Você está na página 1de 86

Uma Abordagem

à Gramática do Kimbundu

3
4
Uma Abordagem
à Gramática do Kimbundu
Fernando Cerqueira

5
6
Índice

Resumo ................................................................................................... 9
As línguas bantas .................................................................................. 11
As línguas bantas em Angola ............................................................ 21
Primeiras publicações em línguas bantas .......................................... 25
O kimbundu .......................................................................................... 27
As classes no kimbundu ..................................................................... 33
Classes I e II ..................................................................................... 34
Classes III e IV .................................................................................. 35
Classes V e VI ................................................................................... 36
Classes VII e VIII ............................................................................... 37
Classes IX e X ................................................................................... 38
Classe XI ............................................................................................ 40
Classe XII ........................................................................................... 41
Classe XIII .......................................................................................... 42
Classe XIV .......................................................................................... 43
Classe XV ........................................................................................... 45
Quadros comparativos das gramáticas de Heli Chatelain, Gram-
matica Elementar do Kimbundu, de José Luiz Quintão, Gramática
de Kimbundo, dos Missionários do Vicariato Geral de Malange,
Elementos da Gramática de Quimbundo e do padre António da
Silva Maia, Gramática de Kimbundo ................................................ 48

7
O alfabeto ............................................................................................... 61
A constituição silábica do kimbundu ................................................ 65
O tom ..................................................................................................... 69
Comentário ............................................................................................. 73
Bibliografia .............................................................................................. 77

ANEXOS

Concordâncias ......................................................................................... 81
Misoso (contos) ..................................................................................... 83
Jisabu (provérbios) ................................................................................ 87

FIGURAS

Figura 1 Famílias linguísticas existentes em África e os dois sub-


ramos da Níger-Cordofânia ................................................ 12
Figura 2 Origem e difusão das línguas bantas. Proposta de
Heine, Bloff e Vossen (1977) ............................................ 13
Figura 3 Classificação proposta por Guthrie ................................... 15
Figura 4 Classificação das línguas bantas com a inclusão da zona J 16
Figura 5 As línguas bantas em Angola ........................................... 22
Figura 6 Capa de Arte da Lingua de Angola ..................................... 26
Figura 7 Capa de Diccionario da lingua bunda, ou angolense explicada
na portugueza, e latina e, em 1805, Collecção de observações
grammaticaes sobre a lingua bunda, ou angolense ................... 26
Figura 8 Heli Chatelain ........................................................................ 28
Figura 9 Distribuição geográfica do kimbundo .............................. 31

8
RESUMO

Pretendemos com este estudo fazer uma descri-


ção das classes e seus prefixos, do alfabeto, do
tom e das várias ocorrências silábicas em
kimbundu tendo como base as gramáticas de Heli
Chatelain, Grammatica Elementar do Kimbundu, de
José Luiz Quintão, Gramática de Kimbundo, dos
Missionários do Vicariato Geral de Malange, Ele-
mentos da Gramática de Quimbundo e do padre Antó-
nio da Silva Maia, Gramática de Kimbundo,
apoiando-nos no Ensaio de Diccionario Kimbúndu-
Portuguez de J. D. Cordeiro da Matta.
Não deixaremos antes de fazer uma breve rese-
nha histórica tanto das línguas bantas como do
próprio kimbundu.
Procuramos ao longo do estudo mostrar as dis-
crepâncias existentes entre os autores. No final
apresentamos em anexo quadros comparativos
dos prefixos de concordância segundo os auto-
res e dois pequenos contos e alguns provérbios
da tradição oral do kimbundu.

PALAVRAS-CHAVE: bantu(a), kimbundu, classes, pre-


fixos.

9
10
As línguas bantas

Para o continente africano Greenberg propõe em


1963, na sua obra The Languages of Africa, uma classifi-
cação em quatro grandes famílias de línguas africanas:
Afro-Asiática, Nilo-Sahariana, Níger-Cordofânia e Khoi-
san. As três últimas famílias são faladas exclusivamente
em África, sendo que a primeira, a Afro-Asiática está
representada também no Médio-Oriente. Duas outras
famílias também podemos encontrar representadas em
África: a Indo-Europeia através do africânder e a
Austronésia pelas línguas de Madagáscar (v. fig. 1). A
família Niger-Cordofânia é composta por dois grandes
ramos — o Cordofânio e o Níger-Congo, incluindo este
último numerosos grupos para sul do Sahara — os Bantu.
A palavra «bantu» significa «pessoas» e é formada a par-
tir de *-ntu, o radical do bantu comum (e proto-bantu,
a proto-linguagem, o ponto de início das línguas bantas)
para «pessoa», temos muntu = pessoa e bantu = pessoas,
em que mu- é prefixo de singular e ba- prefixo de plural.
O termo bantu foi proposto por W. H. Bleek em 1860.

11
http://www.nationsonline.org/oneworld/african_languages.htm
Afro-Asiática
Nilo-Sahariana
Cordofânia
Níger-Cordofânia
Níger-Congo
Khoisan
Austronésia
Indo-Europeu

Figura 1
Famílias linguísticas existentes em África
e os dois sub-ramos da Níger-Cordofânia

O proto-bantu é a língua ancestral de 500-600 línguas


bantas na África sub-equatorial Oeste, Central, Este e
Sudeste. Há aproximadamente 6800 línguas faladas no
mundo, a banta ocupa aproximadamente 10%. Para a
maioria dos autores, o bantu era falado há 5000-4000
anos atrás, na fronteira da Nigéria com os Camarões (no

12
vale central Benue, a Leste da Nigéria) e os seus descen-
dentes espalharam-se por toda a África sub-equatorial (v.
fig. 2).

Andrade, 2007: 23
Figura 2
Origem e difusão das línguas bantas.
Proposta de Heine, Bloff e Vossen (1977)

É uma família de centenas de línguas cujo número de


falantes se aproxima dos 220 milhões. O país com maior
número de falantes é o Congo-Kinshasa e a língua banta
com mais locutores é o Suaíli. As línguas bantas formam
uma família no sentido em que partilham traços comuns,
sendo a distribuição por classes um dos mais marcantes.
O povo bantu pertence a este grupo linguístico, não
constituindo um grupo isolado mas sim uma união de

13
vários povos ao qual pertencem, segundo uma classifica-
ção feita pela semelhança da linguagem. Portanto não
devemos falar em língua banta e sim em línguas bantas,
ou civilizações bantas, porque inúmeras são as línguas e
as civilizações ou povos que estão enquadrados neste
grupo, tendo em comum o elo do parentesco da lingua-
gem que sugere, pela grande semelhança, um tronco
comum de origem, mas que apresentam no entanto
diversidades sociais, culturais e políticas, mudanças
essas ocorridas provavelmente ao longo do tempo. Esta
semelhança da linguagem faz supor evidentemente uma
língua (proto-bantu) e até mesmo um lugar comum de
origem desses povos, que acabou por dar, devido a cir-
cunstâncias históricas, os diversos grupos com a sua
cultura e língua diferentes (embora identifiquemos o
parentesco linguístico).
Desde o início do século xx os linguistas têm vindo a
classificar as línguas bantas. Em 1971, Guthrie apresen-
tou uma proposta (v. fig. 3) de classificação e codifica-
ção, baseada sobretudo em critérios geográficos e de
parentesco, que mais tarde é revista por Tervuren e SIL,
acrescentando-lhe a zona J. (v. fig. 4)

Zona A: Sul dos Camarões e Norte do Gabão


Zona B: Sul do Gabão e Oeste do Congo
Zona C: Noroeste, Norte e Centro do Congo
Zona D: Nordeste, Este da República Democrática do
Congo, Ruanda e Burundi
Zona E: Sul do Uganda, Sudoeste do Quénia e Noroeste
da Tanzânia

14
http://www.bantu-languages.com/zones.html
Figura 3
Classificação proposta por Guthrie

Zona F: Norte e Oeste da Tanzânia


Zona G: Centro e Este da Tanzânia e costa suaíli
Zona H: Sudoeste do Congo e Norte de Angola
Zona K: Este de Angola e Oeste da Zâmbia
Zona L: Sul da República Democrática do Congo e Oeste
e Centro da Zâmbia
Zona M: Este e Centro da Zâmbia, Sudoeste da Tanzânia
e Sudeste da República Democrática do Congo
Zona N: Malaui, Centro de Moçambique e Sudeste da
Zâmbia
Zona P: Sul da Tanzania e Norte de Moçambique
Zona R: Sudoeste de Angola e Noroeste da Namíbia
Zona S: Zimbabué, Sul de Moçambique e Este da África
do Sul.

15
Figura 4
Classificação das línguas bantas com a inclusão da zona J

16
A estrutura silábica das línguas bantas baseia-se em
CV, VCV, CVCV, VCVCV. Muitas línguas bantas têm em
posição inicial NC, podendo a N ser silábica ou não.
a) 

Ataque Rima

Núcleo

  

m b a
b)  

Ataque Rima Ataque Rima

Núcleo Núcleo

   

Ø m j i

A hipótese a) refere-se a mba.ka que em kimbundu


significa multidão e mostra a consoante /b/ pré-nasali-
zada com a respectiva nasal homorgânica, enquanto que
na hipótese b) observamos o prefixo da classe 3, (m-) do
suaíli, a formar uma nasal silábica na palavra m.ji (cidade).

17
A principal característica das línguas bantas é o uso
generalizado de prefixos. Cada substantivo pertence a
uma classe e cada língua pode ter um total de dezanove
classes. A classe a que corresponde é indicada pelo pre-
fixo do substantivo. Os adjectivos e os verbos concor-
dam com aquele, apresentando um prefixo concordante.
O plural é indicado pela mudança de prefixo.
Na página seguinte apresentamos a lista de classes
segundo Guthrie e a sua caracterização semântica.
Fazemos desde já notar que as classes 20-23 são
raras, sendo que a classe 20 na maior parte dos casos é
aumentativa, embora, possa ser diminutiva em algumas
línguas. A classe 21 designa aumentativo e pejorativo. A
classe 22 só se encontra em ganda, e é o plural da classe
20 e de alguns nomes da classe 5. A classe 23 é um
locativo. (Andrade, 2007: 31)

18
Classes e a sua caracterização semântica segundo Guthrie
CLASSE PREFIXO NÚMERO VALOR SEMÂNTICO

11 mu - Singular de 2
Seres humanos e objectos personificados.
12 ba- Plural de 1
13 mu- Singular de 4 Árvores e plantas; partes do corpo; alguns substantivos derivados; alguns emprés-
14 mi- Plural de 3 timos do árabe.
15 i- Singular de 6
Partes do corpo pares; frutos; alguns líquidos; coisas colectivas; noções abstractas.
16 ma- Plural de 5
17 ki- Singular de 8 Artefactos de utilidade geral; nomes de línguas; pessoas com defeitos físicos.
18 bi - Plural de 7

19
19 N- Singular de 10
Animais; grande quantidade de empréstimos do árabe, inglês, português, hindi, etc.
10 N- Plural de 9 e 11
11 du- Singular de 11 Objectos compridos e delgados.
12 ka- Singular de 13
Categoria para diminutivos.
13 tu- Plural de 12
14 bu- Nomes abstractos (qualidades).
15 ku- Substantivos verbais (infinitivos).
16 pa- Situacional
17 ku- Diferentes tipos de locativos. Direccional
18 mu- Interioridade
19 pi - Diminutivos.
20
As línguas bantas em Angola

As línguas bantas de Angola (v. fig. 5) pertencem às


zonas H, K e R tal como propostas em 1971 por Guthrie
e nelas podemos observar, como características gerais de
maior relevância, segundo Fernandes (2002: 68-69) o
seguinte:

• Os nomes são caracterizados por prefixos


que indicam o singular e o plural. O número
de classes, segundo estudos actuais sobre
algumas línguas de cada uma das três zonas
linguísticas, é de 18. No entanto, a classe 15
é verbo-nominal, reunindo nela, portanto,
nomes e verbos. As classes 16, 17 e 18 são
classes locativas e indicam a superfície,
direcção e a interioridade, respectivamente.
Nestas classes não existe a oposição singu-
lar, plural;
• os substantivos são classificados em função
dos seus prefixos do singular e do plural;

21
Figura 5
As línguas bantas em Angola

22
• a maior parte das línguas é tonal, isto é, para
além do acento, existe um determinado tom;
• não há diferença entre masculino e feminino;
• o sistema vocálico é simétrico, quer dizer
que este sistema comporta uma vogal central
(a) e um número idêntico (2) de vogais ante-
riores (i, e) e de vogais posteriores (u, o);
• algumas consoantes orais não aparecem de
forma isolada por serem sempre pré-nasa-
lizadas, quer dizer, precedidas de consoantes
nasais;
• não existem artigos.

23
24
Primeiras publicações em línguas bantas

No ano de 1624, a 4 de Março, a Cartilha da Doutrina


Cristã, do padre jesuíta Mateus Cardoso, acaba de ser
impressa e é este o livro que primeiro se editou numa
língua africana falada no hemisfério Sul. Estava escrito
em português e em quicongo. Anos mais tarde, em 1642,
na cidade de Lisboa, é impresso o primeiro catecismo em
kimbundu. Havia sido organizado pelo padre Francisco
Pacconio e tinha o título de Gentio de Angola sufficientemente
instruido nos mysterios da nossa santa fé.
Em 1659, o missionário capuchinho italiano, padre
Jacinto Brusciotto Vetralla, escreve uma gramática, com
vocabulário da língua quicongo, editada em Roma. No
frontispício da obra, em latim, pode ler-se Regulae
quaedam pro difficillimi congensium idiomatis faciliori captu ad
Grammaticae normam redactae.
Mais tarde, ainda no século XVII, em 1697, o padre
jesuíta Pedro Dias publica em português a primeira des-
crição gramatical da língua africana kimbundu Arte da
Lingua de Angola (fig. 6), «advertencias de como se ha de

25
Figura 6 Figura 7

ler, & escrever esta Lingua» afirma o jesuíta nas primei-


ras linhas da sua obra. O livro era dedicado à Virgem do
Rosário, «Mãy, e Senhora dos mesmos Pretos».
Em 1804, o monge capuchinho Bernardo Maria de
Cannecattim publica, em Lisboa, o Diccionario da lingua bun-
da, ou angolense explicada na portugueza, e latina e, em 1805,
Collecção de observações grammaticaes sobre a lingua bunda, ou
angolense (fig. 7) com uma segunda edição em 1859.
«No anno 1864 foi publicado um trabalho
grammatical por Francina, sob o titulo: ‘Elementos
grammaticaes da lingua bunda.’ Infelizmente este livro
abortou como os precedentes, não conseguindo fran-
quear ao publico o conhecimento d’esta lingua, [...]
nunca nos foi possivel obter ou mesmo ver um unico
exemplar.» (Chatelain, 1889: XVII-XVIII)

26
O kimbundu

A descrição pioneira de Pedro Dias para as classes


nominais do kimbundu é importante para a abordagem da
sintaxe da língua. «Tem doze particulas para adjectivar o
substantivo com os adjectivos. Oito saõ para o singular.
v. g. Ri, v, i, qui, ca, cu, lu, tu. Para o plural saõ as
seguintes: A, i, gi, tu.» (Dias, 1697: 2) [...] «Os linguas
peritos trocaõ hu)as particulas naõ mudaõ o sentido da
oraçaõ; porèm nunca ja mais poem as particulas do
plurar no singular, quando querem significar qualquer
cousa singular.» (Dias, 1697: 36)
A Cannecattim também não escapou a existência de
«letras, ou syllabas iniciaes» para o singular e o plural e
dá-nos conta disto mesmo na sua Collecção de observações
grammaticaes sobre a lingua bunda, ou angolense onde escre-
via:

«He notavel na lingua Bunda, que aquillo, que na


maior parte dos Idiomas se distingue pelas termina-
ções, ella o da a conhecer, não por estas, mas sim

27
pelas letras, ou syllabas iniciaes, como succede no
singular, e plural dos nomes, e nas differentes vozes,
e inflexões dos verbos.» (Cannecattim, 1804: XVIII)

Quanto à origem da língua e a sua relação com as


outras línguas africanas só, mais tarde, em 1888-1889,
através do suiço Heli Chatelain (Fig. 8), benemérito, filó-
logo e folclorista, podemos encontrar a palavra kim-
bundu definida correcta e historicamente como língua e
é então estabelecida a sua distinção em relação às lín-
guas quicongo e umbundo. Nessa gramática é também
feito um estudo empírico do folclore e são reunidas fá-
bulas africanas e poesia tradicional.

«Na litteratura portugueza e estrangeira esta lin-


gua era conhecida até hoje sob o nome de ‘lingua

Figura 8

28
bunda,’ ao passo que entre os brancos de Angola é
mais conhecida como ‘o ambundo’. Scientifica-
mente, porém, nem uma nem outra d’estas denomi-
nações é admissível: a primeira por ser quasi um
termo obsceno na lingua que pretende designar, a
segunda porque significa ‘os pretos’ e não a sua lin-
guagem, ambas por não serem usadas pelos indige-
nas que fallam a lingua em questão. ‘Kimbundu’
pelo contrario, é o termo vernaculo, dizendo os pre-
tos d’Angola, os a-mbumdu: o kimbundu, em kim-
bundu, fallar kimbundu, mas nunca: fallar ambundo
ou bundo ou bunda. Os vocábulos mu-mbundu, um
preto, ou uma preta, a-mbundu, pretos ou pretas e
ki-mbundu, linguagem de pretos constam como base
commum mbundu e dos prefixos mu-, a-, ki-, signi-
ficando mu- pessoa, a- pessoas e ki- linguagem. Concor-
da com isto com o que se nota nas linguas da familia
bantu, á qual peretence também o nosso kimbundu,
sendo o prefixo ki- o que mais s’emprega n’ellas para
designar linguagem. Algumas tribus pronunciam-o
txi- (tyi), xi-, si-, isi-, se-, outras preferem-lhe os
prefixos u- ou lu-, outras, mais raras, contentam-se
com a base sem acrescentamento de prefixo algum.
Assim, sem sahirmos da Provincia de Angola, os
Conguezes ou Exi-Kongo chamam á sua lingua
ki-xikongo, os habitantes do Bailundo e do Bihe, os
I-mbundu, á sua u-mbundu, ao passo que os Akua-
-Mbamba denominam o seu dialecto simplesmente
‘mbamba’. É pois nossa opinião que, se quizermos
fallar correctamente, devemos dizer ‘o kimbundu’,

29
‘o umbundu’, mas não ‘a língua ki-mbundu ou
u-mbundu’, porque ki- e u- já significam língua. Não
recommendamos tampouco o uso de ‘lingua
mbundu’ a não ser que se lhe junte: d’Angola ou de
Benguella (=Bangela) para obviar á confusão que,
de outra forma, seria inevitavel.» (Chatelain, 1889:
XI-XII)

O kimbundu pertence pois ao grande tronco das lín-


guas africanas designado por «bantu» e que, segundo
Raymond Gordon, é a língua mbundu cujos nomes alter-
nativos são: luanda, lunda, loande, loanda mbundu,
kimbundu, kimbundo, north mbundu, nbundu, n’bundo,
dongo, ndongo, kindongo cujos dialectos são: njinga
(ginga, jinga), mbamba (kimbamba, bambeiro), mbaka
(ambaquista), ngola. Pertence à família Níger-Congo,
Mbundu (H.20).
Segundo a SIL o kimbundu tem o seguinte tronco:

• Niger-kongo
• Atlântico-kongo
• Volta-kongo
• Benué-kongo
• Bantóide
• Bantóide meridional
• Bantu estreito
• Bantu central
• H
• Mbundo (H.20)

30
O grupo etnolinguístico Ambundu ocupa uma área
que se estende desde o interior para o litoral e domina
as províncias do Bengo, Kuanza Norte, Norte da provín-
cia do Kuanza Sul, Malanje e Luanda, tendo como lín-
guas vizinhas o kikongo, a Norte, o kioco, a Este, e, a
Sul, o umbundo e o ganguela. Na fig. 9 podemos ver a
distribuição geográfica do kimbundu e quais as provín-
cias de Angola onde se fala esta língua.

1 Bengo 5 Kuanza Sul


Cabinda 2 Kuanza Norte 6 Viye
3 Uíje 7 Lunda Norte
4 Malanje 8 Lunda Sul
3

1 2
Luanda 4
Malanje 7 Henrique de Carvalho
5 8
6
Elaborado pelo autor a partir de Fernandes, 2002: 57
Novo Redondo
Luso
Benguela
Nova Lisboa

Moçâmedes Vila Serpa Pinto

Ambo Haneca-Humbe Ganguela Kioco


Herero Kongo Ovimbundo
Xindonga Kimbundu NÃO BANTU
Khoisan

Figura 9

31
32
As classes no kimbundu

É no século XIX, com a publicação por parte de


Chatelain da Grammatica Elementar do Kimbundu, que as
classes do kimbundu são pela primeira vez anotadas.
Daí para a frente os autores abandonam a velha gramá-
tica descritiva onde nominativo está para sujeito,
acusativo para os complementos directos, ablativo para
indicações circunstanciais e dativo para os complemen-
tos indirectos e que havia inspirado as anteriores.
Os substantivos em kimbundu são divididos em
quinze classes. Reconhecemos a qual classe pertence
cada nome pelo seu prefixo, ou seja, a forma inicial da
palavra. Quanto ao género dos substantivos (masculino
e feminino), com exceção de poucos, os nomes em
kimbundu são usados indiferentemente para ambos os
géneros. As classes em kimbundu tal como em todas as
línguas bantas são monoclasses. Existem no entanto
excepções das quais apresentamos de seguida algumas:

Riala (homem) Muhatab (mulher)

33
Mulume (marido) Mukaji (esposa)
Tata (pai) Mama (mãe)
Rikolombolo (galo) Sanji (galinha)
Kisutu (bode) Hombo (cabra)

CLASSES I e II

Na classe I estão agrupadas todas as palavras com o


prefixo mu- no singular e que designem seres racionais
(pessoas). As palavras da classe I fazem o plural ao
mudar o prefixo mu- para a- e são da classe II.

SINGULAR PLURAL
Mona = filho, criança
1
Ana = filhos, crianças
Mudiakimi = velho sábio Adiakimi = velhos sábios
Muhatu = mulher Ahatu = mulheres
Mukongo = caçador Akongo = caçadores
Muloji = feiticeiro Aloji = feiticeiros
Musuri = ferreiro, forjador Asuri = ferreiros, forjadores
Mutabi = carreteiro d’água Atabi = carreteiros d’água
Mutambi = pescador de an- Atambi = pescadores de an-
zol zol
Mutona = pescador de rede Atona = pescadores de
redes

1
Mona que tem o prefixo mo- tem como radical ana, ao juntar-se-lhe
o prefixo mu-, o encontro da vogal u + a origina a vogal o.

34
CLASSES III e IV

As palavras da classe III têm mu- como prefixo singu-


lar. A esta classe pertencem os seres inanimados (irracio-
nais, objectos). O plural faz-se na classe IV, substituindo
o mu- por mi-.

SINGULAR PLURAL

Muenge = cana Mienge = canas


Mukete = cavalo Mikete = cavalos
Mukila = rabo, cauda Mikila = rabos, caudas
Mulela ou Mulele = pano Milela ou Milele = panos
Mulongi = conselho, exem- Milongi = conselhos, exem-
plo, parecer plos, pareceres
Mulundu = montanha Milundu = montanhas
Munia = espinho Minia = espinhos
Mutandala = queda Mitandala = quedas
Mutelendende = ribombo, Mitelendende = ribombos,
trovão trovões
Mutoto = barro, lodo, lama Mitoto = barros, lodos,
lamas
Mutue = cabeça Mitue = cabeças
Muvu = ano Mivu = anos
Muxima = coração Mixima = corações
Muxitu = bosque, mata, flo- Mixitu = bosques, matas, flo-
resta restas

35
CLASSES V e VI

Na classe V estão agrupados os nomes que começam


pelo prefixo ri- (muitas vezes escrito di-) no singular e
que fazem o plural na classe VI, substituindo o ri- por
ma-. Em alguns nomes o prefixo ri- não é substituído por
ma- ao formar o plural, mas é precedido por ele.
Ritari (pedra), pode ser escrito ditadi. Variedades di-
alectais fazem o ri- soar como di-1.

SINGULAR PLURAL
Riala = homem Mala = homens
2

Ribengu = rato Mabengu = ratos


Rilonga = prato Malonga = pratos
Rilu (Riulu) = céu Maulu = céus
Rimi = língua, idioma Marimi = línguas, idiomas
Ritari = pedra Matari = pedras
Riunda = flecha Mariunda = flechas

1
A este propósito Cannecattim anotava a existência do prefixo ri- e
não di-, considerando Riala e não Diala (Cannecattim, 1805: 8). Já antes
escrevia: «Os Ambundos confundem no principio da palavra a letra r com
a letra d, [...] umas vezes parece que pronunciam Riála, o homem; outra
Diála, porém a verdadeira pronunciação he Riála, mas não se deve
carregar muito a lingua sobre a letra r, ou a syllaba ri, como se faz no
Portuguez, a pronuncia deve ser mais branda, o que se deve observar em
todas as palavras que principião com a syllaba ri, como são todos os
nomes da quarta declinação na voz do singular.» [...] «Eu que varias vezes
examinei este particular, me tenho servido da mesma letra R porque
parece que a pronunciação se aproxima mais á letra R do que a D, se
bem que não seja hum R aberto e claro, mas hum R sumido e brando,
proferido com a ponta da lingua junta aos dentes no acto da pronun-
ciação.» (Cannecattim, 1805: 2 e 152) «Por seu lado Quintão (1934: 12)

36
CLASSES VII e VIII

Na classe VII estão agrupados os nomes que são ini-


ciados pelo prefixo ki- e fazem o plural na classe VIII,
substituindo ki- por i-.

SINGULAR PLURAL
Kiala = unha Iala = unhas
Kimbanda = curandeiro Imbanda = curandeiros
Kimbungo = lobo Imbungo = lobos
Kinama = perna Inama = pernas

Dentro desta classe estão agrupados todos os nomes


no aumentativo, porque o kimbundu forma o aumenta-
tivo através do prefixo ki-.
Seguem alguns exemplos da for mação dos
aumentativos.

PORTUGUÊS KIMBUNDU AUMENTATIVO


Boi Ngombe Kingombe
Mulher Muhatu Kihatu

escreve «r ou ri (nunca sem i) — equivale em Luanda a ri brando, com


aproximação a di; no interior sôa como di, com aproximação a ri brando.»
Na verdade estes dois sons que têm o mesmo ponto de articulação
[+ant] e [+cor] distinguem-se nos seus traços redundantes por o [R] ser
[+son] e [+cont] contrariamente ao [d].
Ao longo deste trabalho adoptámos a formulação /ri/.
2
Não se diz maala. Quando ocorrem duas vogais /a/ em simultâneo,
somente uma prevalece.

37
CLASSES IX e X

Na classe IX os nomes no singular não apresentam


prefixo de classe e o plural faz-se na classe X, colocando
o prefixo ji- antes do nome. Reconhecemos um nome
como pertencendo a esta classe por exclusão, ou seja,
quando não reconhecemos os prefixos das outras classes
na palavra do singular. Alguns nomes podem gerar con-
fusão como é o caso de Tulu (peito), Tuku (cauda; plu-
ma; pena), Tumba (naco), Tumbu (umbigo), Tunda (ser-
tão; Oriente) que pertencem a esta classe e podem ser
confundidos como pertencentes à classe XIII.

SINGULAR PLURAL
Fundu = feira, mercado, Jifundu = feiras, mercados,
praça praças
Imbia = panela Jimbia = panelas
Imbua = cão Jimbua = cães
Inzo = casa Jinzo = casas
Ixi = terra, naturalidade Jixi = terras, naturalidades
Mama = mãe Jimama = mães
Mvula = chuva, maré Jimvula = chuvas, marés
Ndandu = parente, primo, Jindandu = parentes, primos,
abraço abraços
Ndenge = pequeno, inferior, Jindenge = pequenos, infe-
criança riores, crianças
Ngangula = ferreiro Jingangula = ferreiros
Ngiji = rio, riacho, conhecido Jingiji = rios, riachos, conhe-
cidos
Ngombe = boi Jingombe = bois

38
Ngombo = umbigo, adivi- Jingombo = umbigos, adivi-
nho, fugitivo nhos, fugitivos
Nguzu = força, vigor Jinguzu = forças
Nhoka ou Nioka = cobra Jinhoka ou Jinioka = cobras
Nhoki ou Niiki = abelha Jinhoki ou Jiniiki = abelhas
Njila = caminho, pássaro Jinjila = caminhos, pássaros
Pambu = atalho, encruzi- Jipambu = atalhos, encruzi-
lhada, fronteira lhadas, fronteiras
Pange = irmão Jipange = irmãos
Poko = faca Jipoko = facas
Sanji = galinha Jisanji = galinhas
Tata = pai Jitata = pais

Obs.: Muitas palavras desta classe que começam por


/i/, quando escritas numa frase, observamos que o /i/
desaparece e é substituído por um apóstrofe.
Ex.: Inzo = ’nzo = casa; Imbua = ’mbua = cão; Ixi
= ’xi = terra, naturalidade.

39
CLASSE XI

Na classe XI estão incluídos os nomes cujo prefixo no


singular é lu- e que fazem o plural acrescentando ao
singular o prefixo da classe VI, ma-.

SINGULAR PLURAL
Lubambu = corrente Malubambu = correntes
Lukuaku = mão Malukuaku = mãos
Lumbu = muro Malumbu = muros
Lumuenu = espelho Malumuenu = espelhos

Obs.: O termo Malukuako é pouco usado, sendo mais


conhecido o termo Maku.
No interior ocorrem variantes em que muitos nomes
que começam pelo prefixo lu-, fazem o plural como os
substantivos da classe X. Estes nomes são os que deri-
vam de um nome colectivo e o prefixo lu- passa a indicar
um objecto único a partir deste nome.
Ex.: Ndemba = cabelo/Lundemba = cabelo (um)/
Jindemba = cabelos.

40
CLASSE XII

Na classe XII o prefixo do singular é ka- e no plural é


tu-. O diminutivo em kimbundu é feito colocando-se o
prefixo ka- a preceder o nome.
Ex.: Hoji = leão — Kahoji = leãozinho; Ritari =
pedra — Karitari = pedrinha.

Muitas vezes na formação do diminutivo o prefixo da


classe que vai diminuir desaparece.
Ex.: Muhatu = mulher/Kahatu = mulherzinha; Kima
= objecto, coisa/Kama = coisinha.

SINGULAR PLURAL
Kakuria = bocado de comida Tumakuria = bocados de
comida
Kamona = filhinho Tuana = filhinhos
Ka’nzo = casinha Tu’nzo = casinhas
Kauta = arma pequena Tumauta = armas pequenas

41
CLASSE XIII

A classe XIII tem no singular o prefixo tu- e faz o


plural acrescentando ao singular o prefixo da classe VI,
ma-. São raríssimos os nomes em kimbundu pertencen-
tes a esta classe (encontrámos quatro, sendo que dois
são empréstimos). Muitos nomes que começam por tu-
na realidade pertencem à classe IX, onde tu- não é pre-
fixo de classe, mas pertence ao radical da palavra Tulu
(peito), Tuku (cauda; pluma; pena), Tumba (fatacaz;
naco), Tumbu (umbigo), Tunda (sertão; Oriente).

SINGULAR PLURAL
Tubia = fogo, lume Matubia = fogos
Tuji = excremento Matuji = excrementos
Tujola = tesoura Matujola = tesouras
Tuxinha = toucinho Matuxinha = toucinhos

42
CLASSE XIV

Na classe XIV estão incluídos os nomes que começam


pelo prefixo u- no singular e fazem o plural acrescen-
tando ao singular o prefixo da classe VI, ma-.

SINGULAR PLURAL
Uanda = rede, tipóia Mauanda = redes, tipóias
Uanza = esperma Mauanza= espermas
Uenji = negócio Mauenji = negócios
Uhaxi = doença Mauhaxi = doenças
Uina = toca, buraco Mauina = tocas, buracos
Ulungu = canoa Maulungu = canoas
Usuku = noite, escuridão Mausuku = noites, escuridões
Uta = espingarda, arma Mauta = espingardas, armas
Utokua = cinza, cisco Mautokua = cinzas, ciscos

Muitas vezes o prefixo mau- pode ser encontrado


como mo-, ou ma-. Poderemos então ver escrito Mauta,
Mota ou Mata com o mesmo significado, espingardas;
Mausuku ou Mosuku = noites.
Na classe XIV estão incluídos os nomes abstractos e
também as profissões. Esses nomes derivam de nomes
concretos.
A respeito dos termos abstractos os Missionários do
Vicariato Geral de Malange escreviam «As línguas africa-
nas são muito pobres em termos abstractos.
Encontramos, todavia, um certo número de termos
abstractos, cuja característica é o prefixo u.
Ex.: umonha — a preguiça; ukumbu — a soberba;

43
unjinji — a avareza; ufusa — a ingratidão; unzambi —
a divindade; ungana — a realeza; undenge — a infân-
cia.» (1944: 12)

NOMES CONCRECTOS NOMES ABSTRACTOS


E PROFISSÕES E PROFISSÕES
Mukulu = velho, maior, ante- Ukulu = antiguidade
passado
Mutona = pescador Utona = profissão de pesca-
dor
Muzangala = rapaz, jovem Unzangala = juventude,
mocidade, rapaziada
Mvama = rico Umvama = riqueza
Ngamba = carregador Ungamba = profissão de
carregador
Ngana = senhor, senhora Ungana = senhoria
Nguma = inimigo, rival Unguma = inimizade, rivali-
dade
Nzambi = Deus Unzambi = divindade
Pange = irmão Upange = fraternidade
Rikamba = amigo, camarada Ukamba = amizade, camara-
dagem
Rikota = mais velho, superior Ukota = maioridade, supe-
rioridade

44
CLASSE XV

A classe XV engloba os nomes que têm no singular o


prefixo ku- e fazem o plural acrescentando ao singular o
prefixo da classe VI, ma-. Quase todos esses nomes são
infinitivos verbais que muitas vezes em kimbundu
podem também ter o sentido de substantivo. Assim, por
exemplo, Kuria pode significar tanto o verbo comer
quanto pode ter o significado de o comer, isto é, comida.

SINGULAR PLURAL
Kufua = morte Makufua = mortes
Kuinhi = dezena Makuinhi = dezenas
Kunua = bebida Makunua = bebidas
Kuria = comida Makuria = comidas
Kutunga = costura Makutunda = costuras

45
CLASSE PREFIXOS
SINGULAR PLURAL SINGULAR PLURAL

1 2 mu a
3 4 mu mi
5 6 di ma
7 8 ki i
14 6 (+ 14) u ma+u
11 6 (+ 11) lu ma+lu
13 6 (+ 13) tu ma+tu
15 6 (+ 15) ku ma+ku
9 10 Ø–i ji
12 13 ka tu

Ao quadro apresentado e retirado de Angola: Povos e


Línguas (Fernandes, 2002: 72) os autores apresentam mais
três classes — as locativas —, sendo a 16, a 17, e a 18,
bhu, ku e mu, respectivamente.
As gramáticas de kimbundu existentes até à data
consideram dez classes, cada uma delas com singular e
plural. Esta não compreensão das classes em que se
dividem as línguas bantas originalmente e a falta de estu-
dos globais acerca destas levou os gramáticos da época
a apresentar vários erros que podemos facilmente cons-
tatar.
Chatelain e Quintão estão de acordo no fundamen-
tal, sendo a gramática de Quintão, no essencial, igual à
de Chatelain. Logo na primeira página do Prólogo,
Quintão escreve «Confesso que nesta tarefa, fui muito
auxiliado pela gramática de Heli Chatelain e pelo dicio-
nário de J. D. Cordeiro da Matta; ambos estes livros,

46
especialmente o primeiro, tive de, frequentemente, con-
sultar e compulsar para uma coordenação mais ade-
quada e atingir o fim a que me propuz.» (1934: 1) Na
verdade as divergências de Quintão com Chatelain
resumem-se ao uso dos prefixos ri- ou di- na classe IV
e ao prefixo i- na classe IX. Entre os Missionários e
Chatelain não há qualquer divergência, entre o padre
Maia e os restantes autores os contrastes são maiores.

CLASSE CHATELAIN QUINTÃO MISSIONÁRIOS MAIA

11.a
mu – a mu – a mu – a mu/u – ma/a
12.a mu – mi mu – mi mu – mi mu/u – i
13.a ki – i ki – i ki – i ki/e – î
14.a ri – ma di – ma ri – ma o/i/e – ma
15.a u – mau u – mau u – mau u – mau
16.a lu – malu lu – malu lu – malu m/n/o – o la 1
17.a tu – matu tu – matu tu – matu lu – malu
18.a ku – maku ku – maku ku – maku ku – maku
19.a Ø – ji i; Ø – ji Ø – ji ka – aka/maka
10.a ka – tu ka – tu ka – tu ka – u

1
Hoje há uma grande tendência para mudar o prefixo do plural o la (6.a classe)
em a; ex.: angombe, os bois — por o langombe. (Maia, 1957: 14)

Nas páginas seguintes apresentamos um quadro com-


parativo das quatro gramáticas estudadas, relativo aos
prefixos de cada uma delas e à divisão em classes.

47
MISSIONÁRIOS
PADRE ANTÓNIO
HELI CHATELAIN JOSÉ LUIZ QUINTÃO DO VICARIATO GERAL
DA SILVA MAIA
1888-1889 1934 DE MALANGE
1957
1943
À primeira classe (I ) pertencem A esta classe pertencem os O prefixo do singular Pertencem à Primeira Classe
todos os nomes de entes racionaes nomes de entes racionais da 1.a classe é mu- e o do os substantivos, que ordinà-
(pessoas), que começam no (pessoas) cujos prefixos do plural é a-. riamente designam pessoas.
sing. por mu-. Ex.: mubika. singular e plural são: mu-; a-, Para a formação do plu- Singular mu-/u-, plural ma-/
Estes formam o seu plural, ex.: mutu; atu, pessoa; ral basta substituir o a-. (p. 13)
mudando o pref. mu- em a-. mubika, abika, escravo. prefixo do singular pelo

I
Ex.: mutu, pessoa, pl. atu pessoas. Mona, filho, pertence à 1. a do plural.
Excepções aparentes: mona per- classe, pois é contração de Pertencem à l. a classe,

48
tence á cl. I por ser contrac- muana (u+a=o), e faz no pl. ordinàriamente, os subs-
ção de muana (u+a=o), e faz ana, contração de aana tantivos que designam

CLASSE
plur. ana contracção de aana (a+a=a), Muiii, ladrão, tem o pessoas.
(a+a=a). pl. eii, contração de aiii Quando se encontra um
Muiii, ladrão, tem o pl. eii por (a+i=e). (p. 14) nome que principia por
contracção de aiii (a+i=e). (p. 1) mu e que designa um
ente racional sabe-se
logo que pertence à
l.a classe. (p. 10)
MISSIONÁRIOS
PADRE ANTÓNIO
HELI CHATELAIN JOSÉ LUIZ QUINTÃO DO VICARIATO GERAL
DA SILVA MAIA
1888-1889 1934 DE MALANGE
1957
1943
À cl. II pertencem os nomes A esta cl. pertencem os O prefixo do singular Pertencem à Segunda Classe
de entes inanimados (coisas) que nomes de entes inanimados da 2.a classe e mu-, como os nomes que geralmente
têem no sing. o pref. mu-. (coisas), cujos prefixos do na l.a classe, mas o pre- designam coisas.
Excepç.: mundele, o branco pl. sing. e pl. são: mu-; mi-. fixo do plural é mi-. Singular mu-/u-, plural î-.

II
mindele. Esta cl. abrange quási todos Para a formação do plu- (p. 13)
Esta cl. abrange quasi todos os os nomes de árvores e plantas. ral basta substituir o
nomes de arvores e plantas (vida (p. 15) prefixo do singular pelo
vegetativa). do plural.

49
CLASSE
Forma o seu pl., mudando o Pertencem, geralmente,
pref. sing. mu- em mi-. a esta classe os nomes
Ex.: mukanda pl. mikanda. (p. designativos de coisas.
2) (p. 10)
MISSIONÁRIOS
PADRE ANTÓNIO
HELI CHATELAIN JOSÉ LUIZ QUINTÃO DO VICARIATO GERAL
DA SILVA MAIA
1888-1889 1934 DE MALANGE
1957
1943
À cl. III pertencem os nomes A esta cl. pertencem todos os O prefixo do singular Singular ki-/e-, plural î-.
que no sing. têem o pref. ki- nomes, cujos prefixos do da 3.a classe é ki- e do (p. 13)
. Forma o seu pl., mudando sing. e pl. são: ki-; i-. plural é i-.
o pref. sing. ki- em i-. Abrange todos os aumentati- Para a formação do plu-
Abrange todos os augmentati- vos, ex.: kihatu = mulherona ral basta substituir o
vos. Ex.: kihatu = mulherona (de muhatu, mulher). prefixo do singular pelo

III
(de muhatu, mulher). Para a for- As regras para a formação do plural.
mação do pl. d’estes veja-se dos aumentativos, são as Pertencem a esta classe

50
no N.o 17* a formação analoga mesmas que para a formação os substantivos que
do pl. dos diminutivos, cujas dos diminutivos na X cl. Anti- principiam por ki- e
regras são tambem applicaveis gamente era a cl. dos objec- todos os aumentativos.

CLASSE
aos augmentativos. tos inanimados; hoje con- (p. 10)
Antigamente era a cl. dos tém também pessoas e
objectos inanimados; hoje animais. (p. 15)
inclue tambem pessoas e
animaes. (p. 3)

* Ver o que está escrito a pro-


pósito da classe 10.
MISSIONÁRIOS
PADRE ANTÓNIO
HELI CHATELAIN JOSÉ LUIZ QUINTÃO DO VICARIATO GERAL
DA SILVA MAIA
1888-1889 1934 DE MALANGE
1957
1943

À cl. IV pertencem os nomes A esta cl. pertencem todos O prefixo do singular Singular o-/i-/e-, plural ma-
que têem no sing. o pref. ri- os nomes, cujos prefixos do da 4.a classe é ri- e o do . (p. 13)
. No plur. o pref. ma- toma o sing. e pl. são: di-; ma-. plural é ma-.

IV
logar do pref. sing. ri-. Quando o pref. sing. desta Para a formação, do plu-
Ex.: ritari pl. matari. cl. aparece noutra parte da ral basta substituir o
Quando o pref. d’esta cl. oração, concordando com o prefixo do singular pelo
apparece n’outra parte da ora- nome, êste deixa muitas do plural.

CLASSE
ção que concorda com o vezes de levar o seu pref. (p. Pertencem a esta classe

51
nome, este muitas vezes care- 15) os nomes que, no singu-
ce do seu prefixo. (p. 4) lar, começam por ri-.
(p. 10)
MISSIONÁRIOS
PADRE ANTÓNIO
HELI CHATELAIN JOSÉ LUIZ QUINTÃO DO VICARIATO GERAL
DA SILVA MAIA
1888-1889 1934 DE MALANGE
1957
1943
A cl. V tem por pref. sing. u-, A esta cl. pertencem todos os O prefixo do singular Singular u-, plural mau-.
e por pref. pl. mau-. nomes, cujos prefixos do da 5.a classe é u- e o do (p. 13)
Ex.: uta pl. mauta. sing. e pl. são: u-; mau-. plural é mau-.
O pref. u- serve pra a forma- Nesta cl. e nas VI, VII e VIII, o Para a formação do plu-
ção de nomes abstractos, que pref. do pl. ma-, antepõe-se ao ral basta substituir o
significam a qualidade caracteris- do sing., ficando: mau-, malu-, prefixo do singular pelo
tica ou o officio do ente repre- matu-, maku-, no pl. O pref. do plural.
sentado pelo nome concreto mau- pode contrair-se em mo-, Pertencem a esta classe

52
de que o abstracto se deriva. ex.: mölungu = maulungu os nomes que, no singu-
Ex.: haxi, o doente, uhaxi, doença, (a+u=o). Também se diz mata lar, principiam por u-, e
Nzambi, Deus, unzambi, divin- ou möta em lugar de mauta. todos os nomes abstrac-

CLASSE V
dade. (p. 5) O pref. u, serve para a for- tos. (p. 11)
mação de nomes abstratos,
sevindo-lhes de base outros
nomes, ex.: haxi, o doente;
uhaxi, doença; Nzambi, Deus,
unzambi, divindade; ndandu,
parente, undandu, parentesco.
(p. 16)
MISSIONÁRIOS
PADRE ANTÓNIO
HELI CHATELAIN JOSÉ LUIZ QUINTÃO DO VICARIATO GERAL
DA SILVA MAIA
1888-1889 1934 DE MALANGE
1957
1943

A cl. VI tem no sing. o pref. A esta cl. pertencem todos O prefixo do singular Singular m-/n-/o-, plural o
lu-, que no pl. se muda em os nomes, cujos prefixos do da 6.a classe é lu- e o do la-. (p. 13)
malu-. Ex.: lumbu pl. sing. e pl. são: lu-; malu-. plural malu-.
malumbu. No Sertão, muitos nomes Para a formação do plu-
No sertão muitos nomes que que começam por lu-, não ral basta substituir o

VI
começam por lu- não for- formam o pl. como esta cl., prefixo do singular pelo
mam o pl. como esta cl., mas mas sim como a cl. IX; são os do plural.
sim como a cl. IX: são os que que se derivam de um nome Pertencem a esta classe

53
se derivam de um nome colectivo e indicam um os nomes que, no singu-

CLASSE
collectivo e indicam um objecto único, separado da lar, principiam por lu-.
objecto unico, destacado da colectividade, ex.: lundemba = São muito poucos os
collectividade. Ex.: lundemba um cabelo, pl. jindemba; substantivos que perten-
= um cabello, pl. jindemba. lünguba, um amendoim, pl. cem a esta classe. (p. 11)
(p. 5) jinguba; lumbozo, uma batata,
pl. jimbozo. (p. 16)
MISSIONÁRIOS
PADRE ANTÓNIO
HELI CHATELAIN JOSÉ LUIZ QUINTÃO DO VICARIATO GERAL
DA SILVA MAIA
1888-1889 1934 DE MALANGE
1957
1943
A cl. VII tem no sing. o pref. — O prefixo do singular Singular lu-, plural malu-.
tu-, e no pl. matu-. São da 7.a classe é tu- e o do (p. 13)
rarissimos os nome d’esta plural é matu.
classe. Para a formação do plu-
Em muitos nomes que ral basta substituir o
começam por tu-, esta syllaba prefixo do singular pelo
faz parte do radical, e estes do plural.

VII
nomes pertencem à cl. IX. Ex.: Pertence a esta classe

54
tulu, peito, pl. jitulu. (p. 6) um ou outro nome que,
no singular principia
por tu-.

CLASSE
A esta classe devem per-
tencer apenas umas três
palavras. As palavras
tuku, cauda; tulu, peito;
tumba, naco; tumbu,
umbigo pertencem à 9.a
classe. (p. 11)
MISSIONÁRIOS
PADRE ANTÓNIO
HELI CHATELAIN JOSÉ LUIZ QUINTÃO DO VICARIATO GERAL
DA SILVA MAIA
1888-1889 1934 DE MALANGE
1957
1943
A cl. VIII tem no sing. o pref. A esta cl. pertencem todos O prefixo do singular é Pertencem à Oitava Classe os
ku- e no pl. maku-. Quasi os nomes, cujos prefixos do ku- e o do plural é nomes geralmente verbais.
todos os nomes d’esta cl. são sing. e pl. são: ku-; maku-. maku-. Singular ku-, plural maku-.
infinitivos, nomes verbaes. Só Todos os nomes desta cl. Para a formação do plu- (pp. 13-14)
admittem o plur., quando o são infinitivos, (substantivos ral basta substituir o

VIII
uso lhes dá uma significação verbais. Só admitem o plur., prefixo do singular pelo
concreta. quando o uso lhes dá uma do plural.
As cl. IV, V, VI, VII, VIII, têem o significação concreta. (pp. Pertencem a esta classe

55
mesmo pref. pl. ma-; porém 16-17) os nomes verbais. (p. 11)

CLASSE
na cl. IV este pref. pl. substitue
o pref. sing., enquanto que
nas cl. V, VI, VII, VIII lhe fica
anteposto. (p. 6)
MISSIONÁRIOS
PADRE ANTÓNIO
HELI CHATELAIN JOSÉ LUIZ QUINTÃO DO VICARIATO GERAL
DA SILVA MAIA
1888-1889 1934 DE MALANGE
1957
1943

A cl. IX carece de prefixo no Esta cl. carece de prefixo de O prefixo do plural da Singular ka-, plural aka-.
sing., e forma o plur., ante- sing.; ou se o tem, deve estar 9.a classe é ji-. O prefixo (p. 13)
pondo ji- no sing. Ex.: hoji representado nas nasais n ou do singular não existe.
pl. jihoji. m. A letra i, inicial de alguns Para a formação do plu-
Reconhecem-se os nomes nomes é eufónica e prefixa- ral basta acrescentar o
d’esta cl. pela ausencia de qual- se aos nomes, que doutra prefixo do plural ao
quer dos pref. das outras classes. forma, seriam monossílabos, nome.

IX
Os nomes da cl. IX podem ter ex.: inzo, inji, ingo, imbua. Êste Pertencem a esta classe

56
por inicial qualquer das letras i, cai igualmente quando o os nomes que princi-
seguintes: h-, p-, j-, x-, s-, f-, n-, nome é precedido de vogal, piam por m- ou n- e um
a-, e-, i-, o-, m-. (Exc.: sing. como, o’nzo. ou outro que começa

CLASSE
mu- e pl. mi-), t- (Exc.: sing. Reconhecem-se os nomes por tu-, bem como os
tu- cl. VII e pl. tu- cl. X), k- desta cl. pela ausência de nomes de origem
(Exc.: ki-, ka-, ku-), l- (Exc.: lu-). qualquer dos pref. das outras estrangeira.
Pode haver alguma duvida só cl. Nota: Os substantivos
quando um nome começa Antigamente era esta, a classe com o prefixo próprio
por tu-, ku-, lu-. N’esse caso dos animais, hoje contém desta classe podem ficar
basta perguntar a um indi- também para pessoas e coi- sempre no singular,
gena o pl. do nome. sas. quando tiverem alguma
Todos os que têem ji- no pl. Quási todas as palavras palavra com que con-
pertencem á cl. IX. estrangeiras, sem embargo cordem, excepto se fôr
Antigamente era esta a cl. dos da sua formação inicial, for- um pronome. Ex.:
animaes; hoje usa-se tambem mam o pl. como esta cl., ex. ngombe jiiari, dois bois;
para pessoas e coisas. kabalu, cavalo, pl. jikabalu. jingombe j’ami, os meus
Quasi todas as palavras estran- Quando um nome tem por bois. (pp. 11-12)

(cont.)
geiras, sem embargo da sua i- ilide-se êste i- no pl., ex.
forma inicial, formam o pl. inzo, pl. jinzo (i+i=i).
como esta cl. Ex.: kabalu, No pl. os nomes desta cl.
cavallo pl. jikabalu. podem omitir o prefixo ji,
Quando um nome tem por quando são seguidos de ja

C L A S S E IX
letra inicial um i- elide-se (genitivo), ex.: ndandu ja

57
este i- no pl. Ex.: inzo, casa, mundele = jindandu ja mundele.
pl. jinzo (i+i=i). (p. 7) (p. 17)
MISSIONÁRIOS
PADRE ANTÓNIO
HELI CHATELAIN JOSÉ LUIZ QUINTÃO DO VICARIATO GERAL
DA SILVA MAIA
1888-1889 1934 DE MALANGE
1957
1943

A cl. X tem no sing. o pref. A esta cl. pertencem todos O prefixo do singular Pertencem à Décima Classe
ka- e no pl. o pref. tu-. os nomes, cujos prefixos do da 10.a classe é ka- e o especialmente os diminuti-
Compehende esta cl. todos sing. e pl. são: ka-; tu-. do plural é ti-. vos.
os nomes diminutivos. Estes for- Compreende todos os dimi- Para a formação do plu- Singular ka-, plural u-. (pp.
mam-se, prefixando ka- ao nutivos e formam-se, ral basta substituir o 13-14)
nome que se quer diminuir. perfixando ka ao nome que prefixo do singular pelo
A formação do pl. dos dimi- se quer diminuir (no sing.). do plural.

X
nutivos apresenta alguma A formação do pl. dos dimi- Pertencem a esta classe,

58
difficuldade, porque deixa nutivos, apresenta alguma sobretudo, os diminuti-
subsistir em muitos casos o dificuldade, porque em mui- vos. Os nomes que
pref. plur. da classe do nome tos casos, o pref. plur. da principiam por ka- são

CLASSE
diminuido, como se vê nos classe do nome diminuido, muito poucos. (p. 12)
exemplos. Note-se: 1) que na subsiste, como se vê nos
cl. IX sempre se omitte o seu pref. exemplos.
pl., 2) que nas cl. I e III o seu Note-se que na cl. IX, sempre
pref. sing. e pl. se elimina se omite o seu pref. pl., e
algumas vezes ao passo que nas que nas cl. I e III, o seu pref.
outras cl. sempre se conserva. sing. e pl. se ilimina algumas
Cada vez porém, que o pref. vezes, ao passo que nas
da classe desapparece na for- outras classes sempre se
mação do diminutivo sing. conserva.
tambem não apparece no pl. Quando o prefixo da cl.

(cont.)
Ex.: kahatu pl. tuhatu (de desapparece, na formação
kamuhatu). Kaulungu pode do diminutivo sing. também
contrahir-se em kolungu não aparece no pl., ex.: kahatu
(a+u=o). pl. tuhatu (de kamuhatu).
Kaulungu pode contrahir-se

CLASSE X
em kolungu (a+u=o).

59
Nota: As descrições apresentadas nas pp. 48-59 estão grafadas conforme as edições consultadas.
CHATELAIN, Heli (1889). Grammatica Elementar do Kimbundu, 2.a ed., 1964, New Jersey: The Gregg Press Incorporated.
QUINTÃO, José Luiz (1934). Gramática de Kimbundo, Lisboa: Descobrimento.
MISSIONÁRIOS DO VICARIATO GERAL DE MALANGE (1944). Elementos da Gramática de Quimbundo, Malange.
MAIA, padre António da Silva (1957). Gramática de Kimbundo, 2.a ed., 1964, Cucujães.
60
O alfabeto

Segundo os vários autores o alfabeto do kimbundu é


constituído pelas vogais /a/, /e/, /i/, /o/, /u/ e pelas
consoantes /b/, /d/, /f/, /g/, /h/, /j/, /k/, /l/,
/m/, /n/, /p/, /r/, /s/, /t/, /v/, /x/ e /z/. Note-se
que /c/, /q/, /w/, /y/ não existem.
Quanto à pronúncia Chatelain (1889: XXII) escreve:

«Vogaes: a, e, i, o, u, como em portuguez (valor


alphabetico).
Obs.: 1) Na pronuncia rapida e ante vogal = i v. g.
pange ami = pangiami.
2) i e u ante vogal = semi-vogaes v. g. iiii, uiua. Cf.
portuguez: aia, agua. As excepções são marcadas
com accento agudo v. g. kizúa, ngejía.
3) au, ai, eu, ou: Sendo finaes teem o acento tonico
na 1.a vogal v. g. rikau, pron. rikáu; sai, pr. sái;
sendo seguidos de consoante teem o accento na
ultima vogal v. g. sai-ku, pron. saí-ku; kubauka, pr.
kubaúka.

61
Consoantes: b, d. f, j, k, l, m, n, p, t, v, z, como em
portuguez.
Obs.: m e n não nazalizam a vogal antecedente, mas
sim a consoante immediata. Ambos representam o nasal:
m ante as labiaes b, v, no sertão tambem ante p e f
(mb, mv, mp, mf).
n ante as dentaes brandas d, z, j, e a guttural branda
g (nd, nz, nj, ng).
g é sempre duro e nasal = ng; nge e ngi = ngue e ngui
em portuguez.
h é sempre aspirado, nunca mudo.
r ou ri (nunca sem i) equivale em Loanda a ri bran-
do, com approximação a di, no interior sôa como
di, com approximação a ri brando.
s é sempre = ç, nunca = z.
x é sempre = x e ch em xaque, cheque.

Syllabização: 1) Todas as syllabas devem acabar em


vogal.
2) m e n precedendo consoante sempre se devem
escrever e pronunciar juntamente com a consoante
v. g. ambula = a-mbu-la imvo = i-mvo, ndongo =
ndo-ngo, ngenji = nge-nji.
3) au, ai, eu, ou finaes contam por duas syllabas (a-
u, a-i, e-u, o-u), mas na pronuncia rapida sôam
como diphtongos.»

Ainda relativamente às vogais escrevem os Missioná-


rios do Vicariato Geral de Malange (1944: 4) que o /e/
«pode ter dois sons: aberto como o e de fé; fechado,

62
como o e de medo, quando seguidos das consoantes n ou
m, contanto que não sejam puras. Ex.: — menha água;
henda amor.»
No que diz respeito às consoantes /m/ e /n/ cabe
acrescentar que são nasais homorgânicas que se arti-
culam no início da sílaba com outras consoantes. Aque-
las não possuem o valor real de consoante, mas servem
como sinais gráficos (como se fossem um til), e represen-
tam o som nasal, isto é, as consoantes que são por elas
precedidas têm o som nasalado e são proferidas numa só
emissão de voz. O /m/ ante as labiais /b/ e /v/ «no
sertão tambem ante p e f» Chatelain (1889: XXIII )
(Mbengu [mÉbeNÉgu], Imvo [imÉvo]) e o /n/ antes de
/d/, /g/, /j/ ou /z/ (Ndombe [nÉdomÉbe], Nganga
[NÉgaNÉga], Njibiri [nÉZibiri], Nzumbi [nÉzumÉbi].
Constata-se também a existência de variedades dia-
lectais em que as consoantes são trocadas — /r/ por /
d/ (kitari ou kitadi — dinheiro).
Na sua gramática, Chatelain (1889: XXIII) deixa claro
que a sílaba tónica recai como regra geral na penúltima
sílaba, sendo esta sílaba, portanto, a que tem maior força
na pronúncia. Alguns autores, como é o caso de Cor-
deiro da Matta, destacam a sílaba tónica com o uso do
acento gráfico, sendo que Chatelain dispensa o uso do
mesmo; uma vez que considera que já está implícito que
esta sílaba é a que tem maior intensidade na pronúncia.
Para Chatelain e outros autores, os acentos servem
somente para as excepções à regra geral.
Segundo Mingas (2000: 36) «o quimbundo tem cinco
vogais (duas anteriores, duas posteriores e uma central),

63
com quatro graus de abertura. Esta língua não apresenta
nenhuma vogal nasal. Interessa, entretanto, sublinhar
que as vogais que seguem uma consoante pré-nasal rea-
lizam-se nasalizadas, quando pronunciadas por locutores
da variante.
As consoantes comportam sete séries, nomeada-
mente: labial, dental, pré-palatal, palatal, apical, velar e
glotal.»
A mesma autora apresenta-nos para as vogais (Min-
gas, 2000: 36):
ANTERIOR CENTRAL POSTERIOR

1. o
grau [i] [u]
2.o grau [e] [o]
3.o grau [E] [ç]
4.o grau [a]

Para as consoantes (Mingas, 2000: 38):


LABIODENTAL

PRÉ-PALATAL
BILABIAL

PALATAL

GLOTAL
APICAL

VELAR

Orais Fortes (surdas) [p] [f] [t] [s] [S] [k] [h]
Fracas (sonoras) [b/B] [v] [d] [z] [Z]

Nasais Fortes (nasais) [m] [n] [¯]


Fracas (pré-nasais) [mb] [Mv] [nd] [nz] [nZ] [¯g]
Contínuas [l] [y] [w]

64
A constituição silábica do kimbundu

O kimbundu segue a regra de constituição silábica


mais comum à maioria das línguas do mundo, CVCV.
Apresentamos de seguida as várias ocorrências e a
sua descrição no esqueleto.
V imbanda = i.mba.nda (curandeiros)
CV mutue = mu.tue (cabeça)
CGV munia = mu.nia (cachorrinho)
NCV mbulu = mbu.lu (fim)
NCGV imbia = i.mbia (casa)

65
a) observamos sílabas de Ataque vazio como em
i.mba.nda;

Ataque Rima

Núcleo

 

Ø i

b) observamos sílabas de Ataque não ramificado sim-


ples como em mu.tue;

Ataque Rima

Núcleo

 

m u

66
c) observamos sílabas de Ataque ramificado como
em mbu.lu

Ataque Rima

Núcleo

  

m b u

d) observamos sílabas de núcleo ramificado como em


mu.nia

Ataque Rima

Núcleo

  

n i a

67
O kimbundu apresenta três tipos de Ataque: ramifica-
do quando domina duas posições do esqueleto que cor-
respondem a duas concoantes; não ramificado simples
quando domina uma posição no esqueleto que corres-
ponde a uma consoante ou nenhuma (vazio):
simples
não ramificado
vazio
Ataque

ramificado

Em kimbundu a Rima é sempre não ramificada


podendo ter um núcleo ramificado ou não:

não ramificado
(Vogal)
Rima não ramificada = Núcleo
ramificado
(Vogal e Glide)

Em kimbundu as sílabas acabam em vogal não exis-


tindo sílabas de rima ramificada (ver exemplos acima);
As ocorrências /au/, /ai/, /eu/, /ou/ em final de
palavra equivalem a duas sílabas, embora numa veloci-
dade de elocução elevada possam parecer ditongos, por
ex.: [Rikáw] no lugar de [Rikáu] sendo <ri.ka.u>; passa-
se o mesmo que em latim vulgar em que a passagem do
ritmo tonal ao intensivo motiva o desaparecimento da
qualidade da vogal com traço fónico diferente.

68
O tom

Algumas línguas bantas, entre elas o kimbundu,


fazem-se valer da intensidade com um valor fonético
que recai preferencialmente sobre a penúltima sílaba da
palavra.
O facto de o kimbundu ter sido estudado principal-
mente por missionários e funcionários administrativos preo-
cupados com objectivos imediatos e em acomodar os tons
escutados à sua estrutura linguística, de lembrar que o
português não é uma língua tonal, leva a que as gramáticas
e dicionários da época, por si só, não nos ofereçam meios
para uma marcação dos tons na escrita. Em 1891, no seu
trabalho As Linguas de Angola, Ladislau Batalha (professor)
tinha como objectivo «o de mostrar e conseguir que se
comprehenda a organisação e meios de que se serve a lin-
guagem agglutinativa para verter os pensamentos e as idéias
em phrases sonoras, cadenciadas e harmonicas.» (Batalha,
1891: 8) As «phrases sonoras, cadenciadas e harmonicas»
haviam sido vertidas para a escrita com os sons que quem
os registava podia reproduzir com o seu código de escrita.

69
Mesmo hoje uma pesquisa in loco seria dificultada pela
assimilação de outras línguas, o português e vizinhas,
por parte dos falantes. A língua portuguesa, à época das
descrições existentes do kimbundu, devia ser «falada
correctamente por quem desejar candidatar-se à cidada-
nia portuguêsa», assim estava escrito nos Estatutos dos
Indígenas da Guiné, Angola e Moçambique.
«A forma mais usual de indicar os tons mais comuns
consiste em sobrepor à vogal os símbolos: ´ (tom alto),
` (tom baixo), ‡ (tom ascendente) e fl (tom descendente).
Na grande maioria das línguas tonais são os núcleos silá-
bicos as unidades portadoras de tom.» (Andrade, 2007:
93)
Em Quintão os acentos «Servem para indicar as excep-
ções à regra geral e para distinguir um vocábulo de outro
seu parónimo. [...] na penúltima: entoação particular de
parónimo.» (Quintão, 1934: 13) Para Maia «As sílabas (sons
pronunciados com uma só emissão de voz) das palavras do
Quimbundo são pronunciadas todas com tal clareza que à
primeira vista parece nenhuma estar acentuada.
Há, porém, sílabas acentuadas dentro das palavras —
o que só se aprende a fazer e a distinguir com o uso e
a prática da Língua.» (Maia, 1964: 6)
As línguas tonais valem-se da duração, ou seja, da
oposição entre vogais longas e vogais breves. Normal-
mente as vogais longas ocorrem de uma elisão. Se os
tons são iguais, permanecem e inversamente combinam-
se em ascendente-descendente, descendente-ascendente,
etc. Certos pares de palavras, caso dos parónimos, só se
distinguem pelos tons: ex.: kubanga (fazer), e kubánga

70
(pelejar); hama (cama) e háma (cem); kuloua (enfeitiçar)
e kulóua (pescar); njila (caminho) e njíla (pássaro), etc.
o que mostra que fonemas aparentemente iguais, mas
diferentes em tons são também eles diferentes nos seus
significados independentemente do contexto em que se
encontram.
O acento agudo com que está marcada a sílaba tónica
«não é tonico, não existe na pronuncia de uma lettra
particular, mas na entoação de toda a palavra. [...] de
modo que a antepenultima e a ultima ou esta só soam
mais claras e que na emissão da ultima a expiração vogal
fica como que suspendida.» (Chatelain, 1899: 153)

71
72
Comentário

Ao longo da História o continente africano foi sendo


usado pela Europa como depósito de degredados e
armazém de escravos. O kimbundu, língua em que a
palavra cadeia não existia, necessitou de um emprés-
timo do português para a incorporar. Por exemplo, a
conhecida canção do movimento de libertação MPLA:
«Doutor Netoé mu caleia, ngongoé» (O Doutor Neto
está na cadeia, que sofrimento). Sabemos também que
o árabe, o francês, o inglês, o português e o africânder
ao longo de vários séculos deixaram uma quantidade
considerável do seu vocabulário em muitas línguas afri-
canas.
O kimbundu, à semelhança das outras línguas bantas,
não tem tradição escrita. Os primeiros a escrevê-la e a
estudar-lhe as regras gramaticais foram os missionários
capuchinhos e jesuítas de Ambaka. Fizeram-no com o
fim de ensinar a língua portuguesa e o catecismo aos
africanos. Foram eles que introduziram os princípios or-
tográficos ainda hoje vigentes.

73
Nos séculos XIX e XX surgem estudiosos do kimbundu,
de onde destacamos Héli Chatelain. A este sucedeu-lhe
José Luiz Quintão cujas diferenças com Chatelain são
anotar o prefixo di- em lugar de ri- no singular da classe
4, a organização da obra por ter agrupado todos os exer-
cícios no final e finalmente ter acrescentado uma parte de
vocabulário. É ainda de salientar o anotar das «Diferenças
principais entre o dialecto do Sertão e o de Luanda»
(Quintão, 1934: 200) que se apresentam de seguida e que
já estavam expostas em Chatelain (1889: 150):

— Em logar de ng de Loanda, encontra-se, às vezes,


no Sertão l, ex: ngoji, corda, ngatu, colhér; loji, lutu.
— Em Loanda é facultativo dizer: lumata ou numata,
bokola ou bokona, no Sertão prefere-se o n.
— No Sertão o p e o f são geralmente precedidos da
nazal m, ex: mpexi em vez de pexi, cachimbo.
— O ri que em Loanda sôa quási como em português,
e que eu nêste compêndio substituo por di, sôa no
Sertão como di (em umbundu: li).
— Ao ui final de Loanda, corresponde no Sertão ue,
ex: ditui, dizui = ditue, dizue, orelha, voz.
— O x de muitas palavras, pronuncia-se no Sertão
com tx (umbundu: c), ex: muxi, muxima = matxi,
mutxima, pau, coração.
— Ao som de tx, corresponde o som de ch, usado no
Norte de Portugal.
— No Sertão preferem as formas completas às abre-
viadas, ex: kiabu em vez de kiá, ngoho em vez de
ngó, já e só.

74
— Em muitas palavras há uma pequena diferênça, ex:
L. mungaa, sal, S. mongua; L. nhiki, ou nhoki, S.
nhuki, abelha; L. kindala, agora, S. kindaula; L.
diju, S. dizu, dente: etc.
— Em vários pontos do Sertão conta-se assim: moxi,
kadi, tatu, uana, tana, samanu, sambuadi, dinake,
divua, dikumi (de 1 a 10); makumi a ladi, (20)
makumi a tatu (30), etc.»

Das outras duas gramáticas, a dos Missionários do


Vicariato Geral de Malange reproduz em versão abre-
viada o que as anteriores já tinham estudado, enquanto
que a do padre Maia está em flagrante contradição com
todas as outras nomeadamente quanto aos vários prefi-
xos do kimbundu.
Parece-nos que o autor de qualquer uma destas gra-
máticas pretendia frutos de entendimento mínimos e
rápidos. A sua preocupação não era o estudo da língua,
mas sim fazer uma ferramenta, ainda que rudimentar.
Para dar ordens era necessário ser entendido, sendo o
mesmo também válido para as almas.
A primazia da fala sobre a escrita é, ainda hoje em
dia, uma realidade que se observa em sociedades onde o
rural se sobrepõe ao urbano, como acontece em África.
É comummente aceite a importante presença da tradição
oral ao longo da História de África. Os contos e os
provérbios têm lugar de destaque nas tradições bantas,
pois são estes que vão transportar o passado até ao pre-
sente.

75
76
Bibliografia

ANDRADE, Ernesto d’ (2007). Línguas Africanas — Breve


Introdução à Fonologia e à Morfologia, Lisboa: A. Santos.
BAIÃO, padre Domingos Vieira (1946). O Kimbundu sem
Mestre, Porto: Imprensa Moderna.
BATALHA, Ladislau (1891). A Lingua de Angola, Lisboa:
Companhia Nacional Editora.
CANNECATTIM, Bernardo Maria de (1804). Diccionario da
lingua bunda, ou angolense explicada na portugueza, e
latina, Lisboa: Impressão Regia.
CANNECATTIM, Bernardo Maria de (1805). Collecção de
observações grammaticaes sobre a lingua bunda, ou angolense,
Lisboa: Impressão Regia.
C HATELAIN , Heli (1889). Grammatica Elementar do
Kimbundu, 2.a ed., 1964, New Jersey: The Gregg Press
Incorporated.
DIAS, Pedro (1697). Arte da Lingua de Angola, oferecida a
Virgem Senhora N. do Rosario, Mãy, e Senhora dos mesmos
Pretos, pelo P. Dias da Companhia de Jesu, 1.a ed., Lis-
boa: Officina de Miguel Deslandes, 2.a ed., Rio de

77
Janeiro: 2006.
FERNANDES, João; Zavoni Ntondo (2002). Angola: Povos e
Línguas, Luanda: Editorial Nzila.
GORDON, Raymond G., Jr. (ed.), (2005). Ethnologue:
Languages of the World, Fifteenth edition. Dallas, Tex.:
SIL International. Versão on-line em http://
www.ethnologue.com/ (acedido em 30-12-2008).
M AIA , padre António da Silva (1957). Gramática de
Kimbundo, 2.a ed., 1964, Cucujães.
MATTA, J. D. Cordeiro da (1893). Ensaio de Diccionario
Kimbúndu-Portuguez, Lisboa: Casa Editora António
Maria Pereira.
MINGAS, Amélia A. (2000). Interferência do Kimbundu no
Português Falado em Lwanda, Lisboa: Campo das Letras.
MISSIONÁRIOS DO VICARIATO GERAL DE MALANGE (1944).
Elementos da Gramática de Quimbundo, Malange.
QUINTÃO, José Luiz (1934). Gramática de Kimbundo, Lis-
boa: Descobrimento.
http://www.bantu-languages.com (acedido em 30-12-
2008).

78
ANEXOS

79
80
Concordâncias

A concordância faz-se, em kimbundu, através do pre-


fixo do substantivo que inicia a frase e lhe serve de
sujeito. Apresentamos de seguida quadros dos prefixos
nominais e concordantes descritos pelos autores por nós
estudados e a sua aplicação prática. Exemplos em Baião,
1946: 26.
PREFIXOS NOMINAIS

CLASSE CHATELAIN QUINTÃO MISSIONÁRIOS MAIA

11.a
mu – a mu – a mu – a mu/u – ma/a
12.a mu – mi mu – mi mu – mi mu/u – i
13.a ki – i ki – i ki – i ki/e – î
14.a ri – ma di – ma ri – ma o/i/e – ma
15.a u – mau u – mau u – mau u – mau
16.a lu – malu lu – malu lu – malu m/n/o – o la 1
17.a tu – matu tu – matu tu – matu lu – malu
18.a ku – maku ku – maku ku – maku ku – maku
19.a Ø – ji i; Ø – ji Ø – ji ka – aka/maka
10.a ka – tu ka – tu ka – tu ka – u2

81
PREFIXOS CONCORDANTES

CLASSE CHATELAIN QUINTÃO MISSIONÁRIOS MAIA

11.a ua – a ua – a ua – a ua – a
12.a ua – ia ua – ia ua – ia ua – ia
13.a kia – ia kia – ia kia – ia kia – ia
14.a ria – ma dia – ma ria – ma/a lia – a
15.a ua – ma ua – ma ua – ma/a ua – a
16.a lua – ma lua – ma lua – ma/a ia – ia
17.a tua – ma tua – ma tua – ma/a lua – a
18.a kua – ma kua – ma kua – ma/a kua – a
19.a ia – ji ia – ja ia – ja ka – a
10.a ka – tu ka – tua ka – tua ka – ua

11.a
Mubika uami uakala umoxi Abik’am iakala atatu
O meu escravo era um Os meus escravos eram três

12.a
Mukolo uami uakala umoxi Mikolo iami iakala itatu
A minha corda era uma As minhas cordas eram três

13.a
Kialu kiami kiakala kimoxi Ialu iami ikala itatu
A minha cadeira era uma As minhas cadeiras eram três

14.a
Rilonga riami riakala rimoxi Malonga mami makala matatu
O meu prato era um Os meus pratos eram três

15.a
Uta uami uakala umoxi Mauta mami makala matatu
A minha arma era uma As minhas armas eram três

16.a
Lumbu luam iluakala lumoxi Malumbu mami makala matatu
O meu muro era um Os meus muros eram três

17.a
Tubia tuam ituakala tumoxi Matubia mami makala matatu
O meu fogo era um Os meus fogos eram três

18.a
Kuria kuami kuakala kumoxi Makuria mami makala matatu
A minha comida era uma As minhas comidas eram três

19.a
Mbiji iami iakala imoxi Jimbiji jami jakala jitatu
O meu peixe era um Os meus peixes eram três

10.a
Kamona kami kakala kamoxi Tuana tuami tuakala tutatu
A minha criança era uma As minhas crianças eram três

82
Misomo
Contos

Eme ngateletele ngana Eu contava(do) senhor


Kimalauezu kia Tumba Kiamaluezu de Tumba
Ndala, uakexiriê ni mukaji Ndala que estava com mulher
ê, ku rima ria kukala anga d’elle, atrás de ser e estavam,
akalâ mukaji ê anga uiza a mulher d’elle veiu (a) con-
uimita. Muene kana kariê ceber. Ella não comia
xitu, maji usema ngó mbiji. carne, mas antojava só peixe.
O riala, ki aia mu tamba, O homem, quando ia pescar,
ubeka ndumba ria jimbiji. trazia quantidade de peixes.
O jimbiji anga jilengela mu Os peixes pois refugiaram-se
ngiji iengi. O riala anga para rio outro. O homem pois
uambela o muhatu, uixi: disse á mulher, disse:
«Ngi ririkile huta,» anga o «Prepara-me comida,» e a
muhatu uririka o huta, anga o mulher preparou o comer, e o
riala riia bu ngiji, bu alengelele homem foi para o rio, onde
o jimbiji anga ubanga-bu o tinham fugido os peixes e fez
fundu iê anga uria. Ki azubile, lá o seu fundo e comeu. Tendo

83
uixi: «Ngiia mu tamba,» anga acabado, disse: «Vou pescar,»
utakula o uanda. Luarianga e lançou a rede. A primeira
kakuateriê kima, lua kaiari vez não apanhou nada, a
kiomuene, o lua katatu anga segunda o mesmo, a terceira
uivua uanene anga uivua vez então sente(a) pesada e
moxi a menia muixi: ouve dentro da agua dizendo:
«Kinga, mbata mukuenu «Espera, porque o teu amigo é
mukua-mona.» Kia azubile o pai de familia.» Tendo já espe-
kukinga anga uivua ringi rado então ouve outra vez,
muixi: «Sunga kiá!» Anga usunga dizendo: «Puxa já!» E puxou
kimbiji kionene anga u ki ta um peixão grande e pôl-o na
muhamba anga umateka o muhamba e começou a
kuenda. Maji o jimbiji joso andar. Porém os peixes todos
jakexile mu kaiela o kimbiji eki, estavam a seguir o peixão este,
o riala anga rivua-jinga ngó o homem e ouve continuam só
mu iangu: ualalá! ualalá! — no capim: ualalá! ualalá! —
Ki akexile kiá mu bixila ku Estando elle já para chegar em
bata, o muhatu uendele ku mu casa, a mulher foi ao seu
kauirila ni akua-riembu riê. encontrocom os vizinhos d’ella.
Ki abixirile ku bata, Tendo chegado em casa, o
o riala anga ribana o mbiji homem então deu o peixe
pala ku i banga. O muhatu pe para ser feito. A mulher
anga anga uambela o riala, uixi: porém disse ao homem, disse:
«Banga-iu!» O riala uixi: «Escama-o tu!» O homem disse:
«Nguami.» O muhatu anga «Não quero.» A mulher pois
umateka o ku i banga. Maji o começou a escamal-o. Mas o
mbiji iakexile mu kuimba, peixe estava a cantar,
ixi: «Ki u ngi banga, ngi dizendo: «Escamando-me tu,
bang’ami kiambote.» Ki azubile escama-me bem.» Tendo acabado
anga u i ta mu ’mbia, então ella o pôz na panella,

84
maji o mbiji iakexirilê hanji mas o peixe estava ainda a
mu kuimba. O mbiji ki iabile, cantar. O peixe estava
o muhatu anga uririka prompto, a mulher então
malonga matanu anga arranjou pratos cinco e convi-
ukuvitala o riala ni akua dou o marido e os vizinhos
riembu riâ; ene anga a ri tunâ. d’elles; elles porém recusaram.
Muene anga uria k’ubeka uê. Ella pois comeu sósinha.
Ki azubile anga ukatula o Tendo acabado então tirou a
rixisa ni pexi iê anga u ri zala esteira e o cachimbo seu e
mu kanga, anga uivua mu extendeu-a no chão, e ouviu na
rivumu uixi: «Ngitundila barriga dizendo: «Sahirei por
kué?» O muhatu uixi: onde?» A mulher disse:
«Tundila ku makanda me «Sahe pelas plantas dos
’nama.» O mbiji ia mu pés.» O peixe lhe respondeu:
kumbuile: «Ku inama ié, ku «Pelos pés teus, com que costu-
uenioriatela o matuji, kuene mas pizar as porcarias, por ahi
ku ngitundila!» — O muhatu hei-de sahir!» — A mulher
uixi: «Tundila mu kanu.» — disse: Sahe pela bocca.» —
«Mu kanu, mu ua ngi miniina, «Pela bocca, em que tu me
muene mu ngitundila?» enguliste, por ahi hei-de sahir?»
O muhatu uixi: «Sota buoso A mulher disse: «Procura onde
bu uandala. O mbiji ixi: quer que desejes.» O peixe disse:
«Eme ze ngitund’ ó!» anga o «Eu pois saio lá!» e a
muhatu ubaza bu ’axaxi. O mulher rebentou no meio.
mbiji anga iiê. O peixe porém foi-se embora.

(Chatelain, 1889: 147-149)

85
II

Tuansange jinzeu mu njila; Encontrámos formigas no caminho;


na ngulungu ua ji voto ió ua o senhor veado as apanhou e as
ji te njibela. Uate mu njibela, pôz na algibeira. Postas na algibeira
ja mu numata. Ngama ’ngo ellas o mordem. O sr. leopardo
uambe: u kiouna. disse: és sandeu.

(Chatelain, 1889: 149)

86
Jisabu
Provérbios

1. Sasa o ingo, i ku tolole o xingu


Cria a onça, (que) ella te parta o pescoço
2. Xixikinia uatumine nzamba
A formiga (já) mandou (ao) elephante
3. Muzueri uonene kalungê
O fallador grande não tem razão
4. Tubia tua ri zemba ni fundanga
O fogo odeia-se com a polvora (reciprocamente)
5. Ukembu ua petu, moxi isuta
Belleza de almofada, dentro trapos
6. Hima katariê ku mukila uê
O macaco não repara no rabo d’elle
7. Uene ou uenda ni muzumbu kajimbirilê
Quem está ou anda com beiço não perde (o caminho)
8. Uabinga Nzambi, kasukê muxima
Quem pede a Deus, não desespera

(Chatelain, 1889: 131-132)

87
88

Você também pode gostar