Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
JOÃO PESSOA
2013
LARISSA ANGÉLICA DE SANTANA MADRUGA
JOÃO PESSOA
2013
LARISSA ANGÉLICA DE SANTANA MADRUGA
BANCA EXAMINADORA
______________________________________________________________
Prof. Dr. José Josinaldo Fernandes Malaquias (orientador)
_______________________________________________________________
Prof. Dr. Wilfredo José de Jesus Maldonado Diaz
_______________________________________________________________
Profa. Dra. Glória de Lourdes Freire Rabay
Dedico este trabalho a Deus e a todos
aqueles que acreditam no Jornalismo
como ferramenta de promoção do Estado
Democrático de Direito, da cultura da paz
e da legalidade.
AGRADECIMENTOS
1 INTRODUÇÃO ........................................................................................... 10
6 REFERÊNCIAS ........................................................................................... 49
10
1 INTRODUÇÃO
estuprada por uma dupla em Campina Grande. Doparam ela, colocaram coisas na
boca dela, ela adormeceu e os caras estupraram a mulher.” De forma exagerada o
apresentador gesticula, anda por toda extensão do cenário e anuncia o tema da
reportagem, depois aparentando estar revoltado ele chama a repórter e aponta para
o telão, onde é exibida a matéria: “Eu vou chamar Ana Paula que vai contar essa
história da mulher que levou uma cacetada, deram uma cacetada nela, depois
pintaram e bordaram com ela, estupraram a mulher”. E é dessa forma, no mínimo
insensível, que o apresentador trata o delicado assunto, expondo a vítima e os
familiares ao ridículo.
No Caso de Polícia, exibido no dia 12/03/2013, o apresentador Fábio
Araújo relata um homicídio ocorrido no município de Santa Rita: “Um jovem foi morto
com três tiros quando saía de casa”, enquanto isso no telão aparecem as imagens
do cadáver e da casa da vítima. “De acordo com a polícia, a vítima era usuário de
drogas. Olha aí a novidade: usuário de drogas. O crime teria sido cometido por dois
homens que fugiram a pé. Até agora ninguém foi preso, ninguém sabe o paradeiro, a
velha forma de matar de quem deve ao tráfico de droga. Ficou devendo ao tráfico de
drogas é bala na cabeça.” Ele ainda complementa, justificando a morte do rapaz:
“Mais um que foi pro saco, mais um que foi embora porque devia ao tráfico de
drogas. É melhor o camarada não entrar, porque se entrar é caixão e vela preta, é
saco preto pra você, é gaveta do IML (Instituto de Medicina Legal) pra ti. Olha aí
comunidade do Cadeado em Santa Rita, jovem foi morto com tiro na cabeça,
executado porque provavelmente devia ao tráfico de droga.”
No programa Aqui na Clube, o apresentador Victor Freitas entra no ar ao
som de uma música evangélica e fazendo um discurso de agradecimento a DEUS, e
logo em seguida passa a fazer a chamada das manchetes do programa, à medida
em que também pede a produção para que sejam exibidas as imagens chocantes de
cada uma delas. Pedindo para que os telespectadores interajam através da internet
o apresentador dança em frente as câmeras. Na edição do dia 13/03/2013 em prova
de total menoscabo a princípios constitucionais e a direitos resguardos pela
Constituição Federal, o apresentador anuncia: “Esse bicho do cabelo amarelo
(referindo-se ao acusado). Bandido não me interessa não. Esses bicho não tem
nada a perder. Se puder botar pra mim as imagens (reportando-se a produção do
programa). Eu quero as imagens do safadinho com a mochila nas costas (referindo-
12
se ao momento em que o acusado chega para abordar a vítima). Ele não tem nada a
perder. Tá aqui olha (apontando para o telão). O cara ter a ruindade de tirar a vida
de outra pessoa é o cara ser muito miserável. Nojento, rapaz”.
No programa Cidade em Ação, que é transmitido pela Rede TV através da
afiliada TV Arapuã, do dia 14 de março também deste ano, o apresentador Vinícius
Henriques que tem formação em Direito, afronta o direito do telespectador a ter
informação correta, fazendo um juízo de valor a respeito de um crime, ao passo que
coloca sob dúvida a reputação da vítima, pondo sua família em situação vexatória:
“Meu amigo, minha amiga, escapou da primeira e deveria ter entendido o recado.
Mas não, infelizmente ficou. Talvez até por uma condição financeira, não teria como
sair daqui de João Pessoa e ir para um local diferente, mudar de ambiente de ares,
né? Tiro de calibre 12. Na cabeça. Estourou a cabeça da vítima. Agora esse rapaz
era envolvido com alguma coisa, será? Porque tanta vontade assassiná-lo? E assim
conseguiram. O que é lamentável”
Este tipo de discurso em muito é favorecido pela televisão, que é um
veículo capaz de, por suas próprias características técnicas, tocar o imaginário
popular das mais diferentes formas, haja vista que tal mídia se constitui assim em
ambiente propício para a disseminação da indústria do espetáculo, ampliando a
própria realidade, dando margem para a dramatização, para o apelo emocional e
para a espetacularização da vida humana, com ênfase para as notícias que
envolvem crimes, acidentes, tragédias familiares, miséria, entre outras.
Para Santaella (2000, p. 47) “Por mais que a mensagem transmitida pela
televisão seja banal, superficial esquemática, sua complexidade simbólica é bastante
grande”.
Ao longo dos anos, a televisão tem transformado tanto a sua
programação quanto a forma de abordar os conteúdos. E dentro deste contexto de
mudanças, podemos encarar a inserção da espetacularização como um dos fatores
principais, ingrediente que se faz presente, inclusive, dentro do jornalismo.
15
2.3.1 FORMAIS
O apelo, afinal, pode recair mais sobre o modo pelo qual a informação foi
obtida do que sobre a informação em si. O efeito de espetáculo é, assim,
deslocado do conteúdo informativo para a forma - menos convencional e até
eticamente duvidosa - de se alcançar a informação, ou seja, do contexto do
enunciado para o código da enunciação, ou ainda, da função referencial
para a metalinguagem.
2.3.2 M ATERIAIS
A busca pelo fait divers, ou seja, daquilo que é mais corriqueiro e que
ao mesmo tempo transmuta-se no que é peculiar, pela forma como é contado é um
dos objetivos do gênero.
No reino dos fins, tudo tem ou um preço ou uma dignidade. Quando uma
coisa tem preço, pode ser substituída por algo equivalente; por outro lado, a
coisa que se acha acima de todo preço, e por isso não admite qualquer
equivalência, compreende uma dignidade.
Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
31
Art. 1º O Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros tem como base o direito
fundamental do cidadão à informação, que abrange seu o direito de
informar, de ser informado e de ter acesso à informação.
Sem falar que com esta postura, ao utilizar estes termos, ele ainda
comete o crime de calúnia, atribuindo a prática de um delito ao indivíduo acusado. O
Código Penal tipifica esta conduta da seguinte forma:
É o crime mais grave de todos os crimes contra honra previstos pelo Código
Penal. Na narração da conduta típica, a lei penal aduz expressamente a
imputação falsa de um fato definido como crime. Assim podemos indicar
três pontos principais que especializam a calúnia com relação as demais
infrações contra a honra, a saber: a) a imputação de um fato; b)esse fato
imputado à vítima deve, obrigatoriamente, ser falso; c) além de falso, o fato
deve ser definido como crime.
um processo judicial, em que ele teria direito a produzir provas e demonstrar a sua
inocência.
Muitas vezes, esse pré-julgamento do acusado feito pela mídia acaba
influenciando de maneira negativa no julgamento realizado pela Justiça, porque de
certa forma esse tipo de tratamento espetacularizado dado a notícia acaba atraindo
os olhares da sociedade e suscitando o clamor público, que protesta pela
condenação sem, no entanto, a certeza jurídica para tal. Isso termina criando um
clima de insegurança no Judiciário, em que a mídia, especialmente a televisiva,
torna-se um fator decisivo nas sentenças judiciais.
Em outra passagem do programa, Samuka Duarte relata um homicídio,
explorando de maneira insensível a dor e a perda da família da vítima, e ao final
ainda fere a honra desta, vejamos:
“Olha gente, vocês viram, vocês viram que situação. É o que eu digo
sempre aqui, no final de tudo a família sofre. A dor da mãe, a dor da esposa. Bota aí
a imagem do desmaio, a hora que chega. Tem como Cristina, ver? Ele diz isso
reportando-se a diretora do programa. Vai olhando. Olha o desmaio aí. A mulher
desmaia. A mãe desmaia. Veja só. É Linguiça que tá colocando? Dirigindo-se a
alguém da produção. Linguiça, bota aí. A mãe vai desmaiar, olha aí. Presta a
atenção, a mãe vai desmaiar, olha. A mãe desmaiando, olha aí. Já está a esposa
dele ali, desmaiada. Tá ali a prima dele de blusa amarela. Olha o desespero da
família, gente. A família no desespero. (voltam as imagem chocantes da matéria).
Isso é lamentável. É o que a droga causa, ou o que as drogas causam nas
pessoas.”
As imagens a que o apresentador se reporta são chocantes e expõem
não apenas o cadáver que está ao solo, mas toda a família que é filmada no
momento em que se depara com o corpo da vítima.
Ao mostrar estas cenas, não apenas o apresentador, mas o veículo em si,
está desrespeitando os preceitos do artigo 5º, X da CF/88, e podem ser
responsabilizados por isso:
Art. 5º (...)
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das
pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral
decorrente de sua violação.
37
Art. 24. São puníveis, nos termos dos arts. 20 a 22, a calúnia, difamação e
injúria contra a memória dos mortos.
Apesar de não ter a força de lei, isto é, de não ser capaz de impelir o
indivíduo a cumpri-lo, o Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros demarca um
norte para a profissão, traçando os caminhos pelos quais o jornalismo comprometido
com a verdade dos fatos deve passar. Servindo, portanto, de divisor de águas entre
o jornalismo sério e aquele que tem como maior preocupação a audiência.
“Meu amigo, minha amiga, pilotar moto, com todo respeito, não é para
todo mundo não. Muitas pessoas têm vontade de ser piloto de motocicleta, mas tem
que ter um dom. Não é fácil não, é complicado. Você tem que ter a noção de espaço
e tempo senão acontece tragédia. É diferente de carro. No carro se você cometer
um erro há mais prejuízos materiais do que a própria vida. O motociclista não,
sempre ele é o para-choque. O rapaz puxou para a esquerda tentou ultrapassar,
como não deu, ele voltou. Pelo o que eu vi foi fratura de pescoço, porque ele estava
de capacete”. Referindo-se as imagens veiculadas.
Afora a vil justificativa que o próprio apresentador cria para a ocorrência
do acidente, falando como se especialista fosse, ele ainda vilipendia a vítima e a sua
família mostrando as cenas do cadáver, e fazendo elucubrações sobre a possível
causa da morte. Agindo assim ele vai de encontro ao que preceitua o artigo 11 do
Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros, analisado precedentemente, bem como
direitos e garantias fundamentais, também já mencionadas anteriormente.
Neste programa há uma peculiaridade, pois além do apresentador,
responsável em chamar as principais matérias, existe a figura, do que podemos
chamar, comentarista de fatos policiais, que tem um quadro e um cenário exclusivos
para falar, sobretudo, de notícias que envolvam crimes e prisões.
O responsável em fazer tais comentários é Anacleto Reinaldo, ou como
ele mesmo se intitula, o Chumbo Grosso, que o faz sem qualquer pudor ou
comprometimento com a informação, utilizando-se de termos grosseiros, palavras de
baixo calão, palavrões, aviltando de várias formas os Direitos Humanos, o que já é
perceptível a partir de sua apresentação no programa:
“Boa tarde Vinícius. Boa tarde João Pessoa. Boa tarde Paraíba. É o
Chumbo Grosso voltando para marretar bandido sem vergonha, para dar pau em
cabra safado. Você que é bandido sem vergonha, ladrão, traficante, maconheiro,
bandido sem vergonha, é pau agora. Aqui é o Chumbo de verdade, o resto é bagaço
que a porca chupa. Sem medo de bandido, sem medo de nada, com a gota serena.
Quer vir, venha. Prepara o lombo para levar pau agora, filhote de corno”.
A seguir, sentado em uma cadeira e em um cenário que imita uma
delegacia de polícia, o apresentador chama a manchete da notícia, que em geral é
muito simples, e em seguida comenta o fato:
43
Art.5º (...)
LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados
em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e
recursos a ela inerentes;
o que nos chama mais atenção neste discurso é o fato de o apresentador fazer
menção várias vezes a violência como saída plausível para dar um basta na
criminalidade. E este discurso acaba sendo, muitas vezes legitimado em razão da
grande audiência que tem esse tipo de programa, conformada em sua maioria por
pessoas com baixo nível de instrução.
É importante salientar que esta conduta do apresentador encontra-se
tipificada no Código Penal como incitação ao crime, disposta da seguinte maneira:
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
apenas eles podem atestar a sua qualidade e decidir o uso que podem fazer dela. A
partir daí é possível quebrar o ciclo vicioso em que a audiência passiva daqueles
que consomem esse produto alimenta a sua subsistência, e vice-versa.
Ademais, o presente trabalho não tem um fim em si mesmo, nem a
pretensão de ser completo, tendo em vista que o conhecimento é algo inesgotável.
Esperamos ter contribuído não para o esvaziamento do tema, muito pelo contrário,
mas para mais questionamentos e indagações a seu respeito, gerando a curiosidade
para a sua continuação e aperfeiçoamento.
A título de encerramento acreditamos que o Jornalismo ético é uma
ferramenta de promoção do Estado Democrático de Direito, da cultura da paz e da
legalidade. A mídia leviana, por outro lado, é um instrumento de desrespeito aos
direitos fundamentais, garantidos pela Constituição Federal e pelo sistema normativo
internacional.
49
6 REFERÊNCIAS
BUCCI, Eugênio. O peixe morre pela boca. São Paulo: Scritta, 1993.
CUNHA, Rogério Sanches. Direito Penal: parte especial. 2. ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2009.
SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 20. ed. São
Paulo: Malheiros, 2001.