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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA

CENTRO DE ARTES E LETRAS


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS

Bruna Silva Ramos

TRABALHO FINAL PARA A DISCIPLINA LITERATURA, MERCADO


E INDÚSTRIA CULTURAL

Professor: Enéias Tavares

Santa Maria, RS
2023
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Introdução:

O saudoso mestre Massaud Moises (1978, p.5) afirmou certa vez, em um de seus
muitos trabalhos sobre literatura portuguesa, que “História literária ensina-se; literatura, não”.
De fato, essa frase contém uma afirmação verdadeira e uma reflexão sobre o objeto de estudo
sobre o qual nos debruçamos: a literatura. A verdade é que o literário é ainda um conceito
inefável e espectral sobre o qual muitos de nós não possuem uma resposta definitiva para
oferecer, já a História literária, esse recorte fundamental de épocas e períodos da produção da
arte literária consiste em um dos elementos basilares para o nosso estudo.
Ao pensar nisso, para essa breve discussão, o que se pretende é tratar, ainda que
rapidamente, da história literária e da literatura, observando como esses dois temas se
entrecruzam na obra d’Os Maias, de Eça de Queirós. De certa forma, o que se realizará neste
texto é uma discussão sobre a forma como esses dois elementos são tratados nessa obra,
considerando o campo literário no qual o autor estava inserido, como ele o encarava e quais
considerações suas aparecem na narrativa (possivelmente, considerando a teoria de Wayne
Booth, um claro sinal da presença do autor implícito ou implicado). Além disso, intenciona-se
oferecer uma breve introdução à história de Eça de Queirós a fim de debatermos um pouco de
sua vivência, visto que, como apontam as novas teorias que resgatam a figura do autor na obra
literária, este não é uma entidade fantasmagórica, mas alguém que de fato se mostra em seu
texto e que dá, a todo momento, mesmo sem pretender, indícios de sua presença.

Quem foi Eça de Queirós?

O autor Eça de Queirós é tido como o responsável por inaugurar o fazer realista na arte
literária em Portugal, através da primeira edição de seu livro O Crime do Padre Amaro, de
1974.
Sobre o início da sua vida, sabemos o seguinte:

Nasceu José Maria de Eça de Queirós aos 25 de Novembro de 1845, na Póvoa do


Varzim. Era filho de D. Carolina Augusta Pereira de Eça de Queirós e do Dr. José
Maria de Almeida Teixeira de Queirós. Levado pela Vila do Conde, é baptizado na
Igreja Matriz pelo padre António da Silva Coelho. (RAMOS, 1967, p. 687).

No princípio de sua vida, o pequena José Maria não vive com os pais, mas com um
casal de vida modesta, Ana Joaquina Leal de Barro e o marido António Fernandes do Carmo.
Os pais iam visitá-lo com certa frequência. Depois de alguns anos, o menino é levado para a
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casa dos avós paternos, em Verdemilho, para ser cuidado então pela D. Teodora Joaquina de
Almeida e Joaquim José Queirós. Quando completa 10 anos – de acordo com Ramos (1967,
p. 688) – ele é levado pelos pais para o Colégio da Lapa, no Porto. Essa vida secreta da
criança teria um motivo plausível para a época: sua mãe, uma senhorita portuguesa, e seu pai,
um garboso moço brasileiro, ainda não eram casados no tempo da sua concepção, logo ele era
um escândalo para a sociedade portuguesa, profundamente católica, só por ter nascido (um
indicativo irrevogável de fornicação). Os pais teriam se casado somente quatro anos após o
nascimento do menino, o que teria sido a justificativa pelo afastamento deles. O rebento
cresceu longe do afeto de ambos os pais.
Sua passagem pelo colégio se deu de forma comum e modesta, sem grandes feitos. Em
1861 ele se matricula na faculdade de Direito, na Universidade de Coimbra. Foi na
universidade que Eça conheceu alguns de seus companheiros intelectuais mais importantes,
também escritores de renome na época, como Antero de Quendal, Germano Meireles,
Antônio de Azevedo Castelo Branco, José Falcão, Santos Valente, Lobo de Moura, Teófilo
Braga, Alberto Sampaio. Enquanto estudante universitário, ao que parece, também não foi
nada brilhante, teve uma atuação bastante singela. (RAMOS, 1967, 687-688).
Sua estreia no mundo da literatura se dá através de um folhetim que escreveu enquanto
cursava o seu último ano da faculdade. “Noites marginais” foi publicado a partir do mês de
março de 1866, na Gazeta de Portugal. Eça formou-se em Direito em Junho daquele mesmo
ano. No entanto, não atuou diretamente na área da advocacia, preferindo seguir o caminho de
escritor. Em 1867, era redator do jornal Districto de Évora.
Em 1869, após a inauguração do Canal do Suez, impelido de curiosidade, junto a seu
amigo Conde de Resende, Eça realiza uma viagem ao Egito e à Palestina. A excursão foi
bastante significativa para Eça e influenciaria alguns de seus trabalhos futuros. Ele regressaria
ao oriente em janeiro de 1870 “Homem sem Fé, ajoelhou-se, porém, nos Lugares da Palestina,
junto ao sepulcro de Jesus” (RAMOS, 1967, p.688). Possivelmente após a rica experiência de
suas viagens, Eça decide seguir a careira diplomática. Presta o concurso para cônsul e é o
primeiro classificado.
Nessa mesma década, de 1870, há um movimento importante de mudança de
mentalidade em Portugal que já se iniciava na década anterior “Nos anos seguintes a 1860,
desencadeia-se uma profunda reviravolta na vida mental portuguêsa: o Romantismo, exausto,
agonizante como estilo de vida e de arte, começa a sofrer os primeiros ataques por parte da
nova geração que surge.” (MOISES, 1975, paginação irregular). Após um longo período em
que o romantismo reinou soberano como tendência artística, mantendo sempre os sentimentos
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humanos e a perspectiva subjetiva como único viés respeitável para se pensar a arte, em que
“[...] as excentricidades da imaginação, uma legião de frases estereotipadas de índole sombria
e a sentimentalidade mórbida eram moda estética obrigatória” (RAMOS, 1967, p. 645) o
desgaste desse modelo foi inevitável: o ultrarromantismo trouxe uma face da realidade, que
diante da complexidade de temas possíveis, foi maculada a ponto de não mais representar o
que se vivia enquanto sociedade.
A questão Coimbrã exemplifica o marco da transição dessa tendência e a guerra de
ideias que performava entre os escritores de Portugal em que cartas e panfletos serviam de
veículo para atacar e defender ideias.
O início desse episódio se deu no momento em que Antônio Feliciano de Castilho, ao
escrever o prefacio do Poema da Mocidade, de Pinheiro de Pinheiro Chagas, teceu duras
críticas a nova geração de escritores, então estudantes da Universidade de Coimbra, entre eles
estavam Antero de Quendal, Vieira de Castro e Teófilo Braga. Adeptos de um movimento
literário que então buscava uma simplificação do estilo, a fim de evitar as rebuscadas
interpelações do romantismo, além de aproximar a temática de sua escrita à realidade da
sociedade da época, Castilho os rebaixou e elogiou o fazer literário vigente, o romantismo,
apelando para o que ele chamou de falta de “bom gosto” e “bom senso”. Possivelmente
indignado, Antero escreve uma carta, denominada Bom Senso e Bom gosto, em 1865, que é
apontada pela fortuna crítica como o início do Realismo em Portugal.
Nessas trocas de farpas, que se estenderam, houve inclusive o duelo de espadas entre
Antero de Quental e Ramalho Ortigão. Após este dizer que “Antero havia maculado ‘os seus
vinte e cinco anos com a mais torpe das nódoas que um mancebo pode lançar no seu carácter:
a cobardia’” (RAMOS, 1967, p.652). Antero teria partido para o Porto e duelado com
Ramalho, a quem feriu o braço, finalizado o duelo como vencedor.
Cinco anos depois, Antero organiza as suas conferências democráticas, também
conhecidas como Conferências do Casino, por terem se realizado no Casino Lisbonense,
durante a primavera de 1971, teriam sido 12 reuniões no total, amplamente divulgadas pelos
jornais (RAMOS, 1967, p. 653). Eça de Queirós foi o terceiro conferencista, responsável por
dissertar sobre o tema Realismo como nova expressão da Arte. Ao chegar a quinta
conferência, ministrada por Salomão Saragga, cujo tema seria Os Historiadores Críticos da
Vida de Jesus, poucos minutos antes de sua fala, as autoridades mandaram fechar o casino,
com apoio considerável da gente comum, afirmando que o teor das reuniões ia contra alei do
estado e da religião católica. Apesar da impossibilidade da retomada das conferências, esses
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letrados mantiveram suas ideias e continuaram firmes no propósito de revolucionar a


literatura e as ideias nacionais:

Quando, em 1874, Eça de Queirós disserta sobre o Realismo como nova expressão
da Arte, no Casino lisbonense, condena ainda a sentimentalidade ultrarromântica e
exorta a objetividade e a observação na literatura. Propõe mais: que a matéria
literária se extraia da vida contemporânea. O escritor deveria exercitar as faculdades
observativas do meio que o rodeava. [...] Mas Eça de Queirós, ao ocupar-se do
Realismo e ao chamar a atenção para a vida contemporânea, fundamentava-se em
Flaubert, que detestava as efusões líricas e o impressionismo sentimental, bem como
recorria ainda ao pintor francês, Gustavo Coubert, cujos quadros, muito
ousadamente, analisou sem jamais os ter visto. O rigor da observação, a inclinação
para realçar o concreto, naturalmente mais susceptível de análise, a preferência pela
vida contemporânea, o gosto pelas anormalidades psíquicas e pelos desequilíbrios
fisiológicos, a proscrição da retórica lírica e sentimental, enfim, o contacto com a
vida e o real constituem as tendências que individualizam a estética nova. (RAMOS,
1967p. 655)

Em 1872, parte para Havana, como cônsul. Em 1874 ele é transferido para New
Castle, na Europa. Nesse tempo visitou os Estados Unidos da América, mas achou-os um
grande ‘nada demais’. É na Inglaterra que ele escreverá seus primeiros grandes romances, O
Crime do Padre Amaro e O Primo Basílio. O recebimento pela crítica foi de certa forma,
outro escândalo, muitos acusaram o teor dos romances como impróprios, a crítica ao clero
pareceu ferrenha demais, e o Primo Basílio foi taxado como pornográfico. Preferencialmente,
o romance como instrumento literário. Escreveu também contos e ensaios, além de textos
jornalísticos. Sua primeira obra de destaque, O Crime do Padre Amaro que teve mais de uma
edição circulando, tendo a 1 sido distribuída em 1874 e a definitiva em 1880; Eça teria
realizado modificações atentando-se aos movimentos da crítica. (p.692).
O romance de costumes teve por inspirações obras francesas, La Faute de l’ Abbé
Mouret, de Zola, e Mounsier de Boisdhyver, de Chamfleury
Era desejo de Eça formar família. Em carta a seu amigo, Ramalho Ortigão, chegou a
dizer o seguinte:

[...] precisava duma mulher serena, inteligente, com uma certa fortuna (não muita),
de caráter firme disfarçado sob um caráter meigo, que me adotasse como se adota
uma criança, me obrigasse a levantar a certas horas, me forçasse a ir para a cama a
horas cristãs – e não quando os outros almoçam – que me alimentasse com
simplicidade e higiene, que me impusesse um trabalho diurno e salutar, e que,
quando eu começasse a chorar pela Lua, ma prometesse – até eu a esquecer... Essa
doce criatura salvaria um artista de si mesmo – que é o pior abismo dum artista – e
faria uma daquelas obras de caridade que outrora levaram gente ao Calendário.
(RAMOS, 1967, p. 689).
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É no ano de 1884 que conhece a senhora D. Emília Resende, com quem se casará em
1886. A correspondência amorosa deles está disponível para nós, leitores, tendo sido
compilada e publicada pela primeira vez em 1935, após a morte do autor.
Na sequência dos acontecimentos marcantes da vida do escritor:

Em abril de 1885, de passagem em Paris, visita o romancista Emílio Zola, com


quem conversa durante algumas horas. O romancista francês, ao saber, mais tarde,
da morte de Queirós, dirá, numa homenagem de admiração, que o romancista
português era superior ao seu mestre, Flaubert. (RAMOS, 1967, p.690).

Eça de Queirós é nomeado cônsul em Paris, em 18881 o que o deixa extremamente


feliz, por ser um de seus sonhos. É na cidade luz que ele irá viver até o fim de sua vida, com a
sua Esposa, D. Emília de Castro “[...] as naturais alegrias e contrariedades da fortuna. Tudo
faz para que os filhos sejam felizes e saudáveis. Parece ter possuído a mística da família. Já
quando o seu estado de saúde ia piorando, Eça de Queirós esquecia-se quase completamente
de si, se era preciso tratar os seus” (RAMOS, 1967, p.690). Ao que parece, a despeito de não
ter sido cuidado na infância com zelo pelos próprios pais, Eça superou a falta de amor dos
pais sendo ele mesmo um pai presente e cuidadoso com seus filhos.
Em 1889 agrega-se aos Vencidos da Vida e visita Portugal pela última vez em 1900.
Falece em agosto daquele ano, devido às suas doenças intestinais. Eça teria um tipo raro de
doença que acometia a base intestinal, a amiloidose hereditária.

Na manhã de 16 de agosto de 1900, o especialista Bouchard verifica a incurabilidade


do doente e surpreende-se com a lucidez de Queirós, que descreve com toda a
nitidez os seus mortais procedimentos. À tarde, começa a piorar. O Padre Lenfant,
chamado pela família, lança-lhe a absolvição e ministra-lhe a Extrema-Unção. Às
quatro horas e meia da tarde, desse dia, Eça de Queirós morria junto dos seus, com
toda a serenidade. (RAMOS, 1967, p. 692).

Como é retratada a história literária na obra Os Maias?

Ao considerarmos propriamente o seu romance Os Maias,

Como é retratada a Literatura na obra Os Maias?

Como são retratados os escritores?

Que livros e escritores são mencionados?


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Como são tratadas as personagens leitoras?


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REFERÊNCIAS

COELHO, Jacinto do Prado. Para a compreensão d’Os Maias - Eça, escritor ambíguo. In: Ao
contrário de Penélope. Lisboa/PT: Livraria Bertrand, 1976.4

FIGUEIREDO, Fidelino. História Literária de Portugal. 3. ed. São Paulo: Companhia


Editora Nacional, 1966.

MASSAUD, Moisés. Literatura Portuguesa. 13.ed. São Paulo/BR: Cultrix, 1975.

MASSAUD, Moisés. Presença da Literatura Portuguesa III: Romantismo e Realismo.


5.ed. DIFEL: São Paulo, 1978.

QUEIRÓS, Eça. Os Maias: Episódios da vida romântica. Edição comentada e ilustrada. São
Paulo/SP: Editora Zahar, 2014.

RAMOS, Feliciano. História da Literatura Portuguesa. 9. ed. Livraria Cruz Braga:


Braga,1967.

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