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Capítulo XIV
No mesmo dia em que Afonso da Maia partia para Santa Olávia, Maria Eduarda
instalava-se nos Olivais. No dia seguinte, Baptista informa Carlos que Ega partira
para Sintra. À noite, depois do jantar, Carlos vai ao Grémio, onde encontra Taveira,
que o adverte sobre as ameaças de Dâmaso do escândalo que se prepara
envolvendo Carlos. Deslocam-se até ao Price, mas Carlos não se demora e, ao sair,
encontra Alencar e o tio de Dâmaso, o Sr. Guimarães, a quem Alencar o queria
apresentar.
No regresso ao Ramalhete, Carlos pensava no pai e na sua amizade com o
Guimarães. E pensava ainda no desgosto que poderia ter o avô, vendo-o envolvido
com Maria Eduarda. Tornava-se forte o desejo de fugir para Itália com a mulher
amada. Carlos visitava-a todos os dias nos Olivais, mas esses encontros diurnos
tornaram-se insuficientes para o seu amor e ambos combinaram encontros
noturnos. Para esse efeito, Carlos tratou de alugar uma casita, à beira da estrada e,
a partir daí, começaram a encontrar-se todas as noites.
No início de setembro, Craft visita Carlos vindo de Santa Olávia e diz-lhe que o avô
está magoado por ele não o ter ido visitar. Nessa noite, Carlos falou a Maria da
visita que tinha de fazer ao avô e ela confessou-lhe o desejo de conhecer o
Ramalhete. Esta visita ficou combinada para o dia em que Carlos partia para Santa
Olávia.
Assim aconteceu. Maria ficou encantada com a casa, em especial com o escritório
de Afonso e o jardim. Manifestou-se angustiada pelo facto de Carlos ter de deixar
todo aquele conforto para fugir com ela. Ao jantar, Maria comentou que Carlos era
parecido com a sua mãe, em certos jeitos e na maneira de sorrir. De repente,
apareceu Ega, regressado de Sintra, e Carlos achou melhor que o encontro se
desse ali, de forma natural. Depois de conversarem sobre o que Ega andara a fazer
em Sintra, Carlos e Maria Eduarda saíram de casa, instalando-se num coupé que
levaria Carlos a Santa Apolónia e Maria à Toca.
No sábado seguinte, Carlos regressou de Santa Olávia. Ao almoço, com Ega,
confidenciou que ambicionava instalar Maria em Itália e visitar regularmente
Portugal para ir revelando, progressivamente, o seu amor por aquela mulher. Mas
Ega achava que a melhor cidade para viver o amor era Paris. Baptista, entretanto,
interrompeu os amigos para entregar a Carlos um bilhete que anunciava a presença
do Castro Gomes. Carlos, surpreendido e intrigado, recebe-o no salão grande.
Castro Gomes mostrou a Carlos uma carta anónima que tinha recebido no Brasil, a
denunciar a relação de Carlos com Maria Eduarda. Revelou a Carlos que Maria
Eduarda não era sua mulher e que Rose também não era sua filha, portanto, para
não passar pela fama de marido atraiçoado, se limitava a retirar-lhe o seu nome,
deixando-a com o nome de madame Mac Gren, que ela usava anteriormente.
Uma revolta furiosa apoderou-se de Carlos, ferido no orgulho e na sua
ingenuidade. Ao contar a Ega o sucedido, este compreendeu que a situação era
horrível, mas simplificou a questão pragmaticamente dizendo que o facto de Maria
Eduarda não ser casada com Castro Gomes solucionava os obstáculos que
impediam aquele amor.
Carlos pensou em escrever uma carta a Maria Eduarda a terminar a relação entre
eles, enviando-lhe dinheiro. Mas após muito refletir, decidiu deslocar-se aos Olivais.
Ega assegurou-lhe que teria sido Dâmaso o autor da carta anónima dirigida a
Castro Gomes, e Carlos lembrou-se da conversa com Taveira, em que este lhe
contara sobre o propósito de preparar um grande escândalo em Lisboa, envolvendo
tiros e um duelo.
Carlos dirigiu-se, então, aos Olivais, mas antes de chegar a quinta, encontra
Melanie, transtornada, que o informa que a senhora estava aflita, perdida de choro e
desejando morrer. Confidencia ainda que Maria Eduarda já não levantava o dinheiro
que Castro Gomes lhe enviava, por isso Carlos a tinha encontrado um dia à porta do
Montepio, onde fora empenhar uma pulseira da senhora.
Ao chegar aos Olivais, Carlos encontrou Maria Eduarda em pranto e com vontade
de lhe contar o seu passado, mostrando que tinha sido a mãe a culpada da sua
desgraça. Em choro, pediu perdão a Carlos, relembrando o dia em que tentara falar
com ele, insistindo que tinha algo para lhe dizer. Carlos mostrava-se ultrajado com a
sua mentira mas, por fim, não conseguindo resistir mais e tomado pela emoção,
pediu-a em casamento.
Capítulo XV
Carlos e Maria viveram momentos de enlevo e até confessaram a Rosa que iriam
viver juntos e que ele iria ser o seu novo pai. Maria, por fim, contou toda a sua
história, a sua vida no estrangeiro com a mãe e com Mac Gren, o nascimento de
Rosa, a relação com Castro Gomes. E jurou-lhe que apenas por vartos se tinha
apaixonado. A Ega, Carlos contou o impulso da paixão que o lançara de novo nos
braços de Maria. No entanto, não escondeu a preocupação com o avo e a sua
reação ao saber da história. Ega aconselhou-o a não casar, a esperar que o avo
morresse, visto já estar tão idoso.
Carlos começou a levar os seus amigos à Toca, para jantar e para longas
conversas ou serões. Maria tudo aprimorava para receber os amigos de Carlos.
Organizavam-se solenidades e celebravam-se datas históricas e até o marquês
dizia que ir à Toca era «dia de civilização».
Um dia, Carlos recebeu o correio do qual constavam uma carta de Ega e dois
números de jornal. Na carta, Ega fazia referência a um artigo na primeira página do
jornal e afiançava ao amigo que tinha conseguido suprimir toda a tiragem. Carlos
pegou no jornal A Corneta do Diabo e leu, num relance, o artigo salpicado com o
seu nome e que conspurcava a sua relação com Maria Eduarda. Carlos sentiu asco
e novas dúvidas sobre a viabilidade da sua ligação com Maria o assaltaram.
Carlos e Maria Eduarda decidem ir a Lisboa e encontram Ega no caminho que,
constrangido, não podia desabafar diante de Maria sobre o caso do jornal. Lembrou
que deveriam comparecer no sarau da Trindade, onde Cruges iria tocar e Alencar
recitar. No momento em que a tipola estanca junto ao passeio, dão de caras com o
tio de Dâmaso, o Guimarães, que pareceu assombrado ao ver Maria.
Carlos e Ega vão falar com Palma Cavalão, diretor do jornal, e propõem-lhe que, a
troco de dinheiro, identifique a pessoa que encomendara o artigo difamatório contra
Carlos, conseguindo a confirmação que tinha sido Dâmaso com a cumplicidade de
Eusebiozinho. Carlos envia Ega e Cruges a casa de Dámaso, desafiando-o para um
duelo ou a retratar-se. Dâmaso opta cobardemente por assinar uma carta, redigida
pelo próprio Ega, afirmando que a publicação no jornal Corneta fora invenção
gratuita e se devia ao seu estado de embriaguez. Para se salvaguardar
relativamente a futuras maledicências, Ega fê-lo declarar que não o deviam levar a
sério, devido à sua tendência para abusar da bebida que era, aliás, hereditária.
Afonso da Maia regressa, entretanto, de Santa Olávia e Carlos e Ega contam-lhe o
episódio com Dâmaso, omitindo, contudo, a parte dos amores de vartos.
No teatro, Ega descobre Raquel Cohen num camarote, acompanhada do marido e
de Damaso. Este acena a Ega com um gesto petulante, o que o feriu como um
insulto. Ega resolve subitamente dirigir-se à redação do jornal. À tarde, com o
objetivo de pedir a publicação da carta do Dâmaso. Dias depois, não se falava mais
do escândalo e o assunto da carta foi depressa esquecido em Lisboa. Na véspera
do sarau da Trindade, leu-se no jornal A Tarde, a notícia de que «o distinto
sportman Dâmaso Salcede» partia em breve para uma viagem de recreio a Itália.
Capítulo XVI
Maria Eduarda encontrava-se de novo instalada na Rua de S. Francisco.
Terminado o jantar, Ega insistia para irem ao sarau do Teatro da Trindade, mas
Maria declinou o convite por se encontrar cansada. Juntamente com Ega, Carlos
suportou estoicamente o discurso de Rufino, um deputado arrebatado, ouviu a
atuação de Cruges, tocando ao piano a Sonata Patética de beethoven, e assistiu ao
triunfo de Alencar recitando um poema da sua autoria, dedicado à Democracia. No
botequim, Ega travou conhecimento com o tio do Dâmaso, Guimarães, que tinha
demonstrado vontade de falar com Ega, porque se sentia atingido pelas declarações
do sobrinho que Ega redigira e o fizera assinar.
Mais tarde, já Ega tinha saído do teatro e passava à porta do Hotel Aliança com
Cruges, quando o Sr. Guimarães o chamou para lhe perguntar se ele e o Carlos da
Maia eram muito amigos. Perante a resposta afirmativa do seu interlocutor,
Guimarães começou a contar a história da sua amizade com a mãe de Carlos e
afirmou ter uns documentos para entregar à família, agora que se iria ausentar de
Lisboa. Atento a todos os pormenores dessa história, Ega fica a saber dos lacos de
parentesco entre Carlos e Maria Eduarda: são irmãos.
Atordoado com o relato, Ega vai ao hotel onde Guimarães se hospedava para este
lhe entregar os documentos que comprovam a sua história. De posse do cofre,
correu para o Ramalhete tomando consciência da crueldade da situação: Carlos era
amante da própria irmã! Sem saber como reagir, toma a decisão de contar tudo a
Vilaça, o procurador dos Maias, para que este providencie o modo de contar tudo a
Carlos.
Capítulo XVII
No Ramalhete, Ega tinha acordado cedo e sempre a pensar na melhor estratégia
para revelar ao seu amigo aquele segredo que mudaria a vida de todos para
sempre. Ainda colocou a hipótese de ser ele a fazê-lo e não incomodar o Vilaca com
essa tarefa medonha. Carlos foi ao seu quarto para conversar e o amigo ficou em
pânico que ele desse pelo cofre que ali se encontrava. Assim, sem coragem,
inventou uma ida a Sintra com o Taveira. Procurou Vilaça, que se encontrava
ausente de casa.
Quando Ega finalmente se encontrou com o procurador, contou-lhe toda a história,
incumbindo-o de revelar a verdade a Carlos. Vilaça, contudo, começou por duvidar,
sugerindo que tudo se tratava de uma forma de extorquir dinheiro aos Maias. Mas
depois de analisar os documentos do baú que Guimarães entregara, tomou
consciência da situação. Tinha de revelar a verdade a Carlos e, para isso, dirigiu-se
ao Ramalhete ao final da tarde. Carlos, contudo, não teve tempo para o receber
nesse dia e tudo ficou adiado para o dia seguinte.
Tinha Vilaca acabado de expor a situação a Carlos, quando Ega apareceu no
Ramalhete. O procurador resolveu abandonar a sala e Ega contou o encontro com
Guimarães e a sua longa e terrível conversa. Afonso da Maia apareceu na sala e
reparou na face transtornada do neto. Este desabafou com o avô, na esperança de
ele contrariar a versão dos factos dada pelo Guimarães e sem pensar no abalo que
lhe podia provocar. O velho leu a declaracão de Maria Monforte e vergou-se à dor
de imaginar o neto cometendo incesto, pois sabia que Carlos tinha uma amante na
Rua de S. Francisco. Carlos estava também perturbado com o facto de no caminho,
imaginava os diferena, mas decidiu que só ele O devia fazer. E, no caminho,
imaginava os diferentes cenários que poderiam suceder e as atitudes a tomar face a
essas reações.
Maria estava deitada, sentindo-se muito cansada, e Carlos anunciou que iria por
uns dias a Santa Olávia. Ela estranhou a decisão repentina e puxou-o para si.
Carlos não soube resistir-lhe e cometeu incesto conscientemente, por vontade
própria.
Durante uns dias não conseguiu dizer-lhe nada e continuou a não conseguir resistir
à paixão. Ao mesmo tempo, tentava evitar Ega e o avô. Uma noite, quando
regressava de um encontro com Maria Eduarda e procurava entrar em casa sem ser
notado, cruzou-se com o avô, que o esperava com olhar reprovador para o acusar
em silêncio. Na manhã seguinte, os criados chamaram Carlos ao jardim, onde
tinham encontrado Afonso morto, caído sobre a mesa.
Atormentado pelo remorso que sentia pela morte do avô, Carlos partiu para a
quinta de Santa Olávia e deixou dinheiro a Ega para que o entregasse a Maria
Eduarda, juntamente com a carta de Maria Monforte. Combinaram ainda que Ega
fosse ter com ele a Santa Olávia e daí partissem para uma viagem à América e ao
Japão.
Tal como Carlos tinha proposto, Maria partiu para Paris. Ega, que também partia
para Santa Olávia, avistou Maria em Santa Apolónia e, no Entroncamento, viu-a
pela derradeira vez.
Capítulo XVIII
Semanas após a partida de Maria Eduarda para França, Carlos e Ega encetaram
uma longa viagem pelo mundo. Um ano e meio depois, Ega regressou a Lisboa,
cheio de histórias e aventuras do Oriente, e com a notícia de que Carlos alugara um
apartamento nos Campos Elísios e não tinha intenção de regressar a Portugal.
Contudo, dez anos depois, os dois amigos encontraram-se para almoçar num salão
do Hotel Bragança. Carlos não pretendia demorar-se muito tempo, apenas tratar de
alguns assuntos e matar saudades dos amigos. Ega contou as últimas novidades: a
sua mãe morrera, tendo-lhe deixado uma boa herança; a condessa Gouvarinho
tinha herdado uma fortuna de uma tia e Passeava nas melhores carruagens,
continuando a receber às terças-feiras. Apareceram então o poeta Alencar e o
maestro Cruges e Carlos convidou-os para jantar, às seis horas.
Entretanto, Carlos e Ega decidiram visitar o Ramalhete. Passaram pelo Largo do
Loreto e Carlos espantou-se com o facto de nada ter mudado. Ao descerem o
Chiado, Carlos teve também a mesma impressão, reconhecendo, às portas dos
cafés, as mesmas pessoas que por lá estavam, dez anos atrás, com o seu ar triste e
apagado.
Pelo caminho cruzaram-se e cumprimentaram Dâmaso, que casara com a filha
dos condes de Águeda, uma gente arruinada. Dâmaso sustentava a família e, além
disso, a mulher traía-o, mas ele parecia dar-se bem com isso, uma vez que até tinha
engordado. Passaram em frente do consultório de Carlos, onde agora havia uma
tabuleta de modista, e reviveram momentos do passado, quando se tinham
instalado em Lisboa, cheios de projetos.
Chegaram depois à avenida, que tinha sido renovada, mas Carlos espantava-se
com o aspeto molengão dos rapazes que por ali passeavam, vestindo segundo os
figurinos franceses mas faltando-lhes o sentido estético.
Os dois amigos concluíram então que o que se mantinha genuíno em Lisboa era o
alto da cidade, o casario pelas encostas, os palacetes, os conventos e as igrejas.
Cruzaram-se com Charlie, o filho da Gouvarinho e viram Eusebiozinho, que subia a
avenida, de braco dado com uma mulher muito forte. Tinha um aspeto ainda mais
triste e molengão, e dizia-se que a mulher lhe batia. Carlos, recordando o artigo
publicado no jornal A Corneta do Diabo, a mando de Dâmaso e de Eusebiozinho,
perguntou por Palma Cavalão e Ega esclareceu que ele tinha deixado a literatura e
se dedicava à política.
Apanharam depois uma tipoia para o Ramalhete. Viram Alencar ao longe e Ega
explicou a Carlos que se tornara amigo dele, por ser um dos poucos homens que se
mantinha genuíno e com sentido de honestidade, lealdade e generosidade. O
procurador Vilaça já os esperava e apresentou-lhes o jardineiro que ali vivia com a
mulher e o filho, guardando o Ramalhete.
Os dois amigos percorreram as diversas salas, onde se guardavam os móveis e os
objetos trazidos da Toca. Ficaram emocionados ao visitar o escritório de Afonso e
romperam em espirros, devido a um pó que Vilaça colocara sobre os móveis e os
lençóis que os tapavam. Alguns móveis estavam preparados para serem levados
para Paris, onde Carlos fixara a sua morada. Relembraram o reverendo Bonifácio, o
gato de estimação de Afonso, e Carlos falou sobre a sua morte em Santa Olávia.
Carlos comunicou então ao amigo que Maria Eduarda ia casar com Mr. de Trelain,
vendo nisso a união de dois seres desiludidos da vida que queriam afrontar juntos a
velhice.
Já no quarto de Carlos, os amigos concluíram que haviam falhado na vida, não
tendo levado por diante os seus projetos. Carlos comoveu-se, verificando que só
vivera dois anos naquela casa, mas que era ali que estava toda a sua vida. Ega
reconheceu que, afinal, não tinham passado de uns românticos, governando-se na
vida mais pelo sentimento do que pela razão.
Por fim, decidiram fixar a sua teoria sobre a vida, o «fatalismo muculmano»: nada
desejar e nada recear, não ter ambições nem esperanças e tudo aceitar com
resignação e com a consciência acerca da impossibilidade de se ter qualquer
controlo sobre a vida.
Concluíram que não valia a pena correr para nada, «nem para o amor nem para a
glória nem para o dinheiro nem para o poder», mas, já na rua, aperceberam-se do
adiantado da hora e correram desesperadamente para apanhar um americano'.
Afinal, tendo eles decidido que não valia a pena correr fosse para o que fosse,
apenas apressavam o passo para satisfazerem os apetites do estômago, pois
estavam atrasados para o jantar que Carlos tinha marcado no Hotel Bragança.