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Academia Estadual de Segurança Pública do Ceará – AESP|CE

Curso de Formação Profissional Para Ingresso no Cargo de Médico Perito Legista 1ª Classe da
Perícia Forense do Estado do Ceará - PEFOCE
SEXOLOGIA FORENSE

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Academia Estadual de Segurança Pública do Ceará – AESP|CE
Curso de Formação Profissional Para Ingresso no Cargo de Médico Perito Legista 1ª Classe da
Perícia Forense do Estado do Ceará - PEFOCE
SEXOLOGIA FORENSE

SECRETARIA DA SEGURANÇA PÚBLICA E DEFESA SOCIAL - SSPDS

DELCI Carlos TEIXEIRA


SECRETÁRIO DA SSPDS

PERÍCIA FORENSE DO CEARÁ

MAXIMIANO Leite Barbosa Chaves


PERITO GERAL DA PERÍCIA FORENSE DO ESTADO DO CEARÁ

ACADEMIA ESTADUAL DE SEGURANÇA PÚBLICA DO CEARÁ – AESP|CE

José Herlínio DUTRA – Cel PM


DIRETOR-GERAL DA AESP|CE

ELIANA Maria Torres Gondim - DPC


SECRETÁRIA EXECUTIVA DA AESP|CE

DOUGLAS Afonso Rodrigues da Silva – Ten Cel PM


COORDENADOR GERAL DE ENSINO DA AESP|CE

Amarílio LOPES Rebouças – TC BM


COORDENADOR PEDAGÓGICO

NEYLA Adriano de Santana


ORIENTADORA DA CÉLULA DE EDUCAÇÃO À DISTÂNCIA DA AESP|CE

CURSO DE FORMAÇÃO PROFISSIONAL PARA INGRESSO NO CARGO DE MÉDICO PERITO LEGISTA DE 1ª CLASSE
DA PERÍCIA FORENSE DO ESTADO DO CEARÁ - PEFOCE

DISCIPLINA
SEXOLOGIA FORENSE

CONTEUDISTA
Renato Evando Moreira Filho

REVISÃO DE COERÊNCIA DIDÁTICA


Erika Maria da Silva Pereira
Francisco José Amaral Lima
Jorgeana Reis da Silva
Luciana Canito Austregésilo de Amorim
Luciana Moreira da Silva
Renata Teixeira de Azevedo

FORMATAÇÃO
JOELSON Pimentel da Silva – Sd PM

• 2015 •

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SEXOLOGIA FORENSE

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO E CONCEITOS......................................................................................................................................5
2. TIPOS DE SEXO ..........................................................................................................................................................5
2.1 Sexo Biológico ou Sexo Genético ........................................................................................................................5
2.2 Sexo Biológico Cromossômico ............................................................................................................................6
2.3 Sexo Biológico Cromatínico ................................................................................................................................6
2.4 Sexo Gonadal ......................................................................................................................................................6
2.5 Sexo Morfológico (Anatômico Ou Fenotípico) ...................................................................................................7
2.6 Sexo Endócrino ou Hormonal .............................................................................................................................7
2.7 Sexo Psicológico..................................................................................................................................................7
2.8 Sexo Jurídico (Legal ou Civil) ...............................................................................................................................8
3. EROTOLOGIA FORENSE .............................................................................................................................................8
3.1 Conceito .............................................................................................................................................................8
3.2 Sexualidade Anômala - Conceito ........................................................................................................................8
3.3 Sexualidade Anômala – Classificação – Exemplos ..............................................................................................8
4. APLICAÇÕES NO DIREITO ..........................................................................................................................................9
4.1 Tipo objetivo ......................................................................................................................................................9
4.2 Sujeito do Crime ...............................................................................................................................................10
4.3 Consumação ....................................................................................................................................................10
4.4 Tentativa ...........................................................................................................................................................10
4.5 Causas de Aumento da Pena ............................................................................................................................10
4.6 Formas Qualificadas do Crime ..........................................................................................................................10
5. OBSTETRÍCIA FORENSE ...........................................................................................................................................11
5.1 Existência de Recenticidade do Parto...............................................................................................................11
5.2 Existência de Antiguidade do Parto ..................................................................................................................12
5.3 Pericia Médico-Legal no Aborto .......................................................................................................................12
5.4 Perícia de Aborto In Vivo ..................................................................................................................................12
5.5 Infanticidio........................................................................................................................................................13
5.6 Prova de Ser Nascente ......................................................................................................................................13
5.7 Prova de Infante Nascido ..................................................................................................................................13
5.8 Prova do Recém-Nascido ............................................................................................................................14
6. SEXOLOGIA CRIMINAL .............................................................................................................................................16
6.1 Perícia na Conjunção Carnal e Himenologia.....................................................................................................16
6.2 Exame da Região Genital ..................................................................................................................................17
6.3 Identificação de espermatozóides ....................................................................................................................18
6.4 Pesquisa de Proteína Prostática P30 ................................................................................................................18
6.5 Identificação de DNA ........................................................................................................................................19
6.6 Perfil de DNA da vitima ....................................................................................................................................19
6.7 Provas indiretas de conjunção carnal ...............................................................................................................19
6.8 Perícia no Ato Libidinoso Diverso da Conjunção Carnal ...................................................................................20
6.9 Inspeção ectoscópica do corpo inteiro .............................................................................................................20
6.10 Exame com luz ultravioleta filtrada (Iâmpada de Wood) ...............................................................................20
6.11 Exame da região anal .....................................................................................................................................21
6.12 Colheita de material anorretal .......................................................................................................................22
6.13 Colheita de material das regiões cutâneas .....................................................................................................22
6.14 Colheita de sangue para exames sorológicos .................................................................................................23
7. SEXOLOGIA CRIMINAL E CRIMES CONTRA A HONRA .............................................................................................23
8. SEXOLOGIA CRIMINAL E CORPOS ESTRANHOS .......................................................................................................23
9. SEXOLOGIA FORENSE NA PRÁTICA CIVIL .................................................................................................................23
9.1 Perícia e Doutrina .............................................................................................................................................23
9.2 Exames Subjetivo, Objetivo e Complementares...............................................................................................24
9.3 Considerações Doutrinárias..............................................................................................................................24
9.4 Provas Médico-Legais Não-Genéticas ..............................................................................................................24

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9.5 O Exame de DNA na Investigação de Paternidade/Maternidade .....................................................................24


9.6 Interpretação do Exame ...................................................................................................................................25
9.7 Anulação do Casamento ...................................................................................................................................25
9.8 Pseudo-Hermafroditismo .................................................................................................................................26
9.9 Outras Deformidades Genitais e Extragenitais .................................................................................................26
9.10 Hipoestesia e Singularidade da Libido ............................................................................................................ 27
9.11 Conclusão ....................................................................................................................................................... 27
10. ATENDIMENTO ASSISTENCIAL E VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA SEXUAL ........................................................................ 27
10.1 Aspectos Éticos e Legais .................................................................................................................................28
11. VIOLÊNCIA SEXUAL E HOMOSSEXUAIS .................................................................................................................29
12. ABORDAGEM MÉDICO-LEGAL DA TRANSEXUALIDADE .........................................................................................29
PALAVRAS FINAIS ........................................................................................................................................................30
REFERÊNCIAS ..............................................................................................................................................................31

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DNA FORENSE

1. INTRODUÇÃO E CONCEITOS

A Sexologia Forense é a divisão da Medicina Legal que estuda os problemas médico-legais ligados ao
sexo. Dois instintos poderosos e primordiais governam o homem: o da fome e o do sexo. O primeiro assegura,
pela nutrição, a conservação do indivíduo; o segundo, pela reprodução, garante a perpetuidade da espécie.
Tão poderoso como o da nutrição, é o instinto sexual. Dele depende, e não do acaso, a conservação da
espécie. Os conhecimentos científico e artístico se inspiram em tal instinto, sublimados no amor e na afetividade.
Nele se fundamenta a obra da contínua renovação humana.
Não obstante, conforme categorização descrita desde a Grécia antiga há o amor anômalo e o amor
criminoso. Estes dois representam a face oculta e doentia do outro.
É de elevada relevância o estudo da Sexologia Forense. Nela se descreve os distúrbios sexuais de
interesse jurídico, com o intuito de demonstrar e prevenir os tenebrosos desvios do instinto. Esclarece, a médicos
e juristas, sobre os meios de identificar as anomalias e crimes sexuais, como julgar seus autores e proteger suas
vítimas. Sofreu sensíveis e recentes alterações, inicialmente com a abolição do crime de sedução do ordenamento
jurídico por meio da lei 11.106/2005 e, mais recentemente, com a vigência da lei 12.015/2009, além das
modificações na redação dos artigos referentes aos crimes contra a dignidade sexual (anteriormente denominados
crimes contra os costumes), inscritos na parte especial do Código Penal. Percebe-se que a legislação tenciona
punir com mais vigor os autores de tais crimes, alguns classificados como hediondos, notadamente quando do
envolvimento de crianças e adolescentes.
A Sexologia Forense estuda, ainda, o casamento, o divórcio, a fecundação, a gestação, o parto, a
investigação da paternidade, o aborto, o infanticídio, as perversões sexuais, os crimes sexuais, a exposição a perigo
de contágio venéreo e a prostituição. Subdivide-se em três partes: Sexologia Criminal, que estuda os problemas
médico-legais relacionados com a conjunção carnal e atos libidinosos diversos; a Obstetrícia Forense, que faz o
mesmo estudo em relação à fecundação, gestação, parto, aborto, infanticídio e investigação de paternidade e a
Erotologia Forense, que se ocupa das perversões e crimes sexuais, da exposição a perigo de contágio e da
prostituição.

2. TIPOS DE SEXO

Entende-se sexo a constituição somatopsíquica do individuo que o define como homem ou como
mulher. Para se estabelecer esta determinação, na prática, intervêm fatores os mais variados.

Não é por outra razão que o sexo de um individuo pode ser considerado sob diversos prismas, a saber:

1. Sexo biológico ou genético: resulta da constituição dos gens do zigoto, podendo ser subdividido em:
- cromossômico ou citogenético
- cromatínico;
2. Sexo gonadal: diferencia-se pelas gônadas que o individuo possui (testículos ou ovários);
3. Sexo morfológico (anatômico ou fenotípico): evidenciado pelos genitais externos;
4. Sexo endócrino ou hormonal: resulta dos hormônios que o indivíduo segrega em maior concentração
(estrógenos e progesterona, no sexo feminino; testosterona, no sexo masculino);
5. Sexo psicológico: o que o indivíduo percebe-se ou presume ter;
6. Sexo jurídico ou legal: resulta do que consta no Registro Civil.

2.1 Sexo Biológico ou Sexo Genético

Determina a maior parte das características e comportamento sexual que acontecerá no indivíduo
durante a embriogênese e ao longo de sua vida.
Com efeito, os aspectos sob os quais se possam examinar o sexo desse novo ser, não raro, serão facetas
da expressão das informações genéticas contidas nos cromossomos do zigoto. É o sexo biológico que determina
que se forme certo tipo de gônada (sexo gonadal); é porque existe certo tipo de gônada que o estímulo dos
hormônios fará com que se diferenciem algumas estruturas primordiais, de modo a que se desenvolva

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determinado fenótipo sexual (sexo morfológico); e é porque existe certo tipo de gônada que, quando da
puberdade, começarão a ser produzidos determinados hormônios característicos do sexo do indivíduo (sexo
endócrino ou hormonal).

2.2 Sexo Biológico Cromossômico

Nos seres humanos, os pares cromossômicos se distinguem uns dos outros, podendo ser agrupados
seguindo dois critérios cumulativos: ordem decrescente de tamanho e posição do centrômero. Isto permitiu ao
Grupo de Estudo de Denver, já em 1960, classificar os cromossomos em 22 pares, numerados de 1 a 22. Estes 22
pares são conhecidos, genericamente, como autossomos. O par restante, o 23°, corresponde aos gonossomos ou
cromossomos sexuais.
Os cromossomos sexuais, na mulher, são semelhantes entre si em forma e tamanho, enquanto que no
homem são desiguais. Com efeito, os dois gonossomos da mulher, bem como o maior dos cromossomos sexuais
do homem, são denominados cromossomos X, enquanto que o menor do par gonossômico masculino é
conhecido como cromossomo Y. Sendo assim, o cariótipo da mulher normal se expressa como 46, XX e o do
homem normal como 46, XY.
Patologicamente, são observadas constituições cromossômicas diversas das citadas. Assim, poderemos
encontrar mulheres 47, XXX e 45, X0 além de homens 47, XXY e 47, XYY. O que não pode acontecer é a ausência
absoluta do gonossomo X.
Todas as observações apontam no sentido de que o desenvolvimento fenotípico espontâneo do
individuo é o feminino. É certo que a presença do gonossomo Y condiciona o aparecimento da morfologia externa
própria do fenótipo masculino. Assim, na ausência do cromossomo Y, o indivíduo apresenta fenótipo feminino.

2.3 Sexo Biológico Cromatínico

Cada cromossomo, em termos genéticos, representa um reservatório de informações codificadas através


de sequências de nucleotídeos - os genes – ao longo das moléculas do ácido desoxirribonucléico, o DNA.
Como existem dois cromossomos para cada par - cujos genes nem sempre são necessariamente iguais
(heterozigose), porquanto oriundos cada um de um dos genitores, resulta fácil compreender a necessidade de
que, de cada duas informações que existam para determinado locus, em cada um dos componentes do par
autossômico, uma das duas deva ser silenciada ou inativada.
Como a obtenção de células do corpo de um indivíduo não requer maiores dificuldades - notadamente
através da raspagem da mucosa que reveste internamente a cavidade oral - esse método de avaliação do sexo se
difundiu Iargamente.
Assim, a cromatina sexual ou corpúsculo de Barr é uma massa biconvexa de heterocromatina justaposta
à membrana nuclear. Todavia, é fácil compreender que a forma de apresentação que consta da técnica dependerá
muito da maneira como tenha ficado disposta a massa de heterocromatina durante a elaboração do esfregaço.
Destarte, a cromatina sexual não estará presente em todas as células, aceitando-se como positivos, isto é, como
pertencentes ao sexo feminino, a presença de corpúsculo de Barr em 50% dos núcleos.

2.4 Sexo Gonadal

A constituição genética do individuo, tal como vem representada pelos seus cromossomos, acaba por
repercutir, anatomicamente, na presença de determinado tipo de gônada: testículos ou ovários.
A constituição 46, XY, em condições normais, determina o surgimento dos testículos primitivos, a
proliferação dos cordões sexuais primitivos que se transformam em cordões testiculares, que perdem contato com
o epitélio celômico pelo adensamento de uma camada de tecido conjuntivo fibroso, a túnica albugínea, e o
aproveitamento subsequente das estruturas mesonéfricas (ductuli efferentes e ducto de Wolff) e seus derivados
diretos: epidídimo, ducto deferente e glândulas vesiculosas (vesículas seminais).

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2.5 Sexo Morfológico (Anatômico Ou Fenotípico)

Corresponde à configuração ou arquitetura corporal do indivíduo, especialmente a dos seus órgãos de


reprodução e dos seus caracteres sexuais secundários. Em geral, o sexo fenotípico coincide com o sexo gonadal, à
exceção dos casos de hermafroditismo e de intersexualidade. Pode ser avaliada a anatomia externa pela simples
ectoscopia e palpação, bem como, a anatomia interna por meio de exames de imagem, a exemplo da
ultrassonografia, visando-se observar a presença de útero/ovários ou próstata.

2.6 Sexo Endócrino ou Hormonal

Indiretamente é dado pelas gônadas, porquanto são elas as produtoras, em maior concentração, de
hormônios sexuais. Comumente, há coincidência entre o sexo cromossômico e o sexo hormonal.
Contrariamente, inexiste correspondência necessária entre o sexo cromatínico e o sexo endócrino, como
ocorre nas gonossomopatias e nas cromossomopatias. Como exemplo, temos a sindrome de Klinefelter (47,XXY),
em que o sexo morfológico ou anatômico é masculino, ao passo que o sexo cromatínico é feminino (presença de
um corpúsculo de Barr). Na síndrome de Turner (45,X0), acontece o inverso: o sexo morfológico ou anatômico é
feminino, ao passo que, o sexo cromatínico é masculino (ausência de corpúsculo de Barr).
Assim, o simples exame físico da pessoa, notadamente dos seus genitais externos, nem sempre permite
realizar um diagnóstico adequado do sexo endócrino ou hormonal do indivíduo. Com efeito, isto somente será
possível mediante exames laboratoriais com a determinação da concentração - conforme faixa etária e sexo a
determinar - uma vez que, os hormônios FSH, LH, estrógeno, progesterona e derivados androgênicos são
secretados por qualquer dos sexos, no entanto, em faixas diversas de níveis séricos ou em outros fluidos corporais.

2.7 Sexo Psicológico

É aquele que o individuo sente ou presume ter. Por outras palavras, é o sentimento de masculinidade ou
feminilidade, e, como consequência, a aceitação do caráter feminino ou masculino.
Isto implica como é curial, no comportamento apropriado para o sexo morfológico que se tem, bem
como na orientação ou direcionamento da libido para o sexo oposto. O sexo psicológico é a própria identidade
sexual.
A definição da identidade sexual subjetiva se estabelece, via de regra, por volta dos três anos de idade. O
sexo psicológico resulta, como parece evidente, de dois grandes componentes: de um lado, o endógeno; de outro,
o exógeno. O primeiro decorre da tríade cromossômico-morfo-endócrina. O segundo é constituído pelos fatores
socioculturais do ambiente.
O sexo psicológico não aparece de forma repentina, abruptamente. Antes, resulta de um longo processo
de aprendizagem. Com efeito, nesse lapso, aprendem-se certas condutas próprias e isso, como é óbvio, não é
determinado nem pelos cromossomos sexuais nem por quaisquer outros fatores neuroendócrinos.
A educação, o meio ambiente, os fatores socioculturais, como o tratamento social recebido, as roupas
que se usa, dentre outros, podem aos poucos definir um comportamento sexual determinado.
Tais influências são, com frequência, observadas nos casos de intersexualidade, uma vez que, apresenta
traços de ambos os sexos. Caso seja educado como uma menina, aprenderá a comportar-se como tal e,
obviamente, será psiquicamente feminino. Contrariamente, se os pais o educam como um varão, o menino se
sente e comporta-se como um varão, defendendo a sua masculinidade.
Em outros casos, a vontade da mãe de ter um filho de determinado sexo faz com que ela, quando ganha
um bebê de sexo diferente do desejado, passe a vesti-lo e a tratá-lo como se fosse realmente do sexo oposto. Isso
era mais usual nas crianças do sexo masculino, que eram vestidas e tratadas como se fossem meninas. De outra
forma, os fatores socioculturais e a agressividade do ambiente, em um mundo de costumes hostis, fez com que
certas mulheres optassem por vestir-se e comportar-se como se homens fossem.
Verifica-se assim, na prática, que a identidade sexual depende mais do sexo assimilado do que do
próprio sexo biológico.

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2.8 Sexo Jurídico (Legal ou Civil)

Resultado do assinalado no Registro Civil de Nascimento. Considera-se que, em face da Lei dos Registros
Públicos (Lei 6.015/73), existe a presunção juris tantum de verossimilhança daquilo que tenha sido registrado.
Todo individuo, por lei, tem um sexo que é aquele que, quando do registro do nascimento, foi declinado pela
pessoa que fez a declaração e foi inscrito pelo funcionário que fez o lançamento, em obediência ao artigo 54 do
citado diploma legal.
Todavia, a utilização muito frequente ainda no Brasil, de prenomes como, Darcy, Darli, Djaci, Donizete,
lrani, lvani, dentre outros, muitas vezes é responsável por equívocos por parte dos cartorários, notadamente em
comarcas do interior. Com efeito, o analfabetismo das pessoas simples que se apresentam para fazer as
declarações exigidas, por um lado, e a dificuldade de comunicação com os funcionários dos Cartórios de Registro
das Pessoas Naturais, por outro, fazem com que, não raro, criem-se situações de trocas do sexo legal, cuja
modificação, ainda que possível, exige um decisum judicial, por força do que dispõe o artigo 40 da Lei 6.015/73.

3. EROTOLOGIA FORENSE

3.1 Conceito

Divisão da Sexologia Forense que se incube em estudar o comportamento sexual com ênfase nos desvios
e crimes de natureza sexual

3.2 Sexualidade Anômala - Conceito

Modificação quantitativa e/ou qualitativa da atividade sexual.

 VARIAÇÕES
• Local
• Temporal
• Legislação

 CAUSAS
• Psiquiátricas
• Genéticas
• Infecciosas
• Endocrinológicas
• Sociais
• Educação desvirtuada,
• Vida afetiva corrompida,
• Promiscuidade sexual,
• Extremismos religiosos,
• Abusos na infância/adolescência
• Liberação dos costumes
• Atrativos financeiros

3.3 Sexualidade Anômala – Classificação – Exemplos

1) TRANSTORNOS COM AUMENTO OU EXALTAÇÃO SEXUAL


Satiríase, ninfomania, exibicionismo.

2) TRANSTORNOS DA DIMINUIÇÃO DA SEXUALIDADE


Anafrodisia, frigidez.

3) TRANSTORNOS EXTEMPORÂNEOS
Precocidade libidinosa, lubricidade senil.

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4) ALTERAÇÕES QUALITATIVAS
Topoinversão, cronoinversão, cromoinversão, etnoinversão, travestismo.

5) DESVIOS SEXUAIS
Fetichismo, narcisismo, onanismo, pluralismo, riparofilia, voyeurismo, pigmalionismo, bestialismo,
vampirismo, necrofilia, mixoscopia, urolagnia, coprofilia, coprolalia, edipismo, algolagnia

4. APLICAÇÕES NO DIREITO

 DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL


Ato obsceno
Lesões corporais
Ultraje público ao pudor
Abuso e exploração sexual de menores
Abuso e exploração sexual de idosos

OBS: Responsabilidade atenuada (se doença mental associada)

 DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL


Direito de família
Anulação do casamento (CC, art. 1548)

 DIREITO DO TRABALHO E PROCESSUAL DO TRABALHO


Dispensa por justa causa (CLT, art. 482)

ESTUPRO – ASPECTOS JURÍDICOS

Código Penal - artigo 213 - Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção
carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso.
Pena - reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos.

4.1 Tipo objetivo

Pune-se o ato de constranger (obrigar alguém a fazer algo contra sua vontade; compelir; forçar) a
praticar ou permitir que se pratique qualquer ato libidinoso.
Os meios executórios previstos na disposição legal são a violência física (vis absoluta) e a grave ameaça
(vis compulsiva). A fraude como modus operandi não é abrangida pela disposição, mas se enquadra no crime do
art. 215 (violação sexual mediante fraude).
Registre-se que tanto a violência quanto a grave ameaça contra a pessoa podem recair diretamente no
ofendido ou em terceira pessoa; por exemplo: agredir o filho da vítima (ou ameaçar fazê-lo) até que ela ceda à
concupiscência do autor.
É fundamental que haja resistência séria e inequívoca imposta pela vítima. Para tanto, basta que, de
qualquer modo, manifeste sua discordância quanto ao ato. É suficiente, por exemplo, que diga: “não!”. Não é
preciso que haja resistência violenta por parte do sujeito passivo, bastando seu dissenso, repita-se, séria e
inequivocamente manifestado.
Acrescente-se que o dissenso do ofendido deve persistir durante todo o ato sexual. Não há crime se o
ofendido, de início, resistiu, mas, iniciada a conduta, aquiesceu, tendo prazer no contato sexual. Deve-se
compreender bem, todavia, o que se entende por “aquiescer”. Casos há em que o sujeito passivo, percebendo que
qualquer resistência será inócua, porta-se passivamente (isto é, desiste de lutar). Essa atitude, evidentemente,
não configura consentimento e, destarte, é incapaz de excluir o caráter delitivo da conduta perpetrada.
Há duas formas de cometer o estupro: praticar o ato (o que supõe participação mais ativa da vítima) e
permitir que se pratique (que sugere atitude passiva do ofendido, o qual é obrigado a suportar a conduta do
agente). Não é necessário que haja contato físico entre o autor do constrangimento e a vítima. O agente pode, por
exemplo, obrigá-la a se masturbar diante dele, sem tocá-la em momento algum.

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O fato pode ser praticado por ação (regra) ou omissão (quando o sujeito possuir o dever jurídico de agir;
por exemplo, o carcereiro que, ciente da intenção dos demais detentos, nada faz para impedir que estes estuprem
um companheiro de cela).
Atos libidinosos são todos aqueles que tenham conotação sexual, isto é, tendentes à satisfação da
lascívia. Abrangem o típico ato libidinoso, vale dizer, a conjunção carnal (penetração do pênis na vagina, também
chamada de cópula vaginal ou intromisso penis in vaginam) e quaisquer outros, tais como: a masturbação, o coito
anal, a felação, o toque ou beijo nas partes pudendas.

4.2 Sujeito do Crime

O estupro é crime comum, podendo ser praticado por qualquer pessoa, de qualquer sexo. O mesmo
raciocínio se aplica ao sujeito passivo.
É possível, destarte, que se cometa estupro entre dois homens, entre duas mulheres ou entre pessoas
(autor e vitima) de sexos opostos.

4.3 Consumação

O delito se consuma com a prática do primeiro ato libidinoso envolvendo a vitima. Quando este consiste
na introdução do órgão viril na vagina da mulher, não é necessário que se dê a total penetração do membro. O
delito é de mera conduta, pois a lei não faz alusão a qualquer resultado naturalístico. O cometimento de mais um
ato com conotação sexual, no mesmo contexto fático, importará em crime único, mas deverá ser levado em conta
pelo juiz na dosimetria da pena. Se o agente, por exemplo, obrigar o ofendido à prática de felatio in ore e de
cópula anal, de modo subsequente e sem solução de continuidade, haverá unidade de infração penal.

4.4 Tentativa

É admissível, pois alguém pode dar início à execução do crime e ver frustrada sua intenção por fatores
alheios a sua vontade. Deve-se lembrar que o delito possui dois momentos: o inicial, em que há o emprego da
violência física ou grave ameaça contra a pessoa, e o momento posterior, de natureza libidinosa, em que o ato de
cunho sexual é praticado. Uma pessoa pode, por exemplo, apontar arma para a vitima e levá-la a um terreno
baldio com o intuito de estuprá-la, mas ser impedida pela intervenção oportuna de terceiro, pela aproximação da
policia, etc.

4.5 Causas de Aumento da Pena

Ao crime de estupro aplicam-se as causas de aumento de pena dos arts. 226 e 234-A do Código Penal
(CP), a saber:

• Aumento de quarta parte, quando o crime é cometido com o concurso de duas ou mais pessoas;
• De metade, se o agente é ascendente, padrasto ou madrasta, tio, irmão, cônjuge, companheiro, tutor,
curador, preceptor ou empregador da vitima ou por qualquer outro titulo tem autoridade sobre ela;
• De metade, se do crime resultar gravidez;
• De um sexto até a metade, se o agente transmite à vítima doença sexualmente transmissível de que
sabe ou deveria saber ser portador.

4.6 Formas Qualificadas do Crime

Os §§ 1º e 2º do art. 213 preveem formas qualificadas, respectivamente, pela lesão grave e pela morte.
Referido resultado deve envolver o sujeito passivo do crime contra a dignidade sexual (e não terceiro como o
policial que intervém no ato para prender o estuprador e acaba morto na troca de tiros por este). Se ocorrer lesão
corporal grave ou morte de terceira pessoa, haverá concurso material de delitos.
A ocorrência de lesão corporal leve, ou mera contravenção de vias de fato, não enseja a qualificação,
pois esses resultados entendem-se implícitos na disposição. A imputação do resultado – lesão grave ou morte –
pode dar-se a título de dolo ou culpa.

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Qualificadora em razão da idade da vítima (§ 1º)


O § 1º do art. 213 pune com reclusão, de 8 a 12 anos, o estupro cometido contra adolescente maior de
14 anos. Não se trata da incriminação de simples contato sexual com pessoas nessa faixa etária, mas da prática do
ato com emprego de violência física ou grave ameaça.
Quando se tratar de vítimas menores de 14 anos, aplicar-se-á o art. 217-A (estupro de vulnerável),
sujeitando o agente a pena de reclusão, de 8 a 15 anos. Nesse caso, pouco importa se houve ou não consenso na
realização do ato libidinoso. Caso o sujeito ativo empregue meios coercitivos para a satisfação de sua
concupiscência, poderá haver a forma qualificada prevista no § 2º do art. 217-A, quando resultar lesão corporal
grave (reclusão, de 10 a 20 anos) ou no § 3º, se ocorrer a morte (reclusão de 12 a 30 anos).

5. OBSTETRÍCIA FORENSE

 A PERÍCIA MÉDICO-LEGAL NO PARTO E NO PUERPÉRIO

Múltiplas são as situações que podem ensejar uma perícia médico-legal relacionada com o parto ou com
o puerpério.

5.1 Existência de Recenticidade do Parto

A averiguação pericial do parto recente se realiza pesquisando alguns dos sinais que se podem observar
na mulher nessas condições, como:
 Estado geral;
 Estado dos órgãos genitais;
 Corrimento de sangue;
 Corrimento de lóquios.

Este último corrimento apresenta modificações sucessivas de cor e de aspecto (inicialmente lóquios
sanguinolentos; a seguir, serossanguinolentos; por último, serolactescentes), que se iniciam logo apos o parto até
desaparecer completamente, o que possibilita fazer certa avaliação cronológica.

Todavia, durante um exame pericial mais amplo, podem detectar-se outros sinais na mulher, como:
1) Cloasma gravídico;
2) A pigmentação da linha alba;
3) A pigmentação da aréola mamária;
4) A hipertrofia dos tubérculos de Montgomery;
5) A turgescência dos seios, com o inicio da lactação, quer como colostro, quer como leite maduro;
6) Flacidez da parede abdominal;
7) Estrias gravídicas recentes;
8) Involução do volume uterino, cuja cronologia é variável, mas, quanto à altura em que se encontra o
fundo do útero, em geral segue a seguinte sequência:
- 1° dia - acima da cicatriz umbilical;
- 2° dia - sobre a cicatriz umbilical;
- 5° e 6° dias - abaixo da cicatriz umbilical;
- 9° dia – em torno de 2,0 cm acima da sínfise púbica;
- 12° dia - no nível da sínfise púbica.

Paralelamente, a avaliação laboratorial do líquido amniótico, do induto sebáceo, dos lóquios, do


mecônio, do colostro, do leite maduro, etc., permitirá, com ainda mais propriedade, complementar os dados
fornecidos pelo exame pericial prévio.

Como é evidente, o laudo pericial deverá ser extremamente minucioso, descrevendo o maior número
possível de informações, de tal sorte que cumpra, com rigor técnico, a sua função processual.

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5.2 Existência de Antiguidade do Parto

Quando o parto não é recente - ainda que muitos dos sinais elencados possam desaparecer, porquanto
temporários e fugazes - alguns podem persistir por mais tempo, como:
 Pigmentação da aréola mamária e da linha alba;
 Cicatrizes no períneo e na fúrcula;
 Carúnculas mirtiformes, no que restou do hímen;
 Colo uterino mais reduzido;
 Orifício cervical externo em forma de lábios e com eventuais cicatrizes.

Quando o exame se realiza no morto, o cadáver feminino poderá apresentar um ou mais dos elementos
apontados, sendo certo que, nesses casos, poderão acrescentar-se o exame interno dos órgãos do sistema genital
e outros elementos porventura colhidos durante a necropsia.
Durante a necropsia, deve-se ter presente que é possível verificar-se, no interior do útero, vestígios da
implantação da placenta, até por volta de oito semanas após o parto.
Na literatura médico-legal, há referências ao denominado “parto post mortem”, que ocorreria na mulher
grávida que vai a óbito e que, durante a fase enfisematosa do processo putrefativo, expulsa o feto por via vaginal,
pela pressão intra-abdominal dos gases. Nestes casos, pode-se verificar, outrossim, um extenso prolapso uterino,
em geral com eversão completa, encontrando-se o feto entre as coxas do cadáver. Este é mais um achado de
exumação, às vezes anos depois do fato, quando da redução ou transferência dos restos mortais.
Nos casos em que a morte da mulher gestante ocorre durante o parto, ou mesmo logo antes, com o feto
de termo e vivo, dão-se as condições exigíveis para realizar um parto cesáreo post mortem.
Avaliando-se, criteriosamente, todos os dados possíveis de obter mediante o exame necroscópico, o
médico perito legista terá elementos suficientes para poder extrair suas conclusões, no que poderá auxiliar-se,
ainda, de exames complementares.

5.3 Pericia Médico-Legal no Aborto

A perícia procurará demonstrar a existência de uma gestação pregressa do respectivo abortamento e dos
meios postos em ação para alcançá-lo; também estudará a personalidade da gestante e do possível agente, para
determinar a idade, o estado mental, a possibilidade de violência, lesões várias etc. Não faltará, quando possível, o
exame do produto/material expelido, para bem ser caracterizada a espécie. É oportuno recordar a distinção entre
o conceito obstétrico e médico-legal de aborto.

5.4 Perícia de Aborto In Vivo

Em pericias deste jaez, todos os cuidados são imperativos. Ainda que se trate de um flagrante, em que se
encontre o agente praticando o abortamento e a mulher grávida sendo submetida a citado procedimento,
desnecessário mencionar a exigência de rodear o ato de coleta, de materiais e de informações, dos maiores
cuidados, visando não prejudicar ou, até, descaracterizar a prova indiciária.
Com efeito, não é de estranhar que a gravidade do crime, as implicações do processo penal e as
consequências do apenamento induzam comportamentos esdrúxulos e aberrantes.

Por isso mesmo, o perito médico tratará de cercar-se de alguns cuidados, como:

a) Anamnese meticulosa, indagando:


• antecedentes ginecológicos e obstétricos;
• data da última menstruação;
• motivo de estar se prestando aquela prática;
• caracterização da personalidade da gestante e do possível agente;
• a idade;
• o estado mental;
• a possibilidade de violência;
• lesões corporais diversas.

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b) Exame ginecológico cuidadoso, pesquisando:


• sinais de probabilidade e/ou de certeza de gravidez;
• presença de hemorragia genital;
• verificar a cor da mucosa vaginal;
• presença de colostro;

5.5 Infanticidio

Intervenção pericial chamada crucis peritorum por sua complexidade para afirmar este crime. A perícia
médico-legal exige para a sua caracterização os seguintes elementos:
1) prova de ser nascente;
2) prova de infante nascido;
3) prova de recém-nascido;
4) prova de vida extra-uterina autônoma;
5) época da morte;
6) diagnóstico da causa jurídica da morte do infante;
7) exame somatopsíquico da puérpera.

5.6 Prova de Ser Nascente

O ser nascente poderá ser morto "durante o parto", ou seja, antes de ter respirado, portanto, quando
apenas um segmento corporal, ou parte, despontou (occipito), ou exteriorizou, mostrando, ao exame pericial, nele
assentadas as lesões causadoras da morte com as características das produzidas intra vitam, como a coagulação
do sangue, o afluxo leucocitário, a bossa sero-sanguinolenta, dentre outros.
a) Aqui não há indicação de provas respiratórias. O legisperito lançará mão das docimásias
circulatórias, já que, embora o ser nascente não tenha respirado, o sangue, entretanto, circulava nas
artérias. Assim é que a lei, durante o parto, não exige vida extra-uterina autônoma, mas, tão
somente, a existência de vida biológica, que se comprova, amiúde, pela circulação sanguínea.
b) A bossa sero-sanguinolenta, produzida pela diferença de pressão sofrida pelos segmentos corporais
do ser nascente, que se encontram, respectivamente, dentro do útero e no canal vaginal, é a prova
mais inconteste de que o concepto encontrava-se vivo ao iniciar-se o parto e durante sua travessia
pelo canal do mesmo. lsto porque, para formação da bossa sanguínea, tumor do parto ou caput
succedaneum e necessário feto vivo.
c) Não se confunde bossa sero-sanguinolenta com céfalo-hematoma. O céfalo-hematoma forma-se
um a quatro dias após o parto, na região occipital, pela invasão hemática da sutura. Fica limitado a
um osso enquanto a bossa sero-sanguinolenta é formada especialmente por liquido de edema que
atravessa as linhas de sutura craniana.

5.7 Prova de Infante Nascido

a) Infante nascido é o que acabou de nascer, isto é, o que, tendo sido expulso do álveo materno, não
recebeu nenhuma assistência, especialmente quanto a higiene corporal, ou ao tratamento do
cordão umbilical. É por isso que o corpo apresenta-se, total ou parcialmente, recoberto por sangue
materno ou fetal, o que se reveste de fundamental importância para a afirmação pericial de que o
crime ocorreu “logo após o parto”;
b) De importância é, também, a observação pericial de vários elementos, como o induto sebáceo ou
vernix caseosum, o tumor do parto, a expulsão de mecônio e a respiração autônoma;
c) No infante nascido, a termo, a estatura é, amiúde, 48 a 51cm, o peso entre 3.000 a 3.200g, na
menina, e 3.200 a 3.500g, no sexo masculino.
d) No varão, os testículos já se encontram nas bolsas escrotais. Perdem até 10% de seu peso ao nascer,
em seguida engordam 25 a 30g por dia. Portanto, são necessários 7 a 10 dias para readquirirem o
peso do nascimento.

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5.8 Prova do Recém-Nascido

1) O conceito médico-legal de caracterização do recém-nascido abrange um período que vai desde os


primeiros cuidados de higienização corporal, com consequente remoção, de sua superfície, de sangue
materno ou fetal, e pelo tratamento do cordão umbilical, após o delivramento, até o sétimo dia do
nascimento.

2) Aqui, também, o perito observará vários elementos orientadores, como:


a) bossa sero-sanguinolenta, tumor do parto ou caput succedaneum - formado durante a fase expulsiva
do parto, que regride paulatinamente até desaparecer ao fim do terceiro dia;
b) induto sebáceo – poderá, eventualmente, ser removido, quando da higienização do infante nascido;
c) mecônio: eliminado do primeiro ao terceiro dia;
d) coto do cordão umbilical - achatado no primeiro dia, com formação inicial da orla de eliminação, nas
primeiras horas, tornando-se dessecado e coriáceo, no terceiro dia, seguido de sua queda até o sétimo dia;
e) descamação epidérmica – tóraco-abdominal, inicia-se no segundo dia pós parto, atingindo grau
máximo em tomo do décimo dia;
f) mielinização do nervo óptico - inicia-se ao fim do primeiro dia, no vivo, apresentando-se
completamente mielinizado ao fim do quarto ou quinto dia;
g) obliteração dos vasos umbilicais - do oitavo dia em diante;
h) respiração autônoma.

Prova de vida extra-uterina autônoma

Para a comprovação do nascimento com vida, ou seja, de que o ser humano respirou, utiliza-se
obrigatoriamente um conjunto de provas denominadas docimásias (do grego dokimasia) e pelas provas
ocasionais. As docimásias baseiam-se na possível existência de sinais de vida, manifestados principalmente nas
funções respiratórias, digestivas e circulatórias.
Ressalte-se, por oportuno, que o laudo pericial deve obrigatoriamente esclarecer qual a docimásia
pulmonar ou respiratória empregada para a afirmação conclusiva de que a vítima nasceu com vida, pois a não-
obediência a esta metodização desprove a pericia médico-legal da necessária fundamentação para comprovar a
materialidade do infanticídio. Sobre esta questão:

a) Docimasia hidrostática pulmonar de Galeno - a mais antiga e, por prática, usada correntemente.
Baseia-se na densidade do pulmão que respirou e do que não respirou. O pulmão que respirou tem densidade
entre 0,70 a 0,80. Em condições normais de pressão e temperatura, a densidade da água é de 1,0. Posto em
recipiente contendo água em temperatura ambiente, o pulmão que respirou forçosamente flutuará, pois seu peso
específico é mais leve que o da água; inversamente, o pulmão que não respirou não sobrenadará, por ter peso
específico maior que o da água, ou seja, em torno de 1,040 a 1,092 Essa docimásia comporta quatro fases
distintas, a saber:

1ª fase: em um recipiente suficientemente fundo e largo, contendo água até 2/3 de sua altura, em
temperatura ambiente, coloca-se, em bloco, a árvore traqueobrônquica, a língua, os pulmões, o timo e o coração,
e observa-se se flutua por inteiro, a meia água, ou se afunda.
2ª fase: separados pelos hilos, os pulmões das demais vísceras no fundo do vaso, se eles sobrenadam
por inteiro ou a meia água, diz-se positiva a prova, sendo, segundo alguns, desnecessário seguir avante.
3ª fase: incisar um pulmão inteiro no fundo do reservatório com água e observar se algumas ou todas as
suas partes flutuam, o que confere positividade a prova. A prova será dita negativa, impondo a pesquisa da 4ª
fase, se todos os fragmentos pulmonares permanecerem no fundo do vaso.
4ª fase: consiste em comprimir energicamente, pela mão voltada para a superfície ou contra a parede do
vaso contendo água, um fragmento de pulmão que não tenha flutuado. Verificando-se que ocorre
desprendimento de finas bolhas gasosas misturadas com sangue, a fase é considerada positiva.

Deve o perito realizar sempre as quatro fases da docimásia hidrostática pulmonar de Galeno, pois se Ihe
obriga fundamentar suas assertivas, buscando a maior exatidão, porque se a primeira for positiva presume-se que

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o infante respirou satisfatoriamente; se a primeira fase for negativa e a segunda e a terceira fase positivas,
conjetura-se ter ocorrido uma respiração precária; e, finalmente, se apenas a quarta fase for positiva, pela
exteriorização de espuma com borbulhas sanguinolentas, conclui-se por prova duvidosa ou por ter havido raros
movimentos respiratórios. Desnecessário dizer que se opinará pela inexistência de respiração, ou seja, por não-
existência de vida extra-uterina, se as quatro fases forem negativas.
Importa saber que a docimásia hidrostática pulmonar de Galeno, 24 horas após a morte do recém-nato,
está sujeita a falhas por interferência dos gases de putrefação, da insuflação de ar nos pulmões de recém-natos
que receberam assistência médica, da congelação, da conservação em álcool, da atelectasia secundária, etc. Por
isso é que se recomenda ao perito, complementar as suas observações com a docimásia gastrintestinal de Breslau.
Essa complementação deveria ser feita obrigatoriamente pela docimásia histológica de Balthazard, que, mesmo
nos pulmões putrefeitos, comprova se o infante nascido respirou ou não.

b) Docimasia histológica de Balthazard - Consiste no exame histológico dos cortes dos pulmões, ao
microscópio, segundo técnica comum.

No pulmão do natimorto os gases de putrefação desenvolvem-se no tecido conjuntivo, colabando as


cavidades alveolares, enquanto no recém-nato que respirou os gases formam-se nos alvéolos, destruindo os
septos e condensando o tecido conjuntivo. Se já ocorreu destruição do tecido alveolar pelo fenômeno
transformativo da putrefação, devem-se examinar as fibras elásticas pelo método de Weigert, ou ainda, se estas já
foram destruídas, impregnando o retículo fibrilar pelo método de Levi-Bilschowsky, ambos com a finalidade de
observar a disposição arquitetônica celular distendida ou não, conforme tenham os pulmões respirado ou não.
Destaque-se que as docimásias pulmonar de Galeno e histológica de Balthazard são despidas de valor
nos fetos carbonizados.

c) Docimásia diafragmática de Plocquet - A abertura da cavidade tóraco-abdominal do cadáver permite


visualizar as hemicúpulas diafragmáticas em convexidade exagerada, caso os pulmões não tenham respirado, e em
posição horizontalizada, quando a respiração autônoma existiu.

d) Docimasia óptica ou visual de Bouchut - A inspeção direta do pulmão registra aspecto hepatizado do
órgão, quando o feto não respirou, e superfície em mosaico, se ocorreu respiração autônoma.

e) Docimasia radiológica de Borda - Os campos pleuropulmonares de quem respirou apresentam-se aos


raios X com tonalidade escurecida. Os pulmões que não respiraram, bem como os portadores de graus variáveis
de atelectasia, ou pneumonia mostram opacidade aos raios de Roentgen, em forma de punho ou triangular, o que
diminui o valor pratico da prova.

f) Docimasia gastrintestinal de Breslau - Tem indicação em recém-nascido espostejado, do qual somente


se conserva o abdome. Consiste na imersão em água do aparelho gastrintestinal separado em vários segmentos
por prévias ligaduras da cárdia, do piloro, da porção terminal do intestino delgado e do reto, observando-se se
sobrenadam, ou não, todos ou alguns.
Em seguida, incisam-se os vários segmentos do tubo digestivo entre as diferentes ligaduras, presumindo-
se, se eles flutuam, que a prova é positiva. Fundamenta-se no fato de que, com os primeiros movimentos
respiratórios, ocorre deglutição de ar, que se instala no estômago nas primeiras horas, e no intestino mais
tardiamente.

g) Docimásia auricular de Wreden-Wendt-Gélé - praticada em infante espostejado do qual somente se


dispõe da cabeça. Baseia-se na existência de ar no ouvido médio, levado através das tubas auditivas, nos primeiros
movimentos respiratórios e de deglutição do infante nascido vivo. Visualizado o tímpano, prévia exposição do
conduto auditivo externo e da parede inferior e sua secção em duas metades, com tesoura, conforme a técnica de
Filomusi-Guelfi, mergulha-se a cabeça dentro d’água, e com uma agulha grossa punciona-se a rnembrana,
presumindo-se que houve respiração se do ouvido médio sair uma bolha gasosa que se rompe na superfície do
liquido.

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h) Docimasia epimicroscópica pneumo-arquitetônica de Hilario Veiga de Carvalho - Corta-se o pulmão,


previamente lavado em formalina, goteja-se glicerina sobre os fragmentos colocados numa placa de Petri e
observa-se com objetiva de imersão: se houve respiração autônoma, os alvéolos pulmonares mostram-se
regulamente distribuídos e arredondados, com refringência contrastada em fundo negro; em caso contrário,
visualiza-se um fundo negro sem imagens. No pulmão putrefeito, as cavidades cheias de gás de putrefação são
grandes, disformes e de distribuição irregular.

i) Docimásias hidrostáticas de Icard - complementam a docimásia pulmonar de Galeno nos casos


duvidosos ou quando apenas a 4ª fase se positivou. Elas são feitas por aspiração e por imersão em água quente.

j) Docimásia por aspiração: os fragmentos dos pulmões são colocados em um frasco contendo água fria
até a altura do gargalo, o qual é fechado com rolha perfurada de borracha, adaptada a uma cânula e seringa de
metal, destinadas a diminuir a pressão interna do recipiente por rarefação do ar e estabelecer um equilíbrio com o
ar alveolar. Isto faz com que os pedaços analisados aumentem de volume e flutuem, conferindo, nesse caso,
positividade a prova.

k) Docimásia por imersão: os fragmentos do pulmão que não sobrenadaram são imersos em um
recipiente contendo água quente para que, depois de algum tempo, o calor dilate o ar alveolar, se existente,
favorecendo a flutuação dos pedaços.

l) Docimásia pneumo-hepática de Puccinotti - Segundo esse autor, é possível concluir se houve ou não
respiração autônoma pela determinação da quantidade de sangue encontrada no fígado e no pulmão. Este, se
respirou, mostra peso específico menor que o do fígado.

m) Docimasia hemato-pneumo-hepática de Severi - Consiste na colheita de sangue no fígado e no


pulmão, determinando-se, cuidadosamente, as taxas de hemoglobina; se forem idênticas, obviamente não houve
respiração. Em contrapartida, taxa de hemoglobina mais alta no sangue do pulmão fala a favor de respiração
autônoma.

n) Prova hemato-arteriovenosa de França - Indicada se de um espostejamento restar apenas um


membro, superior ou inferior. Consiste, em dissecarem-se as artérias e as veias com coleta separada de sangue,
procedendo-se, a seguir, a uma cuidadosa dosagem da oxiemoglobina de ambas as amostras. Conclui-se ter
havido hematose e, consequentemente, respiração, se a taxa de oxiemoglobina mostrar-se mais alta no sangue
arterial. Supondo sejam idênticas as taxas, confirma-se a não-respiração.

o) Provas ocasionais: representadas pela presença de corpos estranhos nas vias respiratórias e de restos
alimentares no tubo digestivo, e pelas reações vitais encontradas na vitima de infanticídio, além de indícios de
recém-nascimento. Quando associadas às docimásias afirmativas de respiração, revestem-se de grande
importância para a conclusão pericial de ocorrência de vida extra-uterina.

6. SEXOLOGIA CRIMINAL

6.1 Perícia na Conjunção Carnal e Himenologia

O exame pericial, nos casos de conjunção carnal, além de bastante complexo e minucioso, implica a
coleta de uma serie de informações, em sua maioria perecíveis, e que ao final hão de ser analisadas no conjunto
probatório técnico-científico, em sua plenitude.
Nesse sentido, a perícia médico legal, nos casos de conjunção carnal – cuja sequência poderá ser
utilizada, também, mutatis mutandis, nos casos de outros atos libidinosos - deverá passar, necessariamente, pelas
seguintes fases:
1. lnspeção ectoscópica do corpo inteiro, com luz natural visando detectar lesões corporais,
especialmente na região genital e paragenital, bem como outras zonas erógenas (pescoço, mamas, coxas);

2. Exame das mesmas regiões com luz ultravioleta filtrada (lâmpada de Wood);

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3. Exame da região genital, em especial da vulva e do hímen, a vista desarmada e, se possível, com
auxílio de colposcópio;

4. Colheita de material vaginal, para:


- pesquisa de espermatozóides;
- pesquisa de proteína prostática p30;
- identificação de DNA.

 Colheita de material das regiões cutâneas que mostraram fluorescência positiva, para pesquisa de
esperma ou de DNA do agressor;
 Identificação do perfil de DNA da vitima;
 Colheita de sangue para realizar exames sorológicos visando detectar doenças sexualmente
transmissíveis (DST).

= Inspeção ectoscópica do corpo inteiro =

Antes de proceder a qualquer colheita de materiais para estudo laboratorial, a primeira medida é o
exame ectoscópico, sem instrumentos, do quadro Iesional somático como um todo. Assim, deverão ser
procuradas e registradas as lesões, fazendo-se um inventário, de modo a caracterizar as:
 lesões de imobilização ou sujeição;
 lesões de deslocamento ou arrasto;
 lesões derivadas de atos Iibidinosos, em geral;
 lesões derivadas da conjunção carnal.

= Exame com luz ultravioleta filtrada (lâmpada de Wood) =

A lâmpada de Wood emite luz ultravioleta, que é filtrada, de modo que são liberadas apenas as
radiações com um comprimento de onda entre 330 nm e 400 nm, que excitam certas substâncias, as quais, em
seguida, emitem fluorescência.
Uma dessas substâncias é o sêmen, que dessa forma pode ser detectado sobre a pele, até 72 horas
depois da agressão, desde que a região não tenha sido lavada. A detecção da fluorescência do sêmen sobre a pele
é de inestimável auxílio nos casos em que a vítima está em estado de coma, em estado de choque ou, pela sua
curta idade, não tem maneira de expressar-se e contar o acontecido.
É sabido que com a lâmpada de Wood é possível observar-se fluorescência sobre a pele, em razão de
outras causas que não apenas a presença de sêmen humano. No grupo das substâncias responsáveis pelos falsos
positivos, encontramos:
 as fórmulas lácteas;
 algumas colas;
 as loções suavizantes para pele;
 a vaselina líquida;
 a urina.

6.2 Exame da Região Genital

O exame da região genitoperineal da vítima deve seguir a sequência, verificando-se:

 presença de lesões na área (hipogástrio, monte de Vênus, região inguinocrural, região proximal das
coxas, região perineal, região perianal e ânus);
 presença de lesões vulvares (em lábios maiores, lábios menores, clitóris, vestíbulo, hímen, fossa
navicular e fúrcula);
 Himenologia, de modo a caracterizar lesões (equimoses, escoriações, roturas completas e
incompletas, esgarçamentos, Iacerações); esta avaliação deve incluir:

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- observação com luz ultravioleta filtrada (lâmpada de Wood);


- Observação com lupa ou colposcópio;
- diferenciar roturas de entalhes congênitos;
- introdução de espéculo vaginal (se possível).

= Colheita de material vaginal =

A colheita de material vaginal deve ser feita, preferencialmente, do fundo de saco posterior da vagina e
do orifício externo do cérvix. O material deve ser colhido de forma que o seu volume seja o mais abundante
possível. Não esquecer que se trata de materiais perecíveis e que a oportunidade de colhê-los é única.

O material colhido deverá ser dividido a fim de ser submetido a diferentes exames, como:
 pesquisa de espermatozóides vivos, em gota suspensa, entre lâmina e lamínula;
 exame de DNA imediato, para confronto, a fim de identificar algum agente suspeito;
 exame de DNA mediato, quando não há suspeito, sendo que neste caso o material vaginal deve ser
armazenado, deixando-o secar e guardando-o em recipiente (rotulado e lacrado);
 avaliação microbiológica, para identificação de eventuais microrganismos patogênicos (gonococos,
clamídias etc.).

6.3 Identificação de espermatozóides

A presença de esperma na vagina pode ser constatada pelo achado de espermatozóides, móveis ou não,
nas gotas suspensas ou nos esfregaços preparados a partir do material colhido na vagina. Durante a perícia, colhe-
se, com espátula de Ayres ou com pipeta, o conteúdo da cavidade vaginal, especialmente no canal cervical e no
fundo de saco posterior. Transporta-se o colhido para a avaliação laboratorial.
O resultado positivo da pesquisa de esperma na vagina, no caso de hímen rompido ou complacente, é
prova de conjunção carnal. Com efeito, nos casos em que o hímen é íntegro e daqueles que se romperiam à
introdução do pênis, o achado de esperma na vagina não significará conjunção carnal, mas apenas cópula vulvar
com ejaculação transhimenal.
O tempo é um fator decisivo da avaliação laboratorial. Sempre se deve insistir para que as vítimas
compareçam para a perícia, o mais rapidamente possível, em relação ao momento do assalto sexual.
À medida que passam as horas desde o assalto sexual, considera-se que a ejaculação intravaginal, de
regra parcial e resistida, tende a diminuir de forma exponencial. A pesquisa nas lâminas não é tarefa fácil. Isso,
muitas vezes, coloca o médico-legista ou o laboratorista em situações constrangedoras, pois, após vasculhar
exaustivamente toda uma lâmina, tentando encontrar pelo menos um espermatozóide, em um caso flagrante de
conjunção carnal, às vezes não encontra nenhum. Tal fato, em geral, parece incompreensível para as autoridades e
para as partes, mas é uma possibilidade. De certa forma, torna o método de pesquisa de espermatozóides - que,
quando positivo, é de certeza - um procedimento de baixa sensibilidade.

Em acréscimo, mister lembrar situações como o caso dos agressores azoospérmicos ou o dos
oligozoospérmicos:
 vasectomizados (no Brasil, aproximadamente 300 mil por ano),
 portadores de doenças testiculares pregressas ou atuais (orquite pós-caxumba, pós-tuberculose,
pós-blenorragia, por criptorquidia bilateral, por anorquidia e/ou tumores),
 portadores de insuficiência fisiológica testicular, puberal ou senil.
A pesquisa de espermatozóides em lâmina tem maiores chances (oligozoospermia) ou todas as chances
(azoospermia) de ser negativa, mesmo na ocorrência de uma violência sexual manifesta. Assim não se pode excluir
outros métodos complementares de exame.

6.4 Pesquisa de Proteína Prostática P30

A proteína prostática - p30 - cognominada antígeno específico prostático, ou PSA, é encontrada no


liquido seminal e na urina do homem, sendo certo que, em condições normais, estará ausente de quaisquer
outros liquido ou tecidos do homem e, a fortiori, da mulher.

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Elevados valores de PSA (p3O) indicam de maneira incontroversa que houve ejaculação intravaginal, com
idêntico significado médico-legal do achado de esperma na vagina.

6.5 Identificação de DNA

No material colhido na vagina, ainda que exíguo, poderá ser efetuada a identificação do perfil de DNA do
agressor. Em havendo um suspeito ou acusado, a comparação poderá ser feita de imediato. Caso contrário, o
material poderá ser conservado, deixando-se secar a amostra sobre papel de filtro e guardando-a, em recipiente
lacrado e rotulado, armazenado em local próprio, até surgir oportunidade de fazer o cotejo.
A técnica da PCR permitirá, utilizando mínimas quantidades do material colhido e secado à época,
sequenciar perfis comparativos, utilizando loci específicos:
 no material problema;
 na vitima;
 no suposto agressor.

É curial que a superposição dos perfis do material colhido na vagina da vítima, logo após o assalto
sexual, com os do agressor, permitirá identificá-lo de maneira incontroversa ou, caso contrário, excluir
definitivamente o individuo do rol dos suspeitos.

Colheita de Material das Regiões Cutâneas com Fluorescência Positiva

Identificada uma zona cutânea que exiba fluorescência com a lâmpada de Wood, e que, por essa razão,
poderia conter esperma, deverá proceder-se a sua retirada para pesquisa laboratorial de sêmen ou do perfil de
DNA do agressor.
Caso o material estiver ainda fresco, bastará removê-lo com um swab ou cotonete. Caso já esteja seco, o
material deverá ser umedecido com salina e retirado cuidadosamente com um swab, que absorverá a salina e os
restos de esperma porventura existentes no local. A seguir esse swab é colocado em um tubo, com tampa, e
encaminhado para o laboratório onde se procederá a identificação de sêmen; se positiva, poderá traçar-se o perfil
do DNA do agente.

6.6 Perfil de DNA da vitima

Será necessário, para conhecer suas características na hora de efetuar comparações. Com efeito, porque
muitas vezes se trabalha com materiais que são verdadeiros “pools” ou misturas - e.g., secreção vaginal com
sangue e esperma - é de singular importância conhecer o perfil sorológico e do DNA da vitima para, quando
estudada a amostra, poder subtrair da mesma aquilo que necessariamente é dela. Os achados a mais serão
oriundos do(s) agressor(es).

Colheita de sangue para exames sorológicos

Visando detectar doenças sexualmente transmissíveis (DST) faz-se necessário obter amostras sanguíneas
da vítima, por venopunção. Os exames deverão ser repetidos nos 30, 60 e 90 dias, a contar da data do assalto
sexual.

6.7 Provas indiretas de conjunção carnal

Há provas indiretas da conjunção carnal que podem escapar das observações rotineiras e tradicionais.
Com efeito, o achado de pêlos pubianos, de cromatina sexual masculina ou de doenças sexualmente
transmissíveis (e.g., condiloma acuminado), profundamente situados na cavidade vaginal ou sobre o colo uterino,
também pode transformar-se em silente testemunho de que houve amplexo carnal.

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6.8 Perícia no Ato Libidinoso Diverso da Conjunção Carnal

Nessa esteira, a perícia médico-legal, deverá passar pelas seguintes fases:

 Inspeção ectoscópica do corpo inteiro, com luz natural, visando detectar lesões corporais, lato sensu,
especialmente na região anal e perianal, bem como outras zonas erógenas (pescoço, mamas, coxas etc.);
 Exame das mesmas regiões com luz ultravioleta filtrada (lâmpada de Wood);
 Exame da região anal e perineal, à vista desarmada e, se possível, com o auxílio de lupa ou
colposcópio;
 Colheita de material ano-retal para:
- pesquisa de espermatozóides;
- pesquisa de proteína prostática p30;
- identificação de DNA.

 Colheita de material das regiões cutâneas que mostraram fluorescência positiva;


 Identificação do perfil de DNA da vítima;
 Colheita de sangue para realizar exames sorológicos visando detectar doenças sexualmente
transmissíveis (DST).

6.9 Inspeção ectoscópica do corpo inteiro

Antes de proceder a qualquer colheita de materiais para estudo Iaboratorial, a primeira medida é o
exame ectoscópico, sem instrumentos e a vista desarmada, do quadro Iesional somático como um todo. Assim,
deverão ser procuradas e registradas as lesões, fazendo-se um inventário, de modo a caracterizar:
 lesões de imobilização ou sujeição;
 lesões de silenciamento ou homicídio (tentado ou consumado);
 lesões de deslocamento ou arrasto;
 lesões derivadas de atos libidinosos, em geral;
 lesões derivadas da cópula anal.

Através da inspeção ectoscópica, o médico-Iegista terá condições de colher informações que lhe
possibilitarão recompor, a posteriori, a sequência dos fatos ocorridos durante o assalto sexual.

6.10 Exame com luz ultravioleta filtrada (Iâmpada de Wood)

A lâmpada de Wood emite luz ultravioleta, que é filtrada, de modo que são liberadas apenas as
radiações com um comprimento de onda entre 330 nm e 400 nm, que excitam certas substancias as quais, a
seguir, emitem fluorescência.
Como mencionado, é um fato conhecido que com a Lâmpada de Wood pode observar-se fluorescência
sobre a pele, em face da presença de outros elementos que não exatamente o sêmen humano: este grupo
constituirá os resultados falsos positivos. Isso deverá ser levado sempre em consideração, sem que, contudo, deixe
de ser colhido material dessas regiões fluorescentes para estudo e pesquisa das características do sêmen, o que
permitirá diferenciá-lo das outras substancias que possam também exibir uma fluorescência positiva.

No grupo das substâncias responsáveis pelos falsos positivos, encontramos:

o leite inteiro, tipo A ou B;


algumas colas;
as loções suavizantes para pele;
a vaselina líquida;
os cremes que contenham algum desses produtos;
urina.

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6.11 Exame da região anal

O exame da região genitoperineal da vítima deve seguir a sequência enunciada no início, verificando-se:
 presença de lesões na área (hipogástrio, monte de Venus, região inguinocrural, região proximal das
coxas, região perineal, região perianal e ânus)
 exame específico do ânus, de modo a caracterizar lesões (equimoses, escoriações, rágades etc.). Este
exame deve incluir:
- observação com luz ultravioleta filtrada (lâmpada de Wood),
- observação com lupa ou colposcópio,
- aplicação de solução de azul de toluidlna para identificar a recenticidade das lesões,
- diferenciar rágades de fissuras,
- registro fotográfico dos principais achados macroscópicos
 toque retal (utilizando o dedo mínimo, em crianças), visando verificar a tonicidade do esfincter;
 introdução do anuscópio:
- infantil ou sempre de tamanho menor que o que corresponderia a vitima,
- de preferência, dos descartáveis de acrílico ou tipo de plástico transparente,
- que facilita a observação de lesões das paredes do canal anal,
- que possibilita a colheita de material do canal anal e/ou da ampola retal, para exames laboratoriais.

O exame deve ser feito com a vítima em posição genupeitoral ou em decúbito lateral, com boa
iluminação, o que permite reconhecer melhor o orifício anal. Os glúteos devem ser separados (de preferência por
um auxiliar, de modo a que as mãos do examinador fiquem livres), revistando-se a seguir as pregas anais, de
forma ordenada e completa.
O toque retal, visando avaliar a tonicidade do esfincter muscular, deve ser feito de preferência com o 5°
quirodáctilo (mínimo), no caso de crianças, e sempre que possível, ratificado pela manometria instrumental.
O diagnóstico de certeza do coitus contra naturam somente é possível no atentado agudo quando, além
das lesões traumáticas verifica-se:
 rágades (rágadas),
 hemorragia,
 equimoses,
 congestão,
 edema,
 hipotonia esfincteriana, quando pode ser encontrado sêmen na ampola fetal.

A ocorrência de lesões anorretais dependerá, a semelhança do que vimos no coito vagínico, da violência
com que se tenha perpetrado o ato sexual e da desproporção de volume entre as parte anatômicas, o que pode
ensejar rágades das pregas do esfincter anal, escoriações etc.
É recomendável que o exame seja realizado o mais rapidamente possível, pois dessa forma poderá
encontrar-se inclusive paralisia pós-traumática, imediata, do esfincter anal, com dilatação e disposição em forma
de funil, a partir do esfíncter anal com dilatação em direção a mucosa retal.
Quando o exame é realizado tardiamente, é bem provável que já não se encontrem mais as lesões
elencadas, o que não exclui que tenha havido um coito anal. Todavia, a presença de esperma no canal anal ou na
ampola retal é um importante elemento a corroborar a agressão. Mister lembrar que, na ampola retal, a sobrevida
dos espermatozóides não supera seis (6) horas.
Durante a penetração anal, a distensão local do esfincter e da pele acaba por produzir rágadas ou
rágades, fendas longitudinais agudas, instantâneas, do revestimento cutâneo do ânus e do canal anal, lesões
características e patognomônicas desta modalidade de ato libidinoso.
Um dos pontos críticos do exame médico-legal do coito anal é a diferenciação entre as rágades e as
fissuras anais que podem preexistir na vitima.
As rágades são esgarçamentos longitudinais da cobertura epitelial, sem localização fixa, produzidos pela
dilatação brusca do canal anal, que deixam em exposição a derme ou a hipoderme, no seu fundo.

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A fissura anal, por sua vez, é uma laceração ou fenda longitudinal do epitélio estratificado plano,
queratinizado, da região do ânus, uma ulceração ovóide, crônica, do canal anal. Ao lado da dor, o abscesso, a
fistula e as hemorragias são as complicações mais frequentes. Todavia, em geral, o sangramento da fissura anal é
pequeno e acompanha o ato da defecação, que é sempre doloroso.
O diagnostico diferencial entre rágades, traumáticas, e a fissura, patológica, é feito atentando para as
características que se veem no quadro a seguir:

Características Fissura Rágades


Etiologia desconhecida Traumática
Evolução crônica Aguda
Número em geral, única, Múltiplas
Localização preferencial linha media posterior, às 12h Sem preferência de local
Localização secundaria linha media anterior, às 6hs Sem preferência de local
Forma ulceração ovóide Fendas longitudinais
Extremidade inferior plicoma sentinela Sem peculiaridades
Extremidade superior papila hipertrótica Sem peculiaridades
Tonicidade do esfíncter hipertonia,espasmo Hipotonia imediata
Sangramento crônico, escasso Agudo, imediato
Complicações abscesso Nenhuma
Cicatrização em geral, pós-cirúrgica Espontânea

Bonnet ressalta que alguns dos sinais das fissuras podem ser decorrentes de quadros clínicos outros,
como:
 diarréias profusas;
 constipação;
 parasitoses (e.g., oxiuríase), com prurido;
 doenças dermatológicas;
 introdução de corpos estranhos.

6.12 Colheita de material anorretal

A colheita de material anorretal deve ser feita, inicialmente, do canal anal, e apenas com swab, sem o
uso de anuscópio. Em uma segunda fase, quando colocado o anuscópio para identificar lesões mais profundas,
será possível colher material da ampola fetal. Não há de esquecer que se trata de materiais perecíveis e que a
oportunidade de colhê-los é única e irrepetível.

6.13 Colheita de material das regiões cutâneas

Identificada uma zona cutânea que exiba fluorescência com a lâmpada de Wood e que, por essa razão,
poderia conter esperma, deverá proceder-se a sua retirada para pesquisa Iaboratorial de sêmen ou do perfil de
DNA do agressor.
Caso o material estiver ainda fresco, bastará removê-lo com um swab. Caso já esteja seco, o material
deverá ser umedecido com salina e retirado cuidadosamente com um swab, que absorverá a salina e os restos de
sêmen porventura existentes no local. A seguir, o swab é colocado em um tubo, com tampa, e encaminhado para
o laboratório onde se procedera a identificação de esperma e, se positiva, poderá tragar-se o perfil do DNA do
agente.
Em torno das marcas de mordida eventuais, é possível encontrar-se manchas de saliva que, uma vez
individualizadas, poderão ser utilizadas para, do agressor, traçar o seu perfil de DNA.
Procede-se de maneira análoga para manchas de esperma. Com um swab umedecido em salina se “lava”
a pele em torno da mordida, sendo certo que a remessa do cotonete para o laboratório deve cercar-se das
cautelas habituais para amostras biológicas criminais (tubos separados, rotulagem, evitar contaminações etc.).

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O resultado Iaboratorial deverá ser interpretado usando os mesmos critérios apontados para as manchas
de esperma. É cediço que a superposições dos perfis do material colhido ao redor da mordida, com os do acusado,
permitirá identificá-lo ou excluí-lo do rol dos suspeitos, de maneira incontroversa e definitiva.

Perfil de DNA da vitima

Será necessário para conhecer-lhe as características no momento de efetuar comparações. Com efeito,
porque muitas vezes se trabalha com materiais que são verdadeiros pools ou misturas, onde há sêmen e sangue
que tanto podem ser da vítima como do agressor, será de singular importância conhecer o perfil sorológico e do
DNA da vítima, para, quando estudada a amostra, poder “subtrair” da mesma aquilo que necessariamente é dela.
Os achados excedentes serão oriundos do(s) agressor(es).

6.14 Colheita de sangue para exames sorológicos

Visando detectar doenças sexualmente transmissíveis (DST), faz-se necessário obter amostras
sanguíneas da vítima, por venopunção. Os exames deverão ser repetidos nos 30, 60 e 90 dias, a contar da data do
assalto sexual.
Provas indiretas do ato libidinoso diverso da conjunção carnal
Vide comentários da conjunção carnal, mas localizada na região anal ou dentro do canal anal.

7. SEXOLOGIA CRIMINAL E CRIMES CONTRA A HONRA

CÓDIGO PENAL – PARTE ESPECIAL - TÍTULO I - DOS CRIMES CONTRA A PESSOA

CAPÍTULO V - DOS CRIMES CONTRA A HONRA

CALÚNIA (art. 138) - Caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato definido como Crime.
DIFAMAÇÃO (art. 139) - Difamar alguém, imputando-lhe fato ofensivo à sua Reputação.
INJÚRIA (art. 140) - Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro.
PERÍCIA DE CONSTATAÇÃO DE VIRGINDADE. Aspectos periciais semelhantes ao crime de estupro,
precipuamente a himenologia.

8. SEXOLOGIA CRIMINAL E CORPOS ESTRANHOS

Eventualmente, as unidades prisionais encaminham, ao serviço de Medicina Legal, mulheres com


suspeita de carrearem, durante horário de visitas aos presidiários, corpos estranhos na cavidade vaginal ou retal.
Nessas situações, deve-se proceder a avaliação genitoperineal, com aposição de espéculos (vaginal e anal) e uso
de pinças, bem como realização de toque vaginal e retal a fim de flagrar corpos estranhos nessas regiões para fins
de ingresso no sistema penitenciário (v. g., drogas ilícitas, pen drive, celular, dentre outros).
Deve-se entregar o corpo estranho extraído ao agente prisional que acompanha a ocorrência a fim de
que se direcione para perícia específica do objeto.
(Vide Decreto 25.050 de 14 de julho de 1998 que dispõe sobre o sistema de revistas nos
estabelecimentos penais do Estado do Ceará e dá outras providências, Publicado no DOE de 16/07/98).

9. SEXOLOGIA FORENSE NA PRÁTICA CIVIL

Relaciona-se a questões jurídicas envolvendo a determinação da paternidade/maternidade e alterações


no sexo jurídico

9.1 Perícia e Doutrina

Levantamento dos Dados Históricos


O histórico, no exame de investigação de filiação, é elaborado com a versão dada ao caso pelas partes e
com os dados constantes dos autos do processo.

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Devem constar os dados referentes ao conhecimento das partes, a coabitação, a época do provável coito
fecundante á gestação; a convivência, a assistência; a época, o local e o tipo do parto; o registro do nascimento, o
desentendimento entre as partes.
Do histórico do processo judicial, constam: a data do início da ação, as alegações evocadas na fase inicial,
as fases mais importantes do andamento do processo, a solicitação de perícia, a formulação de quesitos, a
nomeação do perito.

9.2 Exames Subjetivo, Objetivo e Complementares

Toda segurança, com respeito à identificação das partes, é necessária. Essa identificação é feita por meio
de documentos e de reconhecimentos mútuos quando do exame clínico e por ocasião da colheita de sangue e
saliva, para evitar qualquer substituição de pessoas.
O exame subjetivo é feito para facilitar um melhor relacionamento entre o perito e o examinado.
Durante essa etapa são analisadas as funções mentais e as características psíquicas das partes.
A seguir, passa-se ao exame objetivo, registrando-se o peso, a estatura, o biótipo, o tipo de crânio, o
formato do rosto, o tipo de cabelo, de nariz, de olhos, de lobo da orelha de cada examinado.
Os caracteres hereditários patológicos que forem observados e detectados são descritos com precisão. O
sangue e a saliva são colhidos para os exames imuno-hematológicos. No laboratório, determina-se o tipo de cada
examinado pelo maior número de sistemas possível.

9.3 Considerações Doutrinárias

Nessas considerações, têm-se presentes todos os achados dos exames antropológicos e laboratoriais
realizados, bem como a legislação e a doutrina médico-legal relacionadas com as provas médico-legais não
genéticas e as provas genéticas, tanto sanguínea quanto não-sanguínea.
Finalmente, têm-se presentes as tabelas organizadas para os diversos sistemas para a exclusão do
vínculo genético.

9.4 Provas Médico-Legais Não-Genéticas

São as relacionadas com a capacidade de procriação das partes e com a compatibilidade cronológica dos
fatos, tais como:
 Impotências generandi e concepiendi;
 Impotência coeundi e virgindidade;
 Período de coabitação e época do parto;
 Duração da gravidez e desenvolvimento fetal.

9.5 O Exame de DNA na Investigação de Paternidade/Maternidade

Existem duas metodologias para análise do DNA.


Uma baseia-se no estabelecimento dos padrões genéticos após a obtenção de fragmentos de restrição
de DNA dos indivíduos (polimorfismo de comprimento de fragmentos de restrição – RFLP).
A outra, mais usada na investigação criminalística, é conhecida como PCR (reação em cadeia da
polimerase). Representa uma poderosa ferramenta em virtude de sua facilidade, rapidez e automação,
minimizando riscos de contaminação da amostra.
Essa metodologia tem por base a elaboração e multiplicação de cópias, sendo conhecida como
“amplificação” de regiões hipervariáveis, catalisadas por uma enzima chamada DNA polimerase. Possibilita o uso
de mínimas quantidades de DNA, obtendo-se resultados satisfatórios.
Ao médico-legista ou perito do Juízo compete, nos casos de investigação de paternidade, coletar o
sangue da mãe, do filho e do suposto pai obedecendo às normas estabelecidas pelo laboratório que irá realizá-la,
lacrando material na vista das partes interessadas e elaborando um relatório de coleta, no qual deverão constar a
qualificação das pessoas envolvidas, a hora, a data e o local da coleta, que deverá ser encaminhado ao laboratório
juntamente com as amostras.

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O exame de DNA permite um cálculo estatístico de probabilidade, portanto sempre possibilitando uma
margem de erro ínfima, estatisticamente insignificante.
O laboratório de genética deve ter equipamentos necessários com permanente manutenção e
assistência técnica e um rigoroso controle de qualidade devido a: erro humano, erro de técnica ou de cálculo e
contaminação do material a ser examinado. .
Há casos em que o suposto pai/mãe já faleceu. Nesses, o juiz autoriza e determina uma exumação cível
visando a obter material biológico: osso (metade superior do fêmur), dentes (pré-molares e molares) e cabelos. O
perito deve fazer um relatório de exumação para retirada de material biológico e essa deve ser presenciada pelas
partes ou por seus advogados. O material coletado deve ser embalado e lacrado. O relatório deve ser ilustrativo
(com fotos) e explicativo, sendo encaminhado ao juiz e com cópia que deverá acompanhar o material que seguirá
para o laboratório de DNA Forense da PEFOCE.

9.6 Interpretação do Exame

O exame para verificação do vínculo genético tem valor absoluto quando exclui um filho a partir de um
casal; exclui um pai com relação a um filho, quando se tem como certa uma mãe; ou exclui uma mãe com relação
a um filho, quando se tem como certo um pai.
O exame de DNA para investigação de paternidade e/ou maternidade traz um resultado que pode chegar
a 99,9999...% de probabilidade de o indivíduo ser a mãe ou o pai biológico.
Esse resultado, com margem de erro estatístico insignificante, determina o pai/mãe biológico e
fundamenta a convicção do magistrado para construir sua sentença.

9.7 Anulação do Casamento

Para que a anulação de um casamento seja decretada, faz-se necessário o atendimento dos requisitos:
causal, cronológico e consequencial.
O requisito causal é a razão determinante da anulabilidade, isto é, são os motivos alegados para invalidar
o casamento.
Esses motivos são genericamente arrolados pela lei (Código Civil arts. 1.548, 1.550, 1.556 e 1.557) e
concretamente especificados pela perícia.

Art. 1.548. É nulo o casamento contraído:


I - pelo enfermo mental sem o necessário discernimento para os atos da vida civil;
II - por infringência de impedimento.

Art. 1.550. É anulável o casamento:


I - de quem não completou a idade mínima para casar;
II - do menor em idade núbil, quando não autorizado por seu representante legal;
III - por vício da vontade, nos termos dos arts. 1.556 a 1.558;
IV - do incapaz de consentir ou manifestar, de modo inequívoco, o consentimento;
V - realizado pelo mandatário, sem que ele ou o outro contraente soubesse da revogação do mandato, e
não sobrevindo coabitação entre os cônjuges;
VI - por incompetência da autoridade celebrante

Art. 1.556. O casamento pode ser anulado por vício da vontade, se houve por parte de um dos nubentes,
ao consentir, erro essencial quanto à pessoa do outro.

Art. 1.557. Considera-se erro essencial sobre a pessoa do outro cônjuge:


I - o que diz respeito à sua identidade, sua honra e boa fama, sendo esse erro tal que o seu conhecimento
ulterior torne insuportável a vida em comum ao cônjuge enganado;
II - a ignorância de crime, anterior ao casamento, que, por sua natureza, torne insuportável a vida
conjugal;
III - a ignorância, anterior ao casamento, de defeito físico irremediável, ou de moléstia grave e
transmissível, pelo contágio ou herança, capaz de pôr em risco a saúde do outro cônjuge ou de sua descendência;

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IV - a ignorância, anterior ao casamento, de doença mental grave que, por sua natureza, torne
insuportável a vida em comum ao cônjuge enganado.” Grifamos

1ª Devido a defeito físico irremediável:


 Deformidades genitais como: pseudo-hermafroditismo, agenesia vaginal, agenesia de pênis,
exigüidade peniana, gigantismo peniano, atresia vaginal etc.;
 Deformidades extragenitais repugnantes como: hirsutismo, amastia.;
 Impotência e anomalias sexuais como: impotência coendi, frigidez, anafrodisia, satiríase,
ninfomania, transsexualismo, homossexualismo, travestismo, sadismo e masoquismo.

2º Devido a moléstias graves:


Transmissíveis a outro cônjuge por contágio: sífilis, hanseníase, tuberculose, doença venérea etc.;
Transmissíveis à prole por herança: sífilis, epilepsia essencial, esquizofrenia essencial, oligofrenia,
personalidades psicopáticas.

9.8 Pseudo-Hermafroditismo

É condição sine qua non para que haja casamento a diferença de sexo entre os convolantes. Está
evidenciado o erro essencial sobre a pessoa do outro cônjuge quando este apresenta características sexuais
dúbias.
Sexo dúbio ou pseudo hermafroditismo é a anomalia morfológica em que as genitálias externas e
internas do indivíduo não estão bem definidas para qualquer um dos sexos.
Enquanto, portanto, o hermafroditismo é um estado bissexuado, o pseudo-hermafroditismo é um estado
intersexual masculino ou feminino. A literatura registra muitos casos de casamento de pseudo-hermafroditas
exatamente porque o próprio portador do defeito desconhecia a sua situação.

9.9 Outras Deformidades Genitais e Extragenitais

Entre outras deformidades genitais, de interesse médico-legal, destacamos a agenesia (ausência de


geração) e a atresia (defeito na formação) do tubo vaginal; o infantilismo e o gigantismo peniano; a hipospádia e a
epispádia; as cicatrizes viciosas, no períneo, retraindo a vulva ou o pênis e a elefantíase.
Entre as deformidades extragenitais estão a amastia, o hirsutismo, as cicatrizes e manchas repugnantes.
Todas são deformidades facilmente constadas pela perícia médica.
Impotência: é a incapacidade de o indivíduo, masculino ou feminino, levar a bom termo, para si e para o
parceiro, o ato sexual.
Alguns autores englobam como impotência a esterilidade masculina (generandi) e a feminina
(concepiendi), mas impotência verdadeira é a coeundi ou erigendi (masculina) e a coeundi ou acopulia (feminina).
A esterilidade masculina pode ser devido à azoospermia fisiológica, relacionada com a idade, e devido à
azoospermia patológica, relacionada com a anorquidia (eunucoidismo traumático e eunucoidismo congênito),
criptorquidia, hipoplasia testicular, orquite, dentre outras.
A esterilidade feminina pode ser fisiológica, devido à idade e ao período de lactação, e patológica,
devido a malformações congênitas ou a afecções genitais adquiridas.
A impotência masculina coeundi: pode ser orgânica/instrumental, devido à ausência de pênis,
malformações ou cicatrizes retráteis, volume peniano exíguo ou exagerado; funcional, que pode ser fisiológica
(imaturidade, senilidade) e patológica (psíquica e somática).
A impotência feminina coeundi pode ser orgânica ou instrumental, devido à atresia vaginal, rotura
acentuada do períneo; funcional, devido a perturbações miotônicas (vaginismo, dispareunia) e psíquica
(coitofobia).
A pericia na impotência masculina é complexa. O simples fato de a mulher permanecer virgem até a
época do exame não é sinal de impotência masculina. Deve-se utilizar além do exame físico, métodos
complementares de diagnóstico.
A arteriografia peniana é exame complementar possível, mostrando a falta de enchimento vascular na
impotência funcional.

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9.10 Hipoestesia e Singularidade da Libido

A frigidez, que não é rara, e a anafrodisia, que é incomum, por motivos óbvios, justificam a anulação do
casamento. A mulher frígida desconhece a sua condição ou se acomoda, ao longo de muitos anos, sem que o
marido perceba claramente. Quando a vida sexual conjugal vai ficando insípida, o prazo para a ação já foi
ultrapassado.
A satiríase e a ninfomania são consideradas, no início da vida conjugal, como entusiasmo do amor que
inibe o outro cônjuge de qualquer providência, por isso, também, raramente alegadas como motivos para anular
casamento.
O sadismo e o masoquismo, com todas as suas nuances, incomodam o outro parceiro e, por isso, são
motivos justos e constatáveis pela perícia.

Moléstias graves transmissíveis por contágio no outro cônjuge

A sífilis, a tuberculose, as doenças venéreas, a hanseníase são moléstias transmissíveis por contágio
direto ou indireto. A maior parte é curável, até por métodos relativamente baratos e fáceis, mas provocam
recaídas ao menor descuido, pondo sempre em risco a saúde do outro cônjuge.
O diagnóstico e o tratamento dessas moléstias devem ser feitos no período pré-nupcial e com o
conhecimento do futuro cônjuge.

Moléstias graves e transmissíveis por herança à descendência

A genética médica experimentou, nestes últimos anos, um fabuloso impulso, e muitas doenças
gravíssimas têm sua origem na herança, mas a jurisprudência tem-se firmado ainda em torno das tradicionais:
sífilis, epilepsia essencial, esquizofrenia essencial, oligofrenias e personalidades psicopáticas.
A mulher sifilítica leva até ao seu filho a sífilis congênita, com todo o seu cortejo de malformações e
degenerações. A epilepsia essencial, ligada à constituição genética, é transmissível de pais para filhos. A
esquizofrenia essencial, também.
O retardo mental, nos graus mais acentuados, constitui impedimento matrimonial (incapacidade de
consentir), porém, no grau mais brando (retardo mental leve), conforme França, não constitui incapacidade civil.

9.11 Conclusão

De posse dos dados colhidos durante os exames subjetivos, objetivo e complementares, feita a
discussão, se necessária, tendo presentes a legislação e a doutrina vigorantes, tira-se a conclusão, que é o
diagnóstico da presença ou da ausência de uma causa justa para anular o casamento.

10. ATENDIMENTO ASSISTENCIAL E VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA SEXUAL

Na ocorrência de traumatismos físicos, genitais ou extragenitais, é necessário avaliar cuidadosamente as


medidas clínicas e cirúrgicas que atendam as necessidades da mulher, da criança ou da adolescente, o que pode
resultar na necessidade de atenção de outras especialidades médicas.
Embora a mulher em situação de violência sexual possa sofrer grande diversidade de danos físicos, as
equimoses e as lesões incisas genitais são os mais frequentes. Os danos físicos, genitais ou extragenitais, devem
ser cuidadosamente descritos em prontuário médico assistencial. Se possível, os traumatismos físicos devem ser
fotografados e também anexados ao prontuário. Na indisponibilidade desse recurso, representações esquemáticas
ou desenhos podem ser utilizados e igualmente incluídos no prontuário. Lembrar que a perícia médico-legal
poderá ser realizada, de forma indireta, nestes e em outros documentos produzidos pelo médico assistente.
Oportuna a recente legislação tratando da necessária integração entre os serviços periciais e assistenciais: lei
federal 12.845 de 1º de agosto de 2013.

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10.1 Aspectos Éticos e Legais

A atenção à violência contra a mulher e o adolescente é condição que requer abordagem


multiprofissional e interdisciplinar, com importante interface com questões de direitos humanos, de segurança
pública e de Justiça. Algumas informações são fundamentais para os profissionais de saúde que atendam pessoas
em situação de violência sexual:
A lei 11.340, de 7 de agosto de 2006, - também conhecida como Lei “Maria da Penha” - cria mecanismos
para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, estabelecendo mudanças na tipificação dos crimes e
nos procedimentos policiais e jurídicos. De acordo como seu art. 90, caput, "a assistência à mulher em situação de
violência doméstica e familiar será prestada de forma articulada e conforme os princípios e as diretrizes previstos
na Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), no Sistema Único de Saúde, no Sistema Único de Segurança Pública,
entre outras normas e políticas públicas de proteção, e emergencialmente quando for o caso". Já o § 3º do art. 9º
prevê que a assistência compreenderá o acesso aos benefícios decorrentes do desenvolvimento científico e
tecnológico, incluindo os serviços de anticoncepção de emergência, a profilaxia das DST/AIDS e outros
procedimentos em saúde necessários e cabíveis nos casos de violência sexual.
A lei 10.778, de 24 de novembro de 2003, estabelece a notificação compulsória, no território nacional,
dos casos de violência contra a mulher, atendidos em serviços de saúde públicos ou privados de saúde. O
cumprimento da medida é fundamental para o dimensionamento do fenômeno da violência sexual e de
consequências, contribuindo para a implantação de políticas públicas de intervenção e prevenção do problema.
Essa lei foi regulamentada pelo Decreto-Lei 5.099 de 03/06/2004 e normatizada pela Secretaria de Vigilância em
Saúde do Ministério da Saúde através da Portaria MS/GM 2.406 de 5 de novembro de 2004, que implantou a
notificação compulsória de violência contra a mulher no âmbito do Sistema Único de Saúde.
Em relação à notificação compulsória de violências contra crianças e adolescentes, está definida pela Lei
8.069/1990 - Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que foi regulamentado pelo MS através da Portaria MS
1.968/2001. Saliente-se que nas situações de violências contra adolescentes e crianças, uma cópia da ficha de
notificação deve ser encaminhada ao Conselho Tutelar da Criança e do Adolescente conforme preconiza o ECA.
Essa ficha deve ser utilizada para a notificação compulsória de qualquer caso suspeito ou confirmado de violência
doméstica, sexual e/ou outras violências contra mulheres, independente de faixa etária, de acordo com a lei
10.778/2003, o Decreto-Lei 5.099/2004 e a Portaria MS/GM n° 2.406/2004. Quando se tratar de notificação de
violências contra crianças e adolescentes uma via da ficha deve ser encaminhada para o Conselho Tutelar.
Em crianças e adolescentes, a suspeita ou a confirmação de abuso sexual deve, obrigatoriamente, ser
comunicada ao Conselho Tutelar da Criança e do Adolescente ou à Vara da Infância e da Juventude. Na falta
destes, comunicar-se-á a Vara de Justiça existente no local ou à Delegacia, sem prejuízo de outras medidas legais,
conforme o artigo 13 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).
Após o atendimento médico, se a mulher tiver condições, poderá ir à delegacia para lavrar o Boletim de
Ocorrência Policial, prestar depoimento, ou submeter-se a exame pelos peritos do serviço de Medicina Legal. Se,
por alguma razão, não for mais possível a realização dos exames periciais diretamente pelo médico-legista, os
peritos podem fazer o laudo de forma indireta, com base no prontuário médico. Assim, os dados sobre a violência
sofrida e suas circunstâncias, bem como os achados do exame físico e as medidas instituídas, devem ser
cuidadosamente descritos e registrados em prontuário.
O Boletim de Ocorrência Policial registra a violência para o conhecimento da autoridade policial, que
determina a instauração do inquérito e da investigação. O laudo do serviço de Medicina Legal é documento
elaborado para fazer prova criminal. A exigência de apresentação destes documentos para atendimento nos
serviços de saúde não é necessária.
Segundo a lei trabalhista, nos casos em que a violência sexual ocorra durante o percurso do trabalho a
mulher deve ser orientada sobre a importância de realizar a Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT), havendo
ou não a necessidade de afastamento do trabalho. O cadastramento do CAT garante direitos para a mulher
trabalhadora em situação de violência sexual que assegura, entre outros, que ela possa receber atenção
necessária à sua saúde.
O atendimento de pessoas em situação de violência sexual exige o cumprimento dos princípios de ética
e segredo profissional. A Constituição Federal, artigo 5º, garante que "são invioláveis a vida privada, a honra e a
imagem das pessoas, assegurado à indenização material ou moral decorrente de sua violação". O artigo 154 do
Código Penal Brasileiro caracteriza como crime "revelar alguém, sem justa causa, segredo, de que tem ciência em
razão de função, ministério, ofício ou profissão, e cuja revelação possa produzir dano a outrem". Da mesma forma

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o Código de Ética Médica, artigo 74 comina ser vedado ao médico: “Revelar sigilo profissional relacionado a
paciente menor de idade, inclusive a seus pais ou representantes legais, desde que o menor tenha capacidade de
discernimento, salvo quando a não revelação possa acarretar dano ao paciente”.
A assistência à saúde do menor de 18 anos deve observar ao princípio de sua proteção. Se a revelação
dos fatos for feita para preservá-lo está afastado o crime de revelação de segredo profissional. Entretanto, a
revelação do ocorrido também pode Ihe acarretar danos, em algumas circunstâncias. Entre outros prejuízos ainda
mais graves, pode afastar-se do serviço e perder a confiança nos profissionais que o assistem.

11. VIOLÊNCIA SEXUAL E HOMOSSEXUAIS

Os peritos devem atentar que, em muitos casos, a violência a que essas mulheres e adolescentes estão
sujeitas pode ser tão ou mais cruel e grave em função do preconceito que envolve sua orientação sexual. Muitos
adolescentes são vítimas de violência na própria família que usa de tais métodos para tentar 'corrigir' sua
sexualidade.
Sabe-se que a discriminação e preconceito por orientação sexual e por identidade de gênero
determinam formas de adoecimentos e sofrimentos. Assim, é importante estar aptos a acolher essa população
sem discriminação, não permitindo que se coloque qualquer pessoa em situação de violência institucional. A
igualdade de direitos à saúde é preconizada na Constituição Federal de 1988, o que a torna um direito social.
O seguimento do atendimento clínico, psicológico e laboratorial das pessoas que fazem sexo com outras
do mesmo sexo civil e que foram vítimas de violência deve ser feito considerando que, manter relações sexuais
com pessoas do mesmo sexo não é uma doença e que a violência sexual pode agravar os sentimentos de exclusão,
humilhação e isolamento que muitas vezes permeia a vida das pessoas por sua orientação sexual.

12. ABORDAGEM MÉDICO-LEGAL DA TRANSEXUALIDADE

A abordagem médico-legal da transexualidade, de uma maneira geral, não era em nada acolhedora, até
recentemente. Nos compêndios da especialidade, era apresentada como um distúrbio da sexualidade ou do
instinto sexual, encontrando classificação entre as chamadas "inversões", ao lado de transtornos como fetichismo,
pederastia, pedofilia e outros socialmente não menos reprimidos.
Castel (2001), em um interessante trabalho empenhado em estabelecer a cronologia ao "fenômeno
transexual", o considera um indicador muito seguro das modificações históricas da percepção científica, assim
como também cultural e política, da identidade sexual no século XX.
A partir do início do século XX, com o crescimento da sexologia impulsionando os estudos sobre a
sexualidade humana e acompanhando um melhor entendimento das questões entre sexo e gênero,
principalmente após o trabalho de Harry Benjamin (1966) e outros que se seguiram, o fenômeno da
transexualidade foi obtendo melhor entendimento médico.
Os autores consideram que a noção de "gênero" consagra um triunfo em Psiquiatria de uma concepção
sociológica particular da identidade, constituindo-se em uma noção mais esclarecedora do que é "sexo", que tem
inspiração mais biológica e de fundamentação basicamente anatômica.
Atualmente, encontra a transexualidade, sob a denominação de transtorno de identidade de gênero,
classificação no manual editado pela Associação Americana de Psiquiatria (DSM-IV; Diagnostic and Statistical
Manual of Mental Disorders, 4. ed.,1994), assim como se encontra classificada na Classificação Internacional de
Doenças, 10ª revisão (CID-10,1993),editada pela Organização Mundial de Saúde (OMS), em seu capítulo V, incluída
entre os transtornos de identidade sexual.
Após uma longa fase de obscurantismo, onde a ausência de normatização específica sobre o assunto o
deixava em aberto às discussões éticas, o Conselho Federal de Medicina, por meio de sua Resolução 1.482,/97,
veio regulamentar o tratamento cirúrgico por meio da adequação genital, criando um protocolo de atendimento
multidisciplinar, consubstanciando uma forma de manifestação legal sobre o tema. Em 2002, nova Resolução do
Conselho Federal de Medicina, vem atualizar o disposto na Resolução anterior.
A partir da tomada de posição por parte do Conselho Federal de Medicina, reconhecendo como ética a
cirurgia de adequação genital, em acordo com o disposto de suas resoluções, cria-se, em nosso país, uma base de
sustentação legal para o tratamento completo dessa forma de transtorno de gênero, em acordo ao preconizado
pelo protocolo da Harry Benjamin lnternational Gender Dysphoria Association (The Standards of Carefor Gender
Identity Disorders, 2001).

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Alguns centros médico-universitários passam a oferecer serviços especializados, programas completos


de apoio e tratamento aos portadores desse tipo de transtorno, incluindo a cirurgia de adequação genital.
Os pacientes tratados, utilizando-se dos recursos terapêuticos disponíveis, passam a apresentar uma
expressão corporal em harmonia com seu gênero de identificação, a fim de Ihes permitir desempenhar,
minimizado o fator de discrepância corporal, o papel social deste gênero em toda sua plenitude.
Cumpre à Medicina, ao assegurar a perseguida harmonia somatopsíquica do indivíduo, um dos preceitos
pilares de seu exercício ético, colocando-se a serviço da saúde do ser humano, sem discriminação de qualquer
natureza.
Esses indivíduos são portadores de documentos de identificação, cujos dados têm origem no registro do
assentamento de seu nascimento, quando a determinação do nome e do sexo ocorreu em acordo com a
atribuição que lhes foi feita ao nascer, em tudo discrepante com o gênero com que vieram a se identificar, embora
em perfeita harmonia com sua expressão corporal. Este fato, constrangedor em seu dia a dia, torna-se
perturbador de sua harmonia somatopsíquica, comprometendo sua dignidade e estorvando suas relações, tanto
no campo familiar, como no social e no profissional.
A retificação documental desses indivíduos, com mudança do nome e do sexo civil, impõe-se como uma
medida complementar importante, permitindo sua inserção social harmoniosa e a possibilidade do seu pleno
exercício de cidadania.
Ainda que inexista norma jurídica específica para o atendimento desses casos, não Ihes abandona o
Direito que, por meio de sucessivas manifestações jurisprudenciais, procura acompanhar a evolução científica que
a Medicina lhes possibilitou ao disponibilizar medidas terapêuticas capazes de restituir o desejável equilíbrio
somatopsíquico. Assim, ações cíveis de retificação de nome e sexo seguem-se ao completo tratamento desses
casos, buscando agora lhes oferecer o almejado bem-estar social, imprescindível ao pleno gozo do estado de
saúde.
Cabe, entretanto, aos juízes e promotores envolvidos nessas demandas buscarem as informações
médicas pertinentes, as quais Ihes possibilitem atuar com segurança na busca da justa decisão, que poderá
contribuir com a restituição da pretendida convivência social harmoniosa.
Nestes casos, perícias médicas, assim como pareceres médicos, podem e devem contribuir com a
informação médica precisa, que lhes ofereça substrato científico para suas decisões, que tanto poderão repercutir
sobre a saúde do indivíduo, bem maior e direito fundamental, inerente à condição humana, como estabelecido
em nossa Lei Magna.
Com este objetivo, através de um cuidadoso relato médico-legal, devem os operadores do Direito serem
conscientizados, por conclusão apoiada no histórico médico e também em completa avaliação físico-psíquica
desses indivíduos, dos aspectos aqui discutidos para que possam, em suas deliberações, contribuir para o integral
estabelecimento da saúde do interessado, na mais completa extensão do seu atual conceito.

PALAVRAS FINAIS

Este trabalho não tem, nem poderia tê-lo, a pretensão de esgotar os assuntos de interesse da Sexologia
Forense. Longe de exaurir o tema, muito ainda há que se dizer e tratar. Espera-se, principalmente, que os que o
leiam sintam-se estimulados a aprofundar seus estudos, sempre em benefício de seus periciandos, em particular,
e da Justiça, em geral.

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REFERÊNCIAS

ALCÂNTARA, H. R. Perícia médica judicial. 2. ed. Rio de Janeiro: Guanabara-Koogan, 2006.


BRASIL. Código Penal. 13. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008.
BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de
Ações Programáticas Estratégicas Prevenção e tratamento dos agravos
resultantes da violência sexual contra mulheres e adolescentes : norma técnica
/ Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações
Programáticas Estratégicas. – 3. ed. atual. e ampl. – Brasília : Ministério da Saúde,
2011.
ESTEFAM, A. Crimes Sexuais. São Paulo: Ed. Saraiva, 2009
GOMES, H. Medicina Legal. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2004.
NERY JR., N.; NERY, R. M. A. Código Civil Comentado. 8. ed. São Paulo : Revista
dos Tribunais, 2011.
VANRELL, J. P. Sexologia Forense. 2. ed. São Paulo: JH Mizuno, 2008.
VIEIRA, T. R.; PAIVA, L. A. S. Identidade Sexual e Transexualidade. São Paulo: Ed. Roca, 2009.

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