Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Joao Cabral de Melo Neto Uma Faca So Lamina
Joao Cabral de Melo Neto Uma Faca So Lamina
OU
SERVENTIA
DASIDÉIASFIXAS
L955
/ UM^ F^c,{ Só L^MrN^ 205
rclógioque tivuse
o gut.nede umafocg
e tod.aa impiedade
de lâmixa azula.da;
assimcomoumafaca
que.sem bolsooubainha
setransformasseemPorte
de vossaanatomia;
qral umafaca íntima
ou faca d.eusointemo,
habìtandonum arpo
comoo própio esqueleto
de um homemque o titase,
e sempre,dobroso,
de homemqueseferìsse
contrqseuspróprios ossos.
/ UMA F^cA Só L{MINA
JoÃo CABRÂr.
DEMELo NETo / OBRÀCoMpLEr\
Sejabala,relógio, Dasmaissurpreendentes
ou a lâminacolérica, é a vida de tal faca:
é contudouma ausência faca, ou qualquer metáfora,
o que essehomem leva. pode ser cultivada.
c D
E
F
Forçosoé conservar
a faca bem ocúta Quer sejaaquelabala
pois na umidâde pouco ou outra qualquer imagem,
sejamesmo um relógio
seurelâmpagodura
a ferida que guarde,
(na umidade que criam
ou ainda uma faca
salivasde conversas,
que só tivesselâmina,
tanto mais pegajosas
quantomaisconfidências). de todas asimagens
a mais voraz e gúfica,
Forçosoé essecuidado
ninguém do próprio corpo
mesmo senão é faca
poderá retirála,
a bÌasa que te habita
não importa seé bala
e sim, relógio ou bala.
nem seé relógio ou faca,
Não suportam também
todas as atmosferas: nem importa qual seja
a raça dessalâmina:
sua carne selvagem
quer câmarasseveÍas. hca mansade mesa,
feroz pernambucana.
Mas sedevessacrá-los
para melhor softê-los, E senão a retiÌa
quem sofre sua rapina,
que sejaem algum páramo
ou agrestede ar aberto. menospode arrancáJa
nenhuma mão úzinha.
Mas nunca sejaao ar
que pássaroshabitem. Não pode contÍa ela
Dwe sera um ar duro, a inteira medicina
de facasnumerais
sem sombra e sem vertigem.
e aritméticas pinçãs.
E nuncasejaà noite,
que estatem asmãos férteis. Nem ainda a polícia
com seusciÌurgiõ€s
Aos ácidos do sol
e até nem mesmo o tempo
seja,ao sol do Nordeste,
com os seusalgodões,
à febre dese sol
que faz de arameas ervas, E nem a mão de quem
que faz de esponjao vento sem o saberplantou
bala,relógioou faca,
e faz de sedea terra.
imagensde furor.
loÃo CABRÁL
DE MELo Nsro / OBRÂCoMpr.tü / UM^ F^cA Só L^MIN^
G H
I
De rclta dessafaca,
amigaou inimiga,
Essalâtnina adversa,
quemaíscondensa o homem
como o relógio ou a bala,
qua to nais o masüga;
setorna mais alerta
todo aqueleque a guarda,
de rcIta dessafaca
deporte tão secaeto
sabeacordar também
que det'esetlevada
os objetos em torno
comoo ocultoesqueleto;
e atéos próprioslíquidos
podem adquirir ossos,
da imagemem quemaìs
me detíve,a da hmina,
E tudo o que era vago,
porqueé de todaselas
toda Íiouxa matéria,
para quem sofie a faca certamentea maìsávida;
ganhanervos, arestas.
poìsde yolta dafaca
x nbe ò outra imagem,
Em volta tudo ganha
àquelade um relógio
a vida mais intensa,
picandosoba carne,
com nitidezde agulha
e presençade vespa,
e delaàquelaouto,
s pineíra, a da bald,
Em cadacoisao lado
que tem o dentegrosso
que corta seÌevela,
poúm forte a dentada
e elasque pareciam
redondascomo a cera
e daí à lembrança
que1)esüutais iuagens
despem-se agorado
e é Ìnuito maísintensa
calosoda rotina,
do quepôde a linguagem,
pondo-se a funcionar
com todassuasquinas.
e ofinal à presença
pima,
da realid.ad.e,
Pois enúe tantas coisas
quegeroua leubronça
que também já não dormem,
e ainda a geta aìnda,
o homem a quem a faca
cofta e emprestaseucoÌte,
por fm à rcalìdade,
piüa, e tã.oiole ta
soliendo aquelalâmina
que4o tentar apreefldê-la
e seuiato tão frio,
passa,lúcido e insone, toda imagemrebenta,
vai fio contÍa fios.
FIM DE.UMA FÁ,c SÓ I.ÁMINÂ"