Você está na página 1de 2

14/08/2017 Folha de S.

Paulo - Cordel subverte o cânone - 26/02/2001

Assine 0800 703 3000 SAC Bate-papo E-mail E-mail Grátis PagSeguro

BUSCAR

São Paulo, segunda-feira, 26 de fevereiro de 2001

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Autores contemporâneos de folhetos brasileiros serão


tema da sintuosa coleção "Archivos", até hoje
exclusivamente dedicada à literatura clássica

Cordel subverte o cânone


A holandesa Ria Lemaire, coordenadora do projeto e do
acervo Cantel, volta ao Brasil em março

SILVANA ARANTES
DA REPORTAGEM LOCAL

Uma literatura "avant la lettre" é a definição tradicional do


cordel brasileiro. A contestação do cânone está em curso
numa extensa análise de folhetos de cordelistas nordestinos
que deve resultar no primeiro volume da prestigiosa coleção
"Archivos" dedicado a autores vivos.
A proeza é mérito da estudiosa holandesa Ria Lemaire,
doutora em estudos comparados de literatura medieval pela
Universidade de Utrecht e integrante do Centro de Estudos
Latino-Americanos da Universidade de Poitiers (França),
que coordena a "Archivos" em suporte eletrônico.
Em 1992, Ria Lemaire teve contato com o acervo de cordel
brasileiro reunido pelo professor Raymond Cantel e
depositado na Universidade de Poitiers (leia nesta página). A
partir daí, observou que "essa literatura popular que nasce no
Brasil no século 19, impressa, mas não escrita, em função da
passagem direta da oralidade à impressão, apresenta muitas
características comparáveis às das literaturas da Idade Média
e do início dos tempos modernos na Europa".
E concluiu que "é preciso estudar a literatura de cordel sob a
base do que ela é de fato, não simplesmente como uma fase
anterior à literatura escrita, mas como uma literatura
radicalmente diferente".
Para convencer os organizadores da coleção "Archivos" -que
reúne institutos de estudos literários de 11 países e a Unesco-
da pertinência de realizar um volume sobre o cordel
brasileiro, a pesquisadora precisou solapar alguns preceitos
da coleção, como as noções de autor, leitor e obra dadas por
imutáveis e definitivas.
"Archivos" produziu até hoje 50 títulos, sempre com a
pretensão de promover uma análise textual, crítica e
historiográfica-cultural que esgote a avaliação de uma obra
(acabada) ou um autor (falecido).
Entre os 16 brasileiros que já foram ou estão sendo
abordados pela coleção, citam-se Euclides da Cunha ("Os

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrad/fq2602200106.htm 1/2
14/08/2017 Folha de S.Paulo - Cordel subverte o cânone - 26/02/2001

Sertões"), Gilberto Freyre ("Casa Grande e Senzala"), Sérgio


Buarque de Holanda ("Raízes do Brasil"), Caio Prado Jr. ("A
Formação do Brasil Contemporâneo") e Graciliano Ramos
("Memórias do Cárcere").
Na argumentação em defesa do cordel, Ria Lemaire recorreu
novamente à comparação com características da literatura
medieval. Nesta última, a pesquisadora explica que "o termo
autor, por exemplo, podia assumir vários significados
diferentes: o que compõe oralmente o texto, o que canta, o
que dita, o que anota, o que copia ou o mecenas que paga o
copista".
A pesquisadora diz que "se hoje a maioria dos poetas sabe
ler e escrever, às vezes até produzir seus folhetos em
computador e enviá-los por Internet, o cordel não se tornou,
por isso, uma literatura escrita, no senso moderno do termo.
Os poetas continuam criando mentalmente seus textos, para
anotá-los só depois".
A decisão de dedicar um volume da coleção "Archivos" ao
cordel brasileiro foi tomada em 1998 e nesse mesmo ano a
especialista holandesa esteve no Brasil, buscando
colaboradores para o projeto. Os professores Gilmar de
Carvalho (Universidade Federal do Ceará), Elba Braga
Ramalho (Universidade Estadual do Ceará) e Francisca
Neuma Fechina Borges (Universidade Federal da Paraíba)
são alguns dos convidados.
No próximo mês, Ria Lemaire desembarca novamente no
país e intensifica os contatos para a definição dos autores e a
produção dos textos analíticos sobre suas obras. Mas não há
prazo para que o volume esteja concluído. "Os projetos
"Archivos" levam sempre vários anos", diz.

Texto Anterior: Programação de TV


Próximo Texto: França tem obras dos anos 50 e 60
Índice

Assine 0800 703 3000 SAC Bate-papo E-mail E-mail Grátis PagSeguro

BUSCAR

Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico
ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrad/fq2602200106.htm 2/2

Você também pode gostar