
impacto sobre o que os atores devem vestir. O atraso das decisões sobre
figurino também permite que o figurinista observe o corpo de cada ator com
cuidado para considerar a melhor maneira de vesti-los, tanto em termos de
corte como em cores. Compreensivelmente, os atores também podem ficar
ansiosos sobre diferentes partes de seus corpos que o figurinista acaba
descobrindo quando vai tirar medidas ou na conversa durante o intervalo pro
café. Um ator poderia, por exemplo, ser muito autoconfiante sobre suas pernas,
e outro muito consciente sobre sua barriga. O projeto do figurino precisa ser
sensível a estas preocupações. Se tudo é decidido antes de começarem os
ensaios é impossível fazer as mudanças necessárias para vestimentas em
respostas a estas questões.

89
As próximas etapas do processo de criação ocorrem durante o período
de ensaios.

RESUMO

Gaste um tempo com o iluminador explorando os detalhes da peça ao


invés de trabalhar em soluções para cenas específicas.
Como ponto de partida, pense em cada lugar na qual a ação da peça se
passa como se fosse um lugar real.
Pense em como os personagens vão usar o local ou locais,
acontecimento por acontecimento, e considere como tudo naquele
lugar - móveis e pontos de luz - vão ser arrumados.
Verifique se você tem entradas posicionadas, ou móveis, de tal maneira
que os acontecimentos principais das ações sejam bem focados e
visíveis se forem utilizados de forma lógica pelos personagens da
situação.
Dê carta branca ao cenógrafo.
Tenha uma boa compreensão das linhas de visão. Deixe as regras
básicas de visualidade guiarem suas escolhas.
Discuta o gênero e as ideias da peça para decidir como tratar o local ou
locais onde a ação acontece.
Sente com seu cenógrafo no teatro vazio para discutir sobre os prós e
contras da configuração que vocês estão trabalhando.
Lembre-se de que não há um assento perfeito para que todos assistam o
espetáculo.
Observe e fale a respeito da maquete em diversos pontos da sua
concepção.
Considere como as escolhas da iluminação podem melhorar o projeto da
cenografia e envolva o iluminador no processo antes que o projeto
seja concluído.
Discuta o que cada personagem vai vestir em cada cena em relação às
biografias individuais e a estética geral da cenografia.

90
6.2 Iluminação2

A iluminação tem quatro funções principais.

Auxiliar a cenografia a comunicar o tempo e o lugar. Por exemplo, um


feixe de luz dourado entrando pela janela sugere amanhecer, enquanto uma
luz amarelada vindo de um ponto alto através de uma janela indica a luz da rua
de uma cidade.
Assegurar que a ação seja visível pela pateia. Não haveria problemas de
visualização se todas as peças utilizassem a luz clara como a do dia. No
entanto, muitas peças em ambientes na penumbra representam tardes
chuvosas e cinzentas. Esta ação seria invisível se as cenas fossem iluminadas
realisticamente. Por isso, a iluminação também faz correções utilizando truques
como jogar uma luz extra no rosto ou no corpo dos atores.
Sublinhar e dar forma ao que vemos no palco. Se, por exemplo, a ação
principal cruza o palco de baixo para cima, da esquerda para a direita durante a
cena, as luzes podem se ajustar para que o público seja encorajado a seguir a
ação com o olhar. Esse ajuste é mais funcional se acontece dentro da lógica do
horário do dia em que a ação se passa.
Alterar a atmosfera ou o clima da ação se for abstrata. Por exemplo,
uma cozinha pode ser iluminada para parecer segura e ensolarada ou perigosa
e sombria.

A primeira função de iluminação no teatro - informar hora e local - pode


ser preparada antes de começar os ensaios. As outras três funções só podem
ser desenvolvidas no decorrer das ações e dos movimentos criados pelos
atores durante os ensaios. Pode ser útil conversar com seu iluminador sobre
essas quatro principais funções e qual papel você gostaria que a iluminação
tivesse na sua produção. O ideal é que o seu iluminador inclua as quatro
funções, mas se você estiver sendo pressionado pelo tempo, tente assegurar
que ao menos o tempo e o local estão claros e que a ação seja visível para o
público. A terceira e a quarta funções requerem muito cuidado, trabalho e
tempo, e quando você está começando você pode não estar em uma posição
favorável para alcançar essas funções mais sutis.

Faça com que seu iluminador presencie todas as suas decisões


relacionadas ao tempo, lugar e circunstâncias imediatas, uma vez que isso
determina a iluminação das cenas. Então converse sobre os acontecimentos e
discuta como a iluminação pode contribuir sutilmente para as mudanças na
imagem da cena durante ou depois de cada acontecimento. Compartilhe
decisões sobre as ideias de gênero da peça com seu iluminador. Finalmente,
certifique-se de que o iluminador esteja em contato desde o início do processo
com o cenógrafo. Em reuniões entre o diretor, o cenógrafo e o iluminador
discuta sobre a maneira que o cenário vai informar a hora do dia e como a
iluminação vai dar suporte, ou se serão utilizadas luzes práticas para dar foco
na ação.

2
Para a iluminação sugere-se a leitura da tese: SIMÕES, CIbele Forjaz - À luz da linguagem. A iluminação
cênica de instrumento da visibilidade à Scriptura do visível

91
RESUMO

Comece a pensar sobre como usar as quatro funções dos projetos de


iluminação.
Compartilhe todas as suas decisões sobre tempo, lugar, circunstâncias
imediatas, eventos, gênero e as ideias da peça com o seu iluminador.
Verifique se o iluminador está em contato constante com o cenógrafo.

6.3 Som3

O som tem quatro funções principais.

Descreve o tempo e o lugar - tal qual a cenografia e a iluminação. Por


exemplo, você poderia usar o som de carros passando para indicar a rua fora
de um quarto ou uma combinação de alarmes de carro ecoando e sons de
motocicletas em alta velocidade para sugerir a vida noturna de uma cidade.
Estabelece uma atmosfera ou um clima para cada cena quando tocada
antes da cena ou entre cenas.
Sonoriza uma mudança de atmosfera durante uma ação. O que significa
usar uma sonoridade abstrata.
Disfarça problemas técnicos. Se as mudanças de cena demorarem
muito e você percebe o público sentado no escuro girando os polegares, o som
dá a impressão de que o tempo passa mais rápido do que ele realmente passa.

Utilizar a sonoplastia para comunicar tempo e lugar é o mais essencial a


ser feito. No entanto, se você for capaz de aproveitar as outras três funções da
sonoplastia, sua produção será considerada mais afiada. O terceiro uso -
sonorizar mudanças de atmosfera durante a ação na peça - é a mais complexa
e, na minha experiência, é a que melhor se encaixa com o processo descrito
nesse livro.

O uso de sons abstratos é um procedimento delicado e requer um


posicionamento cuidadoso de deixas, considerando as escolhas de efeitos
sonoros e um nivelamento sutil. A melhor maneira de aguçar a percepção do
som abstrato é assistir filmes e atentar para a precisão em que o som é
utilizado. Você ficará surpreso com a forma como muitos elementos diferentes
compõem o ambiente sonoro de forma geral. Filmes utilizam o som abstrato
para evocar diferentes atmosferas ou aguçar mudanças que acontecem na
ação - especialmente mudanças psicológicas. Por exemplo, o diretor de cinema
David Lynch utiliza o som para criar uma grande variedade de ambientes, de
suspense e medo à ironia e náuseas. O volume do som varia entre o subliminar
para o muito alto e é quase constante ao longo de seus filmes.

O som também é usado no cinema para criar uma impressão subjetiva


de como seria se estivéssemos dentro da cabeça de um personagem. Por

3
O curso de Direção da UEA ofertado sugere a utilização do seguinte livro: CHION, Michel - A audiovisão
som e imagem no cinema

92
exemplo, o diretor russo Elem Klimov usava sons em seu filme Come and See
para proporcionar a sensação de estar dentro da cabeça de alguém que acaba
de ter seus tímpanos estourados. Outro cineasta russo, Andrei Tarkovsky,
usava padrões sonoros complexos para comunicar como as memórias se
alojam no cérebro.

O uso de sons como estes no teatro contribui para dar suporte ao


trabalho que os atores estão fazendo e aguçar a maneira como você transmite
a sua análise ou interpretação do material. Você pode reproduzir o som em um
nível muito baixo para que ele funcione no subconsciente do público ou você
pode colocá-lo mais alto para que eles ouçam conscientemente. Por exemplo,
você pode usar o som abstrato para intensificar um acontecimento. Você pode
escolher para dar ênfase antes ou durante a ação, ou na transição de uma
cena após o acontecimento. Ou você pode ter diferentes qualidades de som
para cada uma das três etapas. Alternativamente, você pode usar o som para
aguçar a atmosfera de um lugar. Um lugar como uma cozinha ou um escritório
podem parecer seguros, mas se você toca um acorde de contrabaixo
ameaçador, o lugar se transforma em algo assustador. Lembre-se que o som
deve dar suporte ao que os atores estão fazendo; ele não deve substituir ou
minar a ação. Lembre-se também de que esse tipo de som afeta tanto o
público como os atores - e esse efeito pode ser físico, fazendo com que as
pessoas sintam-se inseguras e até desconfortáveis.

Sons abstratos em baixa frequência podem ajudar os atores a se


envolverem no universo da peça. No entanto, lembre-se de ser cuidadoso ao
utilizar sons desse tipo. O público pode não estar acostumado com o tipo de
sons que você usa. Música ou som adicionados as cenas de uma forma
pesada podem arruinar completamente com o que os atores estão fazendo, e
embrutecer a cena. Então utilize esta ferramenta com cuidado e sutileza. Ajuste
imediatamente o som se interferir no que o ator está fazendo ou se afetar a
apreciação de uma cena pelo público - especialmente a capacidade de ouvir o
que está sendo dito.

Lembre-se também que você é muito pouco provável que o teatro seja
completamente silencioso. Sente-se na plateia com o sonoplasta, feche os
olhos e ouça os ruídos que o espaço faz.

Pergunte-se o que você quer adicionar ou retirar. Alguns teatros são


muito barulhentos por causa dos sistemas de ar condicionado, o zumbido dos
refletores ou os ruídos de fora que invadem o interior da sala de espetáculos.
Considere o uso de som abstrato de frequências graves para eliminar esses
ruídos de interferência. Não há nada pior do que ficar sentado olhando para um
cenário de um campo na zona rural e ouvir um estrondo do metrô sob a plateia.
Mesmo que você tenha que substituir esses ruídos com sons mais altos, pelo
menos, estes serão os sons que você escolheu para suprir o universo do
espetáculo.

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RESUMO

Decida qual das quatro funções gerais você quer que a sonoplastia
cumpra em sua produção.
Estude como o cinema usa sons abstratos para criar atmosferas ou
sublinhar acontecimentos.
Use o som para dar suporte ao que o ator faz ao invés de minar a ação.
Ouça os sons do teatro vazio e considere usar sons abstratos para
eliminar ruídos que não são do universo da peça.

6.4 Música

A música tem seis funções principais:

Descrever tempo e lugar


Estabelecer a atmosfera ou clima da cena
Ressaltar mudanças durante a ação
Dar suporte à cenografia, como números de dança
"Cobrir" as transições de cena
Dar senso de coerência à produção, a partir do uso criterioso do mesmo
material ou similar. Isso faz com que muitas cenas diferentes ganhem unidade
quando estão juntas, ou contribui para prolongar as ideias ou temas
subjacentes à ação. Essa é a função mais importa que a música pode
desempenhar em uma produção.

Você vai trabalhar tanto com músicas criadas especificamente para o


seu espetáculo quanto utilizar material gravado anteriormente. Se você
trabalhar com um compositor, lembre-se que isso vai levar tempo para que ele
possa compor o que você quiser. Você pode ter que passar por vários esboços
de uma ideia musical antes de chegar a uma que vocês dois gostem. Dê tempo
para este processo e seja paciente. Lembre-se também de que os
compositores podem pensar em música como algo que tem a sua própria
estrutura, como um prédio ou uma pintura. Diferentes compositores vão se
sentir de forma diferente sobre ter suas músicas 'cortadas sob medida' para
atender a uma produção, assim como um pintor pode ter dúvidas sobre expor,
por exemplo, o canto direito da sua última obra. Ajudará se você colocar para
fora as regras desse comprometimento com antecedência para que o
compositor invista no processo de repensar o seu próprio trabalho à medida
que avancem os ensaios. O processo quase inevitável de cortes radicais ou
repentinas edições, então, será visto como um desafio criativo.

Esteja ciente, também, que o instinto de um compositor é


frequentemente o de apontar para uma música que é rica, surpreendente e
prende toda a atenção. Muitas cenas em teatros não têm o espaço para esta
intensidade e, às vezes a melhor música para uma cena seja incrivelmente
simples. Talvez seria desinteressante ou banal fora do seu contexto, mas serve
como uma função da cena. Isso nem sempre é o caso, mas vale a pena falar
sobre isso antes de começar a trabalhar.

94
Lembre-se, de que é fácil se intimidar pelas habilidades especiais ou a
linguagem que os músicos têm. Fique tranquilo, no entanto, a maioria dos
compositores estão acostumado a interpretar as descrições não-técnicas de
música, por isso seja corajoso sobre como você descreve o que deseja. Dito
isto, uma boa ideia é se familiarizar com algumas das noções básicas, tais
como as ideias de tons maiores e menores, ou a diferença entre uma escala e
um arpejo. Isso pode fazer a discussão sobre música com os músicos mais
eficientes.

Se você usar a música gravada, esteja ciente de que certas peças são
bem conhecidas como as de Samuel Barber Adagio, Canon de Pachelbel ou as
Variações Goldberg de JS Bach e carregam com elas informações sobre outros
contextos, tais como filmes ou publicidade, que podem confundir o público ou
ameaçar sua produção. Você pode considerar, é claro, brincar com estes
valores importados para fins irônicos. No entanto, se você estiver usando
apenas música 'achadas' como estas, fique de olho no significado geral delas.
Você pode encontrar boas músicas que funcionam bem para cenas individuais
em ensaio, mas quando você coloca a peça toda algo parece estar faltando.
Talvez as partes da música que você esteja usando sejam muito ecléticas, ou
então está abusando de uma que é pessoalmente sua favorita. A vantagem de
ter um compositor ou diretor musical a bordo é que eles podem pensar sobre
esse tipo de preocupação estrutural.

Vale a pena ser cauteloso sobre o uso da música para cobrir mudanças
de cena. Mudanças de cena frequentemente demoram mais tempo do que o
previsto, e o diretor ou compositor é por vezes forçado no último minuto a
acrescentar mais música ou som para preencher a lacuna. Esta música pode
ter um efeito negativo sobre as cenas que se seguem - por exemplo, a criação
de uma atmosfera ou clima que você não tinha a intenção. Tente prever
problemas como este e planeje uma solução sonora com antecedência.
Finalmente, certifique-se de requerer os direitos para reproduzir a música que
está sob direitos autorais no início do processo, para o caso de você descobrir
que ela não é gratuita tarde demais para encontrar uma boa substituta.

Em casas alugadas ou o em teatros comerciais, música composta


geralmente é tocada ao vivo durante a performance. Se você estiver
trabalhando neste contexto, decida se você quer que a banda fique visível para
o público ou não. O compositor mesmo, os músicos ou um diretor musical vai
assumir o comando deste processo. Se você quiser fazer música ao vivo no
palco, lembre-se que a maioria dos instrumentos são bastante altos. Você pode
achar que um pequeno grupo pode facilmente abafar o texto falado, e que seus
músicos têm de tocar muito calmamente quase o tempo todo. Esteja avisado
que uma banda tocando calmamente soa completamente diferente de uma
gravação de uma banda tocando alto, mas com o som baixo. Isto pode não ser
o som que você deseja. Lembre-se também de que os músicos são caros, por
isso é improvável que você seja capaz de trabalhar com eles muito antes do
ensaio técnico - a menos que você já tenha orçado isto. Se você precisar de
tempo extra com músicos certifique-se de marcá-lo cedo, com o produtor.

95
Idealmente, o seu compositor ou diretor musical vai trabalhar de mãos
dadas com o seu sonoplasta. O som e a música gerada por ambos irão fazer
uma trilha sonora firme. Certifique-se de que isso aconteça, incentivando
reuniões entre a direção, o compositor ou o diretor musical e o sonoplasta.
Juntos, você pode passar por todos os acontecimentos e descobrir como o som
ou a música podem apoiar melhor as mudanças.

Lembre-se, no entanto, de que a música é uma forma de arte em si, e


não costuma precisar de uma peça para dar-lhe significado. Claro, cenografia e
sonoplastia também são formas de arte, mas, ao contrário da maioria dos
cenógrafos, quase todos os compositores rotineiramente fazem música que
estão por conta própria como uma obra em si. Dependendo de quão eles são
experientes, ter um papel subserviente com as regras do drama é uma
mudança de paradigma. Você precisa estar ciente disto se você selecionar um
compositor que trabalha principalmente no campo da música, ao invés do
teatro.

RESUMO

Decida qual das seis funções gerais que você quer que a música
desempenhe em sua produção.
Decida se você quer músicas compostas para o espetáculo ou pretende
usar músicas pré-gravadas já existentes.
Dê tempo para o compositor elaborar a música que você quer.
Antes de começar a trabalhar com um compositor, discuta como quer que
a música evolua junto com o processo de ensaio e a maneira que
você deseja que ela complemente as ações/palavras da peça.
Seja corajoso quando descrever o que você deseja do seu compositor.
Familiarize-se com algumas das noções básicas da teoria musical.
Evite o uso de músicas gravadas que levem a outras associações não
destinadas a sua produção.
Seja cauteloso sobre como inserir de última hora músicas para cobrir as
mudanças de cena.
Se você estiver trabalhando em um espaço alugado ou em um teatro
comercial, decida se você quer que os músicos fiquem visíveis ao
público ou não.
Certifique-se de que o compositor ou diretor musical trabalhe em parceria
com o sonoplasta para criar uma paisagem sonora complementar.
Incentive reuniões entre diretor musical ou compositor e o sonoplasta
desde o início.

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6.5 Vídeo

O uso de vídeo ainda está engatinhando no teatro comercial - mesmo


que tenha sido usado extensivamente e primorosamente por companhias de
vanguarda, tais como The Wooster Group e a Hesitate and Demonstrate desde
os anos 1980. O campo é, portanto, amplo e é um excitante meio a ser
explorado. Existem tantas formas de integrar vídeo em teatro como há
espetáculos que o utilizam, mas, a grosso modo, ele tem duas funções amplas.

Dar suporte à cenografia em comunicação com o universo e as ideias da peça.


Por exemplo, usar uma filmagem de nuvens no céu se movimentando através
de um cliclorama branco.
Atuar como um participante ao vivo no desempenho, com quase estatuto de
igualdade de um ator. Por exemplo, imagens de vídeo de um pessoa - gravada
ou ao vivo - pode literalmente substituir um dos atores. Alternativamente, um
ator pode 'realizar' a parte superior do corpo de um personagem de filme, essa
pré-gravação é retransmitida em um tela enquanto um ator mostra o que a
parte inferior do corpo está fazendo, como no recente trabalho do Wooster
Group: 'Phèdre'.

Eu usei vídeo corretamente pela primeira vez em 2007 para dirigir uma
adaptação do romance de Virginia Woolf 'The Waves'. Havia uma grande tela
em que o público assistia partes de um filme. As imagens do filme foram
criados ao vivo embaixo da tela por atores usando luzes, adereços, figurinos e
som. Era como olhar para a sessão de fotos em um estúdio de cinema e a
edição final em simultâneo. O processo me ensinou duras lições sobre o uso
do vídeo.

Quando eu pensava sobre o uso do vídeo eu era bastante ingênua: Eu


pensei que eu poderia simplesmente ligar a minha câmera caseira em algum
soquete e gerar imagens ao vivo em uma tela. Eu não fazia ideia da
complexidade técnica do processo ou da sutileza que poderia ser alcançada
com imagens ao vivo usando diferentes configurações da câmera (em vez de
meu conhecido botão 'auto') e um servidor de mídia. Se você quiser usar o
vídeo para gerar imagens ao vivo de uma forma sustentada ou complexa, você
pode ter que comprar ou contratar câmeras adequadas, um servidor de mídia,
um projetor e uma tela de alta qualidade. Você também vai precisar contratar
alguém para operar a edição de maneira fácil e ajudar os atores com o uso das
câmeras e da iluminação.

A princípio, quando pensei sobre o uso do vídeo eu era um pouco


ingênua: pensei que eu poderia simplesmente ligar a minha câmera de vídeo
de casa em alguma tomada e gerar imagens ao vivo em uma tela. Eu não tinha
ideia da complexidade técnica do processo ou da sutileza que era possível criar
com imagens ao vivo usando diferentes configurações da câmera (em vez de
meu amigável botão "auto") e um servidor de mídia. Se você quiser usar o
vídeo para gerar imagens ao vivo de uma forma prolongada ou complexa, você
pode ter que comprar ou alugar câmeras adequadas, um servidor de mídia, um
projetor e uma tela de alta qualidade. Você também vai precisar contratar

97
alguém para operar a ilha de edição e ajudar os atores com o uso de câmeras
e iluminação.

Um servidor de mídia pode ser utilizado com imagens ao vivo ou pré-


gravadas: ele processa as imagens, as organiza ou trata com filtros especiais
(como sépia ou preto e branco, ou uma dessaturação suave de todas as
cores). Mais importante, você vai ter que trabalhar em uma sala de ensaio com
uma instalação adequada para blackout, alguma iluminação de teatro, e com
um lugar para pendurar o projetor e a tela.

A utilização de um sistema de servidor de mídia também permite a


utilização de várias superfícies de projeção sem a necessidade de vários
projetores. Com um projetor adequadamente poderoso e a lente certa, é
possível cobrir uma grande área do palco com projeção e isolar áreas
específicas com precisão. Quando criamos 'Waves', fizemos mais de cem
tomadas diferentes. Cada tomada, fosse ela um close-up de rosto, ou gotas de
sangue pingando em uma tigela ou uma folha ondulante em um varal, teve que
ser iluminada separadamente e as definições da câmara tiveram de ser
ajustadas entre as tomadas. As tomada em movimento e em velocidade eram
muito complexas e exigiam que os atores aprendessem uma grande
quantidade de novas informações técnicas e praticassem novas habilidades.

Esteja preparado para as coisas acontecerem muito lentamente, se você


decidir trabalhar com esse tipo de recurso. Eu sempre ficava impressionada
com o tempo que era necessário para gerar uma imagem e às vezes, ainda,
levar duas horas para conseguir a tomada certa. Enquanto você trabalha,
certifique-se de quem alguém esteja marcando no chão a posição entre a
câmera, o objeto que será filmado e as posições dos refletores de luz para
cada tomada. Com frequência, nós fazíamos excelentes tomadas e
descobríamos que não poderíamos repeti-las tão facilmente, porque não
marcamos as posições no chão.

Esteja preparado para a tensão entre o uso de luzes para criar as


imagens que serão projetadas e o uso de luzes para a iluminação da ação
teatral. Em ensaios foram utilizadas algumas mesas de luz portáteis para
iluminar as tomadas. Quando chegamos ao teatro foi muito difícil para o
designer de iluminação adicionar quaisquer outras luzes para iluminar a ação
teatral abaixo da tela sem que interferisse com a iluminação de algumas das
cenas do filme. Pense exatamente como você vai usar as luzes no projeto e, se
possível, assegure-se de que o iluminador esteja presente durante todo o
período de ensaio. Se você está criando imagens ao vivo ou não, é importante
que o iluminador e o cinegrafista trabalhem juntos, ambos utilizam uma mesma
mídia: a luz.

O posicionamento das telas de projeção (ou o design de superfícies de


projeção) também é importante para fazer dar certo e certificar-se de que o
cinegrafista caminhe lado a lado com o cenógrafo sobre este assunto.
Finalmente, vale a pena considerar alternativas para projetar sobre uma grande
tela branca na parte de trás do palco, o domínio tradicional do uso de vídeo no
teatro. Uma tela em branco pode ser uma distração para o público quando não

98
está sendo usada para projetar imagens. Embora a tela específica lhe dê uma
imagem muito precisa porque esse tipo de tela é projetada tanto para transmitir
quanto para refletir a luz, dependendo se a projeção é atrás ou na frente da
tela, lembre-se de que você pode conseguir resultados dinâmicos e
interessantes usando superfícies de projeção não-tradicionais, como paredes,
ou diferentes telas coloridas especializadas, como a tela preta que usamos em
'Waves'.

RESUMO

Decida se você quer usar o vídeo como paisagem ou como participante


direto na ação.
Certifique-se de que você tenha o equipamento adequado e elabore um
orçamento realista.
Certifique-se de que você tenha facilidade de blackout na sala de ensaio,
equipamentos de iluminação adequados e um algum lugar para
pendurar a tela e os projetores. Discuta sobre a diferença entre a
iluminação das tomadas e a iluminação da ação teatral com o seu
iluminador e seu cinegrafista antes de iniciar o trabalho.
Incentive o designer de vídeo e o cenógrafo a trabalharem lado a lado.
Considere o uso de diferentes superfícies de projeção, em vez de a tela
branca normal.

6.6 Voz

O trabalho de voz possui duas funções principais.

Garantir que tudo o que os atores dizem seja ouvido claramente pelo público;
mesmo se, como eu, você esteja interessado tanto em comportamento como
na linguagem, audibilidade é essencial.
Remover qualquer prova de esforço físico no processo pelo qual as palavras
são amplificadas.

Há, naturalmente, muitos outros usos sutis do trabalho de voz, mas para
mim essas são as duas funções principais. No entanto, é importante
acrescentar que o trabalho vocal não é uma área que sou particularmente
experiente, e meu próprio trabalho, por vezes, sofre com o resultado -
especialmente em termos de audibilidade do ator. Problemas com a
audibilidade do trabalho que eu faço tendem a surgir por causa do nível de
imersão na situação que eu peço dos atores. Essa imersão leva a uma redução
de todas as formas de expressão teatral convencional, tanto físicas como

99
vocais. Este não é um problema quando o espetáculo está ocorrendo em um
local pequeno, mas pode ser um problema em um teatro de cerca de 500
lugares ou mais. Se a voz é elevada para um nível em que qualquer um pode
ouvi-la, então o som feito pelos atores pode se tornar bastante distorcido ou
gritado, por mais que a voz seja cuidadosamente preparada. Mais importante,
este processo de amplificação pode dissolver alguns detalhes psicológicos e de
sutileza que só podem ser expresso em registros vocais mais calmos ou mais
suaves. Eu, muitas vezes, luto com maneiras de obter o equilíbrio entre o
detalhe vocal e o volume certo, e gostaria de pedir que você tenha isso em
mente quando ler o que segue.

Existem muitas abordagens diferentes para o trabalho de voz. É


importante que você encontre uma que seja filosoficamente simpática a seu
processo e que você trabalhe com pessoas cujos métodos podem se encaixar
ao seu. Por exemplo, se você trabalha com intenções, certifique-se de que a
pessoa de voz utilize esta terminologia quando se trabalha com os atores. Se
eles estão trabalhando em um discurso com o ator fora da sala de ensaio
principal, dê informações sobre as intenções do discurso para o profissional de
voz, bem como a situação em que se fala, incluindo o tempo e lugar. Muitas
vezes um ator retorna de uma sessão de voz com maior consciência da sua
própria voz, o que significa que quando eles começam a trabalhar na cena
abandonam tudo que foi pedido para que pensassem. Eles falam as palavras
muito claramente e em voz alta, mas você não acredita no que eles estão
fazendo na situação. Juntamente com o profissional de voz, você precisa
encontrar um equilíbrio entre a situação e a audibilidade, caracterização e
clareza vocal. E lembre-se que a falta de clareza vocal pode estar ligada a
clareza no pensamento, que é de responsabilidade do diretor, e nem sempre é
o resultado de como os atores estão usando suas vozes.

Certifique-se de integrar o trabalho de voz em seu processo de ensaio


desde o início, especialmente se você estiver trabalhando em um grande teatro
ou em um espaço amplo. Em grandes teatros subsidiados ou companhias,
especialistas em voz muitas vezes são trazidos para o processo de ensaio
tarde demais para ser totalmente úteis. Por exemplo, especialistas em voz às
vezes são trazidos durante os ensaios abertos por conta de queixas do público
sobre a audibilidade. Como alternativa, eles se juntam ao processo porque um
ator individualmente está com um problema de fala ou sotaque. A pessoa de
voz pode ter algumas sessões rápidas com o grupo ou individualmente e, em
seguida, sai. Isto pode ser contraproducente. Alguns atores respondem
facilmente a essa nova adesão, outros se sentem muito prejudicados. Evite
isso, deixe a pessoa de voz fazer sessões vocais regulares para desenvolver
os músculos dos atores conforme o tamanho do teatro onde irão se apresentar.
Se você estiver trabalhando em espaços de dimensões pequenas ou médias,
onde a amplificação não é um pré-requisito, você pode ser mais flexível sobre
se você vai fazer um trabalho de voz ou não. No entanto, os atores sempre se
beneficiarão, em termos de clareza e de vigor, se os seus músculos vocais
forem regularmente exercitados.

Dito isso, esteja preparado para os atores terem fortes reações


negativas ao trabalho de voz. Isso é por causa de experiências durante a sua

100
formação. Às vezes, eles tiveram que lidar com críticas sobre as suas vozes e
eles encontram, em qualquer trabalho de voz, uma dificuldade de embarcar -
mesmo que eles não estejam mais num contexto de formação. Outros atores
tiveram experiências negativas na sua vida profissional e eles também podem
reagir fortemente contra o trabalho de voz. Por isso, ajuda se você introduzir a
pessoa da voz e sua função com muito cuidado e claramente desde o início.

O corpo e a voz estão intimamente ligados. Se há tensão no corpo,


especialmente no pescoço e ombros, a voz será afetada. A voz do ator vai soar
tensa e esganiçada, como se o som fosse um objeto grande sendo forçado em
um pequeno funil. Se este for o caso, você ficará tenso ao assistir o ator e o
personagem que o ator está interpretando não será crível. Então, sempre que
possível, trabalhe movimento e voz juntos. Idealmente, você vai ter uma
pessoa de voz e uma pessoa de movimento, e eles vão trabalhar em harmonia
com os objetivos compartilhados. A pessoa de movimento vai aquecer o grupo
fisicamente e a pessoa de voz vai assumir os exercícios vocais.

Se você não têm recursos para empregar uma pessoa de voz, você
pode dar tempo aos atores para trabalharem em suas próprias vozes
diariamente ou em intervalos regulares no processo - por exemplo, uma vez a
cada dois ou três dias. A maioria dos atores terá exercícios vocais que os
ajudam e, dado o espaço, será prontamente abraçada a oportunidade de se
aquecer. Você não precisa dedicar muito tempo para isso - apenas 15 minutos
uma vez por dia será suficiente se você está pressionado pelo tempo.
Movimentos também podem ser integrados no aquecimento, tal como descritos
abaixo.

RESUMO

Encontre um especialista em voz cujos métodos de trabalho


possivelmente se encaixem com o seu processo. Introduza o trabalho
de voz no processo desde o início e não no último minuto ou durante
as suas primeiras apresentações.
Se você não pode pagar uma pessoa de voz, dê tempo aos atores para
aquecerem suas vozes regularmente durante todo o período de
ensaio.
Esteja preparado para reações negativas ao trabalho de voz e contorne
isso introduzindo a pessoa de voz e sua função com cuidado e de
forma clara.
Trabalhe a voz e o movimento juntos com sessões seguidas uma da
outro. Se você não puder pagar especialistas em voz e movimento,
simplesmente dê aos atores tempo para fazer cada passo por conta
própria.

101
6.7 Movimento

O trabalho de movimento possui três funções principais.

Aquecer os atores para que eles possam se preparar fisicamente para o


início do dia do ensaio ou chamada. Este aquecimento pode durar de 15
minutos a uma hora - dependendo de quanto tempo de ensaio você tem. Os
aquecimentos são úteis em todas as fases do processo de ensaio.
Preparar o corpo dos atores para as demandas específicas da peça que
você está dirigindo. Por exemplo, em 'Ifigênia em Aulis', de Eurípides, o coro
ficava em pé por duas horas e meia. Isso colocava pressão em suas costas e
pernas. O diretor de movimento, Struan Leslie, elaborou uma série de
exercícios diários para o período de ensaio que os ajudou a construir a sua
resistência física. Isso ajudou a companhia a evitar lesões e deu confiança aos
atores para fazerem o que lhes era solicitado durante o processo.
Construir as habilidades físicas ou de dança usadas diretamente na
ação. Na peça 'Dream Play', os atores praticavam balé e valsa diariamente
com a coreógrafa Kate Flatt. Ambas as formas de dança foram usadas no
espetáculo em sequências de coreografia. Qualquer movimento ou habilidades
especializadas de dança precisam ser construídas ao longo do tempo e não
podem ser apresentadas ao ator no último minuto.

É importante fazer uma distinção clara entre um aquecimento que


prepara o ator para o palco, e o aquecimento para jogar um esporte. Os peças
incluem esportes competitivos (como futebol ou vôlei ) ou peças infantis (como
pega-pega, pata-cega ou esconde-esconde). Ao longo do tempo, os
profissionais de teatro têm modificado peças infantis para atender às
necessidades de determinados trabalhos em equipe em projetos específicos e
estes peças tornaram-se frequentes em muitas salas de ensaio. Há peças
pensados para ajudar os atores a lembrarem os nomes uns dos outros ou para
construir a confiança entre os membros da companhia. Os peças podem ser
úteis para quebrar a tensão no início de ensaios ou se livrar do excesso de
energia na sala. No entanto, não confunda-os com um bom aquecimento físico
e use-os com moderação uma vez que a sua função é limitada. Lembre-se de
que os atores podem se machucar jogando, especialmente se eles não fizeram
um bom aquecimento antes de começar. Além disso, os peças podem
estimular um ambiente competitivo na sala de ensaios o que pode ser
prejudicial para a ética do trabalho, incentivando os artistas a se compararem
negativamente uns aos outros. Eu usei vários peças quando eu comecei, mas
eu achei que eles muitas vezes deixavam os atores sem foco ou exaustos para
o ensaio de cena que se seguia. Gostaria de aconselhar também contra o uso
de peças de status para alimentar os atores no trabalho da peça, pois estes
podem incentivar uma simplificação no pensamento do ator sobre
relacionamentos.

Quando eu comecei pensava que eu mesma deveria liderar o trabalho


vocal e físico. Eu li vários livros fantásticos sobre ambos os assuntos, escrito
por pessoas como Patsy Rodenburg e Jerzy Grotowski, e eu, em seguida,
tentei fazer com que os atores realizassem os exercícios descritos nos livros.
Com o tempo, no entanto, eu percebi que era melhor confiar em pessoas que

102
foram treinadas nestes campos especializados para liderar o trabalho
diretamente ou simplesmente para deixar os atores fazerem seu próprio
aquecimento. A maioria dos atores sabe o que precisam fazer para aquecer
seus corpos adequadamente, mas se você forçar um ator a fazer um exercício
vocal ou físico contra a sua vontade, ou conduzir de forma inadequada um
exercício que você leu em um livro, você pode prejudicar seriamente a voz ou
corpo de um ator - ou minar a utilidade do trabalho de movimento.

Se você quiser trabalhar com um especialista em movimento, procure


alguém cujas habilidades e processo possam complementar o seu trabalho.
Antes de pedir a alguém para assumir o comando do movimento, veja seu
trabalho em espetáculos para verificar se ele atende ao que você espera que
ele faça. Em seguida, fale com ele com muita precisão sobre o que você
precisa. Muitas vezes as coisas podem dar errado em ensaios porque o diretor
não foi claro na fase de entrevista sobre o que era realmente necessário em
relação as movimentações. Uma vez contratado, descreva as etapas de seu
processo em detalhes e discuta o que você quer fazer em cada etapa. Lembre-
se de compartilhar a linguagem do seu processo; Dessa forma, você vai evitar
que os atores sejam puxados em duas direções diferentes pelo diretor e pela
pessoa responsável pela composição de movimento. Se ele fala sobre um
exercício ou técnica que você não entende ou não pode visualizar, peça que
ele demonstre. Mais importante ainda, seja claro sobre se você quer que ele
contribua para a produção além do aquecimento ou quaisquer requisitos
específicos coreográficos. Se as fronteiras não são claras, o especialista pode
entrar de maneira inadequada em todas as áreas relacionadas a fisicalidade na
sua produção.

Se você não pode pagar para uma pessoa trabalhar o movimento, peça
aos atores para fazerem aquecimentos individualmente no início de cada
ensaio. Se você também não têm uma pessoa de voz a bordo, combine o
aquecimento com o trabalho vocal. Eu sugiro que você não faça isso como
uma atividade de grupo. Em vez disso, dê aos atores o espaço para trabalhar
individualmente. Deixe-os encontrar um lugar na sala de ensaios para fazer
seus próprios aquecimentos físicos e vocais simultaneamente. Isto significa
que você estará contando com a concepções que os atores receberam em sua
formação na arte dramática. Você pode dar-lhes entre 15 e 30 minutos para
fazer isso, dependendo do tempo do seu processo de ensaio.

Aconselho que não participe durante o aquecimento. Em vez disso, use


o tempo que os atores estão se aquecendo para preparar o trabalho que você
vai fazer com eles depois do aquecimento terminar. Lembre-se de que você
também pode aprender muito sobre seus atores por estar discretamente
observando como eles usam seus corpos ou vozes em um aquecimento.

Lembre-se sempre de avisar aos atores que você vai fazer o trabalho de
movimento antes do dia que você pretende fazê-lo, para que eles possam
providenciar roupas adequadas. E se o trabalho é particularmente exigente
fisicamente, considere fazer um 'desaquecimento' no final do dia, onde você
dará aos atores 15 minutos para alongarem-se e dissipar a tensão de seus
corpos. Isto é particularmente importante se eles estão fazendo uma peça que

103
é fisicamente exigente ou envolve imaginar uma situação psicologicamente
angustiante (como 'As troianas' ou 'Ifigênia em Aulis', onde muitas das cenas
dizem respeito à morte de crianças). Isso pode deixar muita tensão física nos
corpos dos atores depois de um ensaio ou apresentação.

RESUMO

Decida qual das três funções principais você quer que o movimento
cumpra na sua produção.
Seja claro sobre a diferença entre o trabalho de movimento e jogos.
Não conduza o movimento ou o aquecimento vocal por si mesmo, a não
ser que tenha sido treinado nesse campo. Encontre uma pessoa de
movimento cujas habilidades e processo possam complementar o
seu.
Informe exatamente o que você quer fazer antes de aceitar o trabalho.
Uma vez contratado, avise exatamente o que você quer fazer em cada
etapa do processo de ensaio.
Se você não quer, ou não pode pagar, uma pessoa de movimento ou voz,
reserve um tempo nos ensaios para os atores fazerem seus próprios
aquecimentos de voz e corpo.
Use o tempo de aquecimento para preparar o trabalho que você vai fazer
com os atores depois.
Sempre avise aos atores que você pretende fazer um trabalho com
movimentos na noite anterior para que eles possam vestir roupas
adequadas.
Considere fazer um 'desaquecimento', se o trabalho for muito exigente
fisicamente ou envolver imaginar uma situação que é
psicologicamente angustiante.

104
Katya Kabanova de Leos Janácek

7. Capítulo - Selecionando atores e testando os pontos de


partida para os ensaios
(Tradução de Agatha Paes - Revisão Humberto Issao)

Este capítulo tem duas etapas:

7.1 Seleção de elenco


7.2 Oficinas

7.1 Seleção de elenco

A seleção de elenco é sobre a escolha dos atores certos para o peça e


os atores certos para o seu processo de ensaio. Se você testa um ator que é
certo para o papel, mas que não vai realizar o seu processo, você pode perder
um tempo precioso em repetidos conflitos sobre metodologia de trabalho, o que
significa que os atores que querem trabalhar em seu processo serão pegos no
fogo cruzado. O resultado será uma produção em que os atores não habitam o
mesmo mundo. Por outro lado, se você trabalhar com um ator que esteja
absolutamente disposto a trabalhar com você, mas não pode fornecer a
personagem, todo mundo vai estar no mesmo mundo, mas uma pessoa não
será crível. Tente obter um equilíbrio.

Quando você faz audições, passe pelo menos 30 minutos com cada
pessoa. Muitos atores acham audições assustadoras e como resultado, eles
não podem facilmente fazer-se justiça. Dando-lhes um pouco mais de tempo

105
para relaxar, pode-se diminuir o medo e a pressão que há sobre eles. Eles,
então, fazem um trabalho melhor e você será capaz de medir sua adequação
para o papel com mais precisão. Também tenha copos e água à mão para
cada pessoa - o medo pode causar desidratação e interferir com a capacidade
de um ator para falar.

Divida as audições em quatro seções soltas:

Converse com o ator sobre os trabalhos no seu CV


Pergunte o que eles pensam sobre a peça e o personagem para o qual
estão fazendo o teste
Explique o trabalho como você o entende - o papel e o processo
Dê-lhes tarefas diferentes para interpretar em uma cena curta da peça.

Aproveite o tempo para ler cada CV antes do ator entrar na sala e


selecione um ou dois empregos do seu CV para lhe fazer perguntas.
Idealmente, esse trabalho deve ser aquele que você sabe algo sobre (por
exemplo, você pode saber o diretor ou o texto ou ter visto a produção). Se, por
exemplo, você conhece o texto, em seguida, pergunte como eles lidavam com
um momento específico. Falar sobre o trabalho que eles já fizeram também vai
relaxar o ator. Em seguida, pergunte o que eles pensam sobre a peça que você
está fazendo na audição. A resposta a esta questão irá medir o grau em que o
ator está interessado na peça em geral em comparação com o personagem
para o qual estão sendo vistos. A completa ausência de qualquer pensamento
sobre a peça em geral deve tocar uma pequena campainha de alarme em sua
cabeça. Em seguida, pergunte o que eles pensam sobre o personagem que
você está vendo para eles. Aqui, procure as afinidades do ator com o
personagem que poderiam ficar no caminho deles interpretando o papel. Um
ator pode querer usar o personagem para exercer ou exorcizar um problema
privado, que seria melhor tratado em terapia. Por exemplo, o ator que começa
a chorar quando eles falam sobre o papel ou que oferece um paralelo
inadequado e demorado entre a sua própria vida e a vida do personagem é um
motivo de preocupação. Faça as perguntas sobre o peça e o personagem
antes de lhes dar uma ideia de como você está se aproximando dela. Isso irá
fazer com que os atores parem de tentar agradá-lo tentando ajustar suas
respostas a sua leitura do material.

A seguir, faça uma breve descrição do seu processo de trabalho e


pergunte se eles estariam confortáveis trabalhando dessa forma. A maioria dos
atores vai dizer que eles gostariam de trabalhar da maneira que você descreve,
porque eles querem o trabalho - assim, analise-os cuidadosamente à medida
que respondem a esta pergunta, e procure por qualquer informação que possa
desmentir o que estão dizendo. Por um instante, você pode ver um movimento
repentino, um olhar súbito, ou um movimento involuntário da mão para a boca
ou uma contração do pé. Descrevendo como você trabalha também irá
fornecer-lhe uma apólice de seguro para o futuro. Você pode lembrá-los do que
você disse na audição, se eles se queixarem sobre o processo de trabalho
durante os ensaios.

106
Em seguida, descreva o trabalho que planeja para eles. Seja claro e
direto sobre o que o trabalho é e, em prol do desejo de protegê-los, não leve-os
a pensar que pode ser algo que não é. Por exemplo, quando você está fazendo
audições para pequenos papéis, não finja que o papel é maior do que é - ou
que você irá adicionar coisas a ele quando você não tem nenhuma intenção de
fazê-lo. Da mesma forma, não ajuste a sua descrição do processo a fim de
garantir um ator. Não finja que as sessões de marcação, que são centrais para
a forma como você trabalha, são opcionais, porque um ator famoso claramente
não gosta deles. Mentiras como esta vão pegar você no processo de ensaio
quando o ator vai ver as coisas como elas são.

Finalmente, passe para a leitura do texto. Irá ajudar enormemente ter


outra pessoa para ler o texto com o ator para que você possa observar de
forma objetiva o trabalho feito pelo ator que está fazendo a audição. Isso não é
possível se você estiver envolvido na própria leitura. Se você tem um diretor de
elenco, eles normalmente vão ler com os atores. Se você não tiver um, peça a
alguém para ler - talvez um amigo ou um ator que já esteja no elenco. A cena
que você selecionar para isso deve ser simples, fácil de entender depois de
uma primeira leitura. Idealmente, a cena deve ser entre dois personagens e as
tarefas que você sugerir para o ator devem ser simples e claras. O retorno que
você dá deve ser direto e reconfortante - se o trabalho é bom ou ruim. Cada
ator fazendo testes para um papel deve ler a mesma cena e fazer as mesmas
tarefas. Isso irá ajudá-lo a avaliá-los de forma justa e precisa, especialmente no
final de um longo dia de audições. Lembre-se que se você ler várias cenas
diferentes ao lançar um personagem, às vezes você pode confundir o fato de
que alguém está lendo uma cena diferente para uma melhor audição.

Primeiro, peça ao ator para ler a cena através de um único sentido, pois
isso lhes dá a chance de dizer o texto em voz alta, sem a pressão de ter que se
entregar a uma performance. Em seguida, estabeleça algumas tarefas simples.
As tarefas devem incluir instruções sobre tempo, lugar e intenções. Aqui está
um exemplo das tarefas que você poderia definir para os atores numa audição
para Konstantin em 'A Gaivota'. Peça a cada ator para ler a cena do segundo
ato, quando a gaivota é colocada aos pés de Nina; peça-lhes para reproduzir
que é um dia muito quente e que o almoço deve ser servido em cinco minutos.
Eles vão ler a cena três vezes e a cada vez peça para reproduzir uma intenção
diferente:

Fazer Nina se sentir culpada


Acordar Nina para a realidade do que ela tem feito
Entreter Nina.

Idealmente a terceira intenção deve ser um chute com efeito projetado


para ver como cada ator pode ser imaginativo e flexível.

Depois de ler a cena, agradeça pelo trabalho e pergunte se eles têm


alguma dúvida que gostariam de lhe perguntar sobre a produção ou processo.
Uma palavra de cautela aqui: esteja preparado no campo para algumas
perguntas desafiadoras neste ponto. Muitas vezes me perguntam questões
como: 'Por que você quer dirigir esta peça', ou 'O que atraiu você para a peça?'

107
ou 'Como é que você vai apresentar a peça?' Portanto prepare-se para isso de
antemão. Ser capaz de responder a perguntas como esta de forma simples e
com confiança pode ajudar o ator a se sentir seguro sobre você como um
diretor. Afinal, o processo de audição é uma via de mão dupla - vocês também
estão sendo avaliados pelo ator.

Depois de ver cada ator, tenha um par de minutos para anotar seus
pensamentos sobre o seu trabalho. No final de um dia longo de audição você
poderia facilmente esquecer seus pensamentos precisos sobre os primeiros
atores que você viu. Faça as notas claramente para que você possa lê-los de
volta com facilidade no final do dia. Faça isso antes de pedir o retorno da
pessoa com você na audição. Então você vai pegar suas respostas precisas e
imaculadas sem a opinião de outra pessoa.

Um número surpreendente de atores têm dislexia, assim, deixe todos


saberem de antemão a cena que você estará trabalhando na audição. Dessa
forma, eles todos podem ter uma oportunidade justa para fazer o seu melhor.

Quando você estiver tomando decisões depois de audições, tente


manter em mente o seguinte:

A adequação do ator para o papel


Como escalando esse ator você poderá trabalhar em relação a outras
escalações de elenco que você está fazendo
O interesse deles em como você trabalha e
Como eles se encaixam em um grupo de pessoas que precisam
trabalhar em conjunto.

Ouça com muita sensibilidade a sua intuição ou instinto sobre os atores


que se encontram. Se você sentir que um ator é difícil ou agressivo ou desligou
de alguma forma, é mais do que provável que você esteja certo. Palpites são
difíceis de explicar ou defender a diretores de elenco ou produtores. No
entanto, se não forem seguidos, podem levar a erros de elenco que causam
danos a produção. Se você escolher alguém que se torna difícil ou destrutivo
muitas vezes você vai olhar para trás e lembrar de como um pensamento
negativo sobre eles passou pela sua cabeça durante a audição. Se você tem
alguma dúvida sobre um ator, troque com outros diretores que trabalharam
com eles. A maioria dos diretores são mais do que felizes em falar sobre as
pessoas com que trabalharam - até mesmo diretores muito famosos.
Telefonemas podem tranquilizá-lo sobre uma escolha ou confirmar suas
dúvidas. Se você está selecionando atores que são mais velhos ou mais
experientes do que você, tente não ser intimidado por seu conhecimento ou
status. Lembre-se, é possível ser respeitoso e ainda manter distanciamento. Da
mesma forma, tente não deixar suas próprias inseguranças sobre o seu direito
de dirigir determinar seu comportamento. Logo no início da minha carreira,
quando eu fiz o teste em atores mais velhos, lembro-me de colocar tanta
energia para convencer o ator que eu poderia dirigir, que eu mesma não dei
tempo para julgar a sua capacidade para desempenhar o papel. Levei vários
anos para estar confiante o suficiente para colocar minha energia em audições
para selecionar o melhor ator para o papel.

108
Resumo

Passe pelo menos 30 minutos, com cada ator.


Pergunte a eles sobre o trabalho.
Pergunte a eles o que eles pensam sobre o peça e a personagem.
Seja claro sobre o que o trabalho envolve.
Descreva o seu processo de trabalho e verifique se eles estão
confortáveis com ele.
Peça que eles leiam uma cena da peça e defina tarefas simples de
realizar.
Tenha uma terceira pessoa na audição para ler com o ator.
Deixe os atores saberem qual cena você estará trabalhando antes da
audição.
Pergunte se eles têm alguma pergunta para você e esteja preparado para
ser desafiado.
Certifique-se de que cada ator fez o teste da mesma forma.
Anote um registro de seus pensamentos depois de cada teste.
Ouça suas intuições.
Se você tiver dúvidas, ligue para os diretores que o ator trabalhou
anteriormente.

7.2 Oficinas

Enquanto os ensaios são sobre a entrega de uma produção para uma


audiência, oficinas são sobre a exploração de ideias. Use oficinas para
investigar áreas cinzentas em sua interpretação do texto, ou para
testar/executar novos passos e ferramentas em seu processo. As descobertas
feitas nas oficinas irão lhe fornecer pontos de partida claros para os ensaios.
Em um processo de ensaio você não pode mudar sua ideia o tempo todo sobre
o seu método de trabalho ou a interpretação do texto. Isto tornará os atores
instáveis e irão detê-los de construir uma performance forte o suficiente para ir
a frente de uma plateia. Em uma oficina você pode cortar e mudar tanto quanto
você gosta, porque você não tem que construir alguma coisa duradoura.

Adquira o hábito de fazer uma oficina antes de cada período de ensaio.


Haverá sempre algum canto do trabalho que beneficiará a investigação ou uma
etapa em seu processo que precisa de reavaliação. Por exemplo, em 'A
Gaivota', exploramos diferentes soluções para o estilo de produção da peça de
Konstantin usando o movimento e a música. No Dream Play, estudei a
composição dos sonhos e procurei uma linguagem com a qual nós nos
comunicaríamos no palco. Oficinas também lhe permitem chutar o material em
torno do seu trabalho de uma forma mais aventureira do que você poderia em
um período de ensaio. Por exemplo, com as 'Três Irmãs' de Tchecov,

109
investigamos formas nas quais movimento e valsa lenta poderiam trabalhar ao
lado de um realismo psicológico.

Oficinas são feitas melhor com um grupo de quatro a seis atores. Pode
ajudar ter um número par, de modo que você possa configurar tarefas em
pares. Caso já tenha uma equipe em sua produção, utilize a totalidade ou parte
do seu elenco - dependendo do tamanho da companhia. Se você não tiver
elenco, trabalhe com atores que você está considerando selecionar - mas não
use a oficina como um teste. Alternativamente, você poderia usar atores que
você tenha trabalhado antes, você vai obter mais resultados com atores com os
quais você já tem um relacionamento.

Introduza a oficina com uma série de perguntas simples e oriente os


atores no sentido de responder a estas questões, dando-lhes coisas concretas
para fazer. Se houver conflitos ou debates abstratos, incentive os atores a
traduzi-los em um exercício prático. Por exemplo, eu comecei uma oficina
sobre a peça Dream Play de Strindberg dizendo aos atores que eu queria (a)
explorar do que os sonhos eram compostos, e (b) encontrar uma linguagem
para comunicá-los no palco. Eu tinha seis atores do grupo. Em primeiro lugar,
eu pedi a todos para recordar um sonho que tiveram recentemente. Em
seguida pedi para tentar levar esses sonhos para o palco. Eles poderiam usar o
resto do grupo ou trabalhar isoladamente. A sala de ensaio era bastante vazia,
então eles tinham que usar cadeiras, mesas ou qualquer objeto que
encontrassem na sala.

Um por um, eu assisti os sonhos "encenados". Outros membros do


grupo assistiam comigo - se não estavam dentro do exercício. Após cada
tentativa de encenação perguntava aos atores que assistiam o que observaram
sobre a composição dos sonhos e as soluções de encenação. Nós compilamos
uma lista dos ingredientes de sonhos. Percebemos, por exemplo, que havia
sempre um sonhador, que as pessoas do mundo desperto dele, muitas vezes
apareceram em papéis diferentes e que saltavam de lugar para lugar. Em
seguida, notamos quais aspectos dos sonhos foram possíveis encenar e quais
não foram. Por exemplo, era mais fácil encenar um sonho em um ambiente
doméstico (como uma cozinha) do que em um local exterior (como o mar). Em
seguida, levamos os aspectos dos sonhos que tínhamos listados e trabalhamos
com eles um por um. Por exemplo, nós passamos uma tarde olhando para
diferentes formas práticas de fazer saltos/cortes entre os locais dos sonhos.
Em seguida, pedi-lhes para se concentrar em trabalhar sonhos em ambientes
domésticos. Então eu dei-lhes para trabalhar alguns dos sonhos descritos por
Carl Jung e Sigmund Freud.

Posteriormente começamos a aplicar o que haviam aprendido na peça.


Por exemplo, nós selecionamos os candidatos para o papel do sonhador da
lista de personagens - dramatis personae (o banqueiro, o escritor e Agnes). Em
seguida, tentamos encenar algumas das cenas mais curtas, como se
estivessem sendo sonhadas por cada uma das três pessoas. No início da
oficina nós tínhamos percebido que a maioria das pessoas que aparecem em
sonhos vinham de algum lugar de nossas vidas despertas. Logo percebemos

110
que precisávamos construir uma sólida história para cada um dos nossos
sonhadores, para que puséssemos as pessoas nos sonhos com precisão.

Ao final da oficina eu tinha uma ideia clara de como usar o trabalho em


sonhos para dirigir a peça. Eu sabia que tínhamos de evitar definições
ambiciosas, como a água ou o céu. Os exercícios de salto/corte nos fez
perceber que o conjunto tinha que ser capaz de se mover de local para local
em uma fração de segundo. Eu sabia que tinha que escolher um personagem
para ser o sonhador e que o banqueiro era o melhor candidato. Por sua vez,
compreendi que esta biografia real do sonhador teve de ser construída antes
que pudéssemos construir seu mundo de sonhos. Você pode ver que as
oficinas seguiram uma lógica simples que emergiram de duas questões iniciais.

Uma oficina para testar novas ferramentas de direção pode seguir um


formato similar. Por exemplo, você poderia ter ideias ou exercícios que você já
leu sobre ou foi ensinado, mas ainda não está confiante o suficiente para usar
em uma situação de ensaio. Resuma as coisas que você quer investigar em
três ou quatro perguntas simples. Uma oficina sobre as intenções, podem
incluir as seguintes perguntas.

Na vida, como vamos conseguir o que queremos de outras pessoas?


Como você acha que a intenção de um personagem é a partir do texto
da peça?
Como vamos notar as intenções?
Será que cada palavra ou ação na peça precisa ser aproveitada para
uma intenção?

As questões irão focar seu trabalho com os atores e fornecerão pontos


simples de referência para retornar a exploração caso perca o foco.

RESUMO
Seja claro sobre a diferença entre uma oficina e um ensaio.
Isole quaisquer aspectos do texto ou encenação que você está esteja em
dúvida.
Inicie a oficina com uma série de perguntas simples e certifique-se de
que o trabalho que faz tenta responder esses questionamentos.
Elabore uma lista de coisas para enfrentar na sala de ensaios.
Use oficinas para testar novas ferramentas de direção ou exercícios.

111
Katya Kabanova de Leos Janácek

112
8. Capítulo - Preparando o ambiente de ensaio
(Tradução de Thaís Vasconcelos - Revisão Humberto Issao)

Este capítulo possui quatro etapas:

8.1 - Trabalhando com a direção de palco


8.2 - Seleção de salas de ensaio
8.3 - Estabelecendo estruturas de comunicação
8.4 - Preparando a sala de ensaio

8.1 Trabalhando com a direção de palco

Ter uma boa equipe de direção de palco é crucial para um ambiente


saudável na sala de ensaio e uma transição harmoniosa para o teatro.
Diferentes culturas têm diferentes maneiras de organizar a sua direção de
palco. Nos grandes teatros do Reino Unido, como o Teatro Nacional, há uma
equipe de três ou quatro pessoas - diretor de palco, segundo diretor de palco e
um ou dois assistentes de palco. Em comparação, a produção alternativa no
mesmo país, provavelmente envolverá uma ou duas pessoas que cobrem
todas as funções de gerenciamento de palco.

Se você tem uma equipe de dois a quatro, alguém vai dar as deixas para
o espetáculo, e é nessa relação que você precisa acertar. Esta pessoa é
tecnicamente chamada de segundo diretor de palco e ela senta com você
durante todos os seus ensaios. Ela tem uma cópia do texto e nela são
anotadas todas as marcações e movimentações que os atores fazem. Quando
você entra no teatro ele anota todas as deixas de iluminação e sonoplastia.
Esta cópia do script é chamada de 'o livro', e será usado pelo segundo diretor
de palco para dar as deixas da iluminação para os técnicos de som. A maneira
como eles dão as deixas interfere no ritmo de toda a peça. Portanto, essa
pessoa deve ter uma noção clara do que você quer artisticamente, tanto em
termos do ritmo global como dos pequenos detalhes de palco, das diferentes
entradas ou efeitos de sonoplastia. Você, por exemplo, quer que as entradas
sejam antecipadas e precisas, ou lentas e atrasadas? Ou você quer que o som
venha uma fração de segundo antes, ou depois, em uma determinada linha?

Tenho achado surpreendente a diferença no trabalho de vários


segundos diretores de palco. Sinto suas energias e personalidades no ritmo
dos espetáculos que eles operam. Desde 2003, tenho trabalhado quase que
exclusivamente com Pippa Meyer, como segunda diretora de palco. Isto é
porque ela tem nervos de aço, entende completamente o que eu preciso
ritmicamente e trabalha em estreita colaboração com os atores. Se eles fazem
qualquer mudança nas marcações, ela os acompanha modificando as deixas.
É uma arte.

Se você tem opções de escolha de quem vai fazer este trabalho para
você, entreviste pessoas diferentes para esse papel. Se você não tem uma
escolha, separe um tempo antes de iniciar os ensaios para falar com o seu
segundo diretor de palco e explicar exatamente como você quer que ele se
coloque na sala de ensaio com você e como você trabalha. Então, quando os

113
ensaios técnicos estiverem próximos, sente com ele e diga exatamente o que
você quer em termos de tempo e ritmo de todas as deixas. Não pense que o
segundo diretor de palco vai estar em total sintonia com a sua maneira de
trabalhar ou seu ritmo. Se você encontrar um segundo diretor de palco com
quem você trabalha bem, tente contratá-lo novamente.

Se você estiver trabalhando em um teatro de grande escala no Reino


Unido, as outras funções de direção de palco podem ser estruturadas da
seguinte forma.

O diretor de palco é responsável pela gestão global do espetáculo. Eles


muitas vezes não estarão em ensaios com você, uma vez que eles estão
coordenando todos fora da sala de ensaio, tais como gestão da produção,
adereços, cenógrafos e assim por diante. Eles organizam as reuniões
necessárias e comunicam quaisquer problemas suscitados pelo processo de
ensaio para o resto da equipe criativa. Quando você estiver no teatro, eles
fazem o ensaio técnico e permanecem nos bastidores para cada apresentação,
garantindo que tudo corra bem.

Antes de começar os ensaios, é importante ter uma reunião com alguns


ou todos da sua equipe de direção de palco para discutir como você gosta de
trabalhar. Há muitas maneiras diferentes de organizar a cultura da sala de
ensaio e vai ajudar muito se sua equipe puder preparar a sala e ajustá-la de
acordo com suas funções, de modo que seja adaptada às suas necessidades
específicas. Converse sobre as etapas de seu processo de ensaio e como você
gostaria que a sala fosse organizada para cada etapa. Vai ajudar, por exemplo,
revisar a lista de adereços com a sua equipe de direção de palco e discutir
quais adereços você precisa nos ensaios e quando. Se você estiver
trabalhando em um pequeno teatro, eles podem encontrar os próprios
adereços; em uma grande organização eles podem pedir ao departamento
competente, para procurá-los. Lembre-se de passar quaisquer exigências do
preparador físico (por exemplo, esteiras de ginástica para exercícios) para o
seu diretor de palco. Você também deve discutir o ponto em que você gostaria
que a equipe de direção de palco faça as marcas no palco.

As marcas no palco são uma maneira de anotar a posição da cenografia:


são uma série de linhas marcadas no chão com fita plástica que indicam os
limites da paisagem ou arquitetura que o conjunto descreve. A direção de palco
geralmente marca o chão da sala de ensaio no primeiro ou segundo dia de
ensaios a menos que você diga para não fazer.

Infelizmente, quando você está começando, nem todas as equipes de


direção de palco, ou membros individuais das equipes, estarão preparados
para ouvir, ou seguir, uma forma diferente de trabalho - especialmente se você
é um diretor mais jovem e menos experiente. Não espere sempre que o
relacionamento seja fácil de lidar. No entanto, as boas experiências superam
as más e, é claro, uma boa equipe de direção de palco é um trunfo inestimável
a qualquer diretor.

114
RESUMO

Tenha um bom relacionamento com a pessoa que dará as deixas do


espetáculo.
Se possível, entreviste candidatos diferentes para o papel de segundo
diretor de palco.
Se você não tiver opções de escolha, conheça a equipe de direção de
palco, e converse com eles sobre seu processo de trabalho e o que
você precisa que eles façam.
Antes de começar os ensaios, marque uma reunião com sua equipe de
direção de palco para falar sobre como você gostaria de trabalhar.
Certifique-se de que a direção de palco tenha preparada a sala de ensaios
para atender às suas necessidades específicas.
Não se desanime se a equipe de direção de palco não apoia
imediatamente o seu modo de trabalhar.

8.2 Seleção de salas de ensaio

Em muitos teatros você não terá uma escolha sobre sua sala de
ensaios. Se você estiver trabalhando na cena mais alternativa, o seu
orçamento pode significar que você terá que alugar o salão inóspito de uma
igreja. No entanto, se você tem qualquer margem de manobra, considere os
seguintes aspectos ao fazer a escolha da sala de ensaio.

Certifique-se de que a sala é grande o suficiente para marcar o chão


com as plantas baixas da cenografia e que ainda fique sobrando um ou dois
metros. Esta margem de espaço garante que eles já estejam dentro da
personagem e da situação antes de começar a ação da cena e, portanto,
impede que eles usem o primeiro passo da sua entrada no palco para entrar no
mundo da peça.

Lembre-se, também, de que é difícil de praticar a entrada em uma sala


ou um edifício de forma convincente quando você não pode ficar atrás da porta,
porque ela está rente a parede da sala de ensaio. Leia a seção sobre marcas
no capítulo 11, se você precisar de mais esclarecimentos.

Verifique se há algum lugar para fazer bebidas quentes, armazenar o


leite e que haja um lugar seguro para os atores deixarem seus pertences fora
da sala de ensaio. Se isso não for possível, divida a sala de ensaio em seções
diferentes que cumprem essas funções. Por exemplo, você poderia colocar
uma parede falsa no canto da sala e armazenar sua cafeteira, geladeira e
assim por diante por trás dela. Você poderia colocar uma cortina em outros
lugares para criar um lugar onde os atores poderão deixar as suas coisas
durante os ensaios e beber ou conversar durante os intervalos. A sala de

115
ensaio não deve ser um lugar que confunde as fronteiras entre tempo livre e
tempo de trabalho. Nem deve ser cheia de pertences de todos. Isto vai encher
a cabeça dos atores e tornar difícil para eles imaginarem o mundo da peça.

Em seguida, verifique se a acústica da sala não está crescendo ou


ecoando. Em seguida, descubra mais sobre a temperatura. Se é inverno,
informe-se sobre o aquecimento, e se é verão, pergunte se há um sistema de
refrigeração ou ventilador. Certifique-se de ligar todas as luzes da sala que
pretende usar no espaço. Algumas salas são iluminadas principalmente por
luzes tubulares ofuscantes. Isso torna difícil para os atores se concentrarem
durante longos dias de ensaio. Se as luzes não forem boas, pergunte se você
pode equipar a sala com algumas luzes teatrais simples. Se você estiver
planejando usar o som durante os ensaios, verifique se o sistema de som pode
ser instalado e se há um lugar seguro para guardar o equipamento durante a
noite. Verifique também se você pode pendurar coisas nas paredes.

No início de sua carreira, você vai se perceber que muitas das salas de
ensaio estão longe do ideal e não terão boas instalações - ou possibilidades -
como as que estou sugerindo que você procure. Quando eu comecei na cena
alternativa de Londres, eu trabalhei em salas que pareciam câmaras frigorificas
congelantes, onde eu tinha que usar chapéu, casaco e cachecol, e me manter
em movimento o tempo todo. Eu também trabalhei em depósitos de cozinha
ferventes, onde eu ficava sentada vestindo quase nada, me abanando com o
texto da peça. Na maioria dos casos, eu simplesmente tinha que aguentar isso,
mas sempre que eu podia eu tentava levantar um pouco de dinheiro extra para
uma sala melhor. Eu aprendi muito rapidamente que uma sala agradável,
confortável e limpa realmente aumenta o trabalho dos atores - e nos dá a
sensação de trabalho profissional, especialmente se você não pode pagá-los.
Quando o dinheiro está apertado, aluguel de sala de ensaio é pouco relevante
no planejamento das pessoas. Se possível, coloque-o um pouco mais para
cima na sua lista - se, por exemplo, você tem uma escolha entre um figurino
caro e uma sala de ensaio, aplique esse dinheiro na sala de ensaios.

116
RESUMO

Certifique-se de que a sala de ensaio seja grande o suficiente para marcar


o chão com a área em que a encenação acontece. Deixe, pelo menos,
um ou dois metros entre a parede da sala de ensaio e o limiar de onde
a ação começa.
Certifique-se de que existe algum lugar para fazer bebidas quentes, etc., e
um lugar seguro para os atores deixarem seus pertences.
Verifique se a acústica da sala é boa para dizer o texto.
Verifique o aquecimento, se você está ensaiando no inverno, e os
sistemas de refrigeração, se você estiver trabalhando no verão. Ver o
tipo de iluminação disponível na sala e, se não estiver bom, pergunte
se você pode instalar outras luzes.
Se você planeja usar o som, verifique se você pode instalá-lo e que haja
um lugar seguro para guardar o equipamento durante a noite.
Lembre-se que uma sala de ensaio deve ser calorosa e acolhedora é um
acerto real, se você está pedindo para os atores trabalharem por
pouco ou nenhum dinheiro. Coloque esse ítem um pouco mais acima
na sua lista de prioridades.

8.3 Estabelecendo estruturas de comunicação

É essencial que tudo o que acontece na sala de ensaios seja


comunicado claramente a todas as pessoas relevantes - sejam eles
cenógrafos, figurinistas ou cenotécnicos. Se você está trabalhando para um
teatro com uma grande infraestrutura ou para uma empresa com fins lucrativos
reduzidos, estabeleça sistemas robustos e eficientes de comunicação com
prioridades claras.

O primeiro meio de comunicação são as anotações de ensaio. Estas são


as notas que o diretor de palco envia diariamente para todos os envolvidos na
produção. Eles contêm todas as coisas novas que surgem nos ensaios, e
incluem ideias de figurino, modificações na peça e novos adereços. Certifique-
se que você envia as anotações de ensaio e que você as lê. Problemas de
comunicação muitas vezes podem ocorrer devido a uma anotação de ensaio
imprecisa. Se você está planejando o trabalho a partir do zero ou faz alterações
substanciais no texto durante os ensaios, certifique-se de que a direção de
palco contextualize esses novos ingredientes. Por exemplo, em vez de apenas
dizer que um adereço é necessário, peça-lhes também para explicar como ele
é usado e por que ele foi adicionado. Isso cria um pouco de trabalho extra para
a direção de palco, mas garante que todas as pessoas relevantes digiram as
novas informações de forma clara e eficiente. Mesmo se você estiver
trabalhando na cena alternativa com um orçamento pequeno, use notas de
ensaio para estabelecer uma cultura de comunicação entre a sala de ensaio e
qualquer um que trabalhe para você fora desse ambiente. Isso irá ajudá-lo a
pilotar o barco, especialmente se os recursos são baixos. Também estabelece

117
uma atmosfera de profissionalismo, mesmo que você não consiga
corresponder com salários justos para todos.

O segundo meio de comunicação são as reuniões de produção


regulares, organizadas pelo diretor de produção. Essas reuniões deverão
acontecer uma vez por semana em uma pausa para o almoço ou no final do dia
de ensaio. Elas são presenciadas por todos os envolvidos na produção:
aderecistas, assistentes de produção, diretores técnicos, pessoal de
iluminação, som, figurinistas, contrarregras, maquiadores e assim por diante.
Nestas reuniões, notas de ensaio pouco claras são esclarecidas e todas as
exigências técnicas discutidas. É importante ser claro e simples sobre por que
você precisa de novos elementos, tais como um suporte ou uma peça de
mobiliário. Se quaisquer preocupações financeiras surgem na reunião de
produção, primeiro tente descobrir exatamente o que a está causando. Em
seguida, pergunte se há algo que pode ser feito para resolvê-los. Seja qual for
o resultado de suas investigações, não dê uma decisão imediata. Em vez
disso, pense se há uma solução criativa para o problema. Se necessário,
organize reuniões menores com indivíduos específicos para discutir problemas.
Mesmo se você estiver trabalhando com um pequeno grupo de pessoas e tem
recursos limitados, tente reunir-se regularmente com todos que ajudam você a
fazer a produção. Isso irá garantir uma boa comunicação e planejamento.

Também é útil ter pequenas reuniões regularmente com a equipe de


criação - cenógrafo, iluminador, sonoplasta e compositor e/ou diretor musical.
Isto permite que você tenha tempo para debater problemas criativos que não
precisam de uma solução técnica imediata. Com o trabalho Idealizado, também
pode ajudar a enviar anotações artísticas. Estas são as anotações que
descrevem em detalhes como o trabalho está sendo desenvolvido na sala de
ensaios: eles são particularmente importantes se não houver um texto antes de
começar os ensaios.

RESUMO

Estabeleça sistemas robustos e eficientes de comunicação com


prioridades claras, independente se você está trabalhando para um
teatro com uma grande infraestrutura ou em uma companhia com
lucros menores.
Estabeleça um sistema de anotações de ensaio e garanta que todas as
mudanças sejam claramente contextualizadas.
Estabeleça um sistema de reuniões de produção, com uma pessoa na
liderança que priorize as coisas de forma eficiente.
Estabeleça um sistema de reuniões regulares da equipe criativa para
debater problemas criativos que não têm soluções técnicas
imediatas.
Se você está planejando um trabalho, estabeleça uma série de notas
artísticas para complementar as suas notas de ensaio.
118
8.4 Preparando a sala de ensaio

Em um mundo ideal, você terá encontrado agora uma sala de ensaio


confortável, bem aquecida, com uma boa acústica, maior do que a área de
encenação do seu projeto. Você também terá uma área dentro da sala, ou ao
lado dela, para fazer chá e café e uma outra área em que os atores podem
colocar seus pertences. Peça para a sua equipe de direção de palco comprar
chá, café e biscoitos para o primeiro dia de ensaios (forneça estes no primeiro
dia, em seguida, encoraje o diretor de palco a organizar uma vaquinha para
que todos na sala possam contribuir). A direção de palco vai também ter
organizado a cenografia e os adereços que você pediu na reunião que teve
com eles antes dos ensaios. Felizmente, estes irão incluir um monte de coisas
que você vai usar na própria apresentação. A sala deve ser arrumada com
todos esses objetos empilhados ordenadamente no canto ou ao longo das
paredes.

Agora, reserve uma mesa para o seu material de pesquisa. Aqui você
pode compartilhar a pesquisa que você fez enquanto você estava começando a
sua investigação inicial ou os livros e fotografias que você tem usado durante o
processo de criação. Pode ser tentador colocar um pouco do material de
pesquisa ou desenho na parede antes de os atores chegarem. Em vez disso,
tenha as paredes nuas para o primeiro dia, em seguida, começar a furar as
coisas à medida que surgirem ou forem discutidas no processo de ensaio.
Dessa forma, os atores vão entender a função de cada referência. Em seguida,
garanta que você tenha uma mesa grande o suficiente para acomodar a todos.
Tente manter a sala limpa e pronta para o trabalho.

Na minha experiência, é melhor não fazer as marcas no chão no início


de ensaios. Isso porque você não vai fazer nada prático nos locais onde a
encenação está definida nos primeiros 40% dos seus ensaios. Eu escrevo
sobre quando - e como - iniciar as marcações no chão no capítulo 11.

RESUMO

Certifique-se de que a direção de palco compre chá, café e biscoitos para


o primeiro dia.
Garanta que todos os adereços ou mobília de ensaio estejam empilhadas
ordenadamente no canto da sala.
Colocar todo o seu material de pesquisa discretamente em uma mesa na
sala de ensaio.
Certifique-se de que você tenha uma mesa grande o suficiente para
acomodar toda a equipe - e cadeiras.
Peça para a direção de palco marcar o chão mais tarde no processo,
quando você começar a fazer improvisações ou ensaios de cena no
lugar onde a ação da peça será definida.

119
PARTE 2 - ENSAIOS

Jephtha de George Frideric Handel

120
Esta seção do livro descreve como usar todos os trabalhos preparatórios
que você tem feito com os atores. Os ensaios devem permitir que os atores
construam as coisas passo a passo ao longo do tempo, de forma lenta e
gradualmente. As principais competências exigidas do diretor são paciência e
pensamento de longo prazo. Mesmo se você tenha apenas duas semanas de
ensaio, o processo deve se desenvolver suave e cuidadosamente. É como
construir uma casa em que diferentes materiais são estabelecidas camada por
camada das fundações até a cobertura. Os materiais devem ser postos em
prática com cuidado e em uma ordem lógica, ou a edifício não vai se levantar
corretamente. Então, tente dar pequenos passos ao invés de grandes saltos.
Não espere um resultado imediato do ator e não responda a um trabalho feito
nos primeiros ensaios como se fosse o resultado final que o público vai ver. Em
vez disso, veja como um passo para esse resultado. E seja paciente com os
erros iniciais ou tropeços. Atores precisam de tempo para construir seus
personagens e praticar o que eles tem que fazer nas cenas. Eles nem sempre
podem responder a uma instrução com uma solução imediata ou resultado. Se
você esperar um par de dias você pode muito bem ver o resultado se
desdobrar. Se não, simplesmente continue dando as instrução até que ele faça.
Da mesma forma, se há um grande problema na cena, não ache que você tem
que resolvê-lo de uma só vez. Em vez disso, desmembre-o ao longo do tempo.

Lembre-se também que os ensaios são sobre como fazer um trabalho


que dure durante a realização da peça - não crie momentos únicos e
emocionantes que não podem ser repetidos. Então certifique-se de que o
processo não é sobre a busca de uma descoberta reveladora súbita ou uma
epifânia que vai desbloquear tudo. Atores muitas vezes falam sobre "encontrar
o personagem", como se o personagem fosse um conjunto de roupas que
sentam-se em uma sala em algum lugar apenas esperando o ator para abrir a
porta direita e colocá-lo. Eu já trabalhei com um ator que transformava-se nos
ensaios todos os dias com um nova proposta inteiramente diferente para o seu
personagem. Um dia ele iria interpretar como se ele fosse da sua idade e ritmo;
no dia seguinte ele seria mais velho e fazia tudo em um ritmo mais rápido. Ou
ele iria transformar-se e ao ter diagnosticado o seu personagem com um novo
problema psicológico, como a depressão ou a ansiedade de separação.
Finalmente, no penúltimo ensaio, disse ele, "Eu acho que eu encontrei" e fez
um fantástico esboço. Este ator foi tão brilhante que ele foi capaz de elaborar
uma biografia por trás deste sucesso, de última hora, ele escolheu e o
personagem foi totalmente real e fundamentado. Sua capacidade de fazer isso
foi uma exceção. A maioria dos atores que "encontram" seus personagens na
final dos ensaios, na apresentação do trabalho para o público fica raso - e
continua a ser raso da primeira apresentação a última. Isto porque é preciso
tempo para que qualquer ator construa um personagem crível. Epifânias são
muitas vezes construídas sobre uma emoção passageira e são raramente
possíveis de serem recriadas todas as noites. Crie uma cultura na sala de
ensaios que incentive a construção gradual e forte dos personagens em
situações duráveis.

Os próximos três capítulos assumem comoa ideal um período de


ensaios de seis a oito semanas. Isto é, eu sei, muito diferente de muitas
situações que os diretores vão encontrar no início de suas carreiras, em que os

121
períodos de ensaio podem ser tão curto quanto duas ou três semana. Portanto,
no final dos capítulos 10 e 11, eu incluí uma descrição de como utilizar os
passos descritos se você tem um período de ensaio mais curto. Certifique-se
de ler o capítulo inteiro antes de olhar para os ingredientes essenciais para um
curta período de ensaio. Tenha a certeza, no entanto, que é perfeitamente
possível utilizar as técnicas destes capítulos com um grande e preciso efeito
em um período de tempo menor que o ideal - e, mesmo se você só tem tempo
para usar um ou dois dos exercícios descritos, lembre-se que sua direção já
estará consideravelmente reforçada pela preparação que você tem feito em por
si próprio antes de começar os ensaios.

The Oresteia de Ésquilo

122
9. Capítulo - Os primeiros dias de ensaio
(Tradução de Juka Lion - Revisão Humberto Issao)

Este capítulo aborda os primeiros dias de ensaios com os atores e


descreve como estabelecer a maneira que você quer trabalhar. Comece no
caminho certo e isso irá encaminhar todo o processo. Faça um erro nos
primeiros dias e isso pode causar danos permanentes. Este capítulo está
separado em nove partes:

9.1 Organizando seus pensamentos sobre os atores


9.2 Doze regras de ouro para trabalhar com atores
9.3 Estabelecendo a linguagem do seu processo
9.4 Como dar retorno (feedback) aos atores sobre o trabalho deles
9.5 Como sentar-se na sala de ensaio
9.6 Apresentando o texto para os atores
9.7 O primeiro dia de ensaios
9.8 Maquete
9.9 Apresentando som, figurinos, adereços, móveis, luzes e elementos
cênicos para o processo de ensaio

9.1 Organizando seus pensamentos sobre atores

Os pensamentos que você tiver em mente sobre os atores quando você


entrar na sala de ensaio irão ditar como você vai trabalhar com eles. Se, por
exemplo, você tem o pensamento de que “atores são difícieis” você vai entrar
na sala de forma defensiva, antecipando os problemas, mesmo quando não há
nenhum. Se você tiver o pensamento de que "atores são especiais”, você vai
entrar na sala preocupado, pensando estar em desvantagem – não sendo
especial o suficiente para si mesmo – e pode muito bem começar a tratá-los
com luvas de pelica.

Resolva os seus pensamentos privados sobre os atores antes de


começar os ensaios. Dedique alguns minutos agora para preencher a
sentença: "Os atores são ...” com alguns adjetivos simples. Largue todos os
seus pensamentos, relevantes ou não. Você vai descobrir que seus adjetivos
incluem palavras positivas como: "imaginativos" e "bravos" e também negativos
como: 'exigente' e 'difícil'. Em alguns casos você irá usar palavras como,
'artistas' 'especiais' ou 'instintivos' que classificam os atores como uma raça
única e especial. Em outros casos, você vai achar que você usa palavras como
"assustadores" que revelam suas próprias ansiedades sobre como trabalhar
com eles. Olhe para todas as palavras que você usou para descrever os
atores. Elimine as palavras como assustadores", "difíceis" ou "especiais", pois
isso fará você se sentir inadequado, ou colocá-lo em desvantagem. No lugar
coloque novas palavras para ajudá-lo a trabalhar mais facilmente com os

123
atores. Use palavras simples e claras, como "adultos" ou "artesãos
qualificados" ou "responsáveis". Sempre tento ser objetivo: é uma situação
profissional.

A profissão do ator, como qualquer profissão, contém algumas pessoas


que são difíceis de trabalhar. Isto leva a problemas na sala de ensaios. Por
exemplo, um ator pode usar o personagem inadequadamente para demonstrar
a sua própria dor enquanto outro será conduzido com muita força pelo
pensamento na sua carreira e tomará atalhos no seu trabalho. Quanto mais
você dirigir mais familiarizado você se tornará com diferentes tipos de
problemas - e mais hábil você será para evitar certos tipos de atores ou irá
aprender a lidar com os desafios que eles colocam no chão da sala de ensaio.

Classificar seus próprios pensamentos sobre os atores será um longo


caminho a se percorrer para que ao final você possa lidar com os atores
difíceis desde o início. Isto vai colocá-lo em um lugar mais saudável
mentalmente falando. Console-se com o fato de que, mesmo os diretores mais
qualificados e experientes não podem evitar elencos com atores difíceis ou
problemáticos - seja por causa de necessidade, ou por causa de um erro de
julgamento. Lembre-se que os atores difíceis foram muitas vezes formados de
experiências ruins. Fornecer um atencioso, consistente e respeitoso ambiente
de trabalho em sua sala de ensaio vai lhe ajudar a atenuar o impacto de seu
comportamento.

No entanto, sempre haverá algumas pessoas que são impossíveis de se


trabalhar. Todas as suas tentativas de dirigi-las irão falhar. Nestes casos, é
importante lembrar duas coisas. Primeiramente, não altere seu processo de
trabalho: não adote uma forma de dirigir diferente para com o ator que é mais
difícil e um outro caminho para o resto do conjunto. Dessa forma, você pode
acabar perdendo a confiança de todo o grupo assim como o ator difícil. Uma
alteração do processo de trabalho não irá remover a dificuldade. Então,
mantenha suas armas e seja respeitoso, mas consistente. Em segundo lugar,
certifique-se de que o ator difícil não ocupa todo o seu espaço mental. Reduza
o espaço que ele ocupa em sua cabeça e ajuste suas expectativas para o que
é realisticamente possível nas circunstâncias. Em seguida, concentre-se nos
outros atores – e sobre as coisas que você pode mudar e desenvolver. Toda
batalha pode pode ser vencida. Não deixe que este conselho sobre atores
difíceis ou negativos lhe dê uma imagem errada da profissão, imaginando que
está cheio de indivíduos perturbados e preocupantes. A maioria dos atores são
adultos responsáveis. Eles vão trabalhar duro para construir o mundo do peça
e o personagem dentro desse mundo.

124
Resumo
Lembre-se que os pensamentos que você tem em sua cabeça sobre
atores vai ditar como você trabalhar com eles. Resolva os seus
pensamentos privados sobre os atores antes de você entrar na sala
de ensaio. Prepare-se mentalmente para trabalhar com atores
difíceis.

9.2 Doze regras de ouro para trabalhar com atores

01 - Cultive a paciência e o pensamento a longo prazo.


Trabalhe lentamente e dê pequenos passos ao invés de grandes saltos.
Não responda negativamente ao trabalho dos atores em um ensaio no começo
do processo se é o resultado final que o público vai ver. Em vez disso, veja
como um passo para esse resultado. Seja paciente com qualquer erro
antecipado ou tropeços. Atores precisam de tempo para construir o seu
personagens e praticar o que eles têm de fazer nas cenas. Imagine, em vez
disso, que você está construindo um trabalho que será claro para o público
durante toda a performance.

02 - Seja consistente.
Seja consistente no uso da linguagem, seus objetivos, seu
comportamento e como você conduz seus relacionamentos. Mantenha um
relacionamento estável e simples com cada ator com limites claros. Não
priorize uma relação mais longa com um ou outro, assim você cria
competitividade no grupo. Dê a sua opinião clara e encorajadora para cada
membro do conjunto, independentemente dos créditos de cada ator. Esta regra
será ampliada em duas seções posteriores: “estabelecer a linguagem do seu
processo” e “Como dar retorno para atores sobre o seu trabalho".

03 - Não se preocupe em ser amado


Você não vai tornar o trabalho mais claro se você está muito preocupado
com sua popularidade entre os seus atores. Se este é o seu objetivo,
infelizmente, às vezes, você vai evitar propor algo mais difícil ou desafiador por
medo da reação do elenco. Você também vai perder tempo tentando garantir
que todos tenham momentos agradáveis, em vez de se concentrar em afiar o
trabalho que os atores estão fazendo, mesmo que isso não soe da melhor
forma aos ouvidos de cada um. Mesmo sendo a meta, é improvável que você
consiga. As pressões sobre o ator na construção de um personagem em uma
peça são tais que eles são obrigados, em algum ponto do processo, a entrar
em um conflito mais tenso no relacionamento com o diretor. Substitua a
necessidade de ser amado com o objetivo de ser respeitado - tenha isso em
mente objetivando tornar o trabalho mais claro.

125
04 - Faça com que o texto seja um mediador de conflitos.
Posicione o texto como árbitro entre você e o ator se houver qualquer
divergência na sala de ensaio. Leia as palavras juntas e pergunte o que é que
o escritor pretende. Olhe para a impressão mais simples que o texto oferece.
Isso vai ajudar o ator a ver a diferença entre o que eles querem, o que o diretor
quer e o que está realmente escrito na página. Você pode usar frases como:
“Isso é um observação útil, mas o que verdadeiramente Chekhov está dizendo
aqui?” para ajudar a orientar o ator. Se você estiver utilizando um texto ou
idéias como princípios de construção utilize-os como os mediadores.

05 - Não culpe automaticamente o ator se algo deu errado.


Se há um problema em um exercício, uma improvisação ou um cena do
ensaio, não culpe imediatamente o ator quer na sua cabeça ou em voz alta. Em
vez disso, assuma que é sua falha. Pare e pense sobre o que aconteceu.
Pergunte a si mesmo se não foi qualquer coisa que você disse que não era
clara. Por exemplo, você pode ter dado a sua instrução muito rapidamente e o
ator não entendeu o que você queria. Talvez você falou abstratamente e o ator
não soube traduzir suas idéias em algo concreto. Reflita sobre se o “timing” da
sua instrução se tornou difícil para o ator executá-lo. Talvez você deu a sua
instrução no último minuto e o ator não teve tempo para absorvê-la. Pergunte
se o seu estado de espírito ou a preocupação com outras coisas interferiu com
a forma como você deu as indicações para o ator. Talvez você estava se
preocupando com um problema orçamental quando você disse o que você
queria que eles fizessem, às vezes o ator apenas respondeu ao seu olhar
preocupado em vez de ouvir o que você realmente estava dizendo. Quando
diagnosticada a possível causa do problema, dê novas instruções e tente a
cena ou a improvisação novamente. Na maioria dos casos a nova instrução vai
remover o problema ou começar a removê-lo.

06 - Sempre peça desculpas se você cometer um erro


Erros de direção vêm em todas as formas e tamanhos. Por exemplo,
você pode dar uma instrução obscura que confunde o que a ator faz na cena,
ou poderia ter chamado um ator para ensaiar uma cena, mas ficou para trás na
sua programação original, deixando a ator sentado na sala girando seus
polegares. Se você cometer um erro, peça desculpas imediatamente. Um
pedido breve e simples de desculpas – depois, siga em frente. Não seja
tentado a esconder um erro por causa de embaraço ou do orgulho. Se você
fizer isso, então os atores vão seguir o exemplo e criarão um ambiente de
trabalho insalubre em que todos desperdiçam energia fingindo que estão
certos. Por outro lado, não se desculpe a cada minuto para minúsculos erros
que só você nota. Os atores vão pensar que você é inseguro.

07 - Não utilize alguém como um bode espiatório.

126
Não utilize alguém como um bode espiatório. Isso pode começar no
primeiro dia de ensaios ou sutilmente ao longo do tempo. Você pode estar
ciente que está fazendo isso ou você pode estar fazendo isso
inconscientemente, até que alguém lhe aponte isso. Bodes espiatórios são
frequentemente assistentes de diretores, ou diretores de palco, ou gestores, ou
atores interpretando pequenos papéis. Trate alguém mal e o respeito de todos
por você na sala de ensaios será prejudicado. Você também vai criar um clima
de medo. Os atores vão ter medo que de repente você vai tratá-los na mesma
maneira. Como resultado, eles vão parar de oferer o melhor de sua
criatividade.
Você vai abalar os atores se deixar que qualquer emoção negativa tome
conta de você - mesmo que justificada. As emoções negativas incluem raiva,
frustração e desespero. Essas emoções vão afetar o seu julgamento – você
não verá as coisas ou mesmo falará claramente sobre elas. Ás vezes é melhor
ir tomar um café, se você sentir uma emoção como esta tomando conta de
você. Controle a emoção, então comece de novo o trabalho. Se você
regularmente experimenta a mesma emoção negativa, trabalhe em si mesmo
fora da sala de ensaio. Descubra o que está causando esse repetida emoção
e, em seguida, quando você experimentar o primeiro sinal dela no trabalho,
aprenda a inibi-la.

08 - Não coloque o tempo como pressão sobre os atores e não


perca tempo.
Nunca dê ao ator a impressão de que não há tempo ou muito pouco
tempo - mesmo se for esse o caso. Curtos períodos em particular criam
ansiedade sobre o tempo e isso leva o diretor a dizer coisas como: "Nós só
temos quatro semanas, por isso temos que trabalhar muito rápido. "Isso faz
com que o ator sinta que não há tempo para construir qualquer coisa
corretamente ou explorar. Isso coloca-os sob pressão e eles podem tomar
atalhos e perder a fé necessária nas etapas do processo. Mantenha a sua
ansiedade sobre o tempo para si mesmo. Converse com um ator que
desperdiça o tempo, tenha uma palavra tranquila com ele, talvés até em uma
xícara de chá no final de um dia de ensaio. Aponte a ele o que ele esta fazendo
- por exemplo, constantemente voltar mais tarde em um intervalo entre os
ensaios – converse sobre o efeito negativo que tem sobre o grupo. Peça-lhes
educadamente para parar. Não confronte um ator que desperdiça seu tempo,
não olhe constantemente para o relógio na sala de ensaios. Em vez disso, veja
a possibilidade de colocar um relógio na parede em uma posição que você
pode facilmente olhar para ele sem que ninguém perceba. Você pode manter
um olhar rigoroso no tempo sem afetar qualquer pessoa com sua ansiedade no
tempo.
Não perca tempo. Quando você está começando como diretor, é fácil
perder um tempo precioso explicando suas idéias ou justificando o seu
processo. Você pode pedir aos atores para que façam um exercício, em

127
seguida, passar 10 minutos explicando o pensamento por trás desse exercício.
Os dez minutos de explicação é um sinal de ansiedade sobre a sua
inexperiência. Em vez disso, basta pedir aos atores para fazerem o exercício.
Se alguém questiona a idéia por trás do exercício ou o processo, sugira
firmemente fazer a tarefa em primeiro lugar e, em seguida, ver se o ato de
fazê-lo responde aos questionamentos e suas preocupações. Nove vezes em
cada dez, fazer o exercício resolve as coisas. Se não, explique as coisas de
uma forma simples e breve após o exercício terminado.
Se você tem um curto período de ensaios, estude todos os aspectos do
seu estilo de direção e o processo a partir de um ponto de vista do tempo. Veja
se existem etapas que você pode cortar ou comprimir - ou quaisquer áreas
fracas que você pode retocar de modo que você seja mais eficiente e flexível
com o uso de tempo. Isto vai poupar tempo sem que os atores saibam que
você está preocupado com isso. Mais uma vez, não olhe constantemente para
o relógio na sala de ensaios. Em vez disso, colocque um relógio de parede
como descrito anteriormente.

09 Fique de olho nos atores ''que pensam demais no público".


Naturalmente, diretores e atores devem ter pensamentos sobre o público
- o trabalho está sendo feito inteiramente para eles. Mas, existem pensamentos
úteis para os atores e os pensamentos que não são úteis. Pensamentos úteis
são: "Eu quero o personagem em uma situação que seja clara para o público ",
ou "O público são moscas na parede”. Pensamentos que são menos úteis são
aqueles que ficam questionando a maneira deles de interpretar os personagens
nas situações e que podem distorcer e perturbar o que o ator está fazendo. Por
exemplo, uma ator pode pensar 'Eu quero impressionar o público", o que
resulta neles em um artificialismo e numa valorização excessiva do que estão
fazendo, adicionando alguns floreios vocais. Ou, eles podem querer mudar a
posição de onde estão, como ficar em pé, a fim de ser visto pelo público ou
aumentar a sua voz irrealisticamente. Alternativamente, um ator que pense
"Estou entediando o público" irá acelerar artificialmente o que ele está fazendo.
É possível que a presença do público os assuste ou faça com que se
ensimesmerem. Eles não serão capazes de controlar o que fazem e as suas
mãos vão tremer. Todas estas respostas criam material físico e vocal que não
está presente na situação em que seus personagens se encontram. Este
material adicional confunde o público.
Aprenda a diferenciar entre ações ou gestos que refletem um ator
interpretando um personagem em uma situação, e aqueles que refletem um
ator ensimesmado em um palco. Por exemplo, um ator ensimesmado pode
esfregar várias vezes um dedo sob seu nariz, colocar a mão sobre sua boca
quando está falando ou passar a mão no seu cabelo o tempo todo. Esses
pequenos tiques físicos não são uma expressão da personagem que eles estão
interpretando. Inicialmente, não aponte ações ou gestos diretamente para o
ator. Em vez disso, continue a dar indicações sobre coisas como o tempo ou

128
lugar ou relacionamentos. Estas instruções devem começar a mergulhar o ator
na ação e os gestos ensimesmados devem lentamente diminuir. Se você é
incapaz de desalojar esse ensimesmamento ao longo do tempo, chame a
atenção do ator para esses momentos onde o pensamentos está voltado
demais para o público, e peça-lhes para abaixar o volume dos seus
pensamentos sobre a platéia.

10 Deixe calras as fronteiras entre a vida privada e profissional dos


seus atores.
Incentive os atores a traçarem fronteiras claras entre a sua vida privada
e seu trabalho. Atores, muitas vezes, recorrem a eventos pessoais em suas
vidas para construir aspectos de sua personagens - se você perguntar a eles
ou não. Se você percebeu isso sendo feito e for útil para a peça, não se
intrometa nos eventos pessoais subjacente às suas escolhas. Se um ator
começa a usar a sala de ensaio como um consultório terapêutico, encontre
uma maneira de pará-los imediatamente. Você pode falar com eles diretamente
sobre o problema, ou usar a idéia de afinidades ou impressões para para-los
de impor emoções impróprias de sua vida privada sobre o personagem. Se o
ator começa a falar com você sobre sua vida pessoal, reduza essa conversa
logo que possível - a não ser, é claro, se for uma séria preocupação que irá
afectar a sua capacidade de fazer o trabalho, como a doença mortal de um
ente amado. Lembre-se, você não tem qualificações como um terapeuta e você
pode encontrar-se fora de sua área muito rapidamente. Lembre-se também que
a direção é sobre como fazer espetáculos claros, em vez de resolver os
problemas pessoais dos atores. Se você se mistura com os atores socialmente,
mantenha as fronteiras claras.

11 Evite instruções de última hora.


Você deu aos atores cinco coisas que você queria que eles fizessem,
você sugeriu, e eles levam alguns minutos para digerir suas instruções. Eles
estão prontos para a prática do cena, eles estão de pé na sala prestes a
começar e você já sentou-se com o seu notebook pronto para assistir o
trabalho. Então, de repente você salta para cima e diz: "Ah, sim, e outra coisa,
concentre-se no momento do dia!" Os atores, em seguida, fazem a cena. Esta
última instrução dada no último minuto irá desfazer todas as cinco outras
instruções que você deu, será aquela que será realizada mais porque é a mais
alto nas mentes dos atores. Também vai ser realizada de modo errado porque
não tiveram tempo para digerir a instrução adequadamente. Então, se você tem
um pensamento de última hora, não dê para os atores pouco antes de ensaiar
uma cena. Em vez disso, anote-o em seu caderno e passe na próxima vez que
você ensaiar a cena.

12 Mantenha a calma

129
Há momentos em cada processo de ensaio, onde o diretor privada - ou
publicamente - perde a coragem. Por exemplo, você pode não ser capaz de
mergulhar um ator no personagem com precisão e você pode começar a se
sentir derrotado pelo esforço para fazê-lo. Se um ator não é capaz de aprender
a sua fala e que pode de repente parecer impossível que ele consiga
desempenhar o papel, é possível que a primeira leitura rápida de peça seja um
desastre completo, sem estrutura ou clareza. Como você gerencia esses
momentos vulneráveis determina o sucesso da produção e o que o público vai
ver. Realize o seu trabalho com renovada determinação. Tente manter a calma;
será melhor para todos os envolvidos na produção. Lembre-se, quanto mais
você praticar seu ofício, mais sintonizado você estará naqueles momentos de
nervozismo. Este conhecimento vai fazer com que você consiga controlar a
situação melhor.
Haverá também momentos no processo quando a sala de ensaio de
repente e inesperadamente se transformará em um lugar assustador. Isso pode
ocorrer porque problemas pessoais do relacionamento entre dois atores (que
você não sabe nada sobre) explode na frente de você, ou talvez um ator tem
consistentemente tentado prejudicar outro. Estes eventos caracterizam-se por
súbitas explosões de emoção, normalmente agressão ou lágrimas. Outro ator é
muitas vezes o alvo, mas o director também pode estar em risco. Quando isso
acontecer, lembre-se que você está no comando e, se as coisas ficarem fora
de controle, você pode sabiamente pedir uma pausa. Certifique-se de deixar a
sala de ensaio, caminhe em volta do bloco algumas vezes, sozinho ou com
alguém que você pode confiar (como um diretor de palco ou um ator que não
está diretamente envolvidos no evento). Analise o que aconteceu e pense nos
melhores passos que você pode tomar para lembrar todos os envolvidos que
este é um ambiente profissional.

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RESUMO

01 - Cultive a paciência e o pensamento a longo prazo.


02 - Seja consistente.
03 - Não se preocupe em ser amado
04 - Faça com que o texto seja um mediador de conflitos.
05 - Não culpe automaticamente o ator se algo deu errado.
06 - Sempre peça desculpas se você cometer um erro.
07 - Não utilize alguém como um bode espiatório.
08 - Não coloque o tempo como pressão sobre os atores e não perca
tempo você mesmo.
09 - Fique de olho nos atores ''que pensam demais no público".
10 - Deixe calras as fronteiras entre a vida privada e profissional dos
seus atores.
11 - Evite instruções de última hora.
12 - Mantenha a calma.

9.3 Estabelecendo a linguagem do seu processo

Esta forma de trabalho utiliza uma linguagem que é muito particular;


portanto é útil encontrar uma maneira de introduzi-la para os atores com
clareza e precisão. No entanto, mesmo se você não estiver usando a
linguagem deste processo é útil que pense em como você vai apresentar a sua
forma de trabalhar com os atores. Você pode até não estar consciente de que
você use um vocabulário específico para falar sobre a atuação, por isso antes
dos ensaios gaste um pouco de tempo pensando sobre as palavras você vai
usar e considerando a melhor forma de apresentá-las na sala de ensaio.

O melhor é introduzir essa linguagem desde o primeiro dia de ensaio.


Será um ponto de referência estável para os atores e fornecerá objetividade.
Você pode apresentá-la usando palavras-chave repetidas vezes em suas
sentenças ou em relação a um determinado degrau na processo.
Alternativamente, você pode simplesmente informar a todos desde cedo que
estas são as palavras que você usa para falar sobre o trabalho. Certifique-se
sempre de dar exemplos concretos do que você quer dizer com algumas das
palavras que você introduziu. Escolha um exemplo da peça que você está
trabalhando ou da sua vida para pontuar de forma clara. Por exemplo, quando
você introduz a palavra "afinidade", selecione um personagem para descrever.
Por exemplo, aponte que Arkadina tem quatro aspectos fundamentais para sua
personagem: ela é uma atriz, uma mãe, uma amante e uma irmã. Interpretar

131
uma afinidade significaria alimentar um ou dois aspectos do personagem e não
todos os quatro. Todos os quatro tem que estar no lugar para o personagem
funcionar plenamente na peça.

Atores vão entrar em sua sala de ensaios falando diferentes línguas


sobre o seu ofício. Estas linguagens refletem a sua formação e experiência
profissional. Quando você apresentá-los para a sua linguagem (o do processo
aqui descrito), não faça de uma forma que sugira que seja a única maneira de
falar sobre a atuação, porque não é. Em vez disso, assegure a eles que é
apenas uma das muitas línguas, mas que estas palavras ajudarão todos a
trabalhar em conjunto, se todos eles concordarem em usá-las durante este
trabalho. Aqui estão alguns exemplos das palavras-chave deste processo que
você deve introduzir em suas frases logo no início.

Use a palavra "afinidades" para orientar o ator a olhar para o


personagem objetivamente. Incentive-os a ler o texto com cuidado para ouvir a
"impressão" que o escritor está dando em caso de divergência ou confusão.
Advirta contra ser muito 'interpretativo' sobre seus personagens ou outros
personagens da peça. ("Interpretativa" significa julgamentos superficiais e
fracos de valor sobre o personagem baseado numa leitura simplista de uma
cena.) Por exemplo, em 'A Gaivota' uma declaração interpretativa seria
"Arkadina é profunda" ou “Nina é ingênua". Juízos de valor como este podem
fazer os atores desempenharem seus personagens em duas dimensões.
Introduza a palavra "prática" para descrever qualquer trabalho nas cenas. Você
pode usar esta palavra em vez das palavras "executar" ou "ensaiar", a palavra
"prática" cria uma pressão sobre o ator para entregar-se em uma cena desde a
primeira vez que a ensaiar e estimula o pensamento a longo prazo. Fale sobre
imagens passadas e imagens do futuro para ajudar os atores a concretizar o
passado de seus personagens e seus desejos para o futuro. Outras palavras
como "intenção", "evento", "tempo" ou "lugar" são melhor introduzidas quando
você está dando retorno em exercícios de atuação, eu escrevo sobre como
fazer isso no capítulo 10.

Lembre-se também de que você não tem que usar os termos constantes
neste livro, a fim de utilizar as ferramentas descritas. Alguns atores vêem
"intenção" ou "evento" como palavras desagradáveis. Faça-os sentir como se
eles fossem amostras científicas em um laboratório; talvez estas palavras não
soem da maneira que eles experimentaram no comportamento humano. Se um
ator reage fortemente contra um termo, pare de usá-lo. Encontre uma maneira
mais simples de descrever o que você deseja investigar. Em vez de "Intenção"
peça: "O que o seu personagem quer?" Em vez de "evento" pergunte-lhes:
"Onde é que as coisas mudam para todos os personagens?"

Em seguida, estabeleça as palavras com que o trabalho vai ser


classificados e medido. Por exemplo, remova as palavras "bom", "mau", "certo"

132
e "errado" do vocabulário da sala de ensaio. Estes são os juízos de valor que
podem posicionar você inadequadamente em relação ao ator - como pai ou
árbitro moral. Substitua-os com palavras como "claro" e "escuro", "específico" e
"inespecífico", "focado" ou "borrado". Estabeleça uma cultura em que o maior
elogio que um ator pode receber é: "Isso foi muito claro." Estas palavras, por
sua vez, posicionam o diretor em um papel mais próximo ao de um membro do
público acompanhando o desempenho pela primeira vez.

Lembre-se de manter a sua língua na proporção das circunstâncias. O


uso de palavras hiperbólicas de louvor como "excelente" ou "brilhante" podem
ser contraproducentes. Elas perdem valor com a repetição. Da mesma forma,
um vocabulário mais sensacionalista com palavras como "completamente
horrível" ou "um desastre" não vai ajudar os atores a construir qualquer coisa.
Às vezes, diretores usam esse tipo de linguagem em resposta a pequenas
falhas em uma cena. Usar essas enormes palavras para minúsculo problemas
não ajuda ninguém a tomar uma ação adequada para o que eles estão fazendo
ou precisam fazer.

Fique de olho em como os atores descrevem seu próprio trabalho. Eles


podem usar uma linguagem que é auto-flagelatória ou depreciativa. Eles
podem dizer coisas como "isso foi uma porcaria', ou “eu falhei terrivelmente
com essa tarefa”. Então informe suavemente os atores que as palavras que
eles utilizaram não descreve com precisão o que eles fizeram e o que você viu.
Dizer coisas como: "Foi interessante que você tenha usado a palavra "porcaria"
ali. Eu penso que tempo e lugar foram interpretados com precisão. Mas talvez
você precise afiar um pouco como você interpretou sua intenção".

Encontrar palavras exatas que descrevam os pontos fortes e fracos do


trabalho dos atores faz você incentivar um ensaio num ambiente mais calmo e
mais comedido. E se você precisar ajustar sua linguagem, de qualquer
maneira, tente sempre reduzir a escala de qualquer problema adicionando
"minúsculo", ou "pouco" ou "um pouco" para suas notas.

Finalmente, tenha cuidado para evitar frases feitas que carregam


significados negativos. Elas certamente não fazem o ator sentir que este é mais
um passo em um processo pelo qual eles vão tornar-se imersos em uma
situação ou personagem. Em vez de usar esta frase, descreva a tarefa real
usando uma linguagem simples. Deixe os atores saberem que vão estar em
execução ou praticando seus textos.

133
RESUMO
Introduza a línguagem do seu processo no primeiro dia de ensaios e
mantenha-a
Use palavras-chave de forma consistente em suas sentenças, ou
apresente-as em relação a um determinado degrau no seu processo
ou simplesmente informe a todos que estes são as palavras que você
usa.
Enfatize que a sua línguagem - e o sistema descrito não é a única maneira
de falar sobre o fazer teatral. Ele é apenas algo que este conjunto vai
aderir para este trabalho.
Deixe os atores saberem as palavras-chave que você vai usar para lhes
dar o retorno sobre o seu trabalho.
Mantenha a sua linguagem, na proporção das circunstâncias.
Evite frases feitas que carreguem significados negativos.

9.4 Como dar retorno aos atores sobre o seu trabalho

Aprender a falar precisamente com os atores sobre sua atuação é


fundamental para uma boa direção. O primeiro passo para alcançar isso é ser
uniforme na forma como você passa o retorno ao final da atuação nos
exercícios, ensaios de cena, de passagem, corridos e performances. Os
problemas ocorrem quando há mais de uma maneira de dar apontamentos
para o ator uma nos ensaios, uma no ensaio técnico e outro nas
apresentações. O relacionamento entre ator e diretor quebra no pontos das
alterações de linguagem, porque o ator sente uma súbita mudança na forma
como falou e o que o diretor espera. Lembre-se, também, que as metas de
uniformidade e língua irão aumentar a capacidade do ator para ser auto-critico -
E, a mais longo prazo, a auto-direção. Isto significa que eles podem.
Observarem-se, mais precisamente, individualmente ou como um grupo,
durante a realização das performances quando você não está lá.

Aqui está uma lista das áreas de trabalho dos atores que você deve
estar dando apontamentos. Fique de olho em todos estes ingredientes a cada
passo em seu processo a partir do primeiro dia até a última noite, e o trabalho
será construído corretamente e completamente.

- Tempo
- Lugar
- Circunstâncias imediatas
- Eventos

134
- Intenções
- Personagens (fotos de eventos passados, tempo, pensamentos e futuras
fotos)
- Relacionamentos

Os Capítulos 10 e 11 irão mostrar-lhe como configurar cada tarefa nesta


lista pratica com os atores.

Quando você estiver assistindo o trabalho dos atores observe com muita
precisão o que eles estão fazendo. Isto significa que você tem que olhar para
corpo inteiro dele, e não apenas o rosto. Preste atenção a todos os pequenos
detalhes físicos, como um movimento de um olho, uma contração de um pé ou
a forma como eles se sentam pesadamente em uma cadeira. Observar
detalhes físicos precisamente é uma habilidade que você pode treinar. Grande
parte das informações sobre coisas como tempo, lugar ou eventos estarão
contidas nos detalhes físicos. Se, por exemplo, alguém está com calor,
poderiam fazer minúsculo ajustes nas roupas ou como eles estão sentados em
toda a cena. Caso alguém tenha acabado de ouvir alguma má notícia, podem
sentar estáticos ainda por um momento e então segurar a mesa com as mãos,
a fim de equilibrar-se. Você também deve prestar atenção ao que o atores
estão dizendo e como estão dizendo - mas lembre-se que as informações
sobre o que está acontecendo dentro de alguém vem de uma combinação de
aspectos físicos e de suas palavras. Pode ser muito fácil fixar-se em ouvir as
palavras e esquecer de olhar para os corpos.

Sempre dê retorno aos atores depois de terem feito qualquer trabalho de


prático para você, em qualquer fase do processo, mesmo que você tenha
acabado de dar um breve apontamento sobre o tempo ou o lugar. Dê os
apontamento em frases simples e curtas. Por exemplo, diga: "Sua intenção não
estava clara quando você entrou na sala de jantar até o momento em que você
sentou-se" ou "Você não deu a impressão de que eram 12 horas e estava
quente durante toda a cena." Seja específico e concreto. Misture as críticas e
os elogios, e vice-versa - por exemplo: "Você interpretou as circunstâncias
imediatas com muita precisão quando você estava carregando as malas, mas
foi menos preciso quando você escreveu as etiquetas da bagagem."

Não dê um apontamento, se você não puder pensar de um forma


econômica e concreta de dizê-la. Este é um sinal de que você não está
totalmente certo do problema que o ator tem ou da direção que você quer, ou
em que você quer que eles se concentrem. Nestes casos, assista a cena
novamente e veja se você pode isolar o que eles precisam fazer para melhorar
o trabalho.

Seja imparcial e certifique-se de observar todos os atores envolvidos na


cena ou chamados para a sessão de apontamentos - mesmo se você acabou
de dar uma única instrução. Dessa forma, todos sentem que seu trabalho
135
contribuiu e que foram valorizados. Observe se um ou dois atores estão
contantemente recebendo mais retorno que o resto do grupo. Esses atores
podem se sentir inadequados ou colocado em evidência a seus sentimentos
podem impedí-los de melhorar o que estão fazendo. Acrescente equilíbrio dê
menos apontamentos por um período. Isso pode diminuir a pressão sobre os
atores e pode levar a resultados mais claros. Alternativamente, você pode
armazenar suas notas sobre um ensaio e lentamente alimentá-los durante um
longo período de tempo.

Dê a sua opinião sobre o trabalho quando estiver claro e quando não


estiver. Às vezes, você pode se concentrar nas coisas que não são claras e se
esquecer de dar retorno sobre as coisas que estão indo bem. Isso pode gerar
insegurança em atores que podem interpretar a ausência de retorno positivo
como um sinal de desaprovação ou de um trabalho ruim. Quando você der
retorno sobre um trabalho que está indo bem, lembre os atores o que causou
essa clareza. Por exemplo, informe que foi a nova intenção que clarificou o que
estavam fazendo, ou que foi uma agudização da imagem de um evento em sua
histórica passada que levou a esse trabalho mais claro. Atores precisam ser
capazes de repetir o trabalho claramente. Eles vão fazer isso de forma mais
eficiente se você lembrá-los sobre o que causou a clareza, em vez de
descrever o que o resultado parecia. Mas não dê falsa confiança, dando um
retorno positivo sobre o trabalho que não está indo na direção certa.

Sempre apresente o retorno abertamente em um grupo, em vez de dar-


lhe em particular com os indivíduos no canto da sala. Dessa maneira todo
mundo ouve todas os apontamentos e ninguém pode ser perturbado por uma
nova escolha interpretada por um colega. Essa abertura também remove
favoritismo e hierarquia, como você é visto e como trata todos igualmente. É
importante ter em mente que se você realizar os apontamentos individualmente
um ator pode contradizé-lo e apontar o dedo culpando outro ator. Eles podem
dizer: "Eu não posso fazer o que você está me perguntando porque o ator X
não está realizando a intenção." Como alternativa, o ator pode utilizar a
situação para falar longamente sobre problemas pessoais em suas vidas -
assim, posicionando-o num relação terapêutica inapropriada. Há alguns
momentos muito raros, quando você precisa quebrar essa regra e lidar com um
agente externo ao grupo - por exemplo, se um ator está realmente lutando para
entender uma instrução ou levando-o a fazer um longo explanação que ele está
resistindo em enender. Se este for o caso, arranjar um tempo para conversar
com eles em particular e certifique-se de manter a conversa eficiente e breve -
e no interior do local de ensaio.

Atores recebem apontamento ou instruções de muitas maneiras


diferentes. Alguns compreendem rapidamente, sem dizer nada. Outros
precisam falar com você durante um tempo para entender exatamente o que é
você está dizendo. Seja paciente. Os apontamentos são inuteis a menos que o

136
ator compreenda e absorva. Às vezes, falar sobre um apontamento é
simplesmente uma maneira do ator digerí-la corretamente – assim não
confunda a conversa com a discordância.

Se um ator discorda fortemente do seu retorno, acolha-o. Olhe para a


cena ou repita e veja se você não cometeu um erro de diagnóstico. Se você
tiver feito um erro, simplesmente reconheça o erro. Se não, estude o problema
novamente. Se você perceber que a resistência por parte do ator aos seus
apontamentos se deve a um desejo de interpretar algo diferente do texto, dê o
apontamento novamente - explicando que você olhou para a cena com mais
cuidado e sentiu que apontamento ajudaria. Como alternativa, procure uma
maneira diferente de dar o mesmo apontamento. Se você der um apontamento,
peça-lhes para fazer novamente, mas de forma mais acentuada. Ou diga que
você vai assistir com mais cuidado para verificar se você não cometeu nenhum
erro.

O tempo que leva para dar o retorno varia em diferentes fases do


processo. Por exemplo, depois de um ensaio precoce de um cena, você não
deve gastar mais de dez minutos dando apontamentos. Mas depois de um
tempo, você pode gastar entre uma e duas horas e meia em uma sessão de
apontamentos. Nos capítulos 11 e 13, eu escrevo especificamente sobre como
lidar com notas e sessões depois de passar a peça na sala de ensaios ou após
as apresentações públicas no teatro. Eu também escrevo sobre o efeito do
estréia eminente sobre os atores e a capacidade de tomar notas.

Encontre uma maneira eficiente de escrever seus apontamentos e


certifique-se que cada nota que você anota é legível. Aceite que você pode
perder algumas coisas na ação. Aceite também que suas anotações vão
alcançar os atores e que alguns atores serão afetados pela movimento de sua
caneta como ela escreve, porém eles estarão imersos na situação. Se você
está ansioso e não quer perturbar o seu trabalho escrevendo uma nota no
momento que ela vem a você, pratique guardando notas em sua memória até
que haja um melhor momento para anotá-las. Desenvolva um atalho para que
você não tenha que escrever tantas palavras para cada nota. Eu usava a letra
d com um círculo em volta dela D para designar uma questão de design, a
letra P com um círculo em volta dela para designar a palavra "Pensamento", a
letra I com um círculo em volta dele para denotar "Intenção", B para denotar
"biografia" e assim por diante. Não descreva o problema que você está
observando em detalhes. A anotação é breve, para lembrá-lo do problema
quando você lê-las de volta. Lembre-se: nunca dê um apontamento, se você
não puder decifrar sua caligrafia; em vez disso, coloque um ponto de
interrogação ao lado e siga em frente. Olhe para trás sobre a seus escritos ao
final do dia para ver se você pode decifrar o que você escreveu. É preciso
tempo para aprender a observar bem os atores e dar um retorno
eficientemente. Pratique esta habilidade observando o trabalho dos atores em

137
outras produções que você vê. Escolha um ou dois itens da lista de verificação
no início desta seção e trabalhe com eles em mente. Tome notas mentais ou
literais como uma forma de fortalecer os músculos que dirigem. Também
ajudará a não cair em juízos de valores fáceis sobre o trabalho de outros
diretores. Em vez disso, você vai ser capaz de identificar com precisão onde
estão os pontos fortes e fracos do diretor ou dos atores - melhorando assim
suas próprias habilidades.

RESUMO
Seja uniforme na forma como você expõe suas notas em todo o processo
de ensaio e apresentações públicas da peça.
Tenha uma lista fixa de metas ao anotar, que permanece o mesmo em
todo o processo.
Dê retorno aos atores para qualquer trabalho prático de atuação que
eles fizerem para você.
Faça apontamentos em uma linguagem simples e concreta.
Misture crítica com louvor.
Não dê um apontamento, se você não puder pensar de uma forma clara e
concreta de dizê-la.
Seja imparcial com o seu retorno.
Dê notas para os atores quando o trabalho que eles fizerem for claro.
Dê todas as notas abertamente no grupo e garanta que você dá retorno
para todos os envolvidos.
Compreenda que os atores vão digerir os apontamentos em uma ampla
variedade de maneiras.
Se um ator não concorda com um apontamento, recolha e estude a cena
para ver se você cometeu algum erro.
Esteja preparado para o fato de que dar retorno tomará quantidades de
tempo diferentes em diferentes fases do processo.
Encontre uma maneira eficiente de tomar notas em seu caderno de
anotações.
Pratique anotações tomando notas em produções de outros diretores.

138
9.5 Como sentar-se na sala de ensaio

Muitos diretores não estão cientes do impacto da maneira como eles


sentam ou o que eles fazem na sala de ensaios sobre os atores. Por exemplo,
alguns diretores se sentam largados atrás de uma cadeira com os braços
cruzados. Isto dá aos atores a impressão de que ele está julgando o trabalho
ou que eles estão entediados. Outros se inclinam para a frente com as pernas
cruzadas e uma perna para cima e outra para baixo, Isto dá aos atores a
impressão de que estão tensos e nervosos. Outros olham repetidamente em
seus relógios, o que dá aos atores a impressão de que há muito pouco tempo
para ensaiar ou que o diretor está entediado. Às vezes, nenhum desses
pretende dar a impressão descrita e eles teriam até vergonha se fossem
apontados assim. No entanto, todos essas posturas para sentar e atitudes
físicas afetam a forma como os atores trabalham.

Observe como você se senta, como você vê os atores atuando. Cobre de


si mesmo se você está sentado de uma forma que é propícia para o seu
trabalho. Se não tiver certeza, ajuste a sua posição e veja se faz alguma
diferença para os atores.

RESUMO
Sente-se na sala de ensaio de uma forma que faça com que os atores
sintam que você está interessado em seu trabalho.
Observe como você se senta e se pergunte se é propício para os atores.

9.6 Apresentando o texto para os atores

Idealmente, os atores terão o texto que você quer trabalhar antes do


primeiro dia de ensaios. Se você tiver preparado o texto para os atores (como
descrito no Capítulo 4), certifique-se de que este foi partilhado antes dos
ensaios de modo a que todas as pessoas estão trabalhando a partir do mesmo
documento.

Quando você se senta pela primeira vez para ler a peça, explique as
razões por trás de todos os cortes que você fez para a direções de palco e
sugira firmemente que os atores aceitem, em vez de perder tempo comparando
diferentes versões publicadas do texto ou outras traduções. Na minha
experiência, é melhor quando o texto é um ingrediente fixo e estável na sala de
ensaio. Um valioso tempo, às vezes, pode ser desperdiçado comparando

139
versões ou traduções - com muito pouco resultado útil. Isto é particularmente
importante se você não tem um longo período de ensaio.

Apenas faça alterações ou cortes no texto durante o período de ensaio


quando for absolutamente crucial - por exemplo, se a história não é clara ou se
a estrutura geral não funcionar. Cortes inoportunos podem desestabilizar os
atores e fazer o seu trabalho menos concreto. Tente esperar até que a obra
esteja segura sob os pés dos atores antes de fazer cortes, e tente entregar
todos os cortes de uma só vez. Evite uma situação em que você faz cortes
todos os dias nos ensaios: Isto irá afetar os atores, na capacidade de construir
um trabalho sólido ou duradouro. Lembre-se que eu estou escrevendo aqui
sobre formas de abordar o texto de escritores mortos; a apresentação do texto
de um escritor vivo requer um tratamento muito diferente.

RESUMO
Explique a razão por trás de alterações no texto no primeiro dia de ensaio,
mas deixe claro que o texto na mão é agora um elemento não
negociável do processo.
Apenas faça alterações ou cortes no texto, se for absolutamente
necessario.

9.7 O primeiro dia de ensaio

Os primeiros dias são sobre como gerenciar o medo de todos de forma


eficiente para que todos possam ter um dia de trabalho adequado e útil. Se
alguém tem medo, ele não guardará bem as informações ou responderá
precisamente as tarefas, por isso considere algumas coisas que você pode
fazer para reduzir esse medo. A leitura formal na frente de um público
convidado é o que alimenta muitos dos primeiros dias e que pode ser
completamente aterrorizante para os atores - eles podem começar a murmúrar,
ficarem paralisados segurando seus copos de café, ou construir e elaborar
performances clichês que serão difíceis de serem deixadas para trás.

Na minha experiência, essa leitura não é uma coisa útil de se fazer e


gostaria de sugerir que em vez disso você construa um dia com uma série de
passos simples e relaxantes em que ninguém é colocado em esposição. Não
confunda isso com uma licença para desperdiçar um dia de ensaio. É
perfeitamente possível tratar o primeiro dia como um dia de trabalho adequado

140
e fazer um trabalho criativo ao mesmo tempo em que se enfrenta o medo. Aqui
estão algumas sugestões sobre o que poderia ser útil fazer no primeiro dia de
ensaios.

Comece dizendo aos atores o que você vai fazer durante o dia para que
eles tenham um plano em suas cabeças. Em particular, deixe-os saber que
você não vai fazer uma leitura pública. Em seguida, faça um aquecimento
suave, com exercícios físicos que possam suavizar o medo que estiver preso
ao corpo. Se você tem um diretor de palco ou um preparador corporal, eles
serão capazes de fazer este trabalho ou você pode permitir que os atores
utilizem 20 minutos ou mais para se aquecer por conta própria. Siga este
aquecimento com algo mais físico que se relacione com a produção e traga os
atores juntos em pares ou em um grupo inteiro.

Enquanto trabalhando na ‘A Gaivota’ e ‘Três Irmãs’, os atores


aprenderam danças de salão - valsa e tango. Isso quebrou o gelo entre as
pessoas e também significava que eles começaram a trabalhar em algo para a
peça. Alguns atores gostam de mudar e trocar de roupas para trabalhar melhor
fisicamente, certifique-se de ter organizado um lugar para eles fazerem isso.
Não presuma que os homens e as mulheres serão felizes em fazer isso na
mesma área.

Leia as cenas, mas sem atores lendo sua própria parte. Vá em círculo
com cada pessoa dizendo uma fala a cada tempo. Certifique-se de que as
rúbricas e todos os adjetivos entre parênteses sejam lidos. Incentive os atores
a ler o texto agora sozinhos e tranquilize-os de que nenhuma atuação é
necessária agora. Você, o diretor de palco e os outros membros da equipe
criativa também podem participar desta leitura, e isso vai ligar todos os que
trabalham no projeto juntos. Essa é a forma como foi feta a leitura com 10
pessoas da primeira cena de ‘A Gaivota’.

Pessoa 1: Lê a lista de personagens


Pessoa 2: A seção do parque na propriedade de Sarin. Uma ampla avenida
leva para longe do público para as profundezas em direção ao lago. A avenida
é fechada por um palco que corre até alguma casa de entretenimento, de modo
que o lago é completamente invisível. Saindo do palco há um arbusto, algumas
cadeiras e uma mesa de jardim.
Pessoa 3: O sol acaba de se por. No palco improvisado, por trás da cortina
abaixada, estão Yakov e os outros TRABALHADORES; tosse e martelos
batendo podem ser ouvidos. MASHA e Medvedenko entram à esquerda, em
seu caminho de volta a partir de um andar.
Pessoa 4: Por que você sempre se veste de preto?
Pessoa 5: Eu estou em luto por minha vida. Estou infeliz

141
Pessoa 6: Por quê? [Reflexiva] não entendo. Você tem sua saúde. Seu pai
pode não ser rico, mas ele não é mal, eu tenho uma vida muito mais difícil que
a sua.
Pessoa 7: [Eles se sentam]
Pessoa 8: Não é uma questão de dinheiro. Mesmo um mendigo pode ser feliz.
Pessoa 9: Teoricamente, na prática, se resume a isto: minha mãe e eu, além
de minhas duas irmãs e meu irmão mais novo e apenas 23 rublos por mês
chegando. Você quer dizer que não tenho que comer e beber? Não há
nenhuma necessidade de chá e açúcar? Não há necessidade de tabaco? Eu
não sei como gerenciar isso.
Pessoa 10: [Olhando em volta ao palco improvisado] O show vai começar em
breve

Depois de ter lido toda a peça, divida o conjunto em grupos menores e


dê a cada um uma tarefa específica. Trabalhar em pequenas equipes ajuda as
pessoas a conhecer uns aos outros e começamrem a aprender a trabalhar em
conjunto. Por exemplo, você pode pedir a um grupo para coletar informações
sobre uma categoria específica (como descrito no Capítulo 10). Por fim, faça
um breve relato sobre o escritor. Converse através dos três ou quatro fatos
essenciais sobre a sua biografia que você preparou (ver Capítulo 3) e discuta
como eles lançam luz sobre a peça. Lembre-se que este exercício deve ser
tratado de uma maneira diferente se você estiver trabalhando com um escritor
vivo.

No final do dia, defina para os atores uma tarefa simples como uma
pesquisa a se fazer durante a noite. Por exemplo, pedir-lhes para encontrar
três fatos sobre o tempo que a peça definide. Com ‘A Gaivota’ eu solicitei aos
atores que encontrassem três fatos sobre a Rússia no final de 1890. Com a
peça ‘O País’ de Martin Crimp pedi aos atores para localizarem três fatos sobre
o médico britânico e a profissão em 2000. Ao definir esta tarefa, dê um exemplo
do resultado desejado. Tarefas de casa como esta são uma forma útil de ajudar
os atores a pensar na direção certa para a se trabalhar fora da sala de ensaio.
Você pode usar essa ferramenta durante todo o período de ensaio. Atores
deverão sempre pensar sobre o seu trabalho fora do horário de ensaio, por
vezes, eles vão fazer isso de uma forma que não é útil. Eles podem, por
exemplo, se preocupar em um pequeno momento na ação ou sobre a sua
capacidade de fazer a coisa toda claramente. Tarefas de casa são uma forma
de encher suas cabeças com pensamentos que são úteis para o que eles têm
que fazer. No entanto, aborde o uso da palavra "trabalho de casa" com cautela.
Alguns atores têm associações negativas com esta palavra por causa de
experiências infelizes durante os anos escolares. Use a palavra de forma leve,
ou, se as pessoas reagem fortemente contra ela, encontre uma outra maneira
de dizê-la.

142
Diretores também têm que lidar com os efeitos do medo no primeiro dia.
O medo pode fazer você falar mais rápido do que normal; esta aceleração em
pensamentos e palavras significará que você não está 100% claro no que você
está dizendo. Iste pode confundir os atores. O medo pode fazer seus
pensamentos pularem, ou você pode falar muito. Suas tentativas de esconder
seu medo podem criar mais problemas - Por exemplo, você pode parar de
observar a reação que outros têm com o que você está dizendo.

Durante uma oficina, um jovem diretor já descreveu como ele lidou com
seu medo no primeiro dia de ensaios. Ele disse que tentou dar a impressão de
ser mais organizado e eficiente. Pedi para reencenar isto com o resto do grupo
de atores. A impressão de que ele deu foi de ser abrasivo e rude. Ele não era
consciente disso e estava mortificado em perceber isso. O medo pode também
impedi-lo de ser capaz de lembrar realmente coisas simples e importantes,
como os nomes das pessoas. Portanto, certifique-se de planejar o dia para que
você possa gerenciar seu próprio medo.

Em primeiro lugar, trabalhe apenas com exercícios que você tenha


preparado com cuidado para que você saiba todos os passos e possa
responder a qualquer dúvida. Em segundo lugar, crie um equilíbrio entre os
exercícios onde você lidera o grupo e aqueles que os atores trabalham por
conta própria. Finalmente, existem algumas tarefas como introduzir as pessoas
umas às outras que você não pode evitar, portanto, certifique-se de pensar
sobre isso na noite anterior.

A maioria dos grandes teatros vai querer agendar uma hora para que os
atores e a equipe criativa se encontrem com a equipe artística e administrativa
do edifício. Este evento é muito importante, pois permite que as outras pessoas
no edifício acolham os atores e significa que os atores ficam conhecendo os
rostos e funções das pessoas que eles encontrarão nos corredores do teatro.
Se você puder, evita fazê-lo no primeiro dia. O medo pode ser multiplicado dez
vezes por uma situação social inábil como esta. Em vez disso, agende no final
do dia ou, de preferência, um dia mais tarde. Em seguida todos aqueles
diretamente envolvidos no processo dos ensaios terão que conhecer uns aos
outros.

Todas essas idéias para organizar o primeiro dia podem ser colocadas
em prática na maioria dos ambientes de trabalho, mas haverá casos onde você
terá que fazer coisas como uma leitura ou uma amostragem no primeiro dia.
Isto pode acontecer se você estiver trabalhando para um teatro comercial ou
porque o diretor artístico está indo embora de férias e só pode fazer um
encontro no primeiro dia. Lembre-se de definir esses eventos com sensibilidade
e com uma compreensão do medo que todo mundo experimenta no primeiro
dia. Organize uma leitura de mesa para que os atores e as pessoas envolvidas
escutem, em uma disposição menos opressora do que a de atores de um lado

143
e a "audiência" do outro. Em seguida, peça para que os atores leiam a peça,
focando principalmente no sentido das palavras e lembre-os de que eles não
estão sob qualquer obrigação de atuar. Isto irá reduzir o medo e moderar
qualquer tendência a moldar uma atuação final.

RESUMO
Perceba que o medo é o principal obstáculo para se trabalhar no primeiro dia.
Não faça uma leitura formal.
Utilize apenas os exercícios que você preparou de antemão.
Comece o dia com um trabalho de aquecimento.
Siga com algo físico que se relacione com a produção e os reúna em pares, ou
como um grupo inteiro.
Leia a peça sem que eles leiam suas próprias falas.
Divida o conjunto em grupos menores, com tarefas específicas, trabalhar em
equipes pequenas ajuda as pessoas a conhecer uns aos outros.
Leve um breve relato sobre o escritor.
Defina-lhes uma tarefa de pesquisa simples de ser feita durante a noite como
dever de casa.
Planeje o dia para que você como diretor, possa gerir o seu próprio medo
também.
Não se preocupe se você tiver que cumprir compromissos no primeiro dia;
basta ser sensível em como você irá configurá-las para diminuir o medo no
primeiro dia.

9.8 Maquete

O principal objetivo de mostrar a maquete para os atores é marcar em sua


imaginação uma imagem clara dos lugares onde a ação da peça irá ocorrer. Dê
tempo aos atores para absorver o que eles estão olhando e responda a todas
as perguntas que eles tiverem. Lembre-se: a próxima vez que eles verão o
conjunto será, provavelmente, no teatro, por isso, se você apressar a
apresentação da maquete pode impedí-los de formar uma imagem do ambiente
para alimentar o trabalho deles nos ensaios. Isso pode criar problemas quando
você entrar no teatro, uma vez que haverá uma lacuna entre o que eles

144
imaginam na sala de ensaio e o que encontram pronto. Esta lacuna será mais
difícil para os atores que acreditarem em suas ações nesta fase crítica do
processo sem uma imagem clara do espaço de representação. Da mesma
forma, não mostre a maquete no primeiro dia, será prejudicial devido ao medo
que tende a acompanhar o início do período de ensaios.

Uma vez, na última semana de ensaios, eu tive uma conversa muito


confusa com um ator que não tinha idéia de como o cenário do quarto na cena
final parecia. Eu estava perplexa, porque ele tinha visto a maquete no primeiro
dia de ensaio cinco semanas antes. Eu disse a ele: 'Mas, certamente, você viu
que era assim na maquete? Ele respondeu: "É poderia muito bem ter sido um
ancinho rosa brilhante com uma sacolinha púrpura para que eu carregasse
tudo o que mais importava na cena. Eu estava muito assustado para notar
qualquer coisa: Todo o dia foi um borrão." Percebi, então, que as maquetes das
peças são mais eficazes se deixadas para serem mostradas no segundo ou
terceiro dia de ensaios.

A melhor maneira de aliviar a pressão é uma apresentação da maquete


realizada com o diretor e o cenógrafo juntos para explicá-la. A maquete pode
também ser usada para fornecer uma imagem de como a peça será
compartilhando com as pessoas envolvidas na produção da peça. Se você
puder, faça este apresentação da maquete separadamente, pois estas duas
apresentações têm diferentes objetivos. Em alguns casos, você não terá uma
maquete para mostrar – quer porque você ainda está planejando a enceação
ou porque não havia dinheiro para fazê-la. Em vez disso, encontre uma
maneira de articular a imagem que você tem em sua cabeça sobre o olhar dos
lugares onde a ação ocorre, usando fotografias ou reproduções de pinturas -
mesmo se as imagens que você mostrar sejam apenas palpites sobre o
resultado final.

RESUMO
Dê tempo atores para absorver a maquete e fazer perguntas.
Não mostrar a maquete no primeiro dia de ensaio, o medo pode afetar
alguns atores e eles podem não absorvê-la bem.
Discuta a melhor maneira de apresentá-lo com o cenógrafo.
Combine uma apresentação da maquete para os atores e outra
apresentação para todas as pessoas envolvidas na produção da peça
- mas não nos ensaios.
Se você não tem uma maquete, tente mostrar algumas informações
visuais que indiquem a direção da encenação.

145
9.9 Som, figurinos, adereços, móveis, luzes e elementos cênicos para o
processo de ensaio

Se você está trabalhando para um grande teatro subsidiado ou um


pequeno teatro alternativo, você terá menos tempo para ensaiar tecnicamente
no teatro do que você tem que trabalhar na sala de ensaio. É claro, este não é
o caso de alguns países europeus, como a Suécia e a Alemanha, mas no
Reino Unido e nos EUA esta é a norma. Isso coloca muita pressão a todos para
fazer os ensaios técnicos de forma incrivelmente rápida e eficiente. Os atores,
em particular, têm de absorver vários novos ingredientes - luzes, sons, cenário,
figurinos e assim por diante - em um período muito curto de tempo. Toda essas
informações novas podem sobrecarregar os atores e diluir o trabalho que
cuidadosamente foi construído ao longo do período de ensaios. Introduza
muitos destes ingredientes no ensaio tão cedo quanto possível, uma vez que
irão facilitar a transição para o teatro. Ele também irá poupar tempo na técnica
e nos ensaios para que você possa concentrar-se nos elementos que são
simplesmente impossíveis de se colocar na sala de ensaio (como um
equipamento gigante de iluminação) ou até mesmo algo simples (como uma
máquina de vento ou o efeito de chamas).

Os efeitos sonoros, especialmente os efeitos abstratos, podem ser


emboscadas para os atores se você não integra-los nos ensaios, por isso,
ajuda introduzi-los em algum ponto do processo. Considere, por exemplo, ter
uma mesa de som e o operador nos ensaios para a última semana, e introduza
todos os elementos sonoros para os atores ensaiarem.

Considere a introdução gradual de figurinos e adereços durante todo o


período de ensaios para que os atores possam praticar como se movimentar
no palco. Ensaie com os adereços e os mobiliários reais sempre que puder.
'Reais' é a palavra usada para descrever um adereço ou peça de mobiliário que
será usado na etapa de apresentação. É ideal para o ator praticar tanto quanto
possível, e por tanto tempo quanto possível, com os objetos 'reais' – os
adereços ou móveis que irão eventualmente usar. Quanto mais eles tiverem
feito isso no ambiente calmo do ensaio, mais precisos e fluentes eles vão
estarão com esses objetos no ambiente pressurizado do teatro. Tenha a
certeza, no entanto, que um traje improvisado é melhor do que nada.

Não tente complexas luzes na sala de ensaios. Alguns ensaios não


acontecem nos teatros em que serão realizadas as cenas, e eles não têm
iluminação complexa como equipamentos ou operadores de iluminação. Eles
não serão capazes de entregar qualquer coisa que se assemelhe aos estados
de iluminação finais e tentar aproximar a iluminação teatral no período de
ensaios pode confundir os atores.

146
Tenha em mente o fato de que poucas salas de ensaio têm bom controle
de iluminação. Há exceções a esta regra, quando, por exemplo, você está
trabalhando com multimídia, usando vídeos. Nestes casos, você vai precisar
que a sala de ensaio funcione mais proximamente das condições da
apresentação com plena escuridão e muitas das luzes reais. Esta forma de
trabalhar precisa de um planejamento cuidadoso e custa muito dinheiro extra.
Certifique-se que você preparou seus produtores para este custo adicional. É
útil, no entanto, ter luzes práticas para o trabalho na sala de ensaio, como
abajures, velas, lanternas ou luminárias. Você pode usá-los durante o dia (se
você tem como fazer um blackout facilmente) ou à noite.

Claro, o grau que você pode conseguir qualquer parte disso depende o
seu orçamento. Algumas das minhas sugestões anteriores podem ser
impossíveis em um teatro alternativo ou num pequeno grupo teatral. No
entanto, sempre haverá coisas que você pode integrar e, mesmo que tudo que
você consiga fazer seja um ou dois figurinos para ensaiar nos últimos dias, já
vai aliviar um pouco a pressão do ensaio técnico.

Lembre-se de preparar os atores para tudo de novo que você está


planejando fazer no teatro. Evite surpreendê-los com idéias completamente
novas. Se, por exemplo, você fez alterações no cenário ou nos figurinos após a
maquete, compartilhe isso com os atores na sala de ensaio. Tente não deixar
que apareçam lacunas entre o que os atores imaginaram num figurino ou
cenário e a sua aparência real, e evite apresentar um novo e grande elemento
cênico em um ensaio técnico. Nesse ponto do processo, você quer seus atores
firmes e calmos, não perdendo o equilíbrio por uma mudança inesperada.

RESUMO

Apresente o máximo de ingredientes-chaves na sala de ensaio, tantos


quantos você puder, porque vai facilitar a transição dos atores para o
teatro.
Considere, por exemplo, a instalação na sala de ensaios de uma mesa de
som e da presença do operador e introduza elementos de figurinos,
calçados e adereços reais além de móveis e alguns elementos
cênicos.
Não instale qualquer elemento ou equipamento de iluminação na sala de
ensaio; em vez disso, use luzes práticas que estarão presentes na
peça.
Prepare os atores para qualquer coisa nova que você esteja planejando
fazer em qualquer uma dessas áreas antes de entrar no teatro.

147
As criadas de Jean Genet

10. Capítulo - Construindo o mundo da peça


(Tradução de Marilene Maia com enxertos de Diego Leonardo - Revisão Humberto
Issao)

O processo de ensaio é divido em duas partes. A primeira parte é


quando toda companhia se junta para construir o mundo da peça. Isso leva
40% do tempo dos ensaios. A segunda parte divide a peça em pequenas cenas
e apenas os atores de cada uma dessas cenas são chamados para encenar.
Isso toma 60% do tempo dos ensaios. Esse capitulo fala sobre como construir
o mundo da pea e inclui conselhos sobre as seguintes áreas:

10.1 - Como dividir os dias de ensaio;


10.2 - Introduzir fatos e questões;
10.3 - Pesquisa;
10.4 - Locais;
10.5 - O autor e o gênero;
10.6 - Trabalho prático em ideias;
10.7 - Trabalho pratico sobre emoções;
10.8 - Biografias dos personagens;
10.9 - O primeiro trabalho prático sobre a personagem e o ritmo dela;
10.10 - Relacionamentos;
10.11 - Como configurar improvisações com os atores;
10.12 - Como usar os exercícios de visualização;

148
10.13 - Como fazer tudo isso num período curto de ensaios;

Essa lista dá a impressão de que para poder ir para o próximo passo é


necessário finalizar a precedente. Dá a entender que você precisa trabalhar
numa ordem precisa. Nenhuma dessas coisas é verdade. Por exemplo, você
pode escolher começar o trabalho prático em ideias enquanto você ainda está
trabalhando nos fatos e nas questões. A complexidade da pesquisa pode ser o
motivo que faça você começar a trabalhar na biografia do personagem.
Trabalhe essas coisas escutando. O ingrediente para ir em uma ordem linear é:

Voltar a história para os fatos/questões


Biografia do personagem
Primeiro trabalho prático com o personagem
Relacionamentos
Improvisações (Eventos no passado, evento gatilhos das circunstancias
imediatas)

Esse capítulo vai ensinar você a usar os materiais que você tem para a
preparação do ator. Seja cuidadoso ao se referir a preparação do ator. Use isso
para guiar e focar os atores – não faça eles sentirem que não tem nada a
contribuir. Faça com que eles sintam que estão construindo esse mundo
ficcional junto com você e sempre que possível, os encoraje a trabalhar nas
coisas por eles mesmos. Faça isso fazendo questões em vez de declarações.
Isso é particularmente importante quando se começa a trabalhar na criação do
personagem.

10.1 Como dividir o seu dia de ensaio

Eu estruturo o meu dia de ensaio baseado em três ingredientes:


Trabalhar interpretando a cena ao redor da mesa, trabalhando os movimentos
e exercícios de atuação. Evite gastar muito tempo em uma mesma atividade,
particularmente no trabalho de mesa. Lembre que os atores irão transformar as
ideias discutidas na mesa em práticas que serão feitas na sala de ensaio. De
fato, a prática é o principal trabalho na criação de um personagem ou
exploração do tipo de atuação que você pede para os atores fazerem.

Aqui vai um exemplo de como dividir o seu dia. Essa é uma forma de lhe
guiar, não é uma estrutura que precisa ser seguida rigorosamente. Os
exercícios citados serão explicados melhor no decorrer do texto.

10am Aquecimento
11am Trabalho na mesa: Ler o primeiro capítulo e listar todos os fatos e as
questões
1pm Intervalo
2pm Exercícios de atuação: Praticar as ideias

149
3.30pm Trabalhos de movimento: Dança de salão
4.15pm Trabalho na mesa: Os atores compartilham as descobertas das tarefas
solicitadas para serem feitas na noite anterior.
5pm Fim

No final do dia, você talvez deva entregar algumas tarefas para os atores
responderem durante a noite, da mesma forma que você fez no primeiro dia
(como foi dito no capítulo 9). Essa tarefa pode surgir do trabalho durante o
levantamento de fatos e questões e o ideal é fazer com que você interligue a
tarefa com o personagem que o ator está interpretando. Por exemplo, em ‘A
Gaivota’, o ator que interpreta Sorin deve pesquisar o uso de bengalas ou a
atriz que interpreta Marsha deva investigar o preço e a funcionalidade de um
rapé.

Já sugeri que você atrase a marcação da planta baixa no piso enquanto


você está construindo o mundo da atuação. A sala de ensaio será usada para
efetuar exercícios ou improvisações que ocorrem em vários lugares diferentes
que não são o local ou os locais onde a ação da peça é definida. Por exemplo,
improvisações de acontecimentos passados irão levá-lo para outras casas de
família em diferentes países ou cidades assim como exercícios sobre as ideias
da peça. A presença de fitas coloridas marcando o chão da sala de ensaio vai
distrair constantemente os olhos e a imaginação do ator, como eles interpretam
eventos em lugares totalmente diferentes.

RESUMO
Estruture seu dia de ensaio para incluir três ingredientes principais:
trabalho na peça em torno de uma mesa, trabalho de movimento e
exercícios de representação.
Evite passar muito tempo em uma única atividade, particularmente no
trabalho de mesa.
No final de cada dia, você pode definir aos atores algumas tarefas
simples para que façam durante a noite.
Não coloque marcações de planta baixa.

10.2 Introduzindo os fatos e as questões

Fazer os atores lerem a peça para subtrair os fatos e questões da


história (sobretudo o que existe e acontece antes de começar a atuação) é a

150
forma mais eficiente de estabelecer uma cultura de sala de ensaio em que todo
mundo pensa em atuar precisamente e objetivamente.

Peça aos atores para lerem a peça da mesma forma que eles leram no
primeiro dia – com todos no círculo lendo uma fala por vez. Antes de você
começar a ler, diga-lhes que eles farão quatro listas:

Fatos sobre tudo o que existe e acontece antes da peça começar


Questões sobre tudo o que existe e acontece antes da peça começar
Fatos sobre as circunstancias imediatas da primeira cena
Questões sobre as circunstancias imediatas da primeira cena

Peça para eles lerem uns as listas dos outros. Tente não finalizar essa
tarefa em uma sessão ou quebrá-la. Possivelmente as tarefas serão dividas em
três ou quatro dias – ou até mais se você tiver bastante tempo.

Vale lembrar que a lista de fatos que você escreveu quando fez a
preparação não será igual ao que os seus atores escreveram agora. As listas
deles irão acrescentar coisas que você não tinha percebido na lista que você
tinha preparado.

Contudo, o seu conhecimento sobre o resultado do exercício pode


ajudar os atores a perceberem fatos que eles não perceberam ou questões que
eles não se fizeram.

Se houver alguma discussão sobre um pedaço do texto se é um fato ou


não, perceba imediatamente que isso é uma questão. Se você é incapaz de
falar se a informação é um fato, claramente há uma ambiguidade ou uma
duvida na informação. Inclua isso na lista de questões e retorne depois para
ver isso com mais precisão. Tente se certificar de que os atores não tentem
responder a quaisquer perguntas que você fizer na tarefa. Deixe-os saberem
que algumas informações serão respondidas no decorrer do processo. Os
atores talvez perguntem questões que não se relacionam com o que você está
trabalhando. Eles podem, por exemplo, questionar sobre uma ação da peça ou
o sentido de uma determinada fala. Tome nota das perguntas e tranquilize-os
dizendo que essas coisas serão abordadas em um momento posterior do
processo – quando você analisar a ação da peça ou quando você fizer o
primeiro ensaio da cena.

Durante este exercício, alguns atores podem começar a falar


longamente sobre seu personagem ou outros aspectos da peça. Isto é porque
será o primeiro fórum de discussão que o processo terá permitido a
eles. Restrinja essas conversas, pedindo-lhes para reduzir seus pensamentos
em uma simples pergunta. Adicione esta pergunta à lista e sega em frente. No
final do presente processo dê uma fotocópia das quatro listas aos atores. Estas

151
RESUMO
listas mestres serão extremamente úteis quando os atores forem construir suas
biografias dos personagens.
Leia a peça junto com os atores e estabeleça quatro listas:
- fatos sobre o que existiu e aconteceu antes da ação da peça começar
- perguntas sobre o que existiu e aconteceu antes da ação da peça
começar
- fatos sobre as circunstâncias imediatas da primeira cena
- perguntas sobre as circunstâncias imediatas da primeira cena.
Use o seu conhecimento do resultado do exercício para orientar os atores
através dele.
Se existirem disputas sobre se a informação é um fato ou uma pergunta,
adicione essa informação à sua lista de 'perguntas'.
Desencoraje os atores a responder às perguntas nesta fase e tranquilize-
os que elas serão respondidas mais tarde no processo.
Tome nota de quaisquer questões relacionadas com as outras etapas do
processo, para a discussão mais tarde nos ensaios.
Pare os atores que usarem este exercício para conversar longamente
sobre outras preocupações.

10.3 Pesquisa

A pesquisa garante que os atores construam compartilhadas, concretas


e detalhadas imagens do tempo e do lugar. É parte integrante do processo de
ensaio, mesmo quando uma peça é novinha em folha. A pesquisa que você fez
quando você preparou o texto significará que você poderá alocar tarefas
essenciais aos atores de forma específica e encaminhá-los para livros ou
artigos que irão ajudá-los a responder suas perguntas de pesquisa
economicamente. Você também será capaz de corrigi-los, se as informações
que eles retornarem não forem muito precisas.

No primeiro dia de ensaios você podia ter pedido aos atores para
realizar sua primeira tarefa simples de pesquisa durante a noite – para
descobrir três fatos sobre o ano (ou anos) em que ocorre a ação da
peça. Estes fatos podem fazer referência a eventos políticos, sociais ou
artísticos. No segundo dia, reuna o grupo em torno da mesa e pergunte a cada
ator em vez de compartilhar seus fatos. Faça isso por no máximo uma
hora. Por exemplo, aqui estão alguns fatos que os atores trabalhando em 'A
Gaivota' trouxeram de volta para a sala de ensaio.

152
Em 1891, a fome afetava de 14 a 20 milhões de pessoas;
Tchaikovsky morreu em 1893;
Entre 1850 e 1900 a população da Rússia dobrou;
Em 1890 a Russia enfrentou a primeira greve em massa;
Nos 1890s o movimento literário simbolista russo começou;
No período que o Alexander III era csar. Ele era um reacionário autocrata que
presidia um regime opressivo. Em 1984, Nicholas II tomou o trono.

Enquanto os atores discorrem sobre os fatos, encoraje todos a


relacionar isso com a peça. Em 'A Gaivota', um dos fatores recorrentes é a
fome de 1891 (dois anos antes do ano em que a peça ocorre). Quando alguém
relata esse fato, tenha certeza que todos os atores serão afetados por esse
fato e usarão isso na biografia de suas personagem. Encoraje-os a pensarem
no que seus personagens fariam durante esse período e transfera isso para o
passado dos personagens. O momento em que a fome é explanada no texto é
no primeiro ato quando o cachorro está amarrado protegendo os preciosos
grãos de uns ladrões que ficaram desesperados pela época ruim na colheita.

Estes fatos vão começar a criar uma imagem compartilhada do mundo


em que se realiza a ação da peça. Em 'A gaivota', era importante para os
atores perceber que a ação ocorre em um tempo repressivo na Rússia, após o
assassinato de Alexander II em 1881; que a viagem foi difícil porque havia
apenas 25.000 milhas de estrada de ferro; e que o país estava se recuperando
de uma fome desastrosa. Mesmo se esta é a única pesquisa que você tem
tempo para fazer, realmente ajudará a lançar os atores no mesmo mundo.

Essa tarefa também irá revelar quais atores estão confiantes com suas
pesquisas e quais não estão. Se, por exemplo, você notar que um ator é
generaliza e é muito vago com as suas informações, você saberá que terá que
guiá-lo com muito cuidado quando você definir a próxima parte da
investigação. Em um nível mais prático, você poderá descobrir que o ator não
tem acesso à Internet ou uma biblioteca. Você pode ter que fornecer a esta
pessoa ou pessoas o acesso à Internet ou definir tarefas que eles podem fazer
com os livros que você possa emprestar.

Em seguida, passe as duas listas de perguntas sobre as listas de


"história passada" e todas as perguntas que precisam ser respondidas pela
pesquisa cuidadosamente. Em seguida aloque as tarefas de pesquisa para os
atores regularmente como lição de casa sobre durante esse período dos
ensaios. Sempre que possível, dê tarefas que se relacionam diretamente com
os personagens que eles fazem. Apenas dê uma tarefa de pesquisa aos atores
um de cada vez, então agende sessões de uma hora regulares, onde eles
apresentam suas pesquisas para o grupo. Continue a relacionar os fatos de
pesquisa coletados pelos atores com a ação da peça.

153
Você pode perguntar: 'Mas por que eu tenho que orientar os atores a
psquisarem tudo? Por que não apenas fotocopiar toda a pesquisa que eu tenho
feito e entregar para eles lerem?' Isso ocorre porque a pesquisa é melhor
digerida quando os atores descobrem as informações por si mesmos; ajuda-os
a ir em uma jornada para encontrar a informação, e a descoberta pode ser
satisfatória. Esse sentimento de satisfação pessoal significa que a informação
aloja-se nos seus pensamentos mais fortemente. Se as informações se alojam,
então imagens mais nítidas se fixarão em suas cabeças e influenciarão como
melhorar as coisas que fazem nas cenas. Lembre-se também que a pesquisa é
absorvida mais eficazmente se entregá-las a uma série de pessoas
diferentes. Se o diretor ou um especialista apresenta toda a pesquisa para o
conjunto em um monólogo, a sala de ensaio pode começar a ser vista como
uma escola e a pesquisa podem acabar entrando por um ouvido e saindo pelo
outro.

Atores, às vezes, podem se perder na pesquisa. Se isso acontecer,


oriente-os para extrair o que é útil do que eles têm investigado e ignorar o
resto. Lembre-se que a pesquisa deve aprofundar a compreensão dos atores
do mundo ou o da sua personagem ou o que ela tem que fazer na peça.

Agora, coloque um pedaço grande de papel na parede e escreva uma


lista de datas e eventos que tenham resultado da pesquisa. Você pode
adicionar a ele informações toda vez que uma nova descoberta é feita ou ao
encontrar uma data importante. Mais tarde no processo, você pode adicionar
as datas importantes das biografias dos personagens. Este é um bom trabalho
para dar ao seu diretor de palco, ou um ator que atua numa pequena parte ou
ao assistente de direção. Coloque qualquer informação visual que emergir da
pesquisa dos atores na parede da sala de ensaio.

Mostre qualquer vídeo ou DVD que você tenha coletado como parte de
sua pesquisa no período de pré-ensaios. Dê tempo para uma discussão mais
longa e não presuma que os atores irão perceber as coisas como você fez; as
pessoas não vão ver sempre o ponto ou a utilidade do material que você está
mostrando. Uma discussão prévia deixá que eles saibam o que você quer tirar
do material que irão visualizar para o seu trabalho sobre o personagem ou
sobre o lugar.

Organize quaisquer viagens de campo na primeira semana de ensaios


para que eles possam alimentar a imaginação dos atores no ponto em que eles
estão começando a construir o personagem e o mundo. Se você demorar
muito, eles já terão um forte retrato imaginário que pode estar em conflito com
a realidade do lugar visitado. Certifique-se de que todo o grupo fará a viagem e
tente incentivar o resto da equipe criativa a ir – cenógrafos, iluminadores,

154
RESUMO
coreõgrafos, sonoplastas, compositores. Depois da viagem, certifique-se de
que você dê tempo para o grupo discutir suas impressões e descobertas.
Defina uma tarefa inicial de pesquisa desde o início, em que você peça
aos atores para descobrir três fatos simples sobre o ano em que a
peça é definida.
Traga os atores para compartilhar esses fatos no grupo, relacione os
fatos com a ação da peça e avale as habilidades de pesquisa dos
atores.
Marque todas as questões de investigação como emergem das suas
listas de "histórias passadas" e de fatos e perguntas.
Regularmente, aloque tarefas de pesquisa nas listas de "histórias
passadas" e de fatos e perguntas.
Use sua própria pesquisa para orientar os atores na direção certa para a
obtenção das informações.
Dê a cada ator tarefas de pesquisa que são específicas para os
personagens que eles estão atuando. Lembre-se que pesquisa é
melhor absorvida pelo atores se eles fazem isso por si mesmos.
Execute sessões de grupo regulares onde atores reportem
individualmente suas conclusões para o grupo.
Colete datas-chave da pesquisa em um grande pedaço de papel e
coloque isso na parede.
Mostre DVDs ou vídeos relevantes e permita um tempo adequado para
uma discussão mais longa.
Faça viagens de campo

10.4 Locais

Construir uma visão completa do lugar ou lugares em que ocorrem as


ações da peça ajuda o ator a entrar e acreditar no mundo no qual sua
personagem existe. No entanto, lembre-se que na cabeça do ator, o lugar pode
ser menos interessante para atuar do que emoções ou as biografias dos
personagens, então você pode ter que trabalhar um pouco mais para incentivá-
los a prestar atenção a este aspecto da peça.

155
Introduza o lugar da peça aos atores com a construção de um exercício
simples. Quando você preparou o lugar da peça você trabalhou na
diferenciação entre os distintos círculos de lugar. Use esta informação para
configurar o seguinte exercício.

Divida o grupo em grupos menores e peça a cada grupo para fazer uma
lista de fatos e perguntas a partir do texto sobre um dos círculos de lugar. Se
estão ensaiando 'A Gaivota', um grupo pode funcionar para o interior da casa,
outro na propriedade, um terço na Rússia e um quarto nas referências para
locais fora da Rússia. Quando eles completarem suas listas, peça-lhes para
elaborar um mapa aproximado ou plano de cada círculo de lugar – ou encontrar
um mapa de um lugar real (tais como a Rússia ou a Europa) e marcar todos os
lugares mencionados. Então, cada grupo compartilha o que eles fizeram com o
conjunto completo.

Vai haver lacunas no seu trabalho e, em alguns casos, os atores


precisarão fazer pesquisas adicionais antes que possam terminar a tarefa.
Coloque os mapas na parede e, de acordo com que o conhecimento do grupo
sobre o texto depende ou das pesquisas e perguntas que forem respondidas,
redesenhe ou melhore estes mapas. Em seguida, use-os como pontos de
referência para improvisações sobre acontecimentos passados que ocorrem no
lugar ou lugares onde a ação da peça é definida ou, mais tarde ainda, para os
ensaios de cena.

A partir deste momento, certifique-se de que os atores têm um forte


senso do lugar sempre que fazem qualquer trabalho prático de atuação. Antes
de cada exercício peça-lhes para ter certeza que eles sabem exatamente o que
os rodeia e incentive-os a usar cadeiras ou outros objetos para marcar as
bordas de diferentes lugares. Por exemplo, duas cadeiras podem marcar uma
entrada enquanto quatro cadeiras poderiam marcar os cantos de um quarto
grande.

Da mesma forma, coloque o lugar no alto das suas listas sempre que
você for dar o retorno sobre qualquer trabalho de atuação e seja preciso sobre
quando os atores atuam no lugar com precisão e quando não o fazem. Quando
começar a fazer ensaios de cena, certifique-se sempre que o lugar onde a ação
ocorre é marcado claramente e que os atores passaram alguns minutos
lembrando-se do que eles podem ver ao redor deles.

Não se sente sempre no mesmo lugar da sala de ensaio para assistir o


trabalho que os atores fazem. Isto irá incentivá-los a apresentar tudo nessa
mesma direção, significando que eles podem ajustar ou distorcer o que estão
fazendo para que você possa vê-los. Em vez disso, Assista as cenas ou
exercícios de atuação de ângulos diferentes, como se você fosse dirigir um

156
teatro de arena. Incentive todos que estiverem vendo a fazer o mesmo. Mas
tenha cuidado para não invadir o lugar onde a ação começa. Certifica-se de
que você não está sentado em uma entrada que será usada ou de cócoras no
canto de um quarto onde o fogão supostamente ficará. Você sempre pode
mudar se há algo que você não pode ver. Movendo-se assim você irá incentivar
os atores a habitar um mundo totalmente imaginário, ao invés de se preocupar
sobre onde estará o público.

RESUMO

Introduza os atores ao lugar com um simples exercício sobre os círculos


de lugar.
Colocar os mapas de cada círculo de lugar elaborado pelos atores nas
paredes e aprimore-os através de ensaios, cada vez que você
descobrir mais sobre cada lugar.
Assegure-se que os atores têm um forte senso de lugar, quando eles
fazem algum exercício de atuação e coloque o lugar no topo da sua
lista de coisas a apontar quando você der o retorno sobre o trabalho
de atuação.
Não sente e assista todo o trabalho que os atores fazem de um lugar fixo
na sala.

10.5 O autor e o gênero

Aprofundar a compreensão dos atores sobre o escritor ajuda-os a


entender os detalhes específicos sobre o texto e a localizar os ingredientes da
vida do escritor que poderão ser úteis na construção de seus personagens.

O escritor vai ter sido introduzido no primeiro dia de ensaios quando


você compartilhou os fatos essenciais sobre a sua vida e sugeriu como eles
podem lançar luz sobre a peça. Agora você pode compartilhar mais
detalhadamente informações coletadas quando você pesquisou o escritor
durante a sua preparação – por exemplo, quaisquer fatos biográficos que se
relacionam a um momento específico na peça ou coisas úteis que o escritor
falou sobre a peça durante a sua vida. Assinale todas as conexões que ajudem
alguns atores a vestirem a pele de seus personagens. Com 'A Gaivota', a atriz
que fazia a Nina poderia utilmente ler sobre Lika, uma das namoradas de
Chekhov no momento. É possível que as características desta mulher sejam
construídas para a personagem na peça. Às vezes a relação entre eventos na

157
vida do escritor e eventos ou personagens na peça que eles escreveram não
ajudarão os atores a atuar na peça. Se o escritor teve alguns pequenos
incidentes na vida e colocou em uma ordem diferente de como eles ocorreram,
isto terá criado uma realidade inteiramente nova. Se este for o caso, então
desencoraje os atores de pesquisar essas conexões. Novamente, sua
preparação significa que você salvará os atores de desperdiçar tempo em
pesquisas infrutíferas.

Sugira que atores específicos realizem pesquisa mais detalhada para os


aspectos da vida do escritor que poderão ser úteis para suas próprias
biografias de personagem. Por exemplo, o ator que interpreta Dorn pode
querer pesquisar os treinamentso médicos de Tchekhov, ou os atores que
interpretam Sorin, Polina e Shamrayev podem querer pesquisar como Chekhov
conseguiu sua própria propriedade rural. Essas tarefas de pesquisa permitem
que os atores preencham as lacunas sobre o conhecimento, a formação do seu
personagem ou a experiência de trabalho deles com materiais retirados da vida
de próprio Chekhov. Se o escritor está vivo, siga seu exemplo quando se tratar
de compartilhar informações. Quaisquer descobertas que você fizer sobre
conexões entre a vida do escritor e a peça não devem ser usadas na sala de
ensaio sem aprovação do escritor.

Em seguida, deixe os atores saberem sobre o gênero da peça, mas


tente evitar debates longos e intelectuais sobreo assunto. Simplesmente
introduzir o gênero, em seguida, dê alguns exemplos de como ele se manifesta
na ação da peça e tranquilize-os porque você irá trabalhar sobre como
incorporar o gênero quando você ensaiar as cenas. Na seção sobre gênero no
capítulo 3, eu escrevi sobre como direcionar 'A Gaivota' como simbolista e
como eu aumentei a força de uma rajada de vento em dois dos atos para
concretizar o gênero. Você pode explicar isso para os atores em termos reais,
falando sobre as súbitas rajadas de vento que podem ocorrer antes de uma
tempestade, ou você pode falar com eles diretamente sobre os objetivos do
gênero.

Se você estiver trabalhando em um gênero particularmente exigente


como o surrealismo, pode ajudar fazer alguns exercícios práticos neste
momento para auxiliar os atores a se familiarizarem com o gênero. Por
exemplo, você pode pedir sos atores para reconstituir alguns dos seus sonhos,
e depois que você assistir a estas re-encenações você pode discutir os
componentes concretos daqueles sonhos e os elementos que você pode levar
para a frente em seus trabalhos sobre as cenas.

158
RESUMO

Olhe para os fatos simples da vida do escritor morto e discuta como eles
podem lançar luz sobre a peça.
Compartilhe informações mais detalhadas sobre o escritor – por
exemplo, quaisquer fatos biográficos que se relacionem a um
momento específico na peça ou coisas úteis que o escritor falou
sobre a peça durante a sua vida.
Sugira que atores específicos realizem pesquisas mais detalhada para os
aspectos da vida do escritor que poderão ser úteis para suas
próprias biografias de personagem.
Com um escritor vivo, apenas passe por um processo de 'pesquisa'
semelhante se o escritor comprometer-se com ele.
Introduza o gênero simplesmente.
Leve alguns exercícios simples e práticos para ajudar os atores a se
familiarizar com um gênero difícil.

10.6 Trabalho prático em idéias

Trabalhar praticamente nas idéias que sustentam a peça irá dar vida às
idéias de forma vívida e tangível para os atores – e vai mostrar-lhes como
traduzir essas idéias em ações concretas que eles podem fazer na peça.
Também irá lembrá-los sobre a relação entre as situações da vida real e o que
acontece na peça e irá incentivá-los a usar observações extraídas da vida real
para construir o seu trabalho em cenas ou personagens. Todos os bons atores
extraem diretamente da vida o material para fazer seu trabalho, mas às vezes
pode ajudar lembrá-los o nível de precisão necessário para replicar esse
comportamentos bem. Os exercícios, portanto, permitirão que você apresente
seu interesse, e a expectativa, de deixar detalhadas e precisas as informações
físicas. Este será o primeiro trabalho de atuação que você assistirá e fará
comentários, e também permitirá a você introduzir suavemente ingredientes
que você usará mais tarde no processo, tais como intenções, eventos, tempo
ou lugar.

Primeiramente reuna os atores em torno de uma mesa e peça-lhes para


sugerir as ideias-chave da peça. Diga-lhes que você está procurando palavras
simples ou frases ou uma 'abordagem escolar', a descrição de uma idéia, ao
invés de algo sofisticado ou intelectual. Anote todos os pensamentos que

159
surgirem; você descobrirá que algumas sugestões são acertadas, outras estão
perto e algumas não estão erradas em tudo. Quando a lista estiver completa
gentilmente guie o grupo em direção as três ou quatro idéias que você fez
isoladamente quando você preparou a peça. Talvez o nome que você deu a
uma ideia não dialoga com o grupo, nesse caso você deve alterar o nome. Por
exemplo, o grupo poderá não responder às palavras 'sonhos destruídos',
preferindo 'esperanças acabadas'. O que importa é que a idéia está localizada.

Como uma guia áspera, eu tento ter certeza que uma idéia se relaciona
com mais da metade dos personagens e é visível na ação da peça. Se os
atores propõem uma idéia que não é clara na peça, incentivo-os a testar essa
ideia contra todos os personagens e a ação – assim como fiz quando estava
trabalhando em meu período de preparação nas ideias. Muito rapidamente se
tornará claro que uma sugestão imprecisa não afeta os personagens ou a ação
significativamente o suficiente para se qualificar como uma ideia.

Quando você tiver elaborado uma lista final, peça aos atores a idéia
principal da peça. Isso é, sobre o que é a peça. Todo esse processo não deve
demorar muito; Tente orientar os atores para terem as respostas rápidas e
eficientemente. Não deixe o grupo ficar preso em uma longa digressão ou
entrar em argumentos. Neste caso, sugiro que todo mundo aceite uma lista
inicial como ponto de partida para trabalhar.

Em seguida, trabalha praticamente nessas ideias. Selecione uma ideia e


peça aos atores que pensem em um momento em suas vidas, que se
relacionem com essa ideia. Peça-lhes para imaginar que sua vida é um filme
muito longo e incentive-os a apresentar alguns minutos desse filme,
exatamente como aconteceu, sem edições ou correções. Peça aos atores para
recordar o que aconteceu, como aconteceu, quando aconteceu e onde. Este
extrato pode durar entre dois e dez minutos. Dê-lhes um exemplo do que dizer
a partir da sua própria vida a fim de esclarecer o exercício. Em 'A Gaivota', o
tema dos sonhos destruídos pode fazer os atores pensarem por um momento
em suas vidas quando descobriram que eles não tiveram uma escola de teatro,
ou um momento quando eles descobriram que um emprego desejado tinha ido
para outro ator. Pode ser um telefonema com um agente ou uma conversa com
um professor. O tema do amor infeliz pode ser representado por um momento
quando um ator foi rejeitado por alguém que eles amavam ou um evento
específico em uma relação que os tornaram infelizes.

Tranquilize-os que o momento que eles escolhem pode ser banal e


doméstico (um casal discutindo quem põe o lixo para fora ou um momento
quando eles se sentaram no sofá sozinhos e ligaram a televisão). Lembre-os,
também, de não ajustar o que aconteceu para que se assemelhe a uma cena
de uma peça. Mais importante ainda, avise os atores para não usar quaisquer

160
eventos que são recentes, dolorosos ou não corretamente digeridos. Lembre-
os que a sala de ensaio não é um ambiente terapêutico. Se qualquer uma das
ideias são particularmente sombrias (tais como a morte ou uma doença), faça o
exercício ser opcional. Dê os atores uma noite para pensar sobre a tarefa;
Diga-lhes que eles vão estar encenando o que aconteceu com os outros
membros da companhia no dia seguinte.

No dia seguinte o grupo irá descobrir quantas pessoas se apresentam


no recorte do cotidiano de cada ator. Em seguida, configure os exercícios para
que todos em conjunto sejam ocupados sendo eles mesmos em um pedaço de
sua vida ou sendo outras pessoas na parte de outra pessoa. Dê a cada ator
tempo para compartilhar as informações sobre o evento com as pessoas que
irão re-encenar isso com eles. Não se surpreenda se este processo demorar
mais ou menos 20 minutos. Realce, que não é necessário mudar coisa alguma
na situação que será 'compartilhada'. O objetivo é reconstruir um evento que
aconteceu em suas vidas o mais precisamente quanto possível e não, como eu
escrevi anteriormente, para fazer uma 'cena de uma peça'. Quando estiverem
prontos, peça-lhes para mostrar cada pedaço de vida um de cada vez. Você
também vai assistir estes exercícios sózinho (porque todos os artistas estarão
envolvidos re-encenando partes da vida) ou irá assistir com os atores que não
estão envolvidos em uma situação em particular.

Depois de finalizado o exercício, discuta-os por cinco minutos. Primeiro,


incentive os atores a fazer as ligações entre o que aconteceu no exercício com
momentos da peça ou os personagens. A re-encenação pode apresentar um
evento real que fala de uma cena em particular da peça, ou ele pode vomitar
um detalhe físico, tais como a forma que alguém se desloca de seu assento
antes de dizer a outra pessoa, que eles já não são amados. Chamando a sua
atenção para links e detalhes como estes você irá ajudar os atores a estudar o
comportamento humano com mais cuidado e pensar sobre como alcançar o
mesmo nível de precisão na produção de seus personagens.

Se você está assistindo os exercícios sozinho, você terá que apontar as


semelhanças entre o cotidiano e a peça. Se você está assistindo-os com outros
atores, você poderia fazer-lhes perguntas como: 'Havia algo nesta parte da
vida que fala de um momento na peça?' Faça a conexão para o grupo se eles
não conseguirem vê-la em primeiro lugar. Os atores não estão acostumados a
falar uns aos outros diretamente ou em um grupo sobre o seu trabalho, assim
podem estar um pouco tímidos na resposta voluntária. Se você continuar
fazendo as perguntas, os atores finalmente se tornarão confiantes em falar,
particularmente quando eles perceberem que não são solicitadoa a criticar a
atuação de outras pessoas, mas sim, apontar detalhes pequenos e concretos
sobre o comportamento humano.

161
Você também pode usar estes exercícios para introduzir as ideias-chave
do seu processo e as palavras que você usa para descrevê-los (ver capítulo 9).
Você pode perguntar aos atores que assistiram o exercício com você, coisas
como 'Onde e o que aconteceu?' ou 'Que horas do dia você acha que isso
ocorreu?' e, assim, introduzir o lugar e o tempo. Quando você vê um momento
em um exercício, quando há um evento particularmente claro ou intenção,
indique-o. Por exemplo, uma parte da vida relacionada com a ideia de 'amor
infeliz' pode apresentar duas mãos dadas passeando por um canal em Veneza.
A mulher aponta para um hotel muito bonito e diz, jocosamente: 'Este é um
bom lugar para um caso'. O homem diz: 'Sim, é'. A mulher de repente para em
suas trilhas e larga a mão do homem. Ela diz a sério: 'Você teve um caso lá?' O
homem faz uma pausa e então diz: 'Sim'. Ambos viram suas cabeças longe um
do outro.

Neste exercício, a mudança ou evento começa quando o homem diz 'É'


e termina quando ele diz 'Sim'. Aponte o que acontece fisica e textualmente
para marcar os delimitadores do evento – como a mulher parar em suas trilhas
e largar a mão e como ambos afastaram-se um do outro.

Peça ao grupo que assistiu o exercício para contar o que eles pensam
sobre quais eram as intenções do homem e da mulher antes e após o evento.
Estas respostas aos exercícios darão uma ferramenta analítica de um contexto
concreto de uma vida. Sugira aos atores que isto é o que você procurará mais
tarde no processo quando você vai analisar o texto em busca de eventos e
intenções. Este exercício será um ponto de referência inestimável quando você
começar esse trabalho.

Lembre-se, no entanto, de não deixar a discussão entre as pessoas que


estiverem assistindo essas re-encenações de ficarem vagando em uma análise
aprofundada da vida do ator (solicitada pelo exercício), isto pode ser invasivo e
crítico para o ator em questão.

No final da discussão, dê aos atores tempo para anotar qualquer um dos


detalhes físicos discutidos que podem ser úteis quando eles forem fazer a peça
(por exemplo, do jeito que alguém moveu um pé quando disseram "Eu te amo",
ou que seu corpo inteiro tremeu enquanto se afastavam de uma pessoa que
iria morrer). Anote essas observações; você pode então referir-se a elas mais
tarde no processo quando você estiver trabalhando sobre as cenas. Por
exemplo, você poderia dizer para o ator que interpreta Masha: "Você se lembra
quando Beth tocou em seu assento antes que alguém dissesse a ela que não a
amava no exercício sobre a infelicidade no amor? Tente adicionar esse detalhe
físico antes de você dizer que você não ama Medvedenko."

162
Você trabalhar uma idéia diferente por dia ou fazer uma idéia durante
dois dias – dependendo da quantidade de tempo de ensaio que você tem. Não
trabalhe em blocos de idéias por mais de duas horas. Eles exigem muita
concentração para se executar, para assistir e para extrair informações dela.
Você pode intercalar exercícios de ideias com tarefas de pesquisa ou lendo a
peça para fatos e questões.

RESUMO

Chegue a um consenso sobre as ideias da peça com os atores.


Isole a ideia principal.
Trabalhar com as idéias praticamente uma por uma. Peça a cada ator para
reencenar um evento de suas vidas que se relacione com cada uma
das ideias, uma de cada vez. Faça isso durante alguns dias.
Depois de assistir a cada exercício, dê um retorno sobre o trabalho e
incentive o grupo a traçar paralelos entre o exercício e a peça.
Quando você vir um exemplo de qualquer uma das etapas de seu
processo, como uma intenção ou um evento, indique-o para os
atores. Chame a sua atenção para ingredientes tais como o tempo e o
lugar.
Permita que os atores tenham tempo no final de cada re-encenação de
anotar quaisquer detalhes úteis. Trabalhe nas idéias em blocos de
duas horas. Não faça mais do que isso em um dia.

10.7 Trabalho prático sobre emoções

Estudar como as emoções afetam o corpo pode também ser uma boa
maneira de realizar trabalhos práticos no início do processo de ensaio antes
que o ator vá trabalhar por sí em seu personagem. Tal como acontece com o
trabalho prático em ideias, estes exercícios fazem o ator ver a necessidade da
precisão física no seu trabalho e incentiva-os a ver o que acontece na vida
mais precisamente como uma forma de dinamizar o seu trabalho no palco.

Quando você estiver preparando a peça você observará que alguns


personagens experimentam algumas emoções mais fortemente do que outros.
Por exemplo, em 'Ifigênia em Áulis' de Eurípedes uma das emoções
dominantes é o medo: cada personagem experimenta o medo em um momento
163
crítico da ação e grandes pedaços da ação ocorrerem em um contexto de risco
de vida, onde o medo motiva o comportamento. Se você está dirigindo esta
peça, você pode estudar como esta emoção afeta o corpo.

Quando comecei a trabalhar na 'Ifigênia em Áulis', pedi aos atores para


pensarem em uma situação de suas próprias vidas, quando eles estavam com
medo. Lembrei-lhes, como em seus trabalhos sobre as ideias, que deveriam
escolher uma situação que não estivesse muito crua. Na manhã seguinte pedi-
lhes para re-encenar esta situação, da mesma forma que eles re-encenaram
partes da vida, em seu trabalho sobre as ideias. Eles re-encenaram a situação
por conta própria ou com outros membros do conjunto. Pedi para o resto do
grupo para que percebessem como os corpos dos atores comportavam-se
quando os estímulos assustadores os atingiam. Nas discussões que se
seguiram a cada exemplo, desencorajei qualquer análise psicológica e atraí as
observações feitas sobre a fisicalidade das pessoas.

Um ator recriou um momento de sua vida quando ele tinha que filmar
uma cena com um leão. Houve uma sessão de treinamento em que ele teve
que entrar na jaula dos leões. Ele entrou, ficou imóvel por 10 segundos, então
continuou a limpar as palmas das suas mãos nas suas coxas, dando pequenos
passos para a frente e pequenos passos para trás, sem contudo avançar para
o leão. Então virou a cabeça repetidamente para trás e aproximou a câmera do
leão. A temperatura do seu corpo aumentou e ele ficou vermelho. Vimos seu
batimento cardíaco aumentar com uma veia no seu pescoço bombeado
fortemente. A respiração dele ficou curta e vimos que sua boca estava seca,
quando ele falou.

Em outro exercício, o carro do ator foi parado em um posto na Irlanda do


Norte. Uma arma estava apontada para a janela. A mulher e o homem do carro
ambos tornaram-se completamente imóveis por cerca de cinco segundos.
Depois disto, seus movimentos eram muito lentos e cuidadosos. Você poderia
ver o ator movendo os dedos de cima e para baixo. A mulher continuou a
segurar o volante muito firmemente, e os músculos em seus dedos, mãos,
braços e ombros estavam todos muito tensos.

Quando você debater estes exercícios com os atores, se puder


relacione-os a um momento ou evento da peça – como você fez quando você
discutiu os exercícios sobre as ideias. Após a re-encenação do leão, eu
perguntei a companhia se havia qualquer momento na ação de 'Ifigênia em
Áulis' na qual alguns ou todos os mesmos sintomas físicos podiam ser vistos.
Uma pessoa sugeriu que veríamos o corpo de Agamémnon se comportando
desta maneira quando ele se aproximou do altar onde ele estava prestes a
cortar a garganta de Ifigênia. Outra pessoa sugeriu que a súbita quietude por
dez segundos podia estar relacionada com o que as mulheres em coro fazem

164
quando dizem as notícias que Ifigênia deve ser sacrificada. A atriz que
interpretava Clytemnestra sugeriu que ela podia ter alguns dos mesmos
‘sintomas’ físicos que a mulher no carro na re-encenação do posto na Irlanda
do Norte demonstrou, quando ela ouve a notícia sobre a morte de Ifigênia. Ela
pensou, por exemplo, que ela poderia segurar Ifigênia da mesma forma que a
mulher fez no volante. Desta forma, você pode incentivar os atores a usar
informação físicas mais precisas de situações da vida real em certos momentos
na ação da peça.

Claro, selecionar uma emoção dominante não exclui a vasta gama de


outras emoções expressadas na peça. No entanto, chamar a atenção para uma
emoção dá o tom da precisão com que todas as emoções estão sendo
investigadas e reencenadas na produção. Lembre os atores que o corpo é um
dos principais meios pelos quais o público "lê" as emoções – e entende o que
está acontecendo dentro de uma pessoa. Como os exercícios sobre as ideias
descritas na seção anterior, este trabalho sobre as emoções lhe proporciona
um conjunto de pontos precisos de referência para mais tarde no processo. Se,
por exemplo, quando você está ensaiando uma cena muito adiante no
processo, você sente que o ator não está atuando com medo suficiente ou com
a precisão física necessária, você pode dizer algo como: "você se lembra
quando Ben fez o exercício sobre o leão, e como ele se manteve limpando as
palmas das mãos para baixo de suas calças e deu pequenos passos para trás
e para frente? Pense como seria o seu personagem expressando o medo em
seu corpo." Isto vai lembrar os atores de adicionar esses detalhes físicos para o
que estão fazendo.

Este exercício não é para fazer com que os atores exagerarem ou


estilizem o que eles fazem fisicamente. Pelo contrário, é para levá-los a
aprovar a forma física precisa de uma certa emoção, sendo fiel à sua escala e
ritmo de vida. Você ficará surpreendido com o quão grande é possível estes
gestos e ações. Quando nós estávamos trabalhando no medo de 'Ifigênia em
Áulis', um ator recriou um momento de sua vida quando ele abriu a porta do
apartamento dele e viu um rato no topo das escadas. Ele saltou de volta três
metros. Depois de fazer o exercício, o ator foi surpreendido ao descobrir quão
longe ele tinha saltado. Sua impressão era que ele tinha acabado de tomar um
passo atrás. Posteriormente integramos este grande salto na produção como
uma reação à notícia que Aquiles ia se casar com Ifigênia.

165
RESUMO

Encontre a emoção que domina a ação da peça.


Peça aos atores para pensar em um momento de suas vidas onde eles
experimentaram essa emoção.
Peça-lhes para re-encenar este evento para o resto do grupo assistir.
Chame a atenção de informaçõe psicológicas e informações físicas.
Conecte esta informação físicas com momentos na peça.
Use os exercícios como pontos de referência mais tarde no processo de
ensaio quando você estiver trabalhando na obtenção de precisões
físicas.

10.8 Biografias dos personagens

Cada diretor terá um campo de perguntas para os atores sobre a vida


dos personagens que estão atuando. Esta é uma etapa inevitável do processo
de ensaio, você sempre terá que discutir ou responder a perguntas como:
"Quando nos encontramos?", "Quanto tempo nos conhecemos?" E "Quando eu
finalmente vi meu tio?" Trabalhar coletivamente em biografias de personagens
no início do processo significará que estas questões serão abordadas pelo
tempo que você ensaia a cena e que todos os envolvidos terão uma imagem
compartilhada do passado.

Você já vai ter o esboço de cada personagen em um pedaço separado


de papel. Você agora vai guiar os atores através das mesmas etapas iniciais
que você trilhou para chegar a essas biografias e você irá definir as tarefas que
se seguem para que sejam realizadas durante a noite. Peça a cada ator para
coletar todos os fatos e perguntas sobre o seu personagem nas listas de
"história passadas" que fizeram, de tudo que existiu e aconteceu antes da ação
da peça começar. Então peça que coloquem os fatos numa lista em uma ordem
cronológica. Sugira que façam a ordem mais simples e mais lógica, assim
como você fez quando você preparou as biografias; atores, assim como
diretores, têm uma tendência a complicar excessivamente o passado dos
personagens. Lembre-se, também, que personagens muitas vezes
compartilham um mesmo passado; portanto, não adianta os atores trabalharem
detalhes de suas biografias de forma isolada uns dos outros. Eles podem
aparecer com ordens completamente diferentes dos eventos e não parearem
nada e você terá que gastar muito tempo para alinhar o trabalho deles. Por
essa razão, é melhor pedir para os atores para prepararem uma lista breve e
simples de fatos para a biografia do seu personagem. Peça que coloquem as
datas pelos acontecimentos na biografia, se puderem. Se eles não tem certeza

166
sobre onde um fato aconteceu na vida do personagem, eles podem deixá-lo.
Incentive-os a deixar sua lista de perguntas sem respostas. Aloque trabalhos
sobre as biografias dos personagens indiretos para os atores que estiverem
realizando pequenos papéis ou atores interpretando personagens com uma
relação forte com o personagem indireto – por exemplo, peça para
Medvedenko trabalhar sobre a biografia de seu pai e sua mãe. Defina todas
essas tarefas que devem ser concluidas fora da sala de ensaio.

No dia seguinte, sente em uma mesa com todo o grupo. Comece com os
personagens e trabalhe através de cada personagem, por sua vez, verificando
a ordem dos fatos que cada ator preparou sobre seu personagem e responda a
algumas das perguntas mais simples. Cada ator deve sair da sessão com uma
clara cronologia dos principais eventos no passado do seu personagem.

Use suas anotações da biografias dos personagens já preparada para


orientar os atores. Peça a cada um deles para falar com você sobre a biografia
do seu personagem e impeça-os de colocarem uma data na posição errada. Ao
invés de contar aos atores que sua escolha de datas é "errada", é aconselhável
dar um contexto para sua própria sugestão. Você pode, por exemplo, dizer: "Eu
não estou inteiramente convencido que colocar a morte da mãe da Nina há
muito tempo é útil. Talvez seja melhor considerar colocá-l' um pouco mais perto
da ação da peça para que sua madrasta seja mais recente."

Tente citar um momento na peça quando este reposicionamento ajudará


os atores a atuar numa linha ou uma intenção. Desta forma, você sempre o
manterá focado na conexão entre os eventos no passado e o que o
personagem diz ou faz na ação presente da peça. Se o ator não concordar com
você, leia a seção relevante no texto juntos e olhe para a impressão mais clara
que as palavras dão. Então trabalhe através de personagens indiretos da
mesma forma (na ordem em que seus nomes aparecem na peça).

Mantenha todo o grupo envolvido no processo, encorajando todos a


procurar ligações entre os personagem que você está trabalhando e o passado
do seus próprios personagens. Certifique-se de que grandes eventos, como um
casamento ou uma morte na família, sejam escritos em todas as biografias de
familiares – mesmo que apenas um membro da família fale sobre o evento no
texto.

Use seu trabalho sobre os relacionamentos para orientar os atores a


pensar sobre as relações que eles têm na peça, como eles constroem suas
biografias. Mesmo se dois personagens têm pouquíssima interação direta na
peça em si, incentivá-los a reconhecer que podem haver eventos no passado
que os conectem, portanto, ajude-os a construir um relacionamento. Por
exemplo, se você estava trabalhando em 'A Gaivota', quando chegar à data do

167
nascimento de Nina você pode virar para o ator que interpreta Dorn e
perguntar: "Você acha que você fez o parto de Nina?" Quando Nina fala sobre
a morte da mãe pergunte a quem faz Dorn: "Você acha que você cuidou da
mãe dela?" Lembre-se que Dorn tem uma fala no texto no primeiro ato, onde
ele fala sobre o pai da Nina de forma agressiva e o ator precisa ter algo em sua
biografia para apoiar este sentimento. O ator que interpreta Dorn irá adicionar a
data de nascimento da Nina e a morte da mãe para sua lista de fatos sobre o
passado. Lembre-se também que Dorn aparece em várias cenas com a Nina, e
eles precisam ter uma imagem de seu relacionamento passado para atuarem
juntos com precisão.

Além disso, lembre-se de usar o trabalho que fez nos relacionamentos,


descritos no capítulo 5, alerte o ator como um incidente particular pode ter
formado o jeito de pensar do seu personagem sobre si próprio ou sobre outro
personagem. Por exemplo, aponte como o pensamento de Arkadina sobre
dinheiro foi formado por suas experiências iniciais de deserdação e pobreza.
Você só precisa apontar alguns momentos-chave como este em um par de
biografias dos personagens para o resto do grupo ficar com a ideia clara. Você
então pode se referir a outras conexões como esta mais tarde, quando você
estiver trabalhando em uma cena onde há uma conexão forte entre o
comportamento presente e um evento do passado.

Certifique-se você dá a cada personagem, o tempo e a atenção


necessárias – mas não permita a qualquer ator sequestrar o ensaio do grupo e
usá-lo para conversar longamente sobre seu personagem. Se isto começar a
acontecer, peça ao ator para colocar suas preocupações na forma de uma
pergunta simples e adicioná-lo à sua lista de perguntas para ser abordada em
um momento posterior. Se há uma grande disputa entre dois atores sobre
quando e como um evento compartilhado aconteceu no passado, peça que
coloquem o fato fora da equação por enquanto. Os dois podem transformar o
fato em uma questão a ser abordada num futuro próximo. Siga em frente,
rapidamente.

No final deste processo, você não precisa ter preenchido todos os


detalhes de cada biografia ou ter respondido a todas as perguntas. Sempre
haverá coisas que precisam de uma pesquisa adicional, ou pensamento mais
cuidadoso ou uma leitura mais próxima do texto em um momento posterior. No
entanto, não deixe muitos fios soltos. Todos os atores devem deixar este
processo de grupo sentindo que eles têm uma imagem mais completa do
passado do seu personagem do que em seu rascunho inicial dos fatos e que
eles compreenderam os principais eventos compartilhados no passado. Eles
também devem ter começado a pensar sobre sua relação com todos os outros
personagens.

168
A ensaio de mesa em grupo é uma atividade trabalhosa e demorada. Só
embarque nela se você concluiu a preparação cuidadosa de todos os
personagens (como descrito no capítulo 1). Fique calmo e concentrado – e
sempre mantenha o exercício movendo-se sem dar a impressão aos atores de
que o tempo é limitado. Ajudará se você não tentar construir todas essas
biografias em uma única sessão. Talvez você prefira trabalhar através de seis
personagens em uma sessão de três horas e mais seis em uma sessão
posterior. Lembre-se de convidar o cenógrafo e o figurinista para estas
sessões. Observar os atores aprofundando as biografias dos personagens vai
ajudar a aguçar as escolhas sobre os trajes. Lembre-se, também, que o
processo não é uma rua de mão única – os atores muitas vezes virão com
adoráveis novos detalhes que você nunca pensou, significando que você pode
ter que ajustar as informações nas biografias que você havia preparado.

RESUMO

Peça aos atores para coletar todos os fatos e questões sobre sua
personagem na lista mestra de fatos e questões que vocês criaram
juntos. Incentive-os a colocar os fatos em uma ordem cronológica.
Peça aos atores para fazer este trabalho também sobre os personagens
indiretos.
Reuna a companhia e passe por cada personagem. Use as biografias que
você preparou para orientar os atores na construção de uma biografia
que irá ajudá-los a encenar a peça. Ajude-os a chegar a um acordo
sobre eventos compartilhados nas biografias do outros personagens.
Mantenha todo o grupo envolvido no processo, incentivando todos a
olhar para as ligações entre os personagens focando no passado do
seu próprio personagem.
Use o trabalho que você fez sobre as relações entre os personagens e
chame a atenção dos atores para a relação entre eventos do passado
e como os personagens pensando na ação presente da peça.
Dê a atenção adequada a cada personagem.
Gerencie problemas neste processo pedindo aos atores para colocar suas
preocupações na forma de perguntas a serem respondidas mais tarde
no processo.
Quando você chegar ao final deste trabalho, certifique-se de que você não
deixou muitas pontas soltas nas biografias dos personagens.
Certifique-se de que seus ensaios de mesa em grupo trabalhando os
personagens sejam sustentados pela pesquisa e pela preparação feita
antes dos ensaios começaram.
169
10.9 O primeiro trabalho prático sobre a personagem e o ritmo dela

Estes exercícios permitem que os atores agarem seus personagens em


um contexto sem pressão, bem como dâ a eles a oportunidade de ver como
absorveram o trabalho que fizeram juntos em suas biografias. Você pode iniciar
estes exercícios, depois de ter concluído o trabalho de mesa em grupo sobre
as biografias dos personagens. Estes exercícios também permitem que os
atores testem com maior precisão física os exercícios sobre as ideias eas
emoções, introduzidos no processo de ensaio.

Peça a cada um dos atores para olhar a biografia do personagem e


pensar em um ritmo específico e um lugar onde seu personagem estivesse
fazendo uma atividade simples – tais como engraxar seus sapatos, cozinhar
uma refeição ou fazer uma cama. Certifique-se que ele escolha um momento
que antecede aos eventos que iniciam a peça e peça-lhes para evitar grandes
eventos. Incentive os atores a mapear o lugar onde seu personagem está
usando cadeiras e quaisquer adereços que se encontrem no quarto ou
simplesmente peça para que imaginem os objetos que eles precisam. Todo o
grupo pode fazer esses exercícios simultaneamente na sala de ensaio
enquanto você senta e assiste.

Depois de terminar o exercício, peça a todos para dizer resumidamente


o que eles aprenderam sobre seu personagem. Se você tem apontamentos
para alguém que está indo em uma direção imprecisa, assinale quaisquer
ingredientes adicionais que ele talvez precise pensar ou incentive-o a trabalhar
em um aspecto do personagem que precisa de um reforço. Em 'A Gaivota', o
ator que interpreta Shamrayev fez vários exercícios que envolvia, a limpeza do
seu kit de emergência do exército e treinou para reforçar o lado militar da
personagem (ele tinha sido um oficial do exército, antes de se tornar um
gerente de propriedade).

Faça estes exercícios regularmente por uma semana ou mais,


dependendo de quanto tempo for o seu período de ensaio. Eles só devem levar
cerca de 20 minutos para estabelecer, executar e discutir.

Aqui estão alguns exemplos do tipo de exercícios que os atores fizeram


para 'A Gaivota'.

Era agosto de 1871 e Dorn estava sozinho com Masha ainda bebê. Ele segura
a criança.
Era maio de 1888 e Konstantin estava tentando escrever pela primeira vez.
Era julho de 1873 e Arkadina estava colocando a maquiagem para sua
performance em Poltava.
Era novembro de 1890 e Polina estava engomando as roupas de Konstantin.

170
Introduza a ideia do ritmo do personagem durante estes exercícios. Esta
é a velocidade na qual o personagem pensa e faz as coisas fisicamente. Às
vezes atores interpretam seu personagem em sua própria velocidade. Isto pode
ser mais rápido ou mais lento do que o ritmo de seu personagem. Assim que
você notar isso assinale para ele. Atores podem construir seus personagens no
ritmo errado desde o início e é uma coisa muito difícil de se desfazer. O
problema surgirá mais tarde no processo quando as cenas são encenadas em
velocidades imprecisas porque uma pessoa não está no ritmo do seu
personagem, precisamente.

Você vai começar a chegar a algumas conclusões sobre o ritmo, ao


trabalhar com relacionamentos e biografias do personagem. Você pode notar,
por exemplo, que Sorin fala dormindo e se move com uma bengala. Isto pode
começar a dar-lhe a impressão de um ritmo lento. Analisar eventos e propósitos
irá aprofundar sua compreensão do ritmo. Você pode notar, por exemplo, a
velocidade na qual Konstantin responde aos eventos no primeiro ato, apartir da
maneira que ele ataca sua mãe quando está falando com Sorin, ou a súbita
emoção que o atinge em resposta aos passos de Nina, ou a maneira como ele
pára abruptamente a apresentação de sua peça. Pouco a pouco a velocidade
de suas respostas levará à conclusão de que ele tem um ritmo rápido. A
precisão da velocidade ou o ritmo de cada personagem vai cristalizar-se dessa
forma de acordo com o avanço das suas tarefas de preparação.

RESUMO

Peça aos atores para pensar em um ritmo específico e um local onde o


personagem esta fazendo uma atividade simples por conta própria.
Faça os atores marcarem com cadeiras o lugar onde isso aconteceu.
Todos os atores marcam seus lugares simultaneamente na sala de
ensaio.
No final do exercício pergunte o que eles aprenderam e faça alguns
comentários.
Introduza a ideia do ritmo da personagem.

10.10 Relacionamentos

Eu gosto de olhar para o que está acontecendo entre as pessoas no


palco e pensar que os relacionamentos são como teias de aranhas invisíveis e
lindamente modeladas, vinculando as pessoas – se você colocar sua mão
suavemente entre os personagens você quase seria capaz de sentir essa teia.
Às vezes, quando eu assisto produções vejo atores executando um
personagem com um senso muito apurado mas sem ter uma imagem clara da

171
sua relação com os outros personagens em cena. Quando isso acontece, uma
parte de mim sempre perde o interesse no que está acontecendo.

O trabalho sobre os relacionamentos incentiva os atores à pensar sobre


as interações que eles têm com todos na peça, a partir das pessoas menos
significantes para a mais importante. Com o trabalho que foi feito sobre a
bioagrafia dos personagens já se terá a atenção dos atores para todas as
relações que eles têm na peça. Quanto mais você puder aprofundar o seu
pensamento sobre estas relações, mais crível essas relações serão na
performance que o público assistirá. (Se você não fizer esse trabalho, os atores
podem ser guiados por suas afinidades e na melhor das hipóteses apenas
atuar com as mais importantes relações ou na pior das hipóteses, atuar apenas
uma relação em dez. Por exemplo, a atriz que interpreta Arkadina pode apenas
encenar seu relacionamento com Trigorin e Konstantin, desse modo
negligenciará mais que oito outros relacionamentos – incluindo seu irmão
doente, Sorin e sua antiga paixão, Dorn.)

Não peça aos atores que escrevam citações da peça que se relacionem
com seus pensamentos sobre cada personagem, como você fez quando você
se preparou para a peça. Em vez disso, peça a cada ator para escrever a
sentença inacabada "Eu sou...", assim como você fez quando você estava
preparando os relacionamentos (ver capítulo 5) e preencha-a com três ou
quatro adjetivos simples ou substantivos que descrevam como o personagem
pensa sobre si. Incentive os atores a considerar estas frases como
pensamentos que o personagem nunca revelaria a ninguém. Dê a eles 15
minutos para fazer isso, em seguida, reuna o grupo e passe por cada
personagem. Cada ator vai ler sua sentença e você responderá ao que eles
propõem.

Você vai notar que os atores às vezes escrevem juízos de valor em seus
personagens. Por exemplo, em 'A Gaivota', o ator que interpretava Konstantin
talvez pudesse ter escrito: "Eu sou uma criança" ou o ator que interpretava
Shamrayev talvez tivesse escrito: "Eu sou agressivo". Estas são coisas que
outras pessoas podem dizer sobre o personagem, mas eles não existem como
pensamentos na cabeça desse personagem. Retire estas sentenças ou
substitua-as com adjetivos mais precisos. Por exemplo, Konstantin pode
pensar: "Eu sou inútil" que, por sua vez, faz com que ele se comporte como
uma criança, ou Shamrayev pode pensar: "Eu sou desvalorizado" o que o faz
parecer agressivo.

Se os atores escreverem várias palavras que significam a mesma coisa,


vocês juntos, devem selecionar a palavra que melhor encapsula o pensamento.
Por exemplo, o ator que interpretava Konstantin poderia ter escrito: "Eu sou
sem talento, uma falha, nada"; as três palavras em itálico podem ser

172
condensadas na palavra "inútil". Alguns atores também podem simplificar os
pensamento de seu personagem através da remoção de pensamentos que se
contradizem. Certifique-se de que eles não fazem isso; se eles têm omitido
pensamentos contraditórios, oriente-os a adicioná-los de volta em suas
sentenças. Cada ator deve surgir com este exercício com uma frase simples,
precisa e clara, com três ou quatro adjetivos ou substantivos.

Se o grupo se empenhar neste exercício e ver a utilidade disso, você


pode levá-lo para o próximo nível, definindo-lhes uma tarefa semelhante, mas,
mais a noite. Peça-lhes para preencher uma série de sentenças, da mesma
forma sobre cada um dos outros personagens – novamente peça que
escrevam apenas três ou quatro substantivos ou adjetivos. Em 'A Gaivota', a
atriz que interpretava Arkadina poderia preencher as seguintes frases:
"Konstantin é ... ", "Sorin é ... ", "Dorn é ... " e assim por diante. Peça aos atores
para considerar sua relação com cada personagem da peça, a fim de que eles
evitem qualquer uma das suas próprias afinidades. Mais uma vez, deixe que
saibam que os adjetivos que eles colocam descrevem um pensamento que sua
personagem nunca revelaria a ninguém.

No dia seguinte peça para cada ator ler suas sentenças concluídas para
o grupo. Use a sua preparação para ajudá-los a preencher as lacunas e
remover imprecisões. Às vezes, os atores se concentram apenas nas relações
principais e negligenciam outras. Isto é por causa de afinidades, hábito ou falta
de orientação. Este exercício assegura que todos mantêm os seus
relacionamentos na peça vivos – não importando quão grandes ou pequenos
possam ser. Ele também garante que os atores comecem a construir as suas
relações na direção certa para a peça. Finalmente, o exercício revela eventuais
lacunas no pensamento sobre os outros personagens. Atores podem atolar
para encontrar os adjetivos certos ou contestar adjetivos que você sugere,
então tente conduzir este exercício com sutileza e não faça-os se preocupar
muito com isso. O principal objetivo neste momento é que eles comecem a
considerar todas as relações que eles têm na peça.

Tente ser imaginativo sobre personagens menores com pouco a dizer.


Dê-lhes alguma orientação, antes de fazer esta tarefa. Eu pedi aos atores que
interpretam os servos em 'A Gaivota', que considerassem a higiene pessoal,
hábitos sexuais e arrumação das pessoas para quem trabalhavam.
Empregados sempre saberiam detalhes íntimos como esses sobre as pessoas
que os empregou e estes detalhes formariam o que pensam sobre seus chefes.

173
RESUMO

Peça aos atores para completar a frase 'Eu sou...' com adjetivos simples
ou substantivos que descrevem o que personagem pensa sobre si.
Peça-lhes para ler suas frases para o grupo e ajude-os a selecionar uma
lista precisa de adjetivos ou substantivos.
Se o grupo se empenhar no exercício, dê a tarefa de listar os adjetivos
que descrevem quais são seus pensamentos sobre todos os outros
personagens.
Ajude a direcionar os atores que interpretam personagens menores em
um sentido útil ao solicitar essa tarefa.

10.11 Como configurar improvisações com os atores

Improvisações vão construir fortes imagens do passado nas mentes dos


atores, e estas imagens irão ajudá-los a encenar o presente da ação da peça
com mais precisão. No capítulo 5 sugeri formas de seleção e planejamento de
improvisações. Só comece fazendo improvisações quando você já tiver
trabalhado as biografias dos personagens e os relacionamentos. Lembre-se de
trabalhar as improvisações em ordem cronológica, você planejando fazer duas
ou vinte.

Comece fazendo qualquer improvisação planejada que preceda o evento


que inicia a peça. É melhor fazer improvisações sobre o evento que inicia a
peça e improvisações sobre as circunstâncias imediatas da primeira cena mais
tarde no processo, conforme descreverei no capítulo 11. Lembre-se de guardar
as improvisações do que acontece entre as cenas para quando você realmente
estiver ensaiando as cenas da peça. Em seguida, você pode inserir essas
improvisações entre os ensaios das cena relevantes. As circunstâncias
imediatas para cada cena podem ser improvisadas antes de se trabalhar na
cena, para que a memória do que acontece antes da ação da cena seja fresca
nas mentes dos atores. A descrição que se segue explica como estabelecer
qualquer improvisação com os atores.

Reuna os atores e dê-lhes suas instruções preparadas para a


improvisação inicial que você quer fazer. Esta será a primeira vez que você
dará instruções diretamente para os atores e a primeira vez que os
ingredientes chave deste processo estarão juntos em um exercício de atuação
(circunstâncias imediatas, eventos, intenções, lugar e tempo). Não se apresse
ao dar as suas instruções e use o tempo que for para responder a quaisquer
perguntas que os atores possam ter.

174
Enquanto eles absorverem o que foi dito, dê tempo a eles para que
construiam e demarquem uma imagem clara do local onde acontecerá a ação
da improvisação.

Você vai assistir a improvisação sozinho ou com outros atores (não


deixe aqueles que logo entrarão em cena assistir). Incentive todos a ver e a se
sentarem em torno dos limites do lugar onde a improvisação é definida como
se fosse um teatro de arena. Incentive as pessoas a assistir movendo-se se
eles não conseguirem ver algo. Peça aos atores para continuar com a
improvisação até você pará-los (embora você possa permitir um máximo de 10
minutos). Pare-os quando eles estiverem perdendo a crença na situação ou ao
tornarem-se vagos sobre qualquer uma das instruções – por exemplo, se sua
imagem do lugar está fraca ou se eles pararam de demonstrar as suas
intenções. Saber quando parar uma improvisação é uma arte. Você vai cometer
erros, mas esses erros vão ajudar você a melhorar.

No final da improvisação, faça comentários que se relacionem


diretamente com as instruções que você deu ao estabelecer a improvisação.
Aponte onde um evento ou uma intenção não ficaram nítido, onde os lugares
estavam claramente presentes e onde não estavam. Destaque as coisas que
os atores fizeram que estavam indo na direção certa da peça e aponte as
coisas que foram menos úteis. Por exemplo, se um personagem como Sorin
não usou sua begala na improvisação, lembre-o de pensar sobre sua condição
física um pouco mais; e se a atriz que interpreta Masha usa seu rapé com
grande precisão, deixe-a saber que ela o fez.

Se você tem uma grande companhia, você pode estabelecer várias


improvisações de uma só vez. Dê a cada grupo separadamente suas
instruções já preparadas, em seguida, dê tempo para que eles estabeleçam o
lugar conjuntamente. Então faça as improvisações em ordem cronológica. Você
pode pedir aos atores que estiverem assistindo as improvisações para dar seus
comentários sobre os aspectos mais simples da improvisação como o tempo e
lugar.

Se um ator resistir a sua ideia em uma improvisação, você pode alterar


essa ideia ou ir em frente de qualquer maneira. Se o ator está preparado para
tentar sua ideia, peça para fazer a improvisação, mas lembre-o que é apenas
um rascunho inicial. Deixe-os saber que você vai tentar outra versão se a
primeira não funcionar. Nove vezes em dez sua versão irá persuadi-los. Se
aquele ator discordar veementemente então peça para propor um mapa
alternativo do que acontece e experimente-o. Você então terá que entrar com
tudo e com instruções precisas.

175
RESUMO

Só comece fazendo as improvisações quando você tiver trabalhado com


as biografias dos personagens e os relacionamentos.
Trabalhe as improvisações em ordem cronológica.
Dê suas instruções já preparadas de forma lenta para que os atores
tenham tempo para absorver as informações.
Dê aos atores um tempo para estabelecer o local onde acontecerá a
improvisação.
Peça para as pessoas assistindo a improvisação se sentar ao redor dos
limites do local onde a ação ocorre como se fosse um teatro de arena.
Faça comentários ao final de cada improvisação que se relacione com as
instruções que você deu quando você as estabeleceu.
Se um ator não está de acordo com sua ideia para uma improvisação, ou
mude seu plano ou peça para que ele a faça garantindo que depois
irão experimentar a idéia dele.

10.12 Como usar os exercícios de visualização

Exercícios de visualização são uma outra maneira de criar imagens dos


últimos eventos para apoiar a ação da peça. Eles também podem substituir
improvisações, se você está pressionado pelo tempo. Eles podem ser feitos na
sala de ensaio ou como lição de casa durante a noite.

Peça aos atores para sentarem ainda com os olhos abertos e imaginar
que seus olhos são como uma câmera se movendo através de um lugar,
interagindo com outras pessoas ou objetos. Dê-lhes um evento para visualizar.
Em 'A Gaivota', Masha pode visualizar pela primeira vez ela comprando seu
rapé ou Konstantin pode visualizar Arkadina atuando em uma das peças de
Trigorin. Quadro por quadro, o ator irá imaginar como o evento se desenrolou.
Se o ator estiver lutando para fazer o exercício com seus olhos abertos, então
sugira que os feche.

Exercícios de visualização são particularmente úteis para eventos que


acontecem com um personagem sozinho, mas eles são menos úteis para
eventos que afetam mais de uma pessoa. Nesses casos, uma imagem
compartilhada criada por uma improvisação será mais útil. Em 'A Gaivota', por
exemplo, seria bom para Konstantin visualizar matar uma gaivota entre o
primeiro e o segundo ato, porque ninguém mais está envolvido neste evento.
No entanto, não seria útil para Nina e Trigorin visualizar a gravidez, nascimento
e morte de seu filho entre o terceiro e quarto ato porque eles precisam
compartilhar fatos do que aconteceu.

176
RESUMO

Peça aos atores para que se sentem com os olhos abertos (ou fechados)
e visualizem um evento na biografia do seu personagem, como se
fossem uma câmera de filmagem em um evento, quadro por quadro.
Lembre-se que estes exercícios são menos úteis para eventos que
acontecem com mais de uma pessoa.

10.13 Como fazer tudo isso com um período curto de ensaio

O perigo de compactar ou pular etapas deste processo para caber em


um período mais curto de ensaios é que você vai construir personagens que
não têm imagens claras do passado ou do futuro, ou os personagens que você
construir não existem em um tempo real e um lugar real. Tenha isso em mente
ao selecionar os ingredientes que você escolhe para trabalhar.

Apresentando fatos e perguntas: Se você está com pouco tempo, não faça
perguntas sobre as circunstâncias imediatas e fatos como uma tarefa para a
sala de ensaio. Prepare os detalhes das circunstâncias imediatas e dê aos
atores antes dos ensaios pertinentes da cena. Comprima o tempo que gasta na
compilação de sua lista de "histórias passadas" e a lista de fatos e perguntas
com os atores em uma sessão de três horas. Em seguida, mantenha o
exercício movendo-se bruscamente e evite longas discussões. Tão logo você
veja uma discussão se desenvolvendo, acabe-a rapidamente, pedindo aos
atores em questão para resumir seus pontos em perguntas simples. Se você se
encontra correndo contra o tempo peçar ao grupo para focar nos fatos
sozinhos.

Pesquisa: Peça aos atores para aparecer com três fatos simples sobre o
universo da peça. Faça isso como lição de casa no primeiro dia. Reuna-se com
o grupo e ouça cada um dos fatos por meia hora; Isto irá ajudar a construir uma
imagem compartilhada do universo ficcional. Durante a primeira semana defina
individualmente para os atores individualmente tarefas essenciais que podem
ser realizadas durante a noite. Por exemplo, não é possível interpretar Masha
sem saber sobre o rapé. Idealmente, qualquer investigação levada a cabo deve
ser compartilhada em uma sessão de comentários com todo o grupo, mas se
você não tem tempo para a pesquisa, ajude os atores individualmente na
construção de seus personagens. Tente encontrar um ambiente onde os
ingredientes principais das tarefas de pesquisa possam ser compartilhados. Se
houver quaisquer informações essenciais que todo mundo precisa saber, dê
para os atores em uma folha A4 que possa ser lida durante a noite. Em 'A
Gaivota', todos os atores estavam no palco para o primeiro ato quando
Arkadina refere-se às propriedades abandonadas; Todos precisam saber um
177
pouco de informações básicas sobre por que essas propriedades entraram em
colapso e a economia mais ampla das propriedades no momento.

Localização: Faça o exercício inicial dos círculos de lugar no primeiro dia. A


partir de então, você deve ser capaz de realizar todo o trabalho sobre o lugar,
sem a necessidade de anular qualquer momento especial do seu processo.
Faça isso sempre fazendo comentários claros sobre o lugar, em qualquer um
dos exercícios de representação, improvisações ou ensaio de cena que você
fizer.

O escritor e o gênero: Você vai ter introduzido os fatos essenciais sobre o


escritor no primeiro dia e você não precisará fazer outra sessão de grupo sobre
o escritor. Em vez disso, dê pedaços de informações relevantes durante o
trabalho sobre a biografias dos personagens. Por exemplo, quando você
chegar na biografia de Dorn e peça para ele dar uma olhada na vida de
Tchekhov em seu trabalho fora do teatrao, para fora como ele treinou como um
médico. Você poderá dar para os atores tarefas relevantes de pesquisa sobre
as pessoas na vida do escritor que forneça as base para seus personagens, ao
invés de convocar uma sessão para compartilhar informações sobre a vida do
escritor com todo o grupo. Deixe os atores saberem qual é o gênero da peça e
trabalhe isso nos seus ensaios de cena.

Trabalho prático em ideias: A sessão de grupo em que você chegará a um


acordo sobre as ideias da peça, você deve levar um máximo meia hora.
Selecione a ideia principal e, em seguida, peça aos atores para pensar durante
a noite sobre uma parte de suas vidas que se relacione com essa ideia. No dia
seguinte re-encene as propostas em uma única sessão de três horas. Quando
você fizer comentários, saliente a relação entre a vida e a ação da peça e
esteja atento para quaisquer ingredientes-chave do processo e os aponte com
precisão (tempo, lugar, intenção, evento e gestos físicos precisos e posturas
corporais que possam ser usadas). Trate outras ideias quando você estiver
ensaiando cenas ou construindo a biografias dos personagens. Você pode
avisar aos atores se eles não estiverem construindo seus personagens com
todas as ideias que sustentam a peça em mente. A atriz que interpreta Arkadina
pode estar atuando com a ideia de infelicidade no amor sobrepujando o tema
da família; Isto se manifestará na sua atuação apenas no caso de amor com
Trigorin e não sendo uma mãe crível com Konstantin. Sugira que ela construa
seu pensamento sobre a família um pouco mais.

Trabalho prático sobre emoções: Corte esta etapa por completo.

Biografias de personagens: É essencial para os atores realizar o simples


exercício da biografias dos personagens como lição de casa e trabalhar essas
biografias em uma sessão de trabalho em grupo. Você deve ser capaz de fazer

178
isso em uma sessão de três horas. Se você acelerar este exercício, pode haver
mais pontas soltas do que o normal, então tenha certeza de como você
trabalha e classifica as cenas. Se você está realmente com pouco tempo, faça
as biografias em um esboço e dê aos atores como ponto de partida para a
discussão.

Primeiro trabalho prático sobre o personagem e o ritmo do personagem:


nestes exercícios tome apenas cerca de 15 ou 20 minutos, então tente fazer
pelo menos três deles espalhados por alguns dias. Se você realmente não
pode ter mais tempo, corte-os.

Relacionamentos: Ignore o exercício em grupo sobre relacionamentos, em


vez disso, use seu trabalho preparatório para orientar os atores quando eles
estão trabalhando em cenas juntos ou construindo suas biografias de
personagens. Por exemplo, você pode apontar para dois dos atores em uma
cena de grupo, que não têm uma relação considerável um com o outro. Peça-
lhes para esclarecer seus pensamentos sobre o personagem um do outro.

Improvisações: Se você tem pouco tempo, você poderá considerar cortar


todas as improvisações e em vez disso, discutir o que aconteceu no passado
no ponto relevante em uma cena durante o ensaio (ou você pode pedir para
que eles visualizem os eventos). Por exemplo, quando um personagem
descreve um evento no passado, pare e fale sobre isso ou dê-lhes alguns
minutos para visualizar os eventos ou peça para que pensem em como o
evento aconteceu durante a noite. Se as imagens do passado são
compartilhadas, dê aos atores um tempo significativo nos ensaios para
visualizarem o evento juntos. Lembre-se, no entanto, que uma improvisação
estruturada pode levar até menos tempo de ensaio que uma discussão.

Exercícios de visualização: Eles podem ajudá-lo a configurar alguns destes


exercícios, mas eles não são essenciais.

179
'As Criadas' de Jean Genet

11. Capítulo - Trabalhando nas cenas da peça


(Tradução de Isarel Castro [até a página 181] e Mateus Santos - Revisão Humberto
Issao)

Este capítulo analisa a forma de colocar a peça a seus pés. Este


trabalho vai demorar cerca de 60% do seu período de ensaio. Ele cobre tudo,
desde a análise da ação da peça até o último passadão na sala de ensaios. Ele
inclui conselhos sobre o seguintes pontos:

11.1 - A análise da ação do peça com os atores


11.2 - Delimitando os espaços das cenas
11.3 - Improvisando o evento gatilho e as circunstâncias imediatas
11.4 - Como estruturar o dia de ensaio
11.5 - Ensaiando uma cena pela primeira vez
11.6 - "Desenho de cena" (Blocking), ou fazendo a ação clara para o público
11.7 - Os segundos e terceiros ensaios de uma cena
11.8 - Passadões
11.9 - Como gerenciar os últimos dias na sala de ensaio
11.10 - Trabalhando com o cenário, figurinos, som, iluminação e músicas
durante os ensaios
11.11 - Como fazer tudo isso com um período curto de ensaio

180
11.1 A análise da ação do peça com os atores

O grupo já terá lido a peça uma vez ao fazer a lista de fatos e questões
sobre tudo o que existe e o que aconteceu antes do início da ação da peça.
Agora, você vai ler a peça novamente com quatro tarefas específicas em mente
para todos:

Isolar os “eventos”(acontecimentos) e dar-lhes um títulos


Anotar os fatos e questões sobre o que aconteceu entre cada ato ou cena.
Anotar os fatos e questões sobre as circunstâncias imediatas de cada ato ou
cena (i.e. o que ocorre nas 24 horas que antecederam a ação da cena)
Encontrar um nome para cada ato.

Até agora os atores devem estar familiarizados com a palavra "evento",


como você vai tê-lo usado ao dar retorno nos exercícios sobre as idéias e as
emoções, e na estruturação de suas improvisações iniciais. No entanto, não vai
machucar se neste momento você lembrá-los de uma simples definição da
palavra: um momento na ação onde todos mudam o que estão fazendo ou
atuando. No entanto, deixe-os saber que o nome do ato ou cena deve ser a
descrição mais simples do que está acontecendo em todo o ato ou cena.

Leia o peça da mesma maneira que você fez inicialmente sem nenhum
dos atores lendo suas próprias partes mas com cada pessoa lendo uma fala de
cada vez. Peça-lhes para parar sempre que eles houverem informações
pontuais que possam ajudar com quaisquer das quatro tarefas. Se eles
passarem sobre quaisquer informações chame a atenção para o que eles
perderam. É melhor perguntar aos atores sobre o título de cada ato ou cena
antes de começar a leitura juntos. Certifique-se de que todos no grupo
escrevem o título de cada cena e o nome de cada evento. Além disso,
certifique-se de que todo mundo tem clareza sobre quando cada evento
começa e termina e que todos escrevem pelas as mesmas palavras para
descrever cada evento. Use o texto preparado para orientá-los.

Eu sempre acho que as percepções dos atores leva à correção da


posições de alguns eventos ou à adição de um par de novos eventos que eu
perdi quando eu fiz a minha preparação. Eu também acho que é útil perguntar-
lhes o que eles acham que é o título mais simples para um evento ao invés de
oferecer a solução que eu tenho a não ser que eles estejam lutando para
encontrar um. Se um ator discordar fortemente sobre um evento ou sobre seu
título, sugira que colocar um ponto de interrogação e assegure que você vai
reexaminr a questão mais tarde no processo. Não perca tempo em uma sessão
de grupo com longos debates.

Certifique-se de que todos no grupo mantêm-se no exercício. Lembre-se


que leva tempo para escrever títulos ou circular uma fala em torno de um
evento e nomeá-lo. Não avance até que todos tenham terminado cada tarefa.
Não tente trabalhar em uma sessão longa; em vez disso faça o trabalho ao
longo de um par de dias. Intercale com traalhos de corpo, trabalho prático
sobre temas ou improvisações. Esse trabalho requer muita concentração de

181
todos. Fique aberto e receptivo às ideias e percepções dos atores; ao mesmo
tempo use sua preparação para mantê-los no caminho certo.

Esta sessão é também uma oportunidade para os atores abrirem suas


dúvidas sobre a ação da peça ou as sensações de uma fala. Eles podem ter
anotado as dúvidas deste tipo quando você trabalhou nas listas iniciais de fatos
as questões e na lista de circunstâncias imediatas logo no início do processo.
Encaminhe quaisquer dúvidas nestas sessões. Adiar dúvidas mais complexas,
até os ensaios da cena.

No final do processo, dê uma definição de evento gatilho e peça-lhes


para identificá-lo. Em seguida, pedça-lhes para identificar os principais
acontecimentos de cada ato e o acontecimento mais significativo em toda a
peça. Complete o processo pedindo aos atores para decorarem onde os
acontecimentos ocorrem no texto ao mesmo tempo que eles decoram suas
falas.

Finalmente, lembre os atores sobre as intenções e dê-lhes a definição


mais simples da palavra: o que um personagem quer fazer ou mudar no outro
personagem (ou personagens). Dê exemplos concretos do que você quer dizer
a partir de exercícios que eles já fizeram em ensaios ou cenas no peça.
Lembre o grupo que as intenções só mudam em “eventos. Quando tiverem
absorvido tudo isso, peça-lhes para se preparar para seus ensaios de cena e
trabalhar as intenções do seu personagem entre eventos fora do horário de
ensaio. Isso é algo que ele pode trabalhar em seu tempo livre fora da sala de
ensaio. Você vai aguçar a sua compreensão desta ferramenta quando você
fizer os seus primeiros ensaios para a cena. Não gaste muito tempo para
desembalar intenções longas neste ponto.

RESUMO

Leia o peça novamente com o grpo e isole quatro coisas: eventos, títulos
dos atos, o que acontece entre as cenas e as circunstâncias
imediatas para cada cena.
Certifique-se de que todos escrevem nos seus textos todas as
informações e não se apresse e nem deixe pessoas para trás ao fazer
essa tarefa.
Ajuste as suas respostas, preparadas previamente, para acomodar novas
descobertas ou novas propostas apresentadas pelo grupo.
Não perca tempo em longas disputas sobre respostas para as tarefas
definidas.
Intercale essa atividae com outros trabalhos práticas.
Identifique o evento gatilho, os principais eventos em cada ato e o mais
importante evento em toda a peça.
Pergunte aos atores onde ocorrem os eventos.
Lembre-os da definição mais simples de uma intenção.
182
Defina como atividade fora dos ensaios a preparação das intenções entre
os eventos para os primeiros ensaios da cena.
11.2 Delimitando os espaços das cenas

Peça ao diretor de palco para colocar a marcação de chão assim que


você estiver prestes a fazer os trabalhos práticos no(s) local(is) onde a ação do
peça ocorre. Isso normalmente acontece quando você começa a fazer
improvisações sobre o evento gatilho, sobre as circunstâncias imediatas da
primeira cena, ou antes do ensaio da primeira cena. Se a ação da peça se
realiza em mais de um local, o diretor de palvo vai estabelecer uma série de
planos em camadas uma sobre as outas com diferentes tipos de fitas plásticas
coloridas para designar cada lugar.

Idealmente, conforme descrito no Capítulo 8, você deve estar em uma


sala de ensaio que é grande o suficiente para uma marcação do cenário com
uma sobra de no mínimo dois ou três metros ao redor do espaço demarcado do
palco. Peça ao diretor de palco para colocar a marcação no meio da sala e, em
três ou mais metros ao redor, adicione tantos quanto puder de outros cômodos
ou áreas externas, mesmo que estas outras salas nunca sejam vistas pelo
público. Por exemplo, se a ação ocorre em uma sala de jantar, adicionar uma
marcação da cozinha ou corredor e a porta dianteira que dá na sala de jantar.

Quando nós ensaiamos 'A Gaivota' no Teatro Nacional( Londres),


tivemos a luxo de uma grande sala de ensaio. Nós fomos capazes de marcar
várias salas do piso térreo da casa, incluindo as duas salas onde a ação dos
atos três e quatro se realizavam: a sala de jantar e a sala de estudos de
Konstantin. As outras salas marcadas (o vestiário, cozinha, corredor) não foram
vistas pelo público no cenário final, mas eles foram usados pelos atores nos
ensaios para ajudá-los a construir uma imagem de onde eles vinham e para
onde eles estavam indo durante a ação.

Claro, isso foi um tamanho incomum para uma sala de ensaio e não
espere por tudo issno no início de sua carreira. Se você só é capaz de marcar
a planta baixa do seu cenário sem nenhuma sobra( ou até menos do que isso)
Não se preocupe, apenas lembre-se de que você terá de encontrar outras
formas de ajudar os atores a se prepararem para entrar nos lugares onde a
ação do peça ocorre.. Você pode, por exemplo, usar exercícios de visualização
ou simplesmente permitir que os atores tenham alguns segundos antes de
começar a cena para se lembrar exatamente de onde eles acabaram de vir e o
que eles estavam fazendo naquele lugar.

Se você estiver trabalhando em um peça em que a ação ocorre em


vários locais diferentes e você não quer confundir os atores com camadas de
várias marcações uma em cima das outras, use varas de bambu para delinear
os limites de cada sala ou lugar. As varas podem ser facilmente movidas um
lugar para lugar.

Peça ao diretor de palco para fazer a marcação, quer no final do dia do


ensaio ou um pouco antes do início do ensaio. Em seguida, logo que os atores
chegarem peça-lhes para se familiarizarem com o ambiente que a marcação
indica: você poderia andar em volta da marcação com todo o elenco,
lembrando a eles o que as linhas no chão representam em termos de

183
arquitetura ou paisagem. Discuta o que pode ser visto ou ouvido fora do local
(ou locais) marcados, ou as diferentes saídas e entradas qeu levam a cada
lugar e, como sempre, certifique-se que todos os atores sabem o que podem
ver em cada lugar se eles girarem 360 graus.

Neste ponto, também é útil discutir com seu cenógrafo qualquer


elemento cênico chave que você pode querer utilizar. Considere, por exemplo,
a construção de um elemento cênico como uma moldura de porta com uma
porta, uma esquadria com uma janela ou alguns biombos que representem
paredes. Eu sempre achei portas cênicas uma coisa realmente importante de
se ter em ensaios, mas lembre-se que a construção de uma porta cênica é uma
arte: muitas dessas portas têm uma tendência a cair rapidamente à medida que
são utilizadas.

RESUMO

Faça a direção de palco fazer uma marcação do cenário no chão no centro


do ambiente e, se possível, permita um espaço de dois ou três metros
entre a borda da marcação e as paredes da sala de ensaio.
Adicione outros quartos adjacentes ou áreas externas em torno da
principal área demarcada, mesmo que o público não vai vê-los.
Se você só tem espaço para uma marcação, encontre outras maneiras de
ajudar os atores com imagem de onde eles vêm e o que eles estavam
fazendo naquele lugar.
Se você estiver trabalhando em um peça que se passa em muitos locais
diferentes, considere a possibilidade de usar varas de bambu para
delinear os diferentes lugares, de modo que os atores não se
confundam com várias camadas de fitas plásticas de cores diferentes.
A direção de palco deve fazer a marcação no final de um dia de ensaio.
Caminhe em volta da marcação com o elenco no dia seguinte e lembrem a
eles o que as linhas no chão representam, em termos de paisagem ou
arquitetura.
Considere acrescentar alguns objetos cênicos dos principais elementos
da cenografia, tais como portas, janela ou paredes.

11.3 Improvisando o evento gatilho e as circunstâncias imediatas

Agora faça as improvisações que você tem planejado em torno do


gatilho seguido das improvisações sobre as circunstâncias imediatas da
primeira cena. Defina exatamente da mesma maneira que você fez nas outras
improvisações (ver Capítulo 10) e continue dando um retorno preciso. Não siga

184
qualquer uma das improvisações em torno dos eventos que acontecem entre
atos ou cenas, ou quaisquer circunstâncias imediatas para quaisquer outras
cenas ou atos. Você vai fazer essas improvisações mais tarde no processo
quando você estiver trabalhando elas no seu caminho através da ação da
peça.

RESUMO

Configure as improvisações em torno do evento gatilho e das


circunstâncias imediatas para a primeira cena ou ato.
Dê o retorno precisamente.

11.4 Como estruturar o ensaio

Neste ponto do processo o seu dia de ensaio vai mudar estruturalmente


e você vai começar a ensaiar a peça em si, só chamando os atores que estão
na cena em que está trabalhando. Tente trabalhar à sua maneira através do
peça em ordem cronológica e use os eventos como uma diretriz para dividir a
peça em partes menores para ensaiar. Se alguém irá entrar durante a ação,
você precisa ter certeza de que essa pessoa esteja no ensaio anterior para que
todos possam praticar o evento da sua entrada. Desta forma, as cenas que
você ensaiar, muitas vezes se sobreporão: isto fará com que no momento que
você colocar as cenas juntas em um passadão essa junção seja muito mais
suave.

Aqui está a estrutura da primeiro cena de ensaio da 'A Gaivota'.

10h30min Masha, Medvedenko, Yakov e operários


11h30min Konstantin e Sorin para participar
13h30min Almoço
14h30min Konstantin, Sorin, Yakov e operários
16h00min Nina para se juntar
17h30min fim

Dê os atores alguns minutos para aquecer antes de cada entrada, ou, se


você estiver pressionado pelo tempo, chame grupos maiores de atores e peça
para que fiquem preparados. Durante este período dos ensaios, você também
pode considerar chamar o conjunto completo de vez em quando para trabalhos
de corpo, voz, ou para retransmitir qualquer novo material de pesquisa. É
importante não perder o senso e o propósito em uma atividade de
compartilhamento com o grupo. Faça isso uma vez por semana durante uma
hora ou assim. Isto é, claro, em uma estrutura ideal de ensaios a longo prazo.
Não se preocupe se você tem um curto período de ensaio e não têm tempo
para agendar esses trabalhos coletivos.

185
RESUMO

Trabalhe à sua maneira através do peça na ordem cronológica.


Use eventos como uma diretriz para dividir a peça em partes menores
para ensaiar.
Sobreponha a presença dos atores nos ensaios para que os atores
possam praticar os eventos de entradas e saídas.
Agende tantos aquecimentos quanto puder.
Agende sessões ocasionais com todo o elenco para trabalhos coporais
ou para dar retorno das pesquisa realizadas.

11.5 Ensaiando uma cena pela primeira vez

O objetivo do primeiro ensaio de uma cena é estabelecer todas as metas


que os atores precisarão trabalhar a longo prazo e lhes permitir entrar no
material com cuidado. Antes de estudar a parte que você vai trabalhar, verifique
se não há questões pendentes ou perguntas sobre o significado do que é dito
no texto. Se existem, discuta-os e se possível, deixe-os do lado de fora.

Em seguida, deixe os atores saberem que este primeiro ensaio não é


sobre a prática as palavras em sua exatidão; em vez disso, trata-se de praticar
tudo o que está subjacente às palavras. Esses "fundamentos" incluem
intenções, circunstâncias imediatas, tempo, as imagens do passando,
relacionamentos e o lugar.

Primeiro, olhe para eventos e intenções juntos. Normalmente, você vai


ensaiar a peça "evento por evento", relembre aos atores onde o evento ocorre,
aonde começa e aonde termina. Então pergunta a cada um deles, por sua vez,
qual é sua intenção antes e depois do evento (e lembre-os que as intenções só
mudam em eventos). Você já terá escrito estes pontos no seu texto, de modo
que você pode usar sua preparação para orientar os atores na direção certa.
As percepções dos atores podem significar que você tem que alterar a
sentença que você escreveu originalmente para cada uma das intenções.

Quando você tiver chegado a um acordo sobre uma intenção, certifique-


se de que você e o ator anotem a sentença concordaram com precisão. Não
importa se a sentença final é diferente da que você concebeu durante a sua
preparação, desde que capture a essência do que você quer do ator para a
cena. Alguns atores vão preferir uma linguagem fria e cerebral, tais como “para
fazer “Medvedenko” se sentir desconfortável". Outros irão responder melhor às
palavras mais fortes, como “você faz Medvedenko se sentir como um pedaço
de merda". Durante os ensaios, você vai aprender como traduzir a intenção do
que você quer para a peça dentro do vocabulário ou sintaxe que combina com
cada ator individualmente e que obtém o resultado que você deseja. O
processo de decidir sobre as intenções vai ocupar 50% deste primeiro ensaio.
No fim de tudo, peça aos atores para ler a cena junto com as intenções em
mente.

186
Em seguida, lembre-os das circunstâncias imediatas, a hora do dia e o
nome da cena ou ato que você está trabalhando. Finalmente, peça-lhes para
renovar a imagem do lugar em que a cena ocorre. É melhor incentivá-los a
fazer isso por conta própria. Eu costumo dar aos atores cinco ou dez minutos
para falarem sobre o lugar juntos, eles normalmente ficam nas marcações do
cenário e descrevem uns aos outros o que eles podem ver ao redor deles. (A
primeira vez que você ensaiar uma cena como esta, pode ajudar navegar pelo
"lugar" com os atores por meio de perguntas simples, tais como "o que você
pode ver através da janela?", se a cena se passa dentro, ou “O que você pode
ver a certa distância de você?”, se a cena se passa lá fora. Eles também
podem se referir aos mapas dp lugar que eles fizeram mais cedo no processo
de ensaio (ver Capítulo 10) e que agora estará na parede da sala de ensaio.)

Peça aos atores para usar no ensaio uma mistura das palavras que
lembrarem do “texto” e palavras que ele próprio inventa. Esto traz o primeiro
ensaio mais para perto de uma improvisação e mais importante, significa que
os atores não terão que se agarrar a seus textos quando eles estejam
ensaiando a peça. Seus textos ficarão sentados fora do lugar onde a ação da
peça ocorre em uma mesa, uma cadeira ou no chão.

A primeira vez que os atores praticarem a cena vai ser um pouco


estranho: eles vão se lembrar de algumas coisas e esquecer as outras. Eles
podem até se sentir um pouco frustrados ou envergonhados depois,
especialmente se esta é a primeira vez que eles ensaiam uma peça desta
forma. Não se preocupe se isso acontecer e em vez disso, dê-lhes um retorno
sobre as tarefas que você definiu( incluindo eventos, intenções, circunstâncias
imediatas, hora e local) assim como você fez quando você configurou as
primeiras improvisações. Você pode, por exemplo, pedir-lhes para afinar a
atuação no que se refere ao lugar e ao tempo da peça, mas tranquilize-os que
suas intenções eram claras.

Em seguida, peça-lhes para "passar" a cena novamente, veja como eles


a realizam de acordo com as indicações que você deu. Se você tiver tempo
para passar uma terceira vez, você pode começar a adicionar outras coisas
para sua lista retorno como os relacionamentos e os personagens (imagens do
passado, ritmo e pensamentos sobre eles mesmos). Você poderia, por
exemplo, sugerir que a imagem de um evento passado não foi imaginada com
precisão ou orientá-los para atuar a relação entre os personagens com mais
precisão. Na maioria dos casos, esses apontamentos serão coisas que você já
tem trabalhado com eles no processo de ensaios. Nestes primeiros ensaios, a
cena não será realizada exatamente como o público irá vê-la, haverão lacunas
e imprecisões, mas os atores terão um sentido claro de todos os ingredientes
que precisam estar no lugar e em futuro próximo. Alguns atores serão capazes
de absorver todas os apontamentos que você der a eles neste primeiro ensaio
e precisarão de tempo para digeri-los após o ensaio. Neste ponto, não se
preocupe se a sua taxa de absorção é lenta.

No final do ensaio, peça para os atores realizarem todas as tarefas de


investigação que têm surgido ou dê-lhes coisas para pensar até o próximo
ensaio como esmerar as imagens dos eventos do passado do seu personagem

187
ou preenchendo qualquer lacuna na sua imagem do lugar. Em seguida, peça-
lhes para decorar as intenções. Decorar as intenções é tão importante quanto
decorar as palavras. Na vida, quando você olha para trás em eventos
significativos muitas vezes é o que você queria alcançar ou havia desejado que
se aloja na memória, mais fortemente do que qualquer coisa que você tenha
dito.

Você vai repetir este processo para cada parte da peça, movendo-se de
evento para evento. Normalmente, a maioria das palavras faladas no primeiro
ensaio da cena será improvisada. Idealmente, as falas serão aprendidas ao
longo dos segundos e terceiros ensaios, então no momento em que você faz
um ensaio, as únicas palavras utilizadas serão a partir do texto geral.

Esta forma de trabalhar nas cenas iniciais nos ensaios foi uma revelação
para mim quando cheguei nisse. Durante anos eu tinha lutado com a transição
das primeiras improvisações para o trabalho nas cenas da peça. Eu amava a
fluidez e a facilidade de uma improvisação e odiava a constipação e a tensão
dos ensaios das primeiras cenas. A idéia de misturar palavras da peça com as
palavras de imaginação dos atores foi uma maneira perfeita de construir uma
ponte entre essas duas fases de ensaios. No entanto, esteja avisado de que
alguns atores tomam um pouco de mais de tempo para se adaptar a esta forma
de trabalhar. Alguns vão se preocupar em obter as falas da peça e você terá
que pedir-lhes para aquietar essa preocupação. Se um ator já aprendeu suas
falas, então ele deve usá-las, mas peça-lhe para ter em mente o fato de que
eles podem não obter as deixas exatas de seus colegas atores que não
decoraram as falas. Você também pode permitir que os atores mais velhos
usem mais das palavras da peça do que todos os outros, por causa de suas
preocupações genuínas sobre sua capacidade de memorizar o texto. Atores
também podem encontrar dificuldade em conciliar tudo o que você está
pedindo-lhespara atuar neste primeiro ensaio. Eles nem sempre podem estar
acostumado a pontuar em seu trabalhos índices sobre o tempo e lugar, bem
como as intenções e as imagens do passado. Tranquilize-os que isso vai levar
tempo para ser conseguido, mas que eles vão chegar lá a longo prazo.

Quando você estiver trabalhando com as intenções, você pode encontrar


resistência por parte de alguns atores, que pensam que a fixação das
intenções a cada etapa da ação faz com que seus personagens aparentem ser
manipuladores. Se isso acontecer, lembre-os que na vida nós somos
frequentemente inconscientes dos desejos ou intenções que nos guiam,
mesmo considerando que um psicólogo, observando do lado de fora, seria
capaz de nos dizer exatamente o que queremos a todo momento. O processo
de diagnosticar e nomear as intenções, portanto é frequentemente sobre como
fazer os desejos inconscientes serem conscientes, por um tempo, para que as
forças motrizes da personagem sejam bem compreendidas. Os atores não tem
que atuar como se estivessem conscientes de tudo e como se todos os
personagens fossem como Iago em 'Otelo', manipulando claramente todos os
personagens para seu próprio fim.

Alguns atores também vai querer mudar as suas intenções após a sua
primeira tentativa de passar a cena. Tente resistir a este pedido a menos que

188
tenham causas verdadeiras. Em vez disso, peça ao ator para explorar as
diferentes maneiras de atuar as intenções. Se, até no final do ensaio, o ator
ainda estiver convencido de que a intenção não está correta, sugira que vocês
dois tenham um tempo antes do próximo ensaio para pensar em uma
alternativa. O ideal é que a decisão sobre as intenções mude muito pouco a
deste primeiro ensaio até a última noite das apresentações, portanto, neste
ensaio inicial, certifique-se que os atores percebam que você está
estabelecendo um mapa de longo prazo.

Trabalhando nas intenções você vai notar que não há obstáculos que
modifiquem a atuação dessas intenções. Estes obstáculos podem ser
"externoa" ao personagem como o calor do sol ao meio-dia ou eles podem ser
"internos" ao personagem, como uma azia, um resfriado pesado ou o efeito da
culpa que o personagem sente sobre o que ele fez para a pessoa com quem
ele está falando. Obstáculos como estes irão afetar a forma como a intenção é
realizada, mas nunca irão desalojar a intenção completamente.

Fique de olho se as personagens que precisam de intenções estando


dentro dos evento ou não, e adicione-as se você sentir que irá ajudar a
esclarecer o que os personagens estão fazendo. Você pode, por exemplo,
achar que determinados eventos( como uma entrada ou saída) leve mais
tempo do que o texto pretendia( isto pode ser devido à forma como os atores
estão atuando, ou por causa de uma complicação inesperada na cenografia).
Nestes casos, dê aos atores uma intenção durante a saída ou entrada.
Alternativamente, alguns eventos ocorrem ao longo de um período de tempo
maior do que outros: os atores precisarão de intenções durante esses eventos.
Acontecimentos lentos que ocorrem ao longo de várias falas também podem
exigir que os personagens tenham intenções.

Quando você chegar ao final da cena ou ato, improvise os eventos que


ocorrem fora da cena antes de começar a próxima etapa. Se você não tem
tempo para fazer uma improvisação, você pode pedir para os atores
visualizarem o que aconteceu ou simplesmente pedir-lhes para falar sobre isso
brevemente com você. Em seguida, improvise quaisquer circunstâncias
imediatas que precedam a próxima cena que você vai trabalhar, em seguida,
ensaie a próxima cena ou ato. Se você não tem tempo para improvisar as
circunstâncias imediatas, você pode dar aos atores as suas informações
preparadas previamente sobre estas circunstâncias, como parte de suas
instruções para o próxima ensaio da cena.

189
RESUMO

Resolva as questões pendentes sobre o sentido do texto.


Relembre os atores aonde cada evento termina e começa.
Discuta as intenções entre cada evento e escreva a descrição acordada
para as intenções de maneira precisa.
Relembre aos atores as circunstâncias imediatas, hora do dia e da
denominação da cena.
Dê-lhes tempo para configurar lugar e construir uma imagem clara do
mesmo.
Deixe-os saber que eles estarão usando uma mistura das palavras de que
se lembram do texto e um diálogo improvisado com suas próprias
palavras.
Não se preocupe se a primeira tentativa ficar estranha. Peça-lhes para
tentar novamente com as mesmas instruções.
No final dos ensaios peça-lhes para decorar suas intenções.
Esteja ciente de que alguns atores precisam de tempo para aprender esta
nova forma de ensaiar as cenas.
Desencoraje-os a mudar as intenções, a menos que tenham uma causa
real.
Considere quais os obstáculos poderiam modificar as intenções dos
personagens.
Considere acrescentando as intenções dentro dos eventos.
No final de cada ato ou cena improvise o que acontece entre as cenas e
as circunstâncias imediatas antes da cena seguinte.

11.6 “Desenho de cena”( Blocking4), ou fazendo a ação clara para o


público

É essencial que os atores sejam organizados no palco para que a ação


e os acontecimentos chaves da história sejam visíveis e bem focados para o
público. Isto é uma parte importante do seu trabalho como diretor. O “Desenho
de cena” é uma expressão usada para descrever uma forma de organizar estas
“imagens de palco”. Muitos processos de ensaios começam com esses
"desenhos de cena": tipicamente, o diretor e o ator discutem onde o
personagem deve entrar e onde deveria sentar, levantar, pular e assim por
diante. Em alternativa, o diretor pode simplesmente dizer para o ator onde ficar
e o que fazer. Estas decisões são reorientadas durante os ensaios e os
movimentos são então repetidos de forma idêntica em cada apresentação.

4
O termo Blocking é um termo muito específico utilizado pelo universo teatral de língua inglesa para
denominar o desenho da cena, ou seja, onde os atores estarão posicionados ou se movimentando
dentro do espaço de representação.

190
Para mim, no entanto, o "desenho de cena" é sobre como equilibrar a
ação de forma bem focada para o público com movimento fluidos e desinibidos
pelos personagens da situação. Se disser sem rodeios para o ator onde ficar
para que o público o vja, ele pode aumentar o seu foco sobre esse público e
reduzir o foco no personagem e na situação. Isso pode levar a gestos
excessivamente conscientes e ações e movimentos desajeitados. E isto, por
sua vez, pode levar a uma experiência desigual para o público: às vezes eles
vão assistir movimentos que se assemelham a vida enquanto em outras vezes
eles vão assistir movimentos muito conscientes ou incongruentes que não são
da vida comum. Por movimentos muito conscientes quero dizer, grosso modo,
um momento em que um personagem dá três passos grandes na diagonal
baixa e olha para o público enquanto diz a alguém que apaixonado por eles.
Este não é um movimento convincente elaborado a partir de uma situação da
vida real. É claro, o público nem sempre está consciente da diferença, mas eles
absorvem em algum nível e isso interfere na crença e no interesse sobre o que
está acontecendo.

Uma vez eu peguei um amigo meu que era um neurocientista e o levei


para ver uma produção que eu estava dirigindo e, espontaneamente, ele
destacou um problema central sobre a atuação. Ele disse que haviam dois
tipos diferentes de atuação acontecendo: uma era realista e o outro era "mais
elevada, muito consciente e teatral". Ele poderia lidar com os dois tipos, ele
disse, mas no momento em que o cérebro dele mais se esforçou foi quando os
atores cambalearam entre um estilo e outro: nesses momentos, ele perdeu
toda conexão com o que estava acontecendo na ação da peça.

No Capítulo 6, sugeri que, durante o processo de ensaios você deveria


pensar a frente na maneira com que os personagens poderiam usar o espaço,
a posição do cenário, entradas, saídas e móveis, de tal forma que ele levasse
em consideração o "desenho de cena" e utilizasse o ambiente logicamente.
Este é o primeiro passo para a obtenção de um equilíbrio entre movimento
desinibido, fluidez dos atores e uma ação bem focado para o público. Quando
você está trabalhando em primeiro lugar nas cenas, deixe os movimentos
evoluirem naturalmente seguindo a lógica da situação. Dessa forma, a maior
parte da ação vai em se “desenhar” a si mesmo sem os atores necessitarem se
preocupar com isso ou até mesmo saber que o processo está acontecendo.

Também irá ajudar se você tentar evitar pensar que no palco a ação só é
“focada” quando o público está olhando para os rostos ou a frente do corpo das
pessoas. O pior tipo de “"desenho de cena"” ocorre quando os atores estão
posicionados em um agradável semi - círculo de frontalmente para a frente do
palco, andando de lado como se fossem caranguejos. Lembre-se que os perfis
e costas também podem ser usados para focar a ação ou direcionar o olhar do
público para um determinado personagem ou objeto. Grosseiramente falando,
se você posicionar o ator falando de frenta para o público e posicionar o ator
escutando de frente para o fundo, o personagem falando estára bem focado.

Claro, deixar o "desenho de cena" evoluir assim não vai resolver todos
as suas questões. Você sempre vai precisar ajustar a forma física da ação. Isto
é, você vai ter que pedir aos atores para fazer ajustes no que eles estão

191
fazendo, onde eles estão em pé e assim por diante. No entanto, evite fazer isso
até que os atores estejam bem imersos no personagem e da situação. É mais
fácil para o ator mudar o que eles fazem ou onde estão, se eles tem clareza
sobre o que eles estão fazendo. Dessa forma, eles podem absorver a mudança
sem deixar evidente essa consciência excessiva. Onde for possível, veja se
você pode sutilmente alterar a posição dos objetos ou a colocação de adereços
para resolver o problema sem preocupar os atores sobre isso. Claro, qualquer
ator inteligente vai saber exatamente por que a cadeira ou o suporte está
sendo movido, mas eles irão apreciar o fato de você ter abordado o problema
através da alteração da situação em vez de fazer um ensaio só de "desenho de
cena". Se você não pode fazer um ajuste útil fale direta e claramente para o
ator sobre o problema, que se trata de um problema com posicionamento ou
uma tentativa de focar claramente um momento.

Lembre-se que a organização espacial dos atores é apenas uma das


ferramentas à sua disposição para fazer a ação clara. Este trabalho será
complementado pela iluminação, figurinos e cenografia. Estes ingredientes
adicionais serão inseridos quando você começar os ensaios técnicos. Mas
tente manter esses ingredientes em mente na sala de ensaio: às vezes você
pode estar preocupado no foco físico de uma cena e esquecer que é noite e
que a luz geral sobre do cenário irá manter os olhos focados na ação chave da
cena. Se você tiver um problema que não consiga resolver, pense sobre como
a iluminação, o som ou os figurinos podem ajudá-lo a encontrar uma solução.

Se você estiver lutando para fazer os "desenhos de cena" que funcione,


passe algum tempo estudando pintores e pinturas. Isso irá treinar seu olho na
composição. Estudar o trabalho de pintores que usam a figura humana quer em
livros, ou, melhor ainda, em galerias de arte. Artistas como Caravaggio,
Rembrandt, Vermeer, Manet, Gwen John, Hammershoi, Edward Hopper, Lucian
Freud ou Paula Rego são mestres da composição. Olhe para a relação entre a
figura, os móveis e o ambiente. Estude como a luz natural ou artificial caem
sobre as figuras. Observe como a cor é usada para guiar o olhar para uma
figura ou objeto mais do que para outro. Não há necessidade de fazer o palco
parecido como uma pintura, mas um conhecimento do trabalho de composição
pode ajudá-lo a focar a ação que o público irá ver.

RESUMO

É essencial que os atores sejam dispostos no palco de modo que o que


eles fazem fique visível para o público.
Deixe os movimentos evoluirem naturalmente dentro da lógica da
situação.
Se você precisar fazer ajustes físicos para a ação a fim de melhorar a
visualização, faça mais tarde no processo e tente alcançar isso
primeiramente movendo coisas inanimadas, como móveis ou
adereços.
Lembre-se que a organização dos atores no espaço é apenas uma das
ferramenta para a criação de foco - este trabalho será complementado
192
pea iluminação, som, figurinos e cenografia.
Saiba mais sobre composição estudando pinturas figurativas.
11.7 Os segundos e os terceiros ensaios de uma cena

O comprimento do seu período de ensaio e a duração do peça irão


determinar quantas vezes você ensaiará uma cena. Mesmo com um período de
ensaio de oito semanas, se você estiver trabalhando em um peça longa do
século XIX, como 'A Gaivota' (com mais de três horas de duração) você pode
achar que você tem tempo apenas para entre três e quatro ensaios de cada
seção. Em média, você provavelmente vai ensaiar uma cena três vezes.

Quando você ensaiar uma cena pela segunda ou terceira vez, dê


exatamente as mesmas instruções que você deu no primeiro ensaio e continue
a dar o retorno sobre estas instruções. Porque você já discutiu, identificadou e
nomeaou as intenções os atores serão capazes de passar as cenas três,
quatro ou até cinco vezes. Sempre permita que os atores leiam ou digam as
falas uma vez sentados antes deles se levantarem e irem para a cena.

Os atores devem continuar a misturar as palavras que eles se lembram


do texto com palavras inventadas. Idealmente, as palavras da peça vão se
tornando mais familiares durante estes ensaios. Às vezes, porém, um ator, de
repente, aprende as suas falas antes do segundo ensaio, porque ele está muito
ansioso para ter tempo suficiente para praticar essas falas. Nos ensaios que se
seguem uma ênfase indevida pode ser colocada nas palavras ditas enquanto
outros aspectos da situação, tais como intenções e uma visuaalização clara do
lugar podem murchar por um tempo. Continue dando apontamentos sobre as
áreas do trabalho que estiverem sendo negligenciadas e, finalmente, os atores
vão trazer todos os elementos juntos.

Em seus segundos e terceiros ensaios, quando você chegar ao final de


uma cena ou ato você não precisa voltar a improvisar o que aconteceu entre as
cenas, os atos ou as circunstâncias imediatas da cena. Basta lembrar aos
atores da improvisação que você fez a partir da ação da peça juntos. Ou, se
você não fez uma improvisação inicial, lembre os atores do que aconteceu
entre as cenas e imediatamente antes da próxima cena que você irá trabalhar.

Comece a assistir as cenas de ângulos diferentes. Um dia você pode


assistir à ação a partir da perspectiva do público; outro dia você pode assistir a
partir de um ângulo à esquerda, à direita do palco ou acima. As mudanças de
perspectivas podem ajudar você a entender melhor a cena. Isto também irá
incentivar os atores a pensar sobre a situação da peça, ao invés de pensar no
público: isto deve levar a gestos e ações mais realistas. Ao mesmo tempo, você
deve sempre manter a perspectiva do público em mente – pois não haverá
valor na criação de um gesto realista, se ninguém puder vê-lo. E aqui reside o
coração do ofício: imergir os atores na situação, de forma a confirmar que o
que fazem é construído com a perspectiva do público em mente. É esse
equilíbrio entre criar algo realista e estruturar algo artificial que sempre me
fascinou. Naturalmente, o diretor deve ter como objetivo equilibrar essas duas
tarefas com muito cuidado.

O terceiro ensaio de uma cena pode muito bem ser a sua última
oportunidade de passar uma cena antes de você começar a ensaiar atos

193
inteiros ou toda a peça. Em muitos aspectos, este ensaio deve ser idêntico ao
de seus antecessores, mas neste momento você deve considerar a relação do
público a cada cena, o que significa que você terá que estar mais atento em
relação a visibilidade, foco e clareza da narrativa. Não altere pontos centrais
do processo e comece a fazer "desenhos de cena", não mude as intenções ou
o atmosfera da cena. Basta tentar ver o trabalho como se você nunca o tivesse
visto antes. Até agora você tem trabalhado próximo aos atores, então mude
mentalmente. Quando o público assiste pela primeira vez a apresentação, são
frequentemente movidos por uma relação mais objetiva ou distanciada com o
trabalho feito. Isto pode ser um choque e pode acontecer demasiadamente
tarde no processo para permitir as alterações necessárias, então faça os
ajustes da sua percepção na sala de ensaios. Em seguida, dê apontamentos
para os atores usando exatamente as mesmas ferramentas que você tem
utilizado até agora. Observe e avalie o trabalho para garantir que ele seja
comunicado precisamente para o público.

No final do ensaio dê aos atores a impressão de que eles ainda têm


muito tempo para melhorar o seu trabalho. Mesmo que isto não seja
exatamente o caso, mas isso ajudará a manter a calma nos atores. Ao se
aproximarem do dia quando eles irão apresentar pela primeira vez para o
público, a ansiedade pode afetar o que eles estão fazendo de forma negativa.
Suas ideias sobre o que o "público pensa", que normalmente não ajudam,
aumentam e nesse momento e eles deixam de lado as camadas do preciso
trabalho que se sobrepuseram. Eles podem substituir este trabalho com
escolhas rasas ou eles podem tornar-se menos abertos sobre experimentar
novas possibilidades. Eles querem consolidar o que eles estão fazendo -
mesmo que isso não esteja acabado ou claro. Mantenha a coerência.
Suavemente e com firmeza, incentive-os a completar e aperfeiçoar as tarefas
que foram pedidas para que fossem feitas durante todo o período de ensaio.

Aqui estão algumas dicas úteis para a resolução de problemas que


podem ocorrer nos segundos e terceiros ensaios de uma cena. Nestes ensaios
finais você pode descobrir que alguns eventos e intenções não parecem
fornecer dados precisos. Às vezes, um ator vai apontar isso antes de você
apontá-lo. Você pode precisar adicionar mais um evento ou você pode decidir
que um evento existente está no lugar errado. Responda abertamente às
propostas sobre as alterações dos eventos, mas certifique-se de que as
mudanças são precisas antes de ir adiante com elas. Não crie uma cultura de
sala de ensaio em que os eventos e intenções mudam a cada vez que você
passa uma cena.

Às vezes, você vai observar que um ator está tentando amontoar todo o
passado do personagem em uma única cena. Isso é muitas vezes perceptível
quando eles estão excessivamente emocionados. Eles observaram
corretamente que o personagem tem uma série de experiências dolorosas no
passado, mas eles colocam a dor de todos os eventos em uma única cena -
como se todos os eventos tivessem acontecido segundos antes que a ação
começasse. Se isso ocorrer lembre-os que as memórias são armazenadas em
diferentes volumes ou intensidades e que a cena é somente uma fatia em toda
a vida de uma pessoa. O objetivo do trabalho é fazer com que essa fatia seja

194
tão precisa quanto possível e fiel à biografia que a precedeu. Peça-lhes para se
concentrar em uma memória do passado que ele sinta que alimente a ação
mais precisamente.

Às vezes, os atores não vão saber como usar no trabalho o passado do


seu personagem. Assim que começar a trabalhar na peça eles vão abandonar
este trabalho a respeito do passado e concentrar-se na cena como se fosse um
barco flutuante em um amplo e inexpressivo oceano. Eles podem falar sobre
eventos passados, sem ter quaisquer imagens em suas cabeças. Não se
preocupe com isso. Continue a fazer ligações entre o trabalho que eles fizeram
sobre o passado do personagem e a ação presente. Por exemplo, quando sua
personagem se referir a uma memória particular, peça-lhes para recordar uma
imagem clara da improvisação que eles fizeram, o que poderia ter criado a
memória. Quando eles demonstrarem uma nova intenção, lembre-os de que o
combustível são os eventos passados entre um personagem e outro. Peça-lhes
para pintar um retrato desse evento para você ou lembre-os da improvisação
que eles fizeram em torno desse evento.

Em outros momentos, você pode assistir a um ensaio e sentir que toda a


cena está fora de foco ou confusa. Por exemplo, você pode sentir que os dois
atores em uma cena estão com aspectos um pouco estranhos, ou que o ritmo
da cena não é muito preciso, ou que tudo apenas "parece uma bagunça". Não
entre em pânico e não descreva o problema para os atores. Em vez disso,
peça-os para fazer a cena novamente e se concentrarem em um ou dois
aspectos do trabalho de sua lista de verificação de retorno do Capítulo 9. Por
exemplo, peça aos atores para "acentuar o seu trabalho sobre os
acontecimentos e as intenções". Dessa forma, eles podem repetir a cena,
praticando alguns de seus ingredientes essenciais, enquanto você vê
novamente e diagnostica onde os problemas mais profundos aparecem. Às
vezes, o simples ato de pontuar aos artistas sobre esses ingredientes
essenciais, irá soltar a cena e limpar o "desenho de cena" ou o problema.
Lembrar a eles o título da cena ou ato também pode ajudar a soltar uma cena
que está presa.

Em seguida, haverá momentos em que os atores têm o mesmo


sentimento negativo que você tem sobre a cena. Eles vão te dizer que eles
estão completamente confusos ou que eles não sabem o que estão fazendo.
Não fique alarmado com esta resposta e não lhes peça para repetir a cena
imediatamente depois de terem dito isso. Em vez disso, sentem-se e pergunte
qual parte do trabalho não está clara. Novamente, tenha a lista de verificação
de retorno do Capítulo 9 em sua mente. Por exemplo, pergunte a eles: "O
problema é com alguma coisa antes da ação, como um evento no passado do
personagem, ou as circunstâncias imediatas? Ou é sobre a ação da própria
cena, como uma intenção ou evento? Ou é sobre alguma confusão sobre o
lugar que seus personagens estão?" Estas simples perguntas irão ajudá-lo a
identificar as partes do trabalho que estão causando o problema na cena. Não
deixe que esta conversa continue por muito tempo. Uma vez que você sinta ter
afastado o problema, peça-os para testar o diagnóstico fazendo a cena
novamente.

195
Lembre-se de resistir à tentação de resolver tudo em uma única
passada. Em vez disso, mantenha alguns apontamentos prontas para a
próxima vez que você trabalhar a cena ou o exercício. Certifique-se se sua
linguagem está refletindo seu propósito primordial - tornar o comportamento
dos personagens claros para o público.

Ao longo dos ensaios mantenha os olhos sobre o que os atores estão


fazendo fisicamente. Na minha experiência, quanto mais profundamente os
atores adentram na peça, mais eles esquecem todas as observações úteis
feitas no início de ensaios sobre a forma como o corpo responde em situações
da vida real e menos interessados eles se tornam em atuar essas coisas (tais
como o tempo e o lugar) que tem um forte impacto sobre seus corpos. Eles
tornam-se menos precisos fisicamente, especialmente na parte de baixo de
seus corpos. Eles podem ficar parados sem mover um músculo da cintura para
baixo ou seus braços e mãos podem ficar em um estado não natural relaxados
nas laterais de seus corpos. Sempre que possível, lembre-os de qualquer coisa
relevante que eles possam utilizar a partir das experiências reais que eles
encenaram quando eles estavam trabalhando com as ideias e as emoções.

Lembre-se que a medida que os atores aprendem suas falas você


precisará reservar um tempo para prática-las e executá-las. Faça isso no início
do ensaio e peça ao diretor de palco para fazer este trabalho. Este é um
exercício técnico e é melhor feito sem o diretor.

No final destes ensaios, você estará pronto para começar a fazer um


passadão.

196
RESUMO

No segundo ensaio repita as mesmas instruções que você deu no


primeiro ensaio e dê um retorno claro sobre as mesmas tarefas.
Permita que os atores ainda não sabibam todas as falas da peça.
Assista ao trabalho a partir de ângulos diferentes, mas nunca perca o
ponto de vista do público de sua cabeça.
No terceiro ou último ensaio começar a pensar como se você fosse um
membro da plateia assistindo o trabalho pela primeira vez. Dê
apontamentos em resposta às descobertas feitas, fazendo o ajuste de
como você olha.
É esperado que o medo iminente da estréia irá afetar como os atores
trabalham. Seja paciente com eles e não mude sua forma de trabalhar.
Altere quaisquer intenções ou eventos que não estão funcionando. Ajude
os atores a aprender a usar suas biografias nos trabalhos sobre as
cenas.
Se a cena é completamente desfocada, continue dando instruções a partir
de sua lista de verificação de retorno até que você possa identificar o
problema.
Se os atores dizem que eles estão completamente confusos, pare e, em
conjunto, identifique o problema.
Fique de olho no lado físico do trabalho dos atores.
Separe um tempo para os atores para aprenderem as suas falas.

11.8 Passadão

Coloque as partes da peça juntas antes de fazer um passdão de toda a


peça. Se é uma peça clássica com uma estrutura formal, como 'A Gaivota', faça
cada um dos atos individualmente antes de coloca-los todos juntos em um
passadão sem paradas. Se você estiver trabalhando com uma peça de teatro
que não tem uma estrutura formal, escolha um ponto de quebra lógica na peça
(talvez o ponto em que você esteja planejando colocar um intervalo) e execute
essa primeira parte.

Faça um passadão no final da sua penúltima semana de ensaios. Isso


lhe dará pelo menos uma semana para fazer qualquer alteração em resposta a
descobertas sobre a estrutura geral. Se você precisar fazer um passadão mais
tarde do que isso, por causa de um curto período de ensaio, certifique-se de
dar-se algum tempo para corrigir quaisquer problemas - mesmo que sejam
apenas um par de dias.

197
Quando você coloca todas as cenas juntas algumas de suas escolhas
podem não funcionar. Isto é inevitável: não se assuste excessivamente se o
trabalho não está bem como você queria que ele estivesse. O primeiro
passadão é parte do processo de ensaios e não se trata da entrega de um
produto perfeito. Faça o passadão parecer como um ensaio qualquer( que é
claro que é). Diga aos atores que você está colocando em prática todas as
pequenas cenas juntas, assim como você enfia pérolas em um colar. Deixe-os
saber que suas expectativas são baixas e que o passadão vai simplesmente
ajudar todos a aprender o que eles fizeram até agora e determinar o que
trabalhar a seguir. Se você tiver uma lista de apontamentos, descreva o
passadão como um "tropeção" de modo a diminuir a pressão sobre os atores.

Tente manter as pessoas que estão envolvidas superficialmente no


processo, fora de seu primeiro passadão. Se pessoas como diretores artísticos
ou produtores chegarem no início do passadão os atores podem ficar
excessivamente ansiosos. Esta ansiedade poderá distorcer as ações
trabalhadas, o que significa que eles não vão realizar os apontamentos que
você pediu para realizarem bem, e que você não será capaz de aprender tanto
quanto você podia no prazo. O retorno dado por pessoas de fora é essencial no
processo, mas o momento desse retorno é fundamental. Convide pessoas para
o último ensaio, o ensaio com figurino, a primeira ou segunda apresentação
pública - quanto mais tarde melhor. Às vezes porém, é impossível evitar novas
pessoas que vêm para assistir aos ensaios: a melhor maneira de passar por
isso é lembrar-se das tarefas que você precisa alcançar e cumpri-las.

Depois de assistir o primeiro ensaio completo você mesmo pode ficar um


pouco instável por causa do medo, frustração ou excitação. Estabilize-se antes
de dar apontamentos. Idealmente o passadão acontecerá no fim do dia e você
poderá trabalhar em suas notas durante a noite. Se não, pelo menos, dê uma
pausa para o café antes de fazer uma sessão de apontamentos. Edite suas
notas com cuidado, escolhendo o que dizer para os atores e o que você
precisa refletir primeiro. Muitas vezes você vai fazer algumas grandes
descobertas durante o passadão e algumas delas irão primeiro aparecer para
você como grandes impressões. Lembre-se que grandes problemas são
melhor resolvidos fazendo pequenas correções, por isso é melhor não
compartilhar seus pensamentos sobre grandes problemas com os atores. Em
vez disso, vá embora e pense sobre como converter essas impressões gerais
em específicas e em apontamentos concretos. Não importa quais são suas
maiores preocupações, dê aos atores a impressão de que você está feliz com a
direção que o trabalho está seguindo e agradeça-os por fazerem parte do
trabalho.

Frequentemente, observações após os passadões são feitas no final do


dia de ensaio e o diretor faz apontamentos aos atores muito rapidamente.
Tente evitar isso; em vez disso, dê tempo aos atores para discutir quaisquer
apontamentos que não estão claros. Isto é particularmente importante se você
não tem tempo suficiente para tudo. Eu marco entre uma hora e meia e duas
horas para dar o retorno com os apontamentos depois de um passadão.

198
Antes de dar os atores as suas observações, peça a cada um deles por
vez para brevemente dar o retorno deles sobre como foi o ensaio e identificar
as cenas que eles mais querem trabalhar. Muitas vezes, um ator vai apontar
um problema que eles tiveram que irá salvá-lo de dar-lhes um apontamento.
Isso também irá lhe dar uma ideia clara de onde se encontram as prioridades a
serem trabalhadas para que você possa planejar a próxima semana de ensaios
em conformidade com isso.

Pedindo aos atores o retorno de cada um, você começa também a


estimular uma autocrítica ou autoanálise em cada ator. Seu objetivo
preferencial é que eles sejam auto-diretores nesse momento: eles devem ser
capazes de sair de cena depois de uma apresentação e avaliar o que eles
fizeram e saber como melhorar ou se aprofundar.

Depois de ter ouvido o retorno deles, diga suas observações. Lembre-se


que fazer os apontamentos após o primeiro passadão é um momento único no
processo. Os atores serão mais receptivos aos apontamentos depois do
passadão do que após um ensaio normal de uma cena. Portanto, aproveite a
oportunidade para resolver um problema que você identificou a algum tempo
com um ator a respeito de alguma escolha que você queria que ele fizesse.
Você pode argumentar que o passadão lhe mostrou que a escolha que ele
preferia não seria possível. É também um bom momento para fazer grandes
cortes. Lembre-se, no entanto, que os atores são mais vulneráveis após um
primeiro passadão do que após o primeiro ensaio de uma cena, então a
abordagem muda, você precisa fazer isso cuidadosamente. Julgue bem este
momento e você poderá fazer várias alterações essenciais para o trabalho.

Lembre-se, também, que quanto mais perto você está de se mudar para
o teatro ou o local da apresentação, mais tenso os atores podem ficar quando
se tratar de ouvir apontamentos. A sessão de apontamentos após o primeiro
passadão é o momento em que a tensão pode começar a mostrar-se. Por
exemplo, os atores que recebiam apontamentos rápidos durante todo o
processo de ensaios podem, de repente, entrar em desacordo com todas os
seus apontamentos ou questioná-lo longamente sobre uma coisa em particular.
Um ator que é normalmente falante, nos momentos de apontamentos pode, de
repente, ficar em silêncio. Este é apenas um sinal do crescente temor sobre a
estréia da peça e cada ator vai demonstrar a sua ansiedade de maneiras
diferentes. Seja paciente e compreensivo. Isto vai passar.

199
RESUMO

Coloque partes da peça juntas antes de executar o passadão.


Faça o primeiro passadão no momento que você tiver pelo menos dois
dias para fazer as correções em resposta às suas descobertas.
Não se preocupe se houverem erros de direção.
Não convide pessoas de fora do processo para o primeiro passadão.
Faça o passadão ser sentido como um outro ensaio.
Faça uma pausa antes de dar apontamentos para fechar, e trabalhe
através de suas reflexões - de preferência durante a noite.
Não dê aos atores impressões vagas. Em vez disso, processe essas
impressões e, em seguida, converta as soluções em pequenas tarefas
concretas para os atores.
Antes de dar os seus apontamentos, peça aos atores para que eles
mesmos dêem um retorno breve, incluindo as cenas que eles estão
mais dispostos a trabalhar.
Valorize a singularidade do momento de dar apontamentos após o
primeiro passadão.
Lembre-se que os atores estarão vulneráveis após o primeiro passadão e
que você deve ter cuidado sobre como você sugere quaisquer
alterações.
Dê tempo durante o retorno com seus apontamentos para que os atores
possam discutir aqueles apontamentos que não estão claros.
Espera-se que os atores respondam de formas diferentes aos
apontamentos após um passadão

11.9 Como organizar os dias finais na sala de ensaio

Esta fase de ensaios deve equilibrar o trabalho que você precisa fazer
com o trabalho que os atores estão mais preocupados. Muitas vezes as
preocupações são as mesmas, mas se não forem, seja paciente com as
preocupações dos atores. Remova estas preocupações ensaiando a cena de
forma sensata e eles vão entrar nos ensaios técnicos mais confiantes.

Passe algum tempo ensaiando quaisquer mudanças nesses intervalos


de horas, dias ou semanas após o primeiro passadão. Em seguida, passe a
peça novamente, de preferência no penúltimo dia de ensaios. Isso permite que
você use o dia final na sala de ensaios para trabalhar em apontamentos. Mais
uma vez, certifique-se de alocar tempo suficiente para dar esses
apontamentos. Este será o seu último passadão e é fundamental que seus
apontamentos sejam claros.

Como você segue em direção à estréia os atores sentirão medo e os


"pensamentso no público", que em nada ajudam, aumentarão. Isto será mais

200
visível no passadão final e pode alterar o que eles estão fazendo. Às vezes, a
alteração será sutil e pequena; às vezes pode ser grande e gritante. Por
exemplo, os atores podem começar a alterar onde eles estão em pé, porque
estão preocupados que o público não seja capaz de vê-los ou eles podem
começar a falar mais alto, porque estão ansiosos sobre o que está sendo
ouvido. Ações que anteriormente eram discretas podem tornar-se subitamente
amplificadas porque os atores estão preocupados que o público não seja capaz
de compreendê-los se as ações forem feitas em tamanho natural. Apesar de
como essas alterações se manifestarem, você vai notar que mais energia
mental está sendo gasta fora do trabalho no personagem e nas situações, com
os atores começando a se preocupar sobre como o público vai receber ou
entender o que eles estão fazendo. Se este for o caso, aponte suavemente isto
para o ator em questão, peça-lhe para corrigir o desequilíbrio e continue dando
o retorno sobre o trabalho a partir de suas listas de verificação de
apontamentos.

Como diretor, você também deve cuidar de si mesmo. Não se desgaste


excessivamente nos últimos dias ou semanas de ensaio. Você vai precisar de
energia e de recursos para a próxima fase - o ensaio técnico. Mantenha as
regras de ouro 1 e 12 em mente: dê pequenos passos, mantenha as metas de
longo prazo no seu campo de visã e mantenha a calma. Estas duas regras irão
ajudá-lo a manter as coisas dentro das perspectivas.

RESUMO

Após o primeiro passadão, faça as alterações e correções no trabalho.


Mantenha-se atento para as mudanças que são trazidas pelos atores
como resultado do medo com a mudança iminente para o teatro ou
local da apresentação.
Cuide de si mesmo: defina metas de longo prazo dando pequenos passos
e mantenha a calma.

11.10 Trabalhando no cenário, figurinos, som, iluminação e músicas


durante os ensaios

Seu relacionamento com os membros de sua equipe criativa é melhor


mantido se vocês se manterem em contato com regularidade: sempre
compartilhe suas preocupações ou ideias quando surgirem, não obstante quão
pequenos ou aparentemente irrelevantes. Os problemas ocorrem quando o
diretor não se comunica regularmente com a equipe de criação, o que significa
que uma vez que você passar para o teatro, as coisas não podem ser como
você quer que sejam. Talvez a luzes aparentes que você viu em sua
imaginação não são as mesmas, ou a cor ou o corte de um figurino que você
vê pela primeira vez no palco não é como você queria que fosse. Neste ponto
do processo, muitas vezes é tarde demais para mudar as coisas.
201
Há três maneiras de se comunicar com sua equipe criativa durante os
ensaios: primeiro, eles podem vir aos ensaios; segundo, você pode falar
durante as reuniões de produção; e, em terceiro lugar, você pode telefonar para
eles.

Em um mundo ideal, todos os membros de sua equipe criativa vão


testemunhar diferentes fases do processo de ensaio descrito no capítulo
anterior. Em alguns casos, você pode pedir-lhes para vir para ensaios
específicos, por exemplo, a biografia dos personagem em uma sessão de
grupo. Isto dará ao cenógrafo ou ao figurinista informações de grande valor
sobre os personagens para qeu sejam adicionadas ao trabalho você já fez com
eles. Estas informação pode então ser traduzidas para detalhes nos figurinos.
Se você está preocupado com uma cena em particular do ponto de vista de
iluminação, você pode pedir ao iluminador para vir e assistir a um ensaio da
cena com você. Alternativamente, os membros de sua equipe podem assistir
aos ensaios sobre uma perspectiva diferente, trabalhando com você de acordo
com seus outros compromissos ou outros empregos. Às vezes, eles não serão
capazes de ver nenhum ensaio e virão para o último passadão. Esta é uma
etapa essencial, pois oferece-lhes um primeiro olhar da atmosfera e da forma
geral do trabalho.

As reuniões semanais de produção irão lhe fornecer um fórum para


discutir os detalhes emergenciais dos ensaios que afetam áreas particulares.
Reuniões de produção são uma oportunidade para discutir os novos ou
inesperados desdobramentos da produção. Se, por exemplo, você descobrir
que alguém precisa saltar sobre uma mesa em uma das cenas o diretor de
palco poderá passar esta informação para a cenotécnica providenciar os
ajustes. Na reunião de produção você e o cenógrafo vão discutir como reforçar
a mesa que já foi concebida. Você pode descobrir durante os ensaios que você
precisa de uma iluminação aparente específica. Na reunião de produção, você
e o iluminador irão discutir que tipo de luz será então necessária.

Telefonemas individuais para membros de sua equipe criativa sobre as


preocupações que se relacionam com seus diferentes campos vão preeencher
as lacunas de comunicação.

Discutir as mudanças que afetam o cenografia é particularmente


importante se a cenografia é levantada antes dos ensaios começarem. A
cenografia será construída conforme o andamento dos ensaios. Como
consequência do processo de ensaio, inevitavelmente você irá exigir
modificações do projeto original: algumas dessas mudanças serão possíveis e
algumas não, dependendo do estágio em que estiver a cenografia em termos
do trabalho de construção e de pintura. Você tem que ser realista. No entanto,
se você estiver frequentemente em contato, você terá possibilidades
máximizadas para fazer alterações.

Lembre-se que o seu iluminador e o sonoplasta terão prazos para


entregar seus mapas de iluminação e som. Esses mapas dizem respeito ao
que eles querem sobre as luzes ou alto-falantes que necessitam ser
pendurados sobre a plataforma, na cenografia, no palco, etc. Esteja atento

202
quanto a estes prazos, porque eles podem demarcar o momento em que seus
respectivos criadores podem não ser mais capazes de ajustar facilmente
quaisquer novas sugestões vindas dos ensaios. Dito isto, tenha certeza de que
um bom iluminador ou sonoplasta oferecerá a você alternativas criativas nestes
casos.

Após o primeiro passadão, reserve um horário fora do ensaio a fim de se


reunir com os diferentes membros de sua equipe de criação para discutir como
o projeto deles pode se desenvolver ou melhorar o que você fez com os atores.
Converse com eles sobre cada uma das suas ideias individualmente e as suas
necessidades cena por cena. Pergunte ao seu assistente de palco (ou quem dá
as deixas da peça5) para vir no maior número dessas reuniões possíveis. É
importante que eles começem a entender o que você quer do ponto de vista do
som e da iluminação; esta pessoa vai, afinal, ser responsável por dar as deixas
para o funcionamento de todos estes novos elementos.

Anotar todas as deixas de som, a iluminação e as sugestões de música


no caderno de notas do diretor de palco pode levar muito tempo do seu ensaio
técnico. Então adiante-se colocando quantas deixas você puder no caderno
durante os últimos estágios do período de ensaio. Isto é particularmente
importante se você tiver um período de ensaios técnicos muito curto. Ou,
sente-se com o diretor de palco e percorra as deixas uma por uma ou peça a
ele para se reunir com o iluminador e o sonoplasta separadamente para
colocar as deixas provisórias no caderno. Estas deixas provisórias irão fornecer
um ponto de partida inestimável, mesmo que as deixas mudem no ensaio
técnico. Se você tem um operador de som na sala de ensaios, então as deixas
podem ir direto para o caderno como as ideias de som que já foram integrados
na ação. Neste caso, sua ênfase principal antes do ensaio técnico será nas
luzes e nas músicas.

Se você não tem tempo para fazer as deixas no livro, pelo menos,
converse sobre a sequência de abertura - em especial quando você quer que
as luzes da casa sejam diminuídas, quando você quer que a ação seja
revelada e quando você deseja que o som comece. Você será surpreendido
com o quão complexo é essa tarefa a partir de um ponto de vista das deixas.
Planejar a sua cena de abertura irá significar que você começa o seu ensaio
técnico de uma forma mais forte.

5
Essa função de ponto da peça, costuma ser utilizada em grandes produções com grandes elencos e
muitas entradas e saídas (Nota do revisor)

203
RESUMO

Comunique-se regularmente com sua equipe criativa sobre o trabalho que


você está fazendo nos ensaios.
Atualize-os sempre com as novas ideias que surgem, mesmo que
pequenas ou aparentemente irrelevantes.
Para fazer isso, convide-os para tantos ensaios quanto forem possíveis,
fale com eles em reuniões de produção ou telefonando para eles.
Certifique-se de que eles vejam, pelo menos, um passadão, embora o
ideal seja que vejam todos eles.
Esteja ciente de seus respectivos prazos.
Agende reuniões durante a última semana de ensaios com todos os
membros de sua equipe de criação para discutir suas ideias, cena por
cena. Certifique-se que o assistente de palco assista a todas estas
reuniões.
Certifique-se que o assistente de palco realizaou muitas anotações sobre
as deixas a respeito da iluminação, sonoplastia ou música que
puderem antes do início do ensaio técnico.

11.11 Como fazer tudo isso com um período de ensaio curto

Um período curto ensaio não significa necessariamente que o processo


será comprometido. Você ainda pode alcançar a excelência se você estiver
bem preparado e usar o tempo que você tem economicamente. Aqui estão
algumas sugestões sobre como conseguir um trabalho que seja claro em uma
quantidade limitada de tempo.

Analisando a ação da peça com os atores: É essencial ir para texto, isolar e


nomear os eventos. Faça isso, conforme descrito nas páginas 179 e 180 e
tome o tempo que for para esclarecer todas as escolhas. Forneça aos atores
as informações tanto dos eventos que acontecem entre os atos ou cenas
quanto das circunstâncias imediatas entre cada ato seja durante a análise dos
eventos ou pouco antes de trabalhar cada uma dessas cenas. Isto irá
proporcionar-lhes um ponto de partida concreto. Eles podem aprimorar os
detalhes desses eventos durante os ensaios das cenas.

Delimitando os espaços das cenas: O diretor de palco pode fazer isso sem
ter que usar qualquer parte do seu tempo de ensaio.

Improvisando o evento gatilho e circunstâncias imediatas: Se você fizer


apenas uma ou duas improvisações em todo o seu processo, construa elas em
torno do evento gatilho. Lembre-se que este evento gera a ação da peça. Você
não precisa improvisar as circunstâncias imediatas se você não tem tempo
para isso. Alternativamente, lembre os atores das circunstâncias imediatas
pouco antes de ensaiar a cena em que as circunstâncias se relacionam.

204
Como estruturar o dia de ensaio: Observar o mapa de como estruturar seus
dias, como sugerido neste capítulo. Lembre-se: é melhor ensaiar uma cena
apenas duas vezes e configurar todos os alvos do que ensaiar dez vezes e
fazer mudanças curtas como através de instruções.

Ensaiando uma cena pela primeira vez: Conduza este ensaio como descrito
no seção 11.5. Para economizar tempo, de as sugestões aos atores das suas
intenções ao invés de discutirem juntos. Os atores podem fazer testes técnicos
de como eles podem fazer a cena e encontrar alternativas caso não funcione o
que estão testando. Não faça improvisações da ação entre as cenas ou atos.
Em vez disso, converse brevemente sobre estes eventos. No entanto, esteja
avisado que uma improvisação rápida e bem estruturada podem muitas vezes
ser mais eficientes do que discussões.

"Desenho de cena", ou deixando a ação clara para o público: Isto é


aplicável você tendo entre dez dias ou oito meses para ensaiar uma peça.
Tente evitar fazer "desenho de cena" para os atores, mesmo se você tiver
muito pouco tempo: isso não vai produzir um trabalho duradouro que seja
interessante para assistir. Em vez disso, passe mais tempo durante o processo
a procura de detalhes interessantes de como cada personagem vai usar
logicamente o espaço ou os espaços. Certifique-se de que você e o cenógrafo
tem feito todo o possível para assegurar que a concepção e a colocação das
coisas irá dar foco e clareza para a ação.

O segundo e terceiro ensaio de uma cena: a maioria dos períodos de ensaio


permitirá três ensaios de cada cena antes de um passadão. Se você tiver a
chance de fazer apenas dois ensaios, simplesmente garanta que você dará
instruções muito claras e não vacile mais sobre eles. Seja breve em seu
retorno para que mais tempo seja gasto fazendo as cenas ao invés de falando
muito sobre elas.

Passadões: Organize um passadão do trabalho e certifique-se que você tem


pelo menos um dia após o primeiro passadão antes de executá-lo novamente.

205
Easter de August Strindberg

206
Ivanov de Anton Chekhov

207
PARTE 3 - ENTRANDO NO TEATRO E A TEMPORADA

Jephtha de George Frideric Handel

208
ENTRANDO NO TEATRO E A TEMPORADA
(Tradução de Diego Leonardo - Revisão Humberto Issao)

Você estará no seu mais vulnerável período entre os ensaios técnicos de


ensaio e a pressão da noite de estréia. A aproximação do publico vai te afetar
de uma maneira ou de outra, independente do quão estável ou contente você
se sinta sobre o seu trabalho nas salas de ensaio. Não deixe a ansiedade por
causa das eminentes apresentações, a pressão da noite de estréia, suas
dúvidas, mudar o jeito que você trabalha ou a forma que você conduz as suas
relações – com cada ator ou com a sua equipe criativa. A ansiedade pode lhe
atingir a qualquer ponto do processo até a noite da estréia. Administre isso
continuando firme na sua linguagem e nos objetivos que foram traçados na
sala de ensaio. A forma que você tirou o melhor trabalho de todo mundo.

Nesse ponto do processo, seu trabalho é ser o mais consistente e


estável possível. Não entre em pânico e comece a fazer alterações de última
hora. Se você ficar assustado, tire um intervalo de alguns minutos, acalme a
sua mente e se pergunte: "Quais as mais simples etapas práticas que eu
preciso fazer para afinar o trabalho ou resolver o problema?" Depois realize
essas etapas, uma por uma.

Se os atores começarem a esquecer o que estava sendo feito nas salas


de ensaio, não fique indevidamente ansioso: o trabalho vai voltar. Em vez
disso, tente remover algumas coisas que estão bloqueando a imaginação deles
sobre o universo da obra. Se algum membro criativo ficar indevidamente
ansioso e incapaz de fazer alguma função, fique calmo. Faça-o se focar em
uma coisa que seja simpes que precisa ser feita ou o que é realisticamente
possível no tempo qeu resta.

Mudando-se para o teatro, você tem que ficar de olho em mais coisas do
que na sala de ensaio – agora você tem a luz, a sonoplastia e um visual novo
para acrescentar nos ingredientes além do trabalho de atuação. Então tenha
certeza de que você está tomando nota eficientemente. Para lidar com o
aumento do numero de ingredientes que você deve dar conta tente dividir o seu
caderno em duas colunas. Coloque as notas de ação em uma coluna e as
notas sobre a técnica em outra. Dessa forma você vai conseguir dar o retorno
de forma mais rápida e eficiente. Crie uma lista de tudo o que você precisa
trabalhar em cada cena. Tente nomear uma página por cena, desse modo você
pode anotar pensamentos aleatórios sobre o trabalho que precisa ser feito na
página certa e voltar para ela facilmente. Planejar cuidadosamente como e
quando você voltará para lidar com cada item na sua lista.

A produção parece um pouco com o tricotar – se você colocar algo muito


duramente ou repentinamente nessa altura do processo, a coisa toda começa a
desandar. Continue com a cabeça limpa, continue mantendo o que você tem
trabalhado e caso faça alguma alteração, seja muito cuidadoso.
209
Diferencie cuidadosamente as coisas que podem ser adicionadas e as
coisas que não. Se, por exemplo, você cometeu um erro na seleção do elenco,
reconheça que você nunca vai conseguir tornar o ator no que você desejava.
Você, talvez, consiga fazer chega-lo perto do que você imaginou. Aceite o
compromisso e coloque energia nas áreas que você pode mudar. Meu maior
erro no início foi me preocupar com problemas que não tinham soluções,
frequentemente na área da seleção de elenco. Eu gastei bastante tempo
reclamando de coisas que eu não poderia mudar ou tentando mudá-las sem
conseguir resolver o problema de qualquer forma. Depois de muitos anos
gastando meu tempo assim, eu finalmente aprendi a gastar meu tempo em
coisas que poderão fazer efeito.

Finalmente, lembre que há muitos novos conceitos e termos que você


precisa conhecer no processo (veja o glossário onde todos os novos termos
desse estágio do processo estarão em negrito). Tire um tempo para se
familiarizar com essas novas palavras e ideias porque não tem coisa pior que
você ficar perdido sem entender o que alguma pessoa está falando quando o
assunto são coisas técnicas ou agendar sua presença em um ensaio técnico só
para descobrir que você não era necessário lá.

Easter de August Strindberg

210
12. Capítulo - Ensaios técnicos e o ensaio geral
(Tradução de Mateus Santos - Revisão Humberto Issao)

Este capítulo descreve os passos pelos quais você vai fazer a


montagem da peça no teatro e o trabalho que você deve fazer com a produção
até pouco antes da estréia. O capítulo inclui conselhos sobre o seguinte
tópicos:

12.1 - A programação para a montagem no teatro e os ensaios técnicos


12.2 - Como gerir a transição da sala de ensaios para o teatro junto aos atores
12.3 - Como trabalhar com sua equipe criativa durante os ensaios técnicos
12.4 - A afinação da luz
12.5 - Afinando o som e a música antes de começar o ensaio técnico
12.6 - Ensaios técnicos
12.7 - O ensaio geral

12.1 A programação para a montagem no teatro e os ensaios técnicos

Na maioria dos teatros, ainda que pequenos, você receberá uma


programação técnica que descreve tudo o que vai ser feito para fazer a
montagem da produção no teatro e para a estréia. Este calendário será
discutido cerca de uma semana antes de você entrar no teatro em uma reunião
de produção; passe por isso com um pente fino verificando se o tempo está
sendo usado como você e sua equipe criativa desejam. Diferentes projetos têm
diferentes prioridades e erros muitas vezes podem ocorrer quando um
cronograma genérico é imposto a um processo que necessita de uma
abordagem feita mais sob medida.

Há três passos básicos para qualquer programação técnica. Em primeiro


lugar, existe o processo pelo qual o cenário, as luzes e os elementos de som
são montados no teatro. Isso começa com a transposição do cenário para o
teatro, e termina com a afinação das luzes e a verificação das caixas de som e
das pistas sonoras. Não é necessário para o diretor participar de qualquer uma
destas fases do processo técnico. Em segundo lugar, existem as sessões de
afinação quando a luz, a música e as deixas de som são trabalhadas em
preparação para o ensaio técnico. É essencial que o diretor esteja presente
nesta fase, mas os atores não são normalmente chamados. Finalmente, há os
ensaios técnicos em que os atores se juntam a equipe técnica completa para
trabalhar com a sequência da produção e classificar todos os aspectos técnicos
da obra, da luz, do som e das deixas, praticando com as novos maçanetas
sobre o cenário para que as mudanças sejam rápidas. Ensaios técnicos
acontecem com a iluminação completa, som, figurinos, cenário, adereços,
maquiagem, perucas e quaisquer efeitos especiais tais como o vento ou
sangue. É aconselhável programar um tempo para dar aos atores para trocas
de roupa e colocar e tirar os figurinos. De fato, muitos sindicatos especificam
um prazo legal de 15 minutos no começo e no fim de cada ensaio técnico. Isto
pode lhe dar meia hora extra para fazer um trabalho técnico como a afinação
da iluminação ou as deixas do som uma vez que os técnicos e o diretor de
palco não necessitam destas pausas mais longas.

211
Diferentes teatros irão alocar diferentes quantidades de tempo para cada
um destes três passos, dependendo de seus orçamentos, acordos sindicais e
repertório. Você pode, por exemplo, ter dois dias para a transposição e três
dias de ensaios técnicos como no National Theatre em Londres, ou apenas um
par de horas para a montagem do cenário e três horas de ensaio técnico em
um teatro alternativo na mesma cidade. No entanto, na minha experiência, o
comprimento do primeiro passo é sempre subestimado, independentemente do
tamanho do teatro. É uma prática aceita que essa etapa não pode invadir ou
atrasar o início pré-estabelecido do ensaio técnico - exceto em circunstâncias
excepcionais. Isto significa que existe quase sempre menos tempo para fazer
as afinações que são originalmente programado. Tenha isso em mente quando
você fala com o sonoplata e iluminador sobre como você deseja usar o seu
tempo e certifique-se que você tem um plano de reserva se esse tempo for
reduzido.

RESUMO

Familiarize-se com as três etapas do cronograma técnico.


Passe em revista a programação antes de entrar no teatro para verificar
se tudo está programado como você e sua equipe criativa desejam.
Tenha um plano reserva para as sessões de afinação caso o tempo
original alocado no cronograma técnico seja reduzido por causa de
algum atraso na montagem do cenário.

12.2 Como gerir a transição da sala de ensaios para o teatro junto aos
atores

A maneira pela qual o diretor negocia a transição da sala de ensaios


para o teatro precisa de cuidadosa reflexão. Gerenciá-lo sem problemas vai
fortalecer o trabalho dos atores e sua capacidade de ajudá-los a desenvolver
esse trabalho. Gerenciá-lo ineficientemente vai enfraquecer o que os atores
estão fazendo bem como sua influência sobre seu trabalho. Então você vai
perder tempo tendo que reconstruir a sua confiança e suas escolhas de
atuação.

Na sess Capítulo 9 eu escrevi sobre a redução do número de novos


ingredientes que os atores têm que abraçar em um ensaio técnico, adicionando
ingredientes como som, figurinos, adereços e sapatos reais na sala de ensaios.
Se você conseguiu alcançar isso, você terá ajudado a aliviar
consideravelmente este momento de transição. Se, entretanto, você não foi
capaz de integrar qualquer um destes ingredientes na sala de ensaios, não se
preocupe. Apenas lembre-se de levar o ensaio técnico com muita sensibilidade
tendo em vista o fato de que os atores têm que absorver um grande número de
novos elementos.

212
Na seção "como organizar os dias finais na sala de ensaio", escrevi
sobre como os pensamentos dos atores na transição da sala de ensaio para o
teatro pode aumentar o pensamento deles sobre como fazer o que estão
fazendo claramente para o público em detrimento da atuação mergulhada no
personagem ou nas situação. Este problema pode se intensificar à medida que
começarem os trabalhas no teatro. Se um ator não sofreu o impacto das
apresentações públicas iminentes na sala de ensaios, em seguida, ele ou ela
vai definitivamente senti-lo de uma forma menor ou maior, uma vez que
começarem os ensaios técnicos. Como escrevi na seção de ensaios gerais no
Capítulo 11, o ator pode desenvolver uma maior preocupação sobre ser visto
ou sobre ser ouvido mesmo que esteja bem posicionado ou que a voz dela
estejá audibível. Eles podem tornar-se preocupados com a forma como o
personagem vai ser entendido, comecar a duvidar de seus figurinos ou desafiar
escolhas de atuação que você achava que eram sólidas. Essas respostas são
completamente compreensíveis e nascem principalmente do medo.

Há quatro maneiras simples de ajudar os atores a reduzir esses medos.

Em primeiro lugar, tenha cuidado com a linguagem que você usa na sala
de ensaios no que se relacionar com o trabalho que você vai fazer no teatro.
Na semana final de ensaios refiro-me, brincando, ao teatro como "a outra sala"
e falar sobre isso como um lugar onde vamos "compartilhar o trabalho com
outras pessoas". Esta linguagem é a minha maneira de ajudar o ator a construir
uma ponte entre as duas fases do processo. Cada diretor terá de achar seu
próprio modo de fazer isso.

Em segundo lugar, não tente alterar o idioma que você tem utilizado na
sala de ensaios nos últimos dias por lá. Durante os últimos dias de ensaios ou
assim que você começar a trabalhar no teatro palavras mudam sutilmente sem
você perceber: "a peça" se torna "o show", o canto do pássaro torna-se "o
primeiro som de uma deixa" e assim por diante. Esta linguagem impulsiona os
atores para fora do mundo imaginário que você têm construído durante os
ensaios e aumenta o medo deles.

Terceiro, e mais importante, dê aos atores a impressão de que você está


calmo e no controle do processo de transição, não importa o que está
acontecendo nos bastidores. Existem muitos problemas técnicos que podem
ocorrer nesta fase do processo (tal como um atraso na entrada) e a maior parte
pode ser facilmente resolvido, com o tempo. Apenas deixe os atores saberem
sobre problemas que vão afetar o seu trabalho direta e imediatamente. Resolva
quaisquer outros problemas, sem deixar os atores sabem que eles existirão.

Se você não pode resolver algo, informe-os de qual é o problema, o que


está sendo feito sobre isso e quando será concertado. Meça as suas
descrições e evite ser muito dramático com os problemas.

Finalmente, procure formas de tornar o ambiente do teatro


sensivelmente mais próximo da sala de ensaio. Salas de ensaio são
normalmente muito calmas e lugares de concentração. Ninguém fica zanzando
em um ensaio sensível e as pessoas geralmente entram e saem da sala em

213
silêncio. Em comparação a área dos bastidores de um teatro pode ser cheia de
pessoas (equipe, diretores de palco, técnicos e assim por diante) se movendo
de uma forma menos sensível durante a técnica ou até mesmo durante a
própria peça. Seu movimento é normalmente essencial, mas como eles se
movem é algo que pode ser delicadamente policiado por seu diretor de palco.
Há também formas de isolar áreas nos bastidores para criar pequenas ilhas de
calmaria e concentração onde os atores podem se preparar para as cenas,
quer durante os ensaios técnicos ou, mais tarde, durante as apresentações.
Veja se você pode construir espaços fechados ou criar áreas privadas
individuais em que os atores posam se preparar para as suas cenas, ou
trabalhar entre as cenas. Peça ao produtor e ao diretor de palco para começar
a pensar em maneiras de conseguir isso nos bastidores para que todos
possam fazer o seu trabalho sem interromper o que os atores precisam fazer.

Quando eu estava dirigindo 'Ifigênia em Aulis' do Teatro Nacional,


montamos uma série de cabines fora do palco feitas de telas pretas. Nós
também isolamos algumas áreas dos bastidores para a preparação ator. Nós
construímos um cenário a esquerda contendo cadeiras e malas em que
Clitemnestra, Ifigênia e sua escolta sentavam e imaginavam que esta era a
carruagem que os levava para Aulis. No palco a direita havia um quarto fora de
cena representando o quartel de Agamenon. Clitemnestra, Ifigênia,
Agamemnon e seus assessores especiais todos iam para esta sala em
diferentes momentos da ação e continuavam a improvisar o que acontecia lá
entre suas cenas. No início do espetáculo, os atores ficavam cada um em uma
cabine onde eram deixados para que todos começassem a agir, ao mesmo
tempo, independentemente de quando sua personagem entrava em ação no
palco. O público viu apenas um pedaço da ação: Agamenon entrando em um
hotel em desuso.

Trabalhar assim não é uma prática ortodoxa em muitos teatros. Então,


se você quiser tentar este método, é absolutamente crítico que você explique o
que você quer e por que você quer isso para os diferentes departamentos ou
responsáveis. Na maioria dos casos, você será surpreendido por como as
pessoas que trabalham nos teatros respondem positivamente a esse tipo de
proposta, desde que você tome o tempo para explicar por que você sente que
essas estruturas são necessárias.

214
RESUMO

Reduza o número de coisas novas que os atores têm de absorver no teatro,


integrando o maior número possível deles na sala de ensaios com
antecedência.
Esteja alerta para mudanças que os atores podem fazer por que o medo deles
está aumentado ou porque estão pensamento na platéia.
Reduza essa tendência, mantendo um olho no seu linguagar ao falar sobre a
próxima etapa do trabalho. Certifique-se de utilizar a mesma linguagem
que você usou durante os ensaios.
Faça a gestão do seu próprio medo e não preocupe os atores com problemas
técnicos que estão acontecendo nos bastidores.
Investigue formas de tornar os bastidores do teatro um ambiente que esteja
mais perto da sala de ensaio.

12.3 Como trabalhar com a sua equipe criativa durante os ensaios


técnicos

Esta será a primeira vez que os atores trabalham junto com os membros
de sua equipe criativa no mesmo espaço. Quando a equipe de criação visitou a
sala de ensaios eles estavam assistindo o trabalho, não dando retornos
diretamente sobre ele. Gerenciar a interação entre estes dois grupos no teatro
é uma arte delicada e aqui estão algumas coisas que você pode fazer para
ajudar a facilitar essa interação.

No momento em que os atores chegam para o ensaio técnico garanta


que sua equipe criativa está trabalhando para os mesmos objetivos artísticos
que você. Encontre-os com antecedência e diga-lhes como você deseja
executar os ensaios técnicos e, mais importante, como você deseja que sejam
colocadas em campo suas preocupações ou críticas. Lembre-se de discutir
todas as áreas do trabalho com as quais eles estão particularmente
preocupados.

Durante os ensaios técnicos, mantenha as conversas que você tem com


sua equipe criativa sobre problemas ou preocupações fora do alcance dos
atores. Eles nem sempre falam a mesma língua. A observação de um
iluminador, tal qual: "As potências da luz estão muito brilhantes" irá fazer o ator
parar de pensar sobre o quente dia de verão irá fazê-lo pensar sobre como ele
está sendo visto pelo público no teatro, com um consequente efeito no seu
trabalho.

Desencoraje seus colaboradores de falar sobre preocupações


puramente estéticas ou problemas técnicos na frente dos atores. Se eles
sentirem que os níveis de iluminação estão muito baixos, ou que uma coluna
de suporte não está visível para o público, sugira que eles digam a vocês longe
das orelhas dos atores.

215
Finalmente, reserve um tempo no final de cada dia dos ensaios técnicos
para se encontrar com sua equipe principal e discutir problemas ou
preocupações, idealmente após os atores deixarem o teatro.

Lembre-se que a falta de tempo neste ponto do processo coloca muita


pressão em todas as pessoas em sua equipe criativa. Lembre-se, também, que
você já teve várias semanas para fazer o seu trabalho com os atores, enquanto
que a equipe criativa tem que fazer o trabalho deles em poucos dias ou mesmo
horas. (Suas equipes criativas, muitas vezes, estam olhando ou ouvindo seus
trabalhos para a primeira vez no mesmo momento que você os está vendo-os)
Não importa quão duramente um iluminador tenha trabalhado em um mapa de
luz, eles não podem antecipar exatamente o que a combinação daquelas luzes
parecerá no espaço. Não importa quão precisamente pintado uma parede pode
ser realizada na cenotécnica, o cenógrafo não pode saber ao certo se a
construção e pintura final são precisas até que elas sejam montadas no palco.
Mesmo apelando às gravações das aves em um estúdio de som, o sonoplasta
não pode tem como estar absolutamente certo se vai soar apropriadamente na
nova acústica do teatro.

Como eu disse anteriormente, muitas programações técnicas são


demasiadamente otimistas e não alocam tempo suficiente nessa entrada no
teatro. Isto significa que o tempo dado para afinar as luzes, ou fazer as
verificações de som adequadas, pintar o cenário, ou fazer um ensaio com os
músicos são comidos e, às vezes, apagados. Seja sensível à pressão que
todas estas coisas podem colocar sob os seus membros da equipe. Pergunte
ao seu cenógrafo o que eles pensam ser necessessário alterar, antes de ficar
de dar um retorno raso sobre o trabalho. Muitas vezes, as coisas que estão
preocupando você já estão na lista do cenógrafo de coisas a se resolver. Se
você tiver preocupações ou se você não gosta de algo que você viu ou ouviu
no teatro, explique suas preocupações de forma simples e clara. Não permita
que a sua ansiedade com a aproximação da eleve a temperatura do que você
diz ou faz. Finalmente, não olhe para o cenário, as luzes, ouça o som oua
música pela primeira vez com os atores presentes e não dê o seu retorno inicial
sobre qualquer uma dessas áreas com eles por perto.

216
RESUMO

Reúna-se com todos os membros de sua equipe criativa durante a última


semana de ensaios para planejar como você deseja executar o ensaio
técnico e como você gostaria que fossem realizados os retornos
durante esse período.
Mantenha as conversas sobre as preocupações da equipe criativa fora do
alcance dos atores durante os ensaios técnicos. Separe um tempo
para falar a sós com sua equipe criativa - de preferência após os
atores deixaram o edifício.
Seja sensível às pressões que sua equipe criativa estão sofrendo pela
falta de tempo para se preparar ou testar a execução dos seus
trabalhos.
Não olhe para o cenário, as luzes, ouça o som ou a música pela primeira
vez com os atores presentes. Lembre-se de não dar o seu retorno
inicial para estas primeiras tentativas ao alcance das orelhas dos
atores.

12.4 A afinação da luz

A afinação da luz é o momento em que você olha para as propostas do


iluminador e os ambientes criados pela iluminação pela a primeira vez. O
principal objetivo de uma sessão de afinação de luz é obter o maior número de
ambientes de iluminação gravados na mesa de luz antes do começo dos
ensaios técnicos. (A mesa de luz é a máquina que grava os diferentes níveis de
potência de cada refletor) Você já terá discutido o mapa de luz detalhadamente
com o iluminador durante a última semana de ensaios. O iluminador, então,
elaborar um mapa de luz, que descreve onde todas as luzes vão ser
penduradas nas varas de iluminação e as direções que os refletores estarão.
Depois de raquear as linhas de força, as luzes vão ser penduradas na grade de
acordo com o mapa, e então elas serão focadas e gelatinadas.

Uma sessão de afinação de luz acontece no teatro com o seu


iluminador, seu operador de luz e o diretor de palco. Uma mesa improvisada
provavelmente será colocada no auditório para o iluminador. O iluminador irá
trabalhar normalmente com o seu mapa de luz em cima da mesa a frente dele.
Você poderá ver um ícone de uma lanterna sobre o mapa e acompanhar seus
números. Você não precisa saber como ler um mapa de luz ou o que são os
números e as funções de qualquer uma das luzes individualmente, a fim de se
certificar de que o trabalho que você fez será bem iluminado No entanto, se
você se lembrar de algumas das luzes principais e seus números, você poderá
ser capaz de falar sobre o que quiser com mais precisão.

Haverá também um computador na mesa que se conecta ao sistema do


computador usado pelo operador de luz na cabine. O iluminador estará
normalmente com fones de ouvido para que eles possam se comunicar com

217
esse operador e com o assistente de palco (também em sua cabine). Você vai
sentar-se ao lado do iluminador. Você irá confirmar cada ambiente de
iluminação criado, será dado um número a eles, começando com um. Esses
números serão então colocados no caderno de notas do diretor de palco ao
lado da fala ou da orientação da direção com as deixas para as mudança de
luz. Esteja preparado porque este processo leva algum tempo e tente não ser
impaciente. O diretor de palco executará o ensaio técnico muito mais
eficientemente se cada deixa for escrita com cuidado e precisão no caderno de
notas. Algumas deixas serão sinalizadas provisóriamente e ligeiramente
alteradas durante o ensaio técnico quando será possível passar as deixas
juntamente com as ações.

Há muitas maneiras de utilizar uma sessão de afinação deluz, e


iluminadores diferentes têm diferentes processos. A estrutura e o ritmo de uma
sessão de afinação de luz depende da quantidade de tempo disponível. Se
você tem uma sessão com duração de três horas, você pode abordar as coisas
em um ritmo calmo, mas se você tem meia hora, você precisará correr um
pouco para obter os ambientes iniciais na mesa de luz e no livro de notas. Na
minha experiência, é melhor começar a sessão de afinação de luz pedindo ao
iluminador para fazer as principais idéias de ambientação ou as luzes
principais. Você vai sentar-se no escuro, enquanto o iluminador testa diferentes
possibilidades. Isto lhe dará um sentido do alcance das luzes criadas. Se você
gostar de um efeito especial ou uma luz em particular, diga ao iluminador. Você
pode pedir para ele experimentar aquela luz em algum ponto mais tarde, se na
sua opinião um ambiente de luz não estiver funcionando.

Em seguida, trabalhe em cada um dos ambientes para cada uma das


cenas. Peça ao seu iluminador para montar sua primeira proposta, em seguida,
use isso como base para a construção do palco como você quer. Seja paciente
e deixe o iluminador trabalhar as suas ideias para uma cena antes de dar um
retorno a ele.

Então olha para o ambiente junto a ele e peça ao iluminador para fazer
os ajustes que você deseja. Não gaste ano para ajustas os primeiros
ambientes. Faça um esboço básico e siga em frente. Dessa forma, você terá
algo para trabalhar no seu primeiro ensaio técnico. Lembre-se que todos os
ambientes parecem diferentes quando você adiciona pessoas.

Tomar muito tempo iluminando um cenário vazio é um exercício inútil.


Obtenha um esboço amplo e, em seguida, o iluminador poderá fazer os ajustes
em resposta ao que os atores estão realmente fazendo na cena. Esteja
preparado para não ir muito longe nessa primeiro sessão de afinação de luz.
Não me lembro de quando foi a última vez que conseguiu ir mais longe do que
as primeiros cenas em uma sessão de afinação de luz. Esta sessão inicia o
trabalho de afinação das luzes que serão trabalhadas até o dia da estréia. Você
e o iluminador estarão constantemente ajustando os ambientes para torná-los
precisos durante todo este período.

Problemas com a iluminação, muitas vezes ocorrem por causa da


necessidade de equilibrar a iluminação realista da ação e a necessidade de

218
iluminar os rostos para que fiquem visíveis para a platéia. Muitas vezes, a
iluminação dos rostos se sobresai sobre a iluminação da situação, o que
significa que muitas luzes são usados em uma alta intensidade. Se a cena é
muito claramente iluminada, esquecemos que ela está iluminando o lugar onde
os personagens estão em, seja durante o dia ou durante a noite. No entanto
não perca a estrutura básica da fonte de luz real acendendo quanto luzes você
precisar para aumentar a claridade e aumentar a visibilidade. Se você está
tendo problemas de identificar essas estruturas, semicerre os olhos para
permitir que apenas uma pequena quantidade de luz atravesse. Isso remove
detalhes da superfície e permite que você veja os blocos básicos de escuro, luz
e sombra.

Passe um momento semicerrando os olhos nos ambientes de luz criados


pelo iluminador: se você não puder ver qualquer estrutura sob os detalhes da
superfície, peça ao iluminador para fazer um blackaut e começar a construir o
ambiente a partir do esboço. Não se preocupe com a visibilidade dos atores ou
a ação por um tempo. Em vez disso pergunte-se: "O que está realmente
iluminando este lugar? É o Sol? Se assim for, de onde o Sol está vindo e em
que ângulo ele está?" Adicione as luzes que criam o efeito da luz solar e
lentamente construa o resto do ambientes em torno da estrutura que a luz solar
lhe der. Se a cena for iluminada por uma única luz aparente, peça ao
iluminador para aumentar essa luz aparente. Identifique a forma e as matizes
dessa luz e comece a construir os ambientes em torno dela. Mesmo que você
adicione luzes extras você não deve perder a impressão de que o ambiente
está sendo iluminado por essa luz aparente.

Resumo

Esteja preparado que o processo de escrever as deixas de iluminação no


caderno de notas levará algum tempo.
Certifique-se de sair da sessão de afinação de luz as deixas preparadas
do primeiros ambientes de iluminação para as apresentações.
Não gaste muito tempo tentando aperfeiçoar um ambiente em um cenário
vazio; ele vai ficar diferente quando as pessoas estiverem lá.
Não perca de vista a estrutura do que está iluminando a cena, seja o Sol
ou uma luz geral.

12.5 Afinando o som e a música antes do ensaio técnico começar

O principal objetivo destas sessões é afinar os níveis de som ou da


música e, se for o caso, para confirmar se as caixas de som estão funcionando.
Os músicos vão estar em uma "sala anexa para a banda" ou eles vão estar ao
vivo no teatro. (A "sala anexa para a banda" é um cômodo acusticamente

219
isolado, onde os músicos tocam ao vivo e são transmitidos para as caixas de
som do teatro). Se eles estiverem na sala anexa da banda, você terá que
verificar o nível de cada deixa. Se eles estiverem tocando no teatro o
compositor precisará ajustar o volume em que eles estão tocando em resposta
à acústica no teatro.

A agenda técnica raramente aloca mais de uma hora para a banda tocar
ou afinar a música antes do próprio ensaio técnico. Na maioria dos casos, você
terá tempo para ouvir algumas faixas importantes durante esta sessão antes do
sonoplasta ou compositor ter uma breve oportunidade de definir alguns níveis
iniciais para as primeiras dez ou mais deixas. Porque estas sessões são breves
você vai ouvir a maioria das faixas de som e as música diretamente durante o
ensaio técnico.

Lembre-se que é preciso tempo para programar deixas sonoras ou


definir os níveis do volume para a banda tocando em uma sala anexa para a
banda. Esta pode ser uma grande surpresa no início de sua carreira. Você
imagina que o operador pode apenas pressionar um botão, ajustar o volume e
tudo sairá perfeito. Este não é o caso; ele pode levar alguns minutos para
programar todas as definições para uma música ou deixa de som.

Em uma sessão curta de afinação também pode haver uma pausa para
o almoço antes do ensaio técnico começar o que é conhecido como "momento
de silêncio". Este é o lugar onde o sonoplasta pode afinar os níveis ou o
compositor (ou diretor musical) pode ouvir a banda. Você não precisa estar
nesta sessão - a menos que você seja convidado a estar. Você também não
precisa assistir a um "Ensaio da banda", se você estiver tocando ao vivo na
peça.

RESUMO

Esteja preparado para uma sessão curta para ouvir as deixas sonoras ou
músicais.
Esteja preparado para o tempo que leva para programar as deixas
sonoras.
Esteja preparado para ter que ouvir os efeitos sonoros pela primeira vez
durante o ensaio técnico.
Você não precisa participar do "tempo de silêncio" ou de um "ensaio da
banda", a menos que você seja convidado pelo sonoplasta,
compositor ou diretor musical.

220
12.6 Ensaios técnicos

Os ensaios técnicos dão a todos os envolvidos na produção a


oportunidade de trabalhar com a peça do começo ao fim e garantir que todos
os ingredientes técnicos novos sejam cuidadosamente integrados com o
trabalho feito na sala de ensaios.

Criar uma cadeia de comando clara é crucial para o funcionamento


eficiente do ensaio técnico.

Em primeiro lugar decida quem deve executar o ensaio técnico: conduza


você mesmo ou peça ao seu diretor de palco para fazê-lo. Na minha
experiência o melhor é deixar o diretor de palco assumir o comando: isso
permite que você coloque sua energia em observar todos os ingredientes
juntos e discutir as coisas com o sonplasta, o cenógrafo, o figurinista e o
iluminador. O diretor de palco vai estar no palco, organizando todos e dirigindo
o ensaio ao longo da programação pré-planejada. Este calendário será
elaborado entre você e o diretor de palco e irá especificar quais seções da
peça devem ser feitas em cada parte do ensaio técnico. Mantenha o plano e
você estará pronto para o ensaio geral e a estréia. Você pode se comunicar
com o diretor de palco, gritando, usando um microfone ou fone de ouvido,
dependendo da escala do espaço em que vocês estão ou o nível de discrição
que você necessita. Certifique-se de que o microfone ou fone de ouvido estão
em bom estado de funcionamento antes do início do ensaio técnico. Gritar deve
ser desencorajado porque pode dar a impressão de que você está sendo
agressivo.

Em seguida, você precisa descobrir como se comunicar com os seus


assistentes de palco6. Ele estarão sentados nos lugars de onde seja possível
auxiliar nas deixas da peça. Isso pode colocá-los fora do alcance da voz na
coxia ou em uma área restrita como o camarim. Em um pequeno auditório
provavelmente você pode apenas falar normalmente para ele, enquanto que
em um espaço maior, você terá que usar um fone de ouvido ou passar as
instruções peo fone de ouvido do seu diretor de palco.

Por fim, elabore um sistema de comunicação com o iluminador e o


sonplasta. Em uma situação ideal, a mesa de luz e a mesa de som serão
colocadas no auditório, e os iluminador e o sonoplasta vão estar sentados à
mesa de trabalho com seus equipamentos. Normalmente estas mesas estarão
muito perto de você de forma que os três possam se comunicar facilmente. Os
dois normalmente terão fones para que possam se comunicar com os
operadores nas cabines. Isto pode não ser a situação de um teatro alternativo
onde as mesas podem permanecer na área de operação e os equipamentos
podem ser rudimentares, ou nos casos em que o seu iluminador e o operador
são a mesma pessoa. Quaisquer que sejam as circunstâncias, discuta como
você irá se comunicar com o iluminador e o sonoplasta antes do ensaio técnico
começar.

6
Acredito que a figura de assistente de palco seja próxima da de ajudante de camarim que
eventualmente é possível encontrar nos teatros no Brasil (Nota do revisor)

221
Quando os atores chegam no palco para iniciar o ensaio técnico, vá
recebê-los imediatamente. Descreva como você irá executar a parte
tecnologica e peça-lhes para parar logo que encontrarem quaisquer problemas
técnicos. Em seguida, peça ao diretor de palco para mostrar-lhes o entorno do
palco e as áreas de bastidores. Isto dará a eles tempo para se orientar no
teatro. Em seguida, peça-lhes para ficar em suas "posições iniciais". (Este é o
lugar onde eles estão nos bastidores antes das deixas de suas primeiras
entradas de cena.)

Quando estiver pronto, começar a trabalhar com tudo passo a passo.


Deixe a peça correr mesmo que um ingrediente não esteja como você gostaria
que estivesse - por exemplo, se uma deixa de iluminação não começar no
ponto certo, se um ambiente de luz não é o que você quer ou se uma deixa
sonora está muito alta. Pare e deixe que o diretor de palco sei por que você
parou. Fale como resolver o problema técnico com o membro relevante do seu
time criativo. Peça ao diretor de palco para "recomeçar" (isto é, deixar tudo
pronto para começar de novo). Em seguida, começe a passar a ação do ponto
imediatamente antes do que havia dado errado.

Não gaste muito tempo com as primeiras deixas. É melhor para a


mecânica - mesmo se houver coisas que precisam de mais trabalho. Ele ajuda
o moral do grupo a sentir que as coisas estão progredindo com eficiência e de
acordo com a programação. Desacelere após os primeiras 15 minutos ou mais.

Suponha que a maioria de seus atores são adultos sensatos e leve suas
preocupações a sério. Certifique-se de encaminhar imediatamente qualquer
preocupação que os atores levantarem. Alguns deles podem parecer banais,
como a passar uma mudança rápida uma terceira vez ou falar sobre a lógica de
um figurino, mas são esses detalhes que farão com que a atuação deles fique
clara e a apresentação funcione sem problemas. Os dividendos serão pagos se
você encaminhar estas preocupações imediatamente, uma vez que é
improvável que elas desapareçam.

Um ensaio técnico médio dura entre um e três dias, embora às vezes


você pode ter apenas algumas horas. No final de cada sessão, você terá um
encontro, tal como sugerido na sessão "como trabalhar com a sua equipe
criativa durante os ensaios técnicos", com todos os membros da sua equipe
criativa para discutir os problemas ou as preocupações que surgirem. Lembre-
se que a maioria dos teatros têm um sistema de comunicação que transmite o
som do palco para os vestiários e áreas de bastidores. Estes sistemas também
enviam o som do auditório e bastidores para o palco. Se você for se encontrar
com sua equipe criativa no auditório, seja cauteloso sobre como você vai falar
sobre quaisquer preocupações que você tenha; por vezes, no calor do
momento, você pode falar de forma inadequada sobre os atores ou revelar
temores de que possam prejudicar você aos olhos eles. Em alguns teatros
você pode desligar esse sistema de comunicação.

222
RESUMO

Lembre-se que o objetivo dos ensaios técnicos é integrar os novos


ingredientes técnicos com o trabalho já feito na sala de ensaios.
Crie uma clara cadeia de comando para a realização do ensaio técnico.
Converse sobre a melhor maneira de se comunicar com os assistentes
de palco.
Decida quem deve coordenar a técnica - você ou o diretor de palco - e
estabeleça meios de comunicação uns com os outros.
Quando os atores cheguarem descreva como você vai trabalhar e
mostre-lhes o entorno dos bastidores para que eles possam se
orientar.
Pare sempre que houver um problema, discuta-o e faça novamente a
parte relevante. Logo depois, siga em frente.
Não gaste muito tempo com as primeiras deixas; coloque a máquina para
funcionar.
Crie uma atmosfera no teatro que fique perto da atmosfera calma e
focada da sala de ensaio.
Resolva imediatamente qualquer problema que os atores tiverem.
Realize reuniões diárias com sua equipe criativa no final de cada dia do
ensaio técnico.
Lembre-se que existem sistema de comunicação na maioria dos teatros e
cuidado com o que você diz no auditório no calor do momento.

12.7 O ensaio geral

O ensaio geral você terá a primeira oportunidade para colocar todos os


ingredientes que você trabalhou, todos juntos e em movimento. Durante os
ensaios técnicos você irá parar e começar, raramente irá passar grandes
pedaços da ação. No ensaio geral você vai passar as coisas na velocidade da
apresentação e isso sempre vai por pra fora novos problemas: uma mudança
rápida pode não ser concluído a tempo, ou a velocidade de uma deixa de luz
pode ser muito lenta ou muito rápida.

Quando você agendar o ensaio geral permita meia hora no final dos
trabalhos de modo que você pode fazer as correções antes da estréia. Muitas
vezes, os ensaios gerais começam tarde e terminam assim que acaba o
passadão - o que significa que não há nenhuma chance para corrigir quaisquer
problemas e que esses problemas se repitirão na estréia. Em vez disso, use
essa meia hora para corrigir quaisquer problemas técnicos. Como você viu o
ensaio geral, priorizar seus apontamentos. Podem haver coisas que você
precisa mudar urgentemente antes da estréia. Apontamentos técnicos podem
ser dados a sua equipe criativa depois que os atores forem liberados, a tempo
para a apresentação que acontecerá dali a pouco. Depois, há coisas que você

223
pode trabalhar no dia seguinte, quando há mais tempo para resolvê-los
corretamente.

Finalmente, existem todas os seus apontamentos sobre a atuação. Na


minha experiência, não é sensato dar qualquer apontamento entre o ensaio
geral e a estréia. Em vez disso, guarde-os para o dia seguinte e não gaste o
intervalo do jantar correndo camarins ou as salas de descanso de maneira
frenetica tentando levantar os atores com apontamentos de atuação. As duas
horas entre o ensaio geral e a estréia é uma pausa dos atores: eles precisam
de tempo para comer, descansar e se preparar para a apresentação.

Imediatamente assim que o ensaio geral acabar, reuna os atores juntos


e assegure-lhes que o seu trabalho está claro e que você vai dar os
apontamentos após a apresentação desta noite. Em seguida, pergunte se
algum deles tem grandes problemas técnicos ou preocupações. Resolva as
preocupações deles e os apontamento técnicas urgentes na próxima meia
hora. No final deste encontro sugira aos atores que participem de um
aquecimento antes da estréia. Isso irá ajudá-los a lidar com o medo que aarece
na estréia. Lembre-os também de trabalhar como um grupo e que evitem "vôos
solos". Um "vôo solo" é quando um ator se afasta do que foi ensaiado e
começa a impressionar o público de outra forma. Após esse bate-papo, deixe
os atores sozinhos.

Estes passos, é claro, descrevem a maneira perfeita de gerenciar o


ensaio geral e o que se segue. No entanto, haverá casos em que você vai
simplesmente ficar sem tempo e não será capaz de gerir as coisas com este
grau de medida ou cuidado. Se isso acontecer, pelo menos, reuna os atores
durante cinco minutos após o ensaio geral para verificar se não há nada
potencialmente perigoso que precisa de correção urgente antes de realizar
estréia com o público.

No entanto, em alguns casos, você pode não ter um ensaio geral ou


mesmo um ensaio técnico completo. Quando eu estava trabalhando no 'Dream
Play' do Teatro Nacional, nós estávamos tão atrás do cronograma que tivemos
que cancelar a estréia e fazer o ensaio técnico na frente do público (que tinha
aparecido para a segunda apresentação). Esta não é uma situação que eu
jamais iria querer repetir, mas mostra o quão longe do ideal, por vezes, pode-se
chegar com a pressão para entregar um produto para um público pagante de
uma montagem.

224
RESUMO

Esteja preparado para o fato de que o ensaio geral irá por pra fora
problemas que você não hvaia antecipado nos ensaios técnicos.
Agende meia hora no final do ensaio geral para resolver grandes
problemas que surgirem.
Priorize os seus apontamentos ao assitir o ensaio geral.
No final do ensaio geral, pergunte aos atores se eles têm quaisquer
preocupações técnicas imediatas e grandes. Resolva estas questões
na última meia hora, juntamente com seus próprios apontamento
técnicos urgentes.
Não perturbe os atores na sua pausa entre o ensaio geral e a estréia com
apontamentos sobre a atuação.

As criadas de Jean Genet

225
13. CAPÍTULO - As apresentações públicas
(Tradução de Alessandra Lirah - Revisão Humberto Issao)

Este capítulo aborda como gerenciar as primeiras apresentações


públicas, a apresentação para a imprensa e como olhar as apresentações
durante a temporada. Ele incluiu conselhos sobre as seguintes etapas:

13.1 - As primeiras apresentações públicas


13.2 - Apontamentos depois das apresentações
13.3 - Os ensaios durante as suas primeiras apresentações públicas
13.4 - Apresentação para a imprensa
13.5 - A temporada: após o dia da apresentação para a imprensa até a última
noite da temporada
13.6 - Analise o seu trabalho quando a temporada acabar.

13.1 As primeiras apresentações públicas

Estas primeiras apresentações lhe darão a oportunidade de testar o


trabalho na frente de uma plateia e a resposta da platéia permitirá a você medir
a precisão das suas escolhas de direção. Faça anotações da reações do
público ao mesmo tempo que acompanha o trabalho no palco, com especial
atenção para os momentos em que o público está concentrado e quando ele
fica inquieto. Isto lhe dará uma ideia clara das partes que você precisa
trabalhar mais.

Lembre-se de manter o seu pensamento límpido sobre o público: se eles


estão inquietos ou entediados, primeiro pergunte a si mesmo se o seu trabalho
poderia ser mais claro. Não se apegue a uma resposta emocional da reação
deles; não fique chateado se eles estão entediados com seu momento favorito
ou fique com raiva se eles começarem a comer batatas fritas em um momento
importante do seu espetaculo. Se você permitir que as reações deles afetem a
sua concentração, você vai se perder nos seus sentimentos e não olhará
friamente para a cena para diagnosticar o problema que está causando a
perda de concentração do público.

Atores responder à pressão das primeiras apresentações de formas


variadas. Alguns vão ficar muito assustados, outros muito animados e outras
reclusos. Suas respostas podem alterar a relação que você tem com eles,
tornando essa relação mais suave ou mais instável. Mantenha a calma: não
ajuste seu relacionamento com eles ou com os objetivos deles no processo de
trabalho.

Esteja avisado que o impacto físico das primeiras apresentações pode


perturbar o estômago dos atores: alguns podem realmente vomitar ou ter
diarréia antes das apresentações. Eles podem querer cumprir as metas que
você definiu, mas sua condição física torna isso impossível.

226
Equipe os atores com habilidades para receber qualquer retorno que
eles recebam. O ator é mais vulnerável a críticas durante estes primeiras
apresentações do que em qualquer outro ponto do processo. Ambas as
críticas, positivas e negativas, tem um impacto sobre eles. Estas críticas podem
vir de diretores, agentes, entes queridos ou sob a forma de um comentário
ocasional feito por um estranho. Eles podem fazer os atores pularem para fora
da pele do personagem e fazê-los duvidar de tudo que eles estão fazendo ou
podem torná-los excessivamente conscientes a cerca de um momento
particular em uma cena. Um comentário feito por um membro do grupo pode
despertar preocupações antigas que você dissipou durante o processo de
ensaios ou pode criar novas e inesperadas ansiedades. Alguns atores ainda
pode usar o retorno dado nesta fase para apoiar as escolhas que eles queriam
fazer mas que você os tinha desencorajado. Estas críticas ou comentários
podem interromper o processo de desenvolvimento dos objetivos que você tem
como o diretor, tanto para o ator quanto para o trabalho em si.

Tenha uma breve conversa com os atores antes da apresentação, e


avise-os para se aproximar com cautela de qualquer retorno dado e lembre-os
que o trabalho não está terminando. Peça-lhes para ter isso em mente quando
ouvir qualquer retorno dado. Advirta-os de que existe uma diferença entre um
retorno que reflete uma diferença de gosto e um retorno que aceita o trabalho
em seus próprios termos. Eles precisam perceber com que tipo de respostas
eles estão lidando. Se, por exemplo, uma pessoa não gosta da maneira em
que a produção é concebida ou ritmada, isso pode sugerir uma diferença de
gosto e suas observações nem sempre serão úteis para o desenvolvimento do
trabalho. Se, por outro lado, a pessoa entende claramente a direção que o
trabalho está indo mas encontra um momento que está particularmente pouco
claro, suas notas podem ser úteis para o trabalho. Finalmente, incentive-os a
falar com você sobre qualquer retorno que afete o trabalho deles de forma
negativa. Uma breve discussão muitas vezes pode contrariar e segurar alguma
crítica ocasional e dará ao ator a libertdade para voltar a trabalhar como a peça
exige.

Certifique-se do que você escreve sobre o seu trabalho com cuidado.


Saiba, tanto quanto os atores, diferenciar entre um retorno que aponta para
uma diferença de gosto e um retorno que é útil para o trabalho. Da mesma
forma, lembre-se que você não ainda terminou de fazer o trabalho. Não faça
ajustes radicais para algo que está pela metade; em vez disso, anote as
críticas e termine de trabalhar em sua ideia. Quando você tiver terminado o que
você planejou, olhe para trás para observar se ele está exatamente como o
desejado. Se estiver, mude o que você fez.

Não trate todos os comentários com a mesma atenção; um comentário


espontâneo em um bar depois de um espetáculo não é o mesmo que uma
avaliação concreta de uma pessoa que entende da obra. Escolha as pessoas
cujo retorno você vai levar a sério e cujos apontamentos que você vai colocar
em prática. Identifique estes indivíduos antes de começar a apresentação, e
peça-lhes para vir em um dia específico. Você pode até mesmo dar-lhes tarefas
específicas para fazer enquanto eles assistem o seu trabalho, tais como a
verificar se a narrativa ficou clara, ou ver se em um determinado momento o

227
ator/atriz está trabalhando bem ou não. Você vai encontrar essas pessoas ao
longo do tempo e eles vão tornar-se um pequeno grupo. Nem todo mundo vai
falar com você na língua do seu processo, mas isto não invalida suas críticas.
Traduza o que eles dizem para o seu idioma e filtre os apontamentos úteis.

Nunca dê o retorno que você recebeu na íntegra para os atores. Em vez


disso, processe os apontamentos que você valoriza em instruções concretas
para seus atores individualmente. Se um ator lhe perguntar sobre a opinião de
qualquer pessoa importante do meio que foi assistir, é sábio dizer que essa
pessoa gostou do trabalho, tendo ela gostado ou o caso.

Após cada apresentação reuna-se com sua equipe criativa, diretor de


palco, produtor e todos os envolvidos na apresentação (exceto os atores) e
passe seus apontamentos técnicos trabalhando na elaboração de um plano de
ação para o ensaio do dia seguinte.

RESUMO

Assista as reações do público no espetáculo, ao mesmo tempo que você


observa os atores.
Observe quando a plateia está inquieta.
Não se apegue a uma resposta emocional das reações deles.
Esteja preparado para uma ampla gama de respostas diferentes dos
atores para as primeiras apresentações públicas.
Equipe o ator com habilidades para receber o retorno sobre o seu
trabalho de membros da audiência.
Peça-lhes para discutir todas as respostas negativas que não consegue
deixar pra lá.
Faça apontamentos sobre seu trabalho de direção com cuidado.
Nunca passe um retorno na integra para os atores.
Depois de cada passada faça apontamentos técnicos e elabore um plano
de ação para o ensaio do dia seguinte.

13.2 Apontamentos depois das apresentações

Quando os atores saem do palco eles podem estar muito vulneráveis.


Você mesmo pode não estar estável e lúcido: você pode estar feliz com as
coisas que funcionaram ou frustrado com o que não funcionou. É improvável
que você tenha uma visão equilibrada, por isso não dê apontamentos
imediatamente depois de uma apresentação. Em vez disso, agradeça aos
atores pelo seu trabalho e organize uma sessão de apontamentos para o dia

228
seguinte. Em seguida, passe um par de horas revisando sozinho e lentamente
suas anotações, trabalhando em quais apontamentos você quer dar e como
você quer fazer isso. Na sessão de apontamentos, certifique-se de dar espaço
para os atores discutirem os seus apontamentos. Separe a primeira meia hora
para ouvir o retorno deles - incentivando-os a serem breve e concretos sobre
quaisquer problemas que experimentaram.

Dar apontamentos depois de uma apresentação é muito diferente de dar


apontamentos em uma sala de ensaio. Na sala de ensaios o ator tem o tempo
e o espaço para ensaiar os seus apontamentos e para executar a cena
relevante três ou quatro vezes. É muito mais difícil de dar um apontamento
para uma apresentação pública, assim seus apontamento têm de ser muito
simples e específicos. É melhor dar um apontamento clara do seis desfocados.
Lembre-se, também, que se você der cinco apontamentos e quatro deles são
claros e um deles não está claro, que esse único apontamento obscuro pode
destruir todos as apontamentos claras. Se você não está certo sobre como
resolver um problema, não mencione-o para os atores. Em vez disso, vá e
assista ao espetáculo novamente e veja se você pode isolar a causa ou o como
resolver o problema. Lembre-se também que um ator não pode manter um
grande número de apontamentos em sua cabeça para uma apresentação –
tente dar um máximo de cerca de dez para cada ator. Alguns podem demorar
mais e outros menos: levará um tempo para que você aprender o que cada um
pode fazer.

Observe, como parte do desenvolvimento de seu próprio ofício, o quanto


nós dependemos da precisão física dos atores para comunicar o que está
acontecendo para o público. Se, por exemplo, o lugar onde um personagem
está em pé é frio, esta informação irá ser registrada de maneira mais clara no
que fazem fisicamente: eles vão se manter em movimento o tempo todo, bater
os braços para se aquecer ou involuntariamente tremer. Se o frio é uma
característica fixa de uma cena, você terá que lembrar constantemente o ator
de continuar a trabalhar seu efeito em todo o seu corpo. Estou sempre
surpreso sobre quão desiguais os atores podem ser quando se trata de atuar
qual o tempo da peça ou uma temperatura que os afeta fisicamente. Às vezes,
esses ingredientes são completamente visíveis e às vezes não são de forma
alguma; muitas vezes, o ator não está ciente de como descontroladamente
varia a maneira como eles demonstram estes ingredientes de ensaio para o
ensaio, ou de apresentação para apresentação. Em alguns casos, certos
atores simplesmente desconhecem que eles pararam de utilizar estes
ingredientes físicos em absoluto. Construir as manifestações físicas da
situação em que os personagens se encontram é essencial para o trabalho dos
atores. No entanto, alerto que muitos apontamentos sobre o trabalho físico dos
atores também pode levar à um auto-policiamente desfuncional; se isso
acontecer, pare de dar comentários sobre essa área por um tempo.

Se um apontamento não funcionar peça desculpas e sugira que o ator


retorne para a escolha original. Se você der um apontamento e o ator disser
"Mas eu estava fazendo isso’’, então você tem diferentes opções, dependendo
da intensidade da reação do ator. Se a reação for muito forte, retire o
apontamento e olhe novamente para o mesmo momento na noite seguinte para

229
ver se você estava certo ou não, ou para ver se você pode pensar de uma
maneira diferente de abordar o problema. Se a reação do ator for menos
intensa, peça-lhe para fazer novamente uma segunda vez um pouco mais
acentuadamente e, em seguida, diga que você vai ver esse ponto mais uma
vez.

Se em uma sessão de apontamentos em grupo um ator começar a falar


sobre sentimentos gerais de ansiedade sobre o processo geral da produção
então sugira que você terá uma conversa separada com ele assim que a
sessão de apontamentos em grupo acabar. Você não quer que a ansiedade de
uma pessoa passe a perturbar a confiança do grupo todo. Às vezes, o ator só
quer garantias sobre o seu trabalho e você pode facilmente dar-lhe isso. Em
outros momentos, o ator pode realmente estar em conflito sobre o processo, ou
uma cena ou seu personagem. Se este for o caso, incentive-o a resumir a
preocupação geral a um momento ou momentos específicos na ação da peça.
Em seguida, pedir-lhes para resolver as suas preocupações, tomando medidas
concretas pequenas ao longo do tempo. Evite dar falsa confiança. Não é um
remédio duradouro a um problema.

Não dar notas imediatamente antes da apresentação. Se você ficar


zanzando em torno dos camarins, pouco antes do espetáculo dando
apontamentos, os atores não terá nenhum tempo para digeri-los corretamente
antes de entrar no palco. Seu apontamento será realizada grosseiramente ou
se tornará o foco da atuação do ator, deslocando todos os outros
apontamentos que você deu anteriormente.

RESUMO

Não dê apontamento imediatamente depois de um espetáculo. Faça os


apontamentos no dia seguinte depois de ter tido tempo para digerir
corretamente seus pensamentos.
Quando você der apontamento após uma apresentação procure ser
sensível ao fato de que os atores terão de contracenar ao vivo em
frente a uma plateia.
Não dê muitas apontamento - um máximo de dez mais ou menos por ator.
Se você der uma apontamento e um ator reivindicar que ele estava
fazendo ou retire seu apontamento e olhe para o momento novamente
ou peça a ele para fazê-lo novamente de forma mais acentuada na
próxima vez.
Se um ator sequestrar uma sessão de apontamentos com uma ansiedade
geral sobre o espetáculo ou o processo como um todo, peça-lhe para
continuar a conversa em separadamente com você.
Não dê apontamentos imediatamente antes da apresentação.
Estabeleça a forma como você vai dar apontamentos sobre o espetáculo
depois da apresentação para a imprensa.
230
13.3 Os ensaios durante as suas primeiras apresentações públicas

Na maioria dos teatros você será capaz de trabalhar com o som e a


iluminação pelo menos durante metade do dia nos dias de apresentação antes
da apresentação para a imprensa. Durante estes ensaios, tente combinar um
trabalho prático mais técnico sobre o espétaculo com uma sessão de
apontamentos junto aos atores.

Separe a primeira meia hora do ensaio, de modo que os atores podem


dar o retorno deles sobre a noite anterior e dizer o que eles gostariam que você
olhasse atentamente como você fez após a primeira apresentação. Em
seguida, passe o resto do dia trabalhondo numa lista de metas concretas.
Certifique-se que esta lista inclui os principais problemas que os atores
trouxeram em sua sessão de apontamentos. Não apresse as coisas ou tente
esmagar um número irrealista de coisas para se fazer em um dia. Isto levará a
uma apresentação turva e significa que você pode precisará refazer as coisas
mais tarde. É melhor trabalhar em uma ou duas coisas corretamente e
lentamente do que aranhar em dez mudanças de uma forma fragmentária.
Certifique-se de que o seu diretor de palco tenha uma lista das coisas que você
quer olhar para que eles possam organizar o dia de forma eficiente para você.

Faça a sessão de apontamentos sobre a atuação no início ou no final do


dia de trabalho. Faça isso no auditório ou foyer para que o palco possa ser
usado por sua equipe criativa para qualquer trabalho técnico, como a afinação
de luzes ou testando as deixas sonoras. Esta sessão de apontamentos
assegura que você mantenha a peça inteira “cozinhando” e não apenas
aqueles momentos que você vai ter trabalhado na peça durante o dia.

RESUMO

Combine o trabalho técnico prático com uma sessão de apontamentos


com os atores.
Faça a sessão de apontamentos de atuação no início ou no final do dia
longe do palco para que a sua equipe de criação poça usar o palco
para trabalhar.

13.4 Apresentação para a imprensa

Coloque em sua cabeça que essa apresentação é antes de tudo sobre o


gerenciamento do medo. O medo muda o ritmo de uma apresentação
tornando-a mais lenta ou mais rápida, dependendo de como os atores
gerenciam essa questão. O medo impede os atores de fazerem tarefas físicas -
231
às vezes porque eles estão literalmente tremendo. Os atores contraem os
músculos da garganta tornando as vozes dos atores menos distintas e
audíveis. Estas coisas, por sua vez, tornam os atores excessivamente
conscientes, de forma que eles começam a se sentir como se estivessem nús e
em pé no palco ao invés de serem personagens particulares em uma situação.
Isso faz com que se comportem de uma forma pomposa e sem vida. Muito
poucos atores passam pela noite de apresentação para a imprensa sem
vestígios de um ou mais destes sintomas. No entanto, uma gestão cuidadosa
do dia levando até a apresentação para a imprensa pode reduzir os problemas
e, em alguns casos, erradicá-los.

Faça o dia da apresentação para a imprensa ser como qualquer outro dia
de trabalho como os dias anteriores. Mantenha às mesmas horas, talvez
começando uma hora mais tarde para que os atores estejam descansados.
Trabalhe sobre os problemas concretos pendentes e faça uma sessão de
apontamentos adequada. Reforçe a atmosfera de normalidade, deixando que
eles saibam que você estará observando o espetáculo e estabeleça um prazo
para uma sessão de apontamentos no dia seguinte. Sua presença como diretor
trabalhando na noite da apresentação para a imprensa ajudará a normalizar o
dia. Lembrar-lhes que a noite de apresentação para a impresna não é o fim do
processo e inspire-os com a idéia de que eles estão construindo o trabalho
para o público da apresentação para a imprensa - para uma pessoa cuja vida
pode ser alterada por assistir a apresentação da noite.

A ideia que os críticos estarão presentes pode levar os atores a quererem


ser "impressionantes". Assim eles podem se afastar do que eles têm feito e
começar a trabalhar de forma independente do resto do grupo. Antes da
apresentação para a imprensa converse com os atores para trabalhar em
conjunto e evitar vôos solos. Eu também desencorajaria a doação de cartões,
presentes ou flores e pediria para adiar esta atividade até que o final da
apresentação. Isso não vai servir para todos os diretores, grupo ou cultura
teatral, mas vale a pena discutir isso com os seus atores, para ver como ajuda-
los a lidar melhor com a apresentação para a imprensa.

As críticas depois da apresentação para a imprensa terão um efeito sobre


o que os atores fazem – eles lendo as críticas ou não. Os conteúdos das
críticas sempre escoam para fora de alguma forma e tem um impacto sobre o
trabalho não importa quão acostumados os atores podem reivindicar ser. Se as
críticas forem boas, os atores podem se acomodar e o trabalho pode afrouxar.
Se as críticas forem ruins, os atores podem perder seus coração e seu
compromentimento. Você precisa responder de forma robusta para quaisquer
desses problemas. Sente com eles e lhes transmita tranquilidade se eles
perderem a paixão pelo trabalho. Se as críticas forem ruins, você terá de ver o
trabalho com mais freqüência e inspirá-los a continuar a desenvolver o que
estão fazendo; especialmente se as críticas tiverem um efeito prejudicial sobre
a bilheteria.

Eu aconselho você a receber todas as crítica sobre o seu trabalho


diretamento no seu próprio queixo. Se você for nocauteado por elas, sente-se
com todos as críticas, lia-as com calma e veja se há algum mal-entendidos

232
consistente das suas intenções. Então veja se você pode dirigir o trabalho um
pouco mais claramente para remover os mal-entendidos. Quando eu passei
meus comentários sobre meu trabalho 'A Woman Killed With Kindness', eu
percebi que a maioria dos críticos pensou que o chão estava coberto de areia,
enquanto eu tinha objetivao pensar que era terra. Eu imediatamente fiz uma
alteração no material que tinha colocado no chão. Eu não estou sugerindo que
você se curve para os críticos - em vez disso, use o fato de que eles estão
olhando para o seu trabalho com "outros olhos" para ver se eles podem ensinar
a você alguma coisa sobre como fazer esse trabalho mais claro para
audiências futuras.

Certifique-se de estabelecer a maneira pela qual você vai dar os


apontamentos após a apresentação para a imprensa. Deixe os atores saberem
quantas vezes você está planejando vir e discutir com eles esses
apontamentos. Você poderia dar os apontamentos no final da tarde em uma
sessão de de duas horas ou você pode digitar os apontamentos e deixá-los no
camarim para eles antes da apresentação seguinte.

RESUMO

Esteja ciente de que o medo pode distorcer o trabalho que você fez com
os atores.
Planeje um dia de trabalho da apresentação para a imprensa que ajude a
aliviar esse medo.
Nunca se envolver com um crítico sobre o que escreveram.
Estabeleça como você vai dar os apontamentos depois da apresentação
para a imprensa.

13.5 A temporada: após o dia da apresentação para a imprensa até a


última noite da temporada.

Observe o seu espetáculo regularmente durante a temporada para que o


trabalho permaneça com um alto padrão para todas as pessoas que vão
assistir. Manter a qualidade do trabalho é um dos aspectos mais difíceis de
dirigir. Concentre-se na tarefa, lembrando que o público que vê o trabalho no
final da temporada pagou o mesmo dinheiro que aqueles que vieram no início
e, portanto, têm o direito de esperar o mesmo padrão de trabalho.

Depois da apresentação para a imprensa uma parte de você vai querer ir


embora, descansar e lavar as mãos do trabalho por um tempo - especialmente
se ele tem sido um processo difícil ou se o trabalho for mal recebido. Em vez
disso, visite o trabalho regularmente e olhe para as coisas que você pode fazer
233
para melhorar ou desenvolver no trabalho. Veja suas visitas como um processo
no qual você pode aprender mais sobre como dirigir. A melhor maneira de fazer
isso é para assistir ao espetáculo logo após sua sessão de apontamentos.
Estude cuidadosamente a relação entre a forma como você deu os
apontamentos e como ele é (ou não é) realizado. Se o apontamento é feito
claramente, lembre-se do que você disse para o ator - o seu tom de voz e as
palavras e imagens que você usou. Da mesma forma, observe se o ator
realizou um apontamento de forma imprecisa e pergunte a si mesmo: "Houve
alguma coisa que eu disse que não estava claro?" Melhore como você faz os
apontamentos em resposta às suas descobertas.

Lembre-se que qualquer espetáculo que você fizer vai se tornar frouxo,
se você não ficar de olho nele. Como regra geral assista ao espetáculo uma
vez por semana se ele tem uma temporada curta e uma vez quinzenalmente,
se tiver um temporada mais longo. Os atores, muitas vezes, querem que você
fique longe para que eles possam "possuir o trabalho". Obviamente, diretores e
atores precisam de algum espaço de respiro na sua relação de tempos em
tempos, mas equilibre essa necessidade, com a finalidade de manter o trabalho
claro. Lembre-se, também, que seu trabalho não é para agradar os atores; em
vez disso, você está garantindo a clareza de seus trabalhos para o público.

Depois de ter visto a apresentação você pode marcar uma sessão de


apontamentos de duas horas no dia seguinte ou você pode digitar seus
apontamentos. Se você agendar uma sessão de apontamento, certifique-se de
pedir a cada pessoa para falar brevemente sobre como o trabalho está se
desenvolvendo ou que identifique problemas que estão tendo. Em seguida, dê
seus apontamento. Comparecer nas sessões de apontamentos depois da
apresentação para a imprenssa pode ser difícil para alguns atores por causa de
outras obrigações de trabalho ou familiares; às vezes você não terá escolha a
não ser digitar seus apontamentos. Coloque todos os apontamentos para os
atores no mesmo documento e garanta que todos tem uma cópia. Dessa
forma, eles podem ler os apontamentos para as outras pessoas, bem como os
seus próprios e antecipar eventuais alterações. Deixe os atores saberem que
os apontamentos estarão em seu camarim em um determinado momento para
que eles possam vir e digeri-los bem antes da apresentação começar.
Tranquilize-os para não façam apontamentos que não estiverem claros e dê-
lhes o seu número para que eles possam ligar para você a checar sobre o
significado de qualquer coisa que você pediu-lhes para fazer.

234
RESUMO

Observe o seu espetáculo regularmente, de modo que o padrão do


trabalho seja mantido.
Afie suas habilidades para dar apontamentos assistindo o trabalho após
uma sessão de apontamentos.
Assista ao espetáculo uma vez por semana se a temporada for curta e
uma vez quinzenalmente se a temporada for mais longa.
Aceite que os atores nem sempre querem que você observe o trabalho
regularmente.
Dê apontamentos em uma sessão de apontamentos ou digite-os e deixe-
os nos camarins dos atores depois do espetáculo.

13.6 Analise o seu trabalho quando a temporada acabar

A melhor maneira de desenvolver-se como um diretor é analisar seus


erros. Quando uma produção termina o primeiro sentimento que você vai
experimentar é de alívio. Você vai querer descansar antes de antecipar a
próxima produção. Antes de fazer qualquer trabalho, leve uma hora ou mais
para refletir sobre o que você acabou de fazer. Anote suas observações e
certifique-se de se referir a eles um pouco antes de embarcar em seu próximo
trabalho. Se você teve um problema com um ator, pense sobre o problema e
como ele evoluiu. Olhe para trás em cada fase do processo, incluindo o a
seleção de elenco, e localize qualquer coisa que você fez que contribuiu para o
problema. Faça uma nota mental para evitar de fazer a mesma coisa na
próxima vez. Se você estava descontente com o cenografia, a iluminação, ou o
som, trilhe o caminho de volta e reveja os passos do processo em uma
tentativa de ser específico sobre o que você poderia ter feito de forma
diferente. Considere a relação entre a sua preparação e o resultado final.
Pergunte a si mesmo se você se preparou bem ou não e se você pode
melhorar aspectos da sua preparação no próximo trabalho.

Tome nota de quaisquer déficits de habilidades e procure maneiras de


preencher as lacunas em sua especialização. Você poderia, por exemplo,
participar de workshops ou cursos de aperfeiçoamento que cobrem suas áreas
mais fracas. Em seguida, recarregue as baterias antes do início do próximo
trabalho.

Desenvolva suas habilidades dessa forma, mas lembre-se que não há


nenhum solução definitiva, absoluta ou platônica para a realização de qualquer
texto. Cada decisão de um diretor sobre a criação de uma peça envolve um ato
de interpretação - em maior ou menor grau. Algumas dessas decisões são mais
"legíveis" para uma plateia do que para outras, tais como a cor dos figuirnos ou
o período arquitetônico de um elemento particular da cenografia. Outras
decisões podem ser mais sutis, tais como as escolhas sobre o que os

235
personagens querem a todo momento, ou a temperatura do ambiente em que
estão parados. Todas as decisões que você faz se somam para dar ao público
uma impressão sobre o que a peça é. Você poderia cumprir rigorosamente
todas as orientações do texto, impor o seu próprio conceito sobre a peça, ou
mudar o local da ação para o futuro. Faça o que fizer - ou não - a sua
assinatura vai estar lá na peça junto com a do escritor. Pode ser escrita
levemente ou com ousadia, mas vai ser legível a todos que assistirem.
Portanto, é importante que todas as escolhas que você fez, seja com os atores
ou com sua equipe de criação, sejam cuidadosamente e finamente
trabalhadas.

Também irá ajudar se você procurar produções ou artistas, quer no seu


campo ou fora, por quem você possa medir-se. Eu tinha 25 anos quando vi
pela primeira vez o trabalho dos diretores russos Lev Dodin e Anatoli Vassiliev,
e ainda assim eu ainda encontro-me medindo o que eu faço contra o trabalho
que eu os vi fazer há 19 anos. E há outros artistas, fora de meu campo, tais
como a dançarina e coreógrafa alemã Pina Bausch e a companhia polaca
avant-garde Gardzienice, cuja visão e gênio definiram uma padrão
impossivelmente alto para o que eu faço hoje.

236
Fim de jogo de Samuel Beckett

237
14. Capítulo - Como eu aprendi as habilidades que o livro descreve
(Tradução de Marilene Maia - Revisão Humberto Issao)

Esta parte do livro descreve como eu fiz para aprender as habilidades


descritas e fornece um contexto para as tarefas abrangidas em todos os
capítulos anteriores. Ele vai te dar uma idéia dos artistas e metodologias cujo
pensamento e prática serve de base para este livro. Ele contém quatro etapas
– Marcos na minha própria compreensão da arte do diretor:

14.1 - Stanislavsky
14.2 - Lev Dodin ensina direção na Rússia
14.3 - Aulas particulares de direção no Reino Unido
14.4 - Investigação sobre a biologia das emoções

14.1 Stanislavsky

Konstantin Stanislavsky nasceu na Rússia em 1863 e morreu em


1938. Embora tenha começado sua carreira como ator, ele eventualmente
começou a dirigir suas próprias produções. Montou o Teatro de Arte de Moscou
(TAM), em 1897, com o dramaturgo e produtor Nemirovich-Danchenko e
escreveu vários livros sobre o fazer teatral, principalmente sobre a
atuação. Durante sua vida, o trabalho de Stanislavsky influenciou o teatro em
seu próprio país e no exterior, muito famoso na América onde seu trabalho
inicial sobre a memória emocioiva construíu em uma escola de atuação,
chamada "O método". Seu trabalho posterior sobre as ações físicas influenciou
as experiências dos seus contemporâneos (tais como Vsevolod Meyerhold)
bem como o trabalho de praticantes da vanguarda (como Jerzy Grotowski) ao
longo do século XX. A revolução liderada por Stanislavsky afetou tanto o teatro
comercial ocidental quanto a vanguarda. Nenhum praticante desde dele teve
um um impacto tão profundo e duradouro sobre a arte da direção.

O Legado de Stanislavsky tem sido muito incompreendido desde que


surgiu no final do século XIX. Ele também tem sido reverenciado de uma
maneira que intimida um questionamento saudável e crítico sobre alguns
aspectos de sua prática. No entanto os escritos de Stanislavsky ainda
delineiam um processo de trabalho extremamente útil e prático para pessoas
que estão trabalhando no teatro agora – especialmente diretores.

Quando falamos de Stanislavsky em nossas salas de ensaio hoje, nós


não falamos sempre estritamente sobre o trabalho que ele desenvolveu. Seus
exercícios e idéias têm sido modificados, desafiados e atualizados ao longo do
tempo, eles têm sido mastigados e experimentados por diferentes profissionais
de Augusto Boal no Brasil até Sam Kogan em Londres. Às vezes o que chega a
nós é baseado nos escritos do próprio Stanislavsky; às vezes é a interpretação
de Boal ou do Kogan sobre Stanislavsky. Pouco se tenta diferenciar entre as
duas fontes de nossa compreensão de Stanislavsky – uma situação que
compreensivelmente leva à confusão.

Como resultado, muitas das ferramentas que os diretores usam nas


salas de ensaio, como isolar as intenções dos personagens, ou construir suas

238
biografias, tem pouca relação, em sua descrição e em sua terminologia, com a
obra de Stanislavsky. Com efeito, em alguns casos, o que Stanislavsky ensinou
e escreveu sobre, foi deturpado ou dado em um tom impreciso por erros de
tradução. Por exemplo, nós usamos frequentemente a palavra "unidades" para
falar sobre a maneira em que dividimos uma peça em pedaços pequenos e
gerenciáveis. Stanislavsky usou a palavra russa "kuski", que se traduz como
"pedaços", para descrever estas partes. A palavra "pedaços" implica uma
consideração de uma pequena parte de um objeto inteiro, como uma estátua
de vaso ou mármore de china. É um termo simples e fácil de
entender. "Unidade" é uma maneira mais científica de descrever a mesma
coisa, mas evoca uma imagem fria e clínica de objetos de metal sobre uma
mesa de laboratório. Não nos dá uma imagem forte do todo, o organismo ao
qual pertence a "unidade" ou a "peça". Sua frieza e intelectualismo podem ser
desconcertante para os atores. Até mesmo os sotaques dos professores que
ensinaram primeiramente o trabalho de Stanislavsky no Ocidente causaram
confusão. Você pode estar familiarizado com o termo Stanislavskianano
'batidas', uma palavra que tem sido usado para descrever as subdivisões das
unidades. No entanto, Stanislavsky nunca usou esta palavra. Em vez disso se
referia à estas subdivisões como "contas" (como as contas que se unem para
fazer um colar). A lenda diz que Richard Boleslavsky, que ensinou o sistema de
Stanislavsky no American Laboratory Theatre em 1920, tinha um forte sotaque
polonês e que seus alunos ouviam a palavra "batidas" e não "contas"7. Parece
que um dos termos mais amplamente utilizados de análise textual na tradição
teatral ocidental se deve a um erro de pronúncia.

Não há uma única teoria ou sistema para o trabalho de


Stanislavsky. Libertar-se de uma noção de que o trabalho de Stanislavsky é
fixo, um sistema imóvel, vai ajudar você a usar o que ele tem para oferecer de
forma mais eficaz. Seus métodos estavam sempre mudando porque ele teve
que desenvolver e crescer em resposta aos problemas concretos que ele
encontrou em sua vida de trabalho. Ele constantemente reinventava sua prática
de trabalho e, às vezes, contradisse a si mesmo, rejeitando uma maneira de
trabalhar em favor de outra. No entanto, em geral, sua obra se divide em duas
partes. A primeira envolve o trabalho "de dentro para fora", usando as
memórias emocionais da vida do ator para apoiar o mundo emocional do
personagem. O segundo envolveu o trabalho "de fora para dentro", usando
ações físicas como um meio de comunicar emoçõe e o personagem. Ele se
moveu da pergunta "O que você sente?" para a pergunta "O que você está
fazendo?" para seus atores. Achei seu trabalho posterior sobre ações físicas
mais útil no meu trabalho do que seus trabalhos anteriores sobre a memória
emotiva. Você logo deve ter notado que o processo que descrevo neste livro
salienta o "fazer" e não o "sentir".

Muitas pessoas pensam que os exercícios de um russo do século XIX só


podem ser usados quando se estiver trabalhando em uma peça de teatro russa
do século XIX. Isto não é verdade. Você pode usar as técnicas de Stanislavsky,
independentemente do estilo, gênero de peça ou projeto que você está
trabalhando. Eu tenho usado ele quando trabalho em peças de teatro gregas

7
Em inglês a palvra para batidas é "beats" e a palavra para contas é "beads" (Nota do revisor)

239
como 'Ifigênia em Áulis', peças novas, como de Kevin Elyot 'Forty Winks',
atuações abstratas tais como 'Attempts on Her Life' de Martin Crimp ou de
Samuel Beckett 'Footfallse' e até óperas. Lembre-se que Stanislavsky não só
dirigiu peças de teatro realista. Também trabalhou em Shakespeare, Jean
Racine e peças de teatro simbolistas como 'The Drama of Life' de Knut
Hamsun e de Leonid Andreyev 'The Life of Man'. Seu trabalho continua a ser
relevante sempre que você se encontra dirigindo uma peça que contém
personagens que são membros da raça humana, independentemente do
período de tempo que habitam ou do estilo da peça que pertencem.

De longe a melhor introdução ao trabalho de Stanislavsky é o livro de


Jean Benedetti, 'Stanislavsky: An Introductio'n, publicado por Methuen em
1982. São apenas 80 páginas e estabelece as ferramentas e ideias de
Stanislavsky com um desenvolvimento simples e claro. Stanislavsky escreveu
três livros: 'Construindo um personagem', 'Criando um papel' e 'A preparação
do Ator'. Vale a pena ler todos, especialmente agora que eles foram
republicados em 2008 em uma nova tradução, também por Benedetti. Nesta
nova publicação pela Routledge, os dois primeiros volumes de Stanislavsky
são combinados em um único livro, chamado 'O Trabalho do Ator'.

14.2 Lev Dodin ensina direção na Rússia

Meu primeiro contato prático com o legado de Stanislavsky foi em 1989,


quando recebi o Winston Churchill Memorial Trust Fellowship para estudar a
formação dos diretores na Europa Oriental. Passei um total de cinco meses na
Polônia, Rússia, Geórgia e Lituânia, e eu assisti produções e aulas de direção
em todas as escolas de atuação e teatro. Todas as classes de direção eram
lideradas por diretores que estavam em atividade. Foi em uma classe de
direção de primeiro ano liderada por Lev Dodin, diretor artístico do teatro Maly,
em São Petersburgo, que me apresentou à disciplina quase científica do
legado de Stanislavsky. Lev Dodin treinou com Boris Zon, que tinha estudado
com Stanislavsky.

Dodin era um homem negro, com barba espessa e grossa. Quando ele
entrou na sala todos os alunos ficaram ordenadamente em linha. Todos
usavam meias pretas, sapatatilhas de balé pretas e camisas pretas. Na Rússia,
os estudantes de direção treinam por cinco anos; durante o primeiro ano eles
estudam atuação, trabalhando suas escolhas através das etapas básicas do
sistema de Stanislavsky. Neste dia em particular, os alunos estavam mostrando
uma série de estudos, ou "etudes", como eles chamam, baseiados em eventos
que poderiam ter acontecido com eles em suas vidas cotidianas. Eles foram
autorizados a usar mesas e cadeiras, mas todos os outros objetos que usavam
eram imaginários. O primeiro aluno tinha escolhido para re-encenar uma
inalação por conta de um forte resfriado. Na metade do exercício Dodin o
parou.

"Que tipo de apartamento é?" perguntou Dodin

"Meu apartamento", respondeu o estudante.

240
"Um apartamento próprio?"

"Sim".

"Então por que está levando todos os objetos que você precisa para a
inalação da cozinha para o quarto? Por que você não faz sua inalação na
cozinha ou banheiro onde os objetos estão? Não há nenhuma lógica no que
você está fazendo. Se você está doente, qual o sentido em fazer todos esses
movimentos? Se você está realmente doente, faria da maneira mais curta e
fácil."

"Agora eu me lembro porque eu fiz isso no quarto. Quando eu estava


doente, havia alguém no banheiro e na cozinha."

"Se fosse esse o caso então você teria que demostrar essas
circunstâncias." Dodin fez uma pausa e então perguntou: "Por que você está
fazendo uma inalação?"

"Para ficar melhor."

"O que você está sentindo?"

"Muito calor, uma dor de cabeça e dor de garganta."

"Mas que tipo de sensação que um homem que tem estes sintomas
possui? Você é um azarado porque está falando com um especialista. Por dias
eu tive um forte resfriado. Vamos tentar e entender que sensações você está
tentando superar."

"Uma sensação de esforço".

"Claro que tem aquela sensação física, mas isso não é a coisa mais difícil e
dolorosa. O que é mais doloroso e difícil é que você é quase uma outra
pessoa. Você sente que você não é nada porque não pode levantar da sua
cama e trabalhar. Você está suando, molhado, tomando pílulas. Por que você
fez inalação afinal de contas? Você tem que ter algum tipo especial de
psicologia para carregar as coisas de volta quando você esta doente. Se
dependesse de mim eu pensaria: 'devo fazer isto ou devo sentar na cama e
tomar os comprimidos?' Além disso, quando você cuspiu dentro da tigela, você
fez como se estivesse num palco. Mas quando você cospi quando você está
realmente doente, você faz de forma diferente. Você fez como se estivesse
atuando para uma plateia, para mostrar que estava em uma má condição
física. Você, em vez disso, deve fazer a ação como se fosse na vida real. Além
disso, o toque quente da toalha em seu rosto era impreciso. Não parece que o
afeta. No entanto, quando você faz isso nos seus olhos com água quente, sua
pele queima. Nós não vimos isto."

O estudante permaneceu em silêncio. Em seguida, Dodin continuou: "O


que tem nos seus pés?"

241
"Chinelos."

"O que mais está usando?"

O aluno descreveu detalhadamente as roupas dele e então Dodin


começou a desafiá-lo sobre eles: "Mas você vai para uma cozinha fria, sem
vestir algo quente. Você está suando. Você deve trocar de camisa porque você
estaria completamente molhado. No presente estudo é presumível que se
apresente alguns minutos de vida real que deve ocupar seu corpo inteiro da
topo da sua cabeça até a ponta dos dedos dos pés. Uma das sensações mais
desagradáveis de ter uma gripe é quando as pontas dos seus cabelos ficam
molhadas. Quando digo isto não estou inventando algo. Estou tentando lembrar
de algo que realmente aconteceu na minha vida. Isto é o que eu quero que
você faça. Agora faça o exercício novamente.'

O aluno desanimado começou a repetir o exercício. Ele sentou na cama


e abraçou os joelhos no peito. Dodin parou imediatamente.

"Você já está errado. Pense um pouco. Você está com febre e, como
você não é capaz de superar a febre, o corpo começa a relaxa. Você tem uma
alta temperatura e por causa disso você não pode pensar claramente. Os
pensamentos de seu cérebro que vão para seus membros, braços, pernas,
pés, movem-se mais lentamente. Quando você está saudável, você não sente
seu corpo, mas quando você está doente, você começa a sentir isso. Agora
continue."

Neste ponto o aluno realmente começou a sofrer. Eu podia vê-lo corar e


tentando revidar seu embaraço enquanto trabalhava. Dodin interrompeu: "não
tenhas pressa. Quando você está doente, você não tem com pressa."

O aluno tentou ir mais devagar. Ele deitou-se sobre a cama e tentou


dormir. Então ele abriu os olhos. Neste ponto Dodin interrompeu: "Está claro ou
escuro na sala?"

"É dia."

"Está se sentindo confortável ou não? Tem que haver algum tipo de


lógica no que está fazendo. No momento não está claro qual a hora do dia ou
da noite. Esta circunstância vai afetar o que você faz. Lembre-se também que o
tempo todo você está pensando em algo."

O aluno inicia o exercício novamente, pega um livro. Dodin o


interrompe. "Ler um livro é a maneira mais convencional de iniciar um estudo."

Novamente, o estudante tinha que começar, mas novamente ele estava


parado e observado por Dodin. Assim, continuou por cerca de uma hora.

Para começar eu achei o processo cruel. Enquanto ele continuava, eu


percebia que era o único jeito de ensinar o nível de detalhemento que Dodin
queria – interna e externamente. A precisão que ele exigiu de seu aluno foi

242
inspiradora – não menos importante isso exigia um nível intenso de observação
e concentração do próprio Dodin. Eu vi que ele podia ler pensamentos e ações
com igual precisão. Invejei essa habilidade e tornou-se algo que eu pretendia
desenvolver em meu próprio trabalho. Havia algo científico sobre sua
insistência sobre a lógica da ação, e isto também tem ficado comigo como uma
forma de análise e construção de cenas. Eu também percebi que seu interesse
principal era o comportamento e não as palavras. Finalmente e mais
importante, eu notei que nada do que ele disse foi vago – todos os seus
apontamentos eram concretos e específicos. Esta foi a lição essencial que eu
tirei de sua classe que era arrepiante, e se tornou um critério no meu trabalho
com atores desde então. É o princípio orientador atrás das ferramentas e
tarefas que este livro descreve.

14.3 Aulas particulares de direção no Reino Unido

Meu contato com o modo de trabalho descrito na seção anterior foi


renovado dez anos mais tarde, quando comecei aulas particulares para
melhorar a minha direção. Essas classes foram construídas em torno de meu
horário profissional de direção. Eu tive dois professores: Tatiana Olear e Elen
Bowman. Tatiana treinou como atriz com Lev Dodin no Instituto de Teatro
Música e Cinema Estatal de Leningrado, e em seguida se apresentou com sua
companhia por seis anos antes de sair para viver na Itália. Elen treinou como
atriz na Royal Academy of Dramatic Art em Londres, depois como diretora por
três anos sob comando do emigrante russo Sam Kogan na Escola de Ciência
de Teatro em Londres, antes de seguir uma carreira como diretora. Sam Kogan
tinha treinado em GITIS Moscou, e (como Anatoli Vassiliev) sua professora foi
Maria Knebel, que havia sido estudado com o próprio Stanislavsky.

Tatiana e o Elen me ensinam uma variação do sistema de


Stanislavsky. O seu objetivo primordial era a busca de uma linguagem simples
e eficaz para falar com o ator e se comunicar com o público. A principal
diferença entre as duas mulheres foi o resultado da formação com Sam
Kogan. Ele tinha trabalhado como enfermeiro psiquiátrico na Rússia e, por
causa disso, ele tinha desenvolvido uma vertente singular de trabalho que
implicava em uma análise mais profunda dos processos mentais acontecendo
nas mentes dos atores e dos personagens.

Este livro contém muitos dos exercícios que essas mulheres me


ensinaram. Devo muito as duas, como elas me mostraram como usar o
trabalho de Stanislavsky de uma forma simples e clara em uma sala de
ensaios. Elas também forneceram-me ligações para Dodin, Kogan e, através
deles, Stanislavsky. Fizeram que eu me sentisse parte de uma cadeia de
praticantes, cada ferramentas experimentada e testada contra suas culturas e
tempo.

243
14.4 Investigação sobre a biologia das emoções

O desenvolvimento final no meu entendimento de Stanislavsky ocorreu


em 2003 quando eu estava estudando sua última obra em ações físicas como
parte de uma bolsa da Fundação Nacional de Ciência, Tecnologia e
Artes. Enquanto pesquisava Stanislavsky, me deparei com uma referência a
um líder filósofo do século XIX, William James. Em 1884, James tinha escrito
um ensaio chamado 'O que é uma emoção?' que aparentemente havia
influenciado Stanislavsky em suas práticas posteriores. James fez uma
observação crucial sobre as emoções: quando estamos em uma situação
ameaçadora reagimos fisicamente primeiro e em seguida, tomamos ciência do
significado dessa reação física. Para se fazer entender ele usou o exemplo da
resposta ao se encontrar um urso em uma floresta. Antes, James acreditava
que se você visse um urso, você iria se sentir assustado e depois
fugiria. James observou algo diferente. Ele notou que vemos o urso, e
começamos a correr; só então percebemos que estamos com medo.

À primeira vista, esta é uma alteração minúscula. No entanto, para os


profissionais de teatro, cujo negócio é a personificação exata e a transmissão
das emoções humanas, é potencialmente enorme. Aqui está uma maneira de
olhar as emoções que separa a resposta física da consciência e os processos
mentais que seguem a este momento da tomada de consciência. Ele aponta
para uma forma de trabalhar com as emoções através da recriação da sua
forma física ou das circunstâncias. Eu podia ver como as observações de
James puderam influenciar o trabalho de Stanislavsky em ações físicas na
década de 1890, mas perguntava-me elas se manteriam hoje e, por
conseguinte, se seriam de uso concreto no teatro agora.

Essas perguntas levaram-me à obra de Antonio Damasio. Damásio é um


neurocientista luso-americano que escreve sobre a consciência. Seu livro
intitulado 'The Feeling of What Happens' estuda as emoções como forma de
compreensão da consciência. Eu descobri que as observações sobre as
emoções humanas feitas por William James, mais de 100 anos atrás ainda não
foram descartadas pela neurociência – embora com modernas técnicas de
imagens cerebrais e o surgimento de uma imagem mais completa e mais
complexa de como funcionam as emoções.

Damásio, como James, argumenta que uma emoção consiste


principalmente de uma mudança visível no corpo. Esta mudança é legível em
nossas expressões faciais, tom de voz, postura e até mesmo em nossos
processos corporais internos. Há uma lacuna de cerca de meio segundo entre
um estímulo (ver um urso na floresta) para se tornar uma emoção consciente
(medo). Quando ficamos conscientes do que realmente está acontecendo, já
corremos vários metros de distância do urso. A definição de uma emoção como
uma mudança física e o intervalo de meio segundo entre estímulo e
consciência da emoção, forneceram-me uma nova forma de trabalhar as
emoções com atores. Eu comecei a testar essas idéias com atores em uma
série de oficinas como parte da minha bolsa NESTA Fellowship.

244
Em nossos exercícios, a observação de James do reconhecimento
posterior da emoção levantou-se para que fosse examinado por nós. Eu
também percebi que os atores tendem a encenar uma versão um pouco mais
discreta e de bom gosto das emoções no palco em comparação com o que
realmente acontece na vida. Esta descoberta tornou-se um ponto crítico de
referência em meu trabalho com os atores e alterei radicalmente a forma como
eu dirijo as emoções. Comecei a identificar os gestos e as ações que estavam
em convenções teatrais românticas e não eram fiéis à vida e comecei a
eliminá-los do trabalho dos atores. Também foi decepcionante descobrir que há
uma parte do cérebro que é dedicada ao reconhecimento de emoções em
outras pessoas e que recolhemos informações sobre outras pessoas pela
"leitura" de seus corpos. Se, quando representamos emoções no palco,
perdemos algum detalhe físico vital para a expressão de uma emoção, então a
emoção pode não ser legível para o público. Eu percebi que eles só podem ler
o que está acontecendo dentro de alguém pelo que vêem sobre no exterior.

Como resultado dessas descobertas minha relação com o publico


mudou radicalmente. Já não era essencial para os atores sentirem as
emoções; agora, o que importava era que o público às sentissem. O essencial
era que os atores as projetassem precisamente com seus corpos. Ele podiam
fazer isso por dentro, recordando a emoção (lembrando uma vez em suas
vidas quando eles experimentaram a mesma coisa), ou do lado de fora, por
uma reconstrução quase clínica do que o corpo faz quando uma emoção
particular acontece. Essas descobertas cristalizaram meu entendimento no
interesse de Stanislavsky nas ações físicas. Percebi que sua prática tinha
sofrido alterações porque ele estava articulando algumas verdades
fundamentais de do corpo. A fisiologia das emoções substituía a psicologia
como ponto fundamental de referência para falar sobre – e trabalhar – a
atuação.

GLOSSÁRIO
(Tradução e Revisão Humberto Issao)

As entradas em negrito são os termos que você vai encontrar primeiro quando você for da sala
8
de ensaios para o teatro .

Atuais (Actuals): os adereços que serão usados no show em oposição a stand-


ins (veja abaixo).

Afinidade (Affinity): as conexões subjetivas que atraem você a determinados


elementos de uma peça ou um personagem em particular, pois se referem à
sua própria vida ou como você olha para o mundo.

8
Os termor originais foram mantidos em parênteses como no original uma vez que são termos de uso
corrente no ambiente na qual a autora trabalha e nem sempre têm uma correspondência no ambiente
de trabalho brasileiro.

245
Audiência na cabeça (Audience Thinking): os pensamentos que os atores têm
sobre o público que ficam no caminho deles interpretando um personagem em
uma situação.

Ensaio da Banda (Band call): É o tempo que o diretor e/ou compositor


músical gasta com técnica de som, verificando se o som da música tocada ao
vivo está bem equilibrada - estando a banda visível ou escondida em uma Sala
da Banda (veja abaixo).

Sala anexa para a banda (Band room or box): uma sala acusticamente
vedada em que a música tocada ao vivo é retransmitida para o teatro.

Iniciantes (Biginners): Cinco minutos antes do show começar.

Desenho de cena (Blocking): A disposição dos atores no palco para que a


ação, eventos e a os pontos chaves da história fiquem visíveis e focados.

Caderno de notas (The book): Uma cópia do texto em que o diretor de palco
anota todas as deixas que os atores fazem e, quando você entrar em cena,
onde todas as entradas de iluminação e sonoplasita são anotados. O
assistente de palco dá as deixas para a iluminação e a sonoplastia para os
operadores deste caderno de notas. Supostamente o caderno de notas nunca
deixa o teatro.

A caixa (The box): A pequena sala à prova de som, estande ou área em que o
assistente de palco senta-se dá as deixas do espetáculo.

Chamada ou chamada de ensaio (Call ou rehersal call): O plano para o dia de


ensaio. Na maioria das grandes teatros este plano é elaborado em uma folha
de papel A4 e postada no prédio no dia anterior aos ensaios que descreve. É
também chamado de "folha de chamadas '.

Mudanças (Chengeover): O processo pelo qual um cenário é removido do


teatro e outro é instalado, se duas ou mais peças são realizadas no repertório
concomitantemente.

Memória emotiva (Emotional Memory): uma frase usada por Stanislavsky para
descrever a recordação de uma verdadeira emoção da vida de um ator que
pode ser usada para apoiar ou articular o que um personagem sente na ação
de uma peça.

Eventos (Events): Os momentos em um ato ou cena quando algo muda. A


mudança é visível porque os personagens alteram o que eles estão fazendo.

Montagem de palco (Fit-up): O período em que o cenário é construído no


palco do teatro.

Os cinco (The five): 10 minutos antes da apresentação.

246
Biombos (Flats): São telas autônomas que você pode mover ao redor da sala
de ensaio para criar espaços diferentes. A palavra também poderia ser utilizado
para se referir a telas usadas nos bastidores ou para os pedaços de madeira
que se encaixam para fazer as paredes imaginárias de um sala ou edifício.

Flies: A área acima do palco em que telas, elementos cênicos ou luzes podem
entrar e sair de cena voando.

Levantando as luzes (Focus session): O processo pelo qual cada luz é


pendurada no lugar correto nas varas de luz e apontada na direção certa para
o espetáculo. O diretor não precisa participar desse processo..

Gênero (Genre): O estilo em qeu a peça é escrita.

Entrada no teatro(Get-in): o tempo técnico alocado para a instalação do


cenário, aparelhamento as luzes e se preparando o som.

Saída do teatro (Get-out): O tempo técnico alocado para levar o cenário para
fora do teatro e desmontar o som e as luzes.

Ground plan: O plano de como a cenografia se encaixará na planta do espaço


teatral.

A metade (The half): Um termo da direção de palco usado para se referir aos
35 minutos antes do espetáculo começa.

A casa (The house): Outro nome para o público sentado no auditório.

Circunstâncias imediatas (Immediate circumstances): Os eventos que


acontecem nas 24 horas ou equivalente que antecederam a ação de uma cena.
Eles podem incluir o que aconteceu um par de minutos antes da ação ou os
eventos da noite anterior. Eles têm um impacto direto sobre as ações e dão aos
atores algo contreto para atual.

Uma impressão (An impression): A informação que você deriva de uma leitura
de uma fala ou de uma parte de uma peça que não contém fatos óbvios.

Intenções (Intentions): Um termo usado para descrever o que o personagem


querem de quem.

Mesa de luz (Lighting desk): A mesa ou placa na qual a placa e a tela que
programa e opera as luzes são colocados. Em um ensaio técnico ela
normalmente ficará temporáriamente no auditório. Durante a temporada ela
entra em uma cabine na qual o operador de iluminação faz a operação das
luzes no espetáculo.

Marcação da Planta baixa (Mark-up): uma forma de demarcar a cenografia. A


marcação da plnata baixa se faz com uma série de linhas marcadas no chão da
sala de ensaio com fita plástica que indica os limites do paisagem ou
arquitetura que descreve o cenário.

247
Servidor de mídia (Media server): A máquina que processa as imagens ao vivo
ou gravadas. O servidor de mídia organiza ou trata as imagens para que elas
possam parecer mais claras ou mais escuras do que o material de original, e é
capaz de transformar uma imagem colorida, em sépia ou preto e branco.

Meet-and-greet: É a somatória das pessoas envolvidas no processo de ensaio


com todos as outra pessoa que trabalham para o teatro onde a produção está
sendo encenada.

Aprsentação da Maquete (Model Showing): A exibição da maquete acabada


durante o processo de ensaio. O principais objetivos da exibição da maquete
são os de imprimir uma imagem clara dos lugares onde a ação da peça
ocorrerá (a cenografia) na imaginação dos atores e compartilhar as idéias para
a produção com toda a gente no teatro ou na companhia envolvidos em fazer a
peça acontecer.

Trabalho de pintura (Paint job): O processo pelo qual o cenário é pintado.

Casa de pintura (Paint Shop): A sala onde os cenários são pintados (não onde
as tintas são compradas).

Praticável Móvel (Pallet): Uma plataforma deslizante no qual um elemento


cénico do cenário pode ser construído.

Sessão de afinação de luz (Plotting Session): O processo pelo qual o som e


as luzes são misturadas para criar os sons ou os ambientes de luz para o
espetáculo em si. O diretor precisa assistir a estas sessões. Elas acontecem no
teatro sem os atores.

Luz aparente (Practical Light ): As luzes do cenário que são visíveis para o
público, como lustres, lâmpadas de ambientes ou abajures.

Apresentação para a imprensa (Press night): A noite, quando os críticos vêm


assisitr ao trabalho.

Previews: As primeiras apresentações públicas antes da apresentação para a


imprensa.

The quartes: 20 minutos antes da apresentação.

Tempo de silêncio (Quiet time): O tempo no teatro entregue ao sonoplasta ou


músicos para que trabalhaem nas deixas.

Primeira Leitura Corrida (Read-trough): O momento no início dos ensaios em


que a peça é lida pelos atores pela primeira vez.

Rig: O processo pelo qual um elemento cénico aéreo é colocado.

Conjunto de varas (The Rig): A rede de barras onde as luzes são


penduradas.

248
Set Back: Um termo usado durante ensaio técnico para que tudo fique pronto
para comecar de novo.

Linhas de visão (Sightline): As fronteiras 'invisíveis' que marcam a área do


palco que cada membro do público pode ver.

Passagem de som (Sound check): O processo pelo qual são verificados


pelos técnicos de som se todos os alto-falantes estão funcionando. O diretor
não precisa assistir a esta sessão.

Mesa de som (Sound desk): Uma mesa ou placa onde o equipamento de som
é colocado. Este equipamento muitas vezes fica no auditório para os ensaios
técnicos e é então transferido para ums cabine, onde o operador de som senta
durante as apesentações.

Pesos (Stage Weights): Pesos quadrados de metal sólido, com cerca de seis
polegadas de largura, os quais são utilizados para escorar as pernas de uma
perna ou fornecer lastro para qualquer objeto ou elemento cênico que precisa
ser seguro ou ficar sem ninguém segurando.

Reservas (Stand-ins): Os adereços que estão sendo usados como se fossem


os reais (Atuais (Actuals) - veja acima) que os atores vão usar no espetáculo.

Desmontagem (Strike): A palavra usada para descrever o processo de


desmontar o cenário que está no teatro.

Tech or Techs: As abreviações para os ensaios técnicos

Ritmo (Tempo): A velocidade geral em que um personagem ou pessoa pensa e


faz as coisas.

Evento gatilho (Trigger event): O evento antes do início da ação da peça que
estabelece que o moivmento da ação.

Balanço de branco (White balance): O processo de colocar um papel branco


na frente da lente da câmera, a fim de equilibrar as cores ao usar vídeos ao
vivo como parte da apresentação.

Modelo em cartão branco (White card model): Um esboço da maquete do


projeto do cenário que é feito de cartão branco. Não é pintado e geralmente
tem muito poucas informações sobre cor, textura ou detalhes arquitectónicos.

249
A Oresteia de Aeschylus

250

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