Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Social e Desenvolvimento:
Propostas e reflexões museológicas
i
Museus como Agentes de Mudança
Social e Desenvolvimento:
Propostas e reflexões museológicas
iii
O Museu de Arqueologia de Xingó da Universidade Federal de Sergipe agradece
ao Departamento de Museus do IPANH a cessão da imagem referente à Semana
Nacional de Museus utilizada na capa deste livro.
CDU 069:316.43
iv
Sumário SUMÁRIO
Apresentação 7
5
SEGUNDA PARTE: EXPERIÊNCIAS, PROPOSTAS E PERSPECTIVAS
6
Apresentação
O
Os museus, para alguns, ficaram marcados como locais de coisas velhas e sem
vida, mas, para outros, são instituições que podem desempenhar uma função
social junto às sociedades onde estão inseridas. Essas visões polarizadas são, por
um lado, desconcertantes, mas, por outro, são desafiadoras, pois nos impulsio-
nam a procurar entender as idiossincrasias que delimitam os cenários da ação
museológica.
Os artigos reunidos neste livro revelam algumas perspectivas, a partir das quais
essas instituições têm procurado novos caminhos, têm permeado as difíceis rotas
das ressignificações dos acervos e coleções, têm desdobrado as suas ações na
busca de novos públicos, mas, em especial, têm revelado que os trabalhos preser-
vacionistas permitem as mudanças e desafiam os pressupostos do desenvolvi-
mento social, desde que sintonizados com seu entorno social. E todos temos
consciência que esta sintonia é difícil, vulnerável e multifacetada.
7
Essas perspectivas, por sua vez, indicam a ção social dos museus e têm apostado na
preocupação com os princípios teóricos e busca de novos percursos. A sua concepção
metodológicos para a implantação dos pro- é uma resposta a um generoso convite feito
cessos museológicos, evidenciam a necessi- pelo Prof. José Alexandre Felizola Diniz do
dade de implantação de políticas públicas Museu de Arqueologia de Xingó da Universi-
para que os museus participem dos grandes dade Federal de Sergipe que , mais uma vez,
debates do Estado, indicam as necessárias demonstra a sua sensibilidade para a necessi-
preocupações com o espaço arquitetônico, dade de debate em torno de temas museoló-
com a qualidade dos trabalhos museológi- gicos. A realização desta coletânea só foi
cos, com as exigências de avaliação dos pro- possível pelo apoio competente da
cedimentos institucionais e com o delinea- museóloga Kátia Felipini que partilha as res-
mento de novas compreensões sobre o papel ponsabilidades editoriais.
inclusivo dos museus.
Agradeço aos autores, que confiaram nes-
Acreditamos que os museus devem de- ta proposta e garantiram o seu êxito, expon-
sempenhar um singular papel social, pois do suas idéias e revelando as suas experiên-
podem impulsionar mudanças, e os autores cias. Este livro é dedicado aos novos estu-
aqui reunidos apresentam alguns caminhos dantes de Museologia e esperamos que possa
sólidos para essas trajetórias. servir de inspiração para os seus percursos
profissionais.
Este livro é o resultado de muitos entrela-
çamentos entre profissionais que, por dife- Maria Cristina Oliveira Bruno
rentes caminhos, têm problematizado a fun- São Paulo, outono, 2008.
8
1ª parte
CONCEITOS, TRAJETÓRIAS E MUDANÇAS
ARTIGO
1
Museus e desenvolvimento
social – um balanço crítico1
n HUGUES DE VARINE-BOHAN
A
INTRODUÇÃO
Na tradição museológica mundial, tal qual é representada pelo ICOM e tal
to “La Casa del Museo”, um serviço dirigido zação estruturada, pesada e complexa, como
aos bairros pobres da periferia da cidade. é um grande museu artístico ou científico, a
Mais recentemente, é o Museu Imperial de se preocupar com uma grande parcela da
Petrópolis que se engajou na política de edu- população local que não tem o desejo de
cação patrimonial e de participação no de- entrar nestes templos de saber, nem o conhe-
senvolvimento urbano, dirigida especial- cimento dos códigos intelectuais necessários
mente para a população do seu entorno. O à compreensão daquilo que se encontra em
Musée Dauphinois de Grenoble conduz há seu interior. Esta população não tem uma
mais de trinta anos uma ação contínua e ex- demanda explícita a ser confrontada com
pressiva a serviço de todos os segmentos da uma oferta pré-existente, capaz de
população, não somente de Grenoble, mas redefinir o projeto.
também da região “Dauphiné” e dos Alpes
franceses. Notaremos nestes exemplos, como É porque, em geral, há uma satisfação em
em outros casos, a participação entusiasta do anunciar uma vontade de “democratização
conjunto de profissionais nos métodos e nas cultural”, onde a oferta cultural é suposta-
atividades que não são habitualmente consi- mente apropriada pelo conjunto da popula-
deradas e inseridas nas normas museológi- ção, com menos esforços de comunicação ou
cas e museográficas habituais. de orientação do público, sem uma verdadei-
ra mudança profunda, ou ainda da pedagogia
A iniciativa desses projetos, programas, dirigida ao público escolar, na esperança de
ações, surgem geralmente de personalidades que a visita organizada (obrigatória) das crian-
fortes, quer seja dos responsáveis pelo mu- ças ao museu algumas vezes durante o seu
seu, quer seja dos membros do seu serviço período escolar seja suficiente para atrair seus
“educativo”. Para nomear aqueles inovado- pais ou para que voltem ao museu quando
res que não estão mais em atividade, eu cita- adultos. São pressupostos que, do meu ponto
rei a cooperação exemplar entre S. Dillon de vista, jamais foram realmente verificados.
Ripley, diretor geral da Smithsonian
Institution, e John Kinard, fundador do Outro elemento que me parece importan-
Musée d´Anacostia, ou entre Boubou Hama, te e que pode explicar bem as incompreen-
presidente da Assembléia Nacional do Niger, sões e os erros de orientação: o desenvolvi-
e Pablo Toucet, criador do Musée National mento social é uma tarefa coletiva, que im-
de Niamey. A conjunção entre museu e de- plica as comunidades, as famílias, as associa-
senvolvimento social não existe em si, ela ções de maneira mais ou menos solidária. A
exige uma força de vontade e perseverança, prática cultural “social” é de início uma prá-
para vencer as forças contrárias: de uma parte tica coletiva, de esporte, de festa, de lazer.
inércia ou mesmo hostilidade dos profissio- Quando se vai ao museu, se vai em casal, em
nais obcecados pela coleta e pela pesquisa, família ou entre amigos. O discurso e a práti-
ou ainda, pela desconfiança de responsáveis ca dos profissionais de museu consideram
políticos e administrativos preocupados com seguidamente o “visitante” como um indiví-
a rentabilidade e com a comunicação, mas duo só (isto é, um amador motivado que
também do ceticismo dos agentes sociais que vem ao museu por razões pessoais) ou como
vêem tradicionalmente nos museus uma ins- o membro de um grupo organizado, escolar,
tituição empoeirada e reservada pra o delei- de idosos ou de turistas, mais ou menos dis-
te de uma “elite” de privilegiados da cultura. ciplinados e que vai “seguir o guia”.
É necessário confessar que não é nem evi- Pesquisas recentes verificam esta distância
dente e nem fácil levar à frente uma organi- entre a oferta do museu e a maioria da popu-
MUSEUS E DESENVOLVIMENTO SOCIAL – UM BALANÇO CRÍTICO 15
lação, dificultando a emergência de um “pú- nente. Eles não podem absolutamente imitar
blico” culto. os grandes museus. Pelo contrário, eles têm a
possibilidade de fixar objetivos políticos,
Há então um longo caminho a percorrer educativos, culturais ou sociais autônomos,
pelos grandes museus seguindo o exemplo menos dependentes dos imperativos da co-
daqueles que já demonstraram que é possí- leta, da pesquisa, da conservação que as
vel desempenhar um papel no desenvolvi- grandes instituições. Em geral, são
mento social e cultural das comunidades do pluridisciplinares e têm uma proximidade
seu entorno: a intuição dos participantes de fácil com a população (ou a comunidade)
Santiago, que expressou no conceito de que eles servem. Suas responsabilidades são,
“museu integral” desenvolvido nas resolu- talvez, menos qualificadas que a de seus co-
ções adotadas, isto é, um museu que deve legas das grandes cidades, mas localmente
levar em consideração a totalidade da socie- eles são “notáveis”, que têm ou podem ad-
dade na qual ele está inserido, para se colo- quirir uma influência. Eles são atores da vida
car a seu serviço e se organizar em conseqü- local. Eles têm acesso fácil aos políticos, aos
ência, e fica claro para os museólogos cons- outros responsáveis das instituições culturais
cientes que o seu lugar na sociedade e o dos e sociais, eles são atores da vida local. Aque-
agentes sociais é o de buscar um conjunto de les que têm um estatuto associativo, contrari-
soluções provenientes de uma observação e amente aos grandes museus institucionais,
de uma escuta das comunidades do entorno. têm conselhos de administração, com mem-
bros voluntários ativos, que devem ter em
Os Museus Locais conta seus contextos cultural, social, econô-
mico, e são estreitamente ligados ao seu ter-
Falarei aqui de museus locais em geral, ritório.
aqueles que são de uma maneira ou de outra
vinculados a um território, vila, pequena re- Eles têm então naturalmente a tendência
gião, cidade, bairro, sítio industrial, parque de buscar uma nova via: sob sua pressão, o
natural, e não exclusivamente de museus movimento mundial chamado Nova Museo-
atrelados ao que se entende de “nova logia, que teve início por alguns “grandes”
museologia”. Com efeito, esta tendência mu- museólogos nos anos 1970, é progressiva-
seológica já está contemplada em seus textos mente dotado de uma concepção mais soci-
fundadores e em suas práticas cotidianas, e al e política de museu: é o museu comunitá-
são referências fortes para as comunidades, rio, o ecomuseu, ou ainda o museu de terri-
ao desenvolvimento global e sustentável. tório, que se vê um agente e um ator
Mas esses ecomuseus, museus comunitários, patrimonial e cultural do micro-desenvolvi-
ou outros são ainda uma minoria, mesmo mento dos territórios. Mesmo que se trate de
que nos últimos trinta anos têm–se multipli- um movimento mundial, divulgado agora
cado em quase todos os países do mundo os em todos os continentes, cada unidade local
museus de iniciativa local, sob estatutos mui- é original, pode-se dizer única, pois ela deve
to variados. Para se desenvolver, eles são – se adaptar à interação complexa dos fatores
ou deveriam ser – um interlocutor institucio- e dos múltiplos parceiros, segundo as confi-
nal natural à dimensão do território, uma gurações cada vez mais diferentes, e mesmo
ferramenta cultural para a valorização do evolutivas, para se adaptar às mudanças
capital patrimonial deste território. endógenas e exógenas.
foi em seu tempo (anos 1960) o recuos, porque ele vive. É isto que o distin-
Neigborhood Museum d’Anacostia gue do museu de coleção, inserido em um
(Washington). edifício mais ou menos solene, que é para a
cultura viva, aquilo que a produção fora do
Enfim, é preciso não esquecer das iniciati- solo de morangos e champignons é para a
vas que não levam o nome de museu, mas agricultura de campo.
que salientam claramente o mesmo processo
e que por vezes superam a criação de mu- Para ir ainda mais longe na análise, nós
seus ou de exposições e que fazem parte de podemos sem dúvida considerar que esses
um dispositivo mais amplo. Penso aqui no museus são projetos claramente políticos, ao
Projeto Identidade da Quarta Colônia (Bra- menos que eles se vinculem a planos e a pro-
sil, RS), no programa de desenvolvimento do gramas de desenvolvimento relativos a três
Maestrazgo (Espanha, Aragão, Província de dimensões: cultural, social e econômica. Na
Teruel), aos múltiplos “Parish Maps” britâni- melhor das hipóteses, esse caráter político é
cos, aos “Mappe di Comunità” italianos, aos reconhecido e aceito pelos poderes locais
inventários participativos e aos Departamen- ou regionais. Algumas vezes, o museu é re-
tos de Memória de tantas cidades brasileiras conhecido por esses poderes como uma ma-
(Porto Alegre ou Viamão, RS), ou Gênova, nifestação de reivindicação identitária ou da
Itália. inclusão do cultural no desenvolvimento
que é seguidamente considerado apenas
O que nós podemos tirar de comum, a econômico. É o caso, em particular dos terri-
partir desses casos múltiplos e diversos? Dis- tórios onde os responsáveis políticos, obce-
semos primeiro que as dimensões “territó- cados pela indústria turística, só procuram o
rio” e “comunidade” são solidariamente es- patrimônio e os museus como uma atração
senciais, por sua vez como fonte de materi- turística.
ais colocados em cena pelo museu (o patri-
mônio no sentido mais amplo do termo que As instâncias de desenvolvimento social
substitui aqui a noção restritiva de coleção),
como quadro físico e humano da atividade O museu, quer seja grande e generalista,
produzida, quer seja endógena ou exógena, ou local com vocação territorial e comunitá-
enfim como destinatários desta atividade no ria, não pode agir só em relação ao desen-
econômico e no social, que deve se exercer volvimento e à sociedade de seu entorno.
a proveito do desenvolvimento. Ele não pode viver em simbiose, ou como se
diz hoje em dia, em rede, com o conjunto
Em seguida, notamos o caráter original e das outras instituições e estruturas, públicas e
único de cada iniciativa, que não pode se privadas, que constroem em conjunto o de-
moldar num regulamento administrativo ou senvolvimento, mas que seguidamente es-
numa definição muito estrita. Mesmo lá quecem o museu, cuja imagem fica, para
onde existem as redes estruturadas, negocia- muitos, como aquela de uma casa fechada
se com as individualidades reivindicadas. sobre suas coleções e falando em uma lin-
guagem codificada.
Depois, lembramos o princípio de proces-
so “open-ended”, que não tem lugar nos ca- Face à nova dinâmica demonstrada pelo
lendários fixados pelos políticos ou pelos museu, é necessário que exista e se manifeste
técnicos: um tal museu não se inaugura, ele abertamente o reconhecimento, da parte de
se constrói por uma sucessão de etapas, de todo o tecido social envolvente, do patrimô-
eventos, de momentos, de progressos e de nio cultural e natural como recurso do terri-
18 HUGUES DE VARINE-BOHAN
tório e do museu como instrumento central mum, de trocas. Saber que o museu pode e
de valorização deste patrimônio. Porque este quer colaborar com o desenvolvimento social
recurso pode servir de material tanto à edu- faz germinar idéias e projetos novos da parte
cação escolar como à educação popular, à dos atores sociais e culturais do território. Esta
constituição da imagem e da identidade da abertura possibilita ao museu que ele encon-
comunidade, ao encorajamento à tre possibilidades de contato com os meios e
criatividade individual, aos lazeres coletivos, as problemáticas que não lhes são familiares;
ao acolhimento de visitantes, ao reforço das ele pode pedir aos atores sociais, profissionais
ligações com os emigrantes e à inserção dos ou militantes, para lhe ajudar a melhor adap-
imigrados etc. tar a linguagem e suas ações de cultura em
relação às expectativas da população que não
Uma vez este reconhecimento adquirido, faz parte de seus públicos habituais.
uma cooperação deve se estabelecer, seja
por convenções formais (como aquela que É necessário sublinhar a importância que
foi assinada em Lyon entre as instituições esta colaboração entre o museu e seus agen-
culturais, incluindo os museus, e as estrutu- tes e atores sociais pode ter a função de medi-
ras de regeneração urbana), seja pelas rela- ação que todo museu, atualmente, deve ou
ções sobretudo informais entre os profissio- deveria assegurar. Entendemos por mediação,
nais do social e do museu, como o MINOM a partir de relações aos conceitos tradicionais
português deu exemplo associando de visita guiada e trabalho educativo no mu-
museólogos e professores do primário e se- seu: ela é a iniciativa que consiste em estabe-
cundário na reflexão contínua, há mais de lecer e facilitar um diálogo sensível entre, de
quinze anos, sobre função social do museu. uma parte, uma pessoa ou um grupo que visi-
Esta cooperação tinha sido integrada nos es- ta o museu ou participa de uma de suas ativi-
tatutos do ecomuseu da comunidade urbana dades e, de outra parte, um objeto, uma paisa-
Le Creusot-Montceau desde 1974, que fize- gem ou um bem imaterial, ou seja, a cultura
ram de 250 associações, grupos e instituições viva e os saberes de um e os conteúdos cultu-
educativas do território a base de um “comi- rais e científicos do outro. Levar em conside-
tê de usuários”, que tinha o papel de definir e ração a questão social nas missões do museu
avaliar os programas de ação do museu. Este é assegurar que a diversidade das populações
mesmo ecomuseu, mais recentemente, res- e das culturas, das linguagens, das gerações,
pondeu à demanda de centros vizinhos de das origens, das crenças, das experiências
tratamento de Alzheimer visando fornecer- profissionais enriquecerão a museologia e a
lhes objetos usuais do passado, suscetíveis museografia estabelecidas. É uma nova forma
das lembranças dos doentes. de comunicação com o patrimônio, respeito-
so com o visitante, como ocorre na nova
O museu, dessa forma, fica não somente a museologia. Ela é responsável pelo nascimen-
serviço do capital cultural da comunidade, to de uma nova profissão, que se abre tanto
mas também de seu capital social: ele aporta aos funcionários assalariados dos museus
suas coleções e suas técnicas de expressão, quanto aos voluntários. E a mediação será
suas redes de relações, seus saberes, seus pró- mais efetiva, os mediadores serão mais efici-
prios locais; e ele recebe igualmente de sua entes, quando estes estabelecerem contato di-
comunidade colaborações, informações so- reto com o seu meio, tanto em sua vida coti-
bre os projetos que estão em desenvolvimen- diana e nas suas relações de trabalho.
to, lições e críticas, um conhecimento refina-
do das necessidades e demandas da popula- Isto me leva a sugerir que os responsáveis
ção. É um lugar de encontro, de trabalho co- dos museus e em geral do patrimônio acres-
MUSEUS E DESENVOLVIMENTO SOCIAL – UM BALANÇO CRÍTICO 19
centaram um termo ao conceito de “projeto os seus territórios, mas também em seus en-
científico e cultural” que define (ou deveria contros profissionais, reflitam sobre o que
definir) os objetivos e as missões de suas insti- eles podem aportar às agendas 21 que lhes
tuições, aquele do “social”, que significaria pu- concernem, que eles levem esta reflexão,
blicamente a vontade do museu de cumprir tanto quanto possível, com seus colegas do
suas obrigações junto à sociedade local, no setor cultural, social e econômico. Será um
senso largo, na linha direta do “museu integral” pretexto perfeito para mostrar concretamen-
definida pelo Seminário de Santiago, com a te o papel do museu na mudança e no de-
mesma igualdade de outros termos do projeto. senvolvimento social.
Freire (Paulo), Ação Cultural para a Liber- Textos de Museologia, Jornadas sobre a
dade e outros escritos, Paz e Terra, 1987, Função Social do Museu, Cadernos do
149 p. MINOM Portugal, n°1, 1999,99p.
Gjestrum (J.A.) & Maure (M.), éd., Økomu- Togni (Roberto), Per una museologia delle
seumsboka - identitet, økologi, culture locali, Universitá degli Studi di
deltakelse, Icom Norwegian committee, Trento, 1988
Tromsø, 1988, 191 p.
Transmission, Trans-missions –
Maggi (Maurizio), Gli Ecomusei, Umberto Ecomusées et Musées de société entre
Allemandi, Torino, 2000, 124 p. rupture et continuité, actes des 3°
rencontres professionnelles de la FEMS,
Maggi (Maurizio), Ecomusei, Guida Europea, 2006, 120 p.
Umberto Allemandi, Torino, 2002, 238 p.
Varine (Hugues de), L’Initiative Commu-
Museet som makt och Motstånd, Festskrift nautaire, collection museologia, Mâcon,
till Erik Hofrén, Norrkôping,1996, 207 p. MNES & W, 1992 (diffusion Presses
Universitaires de Lyon)
Museologia social (obra coletiva), Unidade
Editorial, 2000, 136 p., Porto Alegre (Brasil) Varine (Hugues de), Les racines du futur –
Développement local et patrimoine ,
Papers in Museology 1, Almqvist & Wiksell Asdic, 2002 (diffusion Editions du Papyrus)
IntI, Stockholm, 1992, 202 p. (Report from
two symposia at the Department of
Museology, Umeå University: What is Nota
Museology ? & Local and Global) 1
Este texto não comporta referências a obras em
particular. Ele é resultado da experiência pes-
Parreiras Horta (Ma de L.) et al., Guia Básico soal do autor adquirida durante os últimos cin-
qüenta anos. Entretanto, a resumida lista biblio-
de Educação Patrimonial, Museu Imperial gráfica no final do artigo, visa fornecer pistas de
e IPHAN, 1999, 65 p. pesquisa e de reflexão.
ARTIGO
2
Mudança Social e Desenvolvimento no
Pensamento da Museóloga Waldisa
Rússio Camargo Guarnieri:
Textos e Contextos
A
ANDREA MATOS DA FONSECA
KÁTIA REGINA FELIPINI NEVES
APRESENTAÇÃO
E
Este artigo, elaborado a seis mãos que refletem diferentes gerações do cenário
museológico paulista, apresenta a trajetória intelectual de Waldisa Rússio
Camargo Guarnieri, a partir de seu envolvimento com os problemas que entrela-
çam os museus, com a área de conhecimento Museologia e com o exercício de
cidadania. Trata-se de um ensaio, de uma busca de razões e de influências, de
uma tentativa de delimitação e que, ancorado em seus próprios textos, procurou-
se apontar a sua compreensão sobre os múltiplos contextos em que atuou com
singular protagonismo, deixando uma herança extremamente importante para
um novo pensar museológico e, ao mesmo tempo, desafios para aqueles que a
ouviram repetir que o museólogo é, antes de tudo, um trabalhador social.
22 MARIA CRISTINA O. BRUNO; ANDREA M. DA FONSECA; KÁTIA R. FELIPINI NEVES
cado, é constituído por um conjunto de estu- Neste artigo, a intenção é recuperar de al-
dos monográficos e/ou biográficos, com o guns dos textos elaborados por Waldisa as
propósito de dar seqüência à organização e marcas que registram as suas idéias em torno
divulgação desse pensamento e das ações da problemática museológica, sinalizam
museológicas desenvolvidas no Estado de para a sua sensibilidade em relação à per-
São Paulo. Cabe registrar, ainda, que este cepção sobre os diferentes contextos em que
programa de estudos sobre mentalidades atuou e, ainda, apontam para caminhos iné-
está delimitado em análises sobre a ação ditos para a sua época que a colocam como
museológica a partir da segunda metade do uma das precursoras, no Brasil, dos postula-
século vinte, considerando, entretanto, a in- dos da Sociomuseologia. Os textos de
fluência fundante e a herança intelectual do Waldisa, relativos a trabalhos acadêmicos
pensamento e das ações de Affonso de (dissertação e tese), a artigos publicados em
Taunay junto ao Museu Paulista e de Mário periódicos, a conferências apresentadas em
de Andrade junto ao Departamento de Cul- eventos científico-culturais são sempre
tura da Cidade de São Paulo, uma vez que argumentativos e permeados por expressões
ambos desenvolveram relevantes trabalhos de convicção inerentes à realidade sócio-
nas primeiras décadas do século passado, le- cultural. O seu estilo, tanto na escrita quanto
gando importante patrimônio de idéias e re- na fala – revela um olhar sensível voltado às
alizações, que contribuíram com a delimita- reciprocidades entre as elites e os marginais,
ção de uma ação museológica regional e entre o poder e os despossuídos e entre a
delinearam as características patrimoniais a necessidade de estabelecer museus compro-
serem ressignificadas por ações museológi- metidos com as mudanças sociais e as críti-
cas nas décadas posteriores. cas contundentes aos museus que abandona-
ram a noção de processo. A sua biografia é
A segunda metade do século passado, permeada por ações militantes a favor das
foco central do mencionado programa de liberdades democráticas e da igualdade soci-
pesquisa, registrou iniciativas direcionadas à al e econômica.
formação especializada, à implantação de
processos museológicos sistêmicos e à ex-
pressiva produção acadêmica, consolidando 1) OS PRIMEIROS PERCURSOS: O ENCONTRO
os campos de ação museológica nesse Esta- COM OS CONTEXTOS MUSEOLÓGICOS
do. A partir das realizações de Vinícius Stein
Campos, desenvolvidas ao longo da década A construção da memória da Museologia
de cinqüenta e ligadas ao governo do Esta- é uma tarefa que não pode ser realizada,
do, teve início uma trajetória de profissiona- muitas vezes, sem o estudo biográfico e a
lização que pode ser identificada em distin- análise da produção de seus principais pro-
tos vetores de análise e, neste contexto, a tagonistas. E não seria diferente em relação à
museóloga Waldisa Rússio Camargo Museologia paulista, uma vez que São Paulo
Guarnieri, personagem central deste artigo, conta com importantes personagens para a
desempenhou papel referencial, cujo legado historicidade da Museologia brasileira, como
ainda carece de estudo, sistematização e so- Affonso Taunay, Mario de Andrade, Paulo
cialização de suas idéias e realizações. A sua Duarte, Vinicius Stein Campos, Pietro Maria
trajetória, no âmbito desse programa de pes- Bardi, Maurício Segall, Aracy Amaral, Ernani
quisas, está embasando a elaboração de um da Silva Bruno, Walter Zanini, Ulpiano Bezer-
livro específico, que deverá entrelaçar a di- ra de Meneses, entre outros e, sem dúvida ne-
vulgação de textos inéditos com artigos es- nhuma, Waldisa Rússio Camargo Guarnieri,
critos por diferentes especialistas. personagem principal deste artigo.
24 MARIA CRISTINA O. BRUNO; ANDREA M. DA FONSECA; KÁTIA R. FELIPINI NEVES
“Experiência vital para o homem con- Essa dissertação permitiu, também, a cons-
temporâneo, o museu permanece ina- tatação da profunda carência profissional na
cessível a parcelas significativas da popu- qual os museus do Estado estavam mergu-
lação. lhados e, evidentemente, a necessidade de
Num país como o nosso, em que a pirâ- alterar esta realidade para que os museus
mide demográfica repousa sobre larga pudessem corresponder às expectativas no
base de crianças e jovens, é imperdoável que diz respeito às potencialidades sociais e
que os museus não tenham sido desper- culturais identificadas pelo mesmo trabalho
tados para a necessidade de serem algo acadêmico. Um resultado imediato dessa
26 MARIA CRISTINA O. BRUNO; ANDREA M. DA FONSECA; KÁTIA R. FELIPINI NEVES
“O fato de o curso ter surgido junto a Porto Alegre e Curitiba, ou seja, São Pau-
esta Escola beneficiou sua estrutura e lo não teria nenhum centro de formação
forma pedagógica desde o início, pois se- de pessoal para museu.
guiu a trilha da Escola Pósgraduada, esta- Foi nesse momento que surgiu a Resolu-
belecendo não apenas a multiprofissio- ção 14/77 do CFE/MEC. Ela nos proporcio-
nalidade, como essencial ao desenvolvi- nava um duplo e útil instrumento de tra-
mento do programa pedagógico, mas, balho: em primeiro lugar, um artifício le-
também, a interdisciplinaridade como gal, válido, ético e eficaz juridicamente,
método.”9 pelo qual poderíamos, enfim, criar cursos
de especialização que, feitos
Ainda em relação à criação de cursos de seqüencialmente, se somariam, perfa-
Museologia, a autora apresenta a visão do zendo os créditos necessários a um
MEC naquele contexto em relação ao bacha- Mestrado dentro da Escola Pósgraduada
relado e discute a situação dos cursos já exis- de Ciências Sociais.”11
tentes:
“Uma das mais sérias questões referen- Envolvida pelos desafios de implantar um
tes à preservação e comunicação do pa- curso de especialização que atraia fortes reações
trimônio cultural, pois o trabalho de mu- no cenário acadêmico vinculado à Museologia
seu é de fundamental importância para a no país e de desenvolver um projeto pioneiro
manutenção do trinômio orientador do no que diz respeito ao perfil museológico do
processo cultural: esse trinômio consiste Museu da Indústria em São Paulo, Waldisa passa
em três atividades distintas e interliga- a desempenhar um papel referencial em deba-
das, a saber, preservar, informar e agir. tes públicos, inseridos nos mais variados even-
30 MARIA CRISTINA O. BRUNO; ANDREA M. DA FONSECA; KÁTIA R. FELIPINI NEVES
tos relativos aos processos de redemocratiza- dem manter como quintais do mundo
ção que o Brasil passa a vivenciar no final dos dito ‘subdesenvolvido’, e que são, lamen-
anos da década de setenta. tavelmente, importadores de todo um
lixo cultural distribuído intensamente
Vale lembrar, também, que Waldisa Rússio através de embalagens mais, ou menos,
foi testemunha dos anos de repressão e cen- atraentes pelos veículos de comunicação
sura, além de viver a expectativa pela abertu- de massa, os museus nacionais são
ra política do país. Sua produção, dessa for- uma necessidade e uma urgência. Tes-
ma, também se vê permeada pela inquieta- temunhos de nossa identidade cultural,
ção de ideais de democratização de conhe- repertórios organizados de nossa memó-
cimentos e igualdade social. Para ela, então, ria, os museus nacionais cumprem, ou
a instituição museológica não pode estar se- devem cumprir, cada vez mais, seu desti-
parada da vida e da realidade, devendo tam- no de resistência a uma invasão que
bém engajar-se nesses processos, tendo tenta desde seus inícios, anular as nacio-
como um de seus papéis fundamentais di- nalidades. Não se fala, aqui, de um naci-
fundir conhecimentos e instigar a capacida- onalismo infantil: fala-se de uma naciona-
de de reflexão e questionamento. lidade suficientemente fortalecida para
dialogar com outras, fala-se de uma iden-
“Ora, nós, brasileiros, vivemos ainda a tidade que se afirma através das
tentativa de superação de entraves à alteridades.”20
nossa independência econômica, política,
cultural, a qual necessariamente passa Se no início de suas análises museológi-
pela superação da dominação científica e cas, ainda nos anos da década de sessenta, o
tecnológica. Esta independência está ínti- contexto sociocultural expressava as amar-
ma e essencialmente ligada à comunica- guras de uma convivência com os regimes
ção do conhecimento científico e políticos autoritários e os respectivos refle-
tecnológi-co e da formação de novas, xos nas instituições da cultura e do patrimô-
mais numerosas e mais intensas voca- nio, já a partir do final dos anos de 1980 o
ções na área. Daí o projeto museológico seu olhar vai se dirigir para a importância do
estar vinculado, também, a esse compro- engajamento dos museus e da Museologia
misso, dentro de uma metodologia clara nas frentes que a sociedade civil abria, deli-
de ‘pesquisa/conhecimento/ação’.”19 neando novos contextos socioculturais.
em uma reforma administrativa do Estado e “O museu tem sempre como sujeito e ob-
ao assumir a função de implantar um museu jeto o homem e seu ambiente, o homem
como assistente técnica na Secretaria de e sua história, o homem e suas idéias e
Cultura, Ciência e Tecnologia em São Paulo. aspirações. Na verdade, o homem e a
Para tanto, procurou os cursos de Museolo- vida são sempre a verdadeira base do
gia da Bahia e do Rio de Janeiro, levantou museu e que faz com que o método a ser
bibliografia, estabeleceu contatos e acabou utilizado em Museologia seja essencial-
criando o Curso de Especialização em Mu- mente interdisciplinar, posto que o estudo
seologia da FESP/SP, influenciando com do homem, da natureza e da vida, de-
suas idéias a formação de dezenas de profis- pende do domínio de conhecimentos ci-
sionais que desempenham diferentes papéis entíficos muito diversos.
na condução da Museologia entre nós. Quando o museu e a Museologia, no sen-
Além disso, o fato de ter se vinculado ao so global do termo, estudam o ambiente,
ICOM possibilitou não somente que conhe- o homem, ou a vida, são obrigados a re-
cesse o pensamento de estudiosos estran- correr às disciplinas que a exagerada es-
geiros, mas também desenvolvesse uma pecialização atual separou por completo.
correspondência profícua, explicitando as A interdisciplinaridade deve ser o méto-
suas idéias para profissionais das mais varia- do de pesquisa e de ação da Museologia
das proveniências. e, portanto, o método de trabalho nos
museus e cursos de formação de
Sintonizada com sua época, a década de museólogos e funcionários de museu.”35
70 e 80 do século XX levantava uma série de
questões sobre a atuação dos museus na so- A sistematização da área disciplinar foi
ciedade. “O museólogo é um trabalhador uma de suas preocupações e, pode-se afir-
social”, dizia Rússio. Incoerente seria con- mar, um de seus legados à Museologia. O ca-
ceber a Museologia como uma disciplina ráter reflexivo de seu trabalho tem continui-
tecnicista, restrita ao tratamento das cole- dade com aqueles que conviveram e parti-
ções museais. A interlocução com outras lharam de seu pensamento. Este se reflete
áreas do conhecimento poderia articular e tanto no âmbito da formação profissional,
orientar as práticas museológicas visando quanto na sistematização do conhecimento
ao desenvolvimento das sociedades. Desta museológico.
forma, sua trajetória esteve intrinsecamente
ligada, de forma pioneira, às preocupações “Quero esclarecer que neste quadro de
de uma Museologia Social. Em outros ter- referência situarei meu trabalho, o qual
mos, dos pressupostos da Sociomuseologia, penso ser mais uma reflexão do que um
que impregnaram a realidade museológica princípio básico: uma reflexão que aten-
paulista. da ao diálogo e à crítica, sem os quais
ficaria fechada em si mesma, sem a pos-
Essa preocupação em definir a Museolo- sibilidade de se estender e se enriquecer,
gia, para além do caráter epistemológico, re- ou, também, fazer sua revisão.”36
verberava em dois aspectos que coaduna-
vam com seu pensamento: a sistematização Waldisa Rússio pautou a sua trajetória
da Museologia e a formação profissional. Era profissional com diferentes formas de
pragmática. Somente formando de maneira engajamento e enxergou nos museus a sin-
crítica os profissionais de museus seria possí- gular potencialidade para a promoção das
vel colocar em prática uma Museologia mudanças sociais. Encarou o ensino como
engajada. uma missão e conseguiu sensibilizar os seus
MUDANÇA SOCIAL E DESENVOLVIMENTO NO PENSAMENTO DA MUSEÓLOGA ... 37
_____. Museus de São Paulo. O Estado de _____. Estação Ciência, um projeto com-
S. Paulo, São Paulo. 13 jan 1980, p. 11-13. prometido com a vida - O Projeto Museoló-
Suplemento Cultural. Recorte. Acer vo gico. São Paulo. S/ data. Acer vo
SIG.RP.MUSP, doação de Maria Cristina Oli- SIG.RP.MUSP, doação de Maria Cristina Oli-
veira Bruno veira Bruno
16
_____. Museologia e Ciências Humanas e RÚSSIO, WALDISA. Alguns aspectos do
patrimônio cultural: o patrimônio industrial.
Sociais. São Paulo. S/ data. Fundo Waldisa São Paulo. 1983-1985. Acervo SIG.RP.MUSP,
Rússio – Instituto de Estudos Brasileiros da doação de Maria Cristina Oliveira Bruno
17
RÚSSIO, Waldisa. Formação do Museólogo: por
Universidade de São Paulo – IEB/USP.
que em nível de Pósgraduação?. São Paulo. S/
data. Fundo Waldisa Rússio – Instituto de
_____. Sistema da Museologia. São Paulo. S/ Estudos Brasileiros da Universidade de São
Paulo – IEB/USP. Grifos da autora
data. Acervo SIG.RP.MUSP, doação de Maria 18
RÚSSIO, Waldisa. Museologia e Museu, O
Cristina Oliveira Bruno Estado de São Paulo, São Paulo, 01 de julho
1979, p. 6-7. Suplemento Cultural. Acervo
SIG.RP.MUSP, doação de Maria Cristina Oliveira
Bruno
19
RÚSSIO, Waldisa. Estação Ciência, um projeto
comprometido com a vida - O Projeto
Notas Museológico. São Paulo. S/ data. Acer vo
SIG.RP.MUSP, doação de Maria Cristina Oliveira
1
RÚSSIO, Waldisa. Texto III - Cultura, Patrimônio e Bruno
20
Preservação. In: ARANTES, Antonio Augusto RÚSSIO, Waldisa. Museus Nacionais: o Museu
(Org.). Estratégias de Construção do Patrimônio da República. São Paulo, 1989. Acer vo
Cultural. São Paulo: Brasiliense, 1984 SIG.RP.MUSP, doação de Maria Cristina Oliveira
2
RÚSSIO, Waldisa. Museu, um aspecto das Bruno
21
organizações culturais num país em RÚSSIO, Waldisa. Museus de São Paulo, O
desenvolvimento. São Paulo: FESP, 1977. Estado de S. Paulo, São Paulo. 13 jan 1980, p.
(Dissertação de Mestrado), p. 132 11-13. Suplemento Cultural. Acer vo
3
RÚSSIO, Waldisa. Museu, um aspecto das SIG.RP.MUSP, doação de Maria Cristina Oliveira
organizações culturais num país em Bruno
22
desenvolvimento. São Paulo: FESP, 1977. RÚSSIO, Waldisa. Museus Nacionais: o Museu
(Dissertação de Mestrado), p. 133 da República. São Paulo, 1989. Acer vo
4
Ibidem, p. 147 SIG.RP.MUSP, doação de Maria Cristina Oliveira
5
RÚSSIO, Waldisa. Museologia e Ciências Bruno
23
Humanas e Sociais. São Paulo. S/ data. Fundo RÚSSIO, Waldisa. Museologia e Museu, O
Waldisa Rússio – Instituto de Estudos Estado de São Paulo, São Paulo, 01 de julho
Brasileiros da Universidade de São Paulo – IEB/ 1979, p. 6-7. Suplemento Cultural. Acervo
USP. SIG.RP.MUSP, doação de Maria Cristina Oliveira
6
RÚSSIO, Waldisa. O Mercado de trabalho do Bruno
24
museólogo na área da Museologia. I Encontro RÚSSIO, Waldisa. Museus Nacionais: o Museu
de Museólogos do Norte e Norte, Fundação da República. São Paulo, 1989. Acervo SIG.RP.
Joaquim Nabuco – Departamento de MUSP, doação de Maria Cristina Oliveira Bruno
25
Museologia. 1982. Fundo Waldisa Rússio – RÚSSIO, WALDISA. Alguns aspectos do
Instituto de Estudos Brasileiros da patrimônio cultural: o patrimônio industrial.
Universidade de São Paulo – IEB/USP. Grifos da São Paulo, 1983-1985. Acervo SIG.RP.MUSP,
autora doação de Maria Cristina Oliveira Bruno
26
7
RÚSSIO, Waldisa. Formação do Museólogo: por RÚSSIO, Waldisa. Os museus e a Criança Brasileira,
que em nível de Pósgraduação?. São Paulo. S/ O Estado de S. Paulo, São Paulo. 16 dez 1979,
data. Fundo Waldisa Rússio – Instituto de p.11-13. Suplemento Cultural. Acervo SIG.RP.
Estudos Brasileiros da Universidade de São MUSP, doação de Maria Cristina Oliveira Bruno
27
Paulo – IEB/USP. Grifos da autora Ibidem
28
8
Ibidem RÚSSIO, Waldisa. Museologia e Museu, O
9
Ibidem Estado de São Paulo, São Paulo, 01 de julho
10
RÚSSIO, Waldisa. Formação do Museólogo: por 1979, p. 6-7. Suplemento Cultural. Acervo
que em nível de Pósgraduação?. São Paulo. S/ SIG.RP.MUSP, doação de Maria Cristina Oliveira
data. Fundo Waldisa Rússio – Instituto de Bruno
29
Estudos Brasileiros da Universidade de São RÚSSIO, Waldisa. Exposição: texto
Paulo – IEB/USP. Grifos da autora museológico e contexto cultural. São Paulo,
11
Ibidem 1986. Acervo SIG.RP.MUSP, doação de Maria
12
RÚSSIO, Waldisa. Um museu da indústria na Cristina Oliveira Bruno
30
cidade de São Paulo. São Paulo: FESP/SP, RÚSSIO, Waldisa. A interdisciplinaridade em
1980. (Tese de Doutorado). p. 240 Museologia. São Paulo. S/ data. Acer vo
13
Ibidem, p. 240 SIG.RP.MUSP, doação de Maria Cristina Oliveira
14
RUSSIO, Waldisa. Um museu da indústria na Bruno
31
cidade de São Paulo. São Paulo: FESP, 1980. RÚSSIO, Waldisa. Sistema da Museologia. São
(Tese de Doutorado). p. 240 Paulo. S/ data. Acervo SIG.RP.MUSP, doação de
15
Ibidem Maria Cristina Oliveira Bruno
MUDANÇA SOCIAL E DESENVOLVIMENTO NO PENSAMENTO DA MUSEÓLOGA ... 39
32
Ibidem SIG.RP.MUSP, doação de Maria Cristina Oliveira
33
RÚSSIO, Waldisa. Estação Ciência, um projeto Bruno
35
comprometido com a vida - O Projeto RÚSSIO, Waldisa. A interdisciplinaridade em
Museológico. São Paulo. S/ data. Acer vo Museologia, São Paulo. S/ data. Acer vo
SIG.RP.MUSP, doação de Maria Cristina Oliveira SIG.RP.MUSP, doação, doação de Maria Cristina
Bruno Oliveira Bruno
34 36
RÚSSIO, Waldisa. Estação Ciência, um projeto RÚSSIO, Waldisa. Sistema da Museologia. São
comprometido com a vida - O Projeto Paulo. S/ data. Acervo SIG.RP.MUSP, doação de
Museológico. São Paulo. S/ data. Acer vo Maria Cristina Oliveira Bruno
ARTIGO
3
A radiosa aventura dos Museus
n MÁRIO CHAGAS
Os museus ainda são lugares privilegiados Por tudo isso, suponho que não é despro-
do mistério e da narrativa poética que se vido de sentido o entendimento de que as
constrói com imagens e objetos. O que torna trocas entre centro e periferia são mais inten-
possível essa narrativa, o que fabula esse ar sas, complexas e desconhecidas do que nor-
de mistério é o poder de utilização das coi- malmente se imagina. A antropofagia - con-
sas como dispositivos de mediação cultural vém salientar - não é uma exclusividade do
entre mundos e tempos diferentes, significa- modernismo brasileiro. No campo museal
dos e funções diferentes, indivíduos e grupos ela tem sido uma prática que amiúde se faz
sociais diferentes. presente no plano nacional e internacional.
Não soa estranho para esse campo a hipótese
Ler e narrar o mistério do mundo através de que aquilo que aqui se produz não seja
de um mundo de coisas é um desafio que se tão-somente cópia, mas seja também origi-
impõe antes mesmo do aprendizado das pri- nal e, portanto, passível de ser antropofagiza-
meiras letras e dos primeiros números. Com- do. Registre-se ainda que a imaginação
preender e saber operar no espaço (tridi- museal brasileira, para o bem e para o mal,
mensional) com o poder de mediação de parece aderir com facilidade ao novo, sem
que as coisas estão possuídas é a base da ima- que isso impeça o hibridismo e represente
ginação museal. Não há museu possível sem grandes compromissos ou grandes rompi-
que essa potência imaginativa entre em mo- mentos.
vimento, é ela que atualiza os museus e lhes
confere vida e significado político-social. No século XX, no Brasil e no mundo, os
museus multiplicaram-se com grande velo-
O surgimento de novos paradigmas não cidade. E essa multiplicação numérica veio
inviabiliza inteiramente o paradigma anteri- acompanhada de uma expressiva ampliação
or, abre apenas novos campos de possibilida- da museodiversidade; além disso, o seu ape-
des e disponibiliza novas (ou velhas) ferramen- lo mítico parece também ter crescido, sem
tas para o enfrentamento de novos (ou velhos) prejuízo das suas dimensões política e
problemas. Além disso, é importante ressaltar, a lúdico-educativa.
complexidade da dinâmica social não autori-
za a naturalização da crença em marcos rígi- Desde o século XVIII, vinha gradualmente
dos que pretendem fazer tabula rasa dos pro- germinando a suposição de que tudo seria
cessos e desenvolvimentos anteriores. passível de musealização, e isso parece ter se
confirmado no século XX. E essa confirma-
No caso dos museus, essa compreensão é ção veio por caminhos variados; surgiram
de grande importância, uma vez que eles e pelo mundo afora museus de um tudo: mu-
seus acervos, mesmo quando organizados seus que se chamam museus; museus que se
dentro do paradigma clássico da chamam casas, espaços e centros culturais;
museologia, podem ser sementes capazes de museus que se chamam jardins, cidades e sí-
explodir, num determinado agora, com o vi- tios históricos, etnográficos e arqueológicos;
gor de uma narrativa que esboroa a preten- museus que se chamam ônibus, navios e
são de construção de muros separadores de trens; museus que se chamam ruas, redes de
tempos e espaços. De resto, o paradigma esgoto e reservas florestais.
clássico de museologia no Brasil e no mun-
do europeu, por exemplo, dominou a maior A escrita dos museus voltou ao campo de
parte do século XX e sobrevive robusto, interesse de artistas, filósofos, antropólogos,
como um componente a mais do espectro sociólogos, educadores, historiadores, políti-
cultural contemporâneo. cos etc. Em meu entendimento, isso ocorreu
A RADIOSA AVENTURA DOS MUSEUS 43
por, pelo menos, dois motivos relativamente 2003, na Pinacoteca do Estado de São Paulo,
simples: a centralidade do poder de media- Timothy Mason informou que, na Grã-
ção das imagens e dos objetos no cosmo da Bretanha, existiam, em 1962, em torno de
cultura; e a capacidade de renovação da 900 museus e, em 2003, aproximadamente
imaginação museal. 2.500, dos quais 1.100 eram pequenos mu-
seus que sobreviviam independentes de re-
Quando, nas décadas de 1960 e 1970, al- cursos financeiros hauridos diretamente das
guns setores da vanguarda cultural do Oci- esferas governamentais.
dente anunciaram a morte ou, no melhor
dos casos, o desaparecimento próximo dos No Brasil, a proliferação dos museus tem
museus, supostamente não levavam em con- correspondência com esse quadro geral,
ta esses dois singelos motivos. uma vez que, como obser vou Benny
Schvasberg, em 1972, estimava-se um total
Em agosto de 1971, como informou de 391 museus e, em 1984, esse número foi
Hugues de Varine, durante a IX Conferência ampliado para 803 (SCHVASBERG, 1989:
Geral do Icom, realizada em Paris, Dijon e 115-116). Hoje, segundo os dados do Cadas-
Grenoble, o beninense Stanislas Adotévi e o tro Nacional de Museus, projeto desenvolvi-
mexicano Mario Vásquez proclamavam do pelo Departamento de Museus e Centros
abertamente: a “revolução do museu será ra- Culturais do Iphan, existem no Brasil algo
dical, ou o museu desaparecerá” (VARINE, em torno de 2470 museus.
1979: 23; 2000: 63-64).
De qualquer forma, as críticas dirigidas ao
O necrológio do museu, traduzido a partir caráter dinossáurico de algumas instituições
de um determinado desejo político, apare- museais surtiram algum efeito e parecem ter
cia acompanhado de um discurso que colo- estimulado os ventos reformistas e moderni-
cava em movimento críticas severas ao cará- zantes que, nas décadas de 1980 e 1990, pas-
ter aristocrático, autoritário, acrítico, conser- saram por algumas delas. A modernização
vador e inibidor dessas instituições, conside- trouxe maior preocupação com os serviços
radas como espécie em extinção e, por isso destinados ao público e maior atenção para
mesmo, apelidadas de “dinossauros” e de as práticas pedagógicas, além do aprimora-
“elefantes brancos”. No entanto, 20 ou 30 mento dos recursos expográficos e do refina-
anos depois, verificou-se que os museus não mento dos procedimentos técnico-científi-
só não morreram, como se proliferaram e cos nas áreas de preservação, conservação,
ganharam destaque na cena cultural e na restauração e documentação museográfica.
vida social do mundo contemporâneo.
Num mundo que passou a adotar o espetá-
Alguns exemplos sobre a proliferação dos culo como medida de todas as coisas, o pró-
museus coligidos na obra La Museologie, prio caráter dinossáurico foi transformado
creditada a George Henri Rivière (1989: 62- em elemento espetacular. Como um
68) são esclarecedores e indicam que, no pe- corolário da cultura espetacular absorvida e
ríodo de 1975 a 1985, o número de museus desenvolvida pelos museus clássicos e tradi-
aumentou expressivamente em países como a cionais, consagraram-se as chamadas mega-
antiga República Federal da Alemanha, o Ca- exposições, algumas tratando de artes, outras
nadá, os Estados Unidos, o Japão e a França. de tesouros históricos e outras ainda de ciên-
cias e de dinossauros, todas sempre espeta-
No seminário “Gestão museológica: desa- culares. Os dinossauros musealizados e os
fios e práticas”, realizado, em setembro de museus dinossáuricos voltaram à moda. Os
44 MÁRIO CHAGAS
socioculturais, incluindo as questões de uso e neral Augusto Pinochet Ugarte. Foi, portanto,
preservação dos chamados recursos naturais. no ventre desse governo socialista e demo-
craticamente eleito, num momento de ten-
Em setembro de 1971, o ministro francês são política para toda a América Latina que
do Meio Ambiente lançou oficialmente, em se realizou um dos encontros mais
Dijon, a idéia do ecomuseu como instituição emblemáticos e seminais da museologia na
norteada por uma pedagogia do meio ambi- segunda metade do século XX.
ente e, na maioria das vezes, inserida em par-
ques naturais (VARINE, 2000: 68). Nessa mes- Contrariando as tendências em voga, to-
ma época, Hugues de Varine foi convidado dos os especialistas convidados para a Mesa
por Marcel Evrard, que atuava na Associação Redonda de Santiago do Chile eram latino-
de Amigos do Museu do Homem de Paris, americanos e, por essa razão, foi adotado o
para participar do projeto de instalação de espanhol como idioma oficial de comunica-
um museu na comunidade Le Creusot- ção. Além disso, também foram convidados
Montceau-les-Mines. De acordo com o depo- para intervir nos debates especialistas em
imento e a memória de Hugues de Varine, o educação, urbanismo, agricultura, meio am-
projeto do Museu do Homem e da Indústria biente e pesquisa científica. Durante a etapa
nesta comunidade tomou forma em novem- de preparação do encontro, cogitou-se a en-
bro de 1971. Três anos mais tarde, esse mu- trega da direção dos trabalhos a Paulo Freire.
seu-processo, fragmentado e espalhado Por razões políticas, sua indicação foi vetada
numa área urbana de 500 quilômetros qua- na Unesco por um delegado do governo bra-
drados, com 90 mil habitantes, receberia ofi- sileiro, que, naquela altura, vivia sob um regi-
cialmente a designação de ecomuseu. No me de ditadura militar.
entanto, entre o ecomuseu anunciado no
contexto da política governamental do mi- Ao fazer um exercício de lembrança do
nistro francês do meio ambiente e o que chamou a “aventura de Santiago”,
ecomuseu abrigado pelo Museu do Homem Hugues de Varine registrou, como resultados
e da Indústria da comunidade Le Creusot- inovadores daquele encontro, duas noções: o
Montceau-les-Mines, existiam nítidas diferen- “museu integral”, isto é, um processo que leva
ças (VARINE, 2000: 68-69). A principal delas em “consideração a totalidade dos problemas
era o caráter urbano e o sentido de participa- da sociedade”; e o “museu enquanto ação”,
ção da população local que informava o isto é, como um “instrumento dinâmico de
processo de reflexão e ação do Museu do mudança social”. A combinação dessas duas
Homem e da Indústria. noções permitiu que se lançasse no campo do
esquecimento aquilo que, durante mais de
Seguindo por outras trilhas teóricas e prá- 200 anos, se apresentava como paradigma
ticas, um grupo de museólogos e profissio- identitário dos museus: “a missão da coleta e
nais de museus reuniu-se em Santiago do da conservação”. Por esse caminho, chegou-
Chile, em maio de 1972, para a realização de se ao “conceito de patrimônio global a ser
uma mesa redonda sobre o papel dos mu- gerenciado no interesse do homem e de to-
seus na América Latina. dos os homens” (VARINE, 1995: 18).
ções entre esses diferentes caminhos de re- analisando o que de comum nas suas
novação da imaginação museal. ações poderia servir de elo a uma cola-
boração mais estreita, afirmando simul-
Iniciado por volta de 1973 e interrompido taneamente que a museologia trilhava
em 1980, o projeto experimental da “Casa novos rumos (1989: 55).
del Museo” desenvolvido em bairros popula-
res do México, a partir do Museu Nacional de Quando oriento o olhar para a herança
Antropologia, é um exemplo claro de aplica- museológica do século XX – sobretudo a que
ção das resoluções de Santiago do Chile e se construiu após a Segunda Guerra Mundial
que apresenta conexões com os princípios –, parece-me claro que as décadas de 1970 e
teóricos dos ecomuseus comunitários. 1980 caracterizaram-se como um período de
(VARINE, 2000: 67-68). efervescência e turbulência museal sem pre-
cedentes. Experiências variadas e inovado-
O golpe militar que pôs fim ao governo ras foram levadas a efeito e novos enfoques
socialista de Salvador Allende contribuiu teóricos foram desenvolvidos. Os museus,
para o silêncio que se impôs em torno da que até aquela época proclamavam a sua
memória daquele emblemático encontro. O neutralidade política e celebravam o seu dis-
desejo de silenciar a construção de uma tanciamento dos problemas sociais, foram
nova imaginação museal, com acento popu- sacudidos e desafiados a enfrentar situações
lar, participativo e utópico, com uma face concretas que não diziam respeito apenas às
política de esquerda, não foi eficaz a ponto tradições de um passado idealizado, mas sim
de impedir que 10 anos depois, 20 anos de- ao cotidiano e à contemporaneidade das so-
pois e mesmo 35 anos depois os principais ciedades em que estavam inseridos. Traba-
temas daquela memorável mesa redonda lhar com museus deixou de ser apenas um
voltassem sucessivamente a ocupar a agenda exercício de retirar, às vezes, a poeira das
de outros encontros locais, regionais, nacio- coisas, de elaborar, de vez em quando, eti-
nais e internacionais. quetas óbvias, de registrar, disciplinada e do-
cilmente, a acromegalia das coleções e de
O desenvolvimento silencioso de experi- contar – ora pelo modo eufórico, ora pelo
ências orientadas por novas perspectivas deprimido – o número de visitantes. Traba-
museológicas eclodiu, com vigor e algum lhar em museus passou a significar também
barulho, no primeiro ateliê internacional re- ter interesse na vida social e política – das
alizado em 1984, na cidade canadense de pessoas, das coleções, dos patrimônios cultu-
Quebec, ocasião em que foram retomadas rais e naturais e dos espaços – e, por essa ve-
explicitamente as resoluções da Mesa Re- reda, a ser um exercício explícito de operar
donda de Santiago do Chile e foram com relações de memória e poder por meio
lançadas as bases do que se convencionou da mediação das coisas concretas.
chamar de Movimento Internacional da
Nova Museologia (Minom). Segundo depoi- O paradigma clássico da museologia foi
mento de Mario Moutinho: posto em xeque. Mas isso não quer dizer que
tenha desaparecido ou sucumbido depois
Coube ao grupo dos ecomuseus do das batalhas travadas nas décadas de 1970 e
Quebec, em particular à ação de Pierre 1980. Os museus clássicos e tradicionais, as-
Mayrand e de René Rivard, lançar um sim como os outros museus, são dotados de
projeto de encontro internacional onde um poder mimético e de uma grande capa-
se reunissem museólogos de vários paí- cidade de adaptação aos novos tempos. Isso
ses, representando experiências diversas, também não quer dizer, como procurei de-
A RADIOSA AVENTURA DOS MUSEUS 47
monstrar, que não tenham sido obrigados a mônio material e espiritual compondo
acionar mecanismos de reforma e de moder- narrativas poéticas, costurando práticas
nização. Mas, ao acionar esses mecanismos, políticas e pedagógicas que não esta-
eles cuidaram de manter intactos os alicer- vam previstas nos manuais museológi-
ces sobre os quais se assentavam. cos da primeira metade do século XX.
Quando assento a lupa para melhor obser- O caráter inovador dessa imaginação
var a herança museológica do século XX, sal- museal que se desenvolveu no enfrentamen-
tam aos olhos a grande proliferação de mu- to com o paradigma clássico da museologia
seus de variados tipos e a constituição de não é suficiente para afastar dos museus e
uma imaginação museal inovadora: aquela dos processos museais que inspira determi-
que se alimenta de práticas culturais desali- nados riscos e perigos, alguns dos quais fo-
nhadas com a idéia de acumulação ram anteriormente identificados por Hugues
patrimonial e que, em vez de se orientar para de Varine. Aos já identificados, acrescento
as grandes narrativas, desejosas de grandes alguns outros e, desse modo, componho e
sínteses, volta-se para as “narrativas modes- apresento a seguir um conjunto setenário de
tas” (KUMAR, 1997) e valoriza a relação entre riscos e perigos que ameaçam os novos mu-
os seres e entre os seres e as coisas. Podem seus e processos museais:
ser narrativas modestas, mas apresentam pu-
jança discursiva e capacidade de promover 1) ser considerado como ameaça ao mu-
outras possibilidades de identificação. seu clássico e a toda ação cultural espe-
tacular, o que pode ocasionar o seu es-
Essa nova imaginação museal está na origem: vaziamento socioeconômico ou sim-
plesmente a intervenção autoritária;
· da apropriação do saber museológico
especializado por determinados grupos 2) ser considerado como um “outro” e,
étnicos e sociais, que, em combinação portanto, na lógica do “mesmo”, sem
com os seus próprios saberes, geram sa- identidade com o universo museal, o
beres híbridos capazes de produzir prá- que pode levar à negação do direito de
ticas inovadoras; ser apenas um museu diferente;
dução dos modelos autoritários, ego- diversidade museal, de que eles podem ser
cêntricos, excludentes e antidemocrá- tomados como ferramentas de trabalho – e
ticos; podem, portanto, servir a interesses variados
– e de que, mesmo dentro de um único mu-
6) o abandono da especificidade da lin- seu, existem múltiplas linhas de força em
guagem das coisas e da narrativa poéti- ação. Um outro desafio é compreender os
ca, o que pode propiciar a transforma- museus como práticas sociais e centros de
ção do museu em outra coisa qualquer; interpretação, e isso possibilita que sejam
entendidos como campos de relações objeti-
7) o rompimento do canal de contato com vas, subjetivas e intersubjetivas. Pensar os
o outro, com o diferente e mesmo com o museus como espaço de relações é aceitar a
universal, o que pode levar à paralisia sua dimensão humana, a sua condição de
cultural, ao exercício estéril de falar a “casa do homem” em processo de constru-
mesma coisa para o mesmo. Esse último ção e, em conseqüência, o seu estado de per-
perigo pode desembocar na autofagia, manente tensão.
que é, em tudo e por tudo, o contrário da
antropofagia dos velhos modernistas. Em 1980, Waldisa Russio Camargo
Guarnieri elaborou o projeto do Museu da
Para além de todos esses riscos e perigos, Indústria, Comércio e Tecnologia de São
interessa reter que os museus constituem, Paulo, concebendo-o como embrião de um
hoje, fenômeno muito mais complexo do ecomuseu de múltipla sede. Nesse projeto,
que aquilo que se imaginava na década de ela propunha a musealização de fábricas e
1960. Para compreendê-los criticamente, empresas e adotava o “discurso chapliniano
não é mais suficiente reduzi-los ao papel de como tema básico” (GUARNIERI, 1980). No
“bastião da alta cultura” (HUSSEYN, 1994) e começo, no meio e no fim do documento de
de legitimadores dos interesses das classes divulgação do projeto, ela repetia o mote de
dominantes, ainda que esses papéis continu- Charles Chaplin: “Vós não sois máquinas!
em sendo assumidos por muitas instituições. Não sois animais! Vós sois homens! Trazeis o
Ao serem compreendidos como campo de amor e a humanidade em vossos corações!
ação e discurso, os museus deixaram de inte- Vós, o povo, tendes o poder de criar esta vida
ressar apenas aos conser vadores dos livre e esplêndida... de fazer desta vida uma
memorabilia das oligarquias. Se isso é verda- radiosa aventura” (apud GUARNIERI, 1980).
de, mais do que nunca se evidencia a neces- Em meu entendimento, esse discurso univer-
sidade de entender tal fenômeno e aprender sal e humanizador de Chaplin aparecia ali
a utilizar esse instrumento mediador que in- na proposta de Waldisa Russio como o fio
terfere na vida social contemporânea. condutor de uma narrativa utópica, que an-
corava uma nova imaginação museal. Essa
Um dos desafios ao pensamento crítico narrativa parecia sugerir: os museus podem
sobre os museus é o desenvolvimento de in- ser compreendidos como máquinas, tecno-
vestigações específicas que levem em consi- logias ou ferramentas; mas nós não somos
deração um processo dialético mais comple- museus, não somos coisas, somos humanos.
xo do que aquele que se reduz ao jogo entre Nós trazemos o amor e a humanidade em
o passado e o presente, o velho e o novo, a nossos corações; nós temos o poder de criar
tradição e a modernidade. Esse desafio im- artefatos e museus; temos o poder de criar
plica, por exemplo, a consideração de que esta vida livre e esplêndida... de fazer da vida
os museus são plurais, de que há uma grande uma aventura radiosa.
A RADIOSA AVENTURA DOS MUSEUS 49
FREIRE, José Ribamar Bessa. A descoberta do HOBSBAWM, Eric J.; RANGER, Terence. A in-
museu pelos índios. In: ABREU, Regina; CHA- venção das tradições. Rio de Janeiro: Paz e
GAS, Mário (Org.). Memória e patrimônio: Terra, 1984.
ensaios contemporâneos. Rio de Janeiro:
DP&A, 2003, p. 250-251. HUBERT, François. L’écomusée, entre utopie
et nostalgie. 1997. Mimeo.
GONÇALVES, José Reginaldo Santos. Auten-
ticidade, memória e ideologias nacionais: o HUDSON, Kenneth. Un museo innecesario.
problema dos patrimônios culturais. Estudos Museum, Paris, n. 162, p. 114-116, 1989.
históricos, Rio de Janeiro, n.2, 1988.
HUSSEYN, Andreas. Escapando da amnésia.
______. O patrimônio como categoria de pensa- Revista do Patrimônio Histórico e Artístico
mento. In: ABREU, Regina; CHAGAS, Mário Nacional, Rio de Janeiro, v. 23, p. 34-57, 1994.
(Org.). Memória e patrimônio: ensaios contem-
porâneos. Rio de Janeiro: DP&A, 2003a, p. 21-29. KUMAR, Krishan. Da sociedade pós-industrial
à pós-moderna: novas teorias sobre o mundo
______. Os museus e a cidade. In: ABREU, contemporâneo. Rio de Janeiro: Zahar, 1997.
Regina; CHAGAS, Mário (Org.). Memória e
patrimônio: ensaios contemporâneos. Rio de LE GOFF, Jacques. Reflexões sobre a história.
Janeiro: DP&A, 2003b, p.175-189. Lisboa: Edições 70, 1982.
MOUTINHO, Mário C. Museus e sociedade. SANTOS, Maria Célia Teixeira Moura. O pa-
Monte Redondo, Portugal: Museu Etnológico pel dos museus na construção de uma iden-
de Monte Redondo, 1989. tidade nacional. Anais do Museu Histórico
Nacional, Rio de Janeiro, n. 28, p. 21-36,
MOVIMENTO INTERNACIONAL PARA UMA 1996a.
NOVA MUSEOLOGIA. Tèxtes de Muséologie.
In: Cadernos do Minom: Tèxtes de SANTOS, Myrian Sepúlveda dos. História,
Muséologie, Lisboa, n. 2, 1992. tempo e memória: um estudo sobre museus
a partir da observação feita no Museu Impe-
MUSEU MAGÜTA. Boletim do Museu Magüta, rial e no Museu Histórico Nacional. 1989. Ins-
Benjamin Constant (AM), ano 1, n. 1, jan. 1993. tituto Universitário de Pesquisas do Rio de
Janeiro, Rio de Janeiro, 1989.
NICOLAS, Alain (Org.). Nouvelles muséologies.
Marselle: Association Museologie Nouvelle et ______. O pesadelo da amnésia coletiva: um
Experimentation Sociale, 1985. estudo sobre os conceitos de memória, tradi-
ção e traços do passado. Revista Brasileira de
POMIAN, Krzystof. Colecção. In: LE GOFF, Ciências Sociais, Rio de Janeiro, n. 23, p. 70-
Jacques (Org.). Enciclopédia Einaudi, v. 1: me- 84, 1993.
mória/história. Porto: Imprensa Nacional, 1984.
SCHVASBERG, Benny. Espaço & cultura:
POULOT, Dominique. Musée Nation Patrimo- equipamentos coletivos, política cultural e
ine 1789–1815. Paris: Gallimard, 1997. processos urbanos (Dissertação de Mestrado).
Rio de Janeiro: UFRJ/ Ippur, 1989.
PRIMO, Judite (Org.). Museologia e patrimô-
nio: documentos fundamentais. Cadernos de SOLA, Tomislav. The concept and nature of
Sociomuseologia, Lisboa, n. 15, 1999. museology. Museum, Paris, n. 153, p. 45-49,
1987.
RIVARD, René. Les écomusées au Québec.
Museum, Paris, n. 148, p. 202-205, 1985. VARINE, Hugues de. A respeito da mesa-re-
donda de Santiago. In: ARAÚJO, Marcelo
RIVIÈRE, George-Henri. Definition évolutive Mattos; BRUNO, Maria Cristina Oliveira
de l’ecomusée. Museum, Paris, n. 148, p. 182- (Org.). A memória do pensamento museoló-
183, 1985. gico contemporâneo: documentos e depoi-
mentos. São Paulo: Comitê Brasileiro do
____. La museologie. Paris: Dunod, 1989. Icom, 1995, p. 17-19.
ROJAS, Roberto (Org.). Os museus no mun- ______. O ecomuseu. Ciências & Letras, Por-
do. Rio de Janeiro: Salvat, 1979. to Alegre, n. 27, p. 61-101, jan./jun. 2000.
ARTIGO
4
As Ondas do Pensamento
Museológico:
Balanço sobre a produção brasileira1
A
INTRODUÇÃO
A
A Museologia vem passando por profundas transformações, notadamente desde
Mesa Redonda de Santiago, de 1972, que considerou prioridade a intervenção
social. O impacto desta Mesa Redonda, organizada pela Unesco, sobre o “Papel do
Museu na América Latina”, faz dela (DESVALLÉES, 1992), ao lado do colóquio “Mu-
seu e Meio Ambiente” (França, 1972) e das jornadas de Lurs, em 1966, onde se
iniciou a gestação do conceito de ecomuseu, um dos momentos fundadores da
chamada Nova Museologia. A Declaração de Quebec e a criação do MINOM –
Movimento Internacional para uma Nova Museologia em 1984, foram considera-
dos o reconhecimento pela Museologia do direito à diferença (MOUTINHO in
ARAUJO; BRUNO, 1995: 29). Em 1992, a Declaração de Caracas reafirmou a função
sócio-educativa do museu, o estímulo ao pensamento crítico e seu papel como
canal de comunicação (DESVALLÉES, 1992: 15-16). Neste ínterim, as reflexões da
Museologia apontam para a compreensão da cultura como criadora das condi-
ções necessárias para o desenvolvimento. Há um rompimento com a idéia de
coleção como fonte geradora dos processos museológicos, a preservação é enten-
dida como fundamental e como possibilidade de integrar diversos aspectos do
patrimônio e potencializar a ação interdisciplinar. Em meio a esta ampliação con-
ceitual e experiências de aplicação, percebemos que não houve produção científi-
ca e sistematização do pensamento museológico equivalentes, especialmente num
Brasil de estreitas possibilidades de formação na área, panorama que apenas no
início do século XXI vai aos poucos sendo transformado.
54 MANUELINA MARIA DUARTE CÂNDIDO
mulas tradicionalmente definidas por algu- Para Heloisa Barbuy, a Nova Museologia é
mas sociedades” (SCHEINER, 1998: 111). Para “ Uma filosofia guiada pelo sentido de
ela, a identidade dos museus hoje, estaria li- dessacralização dos museus e, sobretudo, de
gada à sua compreensão como plural, medi- socialização, de envolvimento das popula-
ador desta pluralidade junto a outras instân- ções ou comunidades implicadas em seu
cias de representação, fenômeno cultural raio de ação” (BARBUY, 1995: 209). Portanto,
em processo – não instituição –, comprome- distingue Museologia e Nova Museologia
tido com a identidade como processo, não como prismas da disciplina. Cristina Bruno
verdade (Idem: 125). argumenta que há somente uma Museologia,
e a Nova Museologia seria denominação
Scheiner identifica como dilemas atuais adequada somente ao movimento inaugura-
da Museologia: entender como o museu tra- do em Quebec, em 1984 (BRUNO, 1995:158).
dicional disseminou-se além da Europa e Não é uma outra Museologia, mas um alarga-
tornou-se hegemônico, distanciar-se do mito mento de horizontes epistemológicos com
e atuar sobre a realidade; analisar os mode- as mesmas preocupações (Idem: 158). Maria
los museológicos alternativos que o séc. XX Célia Santos (2002) se define simplesmente
viu nascerem (Idem: 137-138). Para Chagas, como museóloga, evitando a rotulação de
tais modelos, com toda a reformulação con- “nova museóloga” e trabalha com a adoção
ceitual que acarretaram, geraram para a Mu- de novos conceitos e práticas trazidas para a
seologia o problema da coexistência de pa- realidade social em que se insere, sem rom-
radigmas distintos. A de Peter Van Mensh pimento radical com o patrimônio já institu-
(1994) onde coexistem múltiplas tendências cionalizado. Ao revisar em 1992, no Encon-
do pensamento museológico contemporâ- tro Internacional de Ecomuseus, as ações
neo, revela a inexistência, até o momento, desenvolvidas no Museu de Arte Sacra da
de uma orientação vitoriosa, o que caracteri- UFBA, mostra que não desvincula a ação
zaria uma crise de paradigmas na Museolo- museológica transformadora da atuação em
gia (CHAGAS, 1996: 29). museus tradicionais. Identifica nas práticas
realizadas nesse museu elementos da
Evres (1992: 195-212) relativiza a conclu- ecomuseologia, como a cultura entendida
são de Chagas de que a convivência de para- enquanto processo social, a ação integrada à
digmas na Museologia constituiria um “caos comunidade e a prática social como ponto
teórico” que se resolveria com a hegemonia de partida; e propõe que o exercício museo-
de um dos paradigmas. Evres se opõe, por lógico se relacione com os modelos dentro
entender que a diversidade de orientações de uma necessária redução ao contexto soci-
não é conseqüência de uma crise, mas da ri- al de aplicação (SANTOS, 1993: 114-115).
queza de soluções surgidas no confronto
com a realidade. No mesmo trabalho Evres Discussão inseparável é a própria
estuda as idéias de Cristina Bruno, mas não indefinição da Museologia enquanto campo
no que diz respeito a este problema do científico. Há propostas desde a patrimonio-
paradigma. Entendemos que esta museóloga logia de Tomislaw Sola (já aceita por Van
considera a existência dos múltiplos univer- Mensch), passando pela disciplina científica
sos de aplicação como parâmetros para ajus- em processo de constituição de Ana
tar a prática museológica, mas que se baseia Gregorová, à definição do ICOM da Museo-
sempre na orientação do paradigma da Mu- logia como ciência aplicada ainda muito li-
seologia como estudo do fato museal, ou gada à instituição museu. Embora não total-
seja, da relação do homem com o objeto mente consensuais são constantes a tríade
num cenário. Homem (público/ sociedade), Objeto (cole-
56 MANUELINA MARIA DUARTE CÂNDIDO
ção/ patrimônio), Cenário (museu/ territó- plina aplicada cujas preocupações princi-
rio), em relação, conforme a definição do pais são a identificação e análise do com-
fato museal por Waldisa Russio. A amplitude portamento do homem em relação ao seu
atribuída a cada um desses vértices dá a patrimônio; e o desenvolvimento de pro-
abrangência do papel do museu e da Museo- cessos que convertam o patrimônio em he-
logia. A bibliografia brasileira compartilha o rança e participem da construção das iden-
debate. Santos (1996: 94-95), em busca de tidades.
uma metodologia para a Museologia, revisa
as “cinco linhas básicas de atuação da ciên- Scheiner (1998) identifica três vertentes da
cia museológica”, de Van Mensch, que são a teorização em Museologia: uma na teoria do
Museologia Geral, a Museologia Aplicada, a patrimônio4, geraria o dilema de que a Muse-
Museologia Especial, a Museologia Histórica ologia depende de uma área do pensamento
e a Museologia Teórica. Tais linhas são, basi- maior à qual pertenceria; a segunda congre-
camente, a composição dos quadros ga aplicação e teorização como partes
referenciais da disciplina propostos por indissociáveis; e a terceira pesquisa o fenô-
Cristina Bruno. A formulação de quadros sin- meno museu. A combinação destas posturas
téticos, aliás, é uma constante em Bruno e faria da Museologia uma ciência específica
Santos. O exercício de síntese e de sistemati- ou vinculada a uma ciência do patrimônio e
zação do conhecimento da área reforça a da memória, que busca elementos para a de-
perspectiva de ambas na formulação de uma finição de uma linguagem própria e univer-
teoria própria para a Museologia. sal em suas experimentações. Sua própria
dissertação, entretanto, é mostra de uma for-
Mário Chagas também afirma seu interesse ma de conceber a Museologia mais afeita à
em discutir os fundamentos epistemológicos discussão teórica que à aplicação e ao con-
da Museologia, colocando-os acima da consi- fronto dos conceitos com a realidade. Indo
deração da mesma como ciência, prática, além do raciocínio que identifica na aproxi-
arte ou disciplina, ainda que diga preferir as- mação dos museus com a visão antropológi-
sim considerá-la: como disciplina (CHAGAS, ca o mais significativo avanço5, Scheiner
1996: 17). A compreensão de Museologia des- (1998) apresenta uma concepção
te autor amplia a definição de Waldisa Russio, biocêntrica, fundamentada na lógica
embora parta dela como base, por entender holística, integradora. Ao contrapor o avan-
que o museu possa ser um cenário institucio- ço do discurso às práticas museológicas tra-
nalizado ou não. O museu conceitual é uma dicionais, sugere a alimentação recíproca de
categoria que ele exprime já na análise do teoria e prática. Entretanto, outros momen-
pensamento marioandradiano, onde o identi- tos do seu discurso afastam a característica
fica. Para Chagas, a relação entre homem, ob- de disciplina aplicada da Museologia. A ri-
jeto e cenário constitui uma realidade em queza de sua contribuição consiste na articu-
trânsito e o estabelecimento da relação como lação da teoria museológica com outras áre-
figura geométrica baseada em três vértices as do conhecimento, estimulante por propor
caracteriza um ternário matricial para o pen- novas articulações. Contudo, parece se afas-
samento e para a aplicação da Museologia tar das tentativas de síntese do pensamento
(Idem: 31). O museu conceitual está presente museológico e também da imperatividade
ainda em outros, como Bruno e Scheiner. da aplicação como método para a constru-
ção do pensamento na área. Em um paralelo
Bruno (1996: 09-38) está envolvida no es- com o que Bruno tem postulado, no sentido
forço para a organização epistemológica da de chegar a modelos, sínteses, sistematiza-
Museologia, que compreende como disci- ções, fixação das bases de uma teoria museo-
AS ONDAS DO PENSAMENTO MUSEOLÓGICO 57
lógica, parece-nos que Scheiner vai numa ressa-se ainda pela discussão sobre o conceito
direção oposta, mas complementar, abrindo de realidade, recorrendo a Bellaigue, Sola e
debates e trazendo elementos de outras áreas Van Mensch, que o aproximaram do recorte
para a Museologia. correspondente à herança cultural e natural
(Idem: 92). Para Bruno (1998a: 19) herança sig-
Apresenta a Museologia como “campo nifica um passo além do patrimônio cuja trans-
disciplinar que trata das relações entre o fe- formação em herança se dá a partir da consci-
nômeno Museu e as suas expressões, a partir ência de sua existência.
das diferentes visões de mundo que cada so-
ciedade elabora, no tempo e no espaço” Santos (1996: 276) apresenta fato museal
(SCHEINER, 1998: 136). Ou como “campo do como “a qualificação da cultura em um pro-
conhecimento que analisa e investiga o Mu- cesso interativo de ações de pesquisa, preser-
seu em todas as suas expressões e manifesta- vação e comunicação, objetivando a cons-
ções”, com o caráter “valorizador de peculia- trução de uma nova prática social”. Heloisa
ridades locais, bem como o papel de Barbuy (1989: 37) acrescenta: “A Museologia,
catalisadora do câmbio social, dando ênfase então, não apenas estuda a relação entre o
ao desenvolvimento de formas de museu homem e a realidade, entre o homem e o
que atendam às conjunturas contemporâne- objeto mas procura, também, atuar sobre
as” (Idem: 124). Dentre os seis autores estuda- esta relação e transformá-la”. Inserir-se na re-
dos, é a única que não se refere à relação alidade e agir sobre ela é uma posição que
triangular já mencionada, portanto, que não vem se firmando na Museologia. Autores
se fixa na definição de Russio para fato como Maria Célia Santos defendem uma
museal. Fica mesmo difícil enquadrá-la no abordagem de cultura integrada a outros as-
esquema de Van Mensch para as tendências pectos do cotidiano. Ao afirmar que a procu-
do pensamento museológico. Entretanto, ra pela qualificação da cultura deva ser reali-
como a própria autora considera-se ao lado zada por meio das ações de pesquisa, preser-
de Russio e Stránský na análise do museu vação e comunicação, a autora está definin-
enquanto fenômeno, tendemos a concluir do também o que entende ser a cadeia ope-
que ela esteja na vertente em que Van ratória básica da Museologia (1996: 271).
Mensch os qualifica: a do estudo de uma re- Também Van Mensch (anotações de aula) e
lação específica entre homem e realidade. Mário Chagas (1996: 92) partem destes princí-
Outra possibilidade é supô-la em acordo pios de investigação, preservação e comuni-
com Evres (2000: 60) na hipótese de que a cação em equilíbrio dinâmico. Em outras
figura triangular não dê conta de uma Muse- ocasiões Chagas se refere a uma cadeia ope-
ologia voltada para um patrimônio em cons- ratória mais sintética, distribuída entre pre-
tante reelaboração, já que ao invés de vérti- servação e dinamização (Idem: 63).
ces preexistentes a relação estaria constante-
mente redefinindo o que sejam homem, ob- Fomos convencidos, entretanto, pelo argu-
jeto e cenário.6 mento do Curso de Especialização em Museo-
logia do MAE/USP, conseqüentemente, de
O fato museal também está presente no pen- Cristina Bruno, segundo o qual a cadeia opera-
samento de Santos, que cita em sua obra a de- tória da Museologia consiste na salvaguarda e
finição de Waldisa Russio segundo a qual ele é na comunicação patrimoniais. Este ponto foi
“a relação profunda entre o homem, sujeito inclusive alvo de questões postas pelos alunos
conhecedor, e o objeto que é parte da realida- do CEMMAE a Peter Van Mensch em entrevista
de à qual o homem pertence e sobre a qual ele inédita (realizada em 05/10/2000). Longe de ser
age” (RUSSIO, apud SANTOS, 1996: 92). Inte- uma questão de terminologia, como pode pa-
58 MANUELINA MARIA DUARTE CÂNDIDO
recer, é um debate que a museóloga paulista Ainda para Bruno (1998a: 54-55), “a Muse-
propõe e que pode ser uma de suas maiores ografia corresponde ao universo da técnica,
contribuições, por afirmar a salvaguarda e a da prática, enfim, do fazer museal. (...) Sendo
comunicação patrimoniais como faces de assim, o conjunto de aplicações das idéias e
operacionalização da Museologia, ambas de conceitos, para a consecução de atividades
caráter preservacionista. de conservação, documentação, exposição
e ação educativo-cultural, diz respeito ao
É possível que Mário Chagas seja um dos universo museográfico”. Expografia é o ter-
primeiros a aquiescer a esta formulação, visto mo usado especificamente para discurso
existir, na sua obra, um discurso que inclui a expositivo. Chagas (1996: 33) também consi-
necessidade de comunicação e uso social do dera a museografia como Museologia aplica-
patrimônio na preservação. Assim, ela não da, responsável pelas “condições práticas e
seria equivalente absoluto do termo salva- operacionais de ocorrência do fato museal”.
guarda, menos ainda de investigação. Ao Russio, na apresentação do anteprojeto mu-
ponderar os sentidos de tombamento e de seográfico presente em sua tese de
preservação, o autor se aprofunda no exame doutoramento, revela uma noção de
da origem latina de preservação (Praeservare museografia similar às anteriores. Os concei-
– ver antecipadamente o perigo) para afirmar tos de museografia e de Museologia de
que “o perigo maior que paira sobre um bem Barbuy (1999: 43) são expressos quando se
cultural é a sua própria morte ou deterioração” refere à museografia como “a idéia de uma
(CHAGAS, 1999: 104), e que “o sentido da pre- organização espacial e visual corresponden-
servação está na dinamização (ou uso social) te a uma dada concepção intelectual e ideo-
do bem cultural preservado” (Idem: 105). Se- lógica (museologia)”. Desta forma, trata por
guindo este raciocínio, Chagas poderá resolver museografia não toda aplicação da Museo-
o paradoxo por ele identificado entre as neces- logia, mas o que denominamos expografia.
sidades de conservação e de dinamização, di- Já Scheiner (1998: 124), ao definir
ante da inexorável ação do tempo sobre os museografia, como “o conjunto de práticas
bens patrimoniais (CHAGAS, 1996: 104). Como através das quais o Museu se viabiliza, ga-
hoje compreendemos, a preservação pode es- nhando uma identidade específica, uma per-
tar fundamentando igualmente ações de sal- sonalidade própria”, estaria em acordo com
vaguarda e de comunicação patrimoniais. Bruno, Chagas e Russio, mas eventualmente,
usa o termo também no sentido de expogra-
Para Bruno, a Museologia é uma discipli- fia (Idem: 137).
na preservacionista baseada na cadeia ope-
ratória de salvaguarda e comunicação: “Rea- A determinação do universo de museali-
firmando que a preservação é a função bási- zação também é alvo das discussões, com a
ca de um museu e que a partir dela estão afirmação de uma noção cada vez mais am-
subordinadas todas as outras, tais como cole- pliada do patrimônio musealizável, passan-
ta e estudo dos objetos e/ou espécimes da do de objeto para uma orientação teórica
natureza; salvaguarda das coleções e/ou re- baseada no fato museal, como é predomi-
ferências patrimoniais (conservação e docu- nante ou talvez unânime entre os seis
mentação) e comunicação (exposição, edu- museólogos estudados. Chagas (1996) enten-
cação e ação sócio-cultural), salienta-se que de que o conceito de museu cobre o univer-
o desempenho articulado de todas estas so inteiro e tudo é musealizável. Museu é o
facetas preservacionistas deve estar vincula- lugar onde podem ser estudadas as relações
do ao exercício da disciplina museológica” entre o homem e a realidade do universo em
(BRUNO, 1995: 145-146). sua totalidade. Sua noção de patrimônio
AS ONDAS DO PENSAMENTO MUSEOLÓGICO 59
210). Segundo ela, a compreensão de uma de tempos idos. Embora não o diga clara-
ruptura radical foi imprópria: “Que esses ob- mente, parece-nos subjacente a considera-
jetos sejam recolhidos ou não para dentro ção de que hoje o museu pode, sim, existir
de um museu, isto depende de cada contex- sem objetos.
to cultural e de cada projeto museológico
mas em nenhum momento propôs-se que os Afirmada, porém, a permanência do obje-
objetos deixassem de ser inventariados ” to na tríade que define o objeto de estudo da
(Idem, 211). Uma alternativa à formação de Museologia como sendo o fato museal, pas-
coleções e à recolha de acervos pode ser samos à outra vertente da questão, referente
encontrada entre os modelos museológicos à relação museu-público. Maria Célia Santos
propostos por Bruno (1995): a constituição (1993: 75) confere à identificação entre o pú-
de bancos de dados de referências patrimo- blico e o que se encontra exposto, o papel de
niais. Mesmo sem nomeá-las diretamente, viabilizar esta comunicação. Se a identifica-
entendemos que Barbuy está tratando em ção é hoje palavra de ordem, o estranha-
seu texto daquilo que Bruno assim identifica. mento, o mistério e o distanciamento, já fo-
Já na obra de Chagas, há a alusão direta à ram a tônica da relação. Scheiner expôs
expressão referência patrimonial. como as normas coercitivas já nortearam a
visitação aos museus e geraram certo senso
Waldisa Russio (1980: 114), anterior a esta comum de qual seja a relação possível com
formulação, referia-se a uma “representativi- estas instituições. Para ela, é no séc. XIX que a
dade das peças”. Observe-se a magnitude da emoção entra no museu. Sentimentos como
noção de patrimônio aí envolvida, e a visão o prazer e a emoção são fatores desta rela-
antropocêntrica, porque o objeto não está ção pouco examinados pela Museologia,
presente per si, mas pelo que representa: sua como observaram Fattouh e Simeon (1997:
proposta era de que a linguagem dos objetos 31-32) em sua análise do pensamento do
narrasse o processo de industrialização e que ICOFOM.
aquele não fosse um museu de máquinas,
mas memória de lutas, de homens. Ainda as- A identificação do público com o patri-
sim, o abandono da tridimensionalidade mônio musealizado e sua utilização para ge-
equivaleria para esta autora, ao da represen- rar estímulos no sentido da conscientização
tatividade, documentalidade, testemunhali- e da ação sobre o real são hoje mais condi-
dade e significância inerentes aos objetos zentes com o papel social esperado de um
(Idem: 74-84). museu, que, para Bruno, se realiza na
intersecção de dois outros, o científico e o
Scheiner (2000: 22) entende que mais que educativo, ao “propiciar a compreensão so-
representação, o museu é criador de sentido. bre o patrimônio / herança e o exercício da
Os conjuntos significantes ali criados sinteti- cidadania” (BRUNO, 1998a: 27). Maria Célia
zariam práticas, valores e sensações do indi- Santos (1993: 52) afirma: “Para nós, o simples
víduo, considerados patrimônio pelos víncu- ato de preservar, isolado, descontextualiza-
los afetivos a eles atribuídos. A existência do do, sem objetivo de uso, significa um ato de
objeto seria, desde o mito de origem dos indiferença, um ‘peso morto’, no sentido de
museus, fundamental nos processos desen- ausência de compromisso. Entendemos o
volvidos (Idem, 29-30). Apenas nesta autora ato de preservar como instrumento de cida-
percebemos um certo distanciamento, como dania, como um ato político e, assim sendo,
se o objeto fosse uma realidade ligada so- um ato transformador, proporcionando a
mente a uma atuação museológica mais tra- apropriação plena do bem pelo sujeito, na
dicional, onde seria um mito arraigado des- exploração de todo o seu potencial, na inte-
AS ONDAS DO PENSAMENTO MUSEOLÓGICO 61
gração entre bem e sujeito, num processo de logia definido por Ulpiano Bezerra de
continuidade”. Um museu “onde o cidadão Meneses como administração da memória, e
comum encontre traços da sua cultura, do assim por diante. Scheiner imputa ao museu
fazer do seu dia-a-dia, se identifique como a filiação à memória, que o liga definitiva-
aquele que participa da História, que, sem mente aos seus meios capitais de expressão,
perder de vista as suas raízes, utiliza-a como o tempo, a língua e o espaço. E seria consoli-
referencial, compreende o seu presente e dado por meio do objeto, como em Chagas,
constrói o seu futuro” (Idem: 19). síntese das representações. Como os demais,
percebe a existência de uma memória
É nessa linha de pensamento que se en- multifacetada, construída no presente. Os
contra também Heloisa Barbuy (1989: 36), ao museus, como bibliotecas e arquivos, seriam
centrar o papel social e educativo do museu responsáveis pela guarda dos registros mate-
no seu potencial “de aumentar a capacidade riais da memória coletiva, fazendo dos
de uma coletividade de projetar seu próprio museólogos, administradores dessa memória
futuro e de ser sujeito ativo – e não passivo – (SCHEINER, 2000: 31-35). Como espelho, o
de sua própria história, a partir da consciên- museu lidaria simultaneamente, com identi-
cia que passa a ter de si mesma”, já que “a dade e alteridade, reconhecendo a
ação cultural exercida pelos museus e por pluralidade.
outras instituições culturais tem importante
papel na relação que o homem desenvolve A globalização, criou seu inverso, o refor-
com sua realidade ” (Idem: 40). Waldisa ço das identidades regionais. Esta autora
Russio (1977: 132) propôs um museu destaca a maneira como o museu, em meio
propiciador do questionamento, da crítica, à própria crise de identidade, tem articula-
da avaliação, da ética e da transformação: do o debate sobre esta problemática. Em es-
“O museu deve ser compreendido como um tudo de 1987 sobre a produção do ICOFOM
processo em si mesmo, como uma realidade em torno desta matéria, percebeu as origens
dinâmica. (...) O museu não existe isolada- regionais das distintas compreensões. Esta
mente, mas dinamicamente, na sociedade”. conclusão tem paralelo em Fattouh e
A atitude contrária estaria relegando o mu- Simeon (1997: 48), que apreendem da pro-
seu gradualmente ao esquecimento. dução dos autores procedentes de países
Scheiner alerta também para o papel de “es- em via de desenvolvimento o interesse em
tabelecimento e manutenção da compreen- uma ação que contribua para a construção
são e da tolerância intercultural”, ainda por de identidades nacionais, aspecto, a seu ver,
realizar (SCHEINER, 1998: 35). já resolvido no primeiro mundo. Para além
da busca de ingresso no “concerto das na-
Intrinsecamente ligados à teoria museoló- ções” (BARBUY, 1999; CHAGAS, 1999), os
gica estão os temas da memória, da identida- museus mesmo nos países subdesenvolvidos
de e da diversidade cultural. Para Bruno, é passam a reconhecer a importância da voca-
na consciência sobre o patrimônio e na ção territorial, com base em distintos níveis
construção das identidades que se realiza o de identidade sobre o qual estariam agindo.
tributo dessa disciplina. A intimidade entre Aos museus de caráter nacional, somam-se
Museologia e memória é identificada por os regionais e os locais. No Brasil, o conceito
Evres (2000:62) como existente desde Russio. de museus de território pouco a pouco pas-
Realmente, entre os autores estudados, todos sa a gerar processos museológicos.
praticam esta associação. Chagas entende os
bens patrimoniais como representações da Heloisa Barbuy (1995: 222), ao discutir os
memória, Bruno ressalta o papel da Museo- ecomuseus, alerta para que sua problemática
62 MANUELINA MARIA DUARTE CÂNDIDO
central – que aqui estendemos a toda a pro- está suspensa, presa por um fio de insatisfa-
blemática preservacionista – seja a definição ção” (1977: 142).
para “o limite entre o caráter revolucionário
ou conservador da construção de identida- Desenvolvimento pela qualificação da
des culturais”. O tema da vocação territorial cultura é a proposta presente em Santos e
está associado a uma nova discussão que se Bruno. O ingresso da reflexão sobre desen-
impõe no universo de reflexão da Museolo- volvimento por meio da preservação e da
gia e que diz respeito à necessária compre- ação museológica tornou-se possível somen-
ensão da cultura como criadora das condi- te com as alterações profundas na relação
ções necessárias para o desenvolvimento e, entre museu e passado. Hoje, esta não é a
portanto, sua preservação como fator indis- única temporalidade à qual se liga o museu:
pensável para tal (VARINE in DESVALLÉES, ele articula presente, passado e futuro, como
1992: 56). A disposição no sentido de associar catalisador da evolução social. Waldisa
desenvolvimento sustentável e afirmação do Russio (1977: 26) aludiu ao museu como
uso como estratégia de preservação do patri- “deflagrador das utopias”. A musealização
mônio permeia os debates contemporâneos tem um sentido, em sua obra, não somente
da Museologia, como exemplo, a Carta de de registro do passado, mas de preservação
Santa Cruz, oriunda do II Encontro Internaci- do presente e antecipação do futuro.
onal de Ecomuseus “Comunidade, Patrimô- Scheiner (2000: 91) denota ao fenômeno
nio e Desenvolvimento Sustentável” (2000). museu uma nova inserção no tempo afir-
mando que “Museu é tudo o que se dá no
A idéia não é nova nem o debate pode ser presente, e também o passado e a projeção
superficial. Como Evres, identificamos tam- de futuro”. A própria experiência do tempo
bém a presença de diferentes noções de de- teria sido contemporaneamente revolucio-
senvolvimento entre os documentos de Santi- nada: “presente, passado e futuro diluem-se
ago e de Caracas. Naquele, julga-se suficiente numa percepção de permanente atualidade,
a apreensão de modelos desevolvimentistas onde preservação e transformação se equi-
dos países do primeiro mundo pelos demais: valem” (Idem, 97). E seguem-se outros pontos
“Não há uma preocupação com a forma de de vista confluentes, como em Chagas (1996:
utilização das riquezas naturais, apenas com 99) “A cada dia assenta-se mais a noção de
quem as usa. Como forma de minimizar as que a sobrevivência da instituição museal
desigualdades sociais, o uso da natureza de- depende da sua capacidade de, enquanto
verá ser estendido a todos” (EVRES, 2000: 40). espaço cultural aberto e público, abrir-se
É uma natureza dominada pelo homem que para o tempo presente, para aquilo que de
se encontra nesse documento. Vinte anos de- museológico existe fora dos limites espaciais
pois, Caracas já reflete um mundo em que do museu institucionalizado”.
desenvolvimento e tecnologia não são sinôni-
mos. A desilusão com a manutenção das desi- Houve mesmo uma discussão sobre
gualdades em paralelo ao avanço tecnológi- futurologia e Museologia puxada pelo ICOM,
co e com a inaptidão dos padrões desenvolvi- na qual Barbuy afirmou: “(...) o objeto de tra-
mentistas do primeiro mundo para uma apli- balho é o tempo presente, em toda sua
cação direta e a-crítica nos demais países se fugacidade, em toda sua natureza de passa-
fazem notar. Waldisa Russio já prenunciava o do em potencial” (BARBUY, 1989: 36). E ain-
abismo entre desenvolvimento e progressos da: “ (...) há um papel reser vado à
tecnológico e econômico ao afirmar que Futurologia, que pode auxiliar a Museologia,
“não basta ao ser humano a fruição de um justamente com seus prognósticos sobre a
grande conforto material quando sua alma realidade de amanhã, definindo os pontos a
AS ONDAS DO PENSAMENTO MUSEOLÓGICO 63
proposta por Russio. Quando a autora defen- considera-se em dívida com um estudo das
de a adequação da linguagem tridimensio- contribuições de Freire para as reflexões no
nal dos objetos para narrar o processo de in- âmbito da Museologia. Para ela, “A relação
dustrialização (RUSSIO, 1980: 114), a formu- entre museu e educação é intrínseca, uma
lação é centrada numa narrativa, não ainda vez que a instituição museu não tem como
em um diálogo. A informação contida nos fim último apenas o armazenamento e a
objetos interessa à Museologia pelos fatores conservação, mas, sobretudo, o entendimen-
de documentalidade, testemunhalidade e fide- to e o uso do acervo preservado, pela socie-
lidade. Bruno tem se detido com afinco na ca- dade, para que, através da memória preser-
racterização dos objetos de museu como obje- vada, seja entendida e modificada a realida-
to-diálogo, reforçando que eles não falam per de do presente. Nesse sentido, a própria con-
si, mas que seus sentidos e significados são cepção do museu é educativa, pois, o seu
construídos na relação com o público. objetivo maior será contribuir para o exercí-
cio da cidadania, colaborando para que o
A relação propiciada pelos museus é, para cidadão possa se apropriar e preservar o seu
Chagas, “campo fértil para a ocorrência o patrimônio, pois ele deverá ser a base para
processo educativo transformador, capaz de toda a transformação que virá no processo
estimular a descoberta, de produzir novo co- de construção e reconstrução da sociedade,
nhecimento, de despertar novas emoções, sem a qual esse novo fazer será construído
sensações e intuições” (CHAGAS, 1996: 84). de forma alienante” (SANTOS, 1993: 99).
Barbuy (1989: 36), combina as funções sociais
e educativas do museu para demonstrar seu Santos e Bruno estão lado a lado na defi-
potencial de conscientização e de nição da educação e da conscientização
capacitação coletiva para a tomada das ré- como parâmetros para o desenrolar do pa-
deas de seu porvir. O aprendizado baseado pel social dos museus, sem cujas limitações
na relação dialética entre educador e edu- sua ação pode perder as especificidades e
cando é defendido por Chagas (1996: 84): a confundir-se com atuações de outras áreas
ação educativa tem base no diálogo e permi- do conhecimento.
te a “transformação do bem cultural em bem
social” (Idem: 62). Russio, em suas propostas, Se as fronteiras do que seja ação museoló-
baseava a formulação das atividades gica são delimitadas pela educação e pela
educativas em uma concepção de aprendi- conscientização, estes limites foram explora-
zado constante. Talvez possamos entrever aí dos ao máximo pelas formulações que deri-
paralelos com a educação libertadora desen- varam no modelo museológico do
volvida em processo permanente, de Paulo ecomuseu. Muita confusão na interpretação
Freire. São características comuns a ambos, de conceitos tem feito desta denominação
o desenvolvimento da criatividade, do senso um guarda-chuva onde tudo cabe. Algumas
crítico e da consciência, numa perspectiva balizas, entretanto, são propostas por Barbuy
que a autora denomina ecológico - (1995: 211) a partir da conceituação de
humanista. Bellaigue: o território, a população como
agente, o tempo e o patrimônio. Bruno reduz
A expressão máxima da influência do o conceito às seguintes variáveis: o território,
pensamento deste educador entre os o patrimônio constituído sobre este espaço,
museólogos estudados pode ser a atuação de e uma população, que viva nesse território
Maria Célia Santos na Bahia. Ela mesma des- interagindo com esse patrimônio10. Russio,
taca este aspecto do seu pensamento em en- ao sugerir que os museus de fábrica propos-
trevista a Mário Chagas (SANTOS, 2002) e tos em seu doutorado fossem espécies de
AS ONDAS DO PENSAMENTO MUSEOLÓGICO 65
tividade dessa análise e recorrência na bibli- da, colaborando para a divulgação maior da
ografia da conceituação gerada a partir da produção da Museologia em língua portu-
definição de fato museal por Russio, consi- guesa e abrindo uma das poucas vias editori-
deramos que esta tenha sido até o momento ais nesta língua que resistem às primeiras
a mais proeminente contribuição brasileira publicações.
para a construção epistemológica da Museo-
logia. Contribuição que consideramos de funda-
mental importância na bibliografia nacional
É, portanto, lamentável, que ainda hoje a é a opção por soluções particulares e criati-
barreira da língua seja critério para a delimi- vas frente às tecnologias inadequadas vindas
tação das idéias que possam ou não ser ele- do exterior. A necessidade de redução das
vadas ao plano do conhecimento internaci- teorias aos contextos específicos faz parte
onal e do reconhecimento de sua relevân- das reflexões que os países em desenvolvi-
cia. Por um lado, permanece no mundo da mento podem, mais que quaisquer outros,
Museologia a dicotomia entre reflexões de recomendar, por suas próprias e desastrosas
procedência anglófila ou francófila. Não que experiências com a importação de padrões
isto represente na maior parte dos casos uma não adaptados às suas realidades. Advertên-
discordância conceitual, mas uma resistên- cias a este respeito estão ainda em Scheiner
cia da intelectualidade desses universos em e Bruno. Uma outra consideração é essenci-
aprofundarem o debate da produção prove- al: a diversidade cultural deve ser valorizada
niente de outra língua. O ICOFOM é a instân- como o conjunto das possibilidades do ho-
cia do ICOM que tem proporcionado uma mem resolver sua existência material e ima-
quebra destas rotinas, com a adoção de terial. Como a biodiversidade proporciona
parâmetros bilíngües de publicações e deba- diferentes soluções para a sobrevivência bio-
tes. A superação de um empecilho adicional lógica das espécies, a diversidade cultural
tem sido objetivo de lavor suplementar: a representa os recursos disponíveis para a so-
problemática das terminologias, que gerou brevivência e adaptação da espécie humana
um Grupo de Trabalho específico no seio do ao seu ambiente. Com isto em apreço, avali-
ICOFOM. amos o Brasil como sendo possuidor de um
conjunto cultural especialmente diverso e
Ainda assim, a produção dos autores brasi- detentor de um vasto universo para experi-
leiros aqui estudados não é de largo conhe- mentações que venham a alimentar a
cimento internacional, seja porque os auto- teorização em áreas como a Museologia.
res não têm seus textos versados para outros
idiomas, seja porque nem todos têm ou tive- No sentido das contribuições epistemoló-
ram participação no ICOFOM. Na obra men- gicas, identificamos neste estudo uma outra
cionada de Fattouh e Simeon (1997: 31-32), formulação de grande relevância, quando
os brasileiros presentes são Barbuy, Bruno, Cristina Bruno, em seu exercício de sistema-
Russio e Scheiner, além de Marcelo Araujo e tização da teoria museológica, vai na essên-
Maria de Lourdes Parreiras Horta. cia da questão da especificidade do caráter
preservacionista da Museologia, desenvolvi-
Por isto, destacamos iniciativas como a da do por meios de ações que garantam a salva-
criação do ICOFOM-LAM, onde se tornaram guarda e a comunicação patrimoniais. A de-
possíveis os intercâmbios de idéias em ter- finição desta cadeia operatória básica para a
mos de América Latina e a da publicação já Museologia e a concepção de que a preser-
mencionada dos Cadernos de Sociomuseo- vação é a natureza deste processo nos pare-
logia em Portugal, que estão, há uma déca- ce ser um avanço no sentido da demarcação
70 MANUELINA MARIA DUARTE CÂNDIDO
serviço da pesquisa científica. São Paulo: EVRES. Ana Cristina Léo Barcellos. A Mu-
FFLCH/USP, 1984. (Dissertação de sealização da Natureza. Patrimônio e Memó-
Mestrado). ria na Museologia. Rio de Janeiro: UNI-
RIO, 2000. (Dissertação de Mestrado)
_____. Objeto de museu: do objeto teste-
munho ao objeto diálogo. Palestra proferi- FATTOUH, Nadine, SIMEON, Nadia.
da na Reunião Regional da Associação Brasi- ICOFOM – Orientations museologiques et
leira de Antropologia. Belém: 1993 origines geographiques des auteurs. Paris:
(digitado). École du Louvre, 1997.
CHAGAS, Mario. Há uma gota de sangue _____. “Conceito de cultura e sua inter-rela-
em cada museu: a ótica museológica de ção com o patrimônio cultural e a preserva-
Mário de Andrade. Lisboa: ULHT, 1999. (Ca- ção.” in Cadernos Museológicos, 3. Rio de
dernos de Sociomuseologia, 13) Janeiro: IBPC, 1990.
_____. Museália. Rio de Janeiro: JC Editora,1996. SANTOS, Maria Célia T. Moura. Reflexões
museológicas: caminhos de vida. Cadernos
DESVALLÉES, André. “A Museologia e os mu- de Sociomuseologia Nº18- ULHT, Lisboa,2002
seus: mudanças de conceitos”. in Cadernos
Museológicos, 1. Rio de Janeiro: MinC/ _____. Museu, escola e comunidade: uma
SPHAN - Pró-Memória, 1989. integração necessária. S. L.: SPHAN, 1987.
A
¿QUE PUEDE HACER LA ARQUITECTURA POR LOS MUSEOS?
M
Muchas veces me he hecho esta pregunta como profesional de la
arquitectura, bien entendido que con la mirada en la profundización que va
mas allá de la mera solución espacial, que evidentemente ha de ser siempre la
mejor posible. Como historiador y como conservador de museos, entiendo que
la arquitectura tiene mucho mas que decir y puede ayudar a facilitar el diálogo
con el contenido potenciando la puesta a punto de la obra.
por otro es el pretexto para que los políticos programas (también en continua y confusa
laven su cara con respecto a la indiferencia evolución), y no sabemos como diseñarla y
con que miran la a la cultura. Esto hace que por tanto darle una formalización
se destinen enormes presupuestos coherente.
prácticamente ilimitados en su faceta
arquitectónica y urbanística, que, en la Dado la complejidad que demostró el
mayoría de los casos, no tienen continuidad paso del palacio al museo, ¿Seremos
en el mantenimiento de su programa poste- capaces de lograrlos por caminos mas rápi-
rior ( en España especialmente), con lo que dos, o tendremos que evolucionar con la
se están construyendo brillantes edificios lentitud y dificultad que costo la definición
que no son museos, ya que antes he explica- de una nueva tipología en el pasado? El
do que es absolutamente imprescindible tan- tiempo dirá si hemos aportado algo eficaz.
to un contenedor como un contenido y una
programación buenas (todas y a la vez) para Una parada en el camino
que la institución pueda recibir dicho
nombre. La gran beneficiada es sin lugar a “Dentro de los procesos técnicos conviene
dudas la arquitectura, que esta experimen- de vez en cuando hacer un alto y plantearse
tando nuevos materiales, sistemas desde un punto de vista mas personal sobre
constructivos y estructurales; algo es algo. lo que en realidad se esta haciendo, ya que
en la mayoría de los casos la propia
....y estrellas sin luz mecánica de la investigación no te permiten
“ver el bosque”, alejarte un poco y mirar con
Pero el problema no acaba aquí, ya que se mas perspectiva el tema”.
estén levantando estas espectaculares
construcciones, sin una revisión e Como enseñar el objeto cultural
investigación de los organigramas que los
sustentan: seguimos trabajando con los mo- ¿Qué hacer?, ¿qué dirección tomar? Todas
delos del siglo XIX, y es evidente que la estas incertidumbres cambiaron el ritmo del
sociedad ya no es la misma. trabajo que a partir de entonces se dividió en
dos apartados totalmente diferenciados:
Del palacio al museo...¿del museo a donde?
· El periodo reflexivo, en el que a base de
Con este subtítulo, se pretende expresar de una serie de preguntas ( la mayoría de
una manera irónica la relación que a mi ellas sin contestación), indagábamos so-
juicio se establece o se establecerá en el futu- bre las cuestiones que nos habría
ro, entre los dos cambios mas sustanciales llevado a semejante situación. (¿Por
que hasta la fecha a soportado el museo. qué no vienen a los museos?)
como método, de originalidad como CUANTOS MAS MEJOR, CUANTO MAS DIFE-
actitud, de alarde formal como resultado, ya RENTES TAMBIÉN
que son caminos ineficaces, que en el mejor
de los casos tras brillantes resultados “Ninguno de nosotros solo es
formales, se esconden los mismos problemas tan inteligente como todos
de base sin resolver. nosotros juntos”
Proverbio japonés
Los profesionales de “reconocido prestigio”
Fundamentalmente por eficacia, hemos
Parece en un principio lo mas lógico decidido trabajar siempre colectivamente, es
seleccionar para las respuestas formales, a decir implicar al mayor número de profesio-
determinados especialistas, arquitectos y nales o estudiantes que estén interesados en
diseñadores “famosos” y plantearles las esta propuesta y compartan las mismas
propuestas de investigación teórica para que preocupaciones. Entendemos también que
experimentaran libremente, así se hace habi- los temas culturales, a pesar de haber
tualmente y tenemos a mano numerosos llegado, a nosotros junto a la
ejemplos concretos en busca de ideas y solu- personalización de unos nombres, son logros
ciones nuevas. de mucha gente que va avanzando poco a
poco y que da el gran salto en un momento
Sin embargo analizando mas despacio, determinado y de la mano de una figura
con un cierto detalle los resultados, se obser- concreta (único dato que manejamos),
va que en la mayoría de los casos, el autor de cuando la realidad histórica nos muestra que
prestigio, además de los problemas de sin el proceso colectivo anterior, dicho autor
disponibilidad de tiempo, esta mas no habría sido capaz de encontrar el nuevo
pendiente de otros “matices” que el de la camino.
propia experimentación y su inevitable
riesgo. Por tanto entendía que si era posible Pensé desde el principio que el desarrollo
habíamos de buscar otra vía mas libremente de La Caja de Cristal, requería un esfuerzo
implicada, buscar personas independientes y colectivo lo mas amplio posible en cantidad
arriesgadas, que no tuvieran nada que perder y calidad, ya que estábamos tratando un
si su propuesta fracasaba, (algo inherente en tema importante para la arquitectura (una
los procesos experimentales en el que el búsqueda de tipología), la museología (una
acierto y el error equidistan por igual) y nueva organización del espacio); y la
pudieran dedicar todo su tiempo y energía a exposición ( un concepto diferente). En
este trabajo de inciertos resultados. cantidad al pedir la colaboración de mas
personas; en calidad, intentando que lo
Los estudiantes de los últimos cursos o aceptaran diferentes ámbitos geográficos, di-
preferentemente recién acabados, no versas culturas y en lo posible que fueran
inmersos directamente todavía en proceso países jóvenes por las razones que voy a ex-
social del trabajo y en su vorágine de éxito plicar a continuación.
deseado y consecuente vanidad, me
parecieron los mas adecuados. Para ello Es verdad que en Europa, después de
pedí ayuda a la universidad. muchos siglos hay un nivel social equilibra-
¿QUE PUEDE HACER LA ARQUITECTURA POR LOS MUSEOS? 79
do, que permite un discurso intelectual y mínima oportunidad o las propuestas que
unos procesos de investigación coherentes, continuamente nos llegan para colaborar
pero es así mismo cierto y lo comento con nosotros. Aprovechémoslas.
siempre que me lo preguntan, que cuando
estoy en países de mas corta historia, su falta Es cierto que nuestros estudiantes deben
de estructuración social, su desigualdad en estar preparados para defenderse en la
el conocimiento, queda en mi opinión com- realidad y en ese sentido la universidad ha
pensada, (evidentemente a nivel de actitud, de estar alerta a como funcionan los meca-
nunca socialmente ) por una mayor nismo profesionales en la calle; pero con la
intensidad en todo. Hay mucho por hacer, misma rotundidad defiendo que la sociedad
hay pocas posibilidades y eso genera en los ha de conocer todo lo que el estudio, la
profesionales y especialmente en los investigación y la experimentación
alumnos una actitud increíblemente abierta. universitaria proponga, esa es su misión. Ya
Esto es bueno para la experimentación. Al no se reflexiona, apenas se discute. O es un
fin y al cabo todos estas nuevas propuestas camino en las dos direcciones, o la
siempre serán mejor escuchadas / aceptadas, universidad se convierte en una gestoría de
en aquellas sociedades que tienen todo por los intereses sociales, y desde luego no fue
delante un camino para configurar el futuro, creada para ese fin.
cuando ya no les sirven los viejos modelos
históricos, al que se añade un pasado sin de- Tres excelentes universidades de la
masiadas ataduras. arquitectura y algunos mas
Pienso, que evidentemente sí, pero en un Museos pantalla. ¿Cómo ha de ser un espacio
proceso algo más complejo, ya que estas expositivo, cuando la obra no se cuelga, sino
nuevas concepciones, llevan implícito no que se proyecta?, esta sería la pregunta básica a
solo la nueva aceptación de una serie de la que vamos a intentar contestar formalmente.
conceptos, radicalmente diferentes, sino que A nivel de proyecto, esto significa un cambio
el equipamiento técnico y el diseño espacial trascendental en todos los parámetros del
que necesitan para desarrollarse es muy dife- diseño, ya que los “objetos” audiovisuales
rente. Por tanto si, creo que si los museos poseen unas condiciones bien diferentes tan-
siguen evolucionando con lógica, to en su sentido de exhibición, como en el
incorporarán estas formas de trabajar, pero equipamiento técnico.
no de una manera inmediata. El tiempo dará
la contestación exacta. ¿Cómo y donde se cuelga un cuadro virtu-
al?, ¿ dónde se guarda? Difícil planteamien-
Los trabajos los podríamos para clarificar to, respuesta y solución. Museos virtuales,
mas las propuestas en cuatros grupos. algo sobre lo que hay que afrontar por
mucho queramos evitarlo.
1. Espacios que sean capaces de respon-
der a dos temas fundamentales: El museo como equipamiento urbano
cando, el que se ofrece. No le exige nada, si de construir pero barata a medio y largo
quiere se para, si quiere sigue; no hay mayor plazo por su permanente utilidad. Es eviden-
relación entre ambos que un primer te que según las necesidades que tenga cada
contacto, que pretende en lo posible ser ciudad la instalación que se ha de pensar es
libre, evitar los condicionamientos sociales. diferente. Podríamos en un principio
plantear tres tipos de cuestiones: ¿Una sola
¿Cómo han de plantearse estos nuevos actividad o usos múltiples?, ¿Qué
espacios?, ¿Cómo son las visitas a sus equipamiento técnico debe llevar?, ¿Cómo
“colecciones?, ¿Con que criterios se montan? es su organización espacial?.
que ver una con la otra salvo en casos diez proyectos seleccionados por su interés,
excepcionales. se publicó en el año 2002 en ¿Por qué no
vienen a los museos?
¿Cómo se cuelga un cuadro virtual?
Entiéndase pues como una muestra muy
Hemos emprendido hace un año un resumida de todos los logros conseguidos
proyecto, para tratar de dilucidar algo colectivamente (nunca individual), por la
mas sobre el lenguaje virtual, colaboran- seriedad, metodología y trabajo en
do con dos de los mas prestigiosos grupos profundidad de estas ciento cincuenta
del país especializados en el tema. El personas a lo largo de los últimos diez años.
análisis se ha divido en tres puntos
fundamentales, que desarrollará cada uno Recuerdo que en todos los casos la
de dichos equipos: prioridad de base ha sido la búsqueda para
conseguir que la relación del visitante con la
1. Las posibilidades de la tecnología obra expuesta sea lo mas abierta y rica
audiovisual en las exposiciones posible en todos los sentidos posibles; desde
tradicionales (por identificarlas de el mas estricto diálogo conceptual a la
alguna manera), que apenas se utiliza. mayor coherencia y confort espacial.
es decir según el itinerario que recorriesen. sustituyen el concepto del elemento auxiliar
Tema muy sugerente en el sentido de poder del soporte, por un montaje mucho mas in-
ver una misma obras desde puntos de vista tegrado, hay propuestos bastantes trabajos,
diversos. Difícil solución que siempre tiene prioritariamente diseñados por arquitectos.
como definitivo lenguaje a la geometría. Hay en mi opinión dos problemas que se
repiten en estos planteamientos: la relación
De obra en obra. La preocupación por no de la obra con el espacio, que suele ser mas
producir en el espectador la sensación de un compleja y la potencia que desarrolla la
camino a seguir, llegó a su máximo nivel en un arquitectura, que puede ejercer demasiada
proyecto que marcaba un rígido itinerario; presión sobre la obra.
consiguiendo que desde cada obra solo se vie-
ra la siguiente y por tanto el visitante lo seguía La estética (de la forma a la función). En
de una manera “subconsciente”. Los mas curi- general todos los proyectos que han sido
oso es que todo ello se lograba sin ningún ele- propuestos por alumnos con formación de
mento que no fuera la propia obra colgada. diseño, parten de las pautas estéticas, es
Fue un trabajo realmente complicado. decir prefiguran un entorno concreto espa-
cial y poco a poco lo van dando contenido.
Unidades expositivas y estructuras Lo respeto ,entiendo que es un camino
arquitectónicas. Otro grupo de investigación como cualquier otro, que ha de seguir su
ha sido el análisis de los límites en las proceso de desarrollo y resolver sus proble-
posibilidades que tienen las tipologías mas. No obstante siempre advierto a quien
clásicas (galería y rotonda), adaptadas a los lo toma que lo único exigible en los resulta-
condicionantes actuales. dos finales es que el contenido sea
coherente con el contenedor. Destacaría de
De igual manera se ha probado con dife- todos ellos la reflexión sobre lo que es el
rentes plantas, volúmenes, formas y “diseño”.
conexiones entre ellas. La antigua
recomendación del Congreso sobre Museos Los límites del diseño. Aquellos autores
de Arte celebrado en Madrid en el año 37, lo que manejan con soltura o experiencia si se
hemos hecho nuestro, incluidas las diferen- quiere, la formalización de los materiales,
tes experiencias con polígonos regulares tienen sin lugar a dudas ganado algo muy
importante que va a facilitarlos y a beneficiar
Una difícil conexión. Decía que la espiral el proyecto; pero no nos confundamos, el
es un espacio atractivo específicamente des- diseño tiene una función muy definida den-
de el punto de vista que tratamos. Ir colocan- tro del montaje de una exposición: no es
do obras que nos van haciendo crecer unas solo un problema formal.
expectativas hasta que llegamos a la recom-
pensa final, ha sido una constante en el El contenido (de la función a la forma).
trabajo de los museólogos. Curiosamente cuando un historiador se
propone realizar un proyecto de montaje,
Pero ¿qué hacer luego?, por que volver comienza por los instrumentos que mejor
por el mismo camino es algo contradictorio maneja: el estudio de la obra, sus
y que además rompería la satisfacción evoluciones, sus relaciones y debe decir que
conseguida. tienen una especial sensibilidad a la hora de
plantear “diálogos” entre las piezas. Es justo
En cuanto a los planteamientos de el camino contrario al de los diseñadores,
espacios fuertemente arquitectónicos que empiezan por su final.
88 JUAN CARLOS RICO
Como ellos han de recorrer en sentido in- exposiciones? La respuesta fue dada por un
verso un arduo camino que los lleve a dar proyecto, que tomando los elementos modu-
una respuesta formal coherente con sus lares y flexibles de una conocida sala de ex-
brillantes propuestas teóricas. posiciones bilbaína, proponía “jugar” a crear
diferentes espacios y consecuentemente ex-
Muchos de sus trabajos buscan un entorno posiciones.
“intimo” para que cada visitante se enfrente
con cada obra. Es un tema apasionante para Haga su propio montaje. Indudablemente
cualquier diseñador. es atractiva la posibilidad que ofrezca al visi-
tante la ordenación “ a la carta” de la
Como en mi propia casa. En estos diez exposición. Son evidentemente muchos los
años muchos proyectos han buscado un am- problemas que surgen principalmente desde
biente “domestico”, para ver las obras, diga- la conservación a la seguridad.
mos que con la “confortabilidad” que pode-
mos tener en el sofá del salón. Sin formas. Por último un trabajo ( se esta
desarrollando en estos momentos) que
Me parece que dentro de esta prioridad propone una reflexión sobre los espacios
por relacionar directamente al visitante con “blandos” dentro del mundo expositivo.
la obra, es un camino que no anda nada ¿Cómo puede uno percibir una exposición
equivocado. moviéndose a través de un suelo
ligeramente curvo? Para potenciar esta idea,
Los mas conceptuales. Para acabar este la obra cuelga de una estructura del techo,
somero repaso de los resultados prácticos, que a su vez contiene a las barandillas que
me gustaría decir algo de aquellas protegen de la diferencia de cotas y dan una
propuestas que han ido por derroteros mas cierta unidad al conjunto expositivo.
personales, ampliando horizontes muy
sugerentes. Lo realmente interesante y desgraciada-
mente no habitual, es que esta idea experi-
Dentro / fuera. El proyectar dentro de una mental se ha podido llevar a la realidad en
sala toda ella de cristal con un entorno verde una exposición del pintor Ikella Alonso,
muy agradable, hace que sea ineludible su resolviendo todas las pegas que tienen este
relación. Una solución incluso obvió la tipo de trabajo y cerrando por tanto con la
frontera entre lo interno y lo externo y práctica el circulo completo del proceso
trabajo en todo el espacio. lectivo.
en estas páginas hay que reelaborarlas den- Museos. Arquitectura. Arte III: Los
tro del programa y de la localización de un Conocimientos Técnicos. Editorial Silex. 1999
proyecto concreto, pero también lo es, que
una lectura mas detallada del trabajo puede ¿Por qué no vienen a los museos?
provocar un cambio en la mentalidad en Historia de un fracaso. Editorial Silex
los profesionales en distintas direcciones
con vistas a mejorar la eficacia de los La difícil supervivencia de los museos.
museos. Si así se consigue todo este Editorial Trea.
inmenso trabajo habrá tenido sentido, el
tiempo nos lo dirá. El paisajismo del siglo XXI: entre la técni-
ca, la ecología y la plástica. Editorial Silex.
Otro alto en el camino
La exposición comercial: Tiendas y
En estos momentos iniciamos un nuevo escaparatismo, stand y ferias, gran-
periodo de reflexión sobre todo lo avanzado des almacenes y superficies. Editorial
en estos años y que emplearemos simultáne- Trea
amente para estudiar materias que
necesitábamos desde hace tiempo cuyo fin Manual práctico de museología,
es dotar al proceso de mayor eficacia. museografía y técnicas expositivas (Edito-
rial Silex 2006)
Me estoy refiriendo a la psicología social y
a la sociología de la cultura, que sin lugar a La Caja de cristal, un nuevo modelo de
dudas nos van a ayudar a dilucidar el museo/ The Cristal Box, a new model of
comportamiento de las personas en los Museum . En colaboración con varias uni-
museos, la razón de su insatisfacción y los versidades americanas y españolas (2008)
caminos que tenemos que abrir para poder
acercarnos con todos nuestras posibilidades Como enseñar el objeto Cultural. (Editori-
a ellos. al Silex 2008)
También con el espacio y por tanto con la ¿Cómo se cuelga un cuadro virtual? Las
arquitectura. exposiciones en la era digital (Editorial
Trea 2009)
INTRODUCCIÓN
L
La evaluación sólo tiene sentido por sus repercusiones en el ámbito social,
ésta es un medio, no un fin; por ello el desenvolvimiento social del proceso de
evaluación constituye lo más relevante.
evaluación; 2) para qué evaluar, qué contexto de los museos que es el punto de
beneficios se pueden esperar de la nuestro interés, se debe definir qué fines
evaluación; 3) qué, cuáles son los aspectos persigue el museo, cómo se concibe a éste,
que deben ser evaluados; 4) cómo, qué pro- que función social debe cumplir.
cedimientos permiten constituir un método
apropiado de evaluación, que dé certeza; 5) Se trata de poder valorar los logros, reco-
quiénes, a quién corresponden las responsa- nocer los aciertos, pero de igual modo iden-
bilidades de la evaluación; 6) dónde y tificar las omisiones, definir los errores; de
cuándo, ante qué circunstancias y en qué manera tal que con autocrítica se promueva
momentos resulta adecuado y oportuno tanto la apreciación de los aciertos como la
gestar un proceso de evaluación. de los desaciertos, con el fin de fortalecer las
acciones exitosas y corregir las equivocadas.
Estas interrogantes se convierten en ejes Bajo esta fórmula se puede concebir un
de reflexión que se entrelazan, ya que unos proceso de desarrollo institucional.
responden o derivan de los otros, por
ejemplo, las razones de por qué evaluar, El ejercicio de instrumentar un proceso
responden a los argumentos antecedentes de evaluación sistemático, permite construir
que justifican la evaluación. Estos argumen- parámetros de referencia, en los que se
tos, de manera implícita definen el para qué pueden establecer comparaciones, indica-
evaluar o la justificación consecuente, en dores que advierten de la dirección o
tanto son los beneficios que se espera trayectoria que tienen los cambios. Estos
obtener al atender las deficiencias o parámetros de referencia pueden ser auto
carencias que llevan a implementar un referidos, es decir, apreciar los cambios
proceso de evaluación. habidos dentro de los indicadores de las
acciones de uno mismo, en diferentes mo-
Por qué evaluar define carencias o proble- mentos, lo que configura trayectorias, define
mas, la necesidad de mejorar; el para qué tendencias, permite análisis longitudinales
evaluar atiende la carencia, busca resolver referidos a lo largo del tiempo. También
problemas, encontrar formas para mejorar, pueden constituir indicadores al comparar
de aquí que se señale que están los índices obtenidos con los de otras institu-
intrínsecamente relacionadas las causas (por ciones análogas. O bien considerando
qué) a los beneficios (para qué). circunstancias para que las comparaciones
sean relativas, proporcionadas y equitativas.
La evaluación debe ser sistémica, defini-
das las responsabilidades sociales del museo La comparación es una base sustantiva de
en cuestión, la evaluación constituye un la evaluación, es la manera de tener referen-
procedimiento que debe permitir reconocer tes que permiten posicionar, graduar, aquila-
y apreciar que tan efectivo, eficiente o tar el mérito o desmérito. Es sólo bajo con-
exitoso es el museo en el cumplimiento ca- trastes como se pueden percibir las particu-
bal de sus funciones sociales. laridades.
Este tipo de potencialidades del museo, Una de las líneas de evaluación más
pueden constituir sus fines institucionales, comunes y específicas realizadas en los
pero deben ser explicitadas, de manera que museos, han sido los estudios de público. En
sean valoradas y puedan ser evaluadas, estos estudios se ha centrado el interés en
generándose para ello los indicadores que valorar el significado de la experiencia mu-
permitan saber en qué grado están siendo seográfica en los visitantes.
alcanzadas o cumplidas.
Un punto de partida ha consistido en defi-
Otro punto valioso a evaluar es el grado nir el perfil de los usuarios, para reconocer
de satisfacción (suitability) que el museo las variables de población o características
tiene para con sus visitantes. que la perfilan, tales como: género, edad,
motivo de la visita, grado de escolaridad y
También son objeto de evaluación los pro- nivel socioeconómico; de manera tal que se
cedimientos utilizados para lograr los objeti- puedan conocer las frecuencias y
vos. La evaluación debe reconocer y valorar porcentajes de estos indicadores, lo que le
los procesos. Por ejemplo, inventariar y permite al museo saber quiénes lo vistan y
valorar todos los procedimientos técnicos que motivó su vista. También se pueden
para sistematizar y estandarizar el montaje hacer correlaciones, análisis de varianza
de una exposición. (ANOVAS), regresiones múltiples, análisis
factoriales, para poder estimar y valorar los
La evaluación debe ser integral y sistemá- diversos factores que estén asociados a
tica. Integral en el sentido de que se evalúen efectos debidos a la experimentación muse-
todos los componentes. Sistemática en el ográfica.
sentido de ser institucional: planeada, clara-
mente definida y reglamentada, de Otros estudios tratan de evaluar el impac-
aplicación regular, definida en el tiempo. to que la exposición tiene en el público,
valorando aspectos de orden cognoscitivos,
La evaluación museográfica tiene varios tales como la comprensión y aprendizaje de
componentes específicos, tales como: la los elementos de conocimientos contenidos
misión del museo como institución de cultu- o requeridos en la exhibición; o de opinión
ra, la evaluación de la experiencia museo- que permiten valorar creencias, actitudes,
gráfica de sus visitantes, del museo como re- juicios y prejuicios; o también de recreación
curso educativo, de sus responsabilidades y artística y apreciación estética, lo que es par-
funciones como institución de educación ticularmente importante en el caso de los
permanente, como complemento para la museos de arte.
formación escolarizada, la satisfacción de las
expectativas de sus usuarios, el enriquecimi- Metodología de la evaluación
ento cognoscitivo o de apreciación de los
visitantes, la recreación, la pertinencia y Cómo evaluar
actualización de la exposición, lo apropiado
de la presentación o adecuado del montaje, Podemos diferenciar dos tipos de
el desarrollo y capacitación de su personal, evaluación, una que concentra la valoración
las condiciones de su infraestructura, la en los resultados y la otra que atiende el
calidad de sus servicios. proceso. A la primera se le conoce como
EVALUACIÓN EN MUSEOS Y DESENVOLVIMIENTO SOCIAL 99
de sus visitantes son escolares menores de 12 variable de interés específico, como podrían ser
años, podemos cualificar y decir que se trata escolares, o adultos de género femenino, o turis-
de un museo infantil, lo que tiene implicaci- tas, por mencionar algunos. La observación
ones sustanciales. Lo mismo ocurriría si se directa, el registro sistemático, las entrevistas
observara que el 70% de los asistentes son abiertas y estructuradas, así como los
analfabetos, el museo requeriría una trans- cuestionarios y encuestas, son procedimientos
formación conceptual cualitativa en sus fun- comunes que se utilizan para generar este tipo
ciones y maneras de operar. Resulta cualitati- de valoraciones.
vamente distinto si el 90% de los visitantes de
un museo reportan que éste es claro y ame- Cuando se quiere evaluar una población
no, a si sólo lo hacen así el 10%. Es cualitati- muy numerosa y variable, es muy difícil y
vamente distinto un museo que recibe 10 mil costoso, si no imposible, atender a todos los
personas al año, a otro que tiene un millón casos. Para ello se pueden usar técnicas
de visitantes en el mismo período. estadísticas de muestreo, que consiste en
elegir a una parte relativamente pequeña
Es cierto que algunas valoraciones son en pero representativa de todos los casos. Para
prosa, más descriptivas, y otras más en térmi- que de una selección podamos inferir cuales
nos cuantitativos, como ocurre en los son las características de toda la población, es
estudios de casos singulares a diferencia de necesario que los casos se elijan por un pro-
los de gran escala. Las evaluaciones de gran cedimiento aleatorio, de manera que
escala requieren del apoyo metodológico de cualquier caso tenga la misma probabilidad
la estadística, por la imposibilidad o lo de ser seleccionado. Por ejemplo, se puede
costoso que resultaría valorar puntualmente definir que de cada 20 personas que ingresan
a todos los miembros de una población que al museo, se entrevistará a la que ingrese en el
es numerosa y variable. veinteavo lugar, comenzando nuevamente a
contar para volver a seleccionar al veinteavo,
También es cierto que la exploración y así sucesivamente. Cualquier persona tiene
detallada de casos específicos, lo que se la misma probabilidad de ser seleccionada,
conoce como estudios de caso, proporciona por ello podemos asumir que la selección for-
apreciaciones muy valiosas que de otra ma un grupo elegido al azar y podrá ofrecer
manera sería imposible obtener, por ello re- una idea general de toda la población.
petimos, la evaluación debe considerar las
diversas metodologías para conocer y Puede ocurrir que los grupos de interés
valorar los fenómenos que ocurren dentro sean diferentes en proporción y por lo
del museo, de aquí que sean complementari- mismo en la muestra debe estar reflejada la
os y no excluyentes. proporción, pongamos por ejemplo que nos
interesa conocer las opiniones de los adultos
En una evaluación se debe comenzar por y adolescentes que tienen al menos un año
definir la unidad de análisis. Esta puede ser de estudios universitarios concluidos, en este
el visitante del museo, los grupos escolares, caso podría suceder que el 18% (+/- 2%) de
los profesores, los guías, los directivos, los los visitantes del museo son adultos
museos, etcétera. (mayores de 21 años > 21) y el 24% (+/- 3%)
adolescentes (> 14, < 21) con el nivel de
Es recomendable iniciar la evaluación por estudio requerido; por lo que “el peso
medio de estudios de caso, a través de procedi- muestral” debe corresponder a estas propor-
mientos etnográficos, con registros anecdóticos, ciones, de manera que no esté un grupo so-
por muestreo aleatorio, con base en un factor o bre-representado y el otro sub-representado.
102 FELIPE TIRADO
atractivos; emitir respuestas en este medio es Los visitantes de un museo o exposición son
mucho más fácil que escribir o rellenar alvé- muy heterogéneos, en muchos aspectos,
olos con lápiz, la letra es perfectamente cla- tales como: edad, nivel de escolaridad,
ra, se pueden hacer análisis semánticos, el situación socioeconómica, intereses, gustos,
manejo y edición de la imagen y audio en propósitos de su visita, etcétera.
formato digital son extraordinarios
ofreciendo a los procedimientos de Para afrontar la variabilidad se puede recurrir
evaluación posibilidades antes impensables. a una disciplina especializada en ello, que es la
estadística. La estadística se puede dividir en
La evaluación en medios electrónicos per- dos grandes apartados, uno que corresponde a
mite ser “adaptativa”, es decir, adaptarse a las la estadística descriptiva y otro a la estadística
circunstancias o condiciones de la persona inferencial. La primera tiene como propósito,
que responde, por ejemplo, si indica que es como su nombre lo dice, analizar y describir las
extranjero, se le presentan sólo preguntas características de los datos, a través de un
apropiadas a esa condición; o bien, si contes- compendio y síntesis de éstos, por medio de
ta que no visitó determinada sala del museo, extractos, esquemas y gráficos, que permiten
ya no se le presentan las preguntas relacio- construir una sinopsis o sumario. Los datos más
nadas. comunes son la obtención de distribución de
frecuencias, porcentajes, medidas de tendencia
La interconexión también abre extraordi- central (promedio – media, modo), medidas de
narias posibilidades, ya que el levantamiento variabilidad (desviación estándar), de precisión
de datos se puede hacer en línea abatiendo (error estándar), de asociación o causalidad
tiempo y distancias, al estar disponible las 24 (correlación), regresión (distribución del peso
horas de los 365 días del año. De igual modo de una correlación), entre otras.
pueden ser componentes integrales de los
museos virtuales. La estadística inferencial, tiene como pro-
pósito, como su nombre lo dice, poder infe-
rir las características relevantes de una
ANÁLISIS DE RESULTADOS población, esto a partir de un subconjunto o
muestra de población en la que se realiza un
Una parte muy importante de la análisis de probabilidades (análisis de
evaluación es cómo analizar los datos o re- varianza o covarianza y sus niveles de
sultados obtenidos. Cómo interpretarlos, significación), definiendo el grado de
cómo juzgarlos o valorarlos. En toda confianza que se puede tener de las
evaluación hay una valoración, la cual se inferencias que se generan.
basa en el juicio de apreciación, una
estimación subjetiva, la cual puede ser La estadística permite encontrar la
puesta a la consideración del grupo regularidad de la variabilidad de un conjun-
responsable, a manera de generar una to heterogéneo, y por medio de la ciencia de
deliberación y construir un consenso, con lo las probabilidades, establecer los factores
que se vuelve intersubjetiva, ya no corres- que determinan las regularidades de un
ponde a una persona sino a un grupo. fenómeno variable (análisis factorial); de
manera tal que se puedan construir
El primer problema dentro de los elemen- explicaciones de los fenómenos observados
tos a considerar es cómo juzgar la variabili- con base en un sustento empírico, al identifi-
dad o irregularidades que generalmente se car los factores o variables asociados al
observan, lo que se denomina la varianza. fenómeno objeto de estudio.
106 FELIPE TIRADO
De aquí que la evaluación debe hacerse Los procesos de evaluación permiten dar
con toda responsabilidad, donde priven las cuenta puntual de los estados que guarda
razones y la equidad. La evaluación debe ser una institución, permite la rendición de
para permitir la superación, no para justifi- cuentas (accoutability) por ello constituye
car la exclusión. Su función social es un recurso idóneo para sustentar y facilitar
mejorar, promover la cultura de la responsa- fuentes de financiamiento.
bilidad, y no la de marginar, limitar, extinguir,
empobrecer. Los procesos de evaluación deben es-
tar en permanente revisión y constante
adecuación a la luz de los resultados que
CONCLUSION produce y los efectos que se generan.
BIBLIOGRAFIA
Brown, Frederick G. (1980) Guidelines for
Alt M., (1977). ‘‘Evaluating Didactic Exhibits: Test Use: A commentary on the
A Critical Look’’, Curator , Volume 20, Standards for Educational and
Number 3: pp. 241 –258. Psychological Tests. National Council on
Measurement in Education.
American Educational Research Association,
American Psychological Association, Consejo Asesor Externo del Centro Nacional
National Council on Measurement in de Evaluación para la Educación Superior
Education (1997). Standards for (2000), Estándares de Calidad para Instru-
educational and psychological testing . mentos de Evaluación Educativa, publica-
Washington. APA. Reimpr. 1985. do por CENEVAL, México, D.F.
American Educational Research Association, Degracie, James S., Beverly Merril y James K.
American Psychological Association, National Zaharis (1966), “Implications of Using the
Council on Measurement in Education (1999). Revised Program Evaluation Standards in Lo-
Standards for educational and cal Education Agencies”. Journal of Experi-
psychological testing. Washington. AERA. mental Education. Vol. 63 No. 1 pp. 45-53.
Backhoff, E. y Díaz, M.A. (2005). Plan Gene- Falcão, D.; Colinvaux, D.; Krapas, S.; Querioz,
ral de Evaluación del Aprendizaje. Méxi- G.; Alves, F.; Cazelli, S.; Valente, M.E.; y Gouvea,
co, D.F.: Instituto Nacional para la Evaluación G. (2004). A model-based approach to science
de la Educación. exhibition evaluation: A case study in a
Brazilian astronomy museum. International
Bicknell, S. and G. Farmelo, (Eds.) (1993). Journal of Science Education. Volume 26,
Museum visitor studies in the 90s , Number 8, pp. 951 - 978
Science Museum, London.
Falk, J. H. and L. D. Dierking (1992). The
Bitgood, S., C. Devia, P. Goodwin, C. Rudin, A. Museum Experience. Washington, D.C.:
Trammell, and B. Zimmerman. (2001). Whalesback Books.
Projective focusing: Motivated attention to
works of art. Current Trends in Audience Falk, J. H. and L. D. Dierking (2000). Learning
Research and Evaluation, Volume 14., 25– from Museums: Visitor Experiences and
31. St. Louis, MO: AAM Committee on the Making of Museums. Walnut Creek,
Audience Research and Evaluation. CA: AltaMira Press.
Griggs, S., (1981). ‘‘Formative Evaluation of Newman, A. and F. Malean, (2004). Capital
Exhibits at the British Museum (Natural and the evaluation of the museum
History)’’, Curator, Volume 24, Number 3: pp. experience . International Journal of Cul-
189 –201. tural Studies , Volume 7, Number 4
(December 2004), pp. 480-498, http://
Hein, G.. (1998). Learning in the Museum. e j o u r n a l s . e b s c o . c o m /
London: Routledge. direct.asp?ArticleID=4EEEBD6D9841F8033A2
Hein, G. and Alexander, M. (1998). Museums: Raphling, B. and B. Serrell (1993). Capturing
Places of Learning . Washington, D.C.: and measuring affective learning.
American Association of Museums. Current Trends in Audience Research
and Evaluation. Washington DC, American
Hood, M. (1995). Audience Research Tell Us Association of Museums. 7.
Why Visitors Come to Museums – and Why
They Don’t, in C. Scott (Ed.), Evaluation and Rasch, G. (1980) Probabilistic models for
Visitor Research in Museums: Towards some intelligence and attainment tests.
2000. Sydney: Powerhouse Publishing, pp. 3 Chicago: The University of Chicago Press.
–10.
Scott, C. (Ed.) (1995). Evaluation and
Kelly, L. (2004). Evaluation, Research and Visitor Research in Museums: Towards
Communities of Practice: Program 2000. Sydney: Powerhouse Publishing.
Evaluation in Museums, Archival Science,
Volume 4, Numbers 1-2 / March, 2004: pp. 45– Screven, C. (1990). ‘‘Uses of Evaluation
69. Publisher: Springer Netherlands. http:// Before, During and After Exhibit Design’’,
w w w. s p r i n g e r l i n k . c o m / c o n t e n t / ILVS Review (International Laboratory for
qt27w832x2297852/fulltext.pdf Visitor Studies) Volume 1, Number 2: pp. 36 –
66.
Lifshitz, A. (2007). Evaluación ¿arte o
ciencia?. Documento presentado en el Sudbury, P.; P. Rees, and T. Russell (Eds.)
Congreso Nacional de Educación Médica: (1995). Evaluation of Museum and Gallery
Evaluación en la Educación Médica . Displays . Liverpool University Press -
UNAM- Facultad de Medicina, Academia Na- CRIPSAT Papers.
cional de Medicina de México, Benemérita
Universidad Autónoma de Puebla, enero de The Joint Committee on Standards for
2007 Facultad de Medicina. http:// Educational Evaluation. James R. Sanders,
psicoeducativa.iztacala.unam.mx/?q=node/ Chair (1994). The Program Evaluation
58 Standards. How to Assess Evaluations of
Educational Programs. JCSEE 2d. Ed.
Linacre, J.M. (2005). WINSTEPS. Rash Thousand Oaks. Sage.
measurement computer program. Chica-
go: Winsteps.com| The Joint Committee on Standards for
Educational Evaluation (1981). Standards
Loomis, R. (1987). Museum Visitor for Evaluation of Educational Programs,
Evaluation: New Tool for Management. Projects and Material. 1st. Ed. Sage. (Hay
Nashville: American Association for State edición en español de editorial Trillas, Méxi-
and Local History management series. co D.F.)
EVALUACIÓN EN MUSEOS Y DESENVOLVIMIENTO SOCIAL 111
Tirado S. F., “Evaluación de la Educación Bá- Wavell, C., G. Baxter, I. Johnson, and D.
sica con Posgraduados ”, en: Ciencia y Williams (2002) Impact evaluation of
Desarrollo, México: Consejo Nacional de museums, archives and libraries:
Ciencia y Tecnología, Vol. XVIII, No. 104, pp. available evidence project , London,
39-53 mayo junio de 1992 Resource: The Council for Museums,
Archives and Libraries, ISBN 1901085716.
Tirado S. F., “ Hacia una cultura de la URL: http://www.mla.gov.uk/documents/
Evaluación ”, en: Básica, Revista de la id16rep.doc
Escuela y del Maestro , México:
FUNDACION SNTE para la Cultura del Maes- Weil, E. S.; “Meditations. The Museum, unlike
tro Mexicano, pp. 21-29, enero-febrero, 1997. Beauty, can never be it own excuse for
being.”, en: Museum, Washington: pp. 27-31,
Tirado, S. F. y Cols. “Validez Predictiva del American Association of Museums, January
Examen de Habilidades y Conocimientos Bá- – February 2003.
sicos (EXHCOBA)”, en: Revista Mexicana de
Investigación Educativa, México: Consejo Wright B.D. and Stone M.H. (1988)
Mexicano de Investigación Educativa A.C., Identification of item bias using Rasch
Vol. 2, No 3, enero-junio, pp. 67-84, 1997. measurement, Research memorandum No
55. Chicago, MESA Press. Diseño de mejores
Tirado F., (2004). “Perfiles del EXANI-I”. En F. pruebas utilizando la tecnología de Rash.
Tirado (Coordinador) Evaluación de la (Traducción de R. Vidal). México, D.F.: CENEVAL
2ª parte
EXPERIÊNCIAS, PROPOSTAS E PERSPECTIVAS
ARTIGO
1
Acessibilidade, Inclusão Social e
Políticas Públicas: uma proposta
para o Estado de São Paulo
n AMANDA PINTO DA FONSECA TOJAL
A
INTRODUÇÃO
S
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS) 10% da população mundial
apresentam algum tipo de deficiência, o que representa aproximadamente 610
milhões de pessoas com deficiência no mundo, das quais 386 milhões fazem
parte da população economicamente ativa e 80% do total dessas pessoas vivem
em países em desenvolvimento.
Os dados do Censo Demográfico mostram rial dessas pessoas com o patrimônio cultu-
também que, no total de casos declarados de ral presente nessas instituições.
portadores de deficiências, 8,3% possuem
deficiência mental, 4,1% deficiência física1, Como assinala Aidar (2002, p. 60), “em ter-
16,7% deficiência auditiva, 22,9% deficiência mos ideológicos, as instituições devem mo-
motora2 e 48,1% deficiência visual. Entre 16,5 ver-se na direção do reconhecimento da
milhões de pessoas com deficiência visual, idéia de que elas têm um papel a contribuir
159.824 são incapazes de enxergar, e, entre os para a igualdade social, para o fortalecimen-
5,7 milhões de brasileiros com deficiência to de indivíduos e grupos em desvantagem, e
auditiva, 176.067 não ouvem. para o incremento de processos democráti-
cos dentro da sociedade.”
Trata-se, portanto, de um universo expres-
sivo de pessoas com deficiências, agravado Todos esses temas, porém, não podem ser
pelo fato de o Brasil estar entre os países com concebidos de forma isolada, mas, ao con-
os maiores índices de acidentes de trabalho trário, devem ser pensados a partir de uma
e de violência urbana, o que amplia signifi- política cultural que tome por paradigma as
cativamente o número, principalmente de concepções museológicas contemporâneas.
indivíduos jovens com essas características. Tais concepções compreendem, além das
funções tradicionais (pesquisar, preservar e
Dentro desse quadro de referências, o mu- comunicar), o conceito da responsabilidade
seu, como instituição pública, deve ter como social, exigindo ações interdisciplinares que
objetivo não somente a preservação do pa- envolvam todas as áreas dessas instituições,
trimônio cultural nele abrigado, como tam- o que no caso da freqüência de públicos es-
bém o importante papel de promover ações peciais demandará a participação de todas
culturais enfocando o seu potencial educa- as instâncias do museu – um processo demo-
cional e de inclusão social, atuando como crático que reúna além das áreas de traba-
agente de conhecimento e fruição do patri- lho, os profissionais nela envolvidos incluin-
mônio histórico, auto-reconhecimento e do também a comunidade em geral.
afirmação da identidade cultural de todos os
cidadãos, independentemente de suas diver- Essa compreensão vem, portanto, se con-
sidades. trapor a uma visão em que as ações
educativas aparecem dissociadas do proces-
Nessa perspectiva, o conhecimento e a so museológico, visão esta ainda presente
fruição do objeto cultural, presente nos mu- em grande parte dos museus, exposições
seus, segundo uma visão democrática e temporárias de grande porte e outras institui-
multicultural, deve contemplar todos os pú- ções culturais brasileiras, o que, conseqüen-
blicos, sem distinções, o que especificamente temente, passa a se refletir diretamente na
para os públicos especiais (pessoas com limi- concepção, realização e continuidade de
tações sensoriais, físicas ou mentais) exige projetos educativos dessa natureza.
uma série de adaptações, tanto físicas (aces-
sibilidade arquitetônica e expográfica) como Em razão, portanto, da sua fragilidade, os
sensoriais (comunicação, apreensão espacial projetos educativos realizados a partir dessa
e estética do objeto cultural), além de um concepção e sem o respaldo de uma política
programa de ação educativa especializada, cultural que efetive e promova permanente-
cujo trabalho de mediação seja realizado mente um programa educativo estruturado,
por um agente facilitador que proporcione restringem-se a atendimentos superficiais ao
uma melhor compreensão e vivência senso- público visitante, descaracterizando a sua
ACESSIBILIDADE, INCLUSÃO SOCIAL E POLÍTICAS PÚBLICAS 117
Outro aspecto relevante para o desenvol- de apoio) como também as áreas de pesqui-
vimento e a aplicação de políticas culturais sa, documentação e conservação.
é o que diz respeito às formas de acesso à
cultura por seus cidadãos. Por outro lado, ao adotar-se um
paradigma inclusivo para a política cultural
Sabendo que os bens culturais são produ- de um museu, há de se levar em conta a ne-
tos do conhecimento, o principal obstáculo cessidade de um redimensionamento de
à fruição das diferentes manifestações cultu- suas práticas museológicas, o que, na visão
rais é de natureza simbólica, isto é, um códi- de Aidar (2002, p. 60), representa “a adoção
go que necessita de uma alfabetização para de um posicionamento crítico em relação a
ser reconhecido ou revelado.3 Sendo assim, elas, o que significa não tomá-las como da-
cabe às políticas públicas prever investimen- das ou neutras mesmo aquelas que costu-
tos para a ampliação do repertório cultural mam ser consideradas assim, como as de
dos mais diversos setores da população, in- documentação e conservação. Paralelamen-
vestimentos estes que só serão viabilizados te, os museus deveriam promover uma de-
com o estabelecimento de parcerias tanto mocratização interna, evitando as rígidas hi-
com órgãos educacionais como também erarquias de poder e permitindo que diver-
com outras instituições públicas e privadas. sos setores da profissão e do público partici-
pem e tenham voz nos processos de tomadas
Trazendo estas questões para o universo de decisões.”
da museologia, resta evidente o importante
papel que a instituição cultural museu de- Deve-se levar em consideração que as
sempenha na ampliação do repertório cul- afirmações antes apresentadas ampliam as
tural dos cidadãos, já que a ela é conferida responsabilidades sociais que a princípio po-
a importante função de adquirir, preservar, diam parecer restritas à área de ação
documentar e comunicar os bens culturais, educativa do museu.
muitos deles deslocados de seu espaço ori-
ginal. Partindo do princípio de que ao setor
educativo compete maior parcela de res-
Aos museus, bem como a todas as institui- ponsabilidade acerca das demandas sociais
ções culturais, cabe também estar em nessa instituição, é importante ressaltar que
sintonia com o pensamento contemporâneo as ações previstas para essa área, mesmo sen-
de respeito e reconhecimento da diversida- do de crucial importância para a inclusão
de cultural e social trabalhando a favor não social, não podem ficar restritas às questões
somente da comunicação de seus objetos de ampliação da freqüência de diferentes ti-
culturais , sob um ponto de vista pos de públicos, tarefa esta que conduz à for-
multicultural, como também contribuindo mulação de estratégias que requeiram, entre
para a democratização cultural por meio outras, a eliminação de barreiras para o seu
dos processos de inclusão social. acesso, como as barreiras físicas, sensoriais,
financeiras, atitudinais e intelectuais, bem
Dessa forma, a inclusão social aplicada à como a importante tarefa de criar, preferen-
prática museológica deve conter um foco cialmente por meio de parcerias, um envol-
interdisciplinar abrangendo todas as áreas vimento desses públicos com essas institui-
de trabalho dessa instituição, o que envolve- ções.
ria os aspectos educacionais e museográfi-
cos (compreendendo desde concepção da Importa, pois, acrescentar a essa impor-
exposição até os recursos comunicacionais tante tarefa – a da inclusão social por meio
ACESSIBILIDADE, INCLUSÃO SOCIAL E POLÍTICAS PÚBLICAS 119
das ações educativas – para além de uma seus, Em termos pedagógicos, procedimen-
maior acessibilidade às instituições culturais, tos de conservação utilizados em museus e
o desenvolvimento de ações culturais que explicitados poderiam ajudar a promover
tenham tanto um impacto político, social e nos públicos visitantes uma consciência do
econômico.”A inclusão social em institui- papel e importância da preservação.”
ções culturais deve ser compreendida como
um passo além do trabalho de desenvolvi- Do mesmo modo, o papel do curador
mento de públicos, buscando ampliar suas também deveria ser redimensionado, substi-
atribuições e implicações sociais ao provo- tuindo sua posição de autoridade definitiva
car mudanças qualitativas no cotidiano dos para a de um papel mais flexível permitindo
grupos envolvidos. “ (Aidar, 2003, p. 6) a participação e contribuição de profissio-
nais de outras áreas do museu, principal-
Nesse sentido, a concepção de uma polí- mente no que diz respeito às preocupações
tica cultural para o museu, cujo pensamento pedagógicas de mediação e acessibilidade
ideológico inclui, além das suas funções tra- dos diversos tipos de públicos, para as quais
dicionais, o da responsabilidade social, im- a parceria compartilhada com os educado-
plicará respectivamente em ações interdisci- res dessas instituições torna-se fundamental.
plinares envolvendo todas as outras áreas de
atuação como, por exemplo, as de gerencia- Dessa forma, ao se filiar a essa visão con-
mento de coleções, pesquisa e documenta- temporânea da museologia o museu e outras
ção, que dentro desta concepção, poderiam instituições culturais terão não somente a
estar mais abertas à participação de diferen- consciência de seu importante papel social,
tes grupos sociais dispostos também a dar a mas também a oportunidade de refletir sobre
sua contribuição nos processos de aquisição, as suas próprias práticas, repensando perma-
seleção e complementação de pesquisas so- nentemente a sua condição de instituições
bre os objetos. públicas, fator este diferencial em relação às
concepções museológicas tradicionais, que
A pesquisa e a comunicação museológica restringiam esses espaços de cultura a sim-
deveriam se preocupar também em ampliar ples depositários da história, da tradição e da
a sua rede de informação acerca do patrimô- preservação de seus objetos.
nio pertencente a sua instituição, adaptando
os conteúdos apresentados aos diversos tipos
de públicos, permitindo, dessa forma, que PLANEJAMENTO DE POLÍTICAS PÚBLICAS DE
um maior grupo de pessoas tenha acesso a INCLUSÃO DE PÚBLICOS ESPECIAIS EM
essas informações. MUSEUS DO ESTADO DE SÃO PAULO
Outro exemplo de atuação interdiscipli- Isto posto, cumpre discutir, mesmo que ra-
nar pode ser demonstrado no campo da pidamente, uma experiência prática. Trata-
conservação, muito embora nele vigore uma se, assim, de examinar a metodologia aplica-
contradição, pois, como observa Aidar da durante o desenvolvimento da pesquisa
(2002, p. 61), “uma de suas tarefas é a de esta- da tese da referida autora com o objetivo de
belecer barreiras protetoras entre os objetos avaliar programas de acessibilidade e ação
e o público. Para responder a isso, poderiam educativa inclusiva instrumentalizados por
ser desenvolvidas alternativas para o uso meio de questionários aplicados em museus
controlado e supervisionado de certos obje- do interior de São Paulo pertencentes ao Sis-
tos, em contraponto à oposição negativa do tema de Museus do Estado, vinculados à Uni-
não toque, normalmente adotada em mu- dade de Preservação do Patrimônio Museo-
120 AMANDA PINTO DA FONSECA TOJAL
É claro, também, que a concretização das tações visando à eliminação das barreiras
metas incluem as mudanças de mentalidade arquitetônicas. Nos museus, os obstáculos
e atitudes dos profissionais de museus, tanto podem se iniciar no lado externo do edifí-
no que se refere ao conhecimento e consci- cio, nas entradas e saídas, continuar na cir-
entização das necessidades do público alvo, culação interna vertical (escadas e falta de
como o de se propor projetos dentro de uma alternativas às escadas), horizontal (corredo-
perspectiva inclusiva, baseados em uma di- res, vãos portas, dificuldades para efetuar
nâmica de trabalho mais flexível, o que pres- manobras, manusear botões, maçanetas ou
supõe um trabalho de equipe mais sistemáti- equipamentos, pisos escorregadios ou altura
co e dialogante entre os vários profissionais inadequada de balcões e mesas) e se comple-
envolvidos - museólogos, pesquisadores, tar com a má localização dos objetos em
educadores, arquitetos, entre outros - não se exposição (colocados em painéis, vitrines e
esquecendo também, da importante partici- bases com iluminação e altura inadequadas
pação de pessoas com deficiência, órgãos e ou expostos de forma a facilitar acidentes).
instituições que as representam.
Barreiras Sensoriais
Compreende-se, portanto, que ao se pre-
tender elaborar um diagnóstico sobre acessi- As barreiras sensoriais dizem respeito às
bilidade em espaços museológicos, há de se questões comunicacionais, isto é, o acesso à
ter como parâmetro a eliminação de diver- informação, que deve se iniciar desde a fa-
sas barreiras que levem em consideração chada de entrada do museu com orienta-
tanto os aspectos físicos, sensoriais, cogniti- ções e indicações sobre os espaços existentes
vos como atitudinais, especificados a seguir: (guichês, balcões de informações, banheiros,
lojas, restaurantes, biblioteca, espaços admi-
Barreiras Físicas nistrativos e expositivos).
ral incluir também em seu quadro de funcio- não se tocar em obras e objetos, por questões
nários, profissionais com deficiências. de segurança e preservação do patrimônio,
quando não limita, impede - as de usufruir
As questões atitudinais inerentes às insti- totalmente dos espaços museológicos.
tuições museológicas perpassam o público
visitante, tanto geral como aquele com ne- Nas diversas avaliações, entrevistas e pes-
cessidades especiais. Uma política cultural quisas realizadas com públicos especiais13,
inclusiva deve ser perceptível a todos os visi- constatou-se que o acesso, a independência
tantes - as questões de acessibilidade física e a escolha são os pontos chaves mais valori-
dos espaços e equipamentos, a forma de co- zados. Isto quer dizer que, como qualquer vi-
municação desses espaços e dos conteúdos sitante, as pessoas com necessidades especi-
das exposições e, finalmente, as atitudes de ais querem fazer valer o seu direito à auto-
todos os seus funcionários. nomia, assim como procurar os serviços de
atendimento especializado quando lhes
Para tanto, é necessário também conside- convir. O direito à escolha tem sido recla-
rar as necessidades e recomendações apon- mado pelo público freqüentador dos mu-
tadas pelo público alvo, convidando-os a fa- seus e é um fator importante para a
zer parte de comissões e assessorias, além de efetivação de mudanças sensoriais e
oferecer outras oportunidades, não somente atitudinais. Da mesma forma, esse público
de freqüentar e usufruir as exposições, como quer opinar quanto ao conteúdo das diretri-
também de poder participar de eventos e zes elaboradas pelas políticas culturais das
outras programações adaptadas. instituições, que demandam
reestruturações em todas as áreas museoló-
O museu pode ampliar essas ações ofere- gicas, principalmente na área comunicaci-
cendo cursos de formação ou orientações onal. Aliás, a área comunicacional é a que
aos profissionais, parentes e acompanhantes tem por função conceber exposições basea-
das pessoas com deficiências, com o intuito das no modelo emergente, baseadas em
de melhorar sua participação e fruição nes- propostas mais interativas com os objetos e
sas instituições. com os diferentes níveis de informação so-
bre os conteúdos nelas apresentados, ao le-
Para finalizar, cumpre não perder de vista var em consideração os diversos graus de
que a igualdade entre as pessoas é direito de compreensão e de diversidade dos públicos
todos e que se concretiza mediante políticas visitantes.
que, ao tratar a todos igualmente, reconheça
também as suas diferenças, oferecendo as Entre as muitas respostas dos públicos es-
oportunidades necessárias para que todos peciais a esse respeito, destaca-se a pesquisa
possam desenvolver as suas potencialidades publicada na edição Museus e Acessibilidade
e serem atendidos em suas necessidades da coleção Temas de Museologia do Instituto
também como cidadãos independentes. Português de Museus, relatando um impor-
tante aspecto de ordem atitudinal da política
O museu tem também a missão social de cultural do museu, ao oferecer uma maior
fazer o seu espaço um espaço da diversida- variedade de opções de escolha e formas de
de, onde as diferenças sejam respeitadas e o participação desses públicos. “Os espaços e
direito de usufruir do patrimônio cultural é equipamentos para uso público devem estar
dado a todos. Essa questão entreabre abre sempre disponíveis, independentemente dos
uma reflexão polêmica, pois, para muitas dias da semana ou da presença de um deter-
pessoas, a institucionalização da regra de minado funcionário . No caso específico dos
ACESSIBILIDADE, INCLUSÃO SOCIAL E POLÍTICAS PÚBLICAS 125
Esses documentos, assim como as visitas Além do critério acima apresentado, foi
técnicas feitas aos quatro museus paulistas acrescentado também o critério da localiza-
selecionados, resultaram na concepção de ção dos museus, situados em pontos estratégi-
uma ficha diagnóstico adaptada à realidade, cos das regiões oeste, norte e leste do Estado.
bem como às necessidades mais prementes
identificadas nessas instituições, cujos dados A aplicação da ficha diagnóstico, realizada
principais sobre as questões de acessibilida- durante as visitas técnicas da autora aos locais
de museológica são descritos no seguinte pré-determinados, acompanhada pelos dire-
quadro: tores ou coordenadores das referidas institui-
ções, consistiu primeiramente em um levan-
Estudos de caso tamento, compreendendo barreiras físicas e
sensoriais existentes nos espaços museológi-
Os estudos de caso apresentados a seguir cos, atendimentos regulares ocorridos nos úl-
foram realizados pela autora nos seguintes timos anos com públicos especiais, bem
museus do interior do Estado de São Paulo: como outras formas de atividades, contatos
ou parcerias realizadas com instituições
1. Museu Casa de Portinari – Brodowski educativas ou especializadas visando o aten-
dimento desse público alvo nos museus.
2. Museu Histórico e Pedagógico (MHP)
Bernardino de Campos – Amparo A partir do levantamento preliminar, ini-
ciou-se a coleta dos dados, incluindo docu-
3. M. H. P. Conselheiro Rodrigues Alves - mentação fotográfica, finalizada por uma reu-
Guaratinguetá nião de avaliação com a equipe do museu ou
com o profissional responsável pelo acompa-
4. M. H. P. Índia Vanuíre – Tupã nhamento da pesquisadora no museu.
O critério de seleção desses museus obe- Todo o material colhido foi concluído por
deceu às indicações feitas pela Diretora um parecer, entregue à diretora técnica do
Técnica do Grupo de Preservação do Patri- Grupo de Preservação do Patrimônio Muse-
mônio Museológico, Beatriz Augusta Correa ológico, assim como uma avaliação quanti-
da Cruz, por considerar que essas institui- tativa baseada nos resultados obtidos entre as
ções, pela relevância de seus acervos e de quatro instituições, com o objetivo de escla-
sua articulação cultural com a comunidade recer a situação atual em que se encontra-
local, poderão atuar como futuros pólos vam as questões de acessibilidade dessas ins-
multiplicadores de programas de acessibili- tituições, como forma de estabelecer metas e
dade e ação educativa inclusiva em outros prioridades para implantação de programas
museus, principalmente aqueles credencia- de acessibilidade, principalmente nos mu-
dos pelo Sistema de Museus do Estado de seus do interior do Estado, pertencentes a
São Paulo. essa Unidade.
ACESSIBILIDADE, INCLUSÃO SOCIAL E POLÍTICAS PÚBLICAS 127
FICHA DIAGNÓSTICO
(Síntese)
ACESSIBILIDADE FÍSICA E SENSORIALDE MUSEUS E INSTITUIÇÕES CULTURAIS
I. ACESSIBILIDADE FÍSICA
ÁREAS EXTERNAS Estacionamento
Sinalização
Pátios
Jardins
ENTRADAS E SAÍDAS Acesso Principal
Acesso Secundário
CIRCULAÇÃO INTERNA Circulação Horizontal
Circulação Vertical
Equipamentos
EXPOGRAFIA Circulação
Iluminação
Apresentação de obras e/ou objetos
Segurança
II. ACESSIBILIDADE SENSORIAL
PROGRAMAÇÃO AUDIOVISUAL Informações
Textos/Imagens
Legendas/Etiquetas
Multimídia
AÇÃO EDUCATIVA INCLUSIVA Indireta Recursos e Percursos Multissensoriais
Reproduções Bi e Tridimensionais
Direta Visitas Orientadas
Cursos de Formação
Conscientização Funcional
Assessorias
Parcerias
Avaliações
III. CONSIDERAÇÕES FINAIS
CLASSIFICAÇÃO DE Adequado
ACESSIBILIDADE DO Adaptado
MUSEU OU INSTITUIÇÃO Adaptável
128 AMANDA PINTO DA FONSECA TOJAL
cial, políticas essas que ao mesmo tempo orien- Bruno analisa o modelo de gestão museo-
tarão seus quadros profissionais, segundo os cri- lógico baseado em sistemas ou redes como
térios museológicos de gestão adequados à fun- sendo “uma proposta metodológica para
ção do museu, investindo em questões comuni- propor, realizar, e avaliar os distintos proce-
cacionais, de capacitação funcional, preserva- dimentos museológicos de salvaguarda
ção e proteção do patrimônio. (conservação e documentação) e comunica-
ção (exposição e educação/ação cultural)
das referências patrimoniais, coleções e
PLANEJAMENTO DE “POLÍTICAS PÚBLICAS DE acervos, a partir dos princípios de cadeia
ACESSIBILIDADE E AÇÃO EDUCATIVA EM MU- operatória, de reciprocidade entre ações téc-
SEUS DO INTERIOR DO ESTADO DE SÃO PAULO nicas, científicas e administrativas e, especi-
almente, no que tange ao alcance do enqua-
Introdução dramento patrimonial.”18
6. A avaliação: processo que acompanha O exame das experiências dos quatro mu-
todas as etapas do planejamento (rela- seus do interior paulista – Museu Casa de
ção de interdependência) contribuindo Portinari, MHP Bernardino de Campos, MHP
inclusive para a implementação e ela- Conselheiro Rodrigues Alves e MHP Índia
boração de novos objetivos e metas en- Vanuíre – permite concluir que é perfeita-
volvendo essas ações. mente possível acreditar no desenvolvimen-
to de políticas públicas de acessibilidade e
- Etapas do Planejamento23 inclusão de públicos especiais em museus.
As quatro instituições, cada qual a sua ma-
neira, revelam, ao mesmo tempo, carências
em termos de acessibilidade e capacidade
de superá-las.
A
“A Gestão da Qualidade é muito diferente da Qualidade.
Caracteriza-se pelo sistema de organização que está por
detrás para conseguir pôr em prática a Qualidade de
uma forma permanente e consistente. Tudo isto implica
que a Qualidade de um produto ou de um serviço esteja
definida quando se falam de Sistemas de controlo da
Qualidade. Se não se conseguir definir Qualidade não se
sabe o que se vai controlar ou gerir.”
(Ramos Pires, A., excerto de entrevista, publicado em “ Os
museus e a Qualidade “, Cadernos de Sociomuseologia,
nº23, Centro de Estudos de Sociomuseologia, Edições uni-
versitárias lusófonas, Universidade Lusófona de Humani-
dades e Tecnologias, Lisboa, 2005)
avaliação relativa do impacto dos museus na objectos do que com os objectivos, idola-
sociedade. Falta uma linguagem comum trando o que permanece e desperdiçando o
que permita comparar, sem preconcei- que fluí.
tos, o desempenho social dos museus
com o de outras organizações, tornando- Não nos podemos esquecer que nem toda
os mais acessíveis, “usáveis” e transpa- acção museológica conduz a produtos finais
rentes. e que a dimensão processual da museologia
social (a “caixa negra” que regista as mudan-
Essa opacidade inibe as expectativas dos ças de rumo e os fluxos varáveis de partici-
cidadãos relativamente à sua participação pação) carece de ser avaliada e explicitada
nos processos museológicos e na avaliação como evidência primordial da Qualidade
dos resultados, devido à dificuldade em museus.
objectiva em compreender como o podem
fazer e quais os benefícios que daí advêm A Gestão da Qualidade assenta na
para os indivíduos e para a comunidade. O autoavaliação, flexibilização e transparência
cidadão terá que saber, objectivamente, o das organizações, como via para o desenvol-
que pode esperar da entidade organizacio- vimento pessoal, a democratização das soci-
nal museu no contexto da sociedade actual edades e a satisfação das pessoas entendi-
e, enquanto membro da comunidade, saber das como input e output do sistema da Qua-
como pode contribuir activamente na defi- lidade.
nição da sua missão, comprometer-se com a
visão, identificar-se com os valores, enten- A dimensão ontológica do museu, como
der a especificidade processual do fazer lugar onde se pensa o mundo próximo e
museológico e, sobretudo, ter parte activa distante, em ordem à mudança, contra a ex-
na autoavaliação, como meio fundamental clusão, obriga a um exercício permanente
para prosseguir a melhoria contínua. de observação e negociação, resultante do
diálogo entre os museus, as pessoas e outras
O enfoque na participação como pro- organizações, formais e informais, com
cesso–chave da Qualidade em museus, perspectivas diferenciadas de sociedade,
tem conduzido, no interior e no exterior da valores, culturas e patrimónios. Esta não é
comunidade museológica, ao questiona- tarefa fácil porque, como todos sabemos,
mento desta lógica organizacional e da ideia não há museus neutros nem políticas inó-
de museu que lhe está subjacente, impulsio- cuas.
nando reflexões que visam a reavaliação dos
conceitos e práticas convencionais que mo- Há que fazer opções, estabelecer com-
delam a acção museológica e a revisão das promissos, firmar contratos sociais com
missões dos museus no que toca à sua fun- os parceiros e ter uma visão clara sobre
ção social e à percepção efectiva da Quali- o sentido a dar aos museus, inequivoca-
dade, como conceito abrangente, indissociá- mente expresso nas missões, fortalecido
vel dos ideais de desenvolvimento e de cida- no auto conhecimento e na avaliação
dania. A nosso ver, a permanência do pre- comparada dos resultados. Ter uma clara
conceito relativamente à autoavaliação e percepção do que representa a museologia,
participação efectiva dos cidadãos, assenta enquanto ciência – expressão do pensamen-
na opacidade dos modelos convencionais to contemporâneo e o campo da acção mu-
de gestão, baseados em administrações buro- seológica – a práxis que traduz o posiciona-
cráticas, centradas no controle das funções e mento dinâmico dos museus na sociedade,
das pessoas, mais preocupadas com os face aos graves problemas com que se depa-
142 ISABEL VICTOR
ram hoje as pessoas, aturdidas pela disper- museu. O mote era – o que é ser setubalense
são, reféns da solidão. numa cidade multicultural como Setúbal.
Como se estrutura essa identidade?
Setubalense é alguém natural da cidade ou
O CASO MUSEU DO TRABALHO MICHEL não será também setubalense alguém que a
GIACOMETTI. escolheu para trabalhar, que com ela se cru-
zou ocasionalmente ou alguém que, simples-
Os projectos “Olá Vizinhos” e “Tardes mente, tem Setúbal inscrita na sua vida por
Interculturais” razões afectivas ou de sobrevivência, ou seja,
naturalidade implica identidade?
O “Olá Vizinhos” é um projecto que tem
por objectivo apreender a concepção que os A memória e a identidade são vectores
vizinhos do museu têm do mesmo. Os vizi- fundamentais da Museologia Social e as “
nhos são os moradores, os proprietários e Tardes Interculturais” fomentam o debate de
funcionários das casas comerciais. Mais uma todas estas questões, “dão palco” aos partici-
vez o Museu desenvolve um projecto no pantes, envolvem-nos na sua concepção e
qual dá voz à comunidade onde está integra- execução. As tardes interculturais como,
do para assim perceber a relação que esses “Dar à luz longe de casa – as mulheres imi-
vizinhos estabelecem ou não com a institui- grantes e a maternidade”, “Solidão”, “O Não
ção. A verificar-se a segunda hipótese, o Trabalho – condição/exclusão”, “ O Museu e
projecto torna-se ainda mais útil ao produzir o Microcrédito “, são também exemplos de
pistas para novas linhas orientadoras que acções de sensibilização e de promoção do
derrubem essa “barreira invisível”, e promo- debate sobre fenómenos tão actuais como a
vam o contacto. imigração, a solidão (sobretudo entre os
mais idosos) e o desemprego.
As “Tardes Interculturais”, que se realizam
desde 2003, resultam de um projecto igual- O Museu do Trabalho Michel Giacometti
mente votado à comunidade, que visa dar tem fundado o seu percurso de vinte anos,
voz à diversidade e palco às expressões iden- no diálogo permanente com a comunidade
titárias. No último sábado de cada mês, o e na participação, no sentido do reconheci-
museu acolhe temáticas diversificadas, re- mento por parte da comunidade da impor-
correntes e/ou actuais, que emergem do tra- tância da participação das pessoas no estu-
balho com os diferentes grupos. As Tardes do, identificação, classificação e divulgação
Interculturais versam maioritariamente as di- dos seus patrimónios materiais e imateriais.
ferentes nacionalidades, grupos étnicos e
culturais que habitam em Setúbal, como a É desta forma, procurando o diálogo per-
tarde Húngara, Cigana, timorense, Búlgara, manente com a comunidade, estimulando a
Russa, Angolana, Moçambique, China, entre participação nas acções/projectos, que o
outros, promovem um maior conhecimento Museu do Trabalho tem processado o seu ca-
desses grupos e também o encontro e a troca minho. O modelo que adoptámos baseia-se
de experiências entre os participantes, já que no diálogo com as pessoas/recurso (usando a
e importa referir, as tardes são abertas a todos terminologia de Hugues de Varine) identifi-
os públicos. cadas em cada grupo e por ele reconhecidas
como líderes (formais e/ou informais), no in-
A tarde intercultural “Ser Setubalense – tuito de criar dinâmicas de observação/
memórias e representações identitárias” é acção, aprofundadas nas relações de confi-
paradigmática do percurso trilhado pelo ança inter-pessoal e de grupo, que condu-
PARTICIPAÇÃO E QUALIDADE EM MUSEUS 143
Os eventos são notados e bem vindos, mas O museu como espaço de auto-repre-
quando questionadas, constatamos que o sentação de culturas
que mais marcou as pessoas é o que persiste, O museu como placa giratória de pes-
as acções e projectos que se foram entra- soas e ancoradouro de ideias
nhando nos quotidianos de cada um. São as
acções continuadas em que as pessoas se in- As Tardes Interculturais, no Museu do tra-
tegram envolvendo esforço, aprendizagens e balho, têm-nos revelado a importância de
ganhos individuais ou de grupo, ao nível que dar palco às diferentes expressões identitári-
maior impacto têm na comunidade vizinha. as e ás problemáticas contemporâneas que
Também o reconhecimento externo e a ca- afectam as pessoas e os grupos (nomeada-
pacidade de atrair mais valias sociais e cultu- mente imigrantes) gerando fenómenos de
rais ao lugar, é factor de regozijo e esperança incomunicabilidade e exclusão. Os proces-
de mais oportunidades, sobretudo para os sos, fundados na participação, visando a
jovens. É importante inovar mas também é auto-representação das culturas (mediadas
importante permanecer, persistir, avaliar, cri- pelos seus líderes e agentes locais) ajudam a
ar lastro, para navegar e ser reconhecido. È consolidar a noção de que o museu é uma
esse reconhecimento, esse entrosamento en- construção viva e mutável. A ideia de que o
tre as pessoas da comunidade, de que fazem Museu é uma ferramenta social versátil e
PARTICIPAÇÃO E QUALIDADE EM MUSEUS 145
usável por diferentes culturas. Ajuda a con- para todas as culturas ao longo de várias ge-
solidar a ideia do museu polifónico, que rações. O mercado pode ser um bom exem-
aceita diferentes narrativas a diferentes vo- plo para pensarmos o museu, como organi-
zes, evitando os ruídos, estridência e zação de reconhecida Qualidade que funci-
cacofonia, ditados por modelos rígidos. ona para vários públicos e que está na rota
de todos os setubalenses. O mercado do Li-
Mensalmente, no último Sábado de cada vramento, assim designado, tem mais de um
mês, o museu acolhe as Tardes Interculturais, século e mantém-se actual e actuante. Trata-
abrindo-se à livre participação dos diversos se de um equipamento tradicional de reco-
grupos geracionais, socio-profissionais, as- nhecida Qualidade, que se vai adaptando e
sim como ás diferentes etnias, nacionalida- inovando ao ritmo das necessidades e ex-
des e temáticas transversais por estes sugeri- pectativas dos cidadãos-clientes, aceitando
das e priorizadas. São encontros informais no seu interior vários formatos, oferecendo
feitos “por medida” e talhados em cima do vários produtos sem contudo perder a iden-
pano, à maneira do velho alfaiate. O dese- tidade.
nho destes encontros mensais ajusta-se ás
características identitárias, modos de vida e As Tardes Interculturais, são de entrada li-
formas de expressão de cada um destes gru- vre e integram sempre uma componente
pos com expressão local. Eles são as várias gastronómica, que reflicta a especificidade
formas de ser setubalense. O seu viver e con- dos sabores de cada uso e cultura, confecci-
viver resulta de construções, adaptações, onado pelos próprios em parceria com o
hibridações , recentes ou ancestrais e museu e a colaboração de comerciantes lo-
reflecte, nos mínimos pormenores, os vários cais. Cremos que o acto de comer à mesa e
olhares sobre a cidade, o território, a paisa- aceitar provar é um momento único de
gem, os recursos, as pessoas, os patrimónios aproximação. O detalhe dos procedimentos
materiais e imateriais. Só um trabalho no ter- para a confecção dos alimentos, a receita daí
reno, com os vários líderes ou pessoas –re- resultante, distribuída a todos os comensais e
curso (como as define Hugues de Varine), as- a oportunidade de avaliar conjuntamente os
sente na observação directa e na participa- resultados, provando e comparando, consti-
ção de todos os intervenientes, permite con- tuí a metáfora perfeita dos processos de
tornar a tentação de resumir ao exótico e aos hibridação cultural e a sua celebração numa
epifenómenos as culturas e patrimónios que linguagem prazerosa e universal que dispen-
desconhecemos. Tentamos a todo o custo sa tradução. O mesmo se passa com a músi-
evitar o triste espectáculo da folclorização ca, dança e outras expressões artísticas
da cultura. Trabalhamos persistentemente, convocadas mensalmente para as Tardes
há vários anos, com as pessoas de diferentes Interculturais no Museu do Trabalho Michel
gerações, origens, condições e profissões, os Giacometti. O extenso rol de programas e tí-
aspectos comuns da vida e dos quotidianos tulos das Tardes Interculturais , constituído
no sentido de entender e captar as mais por cerca de meia centena de temas e pro-
subtis transformações, as adaptabilidades blemas, espelha Setúbal na actualidade e re-
funcionais, morais, estéticas, artísticas e exal- vela a fisionomia do seu maior recurso
tar a espantosa capacidade de gerar mudan- patrimonial – as pessoas e as suas competên-
ças e inovação nas mais pequenas coisas. É cias. As aprendizagens de natureza comuni-
disso exemplo a culinária, expressão máxi- cacional e social geradas são a sua mais-va-
ma da fusão das culturas. O mercado local é, lia e o principal input do sistema de inova-
por isso talvez, um exemplo vivo de patrimó- ção e Qualidade. As aprendizagens são trans-
nio por todos referenciado. Uma plataforma versais e vão para além dos ganhos cogniti-
146 ISABEL VICTOR
velhos, não sabem ler ... assim filmámos, para “A sociedade pós-moderna é a sociedade
acesso visual, o que nos disseram sobre os em que reina a indiferença de massa, em
respectivos objectos, as significações e gestu- que domina o sentimento de saciedade e
alidades associadas. Então, foi muito interes- de estagnação, em que a autonomia pri-
sante descobrirmos o que, nem sempre, as vada é óbvia, em que o novo é acolhido
palavras explicam. A exemplificação gestual do mesmo modo que o antigo, em que a
do uso de um simples xaile preto de merino, inovação se banalizou, em que o futuro
com franjas de seda, guardado há cerca de deixou de ser assimilado a um progresso
noventa anos, no seio de uma das mais anti- inelutável.
gas famílias, mostra-nos que este assume dis-
tintas formas de se fazer ao corpo, consoante (...) A cultura pós-moderna é descentrada
a ocasião e a disposição. Uma linguagem e heteróclita, materialista e psi, porno e
simbólica subtil, provavelmente um traço da discreta, inovadora e rétro, consumista e
identidade varina (a confirmar em estudos ecologista, sofisticada e espontânea,
comparados), reconhecido entre as mulhe- espectacular e criativa; e o futuro não
res da comunidade, passado de geração em terá, sem dúvida, que decidir em favor
geração, num vendo/fazendo quase mudo, de uma destas tendências, mas, pelo con-
que se vai entranhando. Uma memória sin- trário, desenvolverá as lógicas duais, a
gular, sedimentada nos gestos : - “o xaile para co-presença flexível das antinomias “
o dia-a-dia”, caído pelo corpo sem artifícios ;
“o xaile para festa”, alegre, descaído sobre os O Museu que se cala para escutar, que ob-
ombros ; “o xaile para a missa” e o “xaile para serva criteriosamente, que diversifica os
sentimento “ que, em sinal de respeito ou de emissores e implica as pessoas na dissemina-
luto, tapa a cabeça e aconchega a dor. ção dos patrimónios e memórias, presta,
quanto a nós, um importante serviço à co-
Os objectos nesta exposição apresentam- municação polifónica e à livre expressão do
se como que fragmentos de um “relicário” pensamento e das identidades.
de família, mote para desfiar “ estórias “, ân-
coras de memórias, contornos de um “senti- No mundo global e ruidoso em que esta-
mento varino “que talvez um dia venhamos mos mergulhados, as pessoas precisam do
a compreender. Por essa mesma razão silêncio, anseiam ser ouvidas. O museu
começámos este texto com um ponto de in- pode recuperar esse importantíssimo pa-
terrogação - Varinos, nós ? Pois assim se in- pel na sociedade, pode ser um espaço ce-
terrogam os mais jovens, surpreendidos com rimonioso de escuta, um lugar fiável e
a persistência deste epíteto, tão longe vai o inspirador, um parceiro competente e activo
tempo da varinagem ; usámos as reticências na mudança.
... em sinal de continuação.
A disponibilidade para ouvir é, quanto a
nós, uma das formas mais activas de suscitar
O Museu, espaço cerimonioso de escuta, a participação e de favorecer as expressões
contra indiferença. identitárias dos diferentes grupos na comu-
nidade. A participação manifesta-se muitas
Gilles Lipovetsky, em “ A Era do Vazio “ vezes pelo silêncio, por isso é necessário es-
(1983), um ensaio sobre o individualismo tar atento, observar, deixar fluir. Criar oportu-
contemporâneo, refere que : nidade para o debate, retomar o lugar perdi-
150 ISABEL VICTOR
do da Ágora social (2) e reconhecer, sem pre- “Materiales, Arte y Música nº 19, Alianza Edi-
conceitos, a dimensão política (na perspecti- torial, Madrid, 1999.
va de Hanna Arendt) do museu e sua especi-
ficidade em gerar empowerment, através das FERNÁNDEZ, Luis Alonso, Historia y
operações museais participadas, dos traba- evolución del museo, in, Museologia,
lhos da memória, dos projectos integrados e Introducción a la teoria y prática del museo,
do reforço das identidades. Madrid, Istmo, 1993
SANTOS, Maria Célia T.M.. (2000) Reflexões mu- 3.BIBLIOGRAFIA BÁSICA SOBRE QUALI-
seológicas: Caminhos para a vida. Cadernos de DADE E GESTÃO
Sociomuseologia nº18, Universidade Lusófona
de humanidades E Tecnologias, 2000, Lisboa. GOMES, Duarte (2002), Cultura organizacio-
nal, Comunicação e identidade, Quarteto
SANTOS, Maria Célia T.M. (1996) Processo Editora, Coimbra
Museológico e Educação, construindo um
museu didáctico – comunitário, ULHT, Lisboa CHIAVENATO, Idalberto (1985), Teoria Geral
da Administracção, Vol.2, Ed. Mkron Books,
ICOM, Código de deontologia profissional, S. Paulo.
Lisboa, Comissão Nacional Portuguesa do
ICOM, 1995 BERTRAND, Ives, GUILLEMET, Patrick
(1988) Organizações: Uma abordagem
ICOM- International Council for Museams – sitémica, Instituto Piaget, Lisboa.
www. Icom.org.
LORD, Barry, LORD, Gail Dexter (1997), Ma-
TELMO, Isabel Cotinelli, (1991) O Património nual de gestión de museos, Editorial S.A. ,
ea Escola do Passado edo Futuro, Texto Edi- Barcelona.
tora, Lisboa
PIRES, A . Ramos. Qualidade – Sistemas de
RIVIÈRE, Georges – Henri (1989) La gestão da qualidade, Lisboa, Silabo, 2000
muséologie selon G.H.R., cours de 4.BIBLIOGRAFIA SOBRE PÚBLICOS/MU-
muséologie, Textes et Temoignes, Editions SEUS
Dunod/Bordas , Paris
ALMEIDA, Adriana Mortara. (1995) A relação
RÚSSIO, Waldisa (s.d.) Museologia e Museu, do público com o Museu do Instituto
Textos de Museologia, ULHT, Lisboa Butantan: Análise da exposição ‘Na Na-
tureza não existem Vilões’, Dissertação de
“VAGUES- Une anthologie de la nouvelle mestrado, Escola de Comunicações e Artes/
muséologie” (colectânea), coord. Marie USP.
Odile de Bar y, Françoise Wasserman,
colecção Museologia, vol.2, éditions W: ALMEIDA, Adriana Mortara. (1997b) Pú-
presse universitaires, Lyon, 1994 blico de museu. Verbete In Teixeira Coe-
lho, Dicionário Crítico de Política Cultu-
VARINE, Hugues de (1987) Politiques ral , São Paulo, Iluminuras/FAPESP,
muséales et stratégies de développment lo- pp.325-328.
cal et national , De l‘exhibitionisme à la
comunication sociale, 1º Atelier Internaci- BOURDIEU, & Darbel. (1985) L’amour de
onal da Nova Museologia, MINOM, Aragão, l’art les musées d’art européens et leur
ULHT, Textos de Museologia, Lisboa public, Les éditions de Minuit, Paris.
VARINES, Hugues de, “Le musée peut tuer ou ALMEIDA, Adriana Mortara. (2000) Visitor
... faire vivre” (1979), in, Vagues, Une Studies in Brazil: a long way to go. Visitor
anthologie de la nouvelle museologie, vol. II, Studies Today! A publication of the Visitor
MNES, Editions W, Svigny – le temple, 1994, Studies Association, Spring, vol.III, issue 1,
in Textos de Museologia, ULHT, Lisboa. p.20-21
152 ISABEL VICTOR
Alt, M.B. (1980) “Four Years of Visitor Surveys CASALEIRO, Pedro J. E. (1996) Museum
at the British Museum (Natural History) 1976- visitors and media science in Portugal. In:
79” Museums Journal, pp. 10-19. S.C. Bitgood (ed.) Visitor Studies: Theory,
Research and Practice. Selected papers from
ABBEY, D.S. and Cameron D.F. (1959). The the 1994 Visitor Studies Conference, Raleigh,
Museum Visitor: I-Survey design-1959 by North Carolina, Visitor Studies Association,
Toronto, Canada : Royal Ontario Museum. 62-73.
ABBEY, D. S. and Cameron, D.F. (1961). The CASALEIRO, Pedro J. E. (1997) Origins,
Museum Visitor: III-Supplementary public perceptions and future directions
Studies-1961 Toronto, Canada : Royal of the National Museum of Natural
Ontario Museum. History in Portugal. University of Leicester,
Tese de doutoramento não publicada.
BORUN, Minda, Chambers, Margaret &
Cleghorn, Ann. (1996) Families Are Learning Cave, J. (1989). “Audience Research to Design
in Science Museums. Curator. and Plan a Children’s Museum. We Kids Need
a Place to Find Out About Things.” Visitor
BORUN, Minda, Flexer, B.K., Casey, A. & Behavior, pp. 5-6.
Baum, L.R. (1983) Planets and Pulleys:
Studies of class visits to science Cheney, T. (1992) “The Visitor Rainbow”
museums, Franklin Institute, Philadelphia. Visitor Studies: Theory, Research, and
Practice 4.
CAMERON, D.F. and Abbey, D.S. (1960). The
Museum Visitor: II-Survey Results-1960 Dennert, Dorothee. (2001) Open for New
Toronto, Canada : Royal Ontario Museum learning. Museums facing economic and
social changes. Keynote speech, CECA Con-
CAMERON, Duncan F. (1967). “How Do We ference, Barcelona, 10 p., versão electrónica.
Know What Our Visitors Think?” Museum
News, pp. 31-33. Falk, J. and Dierking, L. (1992). The Museum
Experience. Washington:Whalesback Books.
CAMERON, Duncan F. and Abbey, D.S. (1961).
“Museum Audience Research.” Museum Faria, Margarida L. (2000) A avaliação da
News, pp. 34-38. eficácia do discurso museológico: Um es-
tudo sobre os públicos e a experiência
CRANE, V.; Nicholson, H,; Chen, M. & global da visita. Instituto de Investigação
Bitgood, S. (1994) Informal Science Científica Tropical, Lisboa (dissertação sub-
Learning. What the Research Says About metida para promoção a pesquisador assis-
Television, Science Museums, and tente).
PARTICIPAÇÃO E QUALIDADE EM MUSEUS 153
Gohn, M.G. (1999) Educação Não Formal e Légaré, B. sous la supervision de Beaulac, M.,
Cultura Política. Volume 71. Cortez Editora. Colbert, F., and Duhaime, C.(1991). Le
marketing en milieu muséal: une
Hood, M.G. (1983). “Staying Away, Why bibliographie analytique et sélective.
People Choose Not to Visit Museums.” Montréal: École des Hautes Études
Museum News, pp. 50-57. Commerciales
Hood, M.G. (1986). “Getting Started in Audience Linton, Jon et al. (1992) A survey of visitors at
Research.” Museums News, pp. 24-31. an Art Gallery, Cultural History Museum,
Science Center, and Zoo. In ILVS
Hood, M.G. (1990). “Identifying and Serving Review,239-259.
New Museum Audiences.” ASTC Newsletter
May/June, pp. 7-8. Loomis, Ross J. (1987) Museum visitor
evaluation: new tool for management.
Hood, M.G. (1993). “After 70 years of Nashville, Tennessee, American Association
Audience Research , What have we Learned? for State & Local History.
Who Comes to Museums, Who Does Not, and
Why?” Visitor Studies: Theory, Research, Loomis, R.J. (1987). Museum Visitor
and Practice, pp. 16-27. Evaluation: New Tool for Management.
Hood, M.G. (1988). “Arboretum visitor profiles Nashville: American Association for State
as defined by the Four Seasons.” in and Local History
Proceedings of the First Annual Visitor
Studies Conference. Jacksonville : Centre Loomis, R.J. (1987). Museum Visitor
for Social Design. pp. 84-100. Evaluation: new tool for management.
Chapter 4, “The Identity of Museums:
Hood, M.G. (1993). “Comfort and Caring, two Evaluation, Marketing, and Audience
essential environmental factors.” Development.” Nashville: American
Environment and Behavior, pp.710-724. Association for State and Local History, pp.
117-156.
Hooper-Greenhill, J.,E. “Museums and the
shaping of knowledge”, Routledge, 1995 Loomis, R.J. (1988). “The Countenance of
Visitor Studies in the 1980’s.” in S.
Kelly, R.F. (1987). “Museums as Status Symbols Bitgood,
II: Attaining a State of Having Been,” in
Advances in Non J. Roper, & A. Benefield (Eds.) Visitor Studies
. - 1988: Theory research, and practice.
Landry, Johanne (1995). “The Biodome and Proceedings of the First Annual Visitor
its Audiences…Or Audiences and Their Studies Conference. Jacksonville, AL :
Biodome?” in Museums: Where Center for Social Design, pp. 12-24.
Knowledge is Shared Société des musées
québécois and Musée de la civilsation, ed. Loomis, R.J. (1987). Museum Visitor
Coté, Michel et Viel, Annette. Evaluation: new tool for management.
Chapter 1, “Understanding Museum Visitors:
Le Marec, Jöelle. (1993) L’interactivité, Evaluation and Management.” Nashville :
rencontre entre visiteurs et concepteurs. American Association for State and Local
Publics & Musées, Lyon,91-109. History.
154 ISABEL VICTOR
Lewis, B.N. and Alt, M.B. (1988). “Evaluation: Robbins, J. and Robbins, S. (1980). “Museum
its nature, limitations and dangers.” Chapter Marketing: Identification of High, Moderate,
15 in The Design of Educational Exhibits. and Low Attendee Segments.” Journal of
(2nd ed.) R.S. Miles et al. London: Allen & the Academy of Marketing Science, pp.
Unwin. 66-76.
Munley, Mary E. (1986) Asking the right Rubenstein, R. (1990). “Focus on Focus Groups.”
questions: evaluation and the museum ASTC Newsletter July/August, pp. 7-8.
mission. Museum News,18-23.
Rubenstein, R., Munro, L. and Black, K. (1993).
Nedzela, M. and Lane, D. (1990). “Modeling “Strategies for Audience Development.”
Museum Attendance.” Curator, pp.180- Visitor Studies: Theory, Research, and
194. Practice 5, pp.143-152.
2
Teixeira Coelho. (1997) Dicionário Crítico DE L’ÉCOMUSEE AU MUSÉE-FORUM-ÁGORA
SOCIAL. Touché, comme bien d’autres, par les
de Política Cultural, São Paulo, Iluminuras/ enseignements de G.H. Rivière, par la
FAPESP. muséographie de Per Uno Agren, par des
échanges fréquents avec Hugues De Varine , je
suis entraîné dans le mouvement associatif,
Verón, E. & Levasseur, M. (1989) Ethnographie depuis les évènements d’Avril 74, au Portugal.
de l’exposition: l’espace, le corps et le Parallèlement, je m’associe aux rencontres
organisées par le Creusot-Montceau-les Mines ,
sens. Paris, Centre Georges Pompidou. devenu un certain temps un pôle de
convergence de muséologues à la recherche de
“ quelque chose d’autre “ : Tous contaminés
Wolf, Mauro. (1987) Teorias da Comunica-
par la vague écomuséale qui déferle en France,
ção, Lisboa, Presença dans les années 70, la muséologie
communautaire active au Mexique, le terreau
est mûr, au début des années 80 , pour une
Wolf, R.L. (1980). “A Naturalistic View of action décisive de la part de musólogues et de
Evaluation.” Museum News, pp. 39-45. non muséologues contestant le système. Ce
furent, coup sur coup, la creation de
l’Ecomusée de la Haute-Beauce – Musée
REVISTAS: territoire, légitimisé par un article de Hugues de
Varine sur “ L’Ecomusée “ (Canada, l978), des
signes de mécontentement sporadiques au sein
Bitgood, S., ed. Visitor Behavior: A de Conférences générales de l’Icom (Mexico,
Publication for Exhibition-Type Facilities. Londres), la convergence spontanée de “
nouveaux muséologues “ au Québec (1984),
Jacksonville: Center for Social Design.
puis au Portugal , en 1985, pour la fondation
du mouvement. La référence à la Déclaration
Bitgood, S., et al, ed. Visitor Studies: Theory, de Santiago du Chili (1972) devient le prétexte
de légitimisation auprès de la communauté
research, and practice. Proceedings of the muséale internationale des partisans du
Annual Visitor Studies Conference changement qui ,étonnament, recevra l’aval de
l’Exécutif de l’ICOM sous forme d’une
Jacksonville:Center for Social Design.
organisation affiliée: On découvre l’ampleur
historique et territoriale des principes qui
Screven, C.G, and Shettel, H.H., editors. ILVS régiront çle mouvement à travers la révélation
des expérioences des deux continents
Review: A Journal of Visitor Behavior. Américains., un fil d’Arianne qui n’a rien de
Milwaukee: ILVS. linéaire, dont les tenants et aboutissants
s’entrecroisent, s’ entremêlent, pour place à
une philosophie de la “gestion de la
Notas compléxité des représentations sociales“ .
1
O Museu do Trabalho Michel Giacometti é um Reprenant la suggestion de John Kinard sur la
museu temático, criado em 1987, sob tutela do creation du forum catarsys, les tendances plus
município de Setubal. Inicialmente designado récentes de grandes institutions muséales à se
por Museu do Trabalho, veio a assumir o nome de transformer en agoras ( place d’idées, place
Michel Giacometti, após a morte do marchande confondues ), nous asssistons au
etnomusicólogo corso, que dedicou grande parte passage progressif du concept de l’écomusée,
da sua vida ao estudo da cultura portuguesa e réactualitsé, à travers ses différentes
que coordenou, após a revolução de Abril de générations, au concept intégratif de Musée-
1974, a recolha da colecção Etnográfica que este- Forum-Agora social, faisant la part égale à
ve na génese do museu. O museu está hoje insta- l’exposition et au débat citoyen. Cette
lado numa antiga fábrica de conservas de peixe, transmutation, déjà sensible à Santa Cruz de
simbolo da industria que marcou a história e me- Rio , apparaîtra avec évidence à Setubal lors du
mória da cidade. O Programa museológico é da 12e Atelier international du MINOM.
autoria de Ana Duarte, Fernando António Pierre Mayrand, 25 de Abril de 2008, in “
Baptista Pereira e Isabel Victor e o projecto de Musealogando – blog Museologia Social, http://
arquitectura da autoria de Sérgio Dias. www.musealogando.blogspot.com/
ARTIGO
3
Museus, Exposições e Identidades:
os desafios do tratamento museológico do patrimônio afro-brasileiro.
A
INTRODUÇÃO
M
Minhas experiências nos últimos anos, à frente da Coordenação do Museu
Afro-Brasileiro da Universidade Federal da Bahia, e como docente da discipli-
na Laboratório de Cultura Africana e Afro-brasileira, no curso de graduação em
Museologia desta mesma Universidade, entre outras experiências, evidencia-
ram a necessidade de reflexão sobre formas de patrimonialização e processos
expositivos de elementos relativos às culturas africanas e afro-brasileiras, no
Brasil, pois é perceptível, no sistema de representações, incluindo os museus, a
propagação de discursos e imagens sobre a presença de heranças negras na
formação da chamada “cultura nacional” marcados por repetição de lugares
comuns, conceitos e preconceitos, reduzindo e desqualificando a importância
da presença de matrizes africanas na construção das nossas formas de vida,
trabalho, sensibilidades, etc.
158 MARCELO NASCIMENTO BERNARDO DA CUNHA
Minhas experiências nos últimos anos, à grupos nos movimentos sociais, produzindo
frente da Coordenação do Museu Afro-Brasi- pressões que levam ao redimensionamento
leiro da Universidade Federal da Bahia, e de propostas e práticas institucionais, bus-
como docente da disciplina Laboratório de cando garantir a manutenção e justificativa
Cultura Africana e Afro-brasileira, no curso da existência de suas memórias. Mesmo as-
de graduação em Museologia desta mesma sim, e talvez por isso mesmo, é clara a resis-
Universidade, entre outras experiências, evi- tência dos museus no redimensionamento
denciaram a necessidade de reflexão sobre de suas práticas e abordagens, verificando-se
formas de patrimonialização e processos defasagem muito grande no que diz respeito
expositivos de elementos relativos às cultu- a discursos afirmativos que explicitem os va-
ras africanas e afro-brasileiras, no Brasil, pois lores de grupos historicamente colocados à
é perceptível, no sistema de representações, margem na sociedade e nos seus mecanis-
incluindo os museus, a propagação de dis- mos de representação simbólica.
cursos e imagens sobre a presença de heran-
ças negras na formação da chamada “cultura A ação preservacionista como um todo, e
nacional” marcados por repetição de luga- as práticas museológicas, em particular, con-
res comuns, conceitos e preconceitos, redu- figuram-se como uma apropriação de reali-
zindo e desqualificando a importância da dades que implicam na produção de ima-
presença de matrizes africanas na constru- gens e referências de memórias. Tais opera-
ção das nossas formas de vida, trabalho, sen- ções e jogos operados no tratamento
sibilidades, etc. patrimonial, produzem formas e modos de
rememoração, ao mesmo tempo em que
De forma geral, manifestações culturais produzem efeitos e exercícios de esqueci-
de origem ou influência africana são trata- mento. Portanto, na dialética das culturas e
das e apresentadas em recortes turísticos e no processamento histórico das referências e
folclorizadores que camuflam a força e o práticas culturais, Museus e Exposições cons-
sentido dessas manifestações na vida brasi- tituem-se como campos abertos para exercí-
leira. Podemos entender tal questão quando cios de trocas simbólicas, jogos de poder e
consideramos que exercícios de preservação de referências culturais, como campos privi-
e patrimonialização estão relacionados ao legiados de lutas e negociações nas práticas
modo pelo qual matrizes culturais são histo- sociais, em embates entre os diversos grupos
ricamente construídas, sistematizadas e sócio culturais constituídos e seus interesses
selecionadas, percebidas, e às formas pelas coletivos e específicos.
quais cada sociedade pretende representar-
se e identificar-se. Sendo o Brasil, historica- Expor é revelar, comungar, evidenciar ele-
mente ávido por branqueamento e constru- mentos que politicamente precisam ser
ção de auto-imagens européias, são produzi- explicitados, em uma perspectiva relaciona-
dos discursos marcados por visões da a um momento histórico, uma produção
eurocêntricas na formulação de uma estética, um ideal político. O Museu é ele-
pretensa cultura nacional, discriminando mento de propaganda ideológica através de
culturas negras ou culturas de negros. imagens e objetos, visando fabricar uma ima-
gem ideal1 da realidade e suas dimensões.
A questão da representação de grupos cul- Logo, ao analisarmos exposições museológi-
turais ditos tradicionais, em museus ou qual- cas e as representações nelas recorrentes, é
quer outro meio de difusão, tem estado na necessário entender a construção destas re-
ordem do dia como resultado do maior presentações como um processo histórico,
acesso e participação de membros de tais buscando compreender também, a aborda-
MUSEUS, EXPOSIÇÕES E IDENTIDADES 159
gem baseada nas imagens oficialmente cons- negro – traz em seu contexto desdobramen-
truídas, e conseqüentes inclusões e exclusões tos de grupos culturais, a realidade nacional
realizadas. expõe contextos extremamente plurais de
referências culturais, fundindo-se em novos
Os processos de exclusão social ocorridos agrupamentos culturais, mas também con-
na formulação da nação brasileira e de sua servando traços referenciais antigos e lon-
identidade nacional, utilizando a cultura gínquos, em ambiente onde a tradição e a
como ferramenta operacional, fundamenta- inovação dialogam permanentemente, em
ram-se na idéia de depuração do “cenário”, fusões e rupturas, acréscimos e exclusões.
de limpeza, organização e classificação das Daí a necessidade de passar da idéia de Iden-
suas referências nativas, portuguesas, africa- tidade Nacional Brasileira monolítica, ho-
nas, com a idealização das narrativas em tor- mogênea, para a idéia de Identidades Brasi-
no destes contingentes, e mitificação de al- leiras, de Culturas Brasileiras, resultantes de
gumas participações e presenças heróicas conflituosos encontros desenvolvidos ao
das três raças ao longo da nossa história. longo de 500 anos. Para esta operação ficam
evidentes o papel e a importância dos patri-
Neste processo está implicada a contínua mônios nacionais, que devem ser entendidos
determinação de papéis de destaque e de como
subordinação, a existência de indivíduos que
vencem e outros que são vencidos, grupos [...] o lugar onde melhor sobrevive hoje a
que constróem e outros que supostamente ideologia dos setores oligárquicos [...]
impedem o amplo desenvolvimento da na- existe como força política na medida em
ção, decorrendo um discurso maniqueísta e que é teatralizado [...] O mundo é um
manipulado em torno de histórias nacio- palco, mas o que deve ser representado
nais. Na perspectiva oficial de nacionalidade já está prescrito. As práticas e os objetos
homogênea, a diversidade e a pluralidade valiosos se encontram catalogados em
podem significar riscos para imagens ideali- um repertório fixo. [...] Por isso as noções
zadas construídas para a Nação, com conse- de coleção e ritual são fundamentais
qüente ameaça a poderes e lugares instituí- para demonstrar vínculos entre cultura e
dos. A idéia de homogeneidade traz consi- poder.2
go, normalmente, um processo de subordi-
nação, de exercícios de poder de um certo Nesta perspectiva, o museu exerce papel
grupo que opera conceitos e práticas ofici- de grande importância, como espaço institu-
ais da sociedade em detrimento de outros cional destinado à apresentação ritualizada
grupos, subordinados e inferiorizados no das culturas, palco para a sua exibição e en-
quadro das referências culturais e das deci- cenação, em que celebram-se valores elei-
sões e definições. tos como representativos de nacionalidades
e de culturas nacionais constituídas por eli-
No quadro do que é identificado como tes dominantes e seus simpatizantes. Neste
cultura nacional temos, pois, de estar atentos processo percebemos que o século XIX foi
para a complexidade de sua constituição/re- essencial, quando se desenrolaram ações es-
constituição, que implicam na diversidade, pecíficas, com estabelecimento de paradig-
pluralidade, contradição e mesmo oposição mas fundamentais na definição, proteção e
de referências, contextos, indivíduos e seus socialização de traços culturais entendidos
interesses. No Brasil, país formado por diver- como patrimônio da civilização ocidental,
sidade étnica muito grande, em que cada um estabelecendo-se vários Espaços de Memória
dos segmentos consagrados – índio, branco e com o objetivo de marcar e definir os ele-
160 MARCELO NASCIMENTO BERNARDO DA CUNHA
nas quais tecnologias e modos de viver esta- lavouras e serviços da casa-grande, deixan-
riam classificados em estágios de primitivos do-se de lado vários outros setores em que
a retardados. Não encontramos exposições negros tiveram presença marcante, como
que apresentem referências contemporâneas nas chamadas artes e ofícios, produzindo
do continente, na sua complexidade decor- objetos para a sociedade civil e religiosa.
rente dos diversos momentos históricos, des- Não encontramos, em nenhuma exposição
de o período pré-colonial até a atualidade. de arte sacra cristã colonial, informações so-
bre a vasta participação de negros e mestiços
Esta visão de uma África marcadamente na sua produção.
tradicionalista, que alia tradição à manuten-
ção invariável de usos e costumes, sem histo- Os discursos costumam ser elaborados em
ricidade, é acompanhada da visão que apre- perspectiva comparativa, utilizando-se termos
senta o continente africano como um bloco classificatórios que enfatizam características da
homogêneo, sem que sejam considerados e produção de cultura material de africanos e
explicitados sua diversidade sociocultural, protagonistas das diásporas negras, através de
política e étnica. Tal construção simbólica adjetivos como ingênuo, rudimentar, elemen-
repete-se, em afirmações ou silêncios, nas tar, primitivo, selvagem. Supostas superiori-
salas de exposição. A visão homogeneizada dades são evidenciadas a partir da monta-
do continente africano transferiu-se para as gem de cenários que contrapõem hábitos e
imagens e imaginários construídos em torno costumes do mundo dito civilizado e supe-
da presença de africanos no Brasil, sem a rior a outros que apresentam traços consi-
consideração da ampla diversidade de gru- derados como reveladores de inferioridade.
pos étnicos, manifestações culturais e tradi-
ções que aqui aportaram, ocorrendo tam- Através de gravuras, objetos e documentos
bém a construção de imaginário sobre a su- escritos, predominam referências a castigos
perioridade iorubana que, somente nos últi- e controle dos escravos, produzindo imagi-
mos anos, começou a ser questionada, com a nários de desobediência de negros, como re-
emergência de estudos e movimentos volta- ações pessoais aleatórias, no entanto, não se
dos para explicitar a forte presença de gru- fala sobre as estratégias de reações individu-
pos bantofones no Brasil e a decorrente pe- ais e comunitárias, organizadas desde o inte-
netração de elementos culturais destas etnias rior das senzalas, passando pela casa grande
na formação das nossas culturas. e ganhando ruas, citando-se o movimento
quilombola, mas de modo reduzido, em re-
Outro fator presente nas salas de exposi- corte focado no Quilombo dos Palmares,
ção brasileiras é a localização dos negros no sem que sejam explicitadas características
passado, cumprindo papéis relacionados ao destes movimentos. Esta ausência de desta-
período colonial e imperial, basicamente na que a movimentos associativos ocorridos en-
lavoura monocultora, omitindo-se a impor- tre negros escravos e libertos, na sua diversi-
tância de escravos e libertos no âmbito do dade de configurações e objetivos, é quebra-
sistema econômico brasileiro como um da com considerações sobre algumas irman-
todo, em uma sociedade, que se estabeleceu dades, mas ainda assim, sem aprofundamen-
e manteve em relação de dependência total to sobre as dinâmicas e importância destas
com mão de obra negra cativa. Na aborda- organizações.
gem da participação de negros nos diversos
setores da sociedade brasileira, observamos No âmbito dos enfoques referentes às reli-
que existem lugares específicos de represen- giosidades encontramos apresentações que
tação, enfatizando-se o trabalho braçal das não exploram a complexidade e diversidade
MUSEUS, EXPOSIÇÕES E IDENTIDADES 163
dos mitos e ritos africanos, sua transposição Esta complexidade leva, geralmente, a
para o Brasil e o surgimento de novas estru- que documentos das culturas africanas e das
turas, criadas para dar conta de novas situa- diásporas sejam interpretados e apresenta-
ções e necessidades locais. O tratamento é dos, recorrentemente, pelo prisma da
marcado por um recorte que apresenta na etnologia e antropologia. Quase nunca en-
maioria das vezes, divindades iorubanas, contramos reflexões sobre o potencial histó-
destacando-se, por vezes, algum líder religi- rico e artístico destes acervos que, quando
oso, influente em determinado local, sem muito, são apresentados como complemen-
que, no entanto, sejam esclarecidas questões tares - ou de oposição –, a objetos históricos
relacionadas à estrutura e organização religi- e artísticos pertencentes a de sistemas cultu-
osa de caráter afro-brasileiro e o importante rais forjados a partir de idéias, conceitos e
protagonismo de tais líderes comunitários visões de mundo ocidentais, europeizadas.
religiosos. Exposições parecem não estar articuladas
aos avanços que têm sido observados, nos
O sincretismo religioso afro-brasileiro é últimos anos, na produção historiográfica
tratado como operação de subordinação ao sobre o continente africano, sua história, seus
universo judaico cristão, e não como estraté- povos e culturas e ainda sobre o Brasil e as
gia ardilosa de sobrevivência e simulação de várias dimensões da presença de tradições e
imaginários e práticas religiosas. Por outro culturas africanas, registradas através do patri-
lado, os terreiros de candomblé não são mônio artístico / cultural e na história do Bra-
abordados como espaços de resistência que sil. Vários discursos identificados em salas de
possibilitaram, através de suas dinâmicas, a exposição sobre o tema, já encontram-se de-
preservação de sínteses de elementos cultu- fasados em relação ao que vem sendo divul-
rais africanos transplantados para o Brasil. gado e discutido em outros contextos, como
periódicos publicados em vários centros de
Uma questão que chama bastante atenção ensino e pesquisa no Brasil e exterior.
sobre as exposições é o fato de que apesar de
estarem tratando de culturas nas quais ritmos Decerto não podermos esperar que os
e sonoridades são de extrema importância museus atualizem, permanentemente, os
como veículos de comunicação, raras são as conteúdos de suas exposições, mas devem
que utilizam o recurso de sonorização do am- buscar a atualização de seus discursos, lan-
biente, prevalecendo espaços expositivos si- çando mão de uma infinidade de recursos
lenciosos, ainda que com presença de instru- expográficos, que em diálogo com os objetos
mentos musicais em suas bases e vitrines. Esta expostos reforcem os sentidos dos temas tra-
questão serve para indicar que o tratamento tados e colaborem para maior entendimento
expográfico destas culturas, constitui em si do que é apresentado. Registros cinemato-
mesmo um desafio, pois estas se desenvolvem gráficos e sonoros, por exemplo, certamente
em estruturas complexas, que incluem uma in- ampliam a percepção do público em rela-
finidade de elementos que se inter-relacionam ção aos elementos culturais que são aborda-
em contextos de performances e diálogos en- dos e expostos, atenuando a distância e
tre diversas estruturas materiais, imagéticas e hermeticidade da apresentação de objetos
mentais, em jogos de cor, ritmos e interações. deslocados de seus contextos.
Esta situação traz para o museólogo, o desafio
de articular, na exposição, objetos e sentidos Por outro lado é necessário que os museus
que se encontram inteiramente desterritorali- e suas coleções sejam vistos como espaços
zados, deslocados e reinterpretados, quando que podem contribuir com o trabalho do his-
apresentados nas salas de museus. toriador, do antropólogo, do etnólogo, do
164 MARCELO NASCIMENTO BERNARDO DA CUNHA
artista, entre outros, uma vez que os objetos ções e em diversos países, permitindo refletir
depositados em suas reservas técnicas ou sa- sobre a historicidade das mesmas, conside-
las de exposição, são ricos indicadores de rando que as exposições são resultado de
evidências históricas, que podem permitir a múltiplas conjunturas institucionais. Traça-
recuperação de sentidos essenciais para a remos aqui algumas considerações sobre al-
compreensão das trajetórias dos diversos gru- gumas das instituições analisadas na cidade
pos sócio-culturais no contexto brasileiro. de Salvador.
Sua exposição inaugural foi estabelecida dos primeiros blocos afros. O Museu passou
como “Módulo Inicial” a ser expandido – a ser ponto obrigatório em visitas oficiais re-
fato que nunca ocorreu. A exposição atual, alizadas a Salvador (a exemplo de ministros
inaugurada em 1999, resultante de reestrutu- e chefes de Estado), atendendo a estudantes
ração iniciada em 1995, tem a seguinte pla- através de seu Programa Museu-Escola, e
nificação: como local para manifestações culturais,
lançamento de livros, exposições temporári-
1ª sala: África: Apresentação da África (ma- as de artes plásticas e desfiles de moda, de
pas: geofísico, da África pré-colonial, da Áfri- grupos organizados e indivíduos da comuni-
ca colonial e contemporânea e do tráfico de dade baiana.
escravos), mapa de localização da proveni-
ência do acervo; apresentação de elementos Malgrado sua importância, no final da dé-
da cultura material africana nos módulos: cada de 90 apresentava deterioração das
metalurgia, cerâmica, esculturas e máscaras, suas instalações, com necessidade evidente
vestes – tecelagem, objetos proverbiais, ins- de atualização de seus recursos expográfi-
trumentos musicais, lazer. cos, bem como da sua abordagem conceitu-
al. Em 1995 foram iniciadas ações para a sua
2ª Sala – Reinos africanos: Reinos Bantos; reestruturação e novamente, ao se desenvol-
Reino do Benin. ver este projeto, ocorreram protestos, por
parte da Congregação da Faculdade de Me-
3ª Sala - Religiosidade afro-brasileira: in- dicina da UFBA, quanto à sua permanência
formações sobre a vinda dos negros para o no prédio. Sua trajetória revela que o Museu
Brasil; nações religiosas do candomblé, di- sempre esteve prejudicado pela falta de po-
vindades da religiosidade afro-brasileira; fer- lítica para os museus da Universidade Fede-
ramentas litúrgicas e insígnias; fotos/referên- ral da Bahia, ficando evidente que diversas
cias de pais e mães-de-santo; bonecas “mini- contingências marcaram e moldaram as
aturas de orixás”. suas abordagens conceituais e expográficas.
imateriais. Máscaras e esculturas, por exem- Na atual exposição do Museu Afro Brasi-
plo, marcam presença na exposição sem leiro houve tentativa de fugir da abordagem
menções ou configurações dos rituais, dan- do sincretismo, ou ao menos atenuá-lo, ape-
ças e cerimônias aos quais cada uma dessas sar de que para algumas divindades, como
máscaras se destinava ou se destina. Oxalá e Iansã6, isto seja muito difícil. Fugir
da abordagem recorrente do sincretismo en-
Analisando esta exposição percebemos tre catolicismo e candomblé, não está ligado
ausência de abordagens e referências aos a uma vontade de negá-lo e desconhecê-lo
movimentos de afirmação de identidades enquanto prática secular do encontro de
ocorridos ao longo dos séculos, dos movi- culturas, crenças e valores europeus e africa-
mentos quilombolas às políticas públicas nos, mas ao desejo em refletir sobre movi-
atuais e suas conseqüências. No projeto da mentos atuais nas comunidades afro-brasi-
atual exposição constava sala com referênci- leiras pela afirmação de suas culturas, sem a
as às lutas dos africanos na Bahia, com desta- necessidade de utilização de elementos es-
que para momentos chave na articulação tranhos para a sua legitimação ou para a
social, como formação de irmandades, gru- construção de discursos necessários no pas-
pos civis e resistências organizadas. No en- sado e inteiramente prescindíveis na atuali-
tanto, apesar de todo estudo ter sido realiza- dade.
do para a sua execução, a sala destinada
para tal módulo foi perdida nas negociações O projeto tentou tratar de aspectos das re-
com os representantes da Faculdade de Me- ligiões afro-brasileiras sem, necessariamente,
dicina, por ocasião dos últimos acertos para falar de catolicismo, ficando evidente, no
a permanência do Museu no prédio, na dé- entanto, que, para além de desejos conceitu-
cada de 90. Perda imensa para a exposição, ais e mesmo da vontade e orientação de cor-
comprometendo o conteúdo de sua narrati- rentes políticas da organização civil e religi-
va histórica. osa afro, as dinâmicas culturais são comple-
xas e o processo de sincretismo mantém-se
Em contrapartida, há questões que se dis- com novas perspectivas e utilizações, fazen-
põem de forma interessante na exposição, do sentido, ainda, para um grande número
como a busca pela fuga aos estereótipos, que de pessoas do culto religioso de matriz afro,
são comuns e recorrentes em exposições bem como ao chamado catolicismo popular,
deste tipo, como, por exemplo, a ênfase nor- indicando um caminho de mão dupla, nas
malmente atribuída às indumentárias utiliza- relações e permanências culturais locais,
das pelos iniciados durante as cerimônias de onde estão envolvidos católicos e “povo de
candomblé, enfatizando-se cromatismos santo”.
previamente estabelecidos para as represen-
tações das divindades. Na exposição atual, Podemos argumentar que alguns dos pro-
buscou-se trabalhar com questões mais blemas sofridos pelo Museu Afro Brasileiro
abrangentes e singularizadoras para o trata- da Universidade Federal da Bahia, em sua
mento das divindades. Por exemplo, nesta trajetória, estão relacionados a pensamentos
exposição, a ferramenta do Orixá fica utiliza- e posturas racistas, que fazem parte de com-
da como elemento de identificação de ar- portamentos recorrentes na cidade do Salva-
quétipos. Através dela busca-se construir um dor e estão presentes, também, no âmbito da
discurso que passa pela construção de ima- UFBA. No entanto, nos últimos anos, tem sido
gens sobre as divindades, o que representam desenvolvidas pesquisas que buscam ampliar
para os membros da comunidade, que senti- e fortalecer os discursos e as ações deste
do atribuem a suas existências e ações. museu, como, por exemplo, as investigações
MUSEUS, EXPOSIÇÕES E IDENTIDADES 167
do-se o Museu do Ilê Axé Opô Afonjá, o Museu a história, formação e manifestações cultu-
comunitário da Mãe Mirinha de Portão e o rais de Salvador, sendo visível que o discurso
Memorial de Mãe Caetana. expográfico gira em torno de referências a
elementos afro-brasileiros, suas práticas cul-
turais, religiosas, costumes e cultura materi-
MUSEU DA CIDADE al. Sem articular tais evidências à importân-
cia de povos africanos na estruturação, orga-
Instalado no Largo do Pelourinho está li- nização e funcionamento de Salvador, esta
gado à Fundação Gregório de Matos da Se- cidade acaba sendo representada sem histó-
cretaria de Cultura do Município de Salva- ria, sem protagonistas contextualizados em
dor. Inaugurado em 05 de julho de 1973, sua suas relações de poder, cargos, funções, ativi-
exposição percorre três andares de dois so- dades econômicas, sociais, culturais.
brados conjugados. Com predominância de
imagens relacionadas a elementos das cultu- A recorrência a imagens ligadas ao uni-
ras afro-brasileiras, seu acervo é composto verso afro-brasileiro, mesmo que não seja in-
de fotografias, quadros, manequins vestidos dicado como intenção conceitual no museu,
com roupas de orixás, bonecos miniatura em traduz a grande força e presença das culturas
cenas do cotidiano da cidade do Salvador, e tradições africanas em Salvador. Já na en-
ex-votos, esculturas e móveis. A exposição trada, único momento de rápida referência
não segue abordagem cronológica ou preo- ao desenvolvimento da cidade, através de
cupação em apresentar aos visitantes acon- mapas antigos sobre a fundação e evolução
tecimentos marcantes da cidade, seu desen- do seu traçado urbanístico, temos as figuras
volvimento e trajetória histórica. de um homem ao tronco, sendo chicoteado
e manequins vestidos com indumentárias da
No andar térreo encontramos sala que Irmandade da Boa Morte10. Mesmo sem pro-
apresenta uma roda de orixás, o xirê, festa posta de abordar a cidade do Salvador a par-
pública de terreiro, com texto que fala sobre tir da contribuição das populações africanas
o candomblé e suas divindades e sala de ex- e afro-brasileiras, em seus mais de quatro-
posições temporárias para a apresentação de centos e cinqüenta anos, praticamente todo
temas correlatos à história da cidade e a ele- o conteúdo exposto remete à presença des-
mentos das culturas afro-brasileiras, na qual tes povos nesta cidade e a suas contribuições
é exposta permanentemente uma escultura para o desenvolvimento de sua vida urbana.
de negro acorrentado.
Chama nossa atenção o fato de que várias
No primeiro andar, encontramos salas que imagens referem-se à condição dos africa-
apresentam miniaturas com cenas do cotidi- nos enquanto escravos, em posturas de sub-
ano da cidade do Salvador nos séculos XIX e missão e sofrendo castigos, em fuga e/ou su-
XX, com predominância da presença de ne- jeição, refletindo recorrências observadas na
gros em atividades cotidianas: feiras, negros disposição de africanos em exposições: a ên-
fugidos, amas de leite, engenho, entre outras. fase na condição escravizada dos negros na
sociedade brasileira, complementada pela
No segundo e último andar encontramos referência seguida a castigos e torturas à que
obras de arte com temática afro, além de foram submetidos. Faltam nas exposições,
uma sala dedicada a ex-votos. imagens e textos que problematizem estes
enfoques, trazendo informações sobre rea-
Percebemos que apesar deste ser o Museu ções, rebeliões e movimentos de resistência,
da Cidade, não contempla dimensões sobre quer isolados ou grupais, como, por exem-
170 MARCELO NASCIMENTO BERNARDO DA CUNHA
plo, as diversas estratégias que buscaram mi- A Casa surgiu como local que além de ex-
nar ou atenuar, quando possível, o poder se- por deslocamentos das culturas do Benin
nhorial em relação aos corpos e mentes de deveria funcionar como centro cultural vol-
homens e mulheres negros. tado para a realização de cursos, palestras,
encontros e outras atividades de estreita-
Ainda sobre a construção de discursos re- mento de relações entre Bahia e Benin, ten-
lacionados à pretendida passividade dos afri- do sido as cidades de Salvador e Cotonou
canos escravizados e negros libertos, percebe- declaradas irmãs por ocasião da sua inaugu-
mos ausência de relatos ou imagens ração.
historicizando as experiências de trabalho,
luta, vida e morte, em uma cidade marcada Os objetos africanos expostos evidenciam
pela presença de homens e mulheres negros. semelhanças com os utilizados em vários se-
tores da vida cotidiana e religiosa na Bahia.
Existem também fotografias que mostram
CASA DO BENIN – SALVADOR-BA traços da presença brasileira no Benin, local
para onde retornaram vários afro-descen-
Instalada em conjunto composto por dois dentes do Brasil12, sendo notada a presença
sobrados, na parte inferior do largo do de traços culturais brasileiros introduzidos
Pelourinho, ao lado da Igreja de Nossa Se- pelos retornados no Benin, com ênfase na
nhora do Rosário dos Pretos, foi inaugurada arquitetura, graças a mestres de obras brasi-
em maio de 1988, ligada à Fundação leiros cujos ancestrais africanos edificaram
Gregório de Mattos, da Prefeitura Municipal Salvador da Bahia. A tese central da exposi-
de Salvador. Restaurado pela arquiteta Lina ção trata dessa ampla relação entre dois con-
Bo Bardi. Além das salas de exposição, o tinentes e a difusão de suas culturas13.
conjunto incluía a residência do diretor e
restaurante, hoje desativados. O espaço A Casa do Benin concretiza e simboliza
expositivo é distribuído em três pavimentos: ponto de relevância a ser considerado em
investigações sobre a historicidade do patri-
Andar Térreo: Exposição de Longa Duração. mônio cultural africano no Brasil: encontros,
tensões e negociações culturais, que provo-
1o. andar: Exposições Temporárias caram injunções pensadas em termos de sín-
teses, sincretismos e mestiçagens. Hoje pen-
2o. andar: atualmente dedicado a uma ex- sadas e trabalhadas em termos de culturas
posição de turbantes, que não são exclusiva- híbridas, constituídas entre fronteiras cultu-
mente africanos ou afro-brasileiros, mas a rais, “entre-lugares” de confrontos e incorpo-
maioria estilizada, com apelo artístico e fol- rações, implicando manutenção e negação,
clórico. conflitos e negociações.
A exposição traz a chancela de Pierre Ainda que a exposição da Casa do Benin re-
Verger, sendo plausível encará-la como uma caia em abordagens que enfatizam expressões
defesa visual de sua obra11, centrada nas reci- relacionadas à tradicionais culturas africanas
procidades ocorridas entre culturas brasilei- em termos de patrimônio cultural e material,
ras e africanas. Verger organizou a exposição ao apresentar manifestações culturais recípro-
a partir de objetos coletados na região do cas, vem abrindo expressivos diálogos entre
Golfo do Benin, tendo como conceito e pro- culturas tradicionais africanas e afro-brasilei-
posta evidenciar circuitos Bahia, Benin e ras, promovendo exposições temporárias de
Nigéria. artistas brasileiros e africanos contemporâneos.
MUSEUS, EXPOSIÇÕES E IDENTIDADES 171
5
CONCLUINDO 1974 – Projeto Original – Pierre Verger; 1982 –
Projeto “Modulo Inicial” – Jacyra Oswald; 1999 –
Marcelo Cunha e equipe de consultores.
Após este breve passeio virtual por salas de
6
Na Bahia é quase impossível não associar o
exposições soteropolitanas, que abordam pre-
Senhor do Bonfim/Jesus Cristo e Santa Bárba-
senças africanas na cidade e suas matrizes afri- ra a Oxalá e Iansã, respectivamente, por conta
canas, podemos perceber a complexidade e da forte tradição das festas da Lavagem da
Igreja do Bonfim (segunda quinta feira após a
desafios que tocam a interpretação, represen- festa da Epifânia, em janeiro) e Festa de Santa
tação e difusão de conteúdos que dêem conta Bárbara (4 de dezembro) das quais participam
tanto católicos quanto praticantes do can-
da complexidade histórica do continente afri-
domblé. Do processo de sincretismo ocorrido
cano e da trajetória dos negros no Brasil. na Bahia podemos destacar muito presente,
ainda, a relação entre Omolu e São Lázaro/
São Bartolomeu e Ibejis e São Cosme e São
Percebemos que somente o exercício de Damião.
produção de posturas e olhares críticos le-
7
Espaço onde são realizadas as cerimônias públi-
varão a transformações nas práticas profissi-
cas da comunidade religiosa – o Terreiro.
onais museológicas e dos produtos delas re-
8
sultantes, que implicam a reelaboração de O projeto e instalação foram desenvolvidos pelo
Departamento de Museus da Fundação Cultural
discursos, visando eliminar posturas do Estado da Bahia, com participação de
hegemônicas e monopolizadoras produzi- museólogos, historiadores e antropólogos, além
de pessoas da casa como depoentes.
das pelas elites e classes dominantes, em
torno da presença negra no Brasil e no 9
Nos últimos anos surgiram vários memoriais em
mundo. Só assim a museologia e os museus terreiros de candomblé, em Salvador e área me-
tropolitana, destacando-se o Museu do Ilê Axé
poderão provocar mudanças político-cul- Opô Afonjá, o Museu comunitário da Mãe
turais que visem o tão almejado, utópico e Mirinha de Portão e o Memorial de Mãe
Caetana.
pouco concretizado, exercício da cidada-
nia, com igualdade de direitos e respeito à 10
A Irmandade de Nossa Senhora da Boa Morte,
diversidade. da cidade de Cachoeira, no Recôncavo Baiano,
tem origem atribuída no início do século XIX, na
Igreja da Barroquinha, em Salvador, constituída
por mulheres negras escravas e libertas. Atual-
mente, formada por mulheres afro-descenden-
NOTAS tes, mantêm a tradição secular.
1
Ver HOBSBAWN, Eric. RANGER, Terence. A In- 11
VERGER, Pierre. Fluxo e Refluxo do Tráfico de
venção da Tradição. São Paulo: Paz e Terra, Escravos entre o Golfo do Benin e a Baía de
2002. Todos os Santos dos Séculos XVII ao XIX. Rio de
2
Janeiro/Salvador: Biblioteca Nacional/Corrupio,
CANCLINI, Nestor Garcia. Culturas Híbridas. 2002.
São Paulo: EDUSP, 2000. p.162
12
3
No século XIX descendentes de escravos africanos
Ver DE CERTEAU, Michel. A Beleza do Morto. In: no Brasil retornam para a África, surgindo no Benin
A Cultura no Plural: Papirus, 2001. (col. Traves- a comunidade de negros retornados, que passaram
sia do Século) a ser conhecidos como os Agoudas.Estabelecidos
4
no Benin, concentrados principalmente em Porto
Pesquisa realizada no âmbito do Doutorado Novo, passaram a ocupar lugar de destaque na soci-
em História Social da Pontifícia Universidade edade local. Ainda hoje existe esta comunidade de
Católica de São Paulo, sob a orientação da “brasileiros” no Benin.
profª Drª Maria Antonieta Antonacci. Ver CU-
NHA, Marcelo Nascimento Bernardo da Cu- 13
Sobre a questão dos retornados ver : CUNHA,
nha. Teatro de memórias, palco de esqueci- Manuela Carneiro da. Negros, Estrangeiros. Os
mentos: culturas africanas e das diásporas ne- escravos libertos e sua volta à África. São Paulo:
gras em exposições. São Paulo: PUC, 2006. Brasiliense, 1985. GURAN, Milton. Agudas – de
acesso em http://www.sapientia.pucsp.br/ africanos no Brasil a “Brasileiros” na África. His-
t d e _ b u s c a / tória, Ciência e Saúde – Manguinhos, jul./out.
processaPesquisa.php?listaDetalhes%5B%5D=2271 2000, vol.7, n.2. p.415 – 424.
ARTIGO
4
O museu dos povos indígenas
do Oiapoque - Kuahí
Gestão do Patrimônio Cultural pelos Povos Indígenas do Oiapoque, Amapá
A
INTRODUÇÃO
D
Diferentemente do que acontece com a arte ocidental, as artes indígenas
possuem sua fonte de inspiração em uma tradição milenar e representam, na
maioria das vezes, a filosofia de um povo, os seus valores, gostos, práticas soci-
ais e religiosas. Possuem, ainda, uma relação forte com o meio ambiente, com
a terra em que vivem, que conhecem, dominam e, na medida do possível,
preservam.
A proposta concreta para a construção do Embora o Museu Kuahí tenha sido inaugu-
Museu foi apresentada pelas lideranças indí- rado em 2007, sua presença já vem se fazen-
genas ao governo do Amapá em 1998 e in- do sentir há alguns anos, quando foram mi-
cluída formalmente no Programa de Desen- nistrados os primeiros cursos de capacitação
volvimento Sustentável do então governa- museológica para uma turma de quinze indí-
dor João Alberto Capiberibe. genas escolhidos pelas próprias comunida-
des de acordo com a formação escolar e in-
Em 2000 foi iniciada a construção do Mu- teresse de cada participante. Estes cursos fo-
seu e os índios, assessorados por mim e por ram ministrados em Oiapoque, no Museu
Lucia H. van Velthem, do Museu Paraense Paraense Emilio Goeldi e no Museu de Arte
Emilio Goeldi, entregaram ao governo um de Belém. Nesta cidade foram também visita-
conjunto de documentos: justificativa e ob- dos o Museu de Estado, o Museu de Arte Sa-
jetivos do Museu, Estatuto, lista de equipa- cra, galerias de arte e localidades da própria
mentos etc. Tratava-se de uma proposta ino- cidade de interesse histórico e turístico.
vadora, por não fazer deste um museu sobre
os índios, mas dos índios. Paralelamente, os resultados de variadas
pesquisas antropológicas (vide bibliografia) e
Segundo planejado o Museu seria manti- especialmente dois projetos culturais desen-
do pelo estado do Amapá e gerido pelos pró- volvidos nas aldeias foram de significativa im-
prios índios, diretamente envolvidos em to- portância para estimular a retomada cultural
das as atividades e com representação majo- que estas etnias têm presenciado. Trata-se dos
ritária no Conselho Curador. Cursos e ofici- projetos: 1) de Resgate e Fortalecimento Cultu-
nas de capacitação seriam oferecidos para a ral, desenvolvido pela Associação dos Povos
formação dos técnicos em museologia, pes- Indígenas do Oiapoque – APIO, em parceria
soas escolhidas pelas próprias comunidades com o Programa Demonstrativo para Popula-
indígenas. Esperava-se por parte do governo ções Indígenas do Ministério do Meio Ambien-
um apoio efetivo aos povos indígenas e suas te – PDPI / MMA; e 2) de Formação de Gestores
manifestações culturais, de cunho não- do Patrimônio Cultural, desenvolvido junto
paternalista, assumindo que a construção da aos professores indígenas que atuam nas aldei-
cidadania para os índios se fundamenta nos as da BR – 156, realizado pelo Iepé – Instituto
seus próprios valores, dinâmica e processo de Pesquisa e Formação em Educação Indíge-
histórico. na, em parceria com a Petrobrás Cultural.
O MUSEU DOS POVOS INDÍGENAS DO OIAPOQUE - KUAHÍ 177
índios. Quando as coleções recolhidas nas conseqüência deste processo, o Kuahí hoje é
aldeias dos diferentes rios chegaram ao Mu- considerado como mais uma instituição in-
seu Kuahí e foram armazenadas em duas sa- dígena na região, tal como as outras associa-
las, a espera de seu destino, o conjunto cau- ções indígenas ou a FUNAI (também coman-
sou impacto. Alguns índios disseram que dada pelos índios), isto é, um sujeito político
nunca haviam visto certos artefatos, não os no contexto institucional indígena da região,
conheciam. Outros não se cansavam de per- com poder de representação. Por outro lado,
guntar e tirar fotos. De fato, não sabiam que muitos eventos da cidade de Oiapoque acon-
tudo isso ainda existia e poderia ter algum tecem no Museu, pelo espaço de qualidade
valor em outros contextos. Os artefatos reco- que ele oferece, o que também prestigia os
lhidos sob forma de coleção representaram índios no meio urbano e municipal.
algo novo para eles. Especialmente a cole-
ção para a exposição do Rio, acompanhada Uma última questão a ser considerada diz
de documentação, fotografias, vídeos, site, respeito à documentação. Há uma discussão
design museográfico apurado e participação com os índios sobre os documentos que de-
dos índios foi um evento muito importante vem compor os arquivos confidenciais, ape-
para dar visibilidade aos Povos Indígenas do nas acessíveis aos indígenas sob a orientação
Baixo Oiapoque, realçando sua identidade do Conselho de Apoio Indígena ao Museu
diferenciada. O Museu Kuahí e especialmen- Kuahí, e o que é acessível ao público. Isto é, o
te as atividades e conhecimentos a ele liga- Museu levanta uma série de discussões muito
das ganharam sentido em um contexto cul- atuais, sobre propriedade intelectual e manei-
tural mais amplo. ras de documentar e divulgar a cultura indí-
gena, não de maneira abstrata, mas bem con-
Há ainda uma outra pequena coleção, re- creta.
sultado do projeto de Resgate Cultural APIO
/ PDPI – MMA. Enquanto os velhos repassa-
vam seus conhecimentos aos mais jovens, os REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
artefatos produzidos eram levados à sede da
APIO e guardados em uma sala. São peças CASTRO, Esther de. “O Museu dos Povos In-
valiosas, muitas delas experimentais e teste- dígenas do Oiapoque: um lugar de produ-
munhas de todo um esforço de transmissão ção, conservação e divulgação da cultura”.
de saberes entre gerações. Fazem parte do In: Aracy Lopes da Silva e Mariana Ferreira
acervo peças bem antigas que não eram (orgs). Práticas Pedagógicas na Escola Indí-
mais fabricadas, mas também inovações, tan- gena. São Paulo: Global Editora, 2001.
to na forma como na decoração. Esta cole-
ção foi, em 2007, incluída no acervo do Mu- GALLOIS, Dominique T. (org). Patrimônio
seu Kuahí, mas como coleção específica e Cultural Imaterial e Povos Indígenas. São
separada, testemunha deste trabalho de res- Paulo: Iepé, 2006.
gate.
NIMUENDAJÚ, Curt. Os índios Palikur e seus
Um outro aspecto interessante com rela- vizinhos. Manuscrito traduzido por Tekla
ção ao Museu é que a demora em Hartmann do original “Die Palikur Indianer
implementá-lo fez com que os índios se und ihre Nachbarn”. NHII/USP, mimeo, 1926.
apropriassem dele, inclusive pedindo insis-
tentemente ao governo que o inaugurasse. O PAES, Francisco S. Curipi. Vídeo de 27 min.
Museu lhes aparece, assim, como mais uma São Paulo: Laboratório de Imagem e Som
conquista do movimento indígena. Como em Antropologia – LISA / FFLCH – USP, 2001.
O MUSEU DOS POVOS INDÍGENAS DO OIAPOQUE - KUAHÍ 181
VIDAL, Lux B. “O modelo e a marca, ou o VIDAL, Lux B. Povos Indígenas do Baixo Oia-
estilo dos ‘misturados’: cosmologia, história e poque – o encontro das águas, o encruzo dos
estética entre os Povos Indígenas do Uaçá”. saberes e a arte de viver. São Paulo/Rio de
Revista de Antropologia, 42 (1/2), 1999. Janeiro: Iepé/Museu do Índio, 2007b.
A
A gente lutou pra conseguir água, luz, esgoto, asfalto.
Hoje a gente tem uma comunidade bonita, com vários
postos de saúde e escolas... Só faltava mesmo o Museu
da Maré!
(Sr. Clóvis, liderança comunitária da Maré)
E
Esta foi uma das muitas intervenções feitas por lideranças comunitárias,
moradores e representantes das instituições públicas e ongs da Maré, durante
uma reunião que tinha como objetivo organizar a cerimônia de inauguração
do Museu, que ocorreu no dia 08 de maio de 2006. O evento foi realizado na
Casa de Cultura da Maré, juntamente com o lançamento nacional da 4a Sema-
na de Museus. A cerimônia contou com as presenças do ministro Gilberto Gil,
membros do Ministério da Cultura e do Instituto do Patrimônio Histórico e
Artístico Nacional, além dos representantes de vários museus e Pontos de Cul-
tura da cidade.
184 CLÁUDIA ROSE RIBEIRO DA SILVA
Esse trabalho de preservação do patrimô- de. E foi isto exatamente que uma mu-
nio imaterial da Maré valoriza a história lo- lher inteligente fez, ignorando os protes-
cal, sistematizada em um texto ilustrado de tos de seu marido e começando a juntar
83 páginas, o Histórico da Maré. O texto foi pedaços de madeira, com o intuito de le-
escrito por Antônio Carlos Pinto Vieira, um vantar um barraco naquele ponto deser-
dos fundadores do CEASM e coordenador to que parecia não ter interesse a nin-
da Rede Memória. Seu trabalho apresenta a guém. Este primeiro casal vinha do cen-
história da região e sua relação com a dinâ- tro do Rio, onde vivia numa casa de cô-
mica da formação da cidade. Ordenando modos, atrás da Estação da Central do
numa seqüência cronológica os processos Brasil. A mulher tinha acabado de che-
históricos ocorridos na região e na cidade, gar do interior de Minas Gerais e não
desde o período colonial até o final da déca- conseguia viver sufocada no pequeno cô-
da de 1990, Vieira escreve a primeira versão modo, ‘com chuva caindo em goteiras’.
da história da Maré e, principalmente, cria Ela escolheu um ponto seco, convenien-
uma identidade comum entre as diversas lo- te, numa pequena elevação próxima ao
calidades que se formaram ao longo da Ave- mar e levantou seu pequeno barraco
nida Brasil, a partir da década de 1940. com os materiais que a maré trazia de
graça. Mais tarde ela se dedicou a plan-
Vieira afirma que a localidade mais antiga tar árvores frutíferas e uma horta e a
da região é o Morro do Timbau e, numa nar- cercar seu ‘território’. Ela conseguiu fa-
rativa mítica, apresenta a história de dona zer tudo sem que qualquer pessoa a per-
Orozina, conferindo àquela que teria sido a turbasse. Mesmo assim, o casal estava
primeira moradora do Morro do Timbau, o bastante assustado, percebendo que eles
status de fundadora da Maré: estavam ocupando algo, sem autoriza-
ção, que não lhes pertencia” (1998, p. 43-
A ocupação da comunidade propriamen- 44, grifo do autor).
te dita se dá a partir da chegada da pri-
meira moradora, d. Orozina, que num De acordo com Portelli (2002), um mito
passeio de final de semana se apaixona não é obrigatoriamente uma história inven-
pelo lugar, e recolhendo a madeira que a tada. Na verdade, o mito é “uma história que
maré trazia, demarca uma área e cons- se torna significativa na medida em que am-
trói o primeiro barraco e assim nos é con- plia o significado de um acontecimento in-
tada por Carlos Nélson: “[...] Havia ali dividual (factual ou não), transformando-o
uma praia, então limpa e agradável. Se na formulação simbólica e narrativa das
chamava Praia de Inhaúma, embora o auto-representações partilhadas por uma
bairro do mesmo nome ficasse distante, cultura (p. 121). É justamente essa narrativa
no interior do tecido urbano. Foi ali, ali- mítica sobre a origem da Maré que os agen-
ás, como resultado de um passeio de do- tes sociais do CEASM formularam a partir da
mingo à Praia de Inhaúma que os primei- história de dona Orozina, apresentada no
ros ocupantes se apaixonaram pelas ca- histórico escrito por Vieira.
racterísticas da localidade. Nada existia
ali, exceto o matagal que, na linguagem O Histórico da Maré compõe o acervo do
do dia a dia significava que a região esta- arquivo documental criado pela Rede Me-
va coberta de espessa vegetação. A mória com o objetivo de abrigar variadas
praia estava coberta de pedaços de ma- fontes sobre a história local: fotografias, ma-
deira trazidos pela maré, e que pareciam pas, uma hemeroteca, documentos oficiais
sugerir seu uso para alguma boa finalida- sobre a Maré, documentos particulares doa-
MEMÓRIA E MOVIMENTOS SOCIAIS 189
dos por moradores, monografias, teses etc. produzido e ampliado para compor várias
Não por um acaso, o arquivo foi batizado exposições sobre a história da Maré.
com o nome de dona Orozina.
As exposições são apresentadas em espa-
Desde sua inauguração, em 27 de abril de ços públicos locais, como escolas e praças.
2002, várias pessoas já passaram pelo arqui- Nos últimos anos, a Rede Memória vem reali-
vo. Algumas, para conhecer; outras, para ver zando também exposições em outros lugares
fotos antigas e “matar” a saudade do passado; fora da Maré, como por exemplo, no Institu-
e muitas, para pesquisar. Grande parte das to de Arquitetos do Brasil (IAB-RJ), Flamen-
pesquisas são realizadas por professores e go; no Instituto de Filosofia e Ciências Huma-
alunos das escolas públicas locais e por par- nas da UFRJ, Largo São Francisco; no Institu-
ticipantes dos outros projetos do CEASM. to de Educação da UFF, no Museu de Arte
Nos registros do arquivo consta um número Contemporânea, e no Centro Cultural do Tri-
considerável de consultas feitas por pesqui- bunal de Contas do Estado, em Niterói; e no
sadores ligados a diversas instituições da ci- Museu da República, Catete.
dade, tais como UNIRIO, CPDOC, UFRJ,
FIOCRUZ e outras. A Rede Memória também possui um gru-
po de contadores de histórias, cujo nome é
A equipe do arquivo é formada por jovens Maré de Histórias. Esse grupo desenvolve um
universitários, moradores da Maré, muitos trabalho a partir das narrativas dos morado-
dos quais fizeram o Curso Pré-Vestibular ofe- res, explorando o aspecto lúdico da história
recido pelo CEASM. Atualmente, eles estão da Maré - as lendas e os causos narrados pelos
em universidades públicas, cursando facul- mais velhos. Histórias como O Ensopado de
dades de História, Geografia, Bibliotecono- Cobra, O Porco com Cara de Gente, O Casa-
mia, Arquivologia e Serviço Social. Esses mento na Palafita e A Figueira Mal Assombra-
jovens realizam um trabalho de pesquisa da fazem parte do repertório do grupo.
junto aos moradores locais para reproduzir
os acervos pessoais sobre a história da Maré. Outro projeto desenvolvido pela Rede
Além disso, a equipe também desenvolve Memória é a pesquisa de história oral. Este
pesquisa em arquivos públicos e particulares projeto tem o objetivo de preservar a histó-
do Rio de Janeiro. ria da Maré, através do registro dos depoi-
mentos orais dos moradores mais antigos.
Em conseqüência do trabalho desenvolvi-
do, o arquivo abriga material variado sobre a A Rede Memória é um dos instrumentos
história local, composto por fotografias, pu- criados pelo CEASM para promover a divul-
blicações, fitas de vídeo e áudio, jornais e gação do bairro, suas questões atuais e sua
mapas. O acervo está disponível à consulta história. Dessa forma, o CEASM se apropria
de moradores, professores e alunos das esco- de uma criação político-administrativa do
las públicas do bairro e de pesquisadores das poder público e, numa outra perspectiva, in-
diversas instituições da cidade. venta o bairro da Maré, dando-lhe uma ori-
gem histórica comum e valorizando o lugar
Grande parte do acervo do Arquivo e os atores sociais que o construíram.
Orozina Vieira é constituído por fotografias,
que retratam variados aspectos da realidade A insistência do CEASM em utilizar a idéia
local, e fotos do início do século XX, de auto- de bairro para se referir e atuar na Maré, ape-
ria do conhecido fotógrafo Augusto Malta. sar da falta de identidade por parte da maio-
Esse acervo iconográfico foi, em parte, re- ria dos moradores em relação a essa idéia, é
190 CLÁUDIA ROSE RIBEIRO DA SILVA
vo das elites econômicas – e também em cultura “superior”. Pelo contrário, eles ne-
relação às favelas – comumente tratadas gam a idéia de sua absolutização, pois são
como lugares de violência, de barbárie, objetos muito simples do cotidiano dos mo-
de miséria e de desumanidade. A polêmi- radores da Maré. No entanto, ao terem sido
ca provocada pelo Museu da Maré subli- musealizados, tais objetos revelam plena-
nhou um fato que, mesmo sendo óbvio, mente a sua dimensão humana, que nos toca
frequentemente não é levado em conta, e emociona. No Museu, esses objetos são
qual seja: o da favela como lugar de cultu- verdadeiros lugares de memória.
ra, de memória, de poética, de trabalho, e
não apenas como território privilegiado Pierre Nora afirma que lugares de memó-
da bala perdida ou teatro de guerra onde ria são aqueles revestidos de simbolismo:
policiais enfrentam bandidos e bandidos “mesmo um lugar puramente funcional,
enfrentam policiais (2007, p. 133). como um manual de aula, testamento, uma
associação de antigos combatentes, só entra
No centro do Museu, emergindo do Tempo na categoria se for objeto de um ritual” (p.
da Água, surge um barraco em tamanho natu- 21). As inúmeras memórias existentes na
ral. É possível passar por entre as palafitas que o Maré, relacionadas a lugares, fatos, pessoas e
sustentam, olhar para cima e ver seu assoalho. objetos, foram revestidas de simbolismo pe-
Mas a experiência mais impactante ainda está los agentes sociais que criaram o Museu, ten-
por vir: entrar na casa e conhecer seu interior; do como eixo central o barraco sobre palafi-
imaginar como as pessoas podiam morar em tas, signo da miséria nacional durante déca-
um espaço tão pequeno que, ao mesmo tempo das, e que hoje se transforma em espaço ritu-
era sala, cozinha e quarto, razão de ser da exis- al de troca e encontro das diferentes memó-
tência de milhares de migrantes que foram che- rias de pessoas de todos os lugares.
gando ao longo de várias décadas.
Para Antônio Carlos Vieira, a casa é um
Por fora, as madeiras daquela construção espaço de encontros e trocas, aflorando nos
simples têm vários tons de azul; por dentro, visitantes diversos sentimentos que são com-
tudo é cor-de-rosa para receber e acolher os partilhados e criam uma “comunidade de
visitantes. Quem entra, se depara com um es- afetos”, que se contrapõe ao movimento de
paço muito bem arrumado, repleto de objetos fragmentação e individualismo do mundo
que não dialogam apenas com quem morou pós-moderno:
em um barraco ou mora em favela. Os objetos
têm vida, por isso eles interagem com o visitan- Se vivemos em um mundo dito pós-mo-
te, emocionam e aproximam memórias e pa- derno, cujas principais marcas são a perda
trimônios de diferentes tempos e lugares. de eixos referenciais, o descarte do espa-
ço concreto como espaço de encontro, a
São objetos simples, que poderiam ter sido comunicação virtual, o individualismo e a
esquecidos: imagens de santos, rede, lamparina, fragmentação de identidades, temos nes-
retratos de família, roupas, móveis; um sa casa um manifesto não escrito, que vai
paneleiro com panelas muito bem areadas; um em rota de colisão a este movimento. É
fogão da marca “Cosmopolita” e, sobre ele, um uma casa de lembranças, que reúne os
pente feito de ferro com cabo de madeira, cha- fragmentos, que valoriza o espaço local,
mado de “pente quente” ou pente de ferro. suas vivências e experiências coletivas,
que propõe uma memória projetada de
Os objetos do Tempo da Casa não são ca- acordo com as experiências de vida, tão
ros, não são raros nem são expoentes de uma diferentes, mas que estão ligadas por cer-
MEMÓRIA E MOVIMENTOS SOCIAIS 193
to fio condutor que perpassa essa memó- Sem dúvida, o Museu é um importante
ria. É um movimento de conexão, que instrumento usado pelos agentes sociais do
extrai das diferentes experiências senti- CEASM, que trabalham para deslocar o en-
mentos comuns e permite o encontro sur- quadramento da memória dos moradores da
preendente do que Halbwachs chama de Maré e da cidade do Rio de Janeiro, conce-
“comunidade de afetos” (2007, p. 154). bendo as diferenças e identidades enquanto
produções sociais que envolvem diversas re-
lações de poder.
CONCLUINDO
Por meio de várias ações, os idealizadores
Os agentes sociais que constroem o do CEASM teimam em valorizar aquilo que é
CEASM deram novo significado ao papel desprezado no geral pelos enquadradores
dos museus, que passam a ser também um das memórias oficiais: as lutas, o protagonis-
recurso para a reflexão sobre a identidade e mo, o patrimônio cultural dos moradores da
a importância do patrimônio cultural dos Maré, e a importância da história desse lugar
moradores das favelas, subúrbios, periferias e para a história de toda a cidade.
bairros populares.
Dessa forma, o Museu imaginado por esses
O conceito de identidade trabalhado no agentes como possibilidade de superação de
Museu é um conceito estratégico e político. uma identidade tida como normal - que gera o
Não se trata de discutir somente quem são os estigma contra a favela -, vai sendo por eles
moradores da Maré, mas, principalmente, inventado, à medida que novos discursos são
como esses moradores são representados na criados a partir da apropriação idéia de bairro
cidade e como essa representação tem influ- e do diálogo entre a realidade local e global.
enciado sua auto-imagem.
_____. Diversidade museal e movimentos SILVA, Tomaz Tadeu da. “A produção social
sociais (arquivo eletrônico cedido pelo au- da identidade e da diferença”. In Identidade
tor). Rio de Janeiro, 2007. e diferença, a perspectiva dos Estudos Cultu-
rais. Petrópolis, Ed. Vozes, 2000. p. 73-102.
GOHN, Maria da Glória. “Movimentos soci-
ais na atualidade”. In GOHN, Maria da Glória VALLADARES, Lícia do Prado. “A Gênese da
(org). Movimentos sociais no início do sécu- Favela Carioca. A produção anterior às ciênci-
lo XXI: antigos e novos atores sociais . as sociais”. In Revista Brasileira de Ciências So-
Petrópolis, Vozes, 2007. p. 13-32. ciais. São Paulo, V. 15, nº 44, out., 2000. p. 5-34.
A
MARIA LUIZA TUCCI CARNEIRO
GABRIELA AIDAR
APRESENTAÇÃO
E
Este texto apresenta o projeto do Memorial da Resistência, que foi desenvol-
vido visando à remodelação do antigo Memorial da Liberdade, através da inici-
ativa da Secretaria de Estado da Cultura de São Paulo, cuja implantação teve
início em 1o. de maio de 2008.
A sua elaboração, a partir de estimulante exercício interdisciplinar, aproxi-
mou o conhecimento já produzido e sistematizado relativo às pesquisas histó-
ricas das potencialidades programáticas inerentes aos estudos museológicos,
permitindo a indicação de propostas conceituais e metodológicas para a res-
pectiva remodelação, com vistas à expansão de sua perspectiva preservacio-
nista e ampliação de seu potencial educativo-cultural. Trata-se de um projeto
voltado para a musealização da memória da resistência e da repressão, a partir
da apropriação de um segmento do antigo edifício sede do DEOPS/SP – Depar-
tamento Estadual de Ordem Política e Social do Estado de São Paulo, hoje
ocupado pela Estação Pinacoteca.
196 MARIA CRISTINA O. BRUNO; MARIA LUIZA TUCCI CARNEIRO; GABRIELA AIDAR
– teve outras sedes: à rua 7 de Abril, nº 81; tência, assim como pouco se conhece sobre
rua dos Gusmões, nº 86, e rua Visconde de os atos de repressão institucionalizada que,
Rio Branco, nº 280. em nome da ordem pública e da segurança
nacional, tiveram seu lugar na História. En-
A partir de 1940, o prédio abrigou também fim, o local carece de uma identidade políti-
a Repartição Central de Polícia e a Chefatura ca, apesar da preservação das celas que fo-
de Polícia (Secretaria de Estado dos Negóci- ram maquiadas para manter “as idéias fora
os da Segurança Pública) que ali permanece- de lugar”.
ram até 1951. Em síntese: o DEOPS ocupou
este espaço desde 1940 até o seu fechamento Assim, pretendemos—através deste proje-
em 1983, marco do final da ditadura institu- to de reformulação do espaço Memorial da
ída com o golpe militar de 1964. Assim, a his- Liberdade – resgatar a identidade social e
tória deste espaço extrapola as imagens de política do prédio da atual Estação Pinacote-
“armazém” da Sorocabana e de “porão” da ca cuja história carece de referências históri-
ditadura militar para alcançar uma dimen- cas. Através de processos museológicos e es-
são ainda maior: a do controle do cidadão tratégias pedagógicas interativas nos dispo-
pelo Estado brasileiro, em tempos de repú- mos a criar condições para informar o visi-
blica e em tempos ditatoriais. tante e formar cidadãos conscientes do seu
passado. Nada nos impede de reconhecer que
Atentos aos processos de higienização da cada vítima tem um valor absoluto se consi-
memória, não devemos perder de vista as derado o grau de injustiça cometido contra
múltiplas funções atribuídas a este prédio ela pelo Estado controlador de idéias e
desde o início do século XX até os dias atu- repressor de ações cotidianas. Entendemos
ais. Não devemos ser coniventes com os que dando a conhecer as histórias da repres-
restauros arquitetônicos implementados por são política e da resistência no Brasil contem-
políticas públicas interessadas em passar um porâneo estaremos instigando o diálogo para
verniz sobre o passado político do Brasil Re- a produção de uma cultura mais tolerante.
pública ou das duas ditaduras, a de Getúlio
Vargas e a Militar. Não podemos nos esquecer O espaço estará também aberto para dis-
que, durante 69 anos, o DEOPS exerceu a cutirmos estratégias de conscientização dos
função específica de controle político-soci- nossos jovens sobre o perigo da persistência
al: vigiou a sociedade e puniu cidadãos acu- de idéias autoritárias, legado das ditaduras
sados de “subversivos ou terroristas” por de- varguista (1937-1945) e militar (1964-1983).
fenderem projetos alternativos daquele sus- Esta será uma das múltiplas formas de salva-
tentado pelo Estado. Usou de práticas repres- guardamos nossas conquistas democráticas.
sivas violentas, arbitrárias e ilegais como a Portanto, cabe a nós, através da educação
tortura, cárcere privado, expulsão, deporta- formal e informal sensibilizar a população
ção e a execução sumária. para algumas singularidades da nossa história
política. Não podemos deixar que o mundo
Restaurado, o prédio mantêm hoje seu fique cego e que a memória se apague. E se
partido arquitetônico com novas funções isto acontece, o todo se converte em Nada. É
muito mais direcionadas à cultura do que à quando retrocedemos aos escombros da ig-
memória política. De forma muita tímida e norância numa espécie de “ ensaio sobre a
surda, o Memorial da Liberdade rende suas cegueira”, à moda do escritor José Saramago.
homenagens aos presos mortos e desapa-
recidos durante a Ditadura Militar. Pouco se Rememorar os atos intolerantes nos colo-
sabe sobre estes grupos e suas ações de resis- ca em estado de alerta contra uma possível
198 MARIA CRISTINA O. BRUNO; MARIA LUIZA TUCCI CARNEIRO; GABRIELA AIDAR
A descrição acima apresentada que, neste 3.1.2 Material educativo impresso de apoio
texto, comparece apenas com suas indicações a educadores e público espontâneo:
principais no que tange ao roteiro expositivo e
à nomeação dos espaços, já está elaborada em Produção de materiais de apoio à prática
relação às proposições expográficas e repre- educativa em sala de aula acerca dos con-
sentará uma sensível ampliação das áreas teúdos tratados pela exposição de longa du-
expositivas, potencializando o diálogo com o ração, com foco no Ensino Médio e na disci-
visitante e a capacidade de extroversão do plina de História, com propostas interdisci-
centro de referência documental. plinares com as demais disciplinas. Este ma-
terial será elaborado em consonância com
as propostas museológicas. Produção de
3 - AÇÃO EDUCATIVA E CULTURAL: ARTICULA- guia de auto-visita para a exposição de lon-
ÇÕES ENTRE O MEMORIAL E A ESTAÇÃO PINA- ga duração, voltado ao público espontâneo.
COTECA
3.1.3 Mediação presencial à exposição
3.1 Ação Educativa: de longa duração:
cendo parâmetros comparativos para avali- rio, dos caminhos percorridos pelos movi-
armos nossas conquistas democráticas e os mentos sociais (movimento negro, feminista,
legados do autoritarismo. estudantil, operário, etc) e, em especial, de
apresentar uma história de anônimos.
3.2.5 Exposições Temporárias:
Além disso, a programação de exposições
A documentação arquivada junto ao Fun- temporárias geradas pelo Memorial contará
do DEOPS nos oferece múltiplas possibilida- com mostras de artes visuais ligadas aos te-
des para “desarquivar” a história política bra- mas e conteúdos trabalhados no âmbito da
sileira, até então restrita a alguns poucos pes- exposição de longa duração e das ações cul-
quisadores. Múltiplas são as possibilidades turais aqui apontadas. Com isto, garantimos
temáticas, se levarmos em consideração que não apenas o necessário diálogo entre o
o DEOPS produziu uma verdadeira radio- Memorial e a instituição que o abriga e é res-
grafia da sociedade brasileira. Através dos ponsável por sua gestão – a Pinacoteca do
documentos confiscados temos condições, Estado - como enriquecemos e ampliamos as
por exemplo, de reconstituir aspectos signifi- abordagens e compreensões a respeito da
cativos da história do impresso revolucioná- memória política brasileira.
Perfil dos Autores
205
Cláudia Rose Ribeiro da Silva Atuou como pesquisadora na Associação
Cláudia Rose Ribeiro possui Licenciatura em Nacional de História, no Itaucultural e no La-
História pela Universidade do Estado do Rio boratório de Políticas Públicas da UERJ, na
de Janeiro (1991) e mestrado avaliação qualitativa do Programa Cultura
profissionalizante em Bens Culturais e Proje- Viva, do MinC. Foi assistente de curadoria da
tos Sociais pela Fundação Getúlio Vargas Coleção Brasiliana da Fundação Estudar. Foi
(2006). Tem experiência na área de História, co-autora do projeto educativo da exposi-
com ênfase em História Política e Social, atu- ção “Vistas do Brasil, Coleção Brasiliana/Fun-
ando principalmente nos seguintes temas: fa- dação Estudar na Pinacoteca do Estado”, e
vela, memória e identidade. Atualmente, coordenadora da ação educativa desta ex-
além de exercer o magistério na rede muni- posição. Foi consultora do projeto educativo
cipal de ensino, é diretora do Centro de Estu- Centro-Periferia da 27ª Bienal de São Paulo.
dos e Ações Solidárias da Maré (CEASM), Atualmente é coordenadora do Programa de
gestora da Casa de Cultura da Maré e coor- Inclusão Sociocultural do Núcleo de Ação
denadora do Museu da Maré, no Rio de Ja- Educativa da Pinacoteca do Estado de São
neiro. Paulo.
206
Lusófona de Humanidades e Tecnologias de pela Universidade de São Paulo (1973). Atu-
Lisboa (2004), onde atualmente é docente do almente é Professora Doutora da Universida-
mestrado e doutoranda em Museologia. É de de São Paulo, Assessora da Fundação de
chefe da Divisão de Museus da Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo,
Câmara Municipal de Setúbal e diretora do Assessora do Conselho Nacional de Desen-
Museu do Trabalho Michel Giacometti. volvimento Científico e Tecnológico e Pro-
fessora Doutora da Comissão Pró Índio. Tem
Juan Carlos Rico Nieto experiência na área de Antropologia, com
Juan Carlos Rico é doutor em arquitetura ênfase em Teoria Antropológica. Atua princi-
pela Escola Técnica Superior de Arquitetura palmente nos seguintes temas: Brasil Central,
de Madrid e em Arte pela Faculdade de His- grupo indígena.
tória da Universidade de Salamanca. É con-
servador de museus. Coordena uma equipe Manuelina Maria Duarte Cândido
multidisciplinar de pesquisa em exposição e Manuelina Duarte possui graduação em His-
sua relação com o espaço, gerando diversas tória pela Universidade Estadual do Ceará
publicações. De acordo com os programas (1997), especialização em Museologia para
da União Européia, o ICOM (Conselho Inter- Universidade de São Paulo (2000) e
nacional de Museus) e o ILAM (Instituto mestrado em Arqueologia pela Universidade
Latinoamericano de Museus), realiza cursos de São Paulo (2004). Tem experiência nas
em diversas universidades européias e ame- áreas de História, Museologia e Arqueologia,
ricanas, além das que é professor titular. atuando principalmente nos seguintes te-
mas: museologia, preservação, patrimônio
Kátia Regina Felipini Neves cultural, educação patrimonial e história dos
Kátia Felipini possui graduação em museus. É membro do Conselho Internacio-
Museologia pela Faculdade de Filosofia, Le- nal de Museus (ICOM), faz parte da atual ges-
tras e Ciências Humanas da Universidade Fe- tão do Comitê Brasileiro do ICOM na quali-
deral da Bahia (1993) e especialização em dade de integrante do Conselho Consultivo.
Museologia pelo Curso de Especialização Tem livros e artigos publicados nas áreas
em Museologia do Museu de Arqueologia e mencionadas, atua como docente e como
Etnologia da Universidade de São Paulo consultora. Atualmente é gestora do Museu
(2002). É membro do Conselho Internacional da Imagem e do Som do Ceará (MIS-CE).
de Museus (ICOM). Atualmente é consultora
em Museologia e ministra cursos de Gestão Marcelo Nascimento Bernardo da Cunha
em Museus. Atua principalmente nas seguin- Marcelo Cunha possui graduação em
tes áreas: diagnóstico para implantação e Museologia pela Universidade Federal da
revitalização de instituições museológicas, Bahia (1992), mestrado em Informação Estra-
programação museológica, gerenciamento tégica pela Universidade Federal da Bahia
de acervos e exposições. (1999) e doutorado em História pela
Pontifícia Universidade Católica de São Pau-
Lux Boelitz Vidal lo (2006). Atualmente é Professor Adjunto da
Lux Vidal possui graduação em Artes pela Universidade Federal da Bahia e professor
Sarah Lawrence College (1951), mestrado em convidado da Universidade Lusófona de Hu-
Ciência Social (Antropologia Social) pela manidades e Tecnologias. Atua principal-
Universidade de São Paulo (1972) e doutora- mente nos seguintes temas: afro, arte,
do em Ciência Social (Antropologia Social) museologia, exposição, museus e acervos.
207
Maria Cristina Oliveira Bruno Mestrado como no Doutorado, tem o racis-
Cristina Bruno possui graduação em História mo como objeto de estudo, ambos publica-
pela Universidade Católica de Santos (1975), dos no formato livro. Em 2001, apresentou à
especialização em Museologia pela Escola Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Hu-
de Sociologia e Política de São Paulo (1980), manas da USP, sua Tese de Livre Docência,
mestrado em História Social pela Universida- intitulada “Cidadão do Mundo”. Desde 1984,
de de São Paulo (1984) e doutorado em Ar- é docente do Departamento de História da
queologia pela Universidade de São Paulo USP. Coordena diversos projetos de pesquisa,
(1995). Fez concurso de Livre-Docência em dentre o PROIN- Projeto Integrado Arquivo
Museologia no MAE/USP (2001). Atualmente Público do Estado/Universidade de São Pau-
é docente - professora associada- ms5 e Vice- lo. É organizadora de diversas coletâneas, in-
Diretora do Museu de Arqueologia e cluindo o Inventário DEOPS (Editora
Etnologia da Universidade de São Paulo, Humanitas, FFLCH/USP).
onde coordenou as quatro edições do Curso
de Especialização em Museologia (1999 - Mário de Souza Chagas
2006). Nesta instituição, participa do Progra- Mário Chagas possui graduação em
ma de Pós-Graduação em Arqueologia, mi- Museologia pela Universidade Federal do Es-
nistra disciplinas optativas de graduação so- tado do Rio de Janeiro (1979) e licenciatura
bre Museologia e desenvolve pesquisas de em Ciências pela Universidade do Estado do
comunicação museológica. É professora Rio de Janeiro (1980), mestrado em Memória
convidada da Universidade Lusófona de Hu- Social pela Universidade Federal do Estado
manidades e Tecnologias de Portugal, onde do Rio de Janeiro (1997) e doutorado em Ci-
ministra seminários e orienta mestrados e ências Sociais pela Universidade do Estado
doutoramentos no Centro de Estudos de do Rio de Janeiro (2003). Atualmente é pro-
Sociomuseologia. Tem experiência na área fessor adjunto da Universidade Federal do
de Museologia, com ênfase para o Ensino e Estado do Rio de Janeiro, técnico nível III do
Projetos de Comunicação Museológica, atu- Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico
ando principalmente nos seguintes temas: Nacional, membro do conselho consultivo
museologia, museu, museologia brasileira e da Universidade Comunitária Regional de
musealização da arqueologia . Presta Chapecó, professor convidado da Universi-
consultorias a outras instituições para a ela- dade Lusófona de Humanidades e
boração de programas museológicos. Tecnologias, em Lisboa. Tem experiência na
área de Museologia, com ênfase em Memó-
Maria Luiza Tucci Carneiro ria Social, Instituições de Memória e Patri-
Historiadora, graduada em História pela Uni- mônio Cultural, atuando principalmente nos
versidade de São Paulo, instituição onde seguintes temas: pensamento social brasilei-
também desenvolveu seus estudos de pós- ro, museologia, museus, educação museal e
graduação em História Social. Tanto no gestão de patrimônio.
208