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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ANTROPOLOGIA SOCIAL

DIVÓRCIO E FAMÍLIA :
"
A EMERGENCIA DA TERAPIA FAMILIAR NO BRASIL

Tese de Doutorado como exigência parcial para a


obtenção do título de doutor em Antropologia

MARIA LUIZA DIAS

Orientadora: Prof! Dr! PAULA MONTERO

-1999-
AGRADECIMENTOS

Aos casais e famílias atendidos por mim em consultório,


com quem compartilhei a natureza destas experiências, pela
inspiração do tema.
À minha respeitada e querida orientadora, Profl! Dcl Paula
Montero, pela orientação competente, pelo vigoroso estímulo à
reflexão e por ter acreditado na viabilidade desta pesquisa na área da
Antropologia.
Às professoras Cynthia Andersen Sarti e Vera da Silva
Telles e aos professores Jurandir Freire Costa e Márcio Ferreira da
Silva, pela valiosa interlocução no período próximo ao meu exame de
qualificação.
Às professora Tânia Maria José Aiello Tofolo e Yvette
Piha Lehman, pela acolhida no Instituto de Psicologia da USP, para
realização de disciplinas e pelas contribuições.
À presidente do "I Congresso de Terapia Familiar", Drª
Maria Rita Seixas, pela disponibilidade em colaborar durante o
período de pesquisa.
Ao Eduardo, meu marido, pelo amor e apoio.
Aos amigos João Baptista, José Mário, Lucia, Gracinha,
Laura, Anete, Karin e Silvana, que colaboraram em tantas diversas
fases do trabalho com apoio e sugestões.
Às amigas Mirei e Sandra, parceiras constantes de
questionamentos na área da Terapia Familiar.
À CAPES - Fundação Coordenação de Aperfeiçoamento
de Pessoal de Nível Superior - por me conceder uma bolsa de
doutorado que viabilizou a pesquisa, facilitando a realização de
viagens (Gramado e Rio de Janeiro) e a participação em Congressos
e workshops.
SUMÁRIO

PÁG.
Introdução 01

Capítulo 1 - Família e parentesco na perspectiva antropológica. 12

Capítulo 2- Novas estruturas de parentesco no Brasil contemporâneo: 19

• Diversidade e novas composições de família. 24


I - Familia uniparental I mono parental
(ou "singular"). 25
TI- Família composta por casal homossexual: 29
a) Conjugalidade homossexual e preocupações predominantes. 31
b) Gênero e alteridade: temas suscitados a partir da terapia conjugal. 39

Capítulo 3 - Extensão familiar em camadas médias, na cidade


de São Paulo - terapeutas de família e seus clientes: 45

. Fanúlia extensa ("reconstituída"). 46


• Economia dos afetos. 73
• Vida material. 90
• A Terapia Familiar. 93

Capítulo 4 - A emergência das terapias de casal e família no Brasil


-a constituição do campo e suas estratégias: 102

• A emergência da Terapia Familiar. 104


• Nova especialidade de atuação sobre a família no Brasil. 108
• A constituição do campo da terapia familiar no Brasil
e luta concorrencial. 116
• A ABRATEF- Associação Brasileira de Terapia Familiar-
uma grande família! 135
• Mudanças na família e a nova especialidade vista na óptica
dos terapeutas de fanúlia. 145
Capítulo 5 - Casais e famílias no Sistema Judiciário, em São Paulo: 159

• Psicólogos forenses - novo campo de atuação sobre a família. 160


• Os especialistas no Fórum de São Paulo I Varas de Família. 161
• O lugar da criança- vista como arma no duelo entre os ex-cônjuges
-e a proposta forense de retirá-la da "guerra". 164
• A "Casa da Lei" e a busca de regras. 168

Capítulo 6- Novas estruturas de parentesco, gênero e alteridade: 180

• Amor romântico e as novas composições. 181


a) O mito da "alma-gêmea" ou da "cara-metade". 184
b) "Principe e Cinderela - representações desadaptadas. 185
c) A idealização da família. 188

Conclusão 194

Bibliografia · 199

Anexos 211
Índice de Anexos

ANEXO 1 - Propaganda de Tenda Espírita e outros serviços. · 212

ANEXO 2 - Relação das entrevistas realizadas e das atividades gravadas em áudio. 216

ANEXO 3 - Cartão animado para homossexuais. 218

ANEXO 4 - Cartão de Natal para a terapeuta - família dividida. 219

ANEXO 5 - Impresso de workshop com profissional norte-americana, promovido


pelo ITFRJ- Instituto de Terapia de Família do Rio de Janeiro,
que utiliza a expressão "família expandida". 221

ANEXO 6 - Cartão de Dia das Mães para a Mãe-dastra. 222

ANEXO 7- Propaganda com o tema Casamento Perfeito. 223

ANEXO 8 - Propaganda com o tema Terapia de Casal. 224

ANEXO 9 - Propaganda de lençóis. 225

ANEXO 1O - Propaganda de canivete. 226

ANEXO 11 - Propaganda de livros de editora. 227

ANEXO 12 - Capa da revista VIP. 229

ANEXO 13 - Capa da revista desCasados. 230

ANEXO 14 -Foto na Revista Psychology Today- cena com a frase Just Divorced. 232

ANEXO 15 - Artigo sobre loja para descasados. 233

ANEXO 16 - Logotipo do "I Congresso de Terapia Familiar"- um ovo. 234

ANEXO 17- Logotipo do "II Congresso de Terapia Familiar"- um sistema. 236

ANEXO 18 - Logotipo do "III Congresso de Terapia Familiar"- família no globo. 237

ANEXO 19 - "Brasil deitado" . 238

ANEXO 20 - Matéria de jornal intitulada O Homem é Mulherzinha. 239

ANEXO 21- Serviço PAI 24 HORAS. 240


Texto de Sócrates Nolasco entregue a pais.
..
ANEXO 22 - Grupos terapêuticos só para homens 244 ·

ANEXO 23 - Palestra promovida pelo ITFRI- Instituto de Terapia de Família


do Rio de Janeiro. 245

ANEXO 24 - Artigo: Separações aumentam 22% em quatro anos.


Jornal Folha de São Paulo, 04.08.96. 246

ANEXO 25 - Impressos com divulgação de grupos de gênero ("Gender Groups")


promovidos pelo psiquiatra Luiz Cuschnir. 247

ANEXO 26- Capa e propaganda de outdoor da Revista Encontre. 249

ANEXO 27- Variadas matérias sobre o tema da "alma-gêmea" I "cara-metade". 251


Matéria da Revista da Folha -O Homem Ideal. ·

ANEXO 28 - Gráfico de pesquisa realizada pelo ffiOPE, em SP, em 1995. 260

ANEXO 29 - Divulgação do evento sobre o tema Resolução de Conflitos,


com Dora Schnitman, em carta da APTF- Associação Paulista
de Terapia Familiar, aos membros associados. 261

ANEXO 30 -Matéria sobre amor na Internet. 262

ANEXO 31 - Variadas matérias sobre as mudanças nos costumes. 265

ANEXO 32- Propaganda de festival . 289


INTRODUÇÃO

O casamento e a família no Brasil contemporâneo constituem o


foco deste trabalho. O tema da família sempre recebeu o interesse de diversas
áreas do pensamento. A Antropologia, em particular, desde muito cedo, colocou
a instituição familiar no escopo de sua atenção. Embora a família constitua um
objeto clássico nas Ciências Sociais, ela continua desafiando o pesquisador,
colocando-o sempre diante de novos problemas.
Este trabalho dá destaque às novas estruturas de parentesco que
emergiram na sociedade brasileira contemporânea em decorrência das
transformações provocadas por processos de divórcio. Procuramos compreender
como estas novas composições de parentesco são concebidas, por famílias de
camadas médias na cidade de São Paulo. Focalizamos, ainda, como estas
famílias e seus principais dilemas são vistos por uma nova classe de
especialistas - os terapeutas de família - que tanto espaço tem ganho no
cenário das grandes metrópoles brasileiras das décadas de 80 e 90.
É fato que enormes transformações ocorreram na vida doméstica
em virtude da legalização do divórcio no Brasil, em 1977 1, A mudança da
legislação é, por sua vez, um indício evidente de que alterações mais profundas
na estrutura da família brasileira já estavam em franco curso. 2 Estas mudanças
ainda não estão de todo exploradas pela literatura contemporânea.
A radical mudança na composição da família é um fator que chama a
atenção daqueles que presentemente se voltam para o seu estudo. Novas
famílias são compostas por casais (inclusive homossexuais) e pelos filhos das
relações anteriores de um ou dos dois membros do novo casal. Esses novos
arranjos variam em combinações de naturezas diversas, o que nos coloca diante
de constelações familiares muito distantes da clássica família monogâmica que
nos servia de modelo. As conseqüências dessa mudança são muito variadas e
complexas. Em particular, dizem respeito à transformação das relações de
parentesco e das representações destas relações no interior da família.
A possibilidade do divórcio fez surgir, portanto, problemas novos como,
por exemplo, os relacionados à guarda de filhos e à transmissão de herança. O
Direito e a Psicologia criaram um campo para dar uma significação a esse
universo, de modo a tentar contribuir para a normatização da vida familiar. Tais
iniciativas, contudo, acabam por gerar novos dilemas.
1 Sobre a legalização do divórcio, veja Cahali (1983).
2
A lei passou a permitir o divórcio por uma vez~ posteriormente, nova medida estendeu este direito a tantos
divórcios e novos casamentos quanto o homem e a mulher brasileiros desejassem, desde que assumissem
suas responsabilidades legais frente às famílias anteriores.

I
No atual quadro de representações, vemos que o próprio conceito de..
família está em cheque, pois a mudança de valores, o ingresso da mulher no ·
mercado de trabalho, a facilitação do divórcio e o aumento de casamentos
sucessivos têm alterado profundamente sua estrutura afetiva interna.
Uma das dimensões dessa mudança diz respeito à diversificação da rede
de alianças entre afins e sua descendência. Uma família constituída a partir de
núpcias que sejam precedidas pelo divórcio de um casal com filho( s) faz com
que esta criança se relacione com uma complexa rede de novos personagens: a
família anterior- na qual o filho em referência foi gerado-, a nova família do
pai e a nova família da mãe. Há uma tendência da parte dos terapeutas e de seus
clientes por conceber estas relações como se elas funcionassem a maneira de
unidades sobrepostas, já que o modelo de referência recorrente ainda é o da
unidade nuclear. No entanto, como mostramos neste trabalho, essas famílias não
são a simples somatória de unidades monogâmicas. Ao se colocarem em
relação, os membros destas configurações familiares constituem um novo
sistema cuja forma está ainda em gestação.
A partir da experiência cotidiana, um filho pode entender que possua
quatro casais de "avós". É possível, com certeza, depararmo-nos com outras
variações de modelos nesta composição mais ampliada. Nestes grupos, chega-se
ao ponto de, eventualmente, não se saber a maneira a ser empregada para se
dirigir aos novos parentes. Um dos exemplos desta situação diz respeito ao
modo como os filhos devem se reportar aos novos parceiros da mãe e/ou do pai.
Termos como madrinha/padrinho, madrasta/padrasto, mãe-2/pai-2, freqüente-
mente dirigidos aos novos cônjuges do pai ou da mãe, emergiram como
tentativas de preenchimento desta lacuna na nomemclatura de parentesco
disponível. J
A dificuldade em "dar nome" às pessoas indica o quanto os papéis
destes novos elementos não estão nítidos no interior das novas estruturas de
parentesco. Nas palavras de uma terapeuta presente no "I Congresso de
Terapia Familiar": "Na medida em que não tem uma nomeação, cada um vai
inventar o que se faz aí!"
Pessoas situadas nestas novas posições da estrutura de parentesco,
quando se apresentam, podem dar a impressão de estar recorrendo a longas
descrições: "-Eu sou a mulher atual do pai dela"; "-Ela é a mãe da atual esposa
do pai do menino". Este tipo de terminologia que se detém na descrição
detalhada da posição de alguém no parentesco não é recente; ao contrário, já

3 Em inglês adotam-se os termos "step-mother" e "step-father". Esta discussão, evidentemente, é de ordem


mais geral, não se limitando à sociedade brasileira, como bem mostra o filme americano "Os meus, os
teus, os nossos".

2
fora abordado por Morgan (1871) que o chamou de tenninologia descritiva ..
Devemos observar que a ausência de uma nomeação satisfatória e precisa nos
remete a alguns problemas clássicos sobre parentesco, tal como foram
trabalhados, entre outros, por Radcliffe-Brown (1969).
Poderíamos dizer que a ausência de nomes para estes lugares
indica o aumento do número de famílias nas quais os papéis parentais e de
membros agregados são sentidos como confusos - fenômeno mais claramente
identificado a partir do advento do divórcio, uma vez que na sociedade
patriarcal do passado os papéis sexuais e parentais encontravam-se definidos de
maneira bastante nítida. O que se esperava de um homem e de uma mulher, de
um pai e de uma mãe e do lugar de filho era bem delimitado.
Este trabalho tem pois, como objetivo, pensar esta nova
realidade da família brasileira, para compreender, por um lado, os processos de
representação através dos quais tais pessoas concebem seu papel e seu lugar
nestas famílias estendidas e, por outro, as expectativas que alimentam essas
uniões sucessivas. Como dito anteriormente, tentamos também compreender o
modo como essa nova estrutura de parentesco opera, o tipo de sociabilidade por
ela ordenado e as novas representações a ela associadas.
Através desta discussão esperamos compreender os dilemas
vividos pelas famílias contemporâneas, tendo em vista as mudanças ocorridas
em sua composição. As vias de acesso privilegiadas para essa compreensão
foram: a análise do diálogo que estas famílias de camadas médias na cidade de
São Paulo iniciaram com os terapeutas de família, profissionais emergentes
neste período; e o exame do modo como os terapeutas constróem e revêem sua
atuação. As diferentes estruturas de parentesco geradas a partir das
transformações sociais da década de 70 trouxeram, como poderemos ver ao
longo deste texto, novas questões vinculadas aos direitos e obrigações no
interior destes grupos, e, portanto, questões vinculadas ao papel circunscrito às
diversas posições no grupo familiar.
Além disso, estas estruturas recentes provocaram uma
reformulação do próprio referencial técnico de atuação nas áreas de Direito e
Psicologia. Assim este trabalho tem, ainda, um segundo foco: examinar como
estas novas fami1ias fizeram emergir toda uma classe de peritos (psicólogos
ligados às Varas de Família e terapeutas de casal e família) especializados no
atendimento a casais e famílias, treinados para tentar solucionar os novos
dilemas que esta constelação familiar coloca. Procuramos observar como tais
especialistas, ao desenvolverem métodos específicos de intervenção na família,
acabam constituindo parte importante do processo de reconstrução simbólica
que dá sentido ao casamento, que motiva sua dissolução ou alimenta sua
reconstrução. Por este motivo, o discurso destes profissionais também foi
tomado como caminho de acesso às novas representações sobre a família que

3
são gestadas tanto nos serviços de terapeutas de família em consultório4, em São..
Paulo, como no âmbito dos serviços jurídicos da Vara de Família.
A reconhecida diversidade na composição da família brasileira
coloca-nos, ainda, um outro problema: o de saber a que tipo de organização
familiar estamos nos referindo quando falamos da família no Brasil. Embora
consideremos que seja legítimo supor que os dados que encontramos para as
camadas médias de São Paulo possam ser estendidos para setores mais
abrangentes da população, evitamos a noção de um padrão de família brasileiras.
Com relação às respostas terapêuticas para as aflições da
família, elas são muitas e diversificadas. Por esta razão, tivemos que fazer
algumas escolhas. Assim, deixamos de lado os tipos de terapêuticas que,
embora procurem oferecer amparo às questões trazidas por estas famílias, não
se incluem na área da Psicologia oficial. Este é o caso, por exemplo, das
abordagens praticadas nas entidades religiosas ou nos serviços de catormantes,
de especialistas em tarô ou mapa astral. O informe de Tenda Espírita é exemplo
disto, com o chamado: "Trago de volta seu amor em 7 dias." (Veja Anexo 1).
Deste modo, embora reconheçamos a existência de terapêuticas
alternativas empreendidas por um conjunto de especialistas, que poderíamos

4 Em certos casos, famílias que procuram clínicas de Universidades podem estar sendo consideradas, no
discurso dos terapeutas entrevistados, uma vez que muitos possuem algum tipo de vínculo com cursos de
especialização.
5 Existem autores, que através do recurso estatístico, procuram encontrar um padrão demográfico para a
família brasileira. Bruschini (1986), por exemplo, procurou elaborar um retrato da família brasileira, em
sua tese apresentada no Departamento de Ciências Sociais da USP. Neste trabalho, a autora tenta uma
versão, baseada em dados dos censos de 60, 70 e 80. Segundo ela, a família brasileira poderia ser retratada
a partir das seguintes características:
• Existe uma tendência à nuclearização. O tamanho médio da família brasileira vem diminuindo. Em 1960,
uma família era composta, em média de cinco elementos. Em 1980, diminuiu para 4,4 elementos por
família;
• Neste período, cresceu o número de famílias e diminuiu seu tamanho médio;
• É possível observar uma diminuição de casamentos religiosos e um aumento de uniões apenas civis.
Também ocorreu um aumento significativo no número de uniões livres; ·
• Cresceu o número de mulheres chefes de família, sobretudo solteiras, gerando novas unidades, em geral
menores, tanto pela ausência do cônjuge quanto pela menor fecundidade, próprios das mulheres solteiras e
em uniões livres;
• Predominam famílias chefiadas por mulheres em etapa mais avançada do seu ciclo vital, já com filhos em
idade superior a 15 anos;
• Os chefes de família tendem a ser ligeiramente mais velhos que as cônjuges (enquanto os homens têm
entre 30 e 45 anos, as mulheres têm entre 25 e 45 anos);
• Ocorreu um aumento da participação feminina na força de trabalho na década de 70, sobretudo entre
mulheres casadas e com filhos pequenos;
• Em termos da relação entre o núcleo familiar e a esfera produtiva, através da participação dos vários
membros das famílias em atividades econômicas, observa-se que as famílias nucleares dependem do
trabalho do chefe da família, do filho maior de 18 anos e, em seguida, do cônjuge feminino.

4
denominar de "peritos em família" ou "peritos do amor", ponderamos que..
explorar essas possibilidades nos obrigaria a enveredar por outros universos de
valores e representações. Tais perspectivas nos afastariam das instituições que
consideramos cruciais no terreno que estudamos, pois que lhes atribuímos
enorme poder normatizador: as terapêuticas psicológicas e o campo judiciário.
Por uma necessidade prática de demarcar o espaço de pesquisa,
concentraremos a atenção nos terapeutas de casal e família, cujo movimento
procuramos acompanhar, através do nascimento da ABRATEF- Associação
Brasileira de Terapia Familiar no "I Congresso de Terapia Familiar" Gulho 94).
Optamos, então, por analisar a atuação deste segmento específico de
especialistas, uma vez que o consideramos particularmente importante na
decifração e também na construção desse novo tipo de família.
Embora as mudanças na constelação familiar tenham atingido de
maneira diferenciada todas as classes sociais, nosso universo de observação
restringiu-se a famílias estendidas cujo poder aquisitivo possibilitava a
existência de uma demanda por esse tipo de terapia. Era sobre essa população
que tínhamos dados de melhor qualidade, capazes de permitir um maior
aprofundamento dos aspectos que queríamos abordar. Tendo considerado a
possibilidade de outros caminhos metodológicos, optamos ainda por focalizar a
família estendida através do atendimento psicológico em consultório,
acreditando que este tipo de atendimento funcione como uma rica fonte de
acesso à intimidade e à natureza dos conflitos vividos por estas famílias.
Avaliamos que através de entrevistas formais não obteríamos uma apreensão tão
rica da natureza deste universo simbólico. O atendimento psicológico em
consultório pareceu-nos, portanto, um caminho particularmente estratégico para
compreendermos, o que está acontecendo na vida familiar contemporânea.
Ao final deste trabalho, é possível verificar que a análise do
discurso da categoria profissional contemplada por esta pesquisa nos conduz a
temas mais amplos6 e importantes vividos nesta experiência da extensão
familiar. É possível que tais temas fossem, em algUma medida, percebidos
através do estudo das atividades de todo e qualquer tipo de perito7 consultado
para estas questões, mas, provavelmente, ·não o seriam com o mesmo grau de
clareza. De qualquer modo, podemos inferir que a natureza do dilema vivido por
tais pessoas independe dos meios terapêuticos procurados - estes, na condição
de opção, parecem depender do nível sócio-econômico ou dos grupos de
referência e de pertencimento de cada pessoa, conforme sua inserção social.

6
Por exemplo, o tema da persistência da ética do amor romântico, nos dias atuais, que será analisado no
capítulo 6.
7 Médium espirita., cartomante, terapeuta, médico psiquiatra etc.

5
Ainda assim, as alternativas terapêuticas mereceriam um estudo mais detalhado, .
o que, entretanto extrapola o escopo deste trabalho.

***
Inspirado na noção durkheimiana de representação 8, este
trabalho busca compreender como as pessoas se concebem dentro da sociedade
e como concebem o mundo ao seu redor.
O conceito de representação social tem sido amplamente
utilizado em várias disciplinas e teve particular influência na Psicologia Social.
Serge Moscovici (1988), um dos seus principais expoe~tes, compreende o
conceito de representação social como um processo de construção da realidade,
isto é, como formas de pensar o social e de se apropriar do mundo exterior que
contnbuem para definir um grupo. Assim, as representações sociais constituem
o instrumento através do qual o indivíduo ou o grupo apreende seu ambiente no
nível das estruturas sociais acessíveis. Os "conjuntos de conceitos, afirmações e
explicações" se apresentam, segundo o autor, como verdadeiras "teorias"
construídas pelo senso comum.
É nesta linha de reflexão que este trabalho se orienta. Ao longo
deste trabalho, procuramos apreender o modo como tais especialistas e seus
clientes se concebem e entendem o mundo das relações amorosas, visto através
do casamento, do divórcio e da extensão familiar. Como o horizonte deste
trabalho é, através de um estudo das representações, analisar o casamento, o
divórcio e a extensão9 familiar em camadas médias da cidade de São Paulo a

8 Utilizaremos, neste trabalho, a noção de representações sociais, inicialmente introduzida por Émile
Durkheim (1898). Diz ele que uma sociedade é constituída, "antes de tudo, pela idéia que ela faz de si
mesma" (1989: 500). Segundo este autor, os conceitos e as noções presentes na linguagem e no diálogo
entre os homens são produtos de .elaboração coletiva. Assim, o individuo esforça-se por assimilar esse
sistema de noções para "poder se entreter com os seus semelhantes". Lembra, ele, que cada individuo "as
vê à sua maneira". Acreditava, portanto, que as representações coletivas impunham-se aos "espíritos
particulares" e diz: "O indivíduo se dá conta, pelo menos obscuramente, que acima de suas representações
privadas existe um mundo de noções-tipos pelos quais é obrigado a regular as suas idéias" (1989: 515).
Durkheim pretendia, através do conceito de representações (individuais/coletivas), compreender os
fenômenos mentais, a maneira segundo a qual eles se produzem, se reproduzem e se modificam. A vida
psíquica seria, com isso, um curso contínuo de representações que se interpenetram - imagens e idéias que
agem entre si. E a vida representativa teria sua gênese, portanto, no pensamento lógico. Introduzindo as
noções de representações coletivas e de representações individuais, Durkheim chamava a atenção para as
categorias fundamentais através das quais o homem ordena seu mundo. Novas visões surgiram
posteriormente tentando superar a dicotomia durkheimiana entre individual e coletivo e passou-se a
chamar tais processos de pensamento simbólico.
9 O termo extensão foi utilizado, na literatura das Ciências Sociais, para designar a situação do grupo
familiar, por ocasião da inclusão de membros agregados (filhos bastardos ou afilhados, por exemplo).

(continua)

6
partir dos anos 70, cremos ser pertinente articular estes temas à emergência dos.
terapeutas de casal e família no Brasil. Isto porque avaliamos que estes
personagens não apenas fornecem pistas extremamente relevantes para a
compreensão da demanda destas famílias no mundo atual, mas também têm
atuado como importantes coadjuvantes da construção deste universo.
O capítulo I enfatiza a importância de um estudo sobre a família
contemporânea, uma vez que as novas composições geradas a partir das
transformações sociais decorrentes dos casamentos sucessivos, possibilitados
pelo advento do divórcio, engendraram novos dilemas. Recorremos à literatura
antropológica, demonstrando como ela poderá nos auxiliar na compreensão
destes novos sistemas de parentesco. Abordamos também a desorganização da
parentela, a busca de nomeação para os novos parentes e, portanto, de uma
significação para o lugar social de cada membro no interior destes grupos - e,
então, de uma definição dos direitos e obrigações pertinentes às diversas
posições na estrutura de parentesco. Estes temas tornaram-se nucleares para a
compreensão da natureza das questões que enfrenta a família atual.
O capítulo 2 apresenta um breve panorama sobre a família
brasileira conforme é vista nos trabalhos já desenvolvidos por outros
pesquisadores e, também, na óptica que os terapeutas a apresentam. Neste
capítulo, mencionamos a presença, no Brasil, de novas estruturas de parentesco
que se distanciam do modelo tradicional monogâmico. Estas configurações
trouxeram novas questões vividas pelas famílias na experiência da extensão
familiar.
Apresentamos ainda algumas considerações acerca do fenômeno
do casamento, do divórcio e da extensão familiar no Brasil, focalizando duas
das composições de família existentes na atualidade: a família uniparentall
monoparental ou "singular" (uma única figura parental com filhos) e a fann1ia
composta por casal homossexual. A família estendida ou "reconstituída" 10 é
focalizada à parte no capítulo seguinte, pois a ela pretendemos dar maior
destaque, já que acreditamos que é este tipo de configuração que expressa com
maior clareza~ os dilemas vinculados aos novos sistemas de parentesco. O
capítulo introduz também o modo como tratamos a família pós-divórcio,

Tempeutas de família têm-se utilizado do tenno fanúlia estendida ou extensão familiaF, no sentido da
ocorrência de uma ampliação do grupo. Optamos, neste trabalho, pela utilização desta denominação, já
que alguma opção teria que ser feita, e esta, era a que mais se aproximava do tipo de compreensão que
estamos tendo desta organização de grupo doméstico. Outros termos poderiam ter sido adotados, como,
por exemplo, família ramificada, sobreposta ou paralela. A anâlise destes termos utilizados por terapeutas
de família é realizada no capítulo 3, quando trataremos, mais especificamente, das questões concernentes
à nomeação nestes grupos.
10 Estes termos, utilizados aqui entre aspas, são os empregados por terapeutas.
compreendida como uma rede relacional que configura um sistema.
Este tema é aprofundado, então, no capítulo 3, quando
analisamos o modo como os membros destes grupos concebem e descrevem
seus principais dilemas. Como adiantamos, nesta parte do trabalho damos
ênfase à família estendida, como uma estratégia metodológica, já que
acreditamos ser este o tipo de composição que melhor expressa as questões que
se instalaram com a lei do divórcio. Embora o contexto observado restrinja-se a
uma faixa da população da cidade de São Paulo, acreditamos que os aspectos
encontrados possam ser representativos e, por esta razão, generalizáveis à
experiência da extensão familiar em outras cidades brasileiras e outros
segmentos sociais.
No capítulo são analisados os discursos de clientes em processo
de terapia familiar desenvolvida em consultório, pois consideramos ser esta a
fonte mais rica de acesso à natureza dos dilemas que pretendemos investigar
neste trabalho. Observamos que, sobretudo para famílias de camadas médias, os
consultórios particulares se transformaram na arena de negociação de questões
para as quais os métodos ou normas tradicionais já não são eficientes, uma vez
que a família extensa requer uma nova definição de regras, o que ainda está em
gestação.
O capítulo 4 trata do desenvolvimento do Movimento da Terapia
Familiar em nosso país, visto como decorrente da nova demanda que emergiu
com as consecutivas separações conjugais, com as transformações na família
advindas destes divórcios e, ainda, com a entrada do Movimento da Anti-
psiquiatria, no Brasil. Procuramos mapear e analisar a fundação das primeiras
associações da classe profissional e o desenvolvimento dos · primeiros
Congressos. Tomando como ponto de partida a idéia de que a vida material e
afetiva nestes grupos ancora-se na experiência da cotidianidade, ou seja, no
modo como a família administra as vivências no tempo e no espaço do convívio
- constatamos que a experiência do divórcio trouxe questões a serem ordenadas,
no dia-a-dia. Neste contexto, verificamos que as questões são percebidas como
sendo de ordem complexa. Administrar o tempo e o espaço na família ampliada
requer o estabelecimento de normas. Esta necessidade é, em geral, vivida pelas
diversas posições na família como uma tarefa pouco simples.
Adotamos alguns conceitos de Bourdieu (1974/1989) para a
análise da constituição do campo da Terapia Familiar e das estratégias utilizadas
pelos especialistas para gerar um mercado lucrativo. Analisamos alguns
aspectos relativos a este "perito em consertos" - este "reparador" ou "co-
construtor" - que a sociedade brasileira da década de 70 fez nascer.
Observamos, no capítulo, como a necessidade de se lidar com o novo sistema
gerado na família, em virtude dos novos casamentos, instalou uma disputa pela
construção de um discurso que desse conta de uma redefinição e de uma

8
reordenação dos direitos e obrigações, no interior destes grupos.
No capítulo 5 vemos como este enredo se atualiza no Judiciário
através dos processos abertos nas Varas de Família. A abertura destes processos
indica, em si mesma, a configuração de situações extremas nas quais a arena de
negociação já convocou o espaço da lei, através da presença do juiz, numa
tentativa de ordenar ou dissolver os impasses vividos por estas familias. As
novas questões suscitadas pela experiência da extensão familiar instalaram no
Sistema Judiciário uma preocupação expressiva com o bom desenvolvimento da
prole, com o apaziguamento dos casais em conflito e com a preservação de seus
direitos materiais.
Diante dos novos problemas vividos pela família estendida, o
Judiciário recorreu à especialidade da Psicologia, vista pelos juizes como a área
de competência para avaliar e diagnosticar a situação emocional e psíquica dos
membros da família. O jurídico assessorou-se na Psicologia para reunir
elementos que o orientasse na tarefa de distribuir os direitos e as obrigações
nestas composições, levando em consideração a estrutura emocional dos
indivíduos no grupo familiar.
No Fórum, normatizar a vida em família é algo visto como
missão premente. Assim, os especialistas são chamados a instrumentar os juízes
na tomada de decisões sobre a família através de laudo técnico. Decidir sobre a
guarda de filhos ou garantir critérios para a transmissão de herança, por
exemplo, constituem em questões importantes.
Além das áreas previamente existentes - por exemplo, o
trabalho do assistente social -, o juiz passou a ancorar sua decisão, também na
avaliação do psicólogo acerca dos aspectos emocionais dos indivíduos
envolvidos e da estrutura psíquica do grupo familiar. O diagnóstico psicológico
ganhou espaço de forma a orientar o juiz em questões que o conhecimento de
sua área- os dispositivos legais- não poderia suprir. O psicólogo, através de
seus conhecimentos em Psicologia do Desenvolvimento, veio a ser identificado,
então, como aquele que poderia indicar o melhor contexto em prol do bom
desenvolvimento da prole dos ex-cônjuges em conflito. Isto porque a principal
meta no Fórum é vista pelo Poder Judiciário como sendo a de simultaneamente
retirar os filhos da guerra conjugal e ordenar um espaço de convívio que os pais
são considerados sem condição de estabelecer por si próprios para, com isto,
solucionar os conflitos.
Conforme argumentamos ao longo do capítulo, o laudo
psicológico, resultado da perícia na família, tem por objetivo, como veremos,
auxiliar o juiz na determinação da sentença final do processo. Deste modo, o
psicólogo passou a assessorar o juiz na definição de direitos e obrigações no
interior destes grupos, assumindo, com isso, também uma função normatizadora.
Todos os envolvidos neste processo instalado no Judiciário participam da busca

9
de uma nova ordenação das relações no espaço da família. Na ocasião de um _
divórcio, os especialistas reiteradamente mencionam a necessidade de
"proteger" as crianças da "guerra" que acreditam ter-se instaurado entre o casal.
Esta se mostrou ser uma das principais preocupações encontradas na atmosfera
do jurídico e pareceu ter sido o grande motivador da entrada do psicólogo como
perito nas Varas de Família.
Discutimos no capítulo 6 alguns aspectos importantes encon-
trados neste conjunto das representações sobre os fenômenos e mitos acerca do
casamento, do divórcio e da extensão familiar. Observamos, por exemplo, a
constante presença da "fantasia de completude" em diversas vertentes destes
discursos 11 e, por vezes, percebemos a terapia do especialista sendo vista como
o veículo através do qual se obteria tal resultado. Nesta direção, constatamos
uma resistência, por parte dos clientes e dos próprios peritos, em conceber a
família extensa como um sistema relacional, como uma única rede de parentes,
já que esta visão é contraditória com a apresentada pelo modelo romântico,
ainda subjacente no discurso dos clientes.
Neste capítulo encaminhamos a conclusão deste trabalho a partir
de uma discussão a respeito das novas estruturas de parentesco (nascidas das
transformações já mencionadas) e das metas idealizadas pela família atual. No
capítulo é desenvolvida uma reflexão sobre comportamento de gênero e o
declínio da alteridade. Nossa argumentação é a de que na atualidade
presenciamos a tendência contemporânea a exigir do outro ser o seu próprio
espelho. Nesta linha, observamos a constituição de um dilema central em tomo
de uma ampla discussão a respeito das estruturas de parentesco vigentes 12 e da
maneira como estes novos sistemas se confrontam com o ideal do amor
romântico, que subliminarmente persiste e se recria no mundo contemporâneo.
Mais que isto, observamos um movimento de resistência à nova imagem da
família como um sistema ampliado, com o que é instaurada uma dissonância
entre o que na realidade se pode viver e aquilo a que se aspira em função do
modelo de referência presente das representações do grupo familiar.
Cabe esclarecer que o universo das observações empíricas
focalizado neste trabalho é composto por 13 entrevistas com terapeutas de casal
e família, gravação de diversos eventos (relativos aos temas de interesse
tratados neste trabalho) do "I Congresso de Terapia Familiar" - ocorrido em
julho de 94, em São Paulo e gravação do Pré-Encontro do evento
Desenvolvimentos em Psicoterapia Familiar, realizado no Hotel Maksoud

11 Neste sentido, o novo casamento pode carregar a significação de ter sido um engano, (já que não
correspondeu às metas idealizadas a princípio) como é visto no capítulo 3.
12 Reconhecidas, legitimadas ou não, na atualidade.

10
Plaza, em São Paulo, de 29 de junho a 02 de julho de 1995. Foi também
utilizado o discurso de clientes em psicoterapia, que no ano em que foram feitos ·
os registros sistemáticos das queixas, alcançou uma rede de pelo menos 20
famílias.
Foram realizadas, ainda, entrevistas com 4 psicólogos, 3
assistentes sociais e 2 juízes, no Fórum de São Paulo. Embora a amostra de
psicólogos entrevistados no Fórum não seja significativa, adicionamos à análise
realizada no capítulo 5 minha experiência em supervisão a psicólogos forenses
envolvidos em processos de peritagem durante a década de 90. Também
constitui material de pesquisa e reflexão minha experiência como docente em
cursos ministrados a equipes de psicólogos e assistentes sociais que têm atuado
em Varas de Família no mesmo período.
Foram as diversas narrativas deste conjunto de protagonistas,
que nutriram este trabalho. Os entrevistados compuseram o conjunto de
personagens através dos quais tentamos extrair o mundo de representações que
organiza os fenômenos aqui analisados. 13

13 Através das entrevistas, isto é, através das falas destes peritos e de seus clientes, procuramos conhecer o
mundo do casamento, do divórcio e da extensão familiar em nossa sociedade. Do mesmo modo foram
tratadas as narrativas dos peritos, colhidas através da gravação de eventos do "I Congresso de Terapia
Familiar" (julho/1994) e do "Encontro" ocorrido no Hotel Maksoud Plaza (junho/julho 1995). Tais
discursos são analisados no seu conjunto. Veja a relação das entrevistas realizadas e das atividades
gravadas em áudio no Anexo 2.

11
CAPÍTULO 1

FAMÍLIA E PARENTESCO

NA PERSPECTIVA ANTROPOLÓGICA

"De fato, presos a uma única cultura,


somos não apenas cegos à dos outros,
mas míopes quando se trata da nossa".

François Laplantine(1991a: 21)

As relações de gênero, o casamento e a constituição da família,


sempre foram tratados como temas relevantes pelos pesquisadores das Ciências
Sociais. São, na verdade, questões importantes no pensamento humanístico,
notadamente a partir do século XIX. Estes temas foram tratados por muitos
autores sob diferentes perspectivas 14, com o intuito de revelar a estrutura e a
14 Desde Tylor (1912), a família foi abordada como um problema fundamental para a compreensão da
sociedade humana. O evolucionismo, como se sabe, via a sociedade como uma evolução de três estágios
consecutivos - selvageria, barbárie e civilização. Para os evolucionistas, se as sociedades podiam ser
classificadas num continuum de evolução, também possuíam composições familiares peculiares aos
diversos estágios. Tylor tratou do tema da família demonstrando como a exogamia correspondia à
modalidade primitiva da "aliança" e da autoconservação política Segundo este autor, nas tribos de "mais
baixo nível cultural", o matrimônio funcionava como um meio de assegurar "alianças permanentes". Tylor
enfatizou o valor da troca de mulheres para a sobrevivência nestes grupos. Para ele, era a exogamia que
permitia que uma tribo se mantivesse ainda em constante crescimento, graças aos repetidos matrimônios
entre seus clãs. Esta idéia permanecerá subjacente em muitos outros estudos sobre o parentesco que
entenderam a aliança matrimonial entre os grupos como a chave da estrutura social primitiva e será
retomada, mais recentemente, por Lévi-Strauss (1982) em suas análises sobre a aliança.
Dentre os autores evolucionistas, é Morgan (1871) que se dedicará mais largamente ao tema da família.
Assumindo os pressupostos básicos do evolucionismo, cria uma seqüência de evolução para as diversas
composições de família encontradas por ele em seus estudos. Interessava-se por levantar as formas
matrimoniais que teriam existido e que explicariam os sistemas de parentesco encontrados. Assim Morgan
formula uma seqüência de tipos de família que corresponderia aos diversos períodos étnicos: a
consangüínea, a punaluana, a sindiásmica ou por pares, a patriarcal e a monogâmica. Ora, para este
autor, compreender a evolução da sociedade era compreender o modo como diferentes tipos de família se
sucederam: a família monogâmica era concebida por Morgan como o resultado da lenta evolução de três
estágios sucessivos de desenvolvimento: a família consangüínea (baseada no matrimônio recíproco entre
irmãos e irmãs no interior do grupo); a família punaluana (que alargando a proibição do incesto -
restringia o casamento de várias irmãs com os maridos de cada uma das outras, ou vice-versa, ao
casamento de vários irmãos com as esposas de cada um dos outros); a família fundada no casal (a
proibição é ainda mais reforçada, restringindo a possibilidade do casamento a até dois indivíduos de cada
vez). A família monogâmica seria uma derivação deste último estágio. Assim, quanto menor o número de
proibições, na escala conjugal, mais arcaico o modelo. Nesta linha de raciocínio, a família baseada no

12
natureza destes vínculos, em diferentes culturas. A Antropologia, tendo que.
articular as contradições entre diversas culturas com a afirmação da
universalidade da natureza humana, foi desde seus primórdios sensível à
diversidade dos arranjos da familia.ts
Assim, a família e suas representações constituíram importantes
pilares da constituição e do desenvolvimento da Antropologia como disciplina.
O que os clássicos nos legaram foi retomado de diversas maneiras pela literatura
contemporânea, que procurou dar conta das transformações da família no
mundo posterior à II Guerra Mundial. No caso da sociedade brasileira, esse
tema começou a ser tratado com mais evidência pelos antropólogos, há apenas
algumas décadas.
A abordagem que privilegia o estudo das representações toma-
se particularmente importante quando se quer compreender as ressignificações
das relações familiares em períodos de transição, tal como o atual. No contexto
brasileiro contemporâneo, a família é freqüentemente percebida como se
estivesse se desdobrando em sobreposições múltiplas. A nova família formada a
partir da possibilidade legal do divórcio e da contração de novos casamentos
trouxe consigo novas questões, relacionadas às fronteiras do grupo familiar e
aos papéis dos indivíduos no seu interior. Tais questões aguardam o olhar da
Antropologia.
A família foi, como dissemos, um tema clássico da Antropologia

matrimónio monogâmico não poderia ser encontrada numa sociedade selvagem.


A humanidade evoluiria, com isso, do "incesto e da promiscuidade" das primeiras composições de família
à coabitação exclusiva, como fonna mais elaborada e superior da relação entre homem e mulher. Ter-se-
iam, então, formas diferentes de matrimônio e, portanto, de parentesco, que se sucederiam, fazendo a
passagem da sociedade de uma condição inferior para uma condição mais elevada. Apresentando
diferentes sistemas de parentesco, Morgan supunha a recorrência de determinados fenômenos, reeditados
repetidamente na história da humanidade. Mesmo detenninados fenômenos encontrados em sociedades
em estágios mais avançados poderiam ser compreendidos como "sobrevivências" de formas anteriores de
conduta, mais primitivas.
15 Independentemente da fragilidade da interpretação evolucionista do século XIX, parece-nos importante
ressaltar que, ao organizar a "história" da família, em três estágios, Morgan (1871), de alguma forma,
reconhecia a diversidade cultural na ordenação da fanúlia. E mais do que isso, a Antropologia de então
aplicava o conceito de família de forma a nele incluir relações de casamento bem distantes do modelo
ocidental. Morgan foi também o primeiro a perceber que a terminologia utilizada na denominação das
relações de parentesco compunha um método de classificação. Tendo sido um dos precursores dos estudos
sobre o parentesco, auxiliou a formular uma terminologia e a instaurar um debate importante e atual sobre
as conexões entre numerosas formas de casamento e outras instituições sociais. Estava correto quanto à
importância da terminologia do parentesco, apesar de partilhar dos demais problemas metodológicos da
corrente evolucionista. Toda sua teoria antropológica sobre casamento, família e parentesco tem por base
uma teoria sobre a composição de gens, fratrias e tribos. Segundo o autor, uma gens é um "conjunto de
consangüíneos, descendendo de um antepassado comum, distingüindo-se pelo nome de sua gens e unidos
por laços de sangue". Uma fratria é "uma associação entre duas ou mais gens da mesma tribo, com vista à
realização de determinados fins comuns". Acreditava que uma tribo caracterizava-se por um nome, uma
língua própria, um governo e um território. As tribos podiam existir sem fratrias, mas não sem gens.

13
e um problema nuclear para a disciplina. O estudo das sociedades sempre..
passou de um modo ou de outro pelo estudo desta "célula-mater", uma
vez que os antropólogos sempre puderam documentar a existência de alguma
forma de família em todas as sociedades. Os estudos sobre parentesco e família
constituíram um dos domínios centrais e tradicionais da disciplina. A
diversidade na organização da .família em diferentes culturas .demonstrou como
o padrão familiar, tal como o concebemos na sociedade ocidental, não era
universal. Coube à Antropologia explicar esta variação. 16 Naturalmente que os
modelos teóricos anteriormente adotados têm sido substituídos por novas formas
de pensar a sociedade em suas relações socioculturais. Dentre estas novas
perspectivas, todas as abordagens que se dedicaram à pesquisa e à análise dos
elementos representacionais existentes na produção simbólica de grupos em
quaisquer das esferas da vida social foram consideradas de grande utilidade para
o encaminhamento deste trabalho.
Procedemos, então, neste estudo, à pesquisa e à análise dos
elementos representacionais encontrados nos discursos dos terapeutas e de seus
clientes sobre a família, o casamento e o divórcio. O trabalho de pesquisa
possibilitou que constatássemos que um dos grandes dilemas da família
envolvida em divórcio e novo casamento, refere-se à definição de direitos e
obrigações dentro do grupo familiar ampliado. Tal dilema diz respeito à
necessidade de delimitar as fronteiras do grupo e o lugar social das pessoas no
seu interior. Observamos que o advento do divórcio no Brasil teve por
conseqüência :uma mudança na concepção sobre a parentela e na forma de
organização e•estruturação desta rede de relações. O código social vinculado à
família monogâmica já não se presta mais como referência para a família
constituída através dos casamentos sucessivos, quando estão implicados filhos
de diferentes uniões.
Deste modo, o casamento e as relações de parentesco, em
diversas composições sociais, foram temas que mereceram a atenção de muitos
estudiosos, ao lado de tantos outros assuntos, como: a religião, a arte, a
economia, a tecnologia etc. É importante salientar que o tema da nomeação, tão
expressivamente ressaltado pelos terapeutas 17, vem acompanhando a
16 Parece-nos, portanto, que essa disciplina, pelo valor central que deu ao problema da família na
compreensão das sociedades e pela sensibilidade que desenvolveu na interpretação de seus mais diferentes
arranjos culturais, fornece-nos os meios adequados para que possamos repensar o problema da familia nas
sociedades contemporâneas.
17 A própria literatura da terapia de casal e família tem procurado termos para nomear estas novas famílias.
Primeiramente os termos "família recomposta" e "recasamento" foram utilizados. O termo "recasamento",
provavelmente traduzido do inglês "remarriage", na versão em português pode deixar a entender que o
mesmo casal se casou novamente - problema observado em entrevista realizada por mim com um juiz no
Fórum de São Paulo, que assim entendeu o termo. Atualmente é mais freqüente encontrar-se a utilização
do termo "família reconstituída".

14
Antropologia desde o início da constituição da disciplina. 18 Vale a pena, por .
isso, retomarmos rapidamente esta trajetória. ·
Desde Morgan (1871) com os sistemas de consangüinidade e
afinidade até As Estruturas Elementares do Parentesco de Claude Lévi-
Strauss19 (1982), a sociedade foi concebida como tendo nascido a partir da
proibição do incesto. Esta é a perspectiva que orienta os antropólogos quando se
dedicam à análise de sistemas de parentesco e regras matrimoniais. No entanto,
dentre o conjunto de autores que se ocuparam da família, Radcliffe-Brown
(1989) é aquele que mais de perto nos interessa neste trabalho pelo fato de ter
chamado a atenção para a importância dos nomes dados aos lugares dentro de
uma estrutura de parentesco. Para este autor, os nomes constituem a chave para
a decodificação do lugar social e das relações entre as pessoas. As conexões
entre parentesco e organização social foram, portanto, temas a que deu ênfase e,
por isso, na análise do parentesco buscou princípios gerais. 20
Radcliffe-Brown demonstrou como os termos utilizados para
denominar os parentes, carregam uma significação social e indicam o método de
ordenar os relacionamentos. Dito de outro modo, o autor demonstra que os
termos usados revelam as normas sociais, a maneira como as pessoas
envolvidas em determinada relação de parentesco devem se reportar uma às
outras. 21
l8 Uma terminologia diversificada nasceu da tentativa de dar conta dos fenômenos que os antropólogos
procuravam explicar e, neste sentido, especificamente novos termos foram gerados no domínio do
parentesco, como: exogamia e endogamia, primos cruzados e primos paralelos, entre outros.
19 O estruturalismo de Lévi-Strauss (1980) também tratou a família como o fundamento da vida social. Em
seu artigo de 1956, A Familia, este autor, embora critique o evolucionismo biológico, do inicio do século,
procura estabelecer em outras bases a universalidade da família. Segundo ele, o que varia são os tipos de
família e casamento, e isto porque o casamento diz respeito à aliança entre grupos (família, linhagens ou
clãs) e não a indivíduos. Para Lévi-Strauss, a fanúlia não é, portanto, um fenômeno que diz respeito à
ordem do biológico, da reprodução humana, mas sim da reprodução da sociedade e o tabu do incesto
desempenha papel importante na reprodução da vida social, uma vez que garante a troca de mulheres e
torna as famílias, interdependentes. Deste modo, o tabu do incesto seria a regra universal que garantiria a
permanência da família no domínio da cultura. No estudo das estruturas de parentesco, Lévi-Strauss
aborda inúmeras questões relacionadas à família, explicando o "avunculado", que constitui numa relação
de obediência e profundo respeito entre tio matemo e o sobrinho uterino; o casamento entre os primos
cruzados etc. Através do estudo da família ter-se-ia acesso, então, às estruturas simbólicas do pensamento
social.
20 Assim o fez ao estudar os andameses, os australianos e outros. Referindo-se à Radcliffe-Brown, Melatti
(1978: 18) afirma: "Ao invés de considerar o costume do casamento com a filha do irmão da esposa como
causa da terminologia omaha, ele considera a ambos os costumes como aplicação do princípio de
linhagem." Portanto, o papel do irmão da mãe de um homem, segundo Radcliffe-Brown, tinha sua função
em um sistema de parentesco que possuía um dado tipo de estrutura.
21 Radcliffe-Brown (1978) questionou o conceito de "sobrevivência", erigido pela perspectiva evolucionista,
em seu artigo "O irmão da mãe na África do Sul". Nele, refutou as idéias de Junod, que defendia que este
costume correspondia a uma "sobrevivência de estágio anterior patrilinear". Demonstrou seu método de
análise focalizando a relação entre o irmão da mãe e o filho da irmã (tio e sobrinho). Os costumes e as
relações que eles expressam são vistos por este autor como parte de um sistema no qual estaria postulado
que o irmão da mãe opor-se-ia à irmã do pai. Neste costume, os irmãos do pai seriam tratados como se
fossem pais e as irmãs da mãe como se fossem mães. Assim, a identidade do grupo de irmãos seria um dos

15
Assim, Radcliffe-Brown mostra como os termos carregam uma..
significação social que comporta métodos prescritivos de ordenação dos
relacionamentos dentro do sistema mais amplo. Segundo ele (1989: 21): "Os
componentes ou unidades de uma estrutura social são as pessoas e uma pessoa é
um ser humano considerado não como um organismo mas tendo uma posição
numa dada estrutura social". Inspirando-nos nessa perspectiva, podemos dizer
que o aparecimento de novos elementos no grupo familiar estendido, ocasionou
uma desorganização da concepção tradicional sobre a parentela no Brasil. A
falta de termos, a serem utilizados para os novos parentes, mostra como os
velhos e novos lugares no grupo da família requerem novo mapeamento.
A despeito da critica que aponta para os problemas ligados à
perspectiva culturalista de Radcliffe-Brown, sobretudo no que diz respeito ao
enfoque de cada cultura como um sistema integrado e o sub.seqüente estudo das
funções de costumes, instituições e crenças como atributos internos destes
sistemas, avaliamos que o autor em pauta22 legou-nos idéias interessantes a
serem consideradas quando focalizamos a transformação da família e os
sistemas de parentesco contemporâneos. A pertinência destas idéias é reforçada
principalmente quando pensamos que a ausência de termos para nomear estes
novos lugares liga-se à dificuldade de se compreender quais são os significados
atribuídos a estas posições, o que fala a favor, portanto, de uma precariedade
denunciadora de impasses e hesitações em saber como se comportar no interior
destas novas unidades .de grupo familiar. Unidades estas que, muitas vezes
sequer estão elas mesmas nomeadas.
No "I Congresso de Terapia Familiar", realizado em São Paulo

princípios de classificação de parentes. Deste modo, a nova versão sobre estas sociedades, que tratava a
tia materna como uma mãe e a tia paterna como se fosse um "pai feminino", trouxe uma descoberta
significativa: seria possível construir um sistema buscando a relação entre as diferentes posições neste
sistema. O sistema de parentesco passa a ser compreendido, então, como um sistema de representações
que seria estruturante da ordem social. Nasce, com isso, uma nova forma de análise do sistema de
parentesco. Ao invés de se entender a identidade de um grupo de irmãos como uma "sobrevivência" de um
grupo de irmãos, Radcliffe-Brown tratou este fenômeno como sendo um sistema de identificação,
independentemente do grupo de irmãos "anterior". E~ Morgan (1871), uma mulher casava com um grupo
de irmãos, portanto, não era possível distingüir o pai - uma visão literal da consangüinidade. Para
Radcliffe-Brown, este costume não implica em uma relação de descendência necessária, mas trata-se de
um artificio de classificação.
22 Radcliffe-Brown inovou o método comparativo utilizado por seus antecessores evolucionistas. Ao invés de
comparar elementos culturais isolados de regiões diferentes, comparou sistemas culturais totais uns com
os outros, classificando os sistemas culturais em tipos, realizando o estudo comparativo entre culturas do
mesmo tipo. Chegar-se-ia, deste modo, a tipos cada vez mais amplos e a princípios ou leis universais que,
portanto, atuariam em todas as sociedades humanas. Ao adotar a existência de princípios gerais e procurar
detectar estruturas - possibilidade viabilizada pela idéia de classificação -, o sistema de parentesco passou
a ser visto como um sistema de relações sociais, remetido ã dimensão social. O parentesco foi a grande
dimensão onde se pode demonstrar isto, ou seja, que um sistema não é um conjunto de costumes isolados,
mas é constituído na medida em que se estabelece a sua estrutura.

16
Gulho/1994), a família estendida foi chamada de "famHia reconstituída" nos..
títulos de atividades como palestras, workshops e mesas-redondas. A iniciativa,
por parte dos organizadores e participantes do evento de proceder a um certo
batismo pode ser entendida como um sintoma da necessidade de encontrar
nomes para estes fenômenos sentidos ainda como muito novos.
Podemos afirmar, então, que os temas da família e do
parentesco, trabalhados pela Antropologia nas mais diversas perspectivas,
permanecem uma questão crucial quando pretendemos compreender a família no
mundo contemporâneo. E isto porque as mudanças ocorridas em nossa
sociedade nos últimos quarenta anos levaram a profundas transformações nessa
ordem de relações. Se compreendermos o parentesco como um sistema de
classificações de pessoas no interior da família, podemos analisar como as
mutações atuais desorganizaram as categorias tradicionais de definição da
parentela. Os significados de cada uma das posições na família transformaram-
se e há uma demanda por parte destas famílias e de terapeutas por compreender
este novo universo que se revela.
Podemos constatar que as transformações sociais mais amplas -
como o ingresso da mulher no mercado de trabalho, a legalização do divórcio, o
aumento da gravidez na adolescência e a chamada "produção independente",
apenas para mencionar algumas delas -, contribuíram para o que se poderia
chamar de revolução no padrão demográfico das famHias brasileiras, fazendo
emergir novas configurações de família. O que ocorre no Brasil atual é a
proliferação e a coexistência de composições diferenciadas no interior de uma
mesma sociedade, o que inaugura uma problemática sentida por terapeutas e
clientes como sendo de ordem complexa.
Mesmo reconhecendo que a antropologia de Radcliffe-Brown
seja permeada pelas dificuldades do pensamento funcionalista, esta incursão
pela obra do autor pode nos servir para pensar algumas das conseqüências das
mudanças ocorridas na composição da família no Brasil atual. Vimos através do
trabalho de pesquisa que a perda do valor do casamento indissolúvel ("até que a
morte vos separe") com o advento da legalização do divórcio deu início a uma
ampla discussão referente aos papéis sociais das pessoas nas novas
composições de família. Naturalmente este não é o caso da análise de
composições diferentes presentes em diversas culturas - como nos estudos de
Radcliffe-Brown -, mas estamos frente à coexistência de novas e distintas
composições na sociedade brasileira.
Se em uma determinada sociedade é possível encontrar o tio
matemo assumindo funções educativas frente ao sobrinho e ao pai cabendo uma
relação afetuosa e de amizade com o filho, podemos chegar à afirmativa de que
os papéis sociais são definidos no interior de cada cultura. O que parece ocorrer
na sociedade brasileira é que os papéis definidos para estes "lugares" - de pai,

17
de mãe etc.- que eram claramente demarcados, passaram recentemente para um.
espaço de imprecisão, cuja delimitação também varia conforme o tipo de
composição do grupo-família
Os novos casamentos de divorciados incluem outros membros
na família, de modo que suas posições no sistema de parentesco permanecem
imprecisas e mesmo os papéis parentais apresentam-se confusos. Numa família
de tipo extenso, chega-se ao ponto de desconhecer a maneira de se dirigir aos
novos parentes. Isto significa que as normas não são claras, ou seja, não se
dispõe de regras que prescrevam os modos de comportamento recíproco para as
pessoas implicadas em determinada relação de parentesco.
Se os termos23 carregam significação social e se não temos
nomes para estes novos parentes, isto significa que não se encontra disponível
um método para se ordenar os relacionamentos, o que equivale a dizer que não
dispomos de um sistema prescritivo de atitudes. É necessário, pois, tentarmos
compreender a nova linguagem que se expressa nos sistemas de parentesco
contemporâneos.

23 Diz Radcliffe-Brown (1978: 62): "Um sistema de parentesco e casamento pode ser encarado como um
arranjo que capacita pessoas para viverem juntas e cooperarem wnas com as outras numa vida social
ordenada."(... ) "Um sistema de parentesco nos apresenta, desta forma, um conjunto complexo de normas,
de práticas e de padrões de comportamento entre parentes" .

18
CAPÍTULO 2

NOVAS ESTRUTURAS DE PARENTESCO

NO BRASIL CONTEMPORÂNEO

"É importante a gente dizer a vocês o que a Escola de Pais pensa sobre o que vem
a ser.... o que é uma família. Contrariamente ao que a gente tem assim em mente
que a familia devia ser bem constituidinha - o pai, a mãe, os filhinhos. E hoje nós
estamos diante de uma realidade: eu vou dar um dado para vocês levantado pela
Escola de Pais: vinte e cinco, trinta anos atrás, casais separados numa reunião da
Escola de Pais eram talvez assim no máximo 5%. Hoje esse número se eleva a 40,
50% do nosso público."(. ..) "São famílias monoparentais. ''2 4

Representante da Escola de Pais do Brasil.


Mesa de abertura do "I Congresso de Terapia Familiar".

Se voltannos a nossa atenção para a família pós-divórcio,


observamos que é possível constatar o aparecimento de um novo padrão
demográfico25 na família brasileira. Grande parte da literatura procura
caracterizar este processo. O que mais nos interessa neste trabalho liga-se à
questão de que, nestas novas composições de família geradas a partir do
divórcio e/ou de casamento(s) subseqüente(s), observamos que um dos eixos do
dilema contemporâneo se refere a uma mudança na concepção que permite
identificar a parentela e a estrutura das relações no interior do grupo doméstico,
já que as posições anteriores e seus respectivos códigos não são mais suficientes
para ordenar os novos relacionamentos, por exemplo, entre madrastas I
padrastos e enteados.
É claro que as separações conjugais e as questões decorrentes
das mesmas não são fatos recentes na nossa história. Segundo Samara (1986: 30),
"de acordo com a literatura, a família brasileira seria o resultado da
transplantação e adaptação da família portuguesa ao nosso ambiente colonial,

24 Referindo-se às classes populares, o convidado acrescenta: "E numa periferia, por exemplo, como São
Paulo, esse número chega a 80, a 90%, de público presente é família constituída por um único adulto e
filhos. Nem sempre filhos próprios. Geralmente assumidos, trazidos de outros, deixados pelo próprio pai.
Alguém que teve a consciência de tratar dessas crianças. n
25 Veja pesquisa realizada por Bruschini (1986), já mencionada na nota n2 5, da introdução deste trabalho.

19
tendo gerado um modelo com caracteristicas patriarcais e tendências.
conservadoras em sua essência". Para a autora, esse modelo genérico de
estrutura familiar, comumente denominado de 'patriarcal', serviu de base para se
caracterizar a família brasileira.
Nesse sentido a concepção de família patriarcal, explorada por
estudiosos como Gilberto Freyre (1983) e Oliveira Vianna (1920), foi aceita pela
historiografia como representativa e praticamente exclusiva para exemplificar
toda a sociedade brasileira. Segundo Samara (1986), estudos e pesquisas mais
recentes têm tornado evidente que as famílias "extensas do tipo patriarcal" não
foram as predominantes no período colonial, sendo mais comuns aquelas com
estruturas mais simplificadas e menor número de integrantes. Por essa razão, o
conceito de "família patriarcal"26 não pode ser aplicado aos diversos momentos
da nossa história e tampouco generalizado para famílias de diferentes grupos
sociais. Podemos concluir, portanto, que o conceito de família patriarcal não
funciona como um paradigma e precisa ser compreendido como um conceito
constituído por um conjunto de autores.
Deste modo, o quadro de submissão feminina, próprio da família
patriarcal traçada pela historiografia brasileira, não foi o mais característico, em
todos os casos. Segundo a autora, no século XIX, casais provenientes de
diversas camadas sociais se divorciaram através da separação de corpos e de
bens, sendo que procedimentos como estes eram reconhecidos legalmente pela
Igreja e pelo Estado. Nesta óptica, o divórcio teria já existido no período
colonial, embora não abrisse possibilidades legais para os cônjuges de contração
de novas núpcias.
Na mesma perspectiva interpretativa, outros autores sugerem a
coexistência de uma pluralidade de estruturas de família nos diversos segmentos
da sociedade brasileira. Assim, ao invés de uma sucessão histórica linear em
que os tipos de família se substituem uns aos outros, teríamos, como observa
Adorno (1978: 137), "várias formas de família, geográfica e socialmente definidas,
que foram se constituindo independentemente umas das outras e que podem
mesmo chegar a cristalizar-se, contemporaneamente, numa mesma sociedade".
Corrêa (1981) aponta a existência de duas linhas dominantes na
literatura sobre a família no Brasil: a que vê a família patriarcal rural como a
instituição fundamental do Brasil colônia27; e a que focaliza a família conjugal
moderna do período de urbanização. Segundo a autora, ambas as vertentes

26
Ao patriarca cabia cuidar dos negócios, da linhagem e da honra. Às mulheres cabia cuidar do lar e dos
filhos.
27 A autora cita, por exemplo, Antonio Cândido (1951) e Gilberto Freyre (1983), que consideraram a fanrllia
patriarcal como a organização fundamental da sociedade colonial brasileira.

20
analisam apenas as classes dominantes como agentes de nossa história e não.
consideram a existência de formas alternativas de organização familiar no
Brasil.
Como decorrência disto, Corrêa afirma que a história das formas
de organização familiar no Brasil "tem se contentado em ser" a história de um
determinado tipo de organização familiar e doméstica - a família patriarcal -
modelo dominante tradicionalmente utilizado como parâmetro. Este seria o tipo
de família que se instalou nas regiões onde foram implantadas as grandes
unidades agrárias de produção: engenhos de açúcar, fazendas de criação ou de
plantação de café. Contudo, a partir da industrialização e da ruína das grandes
propriedades rurais, a família patriarcal foi substituída pela "família conjugal
moderna" (família reduzida ao casal e seus filhos), produto da urbanização.
Segundo Corrêa, tem-se dado ênfase na literatura brasileira a apenas uma forma
de organização familiar: o modelo patriarcal. Corrêa (1981: 7) questiona a idéia
de que a família patriarcal tenha sido o modelo "vencedor sobre várias formas
alternativas que se propuseram concretamente no decorrer de nossa história." A
autora diz (1981: 10): "A 'família patriarcal' pode ter existido, e seu papel ter sido
extremamente importante: apenas não existiu sozinha, nem comandou do alto da
varanda da casa grande o processo total de formação da sociedade brasileira."
Corrêa observa que a implantação da disciplina cristã foi uma
estratégia de controle utilizado pelo Estado português para a ocupação do novo
território, na qual a tentativa de implantar uma moral e uma ordem onde o
casamento tinha importante papel, ainda que simbólico, era elemento chave.
Deste modo, toma a família patriarcal como elemento da "ordem" quando a
"desordem" era tão evidente, já que as "uniões irregulares" eram freqüentes,
uma vez que o impulso sexual ocorria mais usualmente fora do que dentro do
âmbito da fann1ia28 , constituindo, por isso, também unidades domésticas
variadas.
Tal como Adorno, Corrêa reafirma a diversidade histórica da
família brasileira. Neste sentido, observa a autora (1981: 14): "não podemos nem
sequer imaginar a possibilidade de escrever a história da família brasileira, mas
apenas sugerir a existência de um panorama mais rico, a coexistência, dentro do
mesmo espaço social, de várias formas de organização familiar, a persistência
desta tensão revelando-se, não naquela 'quase maravilha de acomodação' que é
para Gilberto Freyre o sistema da casa grande e da senzala, mas na constante

28 Sobre as transformações na prática sexual na constituição da família urbana moderna, diz Corrêa (1981:6):
"A finalidade do casamento não é mais principalmente a manutenção de uma propriedade comum ou dos
interesses políticos de um grupo, mas sim a satisfação de impulsos sexuais e afetivos que na família
patriarcal eram satisfeitos fora de seu círculo imediato."

21
invenção de maneiras de escapar ou de melhor suportar aquela dominação."..
Nesta linha de raciocínio, teríamos que considerar não só a possibilidade da
existência de formas alternativas de organização familiar mas, ainda, que os
autores da história da família brasileira, ao adotarem a família patriarcal como
modelo único, teriam marginalizado outras formas de família. 29
Tal ordem de considerações induz a aceitar que a família
estendida tenha historicamente existido entre nós. Contudo, é após a legalização
do divórcioJ 0 que este tipo de família sai das margens e passa a ser foco
dominante de atenção. Isto se deu, possivelmente, porque os espaços dos
indivíduos, dentro do grupo da família, perderam a nitidez de suas demarcações.
E este parece ser, de fato, o dado novo.
O padrão contemporâneo de família estendida, ao multiplicar-se,
em virtude das possibilidades de divórcio e de subseqüentes casamentos, criou
uma nova distribuição dos direitos e das obrigações entre os membros do grupo.
E, como veremos no capítulo 3, a versão sobre este padrão que é elaborada por
terapeutas e clientes retrata este quadro como sendo formado de composições
sobrepostas ou paralelas, o que nos parece denotar a resistência em conceber a
rede de parentes como sistema estendido.
Como nossa premissa é a de que concepção e representação de
grupo são processos diretamente vinculados à questão do segmento social de
origem de quem os formula, entendemos que a versão apresentada neste
trabalho liga-se ao tipo de experiência encontrado nas camadas médias da
cidade de São Paulo. Assim sendo, essa experiência não pode ser imediatamente
generalizada.
Sarti (1996), por exemplo, encontrou outra representação de
grupo familiar entre camadas urbanas pobres31 , para quem a noção de família se
refere a um tipo de relação que envolve aqueles em que se pode confiar e com
quem se pode contar, ou então ainda, aqueles que retribuem o que se dá e com
quem se tem obrigação. Neste contexto, são, portanto, as redes de obrigação

29 O conceito de "família patriarcal" tem sido também muito utilizado na discussão referente à história dos
papéis de gênero na nossa sociedade. Apesar deste tipo de família ter coexistido com outras estruturas de
grupo familiar, ela nos pennite perceber como os papéis de cada sexo foram mais nitidamente demarcados
no passado e como, hoje, o que se define por masculino e feminino encontra-se mais indiferenciado: a
mulher já ocupa espaço no mercado de trabalho e o homem já cuida dos filhos.
30 Embora a lei do divórcio fosse de 1977, dados do ffiGE (1980/1984) mostram que a Separação Judicial e o
Divórcio apareceram como categoria de classificação nos registros e tabelas do livro das Estatísticas de
Registro Civil apenas em 1984. Este seria o primeiro Censo em que aparece um item sobre Separações
Judiciais e outro com o título Divórcio no Sumário. Existem dados anteriores a 1979/1980, mas são dados
que constam apenas do Anuário Estatístico do Brasil de 1982, pois advinham de outra fonte, com a qual o
ffiGE mantinha convênio. Após 1984, o próprio ffiGE responsabilizou-se por apurar estes dados, que
passaram a constar do livro das Estatísticas de Registro Civil.
31 A pesquisa foi realizada em São Miguel Paulista, na zona leste da cidade de São Paulo.

22
que delimitam os vínculos e é o princípio de obrigação moral que fundamenta a
família e que estrutura suas relações. Nestes segmentos sociais, o princípio de
trocas recíprocas revela-se mais importante que o vínculo de sangue e
funcionando, desta fonna, como wna referência simbólica fundamental. O grupo
familiar visto nesta óptica, restringe-se àqueles com quem se convive, não
levando em conta a árvore genealógica. 32
Consideradas as variações impostas pelas diferenciações e
segmentações sociais, nosso trabalho não tem como pano de fundo a
pressuposição de uma famHia brasileira padrão, uma vez que inúmeras
composições diferentes podem ser observadas.
É claro que, considerada toda a diversidade interna e a
variabilidade dos problemas vividos pela família brasileira, seria possível
levantar alguns dados gerais. 33 As novas tendências demográficas acabam por
revelar que mudanças mais profundas estão ocorrendo na rede de relações da
família atual. Neste sentido, as estatísticas mostram que a família encontra-se
cada vez mais reduzida em seu tamanho, com uma tendência à nuclearização -
tendendo mais recentemente a reduzir seu tamanho de quatro (casal com dois
filhos) para três elementos (casal e um filho) - e que as famílias ditas
"incompletas", chefiadas por mulheres, estão aumentando.
Neste trabalho, consideramos o perfil demográfico da família
contemporânea, porém, procuramos sublinhar as questões relativas aos dilemas
vividos nestas novas formações de grupo doméstico. A pesquisa demográfica
toma o domicílio como unidade de referência, o que nos parece problemático
em relação ao que pretendemos analisar. Isto porque os dados provenientes
deste tipo de recorte não nos parecem suficientes para compreender as
transformações na família após a lei do divórcio, já que este advento ocasiona
uma rede de relações que vincula algumas unidades entre si, como ocorre, por
exemplo, no caso de filhos que participam de duas residências.
Cabe enfatizar que entendemos que a família é um espaço em
que se atualizam as tensões sociais. É o espaço grupal onde se dá a
aprendizagem social, a distribuição das relações de autoridade e submissão, a
definição dos papéis vinculados aos gêneros (feminino/masculino). Deste modo,
pensamos que as famílias geram transformações sociais, mas, também,

32 O uso do sobrenome aparece, com isso, de modo pouco significativo entre os pobres, enquanto para os
ricos, o sobrenome indica status, na medida em que identifica famílias de grupos dominantes brasileiros.
Sarti observou que é uma ordem de natureza moral que articula o sentido do universo social para os
pobres, que se orientam pelo princípio da reciprocidade como organizador da sua visão de mundo e como
fundamento da ordem social. Nesta direção, Sarti afirma que só há vínculo com parentes de sangue, se
com eles for possível dar, receber e retribuir.
33 Veja Bruschini (1986) ou nota nQ 5, da introdução deste trabalho.

23
respondem a elas, num diálogo constante.
Consideramos também que os parâmetros gerais que definem os
traços característicos do objeto que aqui nos ocupa- a família contemporânea -
são ainda abstratos demais para que seja possível ter uma idéia definitiva sobre
a natureza das relações que organizam estes novos padrões de família. Deste
ponto de vista, o discurso dos familiares e dos especialistas nos parece mais útil.
Além disto, optamos por nos circunscrevermos à realidade das famílias
paulistanas de camadas médias que procuram os especialistas, acreditando que
os dilemas vividos por estes grupos, possam estar muito próximos do que é
experienciado em outras regiões brasileiras, sobretudo onde há maior
aglomerado urbano. Assim, objetivando contribuir para a elucidação da natureza
dos dilemas e tensões vividos por estas famílias, procuramos ouvir alguns dos
personagens envolvidos nesta tarefa de busca por uma ordenação da parentela.
Com estes parâmetros, abordamos, a seguir, dois exemplos das
novas composições, geradas a partir das transformações sociais, ocorridas no
Brasil na década de 70: a família uniparental ou monoparental e a composta por
casal homossexual. A família estendida será focalizada no capítulo seguinte,
uma vez que fizemos a opção de tratá-la como referência privilegiada, pois que
este tipo de configuração é o que mais expressa os dilemas vinculados ao
parentesco que pretendemos estudar neste trabalho.

·Diversidade e novas composições de família

Por acreditarmos que o gênero seja uma construção sócio-


histórica e que, portanto, os conceitos de família, de masculinidade I
feminilidade, de maternidade I paternidade precisam ser entendidos dentro do
contexto a que se ligam, procuramos compreender este universo na forma como
estas famílias se concebem e como os especialistas as vêem.
Assim, tecemos algumas considerações a respeito de duas
composições de família que são vistas pelos terapeutas de família como
composições "novas", decorrentes, principalmente, das transformações sociais
trazidas pela possibilidade do divórcio - a uniparental ou monoparental
("singular") e a composta por casal homossexual.
Nosso horizonte foi o de procurar conhecer algo sobre os
processos de representação através dos quais tais pessoas concebem seu papel e
seu lugar nestas fann1ias e sobre como operam essas novas estruturas de
parentesco: o tipo de sociabilidade que ordenam e as novas representações a
elas associadas.

24
I - Família uniparental/ monoparental (ou "singular")

O termo "monoparental" é um termo demográfico utilizado para


famílias onde os filhos habitam ou com o pai ou com a mãe. Esta família
também recebe as denominações de família "uniparental" e "singular", confonne
a nomeou Souza (1994), em seu estudo sobre "pais singulares". Este tipo de
família é composto pelo indivíduo que vive com os filhos e responde pelo seu
cuidado sem a presença de um(a) companheiro(a), embora ele(a) possa existir.
São famílias chefiadas por mulheres ou por homens e podem ser criadas a partir
da chamada "produção independente"34, isto é, mulheres sem cônjuge. 35
Segundo dados analisados por Souza, 50% das famílias no Brasil seriam
nucleares e os outros 50% seriam compostas por famílias monoparentais36 ,
ampliadas, unipessoais e casais sem filhos. 37
Na pesquisa A Família no Brasil - Análise Demográfica e
Tendências Recentes, de Oliveira38 & BerquóJ9 (1990), as autoras observam que a
diversidade de arranjos familiares no meio urbano inclui inúmeras famílias
chefiadas por mulheres: mulheres viúvas (em 1980 havia quatro vezes mais
viúvas do que homens viúvos na população brasileira)~ mulheres solteiras, ou

34 Drásticas mudanças nos costumes podem ser observadas no Brasil contemporâneo. A idéia de "produção
independente". por exemplo, refere-se à possibilidade de mulheres optarem pela maternidade fora de um
casamento. Em 1997, falou-se num "efeito Xuxa". A apresentadora de programa infantil poderia ter
providenciado o namorado para poder ter um filho. Veja matéria na Revista da Folha: Efeito Xuxa-
como se sentem os homens 'escalados' pelas mulheres para engravidá-las. (Parte integrante do Jornal
Folha de São Paulo, de 14 de dezembro de 1997 I Ano 6, nº 295). Na chamada da matéria diz-se:
"Beijinho, Beijinho... Tchau, Tchau". Fazendo uma associação entre Xuxa e a cantora Madona (que teve
um filho com seu persolwl trainer, sem casar-se), a matéria afirma que Xuxa, em rede nacional, exibe o
fato de os homens poderem servir, hoje, como "reprodutores de luxo". A matéria afirma ainda que, em 11
regiões metropolitanas do Brasil, a cada grupo de cinco domicílios, um deles tem uma mulher à frente.
35 Segundo Oliveira & Berquó (1990), quatro podem ser as hipóteses, não mutuamente excludentes, no
decorrer do ciclo de vida das mulheres, para dar conta dessa situação:
a) desejo não concretizado de se casar e ter uma família completa; restando à mulher apenas uma· .
alternativa: ter filhos e se contentar com uma família truncada, sem a presença de um esposo;
b) opção da mulher ser independente e não se casar, mas querer vivenciar sozinha as experiências da
maternidade e da criação de seus filhos;
c) gravidezes resultantes de relações com certa estabilidade mas sem coabitação, como uma etapa pré-
matrimonial ou mesmo definitiva;
d) gravidezes indesejadas, fruto de relações fortuitas.
36 Uma das terapeutas entrevistadas, para este trabalho, comentou sua experiência com este tipo de família:
"Eu tenho atendido muito a familias de pais singulares, quer dizer, ou pai com filhos, pais que assumem
a guarda... eu já tive três familias assim, ou mãe com filhos."
37 Afirma Souza (1994: 7): "Embora a idéia comum de familia, seja o ideal de pai, mãe e filhos morando
juntos e se amando, a realidade brasileira se mostra com menos de 50% de familias nucleares, contra
outros 50% de famílias monoparentais, ampliadas, unipessoais e casais sem filhos."
38 Pesquisadora do Núcleo de Estudos da População da UNICAMP.
39 Pesquisadora da mesma entidade e do CEBRAP- Centro Brasileiro de Análise e Planejamento.

25
mulheres que se mantiveram sós depois do rompimento de uma união. 40 Ainda
segundo as autoras, o aumento das separações contribui de duas maneiras para o
aumento do número de famílias chefiadas por mulheres: de um lado, pelo fato de
a guarda dos filhos ser preferencialmente atribuída às mães quando há separação
ou divórcio (86% dos casos em 1986); de outro, porque existe maior
possibilidade de um novo casamento para o homem, já que há maior oferta de
mulheres na sociedade, em função - entre outras coisas - do padrão cultural que
faz prevalecer um vetor na diferença de idade entre os cônjuges: homens mais
velhos que as esposas. 41

40 Dados da Pesquisa de Condições de Vida na Região Metropolitana de São Paulo (1994), publicada pela
Fundação SEADE em 1994, contempla o período de 1990 a 1994. A pesquisa indica que na Região
Metropolitana de São Paulo, metade das famílias é constituída por casais com filhos. As famílias são
compostas por 3 a 4 pessoas. O número médio de pessoas nas famílias da região é, portanto, de 3,7.
Assim, a maior parte das famílias de todos os grupos sócio-econômicos tem, no máximo, cinco membros,
sendo que aumentou a parcela de famílias sem filhos em todos os grupos sócio-económicos; Observou-se
um crescimento generalizado do contingente de famílias unipessoais (indivíduos morando sozinhos
contam como uma unidade familiar, pois o critério demográfico é o domicílio), compondo pouco mais de
5% das famílias da Região Metropolitana de São Paulo. Este foi o único tipo de família para o qual
ocorreu aumento em todos os grupos sócio-económicos; Houve redução do percentual de famílias
compostas por casais com filhos. Este decréscimo da participação de casais com filhos no total de famílias
da Região Metropolitana de São Paulo, entre 1990. e 1994, é um movimento que se reproduz em todos os
grupos sócio-económicos; A Pesquisa de Condições de Vida partiu de quatro aspectos - emprego,
moradia, instrução e renda -, tomando por base a hipótese de que a pobreza é multidimensional. Chamou
a atenção dos pesquisadores o crescimento da participação de famílias ampliadas pela incorporação de
parentes no grupo D (extremo inferior na escala sócio-económica I corresponde a 54,2% das famílias, que
são carentes si~ultaneamente em moradia, instrução, emprego e renda), movimento que acreditam poder
estar refletindo .u ma estratégia de sobrevivência associada ao aumento do desemprego e à queda da renda
per capita observados para este conjunto de famílias; Em todos os grupos sócio-económicos os chefes
contribuem com 70% da renda familiar, sendo que a parcela de famílias chefiadas por mulheres cresceu
de 17 para 20%.
Observa-se que estes dados de São Paulo coincidem com a tendência demográfica mais geral constatada
por Bruschini (1986). Consideramos aqui que estes achados podem não caracterizar outras populações
regionais, uma vez que o Brasil é grande, mas que, como este texto se propõe a pensar famílias na cidade
de São Paulo, tais dados nos são elucidativos.
41 Conclusões destas autoras confirmam dados das pesquisas de Bruschini (1986) e da Fundação SEADE
(1994). Principais conclusões das pesquisadoras:
(a) A família brasileira, ainda hoje de tipo conjugal como o foi no passado, vem tendo o seu tamanho
sistematicamente reduzido nos últimos 3 5 anos;
(b) As famílias incompletas chefiadas por mulheres vêm aumentando, mercê da pobreza e da emergência
de novos padrões de independência feminina nas camadas médias da população. Nesse processo, o
crescimento das separações desempenha papel importante;
(c) A sobremortalidade masculina, acentuada nos últimos anos, responde pelo peso da viuvez feminina,
contribuindo também na formação de famílias incompletas chefiadas por mulheres;
(d) Em que pese o fato de que uniões consensuais sempre existiram de forma significativa na sociedade
brasileira, o aumento na sua prevalência e sua recentidade revelam um enfraquecimento da valorização
do vínculo legal;
(e) Vem crescendo também, no Brasil, a freqüência de pessoas morando sozinhas, o que, para os homens,
independe da faixa etária. Para as mulheres, porém, essa freqüência se avoluma nas idades mais
avançadas;
(f) Finalmente, as situações destacadas constituem um fenômeno preponderantemente urbano, ainda que

(continua)

26
Na tradição brasileira, em caso de divórcio, as crianças sempr~
ficaram mais usualmente sob a guarda da mãe42 , que a perdia somente em·
situações irregulares como, por exemplo, quando praticava adultério ou padecia
de insanidade mental. As decisões do Poder Judiciário freqüentemente são
tomadas "no melhor interesse" da criança. Esta tradição vem sendo modificada,
porém, com o crescimento do número de pais que solicitam a guarda dos
filhos 43, acentuando a expansão do que hoje se chama por "pai moderno" -
aquele que se envolve com o cotidiano da família e com a educação dos filhos. 44
A permissão de entrada do homem nas salas de parto também
sugere uma tendência cultural a aproximar mais o homem do cuidado com os
filhos e do vínculo afetivo com os mesmos. Deste modo, segundo Souza (1994),
instaura-se uma diferença entre o "pai provedor" (que tem o domínio da rua e
ganha a subsistência econômica) e o "pai cuidador" (que tem o domínio da casa
e lida com demandas afetivas). 45 Observamos, então, que a guarda e a
paternidade do tipo "singular", gerado com o advento do divórcio, fez nascer
estes novos termos.
Contrariamente à "mãe singular" que não parece chamar tanta
atenção, uma vez que tradicionalmente a criança era responsabilidade da
mulher, o "pai singular", que recentemente começa a vivenciar a dupla jornada
de trabalho - inserção no mercado de trabalho e responsabilidade pelas tarefas
de cuidado da casa e dos filhos- toma-se tema de filme e tese. Esta mudança

presente também no meio rural.


42 Diz Souza (1994: 10): "Quando o pai deseja ficar com os filhos, todos justificam que é para 'não pagar
pensão para a mulher'. Os homens são orientados pelos advogados a dizer que moram com a mãe, irmã
ou companheira, como meio de mostrar que 'têm infra-estrutura para ficar com as crianças'. E os juizes
dizem que os homens que conseguem ficar com os filhos 'têm uma mulher por trás~ E isto define um
círculo vicioso sem fim."
43 O filme "Kramer x Kramer", com Dustin Hoffman, trabalha este tema, nos EUA. da década de 70. O filme
é de 1978.
44 Diz Souza (1994: 67): "Em torno dos meados dos anos 80, há um corpo teórico um pouco maior sobre o
pai."(. ..) "E surgem as discussões sobre o divórcio e os diferentes tipos de guarda. Os pais singulares
parecem ser o tema da passagem dos anos 80 para os 90 e sua discussão começa também a ser feita em
muitas das revistas sobre terapia familiar como o Family Processe o The American Journal of Family
Therapy."
45 Na visão da terapeuta Souza (1994: 166), o "pai singular", diante da separação e da conseqüente
reestruturação familiar (nova redefinição de rituais e rotinas), primeiro gerencia a casa e os filhos "como
uma empresa", sentindo-se bem sucedido. Depois, acaba por ter de "envolver-se emocionalmente como as
mulheres". Diz a terapeuta: "Enquanto entre os pais que estavam com os filhos há pouco tempo verificou-
se uma maior ênfase no controle da situação, nos ajustes mais periféricos da organização doméstica e
das rotinas, o que caracterizou a vivência do segundo momento da paternidade singular foi a
necessidade de encontrar um novo padrão de equilíbrio para si mesmo e para a vida familiar." (. ..) "No
relato dos pais que estavam com a guarda havia pouco tempo, percebia-se um tom competente e
confiante. O mesmo tom fora usado pelos outros pais, ao caracterizarem as adaptações iniciais. O
discurso relativo aos anos intermediários de guarda, no entanto, revestiu-se de um forte acento
emocional."

27
parece inaugurar um novo tipo de questão. Enquanto a família era idealizada.
como monogâmica, o lugar de mãe não era disputado. Atualmente, os pais
requerem a guarda de seus filhos e procuram se colocar no papel do principal
cuidador, o que fala a favor de uma perspectiva de redefinição dos atributos da
paternidade.
Em relação aos conflitos que emergem na paternidade ou
maternidade "singular", cabe ressaltar que, em geral, a "mãe singular" é vista
por clientes e terapeutas como aquela que sente uma dificuldade em educar
filhos que é maior do que a das mulheres que não se separam. Sem o marido,
enfrenta mais problemas, segundo a visão corrente entre terapeutas e, por vezes,
entre clientes. É o que pensa esta terapeuta:

''Eu tive oportunidade de ler uma pesquisa. 46 que fazia extremo sentido com a minha prática
clínica e era de ... como as mães que se separaram e não tomaram a se casar e as mães que
tornaram a se casar e têm companheiro vivendo junto, enfrentam, os dois grupos,
comparativamente, muito mais problema para educar seus filhos... problemas tanto de
segurança afetiva, quanto de comportamento, quanto, principalmente, de desvio do que as
famílias ditas intactas, que são as famílias que estão num primeiro casamento e estão
juntos. Então, a idéia de que a separação dos pais traz problemas aos filhos, infelizmente é
injusta, mas é verdadeira. " (. ..) "É mais fácil você fazer um filho obedecer, entrar numa
disciplina, ser responsável, se sentir seguro quando é pai e a mãe e vivem juntos, no lar,
dando as mesmas ordens, do que quando, às vezes, um dá a ordem, o outro dá a outra. '147 .

É interessante a utilização do termo "famílias intactas" nesta fala


da terapeuta, pois a afirmação de que algo não seja- ou esteja- intacto sugere
que este "algo" fora danificado ou, pelo menos, remexido. Podemos constatar
que pequenos detalhes como este - a escolha de uma palavra - descortinam a
visão recorrente de que a família composta por pai, mãe e filhos consangüíneos
que vivem juntos é o modelo mais simples e desejado. Também a idéia de que a
criança cujos pais vivem em regime de co-habitação recebe "as mesmas ordens"
é uma indicação de que o exercício da autoridade neste tipo de organização
familiar é visto como mais simples. Isto é até mesmo questionável, pois o fato
dos pais estarem casados e morando juntos não garante que não discordem, ou
que não entrem em conflito, já que ambos podem estar em embate e darem
ordens divergentes aos filhos. 48

46 Todos os sublinhados das citações são nossos.


47 Este tema está presente também na fala deste ex-marido: "Eu e a X conversamos muito pouco depois que
nos separamos e chegou uma fase da adolescência deles que ela me pediu ajuda, que ela perdeu o
controle. Não tinha mais autoridade. Fizemos uma certa avaliação de como eles iam indo."
48 Freqüentemente os terapeutas referem-se a alterações dos papéis esperados de cada membro na unidade
familiar, quando sai um dos cônjuges. Aparecem nos consultórios garotinhos que passam a dormir na
cama da mãe com a saída do pai de casa e que, eventualmente, podem ser instruídos do seguinte modo:

(continua)

28
Os aspectos relacionados aos conflitos vividos no grupo da ..
família envolvida em divórcio e somente um dos cônjuges passa a viver com
seu(s) filho( s) são aprofundados no próximo capítulo, quando focalizamos a
família em situação posterior ao divórcio. Para o momento, o que queremos
ressaltar é que o aumento das famílias monoparentais inaugurou a necessidade
de um novo mapeamento do vínculo da prole com o ex-casal. É importante
mencionar, ainda, que muitos outros fatores têm colaborado para o aumento do
número das famílias com uma única figura parental. Como exemplos que criam
contingentes de mães solteiras49 , podemos citar: a menor pressão para que a
adolescente ou a mulher grávida se case devido ao surgimento de gravidez e
maior repressão ao aborto em cidades menores (associada à liberdade sexual
conquistada pelos adolescentes), que criam contingentes de mães jovens
solteiras.
Verificamos, então, no panorama atual, a existência da
possibilidade do exercício da maternidade e da paternidade, sem a co-habitação
dos pais biológicos. E isto é algo que vale para homens e mulheres
contemporâneos: quem fica com a criança constitui uma família monoparental,
conforme as novas denominações.

II- Família composta por casal homossexual

Os ditos populares "homem com homem dá lobisomem" e


"mulher com mulher dá jacaré" evidenciam a história do preconceito vinculado à
homossexualidade masculina e feminina na sociedade brasileira. Contudo, se
antes era mais freqüente manter a homossexualidade em segredo, hoje, talvez
como decorrência dos movimentos organizados de homossexuais5°, drag queens

"-Agora você é o homenzinho da casa. Cuide da mamãe!" Neste caso, os próprios adultos alimentam na
criança "fantasias de sucessão". Situação que a mãe, inicialmente, aceita, mas da qual provavelmente se
queixará quando o tempo passar e ela quiser um novo namorado e, provavelmente, tiver que se deparar
com a oposição ciumenta de seu filho; ou quando, ao assumir o "lugar do pai", ele começar a dar ordens
para a mãe e/ou para a irmã. Outro caso observado por terapeutas de "papel deslocado" é quando a filha
adolescente se comporta muito mais como uma mulher traída e aliada à mãe, e hostiliza o pai, chegando
mesmo a se recusar a sair com ele nos dias de visita.
49 Mesmo uma das terapeutas entrevistadas comenta uma experiência deste tipo: "Eu tenho um filho meu que
tem um filho com uma moça que foi namorada dele muito tempo etc. Ela ficou grávida, eles não casaram
e eles nem namoram mais, mas essa criança existe. E é uma coisa que eu acho legal, porque eu acho que
é uma coisa que, ao mesmo tempo, é uma possibilidade que pode dar certo. Ela tem dois anos e está tudo
bem, quer dizer... então é uma possibilidade. E eu acho que isso tem aparecido, eu atendi já casos... eu
atendi um caso de uma pessoa que era mãe e que não casou e que como é que se corrvive com tudo isso,
quer dizer, tem outras possibilidades, que têm aparecido isso."
50 Este universo se inclui em um contexto de âmbito mundial. Na Suécia "a lei de parceria" garante para
casais homossexuais direitos quase iguais aos dos heterossexuais (a lei não concede o direito de adoção de

(continua)

29
e drag kings, a homossexualidade parece estar progressivamente saindo da..
clandestinidade. Os casais homossexuais têm constituído residência conjunta, ·
conformando unidades familiares que muitas vezes incluem filhos tidos em
relações heterossexuais anteriores ou através de processo de adoção. Tais
pessoas têm saído do anonimato, de modo que vizinhos, colegas de trabalho,
amigos e parentes passam a tomar conhecimento destas composições de família
que, em geral, continuam sendo encaradas como exóticas inclusive pelos que
são próximos às pessoas que compõem tais unidades familiares.
Como a terapia de casal e família encontra-se mais divulgada
(inclusive pela mídia, como abordamos no final do capítulo 3), tais composições
de fann1ia têm chegado aos consultórios, recorrendo aos serviços de
especialistas. Assim, nas entrevistas com os profissionais, focalizamos as
experiências de atendimento a casais homossexuais, com ou sem filhos 51 , seja
em atendimento direto seja através de atendimentos realizados por outros
profissionais a quem nossos entrevistados supervisionam.
De acordo com a pesquisa, estes clientes geralmente procuravam
terapia mediante indicação de um profissional que já atendia um(a) dos(as)
parceiros(as) individualmente e que havia sugerido a terapia conjunta. Uma das
entrevistadas indicou-me outras duas terapeutas com experiência em
atendimento a estes casais. Elas foram entrevistadas, assim como uma terapeuta

crianças). No Estado de Nova Iorque foi instituído o registro de "parceiros domésticos", que concede
alguns dos direitos legais a pessoas que vivem juntas sem serem casadas e mesmo que sejam do mesmo
sexo. No caso do casal (registrado como parceria doméstica) adotar uma criança, os parceiros podem
ganhar a licença remunerada que lá se concede aos casais casados quando têm filhos (veja Jornal Folha de
São Paulo, 3-6, 28.03.93). No Brasil, a deputada Marta Suplicy apresentou ao Congresso Nacional
(junho/1995) um projeto de lei que regula a "união civil" de homossexuais (Jornal Folha de São Paulo, 3-
8, 18.06.95) e o primeiro caso relacionado à partilha de bens no casamento informal entre homossexuais
foi registrado em 10.02.98, quando o Superior Tribunal de Justiça reconheceu o direito de herança de um
homossexual de Minas Gerais sobre um apartamento que ele provou ter adquirido com o parceiro, com
quem viveu 7 anos, morto em 1989, em conseqüência da AIDS (Jornal Folha de São Paulo, 3-6, 11.02.98).
Paralelamente, alguns padres já realizam cerimônia de casamento religioso para casais homossexuais.
Deste modo, a realidade brasileira está em sintonia com uma tendência internacional (Dinamarca,
Noruega, Suécia, França e EUA, dentre outros países) no sentido de legalizar as uniões homossexuais, o
que poderia, por exemplo, vir a garantir direitos previdenciários e de herança para o(a) companheiro(a).
51 Nos EUA, por exemplo, uma editora (Veja Wilhoite- 1?90 & Newman- 1989) pôs-se a publicar uma série
de dois livros para filhos de casais homossexuais. Um deles narra a história de uma menina, filha de duas
mulheres. Quando estas resolvem ter um filho, utilizam-se do processo de inseminação artificial. A
criança cresce e começa a freqüentar uma escola. Certo dia, chora porque a amiguinha tinha pai e ela não.
A professora pediu, então, para que cada criança desenhasse sua própria famflia. A diversidade da famflia
é apresentada através dos desenhos das crianças: criança com dois pais e nenhuma mãe, criança com duas
mães e sem pai, pais com quatro filhos adotivos etc. O outro livro narra a história de um garoto, cujos pais
se divorciaram e seu pai casou-se novamente, só que, desta vez, com um homem. Sua mãe lhe explica que
o pai é gay e o texto passa a mostrar o convívio da criança com o casal homossexual, nas rotinas de fim-
de-semana. Na mesma linha existem livros direcionados aos adultos com o intuito de auxiliar estas
famflias, por exemplo, a obra The Lesbian and Gay Parenting Handbook - creating and raising our
families, de April Martin (1993).

30
com a qual fizemos contato durante o "I Congresso". As falas destas..
profissionais constituem material para a presente discussão. Das dez
entrevistadas, cinco mencionaram experiência com atendimento a casal
homossexual, seja diretamente ou através de supervisão de atendimento
realizado por alunos de curso de formação na área. Incluindo as três terapeutas
que foram ouvidas com este propósito específico, temos o total de oito
terapeutas com alguma experiência nestes atendimentos.

A) Conjugalidade homossexual e preocupações predominantes


Até recentemente, o mais comum era a existência de filho( a)
homossexual com pais heterossexuais; atualmente, há filho heterossexual com
pai ou mãe homossexual. Tais casais homossexuais enfrentam forte preconceito
no que se refere à adoção e à educação destas crianças, mesmo que sejam filhos
legítimos do casamento anterior de um dos parceiros. No contexto da
conjugalidade homossexual, é freqüente o temor de perda da guarda de crianças.
Segundo o relato de uma advogada em mesa-redonda no "I Congresso", o
homossexualismo pode provocar a perda da guarda de um filho, ou até mesmo,
colocar o · indivíduo na posição de culpado durante o processo legal de
separação. 52
A existência na sociedade abrangente de uma atitude de
estranheza e de rejeição frente a estes casais e a estas famílias 53 , por parte da

52 Uma advogada em mesa-redonda no "I Congresso" diz: "Quando uma pessoa é culpada é evidente que o
outro pode pedir o divórcio, sem dúvida. Então, o que acontece quando ele vai pedir o divórcio, já
porque a outra o traiu e qualquer coisa semelhante, não é, porque hoje os casos já não são só de traição
de mulher com outro homem, mas existe caso de homossexualidade e tudo isso faz com que o outro se
prejudique por causa da situação que ele fica. Entilo realmente é mais uma luta. Mas a lei diz o seguinte:
se for provada a culpa de um deles a criança fica com aquele que é inocente."
53 Os temas do preconceito, da discriminação, da rejeição, da estranheza, da "relação-escondida", aparecem
com muita freqüência tanto no discurso dos terapeutas quanto de seus clientes. Diz uma terapeuta: "E
assim... desde que eles ríão poderiam caminhar juntos, não podiam estar num mesmo hotel... ou estavam
no mesmo hotel, mas não podiam tomar café juntos, não podiam ir até a piscina juntos." (. ..) "Um casal
que estão 25 anos juntos. " (. ..) "E tudo isso a gente foi reavaliando. Então, hoje eles viajam juntos, eles
andam juntos, eles vão a todos os lugares juntos, os lugares que eles trabalham ... num é complicado de
aparecer, mas ele vai. "
Neste clima que oscila entre a aceitação e a rejeição, acredita uma terapeuta que a homossexualidade
feminina ainda tem mais recursos de proteção, de disfarce. Diz: "Eu acho que a nossa cultura... nós
conhecemos todos os privilégios das mulheres. " (. ..) "Por exemplo, você pode ser homossexual muito
mais tranqüilamente, pois se você mora com uma amiga, tudo bem! Você vai no teatro com a amiga, tudo
bem! Você vai no cinema com a amiga, você vai viajar com a amiga, você está na porta de um cinema e
marca: é casal, casal, três pessoas, duas amigas, três amigas... amigos são adolescentes, homens juntos
você olha para ver se eles são homossexuais. Numa excursão... dois homens? E as mulheres são ou não
são. Duas mulheres sozinhas numa excursão vão na companhia de turismo e falam assim: '-Olha, se tiver
uma companheira de quarto é mais barato!'; '-Tudo bem, eu divido o quarto.' O homem não faz isso. "

(continua)

31
comunidade, faz com que estas unidades tentem se armar de estratégias
amenizadoras. Em um atendimento que realizei, por exemplo, uma mãe que ·
residia com sua nova companheira e tinha quatro filhos do primeiro casamento
heterossexual mencionava abertamente sua preocupação com a opção sexual de
seus filhos. A despeito de sua própria condição, esta mãe manifestava o desejo
que seus filhos fizessem uma opção heterossexual e não homossexual. Seu
argumento era que ela sofria muita discriminação e que não gostaria que isto se
repetisse com seus filhos. Por esta razão, afirmava que a opção heterossexual
ser-lhes-ia mais simples. Em prosseguimento à mesma linha argumentativa,
relatou um episódio em que uma vizinha, com o propósito de xingamento, teria
dito a uma de suas filhas, já adolescente, que a mãe era "sapatona". Além disso,
imaginava que as queixas oriundas do zelador em relação ao comportamento de
seus filhos, no prédio, motivava-se por ela não ter um marido em casa e ser
homossexual. Sua companheira adotara legalmente uma criança, tendo entrado
individualmente com processo na justiça, pois temia que a exposição de sua
homossexualidade fosse motivo para a retirada da criança de sua guarda. Nesta
ocasião, seu casamento homossexual foi omitido e mantido em sigilo. O casal de
mulheres, os quatro filhos biológicos de uma delas e a filha adotiva da outra
freqüentaram, todos, as sessões de Terapia Familiar.
Podemos verificar, então, que mesmo quando é possível
conseguir uma adoção, a preocupação com o bem-estar do(s) filho(s) permanece
equacionada em função da opção sexual dos cônjuges. Este aspecto é
igualmente salientado na experiência de outros terapeutas. Uma das terapeutas
entrevistadas o enuncia da seguinte maneira:

''Eu falei deste casal homossexual masculino que adotou. O rapaz tinha 18 anos e a
queixa... quer dizer, o que o casal veio dizer é o seguinte: 'Olha, doutora, nós estamos aqui'
- e daí eu fiquei sabendo que eles eram homossexuais - 'porque o nosso filho tem 18 anos e
nós não queremos que ele seja homossexual.' Eu achei assim... 'porque é muito sofrido,
porque não queremos que ele passe pelo que nós passamos... ' Era bem assim, quer dizer, eu
levei o maior choque e .eu nunca imaginei que eles pudessem falar tão abertamente I E era
um casal que se dava muito bem, mas que eles... acho que sofreram muito, até se
encontrarem, até poder... até mostrar uma realidade pessoal deles porque, na realidade, um
era travesti, um deles era travesti, certo? Quer dizer, realmente era uma mulher, ele tinha
assumido o papel feminino sem cirurgia nem nada. "

Ambos os casais mencionados - o casal homossexual feminino


(que se zangava com o fato de as crianças do vizinho chamarem-nas de

Outra terapeuta acha que a relação homossexual, mesmo quando não clandestina, faz com que os
familiares contornem situações como a de ter que apresentar o companheiro do pai e dizer: "-Este é o
sócio do meu pai."

32
"sapatonas" para seus filhos) e este casal homossexual masculino - trazem a
questão do temor que a opção homossexual seja repetida pelos filhos. Em geral,
esta preocupação parece ser mais evidente com os filhos que são do mesmo
sexo dos pais. No primeiro caso, as mulheres preocupavam-se mais com as
mocinhas; no segundo, o casal homossexual masculino estava preocupado com
a opção sexual de um rapaz de 18 anos. Nestes relatos, os adultos parecem
suspeitar seriamente que a opção sexual dos filhos seja definida através do
modelo oferecido pelos pais.
Tanto no caso de filhos biológicos como no de adotivos,
constatamos, portanto, a crença de que a homossexualidade seja transmissível.
Abreu Filho (1980) apontou que no sistema de parentesco definido pela lógica da
descendência prevalece a crença de que o sangue seja transmissor de qualidades
fisicas e morais. Segundo ele, "a noção de sangue é central no que se refere à
delimitação de um grupo de parentes." O autor afinna que há em nossa
sociedade a crença que considerando a propriedade do sangue, "é possível
conhecer uma pessoa pelo seu sangue", pela sua família. Deste modo, o sangue
não significa simplesmente "uma substância formadora do corpo", mas também
e principalmente um vetor que define um campo social e moral. É este contexto
que viabiliza, com isso, comentários como: puxou o jeito da avó, o andar do pai,
o gênio do tio etc. Os casais homossexuais em pauta parecem estar operando
com este mesmo critério de transmissão, senão pelo sangue, pelo convívio direto
com eles.
O tema da adoção para casais homossexuais é polêmico54 e
divide a opinião dos profissionais. Uma das terapeutas entrevistadas sente-se
tentada a defender a adoção como uma possibilidade:

''É um preconceito de que não pode. Aí eu me pergunto: 'Não pode por que?' E eu não
tenho uma resposta adequada a partir dos meus referenciais teóricos. Sim, é importante um
pai e uma mãe. ss Sim, acredito que a identidade sexual se forma, em grande parte na
infância... e aí eu só tenho perguntas. Como é a identidade sexual de uma criança criada
por um casal homossexual? Acho que existe diferença entre a criança criada por um casal
homossexual que é filho de um deles, acho que é uma problemática muito diferente."

54Uma terapeuta comenta que os critérios para adoção, no Brasil, já são demasiado exigentes, o que dificulta
ainda mais a possibilidade de um casal homossexual conseguir uma adoção. Diz: "Você tem que provar
que é perfeito antes de você adotar uma criança." (. ..) "Se ao final das contas, eu faço tantas exigências
para alguém adotar um filho." (. ..) "Eu tenderia a colocar o casal homossexual que adota uma criança
dentro do panorama geral da adoção. "
55 A preocupação com a "boa condição" para os filhos, é uma questão colocada pelos terapeutas de família
com bastante freqüência. Vejamos a fala desta terapeuta: "Em geral, a preocupação é quando querem
adotar uma criança, então ai vem a preocupação se vai dar problema. Em geral, é por causa do
preconceito do ambiente e eles precisam saber como lidar com ele."

33
É pertinente enfatizar que, neste universo, mesmo quem tem
filho biológico teme perder a guarda do(a) filho( a) em resultado da alegação do
ex-cônjuge da homossexualidade da mãe ou do pai da criança. Por exemplo, a
situação do pai de filhas adolescentes, que tendo se divorciado e se casado com
outro homem, sofre pressões e chantagens de sua ex-mulher. 56
A extrema dificuldade que existe no Brasil57 para a adoção de
crianças por casais homossexuais parece induzi-los à busca de alternativas. Pelo
menos é nesta direção que dois dos terapeutas entrevistados vêem o lugar de
privilegiada afetividade que os animais de estimação desfrutam na vida de
muitos casais homossexuais, isto é, tais animais podem estar no lugar que, em
princípio e não fossem as dificuldades legais e sociais mencionadas, seria
destinado a filhos:

"Casal de cachorros. que são os filhos e já vieram para a sessão, inclusive. E eles contam
muito do casal de cachorros e... quando vão viajar. deixam na casa da avó, quando a casa
vai desinfetar ou pintar, fica na casa da avó, quando está sem empregada, fica na casa da
avó, dormem com eles. São muito especiais mesmo! A configuração é de quatro pessoas. ''5 8
''Este casal de homens trazia os cachorrinhos. Tinham três poodles que eram umas
gracinhas!"( ..) "Tinha o sentido de serem os filhinhos do casal. "

Frente ao exposto, podemos levantar algumas questões. Haveria


um movimento de resistência na sociedade atual no que se refere a uma maior
abertura para assimilar uma variabilidade de modelos, ao tnesmo tempo que os
incorpora? Ou se trataria mesmo de proteger as crianças da força do preconceito
prevenindo situações de real desconforto?
Arriscamos afirmar que numa família como esta, o que se
oferece é uma maior diversidade de modelos de identificação em relação aos
papéis sexuais permitidos ou recriminados. Souza (1994: 79) afirma que estudos
de Miller (1979) & Bozett (1981) analisam esta questão e concluem: "Além disso,
os pais 'gays' embora tenham problemas de identidade por terem que se
comportar segundo dois padrões de comportamento, não têm filhos ou filhas
com problemas de identificação sexual".

56 Diz sua terapeuta: "Ele trazia a questão: 'Como vou lidar com minhas filhas?'"(...) ''Até que a gente pode
chegar na questão-queixa, que era essa questão de como falar para as filhas, 'o que que eu vou resolver'
e tudo mais. Então isso eu entendi que era uma decisão que o casal tinha que tomar em conjunto,
redefinir em conjunto como é que eles iam lidar com a situação." (. ..) "Contar e o que contar."(. ..) ''Mas
a decisão de como lidar com isso deveria ser uma decisão conjugal e não uma decisão individual."
57 Terapeuta: "Para nós brasileiros que temos acesso a isso, acho que é uma coisa nova. E. .. a questão de
adotarem filhos, essas coisas todas, acho que é uma configuração que está aparecendo, eu acho que
antes não vinha para consultório. Eu acho que é uma coisa escondida!"
58 A mudança de parágrafo indica que são falas de pessoas diferentes.

34
Os terapeutas parecem oscilar entre, de um lado, a aceitação
destes casamentos e, de outro, a adoção de uma visão vinculada a uma
patologia. No nosso universo de pesquisa, pudemos encontrar falas nestas duas
direções e destacamos aqui dois exemplos.
Sobre a presença de patologia no casal homossexual, a fala desta
terapeuta é muito explícita:

"Os casais homossexuais. em geral, estão numa maior fase de fusão que os outros casais.
Em geral, ficam na primeira patolqgia de casal. " ( ..) ''Essa patologia de não reconhecer o
diverso como sendo interessante. E mais ou menos a história do Narciso, que se apaixona
por si mesmo. Então, o outro é a projeção de si mesmo, ele não consegue ver outros... a
nível pessoal, a nível de pessoa, tá? E isso, claro que foi colocado desde criança, mas essa
é uma fase de patologia relacional... e de patologia pessoal também, se você for olhar como
patologia, mas não... quer dizer, eles não são responsáveis, porque... para mim e para a
maior parte dos psicólogos, não há uma... um número de homossexuais que são
homossexuais. " (. ..) ''É a educação, são fatores educacionais que induziram ou que levaram
o indivíduo a se identificar mais com a figura masculina ou feminina e daí, depois da
formação da personalidade, não há... é difícil, não há muito o que fazer." (. ..) ''Agora
juntando com terapia de casal. " (. ..) "Quando eu consigo que eles cheguem à segunda
fase ... em geral, ou eles saem da terapia, ou eles têm uma crise muito grande em que um faz
o papel de mãe e o outro faz o papel de filho. Mas, em geral, eles não chegam a isso e como
eu ouvi... percebi que, como homossexuais, eles têm que permanecer nesta fase, o máximo
que eu faço é readaptá-los, trabalhar as raivas, trabalhar os ressentimentos, as lutas, as
brigas, o poder etc., mas... reforçar o sentimento de cuidado de um pelo outro. E acabou, eu
não posso passqr para a segunda fase, que seria uma fase do casamento, já que a gente está
falando de casal e família, do casamento, porque daria muitos problemas. Eles se
separariam e eles não têm chance de ter um relacionamento heterossexual, porque eles não
têm chance de refazer, na idade de adultos. "

A fala a seguir expressa esta outra visão:

"Com certeza! É completamente diferente, eu acho assim, para o terapeuta, em termos de


como é que você se posiciona em relação a isso, acho que é a primeira questão que me
aparece. Porque se você enxergar como patologia, primeiro acho que não dá para fazer um
trabalho conjugal. De cara já não dá porque não se entende como um casamento e outra,
que a direção do trabalho vai ser totalmente distinta. Então eu não tenho a visão da
homossexualidade como patologia. "

Contudo, esta mesma terapeuta, que tenta uma visão fora do


código da patologia, de outro lado, quando vai explicar a maneira pela qual
concebe os objetivos de um trabalho terapêutico com casais, parece não
conseguir distanciar-se da noção de casal composta por marido e mulher. 59

59 A terapeuta diz: "Quando a gente fala da terapia de casal, acho que especificamente, a gente fala em

(continua)

35
Assim, ao que tudo indica, no encaminhamento destes casos, o modelo de casal
conjugal não deixa de ser a matriz de referência mesmo para casais
homossexuais.
No capítulo 3, veremos que o modelo de família nuclear- pai,
mãe e filhos consangüíneos - persiste como sendo o modelo mais simples e
ideal, apesar de todas as transformações na esfera da conjugalidade e da família.
Talvez por isso, quando é abordado o tema da terapia de casais homossexuais, o
elemento da rejeição à esta modalidade conjugal é muito presente. Nesta linha,
os terapeutas também acreditam que a rejeição a este tipo de casamento é
bastante temida por seus clientes homossexuais. 60
A experiência de atendimento a famílias com essa composição
pode ser considerada como ainda muito incipiente e inicial, quase como uma
resposta que os terapeutas viram-se obrigados a oferecer frente à demanda por
atendimento. 61
Acreditando que uma atmosfera nova precisa ser instaurada,
muitos homossexuais equacionam como caminho uma maior aproximação entre

trabalhar em terapia questões da conjuga/idade, e esse sistema marido e mulher, sejam eles
homossexuais ou não, como é que ele está funcionando. O que está emperrando esta conjuga/idade e ter
sempre como pano de fundo as perspectivas das familias de origem. "
É possível observar o mesmo fato por parte de clientes, segundo esta terapeuta: "E eles vieram... quando
eles chegaram na sala de espera, para mim era um casal comum. Eles vieram fazer terapia de casal e
eles vieram exatamente com isso: o problema deles é que eles se davam muito bem, daí eles me
explicaram e eu levei o maior susto, porque um deles veio vestido e realmente não parecia um homem,
era uma mulher. " (. ..) "Se comportavam como... é como se fosse um casal heterossexual. "
60 Terapeuta: "O paciente individual te procura com questões que vão do 'sou mesmo ou não sou?' 'Sou
aceito?' 'Se meu terapeuta diz que isso é doença, isso é bom!' Questões que vão por ai. O casal
homossexual, quando vem procurar, ele já vem procurar... ele te dá crédito, ele não pede um crédito. É
como se dissesse assim: 'Olha, eu tenho uma referência que você é uma pessoa legal, viu? Portanto, você
me aceita'. E é diferente do paciente individual, que diz assim: 'Você me aceita como homossexual? 'Eu
estou falando que isso passa na fala, porque ninguém vem com essa coisa tão clara, mas às vezes o casal
homossexual vem até mais claro, quer dizer, é uma coisa assim ... vocé tem um crédito com ele. " (. ..) "O
casal homossexual, na minha experiência, ele só vem porque alguém deu a garantia para ele que você é
legal o suficiente para aceitá-lo. O casal homossexual tem uma inserção mais clara, porque ele já
assumiu que ele é um casal, então se ele é um casal... mesmo quando eles não assumiram perante todo
mundo. Agora... ~ minha mãe acho que sabe, as nossas famílias acho que sabem.' E aí começam as
diferenças. "
61 A fala desta terapeuta evidencia bem este aspecto: "Ela me perguntou: '-Você atenderia um casal
homossexual?' Eu falei: '-Eu atenderia, nunca atendi, mas atenderia.' Eu atenderia qualquer coisa hoje
em dia!" (. ..) "Como eu não tinha experiência, primeiro conheci, eu ouvia as duas conversando e
conforme elas iam conversando... eu faço muito isso, entendeu, quando eu tenho uma dúvida eu
transformo a dúvida em trabalho, quando eu tenho uma dúvida assim como terapeuta. E ai foram
batendo muitas dúvidas, sabe foram surgindo dúvidas, dúvidas, dúvidas." (. ..) "De homem e mulher
parece que a gente está desde que nasce ouvindo homem é isso, mulher é aquilo."(...) "Foi ficando claro
para elas a partir das minhas dúvidas, eu fui colocando para elas e fui trabalhando em cima disso." (...)
''Me deixava curiosa, o tempo todo eu deixei a curiosidade na mesa, presente, e a curiosidade me movia
muito nesse atendimento. "
Outra terapeuta diz: "Quem atendeu dois casais" (. ..) "não tem nada a não ser hipóteses. "

36
si, isto é, a formação de grupos dentre os que partilham a condição de
homossexual. Muitos setores da sociedade têm reforçado tais iniciativas. Na
medida em que a conjugalidade homossexual foge ao padrão dominante
heterossexual, a forma de obter uma inserção social caracterizou-se pela
constituição de uma identidade particularizada e, vale registrar, os setores
responsáveis pela oferta de bens e serviços procuram atingir esta fatia de
mercado. Por exemplo, agências de viagem programam pacotes de turismo
exclusivos para homossexuais - inovação recente no país62 • Uma terapeuta
observa algumas condutas, também na área de Terapia Familiar, que igualmente
caminham nesta direção:

''Nos Estados Unidos. agora é muito grande a ênfase de formar terapeutas familiares
homossexuais. e que são os únicos que, de fato, encontram acesso, encontram procedência,
encontram abertura dentro do grupo marginalizado que eles são. "

A família composta por casal homossexual realmente obriga,


mesmo nos dias atuais, que muitas pessoas revejam seus próprios conceitos de
família. Isto porque talvez este tipo de composição seja justamente aquele que
mais contundentemente coloque em ·cheque as visões tradicionais já tão
incorporadàs. 63 Acresce-se a isto, o fato de que o atendimento destes casais em
terapia conjugal faz emergir o tema das relações de gênero. Assim, a maneira de
demarcar o espaço do feminino e do masculino nas relações heterossexuais64 e o
modo como estas imagens se acomodam entre homossexuais consubstanciaram
uma importante questão. 6s

62 Veja Anexo 3. Empresa dedica-se a comercializar cartões (vendidos em papelaria) específicos para gays.
63 Nesta linha, uma terapeuta busca alargar o conceito de família. de forma a poder incluir as novas
composições, dizendo: ~ demografia, por exemplo, define a partir do domicílio. " (. ..) "O que é uma
família? Uma familia é um lugar onde as relações sexuais são prescritas entre duas pessoas e proibidas
entre essas pessoas e as demais. Essa é uma boa definição de fronteira da família, porque cabe o filho do
primeiro casamento da mulher do outro, que veio morar com a gente. Veio morar com a gente, faz parte
da família? Eu estou dando uma definição cultural do tabu do incesto e não a definição biológica."
64 O próprio terapeuta percebe este fator: "Eu acho que isto acaba tendo uma repercussão na questão do
gênero, quem faz o quê, quem é do masculino, quem é do feminino. " (. ..) "Quem pega no negócio pesado,
entende, ou então assim, quem sai de manhã e volta de noite." (. ..) "Uma coisa até de estereótipo da
função mesmo." (. ..) "No casal de mulheres a gente via como elas não tinham estabelecido regras entre
elas. " (. ..) "O que elas esperavam uma da outra. "
65 Diz uma terapeuta: "É, e havia assim ... o rapaz era advogado, um era advogado e o outro era... ele tinha
um curso de administração e ocupava um cargo em uma empresa. Mas era interessante, porque
acabaram se organizando como um homem e uma mulher." (...) "É diferente, eu acho que... para mim,
para o terapeuta, me parece que o desafio maior para ele é ter a coragem de por de lado pautas que você
tem vicerais, do que é um homem, o que é uma mulher, o que é feminino, o que é masculino. Isto ... o que
é uma alma fominina, o que é uma alma masculina... isto tudo você sente que é posto na balança.
entendeu, você sente que é indagado a respeito da sua pessoa pela sua própria pessoa, senão você não
consegue marchar. E aí, é dolorido e trabalhoso, porque se desorganiza em muitos momentos."(. ..) "Não
que eles discutam sobre gênero, nem sempre esse é o tema, de jeito nenhum, mas fica para o terapeuta,

(continua)

31
O ponto é, então, indagar se o que está em pauta é um processo
mais amplo vinculado ao questionamento dos papéis de gênero em nossa
sociedade onde a mencionada busca pelo igual não é exclusivamente conferida
aos pares homossexuais, podendo estar refletindo um movimento mais amplo
mediado pela idéia de que homens e mulheres devem ter as mesmas condições
na vida social e que na esfera da vida doméstica deveriam formar casais
igualitários.
Heilbom (1992) ao estudar três modalidades de casal -
heterossexual, gay e homossexual feminino -, observou que os três arranjos
conjugais proclamam o igualitarismo (condições e direitos iguais para ambos os
parceiros) como o fimdamento das relações entre as duas pessoas no casal.
Assim, segundo esta autora haveria nestas três composições de
vínculo, a existência de um padrão de conjugalidade que independe da
identidade sexual envolvida na construção do casal. Nesta visão, o igualitarismo
aparece, então, como um princípio que estrutura a díade e que independe da
identidade sexual dos parceiros. Tal assertiva contraria toda a idéia de
assimetria como elemento constitutivo das relações de gênero como, por
exemplo, quando a Antropologia se ocupa em focalizar a divisão sexual do
trabalho como denominador comum entre diversas culturas. Segundo a
concepção de Heilbom, na sociedade brasileira atual, é, então, o valor do
igualitarismo que predomina como um princípio organizador da conjugalidade
contemporânea.
Esta temática sobre o que é da esfera do masculino e do
feminino - isto é, se algo é igual ou diferente conforme o gênero ou opção
sexual - foi também detectada em discursos de clientes e terapeutas, tomando-
se uma temática inevitável para o especialista que atende casais homossexuais. 66
Dentro deste universo simbólico, podemos observar que são os próprios
terapeutas que se perguntam sobre a natureza dos papéis de gênero e sobre a
psicodinâmica dos diversos tipos de composição conjugal.

entendeu? Eles vêm e discutem o que é do interesse deles. Fica um pouco mais aflorada para o
terapeuta... em alguns momentos, fica mesmo, nitidamente."
66 Vejamos um exemplo deste aspecto, através da fala desta terapeuta: "É, e havia assim... o rapaz era
advogado, um era advogado e o outro era... ele tinha um curso de Administração e ocupava um cargo em
uma empresa. Mas era interessante, porque acabaram se organizando como um homem e uma mulher. "
(. ..) "É diferente, eu acho que... para mim, para o terapeuta, me parece que o desafio maior para ele é ter
a coragem de por de lado pautas que você tem vicerais, do que é um homem, o que é uma mulher, o que é
feminino, o que é masculino. Isto ... o que é uma alma feminina, o que é uma alma masculina... isto tudo
você sente que é posto na balança, entendeu, você sente que é indagado a respeito da sua pessoa pela
sua própria pessoa, senão você não consegue marchar. E ai, é dolorido e trabalhoso, porque se
desorganiza em muitos momentos." (. ..) "Não que eles discutam sobre gênero, nem sempre esse é o tema,
de jeito nenhum, mas fica para o terapeuta, entendeu? Eles vêm e discutem o que é do interesse deles.
Fica um pouco mais aflorada para o terapeuta... em alguns momentos, fica mesmo, nitidamente."

38
B) Gênero e alteridade: temas suscitados a partir da análise da
terapia conjugal

Solicitados a falar sobre as mudanças ocorridas nas relações de


gênero durante as últimas décadas, os terapeutas referem-se com freqüência às
transfonnações decorrentes do ingresso da mulher no mercado de trabalho.
Apontam também para as inovações causadas no mundo conjugal e familiar pela
pílula anticoncepcional e, posteriormente, pela possibilidade do divórcio. Mas é
o tema da mulher no trabalho e o do homem no lar que são os
predominantemente mencionados. 67
Na linha da inversão da divisão sexual do trabalho tradicional
em nossa sociedade no que se refere à definição de quem fica no lar e quem
trabalha fora de casa, durante mna atividade do "I Congresso" na qual se falava
sobre o comportamento de gênero, uma terapeuta fez um sugestivo relato sobre
sua experiência pessoal com o próprio marido:

''Em determinado momento, eu passei por uma experiência muito interessante com o meu
marido: é que, com a crise financeira, alguém tinha que trabalhar mais na família. E eu fiz
um acordo com ele e falei: 'Você vai cuidar da casa e das crianças e eu vou trabalhar para
garantir o sustento da casa. E quando este acordo não estiver fazendo bem para um ou para
outro nós tomaremos a refazer o oportuno. ' E fiz isso durante oito anos e aí eu não
agüentava mais o meu marido reclamar (risos): reclamar da babá, reclamar da empregada,
reclamar do preço do tomate, reclamar disso e daquilo. E eu chegava em casa do trabalho
e ainda tinha que ouvir todas as reclamações domésticas do meu marido! (risos) E um dia
eu fiquei muito desapontada, porque eu fui no supermercado fazer compras e comecei a
escolher tomates e, de repente, o meu marido pegou o saco de tomates da minha mão, virou
e falou: 'Você não sabe escolher tomates!' {risos)" (. ..) '~ escola das minhas crianças
mandou um questionário, que tinha que ser respondido pelo pai e pela mãe e meu marido

67 Nesta direção, expressam-se estes terapeutas:


"Olha, na década de 60... 50/60, houve o famoso movimento hippie, que modificou muito as relações,
porque houve a liberação mais da mulher. O aparecimento da pilula ajudou muito isso. " (. ..) "Foi de um
pólo de pura repressão, para um pólo de um liberalismo total. E eu acho que aí houve um movimento
aqui... de muita desestruturação da famllia." (. ..) "Em geral, eram casamentos para toda a vida, que
eram para durar etc. E, a partir dai, começou a haver um número de separações muito grande."
"Eu tratei, nos últimos anos, um número considerável de casais no qual a mulher que trabalhava e
sustentava a casa e os filhos estavam sendo cuidados pelo pai, que ficava ... ou fazendo uns bicos ou
trabalhando, fazendo supennercado, uma inversão aí. Há um número de casais que só a mãe trabalha e
um número maior de casais no qual a mãe ganha mais do que o pai. " (...) "É gozado porque essas coisas
são transfonnadoras ao longo do tempo e você não percebe. Se você pára para me perguntar, de repente
eu falei : Nossa é mesmo! Há vinte anos atrás, eu tinha poucas mulheres executivas, com cargos altos em
Bancos, finnas de Engenharia, coisas assim mais... tipicamente masculinas. Eu acho que foi uma
transfonnação." (. ..) "Eu acho que tem, hoje em dia, mais mulheres que trabalham do que mulheres que
não trabalham. "

39
sentou e respondeu o questionário sozinho. E eu voltei e perguntei: 'Ah, e aquele
questionário? Já está acabando o prazo e eu preciso responder a minha parte!' E ele disse:
'Não, eu já respondi'. E eu falei: 'Mas como? O que é que você disse a respeito do
relacionamento dos filhos com a mãe, como que era, de que forma?' E ele disse assim: 'A h,
eu coloquei... que o relacionamento com você era muito bom, mas que você trabalhava
muito, não parava em casa.' (risos) E eu falei: 'Mas como?' Enfim, o que eu senti com essa
experiência também... depois comecei a ficar aborrecida, só eu tinha que sustentar a casa,
tinha que trazer dinheiro etc. e tal, tinha que pagar as contas, cartão de crédito e todas
aquelas outras coisas. Então, já estava na hora de concluir o acordo e a lição que eu tirei
me dá a experiência de que... com a polarização de um lado e do outro não é bom nem para
homem e nem para mulher. " (. ..) ''Daí, rompemos o acordo e ele foi trabalhar, dividimos as
despesas, ele voltou para a Faculdade para estudar, melhorou o nosso relacionamento."
(. ..) ''Então, a lição que eu tirei disso é que o homem desempenhar todos os papéis da
mulher ou a mulher desempenhar todos os papéis do homem não é bom para os gêneros!
Há que se encontrar um meio-termo!" 68

Esta terapeuta acima, colocando-se a si mesma como parte do


dilema do questionamento dos papéis de gênero, demonstra o tipo de embate
estabelecido entre homem e mulher no nosso contexto atual. A questão se
amplia ainda mais ou se intensifica, quando se trata de um grupo minoritário,
diferente do dominante, como é o caso de vínculos entre homossexuais
femininos ou masculinos. 69
Possivelmente os terapeutas estão influenciados pelos debates
realizados pelo movimento feminista pós-década de 60, período em que tanto se
discutiu o lugar da mulher na sociedade. Questões como a dominação masculina-
- através do poder e da autoridade exercidos sobre mulheres e crianças - o
controle da sexualidade feminina e a dupla moral sexual foram, naquele
contexto, temas centrais.
Na década de 70, o movimento feminista brasileiro conheceu o
auge de sua força e vitalidade, inclusive nos âmbitos do debate teórico e dos
trabalhos acadêmicos. Naquela época, buscava-se a legitimação política e as
várias vertentes feministas, embora não tivessem uma identidade unificadora,
introduziram este debate no Brasil. A segunda metade dos anos 70 marcou
decisivamente o impulso dos movimentos feministas e a abertura da academia a

68Questões relativas a como educar meninos e memnas também emergem. Esta outra terapeuta fala sobre as
brincadeiras infantis: ''Acho que a educação de meninos e meninas mudou!" (. ..) "Os pais jogam mais
futebol com suas meninas e as mães brincam de boneca com os meninos. As famílias não têm mais
preocupação tão grande com o menino que brinca de boneca, vai virar 'viado~ .. esse tipo de coisa."
69 Esta discussão, por vezes, não se limita ao tema da troca de papéis, mas fala-se numa saída de um estado
de polarização. Vejamos o que diz esta terapeuta: "Nós estamos numa época de transição muito
importante, então nós estamos saindo da polarização do que seja psicologicamente masculino e
psicologicamente feminino e fazendo uma troca. Isso é doloroso, mas acho que isso é belissimo e eu creio
que vai trazer muito resultado. "

40
essa questão teve início por volta deste período. Sobrevivendo e sendo
preservados até o final da década de 80, os projetos libertários feministas
ajudaram a sedimentar a noção de "patriarcado", ao denunciarem a opressão da
mulher e o controle da sexualidade feminina. Nas palavras de Sorj (1992: 17):
"Construiu-se uma teoria social em tomo da posição das mulheres nas
sociedades patriarcais."
Não podemos nos esquecer que foi também naquela década que
a Terapia Familiar teve seus primórdios no Brasil, através das primeiras
iniciativas de terapeutas brasileiros que se dirigiram para centros de atendimento
à família no exterior em busca de formação específica, como abordamos no
capítulo 4. No Brasil, os terapeutas de famHia estavam, portanto, emergindo
como categoria de especialista ao mesmo tempo que a teoria feminista colocava
a opressão da mulher no centro de suas formulações. Embora o marxismo seja
muito anterior, foi na mesma época que esta corrente de pensamento ganhou
espaço entre intelectuais brasileiros e a exploração de classe transformou-se em
tema proeminente. Os tetnas das desigualdades entre os sexos e da exploração
de classe ganharam destaque no Brasil da década de 70. No contexto,
assumiram proporções expressivas as idéias de que, para além da anatomia
sexual, o gênero é um produto social transmitido através das gerações (ou seja,
é aprendido e representado) e de que o poder era distribuído de maneira
desigual entre os sexos, cabendo à mulher uma posição subalterna na
organização da vida social brasileira.
Os terapeutas de famHia, ao comentarem a realidade de seus
clientes e também a sua própria, expressam elementos marcadamente presentes
nos dilemas vividos durante as décadas em que prevaleceu o debate do
movimento feminista. Isto é, o período em que se discutiu a emancipação da
mulher, a entrada e o reconhecimento das mulheres no mundo público com base
na rejeição enfática do determinismo biológico70 como explicação adequada da
persistência da desigualdade entre os sexos.
Alguns terapeutas trouxeram o tema da alteração do contexto
dos papéis sexuais na famHia, apontando para a necessidade de emancipação
dos indivíduos das formas tradicionais de vida social. Mas observou-se,
também, que a co-participação nos diversos espaços pode ser sentida como
elemento que fomenta a competição entre homem e mulher. 71 Os terapeutas

70 Mesmo a maternidade como um valor essencialmente feminino, também tem sido questionada. Esta
terapeuta fala de clientes: "'-Não quero ter filhos, não acho que a maternidade define a mulher'. E há
muito esse discurso, embora, na prática, isso acabe pesando. Isso tem acontecido muito comigo: chegar
casais que decidiram não ter filhos e tal. Acho que a mulher chega na menopausa, dá um revertério!"
71 Vejamos, como exemplo, a fala destas duas terapeutas:
"Uma competição maior entre homem e mulher, eu não sei... Eu estou pensando um pouco, talvez existisse

(continua)

41
observam um embate entre os gêneros, em relação à posição da mulher e do
homem no mundo público e privado. Estão presentes em seus discursos os
temas da opressão, da perspectiva emancipatória das mulheres, da divisão
sexual do trabalho, da segmentação do mercado de trabalho e da divisão do
trabalho doméstico. E frente a este universo de questões, há terapeuta que
considera que tudo esteja mesmo mais complicado:

''Eu acho que... como sempre, eu acho que as idéias andam mais depressa do que as ações.
Então, acho que tem muita confusão ainda nisso a respeito do que é aceitável para marido,
para mulher, para homem e para mulher, a respeito do comportamento de homens e
mulheres. "
"Complexizou, ao meu olhar, complexizouJ''72

Os terapeutas detectam, então, a existência de um processo de


constante negociação para ordenar a vida doméstica, seja em casais homo ou
heterossexuais. Dentro deste universo, estes especialistas consideram haver
mais stress entre mulheres que trabalham dentro e fora de casa:

''Eu acho que as tarefas ficaram mais divididas, as responsabilidades aumentaram, acho
que existe um stress maior. " (. ..) "Um stress até por definição do próprio papel, quem faz o
quê, quando, quem fica em casa quando se tem dois trabalhos urgentes, um do pai e um da

uma competição menor no sentido de que cada um tinha os seus papéis mais demarcados."(. ..) "É, até
porque competem profissionalmente, muitas vezes... às vezes a mulher ganha mais que o homem, coisa
que antigamente não era tão comum encontrar, não era esperado da mulher que ela ganhasse tanto
dinheiro. Enfim; ela compete no seu trabalho fora, então eu acho que essas coisas... mudaram muito as
relações."
"Uma disputa... enorme para ver quem vence: se eu e o meu histórico familiar, se o outro e o histórico
familiar que vence. Regras da casa, como ganhar dinheiro, como aplicar, como cuidar das filhas
mulheres... Fazemos planos ou não fazemos planos... 'Não, na minha familia não se fazia planos, levava
tudo como vinha, então eu também não vou fazer planos. ' O outro diz concretamente: '-Sim, eu sempre
fui de familia que fazia planos e eu quero fazer planos.' "
72
Numa apreensão mais acadêmica, uma terapeuta ligada à Universidade comenta uma pesquisa que
coordenou: "O grupo de pesquisa de familia que eu coordeno. " (. ..) '~ modificação do papel feminimo é
uma coisa impressionante, mas tão... olha, em todas... foram 900 redações que foram entregues por
escolas de nivel A, B e C, por crianças que estão entrando na pré-adolescência, quer dizer, estão
formando uma concepção, portanto, entre 9 e 13 anos de idade, ftita em Recife, ftita em Vitória, feita em
São Paulo e em Curitiba." (. ..) "O perfil da mulher mudou. Em todas essas, só em três redações a garota
disse ... em todos os níveis sociais... que queria ser dona-de-casa e ficar em casa cuidando dos filhos. Só
três. Nenhuma delas deixou de dizer que quer ter filhos, mas todas elas, estão absolutamente quase que
naturalmente convencidas que vão ter o seu dinheiro e sua profissão. É, com isso, sabe o que está
parecendo? Um homem perdido... inconsistente. Ele não sabe mais como ser homem sem guardar o papel
de provedor, entendeu? Está muito interessante, o homem vai ter que fazer o que a mulher fez: se
agrupar, discutir, saber como ele lida com essa nova mulher. Ele está um tanto quanto perdido." (. ..)
"Nos meninos e nas meninas, foi ... mas é incrível: 'Eu quero me casar e ter filhos! Eu quero me casar e
ter filhos!' Então, esta conversa de intelectuais, não sei o quê, de que a família está fora de moda, de que
a família não sei o quê... é nada! A familia está invadida pelos técnicos. Eu tenho fortes restrições a isto,
mas a família é muito forte e parece que é um anseio que nós, de fato, desconhecemos. "

42
mãe, quem fica com o filho, como é o critério de urgência. ''73

Tentamos, neste trabalho, olhar os gêneros no modo como estes


terapeutas os concebem e como os compreendem no interior da dinâmica
conjugal e familiar. A totalidade de terapeutas que entrevistamos para este
trabalho é constituída de mulheres, pois nesta especialidade, é mais raro achar-
se um homem no exercício da atividade. Este predomínio de mulheres deixa
sugerido que estas falas estão atravessadas pela questão de gênero. Isto pode
indicar o quanto esta atividade é concebida através de um discurso de mulheres,
no contexto sócio-cultural brasileiro.
A questão do "igualitarismo", tratada por Heilbom (1992), retorna
também na fala dos terapeutas, seja para marcar a tentativa de homens e
mulheres compartilharem os mesmos espaços, ou no seu reverso, para
questionar tentativas realizadas de inversão de papéis tradicionalmente
identificados como femininos e masculinos.
Nas falas de terapeutas, observamos a persistência de alguns dos
temas centrais disseminados através dos discursos do feminismo e do
psicologismo emergentes em nossa sociedade durante os anos 70.

***
Diante do que encontramos nos discursos de terapeutas e
clientes, sobre a experiência das pessoas nestas duas composições
contemporâneas de família - a monoparental e a composta por casal

73 Estas outras falas alinham-se na mesma direção:


"E também eu noto outra mudança, que eu acho que é significativo, que, há vinte anos atrás, a gente tinha
queixas na área da sexualidade diferentes das de hoje. Há vinte anos atrás era a época da descoberta do
orgasmo feminino, então tinha muita terapia na qual havia queixa de disfunção sexual, porque as
mulheres não se excitavam ou não gozavam. Eu acho que teve uma tamanha difusão nos meios de
comunicação sobre questões na área da sexualidade feminina, que hoje é muito mais raro ter um caso,
por exemplo, de ... disfunção de orgasmo. Agora, aumentou muito, me parece, as disfunções de desejo,
não sei por quê as pessoas estão mais estressadas." (. ..) "Então eu trabalho mais hoje com falta de
desejo. Eu sinto esta mudança... bem menos com problema de orgasmo. 11
''Eu acho que, para a mulher, ficou muito complicado a coisa de ela ser... ou dona de casa, ou mãe de
família, ou dona de casa e mãe de família e depois começar a querer outras coisas e ir tentar essas
outras coisas. Ou, ao contrário, uma mulher que já entra numa relação com um lugar profissional, com
um lugar de respeito, para manter esse lugar de respeito, para se suportar esse lugar de respeito, uma
boa profissional e uma dona de casa razoável, que pode não tirar o pó de tudo todo dia, mas que tem as
coisas razoáveis, eu acho isso uma batalha. 11 (. • .) "Se espera da mulher que ela limpe melhor o pó da casa
e que ela tenha tudo em ordem, que ela seja boa mãe, continua esperando. Existe uma teoria de que: 'É
ótimo que a gente compartilhe coisas, que a gente tenha mais dinheiro, que a gente compre uma nova
televisão, mas eu ainda quero o pó tirado da casa.' 11

43
homossexual - e na experiência da extensão familiar (como veremos adiante),
observamos que a família, nestes tipos de configuração, compõe um sistema de
parentesco ampliado diferente do modelo do padrão dominante tradicional - a
família nuclear composta por pai, mãe e filhos. Em conseqüência disto, a
definição de direitos e obrigações e, até, de quem faz parte ou não do sistema,
está em questão.
A família vem construindo uma nova história. Foi com esta
perspectiva que optamos pela análise dos tão variados discursos mencionados
na Introdução deste trabalho. Partiremos, agora, para a análise do sistema
representacional encontrado nas famílias estendidas, a fim de que possamos
caracterizar melhor os dilemas mais recorrentemente vividos nestas
composições familiares. Seguiremos a mesma estratégia - análise dos discursos
de terapeutas e clientes-, e a mesma linha de orientação teórica para focalizar,
no capítulo a seguir, a experiência da extensão familiar.

44
CAPÍTULOJ

EXTENSÃO FAMILIAR

EM CAMADAS MÉDIAS, DA CIDADE DE SÃO PAULO

-TERAPEUTAS DE FAMÍLIA E SEUS CLIENTES

"Pela própria velocidade do processo no Brasil, o


que se tem é a aquisição de novas identidades ... que
se sobrepõem às antigas identidades posicionais,
sem contudo alterá-las substancialmente."

Sérvulo Figueira (1991 : 192)

No "I Congresso de Terapia Familiar", realizado em São Paulo


(julho/1994), a família que, neste trabalho, optamos por chamar de estendida, foi
"batizada" de "família reconstituída" nos títulos de atividades como palestras,
workshops e mesas-redondas. A referência a um certo batismo nos indica a
busca de definição de nomes para estes fenômenos sentidos ainda como muito
recentes. 74 Como pretendemos demonstrar ao longo do capítulo, as pretensas
novas imagens acabam por conviver com as antigas exigências.
Para tanto, abordamos a experiência da extensão familiar e seus
dilemas, empregando como recurso metodológico, a análise do modo como tais
pessoas e seus terapeutas concebem este universo de interação no grupo
ampliado. Para focalizar as preocupações transmitidas pelos especialistas ao
lidar com o divórcio e a extensão familiar, utilizamos as falas de terapeutas de
casal e família durante as atividades já mencionadas (Veja Anexo 2). Assim,
buscamos compreender estes fenômenos no modo como são representados por
tais profissionais buscando, também, compreender como eles concebem o
trabalho terapêutico, que realizam com estas famílias.
74 Vejamos a fala desta terapeuta: "A família reconstituída está mergulhada no não-sei. O social não dá o
nome. Os terapeutas de família nesse Congresso deram o nome de família reconstituída. Podia ser
recasamento e aí todo mundo não ia saber se era o primeiro ou segundo." (... ) "Enteada, madrasta,
padrasto, pertencem à história de viuvez. Nós não temos ainda palavras para essas relações que estão
surgindo no social." ( ... ) "Enquanto uma cultura não nomeia, quer dizer que ela não reconheceu, ela não
batizou." (...)"O social não batizou este relacional."

45
Optamos pelo nome "família extensa" ou "estendida", embora o
termo "reconstituída" tenha sido o eleito pelos organizadores e palestrantes do "I
Congresso", pelos terapeutas, em contraposição ao termo "família extensa",
desde há muito utilizado pela Antropologia, para referir-se às famílias do
período colonial. 75
Para observar as representações por meio das quais os
elementos da farmlia estendida operam, posicionam-se, definem quais são suas
obrigações recíprocas e se articulam na constelação de afetos (ódio, amor,
ciúmes etc.), algumas famílias foram observadas em situação de consultório.
Utilizamos, portanto, alguns dados de observação reunidos ao longo de 15 anos
de minha experiência em atendimento familiar, em consultório particular na
cidade de São Paulo. Analisamos este universo preponderantemente através da
fala dos pais- isto é, dos adultos-, uma vez que foram eles os que se tornaram
uma presença constante nestes atendimentos mencionados. A fala de filhos foi
considerada nos casos em que estes freqüentavam as sessões de psicoterapia
com os pais. Assim, primeiramente abordamos alguns dos te1nas que emergem
em sessões de terapia em consultório para em seguida, tentarmos uma reflexão
sobre estas experiências e relacioná-las com o contexto mais amplo que se
pretende analisar. Por opção metodológica, fazemos uso de alguns dos nomes
adotados pelos próprios clientes para denominarar os parentes dentro do
espectro em pauta.
Como podemos também verificar neste capítulo, o material
representacional encontrado na fala de clientes e terapeutas apresenta um
quadro que aponta para preocupações semelhantes, já que os terapeutas são
operadores neste sistema da família. O que percebemos é que os especialistas
produziram termos técnicos para nomear expressões de senso-comum. Por
exemplo, enquanto terapeutas estão falando em relação de "lealdade", em
delimitar "fronteiras" ou em ajudar a família a "ressignificar" suas experiências,
seus clientes queixam-se da diferença de condição entre "quem é mãe" ou
"quem é pai" e "quem não é", assim como das regras etn vigência ou até da
ausência de regras no grupo familiar.

• Família extensa ("reconstituída")

A família estendida, ao compor um novo sistema de grupo


doméstico, decorrente do divórcio e de casamentos subseqüentes, gerou um
questionamento em torno da definição das posições e novas posições na

75 Famílias compostas pelo núcleo conjugal e sua prole legítima, ao que se incorporavam outros parentes,
afilhados, agregados, escravos etc., e mesmo concunbinas e bastardos, como descrito por Gilberto Freyre.

46
estrutura de parentesco e, portanto, da definição do código de regras através do
qual os direitos e obrigações são delimitados no interior da família.
Por conseqüência destas novas experiências de grupo, instalou-
se na família e no espaço de trabalho dos peritos, uma imprecisão no sistema de
classificação dos parentes. Ocorre que a significação para uma mesma posição
passou a variar, o que trouxe uma experiência sentida como problemática, uma
vez que a classificação é importante porque é ela que oferece às pessoas uma
orientação sobre como um parente deve se comportar em relação ao outro.
A natureza das relações mudou76 de tal modo, que as pessoas
não sabem como se posicionar no grupo. Surgiram novos tennos e, então, novas
posições na rede de parentes, como por exemplo, no caso da categoria "meio-
irmãos" ou "meio-irmãs". 77 Neste contexto, psicólogos, juízes, assistentes
sociais e, a própria família, buscam criar sistemas classificatórios que possam
ser aplicados a todas as situações e, com isso, evitar o desconforto de um
relativismo, no qual cada situação seja regida por códigos diferentes. Há uma
busca, portanto, por estabelecer e estabilizar um novo código para o sistema de
parentesco ampliado, já que as referências anteriores não servem mais para
ordenar as atuais.
Esta crise da nomeação foi detectada, tanto no discurso dos
terapeutas, quanto no de seus clientes. Talvez em razão mesma desta imprecisão
na nomeação dos parentes, a família de modelo nuclear tradicional continue
sendo :freqüentemente percebida como aquela que é a mais simples e, por vezes,
mais desejada, já que a ela é atribuído um grau razoável de estabilidade em
decorrência de uma nitidez maior quanto à delimitação e às significações das
posições no seu interior. Na família nuclear, portanto, as posições no sistema de
parentesco e suas significações por estarem estabilizadas, servem de referência
e orientam a ação no grupo da família, de modo mais preciso e, portanto,
confortável.
Entretanto, simultaneamente à idealização da família nuclear,
deparamo-nos com a situação recente na qual a natureza das relações na família
foi de tal modo alterada que os membros dos grupos ampliados não têm clareza
acerca do modo como se posicionar e se representar em relação a estes grupos.
Tais transformações no grupo doméstico trouxeram a necessidade de se criar
modelos classificatórios que possam ser aplicados ao novo sistema. Neste
processo de busca de um novo modelo, observamos que o valor da
76 Terapeuta: "Antigamente, há muito pouco tempo atrás, ter pais divorciados era uma vergonha. Quem é da
geraçlio aqui que teve pais divorciados sabe que não é a mesma coisa que a criançada hoje na escola
fala: 'papai e mamãe se separaram, eu gosto, vou ter duas casas e tar O outro que chega em casa e diz:
'fulano ganhou dois não sei o quê, porque o pai dele ... eu também quero que vocês se separem'!"
77 E possível encontrar situações como a de uma filha que divide o quarto com mais duas "meio-irmãs": uma,
filha de sua mãe, tida em seu primeiro casamento; outra, filha de sua mãe, tida no casamento atual, o
terceiro. Ela, filha do segundo casamento de sua mãe, convive com outras duas irmãs de pais diferentes.

47
consangüinidade concebida como a descendência biológica persiste.78 Apesar da
evidente impossibilidade em posicionar os novos personagens na antiga
concepção de rede de parentesco, observamos uma tentativa recorrente de
procurar recolocar os novos personagens nas posições mais conhecidas: pai,
mãe e :filho(s). Este elemento parece explicar porque o tema da imprecisão do
sistema de classificação dos parentes apresentou-se como um dos dilemas mais
freqüentes nas sessões de terapia com famílias estendidas.
Se a consangüinidade continua sendo um valor, as demais
relações de afinidade que emergiram destas transformações recentes (não mais
somente relações de sogros com genros e noras), adquiriram a feição de crise.
Isto porque originalmente tais relações sempre foram vínculos de afinidade e,
depois, porque estes vínculos foram rompidos com o divórcio. Constatamos que
na família estendida é freqüentemente problemático lidar com as relações de
afinidade e, em conseqüência disso, o vínculo com enteados acaba por revelar-
se ambíguo. Como veremos mais adiante, esse aspecto emerge com força
particular na fala das mulheres em segundo casamento.
Vejamos, primeiramente, como estes conflitos são expressos por
terapeutas e clientes a partir do que chamamos crise de nomeação. Observamos
claramente que a busca de reconhecimento de um lugar na sociedade e na
família para as posições dos novos parentes e a necessidade de uma nomeação
que preencha as exigências das novas experiências transformaram-se nos
grandes eixos do dilema vivenciado por estes grupos ampliados. Um dos
exemplos pode ser o fornecido pelos nomes que surgiram para os filhos se
dirigirem à nova mulher do pai. Mãe 2? Madrasta? Os termos que carregam a
idéia de uma substituição da mãe não oferecem, por exemplo, uma significação
nova para este lugar de mulher do pai: mãe 2 pode ser a substituta boa, em
contraposição à "madrasta". Este último é um termo percebido pelos
entrevistados como sendo muito carregado de conotação negativa e
persecutória; uma conotação provavelmente oriunda dos conteúdos dos contos
de fadas, onde, via de regra, a madrasta é a encarnação do mal que toma o lugar
da mãe após a viuvez e novo casamento do pai. Boa ou má, em geral, nesta fase
de mudança na farm1ia pós-divórcio, a nova mulher do pai é geralmente

78 Tornay (1971: 71) define consangüinidade do seguinte modo: "Por consangüinidade entende-se uma
relação social entre pessoas que reconhecem ter ao menos um antepassado comum, enquanto a aliança é a
relação criada por um casamento." Embora não desconheçamos que na Antropologia relação
consangüinea não é sinônimo de relação biológica, neste trabalho é esta a concepção que emerge na
categoria dos discursos de clientes e terapeutas. No caso dos nossos entrevistados, a representação de
consangüinidade é construída sobre o modelo biológico, conseqüentemente são concebidos como parentes
prioritariamente os que descendem do mesmo pai e da mesma mãe. Nesse sentido, consangüinidade se
torna sinônimo de descendência biológica. Embora nenhum sistema de parentesco resulte pura e
simplesmente dos laços biológicos, o valor atribuído a esses laços por nossos entrevistados é tão forte que
cria dificuldades para situar na rede de parentes inúmeros personagens ligados ao marido e mulher de um
casamento especifico.

48
representada como alguém que deve entrar no lugar de mãe nos contextos em
que esta não está presente.
Deste modo, observamos que a preservação da importância da
consangüinidade instala uma ambigüidade: ao mesmo tempo em que se procura
integrar uma nova mulher na posição de mãe, sabe-se que a relação com esta
figura é, na verdade, uma relação de afinidade e não de consangüinidade. Na
família "reconstituída", quando se tenta posicionar os novos personagens na
constelação de posições já conhecidas - pai, mãe, marido, mulher, genro, nora
etc.-, o resultado é inoperante e conflituoso. Neste tipo de escolha de termos,
parece haver uma tentativa de camuflar ou dissipar tensões vividas nas novas
posições, pois que se tenta "encaixar" um parente afim, em posição
anteriormente preenchida por um parente consangüíneo. 79 Em decorrência disto,
não se consegue posicionar, de fato, os novos parentes na rede de parentesco, já
que a consangüinidade ainda é o valor prioritário.
Diante da persistência deste valor, a idéia de reposição das
posições tradicionais igualmente incide nas opções pelos termos de senso
comum também para denominar a nova composição familiar, como é o caso da
expressão "família substituta". Verificamos o interesse dos terapeutas em ajudar
a família na busca de uma nomeação que seja satisfatória para o grupo da
família. Em um dos eventos do "I Congresso", uma terapeuta arrolou as
denominações das quais tem tido conhecimento: "família substituta, família de
recasamento ou recasada, família reconstituída, família multi-parental, família
agregada, família mista, família remendada, reacomodamento familiar, família
juntada, família amigada, família adotada, família postiça, família dos meus, dos
teus e dos nossos, família reciclada, família de segunda mão, nossa família." E
outra terapeuta acrescenta: "família mosaica". &o
Em 1996, verifiquei em uma família o uso do termo "mãe-
drasta", em cartão de Dia das Mães oferecido por um enteado e sua família à
nova esposa do pai (Veja Anexo 6). Nesta família, os termos "mãe-drasta" e "vô-
drasto" são de uso corrente. Concluimos que a família estava em permanente
busca de nomes que mais expressassem suas concepções sobre tais posições no
parentesco e que a aparição destes novos termos, num segundo momento,
denotavam o início de uma nova significação para estes lugares - as concepções
originais estavam sendo recriadas. A "mãe-drasta" já não é nem a mãe, nem a

79 Cabe lembrar que uma denominação que pode ser bem vista em uma família, pode, na outra, mostrar-se
insatisfat6ria, embom se conformem à ela Veja a fala deste cliente: "Padrasto é o nome que tem, feio ou
bonito!" Parece que essa lacuna na nomeação propicia que, inicialmente, se empreste velhos nomes, em
certas ocasiões, apesar deles não satisfazerem ao usuário. Este fenômeno parece estar presente também em
outros países. Em francês, por exemplo, o termo belle-mere e beau-pere são utilizados tanto para chamar
a madrasta e padrasto como também para chamar sogra e sogro.
80 Observou-se o uso do termo família patchwork, por parte da tempeuta americana Anne Bernstein, presente
em workshop no Rio de Janeiro, em 17 e 18.08.95.

49
madrasta. Na mesma direção, podemos citar o exemplo de uma terapeuta a
quem os filhos do novo marido chamam de "boastra". Esta nova condensação
indica que ela é considerada uma boa madrasta e não a encarnação da malvada
personagem dos contos de fadas.
O tema das posições no parentesco remete a uma discussão
sobre o alcance e os limites de cada integrante na família. O modelo de família
nuclear consangüínea visto como expressão de simplicidade e estabilidade,
assim como a imprecisão quanto à nomeação nas famílias estendidas são temas
bastante emergentes também entre os terapeutas. Isto é, constatamos que não
são somente os familiares que estão em busca de nomes para as famílias
modernas ou para seus novos membros; os próprios terapeutas, que trabalham
com estes grupos deparam-se com o problema colocado pela imprecisão. 81
Nesta direção, mna terapeuta levantou a seguinte questão: "-Como é que se
fala da mãe de um garotinho em família de recasamento, dentro de uma
sessão?" 82 E acrescenta a mesma profissional:

''Em português [apalavra/ não existe. Por exemplo, como é que... qual é a tua relação com
o namorado da sua enteada? Você não é nada dele! E é, não é? Mas não tem um nome para
designar isso e isso é uma das dificuldades, porque eu acho que enquanto não existe um
nome que designa as relações é porque essas relações não estão claramente estabelecidas.
Então, os papéis não estão claramente definidos culturalmente. Então, a ausência do nome
tem um significado importante. "

Esta passagem sugere que a terapeuta percebe, de algum modo,


que nomear não é uma atividade inocente e que é, ao contrário, um desafio
complexo pois que implica a definição e a distribuição dos papéis referentes às
diversas posições na família. Dito de outro modo, a escolha dos nomes para os
novos parentes nunca é desprovida de significados, já que traz consigo a
demarcação implícita sobre o lugar de cada um na família e sobre o seu papel.
Em meio à crise de nomeação, os terapeutas precisaram encontrar nomes até
para as novas composições de família geradas pela possibilidade do divórcio e
de novo casamento. E os nomes criados pelos especialistas para estas familias
levantam polêmica. Vale a pena pensar, por exemplo, sobre um termo
específico, atribuído pela "família dos terapeutas" à família pós-divórcio:

81 Os terapeutas de família nomearam esta composição de família por "reconstituída" para poderem atribuir
nomes às atividades do "I Congresso", que tratariam deste tipo de configuração doméstica. Todos
parecem, de fato, perguntar-se sobre os nomes e lugares destas novas pessoas na estrutura de parentesco e,
portanto, sobre os papéis destas pessoas na família. A fala deste pai confirma isto: "A nossa sociedade
deveria inventar um nome para as pessoas numa familia de segundo casamento!" Constata-se, através
destes elementos. que terapeutas e clientes estão juntos nesta necessidade de nomear.
82 Esta dificuldade para a designação dos parentes é uma experiência também observada pelos terapeutas em
sua clientela: "Os meio-irmãos, eles... isto é uma das dificuldades de familia reconstituída, a falta de
nomenclatura para você designar os parentescos. "

50
"reconstituída"83 • Este nome comunica a idéia de que a unidade familiar se
desarranjou e foi coloca~ posterionnente, em um novo arranjo. Na fala de um
terapeuta: "O divórcio tem uma vivência de fracasso!" A recomposição em outra
unidade familiar pode, então, sugerir um tipo de remediação para o sujeito que
"fracassou" no casamento anterior.
A idéia de . que algo tenha se constituído, depois se
desconstituído e, a seguii,. ·reconstituído sugere um retomo à composição
original. Isto é interessante porque revela duas percepções do divórcio: de um
lado o divórcio aponta para o novo e, de outro, indica uma tentativa de
recompor a unidade, como se ela retomasse à composição da estrutura anterior
e recuperasse seus elementos. Esta ambigüidade cria um paradoxo: de um lado,
parece que se fala de uma família nova; de outro, remete-se à composição
antiga. Porém, como já mencionamos, os novos parceiros não podem se
encaixar automaticamente nestes lugares anteriores, pois isto significaria
assumir não só posições preexistentes, mas também o conjunto de atitudes
referente a estes lugares na estrutura de parentesco. O problema está, pois, na
extensão das novas relações e na necessidade de sua incorporação em algum
sistema. A.permanente inadequação da atividade de nomeação indica, portanto,
que a questão classificatória é estrutural .
Numa outra vertente, alguns especialistas consideram que a
configuração familiar estendida esteja mais próxima de uma família que se
ramifica, a partir de um núcleo original do que de uma célula que se recompõe.
De qualquer forma, convivemos em meio a uma variedade de imagens: uma
família que se ramifica, uma família que se reconstitui, uma nova família ou
composições sobrepostas de família. Todas estas imagens demonstram a
perseverança do modelo nuclear consangüíneo como referência primeira. O
termo "sobreposições" ou "famílias sobrepostas" sugere a idéia de diversos
modelos nucleares entrelaçados. O tenno "família ramificada" procura
igualmente respeitar a idéia de um núcleo inicial a partir do qual se desenvolve
uma rede. O modelo inicial é sempre aquele formado por homem, mulher e
filhos. Assim, tenta-se configurar uma visão no sentido do novo que
paradoxalmente reincide na referência do modelo consangüíneo.
Os próprios terapeutas de família parecem não ter facilidade
para abrir mão do modelo nuclear consangüíneo como um valor. Assim, a
mesma terapeuta que salienta a idéia de que a família reconstituída traz uma
"redefinição de pertencimento", "de quem tem a propriedade sobre o filho" e
"coloca em cheque a noção de família que temos" pode dizer:

83 Nome utilizado no "I Congresso" para título de atividades. Em livros de Psicologia encontra-se também o
termo "recomposição". Em Maldonado (1989), por exemplo, há um capítulo intitulado A Família
Recomposta.

51
"Cada um de nós tem que ter uma representação nuclear. Mas ao mesmo tempo eu posso
me tomar adulto com a representação nuclear e como que não poder usufruir e integrar as
novas realidades. Então eu acho que a família nuclear é um adjetivo importante na
construção de uma pessoa 84

Podemos extrair desta narrativa a avaliação de que é através do


valor da consangüinidades' que tanto terapeutas como clientes ainda demarcam
a propriedade sobre o filho. Disto segue que a família mudou, ela pode variar,
mas o que não mudou é o valor da consangüinidade. É ele que define à quem
pertence o filho. As pessoas acreditam que é preciso ter filhos e que tem sido
através da consangüinidade que continuam a ser definidas as posições de pai e
mãe. Este é um elemento essencial para estas famílias de camadas médias de
São Paulo, para seus terapeutas e para o Sistema Judiciário. Como veremos no
capítulo 5, no espaço do Fórum, a condição de consangüinidade é privilegiada
nas decisões relativas à guarda de filhos e nas definições referentes a
legitimidade, distribuição da autoridade e propriedade do tempo de convívio. É
exatamente nesta direção, que outra terapeuta fala sobre a necessidade de se
"restabelecerem as relações com os pais originais". Deste modo, a unidade
nuclear pode ser identificada e preservada. Diz:

''Está oco"endo muito o terceiro casamento e ai vai ficar com um pai em cada parte; se ela
tem essa r(!.ferêncja não perde a identidade. "

Esta fala salienta, com isso, a crença na importância da


existência de modelos claros, onde os pais biológicos são vistos como sendo os
pais, isto é, aqueles que oferecerão aos filhos um modelo de identidade. 86
Podemos, neste momento, atentar para um outro aspecto da questão. A
preservação do modelo nuclear consangüíneo demarca a propriedade sobre o
filho e define os vínculos de autoridade sobre a prole. Disto podemos inferir
que o problema não parece estar apenas na presença da imagem de núcleo
84 A mesma terapeuta que recorreu ao modelo nuclear tradicional, depois volta a abrir o panorama: "A
fami/ia pode ser de um reforencial biológico, amoroso, do teto onde eu moro, dos recursos de apoio
financeiro, dos apoios para a minha auto-estima."
Sj Há ainda quem pense que a famUia nunca se separa em função dos laços consangüíneos. Veja este aspecto
na fala desta terapeuta: "O que eu tenho sentido é o seguinte: que essas pessoas, em geral, silo obrigadas
a crescer muito para administrar muitos setores, porque famllia nlJo se separa. EntiJo, o que acontece? O
casal se separa, a fami/ia nlJo. Embora eles morem ou elas morem em outro lugar, elas têm a primeira
familia ou eles têm a segunda familia e, às vezes, a terceira familia, porque eles pertencem à primeira,
pertencem à segunda e pertencem à terceira. "
86 Em geral, ao lado da visão tradicional de famllia, o novo é sempre mencionado de forma evidente,
reafirmando, a todo tempo, uma ambigüidade. Uma outra terapeuta o aponta: "A categoria social familia
estendida já é llJo grande... você sabe que os colégios... esses colégios mais... vamos dizer assim de
classe média-a/ta, alguns desses coMgios nlJo estão mais... muitos deles não fazem mais festa de Dia das
Mães e festa do Dia dos Pais, porque é o tal caso... e a criança fala assim: 'Mas eu não quero dar para a
minha mãe, eu quero dar para a tia!" Observa-se que o desrespeito da criança ao critério da
consangüinidade como um valor, parece colocar a escola em uma situação sentida como embaraçosa.

52
inicial, mas no fato de que não se pode reinventar essas relações tradicionais de
referência consangüínea. A extensão das novas relações nascidas na nova rede
de parentesco exige a construção de um outro sistema, que possa incorporar os
novos parentes afins e os "meio-irmãos". Estes últimos conformam uma
categoria nova.
Podemos arriscar dizer que, de um lado parece haver um
esforço dos terapeutas de família na direção de uma abertura para o diferente,
isto é, para possibilidades de novas composições de família, de arranjos
diversificados. Cremos poder afirmar também que tal posicionamento tem por
horizonte a elaboração de um novo sistema classificatório de parentesco que
oriente a ação dos indivíduos nas variadas posições. De outro lado, parece
renitente a esperança de restauração ou preservação do modelo nuclear
consangüíneo - pai, mãe e filhos -, na medida em que se tenta alocar novos
elementos nestes lugares, isto é, quando se tenta incluir os novos parentes nas
significações tradicionais de tais posições. Tal aspiração, contudo, é condenada
ao fracasso, pois os novos participantes não cabem nas antigas posições. Os
primeiros termos eleitos para nomear os novos parentes e para denominar as
próprias composições de família, transmitem esta imagem.
Constatamos, portanto, que os membros destas configurações
familiares não conseguem pensar a si mesmos como um grupo ampliado e os
terapeutas, por sua vez, também oferecem resistência em aceitar essa ampliação
no grupo doméstico, uma vez que insistem na importância da referência parental
consangüínea como estrutura inicial e/ou principal. Dito de outro modo, os
mesmos peritos que ajudam a formar o sistema novo na família são os que
promovem um modelo de resistência à representação deste sistema ampliado na
medida em que vinculam os conteúdos de propriedade e a autoridade sobre o
filho às figuras parentais consangüíneas.
Souza (1994: 52) indica que estudos de Santrock & Warshak (1986)
chegaram, por outros caminhos, a conclusões semelhantes. Estes autores
afirmam que a literatura psicológica trabalha com uma noção de família ideal,
composta por pai, mãe e filhos. Argumentam ainda que os terapeutas, apesar
das tentativas de compreensão dos processos ligados a estas novas composições
de família e de busca de um repertório também novo, freqüentemente acabam
por operar com a noção tradicional de família, ou seja, não abrem mão do
núcleo original consangüíneo como o primeiro critério de referência.
Voltemo-nos, mais uma vez, para o tema da consangünidade
como elemento definidor da propriedade e da autoridade sobre a criança. A
partir dos dados que levantamos pudemos verificar que a consangüinidade
torna-se o parâmetro estrutural mais importante na tentativa de se superar os
conflitos familiares tanto para terapeutas quanto para seus clientes. É através
deste critério que são equacionados os parâmetros acerca de quem tem direito

53
ou não sobre a criança, das responsabilidades financeiras de cada um dos pais,
assim como acerca das visitas aos filhos, do tempo de permanência com os
mesmos, e do tipo de dedicação a ser dispensada à criança.
Neste contexto, a identificação dos papéis parentais é
estabelecida a partir das relações de filiação. Não apenas se demarcam, deste
modo, a distribuição da herança e da propriedade privada, mas também a
distribuição dos afetos. A propriedade do filho é o argumento que funciona
como instrumento de disputa, já que é ela que permite acesso ao poder de
definir e influenciar um certo diagrama das atenções trocadas entre os membros
do grupo doméstico (por exemplo, se será permitido ver um "meio-irmão" ou
não e quando se vai).
Sendo a consangüinidade o valor organizador, o diagrama dos
afetos toma-se mais complicado quando pai e mãe não vivem juntos. Daí
advém, provavelmente, a preocupação manifestada por uma das terapeutas
entrevistadas ao afirmar que "vai ficar um pai em cada parte" quando houver
muitos casamentos subseqüentes. Para administrar estes vínculos, passa a fazer
diferença, então, o fato de os filhos residirem ou não com um dos genitores. A
administração do tempo conjunto e o tipo de vínculo estabelecido com a
criança são conduzidos de maneiras muito diferentes, pois que estão
condicionados à situação de o filho morar ou não com pai/mãe.
Terapeutas e clientes desenvolvem, portanto, modos de lidar
com as tensões que emergem quando a convivência em família não supõe co-
habitação. Numa sessão de terapia, uma mulher de quarenta anos fez o relato de
uma conversa com sua enteada durante a qual a enteada teria dito: "Eu acho que
deve ter sido super dificil casar já com bagagem! Eu não aceitaria casar de
aliança e ter dois, três pares de filhos!" Esta jovem referia-se ao fato de que o
pai se casara pela segunda vez e que as três filhas dele vieram morar com o
casal, já na primeira semana de casamento. Começar a família já "com
bagagem" pode realmente significar uma experiência mais complexa na medida
em que se tem que administrar diversas ordens de necessidade e as
particularidades de mais pessoas.
Mesmo o pai, que não reside mais com seus filhos (quando a
guarda está com a mãe), pode referir-se à dor sentida com a ausência destes
filhos no cotidiano como maneira de demonstrar preferência pela possibilidade
de residência conjunta com os mesmos. Experienciando uma situação deste tipo,
um pai que acabara de retomar de férias com sua nova mulher e os filhos deste
casamento manifestou sua angústia nos seguintes termos:

"O que significa para um cara que já teve duas filhas e ficou longe delas, o que significa
ficar longe de seus dois filhos?"

54
Este pai parece se ressentir de sofrer perdas na relação com
ambas as proles e estas perdas são identificadas a partir da não residência
comum. A tendência a conceber a família de estrutura nuclear consangüínea que
reside conjuntamente como sendo a fórmula familiar mais simples também pode
estar presente na fala de filhos já adolescentes. Por exemplo, uma garota de
quatorze anos diz:

"Uma mãe e um pai já tá bom! Não precisa de dois!" 87

O desejo de compor uma família nuclear pode ser, ainda, mais


abertamente assumido. Nesta linha, uma mulher, diz em terapia: "Eu preferia
que fossem todos meus filhos de barriga!" E a busca de um lugar mais
confortável nisto tudo pode mesmo levar a fantasiar mais uma condição
considerada ideal:

''Melhor que não existissem é, de fato, você tem razão, não é confortável! Tenho duas
fantasias impossíveis: a primeira é que eles não existissem, seria ótimo! A segunda é o
inverso disso, que eles existissem e fossem meus. Duas fantasias impossíveis, então, tenho
que lidar com isso. É muito complicado para mim se eu detesto muito a mãe deles como vou
gostar deles?"

Ao prolongarmos o assunto, esta madrasta se recorda de um


sonho em que conta constrangida, onde a primeira mulher do marido havia
morrido. O marido complementa: "Esta fantasia é constante na minha cabeça!"
Assim, se a "ex" não existisse, todos poderiam compor um único núcleo familiar
e morarem juntos. Esta mesma mulher parece fantasiar que a ex-mulher de seu
marido também preferiria que todos os filhos fossem dela. Assim diz em outro
momento:

''Eu não consigo me relacionar com a mãe dessas crianças. Nós duas temos filhos do
mesmo homem. Então, tudo o que eu posso fazer, ela pode. Quer pegar meus filhos no
colo... se eu deixar, ela pega todos e põe na casa dela!"

As crianças funcionam como um tipo de passado do qual não se


pode esquecer ou se desvencilhar. Há a tendência de pensar que o melhor seria
que os filhos não existissem ou, se existissem, fossem todos do mesmo casal,
como abertamente expresso na citação acima. A preferência pelo modelo
87 Apesar deste tipo de comentário acima em geral, os filhos parecem aceitar a convivência com o novo
cônjuge dos pais, identificand<H>s num lugar distinto do de pai e mãe. Costumam buscar contato com o
novo cônjuge, incluindo-o em seu mundo. Os adolescentes freqüentemente aceitam os novos parceiros dos
pais, mas não deixam de assumir uma postura crítica sobre a relação amorosa estabelecida - se
consideram-na boa ou questionável. Por exemplo: "Não sei como minha mãe aguenta!" Ou mesmo: ''Ah!
Ele é legal com ela!"

55
nuclear de família, como sinônimo de bom grupo familiar, é constantemente
verificada, uma vez que nele fica cristalizada a idealização de que todos os
problemas de relações entre as posições no parentesco são dissipados. O desejo
por este tipo de família no contexto das novas condições trazidas pelo divórcio,
faz com que as tentativas de reacomodar novos parentes em velhas posições
criem um movimento de resistência em conceber um novo sistema. A nova
mulher do pai, que tenta suprir a posição de mãe substituta para as filhas
pequenas do marido, por ocasião das visitas de fim-de-semana, acaba por não
conseguir o arranjo que talvez seja esperado por todos. O papel de substituição
fica falso, já que histórias dolorosas e sentidas como fracassos podem ser
vividas nestas posições. O procedimento de comparação da posição da atual
mulher com a da ex-esposa, além disso, põe em relação duas mulheres em
posições estruturalmente antagônicas. É comum que tais mulheres se descrevam
em situação de oposição e mesmo como rivais.
Neste contexto, a nova mulher tende a preferir que todos os
filhos fossem dela. A composição "casal com filhos conjuntos" é vista como
mais simples e mais confortável. Deste modo, "casar com bagagem" ou pegar o
"pacote inteiro" é visto freqüentemente como algo complicado. Às vezes pode-
se falar disso de maneira espirituosa para quem não tinha fann1ia anteriormente,
por exemplo, diz uma pessoa: "-Arrumei um kit família já pronto!" Mas o riso
indica, de uma maneira dissimulada, que a situação é percebida como
desagradáveL
O quadro a que chegamos é o de que, apesar da mudança
sociológica da família, a família nuclear consangüínea figura como sendo o
modelo dominante aspirado e o modelo concebido como mais simples, tanto na
concepção dos familiares como na dos peritos. Isto parece contribuir para que
as dificuldades vividas em relação à nomeação dos novos parentes e a
significação de tais posições nos novos arranjos, não se dissolvam. 88
A idéia de que a composição nuclear de família é mais simples
revela o quanto as pessoas que participam destas composições ampliadas têm
considerado complexa a vivência cotidiana junto a filhos que passam a
freqüentar duas casas. Neste último contexto, surgem inúmeras questões em
relação ao ordenamento do tempo e do espaço. Os terapeutas de família
mencionam este aspecto através da necessidade de delimitar as fronteiras nas
relações intra e inter-grupais. Tanto a dinâmica de vida do casal como a das
crianças fica afetada pelo número de casamentos experienciados. A definição de
fronteiras de parentesco é uma problemática de ordem teórica e também

88 Este tema persiste mesmo ainda por ocasião do "ill Congresso" (Rio de Janeiro/1998). A programação do
evento continha uma palestra intitulada: "O padrasto: tio, pai, marido da mãe, amigo, chato, ou o quê?"

56
existencial, já que o tipo de arranjo realizado mapeia as vias pelas quais podem
circular os afetos.
Nos depoimentos analisados, as queixas referentes à
administração do tempo e do espaço na família provêm, em geral, da fala
feminina. São as mulheres que mais mencionam as dificuldades sentidas nos
arranjos cotidianos. Talvez porque, embora atualmente participe do mundo do
trabalho fora de casa, ainda é sobre ela que recai a necessidade de supervisionar
filhos. Pai e sogra, muitas vezes, são percebidos na óptica materna como as
pessoas que podem brincar mais com a criança e fazer passeios, estando isentos
de exercer qualquer vigilância sobre as tarefas escolares, a higiene pessoal etc.
Nesta linha de raciocínio, fica instalada uma diferença significativa na
administração do tempo e do espaço quando os filhos são residentes ou não na
casa do novo casal. A necessidade de uma defmição do território (dos direitos
e obrigações) e de uma distribuição da autoridade na família estendida é
muito focalizada pelos discursos que analisamos.
Assim, o tema da posição no parentesco e de sua nomeação,
freqüentemente mencionado pelos terapeutas, como parte do cotidiano do
consultório com estas famílias, está conectado à resolução de tensões e à
redefinição da autoridade concernente a cada posição na família. Vejamos a
título de exemplo, a fala de três terapeutas, que abordam este tema:

"Quer dizer... então, não tem nada que diga assim: Olha, esse cara até não tem nome,
porque QJlfli o atual marido da mãe não tem nome, não é? Quem é? É o tio, é padrasto,
não é padrasto que é nome feio ... Daí, o coleguinha da escola pergunta: 'Quem é esse cara,
é o teu pai?' 'Não, não é meu pai, é o marido da minha mãe'. E começa uma série de
coisas. Que direitos essa pessoa tem, que autoridade ela tem em relação... ela está dentro
de casa, é um adulto que está dentro de casa, tem autoridade, manda ou não manda? Eu
acho que tudo isso fica muito complicado, por causa de todas essas coisas, mas são coisas
que... acho que nós... que a sociedade, não é nós só, acho que a sociedade vai ter que
repensar nisso. "
''Manda ou não manda, tem voz ativa ou não tem, como que refaz espaço, como que refaz a
categoria das ordens... os substitutos, os novos companheiros entram em qual proporção, o
que está fora .fica como? Eu acho que nessa organização, a coisa ficou mais complicada."
''É um problema dificil aí também, a questão de quais são as autoridades e o papel
outorgado ao padrasto e à madrasta. "

Considerando o conjooto dos depoimentos, podemos depreender


que se as posições no parentesco não estão bem demarcadas, emerge um
problema em relação à definição da autoridade e de quem a detém, quando e em
que circunstância. Nesta mesma direção, os terapeutas mencionam, ainda, como
alguns clientes sentem a diferença de condição entre quem fica com a guarda e
de quem não a detém. Afirmam que são comuns, por exemplo, as queixas das

57
mães de que o ex-marido apanha as crianças já "arrumadinhas" para passear e
que não põe limites, preocupando-se apenas em passear com os filhos, mas não
em educá-los ou cobrar que façam as tarefas escolares89 , cabendo a elas a tarefa
educativa, ou seja, o exercício da autoridade.
Vafiáveis legais, como ter ou não a guarda da criança, podem
interferir, então, no modo como se concebe a autoridade e o poder em relação à
ela. Os terapeutas mencionam a culpa sentida pelo cônjuge que deixa a casa,
freqüentemente o pai, como um dos fatores que dificulta saber administrar
limites aos filhos, mostrando "elásticos frouxos" .90
O terapeuta pode mesmo se sentir solicitado a ordenar o espaço
familiar sem normas e, neste sentido, é muitas vezes surpreendido por perguntas
como: "Qual a forma adequada que eu devo chamar a mulher do meu pai?"; "O
que é ser pai de crianças que eu acabei de conhecer, o que se espera de mim? O
que eu posso fazer e o que eu não posso fazer?" A este tipo de demanda, reage a
terapeuta: "Ele está querendo obedecer, mas a gente nem sabe nem que tipo de
filho, que tipo de mulher, como é que é a ideologia dele sobre tudo isso, o pai da
criança onde é que está, quer dizer, ele pede o figurino!" Observamos que, na
óptica dos terapeutas, há uma atmosfera de questionamento sobre como se vai
legislar esta família que tanto clientes como terapeutas percebem como sendo
uma nova realidade.
A sensação de pouco referencial para se lidar com este universo
recente de q~estões é abertamente denunciada por uma terapeuta, do seguinte
modo:

''Se eu tivesse que fazer uma afirmação genérica, eu diria assim... temos pouca cultura
nacional. O que eu quero dizer com cultura nacional é pouca experiência cultural. Por
exemplo, os alemães, eu vejo do meu lado alemão, você conhece o divórcio há quase 400
anos... 300 e tantos anos. O povo que viveu esta experiência já sabe lidar com ela, sabe das
possibilidades, das dificuldades, dos problemas que pode trazer, daquilo que parece que vai
resolver, mas não será e nós não temos isto. As gerações estão entrando no divórcio 'há três
por quatro': casam, descasam, casam, descasam. "

Questões culturais relativas aos gêneros também são


mencionadas, acreditando-se que determinam atitudes em relação ao tipo de
89 Uma terapeuta, ao mencionar um atendimento, diz: "Chega em detenninado momento em que essa mãe
se sente assim prejudicada porque ela tem que cuidar de um filho, enquanto o marido está sozinho, está
vivendo a sua vida e ela não pode ter liberdades porque tem hora para chegar em casa, para sair etc.,
então ela não quer continuar com esse filho. E o pai não quer assumir o filho. Acho essa uma situação
muito dolorosa!"
90 A fala desta terapeuta é um exemplo disto: "Em geral, são os homens que carregam uma culpa enonne
por haver abandonado os filhos, se separado dos filhos, não morar na mesma casa e tem toda uma
história nesse sentido, que ele fica ... assim, muito não conseguindo por limites nos filhos. Ou seja, Já que
vou ver só o fim desta semana, como que eu vou privar de alguma coisa!' " (. ..) "Eles carregam uma
culpa, por não poder cuidar adequadamente desse filho."

58
autoridade concernente às posições no grupo familiar. Nesta linha, uma
terapeuta fala sobre a influência dos padrões culturais na atitude adotada pelos
membros da família:

'~ .. e culturais até. Por exemplo, se você tem um homem árabe casando com uma mulher que
tem dois filhos, se o pai legítimo deles não se cuidar. ele passa a mão, ele passa a mão e
fica o pai e o homem da casa, da forma autoritária, mas da forma participante. Se são
brasileiros, é muito mais difícil... é como eu digo, é uma experiência cultural também que a
gente está tendo. "

Diante da diversidade, sentida até em relação à distribuição do


poder e da autoridade na família, os terapeutas parecem focar seu trabalho no
tema do conflito e buscam, com a família, adaptações que sejam menos
dolorosas. Temas como fronteiras na família, papéis de seus componentes e
autoridade são constantes quando, na terapia, se fala de filhos de pais
divorciados ou em processo de divórcio.
No que se refere aos filhos que vivenciam a experiência de mais
de um casamento dos pais, a tendência do pai parece ser a de tentar tratá-los
pela ideologia da igualdade: ''-Os filhos são todos igualmente amados" .91 Nesta
mesma linha, é freqüente que se espere da nova mulher, ou do novo marido, que
trate os filhos biológicos e os enteados do mesmo modo, quando todos estão
reunidos. É comum que as madrastas reajam, dizendo: "-Há uma real diferença
entre um filho de barriga e um que não é!" Uma mãe, ao comentar que é mais
afeiçoada a seus filhos biológicos do que aos enteados-, brinca falando como
se fosse seu próprio bebê que tivesse falando para ela: "-E eu mamãe? Também
sou de barriga, não sou predileto?" Através deste exercício de ventriloquia
imaginária com seu bebê, esta mãe ao emprestar a sua fala, parece preenchê-la
com conteúdos seus.
Constatamos de um lado, a presença de uma ideologia da
igualdade por parte dos homens e, de outro lado, um pedido, por parte das
mulheres que se faça a reconstrução da diferença, como sugerido no depoimento
acima mencionado. O pai pode perceber alguma confusão com relação ao lugar
de cada um, mas, em geral, não descreve as diferenças entre.filhos biológicos e
enteados de forma conflituosa. Talvez por ainda se conceber o espaço do lar
como predominantemente feminino 92, e se acreditar que as mulheres são mais
ciumentas e que, portanto, criam mais rivalidades, os comentários masculinos

91 Este pai defende seus filhos biológicos colocando como condição para sua nova mulher, que ela deva
também gostar muito deles, para poder manter o casamento. Diz: "Eu amo essas crianças 'para cacete'!
Se quiser ficar comigo é assim! Adoro meus filhos. Por mim, ficaria todo dia, todo final de semana. Por
mim teria uma creche!"
92 Valor que pode ser observado ainda coexistindo com o outro valor da igualdade entre homens e mulheres:
ambos com o espaço da rua e da casa.

59
aparecem menos carregados de peso emocional e são mais racionalizados. Os
comentários mais inflamados, em geral, são feitos pela esposa de segundo ou
subseqüentes casamentos, como veremos a seguir, ao falarmos mais sobre a
madrasta.
É igualmente comum a idéia de que todos, unidos, vencerão os
obstáculos. A postura de enfrentar conjuntamente as dificuldades da vida é
expressa por um casal da seguinte maneira:

"Vamos sofrer juntos, vamos cuidar das crianças, pois já nasceram, não têm culpa. Estamos
juntos e vamos enfrentar o mundo!"

Esta idéia do lema "unidos venceremos "93 é desarticulada toda


vez que irrompem mal-estares, o que denuncia que pertencer a diversos grupos
vistos como sobrepostos é um processo percebido como complicado.
Sentimentos de exclusão podem ser mais facilmente ativados nestas famílias,
onde, muitas vezes, o outro não está incluído na história de relacionamento com
os vínculos mais antigos. Um dos temas mais recorrentes nestas famílias é sobre
o tema do pertencimento, isto é, a questão dos direitos ou deveres de cada um
conforme a situação. A construção das legitimidades das regras que definem
quem faz parte do grupo familiar pode variar dependendo do montante de tempo
que se tem junto com pai ou mãe, da história do ciclo do casal, do momento em
que crianças já estavam ou chegaram nestas relações, da moradia conjunta ou
não etc. Instaura-se uma diversidade conforme a condição de cada um no grupo.
A chegada de enteados para o fim-de-semana e a alteração que
estes provocam na rotina domiciliar, por exemplo, podem despertar na unidade
familiar a necessidade de repensar ou reacomodar a composição das "lealdades"
e "alianças", de forma que os sentimentos de pertencer e de compartilhar
também se reacomodarão. Isto ocorre em situações onde a mulher sente-se
deixada de lado com o filho biológico do casal, quando chegam os enteados e o
marido sai com eles; ou onde o marido sente-se tratado como mais um filho em
casa, quando todos os filhos - conjuntos e não-conjuntos - agrupam-se para um
passeio comum com o casal no fim-de-semana. Estas mobilidades na estrutura
do grupo parecem exigir de todos novas readaptações. Nestes momentos,
quando se entra no terreno do sentimento de exclusão, também sentimentos de
rejeição são relatados:

"Uma coisa que estava boa... agora estou até repelindo eles!"

93 Esta outra frase também expressa esta mesma posição: "As crianças já estão aí, vamos cuidá-las e fazer
uma grande família!"

60
Como expressa a afirmação acima, esta mulher passa a rejeitar o
contato com enteados porque considera que os mesmos estão desarticulando o
arranjo obtido no dia-a-dia do grupo da família. A partir disto, podemos ver que
a necessidade de delimitar território e definir quem tem autoridade sobre a
criança revelam-se, então, fatores prementes, para que se possa organizar a vida
cotidiana. Vejamos este aspecto na fala destas mulheres:

"Que autoridade você tem com essa crianca. a madrasta? Eu não quero tomar o lugar da
mãe, você tem a autoridade do pai. Eu sou uma pessoa e quero ao menos ser respeitada na
minha casa. Em relação a mim, eu espero respeito. "
"Tem que ser bruxa, ser radical, chegar a este extremo, porque não tem nocão de farol!"
"Fomos todos à casa da minha mãe nas férias e o X ficou em São Paulo por causa do
trabalho. Com meus filhos foi fácil, mas com eles era difícil porque eu pedia que não
subissem no muro etc., e eles não me atendiam. É diferente quando é filho! Você tem mais
autoridade, põe mais limite. Com eles não dá!"
"Tem que ver o espaço que vai conviver com essas meninas, senão fica... pode ligar a
qualquer hora, quakJuer dia, tem que ver isso. Tem lei, tem regra, pensão alimentícia, tem
processo em cima. E uma relação ruim. " (. ..) ''Esse apartamento que moramos, ela morou
com ele antes. O telefone era dela, então, quando deixa ela se aproximar, ela invade." (. ..)
"Se você não faz a barreira. daqui a pouco estamos comendo pizza todos juntos. "

Os depoimentos acima mostram quatro situações diferentes: a


primeira madrasta, ela quer ser respeitada, mas crê não ter a autoridade, sendo
esta do esposo e pai da criança; a segunda madrasta, já se coloca na posição de
quem precisa exacerbar uma autoridade para poder ser atendida; a terceira
madrasta, se vê numa posição de autoridade, que é, contudo, diminuída em
relação a possuída sobre seus próprios filhos biológicos; a quarta madrasta
expressa desagrado, reclamando por seu direito à autoridade e, então, de
infringir limites, para garantir a formação de fronteiras no grupo.
No quarto depoimento, fica evidente, ainda, que a nova mulher,
em geral, não considera a "ex" como parte de sua família, já que em sua visão, é
inadmissível "comer pizza todos juntos".
Uma terapeuta cita uma idéia da americana Kaslow (1995),
apresentada no workshop "Casamento, Divórcio e Recasamento" (12 a 14 de
dezembro de 1991 ), quando aquela autora teria proposto o uso do termo "wife in
law". 94 Seguindo o modo da língua inglesa de denominar os parentes- "mother
in law", ''father in law", "brother in law" etc. -, pensa que, uma vez que ambas
as mulheres partilham do orçamento do mesmo homem, passam à categoria de

94 A terapeuta faz o seguinte comentário, a respeito da posição de Kaslow: "Então, são duas mulheres...
partilham e/ou disputam o orçamento de um mesmo homem, a atenção ... para os filhos, elas têm filhos
em comum com o mesmo homem muitas vezes, então ela criou esta expressão ''wives in law" (ri). Eu acho
que já dá para olhar essa questão de parentesco."

61
parentes. 95 Com uma pitada de humor, Kaslow sugeriu que a ex e a nova mulher
de um homem seriam parentes, por compartilharem do orçamento de um mesmo
homem. Pode-se subentender nesta postura a noção de uma intimidade não
desejada, mas irrevogável, já que as duas conhecem o mesmo homem. Assim,
no novo sistema, é buscada a definição de quem pode ser considerado parte da
esfera privada da família. Os valores ligados à nuclearização da família são
preservados, o que dificulta ou mesmo impede que estas mulheres aceitem a
idéia de uma família mais ampliada. A visão da relação entre ex-mulher e a nova
mulher como uma relação de parentesco não é aceita, pelo menos não pelas
mulheres, já que entre elas estão as fronteiras mais inflamadas. 96
Como decorrência desta visão que não inclui ambas as mulheres
(a nova e a anterior) em um mesmo sistema, a família é sentida como
dividida.97 A autoridade parece, então, passar pela via do progenitor. É para os
pais biológicos que se pede permissão para algo e não para os padrastos, já que
o valor da consangüinidade é reiterado. É possível observar que nas diversas
manifestações das diferentes posições, a autoridade de pai e mãe biológicos é
reconhecida e tp.antida, tal como originalmente o era, na composição nuclear
anterior, isto é, durante o periodo de co-habitação dos pais.
Neste contexto, as diferenças geradas entre filhos residentes e
não residentes costumam incomodar, em geral, a nova mulher, trazendo tensões
nas questões relativas também ao espaço de cada um no interior da família,
exaltando novamente a problemática das fronteiras e da distribuição da
autoridade. Vejamos um exemplo na fala desta terapeuta:

''E também se queixam... a segunda mulher, de como que ele não põe limites nos filhos, que
deixa fazer qualquer coisa na casa dela, que também perturba os próprios filhos dela, que...
os outros podem tomar Coca-Cola a qualquer hora e ele não deixa o filho dela tomar Coca-
Cola a qualquer hora. Então, essa situação que eu vejo é que o homem fica muito não
sabendo como se posicionar nessa situação. E ora cuida de um lado, e ora tenta resolver do
outro e fica muito confuso mesmo.

Observamos que mesmo em situações nas quais o pai esteja com


todos os seus filhos biológicos, pelo fato de parte da prole não residir
permanentemente com ele, acaba por prevalecer a representação de grupo
dividido. Deste modo, embora, com freqüência, seja dito que os filhos são
igualmente amados, nem sempre as estratégias de ação entre pais e filhos são

95 "Mesmo que você não tenha pensão como mulher, os filhos têm", afirma Kaslow.
96 Diz uma madrasta: "Acho que é um conflito meu, uma vez que não casei com ela, não tive filho com ela
etc., não tenho nada com ela, tenho com a X, que é minha enteada!"
97 Pode ocorrer ainda eventualmente, uma ambivalência em relação à constituição do grupo-família. Diz uma
mulher: "O casal ainda não se formou, não sei se é uma família."

62
realmente iguais para filho residente e não residente. 98 Um pai pode, por
exemplo, oferecer oportunidades pessoais e/ou materiais a um filho que não
mora com ele e não oferecer condições similares àquele com quem resida.
Assim, podemos inferir que pai solteiro, pai casado e pai divorciado definem
fronteiras e estratégias de relação com os filhos que são também diferenciadas.
Devemos acrescentar a este quadro da diversidade, uma outra
situação: a de cônjuges com representações de grupo divergentes. O grupo
familiar identificado na representação da esposa e o identificado na
representação do marido podem não coincidir e esta diferença se manifesta na
emergência de conflitos sobre o modo com que cada um deles pretende
organizar o espaço e o tempo dos participantes no interior do grupo. As crianças
parecem mais disponíveis para a adaptação à farrn1ia ampliada, ao passo que a
mãe e a madrasta são geralmente mais refratárias aos processos adaptativos
requeridos por estes contextos. Vejamos um exemplo. Comenta a mãe que seu
filho de 5 anos teria dito:

''Papai, eu quero falar com minha irmã! Porque a mamãe não deixa eu falar com a minha
irmã?"

Ao que reage enfaticamente a mãe:

"Eu não consigo conviver com a 'ex', não consigo falar com ela no telefone. Então os meus
filhos não vão conviver com ela."(. ..) ''Esses telefonemas... é complicado! Não é tão íntimo,
não é tão pessoal!" (. ..) ''Eu gosto delas, gostaria de falar com elas no telefone sim, mas
prefiro perder para não ter estes problemas. Porque não dá!"(. ..) ''Não dá para conviver!"
(. ..) ''Precisa ver se eu quero falar com ela, se eu quero que meus filhos falem com ela. Se
ela quer falar com eles o tempo todo, ligar quanto quiser, mas eu não quero. " (. ..) ''Não
quero falar com eles todo dia!"(...) ''Do mesmo modo que eu tenho que respeitar que ele
possa querer falar diariamente com elas, ele tem que respeitar que eu não queira! Vamos
ter que negociar I"

Observamos nesta fala a presença de inúmeras assimetrias: entre


os filhos, existem irmãos consangüíneos que podem conversar diariamente e
outros que não, compondo outra categoria na óptica da esposa, a de "meio-
irmãos" (mas não na do esposo e pai biológico); entre o casal, já que o marido
compartilha de um tipo de intimidade com a ex-esposa, na qual a nova mulher
não está incluída e, em geral, não deseja estar. Vejamos outros detalhes desta
98 Nesta linha, este pai diz: "Tenho dois filhos que, se querem o pai durante a semana, à noite, não têm. Dois
filhos que têm. As crianças são diferentes com relações diferentes comigo. O que procuro fazer é dar
para cada um, nas situações especificas, o que eles precisam e para a X e o Y. (filhos de primeiro
casamento), conto historinhas porque podem conviver com a historinha. Eles levam a historinha para
conviver com o pai. É mais importante contar para eles do que para elas (filhos do segundo casamento),
é a presença do pai quando não estou. Fomzas que você arranja para dizer para as crianças: '-Olha,
você tem um pai, com alguma precariedade, mas você tem um pai!"

63
situação. Esta mesma mãe sugere que o marido tenha um BIP particular para
atender telefonemas de suas filhas e da ex-mulher. E a saída que vê é explicar
para seu filho:

''Não são irmãos, são somente meio-irmãos. Ela tem outra mamãe. " (. ..) "O X é seu irmão
inteiro e Y. e Z. são sueis irmãs-metade, meia-irmãs. X é irmão inteiro. "

E, sentindo-se em posição diferenciada em relação ao marido -


ele com "quatro filhos inteiros" e ela com "dois filhos inteiros" e duas enteadas-,
queixa-se a ele:

"Você tem a coisa de unir os irmãozinhos. Não existe isso, eles são separados!"

Quando o contato entre irmãos é mais livremente permitido, a


situação pode adquirir o significado de uma concessão. Diz uma mãe/madrasta:

''Estou numa relação de extrema generosidade de deixar os.filhos se relacionarem!"

Constatamos que mesmo quando não há o intuito de explicar a


situação como o tem a mãe cujas falas citamos acima, os filhos podem observar
uma distinção de lugares. Por exemplo, quando o nenen comum pode dormir na
cama dos pais e o enteado de um ou de outro não pode. Ou diferenças quando o
pai está ou não presente. Sobre estas circunstâncias, afirma uma mulher:

"O X não precisa arrumar o quarto, eu vou querer que o meu filho arrume. O X come na
mão do pai, eu vou querer que meu filho coma com o garfo. Mas eu só tenho um filho
mesmo!"

Porque esta mulher não é a mãe biológica da criança recém-


chegada ao domícílio e, conforme vimos, o valor da consangüinidade
prepondera, observamos que sua autoridade fica ambígua: de seu filho, ela pode
exigir que arrume o quarto e que coma com o garfo, mas do enteado, ela não
pode ter o mesmo tipo de demanda. Nesta linha, a mulher se queixa de que o
marido a desautoriza frente às crianças. Podemos perceber que, em princípio,
poderia não fazer diferença se os filhos são biológicos ou enteados, já que são
crianças que estão sendo cuidadas conjuntamente, mas no caso da família
estendida, esta distinção entre filho biológico e enteado instaura uma nova
sintaxe em que o fato de ser pai biológico - ou não -, conta em relação à
autoridade que se pode exercer. Deste modo, os filhos são prontamente
colocados em situações que lhes permite perceber diferentes graus de distinção
em virtude de suas posições, apesar de terem o mesmo pai ou a mesma mãe.

64
Há um questionamento em relação às fronteiras no grupo e aos
limites prescritos para as diversas posições no parentesco. Isto denuncia que a
representação sobre o grupo familiar nem sempre é compartilhada por todos os
seus integrantes e que as maneiras de concebê-lo variam em conformidade com
as posições que ocupam na família. A definição de quem pertence à família - e
conseqüentemente quem a ela não pertence - assim como a forma de
pertencimento são questões freqüentemente elaboradas de maneira distinta por
cada um dos cônjuges. Filhos de casamentos anteriores podem ou não estar em
equivalência de posição com os filhos da nova união. Via de regra, pai ou mãe
tendem a incluir todos os seus filhos biológicos no mesmo grupo, mas não
incluem na mesma condição os filhos do outro que são oriundos de relação
anterior. Entretanto, há a tendência de incluí-los num segundo grupo ampliado
que é visto como uma farmlia "sobreposta" ou simultânea.
Este quadro instaura outra necessidade: a de estabelecer uma
hierarquia perante a diversidade e a alegada sobreposição de unidades. Isto
porque a indefinição do papel dos novos parentes e a relação entre grupos
percebidos como sobrepostos requerem que sejam definidas as pessoas e/ou as
questões que devam merecer prioridade. A diversidade dos arranjos gera um
sistema de soluções também variável.
Segundo os terapeutas, existem infinitos tipos de arranjos99 :
segundo casamento de ambos os cônjuges com filhos de uniões anteriores, filhos
só do esposo ou só da esposa com ou sem filhos conjuntos, novo casamento e o
pai biológico das crianças falecendo nesse meio tempo, mulher que tem três
filhos de três maridos diferentes e tem que lidar com três paternidades diferentes
etc. Assim, os terapeutas ressaltam que a emergência de situações até então
inusitadas provoca um questionamento sobre a hierarquia nas posições de
parentesco e sobre a anterioridade de vínculos. A título de exemplo, vejamos as
situações descritas abaixo:

''Filho e mãe vieram antes do casamento. então, a hierarquia também é assim: '-Como que
você se atreve a falar assim comigo e a minha mãe, ela é minha muito antes de você a
conhecer~ E isso é uma realidade, a mãe já tem com essa filha ou já tem com esse filho, um
tipo de ligação que ele se sente com direito a reivindicar. Ele é anterior, tem mais histórico
com essa mãe, é mais importante e a mãe vai estar num conflito de lealdade. "
Terapeuta citando cliente: " 'A mamãe. ela deixava até esse fulano chegar, né, a mamãe é
uma pessoa muito mais aberta, muito mais aberta. ' " (. ..) ''Então além de você ter já as
triangulações que podem surgir num casal nuclear, você tem pessoas que participaram de
uma história aonde o outro ainda não estava presente'~

99 Terapeuta: "O que você observa, de um modo geral, é que existe uma infinidade de possibilidades de
arranjos."

65
Aos olhos dos terapeutas, parece então haver mais problemas
do segundo casamento em diante, uma vez que, via de regra, os filhos já existem
quando da formação do casal subseqüente. Os terapeutas apontam que a falta de
regras claras e padronizadas para os lugares dos parentes nestes novos sistemas
de parentesco origina diversidade nas condutas. Uma terapeuta cita três
exemplos de fala de seus clientes que são reveladores da gama de possibilidades
existente no desafio de "pensar o que é ser pai não biológico residente":
- ''Eu acho que pai é uma coisa que só uma pessoa tem direito a ser, eu gosto muito das
crianças, mas eu não acho que eu tenha que fazer nada de pai, porque se eu fizer vai fazer
mal a ela. Fulana me pede para fazer, mas eu estarei fazendo mal a ela porque ela vai ficar
confusa entre quem é pai e entre quem não é, então eu sou um grande amigo";
- "Olha, eu acho uma palhaçada isso! Eu sou um pai que dá tudo isso, então, que se eu
gosto, se eu gosto de fulana, dou carinho para eles, pago as coisas deles, eu quero para o
bem deles participar da educação deles. Então eu acho que eu tenho que jazer isso, fazer
aquilo outro";
- ''Eu quando muito sou amigo, eu sou companheiro da mulher, dela, da mãe deles, eu não
tinha nada que ver com o filho. A minha relação é com ela. A relação com os filhos dela é
um problema dela!"

O que parece estar em jogo em tais embates é saber o que é ser


pai numa família ampliada. Tal posição não necessariamente deriva da condição
de residência, como no caso do padrasto do primeiro depoimento citado que não
se posiciona como pai dos filhos biológicos da esposa, alegando que pai "é uma
coisa que só uma pessoa tem direito a ser". Posturas deste tipo claramente
reforçam o critério de consangüinidade como traço distintivo neste sistema de
parentesco.
Os terapeutas também observam que numa mesma fann1ia os
filhos manifestam expectativas diversificadas. Por exemplo, uma das filhas pode
estar dizendo ao segundo marido da mãe que "não é nada dele" enquanto a outra
deseja ser filha e não enteada. Assim, ao que alguns terapeutas chamaram por
"complexidade" familiar, podemos acrescentar a idéia da diversidade na
família. A este respeito, destacamos as frases de duas terapeutas:

"Cada vez é uma fàmília diferente. Não se pode ter respostas prontas. "
"Cabe se perguntar sobre quem {à/a, para quem e em que situação!"

A configuração da família estendida padece, portanto, de um


certo relativismo: dependendo do arranjo formulado pelo grupo, é gerado um
novo conjunto de regras. O imperativo de conjugar a necessidade de delimitar
fronteiras na família com a consideração de que tais fronteiras sejam
constantemente elaboradas constitui uma formulação corrente entre os

66
especialistas. Reorganizar fronteiras, então, aparece como uma preocupação
premente dos terapeutas que trabalham com tais famílias. Isto significa dizer que
grande parte dos profissionais considera a questão do estabelecimento de
fronteiras como desafio prioritário para estes novos grupos familiares.
Os terapeutas parecem entender que a delimitação de fronteiras
está intimamente referida à legislação do grupo e à demarcação do território.
Se anteriormente era o vínculo com sogro/sogra que constituía a principal fonte
de preocupação em grande parte dos casos, atualmente uma variedade maior de
posições está sujeita a questionamentos. too As fronteiras dizem respeito ao modo
como todos devem agir em relação à utilização do espaço concreto do domicílio
e em relação ao espaço afetivo. Neste sentido, as questões centrais da legislação
da vida em família estão referidas à definição de quem pode o que, quando e
como.
O tema das fronteiras na família é constantemente mencionado
pelos terapeutas como sendo a articulação de limites que devem ser
estabelecidos em várias direções: entre o novo casal e os ex-parceiros, entre os
atuais cônjuges, entre os filhos do marido com a nova mulher, entre os meio-
irmãos etc. Os clientes também fazem inúmeras menções à importância do
estabelecimento de fronteiras ao tentarem discernir quem pode - e,
conseqüentemente, quem não pode - ter determinados direitos e determinada
forma de participação nas diversas práticas cotidianas da família. O conteúdo
destas discussões nos revela que há diferenças entre filhos tidos em comum e
enteados, ou 'mesmo, entre filhos residentes e não residentes.
De um modo geral, os terapeutas concordam que as relações
entre pais e filhos se tomam mais difíceis nas famílias estendidas. Há
especialistas que acreditam que o filho não residente pode ser visto pelo outro
cônjuge como uma espécie de sogra, mais precisamente aquela sogra do
repertório de piadas populares que sempre aparece como invasora da
privacidade do casal e da família. De toda maneira, podemos afirmar que nestes
cenários sempre se questiona quem é parente e quem não é, quem pode ter
acesso à casa e quem deve guardar alguma distância cerimonial neste espaço.
Em tais circunstâncias, o tema das fronteiras sempre aparece acompanhado da
noção de invasão ou de transgressão de território. Uma das terapeutas
entrevistadas focaliza este aspecto quando afirma:

''Eu acho que a família reconstituída... você encontra modos de conviver que são muito
d{(erentes dos modos de conviver que a família nuclear nos anos 40, 50, 60 tinha com as
famílias de origem. " (. ..) ''Eu acho que a construção da fronteira ... eu estou muito ligada a

100 Esta terapeuta enfatiza tais mudanças: "O recasamento, o que ele vai trazer de complexidade e fronteiras
é de uma ordem, porque nós não estamos falando fronteira de sogro/sogra mais, não é? Porque isso as
pessoas já viveram de alguma forma isso! Como vão ser as fronteiras mais inflamadas?"

67
isso. você vê que eu estou repetindo muito isso, porque eu acho que o que caracteriza uma
família é uma fronteira onde existe especificidade de relações que se dão aqui dentro ou
que não se dão. que é a mesma coisa ao contrário, versus o de fora. E eu acho que na
família estendida tem muito isso, vamos dizer assim: 'Você sabe o que acontece? Ele entra
na minha casa, tem a chave da minha casa!' Isso é o que a gente falava da sogra!"(...) ''É
muito semelhante à sogra que mandava o pratinho preferido do filho, porque: '-Essa
mulher não sabe tomar conta do meu filho!' Você percebe que essa frase, 'essa mulher não
sabe tomar conta do meu filho', ela serve de nora para sogra, de sogra para nora e de
mulher para a nova mulher, é o mesmo tipo de conflito. " (. ..) ''Eu pensaria que, com esse
grande número de famílias estendidas, a criação da fronteira é uma questão de nós e os
parentes, porque é a mesma questão com sogro e sogra, cunhado e cunhada, essa coisa. ''~ 01

O tema das fronteiras aparece ainda na idéia de que é necessário


estabelecer uma diferenciação entre papéis maritais e parentais. Muitos
terapeutas advogam a necessidade de garantir o cuidado para com os filhos após
a separação do casal, o que aponta para a manutenção de um "relacionamento
co-parental pós-separação":

''Se um casal se separa... " (. ..) ''Mas, o que não tem possibilidade de se separar e nem de
divorciar, como você queira chamar, é a função paterna. E o que eu acho que muitos casais
confundem é se o divórcio inclui também o divórcio da função paterna. " (. ..) "Uma coisa
não tem nada a ver com a outra. Mas uma coisa é muito contaminada com a outra. " (. ..) ''E
eles ficam privados realmente muitas vezes desse pai ou dessa mãe. Geralmente esse pai,
porque o pai não conseguiu discriminar que ele se separou da mulher, mas seus filhos não
têm nada a ver com o divórcio. Então... e tudo isto é para te contar que, de um tempo para
cá, isto também felizmente mudou. " (. ..) ''E essa situação era uma situação, digamos... que
foi mudando também aos poucos e, por exemplo, antes, um casal se separava e era um casal
que nem se conseguiam olhar na cara e isso também aos poucos foi mudando. ''1°2

Esta mesma terapeuta fala sobre mudanças na relação entre ex-


parceiros e sobre a maior freqüência de pais pedindo a guarda de filhos. Sua
perspectiva é a de que os pais vêm descobrindo novas maneiras de se
relacionarem por causa da existência de filhos em comum. Nestes casos,
podemos observar que, ainda que os pais vivam em casas separadas, o modelo
nuclear de família continua sendo cultuado como aquele que é o padrão sadio e

101 Pode-se, então, falar das fronteiras na família sob a óptica da transgressão de um limite, da invasão de
espaço fisico ou psíquico. Nesta direção, uma outra terapeuta diz: "Um casal que se apaixona e quer ficar
junto e que tem um monte de gente em volta que não está apaixonado por ninguém e que tem, de repente,
uma relação de intimidade. A minha família! A minha família! É uma invasão total!"
102 A mesina terapeuta salienta a importância de um trabalho preventivo no sentido de procurar Inanter os
pais unidos no cuidado aos filhos: "E também a divulgação dessa situação no sentido assim ... de poder
esclarecer que... eles se divorciaram, não é proibido de eles se comunicarem, em função da possibilidade
de atender esse filho que precisa muito dos dois e que não adianta ter uma supermãe sem pai e que não
adianta ter um superpai sem mãe, porque nenhum dos dois é dispensável, muito pelo contrário, os dois
são absolutamente necessários. Então, os dois vão ter que encontrar algum ponto de contato, alguma
possibilidade de entendimento que vise só poder dar um suporte para o filho."

68
ideal. Tendo por horizonte esta matriz de idealização, tais pais continuam
vinculando sempre a criança às relações consangüíneas e preservando a noção
de casal parental, já que neste tipo de estrutura as posições no parentesco
possuem significados conhecidos. Como a avaliação dominante sobre os
arranjos alternativos é a de que são ainda por demais experimentais, tais
arranjos continuam sendo vistos como instáveis e imprecisos. Uma das
derivações deste embate entre visão idealizada de família nuclear e necessidade
de gestar alternativas claras e estáveis é o preceito de que, embora o casal possa
se divorciar, os pais não devem se separar. Em outras palavras, a visão
normatizadora de que a criança precisa de pai e de mãe. Em sendo essa a idéia
vigente, fica dificil compatibilizá-la com as situações cotidianas que se
inauguram com o divórcio e se desdobram com os casamentos subseqüentes dos
ex-cônjuges.
Nos eventos do "I Congresso", emergiu a discussão sobre
cústódia compartilhada, prática comum em muitos estados norte-americanos,
assim como no Canadá e na Alemanha. Por custódia compartilhada é entendida
a situação em que a guarda é concedida ao pai e à mãe simultâneamente. Assim,
os pais dividem a responsabilidade legal e os cuidados com a criança, de acordo
com critérios aceitos conio legítimos pelos ex-cônjuges e os arranjos que lhes
pareçam convenientes. No âmbito das discussões encaminhadas no referido
Congresso, esta idéia foi recebida com reticência. Parece ser um consenso
razoável entre os especialistas que seria melhor para a criança manter sua rotina
cotidiana em apenas uma das casas.toJ
O tema das fronteiras traz, portanto, para o centro do debate a
questão da vida cotidiana, isto é, a regulação de onde a criança deve tomar seu
café da manhã, de quem deve levá-la para a escola e assim por diante. No caso
da guarda compartilhada, a proposta é de uma simetria no exercício das funções
de cuidado e no espaço de circulação da criança. A noção de fronteira como
marco de interdição é substituída por uma noção que considera o valor da
igualdade nos direitos e nas obrigações.
Vimos que o divórcio e a contração de novos casamentos
fizeram com que os especialistas passassem a acreditar que estão frente a uma
modalidade de vida familiar formada por diversas farrn1ias que se sobrepõem
umas às outras. Tal viés interpretativo advogada que a dinâmica destas
sobreposições engendra várias redes de relações com posições que têm

103 Uma advogada, ao ser inquerida por uma psicóloga sobre a custódia compartilhada na realidade brasileira,
diz: "Muito diflcil passar! Agora atua/mente não passa!"(. ..) "Porque na realidade eles entendem que a
situação de ir e vir vai ficar diflcil. Agora o que se pode aumentar nesta situação, por exemplo, são as
visitas. Se um está com a guarda, o outro ao invés de ter visitas quinzenais, terá visitas no meio da
semana. Por exemplo, a semana que ele não vê a criança, ele terá uma visita."

69
significados distintos. Os especialistas que compartilham dessa visão
consideram haver uma sobreposição de demandas adaptativas.
Neste contexto, pai e mãe biológicos são identificados como as
pessoas que detêm a autoridade sobre a criança. É através deles que se definem
as fronteiras de pertencimento dos demais parentes, como vimos. O vértice que
marca os vínculos de parentesco é inscrito, portanto, através das relações de
consangüinidade. A criança herda relações de afinidade dependendo do
mapeamento que seus próprios pais fazem dos indivíduos dentro da rede de
vínculos. Ou seja, o mapa que detennina quem considerar parente por afinidade
ou não, fica, em geral, condicionado a como o casal parental demarca a
realidade do grupo da família. t04
Entre nossos entrevistados, o termo "família ramificada",
presente como outra possibilidade de nomeação, era muito pouco utilizado,
talvez por incluir membros como ex-cônjuges e enteados na categoria de
parentes. Este tipo de inclusão é sempre problemático porque, de um modo
geral, não podemos afirmar que determinados personagens envolvidos na
extensão familiar sejam necessariamente considerados como parentes. Como
exemplo desse aspecto, podemos nos remeter à situação de um enteado que
possa nunca mais ver um padrasto ou uma madrasta, no caso de uma
subseqüente separação do pai ou da mãe. E este parece ser um obstáculo
importante a considerá-lo como parente, uma vez que é comum a crença de que
"um filho é para a vida inteira". Neste quadro de incertezas e, sobretudo, de
imprevisibilidade as relações de consangüinidade se apresentam como
indiscutíveis, enquanto as de afinidade são sempre passíveis de ser consideradas
relações temporárias, periféricas ou questionáveis. Com isso, aparecem questões
sobre quem está incluído na família, quem dela está excluído e em que tipo de
ocasião podem ocorrer a inclusão e a exclusão.
O termo "família estendida" empregado para a família brasileira,
embora inclua agregados (enteados, por exemplo), em sua utilização no Brasil,
não parece considerar a totalidade de seus personagens como parentes, tal como
a idéia de ramificação poderia sugerir. 105 Como atividade do Instituto de Terapia
Familiar do Rio de Janeiro, foi promovido um workshop com uma profissional
norte-americana a quem o material impresso do evento (Veja Anexo 5) atribui
"larga experiência no atendimento de famílias pós-divórcio" e a formulação do

104 Cabe lembrar que esta é a noção de família encontrada no segmento social específico das famílias
paulistanas de nível sócio-econômico médio e alto que procuram os serviços dos terapeutas de família.
Como vimos no capítulo 2, à pág. 22, Sarti (1996), por exemplo, encontrou outra representação de grupo
familiar entre camadas populares de São Miguel Paulista, na zona leste da cidade de São Paulo.
105 Veja no Anexo 4, um cartão de Natal, onde a mãe/madrasta divide a família em dois sub-grupos nas
assinaturas, onde o segundo diferencia-se do primeiro por incluir enteados. Ela se utiliza do termo família
extensa, mas não no sentido de grupo único permanente de parentesco - diferentemente do que parece ser
a concepção do termo no exterior.

70
significado do termo expansão familiar com os seguintes dizeres: "É sua a
expressão 'família expandida', utilizada para designar aquele sistema onde os
pais separados, seus cônjuges atuais, as crianças e seus meio-irmãos constituem
um todo conectado."
Parece mesmo haver uma diferença de concepção entre o
emprego de termos como "ramificação" e o termo "extensão" ou "expansão"
familiar. Os termos extensão ou expansão comportam a idéia de uma ampliação
familiar, porém sem abrir mão da fronteira nuclear consangüínea. O termo
família estendida é o mais utilizado. Há indícios de que esta escolha tenha se
dado porque, em nossa língua, permitiria expressar a ambigüidade - tão
presente no discurso de clientes e de diversos terapeutas - entre família nuclear
e família estendida (com membros agregados). Neste sentido, a idéia de
"extensão" permite marcar a família nuclear e a estendida como experiências
distintas, ainda que sobrepostas.
Neste contexto, portanto, os terapeutas sentem que o seu papel é
o de auxiliar as crianças a identificar sua família e a nomear seus parentes, ou
seja, a demarcar as fronteiras do grupo familiar. 106 A falta de nomeação parental
para determinados personagens, conforme tratamos nas páginas anteriores, é
sempre lembrada, e parece estar em relação direta com a necessidade de
circunscrever o espaço familiar e seu alcance, assim como demarcar o limite de
cada membro no interior deste espaço, isto é, definir fronteiras às quais todos
devem conformar-se.
Constatamos através desta discussão que o tema das fronteiras
vem instaurando ampla polêmica a respeito de quem está ou não incluído na
rede de parentes. Nesta perspectiva, o tema da estrutura de parentesco na
família contemporânea e a forma de gestão de novas estruturas parecem
constituir o alvo da disputa cujos protagonistas são pais, filhos, novos cônjuges
e, até mesmo, os profissionais: juízes, psicólogos forenses, psicólogos da
família.
A indiferenciação dos papéis na fam.I1ia estendida tem como
conseqüência a disputa pela demarcação das relações permitidas ou proibidas
no interior do grupo doméstico. Vimos que a discussão sobre as fronteiras na
família traz consigo a indagação sobre quem pertence à unidade familiar e em
que situação. Do tipo de encaminhamento que for dado a este dilema dependerá
a definição sobre o que será considerado uma relação incestuosa e o que será
106 Esta terapeuta se vê ajudando a criança a nomear e reconhecer sua família, ou seja, a definir as fronteiras
pelas quais sua família será identificada: "A atitude dela passou a ser diferente e ela consegue hoje
perceber a familia do pai: 'o pai, a mulher do pai e o meu innão e eu moro com a minha mãe na casa
dela~ " (. ..) "A mulher do pai ela chama pelo nome, mas também chama os pais pelo nome e a innã. " (. ..)
"Na escola não conseguia falar: 'na casa do meu pai.' " (. ..) " ~ casa do meu pai, tem uma mulher que
mora lá, e tem meu irmão e tem a minha mãe ~ Então e isso tudo ficava de uma forma tão repartida na
cabecinha dela, que ficou muito complicado!"

71
entendido como uma união ilícita. Cabe lembrar que o casamento entre primos
de primeiro grau, ocasionalmente tolerado, já levantava polêmica. Atualmente,
novos vínculos de conjugalidade são inaugurados e muitas vezes fazem-se
presentes no interior de uma mesma rede de parentes.I07
Os profissionais que atuam com famílias mencionam situações
que, embora pouco comuns, expõem todos à necessidade de enfrentar uma
revisão dos parâmetros que prescrevem quais são as relações permitidas ou
proibidas, neste novo contexto da família. Referem-se a situações nas quais os
filhos que os cônjuges trazem de seus casamentos anteriores iniciam romance
que pode tomar-se um namoro e mesmo resultar em casamento. Assim, um
casal em segundo casamento pode deparar-se com um namoro entre o(a) filho( a)
e a(o) enteada(o) que vivem na mesma residência.
Tal circunstância familiar gera entre estes enteados uma relação
que tem um duplo sentido: de um lado, encontram-se em simetria, num tipo de
vínculo entre irmãos, pois, em geral, espera-se de ambos atitudes identificadas
àquelas que pertencem ao universo da irmandade; de outro, trata-se de dois
jovens sem relação de consangüinidade, o que os coloca, portanto, fora do
universo da proibição justificada pelo tabu do incesto conforme é apregoado
pela óptica prevalecente em nossa cultura.
Imaginemos como ficam as relações de parentesco neste tipo de
configuração familiar. Tomando como referência a filha biológica da esposa no
novo casal, podemos perguntar: o novo marido da mãe será simultaneamente
seu sogro? A partir do lugar da mãe desta jovem, podemos inquirir: o marido da
filha sendo também seu enteado, será ainda o irmão "postiço" de sua filha? E
quem determina "quem é o que de quem"? Tais indagações prestam-se como
exemplo para lembrar que este tipo de problemática também diz respeito às
fronteiras da família e que surge, eventualmente, em algumas famílias
observadas pelos terapeutas nos consultórios. A redefinição de pertencimento
exige, portanto, algum tipo de revisão das relações consideradas como lícitas ou
ilícitas. Desta maneira, abre-se um debate acerca do universo de relações que
fica proibido e o seu reverso, isto é, acerca das relações que podem ser
positivamente prescritas.

107 O caso internacionalmente conhecido do cineasta americano Woody Allen (62 anos) que se casou
oficialmente, em 23.12.97, com Soon-Yi Previn (27 anos), filha adotiva da atriz Mia Farrow, sua ex-
mulher, gerou grande polêmica. Segundo reportagem publicada no jornal Folha de São Paulo, de 25.12.97
(Ilustrada/ pág. 5), Soon-Yi foi adotada por Farrow aos 8 anos de idade, antes de seu casamento com
Allen. Na época, a atriz vivia com o maestro André Previn. Segundo a matéria de jornal, o romance entre
Allen e Soon-Yi foi o responsável pela separação entre o cineasta e a atriz. Situações como esta já fazem
parte da realidade paulistana. Uma terapeuta mencionou o atendimento a uma família em que o padrasto
engravidou a enteada.

72
• Economia dos afetos

Tendo por horizonte a família estendida e tomando por base as


imagens até aqui apresentadas, podemos dizer que a família busca a terapia com
a perspectiva de resolver os conflitos oriundos da natureza dos afetos
experienciados através do sentimento de mal-estar que se instaura com a
representação de que a família está dividida e para tentar acomodar questões
concernentes à vida material e afetiva (distribuição do espaço e do tempo) no
interior do grupo. 108
Na maioria dos casos, os filhos freqüentam ambas as casas e os
dias de visita e os fins-de-semana com o cônjuge que não detém a guarda
parecem fimcionar como organizadores desta parcela do tempo comum na nova
casa. Quando chegam os enteados, a rotina domiciliar é alterada. Isto gera um
tipo de experiência na qual a família se percebe como dividida e a
reciprocidade entre seus membros fica prejudicada. Chega-se a falar, como
vimos, em duas famílias "sobrepostas" ou "paralelas". Fixando esta imagem de
universo dividido, vejamos como fica o diagrama das atenções e dos afetos
distribuídos entre os parentes. Para tanto, destacamos a seguinte fala feminina:

"Tem a família de segunda à sexta e a dos fins-de-semana e férias. " (. ..) '~ família está
completa, tem quatro, agora, ela é extensa, tem dois a mais. " (. ..) '~s pessoas não têm claro
o que é a família a quatro e a seis'~

Esta mesma mãe/madrasta é a que me entregou um cartão de


Natal, ao final do ano, separando as assinaturas em dois blocos de família. À
esquerda, estão colocadas as assinaturas da família constituída por ela, o marido
e os filhos biológicos de ambos; à direita, as assinaturas da família constituída
por ela, o marido, os filhos biológicos de ambos e os enteados (Veja Anexo 4).
Podemos constatar que os esquemas de fim-de-semana e dias de
visita podem ser sentidos, então, como um dos aspectos organizadores da rotina
da segunda ou subseqüente família e que os filhos de casamento anterior podem
ser vistos como um "pacote" ou um "bloco" que chega para o fim-de-semana. É
em função dos que chegam que a rotina é alterada e, freqüentemente, a presença
dos filhos não residentes contribui para a sensação de divisão do grupo. Uma
mulher reclama que, com a chegada do filho de primeiro casamento do marido,
a família se divide e o segundo filho perde o contato costumeiro com o pai:

''Ele falou: 'Você cozinha para a gente?' Ele nem cogitou dizer: 'Vamos todo mundo para a
praça?'"

I08 Terapeuta: "Então, o que é mais dificil é organizar o tempo, o dinheiro e a atenção dada a essas famílias.
Então, existem, por exemplo, pessoas que se desgastam muito, porque acabam não tendo vida pessoal
alguma, porque têm que atender às necessidades das famílias que elas formaram."

73
Por vezes, os filhos de outro casamento podem ser percebidos e
assimilados como um pacote homogêneo que vem para o final de semana,
sobretudo se a diferença de idade não é grande:

"Elas são como um 'bloquinho', fala-se quase sempre delas juntas, passando pelas mesmas
etapas. "(. ..) ''É uma filha única dividida em dois, os problemas são semelhantes, lidam com
o casal separado. "

À esta fala da esposa, o pai das crianças reage argwnentando


que as enxerga como duas pessoas e que seria apenas uma contingência falar "as
meninas", pois, embora conformem um conjunto porque têm "problemas
comuns que vivenciam", "uma é água e outra é vinho". Este pai parece tentar
demarcar a necessidade das filhas serem vistas como indivíduos e não como um
"bloquinho" de enteadas em trânsito e em oposição à unidade de residência
conjunta.
Numa família cuja auto imagem é a de ser formada a partir de
sobreposições de unidades, o terreno do que é permitido fazer - e, portanto, do
que não é .permitido- parece ficar realmente impreciso. Uma mulher pode, por
exemplo, ficar terrivelmente furiosa porque seu marido trouxe enteados para
casa em sua ausência e encontrou a casa "toda virada" ao chegar. Mesmo os
limites impostos aos filhos do casamento em curso e aos filhos de uniões
anteriores podem variar, o que faz a nova esposa muitas vezes arriscar
interpretações dos fatos:

''Ele não consegue ser parede! Dizer não! Ele tem muito medo de ser julgado por elas: 'Ah!
Você não foi bom pai I' "
''Meu marido se sente muito culpado da separação e ele se sente culpado e acha que tudo
vai ser rejeição."

A culpa parece estar ligada ao fato de o pai não participar


cotidianamente do espaço e do tempo da criança, já que é o homem que, em
geral, deixa o domicílio. Há uma crença de que a situação de estar com o(s)
filho(s) todos os dias é a melhor condição para todos. E em determinadas
situações, o homem confirma mesmo esta valoração:

"Eu gostaria que o X viesse morar junto conosco. Ia tirar esse peso da cabeça, só ver o X
no fim-de-semana... então, ia poder sair, pôr regras... "

Contudo, muitas vezes é a mulher quem expressa sentimento de


culpa, que pode aparecer também em relação ao filho biológico. A culpa
feminina se manifesta com outra fisionomia: "Sinto culpa" ( ... ) "quando ele

74
questiona: 'ah, mas a mãe é minha!' "Ela mesma se pergunta o que está fazendo
dando atenção aos enteados e não somente ao próprio filho, que ele é mais
importante e que deveria sempre privilegiá-lo. Diz ainda a mesma entrevistada:

"O que estou fazendo com essa menina [enteada] no colo?"

O enteado pode ser sentido pela madrasta como prolongamento


da ex-mulher do marido, o que ocasiona uma real dificuldade em se relacionar
com a criança sem que isto signifique que esteja em relação também com a mãe
delas. Diz uma madrasta:

"Tem muito amor e muito ódio na parada. Amor pelas crianças e ódio pela mãe delas!"(. ..)
"Ela dorme na mesma cama de casal que ela dormia com o X Faz 10 anos que ele se
separou e ela não se separou. Existe o divórcio, a pensão, mas essa mulher não se
separou!"(. ..) "O X é o único homem da vida dela!"

E o amor? Este sentimento aparece no discurso de madrastas,


por exemplo, quando mencionam o apego aos enteados ou relembram como eles
eram quando crianças e o que faziam juntos quando vinham para as visitas.
Constatamos que quanto mais jovens as crianças por ocasião da formação do
novo casal, maior é a sensação da nova esposa de ter feito o papel de mãe das
mesmas. Há casos de pessoas cujo filho têm poucos meses de vida quando
ocorrem o divórcio e o recasamento, de modo que a madrasta participa da fase
de trocar as fraldas do bebê. Mas a atmosfera de queixa, sobretudo no discurso
feminino, acaba por abrandar o lado amoroso do vínculo com a criança.
Já sob a óptica dos avós, um novo casamento de um filho ou de
uma filha parece ser bem recebido, como se um lugar que estivera vazio
estivesse sendo preenchido. O argumento freqüente é o de que agora o(a)
filho(a) "tem quem lhe cuide novamente". Os netos costumam ser todos bem-
vindos, o que pode colocar os sogros em situações delicadas na rede de afetos,
sobretudo quando a nora anterior continua a ter seu lugar na casa dos sogros e a
freqüentá-la para levar os primeiros netos. Nesta linha, uma das entrevistadas
que é segunda nora se manifesta da seguinte maneira:

"Quando a gente chega, logo perguntam: 'Cadê o resto?'"

Ou mesmo, ao se dirigir ao neto de casamento atual do filho:

"Cadê sua irmã? Não está com saudade dela? Porque não está aqui?"

A atitude desta avó é sentida pela nora como provocação, como


se expressasse não aceitar a separação de seu filho, a constituição da nova
família e estivesse desconsiderando o dado de que os netos mais velhos são

75
participantes quinzenais da vida da nova família. Reclama que a sogra sente
como se tivesse duas noras e quatro netos:

''Aí fica uma coisa de bigamia!"(. ..) ''Eu sou a mulher atual. ela é a ex-nora. ex-mulher, se
ela for a atual. eu vou ser o quê?" (. ..) ''É diferente ser mulher atual e ex-mulher. Não tem
os mesmos direitos, as mesmas condições, não é igual a nível psicológico, jurídico, não é
igual."

Assim, esta mulher defende a idéia de que as pessoas têm


"patamares" diferentes numa família como esta. E, por vezes, isto pode incluir
quem será amado e quem será desgostado, ou ainda, odiado:

''Eu acho isso mesmo, que minha sogra teria que odiar a ex e me amar, por causa do
momento que entrei nesta família." (. ..) ''Falavam mal dela." (. ..) "Sei pela cara da minha
sogra que e/a falou com a ex!"

Outro mal-estar se instala entre esta nova nora e a sogra quando


a sogra discorre sobre os bens do casal na presença dos enteados, o que faz
emergir tensões relacionadas ao aspecto financeiro e à distribuição de herança,
por exemplo, comentários sobre a quitação de compra de uma propriedade ou
então sobre a titularidade jurídica do imóvel. Ou, ainda, o caso da avó que não
pode saber que o casal está em terapia, pois se souber, segundo a nora, ela
diria: "Tirando dinheiro de meus netos para gastar com vocês na terapia!" Uma
mulher fica particularmente embravecida com a seguinte fala de sua sogra:

"Você casou porque quis!"

E reage, dizendo que todos extgem que ela aJa sempre


racionalmente:

''Já que você casou sabendo, não pode se queixar de nada!"

Mas há quem veja os espaços bem demarcados mesmo quando


nem todas as crianças são netos de sangue. Por exemplo, no caso da mulher que
se intimida em pedir à mãe que fique com as crianças quando ambos os
cônjuges têm que trabalhar no fim-de-semana, pois sua mãe teria que cuidar de
seu filho biológico e do enteado, que está em visita de fim-de-semana. Nestas
circunstâncias, o casal opta por distribuir as crianças entre os respectivos avós
biológicos. Mais uma vez observamos que a relação de consangüinidade é
acionada como princípio ordenador dos vínculos na família.
A relação entre genro e sogro é geralmente descrita como menos
tensa do que a que se estabelece entre as mulheres nos diversos papéis. Diz um
homem em segundo casamento:

76
"O genro em relação ao sogro é uma relação de opção. Primeiro se guerreiam para ver se
dá ou não para serem amigos. Se não dá para serem amigos pode sair de perto que a
guerra vai ser dura. Normalmente dá uma amizade. Você é legal! Legal!"

Este mesmo homem acredita que as mulheres se caracterizam


por um tipo de inserção no mundo que é mais "territorial". Diz:

''Mulher no trabalho é feito leão. faz um xixi aqui, xixi ali e ai de quem mexer nas coisas ou
puser algo lá. É como leão! Com o homem é diferente. Tem estas mesas aí, fico 15 dias aqui
porque vou precisar do telefone e depois vai para outro canto!"

Vimos através destes depoimentos que "as fronteiras mais


inflamadas" (adjetivação utilizada por terapeutas) encontram-se nas relações
de afmidade (não consangüíneas) e pertencem ao lado feminino da família. Na
rede de parentes, são as mulheres que, em geral, são porta-vozes das queixas no
grupo. Isto faz com que sejam vistas pelo mundo masculino como as principais
responsáveis pelas tensões afetivas. Corroborando esta visão, podemos observar
que parece haver muito mais a dizer da.mãe ou da madrasta do que do lugar do
homem neste contexto, talvez porque sejam elas as protagonistas das tensões,
inclusive das materiais. São as mulheres que expõem com mais ênfase o teor
dos conflitos vividos nestas famílias. Os homens, embora também se queixem
de transtornos ou más condições, parecem não d3:f a estas questões o tom de
intenso sofrimento. O tom dramático, rival, ciumento e estafado na comunicação
de queixas parece advir da fala feminina, de modo a constituir uma marca deste
discurso. 109
Em meio às tensões vividas na família que se percebe como
dividida, toma-se dificil manter a reciprocidade entre alguns dos vínculos da
rede. Preocupados com o lugar da criança, os terapeutas acreditam que se exige
muito das mesmas, por sua vez, passam a desenvolver um conjunto de atitudes
que optamos por denominar de comportamento "camaleão". Os terapeutas,
além de se representarem como auxiliares na busca por nomeação e distribuição
dos papéis e da autoridade no grupo doméstico e, eventualmente, até na ajuda
da "identificação da própria família" pela criança, vêem-se ainda como
instrumentos de conscientização das manobras dos afetos que filhos e enteados
realizam na família. Vejamos, pois, como os terapeutas enfrentam o problema
da flexibilidade nas posições no parentesco e as diferentes posições da criança
na rede de parentes.

109
A experiência na família de origem também pode ser considerada, como no caso do marido que denuncia
que a mulher, filha única, estaria vivendo a irmandade agora, através das rivalidades e disputas que
fomenta entre filhos biológicos e enteados ou com a ex-mulher.

77
llt
p

Vimos que o grupo familiar gerado a partir de novas núpcias e


da conseqüente inclusão de novos parentes é obrigado a redefinir limites, isto é,
a delimitar o alcance de direitos e obrigações de cada membro no interior do
grupo. Esta redefinição de fronteiras não se faz sem conflitos. A posição de um
filho caçula, por exemplo, pode mudar bruscamente quando ele passa a ser o
filho do meio na nova composição. Esta nova posição o põe diante de uma
"nova narrativa", conforme ilustra esta terapeuta:
''Então, geralmente, você vê na clínica, quem trabalha com família reconstituída, o ex-
caçula de outra família, isto é tristinho... ele não sabe mais como ser, porque ele não sabe a
narrativa do filho do meio!"(. ..) 'j4 gente tem um discurso do que que a gente é, do que que
a gente espera, do que que se espera do filhinho caçula, e quando você por uma situação
dessa é tirado de um contexto de filho mais novo e é colocado num outro... "

Nesta linha de análise, os terapeutas observam o que podemos


chamar de uma mobilidade de posição, o que tem como conseqüência o re-
aprendizado do novo lugar ocupado na família, ou seja, a compreensão do papel
que passa a desempenhar nas diversas conjunturas que o grupo familiar
atravessa. Outra terapeuta enfatiza este aspecto da flexibilidade em relação às
cnanças:

''Se exige muita flexibilidade. De repente essa criança é o filho mais velho numa casa, tem
todas as prerrogativas do filho mais velho, aí no final de semana que ela vai para a casa do
pai, ela é o filho mais novo. A posição interfere na hierarquia. Aí na segunda-feira ela tem
que voltar. De 'repente é uma criança de 416 anos e ela tem que mudar de posição. Chega
na outra casa e encontra o irmão pequeno. ''110

Dentre os terapeutas, há uma visão de que os pais se apercebem


pouco dos desconfortos a que podem expor o(s) filho( s) quando esperam que
estes possam realizar uma adaptação simples e automática com a entrada de um
novo elemento.II 1 Os terapeutas observam que as crianças são obrigadas a
desenvolver estratégias afetivas adequadas a esse constante deslizamento de
papéis e posições: "mudar de pele" acaba sendo importante para driblar
situações de ciúme entre a nova esposa e a "ex". Uma terapeuta comentou a
habilidade de seu jovem cliente em ensinar o irmão a se comportar por ocasião
das visitas à casa paterna:

"Quando você for, diz: 'Mãe, não se preocupa, não se preocupa!' Quando voltar, qualquer
coisa diz assim: 'Mais ou menos, mais ou menos, mais ou menos!' Porque se você sofrer
110 Uma criança que participa de duas residências disse: "-Eu sou filho único, com três irmãos."
111 Terapeuta: "O casal dá por suposto que os filhos vão se amar também e que os filhos vão ganhar como
eles vão ganhar. 'Nossa! Esse menino tem um pai desaparecido há um tempão, que não dá bola para ele.
O fulaninho é dedicado, eu vejo ele com os filhos dele. E aí eu estou dando um presente, um pai para o
meu fi lho'I"

78
muito a sua mãe vai fazer uma coisa horrível com o seu pai e se você gostar muito, a sua
mãe vai ficar muito brava. Então você faz assim, ó: 'Mais ou menos, mais ou menos, tudo
bem, tudo bem I' "

A mesma questão, isto é, a destreza para se movimentar num


terreno contaminado pelo sentimento de animosidade é ainda salientada por
outra terapeuta:

"Chega na porta, a mãe reclama: 'Cadê o tênis?' Se chega contentinho, reclama porque
está contentinho demais. Se fala, 'a tia fulana deu', dá uma coisa aqui no estômago da
mãe!"

Assim, os terapeutas caracterizam as crianças destas fann1ias por


um tipo de comportamento "camaleão" - mudam de cor ou cara conforme o
ambiente- pois que têm que se adaptar112 a diversas composições familiares:
quando estão com a mãe e sua nova família, quando estão com o pai e sua nova
fann1ia, quando estão com a família na casa de uma avó, com a outra avó etc.
Amor e hostilidade são permitidos e proibidos conforme a
posição no parentesco. Examinemos .este aspecto primeiramente do ponto de
vista das mulheres. Durante uma sessão de terapia, uma madrasta relata o
quanto se . sente cobrada pelos parentes próximos (pai e avó da criança,
sobretudo) a exteriorizar apenas o sentimento de carinho. Esta exigência lhe é
feita sob a alegação de que o espaço de convivência com os enteados deve ser
preenchido exclusivamente com amor. -
De um modo geral, a hostilidade, a raiva e qualquer outra
manifestação de indisposição para com a criança são vistas como sentimentos
reprováveis. Tendo por base esse referencial, há atitudes que a mãe pode tomar~
mas que são vetadas à madrasta. Neste sentido, a narrativa de uma madrasta
afirma que se suas enteadas fossem suas filhas biológicas, poderia ter raiva
delas, mas como são enteadas, caso expressasse sua animosidade, passaria por
madrasta má. Esta mãe alega ainda que a repreensão de um filho por mal
comportamento - como pular em cima da cama, por exemplo - é uma atitude
bem aceita porque a intervenção materna faz parte do processo de educação.
Contudo, ainda segundo esta mãe, se pela mesma sorte de motivo a madrasta
repreende o enteado, a situação é mal vista; se a madrasta expressa sua raiva e
seu descontentamento, o marido sente-se pessoalmente agredido. Se fica com
raiva, seu marido sente-se pessoalmente agredido. Vejamos os comentários de
algumas mães a respeito do código que rege as condutas de mãe e madrasta:

112 Há uma grande preocupação, por parte dos terapeutas, com a adaptação das crianças aos novos
casamentos: '~ familia reconstituída, ela vive uma transitoriedade maior do que a familia do primeiro
casamento." (. ..) '~ familia reconstituída, muitas vezes, teme uma nova separação." (. ..) '~s criancinhas
são submetidas a uma certa... com uma certafreqüência, a mais de um divórcio."

79
''Posso até bater no meu filho, com e/as jamais!"
"Tratou bem desta vez, porque da outra vez não tratou? Tem que gostar! Todo dia é
cobrança!"

Esta mãe acredita que se contrariasse as expectativas vigentes,


ouviria: "Se fosse sua filha, você não batia!" E diz ainda: "Já ouvi muito, da
sogra e de outros." Parece-nos claro que esta mãe sente que está sob a constante
vigilância dos parentes consangüíneos das enteadas que pensam que "as
meninas são muito especiais", que "precisam ser cuidadas com certo cuidado".
Dadas estas circunstâncias, ela comunica que sente vontade de dizer: "Gente,
não vou espancar as meninas, não vou afogá-las!" Confessa ainda sentir-se
irritada com o fato de as enteadas serem tratadas como "delicadinhas", como se
"tivessem sofrido um estrago com a separação dos pais e tivessem que ser
ressarcidas". Para exemplificar o quadro, ela relata uma cena onde todos saem
juntos a caminho da escola e as enteadas são as únicas que não podem carregar
suas mochilas, enquanto os filhos de sangue, menores, carregam seus pertences
- "todos carregam para as meninas, as meninas não carregam!", protesta.
Assim, a separação dos pais pode ser sentida como um ataque às
crianças, que passam a ser vistas como frágeis ou danificadas. Do mesmo modo,
a chegada do novo cônjuge pode ser recebida como tranqüilizadora para os pais
dos divorciados, que tendem a pensar que seus filhos serão melhor cuidados,
como também para os avós, que acreditam que seus netos terão "substitutos"
para o lugar da figura parental ausente.II3
Pudemos observar também que, segundo a visão da madrasta, o
fato de a mãe da criança sentir raiva é percebido pelos outros como algo
conjuntural, ao passo que o sentimento de raiva da madrasta dirigido a enteados
é facilmente visto como um atributo permanente e cruel. Nesta mesma linha, o
prazer na relação com os filhos da outra pode ser proibido à madrasta e
permitido para outros parentes, seja porque desperta ciúmes na mãe biológica,
seja porque o que verdadeiramente se espera da madrasta é hostilidade para
com os enteados. Nesta visão, a madrasta ainda estaria sendo vista como a
"bruxa" ou "mãe má", à semelhança das personagens de contos infantis. Cabe
lembrar que o termo madrasta está francamente associado à história da viuvez e
que a mãe substituta não costuma ser retratada como sendo tão bondosa quanto
a mãe biológica seria, se estivesse viva.
Para o pai biológico o quadro apresenta-se mn pouco diferente:
em geral, espera que a nova mulher possa entrar no lugar de boa mãe, nos

113 O possível sentimento de culpa do pai - que mais comumente é quem deixa a casa e, nela, seus filhos - é
mencionado com freqüência. Vimos que a saída do lar pode ser vivida e sentida como uma "traição" ou
"descuido" em relação às crianças.

80
períodos de ausência da ex-mulher, e de companheira participativa. Diz um
homem: "Realmente sinto um desconforto. Gostaria que a X fosse mais mãe que
madrasta! Que ajudasse a decidir!" E diz a esposa: "Se não tiver nem pai nem
mãe, claro que eu vou estar ali para ajudar!" (... ) "Não sei nem se os pais
gostariam que a gente tomasse a primeira iniciativa!"
Se de um lado, aceitar enteados ainda é visto como algo possível
para a esposa posterior, de outro, a relação com a ex-esposa do marido é, em
geral, sentida como conflituosa. Um terapeuta regularmente se defronta com
queixas relativas à autoridade da mãe biológica, descrita como aquela que
"manda mesmo na hora H", que dá a palavra final. Neste quadro, a madrasta
acaba se sentindo pressionada a se adaptar às decisões do ex-casal (pais
biológicos). Diz uma mulher: "Uma sobrinha, você tem a autorização dos pais~
uma criança de pai separado, vão entender que você vai querer tomar o lugar
dela!" Os limites impostos pelo fato de não ser a mãe biológica da criança
podem ser sentidos, portanto, como restrições desagradáveis:

''Até para viajar é diferente! Não posso pegar os meninos e ir para a praia. Para viajar com
a madrasta precisa ter a autorização do pai. " (...) É diferente, com meu filho não preciso
nada disso. Se vou com ele ninguém vai chamar de seqüestro e posso até estar
seqüestrando!" (. ..) ''Legalmente é um abismo profundo!"

Mesmo quando a nova mulher tenta ser mais part1c1pativa e


cultivar de forma amorosa o vínculo com enteados, ela freqüentemente acredita
estar enredada com sentimentos que identifica como sendo ciúmes da parte da
mãe biológica. Uma madrasta queixa-se:

"Se eu faço uma festinha de aniversário para a menina em casa, pode ter certeza que no
fim-de-semana seguinte ela não vem!"(...) ''Nunca em 10 anos um fim-de-semana foi bom e
o outro também! Se for muito bom aqui. vai ter problema lá. Outros 15 dias, chegam mais
frias, já não sentam no colo. " (. ..) ''Mas há mesmo uma punição, depois do fim-de-semana
passado que foi bom, faz 21 dias que elas não vêm!"(...) ''Sendo muito roim ou muito bom,
tem uma punição. " (. ..) "Quando demonstram amor por mim, vão ter problemas com a
mãe. É muito dificil demonstrar que gostam de mim lá na casa delas!"
''Eles podem vir nos visitar, ir ao cinema, mas também não pode ser gostoso!"
''Eu acho que ela tem problema de gostar de mim por causa da mãe. "

O universo acima delineado traz consigo uma contradição: a


madrasta é vista como alguém que deve amar e cuidar, mas quando o faz,
recebe represálias ciumentas da mãe biológica; o filho é visto como alguém que
deve sair de casa para as visitas ao pai, deve ser bem tratado e gostar do
encontro, mas se gosta demais ou de menos, desperta hostilidade por parte do
cônjuge que detém a sua guarda e "fica metido em encrenca"! Do mesmo modo,

81
às vezes, a sogra é solicitada a amar a nova mulher e desgostar da "ex" (do
ponto de vista da esposa subseqüente); geralmente, a nora espera que a sogra
considere a esposa anterior do filho como ex-nora e que esta não desfrute de
intimidade em suas visitas à casa dos sogros. Fazem parte desse universo da
família estendida as comparações, assim como a competição por privilégios,
pela liberdade de movimento e pela definição das lealdades. Portanto, não são
apenas afetos que estão em jogo, mas também a disputa por poder definir
valores, influências e estilos de vida.
Os filhos de pais separados parecem, então, driblar certas
tensões. Acreditam que se expressarem muito contentamento ou muito
desagrado, terão problemas com a mãe biológica. Este universo pode colocar
um adulto em situações complicadas e confusas, como no caso da madrasta que
preparou uma grande festa de aniversário para o enteado e depois de tudo pago
- buffet, show infantil, decoração etc.-, a mãe ameaçou não entregar a criança
para o fim-de-semana, a não ser que ela também pudesse estar na festinha. Com
razoável freqüência, as festas de aniversário são descritas como tensas,
principalmente quando mãe e madrasta estão presentes. Diz uma madrasta
referindo-se à ex-mulher de seu marido, por ocasião do aniversário de sua
enteada:

''Se ela viesse abraçar os meus filhos será que eu ia gostar?"

Observa-se pela fala acima que esta relação - entre a nova e a


ex-mulher- é vivida com reservas. Assim, as madrastas sugerem que a mãe
enciumada não aceita o estabelecimento de uma relação afetuosa entre a nova
esposa do pai e os enteados e que estas, por seu turno, também não vêem a
aproximação da "ex" com seus filhos como algo desejável. Nesta linha, a "ex"
pode ser percebida, de fato, como rival, como alguém que interfere à distância
ou "de outro lado". Conforme aludimos no caso referente à organização de festa
de aniversário, a madrasta acredita que ela "se doa", "no fim-de-semana
seguinte a menina vai ficar doente!" Acredita, então, que sua relação com a
menina seja "permeada pela relação com a mãe" da garota. Chega a descrever
que ser madrasta da menina é ser rival da ex-mulher. Segundo ela, a "ex" não
quer colaborar, quer controlar de longe. Deste modo, a madrasta se vê obrigada
a se relacionar com a "ex" de seu marido através de seus enteados:

''Não gosto dessa mulher. mas vamos lá! Vamos ver as crianças dançando, vamos lá! Mas
não dá! É um puxa criança pra cá, puxa pra lá, bate foto pra cá, bate foto pra lá!"

Esta condição pode muitas vezes ser análoga à que é vivenciada


pelo pai biológico, conforme indica o seguinte depoimento:

82
''Não precisa mais porque a mãe está dentro delas. " (. ..) "Trazem a educação. não precisa
mais da mãe a tira-colo. Já nem luto porque se eu não gosto dessa mulher. de atitudes e
comportamentos dessa mulher e a criança incorpora isso. como eu vou me relacionar com
essa mãe? Têm coisas que não dá para falar I"

Sua esposa complementa:

"São extremamente estranhas neste jeito, porque absorvem a história e educação daquela
família."

E o marido explica como fala com a criança:


"Olhe, papai e A. vivem de jeito diferente. "

Em relação aos filhos, quando eles contam experiências vividas


em uma residência na outra, a madrasta geralmente se incomoda. Sobretudo as
comparações perturbam. O incômodo é provocado ou porque a madrasta
ouviu sobre a mãe biológica e ex-mulher de seu marido em sua casa, ou então
porque os enteados contaram algo da intimidade da "família de cá" para a
"família de lá". De todo modo, as comparações costumam ser mal recebidas.
Este aspecto é também enfatizado por alguns terapeutas que acreditam que um
dos fatores de complicação são as comparações feitas de uma casa com a outra.
Podemos supor que as comparações incomodem porque marcam a percepção da
"divisão" da família e por isso geram tensão. Aponta uma terapeuta:

"É muito freqüente você... ouvir que a mulher fica louca com a entrada dos filhos do marido,
quando os filhos falam: 'Ai, aqui se come deste jeito, mas na casa da minha mãe fazemos desse
outro!' ou 'Ah, essa comida é boa, mas minha mãe faz melhor'. Quando o filho do marido fala: 'Ah,
a minha mãe faz isto, só que faz a comida mais gostosa ou faz de outro jeito'. A mulher se
sente super atacada. super... tocada. " (. ..) ''É um ponto vulnerável. eu diria. " (. ..) 'jis
comparações perturbam." 114

Todavia, o incômodo com . as comparações é vivido


diferentemente por mulheres e homens. Os homens parecem assimilar de forma

114
Segundo esta mesma terapeuta, neste contexto os homens ficam bastante atrapalhados:
"E eu vejo também, por outro lado, que os homens ficam absolutamente atrapalhados nessa situação e,
muitas vezes, o homem não consegue se colocar num lugar firme, adequado e tranqUilo. Ele fica que nem
barata tonta. Ora tentando acalmar e por panos quentes na mulher, ora desculpando a ex-mulher ou
pondo... razões... na ex-mulher. E esta situação vira empecilho na relação deles, porque eu acho que o
homem não consegue marcar uma posição nem com os filhos, nem com a ex-mulher e nem com a atua/
mulher. O homem fica assim... tentando se encontrar e eu acho que isso enlouquece muito mais a mulher,
porque aí ela sente como ele não tem as coisas discriminadas, ou que ainda há essa relação com a ex-
mulher. Muitas vezes você percebe que não é nada disso, é assim: uma impossibilidade do homem saber
onde ele pisa." (. ..) "Em geral, o homem fica muito paralisado, muito... não sabendo o que fazer. "

83
menos tensa os filhos de outro homem com sua mulher, seja ficando à parte,
seja assumindo uma atitude bastante participativa, ou ainda vendo-se como um
tipo de "amigo" do(a) enteado(a). As mulheres são prioritariamente vistas como
rivais, o que gera maiores polarizações. Disto freqüentemente resulta nestas
famílias a impressão de que a ex-mulher e a madrasta não podem se ajudar. A
nova família e a unidade anterior parecem muitas vezes fazer um jogo em que "a
outra unidade" é sempre o depósito das más qualidades e atitudes, com o que
criticam-se mutuamente.
Assim, causa desconforto à madrasta quando os enteados lhe
relatam as experiências tidas com a mãe biológica, ou seja, a madrasta pode
ficar seriamente irritada ao ouvir sobre passeios realizados pelos enteados com a
mãe. Este tipo de perturbação pode ser provocado mesmo por comentários
aparentemente corriqueiros, como: "-Minha mãe tirou 10 no mestrado";
"-Nosso carro foi roubado"; "-Meu sítio"; etc. Sobre este contexto de
comparações, diz uma madrasta:

"Gostaria que viessem. convivessem e pudessem falar dessa família deles. mas que não
excluísse a gente, ficassem comparando!"(. ..) ''Não contam delas, falam da avó, da mãe,
dos primos."(. ..) ''Invade o ar, o som ecoa, não dá para falar: 'Cala a boca'!"

Com isso, o fato de falar da mãe à madrasta pode adquirir o


sentido de uma punição. Diz uma madrasta referindo-se às festinhas da escola
dos enteados:

"O respeito humano tem que existir. Não dá para ir, eu sou muito hostilizada quando vau.
Eu não vou ser punida por algo que não fiz. Já separou, eu não fiz nada!"

A punição pode ser sentida como proveniente dos próprios


enteados ou da mãe biológica: "Ela não pode ser esquecida, faz isto através dos
meninos!" Sugestões de programas para as crianças fazerem com o pai em dia
de visita também podem ser percebidas pela nova mulher como intrusões e
tentativas de controlar sua casa.tts
Falar da madrasta à mãe costuma também ser visto como
desagradável e indesejado, como se a intimidade do novo núcleo familiar
estivesse devastada. Na luta para preservar o tipo nuclear de fronteira Gá que se
preserva o valor da consangüinidade), a experiência da sobreposição de
unidades incomoda. A sobreposição põe em relação dois grupos com mulheres
diferentes. O que se instala neste tipo de arranjo é uma disputa pelo domínio do
controle destas relações. Nestes termos, constatamos a presença de um modelo
115 Observamos, como mencionamos anteriormente, que os enteados e a ex-mulher podem ser sentidos como
um tipo de sogra na imagem antiga, invasora e incômoda, que chega à casa sem a autorização e
concordância da madrasta.

84
ideal de família nuclear que não pode funcionar de maneira harmônica nesse
novo sistema. A pauta de valores familiares funda o seu inverso e a experiência
familiar se desenvolve, com isso, no interior de um permanente paradoxo
imposto pela valorização da harmonia familiar monogâmica que supõe que a
felicidade do casal depende da livre escolha dos parceiros e, portanto, da
possibilidade do divórcio e da supressão imaginária da escolha anterior. O
desejo pelo modelo nuclear revela que este tipo de família é percebido como o
ideal, posto que, não gerando a polarização entre duas mulheres, é visto como
menos conflituoso. Diz uma mulher:

''A casal/ar é o espaço de maior intimidade que você pode ter! Os habitantes são estes.
Temos que tentar pensar um jeito de ter esses outros cantatas sem desestruturar tanto a
casa!"

A exigência expressa nas falas de madrastas põe duas unidades


em oposição, indicando mais uma vez a tentativa de preservar a unidade nuclear
consangüínea co-residente. A representação das relações familiares que exige a
consangüinidade como valor impede a permeabilidade das informações entre as
várias casas porque a aproximação entre duas esferas de intimidade cria
imediatamente um contexto de disputa. O circuito da "casa de lá" e da "casa de
cá" é decididamente um circuito tenso. 116 Além disso, relações de aliança
interrompidas exigem dos filhos novas estratégias para construir outro tipo de
inserção que, embora não alicerçada por contrato, é o que conjunturalmente
concede força e autoridade para um ou outro lado.
Destaquemos a frase dita por uma mulher: "-Eles não querem
tomar partido!" Esta fala denuncia o sentimento de estar em uma disputa, isto é,
em uma situação em que os lados se opõem como verdadeiros times em
competição. Na mesma direção, outra mulher reproduz a fala do cunhado: "-Eu
não vou ficar do lado de ninguém! Eu acho que não tem lado porque não é uma
guerra!" Neste tipo de circunstância, o ciúme masculino geralmente é menos
operante, mas, por vezes, o homem também percebe as rivalidades existentes.
Uma mulher diz sobre seu ex-marido: "-Ele se alia a ela, mas contra a mãe dele.
Por que eu tenho que ficar contra alguém?" Ocorrem também referências a
sentimentos de inveja. Defendendo-se de um possível sentimento invejoso, diz
uma mulher: "Eu não tenho culpa que meu casamento está dando certo, que
meus filhos estão bem!" Assim, a família é percebida como dividida em pelo
menos dois grupos paralelos.
A ex-mulher e a nova mulher podem ainda estar mesmo
envolvidas em outra ordem de hostilidades acirradas. Por vezes, os filhos podem

116 Nesta linha, delata um homem: "Você está numa relação de competição, eu não estou, estou educando
estas crianças."

85
não ser o objeto da disputa, mas o próprio cônjuge, como no caso da "ex" que
telefonou ao ex-marido dizendo que a atual esposa dele, grávida, havia tido uma
hemorragia, sido hospitalizada e perdido o bebê. O homem saiu correndo do
trabalho, dirigiu-se à residência e entrou assustado no quarto, onde encontrou a
esposa dormindo tranqüilamente. Esta acorda sobressaltada com a chegada
inesperada do marido. Naquele dia tem enjôos e cólicas. Este homem tem duas
filhas do casamento anterior e esperava seu primeiro filho com a nova mulher.
Observamos que é possível encontrar arranjos verdadeiramente
tensos. Em algumas situações o filho biológico pode ser até proibido de
freqüentar a nova casa constituída pelo pai. A situação, por exemplo, de um
homem casado e com três filhos deste casamento, cujo primeiro filho, nascido
de outra mulher no período de namoro com a atual esposa, fica impedido de ir à
casa do pai. A atual mulher soube da existência deste filho no período do
namoro. Apesar de sentir-se muito magoada, ressentida e enciumada, decidiu-se
pelo casamento e não quer manter nenhum tipo de relacionamento com esta
cnança.
Vejamos ainda outros aspectos desta problemática. Na
duplicação das famílias, as comparações parecem perturbar porque elas marcam
a oposição de lados que disputam o controle das relações e dos afetos. Enteados
estão em trânsito e provavelmente por esta razão é através deles que se
expressam as tensões. Parece que as duas mulheres (a ex e a atual) disputam
espaço, reconhecimento, legitimidade e autonomia.
Neste tipo de experiência, pelo fato de os papéis não serem
percebidos de forma clara, eles acabam sendo desempenhados segundo a lógica
da "mobilidade de conveniência", isto é: quando aquilo que ocorre "interessa"
ao novo cônjuge este se sente envolvido e reivindica o direito de ter voz ativa;
quando o que ocorre "não interessa" ao cônjuge que não é pai ou mãe, ele
assume a atitude de nada ter a ver com o fato. 117 Na atualização desta dinâmica
de "mobilidade de conveniência", é possível haver cobranças de atitudes
parentais ao cônjuge sem que lhe seja concedido o mesmo tipo de autoridade
que tem por base a consangüinidade. Segundo o relato de uma terapeuta, um de
seus pacientes, ao falar da conduta de sua esposa, diz:

117 Diz: "O problema maior que eu tenho notado, é assim... no momento da conveniência, ele está... o
homem está lá, por exemplo, um deles, no papel de provedor da casa, mas ele não é pai das crianças.
Então, o desafio maior, para mim, é o jogo que se faz em torno disso, quando interessa a ele levar o
papel."(. .) "Começa a haver uma mobilidade de conveniências... não ditas, secretas. A mulher também,
quando interessa a ela, então ela quer que aquele homem seja o pai e, quando não interessa, ela não
quer, entende? Como os papéis não são biologica, naturalmente e fatalmente compelidos, começam os
jogos e os jogos são vários e vários. Até que eles possam"(. ..) "escolher um e se tomar uma posição."

86
" 'Você tem que gostar dos meus filhos tanto quanto eu. você tem que cuidar deles tanto
quanto eu!' Mas ele não tem direito... não lhe é dado o direito"(. ..) ''de por limites. de
educar. de ser uma.figura parental realmente. Então, ele fica numa situação muito difícil!"

A "mobilidade de conveniência" institui, portanto, posições


familiares conjunturais. O fato dessas posições não serem estruturais permite
aos parentes um uso estratégico das relações de parentesco no jogo das
rivalidades e diferenças.
Nas famílias em que a convivência com todos é possível,
observamos que o mesmo tipo de rivalidade entre irmãos têm também lugar
entre meio-irmãos e entre enteados. Além disto, com a existência de maior
número de personagens supostamente substitutos das posições das figuras
parentais, mais pessoas se tornam alvos de disputa das crianças. A manifestação
de tais disputas ocorre nos mais diversos momentos da vida cotiadiana como,
por exemplo, indica uma mulher (mãe e madrasta) ao relatar que quando todos
saem para comprar pão, filhos e enteados disputam quem vai carregar o pacote a
ponto de quase derrubar ou destruir o pão. Em situações como esta, a figura
materna parece ocupar o lugar do doce que todos querem e pelo qual disputam,
sejam filhos biológicos ou enteados.
A mesma madrasta flagrou a conversa das crianças sobre "quem
é quem", sobre quem era mãe de quem. Conta que as crianças diziam: "O X. é o
meu pai!" E aí ficaram, "é meu", "é meu também". Num segundo round, foi a
mulher (madrasta de um e mãe do outro) que passou a ser o objeto da disputa:
"Ela é minha também!"; "Não, ela não é sua, ela é minha! Você é de sua
mamãe!" E diz a mãe/madrasta: "Eles estão tentando entender quem eu sou!" E
é neste momento que o pai teria interferido, dizendo:

''Vocês já tinham decidido há um tempo atrás que a A. é a mãe de 15 dias. Como está esse
negócio, precisa decidir de novo?"

O casal comenta que a decisão precisa ser renovada a cada vez


que aparecem circunstâncias novas, ou seja, conforme o contexto:

Diz o homem: "Cada vez que nasce uma criança. todos estes questionamentos reaparecem. "
(. ..) "Toda vez que nasce uma criança renova o nascimento deles!"
Diz a mulher: "Quando nasceu o X, as meninas contavam muito da gravidez delas."(. . .)
''Essa situação traz muitos conflitos. As meninas tentam achar um lugar para elas onde
possam ser incluídas. "

Pode acontecer até que as denominações mais claras sejam


questionadas, como no caso do garoto de três anos que costuma dirigir-se à mãe
por "mamãe" mas que, na presença dos "meio-irmãos", passa a chamá-la pelo

87
nome, tal qual as outras crianças fazem. A mãe reage com desagrado. Ela
acredita que, primeiro, ele agiu desta maneira para imitar os "meio-irmãos" e,
depois, para irritá-la, uma vez que teria percebido que esta forma de tratamento
a incomodava. Esta mesma mãe/madrasta acredita que os filhos vêem seu
marido como detentor de maior autoridade. Diz, imitando-os com voz de
criança, como se fossem eles que falassem: "Você é mãe de dois e meu pai é pai
de quatro. Tem mais filhos, tem mais poder de decisão!"
Neste contexto, muitos terapeutas descrevem as mulheres como
sendo mais ciumentas e e os homens como capazes de adaptações menos
inflamadas. 118 Com efeito, muito poucas vezes o ciúme do homem é
mencionado. Em relação a isto são feitas rápidas e poucas referências. 11 9
Observamos que, apesar das mudanças sociais relativas à questão de gênero,
persiste a tendência de conceber as mulheres como as "rainhas do lar" e, por
isso, estas seriam mais afetadas pelo ciúmes, conforme apregoam os terapeutas.
Esta terapeuta diz:

''Ficam menos perturbados, eu diria, pela presença desse outro homem, e as mulheres,
ficamos complicadíssimas com a presença... não é a presença, mas com o fantasma, muitas
vezes dessa mulher. E o jeito que eu entendo isso é porque a mulher é muito dona da casa
mesmo, é muito 'dona do pedaço', então é uma das idéias, não sei, obviamente não deve ser
a central. Mas, como se qualquer entrada de outras pessoas é como se realmente
invadissem o espaço delas e interfere no sentido das marcas que a mulher quer dar. "

Esta terapeuta defende a idéia de que os homens ficam menos


perturbados com a presença do outro homem e que as esposas, ao contrário,
ficam "perturbadíssimas", em relação à ex-mulher. Deste modo, o ciúme é
bastante mencionado, tanto na fala dos terapeutas como na dos clientes, sendo
que as mulheres são apontadas como as pessoas que mais padecem deste
sentimento. Alguns terapeutas acreditam que isso ocorra porque a mulher é mais
competitiva ou, então, como visto acima, porque não quer interferências nos
seus domínios, onde tenta ser a "dona-do-pedaço" em casa.

118 Terapeutas:
''A segunda mulher, digamos, fica bastante perturbada, bastante perseguida, eu acho que pelas
características da mulher, o lugar que a mulher ocupa."(. ..) ''A mulher é mais... mais competitiva, não é?
Então, é mais diflcil, eu acho, às vezes a mulher aceitar a outra mulher do marido ou a ex-mulher do
atual cônjuge, é mais diftcil isto .. . entre as mulheres do que entre os homens. Mas, a gente vê que
também aí existe uma modificação, que muitas delas se dão muito bem, até algumas vezes, freqUentam as
casas uns dos outros."
"Eu diria que é uma situação... uma relação onde eles mais facilmente conseguem"(. ..) "esquecer que ele
existe. E o problema das mulheres é que não esquecemos que a outra existe." (...) "O que eu tenho
comprovado é que, em geral, o homem... tolera e se adapta melhor com os filhos da mulher, do que a
mulher com os filhos do homem."
119
Terapeuta: "Estamos falando da ex-mulher, não é? Então, vai se relacionar com o ex-marido, que, por
sua vez, vai dar ciúmes para o aluai marido."

88
Como podemos observar em tudo que foi visto até agora, a
atmosfera conflituosa é muito enfatizada e raramente é ouvido algum comentário
sobre situações com enteados em que o desenrolar dos fatos seja produtivo,
tranqüilo ou amistoso. Mas situações deste tipo mais ameno também fazem
parte da realidade familiar contemporânea, segundo o que observam alguns dos
terapeutas. Vejamos, por exemplo, estes dois depoimentos:
"Tem uma família que eu acho que quem resgatou os adolescentes foi a segunda esposa e o
que ela me ajudou, mas o que ela me ajudou... foi extraordinária. "
''Ela se dá muito bem com o pai substituto. Então, às vezes, se a mãe dela não chegou"(. ..)
"trabalha demais, tem um horário muito louco... então às vezes ele convida: 'Vamos tomar
um champagne, vamos tomar um vinho, vamos ficar conversando?' E e/a fala muito, ela tem
muitos amigos, ela tem uma cabeça pensante riquíssima, essa menina. Então, ela se dá
muito bem, eles conversam muito... e eu tento muito ver através dela, faço perguntas e tudo,
assim... como é que fica quando ela vai em algum lugar ou ela está fazendo alguma coisa
que ele não está de acordo. Então, ela faz o tipo que ele quase não interfere, que ela lida
com a mãe e depois ela mesma pergunta para esse tal de X, o que ele acha, daí ele diz: 'Ah,
eu acho muito perigoso você ir e voltar de taxi, eu ficaria com medo." Aí, ela anexa um
pouco e aí e/afaz alguns movimentos. Mas é uma relação muito boa!"

Os terapeutas acreditam que o tipo de inserção do homem que


propicia o estabelecimento de contextos mais harmoniosos segue um padrão no
qual ou o padrasto assume funções paternas frente aos enteados, ou, o que é
igualmente freqüente, ocupa o lugar de um amigo "diferenciado", confidente dos
enteados. Acreditam os terapeutas que neste tipo de equacionamento passa a
existir uma relação mais cortês entre pai e padrasto, sem prejuízo do papel de
autoridade principal que continua sendo atributo do pai biológico. Como vimos,
a consangüinidade, neste momento é o valor.
Outro elemento bastante mencionado nos grupos estendidos é o
que diz respeito à redefmição no espaço do domicilio, que passa a adquirir
também o sentido de uma redefinição dos afetos. É comum que filhos e
enteados façam referência a dificuldades relacionadas ao espaço fisico da casa.
Por exemplo, podemos citar o caso de um homem e uma mulher que se casam e
a mulher muda para a casa do novo marido com sua filha adolescente e dois
garotos. O segundo esposo, por sua vez, tem um filho e uma filha adolescentes.
A casa possui quatro quartos: um fica para o casal~ o filho adolescente do
marido deixa o quarto maior para os dois garotos que chegam e muda-se para o
quarto menor e, assim, pode continuar a ter um quarto só para si~ o último
dormitório é compartilhado pela adolescente, filha da mulher, e a outra
adolescente que já residia com o pai. A jovem recém chegada à casa relata que
sente que invade o espaço da outra moça que precisou esvaziar gavetas e partes
do armário para que seus pertences pudessem ser acomodados. Por sua vez, a
jovem que tinha o quarto apenas para si começa a queixar-se de que estava

89
acostmnada a estudar à noite, por exemplo, e que agora precisa apagar a luz
para que a outra garota possa dormir. Constatamos que mesmo em espaços
fisicamente amplos, é impossível não haver mudanças de rotina e alterações de
território e de intercâmbio afetivo.
Ainda que temporária, a presença de outros filhos na casa pode
também ser sentida como perturbadora por diversas pessoas da unidade familiar.
Imaginemos a situação de uma mulher que vive num apartamento pequeno com
o novo marido e seu bebê e que, no fim-de-semana, ao receber os três filhos do
primeiro casamento do marido, precisa acomodar mais três crianças,
distribuindo-as entre o quarto do bebê e a sala. Deste modo, num apartamento
de dois donnitórios pode-se encontrar o casal com um bebê, uma criança de
cinco anos, uma de oito e um adolescente. Não nos é dificil aventar que o
desconforto gerado pela escassez de espaço tisico suscite tensões, e mais, que
estas tensões se acirrem caso não seja vislumbrada a possibilidade de mudança
para um espaço tisico maior.

• Vida material

As tensões relacionadas à questão dos direitos de cada indivíduo


no interior destes grupos não se restringem ao aspecto afetivo, à distribuição do
espaço e do tempo; ao contrário, elas atingem também a rede material da
unidade familiar. Vejamos um pouco mais de perto as situações que emergem
no que se refere às propriedades e à vida material da fann1ia.
As preocupações com o aspecto financeiro e com a distribuição
de herança e com a possibilidade de perda da própria moradia em caso de
falecimento do cônjuge são manifestadas mais freqüentemente pela mulher. Por
seu lado, os homens parecem muito mais preocupados em ampliar a renda
mensal, pagar pensão e prover seu próprio domicilio. Devido a este tipo de
preocupação, o homem pode ser visto ou como colaborador - quando assume
corretamente suas responsabilidades mensais - ou o inverso disso, como
displicente - quando a avaliação é a de que ele não colabora tanto quanto
deveria em termos materiais e/ou afetivos. Um homem diz: "Eu não consigo dar
conta das grandezas das nossas vontades!" E a mulher reage: "Foi você que
resolveu ter duas famílias, você resolveu ter quatro filhos!" 120

120 E o marido queixa-se na terapia: "Eu cometi o pecado de ter casado, ter tido duas filhas, ter me
separado, ter seduzido uma pobre donzela e ter tido dois filhos."(. ..) "Então agora eu fiz tudo isto, agora
paga a conta, assuma, sofra. Em alguns momentos é este o tipo de raciocínio que está por trás de tudo o
que você fala!"
Observamos que o cônjuge, que parece incomodar ao trazer filhos de casamento anterior, pode sentir-se
acusado e culpabilizado pelos transtornos que se apresentam. Nesta mesma linha defende-se um homem:
"Não sou eu que estou preparando as armadilhas para você ficar frustrada!"

90
Para que se possa visualizar o tipo de questão material que
surge, vejamos um exemplo. Uma mulher em situação de segundo casamento
relata estar profundamente aborrecida porque havia recebido de seu pai um
apartamento em seu nome e, como se casou em comunhão de bens, o marido
tem direito sobre a metade do imóvel. Eles têm um filho juntos e o marido tem
dois filhos de seu primeiro casamento. Nestas circunstâncias, ela prefigura que
em caso de seu falecimento, os beneficiários da herança seriam os filhos, mas
como o marido tem direito à metade do apartamento, uma parcela desse bem
passaria a ser de seus enteados. Angustia-a mais ainda a idéia de que, uma vez
que seus enteados são menores de idade, este valor em herança ficaria sob a
administração da ex-mulher de seu marido. Diz: "Agora, os bens dela jamais
pararão na mão do meu filho!"
Vemos que o tipo de modelo acionado na geração desta angústia
é o de manter as propriedades materias no âmbito das relações consangüíneas. E
mais: ao se casar em regime de comunhão de bens, esta mulher parece não ter
considerado que a condição de família estendida a induziria à opção de outro
regime jurídico no segundo casamento, possibilidade da qual não se apercebeu.
Por sua argumentação, podemos deduzir que ela estaria esperando que a
legislação restringisse os bens, pelo menos os seus próprios, ao grupo nuclear e
que não ficassem estendidos ao grupo ampliado. Isto pode estar indicando a
ausência de repertório para que tais pessoas se organizem de um modo que seja
percebido como satisfatório para atender às condições suscitadas nas novas
composições familiares.
A situação mais comum é aquela em que há o questionamento
com relação à forma como é feita a distribuição de renda mensal. Diz outra
mulher, em segundo casamento:

''Há uma diferença entre quem é quem, a primeira e a segunda família. Ele tem dois filhos
com a X, não dá para apagar a obrigação de pagar pensão. Ou paga pensão ou é preso,
acabou. Não dá para não existir isso, quando você forma outra família, já leva esta
bagagem. Do salário vai para lá 1/3. Até aí tudo bem! O que começa a pegar são os
encargos de direitos e deveres. Coitadinha! Só com 1/3! Mas aí o pai tem que pagar, levar
no dentista etc. Fica muito nos direitos. A segunda família fica com o que sobrou do salário
do marido mais toda a responsabilidade dos primeiros filhos. Eu não fico só sem 113 do
salário. Vão comer, dormir, vai lavar roupa etc. Quando passam as férias é um mês todo.
Não é 113, é mais da metade às vezes. Vai ter festa de aniversário é um, é outro... Não
convivemos com a ex-mulher, não gostamos. As crianças têm expectativa: '-E eu aqui o que
vou ter? Quero o bolo tal, assim... 'Eu vou gastar mais. Quem é sempre ferrada na história
é a segunda família, não é a primeira. A não ser que você não fique dando os extras. Extra
igual a brinquedinho, férias. Ele tem, eu também quero. Você arca com seus filhos e com os
filhos dos outros. Direitos você não tem nenhum. Ai de você se falar! Não tem esse... você
tem que calar a boca, não pode falar nada. Os meus meninos não vão para lá comer,
dormir. A primeira família 'sooobe', a segunda família 'deeesce', porque a gente faz duas

91
vezes para a primeira família. E eu tenho que administrar todos esses conflitos. Vamos
fazer mais simples, mas vamos fazer."(. ..) ''Só um lanche que faz. gasta!"(. ..) "Os deveres
são muito maiores que os direitos. " (. ..) 'Jis ex-mulheres vão ficar numa situação de
privilégio. Sempre a atua/ é que vai carregar mais pesado. Uma questão de lugar, não que
sou eu, é o lugar que a pessoa ocupa. " (. ..) ''Financeiramente estaria melhor separada que
casada, é que eu não consigo me desvencilhar dele. "

Esta mulher, cada vez mais irritada à medida em que fala, parte
a tecer uma série de comentários em tomo do que lhe parece ser uma ex-mulher.
Sua visão é a de que a ex-mulher é uma figura que não precisa de marido,
arruma amante ou namorado e continua a receber pensão. Este tipo de
construção sugere algo semelhante com a imagem da mulher que não se casa
legalmente para não deixar de receber a pensão do pai falecido.
A existência de diferença de padrão financeiro entre as casas
pode despertar ainda mais irritação. Diz uma mulher:

"Os garotos estão acostumados a padrões que não é o que temos em casa. " (. ..) ''A mãe
trabalha, é esperta para ganhar dinheiro, competente. " (. ..) ''Eles ainda têm duas casas,
dois quartos, duas camas. A diferenciação de padrão entre os garotos e nós é bastante
sensível!" 121

Observamos, portanto, que as desigualdades nas condições


financeiras e a questão da distribuição de herança costumam ser temas
emergentes. Entre os clientes, prevalece a percepção de que quanto mais
casamentos são contraídos, mais declina o padrão financeiro, devido ao acúmulo
de obrigações com as famílias.tzz
Os relatos de experiência indicam que o novo cônjuge percebe a
situação como uma armadilha não prevista, como se um engano houvesse
ocorrido. Constatamos que os tipos de problema a serem enfrentados são
descobertos no decorrer da vida de família, quando é buscado um novo
repertório para lidar com as novas redes materiais e afetivas compostas através
do novo casamento.

12 1 A assimetria entre os cônjuges parece incomodar de forma mais generalizada e não só no aspecto
material. Diz uma mulher:'~ gente fica querendo o igual. Eu .fico querendo que ele não tenha .filhos, que
não tivesse sido casado e ele fica esperando que eu tivesse 40 anos!"
122 Segundo dados veiculados por matéria da Revista Veja, mantidos os rendimentos básicos do marido e da
mulher, na separação a família fica 25% tnais pobre se o tnarido sai de casa; 35% tnais pobre se o tnarido
sai de casa e sustenta a nova mulher; 50% mais pobre se o marido sai de casa, sustenta a nova mulher e
tem filhos no segundo casamento. Consulte: Revista Veja, edição 1413, ano 28, n2 41, pág. 69,
10.10.1995.
Mesmo os terapeutas de família mencionam este aspecto, observando que as diferenças ou oscilações no
orçamento doméstico são sentidas como perturbadoras. Diz uma terapeuta: '~s pessoas, em geral,
decresceram economicamente... outros porque entraram outros filhos, têm que comprar uma casa nova,
coisas do gênero, então as pessoas estão trabalhando muito mais!"

92
Parece mesmo haver uma certa surpresa com relação aos
acontecimentos que se descobre:

"Se eu soubesse não tinha casado!"(. ..) "Como eu ia saber tudo isso aos 19 anos!" (. ..) "Eu não
sonhei isto para meus filhos e para mim!"

Isto não combina nada com a frase de senso-comum: "Quando


casar, passa!"I23 A surpresa também é demonstrada pelos especialistas, como no
caso da terapeuta que se espanta que uma mulher possa pedir ao novo marido
para mandar o enteado embora, apesar de saber que ele tinha filhos ao se
casar. 124
É esta a natureza dos conflitos que permeiam as sessões
terapêuticas. No âmbito da Terapia Familiar, parece-nos pertinente examinar a
maneira como o terapeuta de família concebe os dilemas trazidos ao consultório
e a forma como este especialista se percebe na mediação do processo de
negociação e de ressignificação das experiências na família .

• A Terapia Familiar Familiar

Neste momento, nos interessa pensar o que é o trabalho


proposto pelos terapeutas de família, ou seja, qual o sentido da proposta
terapêutica no contexto anteriormente descrito e como os especialistas lidam
com o problema que detectam nas famílias estendidas.
Diante do panorama cujos dilemas e conflitos procuramos
descrever, podemos dizer que o trabalho terapêutico se auto-representa como
uma resposta à necessidade de eliminar ou pelo menos diminuir a tensão e a
hostilidade presentes em disputas familiares. Sua intervenção se realiza
tendo, portanto, essa meta.
Deste modo, o trabalho terapêutico é apresentado como o
espaço no qual se pensam as disputas e as tensões vividas na família,
geralmente vistas associadas ao ciúmes e à competição. Constatamos que as
intenções dos terapeutas são auxiliar a família a ressignificar as experiências da
nova condição e mediar conflitos, buscando posições mais confortáveis e mais
adaptativas tanto para as crianças e os jovens como para os adultos. Sejam quais
forem as demarcações de espaço e papéis, o que os terapeutas tentam obter,
então, através da suspensão da mobilidade constante dos papéis, é que a família
constitua um instrumental que diminua ou elimine conflitos, na direção de
123Tais queixas, de indivíduos pertencentes a estas novas composições, indicam uma ex-pressão de desconforto
com os reacomodamentos afetivos e materiais necessários para a convivência no grupo ampliado.
124 Terapeuta: "Eu não acredito que a pessoa saiba que estava se casando com um cara que tinha filho e
agora vem dizer que quer que bote o filho para fora!"

93
instalar um intercâmbio entre seus elementos e banir a dor. A noção de grupo
desejável apresentada por detrás destas falas sugere, em realidade, a de um
grupo solidário.
Quando há hostilidade ou ciúmes muito aflorados no grupo, a
situação pode ser percebida como problemática. 125 A intervenção sobre. o
aspecto do conflito e da dor nestas famílias é vista como necessária e instala-se
como um dos objetivos da terapia, no sentido de proteger a criança retirando-a
do centro da disputat26 e dos ressentimentos dos adultos.I 27 A idéia de que a
diversidade dos arranjos na família tenha trazido uma realidade sentida pelos
terapeutas como complexa fez ainda com que estes especialistas tivessem que
rever sua concepção sobre saúde e doença nestes grupos, assim como suas
técnicas de intervenção terapêutica. Vejamos mais de perto o modo como
estes especialistas elaboram as noções de complexidade e patologia.
A fanu1ia estendida traz, de todo modo, um tipo de composição
sentida como complexa, uma vez que os terapeutas acreditam que muitas
variáveis estão em jogo nessas relações. Uma das especialistas entrevistadas
alerta sobre o perigo de se confundir complexidade com doença e sobre a
necessidade de se repensar os pressupostos teóricos da terapia. Diz:

12 5As falas destas terapeutas e:1\.-pressam esta perspectiva:


"Essa idealização que é tão alta, ela esbarra nas dificuldades de uma relação que é trabalhosa, que vai
continuar sendo trabalhosa, para não ter que se haver com este trabalho aqui, isto voa em cfma dos
filhos, mas eu acho que é uma coisa assim ... que estilhaça para cima dos filhos uns dos outros. Então, eu
achei a mulher legal etc. , eu olho para o filho dela e digo que ela é isso, ela é aquilo. "
"Eu acho que é mais o uso que os pais fazem das crianças algumas vezes. " (. ..) '~s crianças servem de ...
são os bodes expiatórios das relações muitas vezes, não é? .À elas é depositado todo ... todas as brigas
passam por elas, como se fossem as causadoras dos problemas. "
126 A situação da criança ser vista como estando envolvida em uma disputa, ou mesmo em uma "guerra", é
focalizada no capítulo 5, quando abordamos a visão dos especialistas forenses da Vara de Família sobre a
criança cujos pais estão em processo de divórcio.
127 Terapeutas:
"O que a gente vê muito hoje em dia, que eu acho que é uma coisa que contribui muito para... para a
saúde mental dos filhos, é assim: um não falar mal do outro, alua/mente, a gente tem trabalhado muito
nesta linha, de não indispor os filhos contra o cônjuge que... do qual se separou, o primeiro cônjuge,
porque... é muito importante para as crianças manterem íntegra a imagem do pai e da mãe dentro delas.
Ele não tem nada a ver com a briga do casal. O pai continua sendo pai, a mãe continua mãe... então, os
casais estão entendendo mais isso hoje em dia." (. ..) "É o jogo assim, de puxar o filho para mim ou de ...
lutar contra o outro que está puxando o filho, e isso está amainando, os pais estão respeitando mais os
direitos dos filhos de amarem os pais, embora eles estejam brigando. Mas isto é um fator de muita... rixa,
de muita briga, principalmente dentro dessas famílias reconstituídas. Porque, às vezes, o padrasto ou a
madrasta que visitam os filhos ... põem muita coisa na cabeça das crianças contra o novo cônjuge, e aí é
mais dificil um entrosamento na família reconstituída, evidentemente."
'~ maior dificuldade das famílias reconstituídas, em geral, é... ela vem da forma como os adultos se
relacionam. " (. ..) "E se o casal não se dá bem, então o cônjuge fica como o terceiro excluído, se ele não
se dá tão bem. "
"Em geral, os irmãos se relacionam bem quando os pais não os jogam uns contra os outros, porque existe
também o ciúme de um dos filhos ir no colégio melhor, de um dos filhos ser mais inteligente que outros,
enfim!"

94
'jf família reconstituída tem uma grande vantagem, por mais modelos que o terapeuta
queira aplicar, isso é bom, não dá para botar numa forma a família reconstituída, porque o
central de hoje que eu queria falar com vocês é o seguinte: o mais perigoso é ele trabalhar
com a idéia de casal. é ele trabalhar com as idéias que ele aprendeu de um tipo de família,
porque se ele for com essa idéia, ele vai confundir complexidade com patologia. Quando eu
trabalho com complexidade, eu trabalho de uma forma, quando eu trabalho com doença, é
neurose, eu escuto e intervenho de outra forma. " 12s

A idéia de complexidade está associada à necessidade de lidar


simultaneamente com várias redes de parentes, o que implica enfrentar um
número maior de dificuldades e diversas demandas adaptativas. 129 E quem vê
patologia neste contexto, pode associá-la à condição do recasamento. 130 A
seqüência de casamentos de uma pessoa pode ser vista como resultado de
desordens afetivas. 131 Há terapeuta que define esta situação como um tipo de
"monogamia seriada". 132 Nesta perspectiva, o que "pode fazer mal" é uma
inadequada e conflitiva evolução das negociações necessárias no processo do
divórcio.B3
O conjunto das falas dos terapeutas indica que essa situação é
geralmente percebida como çrise. Chamar tais mudanças de crise sugere mais
uma vez a idéia de que a família nuclear continua sendo vista como a fann1ia
ideal. Uma psicopedagoga, inscrita em curso sobre atendimento familiar, afirma
que: "-Tem a situação quando a mãe cuida, quando o pai cuida e a família
128 A terapeuta recoloca esta idéia: "Eu acho que os terapeutas, em geral, aplicam no recasamento os
modelos, as idéias, o material que estudaram para o casamento. Então tratam o casal nesta situação
especial com o know-how de terapeuta de casal."(. ..) "Um casal em recasamento, ele tem um nivel de
complexidade diferente." (. ..) "O terapeuta que tratar com o casal, vai tratar um casal extremamente
patológico."
129 Este aspecto é enfatizado por esta terapeuta: "Olha, são situações dijiceis sempre. Eu sempre brinco com
os casais que estão nesta situação." (. ..) "Eles não escolheram a mais fácil, eles escolheram a mais
difícil, lógico que, você fazendo dois casamentos, você acrescenta complicações, não tem como escapar
disso." (. ..) "Como a segunda situação é mais complicada que a primeira, realmente as pessoas ficam
com mais conflito e menos tolerância."
130 Aspecto este que apareceu no discurso de um juiz, no Fórum (Veja Capítulo 5).
131 Como aponta esta terapeuta: "Porque... em geral, eles vêm porque têm consciência que alguma coisa
deve acontecer com eles, porque se eles estão no terceiro casamento, alguma coisa acontece com eles!"
(...) "Ou seja, que eles mesmos percebem que deve existir alguma coisa e existe mesmo! Na teoria de
casal, que é diferente da teoria de familia, isto é muito claro, que existem pessoas que têm determinados
tipos de conformação, têm patologias de casal e que, fatalmente, o casal que se casa... além do amor que
têm, em geral se unem pelos distúrbios ou pela... digamos assim ... por algo não resolvido na própria
família de origem."
132 Esta idéia também já existe entre demógrafos, através da utilização do termo "poligamia seqüencial".
Sobre isto consulte: Mamãe Coragem. Revista Veja, Ed. Abril, edição 1413, ano 28, nQ 4, 10 de outubro
de 1995.
133 Esta terapeuta diz: ''Agora, eu também aceito que o divórcio não mata ninguém! Então eu acredito que o
que mata a criança entre aspas, que intoxica, que envenena, é uma péssima negociação com o divórcio."
(. ..) "Então eu acho que o que faz mal é o tipo de negociação com o divórcio. " (. ..) "E eu vou ajudar com
o melhor divórcio possível porque eu acho que ter pais brigando, mãe muito infeliz, pai angustiado, pai
muito infeliz, são situações que trazem um cotidiano carregado e que provocam um mal-estar familiar,
que é lógico que é um terreno fértil para a patologia!"

95
normal." Ou seja, na visão desta profissional, o normal é pai e .mãe cuidarem
juntos de seus filhos. Por decorrência, os outros arranjos são passíveis de serem
percebidos como desorganizações trazidas pela presença do divórcio na vida
modema.
Podemos, pois, verificar um movimento ambivalente que
simultaneamente aceita e rejeita as novas composições que recriam o espaço da
família. A definição do que seja ordem ou desordem, doença ou saúde, parece
estar assentada em um espaço impreciso e ambígüo.
Os terapeutas tiveram, portanto, que repensar seus pressupostos
em relação à noção de patologia, o que ocasionou um questionamento sobre as
técnicas de intervenção a serem adotadas. Isto significa dizer que emergiu a
necessidade de um novo enquadramento para a terapia de família. Diante
do novo universo experienciado, pelo menos parte dos terapeutas parece estar
pesquisando, juntamente com as famílias, novas formas de se posicionar frente
aos dilemas vividos no mundo contemporâneo e no campo da prática
terapêutica.n4
Neste contexto, os profissionais que atuam com famílias
parecem estar se debatendo, .de um lado, com o modelo tradicional de tratar os
dilemas da antiga família e, de outro, com os novos arranjos que os obrigam a
repensar as categorias que orientam o trabalho terapêutico e as técnicas de
intervenção.
Em muitos momentos, o terapeuta pode até mesmo indagar-se
sobre quem chamar para as sessões de terapia. Por exemplo, quando o sintoma é
apresentado por um filho de outro casamento, que mora com a mãe e seu novo
marido, quem deve participar do processo terapêutico? Diz uma terapeuta:
"Como fazer? Tratar a que me consultou e ficar como se não tivesse pai? Como
é que eu vou entrar com a nova informação?"( ... ) "Como é que esses pais vivem
a realidade disso?" Este questionamento aparece com freqüência na fala dos
terapeutas. 135

134 É nítida a atmosfera de busca e de experimentação: "Eu não tenho nada pronto a ojêrecer. Coisa que
quando é terapeuta de casal, ele pode ter essa ilusão, porque ele tem tanta teoria sobre casal na
cabeça... eu acho que o terapeuta, o melhor terapeuta, ele mantém esse espaço de curiosidade, da
construção singular e específica, que cada indivíduo vai fazendo, e como ele se inter-relaciona e das
dúvidas que você pode colocar, que ele para responder vai ter que se repensar e eu acho que quando a
pessoa se repensa, ele vai construindo diferentes mundos explicativos e a gente é o produto das
explicações que a gente dá e das histórias que a 15ente conta sobre a gente. Então o recasamento, eu
acho que esse sim é que não tem como. " (. . .) "E, a pessoa não sabe como que deve funcionar um
recasamento." (. ..) "Então não acredito nesta coisa interventiva de fora para dentro, eu acredito mais na
co-construção e na tentativa de modificar o código lingilístico. Um dos instrumentos que eu tenho para
modificar a narrativa é perguntar, perguntar de uma forma que a pessoa deve se repensar."
135 Outra terapeuta expressa esse aspecto da seguinte maneira: "Olha, o maior problema na família
reconstituída é se estabelecer qual é o sistema-problema. Por quê? Então, eu já tive uma familia assim:
vem o casal com os filhos e um dos problemas que eles trouxeram é que um dos filhos da mulher tinha
problema de droga." (. ..) "Então, ficou a dúvida: Qual é o sistema problema? É a família atual? Ou é a

%
Em meio a mudanças desta ordem, constatamos que não são
apenas os familiares que se perguntam sobre as novas fronteiras, mas os
próprios especialistas parecem necessitar uma delimitação do que seja o novo
território de ação. Os especialistas acabam sendo obrigados a decidir qual é a
composição de família a ser tratada e quais os critérios considerados nesta
eleição. Outra terapeuta apresenta este problema da seguinte maneira: "Quem
você vai chamar? Pode deixar quem de fora?" ( ... ) "E se há briga legal, sem o
consentimento da mãe e do pai não se pode atender!" Esta terapeuta relata um
caso em que foi a "madrasta" que ligou pedindo o atendimento embora não
tivesse a guarda da criança. Conta que foi dificil avaliar a possibilidade de
realizar o atendimento.
Na condição de clientes, estes novos grupos familiares como
clientes podem conduzir o profissional a optar por sessões também com diversas
composições, como no caso da terapeuta que diz:
''Então, com essas famílias reconstituídas eu costumo fazer várias sessões - com a família
atual e, quando se trata da outra família, que eu faço... que pelo menos seja casado duas
vezes, eu posso fazer as sessões também seguindo um processo de sessões com o pai ou a
mãe. O pai com as crianças... os primeiros, a mãe com os filhos dela... os primeiros.
Depois, o pai com os filhos do primeiro casamento e do segundo casamento, depois a
madrasta, porque evidentemente ela recebe os filhos em casa... com os três filhos sem o pai
e, às vezes, com o pai. Ou seja, você tem que se adaptar a readequar uma estrutura social
mais ampla. " (. ..) ''Digamos assim... numa família extensa em que a monogamia não existe,
que existe com cada parceiro, entendeu? E uma outra estrutura social, é uma outra família
que está surgirldo, outros tipos de família que estão surgindo e tem mães e pais diferentes,
mas que têm irmãos que se relacionam bem. "

Parece-nos haver entre os especialistas um razoável grau de


consenso quanto ao reconhecimento de que transformações importantes
ocorreram na farmlia brasileira nas últimas décadas, sobretudo após a
legalização do divórcio. Neste contexto, é enfatizada a idéia de que
determinadas composições de família deixaram de ser clandestinas para
tomarem-se legalmente constituídas, ou seja, atualmente existe a possibilidade
de "uma autorização legal para o indivíduo deixar o casamento infeliz ou
oficializar a família clandestina". Diz uma terapeuta em mna mesa-redonda no "I
Congresso":

"Uma lei do divórcio, ela já nos autoriza em nosso trabalho terapêutico a redefinir uma família à
sua condição de legalmente constituída e não marginalizada e de poderem se apresentar
socialmente de uma forma não lateralizada".

família original? Então, se você faz a hipótese de que este comportamento... o fato do uso de drogas tem
a ver com a separação, com o fato de não querer os pais separados" (...) "ai, você tem que ver a
oportunidade de chamar a mãe que não está, fazer a reunião para tratar este assunto aqui e depois
retornar com a outra família."

97
Na visão desta terapeuta, o objetivo do trabalho com estas
famílias inclui "renovar a idéia que um indivíduo tem do outro" e propiciar
espaço para que os indivíduos exponham seus pensamentos, formem novas
alianças, triângulos e percebam as diferenças individuais. Haveria, então, uma
preocupação em redefinir a história da família: "perceber a sua condição de
agentes e não repetidores de um script pré-determinado". Segundo ela, a
existência de mais membros em um grupo familiar requer, portanto, que se
repense a maneira de "formular a organização hierárquica, delimitar fronteiras e
reconhecer esse pertencer e seus limites". Nesta linha de raciocínio, a terapia é
vista, em geral, como um espaço de negociação, de mediação, de ressignificação
dos conflitos na família. Este tema é retomado no capítulo 4, quando abordamos
a maneira como os terapeutas descrevem seu próprio trabalho com as farrulias.

***
Empreendemos a tentativa de demarcar o tipo de olhar que os
terapeutas de farrulia têm sobre a família extensa pós-divórcio. Constatamos que
o trabalho destes especialistas está voltado para a diminuição ou a eliminação de
conflitos, através da mediação da comunicação na família. O uso, pelos próprios
terapeutas, do termo "mediação" revela a concepção que estes profissionais têm
de sua própria atuação.
Observamos que no discurso das famílias em atendimento há um
paradoxo com o qual o terapeuta de família está condenado a dialogar. De um
lado os integrantes destes grupos familiares parecem estar orientados pelo tipo
de sociabilidade encontrada na família de modelo nuclear - homem, mulher e
filhos - que tem a consangüinidade como um valor; e de outro, ao configurarem
novas formas de convivência, através das possibilidades nascidas com o
divórcio e a contração de outro(s) casamento(s), distanciam-se cada vez mais do
alcance do tipo considerado como modelo ideal de grupo familiar. Tal quadro
ficou bem evidente na fala da mulher que afirma que melhor seria se todos os
filhos 136 fossem seus "de barriga" e que acredita que a ex-mulher de seu marido
também sinta o mesmo, ou seja, que também gostaria de ter todos estes filhos
como seus filhos biológicos.
Constatamos então que, embora se tenha partido para a
constituição de novas composições - ou seja, uma vez que esta mulher casou-se
com um homem sabendo da existência de sua prole anterior -, a expectativa do

136 Refere-se aqui aos dois filhos tidos por ela com o marido, mais os dois filhos tidos no primeiro casamento
do marido.

98
tipo de família nuclear como o modelo desejável permanece latente, coexistindo
com as novas questões trazidas pela experiência de agregar filhos anteriores ao
casamento em curso. Isto parece ter gerado uma atitude de resistência à visão do
novo grupo como um sistema único, como uma rede relacional estendida. Em
conseqüência, as pessoas não conseguem se pensar no grupo ampliado e, por
vezes, é o próprio terapeuta de família que enfrenta dificuldade em lidar com os
novos elementos que emergem e com a existência tanto dos novos
relacionamentos como de novos parentes ou agregados.
Vimos que a família que se percebe e se representa como
dividida cria uma polarização entre as duas wúdades consideradas como
sobrepostas. As duas mulheres pertencentes a estes grupos são freqüentemente
vistas como se estivessem em disputa. Disputa esta nos pareceu estar associada
com a busca de uma posição de distinção em relação ao domínio das decisões e
às demarcações de fronteiras do grupo. Isto envolve questões como: controle do
tempo, do espaço, da rotina e do dinheiro; distribuição dos privilégios, da
autoridade e dos afetos; e definição de um estilo de vida.
Constatamos ainda que os homens são vistos como quem fica
mais alheio às disputas de domínio no lar, procurando "não tomar partido" na
atmosfera ·de rivalidade que percebem. Na composição dos times, as crianças
parecem ser solicitadas a decidir por um dos grupos em antagonismo.
Observamos que sendo a consangüinidade o valor orientador nestas relações, o
fato de pai e mãe não morarem juntos é vivenciado como um problema. Além
do mais, atentamos para a necessidade de considerar as situações em que os
novos cônjuges operam com representações de grupo divergentes, o que
contribui para a ampliação e/ou intensificação de conflitos.
Em meio a este universo, o instrumental que os terapeutas de
farmlia dispunham para tratar da farmlia nuclear tradicional que buscava seus
serviços - em geral, em função de alguma preocupação com algum dos
integrantes do grupo familiar, ou por um dilema conjugal- teve que ser revisto
face à variedade dos grupos que se constituíram através de subseqüentes
casamentos. E, neste momento, parece que as representações antigas vinculadas
ao casamento e à família, tanto dos terapeutas como de seus clientes, tomaram-
se insatisfatórias para solucionar os dilemas gerados na nova experiência da
extensão familiar.
Temas como descendência, filiação, transmissão de herança,
distribuição de direitos e obrigações no interior da família passarrun a exigir um
novo mapeamento. O mesmo ocorre com a questão da divisão sexual do
trabalho, uma vez que está colocada a necessidade de repensar e demarcar os
espaços do feminino e do masculino. Este elemento foi observado tanto no
discurso dos clientes quanto dos terapeutas. No que concerne à questão de
gênero, constatamos que não se trata mais apenas de substituir a antiga divisão

99
sexual do trabalho - homens no trabalho I mulheres no lar - em função do que
foi legado pelo movimento feminista e, posteriormente, por um certo
"masculismo" 137 ; o discurso atual, ao promover a proposta de uma relação com
tanta igualdade entre os sexos, chega a extinguir a idéia de que haja qualquer
diferença entre os gêneros. Assim, assumimos neste trabalho a perspectiva de
que a atual construção cultural da conjugalidade e da diferença (ou não-
diferença) entre os sexos cria uma imagem onde todos são vistos como sendo o
mesmo. Aspecto este que é retomado no capítulo 6.
Diante de um universo onde velhas e novas representações sobre
a família coexistem, o terapeuta de família parece ter criado um novo tipo de
relativismo: em geral, parte da premissa de que a solução para o conflito que
está trazendo sofrimento à família é encontrada pela família num processo de
"co-construção" com o terapeuta e depende do universo vivido em cada grupo.
Neste esquema, fica suposto que cada grupo poderá gestar um tipo específico de
arranjo ou de modalidade de ação. Isto fica evidente, por exemplo, quando uma
terapeuta (citada anteriormente) mostra como três padrastos de famílias
diferentes podem assumir atitudes diversificadas em relação a enteados. Embora
pertencentes a uma mesma posição no parentesco, cada um significa sua
posição de forma diferente: um se sente com direitos sobre o enteado; outro
assume a posição de colaborador ou de autoridade, quando solicitado; e o
terceiro entende que todas as obrigações e todos os direitos são de pai e mãe e
que ele deve permanecer excluído destas questões.
No espaço da terapia, diante da necessidade de um novo
enquadramento, já que o instrumental antigo não se mostra mais operacional, na
verdade, o que os terapeutas afirmam ter procurado fazer, como vimos, é gerar
um espaço de negociação, mediação e ressignificação de experiências e
conflitos concebidos como novos.
Cabe observar ainda que, em meio a tanta imprecisão, até a
publicidade, através da mídia, participa deste diálogo. Durante o período da
realização da pesquisa, deparamo-nos com diversas propagandas de produtos
associados à idéia do casamento feliz, indissolúvel, e, portanto, eterno, tal como
o matrimônio é apresentado no ideário do amor romântico que pode ser
identificado como subjacente a muitos níveis de discurso da atualidade.
Nesta linha, apartamentos à venda podem ser apresentados
como O Casamento Perfeito (Veja Anexo 7) ou por seu efeito terapêutico: Terapia
de Casal. Você Precisa! (Veja Anexo 8). Uma propaganda de lençóis explora os
temas do amor romântico e do casamento indissolúvel, com o seguinte chamado:

137 Por "masculismo" denominamos a tendência a se requerer os direitos dos homens, por exemplo, em
relação à participação na educação de filhos. Como já foi mencionado, muitos homens estão solicitando a
guarda de filhos e, no Rio de Janeiro, tivemos notícia de uma reunião de escola infantil direcionada
somente aos homens (aos pais).

100
Nós ainda fazemos lençóis acreditando que casamentos são para sempre (Veja
Anexo 9); Na mesma linha, uma propaganda de canivete provoca: O namoro
ninguém sabe. Mas um Victorinex é para sempre. (Veja Anexo 10). Encontramos
até mesmo impressos de editora que propagandeia seus livros na área da terapia
conjugal e familiar com as seguintes frases: '~ .. e foram felizes para sempre"
(página externa do prospecto)~ Graças à Terapia Familiar (página interna,
seguida da relação de livros na área. (Veja Anexo 11). 138
Na linha oposta- a que promove a separação e o divórcio como
a saída para o bem-estar, possivelmente também idealizado -, podemos
encontrar em capa de revista o seguinte título de matéria: Salve seu casamento,
separe-se! (Veja Anexo 12); ou na fotografia de capa de lançamento de revista
direcionada a "descasados" que mostra um homem e uma mulher separados
pelos títulos das matérias, ambos apresentados com fisionomia de felicidade e
êxtase. Paradoxalmente, junto ao nome da revista desCasados, lê-se o
subtítulo: A revista casada com você. (Veja Anexo 13). O descasamento que
deveria incluir luto e sofrimento é apresentado com grande alegria, como se não
houvesse dor: tratar-se-ia apenas de uma fase de transição para um outro
casamento mais feliz. O detalhe do C maiúsculo no me10 do termo
11
desCasados estaria indicando que a saída seria buscar o casamento
11

sonhado? 139
Observamos ainda que o divórcio gerou uma nova fatia de
mercado de consumo. Apareceram lojas voltadas para o comércio de artigos que
supostamente facilitam o cotidiano de divorciados ou de pessoas que vivem sós.
O dono de uma destas lojas argumenta, por exemplo, que é comum o homem
que se separa "sair carregando apenas a roupa do corpo". Em função disto,
voltou sua loja à venda de artigos domésticos, em estilo que entende ser de
pessoas nestas condições. (Veja Anexo 15).

138 No último capítulo deste trabalho, retornaremos ao tema do amor romântico e da imagem idealizada de
completude verificada neste imaginário, a partir das queixas dos clientes e da exploração que a mídia e a
publicidade disto fazem.
139 Mesmo no exterior é possível observar a presença deste mesmo paradoxo. Na revista Psycho/ogy Today
de fevereiro de 1978 há uma foto de casal em carro com a placa Just Divorced (inversão de Just Married).
(Veja Anexo 14)

101
,
CAPITUL04

A ,

A EMERGENCIA DAS TERAPIAS DE CASAL E FAMILIA NO

BRASIL- A CONSTITUIÇÃO DO CAMPO E SUAS ESTRATÉGIAS

"É da modernização acelerada da família e da sociedade brasileira


que surge uma demanda de mapa, de mapeamento que vem
sendo suprida pelo psicologismo. Ao mesmo tempo, e um tanto
paradoxalmente, à medida que o psicologismo se generaliza
enquanto linguagem, cultura e ideologia, contribui a seu modo
para a própria modernização que é a responsável, em última
instância, pelas condições de sua emergência histórica."

Sérvulo Augusto Figueira (1991:192)

O atendimento psicoterapêutica à família instaurou-se no Brasil


como modalidade de atendimento após a década de 70 e a legalização do
divórcio. Os anos 80 foram marcados pela presença de especialistas brasileiros
que, tendo realizado formação especializada no exterior, passaram a formar
novas gerações de terapeutas de casal e família, acompanhando um movimento
internacional. Tratava-se de uma mudança na forma de explicar a doença mental
e os distúrbios de comportamento numa direção em que ambos deixavam de ser
vistos situados no indivíduo e passaram a ser compreendidos como uma
produção do grupo doméstico, com o que foram atribuídos à naturezà dos
vínculos estabelecidos entre os membros da família.
Neste capítulo, analisamos como esta nova classe de
especialistas ganhou espaço no mercado das terapêuticas no Brasil, instalando-
se como uma classe profissional e lutando pela constituição e legitimidade de
seu campo 140 • Procuramos ainda identificar a natureza do conjunto de tensões e
140 A noção de campo utilizada neste trabalho, corresponde ao modo como Bourdieu (1974/1989) entende
este conceito. O tenno campo também é utilizado pelos terapeutas de família, como veremos. Os
terapeutas, contudo, não o definem, utilizando-o dentro da linguagem coloquial. Em seus diálogos, falam,
freqüentemente, em um campo da Terapia Familiar. Cabe esclarecer que, originalmente, o conceito de
campo foi utilizado por Bourdieu para indicar uma direção à pesquisa, pois a noção de campo orienta o
pesquisador a não esquecer que "o objeto em questão não está isolado de um conjunto de relações de que
retira o essencial das suas propriedades". (1989:27) Através de uma crítica à visão weberiana das relações
(cont.)

102
dos fluxos de interesses presentes neste campo. Para tanto, utilizamos as
representações sobre a família produzidas por terapeutas de família swe foram
entrevistados com o intuito de termos acesso ao modo como eleSY próprios
mapeiam a sua parentela profissional. Vemos que as representações que estes
terapeutas têm de sua história e da constituição dos grupos de profissionais (por
eles concebidos como partes de uma grande família) nos auxiliam a
compreender como se estabeleceram as filiações teóricas e como se configurou
a hierarquia neste campo.
Os relatos orais sobre a constituição deste campo de atuação nos
serão úteis como ponto de partida para esta discussão. Assim, acompanhamos o
nascimento dos primeiros Congressos de Terapia Familiar que sucederam aos
Encontros de Terapia Familiar anteriores, dando um caráter de maior
legitimidade ao corpo profissional. Grande parte das discussões realizadas,
sobretudo no Pré e Pós-Encontro do "I Congresso", parecem ter objetivado
definir o modo como este serviço deveria ser apresentado ao mercado das
terapêuticas para que fosse atingido o grau necessário de autonomia frente às
instituições e abordagens existentes no exterior e também fosse ampliado seu
mercado interno. Nestes eventos, os terapeutas organizadores procuravam
explicitar ·os critérios para a definição de profissionais com função didática, ou
entre os agentes religiosos, Bourdieu propõe uma construção do campo religioso como estrutura das
relações objetivas. A partir daí, passou a aplicar o conceito de campo a diferentes domínios, preocupando-
se não apenas com as propriedades específicas de cada campo, mas também com as invariantes
identificadas em diferentes universos - "existem homologias estruturais e funcionais entre todos os
campos". (1989: 67) Segundo Bourdieu, o campo seria o "locus onde se trava uma luta concorrencial entre
os atores em tomo de interesses específicos que caracterizam a área em questão".(ln: Ortiz I 1983: 19)
Assim, o mundo social é visto pelo autor como um espaço de concorrência entre grupos com interesses
distintos. No seio dos conflitos, os atores lançariam mão do capital disponível (que assumiria três formas -
capital social, cultural e econômico), procurando a "maximização dos lucros", ou seja, aumentar o próprio
capital ou, pelo menos, trabalhar no sentido de mantê-lo. No campo manifestam-se as relações de poder
que se estruturam a partir de uma distribuição desigual dos capitais disponíveis, constituindo a
estratificação social em classes e fiações de classe.
Bourdieu analisou diversos campos: o da moda, o da arte etc. Analisando o campo da ciência, Bourdieu
demonstra sua dinâmica como sendo o embate em tomo da autoridade científica, em tomo da disputa pela
legitimidade da ciência. Nesta linha, 9iz Bourdieu (1983: 128): " ... os dominantes são aqueles que
conseguem impor uma definição da ciênCia segundo a qual a realização mais perfeita consiste em ter, ser e
fazer aquilo que eles têm, são e fazem". Os agentes de um campo possuem, portanto, relações assimétricas
de poder. A estrutura de um campo se define a cada momento, pelo estado de relações de força entre os
protagonistas (agentes ou instituições) em luta. Todo campo encontra-se articulado a outros campos como
por uma espécie de imantação: o que adere a ele, faz parte dele. O campo será tão mais sólido quanto
maior autonomia tiver em relação às transformações político-econômicas que ocorrem na sociedade. Diz
Bourdieu (1974: 106): "... quanto mais o campo estiver em condições de funcionar como a arena fechada
de uma concorrência pela legitimidade cultural,(... ) tanto mais os princípios segundo os quais se realizam
as demarcações internas aparecem como irredutíveis a todos os princípios ex1emos de divisão". Deste
modo, o grau de autonomia de um campo é medido pelo grau em que o campo se mostrar eapaz de
funcionar como um mercado específico.

4- concebem os dilemas vividos pela família contemporânea, o seu papel na atuação terapêutica e como eles

103
seja, aqueles que podem fonnar outros terapeutas de modo, então, a ampliar o
mercado para este campo de atuação.
Constatamos que foi por ocasião destes Congressos que os
terapeutas de família procuraram definir as relações no campo da Terapia
Familiar, marcando suas fronteiras e, portanto, delimitando quem está dentro e
fora desta classe de especialistas, isto é, quem pode ter acesso à clientela das
famílias e quem pode fonnar novos terapeutas. Nesta linha de raciocínio,
analisamos algumas das estratégias utilizadas no campo em fonnação,
procurando identificar seus principais atores.
Observamos que, depois da vinda ao Brasil de alguns terapeutas
estrangeiros que eram os precursores da Terapia Familiar Mundial e do
aparecimento dos primeiros grupos de terapeutas brasileiros, foi desencadeado
um esforço para listar as pessoas envolvidas com esta especialidade e para
delimitar uma hierarquia que definisse o jogo das legitimidades na formação
deste campo (quem comanda, supervisiona, quer entrar na área, vai sair etc.).
O acompanhamento dos acontecimentos e eventos no campo da
Terapia Familiar permitiu-nos identificar as grandes correntes organizadoras e
nos forneceu pistas sobre o desenvolvimento do processo de delimitação das
concorrências e da busca por hegemonias. Percebemos que, num mercado
lucrativo, disputa-se a possibilidade de estar no topo da hierarquia, recebendo
um maior número de famílias e executando a supervisão e/ou a formação de
novos especialistas, o que constitui vias de acesso necessárias para abarcar uma
faixa maior do mercado.
Para percorrermos este trajeto, faz-se necessário, inicialmente,
conhecermos um pouco da história do Movimento Mundial da Terapia Familiar
e da sua entrada no Brasil. A partir desse contexto podemos compreender o
significado que o nascimento dos Congressos brasileiros e das Associações
estaduais de classe teve em nosso país.

• A emergência da Terapia Familiar

A literatura sobre a terapia de casal e fann1ia mostra que esta


linha de atuação se constituiu como uma especialidade técnica na década de 50
na Europa e Estados Unidos. Até então esta modalidade de atendimento
terapêutico não era muito difundida, embora alguns profissionais já chamassem
eventualmente o casal ou a família para sessões conjuntas. Após a II Guerra,
houve uma explosão de publicações sobre o tema. Foram abertos muitos setores
de atendimento familiar ligados às universidades, bem como clínicas
especializadas, quem sabe para atender ao que o médico e psicanalista inglês
Hemy Dicks (1980) chamou de nova "epidemia social", referindo-se ao que se

104
acreditou ser a eclosão de conflitos conJugrus e familiares decorrentes da
experiência da guerra.
Pelo conhecimento acumulado até o presente, os primeiros
terapeutas de casal teriam surgido no Brasil por volta da década de 70, muitos
deles oriundos de especializações que tinham realizado no exterior na década
anterior, uma vez que não havia cursos de formação no país. As transformações
no plano das idéias e nas formas de pensar os relacionamentos que tiveram lugar
nos Estados Unidos e na Europa do pós-guerra foram assimiladas pelos
terapeutas brasileiros, quando parece ter sido "emprestado" do Primeiro Mundo
as noções de casal "sadio" e de casal "conflitivo". Passou-se a falar, por
exemplo, em "pactos inconscientes", "lealdades invisíveis", "agenda oculta" da
família, "padrões disfuncionais" nas relações familiares, "família como um
sistema". Houve uma mudança de paradigma na abordagem de grupo que
emergira após a II Guerra: os sintomas psicológicos passaram a ser vistos como
resultado da natureza dos vínculos estabelecidos entre as pessoas, como uma
produção conivente e conjunta, em oposição à perspectiva de uma etiologia
puramente individual.
As noções constituídas por essa nova ideologia herdeira da
II Guerra· vêm compor todo um novo modo de pensar o casamento (e sua
dissolução) e a família, caminhando ao lado do movimento da Anti-psiquiatria,
que rejeita a visão de que a "doença mental" esteja isolada do contexto onde é
gerada, compreendendo-a como uma expressão grupal. Não podemos esquecer
que é também na década de 70 que o movimento contra a reclusão de pacientes
em manicômios está em seu auge, com Franco Basaglia (1985) fechando os
hospitais psiquiátricos na Itália. Deste modo, os conflitos conjugais e familiares
antes entendidos como causados por um membro "problemático" do grupo,
passaram a ser vistos como sintomas produzidos no âmbito das relações entre a
díade ou no grupo familiar. Neste contexto, à semelhança da loucura, os
conflitos familiares não são mais tributados à patologia daquele que é portador
de uma queixa ou de um desajuste; ao contrário, passam a ser vistos como
produtos de padrões de relacionamento que são patogênicos.
Esta posição é bem realçada no trabalho de equipe coordenado
por Gregory Bateson (1980) em Palo Alto sobre a presença do "duplo-vínculo"
como uma modalidade tóxica de comunicação nas famílias esquizofrênicas. Ao
observar as relações de pacientes internados com seus familiares nos dias de
visita, Bateson percebe que era muito comum a emissão simultânea de
mensagens opostas e, portanto, mutuamente excludentes por um dos membros
da família, o que confundia seu interlocutor. Deste modo, uma mãe poderia estar
falando algo a seu filho e simultaneamente enviando uma mensagem não-verbal
na direção oposta à do enunciado verbal, fosse através de sua atitude geral ou
do que estava implicitamente contido nas "entrelinhas" de suas frases. Por

105
exemplo, mna mãe pode estar verbalizando que o filho é amadurecido o
suficiente para se responsabilizar por determinada tarefa e, paralelamente, estar
impedindo todas as suas tentativas de executá-la. Advêm destas idéias as noções
de "família esquizofrênica" e de "mãe esquizofrenizante"; noções estas que
revolucionaram o modo como a esquizofrenia era concebida na psiquiatria
clássica. Bateson, apesar de ter sua formação na área da Antropologia e não ser
psicanalista, recebeu um prêmio da sociedade psicanalítica londrina pela
contribuição que deu ao estudo da esquizofrenia.
Bateson e seus colaboradores passam a integrar uma linha de
atuação na área da Terapia Familiar que se inclui entre as abordagens sistêmicas
ou comunicacionais. Esta corrente de atuação têm, portanto, sua origem ligada a
um grupo de especialistas identificados como "Grupo de Palo Alto" porque foi
formado nesta localidade do estado da Califórnia, nos EUA. Neste grupo
incluem-se diversas vertentes unidas por alguns princípios gerais. Influenciados
pela publicação da "Teoria Geral dos Sistemas" de Von Bertalanffy (1972), estes
especialistas passaram a aplicar a noção de sistema à compreensão das relações
familiares. Partindo do suposto de que o todo transcende à soma das partes,
entendem que a noção de família implica algo que supera o mero conjunto de
seus componentes. Com isso, enquanto a psicanálise está falando em "família
como uma unidade", a abordagem sistêmica se refere à família "como um
sistema". A partir desta configuração epistemológica, surgiram a "escola
estratégica" representada por Don Jackson (1971), Gregory Bateson (1980), John
Weakland (1976) e Virgínia Satir (1988), dentre outros, e a "abordagem de
solução de problema", representada por Jay Haley (1979). Também na Itália teve
início uma produção nesta área, representada por Palazzoli (1978), da "Escola de
Mil-ao."
Estas vertentes diferenciam-se entre si a partir das técnicas de
intervenção que utilizam. Aliados à idéia de Paul Watzlawick (1994) de que "a
realidade é inventada"I 4I, muitos terapeutas de farmlia também começaram a
introduzir idéias do construtivismo na orientação de seu trabalho com famílias,
utilizando-se para isso das mais variadas técnicas de intervenção. Nesta linha,
passou-se a falar em uma "Cibernética de Segunda Ordem", de acordo com a
qual a compreensão da narrativa constituía o instrumento terapêutico para a
consecução do objetivo de gerar posições alternativas que pudessem sustar a
produção do sintoma. Nesta perspectiva buscava-se desenvolver técnicas de
trabalho familiar que criassem condições de mudança através do aproveitamento
do próprio potencial da famíliai42 ~
141 Isto significa que a visão de mundo de um indivíduo ou de um grupo depende do olhar que se tem, a partir
da própria referência de mundo, não existindo o real em si.
142 Diz Watzlawick (1994: 17): " ... é o ponto de vista segundo o qual toda realidade é- no sentido mais direto
(cont.)

106
Paralelamente às produções do Grupo de Palo Alto e da Escola
de Milão, desenvolveram-se outros focos de difusão da Terapia Familiar.
Basicamente, podemos verificar que o tema das terapias de casal e fann1ia foi
tratado por outras três importantes tendências=- que=- posteriormente=- também se
desdobraram em outras novas abordagens ou outras ramificações. Segundo
Lamanno (1987), além das abordagens sistêmicas ou comunicacionais, pode-se
identificar outras abordagens precursoras principais: a abordagem psicanalítica,
a estrutural e as históricas ou psicodinâmicas.
A abordagem psicanalítica teve sua principal origem em
Londres, onde surgiram os primeiros setores de atendimento especializado.
Henry Dicks (1970) fundou o "Family Discussion Bureau" e Lily Pincus (1987) o
"Marital Unit", ligado à Tavistock Clinic. Esta abordagem segue noções
psicanalíticas como as de "inconsciente", de manejo da "transferência" e da
"contra-transferência" em grupo, bem como as noções adotadas pela escola
kleiniana inglesa, de "continência" e de "identificação projetiva" 14l, esta última
necessária à compreensão da constituição do "paciente identificado" no casal ou
na família (aquele que é o "porta-voz" da "doença" familiar).
A abordagem·estrutural tem sua origem com Salvador Minuchin
(1982) em Nova Iorque e Maurizio Andolfi (1984) em Roma. Andolfi iniciou seu
contato com Minuchin em período que foi aos EUA para fazer formação na
área. Ambos os especialistas publicaram uma série de livros sobre a Terapia
Familiar em linha estrutural. Desenvolveram conjuntamente a noção de família
como estrutura e criaram novas técnicas de tratamento das relações conjugais e
familiares. Andolfi foi o fundador do "Instituto de Terapia Familiar de Roma".
As abordagens históricas ou psicodinâmicas são representadas
principalmente pelos norte-americanos Lyman Wynne (1968), Murray Bowen
(1978) e N athan Ackerman (1986). Estes especialistas partiram de noções
psicanalíticas e mesclaram-nas com técnicas de intervenção da abordagem
sistêmica.
Cabe ressaltar que outras demarcações das linhas de orientação
em Terapia Familiar são possíveis. O que pretendemos enfatizar, neste
momento, é como o sucesso desta nova geração de peritos provocou uma
transformação sensível na forma contemporânea de compreender as relações
conjugais e familiares. As publicações na área são inúmeras e é grande a
quantidade de material sobre abordagem sistêmica que tem sido traduzido para
o português, o que tem contribuído para sua disseminação nas universidades e
- construída por quem crê que a descobre e a investiga. Em outros termos, a realidade supostamente
encontrada é uma realidade inventada e seu inventor não tem consciência de sua invenção, mas crê que tal
realidade é algo independente dele e que pode ser descoberta; portanto, à partir desta invenção, percebe o
mundo e nele atua."
143 Consulte, se necessário: Laplanche, J. & Pontalis, J. B. (1982: 302).

107
instituições de saúde brasileiras. Tais livros versam tanto sobre a teoria
sistêmica quanto sobre as técnicas terapêuticas.
É importante identificar a existência deste espectro de
abordagens porque foi no âmbito de sua influência que os primeiros núcleos
brasileiros se constituíram e passaram a empreender a formação de terapeutas
de família entre nós.

• Nova especialidade de atuação sobre a família no Brasil

As tendências teóricas da Terapia Familiar foram introduzidas


no Brasil através de terapeutas brasileiros que buscaram formação no exterior.
Vemos que, ao descreverem a própria formação profissional na área, os
terapeutas, sobretudo os da primeira geração, mencionam viagens aos núcleos
de formação precursores que acabamos de identificar. Palo Alto, Nova Iorque e
a cidade do México encontram-se entre os principais pólos procurados pelos
terapeutas brasileiros que buscaram formação em abordagem sistêmica. Roma e
Milão eram procurados para formação sistêmica e/ou estrutural. Andolfi (1984),
por exemplo, foi convidado a ministrar cursos e supervisionar terapeutas
brasileiros e fez diversas visitas ao nosso pais a convite de equipes brasileiras.
Londres, que já havia recebido muitos psicanalistas brasileiros nas décadas de
60/70 e era conhecida por sua produção na área da Psicanálise, passou a ser
procurada também para formação em Terapia Familiar psicanalítica ou
sistêmica.
Parece-nos importante nos determos na questão de como a
emergência dos terapeutas de família no Brasil (que tem este movimento
mundial como pano de fundo) é narrada pela própria classe profissional para
que possamos encaminhar uma reflexão sobre o desenvolvimento deste mercado
terapêutico em nosso país. Algumas das descrições feitas pelos terapeutas são
úteis para compreender a formação das hierarquias dentro do campo. Podemos
observar que a história contada pelos terapeutas brasileiros sobre o movimento
mundial não difere daquela que é apresentada na literatura. A história da entrada
deste movimento no Brasil é contada pelos terapeutas a partir das viagens que
realizaram ao exterior e da difusão destas teorias e práticas vindas de fora,
sobretudo nas capitais brasileiras.
Para analisarmos as representações dos terapeutas de família
sobre sua própria história, optamos por utilizar o conjunto dos discursos a
I

respeito deste tema que foi recolhido através de entrevistas e de algumas


atividades do "I Congresso" (1994) e do "Encontro" (1995), conforme
mencionamos na Introdução (Veja Anexo 2). Foram entrevistados dez terapeutas de
casal e famHia, escolhidos dentre os profissionais que atuam há mais tempo na

108
área, que participaram de comissões de organização do "I Congresso de Terapia
Familiar" e que, afora a atividade clínica, estão ligados a cursos de fonnação de
terapeutas de família em São Paulo. Inicialmente, pedimos aos entrevistados que
falassem sobre seu percurso profissional e, em seguida, sobre a maneira como
concebiam a história da Terapia Familiar no Brasil, procurando delimitar
períodos de seu desenvolvimento.
Nas entrevistas realizadas, percebemos que quando os
terapeutas falam sobre seu percurso profissional, os marcos importantes
referidos tendem, em geral, a coincidir com os marcos da história oficial sobre o
desenvolvimento da Terapia de Família no Brasil apresentada nos dois eventos
mencionados. Neste sentido, vêem-se como um prolongamento do processo
mundial, como os atores que instalaram as diversas correntes de Terapia
Familiar no Brasil. O discurso dos terapeutas ganhou nova amplitude quando um
segmento destas falas alerta para a necessidade de se recriar a teoria e a técnica
de acordo com as necessidades da família brasileira. Foi neste momento que
parece ter ocorrido uma emancipação em relação ao estrangeiro e a fonnação de
uma identidade própria, como estratégia de luta no mercado nacional. Estes
aspectos serão detalhadamente tratados um pouco mais adiante, depois da
análise do modo como os terapeutas descrevem o papel que desempenharam na
introdução da Terapia Familiar no Brasil.
Através da descrição dada pelos terapeutas de fann1ia, podemos
chegar à delimitação de alguns períodos que, segundo a óptica destes
especialistas, marcaram a trajetória da Terapia Familiar em nosso país:

• Por volta da década de 50:


A literatura marca o início da Terapia Familiar como especialidade
no exterior. Embora já se soubesse de esparsas iniciativas, em alguns
países, em atender ao casal e a familia, é no Pós-Guerra que centros de
atendimento e cursos de formação de terapeutas começaram a ser
instalados. Os terapeutas assumem esta versão 144 sobre o início da
atividade 145 e freqüentemente mencionam os centros precursores no
exterior. O "Mental Research lnstitute" em Palo Alto (Califórnia), o
atual "Ackermann Family Therapy Institute" em Nova Iorque, a
Tavistock Clinic em Londres, o "Instituto de Terapia Familiar de
144 Sobre o início da história da Terapia Familiar no exterior, consulte Guerin (1986).
145 Na apresentação do Histórico na abertura da reunião do Pré-Encontro do "I Congresso", a terapeuta
responsável pela fala diz: ''Inicialmente apresentaremos um rápido relato da origem da Terapia Familiar
em outros países, que nos deu subsídios para o desenvolvimento em nosso pais." (. ..) "Faz sentido
apontar a origem destes conhecimentos em outros países, uma vez que a Terapia Familiar no Brasil tem
sido uma área de estudo e atendimento clínico estruturada, sobretudo, a partir da divulgação das idéias
desenvolvidas nos Estados Unidos e Europa, localidades que se tornaram o "celeiro" dos primeiros
terapeutas, onde foram buscar sua formação." Nesta linha, a terapeuta cita autores e instituições do
exterior, dentre os quais o grupo da Califórnia.

109
Roma" criado por Maurizio Andolfi (1981/1984) e o chamado "Grupo de
Milão" na Itália e centros de atendimento na cidade do México, ligados
a universidades como, por exemplo, a Anahuac, estão entre os mais
lembrados;

• Por volta da década de 60:


Alguns psicanalistas brasileiros deram início a atendimentos aos
casais e famílias e à formação dos grupos de estudo e supervisão
transmitindo este trabalho inicial. Alguns terapeutas, de variadas
abordagens, começaram a sair em viagens para programas de estudo
fora do Brasil e entraram em contato com as abordagens sistêmicas em
Terapia Familiar, participando de todo tipo de atividades - desde
congressos, workshops, até cursos de maior duração;

• Por volta da década de 70:


Muitos terapeutas caracterizaram o período pela falta de uma
formação mais oficial e pela tentativa de um trabalho sentido ainda
como incipiente. As iniciativas no sentido de buscar os centros de
formação no exterior continuavam. Há comentários sobre o não
conhecimento da especialidade. Esta terapeuta marca este tipo de
questão, referindo-se ao ano de 1976:

"Esse tipo de trabalho tinha pouquíssima repercussão. As pessoas meio que


estranhavam que este tipo de trabalho fosse feito ... não tinha como costume
esse tipo de trabalho. tanto de parte dos profissionais, como de parte dos
próprios pacientes. " (. ..) ''Então, por exemplo, com quem eu falava eram
pessoas que, de uma ou outra forma haviam saído fora a se formar. " (. ..) ''Eu
sei que era muito restrito. Se você pegar isto de um outro vértice... por
exemplo, eu ficava muito surpresa que não tinha literatura em português!
Você ia nas livrarias e praticamente não tinha nada! O que tinha era ou em
inglês, ou em espanhol, ou em francês." 146

Para compensar a falta de material para estudo na área, os terapeutas


interessados na especialidade acabavam compondo um grupo de estudo
e supervisão em tomo daqueles que tinham formação fora do país.
São muito freqüentes as menções a este tipo de grupo de estudo. 147
146 Estas duas terapeutas falam, na mesma direção:
"Inclusive o pessoal fazia isso muito... de uma forma até um pouco .. . moderna, vamos dizer assim ... ou
melhor, meio experimental, a impressão que eu tenho, porque não tinha assim um movimento, uma
aceitação, um negócio... Quer dizer, era uma coisa meio experimental, onde alguma experiência que a
pessoa têve fora e que... que é natural que você comece a botar na sua prática."
"Eu diria que aqueles primeiros anos eram os anos pioneiros e, que cada um fazia o que sabia, o que
podia, com a supervisão que tinha, dentro do possível. As pessoas mesmo se juntavam, estudavam,
conversavam, mas não havia nada muito sistemático."
147 Uma terapeuta diz: ''Aí, em 78, chegou aqui no Brasil um terapeuta, meu conhecido, que tinha feito o
curso de familia em ... " (...) "E, então, a gente fez um grupo de estudo." (...) "Então a gente estudou um,
(cont.)

110
Uma terapeuta conta ter concluído mestrado em Terapia Sexual no
início dos anos 70 e que o tema estava em voga na época, sobretudo
nos EUA. Os terapeutas sexuais passaram paulatinamente a ser menos
mencionados no Brasil, provavelmente, na mesma proporção em que os
terapeutas de casal começam a ocupar este espaço. A própria terapeuta
que mencionamos acima passou a atuar, posteriormente, na área de
Terapia Conjugal e Familiar. Também fazem alusão ao movimento da
Anti-psiquiatria no Brasil, sendo reconhecido em caminho conjunto ao
desenvolvimento da Terapia Familiar. Nos cursos de Psicologia lia-se
Laing (1978), Szasz (1976), Goffinan (1974), Cooper (1973) e Foucault
(1978), dentre outros.
Ao final da década de 70 surgiram cursos sobre Terapia Familiar em
Faculdades de Psicologia; dentre elas, compõe-se um núcleo expressivo
na Pontificia Universidade Católica de São Paulo. Uma terapeuta faz
referência a curso na área no programa de pós-graduação da PUC/SP,
com início em 1976.

• Por volta da década de 80:


Alguns terapeutas entrevistados mencionam a realização de viagens
ao México (84/85). Alguns terapeutas também fazem referências à
participação em Congressos no exterior, eventualmente, até, em
Congresso Mundial de Terapia Familiar. Na fala de uma terapeuta:
"-Foi se formando uma rede."
Por esta época ainda podia ser comum chamar o trabalho com os
pais de Orientação de Pais, quando se tratava de sessão com propósito
de tratar do(s) filho( s) do casal.
Os terapeutas fazem referências à mudança de linha de orientação
de trabalho, isto é, pessoas saindo do psicodrama, da psicanálise, da
ludoterapia ou da análise de crianças, para se integrarem,
predominantemente, à abordagem sistêmica em Terapia Familiar ou
associá-Ia ao trabalho que era antes realizado. Uma terapeuta referindo-
se ao ano de 1987 diz:

''Dentro do trabalho com psicodrama, a gente jaz isso. "(. ..) ''Porque Moreno
considerava o trabalho de família e de casal, como um sociodrama, quer
dizer, é um trabalho com um grnpo como qualquer outro grnpo. Então, a
gente já trabalhava, nós já tínhamos instrumentos com psicodramatismo
para trabalho com casal e família. Aí... eu vim para São Paulo."(. ..) ''Aí,
quando eu cheguei em São Paulo, eu comecei a procurar outros terapeutas
de família, outros cantatas, porque... lá em Brasília eu ficava muito isolada

dois anos, comecei a estudar a bibliografia da Terapia Familiar e ouvir as experiências e já saber de
como se estava trabalhando etc. Dai, em 84, eu já tinha lido uma porção de livros a respeito."(. ..) ''Já
tinha lido uma porção de gente e estava interessada em ver como se trabalhava. Então, eu fui para
Massachussetts e fiz aquele curso intensivo de 25 dias."

111
nessa área, não tinha ninguém com quem trocar, porque eu era a única lá...
em Terapia Familiar." (. ..) "E aí, eu entrei em contato com a teoria
sistêmica. que eu não conhecia e comecei a achar muito interessante e
comecei a achar que tinha muito a ver com a teoria do psicodrama. ''1 48

Iniciaram-se os Encontros, organizados por setores de Pós-


Graduação da Pontificia Universidade Católica de São Paulo e outras
instituições distribuídas em outras capitais do país. Uma das
organizadoras, que estima que foram realizados 13 Encontros Nacionais
anteriores ao "I Congresso", diz:

''Acho que por aí, 83, 84, a gente começou a fazer uns Encontros. Nós
fizemos três Encontros de Terapia Familiar, justamente com essa finalidade
de começar a chamar as pessoas interessadas, o pessoal que a gente sabia
que tinha alguma prática, que estava incipiente, que ainda não tinha um
curso de formação nem nada, mas... quer dizer, já tinham várias pessoas ido
para o exterior para Jazer... para buscar esse conhecimento. Em 80 e... 87,
eu fui também a convite... ''149

Da metade para o final da década, surgiram muitas instituições


particulares sob as fomias de centros de estudo ou institutos,
geralmente vinculados a consultórios. Vários dos terapeutas
entrevistados coordenam instituições deste tipo. Estes locais passaram a
oferecer cursos de formação, muitos dos quais, posteriormente, se
transformam em cursos de maior duração (2 ou 3 anos), em caráter de
especialização. 150
No mesmo período, foi organizado um número maior de
"seminários" com estrangeiros, convidados principalmente por
entidades não acadêmicas. 151 Observamos que este tipo de evento
começou a ser denominado workshop no início dos anos 90, quando
inúmeros convidados estrangeiros proferiam cursos de final de semana
148 Na mesma direção, uma outra terapeuta diz: ''A preocupação de incluir a família na terapia veio um
pouco do atendimento de adolescentes, do atendimento de crianças e do atendimento de casos mais
graves." ( ..) "Eu comecei a trabalhar mais com as crianças também e aí era, fundamentalmente,
indispensável o trabalho com a família, por mais que eu trabalhasse em ludoterapia, enfim, linha
psicanalítica, sem fazer um trabalho vincular não dava."
149 A terapeuta participou de atividade na Universidade de Illinois - Chicago.
150 Vejamos a fala destas terapeutas:
"Eu diria que, a partir de 88, surgiu um grande número de Institutos dando fonnação. As pessoas
começaram a se organizar e a gente têve assim o nascimento de enorme... um número enorme de núcleos
dando formação."
"Porque é assim ... que os primeiros terapeutas começaram a dar uma organização formal para as suas
experiências pessoais, digamos assim." (. ..) "E a se juntar, quer dizer, ou em Institutos particulares,
grupos de estudos etc, para formar terapeutas familiares ... assim particularmente. Em 89, começou a
funcionar o curso aqui.11

151 Diz uma terapeuta, ligada à Universidade: "Convidados por grupos particulares. Não tinha entrado esse
Movimento nas universidades ainda. 11

112
promovidos por wna instituição de Campinas, chamada Workshopsy.
Dentre eles: Salvador Minuchin, Carlos E. Sluzki e Ivan Bozormenyi-
Nagi .

• Por volta da década de 90:


Nesta época, a Terapia de Família já é vista como wn campo de
trabalho especializado. A ênfase é dada, de um lado, à sedimentação e
ao crescimento das associações (a ABRATEF- Associação Brasileira
de Terapia Familiar e diversas Associações Regionais são fundadas
neste período); de outro, à edição de livros de autores brasileiros. Isto é
salientado pelas terapeutas cujas falas reproduzimos a seguir:

''Agora que a terapia de família já é parte do stab/ishment. nós estamos


começando a falar, temos que nos preparar bem. "
"Começamos com a APTF, que é a Associação Paulista de Terapia Familiar,
que foi fundada na ocasião, por necessidade de viabilizar o Congresso, mas
que deu, por outro lado, um começo político para essa institucionalização
maior da Terapia Familiar no Brasil. "

Nos anos 90, podemos igualmente observar wn investimento no


sentido de incentivar as publicações nacionais. Diz wna das
entrevistadas:

''E a partir de 90, começa a aparecer uma produção mais regular, em que a
família é objeto do estudo, a família como um todo. E eu gostaria de te dizer
que, a partir de então - isso foi até 92 -, essa produção tem aumentado
muito e nós podemos dizer que temos no Brasil uma produção regular na
área de Terapia de Família." (. ..) ''A partir de 92/93, eu diria, a gente
começou a ter uma produção regular nacional, aqui no nosso curso, de
trabalhos, pesquisas, livros etc., da nossa prática, da nossa experiência.
Quer dizer, eu digo regular, porque ano passado saíram dois livros... três
livros. Este ano vão sair outros tantos e eu acho que, daqui para adiante... "
(. ..) ''Então, a produção nossa atingiu, digamos assim, um ritmo de
regularidade. "

As publicações nacionais, as dissertações de tese e os cursos


incorporados às universidades - até mesmo em nível de pós-graduação,
evidenciam o caráter propriamente acadêmico assumido pela
especialidade no Brasil dos anos 90.

Através do conjunto de depoimentos reunidos, podemos


observar que os psicanalistas que atendiam famílias na década de 60 foram
perdendo espaço para os terapeutas de abordagens sistêmicas que
progressivamente se disseminaram e constituíram uma rede de especialistas em
busca da consagração deste campo terapêutico. Na década de 70, vimos a

113
menção à falta de uma formação "mais oficial"; tal demanda começou a ser
suprida com o surgimento e a consolidação de cursos em algumas Faculdades de
Psicologia, como é o caso da PUC/SP, em 1976.
O sentimento de isolamento profissional e a alegada necessidade
de trocar experiência (como vimos no relato da psicodramatista citada), parecem
ter movimentado a articulação e a associação de grupos de especialistas.
Contudo, podemos ver que a alegada necessidade de intercâmbio encobre uma
outra necessidade mais latente: a da organização de legitimidades e hierarquia
nos grupos de pertinência desta classe profissional. É na década de 90 que esta
linha de atuação sobre a família, identificada já como o Movimento da Terapia
Familiar brasileiro se consagra mediante a organização dos Congressos - que
são os substitutos dos Encontros - e a considerável independência em relação à
presença do profissional estrangeiro como formador.
As dez terapeutas entrevistadas referiram-se às experiências no
exterior, sobretudo ao contar sobre o início de sua formação na área: viagens em
busca de conhecimento e especialização. Itália, México, França, Argentina e,
sobretudo, Estados Unidos, foram os países mais procurados. 152 Este dado nos
confirma que a técnica de Terapia Familiar que entra no Brasil é importada
essencialffiente dos países reconhecidos como o Primeiro Mundo. Esta conexão
era importante, pois vemos que o fato do terapeuta familiar ter incluído em seu
currículo alguma formação no exterior oferecia-lhe uma posição de distinção em
relação aos colegas que não tiveram esta oportunidade, colocando-o em papel
de professor ·ou supervisor na hierarquia do campo. Essa posição lhe permitiu,
posteriormente, dispensar o supervisor estrangeiro.
Por ocasião do "Encontro" do Maksoud, o presidente da
ABRATEF dividiu este espaço terapêutico em três tempos:
152 As menções às viagens ao exterior são realmente freqüentes:
''Ai, eu comecei a ir para os Estados Unidos, coisa que eu vou ainda por uma ou duas vezes por ano, todos
os anos."
"Fui à Itália várias vezes, mas na primeira vez, porque lá eles dão cursos intensivos para terapeutas do
mundo inteiro. Mas assim ... durante um mês você 'respira' de manhã, de tarde e de noite, quer dizer, por
isso que ele escolhe. Ele escolhia, por exemplo, uma pessoa no Brasil... uma ou duas pessoas de cada
pais, que ele achava indicadas, porque não é qualquer um que pode ir lá fazer o curso." (. ..) ''Foi em 82.
E, em 82, eu fiquei um mês, quer dizer, de manhã, de tarde e de noite, certo, quer dizer... e com
terapeutas de todas as partes do mundo com, no mínimo, 5 anos de experiência em terapia. Ele não
aceitava gente jovem. Então, tinha australiano .. . o que foi digamos assim ... um convívio intercultural,
uma aprendizagem imensa, porque tinha da Ajrica do Sul, da Austrália, do México, da Argentina, da
Nova Zelândia... só não tinha do Oriente.
"E aí nós fomos para o México, nós fomos em 12 brasileiras, acho que era umas 8 ou 9 desse grupo da X,
que estudava famllia e umas duas ou três pessoas da PUC."
"Eu fui aos Estados Unidos, fui à Itália e mais recentemente, em 89, eu estive no México. O Programa...
quem me ajudou a montar o Programa [Programa de Pós-Graduação em Terapia Familiar] e que discutiu
muito comigo foi o Y. - ele foi o primeiro. Ele esteve no Brasil e eu me correspondia e nós sentávamos
sobre o Programa, aí eu estive lá... ele me ajudou muito a conceber o Programa como uma peça. "

114
1) ''Havia ou há os precursores mais antigos, aqueles que estudaram fora ou aqui mesmo
por conta dos mestrados e doutorados e troxeram a boa-nova à Terapia Familiar."
2) ''Surgem hoje os de meia-idade. " (. ..) ''Aqueles que, já mais familiarizados com o tema,
partiram para o mundo à procura do mais novo na área, contribuíram com
desenvolvimentos recentes no Brasil do que diziam os mestres lá fora, que inclusive hoje,
nesse Encontro, estão conosco." 153
3) ''Esses já constituem os derivados no Brasil que não saíram ou que foram ou são
discípulos dos mais antigos."(. ..) ''Hoje, atualmente, percebo três novas levas: os discípulos
dos discípulos, o movimento nas diferentes profissões e os recém-chegados dos novos
estudos de fora. "

Nesta visão histórica, teríamos então:


1) Os iniciadores do Movimento da Terapia Familiar no Brasil, influenciados
por mestres estrangeiros, em cursos no exterior ou através de suas obras;
2) Seus discípulos, que novamente aprimoram seus conhecimentos no exterior;
3) Os discípulos dos discípulos como uma nova geração de terapeutas, com
formação nos cursos de extensão, especialização ou pós-graduação já
existentes no Brasil e, eveutuahnente, com formação no exterior.
Observamos que os cursos realizados no exterior estão presentes
nos três níveis da classificação acima mencionados, o que inclui, portanto, a
Terapia Familiar no Brasil como parte da história mundial da Terapia Familiar.
Os cursos no exterior são, desta forma, bastante mencionados e orientam a
edificação da hierarquia no campo profissional e, com isso, demarcam os
lugares de pnvilégio em relação ao acesso à clientela, dependendo do grau de
distinção obtido. Aqueles que são percebidos como precursores na área, têm
acesso a uma clientela mais ampla: não somente a clientela composta pelas
famílias, mas também aquela que é gerada pelos próprios terapeutas, via
supervisão. É comum o terapeuta ter seu trabalho supervisionado por um
profissional mais experiente. Neste contexto, delineiam-se as novas gerações de
terapeutas, tendo como referência "os alunos dos alunos". O mestre mais antigo
qualifica seus discípulos para supervision~ outra geração de especialistas.
Vimos acima que ao se referirem às idas a Congressos no
exterior - muitas vezes Congressos Mundiais - e à transmissão do
conhecimento adquirido fora, os terapeutas brasileiros reforçam a versão de que
retomaram ao país e constituíram uma rede de intervenção sobre a família. O
mestre estrangeiro ficou, inicialmente, com a posição de topo na hierarquia,
supervisionando terapeutas brasileiros que, amparados nas técnicas importadas
(reconhecidas por eles como inovadoras), passaram a formar novos colegas,
transformando-os em seus discípulos. Tais colegas, por sua vez, começaram a
153 Diz o atual presidente: "E estão aqui todos aqueles."(. ..) "recém-chegados no Brasil de seus cursos fora."

115
transmitir as novas abordagens à geração de terapeutas subseqüente.
Entendemos que numa fase posterior, os Congressos
desempenharam um papel fundamental para o estabelecimento de uma
hierarquia de competência na classe de terapeutas de família, já que neles
tentava-se garantir uma legislação que orientasse os rituais de consagração dos
indivíduos no campo. Para que o terapeuta pudesse ascender na rede
hierárquica, deveria comprovar estudo e atuação na área.
No Estado de São Paulo, a APTF - Associação Paulista de
Terapia Familiar definiu que o terapeuta que comprove estar em formação (e
para isso basta estar matriculado em curso reconhecido pela Associação), pode
inscrever-se na APTF como sócio-aspirante. Para integrá-la como sócio-titular,
o terapeuta deve ter completado 360 horas de experiência na área, sendo que
180 destas devem ser preenchidas com realização de cursos e as outras 180
horas com trabalho clínico supervisionado. Além disso, são necessárias duas
cartas de apresentação assinadas por sócios já titulares. Em outras Associações
de Estado, podemos encontrar variações destes critérios, mas há sempre algum
tipo de regulamentação. Observamos que foram as Associações de Estado,
nascidas no período do "I Congresso", .que definiram os critérios de participação
neste campo. Verificamos também que os terapeutas de família passaram a
constituir uma clientela para a própria classe profissional, via supervisão de
terapeutas mais jovens.

• A constituição do campo da Terapia Familiar no Brasil

e luta concorrencial

"Congregar profissionais de um campo de trabalho é fundamental para o


fortalecimento desse mesmo campo. Não só pelo reforço da identidade do grupo
de pares como pelo reconhecimento da comunidade científica mais ampla. " (. ..)
"O programa do evento é testemunho do alto grau de desenvolvimento em que
se encontra a atividade no campo da Terapia Familiar no Brasil."

Mesa-redonda de abertura do "I Congresso de Terapia Familiar"


Representante da área acadêmica.

Os Congressos e as abordagens teórico-técnicas . adotadas


organizaram a distribuição da classe profissional dos terapeutas no Brasil. Os
Congressos acabaram por demarcar a hierarquia das equipes de trabalho e a
·legitimidade destes grupos frente à classe profissional e sua clientela. Os
primeiros Congressos brasileiros foram extremamente importantes porque

116
representaram o veículo através do qual foi possível definir a rede de posições
no interior do campo profissional. O "I Congresso de Terapia Familiar",
sobretudo, teve imenso poder mapeador das hierarquias, uma vez que fez nascer
a ABRATEF- Associação Brasileira de Terapia Familiar, outras Associações
Regionais e as figuras expoentes responsáveis por gerir estas instituições.
Analisemos, pois, com mais detalhes, o modo como estes eventos realizaram
essas funções.
No "I Congresso de Terapia Familiar" houve duas reuniões de
dia inteiro, como Pré e Pós-Congresso, que reuniram os organizadores
(membros das diversas comissões organizadoras) e representantes de entidades
formadoras em Terapia Familiar (representantes de Institutos, Universidades,
Fundações etc.), de várias regiões do Brasil. Compareceram à primeira reunião
representantes de setenta e quatro entidades brasileiras. O primeiro dia foi
dedicado à discussão da formação em Terapia Familiar e para o último estavam
na pauta o enfoque dos Estatutos da ABRATEF e a formação de Associações
Regionais. Incluíam-se ainda nos objetivos da reunião decidir sobre o local do
"II Congresso" e uma avaliação deste "I Congresso". Neste último dia, estavam
em votação os Estatutos para que a Associação pudesse ser registrada e
começasse a funcionar. A organização do Congresso seguinte também
dependeria disto, uma vez que já passaria a ser responsabilidade da ABRATEF,
que teria o encargo de organizar um Congresso a cada dois anos. Neste dia,
fundou-se po.is, a ABRATEF através da elaboração de uma Ata de Fundação que
reunia as assinaturas dos representantes de entidades presentes. As Associações
Regionais (compostas por Estado ou grupo de Estados) constituíram-se após
este Congresso.
No ano seguinte, 1995, em São Paulo ocorreu o evento
intitulado Desenvolvimentos em Terapia Familiar que preparou os planos
futuros, pois foram discutidas questões relativas ao próximo Congresso. Este
evento recebeu o nome de Encontro, pois não poderia ser um Congresso, já que
o Congresso seguinte seria realizado pela ABRATEF, já em atuação. Este
"Encontro" foi organizado por uma instituição da cidade de Campinas que
costuma trazer profissionais estrangeiros ao Brasil. Dentre outros profissionais
norte-americanos que participaram das atividades estavam: Peggy Papp 154 e
Lynn Hoffinan 155 (Nova Iorque), Cloé Mandanes 156 (Washington), Paul
154 Supervisora e diretora do "Post-psychiatric Hospitalization Project" no Ackerman lnstitute for Family
Therapy. Pertence ao conselho editorial da revista Family Process.
155 Começou a trabalhar com Don Jackson, que foi diretor e fundador do MRl- Mental Research Jnstitute,
em Palo Alto, Califórnia. Conviveu com Gregory Bateson, Jay Haley, Carlos Sluzki, John Weakland e
Richard Fisch. Em 1971, passou a trabalhar na Philadelphia Child Guidance Clinic, com Salvador
Minuchin, e em 1978, foi para oAckerman Jnstitute.
156 É diretora do Family Therapy Institute ofWashington, D.C.

117
Watzlawickis7 (Palo Alto).
Diversas pessoas do grupo que organizou o "I Congresso"
estavam presentes, cooperando com o desenvolvimento do evento e, por vezes,
fazendo parte de alguma mesa. Reservaram-se espaços de reunião para que
representantes de entidades brasileiras pudessem se apresentar e falar sobre a
formação oferecida em suas instituições. Houve também um horário estipulado
para discussão sobre a ABRATEF e o Congresso seguinte, em 1996. Ainda
durante o evento, foi proferida a palestra intitulada A Psicoterapia Familiar no
Brasil. Reuniões extras, afora o "Pré-Encontro'\ foram improvisadas com o
intuito de esclarecer pontos que fossem necessários. Por exemplo, convocou-se
informalmente uma reunião com as pessoas que tivessem estado presentes no "I
Congresso" (em 1994) e assinada a Ata de Fundação para que se pudesse
discutir se a sede jurídica da ABRATEF seria itinerante juntamente com a
Associação Brasileira, isto é, transferindo-se a cada dois anos, ou se
permaneceria em São Paulo. Decidiu-se que não era possível alterar a decisão
tomada naquela Assembléia e que a sede jurídica permaneceria em São Paulo.
Em reunião realizada em Pré-Encontro neste evento, foram
apresentadas e discutidas as sugestões de tema para o "ll Congresso" (a
previsão · era de que o Congresso ocorreria em Porto Alegre, no segundo
semestre de 1996). À época, os temas sugeridos foram: família brasileira do
século 2.000; integração família - comunidade; casal do ano 2.000; casal e
família na virada do século; o terapeuta familiar brasileiro no ano 2.000; unidade
e diversidade - a questão da ética na prática da Terapia Familiar; trabalho
preventivo; a família brasileira na virada do século; política social da família;
casal e família brasileiros - construindo a sociedade do século XXI ou
construindo a nova cultura familiar; a relação família/sociedade: terapia na
virada do século; casal e família- a comunidade brasileira na virada do século;
casal, família, comunidade e Terapia Familiar. Estes foram os temas
considerados prioritários, isto é, que deveriam pautar as discussões do "ll
Congresso" (previsto para 1996) sob as formas de sessões plenárias, temas
livres, mesas redondas e workshops.
Esta relação dos temas que apareceram no levantamento
realizado no grupo de discussão mostrou a ênfase dada à questão da mudança
de século, além de manter uma suposta representação denominada "família
brasileira", presente em muitos dos itens. A frase que supõe o casal e a família
brasileiros "construindo a nova cultura familiar" aponta para a ideologia bastante
comum de que à virada do século necessariamente deve corresponder a uma
"nova cultura" ou "nova sociedade". Os indícios são que os terapeutas de família
157 Pesquisador associado do MRl - Mental Research Jnstitute e professor da Faculdade de Medicina da
Universidade de Stanford

118
estão antecipando a discussão sobre o modo com o qual poderão se inserir no
mercado das terapêuticas no ano 2.000, através da tentativa de prospecção dos
temas de interesse. Pensar no século XXI sugere que esteja sendo pensado o
que oferecer à família brasileira do futuro, garantindo a continuidade desta faixa
de serviço no mercado das terapêuticas.
O "TI Congresso de Terapia Familiar" aconteceu em
Gramado/RS, em 1996. Afora as atividades usuais em forma de mesas-
redondas, temas livres, posters, workshops e cursos, reservou-se um horário
para Encontro de Farmadores em Terapia Familiar, um para a Reunião do
Conselho da ABRATEF e outro para o Projeto Semeando. O Projeto Semeando
foi organizado por um grupo de terapeutas com o objetivo de difundir a Terapia
Familiar nas localidades brasileiras em que o campo ainda não tivesse sido
instituído. Para tanto, o Projeto procurava oferecer cursos nestes locais. Durante
o "II Congresso", o Projeto promoveu seminários simultâneos com doze
profissionais estrangeiros. Deste modo, o Projeto Semeando foi apresentado
como uma atividade patrocinada pela ABRATEF que tem por objetivo divulgar
a Terapia Familiar no Brasil, aproveitando a infraestrutura do "ll Congresso".
Observamos que a classe profissional pretende não só manter-se no mercado
das terapêuticas no novo milênio, mas também expandir-se pelo país,
alcançando o maior número de regiões possíveis. Podemos imaginar que o
objetivo latente é o de expandir progressivamente a área de alcance da Terapia
Familiar, gerando demanda por este tipo de serviço e, portanto, um mercado
mais alargado. Parece-nos que o terapeuta brasileiro preocupa-se em se tomar
apto a lidar com a família da modernidade, do novo milênio.
Outro destaque parece ter sido dado ao tema da "Mediação no
Divórcio", tendo participado dos debates diversos profissionais argentinos.
Constatamos o uso do termo "mediação" também em livros publicados no
período próximo ao da realização do "ll Congresso". A escolha por este tema
pode representar uma tentativa de atualização em relação ao mercado
internacional, já que traz para a Terapia de Família um modo mais operativo de
atuação junto às famílias envolvidas em p~ocesso de divórcio.
O "lll Congresso de Terapia Familiar" ocorreu no Rio de
Janeiro, em 1998. Seu tema central foi: "O indivíduo, a família e as redes sociais
na virada do século". Este tema estava desdobrado em quatro eixos:
1) O impacto da globalização nas relações humanas;
2) Redes sociais: intersecção de diferentes áreas de atuação;
3) Pesquisa e prática frente aos desafios atuais: IDV, drogas, violência,
transtornos mentais etc.
4) Novas famílias, novas práticas terapêuticas?

119
Podemos observar que a tendência para pensar a fann1ia do
futuro está presente - expressa através da imagem de família do século XXI -, o
que evidencia uma preocupação com a adequação da prática terapêutica às
características das novas famílias. Constatamos, com isso, o cuidado em garantir
a continuidade da presença deste campo de atuação no mercado das
terapêuticas. Talvez também por esta razão seja constantemente retomada a
história do Movimento de constituição da área da Terapia Familiar.
Na abertura do programa preliminar, foi evocada esta história
como forma de integrar os terapeutas de família. Seu início foi identificado no "I
Encontro de Terapia Familiar", ocorrido em Salvador no ano de 1987; Belo
Horizonte é apontada como o local que sediou o "II Encontro", em 1990;
Brasília promoveu o "ill Encontro", em 1992; o "IV Encontro" foi transformado
no "I Congresso".
No III Congresso, contou-se ainda com a presença de
convidados estrangeiros, embora no II Congresso os terapeutas tivessem
"reclamado por independência", construindo a idéia ainda vigente de uma
"terapia de família à brasileira". Estiveram presentes: Emma Genijovich158,
Marcelo Pakmant59, Carlos E. Sluzki 160 e Dora Fried Schnitman. 161
A história e a evolução dos primeiros Congressos nos permitem,
portanto, compreender a natureza do processo de formação e consagração do
campo da Terapia Familiar no Brasil. Uma análise dos logotipos escollridos para
os Congressos demonstra a ambição de expansão do campo: almeja-se o Brasil
e, quem sabe, o mundo, entrando no mercado internacional. O Projeto
Semeando divulgado no "ll Congresso" já revelava esta intenção.
O logotipo utilizado no impresso do "I Congresso" correspondia
à imagem de um ovo. (Veja Anexo 16) Simbolizava o nascimento da classe
profissional como um grupo organizado 162 , talvez expressando o sentimento de
158 Argentina, co-diretora doMinuchin Center for the Family, Nova Iorque I EUA
159 Argentino, co-diretor da "Unidade de Internação Psiquiátrica do Departamento de Psiquiatria e Ciências
do Comportamento" do Berkshire Medical Center, de Massachusetts (EUA).
160 Argentino, diretor dos "Serviços Psiquiátricos" do Cottage Hospital, de Santa Bárbara (Califórnia I EUA).
161 Argentina, diretora da Fundação Jnterfas de Buenos 'Aires.
162 Na abertura do Congresso, o clima era de nascimento da categoria: ''A transformação do que seria o '"º-
Encontro' em 'I Congresso Brasileiro de Terapia Familiar' decorreu do grande impulso que a Terapia
Familiar vem tomando em nosso país. Este crescimento não só determinou o rápido aumento do mérito,
mas o interesse despertado nos seus estudos gerou razoável aprofundamento teórico-prático, que se
evidencia hoje na grande quantidade de cursos, workshops e temas livres oferecidos neste evento e que
falam de uma produção cientifica bastante intensa. Assim sendo, não seria possível deixar de nomear
Congresso, um evento que atingiu tais proporções. Motivo ainda mais determinante foi que a
compreensão de que a família, objeto de nosso estudo está inserida em um contexto social mais amplo,
gerou a expectativa de participar mais efetivamente do processo de transformação do mesmo e fez com
que os terapeutas de família ansiassem por uma maior inserção nesse social."(. ..) ''A todos esses e outros
profissionais que conosco realizarão o 'I Congresso', queremos também desejar as boas vindas em nome
da comunidade de terapeutas de família. Não podemos esquecer, contudo, que se os movimentos
(cont.)

120
família, que constatamos estar sempre presente nas discussões realizadas nos
Pré e Pós-Encontros do Congresso. As imagens de pintinhos e ovos, em geral,
referem-se à inf'ancia, já que crianças ganham e criam pintinhos ou patinhos.
Esta escolha é curiosa, pois a idéia de nascimento poderia ter sido simbolizada
por um bebê humano, o que se encontraria mais dentro do universo de
referência em questão. Um terapeuta, ao falar sobre o Movimento da Terapia
Familiar no Brasil, usa as fases de inf'ancia, adolescência e maturidade para
qualificá-lo. Pode ser que este momento tenha representado, para os terapeutas
organizadores, o momento da inf'ancia do Movimento.
O impresso do "ill Congresso" (confeccionado no início de
1996) anuncia o tema central do evento- A Família na Virada do Século-
acompanhado de um novo logotipo que ''já saiu do ovo". Nas palavras do então
novo Presidente da ABRATEF: "É um sistema, uma espiral em
desenvolvimento." (Veja Anexo 17) Já este momento foi sentido como um marco
que aponta para a modernidade do futuro e sua demanda - talvez de novo
mapeamento - à qual a especialidade deve estar preparada para responder.
O logotipo do "III Congresso" retratava uma família sobre um
globo, provavelmente simbolizando o mundo, já que o tema da globalização foi
mencionado como um dos eixos principais de reflexão. (Veja Anexo 18)
A rede fonnada por terapeutas e suas instituições (consultórios
particulares, universidades, centros de estudo etc) pode ser identificada a partir
do tipo de organização realizada para os Congressos, sobretudo o "I
Congresso", quando parece ter-se criado a primeira estrutura hierárquica deste
corpo profissional. É possível que a hierarquia também estivesse configurada
pela presença da imagem do ovo. São Paulo, em linha de frente, organizando o
primeiro evento com padrão mais acadêmico, já que os Encontros foram
substituídos por Congressos. Colaboraram com a organização do evento: um
núcleo de especialistas da cidade do Rio de Janeiro; outro de Brasília; um
núcleo gaúcho, agregado em tomo de Porto Alegre; etc. Naturalmente, mais
focos são possíveis de serem identificados, como, por exemplo, a participação
da Bahia e de outros centros do Nordeste. O que mais nos interessa, contudo,
não é listá-los, mas observar que a partir da fundação da primeira Associação de
Estado, a paulista, viabilizou-se a fundação da ABRATEF - Associação
Brasileira de Terapia Familiar e, então, outras Associações de Estado foram
fundadas.
Os Congressos, que na superfície podem ser vistos como
anteriores prepararam e gestaram esse Congresso, seu nascimento só foi possivel graças aos esforços
conjuntos e exaustivos realizados durante dois anos pelas entidades paulistas, que se constitulram na
Associação Paulista de Terapia Familiar, para viabilizar a efetivação e realização desse evento."

121
agregadores de pessoas interessadas em um intercâmbio na área específica,
assumiram neste contexto o caráter de gerador e catalizador dos ritos de
consagração do corpo profissional brasileiro no campo da Terapia Familiar.
Como afirmou uma terapeuta no "I Congresso", teve um "sentido político". Os
anais e programas do Congresso tinham legitimidade e mecanismos próprios
para incorporar ou excluir expositores. Assim, foram demarcadas as relações de
legitimidade e as posições de prestígio. Até o terapeuta que estava à mesa com
o convidado estrangeiro- e muitas vezes serviu-lhe de intérprete e/ou ofereceu-
lhe uma família para atendimento e participou de uma apresentação especial do
convidado- alargou seu prestígio e sua credibilidade.
Os Congressos tiveram as funções - ainda que não declaradas -
de consolidar esta área de atuação sobre a família (oferecendo-lhe
independência em relação à influência estrangeira) e de garantir a demarcação
do acesso ao mercado da clientela de alunos e de cursos, palestras e
supervisões. Os iniciadores do Movimento tenderam a se consolidar como
mestres. Os terapeutas que integraram a equipe do "I Congresso" e assinaram a
Ata de Fundação da Associação Brasileira, ao se tomarem sócios fundadores
da ABRATEF, passaram a ser identificados como precursores e mestres
brasileiros, obtendo filiação direta à Associação de seus Estados, que com
exceção da Associação de São Paulo, estavam todas ainda por ser constituídas.
Dito de outro modo, foi através da rede gerada a partir das equipes de
organização ·das Assoçiações de Estado e da organização dos Congressos que
foram demarcados a hierarquia e os mecanismos de acesso às faixas de
mercado: casais e famílias em conflito, no caso da terapia; terapeutas iniciantes,
no caso da supervisão; palestras e conferências, no caso dos eventos. O que
estava, então, em disputa, era o acesso ao capital social, cultural e econômico,
cujo acúmulo viabiliza obter reconhecimento frente à clientela e, por isso,
acesso à ela.
Os presidentes das Associações de Estado e da ABRATEF, que
têm como uma de suas funções organizar os Congressos, a cada dois anos,
situam-se no primeiro plano de reconheyimento; as equipes que compõem as
comissões que assessoram as gestões encontram-se em seguida; os terapeutas
conferencistas e profissionais de destaque, que participam das atividades do
evento, ganham distinção diante de um imenso alunado que disputa por uma
inscrição no Congresso e aspira ao lugar de mestre para seu futuro.
Os registros históricos do Movimento representam um outro
mecanismo importante para demarcar quem é mestre, mestre-aprendiz ou
alunado. Nesse sentido, uma terapeuta foi incumbida no "I Congresso" de
organizar um histórico sobre a Terapia Familiar no Brasil, que posteriormente se

122
transfonnou em wn artigo publicado em revista.'" A fonna escrita docwnenta o
mapeamento dos precursores e iniciadores e legitima sua memória. Nesse artigo
é ressaltada como um marco relevante a transformação dos eventos da forma
originária de Encontros para a de Congressos.
Esse Histórico da Terapia Familiar no Brasil foi apresentado no
"Pré-Encontro" do "I Congresso". Nele constava o aparecimento dos primeiros
grupos de trabalho em Terapia Familiar e eram apontados os "Encontros"
realizados em capitais brasileiras. Muito disso foi mencionado quando vimos a
história contada pelos terapeutas sobre sua fonnaçi!o e percurso. Mas o que nos
chamou atenção neste caso foi que, apesar da possibilidade de dispor de wn
panorama mais geral da história do Movimento no Brasil por ocasião do "T
Congresso", houve uma constante reiteração do propósito de "completar" ou
enriquecer este histórico com dados de participação dos variados grupos e em
todos os eventos subseqüentes. Isto foi uma marca na apresentação do histórico
durante o ".I Congresso", wn ano antes, e continuou presente no discurso do
"Encontro" (95)'" e no "TI Congresso".'" Vejamos alguns exemplos.
No inicio do "Pré-Encontro", uma Comissão apresentou o
Histórico da Terapia Familiar. A organizadora deste documento solicitou que
todos complementassem seus dados, acrescentando o que soubessem sobre a
história da Terapia familiar e que incluíssem dados de seu percurso ou de sua
instituição. Havia uma preocupação, em sua fala, de que este Histórico fosse o
mais completo possível.'" Mesmo em pequeua reunião em horário reservado
para uma conversa sobre atividades realizadas em instituições de Terapia
Fam.iliar, a responsável pela elaboração do histórico no "T Congresso" estava
novamente pedindo às pessoas que tivessem contribuições a dar para se
16J Consulte Munh6z ( 1997).
1'-4 Vcj:Lrno$ as falos de alguM terapeutas:
.,Eu ocho (/III n coiMJ do pe$tfJiiSO é uma lOJ'tfa da AIJRATEF hoj1. com n colohoroçdo de todo mundo.
N6.r pntciSDmM. $/m, resgatar essa men16riar
•Bom., qvândo 111 fuJ CO!Máado para falor neS10 m~so. t11 ftquel ~,. dilvida, p«que o temo i C'llnp/O
fkmM1. 1ntllo n nllo poduiafo/IJI' M todo~ MO'III~ttU> dn Tnoplo Ftllffilior no Bnuil ou da Tuapla
F411ff10w no /Jn~MI, M lfWdida em qwe h ncJo conhcda todo:~ t» tcropetdas do Bn.sll. nidentemcnte.
MMagoro. •J>OU• qwatro dias, agmtej6ntd coM~ multa gttttc do BnuiL"
"E11 1!6 qvula lnrtbrar qw n #IIII folttt tk a fólw' do s-SMNJI do Rio M Jd'Mlro. & ocho qn ~,.,
llfll1'0rlDIII~ kmbnJr o l1'tJbc/Jto eh.. *
I6J A idba ele.....,._ O l&lórico aio SO dissolve e _...n lliada \UIIIDO depois DO "EDcoalto", a...UO
que ruxbeu o.....,. ele~- .,.l'licotuopio Fomlliar. ocorrido 110 M•!csond A im38I"D ele
- - p:>ne da História surgiu Olé mesmo oa n>doçio ela Ato k R<wd!Jo (do~ do
"I ~-) ~ claboncb. Ap6o moaáoaar uma dioawlo sobre irutituiçlles que aio
haviam sido anolacbs. rqpsttoo« oa Ata da RnmJIJO· "MIIIt01 para!H.nlwram o trt>bolltc do gr.po.
con.fltkrondo qve nt:sJe prlmeim momentt>. estamo~ ttt>4 tncontf'Oifdo e I"«JttHtItectnd<> e Côlf.$lnlindo nossa
l/lu6ria. •
166 Dil 1 organizadora do Hi$t6rk:o; "MQ.S a ge.nJe espera contrlbufçl)u de lodtlf as regi/Jes d() ptJls. para S#!
poó1r ftutr uma coisa mais int~groda e completa, t.lllá bem?"

123
"'-

completar o histórico, que o fizessem.••1


Ainda na manhã do Pré-Encontro do "I Congresso", discutiu-se
uma pesquisa iniciada pela Comissão responsável pela confecção deste
histórico, quando se fez uma tentativa de censo das instituições de Terapia
Familiar que atuam no país.'" Um questionário bavia sido enviado solicitando
infonnações sobre número de alunos em fonnação, tipos de atividade (convênio,
atendimento supervisionado, cursos oferecidos etc.). Isto despertou muita
polêmica, pois muitos dos que não haviam recebido o questionário fizeram
demonstrações de desagrado ao se sentirem exchúdos, não aceitando a
justificativa do grupo organizador de que não dispwtbam dos endereços
cadastrados - eabe informar que o censo também tinha por propósito este
cadastramento.
Podemos nos perguntar da razão pela qual este debate sobre a
história da Terapia Familiar no Brasil causava tanta polêmica se seu objetivo
aparente era o de incluir todos os grupos. Na verdade, a força simbólica
classificadora subjacente a esta história oficial era o que suscitava tantos
melindres. A questão de quem está fora e quem está dentro ou de quem pode
legitimamente participar do grupo tomara-se crucial para o profissional. ••~ Os
terapeutas poderiam considerar o dado de que qualquer história é sempre
incompleta e que a história é uma versão sobre a realidade. Este posicionamento
seria francamente favorecido pelo fato de que vários destes profissionaís se
apresentavam seguidores de abordagem construtivista em Terapia Familiar e,
portanto, conhecem a visão de Watzlawick (1994) de que a realidade é sempre
inventada1'10, não passando de uma construção do próprio sujeito. Entretanto,
todos mantinham um constante interesse em ter uma versão verdadeira,
completa e oficial da História da Terapia Familiar no Brasil. Como explicar essa
necessidade? Esta preocupação em completar este histórico (e não esquecer de
ninguém) possivelmente perseverava em função do intuito de demarcação das
legitimidades e facções no interior deste campo profissional e da participação

124
nos órgãos de representação de classe - as Associações. Podemos imaginar que
fosse esta a motivação que impulsionava o desejo de um histórico "completo".
A prutir da discussão sobre o Histórico da Terapia Familiar no
Brasil, emergiu um outro debate, que também nos pareceu interessante, sobre o
nome da Associação. Este tema mobilizou o grupo e estendeu-se por toda a
manhã. Sua ocorrência foi registrada em Ata de Reunião: "A coordenadora X.
propôs a discussão do tema - Formação e Pesquisa, que havia sido sugerido
quando do Pré-Encontro em 93. Antes que se iniciasse esta tarefa foi levantada
uma discussão referente à definição de termos no campo da Terapia Familiar.
Uma terapeuta propôs que se falasse em Terapia de FamJlia ao invés de Terapia
Familiar." Assim, oscilava-se entre passar para a pauta do dia, que era discutir
formação em Terapia Familiar, e continuar com a resolução do nome da
Associação. Por vezes, mal se podia compreender a razão desta outra temática
ter irrompido com tal força."'
Podemos, entretanto, imaginar que estabelecer o nome da
Associação significava definir quem estava ou não dentro do grupo e em qual
posição hierárquica. Inclusive porque, conforme o nome escolhido, poder-se-ia
dar maior importância a uma ou outra abordagem de atuação sobre a família.
Houve quem sugerisse o nome Associação de Terapia Familiar Sfstêmica; ou
que se colocasse Psicoterapia, ao invés de Terapia. A questão é que se isto
fosse feito, estariam excluídos os não psicólogos, já que teriam problemas com
o Conselho Regional de Psicologia, por estarem atuando na área da
psicoterapia sem terem o registro neste Consellio. De todo modo, parecia ser
compartilhada por todos a idéia de que o Movimento que ligava os membros do
grupo precisava ser reconheci dom para que se pudesse definir, no seu interior, a
171 Terape:uw:
"Pes:sool. eu sei que Isto aqvl t$1d $enÓO um !IDCO, de manhã foi um soco muito grande tambbn, maJ eu
ach() ([11~. se nós nllo tivenrJos cltJreZ.O, ()que nós easarnos fazendo aqui? Porque eu. por exemplo, e$lou
confo!l() sobre o que nós e.slamQs /Mt.ndo aqui/ St o gente nõo sabe onde quer ir, nõo vai chegar nunca
lá, porque o gente não sabe o qve quer/ /$$() me surpne.ndcu multo porque eu eslava absolutamente
convencido que nós esJamos escolhendo() Mrne dá n0$$á A.s:.w.>Cioç~. e nifo o que a gente fazl•
"é'u nlJ() :sei porque voct.s chegaram a e.$$0 CQnclusi)(), pOrque ttm n.:nhum momento nós falamos em
Associoçlfo. Eu abri a ... Q X. d;undo: 'N6s voml)s discutir fom•oçlio. Ai CQI'ni!ÇQU lSfQ discussão por
voto!'" (. ..) "eu disse: ~cabou o Item Hist6rico, nós vamo$ começar o segundo Item que é Formoçifo. E
ai começou a di$CU$$1JQ <k novo.'"
112 VejatnQS as falas destes terapeutas:
"Pelo fato de o gente estar fazendo o 'I Congresso Brasileiro', a gente nlJo tem uma supere#rutura." (...)
~'Entao. ts/tJ resp<>nsabilidade de faze,. esse UNi<Utro segvir adiante, fazer esse cadasá'o atualirado n<Jo é
da prr>I1WÇ4o (/()evento, ndo é da pt'()moçbo do Congresso, d de no.ssas entidade., e o Movimento é n()SS()/
O Congresso é o repre.sentaç&> do nosso encontro. no,ÇSQ estar-junto, e niJo o contrário. Nós temos,
então, que tomar Isso em miJos e dizer: &tá aqui, a nossa pane jlCI)U pronto; enquanto o Congresso vm
estudar isso aqui."
"Em resposta às solldMÇiHs foit(J;S em Enconf1'o.s ante.riQI't.S e de um desejo n0$$0 tm manter, o que
possfvel fo,., registrackJ. o rt~ito do caminho percorrido pela 1'erapia Famlllar tm nosso pois...
"Porque na Regional nós estamos vivendo, é mais do que OSSQCiodo, Nós vamos consrrulr juniiJs um
(COnl.)

125
biemrquia das posições e os rituais de ascençlio na estrutura desta classe
profissional. E, por vezes, tentava-se recupemr a pauta antiga:
"Eu ocbo ll/!1! t uma ll/!esiÕo de ordem. Eu acho que, antes de a geme decidir estes de/alhes
quamo d VOIOÇIJo' 71, a gente precisaw1 ente!ldtr o llJI( ll/!f l'lli sr a tan(a da 111rde. para a
gente urili:ar da melhor forma a tarde. Eu acho que a 111111thil. lnfdizmeme, ficou perdida
numa coisa muito desagratiável~
"Et1 tamMn acbo! Nós estamos numa tarrfq de discy.ttílq de {prmofiJo. Bst foi o nrimelrq
item de d!J0miJQ de (ormgçiig, Infelizmente. nós 110s perdemos nessa discussão e acabo11 o
manh6toda~

Apesar destas falas criticas em relação à evolução da discussão


dos temas emergentes, havia um clima de entusiasmo quanto a nomear a
Associaçao Brasileira da categoria. Dizia-se, com freqüência, que "a primeira
coisa é nomear". Tema que insistentemente retomava."' Parece--nos que surgia,
ponanto, mais um elemento da identidade: nllo se estava apenas tentando
nomear a "AssoclaçiJo", mas sim o próprio trabalho do terapeuta: faria ele urna
"Terapia Familiar" ou urna "Terapia de Famflia"? De inicio, parece que se trata
de urna questão semântica e não de urna questão de identidade. Afinal, na língua
portuguesa, o termo "familiar" comporta, no minimo, duas acepções diferentes:
I) de ou relativo à família, e 2) algo comum, conhecido.m No entanto, como já
mencionado, é evidente que há inúmeras questões implicitas, além da língua, na
escolha do nome. As escolhas contêm interesses, nltidos ou ocultos, no sentido
de se obter melhores posições no campo. Esta escolha do nome da Associação
parecia estar sendo vista como um fato histórico"" que acarretaria
Movimento a portlr de uma MSa. O fato de viwr num boJrro nlfo faz ,fumlr com a casa. Vamos trDbúlhor
juntos poro poder promqver ~ventos. C01f81Y$SOS t publfCõÇ(ks nM nglonni.t.,.
17J A terapeuta rcrerc-se 6 votaçio do nome da Associaçlo Brasileira,
174 VejanK>I alpunu de&tas afi..nnaQOe:$:
'"Agora • 4 o 'I Congrt.uo~ # está se (lr'OCUrando OltOnt40fiJO. qual \IOI .wr o nt>me. nós tod01 ~S1Diti()S
r~e/Mdo qu~m 101tt01 e o que ptn$QirfOS t a priJMiro collálltlNMar."
"St 1110 foll~todo i ptH'qiJ< 01 t4rapetllM oqul pruenle~ oc/uJm que llmptante W um nome poro a
otlvidodtt qt;tJ eles tkNm_/Nnhom. inde~ntktue t:k Stt.f u.o AJJMJdoçllo '* niJo •
•NM UlantO$ dJ.evtiltdo QlMO dutmor o fiQJ$(l olividod.. •
mA clciWçlo do~ "fomi6a" poc1t ser"""""""" ao l);don6rlo Awrlt•• Bdfico diJ Ungv4 POrlltptso
de Aw6io ilullquodollol•ll<b Fenei10. E4 No-.. Fromeút., RJ, 1~.
1" Paroct.a bavt:r receio de que o DC:lllne aio defi.n'MC c:orrdamC:n\t o cp: x qtiCria okleoa OU: ap:area&ar.
Plod<moo ômqinor que isoo .;..,. a p<judieat o tipo de - que .. clcoo:jaw 1« â àiemda. ve;a.-
...., oapccoo CXJ>fCSSO na !Ma clcs1cslerapeUia1;
"l'oNj•• ~ o A.....,;Ofdo Bnuitdra « Tuapo Familiar w se I A.....,;Ofdo Bnuitdra de Ttropio de
Fomllut. EM oc/t() qwe, quando a gmt~ e.st6 pensando em Mar uma A.uodoçJJo, o nome do Assodaç6o ~
Q coJ.sn mais fmporlanle (/1/t tt.ml O prlme;ro p<WO ~o II(Hne que se d6 a tia. •
"0 qtJt vocb sugcnm para a gente cominhor com essa dhrc:tA$SIJo, se m«s que.nm ftcltar essa tR.scu.ulfo,
porq~e foi kNt lembraM pela X que nós tenw11 uma... no domingo, uma t.ntidade a ser Jômtodo e que
pr«<sa o nomt. Eu llCho que l.uo pnci.sa es/ar definido p4ro MIH.r qunl wri str o nome da entidade. 11
"Olha, 110 fim do Congresso e11 tJCh<J q11t a gente vai ler mwlln tol.tn paM disc.uflr a respeilo, porqu~ I
(OOnL)

126
- responsabilidades tanto no futuro (para sempre)!", quanto em relação ã própria
história (podendo até apagá-la).'"
Na ênfase dada ao tema do nome da Associação, acabou
emergindo a preocupação de estar em consonância com critérios e modelos
internacionais."' Isto nos leva a pensar que, de fato, a discussão envolve mesmo
a questão da autorização e do reconhecimento da independência declarada.
Entretanto, alguns procuravam lembrar a dificuldade de se importar modelos e
propunham que se pensasse em algo mais próprio do quadro brasileiro'"', dada a
existência de diferenças de padrões culturais e, portanto, de linguagem.
Havia mesmo ainda quem rejeitasse esta visão de importação,
retomando à idéia de uma tipologia específica ã "nossa famllia", uma adaptação
do trabalho às "nossas necessidades":
"Quanto à çpisa introlt1Cjonq/. eu ficaria um pouco mais {iyre. porque eu acho que rlÓs
temos linha pagã e, tk repente, a francesa tem uma forma de st referir, a americat10 tem
outra forma de se referir e isso tem que ser com o cfmtwe que eS(á jmerido... nós temos
que procurar qual é a nossa, niJo é?"
"E assim, propiciando a ~ de uma emidode nacional. cmrii!XÚifl/i:ando 11ossos
métodos de trqiH!Ihc. a partir de um quadro conceitua/ adaptado às t1()$$1JS necessidades,
sem perder de vista a variabilidade • estratificaçilo sócio-cultural da.r regiões brasileiras."

Mas, neste momento, a defesa da especificidade da "fanu1ia


brasileiro" já começava a ser perturbada pelo argumento da variedade. Não foi
esquecido que esta discussão tratava de como este serviço seria apresentado ao
mercado das tempêuticas, o que faz da questão do nome uma síntese de todos
os aspectos até agom implicados em nossa análise da história: a independência
ciONJ que vai voltar a dJscu.sstJQ a t'&rSfHitO da nome, mM seria multo IKHt1 H a gente }ti tivesse algwma
OOisa '"nis definida. JHNque esm dt1CU4.9llo pOtk tQmar muitq tempo • o gente nllo chegar a r.~mo
conclaullo. .A gotte s6 podtt pdr tm votnçiJo ~tma coim, depois q11e elo jd /M sujfcicnttmente petuoda,
dMOI"'JdtJ, •nik> 4:1 pusoosjicQIIII'fffl •'•'"""'" p<va Y()lar. "
IT7 AJ&uns terapeut:Ls martam exa•amenle esta quca5o:
•A MMOÇIJo ê &. qv• tmlwmt;$<mMlo ""portvgwl.s. Nós jârmt01 t<ropiM de fomlna. ..S. ndo foumos
"mpltU .fomilia,.ur (..J •E e_. I .,.. 'I~, • Mpci# "s-'• ..,..,
'#nr I~ a:x lfiOII'1M' oq
toagoda.,.,;... •
"''tU. na wnlock, tm. t.SSO Cl()fK)I4Ç/Io dt qt~e t coisa ftmtiBnr. " (. .} •Ê. ele Mria mais t:t:lf"fY.to:
WlftD

Tel'apia dr Famllia. E e. «<ro l(tlt ute ~ o realme"tt, poro o get!te di!IICfltir utas q'IIUibu
nJOIJteftl(),
~m4rltitNU, porqwe depol$ o g<nte otm"t'ga errado para o resto da vldtt/"
l1t Terapeuta: "Hoje nós falamos o t«.mpo todo de história, n/Jo ~'I ênlllo, crlt1r um nome novo nesse
momento... n6s já temos uma hlst6rlo. Eu oclw que seria imporla111• a gente ver, tfentro da nos:m
hlstórln, qwals $(/O óS nomes que l~m 11do usados e el<tger ""' deles, porque unllo eles anwlam o passado
crlnndo um nomt novo. E~ estava p«n.t:ondo sobre isso. •
l79 Terapeuta: "Eu ~Ugeririo 1'uaplo Fami//(J1' por'lplt! é um nome IUfim... mob actilo intemadonlJimenft e
,., pnnu. svbjttiWll1lbltt, IMnM r~:nrltJvo •.
I lO Tenpaa: "E. qveria $Ó lembrar WM coisa: a gmte tnr qtl~ JMNIOr wm pot~Ct() que Familiar é 11mo coi:so
de f-1/iondadc. • (...) "'sso qv• -~ fomiUar. ~ """'qvatilo M-dttL & oclto qv• a g.nl• ,.,. q••
pmstt:Jir 11m poMqllinho M.SIIJ fVUIIJt> lttllf4nfico ~ dtt pot"hhgllls. Nós UIDiftOI fNdw:lndo de ovtro 1/ngllo."

127
em relação aos estrangeiros, a formação de uma identidade, a representação
social de "família brasileira", a questão estratégica diante do mercado de
trabalho e da difusão do serviço ao público leigo e, finalmeote, a questão do
reconhecimento e credibilidade. Os terapeutas pareciam, no fundo, estar
constantemente demarcando as leis do mercado e as posições de maior prestígio
no mesmo.
Ao lado dessa inserção globalizante, isto é, da perspectiva de
integrar o Brasil no mercado internacional das terapêuticas, marca-se a questão
da especificidade. Era através da idéia de que a fann1ia brasileira constitui uma
realidade diferente que apenas o terapeuta brasileiro poderia compreender e
ajudá-la e da preocupação com a adaptação dos métodos estrangeiros no Brasil
que os terapeutas acabaram decretando independência do mercado estrangeiro,
numa tentativa de destituir o mestre estrangeiro e colocar, em seu lugar, um
supervisor brasileiro que passa a assumir esta clientela.•••
Este tipo de fala, defensora da especificidade da fann1ia
brasileira, surgiu no Encontro do Maksoud. em 95, que incluía
predominantemente atividades com terapeutas norte-americanos de várias
localizações dos EUA. Um terapeuta presente na conferência A Psicoterapia de
Família no Brasil, ao dizer que "ser represeotante numa mesa da Terapia
Familiar no Brasil é algo muito especial" e que se sentia "como um terapeuta de
família fundamentalmente brasileiro", criticou um profissional americano. Em
sessão ao vivo durante o Encontro, este profissional propôs que a família em
atendimento formasse um conjunto musical (um dos filhos gostava de música e
tocava guitarra), como uma tarefa para casa que objetivava propiciar que a
família tivesse que se organizar em urna atividade grupal. No desenrolar de sua
argumentação o profissional estrangeiro afirmou que "tem muito tambor" no
Brasil. Este terapeuta brasileiro reagiu do seguinte modo:
"Tambor/ Se nós formos pensar que qualquer um de nés que jaça uma terapia com essas
famílias, pela sua vivêiiCia direta com essa cultura, vai ter uma aproximaçlío e vai ter,
provavelmente, uma maneira mais apropriada de falar... vai falar a lú1gua dessa familia."
(. ..) "Estamos participa11do da COIIStroçdo ck algo que seria 1/Jl!G maneira ik ver a terapia
brasileira, uma ma11eira brarileíra ck ver a terapia ou, como disse a X outro dia, uma
terapia à brasileira. n

Desta forma, após um periodo de reconhecimento da


importância da formação com os mestres estrangeiros, surgiu a necessidade de
181 E$1.3 tend&cia pode ser constatada nos seguintes trechos dos discursos:
"Eu acho que Cáda um de nós, do seu jeito, faz uma lerap;a ô brasileiro, dependendo do contexto em que
trabolha."
"A gente esrá chegando m~smo a ter uma cara própria."

128
"adaptação" teórica e técnica diante de uma suposta especificidade da farm1ia
brasileira: o terapeuta de famllia acredita ser necessário "falar a língua dessa
famllia", fazer-se uma adaptação da técnica sistêmica para a nossa linguagem e,
ainda, respeitar o código cultural local. A suposta necessidade de adaptação, na
verdade, parece-nos mais uma estratégia de demarcação das posições de maior
prestigio no campo terapêutico brasileiro, após o ganho de autonomia em
relação aos estrangeiros. Nesta direção, aponta-se para a necessidade de o
terapeuta brasileiro distingüir-se do movimento internacional, ganhando "cara
própria", para atender a um mercado de trabalho encarado como seu - o
brasileiro. Na demarcação de estratégia de espaço, ou de campo de clientela,
dá-se ênfase ao fato de o terapeuta brasileiro já estar trabalhando em diversos
Estados. A afirmação de uma identidade do "terapeuta familiar brasileiro" pode
ter sido também um dos fortes elementos que promoveram a urgência da
formulação de uma história da Terapia Familiar oficial e completa. E, para
ilustrar isto, mencionamos o grande real.ce dado a este tema no "I Congresso" e
sua permanência nos eventos seguintes.
Em 1995, o Encontro Desenvolvimentos em Terapia Familiar
ainda trouxe como convidados diversos terapeutas iniciadores da Terapia
Familiar, no exterior. De Palo Alto, estavam Jay Haley, Richard Fisch e Paul
Wa!Ziawick. Apçsar d!l presçnçll d9s estrangeiros, o '1 Congresso", em 94, foi
sentido como um marco significativo para a construção de uma identidade
própria e do reconhecimento social do terapeuta familiar brasileiro'" e o
Encontro de 95 como um processo de fortalecimento da identidade do grupo
brasileiro, até porque foi nele, que mais se manifestou o intuito de dispensar a
presença do mestre estrangeiro.' 01
O "I Congresso" foi visto, então, como o grande cougregador da
classe nacional dos especialistas. Observamos também que a questão da
hierarquia e do que se poderia evidenciar como uma disputa por clientela, por
prestígio profissional, por bens culturais e econômicos etc., oscila entre ser
abafada ou deflagrada: ora a disputa é negada•*'; ora ela é abertamente
112 A pte:sidente do "'f Congresso"', cm oca:ililo de ~;ua abertura. diz: "Queremos ainda ressaltar que es.sa ..1
Corrgrt$.$0" é o nos:w ver um marco paro o T~rapio Familiar porque de alguma forma con:wgra e
ojidali:<J ~SS<J nova área de otuaçOo terapeutica. Paro que o mesma se (/a.senvo/vo. cnsço e tome-se
Ctlda ~·~:mais consciente e tWp<>n:súvel será prcci$0 qut~ ô conjunto de terapqulos de família brasileiro
continu(! sendo como até hoje, uma matriz de identidade. uma placenta .wcial nutrltiva e que se
n:sponsabilize por elo. n
I&J Clbe relembrar que o nascimento do Ptojeto &mcr.ando <J Tarop;a Fllmiliw no Br<lSil é wn exemplo da
tentath·a de promcwer a expans.lo deste tipo de terapêutica em nos:so pais.
'*'Terapeutas:
"'E fazemos parte por estes minutos de um grupo novo, que ni/Q é nem de t!!rapeutas., é esse sistema novo
que eu aclw que vlw a regra do que seria umo rt/t,ç61J familiar, onde nlSo caht o poder, onde niJO cabe
hierarquia, onde nllo cobe t:()mpetiç/Jo, Por Isso tudo. o nQ$$0 encontro nu: parece um (J.n(;()ntl'() famWQ.I',
onde o terapeut<J vai viver grodatlvamente asfonçl>es de lrmiJo, primo, cunha®. rival, marido, mulher e,
(ccnl)

129
deounciada.•u
Tomando a área da Terapia Familiar como especialidade e a
tentativa dos terapeutas em se organizarem num Movimento de âmbito nacional
e, depois, internacional, coube-nos pensar o esforço feito na luta por melhores
posições no campo. Toda nossa análise da constituição do campo da Terapia
Familiar passou pela constataç1!o de uma luta por mercado de trabalho e por
capital econômico, na medida em que a Terapia de Família é apresentada como
mais eficaz na busca por uma legitimação e por uma melhor estratégia de
mercado. Dentro do mercado especifico das terapêuticas, a terapia familiar tenta
ganhar cada vez mais espaço e tem por estratégia tratar a família do ano 2.000,
conforme a ênfase dada pelo último Congresso (RJ/1998). A Terapia Familiar,
de abordagem predominantemente sistêmica (importada do exterior e vista como
adaptada às condições da família brasileirn). é apresentada, então, como a teoria
e a técnica inovadoras que permitirão rápido resultado diante dos chlemas e das
aspirações da famflia modema.'" Aceita-se o movimento internacional, mas
luta-se pela saída dos estrangeiros e pela constituição de um mercado interno.
Embora a imagem do "Brasil deitado"'*' (VeJa Anexo 19) e a
concepção de que os especialistas da Terapia Familiar componham uma grande
farnilia harmoniosa em colaboração tentem neutralizar a atmosfera de disputa no
mercado nacional. podemos encontrar facetas no discurso dos terapeutas que
evidenciam o clima de luta por melhores posições neste campo.

sol;rttudo, CMS. • (. ..) "Pmenetmo.s a um bloco oomwn que defini-,; crlttrl01 oonutn.f para todo mJJndo. "
(. .J "E n4o trSIOI'I'IO$ pensando em dl.,ldir um bolo de poder, t$l.Qm()$ apenas tentando fazer liMO
con~:n-gnçtJo cooperariwa. "
"E eu nllo go:llaria de que a gent1 tM f'fJH!n ltr se transfOt'mtJ.'I# numa coita l'lgldn, nutoritónn, tipo igrcjo,
elllilo: 'Eu sou dóno do sabei', aquele pqde, nquelc. não pode ~ Isso eu oc.ltô que uria t~rrivel poro n(M•
começnrt11o.t um M~·iTMnto." (. ..) •E:., ,oJ/(»'14 que a gente tenlcustt o mais fJOJSIWI partir para umo
A$M)C/aç/Jo oh<rta, d<moerdllco. •
Ou • Conno, ulilizada po< um lerapeUII, de porobenizar 3 pr<oic:lerúe do -I Con"""'": "E• es.<qu qwn,.,Jo
te ptVOIHnizar• (...) •{Jt(JINlWc rNimcntc .,., acho ~e voct nprucnlo tU~~ uplrl10 drmocrdtlc::o. •
li$ 54 dt um lN:>, hã um di$cuno que atrai u disputas, de: ouuo. cla cmu•
V~ ata f;\b. atitulodccrcmplo "'Vodlldc.t oc:Jaa qH 1..,.. """"''tt oqwt d -~O~IIk7
com força em a.lgamas f.a1as..
IlM COINô A.uocioçdo, a gotk ut6fir:LNJo liMa a:ttOCiDÇilo politica«... ttptJio ~nlirwro etc. e.~~~ atm CtiMfi'O·
qw I a Teroplo FWffiliw, omM elfontOJ britando por icko4ogias ott estt:»ttN tkfem*ndo ilml' tipo lk
Ttl'tJfllo P<wJfiCir cnt cntlro dpo lk Tuopio FMtiliar. •
116 Cabe lembm que """ EUA, a ICOria ru.emica emtrge c:onuaponck>-oe A Psicanálise e dizendo-se mais
eficaz. Talvez não por coincidtncia eu cooria tenha ganho espaço no Brasjl, num momen10 de dcclímo
do di!U$ão do Psicanálise, na p<lSSOgcm do dêcado de 70 p<lra a de 80. ConqolSIOU espaço, alfm disso, num
momento cm que a Igreja Católlcn nlio d:lvn conta de acolher os dilemas vividos e1n tomo da experiê-ncia
do divórclo, já que o proibia. conLinu.ta\'11 a difundir o valor do casamento i ndlssohWe:J e. por conseqüência,
o nGo realizar casamento de di"-orc1Ddot.
181 1m:;a,&em criada por uma ceràpcull intepn1e da rcu.ni3o de Pré-Encontro. no •t Conyesso·. ptu>~
simbolizar a ~ de que lOdc:.s os Eudos estavam no mesmo nh·cl de impon!ocia no c:am.po da Tcrapía
Familiar c em proximídad<, lcn131h--. de aplacar o dima de desconfortO &<t"Jldo um
IIWilO ~o
scotimemo de """""'"' ""' p111t de ar.,... SJ11pos presen1es.

130
-- Podemos identificar, então:
I) Uma concorrência interna ao campo quando se discute quem pode e quem
não pode formar; quem pode fazer parte das entidades e quem fica à margem;
2) Uma concorrência pela inserção no mercado internacional: concorrência com
os estrangeiros.
O aspecto concorrencial pode ser observado até na própria
discussão realizada sobre o nome que se escolheria para a Associação, por
ocasião do "I Congresso", como foi visto anterionnente. Naquele contexto, foi
mencionado que certas denominações poderiam interessar mais que outras, por
favorecer o marketing da especialidade e "dar ibope".'"
Considerando a visão da especialidade como uma terapia com
base em novo paradigma - o sintoma é visto como expressão grupal e não de
responsabilidade única do paciente individual portador de sintoma(s) - cria-se
um novo campo de trabalho, com um markeling próprio e em busca de "ibope".
A intervenção no grupo familiar, tendo o grupo como paciente, foi apresentada,
assim, nllo como concorrente ao mercado da terapia individual, mas como
coadjuvante deste, não implicando na sua eliminação. A visão de que a Terapia
Familiar emerge como um "método eficaz para resolver problemas em que
outros métodos terapêuticos são menos eficazes"'"' é de importância na medida
em que o meio profissional dos terapeutas individuais constituíam a principal
fonte de indicação de pacientes para os novos especialistas.
Muitos terapeutas entrevistados fizeram menção a esta questão
quando inquiridos sobre a origem das indicações dos pacientes. Dizem:
'"terapia de Fami/Ja, você sempre recebe os pacicmes indicados par algum terapeuta."
"As índlcaçl}e.v chegam par parte de colegas e uma grande maioria por parte dos próprios
clientes. "
"De proj/JSiona/s que trabalham com a infância: escolas, pediatra, jonaudióloga.
IA Eus tenapeullls evidenciam este aspecto. referindo-se A lnc:lu.s:lo do ltmlO Terapia ou PsK:oterapia no
nome da Associoçll<>:
"'A .í~tkn ra:MI tk holttr CtutJI. svia m.arbli.ng. S,ria para 9"' M fM#OM jfcMNm Mlh~do que> nós
ITP/xal~ alM CMtJI ~ llniÍIO$ ca.Jais proçtiTOM itttk,.fHknt~IMIII' do$ jiiJrM ~ D genU ~
troboiiNwlo «>m ""filhos. • (...) "Mas cw mls - coJo<or TU<Jplo rk C<Ud • Família • I pcw
n6s ~.nnmos brlgondo oqtH por nomt.L • (.•.) •&t6o vomo.r nos fU#:SSfJI"(lr com 'IIIMJ nnpnso
mQr'k,-liJtg.
d. ctH~~VIIorlo, poro wr qtHJI é o ~rwlltor nDII'trr, poro q11~ o gute pos» .M ~nklr no Si.st~mo
Pácour6plco &wllelrol A.l cois4s .sõo complicodas, miA:» ew ocho qwe V'41e o ~no kwv m. conta isso,
M rtJXnU nós I~Jiti'IM Wfl intt.~SR po/ídCQ em nos oprut.niDrMOI rombbtt como terapt.rtlas de casal. •
•& odto ~t~per lmportarru a dJsdnçiJo. • (. ..) "Qr;trtJ coJ-. por eumplo: Terapia Familiar 011
Psioottrapla tk Familia. T011 .,-ma porçiJo fh ctHtlt.XIOSitOI qwaiJfaiM em psicotuapia é wna coisa que
Iria dar nullto maiL .. s:d 14. nlkJ é ibope, mM I umcr t:O/JD t'l dar mais C~Yt!ibilidode do que falOI' em
teMplo. •
119 Elta terapeula Al'inn3~ *NO$SO tra!NJIIw, agora qwe o Terapia Famillnr j6 tem aceitaçlfo no meio
profis.sionol, como u.m 11tétodo eficaz par<J resolver problemns em que outl"t)S métQd()S terapêutlOO$ silo
numos tjlcaus, t abrir frente ntl soc.ltdtJdt."

131
pslcôloga, psiccdramatista. "

Iniciado o circuito, a própria clientela parece alimentar o rol de


indicações:

"Clientes vlm dos próprios clie/1/es. "


"Pelos clientes, quer dizer, o meu consultório tem essa caracter~1ica desde o começo,"
"Um e/leme indica para outro."
"Quando eles vlm, eles vlm ou ittdlcados por colegas ou Indicados por 01/tros clientes,
outras famílias. •
"Hoje até já tenho indicoç(Jes tk pacientes indicando outros pacientes. •

Com o desenvolvimento do campo de trabalho é atualmente


possfvel prescindir de colegas ou ex-client.es para novas indica.ções:

''Eu acho que ultimamente tem tido... mais divulgaçiJo do trabalho de Terapia Familiar, é
uma coisa mais conhecida, m.ai~· aceita, mais popularizada. "
"Porque eu acltó que 110 i11ícío, às vezes, era alguém que COIIItecla alguém que trabolho•'fJ
com Terapia Familiar, mas eu tenho /lOtado que as próprias pessoas agora já têm acesso. •
"Agora. eu acba que tem tido mesmo uma divulgaf{i<J /IKii()l' porque, antigameme me vinho
muito suviço... que vinha como se fosse Terapia tk Caso/ e eu ampl/(li'Cl para Terapia
Familiar e, hoje em dia, jd vem para Terapia Familiar. Acho que há uma divulgaçlio
maior. •

As transfonnações relatadas quanto à origem da clientela


passaram, então, por três momentos: primeiro, clientes iudicados por outros
terapeutas; depois, clientes indicados por clientes; finalmente, clientes atingidos
pela divulgação da especialidade na àrea leiga (tal ve<~: pela própria mídiat9ol).
Podemos relacionar estes momentos da transformação da
demanda com os momentos do desenvolvimento do prestigio profissional dos
terapeutas de famflia na sociedade brasileira. ou seja. com o processo de
formação dest.e s profissionais e sua inserção neste mercado de trabalho. Para
tanto, é importante recordar algWls períodos da história por eles contada acerca
da Terapia Familiar.
Observamos que, até o final dos anos 80, muitos terapeutas
viajaram para o exterior, buscando adquirir o conhecimento especialiudo para a
constituição deste campo de trabalho no Brasil. Este processo teria sido
promovido pelos institutos particulares (geralmente ligados a consultórios) e
universidades. Naquela época, era considerado da maior importância um
1
'" Vunoo, ao final do capíoulo 3, quo a mldi3 ltpO\-cita a imagem do
-.a
produoas, atr.noés de anúncios.
t<n- de &milia pmo """""''"
l idéia do busca e alconce do fclicidodo elwmooia.

132
diploma de fonnação assinado por um mestre reconhecido no exterior, pois que
isto funcionava como uma espécie de autorização profissional do especialista e
como a garantia do reconhecimento do seu saber, principalmente junto a outros
terapeutas que constituíam as principais fontes de indicação.
Todas as falas parecem indicar que a Terapia Familiar entra em
nova fase a partir dos anos 90. Obtido o reconhecimento necessário junto ao
meio profissional, seu horizonte passou a ser o da expansão do mercado de
trabalho, "abrir frente na sociedade", como disse uma das terapeutas 191 que
apontou hospitais, postos de saúde, escolas, instituições juridicas, instituições de
assistência e amparo aos menores de idade, ou, ainda, o Instituto Médico Legal
e o Instituto de Criminalistica como instâncias ampliadoras possíveis do campo
de atuação em Terapia de Familia. Com este espectro de atuação e divulgação
ampliado, os terapeutas de família passaram a alargar sua clientela dentro de um
público mais diversificado, sendo que podemos verificar o estabelecimento de
uma discussão e mesmo de uma disputa por campo de trabalho.
A opção por chamar a organização de Associação de Terapia
Familiar mostra abertura para receber profissionais de outras áreas de
graduação (tal como acontece no exterior), na medida em que nesta nomeação
não se utiliza o prefixo "psico". A nomeação de Psicoterdpia Familiar era
inicialmente utilizada nas Faculdades de Psicologia e restringe o campo à
atuação de psicólogos. Na discussão sobre quem cabe e quem não cabe neste
campo, disse uma terapeuta:
"O Conselho dg Psicologia e a Conselho de Serviço Social estão discutindo esta questão de
comoetencia quer dizer, de quem é e..va área de (amj/ja, "(...) "No final do ano passado, nós
lá no Instituto recebemos uma carta do CRP 192 comunicando." (. ..)''Nós recebemos uma
carta comunicando à Universidade Federal do Rio de Janeiro {J!!f, a partir daquele
191 Terapeuta: "és~ Eneênfró [Màksoud, 9!1). apuar çle brevt: no que se refore à participttçõo dos
brasileiros. rnos.trou qut a TtropJa Familiar no Brasil jd se expande de Norte a Sul, Cómô um Movimento
lntr<xiuz;do no Bra.sil através de irt:llihltos e consultórios porticulores.. .. e. no fim dtn anos 80, alcançou
um Slálll$ de esrobilizoçõo e formalizoçdo de formaçlJo 110 Brasil. 1imto os in.Uitutos pal'ticulans como o
Univc:tidd(Jdc partiçi~m m:.ue momento e a Terapia Familiar sofre um verd(Jdeiro boom e em quase
todos o:~ Estados hd um movimento no sentido do lntert.S# da crlaçilo dt e3paços de tr<Jbolho ejtnvo.•
(. ..) ""Porque a que.sliJo da Terapia P'omi/JOI' no Brasil hoje, a meu wr, jd nlJo ~ mais a tmplant.açiJo de
cursos.. a preocupaçdo com a /OI'maçllo, mos o aberturo de mercado de trabalho. Nosso trabolho, agor(J
que a Terapia Familiar jd tem âCtii()ÇãO no mtio projiss;onal, como um m~todo eficm para resolver
problemas em que outros métodos lerapeuticos $IJQ menos eficazes. é (Jbrir frente na sociedade. De que
maneira? TrobalhandQ para sensibiliMr esto socJedade e as SUM Jnstiruíçi)es para o trabalho. gue é
possfvel St:l' realizado com DS joml/las na drea de .$(1JÍde, nos hóSpitai~ nos postos de saúde, na escola,
nas drtM jurldicas junto à$ institu;Ç(ks de trabalho cem menM, junto oo Jnstitulo Médico Legal, jurrto ao
Instituto de Criminali$1ica,junto ds JlaráS de Fami/Jo. Enfim, esta agora, â meu ver. é a nosso tarefa. é a
segunda etapa no nosso trtJbalho. t tJbrir frente para que ô rerapeuto familiar nãó fique restrito ao
t1'abalho de consull6rlo particular. mo.s que ele posso dar a ~110 ccntribuiçiJo efotiva pal'o a sociedade em
que nós vivemos. •
192 Conselho Regíomú de Psicologia.

133
momen/0, o6.t n/J9 IK.Idedamos maiular o cuti(jçgdo de emffialislfl cm Tmwig Fomilku
paro o assistente SQCial. Ai se criou esra quesJão, que me parece que também é muito mais
po/íliro e de poder, do que uma que.stõo de competência ou rúJt>.compet~ncia. • 193

A estratégia de substituir o nome "Psicoterapia de Casal e


Família" por "Terapia de Casal e Família", que foi paulatinamente se
disseminando durante as décadas de 80 e 90, fez, portanto, com que se pudesse
manter uma clientela mais ampla de alunos em cursos de fonnação na área,
assim como em supervisão de atendimentos oferecidos pela geração de
terapeutas mais antigos. Além disso, com o declínio do boom psicanalítico
vivenciado nos anos 70, as décadas subseqüentes caracterizam-se pela entrada
da teoria sistêmica no Brasil, onde é acolhida como sendo uma abordagem mais
rápida e mais eficiente para dar conta dos problemas vividos pelas fanu1ias.'..
Vimos ainda que desde o "I Congresso" muito se discutiu a respeito da
autonomia do terapeuta de família brasileiro em relação ao contexto
internacional. Falou-se em "família e terapeuta brasileiros" como um tipo de
especificidade que apontava para a exclusão do profissional estrangeiro,
marcando assim um território nacional e uma clientela singular.
Em "Pré-Encontro" no evento do Maksoud (1995), uma das
questões levantadas era sobre a pertinência de inçlui_r algum convidado
estrangeiro no programa do próx.imo Congresso (agendado para 1996, em Porto
Alegre). Falou-se da possibilidade de ter um convidado "chamariz""> de
clientela, isto é, um nome de prestígio internacional que arregimentasse público
para as atividades do Congresso, mas também foi cogitada a possibilidade de se
prescindir de tal expediente. Claro estava que o desejo era realizar um
Congresso "à brasileira", nos tennos vistos anteriormente. Talvez possamos
1" Em sub&Npo de d.iSCU$S!o sobre a qucstao da fo~, no Pré:·Enoontro do ·1 Con.grcsso·. persunta«:
'"A/gWM mol1 ~ ck problmHU }"l'(diCM deste dpo?• Neste grupo, uma terapeutA c:omcma como IUI
equipe cor~ o pupo de alunos; •()tpot.s • obri11 pt.JTD tJSJJsrtJJte soda/ '-• DIJ1Diifftnl4. n6s tutO.J WM
kraJJ'-IliD oa~podt>nal t JlmQ pedogogo. Em Porlo A t,_grw aist~m ot1.trw gn~pM t(Ve tom«m tnn wm
,.,,.,. ,_.,.,. gJ'WUie das profimu .,.. aceitam poro fomtoçiJo. • (...) 'O grosso do grwpo silo
psicólogo$. 'lfi• tkvtm ser SOH. QS$/st~nl~s110dait~, J(} qw JSH. mjdleo3, 'l"e ~ aomar li.fU ISH c lO
ou 1SU owtrtJI profiss&s.."
1 ~ Esta teropeuU& aliml3: "Predomlna/ltememe. a nO&:Jo cll1111~1a tem sido dt psicólogos, porque quaiUio

nós montamos o curso orlginolm~ntt, que se clt.tlnláYo Plicoteropia de Coso/ t Famllia. o Conselho
RtgiO«Jl dt PlieDiog1a nos qv,_stiCHtOtl o 'P:Iico' ,_ n6.t ''vt.mo.s que tircv ~~ qt;e rtiJo UGm 'Psico'.
Hoj-. o cwoo - i mo# 'P>Ico', I 'Tut>pla FamiUar, qw• , _ - ,.-;nantemotte. "" t<Orla
:listútlco • ~tbn • ~ do ptlcodin4iniCG do>IJ'O do """" .,.,.., ""'"' fN'I"' lndusiv<, - tu
• - dpo de pollm/ca. •
m Cogit011..., o nome de Mawizio Andolfi, direlor de Tn!lituto de Terapóa Fantilior, em Roma, visto, por
muitos, como profissional '"lntere5$11nte• para os pcopósitos almejados. Como se tinha itúonnaç<lo de que
ele já viria :to Bmsil (RJ), em ogosco de 96, discutiu-$C nté $C era peciso planej:ar a daca do •u Con8JCSSO*
em fu.nç4o do S\lpostO convidado estrangeiro. No "11 Congresso de TerapiA Familiar*, realizado cm
Gramado/RS (01 a 03.08.1996), IVIIurW<t AndoUi (43) foi mesmo o oonvMbdo espocill do a-coto.

134
afinnar que, àquela altura, o mestre estrangeiro era quase dispensável, tanto
como agente formador quanto como autorizador do saber, uma vez que,
segundo os terapeutas, já existiam instituições formadoras reconhecidamente
respeitáveis no Brasil. Assim, embora ainda parecesse ser importante a presença
de um profissional vindo do exterior como "chamariz" para eventos nacionais,
lutava-se pela ascenção do profissional brasileiro à posição de autorizador
reconhecido, demovendo o mestre estrangeiro desse seu lugar.
Pensamos que foi exatarnente neste contexto que fez sentido o
surgimento de uma Associação Brasileira de Terapia Familiar, nomeação que
contemplava a estratégia de preencher o lugar inicialmente ocupado pelo
estrangeiro. Os terapeutas lutam pela constituição da própria clientela.

A ABRATEF- Associação Brasileira de Terapia Familiar -

uma grande família!

Apesar das lutas concorrenciais que progressivamente delineiam


a estrutura do campo da Terapia Familiar no Brasil, os profissionais
pertencentes à ABRATEF se representam como uma grande família. Vimos que
os Encontros e Congressos foram sendo percebidos como o lugar de sua
gestação. Assim, nestas ocasiões se debateu longamente o nome dessa família,
pois dele dependia a definição da natureza mesma de suas atividades e a
amplitude do leque de inclusão I exclusão dos profissionais que a ela
pertenceriam.
O tema da nomeação da Associação Brasileira de Terapia
Familiar desdobrou-se na idéia do ovo e do nascimento. A ABRATEF era
sentida em processo de gestação e buscava-se um nome para ela, como se faz
para um bebê que está por nascer. E sabemos que o nome de batismo não é
neutro, mas que ele carrega em si algum tipo de representação em relação ao
que se espera daquele filho. O tema da nomeação prolongou-se de tal maneira
na reunião de "Pré-] Congresso" que, em determinado momento, as pessoas não
sabiam mais porque e quando surgira o assunto:
"Quando você levantou o problema do nome, você estava pensando 110 quê?"

A pessoa identificada como introdutora do tema responde


mencionando um bebê:

135
"EI1 acho que, quando eu C1JIIItcei, era para a gente fazer Hll'II..JÜSt.'!!J,fÕQ sobre II()SSQ
allvidade. Depois, j á não é mais minha, eu acho que o processo do ww
foi tomando 1!111
O!!ITO l!IWQ. que eu acho que o X tem razõo, quer dizer, já trilo t mgjs de ninguém, é uma
digussi!Q para nomear o beM. •

A partir da!, ocorreram manifestações que retomaram o logotipo


do Congresso, imagem de um ovo196, simbolizando o fato de ser o "I
Congresso":
"Mos cu acho que... até o fato de I>Ó$ estarmos passandc de Encomro para CongreSSQ, a
idéia do ow, entiio eu a<:ho que exatameme nesse... Nós estamo.t ugscendo e eu acho que o
grupo que fez o trabalho tem muitos cumprimen/OS. •
"Há dois anos atrás já se discu1iu que g ti<USQ As:sociªQl.g. que dommgo w1í rltlSUr, mi spir
doº'"'.
"A rinica coisa que eu queria d1zer i que a genle está dalulo nome po t/QSSQ bebê e a geme
leJ'O muito tempo pensando em qual é a nome que a geme quer dar para o bebê, todo
mundo l'Ota 11â família".

É interessante notar nesse grande investimento na idéia de ovo e


de nascimento que a emergência dessa nova classe profissional nasce sem pais
fundadores - o ovo <!<i idéia de uma geração espontânea devida a algo que
estava lá, esperando para romper a casca. Ainda assim, a "família" criada a
partir deste ovo fundador assexuado precisava de uma genealogia e uma
llistória.
Buscava-se o nome para o bebê porque havia um sentimento de
pertencimento a uma família.'" O ato de nomear acenava, com isso, para a idéia
de um geuograma, isto é, um mapeamento retrospectivo no qual se buscava os
ancestrais ou a origem do bra71iO da fanúlia. Este pode ser um dos fatores que
pôs a terapeuta que confeccionou o histórico ocupada em completá-lo e em não
esquecer de ninguém! Nesta linha, podemos perceber o desenvolvimento da
idéia de uma família unida. Este tema foi tão exaustivamente debatido que
houve até mesmo quem demonstrasse cansaço para novameme tratar do tema do
ovo no último dia de reunião (Pós-Congresso):
"Eu acho que estamos fazendo um traba!IIC muito bom, a geme está muito CollSado e que
esse º''ºtalvez s~ja um IJQIJCO orematuro! Ele não vai nascer boje,"(...) "E~
ter uma cr/aJ1Ç{J prema/l/rol"

Mas havia também quem questionasse esta posição:


- - -- - - -
" ' V<;jo o lopltipo no AMxo 16.
1n Terapcuu: 'l'tzmbhn oc1to qve t~rltt. t<Jiva, tk dtJr nt>nws pora tt.s:IIU fiunl/uu, nJJo #, ma lô'J1U>$ de
Hlst6rlco. 'f'IUI i tjiiUf e qwn. fonJm M pu:s«J$ ti"~ inlclwP<m oq1IJ • Dli IIOminando, ptxt{l" eu tltCJao
qvt !1M P<,_,. qtl4 pree;_,.fi cor• (. •.) •t•ml>rodM < 0$$/no/odos. •

136
"Eu acho que nós estamos caindo numa confusão. Alguns pensam que estamos assistinda
um parto. Outros pensam que estamos assistindo a se /lotçg: o ovo." (risos)

A mesma pessoa, ao comentar a constituição das Associações


Regionais e os critérios a serem adotados para a aceitação de membros filiados,
diz:
"Nós vamos sair daqui com o ovo. Não
. podemos ter tuda definido!"
.
Pensamos que há um claro anseio de pertencimento a uma
família que se manifesta através do logotipo do ovo e do chamado do
Congresso: "FamJlia - lugar seguro para crescer?" Observamos que os
terapeutas se vêem a partir da mesma óptica que informa a representação que
constróem sobre a família. Isto já se colocava presente na própria abertura do
Congresso, quando disse a presidente do evento:

"Acreditamos que muito contribuirá para isso a constituição da 'Associação Brasileira de


Terapia Familiar', que dará nome c .whnmomç g essq família, g1jo registro estamos
wwarqu4g e provavelmente será escrito a muitas mãos 110 dia 31. Essa entidade que há
muito tempo vem se delinew!do romo um desejo de nmilos nos dará represematiVidade
nacional e internacional. certamente f1!iSeKUrando-nos maior e,meco e reconhecimefllo na
comunidade, "

O desejo de reconhecimento na comunidade, tão presente


quando abordamos a história da Terapia Familiar no Brasil contada pelos
terapeutas, é retomado pela profissional cuja fala acabamos de citar. O grupo
familiar imaginário constituido nesta discussão parece servir também ao intuito
da busca pelo reconhecimento social da atividade e da própria inserção
individual neste campo. A alusão ao ovo e à necessidade de delimitar a lústória
das gerações de terapeutas brasileiros objetiva definir, então, as posições no
campo. A associação entre o nome da entidade e o pertencimento a urna família
pode estar expressando esta pretensão, pois se espera que o nome dado venha a
garantir tal reconhecimento.'•• Voltemos à idéia de família unida e solidária que
foi apresentada pelos terapeutas que participaram da organização do "I
Congresso".'??
19a ObservouooSe que por trás do tema do nomç surgem questões relativas à independência da classe
p<Otmional. à idçntidadc do cspocialiSUl brasileiro, A especificidade da faaúlla brasileim, à CSirdl6gia de
mtrcado, ao reconhecimento e à autorUação do excrclcio do trabalho terapêutico.
I99 Vejamos a presença deste aspecto nos discursos abaixo:
"0 II Encontro de Terapeutas Familiares reallzado em Befo Horizonte. em /990, o qual congregou uma
famllia maiQI' e mais represenratiYa. com palc:sJrantes. debatedores. estudantes e terapeutas numa ampla
discu$S&>."
(cont.)

137
Constatamos que a família como instituição fonnadora de
individuos tem, para os terapeutas, um valor fundamental.100 Acresce-se a isto,
ainda, a idéia de uma "sociedade fraterna", trazida 113 perspectiva da Igreja
Católica, através do convidado presente 113 mesa de abertura. Convidado, este,
escolhido pela comissão de terapeutas que organizaram o Congresso.:zot A idéia
de famllia nuclear, harmoniosa e solidária, esteve presente em diversas falas.
Isto possivelmente reflete a fonna como essa mesa de abertura foi planejada,
isto é, pelo fato de nela estarem incluídos representantes de diversos setores
institucíonais.w
A noção de "sociedade fraterna" também parece obedecer ao
ensinamento da Igreja Católica de que todos devem se manter unidos e amar uns
aos outros. A autora da História da Terapia Familiar no Brasil, em artigo
"Eu oclto qv~ a gente. como A.uoaOÇ!5o lk T1rapetdaS de Famllla. ~:m que estDT prtocupodo com ls.so. a
~tflt . , wno grtJNk famllia e nno algw_mo coi.IO-,
Out10 tcrop<UI3 dirige sua falo na "'"""" diteçio, apesar de nJo "" se utiliz.ado do 11:nno família: •o.
futuro. ficou ttJmbém estalnlecido que delxoi'(JQ de existir oa Encont/'0$ em cardttr nocional, tm favor
dO.J subuqueniU Congresso1 Bnullelro1 tle Terapia Familiar." (...) "Foi abol'dackt novamente n
ciiJCUssllo sobre o tema da criaçlkJ ik uma Assocfaçllo 81"0$iltira, Iniciada em J.klo /1Qrizonte, em 1990,
ntomodo em Brasillo. tm /992, quondo ficou decidido que, neste pr6xlmo Enooncro, criar/amos n
A.uoclaçJJo 8ro.Ji/eira de Teroplo F'tuttlllar, com o objtlivo tk promover a aproximoç/JO e inlerc4mblo
dDs orlidodu voltadas ao e!flldb e à pesquisa das técnica.t e tx>~~heclmt.nlos r'l'lativos à Terapia de
F-ID• e c-J. emitondo ., ,../oçkt do amiUIIk, $01/diJiitd<Jdt • -fi~ t11lff #lU llftlllbi'Of. •
,.. M....., .. abcmua do Coognsso, cose ,-aJor CSüVa pRSeDte . . rata do •.._.... que _ .. •
Ulln'tnidodc: •Adloqur O$qu<IM t"«durmrjdfalaram bast<1111< a r<spdiD doi,.pt>rtdirda dofamllio
e ew odto qve IIÓJ todos otpd nlJo lt~ MttltiJ.IIta dil.vida. f'O' isso trabolltamos com da. E• quero folar
M>brc UM ~nto. • (..J ".A pnpaNJÇIIo dut« C~.sso. do tp«JI pt~dl porticipor ati'!.'(J:IMIIU como
coortknoçllo áo Comis.'J4o Cltntlflt.a. jd foi wm excelente eurclclo dt convivfncia. ondl. ,.lnou a
famlliáode e sobnwdo o rnJNitO mútwo p!tlas dif,rençAS err.'()lvicla$. •
lO I o~ este. çonvidado: "'A Igreja. nA .fila hi.n6ria, Sf1m{N'C st lnttf'U$0U multo fHilt famlllo. Hâ pouco ltmpo
ainclo o Papa dizia: '-O futuro da humanlt:fflde passa pela famllla.' Umn frose que resume um pouco Q
fdjlo de q-ue tJ lgn}fl Imagina uma humanidade onde uma fanrllia N1novado vd «Jn.stl"llir. " (...) "Na
fHri~HCllvt~ da Igreja a famllia pode nr euet'U'ada no .veu re~DO familiar. o /usar de encontro, lugar
Stgll/'0, ~rguntam voc€.s. lugar onde 11 uperit!ltda os primdros paplls de nossa viela. Mas, por owrro
lodo, a famllio po<k ~ dtw tombb• su ,'Isto como o grand~ ttgtftll soda/, ou seja. o JKII'f'l de
~odora tk r.cma sociedolk. • (..J ~em quiser fomllia l>al ru que crltV OCNfdiçiks poro que usa
.fomll1a pos;:MI o:istir. • (.+J •Do eotUI7V~ de 11m0 IOdedade ftv:*ma., de tiMO IOd~dode onde cu peSS()Q:S
J10S1QM CIIOif\JiYer nlf paz. • (. ••) •A IV'JD qw.~r WJJorizor a jQif!Ú/ia.. • (.•.) •NIJD ~ f6cil po1'Q o lgnja ir se
adaptondo cir nem:~$ .fon1uu qJI~ a fam./1/a pod. lom.t". /of&J i fddl pt:ro uma doulrilfO mi/,,uv Mr ~
M dor nspwtas a JN"'bkmas às ~.r plt~ai.r tk u.mo s«Jedode. Mas o qu« pon« ~ntol. o (file
JNUVIce •S!Wncial, no pvspectiWJ do lgnjo. I que a S«it.dack di c:ondrçl)es para que a família ubra.
Segundo: • lg~e]o dew ajudar ofomlllo o .re tomar {omtodoro, crlod""' do ptssoos. A lg~ejo dew
ajut/ar a.t famlliOJ a fazer com qut: os &eus m11mbrw IUS'im se rornem rrat~.rformodore.s ck umá sociedade.
Nt:3tt&:t vias. a Igreja prtttentk /Mel' o seu trabalho junto ~m as fomlllos. E n6s flcornos multo ftllus
quandQ sabemos t[UC um grupo tiJo .tdblo, erudito. rtspensúvel, como eS.ft! gf'tlpó tfUC se rtúne essa nl)ite,
eslá realmente interessado em procurar..• em procurar resposlas ptJrn uma série de indagações que hoje
se coloetAm sobre o fam!Ua. Q11e fHIU ajutk ~·ocb a MCOJttrar realmente tjicllnc/n rw trobalho para que
asjo11111ias runcontrem o ieu etmtlnho. Multo obrigador
202 Compuseram a mesa de abcrtuno do Col1jTC$$0: a pres;c!cnte do Congnsso. um ~ae eh Igreja
Calóbc:a. WD .._..,..do FEBEM ele Slo Paulo, um repo....,W!Il: da &colo de Pois do Bmsilo unu
f<lll'....,lantc do Uoivenidoclc.

138
publicado''" comentou a influência da Igreja sobre o trabalho na área da Terapia
Familiar, apontando que, nos anos 70, o desenvolvimento da psicoterapia de
família e de casal teria sofrido significativa influência da Pastoral da Igreja
Católica que promovia "Encontros de Noivos" e ''Encontros de Casais com
Cristo" em resposta ao aumento de separações e às crises conjugais.204 A partir
disto, podemos inferir que a noção de grupo solidário como modelo tenha uma
de suas origens na influência do catolicismo sobre a formação dos próprios
terapeutas. Cabe lembrar que, em São Paulo, o INEF - Insliluto de Estudos da
Famflia foi um dos primeiros centros de atendimento psicológico ã família e era
originalmente mantido pela Igreja.
Não cabe no escopo deste trabalho abordar as razões pelas quais
o catolicismo teria perdido prestígio e poder de influência sobre a família no
perlodo em que a teoria sistêmica foi introduzida e divulgada no Brasil. Cabe
salientar, porém, que esta abordagem passou a oferecer um novo tipo de
linguagem para a compreensão e a superação dos novos conflitos na família, o
que deve ter certamente contribtúdo para o declinio das representações da Igreja
Católica sobre a natureza dos dilemas da fanu1ia pós-divórcio. A sociedade
norte-americana, que experienciava o divórcio e suas intercorrências há mais
tempo, constituiu um corpo teórico que procurava dar conta dos processos
vividos na família modema, ao passo que a Igreja Católica continuava a pregar
o casamento indissolúvel e a não realizar casamento de pessoas divorciadas.
Os terapeutas de família no Brasil, apesar das proftmdas
transformações nas composições de grupo doméstico, parecem ainda operar
com uma representação de família como grupo nuclear unido. Isto fica muito
evidente nas representações que constróem em tomo de sua própria atividade.
Cabe observar que a idéia de pertencer a uma família apareceu até mesmo no
momento de assinar-se a Ata de FundaçtJo da ABRATEF, quando um terapeuta
disse:
'j4 questão de ordem é a seguinte: que nós aqui reunidos. declaramos ftj. ggorg, nascida a
Assocíadlo. çomo se estivéssemos casando no Jlí!lle{ pqssq4g. Estamos casados. Daqui a
pouco wmgs no Cmt!Jrio passar no papel e estaremos casados de outra maneira."

Aproveitando esta idéia do casamento e do sentimento de fazer


parte de "uma família profissional", poderíamos arriscar dizer que se tentava
lOO ConsultcMunh6z (1997).
204 Diz a autora: "Destes Encontros swrgiram ôs Institutos de Famllia nas diferentes caplt<ús do Brasil: Belo
Horizonte, R/Q de Janeiro, Salvador, São Paulo, Curiliba. Temos infonnaçiJo que conrinuam aluando, as
entidades dt Bt/o Horizonte, Salvador e a do Rio de Janeiro. Em São Paulo o ln.slitulo de Educaçbo e
Orienlaçào da Famllio (INEF) tamb~m no Inicio de suas aJuaç6e:; estava ligado à Pastoral da Igreja
Católica. Ct>mo tcmMm no Rio Grande do Sul permanecem os mwlmcntos religiosos d(l [aml/ia.

139
~

estabelecer quem é pai de quem, quem são os ancestrais e progenitores nesta


làrnilia que parecia estar crescendo rapidamente»> e compondo o seu álbum de
fotografias. Esperava-se por volta de trezentas pessoas para o "I Congresso" e
compareceram aproximadamente setecentas pessoas, segundo a avaliação da
equipe organizadora. O evento nacional foi sentido como um marco e parecia
haver uma preocupação, por parte dos especialistas, em demarcar as
hierarquias.
Embora houvesse a idéia de família hannônica, "tetnia-se innãos
indesejados"'"'· o que revela a tentativa de demarcar quem poderia fazer parte
deste "clã". Isto abre urna certa discussão sobre quem é que vai ser o pai do
ovo. Fica a questão do parentesco histórico: quem pode ou não formar; quem
pode ser considerado um descendente e quem pode se filiar. A noção de família
que está operando nestas falas é a de grupo nuclear, embora se tente falar em
sistemas "estendidos", como vimos no capítulo 3. Esta tendência à comparação
com uma unidade familiar nuclear foi mantida mesmo tun ano depois, nos
discursos colhidos no "Encontro" do Maksoud. A imagem de família nuclear é
sempre a mais empregada como forma de expressão:
"Hoje posso dizer que (lÇ{)mrxmheL deyJe os primeiros passos. esse fi/hgte gescer e ett
hoje cortejgr a mulher dos sr.us so1thos, que é a 'Associação 11rosileira rk TerofJkl
Eamj/jgr', que ainda eski em jormaçllo. Assim, como filhote, ou seja, o Movimento, essa
mulher - a 'ABRA TEF'- eski sendo constn~lda pgm abrigar 11/11 casamento ({11§ [IQS!Itl c/ar
frutos sauclávels ou, pelo menos, possíveis. Mas, como Iode casamemo, .só o tempo dirá
quais foram os contra/os assinados pelos dois: o Movfmemo e a "ABRATEF". o contrato
secrew e o explicito. Em certo mommto, fui filho dele, OJIOS 01Tás me sem/ irmão que ficam
mais velho e hoje já estou até me sentindo poi. ·=
2os Vejamos o que 412.cm est.M u:.rapeuw:
"(?ate putk~ coi0C41' alguM ittl'&l no popel com .nq;t:st(Ju para a continultlnde desse Alovinumto.
levando ~ OOifla que a gente «#6 CtUOmdD muito. •
7tr Jd8tq ~,. C)OrfnMM• . , . pudu de W11.0 qve o Brtull I mw/10 gronde. qu ui.Mc ,,;~ç di~dt:JM ~o
gente W2i tu 4l"t' ar tolutmt4 COM todot 0$ C(JtttUt.N reglonoi.s e 41 .SV4f rlptdjidtJdu e qw IIÔ.f
estamos """" 11t0mento - e #$o foi tJ/g<> qve e~~ rro.a• - oruk UUIJ'ItM DhStrvond(), lt() Bnuil. ~o~mo
aplosiJo quanlltt~tlw:t de jónnnçito de terapet.~tas tk famllla e:, com o tempo, i$» ~ f•wv.
inevitavelmente, a uma melhora qunlltativa e quer, uma das funçiJes tia no.u.a A.s.rociaçao Striâ de
acelerar e.s!Je JH"'CeS$0 e de orientar eJSe ~· "
206 E este cra u:m tema que sempre retoma.,•a: •Mas, o que se pen$0u é que ~riam projis$()naif que
u6vewm trtlbolhando em Tuapla tM Famllia e que tlw~... que rtceM.sst um nfumdô de dois outros
profissionds, paro volldor a A#Odaç.So. De dois I'«<Nth<ddt» qw dariam a crldito paro aqvda1 " -
eomc> a gente tomblm a filiorla ptJr'Q t•ntar imJXtlir que. de rrpmte. pe$$1HU que o gmte JU1o ~.
arl(), vie3:Um entrar na:se J.{ovf!Mnto. • ( ..) "Seria uma lntlcoçiJo por pe$SOQ..J que o genle meStnO Iria
referendando ncu 01111'0$.. •
207 A forma como o atual presidente d.1 ABRATEF (•Enconuo" de 95) relata o percurso do MovimentO,
ac:onlJXiDba esc~ mesmo espírito. companmdo o Movimento a um ciclo de vida, segundo o qual a Ternpb1
Familiar, no Bmil, lttia passado pelos perlodos de nascimento, inmncia. adolcsdncia. juvenrudc c pelo
c.~ de wn cosamen•o. Da o ocropeuta: •&tiJa, <u diria: a gestapto j'al<un os Encontros da PUC
tk SiJa Pawlo, <lfl 8S. &J e 87; o tt<UC/_,uo, o 1 Encontro' <m Salvatlar, ' "' 1988; a inftJncia. o '//
(cont.)

140
O contrato explícito parece ser o intercâmbio acadêmico teórico-
técnico. Podemos únaginar que o contrato secreto se referia à organimção dos
grupos hegemônicos e de suas hierarquias no interior de wn campo de atuação
que lutava para se consagrar. A preocupação com ter um "Histórico completo"-
e incluir a todos da família - foi, de fato, constante e veio a responder à
movimentação ocorrida no Pré-Encontro do Congresso em função de
determinados grupos que pareciam se sentir excluidos desta grande família.
Vejamos wn pouco mais sobre este aspecto. Uma profissional do Pará, por
exemplo, provocou grande twnulto na sala quando, falando em nome de seu
llJUpo de trabalho, queixou-se de que sua equipe não era identificada como
fazendo parte da história da Terapia Familiar no Brasil, pois sua entidade não
constava do cadastro que serviu de base para o envio das correspondências do
"I Congresso". Seu sentimento era de que poderia ter sido excluída."'"
Mesmo sendo muito enfatizado que esta era uma primeira
tentativa de levantamento sobre o que havia na área da Terapia Familiar no
Brasil e ter sido ressaltado que até alguns institutos de São Paulo não estavam
inclu!dos, al!,'IJDS reagiam sentindo-se, de fato, excluldos desta familia
profissional,209 enquanto outros tentavam amenizar o mal-estar.>•o
&-tro' tm Bek> Horlront.. me /990; a adolndnda. o 'W Enco.!tro' rm BnuJDa. tm /991: a
jlti'W1flrldtt o ;I Congrn::so Bnui/~,ro d« Tuopia Familiar' ~,. SIJo Pm~lo, ''" 1994; e. o cm:GI'Mnlo
provlwd no 71 ~~ no Rio Gronck do SML Nós tenmos a «rim6nla. tntdo, se !' Movimtnlo
O«lld a ~TEF para amare ltON'GI'o/1 qve a morte M#por~. em 1996. •
101 Dq: • ... tksde 87, buscando o trobtdho de Terapia dtt Famllio nvm qforço tk viajar, de participor de
todos o.J Encontros. • (...) •Nós nllo recdttmCM o questionário, n6.r nllo Jf:.tm03 parle deste questiondrio e
nem "qut.r utamos sendt> citado., como... nem conw pessoa..• individuo/, nt~m ct>loborodoro e nem como
l~titulç4o que n6.s temos formada. Et1tllo, me O$SU.Sfam muUo e:JS.:s dâdM t1 a confu:lllo de inlerpretnçlkJ
cm n:loçlfo oo:s qufJStionórios, porqu• 4 um dado Sllper confu:w. que ntm o pr6pria mesa estd $âbenM
e..clon«r a re.pre.sentoçdo de rr"balho no/ da Terapia Familiar no BrMJII"
()bs: O questionário havia sido enviado para as pc5S03S que partioipanun de Encontros anteriores e tinham
seus todoTCQOO cadastrados. Ele ooliâUM dados 50bre a in$ÜJuiçlo poro que se: pudesse foz.er um
le\...,.menlo das ínstilUições txislentcs no BtoSil e iniciar um cadostrameniO poro possibiülar o envio de
COITCipOIIdo!oc
10t [)Q a ~ ~ •A.goro .,.jo ~ 1t6$ IJIOI"m.os ~,. 8411m do Por6 Pnra ,.;.,., - apoio
ntnltftlfl, tk noduuno üu:ôhdçdo. ~110$ IIIJIO YQntade tk wa grwpo o parlldpor e trti:Uimos . ,
&ottNMnto tk Terapia Fermi/lar como o nouo, nós ndo podemos wor PQI'tldpondo de Pri-Encont:n>SJ
Agora o tWgtmi:OÇdO tamb~m nlto ~fUOM e nem se preot;UptJU tm snkr u n6.t havlomos nubido
qutstlonttrlos!·
110 As seguintes fal<l.S expressam esta ccn~ncia:
"Eu queria colocar umo que:itlJo slmpleJ, que. eu QC./Jo que esse-' dados que estJo aqui, alem de .terem
J'(V'dal:s, portanto, ndo silo completos, Bles refletem o que chegou." (.. .) "N6s de OrOJilia., não estamo.t
rrpre.untado~ aJ pqr ele.:s. ncwo quutlondrlo tQin/Hm não chegou, nOSID qutstionório nllo veio paro ali
Entbo. tanto q~tantq Pará. Bras/lia nno utd represenl/Jda e mS:s t'..SJ(JIItOS, tanto quanto Pará. desde o 'J
&ooncro'. ittelwsive na ipoca da PUC. Juo n/Jo significo tk fomtn alguma descaso!" (. ..) •êsfou
com.tçando a pucebu qw falta. vrr&J. ~ntn nós #.Sp«ialistas. ata molor congngoç/Jo e esu maior
int~I'C4ttfblo, n40 .s6 em fiutç/'lo do Encontro, mas cn fonçiJtJ rk lntercdmbio mamo entre e.nddad~s.
i'lortkll< • Cm~ste • Ptv4 p<la «JmparafiJo com cu dGdo$, utl>o fixo data pof"'laç/JI> por conta
(00111.)

141
A partir disto, foi sublinhada a necessidade das pessoas se
conhecerem e formarem grupos de trabalho. Esta terapeuta procurou esclarecer:

"Eu quero só dizer uma coisa para você: t;I!JYi em São Paulo, nós descobrimos com o
Congresso que existem 30 entidades de Terapia Familiar e a genle não sabia! Aqui em São
Paulo, dentro da cidade de São Paulo, não é nem do Estado! Dentro da cidade de São
Paulo existem 30 entidades de Terapia Famíliar e isso nós descohdJnos agorq, eom o
Congre$$0. Então 1liíf1 se sintam discriminados, porque nós estamos lutando com o pessoal.
Este Conwesso é um Congresso para iuntar pessgqsl"

Apesar do discurso de que o Congresso objetivava juntar


pessoas, a atmosfera era de que certos grupos poderiam ser melhor incluídos
que outros, ou mesmo que alguns estariam excluídos. Antes mesmo do Pré-
Encontro ter início, houve comentários sobre quem poderia fazer parte desta
Associação: entidades e universidades ou pessoas individualmente. Buscavam-
se alianças. Deste modo, observamos a existência de várias possibilidades de
cisão: universidades versus entidades particulares; pessoas flsicas versus
pessoas jurídicas; Sudeste versus Nordeste; professores versus alunos; grupos
versus indivíduos. Na verdade, pelo tom das falas dos terapeutas, foi possivel
observar que, de fato, alguns discutiam como se procurassem decidir quem era
importante e quem não era, ou então quem era competente, reconhecido,
pioneiro. Este temam permaneceu tão presente que uma participante do evento,
ao fazer uma proposta de funcionamento das Associações, utilizou-se da
imagem de um Brasil deitado (Veja Anexo 19), simbolizando que todos os Estados
poderiam ser vistos no mesmo patamar de importãncia e em proximidade. Esta
proposta de funcionamento das Associações Regionais e da ABRATEF foi
mencionada na Ata de Reunitto do seguinte modo:

"Uma apresentação diagramática desta proposta seria o mapa do Brasil deitado, o que
dos quesriondrio..s." (. ..) "Os questiondrios, nlfo foram retornados, muUtJ.s perque niJ() foram rtSprJndldos e
multo.Y porque nlJo r'eceberam. Eni/Jo, nesse sentido. nllo significa uma exclusilo Jo seu, _p()r(Jlle stniJ() eu
t(Jmbém te,.!a que mtt sendr uc/uld<>. 11 (. ••) "E nós somos batalhadores do Movimento de Terapia Familiar
desde o primeiro momento."
"Isto eu acho que é fondamental, para WJCés não ficarem CIJm tSS<J Idéia de que houve discriminação de
tal áre.a.. pqrque ntlo Jlowe nada di$SOI NW estivemos na maior abertura para tod<J mundo, Isto n/JQ é
verdade/ O que houve, realmente, foi uma dijicu.ltkJde muito grande de juntar todós os endereço&. Nós
temos uma lista ftUa pela SH [empreso de eo..·entos que organizou o CongreSSó] de mais dt cinco mil
nomes. Eu vou pedir qut está Oslo fique na secretaria e vou pedir para que cada um amfira o seu
endereço, o endereço de sua entidade, para corrigir C(l$0 esteja en'ado. Existem algumas entidades que
nó.s niJo lemo.'>, por exemplo, o Pará, n6.•; não temos, ndo consta da nossa mata dlrtta." (. ..) "Eu n6o posso
adivinhar que IWJ uma entidade no Pará e a gente niJo con.vegue guardar na cabeça /lx/as as enddades
que existem! EntiJo, o que acônfeceu ftJi iSSó."
211 Uma terapeuta procurando amçnizar; 11Nõo ê um problema de exclusão do N()rdtJ.SJt ou do Nt>rle ou de
quem é que sej a. Se a gtltle cch>cor as coisas desta forma, vai ficar muito desagradável para todo
mundo. E não houve m:nhuma intenção nO$$a de excluir ningu~m!"

142
visualmente, já aparenta diminuir as distâncias entre o Sul e o Norte. "212

Através dessa imagem de condição homogênea e de


proximidade, tentou-se descaracterizar o clima competitivo, de luta
concorrencial por espaço de inserção nesta categoria de serviços e prestígio
profissional. O aparecimento deste tema, contudo, por si só, já denunciava a
preocupação, novamente, com quem faz parte deste grupo líder e quem não faz,
quem pode compor a família e quem não pode. 2 n
Quanto à possibilidade de aceitação de profissionais oriundos de
diversas áreas profissionais - psicólogos, médicos, assistentes sociais,
fonaudiólogos, dentre outros- nos cursos de formação em Terapia Familiar não
houve muita divergência: a posição geral foi favorável à admissão de tais
profissionais, desde que respeitados os critérios estabelecidos para a seleção
dos candidatos aos cursos. 214 Evidentemente, se o campo da Terapia Familiar
pode agregar profissionais provenientes de diversos cursos de graduação para
formação na área, a clientela para os cursos de formação se amplia
significativamente. Querer restringir esta atuação a psicólogos teria outro
sentido: o de manter a clientela de fanúlias circunscrita aos profissionais desta
classe. E esta defesa é realizada pelo Conselho Regional de Psicologia. Em
entrevista realizada após o Congresso, uma terapeuta manifestou seu apoio ao
ingresso dos profissionais de áreas afins no campo da Terapia Familiar com o
seguinte argumento:

"Eu comecei com uma disciplina e... aos poucos, eu fui percebendo que não tem nada a ver
com o curso e nem com a disciplina, tem a ver com uma nova área do conhecimento. Não
adianta você ser assistente social, não adianta você ser psicanalista, não adianta você ser
psicólogo, não adianta você ser sociólogo, você tem que ter a coragem de se despir de toda
uma outra área, entende, de conhecimentos anteriores e mergulhar para uma outra área, e
212 A autora da imagem do Brasil deitado, ao apresentá-la na lousa, disse: "Com tantas entidades presentes,
mais de 50, que, de alguma forma, estão aqui representadas, a gente entende que estes são os nós do
Brasil deitado!"
213 Em entrevista concedida posteriormente ao Congresso, esta terapeuta é mais explícita: "Então a X
[instituição] foi funcionando e eu formei quase todos os meus concorrentes." (. ..) "Sim, agora são
concorrentes!" (. ..) ')4 maior parte dos concorrentes foi eu que formei. " (. ..) "Eu formei novos terapeutas.
Então, aqui em São Paulo existe a metade de todas as instituições do Brasil em Terapia de Família e
muitos fizeram curso com não sei quem, porque... pega mal!" (. ..) ''Mas eu posso falar porque foram os
meus alunos! Foram meus alunos, está certo?"
A fala anterior se refere às primeiras gerações de terapeutas. E essa fala confirma: 'Ji Associação Paulista
é de São Paulo. Nós não temos uma Associação ainda que congregue todas as pessoas, então nós não
temos associados, certo? O que nós temos são terapeutas formadores. Essa reunião foi constituída para
discutir com entidades formadoras."
214 Este tipo de preocupação com quem pode ou não ser incluído nesta "fanúlia profissional", a postura de
ampliar e incluir outros profissionais não psicólogos e a preocupação com possível repreensão ou punição
por parte do CRP (Conselho Regional de Psicologia) são temas que sobrevivem e reaparecem, ainda, um
ano depois, no "Encontro" do Maksoud (1995).

143
fazer outras sínteses e converter outros conhecimentos, tendo como foco a família. Se você
não fizer isso, não avança. "

Considerando a Terapia Familiar como uma nova área de


conhecimento, ficava em pauta, então, não só quem pode ou não pode formar,
mas também quem pode ou não ser formado - em suma: quem pode fazer parte
deste grupo. E ainda, quem pode votar nas Assembléias. E quase tudo tinha que
ser minuciosamente acertado:

"E aí surgiu já um dos temas ou alguma coisa a considerar: quem é o terapeuta, quem pode
fazer a terapia e quem é o formador de terapeutas, não é?"
"Se esta entidade, de alguma forma, formar, ou seja, dando curso de formação ou fazendo
pesquisa, ela é considerada uma entidade formadora, certo? O que não é entidade
formadora são: consultórios, clínicas particulares... essas pessoas não são consideradas
entidades formadoras. "

Na reunião de "Pré-I Congresso" dedicada à discussão de


questões como as mencionadas na citação acima, o grupo foi dividido em três
subgrupos que trataram de temas específicos. O grupo I, interessado na questão
de "quem pode ser formador", concluiu que todos os terapeutas querem um
Conselho que "oriente" e "acompanhe", mas não que "controle"; que a posição
geral é a de que esta instância deveria fazer uma "proposta" de critérios, mas
não uma "imposição" de-critérios. O grupo TI preferiu pensar qual poderia ser o
currículo mínimo para um curso de formação na área e compôs uma "proposta-
esqueleto" para um curso de três anos que incluía disciplinas teóricas,
supervisão de atendimentos e uma monografia. O grupo m discutiu a seguinte
questão: "Como é que nós oferecemos para terapeutas relativamente
inexperientes, famílias muito difíceis?" A conclusão do grupo foi que o
candidato à formação deve já "ter experiência profissional (alguma prática) com
grupos ou famílias", deve cumprir um currículo mínimo, fazer terapia pessoal e
escrever uma monografia, ao término do curso.
Ao final do "Pós-Encontro'~ , ficou decidido que o "II Congresso"
seria em Porto Alegre, onde estaria funcionando a sede da ABRATEF na nova
gestão. A celebração de encerramento do "I Congresso" foi marcada por um
caráter bastante festivo e emocionado:

''Foi um intercâmbio fantástico!"


''Foi um partilhar muito bonito, muito interessante e muito rico da construção da nossa
Terapia Familiar."

Através da análise de como se deu a inserção da especialidade


da Terapia Familiar no Brasil, observamos inúmeras sinalizações no discurso

144
dos terapeutas que apontam para uma representação dos conceitos de "família"
e "familiar" vinculados às idéias de coesão, cooperação, apaziguamento de
conflitos, harmonia e inclusão.
A própria concepção de especialistas da Terapia Familiar no
Brasil como uma grande família procura difundir uma imagem de classe de
especialistas como um grupo cooperativo e harmônico, aparentemente ficando
dissipadas as disputas por campo de trabalho, fora ou dentro do grupo. Ao lado
disso, fica clara a importância dada ao nascimento das Associações Regionais e
da ABRATEF para organizar, consagrar e consolidar as hierarquias - os grupos
hegemônicos- no campo. A representação dos terapeutas de família sobre a
própria classe profissional como sendo uma grande família encobre a luta
concorrencial entre indivíduos e as disputas entre os principais grupos neste
terreno profissional.

• Mudanças na família e a nova especialidade

vista na óptica dos terapeutas de família

A consagração do campo da Terapia Familiar no Brasil- já na


terceira geração de terapeutas - e a luta pela constituição das legitimidades
intelectuais constituíram processos concomitantes ao debate sobre-as fronteiras
da fann1ia contemporânea, uma vez que a experiência do divórcio e dos novos
rearranjos na família impuseram um questionamento a respeito de quem
pertence ou não ao grupo doméstico ou à rede da parentela. Observarmos uma
tendência de compreender a nova rede de parentes como um único sistema e, ao
mesmo tempo, uma resistência à esta nova concepção sobre a família modema,
ao se tentar manter um tipo de olhar que fala em unidades sobrepostas e que
recupera insistentemente o modelo nuclear de família: pai, mãe e filhos
consangüíneos_
Vimos também que a Terapia de Família desenvolveu-se mais
nitidamente no Brasil a partir da década de 70 e que introduziu um novo modo
de pensar a família. A Igreja, que exercia influência sobre o grupo doméstico,
parece ter perdido parte de seu raio de ação para os terapeutas de família que
começam a responder à necessidade de ressignificar as novas experiências
vividas pela família modema - como no caso da experiência de separação e
divórcio que a Igreja não aprova. Com a legalização do divórcio e os dilemas
decorrentes das novas relações que se instauraram, parece ter havido a
necessidade de um outro espaço que desse conta de acolher estas experiências
e, nesse contexto surgem os consultórios dos terapeutas e clínicas de
universidades, especializados em Terapia Familiar.

145
Assim, o fato dos especialistas terem se voltado para o
atendimento a casais e famílias criou um diálogo com a nova demanda social: a
exigência de "reorganização" do grupo familiar em meio às rápidas
transformações ocorridas a partir da década de 70. É justamente nesta década
que a Psicanálise encontra-se em plena efervescência no Brasil e que seu caráter
normativo passa a ser questionado por diferentes autores. 215 Veremos adiante
que essa perspectiva normativa também está presente no campo da Terapia
Familiar que ao trabalhar com uma noção particular de saúde e doença, acaba
por contribuir para a difusão de normas para a vida familiar. Os terapeutas de
família, no entanto, tendem a não identificar seu papel como normalizador2 16 das
relações familiares, já que pensam que estão formulando soluções a partir da
família, isto é, as soluções são por eles vistas como tendo sido elaboradas a
partir de um contexto interno ao grupo familiar.
Estabeleceu-se um diálogo entre famílias e terapeutas, no qual os
especialistas passaram a ser parte integrante deste processo de reconstrução
simbólica do mundo do casamento, do divórcio e da extensão familiar. 217
No constante questionamento sobre os papéis feminino e
masculino, que é característico das relações amorosas contemporâneas tanto
218

215 Por exemplo, autores como M. Foucault (1979) e R Castel (1978) enfatizaram o caráter normativo do
discurso psicanalítico.
216 A idéia de que a atuação dos especialistas tem efeito normatizador nas relações interpessoais na família
foi abordada por outros autores. As relações entre higiene, poder médico e política do Estado foram, por
exemplo, analisadas por Roberto Machado (1978). Jurandir Freire Costa (1989a: 15/17) levanta esta
mesma questão, ao se referir ao processo que denominou de "higienização" na história da saúde e da
doença mental no Brasil, ocorrida no processo de medicalização que acompanha a emergência da
sociedade industrial: "... quando observamos os resultados da educação higiênica, uma conclusão se impõe:
a norma familiar produzida pela ordem médica solicita de fonna constante a presença de intervenções
disciplinares por parte dos agentes de normalização."( ... ) "O problema começa quando percebemos que a
lucidez científica das terapêuticas dirigidas às famílias escondem, muitas vezes, uma grave miopia
política".
217 Cursos na área de Terapia Familiar foram progressivamente incorporados às graduações de Psicologia e

também aos cursos de Pós-Graduação. Os anos 90 ficam marcados pela existência de inúmeros institutos e
centros de estudo particulares constituídos por equipes de terapeutas de familia.
218 No capítulo 3, a partir dos relatos de terapeutas e clientes, vimos como os temas do amor e do casamento e
o do conflito entre os gêneros ganharam espaço, na realidade contemporânea. Podem ser exemplos claros
destas transformações, a matéria de jornal intitulada O Homem é Mulherzinha (Veja Anexo 20) ou
mesmo, os serviços psicológicos direcionados somente a homens, como o denominado por Pai 24 horas
(Veja Anexo 21) ou, ainda, os grupos terapêuticos dirigidos somente a homens (Veja Anexo 22).
Em edição especial da revista Veja (parte integrante da edição 1.306, de 1993), por ocasião de seu
aniversário de 25 anos, foi publicada uma coletânea de artigos, em forma de livro. Neste volume,
intitulado Veja 25 Anos - reflexões para o futuro, encontra-se um artigo de Michelle Perrot sobre a
família: O Nó e o Ninho. A revista fez a seguinte apresentação do artigo: "A Família está um tumulto: o
pai é a mãe, a mãe pode ser de aluguel, os filhos adquirem direitos. Ótimo, sustenta a historiadora
francesa Michelle Perrot: a família está ficando melhor." Estes discursos denunciam o quanto está em
questão o que se espera dos papéis relativos aos membros da familia e aos gêneros, na sociedade atual, e
cria questões relativas às conseqüências disto para a dinâmica do amor conjugal e do casamento.
Constatou-se ainda que o conceito de casamento é bastante polêmico nos dias atuais - já que a noção
encontra-se alargada, na maioria dos segmentos sociais, de modo a não mais se referir apenas ao casal que
(cont.)

146
na condução da vida doméstica como por parte dos terapeutas que lidam com
estas famílias, observamos dois tipos de discurso coexistindo: o que reproduz a
tradicional divisão do trabalho entre os gêneros e o que promove um
igualitarismo entre os cônjuges. A família hierárquica, aparentemente
abandonada, na década de 80, estaria dando lugar a um tipo de família
igualitária.
O questionamento dos papéis de gênero e os dilemas postos
pelas novas estruturas de parentesco em um contexto onde o velho e o novo se
interpenetram passam a ser os temas desenvolvidos por cônjuges em diálogo
com os terapeutas de família. Cabe pois, neste momento, pensar como os
terapeutas de família se inseriram nesta realidade e como, no diálogo com os
novos dilemas, se transformaram em parte integrante deste enredo.
Se nos remetermos à noção de habitus de classe de Bourdieu
(1989), 219 podemos imaginar que os terapeutas de família estejam eles mesmos se
interrogando sobre as questões que afetam a família contemporânea, ou seja, as
questões encontradas nas famílias que temos em foco. Isto porque o grupo de
peritos faz parte dos mesmos segmentos sociais de seus clientes: camadas
médias ou altas da população urbana brasileira. No capítulo 2, vimos um
exemplo da proximidade social existente entre terapeuta e cliente - isto é, do
compartilhamento de um habitus - na fala de uma terapeuta que dá um
depoimento sobre a experiência de ter invertido a tradicional divisão sexual do
trabalho com seu marido. (Veja depoimento citado à pág. 39)
Nesta linha de raciocínio, tomando os discursos dos terapeutas
no seu conjunto, observamos que o próprio terapeuta também se pergunta sobre
o que esperar dos papéis de gênero, sobre como reorganizar a parentela em
situação de divórcio e sobre como ressignificar este espaço de convívio no
grupo doméstico juntamente com a fanu1ia. A partir disto, podemos dizer que os
terapeutas de família estão imersos no mesmo questionamento que as famílias
fazem de seu sistema de relações e se vêem no papel de buscar conjuntamente
soluções para dilemas que, objetivamente instaurados nestes grupos~ podetn ser
reverberações daqueles que eles próprios vivenciam. 220
Tendo como pano de fundo esta experiência, voltemo-nos, neste
legaliza a união, observando-se, ao mesmo tempo, uma tendência à separação e contração de relações
ulteriores. Vimos no capítulo 2 que variadas composições conjugais e familiares emergiram e tomaram
espaço no âmbito das relações amorosas, instaurando novos dilemas.
219 Bourdieu denomina por habitus sistemas de disposições estruturadas, o que implica uma predisposição
(tendência, propensão ou inclinação) do indivíduo a certos gostos ou atitudes. Corresponde a um
conhecimento adquirido, que indica uma disposição incorporada, um sistema de disposições adquiridas. É
um conjunto de princípios geradores e organizadores de práticas e representações - um sistema de
estruturas cognitivas e motivadoras.
220 Outro exemplo disto é a fala da terapeuta que conta sobre a experiência de sua filha ter tido uma criança

sem ter se casado.

l47
momento, para a análise de como a teoria e a técnica da Terapia Familiar são
vistas pelos próprios especialistas. Vejamos como os terapeutas de família
concebem a intervenção que exercem sobre a família da atualidade.
Nas entrevistas realizadas com terapeutas pudemos detectar uma
concepção predominante sobre o trabalho de Terapia Familiar. Em geral, os
terapeutas preocupam-se em não regrar a vida familiar, utilizando-se de técnicas
que buscam chegar a soluções a partir do próprio grupo. O profissional,
participante da produção grupal, pergunta e faz pensar. Desse modo, procura
desencadear na fann1ia um processo de compreensão de seus modos de operar
como estratégia de ajudá-la a encontrar novos significados à experiência no
próprio mundo. A terapia promoveria, pois, uma redefinição de como cada um
se percebe dentro do casamento ou da família e como vê os vínculos dos quais
participa. A forma como esses terapeutas definem seu trabalho é, por vezes,
bem próxima. 221 O modo de expressão pode variar, mas a mensagem contida nas
falas dos terapeutas caminha na mesma direção: a terapia é predominantemente
vista como um trabalho que ajuda a família no processo de ressignificação de
sua experiência e na busca de formas para solucionar seus conflitos. Deste
modo, acredita-se que seja possível evitar ocupar o lugar de guia do paciente, no
sentido daquele que normatiza e educa a vida conjugal e familiar. Há, por isso,
uma crítica à diretividade que funciona como preceito da prática terapêutica. 222
A partir deste princípio geral, podemos distingüir algumas
221 Vejamos um exemplo. Terapeuta: "Eu trabalho numa linha sistêmico-construtivista e construcionista. O
que quer dizer isso? É algo onde, numa Terapia de Familia, o que eu tenho é... a minha proposta será
construir um sistema com esta familia, onde eu não sei o que é melhor para aquela familia. Eu posso
estar com eles no espaço de um diálogo, onde eu vou levantar questões para que eles mesmos possam
repensar a história oficial a qual eles chegaram contando. A proposta seria de reorganizar uma história
com esta família. Uma história onde outras informações que eles não estão utilizando para contar a
história, começam a aparecer." (..) "Eu vejo o terapeuta como uma pessoa que, através das técnicas que
ele usa, através da postura dele, ele vai procurar realmente dar uma nova visão de mundo para essas
pessoas e.. . e fornecer subsidias para que elas encontrem outras respostas para os seus problemas aluais.
Como é que eu faço isto? Eu faço isto usando as perguntas." (..) "São aquelas perguntas do Tom
Andersen, que ele... que começou com o grupo de Milão, que eles usavam as entrevistas circulares." (. ..)
"Então, eles usavam algumas... alguns questionamentos circulares, ou entrevista circular, e tudo baseado
em perguntas que faziam com que a pessoa mesma refletisse sobre a sua realidade e fosse mudando." (. ..)
"Fazer opções de formas de ação diferentes." (. ..) "E ai eu complemento isto com algumas técnicas
psicodramáticas." (. ..) "Quando é necessário, a gente usa algumas técnicas de ação, que são técnicas
também através das quais as pessoas vão, por elas mesmas, descobrindo uma nova realidade." (. ..)
''Através das perguntas, através da dramatização, você dá material e instrumentos para as pessoas
buscarem essa nova visão da realidade em primeiro lugar. E depois, você procura fazer com que, a partir
desta nova realidade, elas descubram novos caminhos de ação."
222 Diz uma terapeuta: ''Agora, o importante é que você saiba que existem outras possibilidades que você
tem abertas e que você pode seguir se quiser. E é um... onde até o máximo que a gente pode chegar,
porque... se a pessoa está bem e está feliz, quem sou eu para chegar e dizer para ela: '-Você tem que
largar a tua mãe e tuas irmãs e casar com uma outra pessoa, que você vai ser feliz!' Eu não sei! (ri) De
repente, ela não vai ser muito feliz, ela vai ser muito inféliz e ela vai fazer a infelicidade de todo mundo:
dela, do marido, dos filhos que ela vier a ter etc. Então, essa é uma atitude que a gente não toma."

148
tendências na visão dos terapeutas de família sobre suas teorias e técnicas. Em
primeiro lugar, a intervenção dos terapeutas é por eles percebida como um
processo de auxílio à famHia na mudança da forma como os integrantes do
grupo percebem seus respectivos lugares. Nesta direção, entendem que não
estariam "corrigindo" ou "normatizando" a vida familiar, mas trabalhando com a
ressignificação da experiência no grupo e alargando a percepção que seus
membros têm da natureza e da legitimidade dos afetos e conflitos vividos.
Nesta direção, na visão dos terapeutas, a terapia visa a dar novos significados às
experiências familiares, obtendo uma mudança das narrativas por parte de seus
integrantes. 223 Além disso, procuram redefinir com a família não somente o
sistema de atitudes, mas o sistema de classificação dos parentes e o
estabelecimento das relações de reciprocidade, como no caso da acomodação de
novos membros no grupo familiar ampliado (no contexto pós-divórcio e de novo
casamento, por exemplo).
Esses especialistas pensam que o tal prisma terapêutico requer,
constantemente, a busca do novo. Este aspecto foi, por eles, muito enfatizado
durante a pesquisa. 224 Assim, os terapeutas se percebem como mediadores no
encaminhamento dos novos dilemas vividos pelas atuais composições de
fanu1ia. Concebem-se como aqueles que promoverão a consciência, o
esclarecimento da significação. Neste quadro, está implícita a idéia de que os
clientes não poderiam processar esta consciência por si mesmos e que a atuação
do terapeuta .aparece como contribuição fundamental. A fala da terapeuta, a
seguir, expressa bem este aspecto:

''E eu brincava, na época, e até brinco hoje, que a gente não tem esse poder nem de
separar, nem de juntar e que quem vai se separar ou juntar são eles! Porque realmente, a
gente só vai poder entrar... a ajudar a elucidar um pouco o que está acontecendo, mas não
é por causa de eles fazerem uma terapia, que eles vão se separar." (..) "O meu objetivo, se
é que eu tenho algum, é que as pessoas, juntas ou separadas possam se conhecer um pouco
melhor e ter uma vida um pouco mais agradável, mais razoável. E eu vejo os clientes
chegarem com um grau de sofrimento altíssimo e eu acho que esse é o ponto que me
interesso."(. ..) "O objetivo seria poder, como eu te falei antes, poder... esclarecer um pouco
mais esse grau de sofrimento e poder... articular melhor essa relação, ou não. Articular,
quando eu falo, seria... ou para uma separação ou para uma continuação, mas que
realmente pudesse nos dois, entender um pouco mais o que está se passando. "
223 A fala desta terapeuta é exemplo disto: "Então, a finalidade é essa, é dissolver esses problemas, é mudar
a narrativa, mudar a história, quer dizer, que a pessoa veja de uma forma diferente." (. ..) ''Mas mostrar
outra visão, não só do terapeuta, mas inclusive criar condições na terapia para que as pessoas
redefinam... não é uma ressignificação apenas, é uma redefinição, o que implica numa mudança de
posições, de maneira de ver, do grau de gravidade, do grau de importância que cada coisa tem na vida
de todos. Acho que essa é afina/idade básica."
224 Terapeuta: "Então, todos os meus trabalhos são nesse sentido, da importância do novo, mesmo dentro da
relação com os pacientes, porque, no meu ponto de vista, é o novo... que é terapêutico."

149
r
í

Observamos na fala citada acima que o oferecimento de ajuda e


a busca da felicidade, como valores, são vistos como objetivos permanentes.
Constatamos com isso, um segundo aspecto importante: a presença do
sofrimento parece ser a fronteira limite, aquela em que os terapeutas se sentem
autorizados a atuar e que justificaria sua intervenção. 225 Prevalece uma visão
funcional da família: o grupo familiar precisa estar ·em processo de
desenvolvimento.
Nesta direção, a Terapia Familiar é freqüentemente vista como
uma ajuda para facilitar as passagens mais conflituosas e garantir a continuidade
do desenvolvimento do grupo. 226 Se seu desenvolvimento é obstruído pelo
sofrimento, a intervenção é vista como necessária. Portanto, nesta linha de
compreensão, é através do argumento de buscar alívio para o sofrimento que o
terapeuta de família justifica a intervenção terapêutica no intuito de obter
mudanças. 227
O tipo de vínculo que os terapeutas acreditam estar
estabelecendo com seus clientes é, então, o de uma parceria, na qual o terapeuta
é um coadjuvante auxiliar nas passagens que a família necessita realizar para se
desenvolver. Em meio à atmosfera de conflito e facções, o terapeuta busca mn
lugar de neutralidade, procurando não tomar partido. A idéia de não julgar é mn
valor muito presente e transforma-se em mais mn aspecto recorrente no discurso
dos terapeutas. A fala do terapeuta a seguir expressa bem isto:

'j4 gente não é nem pró. nem contra e nem do casamento (ri), pelo menos eu não me sinto
nem do casamento, nem da separação. " (...) "Trabalho com o vínculo. com o
relacionamento. " (. ..) "O meu trabalho vai estar centrado em encontrar nem o mocinho e
nem o ruim, porque eu não estou aqui numa função de juiz para dar a razão a ninguém,
porque para mim a razão não existe. "
225 Terapeuta: "O objetivo da Terapia Familiar, quer dizer... eu acho que o objetivo de qualquer terapia é
que as pessoas sejam felizes, que elas se sintam melhor como elas são, com as diferenças que elas têm."
226 Terapeutas:
''Então... isso nas famílias que estão se separando e, nas que estão se juntando, também tentar facilitar
esse processo, quer dizer, tentar ajudá-/os nesse processo!"
"... de ajudar eles a fazerem uma caminhada. Uma caminhada mais possível, mais confortável, mais
complexa. Não no complexo em termos de ser mais confuso, mas com mais alternativas do que eles têm."
''A Terapia de Família... ela é indicada quando existe uma parada no desenvolvimento do sistema
familiar, um bloqueio onde, por alguma razão, a família não está conseguindo ir adiante no seu ciclo de
desenvolvimento."
227 Terapeuta: "Quando, de fato, eu faço o primeiro ou primeiros atendimentos, eu trato de ficar muito livre
e disponível para as pessoas, para ver o que que elas querem, qual que é o sofrimento delas, o que que
está muito desconfortável, que não está mais sendo suportável viver daquele jeito."(. ..) "Pelo menos para
mim tem chegado casos com muita dificuldade, com muita dor, com muito stress. Então, eu acho assim ...
que, até agora, eles conseguiram viver de uma certa forma e agora aconteceu alguma coisa que eles não
estão mais conseguindo viver, eles vieram pedir alguma ajuda. Então, eu fico muito disponlve/ e aberta
para ver o que que não está dando mais e o que que eles gostariam de fazer."

150
Deste modo, a fonna de conceber o próprio trabalho inclui a
imagem de que, em se tratando de relações familiares, não há vilões, nem
vítimas, nem loucos, nem sãos, mas sim processos vinculares. 228 Contudo, esta
posição parece gerar uma ambivalência de papel do terapeuta porque em
determinadas circunstâncias o profissional é convocado a fazer afirmações bem
mais diretivas com o mesmo intuito de buscar uma nonna. Esta ambivalência de
papel é observada com mais nitidez na atuação do profissional nas Varas de
Família, pois, como é visto no capítulo 5, ao avaliar a família sob o ângulo
psicológico e produzir um laudo técnico (que é considerado pelo juiz em sua
decisão), o psicólogo forense acaba por colaborar com o processo de
normatização da família contemporânea.
Na arena de negociação do consultório particular, embora não
exista a figura do juiz, a posição de neutralidade assumida pelo terapeuta acaba
sendo marcada por um impasse bastante semelhante. Embora o psicólogo se
conceba como uma figura que não pretende regrar o convívio familiar,
contraditoriamente, acaba por fazê-lo, ao participar ativamente no processo de
ressignificação das redes de parentesco tendo como ponto de referência sua
visão do que sejam as relaÇões saudáveis. Para exemplificar esta questão,
vejamos a fala de dois terapeutas:

"O objetivo de uma Terapia Familiar é fazer com que... as pessoas convivam
adequadamente entre si, ou seja, passem de serem famílias disfuncionais para famílias
funcionais. Da família disjuncional, há vários tipos: há famílias que somatizam, há famílias
que têm um bode expiatório ou um filho que vai mal na escola, há famílias. " (. ..) ''Enfim,
são famílias disjuncionais onde não se está contente com o modo de viver e que te procuram
para fazer Terapia Familiar."
''Então, eu acho que, em Terapia de Família, você trabalha temas ligados à comunicação, a
afeto e a limites. " (. ..) ''Então, vamos dizer que eu poria um olho um pouco de como andam
esses ingredientes na vida de cada casal, tentando ajudar o casal, em primeiro lugar, q
reconhecer e preservar o que já tem e funciona bem, porque mesmo num casal mais
alucinadamente péssimo, sempre você tem áreas que estão funcionando razoavelmente.
Ajudá-los a reconhecer isso, faz uma aliança com eles, uma aliança terapêutica e um
reconhecimento do que já existe de bom. " (. ..) ''E se pode trabalhar depois as áreas que
estão funcionando mal. "

As idéias de padrões funcionais e disfuncionais na família e de


adequação ou inadequação, extraídas das falas acima, denotam a presença do
código de valores do profissional operando no universo simbólico da família.
Nesta direção, podemos identificar em determinadas falas que o terapeuta está
228 Terapeuta: 'j-4 mudança de uma visão mais individualizada, intrapsiquica, para uma visão interrelacio-
na/."

151
orientado por uma noção particular de doença e saúde, na qual a funcionalidade
dos vínculos familiares para a formação do sistema psíquico da prole é chave. O
terapeuta concebe a família como o grupo no qual o indivíduo se estrutura.zz9
Participando do processo de mudança na família, o terapeuta atua, pois, na
construção dos elos familiares tendo como referência seu próprio código técnico
sobre o que seria o desenvolvimento sadio.
Assim, apesar das reiteradas afirmações que é a família quem
gera novos caminhos ou novas alternativas e que o terapeuta é apenas um
colaborador do grupo, os posicionamentos teóricos e técnicos do terapeuta a
respeito da saúde das relações constróem os modelos que passam a orientar a
reorganização dos investimentos afetivos. Deste modo, embora exista uma
tendência clara na maioria dos discursos no sentido de negar uma atitude
normatizadora da vida familiar, principalmente quando concebem este trabalho
como aquele que pretende promover saúde, os terapeutas são co-autores da
redefinição da rede familiar. Temos aqui, portanto, uma contradição.
Se associarmos a idéia acima àquela de ideal de grupo solidário
e livre de tensões, conforme detectamos na análise do discurso das reuniões dos
terapeutas, podemos verificar que estes profissionais acreditam que algumas
transformações na família sejam mais desejáveis do que outras e esta postura é
ainda subrepticiamente reforçada pelo fato de que a família que procura
processo terapêutico o faz porque vive conflitos que causam o seu sofrimento.
Além disso, cada posicionamento teórico comporta uma visão sobre o que é
sadio e a técnica terapêutica procura instrumentar a busca deste objetivo de
saúde. Apesar disso, a maioria dos discursos reitera a idéia de que é a família
quem decide a "construção" que deseja ou pode fazer para encontrar o alívio do
sofrimento e a felicidade. Contudo, quando se opera com o par saúde e doença,
não se pode evitar a condução das intervenções em determinadas direções, isto
é, toma-se impossível apontar encaminhamentos que não sejam permeados por
estes valores.
Embora percebendo-se apenas como mediador, o terapeuta de
família adere, na verdade, ao projeto de restauração da família contemporânea.
Ao se identificar com as questões vividas nestes grupos - uma vez que é
portador de um habitus de classe próximo ao das pessoas que trata - e ao
diagnosticar os conflitos na família segundo algum código de valores, o
terapeuta de família trabalha com um modelo de ordem familiar fundado na
229 Terapeuta: "Famflia seria a única fábrica de gente específica. Existem outros sistemas de vínculos
afetivos, mas é o único que tem a função específica de ser o espaço de formação de estrutura psíquica da
prole. Então, nesse sentido, as principais funções dafamilia têm a ver com a estrutura psíquica sadia... a
principal de todas é a formação da estrutura psíquica sadia da prole e isso vai se dar através da
transmissão de padrões de comunicação, de afeto e de disciplina."

152
harmonia das relações. Assim, através de sua intervenção, o terapeuta busca
hannonizar o que lhe parece estar desarranjado.

***
Neste capítulo, procuramos acompanhar o desenvolvimento das
associações da categoria profissional dos terapeutas de família e o nascimento
dos primeiros congressos, que se propunham a agregar os especialistas de
família para um intercâmbio da prática na área e organizar a classe profissional
no sentido de "semear" a Terapia Familiar pelo país.
Na constituição do campo da Terapia Familiar, observamos um
tipo de discurso de terapeutas de família no qual a idéia de pertencer a uma
grande família e a noção de família nuclear consanguínea estão todo tempo
presentes como valores norteadores de tomadas de posição e de
comportamentos. Isto já havia sido observado durante a discussão dos temas
abordados no capítulo 3, através da análise do diálogo entre clientes e
terapeutas. No contexto deste capítulo - da constituição da ABRATEF e das
Associações Regionais de Terapia Familiar - pudemos observar a reprodução
de uma noção de família associada às noções de solidariedade, amizade,
confiança e respeito mútuo. Em geral, há a tendência de aplacar, amenizar ou
até mesmo negar conflitos, rivalidades e competição. -A forma como uma
composição familiar é concebida pôde ser observada através da analogia
constantemente reafirmada pelos terapeutas presentes no "I Congresso", entre o
grupo profissional e uma família imaginária. A noção de uma família solidária e
fraterna, sem conflitos ou disputas, que pode viver em harmonia, parece ter
configurado o modelo ideal que pauta tanto a emergência deste campo de
atuação como a condução do trabalho com as famílias.
Através do sentimento de pertencimento a uma "família
profissional" fez-se, também com freqüência, alusões metafóricas entre o
logotipo do ovo do "I Congresso" e a idéia de que uma unidade familiar estava
nascendo. Decidir pelo nome da associação dos terapeutas de família pareceu
significar decidir sobre a hierarquia na família e sobre as fronteiras de quem faz
ou não faz parte deste grupo, ou seja, o conjunto das discussões sobre este tema
constitui um processo no qual se estava definindo o campo e lutando pela
consagração de determinadas posições. E este é o ponto que, neste trabalho, nos
interessa.
Se pensarmos que toda fala é sempre posicionada e que todo
campo profissional é marcado pela disputa por definição de legitimidade e de
boas posições de destaque, fica evidente o enorme esforço realizado pelos

153
terapeutas no sentido de transformar as disputas em consensos harmônicos. A
idéia de uma comunidade solidária era sempre enfatizada: "... estreitando as
relações de amizade, solidariedade e confiança entre seus membros." A forma
como foi planejada a mesa de abertura do Congresso, tentando incluir pessoas
de diferentes setores institucionais, assim como a maneira pela qual a tarefa de
realizar o "Histórico da Terapia Familiar no Brasil" foi encaminhada, buscando
a todo momento incluir todos os grupos e chegar a uma versão "completa",
expressaram a necessidade, inerente a qualquer campo, de mapear e definir a
hierarquia dos segmentos em disputa.
O parentesco histórico pareceu garantir quem seria o pai do ovo,
quem estaria dentro, quem estaria fora da família, da história da família, do
álbum de família. A discussão de quem pode ou não formar outras gerações de
terapeutas remonta à discussão sobre quem pode ou não ser considerado
descendente, ou o que é o mesmo: quem pode filiar-se ao campo e às suas
instâncias associativas. A disputa por quem faz ou não faz parte deste campo
não pôde, entretanto, expressar-se em tom de disputa. A etiqueta do confronto
exige que a disputa seja transcrita para a narrativa das falas românticas e
solidárias. Neste sentido, falar em casamento, cartório, bebê e parto pode ser
uma tentativa de amenizar o clima competitivo num campo em vias de
constituição.
Entendemos que para investigar o sistema de alianças que
instalou o campo da Terapia Familiar no Brasil, temos que pensar como este
campo vem se configurando na realidade brasileira, quais são seus agentes ou
atores em embate, contra quem se organizam e quais os bens disputados. Deste
modo, imaginamos o campo da Terapia Familiar como um espaço da
contemporaneidade onde diversos agentes produzem suas falas concorrentes,
provavelmente numa disputa por definir, com a família, quais são os papéis
culturais direcionados ao homem e à mulher ou à família e seus componentes.
Neste âmbito, procura-se discernir qual é o profissional que tem legitimidade
para oferecer auxílio aos dilemas vividos no interior dessas configurações
familiares. Podemos dizer ainda que é com a mesma perspectiva de amenizar,
aplacar ou camuflar as disputas dentro do próprio campo dos especialistas da
Terapia Familiar que os terapeutas atuam sobre a família, isto é, procuram
harmonizá-la, resolver ou eliminar seus conflitos. A forma como se vêem no
grupo de especialistas - como uma grande família profissional hannônica -
parece ser transposta, em geral, para o modo como olham ou concebem a
aspiração do grupo familiar em atendimento.
Paralelamente, constatou-se que os componentes da família, em
situação de extensão não conseguem se pensar como um grupo ampliado, como

154
uma rede ou um sistema, tendendo a demarcar os grupos formados em
diferentes casamentos como distintos, paralelos ou sobrepostos. 23o Isto gerou
conflitos que tomaram complexa ou dificultada a tarefa de gerir as necessidades
das pessoas envolvidas nestas composições. No cenário da sociedade
contemporânea, o perito surgiu a partir desta demanda. Neste contexto, pais,
filhos, juízes, psicólogos forenses e terapeutas concorrem pela elaboração de
uma forma de gestão que ordene o espaço de convívio dentro do que se entende
por desejável. No âmbito da própria classe de terapeutas de família parece ter-se
instalado uma luta concorrencial, constantemente camuflada, em busca de
posições privilegiadas diante do mercado das terapêuticas. Entre os
profissionais da área, há disputa pela definição de quem ou que grupo de
especialistas possui a abordagem ou linha de atuação mais eficaz em terapia
conjugal e familiar.
Em tal contexto, o terapeuta de família pode até ser visto como o
"perito em consertos", reparador ou co-construtor que a sociedade brasileira fez
nascer nos anos 70 e cuja finalidade era dar conta da ordenação de uma vida
familiar vista como tumultuada por novos arranjos e dilemas. A palestra
Mediação de Conflitos em Faml7ia: um recurso de resolução- proferida em
maio de 1997 num dos primeiros institutos formadores de terapeutas sistêmicos
na cidade de São Paulo (Veja Anexo 23) - adianta já em seu título uma definição do
terapeuta de família na sociedade contemporânea: o profissional que se ocupa
de mediar e, com isso, auxiliar na resolução dos conflitos vividos no grupo
doméstico. A fala desta terapeuta revela este mesmo aspecto:

Eu acho que é difícil você incluir todas essas histórias na sua história. é difícil você... A
gente é" (. ..) "um intermediário de várias histórias, interlocutor. " (. ..) ''É nesse sentido, as
diferenças, como fazer com as diferenças, as diferentes histórias, as diferentes famílias, os
diferentes jeitos de pensar, as diferentes maneiras, as negociações. Eu acho que a gente
media um pouco essas negociações... ajuda a mediar as negociações.

A representação do terapeuta como "mediador" instala um tipo


de atuação que aponta para a idéia de que a família não é mais capaz de
solucionar seus dilemas por si mesma, sendo necessário recorrer ao espaço da
clínica psicológica e em situação mais extrema, ao Fórum, como instâncias de
negociação. Se nos inspirarmos em Giddens (1991), para compreender o papel do
perito, vemos que este surge como mais um operador de "desencaixe",
apresentando-se, então, como parte integrante dos dilemas da atualidade.
Giddens chama de "desencaixe" o processo pelo qual numa determinada
sociedade o tempo e o espaço deixam de atuar de modo interligado ou
230 Veja capítulo 3.

155
concomitante. 231 Podemos inferir que os terapeutas de família da modernidade,
na condição de peritos da vida doméstica, surgiram para reorganizar com a
família o mundo representacional do grupo, já que velhos e novos padrões
geraram um "desencaixe" entre representações aprendidas, demanda social e
condições presentes de vida: o que se aprendeu no tempo passado não
instrumenta o espaço de convívio atual. Passamos a depender do profissional
especialista para sabermos o que fazer em situação de divórcio e guarda de
filhos, por exemplo. Nos depoimentos reunidos para este trabalho, é
generalizado o sentimento de que temos que enfrentar problemas e conflitos do
mundo atual que os padrões e o tipo de organização do espaço doméstico
tradicionais não dão mais conta de ordenar. O conhecimento sobre as novas
experiências foi depositado no perito da família contemporânea: o terapeuta
familiar.
O Movimento da Terapia Familiar Mundial ampliou seu
231 Giddens aponta para o fato de que na sociedade tradicional, o indivíduo dominava todos os momentos de
sua vida: o que usava, por exemplo, sabia de onde vinha e como fazer. O que -caracteriza a modernidade,
segundo este autor, é a ruptura radical com as sociedades tradicionais. Assim, as instituições modernas
seriam únicas, nunca tendo existido na história do ocidente. Ao contrário das sociedades pré-modernas,
que sempre vincularam o tempo ao lugar, não exiStindo um tempo universal (abstrato), o tempo e o espaço
na modernidade, ao se construírem em tomo do consumo, instalaram um espaço moderno de circulação.
Este processo gera "desencaixe", pois que retira a atividade do contexto local e reorganiza as relações
sociais através de grandes distâncias entre espaço e tempo. Deste modo, segundo Giddens, surgiram: A
idéia de rede e de sistema (de estradas, de serviços, de comunicação etc.), que para operar em sincronia
exigiu um tempo universal, caminhando no sentido da globalização, já que o capitalismo requer
mobilidade, fluxo, circulação; Um esvaziamento do tempo, uma ruptura entre a noção de espaço e tempo,
entre espaço e lugar. O homem moderno passou a seguir regras, acreditando em sistemas cujos autores
não conhece, gerando um espaço vazio. Os lugares passam a ser moldados por influências distantes e a
estrutura local não é detenninada por aquilo que está presente em cena - ocorre o estabelecimento de
relações de subjetividade com atores de outro lugar. A instantaneidade da TV, o vídeo-tape, que arranca a
co-presença, e, até mesmo, a possibilidade de consultar um terapeuta via internet, são exemplos disto. O
tempo se separa do lugar; Um sistema de peritos que passa a organizar o conjunto da sociedade através de
um sistema de confiança. A vida social perde sua autonomia e passa a contar com os peritos, que oferecem
uma garantia impessoal. Utilizam-se as fichas simbólicas, basicamente compostas pelo dinheiro e pela sua
capacidade de circulação de coisas, pessoas, idéias; A dependência do perito, para o controle do erro e do
risco, expandindo sistemas de confiabilidade por todo o globo. Passa-se mesmo a confiar não mais em
pessoas, mas em instituições. A ética da moralidade · não está mais em pessoas. Então, a noção de risco
teria sido criada pelo homem moderno e só apareceu quando se construiu a presença dos peritos na
sociedade. Crença, risco e responsabilidade passam a ser elementos chaves na sociedade modema, onde a
racionalidade procura ganhar lugar. O comportamento típico da sociedade atual seria, então, de exigência
de segurança. É esta ideologia central do mundo contemporâneo, que manteria os indivíduos sempre
voltados para o controle do risco e faz com que as práticas tenham que ser constantemente examinadas,
revistas, refeitas, fenômeno ao qual Giddens chamou de reflexibilidade. Ter-se-ia, com isso, um indivíduo
dependente das estatísticas, dos diagnósticos, dos seguros de família, da aposentadoria, dos alarmes, do
extintor de incêndio etc. Um jovem, por exemplo, poderia pensar: "Será que devo me casar se as
separações aumentaram 22% em quatro anos e se um a cada quatro casamentos se desfaz no Brasil?"
(Veja Anexo 24). Podemos pensar, pois, na idéia de Giddens de que são os peritos que oferecem uma
atitude básica que orienta o indivíduo na sociedade "desencaixada", através de um sistema de confiança,
para controle do risco e de que a globalização nos exige a análise das relações de co-presença locais e um
olhar para as relações distanciadas.

156
mercado por ocasião de sua entrada no Brasil, através da busca dos
profissionais brasileiros para fonnação especializada com os profissionais
estrangeiros. Isto ocorreu justamente mnn momento em que foram descritas
mudanças acentuadas na família: quando o velho e o novo instalaram na família,
um diálogo e os variados tipos de organização de grupo geraram todo um
questionamento sobre o casamento, a separação conjugal, o divórcio e os novos
casamentos. Adicionou-se a isto toda a discussão sobre o comportamento a ser
esperado dos gêneros e sobre quem pertence à rede de parentesco.
O terapeuta de fanulia, como perito, encontrou neste contexto
um mercado lucrativo232 em relação ao qual situou-se como o profissional que
poderia "mediar" os diálogos e auxiliar na busca de recursos para "resolver" os
dilemas instaurados no casamento e na família. A atmosfera de satisfação com a
conquista de espaço no mercado das terapêuticas e com o grau de emancipação
em relação ao mercado internacional dos estrangeiros ficou nítida ao término do
"I Congresso" brasileiro.2JJ
Como a vida social não é separada do conhecimento produzido
sobre ela, podemos ressaltar ainda que o discurso científico dos terapeutas
revela a . existência de um auto-questionamento. Ao procurar dar conta das
questões trazidas por estas famílias, os terapeutas tiveram que repensar o
conceito de família com o qual operam, o conteúdo do que se espera dos
gêneros na sociedade atual e as técnicas de intervenção. Constatamos que os
dilemas instalados nas famílias estão relacionados àqueles vividos pelos
próprios terapeutas, em função de uma inserção social similar. Analisamos este
aspecto através do uso do conceito de habitus de classe, de Bourdieu (1989).
Alguns terapeutas chegaram a mencionar situações de suas vidas que expunham
questões muito próximas das vividas pelas famílias por eles atendidas.
232 A discussão a respeito de quem pode ou não formar, como vimos, carrega em si uma definição do
mercado, ou seja, quem tem e quem não tem acesso à clientela. Esta terapeuta revela a questão, ao buscar
definir de quem é o domínio deste campo: "Não estamos nem aí para delimitar o espaço dos terapeutas. "
( ..) "Nós queremos, sim, saber quem tem direitos de se dizer formador e quem não. Eu acho que essa
poderia ser, na minha opinião, a fronteira da nossa discussão. Quem é que pode, quem tem credenciais,
quem será parte desse seleto grupo especial e com uma responsabilidade enonne, posto que multiplica
não apenas como uma família."( ..) "Então, qual seria o critério interno que nós nos propomos para
delimitar essa questão? Quem é que pode, a rigor, consciente e eticamente, aspirar a essa função de
formador e transformador da Terapia Familiar?"
233 Terapeuta: "Eu gostaria de manifestar aqui a minha emoção e o meu entusiasmo pelo que aconteceu aqui
nestes últimos dias."(. ..) "Para mim a realização deste Congresso foi a realização de um ideal baseado
na crença de que o Movimento Histórico de Terapia Familiar permite a delimitação de um campo
específico de trabalho, só que tem objetivo e métodos próprios e já tem uma produção de conhecimento
contextualizada, que atende às necessidades da Terapia Familiar no Brasil e de acordo com as
características da família brasileira. Temos agora que fortalecer este domínio com mais produção e com
a maior circulação desse conhecimento pela comunidade da área que o valida ou que deve validá-/o e
que se aproprie desse conhecimento proporcionando crescimento qualitativo da Terapia Familiar, além
do quantitativo." (. ..) "Eu quero parabenizar a todos que apresentaram trabalho." ( ..) "Foi excelente,
não ficando nada a dever aos Congressos internacionais dos quais participei."

157
O conjunto de discursos produzidos pelos terapeutas de família e
demais profissionais que lidam com o tema dos gêneros fez nascer novos
serviços. Foram criados, por exemplo, serviços voltados à orientação de homens
e mulheres em situação de convívio. Os Gender Groups (grupos só para homens
ou só para mulheres) de um psiquiatra de São Paulo (Veja Anexo 25) é exemplo
disto .. No impresso de divulgação destes grupos, o psiquiatra expõe sua visão
sobre o que "devem" ser o homem e a mulher contemporâneos. No seu discurso
há uma promessa de eliminar os conflitos e fazer prevalecer o desfrute. Diz ele:
"Num mergulho intenso e profundo, lidaremos com as venturas e desventuras da
busca de um relacionamento afetivo harmonioso."( ... ) "Homens devem resgatar
a energia masculina. Mulheres devem resgatar a energia feminina. "234
. Podemos, então, afirmar que pelo menos parte dos especialistas
que se ocupam com casais, famílias e com o tema dos gêneros adotou a
perspectiva de auxiliar as pessoas nestas relações conjugais e familiares na
definição dos lugares sociais de cada um. Poderíamos arriscar dizer que esta
parcela de especialistas compõem um grupo de profissionais que preencheu o
lugar ocupado pelos médicos higienistas nos meados do século XIX, quando a
atenção rnédica voltou-se para a definição de papéis e comportamentos no
cenário familiar, gerando um tipo de moral que norteava as relações familiares.
A fala que evoca o auxílio e o ato de mediar o embate no grupo familiar que
caracteriza o discurso de terapeutas de família acaba constituindo uma parte
integrante do processo de construção de uma · norma de comportamento no
grupo doméstico.

234
Embora o psiquiatra afirme que a relação ideal não seja possível, desenvolve um tipo de discurso de ajuda,
que o coloca entre os profissionais que constróem uma visão sobre a relação desejável entre homens e
mulheres.

158
CAPÍTULO 5

CASAIS E FAMÍLIAS NO SISTEMA JUDICIÁRIO,

EM SÃOPAULO

"Os especialistas encarregados de reeducar terapeuticamente a


família dão-se conta de que a desestruturação familiar é wn fato
social, mas raramente percebem que as terapêuticas educativas
são componentes ativos na fabricação deste fato."

Jurandir Freire Costa (1989a:I6)

Vimos que a fanúlia brasileira mudou a partir das novas


composições geradas com as separações conjugais (e posteriores rearranjos) e
dos novos dilemas que emergiram com a possibilidade do divórcio. Procuramos
investigar estas novas estruturas de parentesco e compreender como tais
pessoas se representam neste processo de mutação contínua da família e quais
são os principais dilemas internos vividos nestas composições.
Pensaremos esta experiência, no espaço do Judiciário, quando
outras instâncias se mostraram incapazes de ordenar as questões vividas no
interior do grupo familiar. Tentaremos compreender como os peritos, oriundos
da Psicologia, interferem neste universo do jurídico: como enfrentam os novos
problemas que estas famílias colocam, na tentativa de ajudá-las, passando a
participar do processo de ressignificar e recriar os dilemas vividos na família, ao
auxiliar o juiz na determinação de sua sentença.
A possibilidade de dissolução do casamento e contração de
outros novos, ao gerar uma explosão de variadas composições de família, trouxe
diferentes e numerosos problemas aos especialistas (assistentes sociais,
psicólogos, advogados, juízes, curadores etc.). Isto fez surgir, dentro da
Psicologia, a terapia de casal e família como uma nova especialidade e também
levou à necessidade de introdução destes psicólogos especializados nas equipes
do Fórum - Varas de Menor e Varas de Farmlia.
A partir dos problemas vividos por estas famílias, que procuram
o Fórum, a área do Direito confrontou-se com questões às quais não possuía,
ainda, um repertório operacional, que auxiliasse no processo de ordenar a nova
sociabilidade nestes grupos. Quando a farmlia, na sua vivência própria, não é

159
capaz de construir os parâmetros de julgamento de seus próprios conflitos,
solicita a intervenção do juiz. Na busca de intermediação, como o próprio
Direito não estava preparado para definir direitos nessa nova constelação
familiar, chamou o psicólogo como perito, para assessorar o juiz no âmbito
psicológico, nesta arena de negociação. O juiz passou a não decidir mais
sozinho: nomeia psicólogos e assistentes sociais para peritagem na família.
Uma vez que o grupo familiar, que procura o Fórum, não está
podendo por si mesmo solucionar os seus dilemas, ele requisita a lei, por meio
da presença do juiz. A padronização destas relações, portanto, passa a ocorrer
também no espaço do Judiciário. Neste âmbito codifica-se a hierarquia do
grupo, a distribuição dos direitos e deveres, a distribuição do tempo e do espaço
destas relações. Assim, o que o terapeuta faz no intuito de reordenar a rede dos
investimentos afetivos legítimos, o perito do Fórum faz para ordenar direitos.
Para ampliar a compreensão destas questões elegeu-se como
universo de observação: psicólogos, assistentes sociais e juízes de Varas de
Família que atuam no Fórum. O discurso dos terapeutas de casal e família- que
atuam em consultórios particulares, clínicas-escola ligadas a Universidades e
outras instituições, entrevistados para este trabalho - também será utilizado,
eventualmente, para enriquecer a discussão realizada neste capítulo.

• Psicólogos forenses - novo campo d~_ atuação sobre a família

Por que fazer esta passagem pelo Fórum? Como foi visto no
capítulo 4, alguns profissionais viajaram na década de 70, ao exterior em busca
de formação em Terapia Familiar. Na década seguinte, estes profissionais
passaram a treinar uma nova geração de terapeutas e formaram equipes de
trabalho. É, então, na década de 80 que os terapeutas de família estão surgindo
como classe profissional, formando novas gerações.
Não deve ser por acaso que, nesse mesmo momento, os
psicólogos começam a ser assimilados nas Varas de Família. O primeiro
concurso público foi realizado em 1985, quando psicólogos que já atuavam nas
Varas de Família precisaram prestar concurso para poderem permanecer no
Fórum. Nesta ocasião, os assistentes sociais já se encontravam atuando no
Fórum há mais de 40 anos. Observa-se, então, que o psicólogo se introduz nas
Varas de Fanulia no mesmo momento em que a terapia de casal e família está se
consolidando. O psicólogo especializado em atendimento à família transforma-
se, neste caso, em assessor da lei, representada pela presença do juiz.
A introdução do psicólogo nas Varas de Família na década de 80
ocorreu após a regulamentação do divórcio. A lei do divórcio de 1977 vem para

160
regular direitos e obrigações dos ex-cônjuges. Segundo Cahali e cols. (1983), a
sentença que concede o divórcio deve dispor sobre a guarda dos filhos, direito
de visitas, alimentos e uso do nome.zJs Processos desta natureza constituíram-se
no campo de atuação do psicólogo forense que se tomou um avaliador da
família.
Psicólogos executam, então, um trabalho de peritagem.
Entrevistam as pessoas envolvidas (o casal e/ou a família - individualmente ou
em sessões conjuntas) para formular um parecer a ser encaminhado ao juiz,
assessorando-o na área psicológica. Seus pareceres são incbúdos, então, em
processos de regulamentação de visitas, revisional de alimentos, modificação de
cláusulas, disputa de guarda, separação judicial litigiosa, interdição de pessoas
que não podem responder judicialmente, dentre outros. Veremos, a seguir,
alguns dos aspectos que mais mobilizaram a fala destes profissionais nas
entrevistas realizadas .

• As representações do papel dos especialistas


no Fórum de São Paulo/ Varas de Família

Observamos uma preocupação recorrente e predominante, por


parte dos profissionais do Fórum de São Paulo, em "proteger" as crianças dos
conflitos e disputas vividos por seus pais. Embora existam processos que não
envolvem necessariamente crianças, são os que as incluem que mais mobilizam
a fala destes profissionais. A criança permanece como uma presença quase
permanente no discurso destes especialistas e é vista, por psicólogos forenses,
como arma no duelo entre os ex-cônjuges.
A idéia de que o Fórum funciona como uma instituição que cria
rituais de repetição ou de elaboração das dificuldades vividas no casamento ou
na fanu'lia é freqüentemente mencionada por estes técnicos forenses. 236 Há uma
hipótese, por parte dos peritos, de que o Fórum é visto como o continente onde

235 Em caso de litígio, recomendam que a partilha dos bens seja decidida em fase posterior, mas havendo
acordo, pode esta ser decidida junto às outras disposições.
236 Mesmo fora do Fórum, há especialistas que apontam a ausência de rituais que permitam ajudar na
elaboração das mudanças na família. Veja a fala desta terapeuta de família, que atua em consultório
particular: "Quando alguém morre, você tem todo um ritual e, quando há uma separaçiio, você não faz
isso e eu acho que isso tudo faz a pessoa já levar, para uma próxima relaçiio, um monte de coisas que
não foram resolvidas, porque niio foi feito aquele ritual. E, muitas vezes, niJo existe o ritual seguinte, que
é a hora que essas pessoas fazem um recasamento. As pessoas vão vivendo, daí levam mais um
pouquinho de roupa, mais um pouquinho de niJo sei o quê e, de repente, estiJo vivendo juntas. De repente
siJo meninas, adolescentes, que eu dizia: 'Como é que foi?' Eu pedi para contar um pouco como é que foi,
como é que elas lembravam, porque elas até pequenas... 'Niio, de repente a gente foi ao circo, de repente
a gente foi não sei onde, de repente ele veio passar um fim-se-semana, tal, tal, tal... morando junto! E, na
verdade, ninguém conversou sobre!"

161
o ritual de conciliação ou de separação é consumado237 - como o espaço final
onde homem e mulher procuram mais uma vez elaborar os dilemas que ainda
não foram capazes de superar. 238 Deste modo, o Fórum se oferece como uma
das arenas de negociação possíveis para os conflitos instalados com a
experiência do divórcio.
O psicólogo forense surge, pois, como um dos segmentos
envolvidos na elaboração de um novo código de normas para o grupo familiar
em conflito. Na visão de grande parte destes profissionais, o Fórum opera como
um espaço de atualização de lutas e conflitos, e seria o espaço onde ocorre uma
tentativa de elaboração dos dilemas em pauta.
O Fórum é apresentado pelos psicólogos forenses como o campo
de batalha da "guerra", que teria sido deflagrada, na família, a partir do evento
da separação.239 Os profissionais acreditam que o processo em andamento no
Fórum, por meio das Varas de Família, nada mais é do que a reprodução, após a
separação, dos conflitos não resolvidos durante o casamento.
A idéia presente no discurso da equipe forense, de que uma
guerra foi instaurada e passa pelo Fórum, eleito como um veículo de mediação,
está, ainda, freqüentemente, presente na visão de assistentes sociais e de
advogados e juízes. Uma advogada que participou em uma mesa redonda sobre
Filhos do Divórcio, no "I Congresso", afirma:

"O tipo de advogado que procura, o advogado no divórcio destrutivo, são advogados que
passam o tempo todo pensando na estratégia, na luta, na briga, na arma, qual é o tiro mais
forte, é tensão em cima de tensão, eles ficam pressionando o psicólogo, o médico. para dar
laudo, para dizer 'fulano é louco, o menino tá mal'! É uma gue"a! É impressionante! É
guerra... depois que eu vivi dentro do divórcio... é impressionante, é guerra, é guerra
mesmo, ali todo mundo está na gue"a, não tem um, o juiz está na gue"a, o terapeuta está
na guerra, o perito está na guerra, está todo mundo na guerra!"

Dentro deste clima de "guerra", mencionado pela advogada e


por, praticamente, todos os entrevistados, a equipe do Fórum relata experiências
de ansiedade, medo, depressão, agressividade, hostilidade, desejo de vingança,
luta competitiva, dentre outras, por parte dos ex-cônjuges, que, segundo esta

237 Nesta linha de raciocínio, o Fórum pode ser compreendido como o locus onde se dá o ritual de passagem
do casamento ao divórcio. Ritual de passagem, provavelmente, compreendido como a "materialidade da
modificação da situação social", tal como Gennep (1978: 123) o define.
238 Vejamos o que diz uma assistente social, do Fórum: "O casal não consegue se desvincular da
problemática que ocasionou a separação. Então, eles usam a Justiça para continuar levando isso e levam
por anos e anos e anos. É uma fonna de eles estarem interligados pela patologia."
239 Os terapeutas de famllia dos consultórios particulares apontaram também este aspecto. Segundo a visão
desses terapeutas, o clima predominante é de hostilidade, surgindo a noção de guerra:
"Eu acho que os casais se separam com muito ódio, com muito pouco esclarecimento do que acontece. 11
''Aí houve guerra, guerra, guerra... Fórum e, no fim, essa guarda ficou com esse pai e ele trouxe o filho
para a família dele. 11

162
visão, não conseguem se desligar um do outro. 240
Na óptica destes profissionais, nas novas "reconstituições"
familiares, então, o mesmo indivíduo iria apenas trocando certos tipos de
conflitos por outros, carregando o incômodo de ver suas metas ideais
fracassadas. E nesta linha de raciocínio, fica evidente que o processo em
andamento no Fórum, por meio das Varas de Família, é visto como a
reprodução, após a separação, dos conflitos não resolvidos durante o
casamento. Esta visão é unânime entre os profissionais entrevistados no Fórum.
O Fórwn opera, pois, como uma arena de negociação de que a
família dispõe, quando outros caminhos mostraram-se inoperantes. A busca da
lei denuncia o quanto o código anterior se tomou incapaz de suprir a
necessidade que o grupo familiar tem de estabelecer normas, que orientem como
cada um deve se comportar. Sendo assim, a passagem da família pelo Fórum
não representa apenas uma tentativa de elaboração dos conflitos vividos, tal
como afirmam os terapeutas; tampouco ocorre porque está havendo a "guerra"
mencionada pelos profissionais; parece-nos que, primordialmente, é no Fórum
que estas famílias vêm buscar um novo código de orientação que defina os
direitos e deveres dos membros do grupo e uma padronização dessas relações
pela busca de aliança com o juiz.
Partimos da hipótese inicial de que o divórcio desorganizou a
parentela e de que, neste momento de transição, a família estendida se viu sem
uma regulamentação ou uma legislação interna ao grupo, que operasse como
normatizadora ou reguladora destes novos vínculos. A Psicologia e o Direito
passam a atuar no espaço forense como os atuais reguladores desta experiência.
No entanto, essa atividade não se realiza sem colocar novas contradições para o
psicólogo preparado e formado para diagnosticar, intervir e curar. Recusando-
se, como vimos no capítulo anterior, ao papel de juiz, ele é chamado a envolver-
se no processo legal para julgar, já que o juiz não mais decide sozinho, mas o
faz, agora, assessorado, dentre outros serviços, pelo Serviço de Psicologia
forense. Esta cumplicidade parece ter gerado uma profunda tensão sobre o papel
e a presença do psicólogo no Fórum, uma vez que peritar significa dar substrato
à decisão soberana do juiz.
O psicólogo, treinado para ser um mediador, passou a ter de
oferecer alguma linha de indicação ou sugestão de seguimento ao processo, já
que avalia a situação psíquica dos indivíduos envolvidos no problema e indica,
de algum modo, se as pessoas estão ou não aptas a determinados papéis: ser ou
não pai ou mãe adotivo de alguém, ter ou não a guarda de uma criança etc.
A criança é uma das fontes de disputa, o que causa desconforto
aos peritos. Muitas vezes é em torno dela que fazem as mais dificeis batalhas

240 Diz, ainda, a advogada: '~ briga é uma fonna de manter o ex-casal junto."

163
judiciais. O Judiciário parece ter incorporado a idéia, do Serviço de Psicologia
do Fórum, de que a criança não pode ser moeda de barganha na disputa dos ex-
cônjuges por melhores posições na "luta". As teorias de desenvolvimento da
criança, parte da formação do psicólogo, passam a operar como a referência, já
que há a crença de que a criança deve ser poupada dos conflitos dos ex-
cônjuges.
Vejamos com mais detalhes como o lugar da criança é
concebido pela equipe do Fórum e como é feita a tentativa de retirá-la do campo
da "guerra". Em seguida focalizamos como se dá a busca por regras, por uma
regulamentação, que possa ter vigência no interior destes grupos e como o
próprio psicólogo entende sua atuação, no âmbito do Judiciário. 241

• O lugar da criança - vista como arma no duelo entre os ex-


cônjuges- e a proposta forense de retirá~Ia da "guerra"

Nem todos os processos de separação são realizados em clima


de extrema tensão. Contudo, ódio e hostilidade podem ser a marca dos
processos nos quais se requer a peritagem do psicólogo forense. Parece que este
profissional intervém quando todas as outras instâncias de negociação já
fracassaram. O espaço do Fórum caracteriza-se, portanto, como um espaço de
divergência e disputa, onde tudo o que não .foi resolvido aparece com clareza,
funcionando como uma arena de negociação possível.
No Judiciário, as crianças são vistas, pelos peritos, como o
"instrumento de vingança" que resta aos pais para a continuidade do duelo242
estabelecido pelo casal, nos casos de separação e divórcio. Os especialistas do
Fórum acreditam que muitas vezes um dos pais pode desejar a criança apenas
para retirá-la do ex-cônjuge e, posteriormente, largá-la com algum parente.
Como observa um dos psicólogos entrevistados do Fórum, podem utilizá-la
como "espada", no duelo entre o casal.
Advogados também têm esta visão. Uma advogada, na mesa
redonda Filhos do Divórcio, no "I Congresso", comenta que a criança não fica
preservada dos duelos entre ex-cônjuges:
241 Pode ocorrer, até mesmo, de ele próprio ter de responder a um processo interno, por exemplo, no caso de
não ser encontrado em seu Setor, no período determinado para suas atividades ou por outro fator que seja
considerado negligência, por um juiz. Nestes casos, pode-se vir a responder a um processo administrativo
ou, até mesmo, criminal, se for acusado de "falso testemunho", por exemplo. Ocorrências como estas,
encontram-se em andamento no Fórum.
242
Esta mesma forma de ver a questão é encontrada, ainda, no exterior. Por exemplo, a especialista
americana Florence Kaslow, em workshop no Rio de Janeiro (12 a 14 de dezembro de 1991), também
acredíta que a preocupação dos psicólogos é de tirar as crianças da guerra. Nesta direção afirmou: "Porque
nós sabemos que os prejuízos a longo prazo para as crianças, que são usadas nesta gue"a marital, são
muito sérios e que nós temos que fazer o que pudermos para conseguir evitar isso."

164
"O que acontece, como eles não querem ceder nem de um lado, nem de outro, e a lei
estabelece, de acordo com o regime de casamento, como vão ficar os bens, acontece que,
então, eles usam as crianças como meio de discussão. São pessoas humanas que muitas
vezes se esquecem que os filhos são muito importantes e que não podem ficar naquele jogo
de interesses, mas infelizmente existe. " (. ..) ''Eles que nem estavam pensando em brincar
com criança, de repente, começam a por, então: 'você não vai ver o seu filho tal dia, porque
o que eu tenho, isso não dá para eu me sustentar, então, como sou eu que estou aqui me
virando para sustentar, você também não vai vir. ' " (. ..) ''Já no divórcio destrutivo os filhos
são utilizados como componentes, como armas, instrumentos de discussões, que passam
pelo conflito do ex-casal. Se mantém a luta entre os esposos, unidos através da briga, os
filhos são tratados como objetos, parte da disputa. E a disputa pode não ter fim. " 243

A criança é, então, vista pela equipe de especialistas como


alguém que não tem direito de existir e de se expressar. 244 Seja a criança
utilizada como "espada" ou como "instrumento de vingança", ela é percebida
como ocupando um "não-lugar", pennanecendo à margem enquanto, em
primeiro plano, fica a confrontação entre homem e mulher. Na briga do casal,
deter a guarda da criança pode até representar um ganho financeiro. A criança
passa a ser a moeda de circulação. Especialistas do Fórum qualificam estas
disputas deste modo:

''A criança pode estar tanto representando o castigo que eu posso dar a alguém que me
deixou ou a criança também pode representar um poder aquisitivo melhor."(. ..) '~s vezes,
a briga da mudança de guarda não é pela guarda da criança. " (. ..) ''Essa criança pode
representar uma boa pensão!" (. ..) ''Então por aí você vê o que pode representar uma
criança."
"Geralmente a criança está sendo usada como um pretexto para se ganhar alguma coisa. ou
mesmo ganhar uma partilha de bens, ou ganhar mais vantagem em termos de pensão. ou
então obter ganhos emocionais mesmo, na vingança. "

243 Ao descrever o "divórcio destrutivo", a advogada revela uma imagem extrema sobre o duelo do ex-casal e
a utilização dos filhos como instrumento de poder na disputa de interesses: "Os processos jurídicos desse
caso tornam-se infindáveis e há uma necessidade de denegrir e ganhar a todo custo."(. ..) '~ criança é
jogada em outra rede de relações: a do mundo jurídico. Totalmente diferente daquele que usualmente
está acostumada- família e escola. Assim, a criança pode ter que enfrentar oficiais de justiça, polícia,
advogado, juiz, curador. Pode ser chamada pelo juiz para depor e isto é uma coisa que eu tenho visto
cada vez mais, na medida em que os pais não chegam em acordo. O juiz chama a criança, junto com o
curador: 'Com quem você vai ficar? Com quem você vai ficar? Com quem você vai ficar?' Dai tem que
sair uma resposta! Eu já vi inclusive situações em que o terapeuta foi junto. E o terapeuta é arrolado! E
olha que esse terapeuta tentou de tudo para não ser arrolado!"
244 Estas psicólogas do Fórum falam sobre isto através da experiência de atendimento:
'~ problemática familiar está no adulto." (. ..) ''Meu Deus, coitadinhos, eles ficam tão desesperados
dentro daquilo!" (. ..) '~ mãe está sendo entrevistada, e a criança junto com a mãe, e você diz para a
criança: ~Você gosta do seu pai?' A primeira coisa que e/afaz é voltar o olho para a mãe, para ver se
ela... como está a expressão dela para poder responder, quer dizer, ela não tem liberdade nem de sentir
amor por alguém, é cerceada no próprio sentimento."
"O que eu acho assim ... mais dificil, é quando... a cabeça da criança já está muito feita por um adulto."

165
"Uma questão meio complicada na divisão dos patrimónios, as crianças são equacionadas
a bens, também do casal. "

A idéia de crianças equacionadas a bens parece ser a forma


extrema de expressão da noção de guerra conjugal. O embate é para que bens e
crianças sejam partilhados. Nesta visão, é necessária uma luta pelo
estabelecimento de direitos e obrigações em relação aos ex-cônjuges. O perito é
visto como o especialista que busca ordenar este espaço de caos e embate. Por
meio de sua atuação espera-se a normalização da família, entendida aqui como a
preservação do lugar da criança, a sua saída do universo de luta (duelo conjugal)
e o restabelecimento do convívio da criança com ambos os ex-cônjuges. Para
tanto, os peritos imaginam que é necessária a interrupção da repetição dos
conflitos vividos no casamento (e não resolvidos), no âmbito do Fórum.
O trabalho no Fórum é apresentado pela equipe, tendo, então,
como um dos principais objetivos o de "proteger" crianças no contexto de
"guerra" conjugal. 245 Por vezes, o serviço pode ser descrito até mesmo como um
tipo de "SOS - proteção à criança". A regulamentação de visitas246 por parte dos
profissionais é parte desta tentativa de "proteger" os filhos. Deste modo, o lema

245 Vejamos, a título de exemplos adicionais, a fala de outros psicólogos, que claramente indicam este fator:
"Processo sempre tem filhos."(. ..) "É sempre em beneficio do menor que a gente ... que eles pedem isto...
para ver o interesse do menor. " (...) "0 que a gente percebe nos processos de guarda e de
regulamentação de visitas é o... a relação mal resolvida do casal, ainda interferindo na questão da
guarda e da visita dos filhos. É o mais freqüente."
·~ disputa é muito grande." (. ..) ~função dessa entrevista é justamente fazer com que eles percebam
qual é o foco da briga, que não é a criança geralmente."
Obs: O terapeuta acima diz que processo sempre tem filhos. Não se poderia dizer, porém, que isto se
aplica a todo caso, pois mesmo casais sem filhos utilizam-se do Judiciário para o embate no período de
separação. Exemplo disto é um atendimento realizado em consultório, onde, após uma briga e a saída de
casa da esposa, cada um dos cônjuges contratou um advogado e abriu um processo diferente de solicitação
de divórcio no Fórum. Durante o atendimento terapêutico os ex-cônjuges solicitavam cartas para adiar
audiências de ambos os processos (um, aberto pelo marido~ outro, aberto pela esposa}, a conselho dos
advogados, nos seguintes termos: "Atesto para os devidos fins que A e B. se encontram freqüentando
sessões de psicoterapia de casal desde _/_/_ . No momento, estamos dando seguimento ao processo
psicoterapêutica, sendo necessário o prosseguimento do trabalho por mais alguns meses. O processo de
psicoterapia do casal poderá auxiliar no esclarecimento das questões que motivaram o pedido judicial de
separação. Desta forma, acredito ser oportuno o adiamento da audiência de separação, com o propósito de
aguardar um melhor posicionamento dos cônjuges com relação ao processo corrente. Ass. terapeuta."
Acreditava-se, com isso, que se ganharia algum tempo para que o casal pudesse avaliar se a separação era
mesmo desejada. Este caso sugere uma inversão na ordem dos procedimentos mais usuais: primeiro
recorreu-se aos advogados e depois ao terapeuta de casal.
246 Há inúmeras menções às dificuldades do casal em relação a organizar as visitas. Uma psicóloga do Fórum
relatou um caso em que o processo havia sido encaminhado pelos advogados porque o pai queria ver os
filhos durante a semana. A mãe queria que isto ocorresse das 18:00 às 20:00 horas e o pai propunha que
fosse das 19:00 às 21:00 horas. A psicóloga foi, então, nomeada como perita no processo. Conta: "Eu
estava me perguntando até por que seria necessário abrir o processo para tentar entrar num acordo ou
tentar... tipo assim, acho que já estava realmente impossível conversar, não é?"
A mesma psicóloga oferece as condições para que isto não precise ocorrer: ·~ gente começa a ver que
existe uma série de dificuldades que não foram resolvidas na época da separação. Quando um casal
realmente se separa, dá para conversar a respeito de 60 minutos de uma visita."

166
geral, cantado a tantas vozes, é: crianças fora da briga! 247
E mesmo por ocasião da confecção do laudo por escrito a ser
arrolado no processo e encaminhado para o juiz, as crianças não são esquecidas.
A preocupação com elas é realmente constante nesses discursos e os psicólogos
farão as indicações que julgarem necessárias, para que se retire a criança das
disputas dos adultos e se decida pela sua melhor condição, ancorada em teorias
de desenvolvimento infantil. Deste modo, os peritos procuram auxiliar o juiz, no
exercício da lei, no sentido de reordenar o convívio entre pais e filhos e entre os
ex-cônjuges. Ao fonnularem um laudo técnico248 , fornecem elementos que serão
analisados pelo juiz e considerados por ocasião de sua decisão final.
Como explicar essa centralidade do Judiciário na criança, nos
seus direitos e na preservação de seu adequado desenvolvimento? Talvez isto
ocorra porque é por intennédio dela que se irá mapear e delimitar as fronteiras
do parentesco e o conjunto de direitos e obrigações pertinentes a cada posição
na rede. É preciso considerar que ocorre uma transformação nos vínculos da
criança, no divórcio, a partir das mudanças nas relações cotidianas da família.
As novas posições requerem novo código de ordenação. Mesmo as antigas
relações (pai/mãe) e não somente os novos elementos que se agregam,
posterionnente, no caso de novos casamentos, passam a operar sob novas
regras. É sobre estas regras que atua o Judiciário, exercendo uma vigilância
sobre os novos arranjos e tentando garantir a preservação do vínculo da criança
com os pais, como vínculos principais. Toma-se necessário, para tanto,
apaziguar a "guerra" que ameaça o lugar da criança, na medida em que ela
consome a atenção dos adultos. Atenção esta que o Judiciário deseja manter
dedicada à criança. Talvez daí advenha a concepção dos psicólogos forenses de
que as crianças são equacionadas a bens. Bens materiais (no caso do pagamento
de pensão e da distribuição da herança) e bens simbólicos (por exemplo, o
tempo e, então, o afeto que se pode ter com a criança) são organizados, por
meio do Judiciário, num sistema de direitos e obrigações entre as pessoas do
grupo familiar, após o divórcio do casal.

247 A fala deste psicólogo caminha bem nesta direção: "O que a gente consegue mui to, o que eu tenho
conseguido muitas vezes, é com que eles entendam que a criança tem que ficar fora disso e, dai, eles
passam a brigar por outra coisa." (. ..) "Eu acho que isso já é um ganho no trabalho."
248 Os profissionais preocupam-se com o destino das crianças, até na ocasião de elaborar o laudo técnico.
Vejamos o que diz esta assistente social do Fórum: '~gente faz um laudo, o laudo, o que é que é? A
cópia escrita, a documentação escrita e isto é um momento muito importante para a gente, de muita
responsabilidade." (. ..) "Porque as palavras ficam, as palavras ficam no processo. Embora o processo
seja arquivado, um dia, essas crianças que um dia foram motivo de litígio têm acesso a isso e podem
olhar para a história delas. Então isso para a gente, isso é muito importante. "

167
• A "CASA DA LEI" e a busca de regras

Sabe-se que ao Estado cabe garantir a formação e manutenção


da lei, que denomina o que é a norma. A psicologia forense, pelo trabalho de
peritagem, oferece um panorama que visa instrumentar o juiz para arbitrar e
garantir o respeito à norma. Há uma disciplinarização fundada na ciência, que
passou a incluir o conhecimento de campo específico do psicólogo. Para
assegurar a proteção da sociedade e da criança, a equipe técnica procura
instrumentalizar o juiz, no âmbito específico, que pode, por exemplo, decidir
por afastar um pai do domicílio da criança e indicar as visitas supervisionadas
pelos técnicos, no espaço do Fórum, ou decidir sobre os momentos em que o pai
(ou a mãe) deve levar a criança para seu convívio. O juiz pode, então, conceder
ou confiscar direitos e a famt1ia perde o poder mediante a certas decisões da
Justiça. Há, com isso, uma normatização da vida familiar, por meio de vigilância
e disciplinarização realizadas pela equipe técnica, expressa através da decisão
final do juiz.
Cremos ser de interesse dedicarmo-nos um pouco a pensar como
os peritos se relacionam com este espaço jurídico, pelo menos em São Paulo.
Isto porque o poder e a lei parecem permear as diversas relações neste tipo de
contexto - há uma constante discussão em tomo do que é a norma.
O clima forense mostrou-se sóbrio, formal, arisco. Tentar
penetrar no dia-a-dia do local transformou-se em uma tarefa que exigia
habilidade, uma vez que todos pareciam agir com prudência. Lá a lei se
apresentava soberana e onipresente: um passo em falso e qualquer um, até
mesmo um juiz, poderia escorregar de uma fronteira à outra. Foi preciso
"tranqüilizar" um psicólogo ansioso com o fato de sua entrevista estar gravada;
um juiz preocupado com a possibilidade de sua entrevista ser divulgada na
Imprensa; assistente social, que temia a exposição de seu nome. Uma psicóloga
alertou: "Você toma cuidado com essas coisas que estou falando!" (incomodada
com o gravador). Outra psicóloga alertou que um juiz poderia sentir-se ofendido
caso seu nome não fosse mencionado no trabalho, pois ele gostaria de aparecer
identificado nele. Esta era uma postura inversa da expressa pela equipe técnica
de apoio (psicólogos e assistentes sociais) que, predominantemente, se
importava com a exposição de seus nomes. As justificativas, para estes, eram
diversas: "Aqui no Fórum é sempre bom ter cautela"; "Algum cliente poderá ler
o trabalho e quando vier à entrevista comigo terá acesso a essas informações a
meu respeito"; "O profissional não pode dar entrevista sem autorização do
Fórum".
O espaço fisico aberto, inclusive, não propicia o sigilo,
reforçando o clima persecutório que parecia haver no local. Os profissionais,
mesmo os psicólogos, realizam seus atendimentos em ambiente sem

168
privacidade. Na sala, as entrevistas eram realizadas entre divisórias que, nem ao
menos iam até o teto ou vedavam o som. E poder-se-ia, ainda, trabalhar com as
portas abertas. Em outras regiões, a situação também não era diferente, pois
uma psicóloga entrevistada, que trabalha em Fórum na periferia de São Paulo,
contou que acreditava que as pessoas permaneciam tão envolvidas com seus
problemas que, muitas vezes, esqueciam que existiam outras pessoas que
poderiam estar ouvindo a conversa. Essa psicóloga trabalhava com um
"comissário" rondando pelo corredor.249 Mesmo um juiz expressou suas idéias
sobre o tema da entrevista e, ainda, ofereceu dados de sua vida pessoal (estado
civil, idade etc.), na presença dos demais funcionários que circulavam no local e
ao som de uma máquina de escrever. Constatamos, portanto, que a intimidade e
o sigilo que fundamentam a relação de confiança do trabalho psicológico no
consultório estão ausentes no contexto do Judiciário.
Estas observações nos levam a afirmar que o psicólogo que atua
no Judiciário parece ter se instalado em "um setting judiciário". Isto significa
que os meandros da vida íntima, ao se destacarem para o âmbito da
reivindicação dos direitos, devem expressar-se em uma arena pública. Do
mesmo modo que um casamento civil deve ser realizado com a porta aberta,
pois os procedimentos legais implicam o testemunho público do ato - caso haja
alguém que tenha "alguma coisa contra" a união, esta pessoa pode se
manifestar-, a separação, o divórcio e os confrontos familiares são tratados no
setting forense como atos públicos.
A preocupação com o sigilo é algo da formação terapêutica. O ·
código de ética do psicólogo versa sobre o direito do cliente ao sigilo. Já a lei é
pública. Os atos civis devem ser registrados publicamente e o que é dito passa a
ser tratado do mesmo modo. Nesse contexto cria-se uma contradição estrutural
para o desenvolvimento do atendimento psicológico. De um lado, os laudos
técnicos são sigilosos, porque estão pautados em uma ética da compreensão das
motivações e da suspensão do julgamento; de outro, ficam arrolados aos
processos para serem lidos, servindo de parecer abalizado para fundamentar
uma decisão judicial. O psicólogo forense ressente-se de sua falta de autonomia
e sobretudo de sua incapacidade de controlar os usos de sua avaliação na
formulação de decisões. Assim, enquanto o terapeuta familiar colabora com a
família na definição dos lugares dos parentes na rede de afetos,
responsabilidades e vínculos, o psicólogo forense colabora com o juiz na

249 Diz a psicóloga: '~ gente percebe também, quando a voz, quando a voz da pessoa se altera, você percebe
os comissários passeando por perto. " (. ..) "São pessoas que... eles são ligados ao juiz e que fazem
fiscalização fora, que a gente faz uma diligência trazer uma pessoa para o Fórum, uma entrevista, e está
por perto da gente mesmo, eles estão prontos para uma iniciativa de, de repente, levar uma pessoa a um
hospital ou está sempre ligado às crianças, cuidar das crianças enquanto a gente faz a entrevista." (. ..)
"Eles vão buscar um Jeitinho para a criança, eles vão servir uma bolacha, eu acho que o trabalho deles é
muito competente!"

169
normatização dos direitos e deveres de cada personagem nessa nova
constelação familiar.
Por intermédio dos laudos técnicos e da sentença o Poder
Judiciário normatiza a vida familiar, procurando ordenar o que parece ter
entrado em desordem, com ênfase na salvaguarda dos direitos da criança em
relação aos bens materiais e à sua posição na parentela. Como se constatou
anterimmente, toma-se inviável dissociar o psicólogo no Fórum da autoridade e
do poder de decisão do juiz, já que se sabe que o laudo final do perito será
considerado na decisão do processo, por ocasião da deliberação de uma
sentença. Este profissional, situado no espaço do jurídico, passa a ter de
manejar, conseqüentemente, variadas contradições.
Observamos que se dá um desajuste entre o repertório técnico
adquirido para o trabalho em consultório e as tarefas exercidas no âmbito do
Judiciário e suas metas. Enquanto no consultório parece haver uma maior
tolerância em relação às novas composições, procurando-se vê-las como parte
de um processo de mutação da família, no Judiciário, a visão tradicional de
fannlia parece ser a predominante. Nessa perspectiva o desvio da norma é
tratado como patologia familiar.
No contexto forense, a polaridade saúde/doença se sobrepõe à
polaridade inocente/culpado250 tomando o diagnóstico psicológico instrumento
de definição de conquista na Justiça. Na "guerra" que acreditam ter se instalado
entre os "ex-cônjuges", os pais aparecem como "doentes" ou "inimigos",
enquanto a cnança é "protegida" como personagem central deste enredo. A
criança é a moeda de circulação. O inimigo é o que escapa ao modelo previsto
para o bom desenvolvimento da criança. Juiz e psicólogo procuram codificar os
termos de paz, usando a lei e as teorias psicológicas como parâmetros da
normatização das relações.
Vejamos com mais detalhes como opera esta tensão presente no
trabalho do psicólogo forense. Dentro da óptica da disputa ou da guerra já
mencionada, uma advogada que participou da mesa redonda Filhos do Divórcio
no "I Congresso", explica que "a lei advém de uma forma de pensamento
linear", o qual insiste em que "um dos parceiros é culpado e o outro inocente".
Segundo sua óptica, o advogado vê somente um dos parceiros da disputa não se
preocupando com o outro: na verdade, ele trabalha contra o outro em um

250 Ao falar sobre a família composta em segundo ou mais casamentos, um juiz ex"j)Õe, claramente, uma visão
sobre a norma sadia. Quando lhe foi perguntado sobre os casos de divórcio "seqüencial", respondeu:
"InconseqUentes tem vários!"(. ..) "São reincidentes!" (ri) "É ... mas é normal, não é? Sei lá, tem pessoas
que se casam, não deram certo uma primeira vez, tentam uma segunda vez, também não dá certo,
separam novamente. Mas isso tem, não é muito freqiiente, mas tem. "
Mas esta posição pode ser mais atenuada com a fala de uma das terapeutas de família entrevistada, que
atua em consultório: "...pensar no divórcio como alternativa válida, não patológica e pensar nos filhos do
divórcio como os transmissores dessa idéia."

170
"sistema do adversário". Segundo a advogada, nos divórcios litigiosos, os
advogados aumentam a raiva de seus clientes em vez de diminuí-la. Assim, a lei
civil acaba por aproximar-se da lei criminal em um movimento não muito
distinto do antigo "divórcio culposo", no qual a lei procurava quem era o
culpado pela dissolução do casamento.
Se consultarmos a lei do divórcio de 1977,251 constatamos que
ela, de fato, se utiliza das categorias culpado/inocente. O artigo 10, por
exemplo, afirma que "na separação litigiosa, filhos devem ficar com o cônjuge
inocente". O artigo 52 rege que "a prisão civil do alimentante infiel pode ser
decretada tantas vezes quantas for necessária". Embora o psicólogo trabalhe no
sentido de reequilibrar a agressividade presente nas relações do ex-casal para
poupar a criança, procurando perceber o casal como um sistema conivente e
compartilhado, freqüentemente se vê envolvido pela necessidade de posicionar-
se diante da polaridade culpado/inocente. 252 Ainda que o psicólogo forense
indique a co-responsabilidade dos pais em relação à situação familiar, a lógica
do espaço forense leva, necessariamente, à definição de quem está com a razão.
A fala deste juiz253, serve-nos de exemplo:

"Toda parte que se sente lesada, de uma certa forma, procura um advogado. Este advogado
faz uma petição inicial e dá início a um processo e a outra parte é chamada e começa a
discussão em tomo daquela determinada questão. Caso não haja um acordo, o juiz vai ter
que interferir, no sentido de dar uma decisão, dizendo que quem está com a razão é aquela
ou outra pessoa. ou então, nenhuma das duas. " (. ..) "Quando se discute causa ou culpa de
separação ou divórcio. ou guarda de filhos, tem muito a parte psicológica nisso tudo. " (. ..)
''Eles normalmente vêm através do juiz, porque todos os meios de se encontrar uma solução
já se esgotaram, então eles querem que o juiz, de uma certa forma, diga com quem está a
razão."

Este depoimento indica que o lugar do juiz é de natureza muito


distinta daquele ocupado pelo psicólogo. Sua intervenção, ao dar razão a uma
das partes em disputa, acaba por legitimar sentimentos e atitudes de uma das

251 Lei nQ 6.515/77. Veja Nogueira (1996).


252Uma psicóloga do Fórum diz: "Não cabe as próprias necessidades da criança quando os pais têm litigio.
As crianças ficam realmente sem poder se expressar." (. ..) "Nunca é visto que o çasal, como um todo vai
influenciar as reações do filho, não, é sempre o outro!"(. ..) "Então não dá para a criança se expressar."
(. ..) "A partir do momento que ela se expressa, se ela se expressa para a mãe, o culpado é o pai; se se
expressar para o pai, o culpado é a mãe."
Observa-se que, novamente, a criança é vista envolvida num clima de briga e discussão entre os adultos.
Outro psicólogo do Fórum também direciona sua fala nesta mesma linha: "Uma separação legal também
é... existe um ... existe um culpado e o inocente. Então o culpado perde a guarda e o inocente ganha a
guarda. Então as crianças são vistas, são tidas como prêmios." (. ..) " 'Tá vendo, eu não fui o culpado da
separação, então eu .fico com os meus filhos!'"
253 Na descrição de suas atribuições, este juiz (atuando desde 1985) lista sua participação nos seguintes
processos: "ações de separação, de divórcio, de guarda de filhos, de menores, de mudança de guarda,
inventários e arrolamentos, anulação de casamento, anulação de testamento."

171
partes do casal. Além disso, é interessante notar que, enquanto a Terapia
Familiar procura incorporar os membros da família no processo de redefinição
dos papéis, quando os conflitos passam para a esfera do Judiciário, os próprios
envolvidos no processo passam a sentir-se marginalizados das decisões. A fala
desta cliente em consultório, do outro lado do cenário, mostra sua concepção
sobre esta experiência:

''Parece um teatrinho: todo mundo falando de sua vida e você quietinha ouvindo. Se você
be"a, você é louca. Não, você está todo o tempo controlada. É um teatro onde os principais
personagens são mudos, não falam. Quem é que fala? O juiz, os advogados, o promotor, o
escrevente. É um mal necessário. As pessoas te julgam, não chegam a uma conclusão. A
juíza, não sei o nome dela, ela leu a história e sabe tudo da minha vida e resolve: 'não
existe mais afetividade, então, vamos fazer um acordo!' Depois daquele monte de elogios!"

Observa-se, pois, que decisões que deveriam pertencer ao


campo da subjetividade são tomadas por personagens que detêm autoridade
para determinar o desfecho das situações e as regras da futura convivência. Um
dos critérios mais importantes que norteia as decisões no espaço do jurídico,
definindo quem pode o que, quando e como, é, como vimos, o da culpabilidade.
Os juízes reúnem fatos e pareceres para configurar culpabilidades, tomando a lei
como medida de avaliação das atitudes. Na falta de critérios suficientemente
claros, internos à família, para organizar as relações, as pessoas envolvidas nos
processos parecem desejar essa ordem abstraía de fora. Quem entra com uma
ação está em busca de regras.
A imagem que os peritos fazem dessas relações é a de caos.
Guerra, caos e ausência de legislação aparecem como temas marcantes. 254
Ordenar o caos é visto, então, por estes profissionais como o desafio central. E
para os necessitados e arredios o juiz pode mesmo indicar uma "terapia
mandatária"- em vez de ele dar a sentença, encaminha as pessoas para terapia
fora do Fórum. Isto levanta questões éticas e técnicas para o psicólogo, que tem
de se haver com clientes que lá estão por exigência do juiz e não por motivos
reconhecidos como próprios. A aspiração pode ser de facilitar a comunicação
entre as partes, sobre pensão, férias, guarda de filhos, tendo por critério a busca
de um arranjo o mais harmonioso possível.
O psicólogo forense opera, então, com o modelo de uma família
harmoniosa e vê sua dissolução como fracasso. Vimos, em capítulo anterior,
como terapeutas e seus clientes continuam, em geral, a trabalhar com a noção de
família nuclear. O valor da consangüinidade é o critério de ordenação da rede de
parentes, apesar das intensas transformações na vida doméstica e o tipo de
254 Vejamos o que diz esta assistente social do Fórum: "Você procura ver a família globalizada, então... o
por quê a dinâmica familiar chegou no caos... que veio para a gente o processo."(. ..) "Então por isso que
vem para a gente fazer o estudo social."

172
composição do grupo familiar terem tomado esse conceito pouco operativo.
Vimos também que o ideal de família, para estes especialistas e seus clientes,
quase sempre implica a noção de grupo solidário e harmonioso. Este mesmo
I modelo familiar monogâmico orienta, no ambiente do Fórum, a intervenção dos
peritos. A fala deste psicólogo resume esta visão:

'jf família é o elemento que agrega os indivíduos numa... com o intuito de que trocas
afetivas aconteçam, de que uma formação afetiva e até de valores e princípios morais... A
família é a célula onde isso acontece dentro da nossa sociedade. Depois vem a escola e
outras coisas, mas a família ainda é o motor disso tudo. principalmente, no que se refere à
afetividade. " (. ..) ''E eu sinto que, ainda hoje, por mais que se fale em crise na família, crise
no casamento, ainda é a única instituição que, de uma maneira capenga, dá conta disso. "
(. ..) ''Entendendo família como pai. mãe e filhos. "

Ao contrário do campo da Terapia Familiar que, muitas vezes,


vê positivamente a dissolução de um casamento conflituoso, no espaço forense a
separação é sempre tratada como um fracasso 255 , uma vez que o objetivo últimO
parece ser o de manter o grupo unido pela descendência consangüínea. Na visão
destes peritos, o conflito emocional é sempre percebido na chave da disputa de
direitos o que, por definição, representa a desagregação das relações; o que as
pessoas buscam no casamento e na constituição de uma família é representado
como o amor, existindo de maneira plena, sem ambivalências. 256
Nesta perspectiva, conflitos e discussões são percebidos como
nocivos e não como parte integrante da experiência conjugal ou grupal, nem da
experiência amorosa - o que sugere uma visualização do amor como uma cena
de completude. Onde ele está não há disputa, nem conflito. Ele é o elemento
fundamental para a constituição de uma família sadia.
É interessante notar que, na rotina do atendimento forense, o
psicólogo está constantemente lidando com relações em que as partes já
romperam a comunicação e o entendimento. Nesse contexto não é possível
pensar positivamente o conflito já que ele é a própria demonstração do estado
patológico das relações.
Nas entrevistas realizadas no Fórum foi possível observar que os
profissionais percebem seu papel como sendo capaz de restabelecer um mínimo
de comunicação entre as partes de modo que produza negociação e acordos. O
casal sadio é "aquele casal que não pira junto!"; "que tem condições de
conversar"; "uma família bem constituída é aquela onde há união, harmonia,
255 Segundo o mesmo profissional, recém-citado: "Constituir uma nova família depois de um casamento
fracassado, apesar de ser uma coisa difici/, é sempre um ganho. No seguinte sentido, de que você ... você
tem de novo, você se dá de novo a oportunidade de elaborar aquele fracasso, de não naufragar de novo."
256 Uma psicóloga do Fórum diz: "É sempre isso, onde a criança está super dividida, onde as pessoas estão ...
onde os pais se colocam brigando e aquela disputa parece que não há amor, porque se fosse amor, não
haveria disputa!"

173
L -.

confraternização e busca entre todos aqueles membros de um bem comum." Os


depoimentos, em geral, convergem nesta direção, independentem~nte do cargo
técnico: juiz, assistente social ou psicólogo. O desacordo leva as famílias ao
Fórum porque representa um estado de desagregação patogênico das relações
no qual, segundo os peritos, a argumentação entre as partes se torna inviável. 25 7
Portanto, quando a briga chega no Fórum, em geral, ela já é percebida como
patologia. 258 Assim, o juiz, auxiliado pelo psicólogo, percebe o seu papel como
o de um mediador que toma possível um contrato: no caso um contrato de
separação.
Como os depoimentos vistos sugerem, o espaço do Fórum pode
ser sentido como o lugar onde se define os parâmetros do pacto familiar. 259 A
norma é a busca de mediações para o conflito, objetivando a harmonia e a
pacificidade nos vínculos. 260 Para obtê-la, procura-se quem represente a
autoridade e possa apaziguar a tensão. O profissional do Fórum constrói para si
um lugar de autoridade exterior à família - isto é, não legitimado pela relação de
consangüinidade - garantido pela capacidade que os clientes acreditam que ele
tem de conceder ou retirar, punir ou premiar, ou mesmo oferecer continência à
sensação de desamparo, de falta de domínio sobre a situação ou de alguém que
possua seu controle. 26 1 Na visão dos peritos sobre as famílias que procuram o
Fórum, as pessoas estão em busca de uma instância que possa utilizar o poder e
operar como uma autoridade de outra natureza, já que na esfera doméstica ela
não é mais capaz de se constituir.
As negociações que se realizam no espaço forense constituem
um jogo de poder no qual o psicólogo ocupa uma posição chave. Assim ele não
é apenas um segmento neutro nas negociações entre as partes, mas, muitas
vezes, constitui-se no instrumento direto do acordo. O perito ajuda o juiz a
produzir a verdade sobre o sujeito em disputa: os inocentes, em geral vítimas,
são a "parte boa" nas relações; os culpados são os desequilibrados e/ou doentes.
257 Assim pensa este juiz, ao falar sobre a tentativa de conciliação ou de fazer uma separação "amigável" e
não "litigiosa": "Então eu acho que esta é a maior dificuldade do juiz no meu modo de ver. Ele vai fazer
eles se tomarem juiz de sua própria causa, eles procurarem uma solução que agrade tanto a um quanto
ao outro." (. ..) "E eu, graças à Deus, eu tenho conseguido um grande número de acordos, ou seja, tenho
conseguido transformar muitas separações litigiosas em amigáveis."
258 A fala desta assistente social é direta neste sentido: "Olha, realmente é um trabalho árduo!"(. ..) ''Muito
árduo, porque você trabalha com a patologia em si, uma grande patologia." (. ..) "Os problemas são
muito graves!"
Diz também um psicólogo: "Bem, dentro da área psicológica, o processo jurídico é visto como mais um
sintoma de uma dinâmica familiar que não vai bem."
259 Os artigos 15 e 16 da lei do divórcio nº 6.515 de 1977 afirmam que "a guarda deve ser disciplinada".
Consulte Nogueira (1996).
260 O tema da mediação no divórcio foi destacado no "II Congresso", quando alguns argentinos também
apresentaram trabalhos já realizados e, nesta ocasião, mesmo um livro sobre este tema foi lançado. Veja
Haynes (1996).
261 Nesta linha, diz uma psicóloga do Fórum: "Então, alguns buscam intervenção externa, um terceiro, no
caso o Poder Judiciário, na figura do juiz."

174
Cabe ao psicólogo forense ver através das aparências e das manipulações do
cliente as verdadeiras intenções.
Uma psicóloga do. Fórum comenta as estratégias utilizadas por
ex-cônjuges para manipular os esforços em tomo dos seus próprios interesses.
Um cônjuge, por exemplo, pode ir à entrevista bem maltrapilho "para tentar
conseguir um aumento de pensão alimentícia" e para "mostrar como o ex-
cônjuge destruiu sua vida" por ser muito mau; ou então muito bem vestido, para
deixar claro "como ficou bem após a separação".
Ao contrário, pois, do terapeuta familiar que se representa como
um mediador das significações, destituído de poder, o perito forense percebe
que detém um poder de intervenção na rotina cotidiana das pessoas. No seu
parecer técnico, o psicólogo pode sugerir que as visitas sejam realizadas,
inicialmente, nestes plantões, indicando este tipo de enquadre para o vínculo
pai/mãe/filho. Uma assistente social do Fórum fala sobre os plantões:

''Nós temos um plantão de sala de visita"(. ..) "onde estão aqueles casos... os quais são
difíceis. Que é muito difícil o pai ir buscar a criança em casa para levar para passear ou
para visitar, não existe mais condição nenhuma de ter um conta/o entre o ex-marido e a ex-
mulher. Então existe esse plantão na sala de visitas. " (. . .) ''Sempre de final de semana, um
plantão a cada 415 meses. " (. ..) "Sempre com a determinação judicial. " (. ..) ''Porque não
existe mais condição daquele pai, daquela mãe" (. ..) "estarem tête-à-tête, frente-a-frente,
o
mesmo que só para entregar filho, sabe, já foi ameaça de morte, ameaça de brigas na
frente das crianças, e tal, aquela situação bem catastrófica mesmo. "

O parecer técnico final tem grande peso na decisão judicial, uma


vez que é encaminhado para a análise do juiz e fica arrolado no processo. Na
verdade, o perito dissocia seu trabalho da idéia de poder e autoridade. 262 Duas
psicólogas do Fórum expressam bem essa percepção:

''Aqui as pessoas... entram em contato com a gente através de uma determinação judicial.
Gostando ou não de mim, me achando ou não simpática, terá que ser atendida por mim. e
ela vem aqui para provar que o que ela está dizendo é verdade e que ela é melhor que o
outro."
''Nós temos sim um poder, estamos numa instituição de poder, a pessoa não quer vir, eu
posso mandar intimar. "

O que é interessante observar nesse contexto é que, apesar de


sua fonnação e de continuar operando na gramática da saúde/doença, o
psicólogo de fanu1ia não é chamado a intervir neste espaço como terapeuta. A
visão sobre o próprio trabalho, por parte dos psicólogos, oscila entre colocar o
profissional no lugar de um observador responsável por uma avaliação e/ou de
262 Uma assistente social foi muito direta em relação a esta questão: "O parecer da gente, meu, no caso, tem
ajudado na elaboraçilo da sentença. "

175
alguém normatizador. A título de exemplo, vejamos estas afirmações de dois
psicólogos e, em seguida, a de três assistentes sociais, todos das Varas de
Família, do Fórum:
''Nós somos contratados para fazer uma perícia. uma avaliação. Então o nosso trabalho
não tem nenhuma finalidade terapêutica. Não é uma terapia breve, não é um trabalho de
terapia familiar. " (. ..) "Ou seja, a gente é pago para avaliar. "
"O jurídico precisa de mais elementos, precisa de outra visão para estar elucidando. "
''É um pouco frustrante porque você detecta o problema, mostra o problema, dá a
devolutivo para a família e encerra. " (. ..) ''Não a tua, porque realmente não é o que... o que
é pedidn no Tribunal. O Tribunal pede que você jaça uma leitura da família hoje e um
histórico da família, porque ela chegou nessa situação e como você vê essa família hoje. "
''A gente não vai trabalhar o conflito, a gente só vai detectar o conflito. "
''Nosso trabalho é basicamente judicial. " (. ..) ''Não envolve tratamento. Então... a gente faz
estudos. diagnostica e até propõe alguma coisa para que beneficie aquele grupo familiar,
ou pelo menos as crianças que estão envolvidas. " 263

Tomando esses discursos no seu conjooto, observa-se que a


perícia é definida não com finalidade terapêutica, tendo o objetivo de
tratamento, mas como uma avaliação que instrumentaliza o jurídico, oferecendo
uma "outra visão". Os peritos entendem que no Tribooal não se atua sobre o
conflito, mas trata-se apenas de detectá-lo. O objetivo é informar o juiz sobre a
condição psíquica específica dos componentes do grupo da fann1ia. A tendência
de se colocar como um tipo de avaliador, atrelada à proposta de um diagnóstico,
desloca a noção de saúde e de doença para outro campo: as noções de saúde ·e
doença mesclam-se, de forma mais velada ou declarada, ao código da Justiça
que opera com a noção de culpado e inocente. Os próprios psicólogos associam
seu trabalho à função de avaliação na Vara da Família com o da Vara Criminal,
acreditando que esta impregnou-se da mesma lógica do trato com o crime. O
trabalho na Vara de Família impregna-se assim do mesmo referencial
fiscalizador2 64, que está na Vara Criminal. Comentando este estilo diz um de
nossos entrevistados:

"Então o psicólogo vem para detectar quem é o culpado da separação. Agora, no momento
que a gente tem essa preocupação, essa compreensão mais psicanalítica dn processo, ª
263 De outro lado, outra psicóloga. referindo-se ao casal, dá uma idéia de indicação de direção, de sua
intencionalidade. Diz: "Quando a gente observa qualquer coisa, a gente vê o menos ruim, não é o que
está ótimo, é o menos ruim, e este menos ruim a gente tenta trabalhar no sentido de esclarecer algumas
coísas, esclarecer durante a entrevista, fazer algumas colocações para clarificar para ela como ela está,
ou ele, como ele está se portando naquela situação."
264 Um psicólogo conta que na área criminal, o psiquiatra é chamado para avaliar o indivíduo e diz: "O

psíquíatra não vem aquí para aplicar remédios nos detentos." (. ..) "Ele vem para ver se o cara é louco ou
não, se ele cometeu o crime porque ele é louco ou não. "

176
gente passa a mostrar que não existe culpado ou inocente. que o que existe é um casal que
11
se separou. ''Então, dessa maneira, não existe um culpado ou um inocente, o que existe
(. • •)
11
é um casal que está num comum acordo ou num comum desacordo.

Culpado x inocente, acordo x desacordo, o embate com estas


polaridades parece estar sempre presente na atmosfera forense e passa a ser
parte integrante do trabalho do psicólogo.
Por meio de um processo diagnóstico, de uma avaliação ou de
um estudo de caso, o psicólogo forense oferece elementos para que o juiz
arbitre decisões que, anterionnente, eram do âmbito do grupo da família. A
atuação do psicólogo e do assistente social está regulamentada em provimento e
portarias das autoridades judiciárias e no "Estatuto da Criança e do
Adolescente",26s onde se diz, no artigo 151: "Compete à equipe inter-
profissional, dentre outras atribuições que lhe forem reservadas pela legislação
local, fornecer subsídios por escrito, mediante laudos, ou verbalmente, na
audiência, e bem assim desenvolver trabalhos de aconselhamento, orientação,
encaminhamento, prevenção e outros, tudo sob a imediata subordinação à
autoridade judiciária, assegurada a livre manifestação do ponto de vista
técnico."
Observa-se, então, que a partir dos novos dilemas surgidos na
família, com o aumento dos divórcios, a instância judiciária regula a vida
familiar, numa tentativa de neutralizar padrões indesejados -por exemplo, o que
aqui foi chamado por "guerra" entre os (ex-)cônjuges, que os peritos acreditam
prejudicar o desenvolvimento da prole.
· Assim, impõe-se um tratamento moral, por uma autoridade
coercitiva, em que a regra central é: crianças devem ficar fora da briga, a
inf'ancia deve ser preservada e o valor da consangüinidade deve continuar a
orientar a distribuição dos direitos e obrigações, atribuídos aos papéis das
diversas posições no grupo da família. 266 O próprio nome perito, utilizado para
denominar a equipe técnica, composta por psicólogos, assistentes sociais e
curadores, denota uma atuação legisladora. Refere-se à perícia, em geral, para
denominar uma vistoria ou exame de caráter técnico e especializado.
A técnica e o estilo de escrita podem variar, mas o laudo sempre
é composto de elementos que pretendem instrumentalizar o juiz na deliberação
do processo. Mesmo o discurso que procura apenas descrever dados de
observação sobre a família indica rumos a serem tomados, pois existem sentidos
embutidos nas afirmações realizadas e no tipo de dado selecionado para o
conteúdo do relato. Em qualquer caso, toma-se inviável dissociar-se a prática e

265 Consulte Cury e cols. (1992: 453).


266 O Estado passa a encarregar-se disto. Assessorando o juiz em deliberações, ao oferecer um laudo técnico,
os psicólogos instauram uma nova modalidade de atuação: a de participação nos processos forenses.

177
a produção do psicólogo forense da atividade decisória do juiz. 267

***
Cabe lembrar que não é intenção desse texto esgotar a
problemática específica do papel do psicólogo de família no Fórum. Tentamos
apenas assinalar alguns dos dilemas com os quais peritos se deparam e como
eles percebem as contradições inerentes a sua atuação.
Embora as mudanças na composição familiar tenham feito
emergir no Fórum um novo tipo de perito - o psicólogo forense - capaz de
trazer novos elementos de julgamento para o juiz, o modelo básico com o qual
este trabalha é ainda o de família nuclear. Este modelo aparece, às vezes,
explicitamente - como no caso das audiências propriamente chamadas de
"conciliação"-, e às vezes indiretamente- como no caso das regulamentações
de visitas, buscando a integração dos filhos às novas casas ou às novas farrn1ias.
Assim, com base nos parâmetros da família nuclear, os peritos
do Fórum (sobretudo os psicólogos e assistentes sociais assessorando os juízes)
ajudam a seu modo a família a ressignificar a experiência do casamento, a sua
dissolução e a composição de novos arranjos familiares. Além disso, acabam
por exercer também uma função normatizadora, já que se apóiam num conjunto
de regras que regulam a vida familiar por meio da decisão judicial nos
processos. O objetivo de pôr fim à "guerra" do ex-casal, "proteger as crianças",
legislar o "caos" e desligar a família do ritual do judiciário é exemplo disso. Não
somente se trata de "observar" "avaliar" ou "mediar" mas de nonnatizar o
' '
sistema familiar pelas sugestões realizadas ao juiz, via peritagem.
O juiz e seus assessores se vêem trabalhando em prol da criança,
almejando "protegê-la" na disputa pelos bens e pela guarda, tentando pôr fim ao
que entendem ser uma "guerra", tirando-a da posição de "arma" entre os ex-
cônjuges. Ao fazê-lo, porém, decidem sobre a família, concedendo ou retirando
direitos. Deste modo, acabam se tomando parte integrante de um universo que
visa preservar a organização familiar e promover a integração dos filhos nesta
organização, como que adaptando o modelo nuclear às novas condições, tnas
buscando, paradoxalmente, mantê-lo. Neste contexto, a família sadia é, com
freqüência, vista como harmoniosa e, sua dissolução, vivida como um fracasso.
Assim, o Fórum é concebido pelos peritos como o continente em que o ritual de
conciliação ou de separação é consumado.
267 Robert Castel (1978: 143) tratou da expropriação da autonomia de decisão do indivíduo submetido, por
exemplo, a uma perícia psiquiátrica. Diz: ·~ delegação de poder faz parte da própria definição de
perícia. Através de um raciocínio de estilo técnico ou científico, toma-se uma decisão, que diz respeito a
um terceiro e que irá doravante selar seu destino."

178
Todos os envolvidos nos processos que passam pelo Fórum
(desde os peritos a seus clientes)268 parecem estar procurando identificar e
estabelecer os parâmetros da ordem ou desordem. Estes novos peritos ao
atuarem sobre a família ajudam a constituir uma versão sobre ela.
Cabe lembrar que o psicólogo introduziu-se nas Varas de
Família, no Fórum, ao mesmo tempo em que nasceu o ensino da Terapia
Familiar no Brasil. Na época, psicólogos que viajavam para o exterior em busca
de formação na área específica da Terapia Familiar articularam os primeiros
grupos de especialistas com atuação em consultórios e Universidades,
oferecendo inicialmente formação por meio de supervisão de atendimentos e de
grupos de estudo.
Diante da intensa mutação da família, o Direito ancorou-se na
Psicologia, para que esta lhe desse subsídios técnicos, já que é a especialidade
que estuda o desenvovimento psíquico humano e, portanto, o desenvolvimento
infantil. Em tomo da criança, que na percepção dos psicólogos foi equacionada
a um bem, condensam-se os interesses emocionais e materiais dos adultos. 269
Instalou-se uma disputa pelos direitos sobre ela e sobre os recursos que dela
podem advir. Sendo a criança a "moeda de circulação", o juiz e a lei devem
codificar e regulamentar o espaço de acesso a ela.
O psicólogo, ao elaborar seu laudo, envolve-se nuina
contradição: preparado, também, para tratar, não pode fazê-lo. Deve avaliar
para que o juiz decida quem é sadio ou inocente e quem não o é. Seu
diagnóstico permitirá a decisão sobre quem terá que tipo de direito e dever
sobre a criança. Peritar é, portanto, auxiliar no processo de normatizar. Na arena
de negociação do jurídico definem-se, dentre outros elementos, as hierarquias
diante da criança, a distribuição do tempo e do espaço destas relações,
padronizando-as. Deste modo o juiz, assessorado pelo psicólogo, procura
codificar os termos de paz.
No processo de fornecer elementos para auxiliar o juiz a julgar,
o psicólogo forense vive a ambivalência de seu papel, permanecendo com as
teorias psicológicas e de desenvolvimento, de um lado, que supõem a suspensão
do julgamento moral das emoções, e de outro, acabando por sucumbir à lógica
forense que opera com as noções de culpa e inocência.

268 E até funcionários, como no caso do "comissário".


269 Como visto, nos relatos de psicólogos forenses, acreditam eles que ficar com a guarda de uma criança
pode significar a obtenção de uma vingança ou de uma pensão alimentícia mais alta etc.

179
CAPÍTUL06

NOVAS ESTRUTURAS DE PARENTESCO,


"
GENERO E ALTERIDADE

No momento wn olhar
Penetrando através da pele
através da razão, da jWJção.
Caminha por todos os poros,
frações de segundos,
corações fecWJdos.
Paraliso.
E tremem as pernas como aviso.
No momento, inexistente tocar.
O corpo não se despe.
Não há um gozo que se veste,
mas as vestes de meu gozo.
Excitação pelas mãos do teu olhar,
donde não brota o semem pró findar
nem o gemido do quase gritar.
No momento, no êxtase do olhar,
houve a fecWJdação.
Não do óvulo; do coração.
Não cresce o ventre, mas a pulsação.
Engravido.
E nesse estado não há espera, nem dor.
Prepara-te meu peito, pois o nome do teu embrião
,
e amor. ..

Poema de uma cliente em psicoterapia.

O amor neste poema é apresentado como uma fecundação do


coração que sugere um sentimento de plenitude, já que não há espera, nem dor.
Esta imagem da experiência conjugal de completude, embora não explicitamente
manifesta nas narrativas dos clientes em terapia permanece subjacente ao
discurso dos cônjuges, sobretudo na fala das mulheres.
Ao lado do reconhecimento de que o amor pleno possibilitado
pelo perfeito encaixe das personalidades não passa de uma utopia, quando as

180
diferenças emergem na vida do casal, há uma constante cobrança de que o outro
possa corresponder às expectativas, possa preencher perfeitamente tudo que
dele se espera. Constatamos com freqüência a grande dificuldade que é para os
cônjuges ter que lidar com as diferenças de visão de mundo.
Diante das inúmeras imprecisões quanto ao papel de cada
indivíduo nos vínculos conjugais e familiares e dos conflitos gerados pelas
novas composições de família e suas respectivas redes de parentes, cada vez
parece mais distante a possibilidade de se concretizar o amor do ideal
romântico. A terapia de casal e família parece ser percebida pelos clientes como
o veículo através do qual se obteria o estado de plenitude propiciado pela
relação harmoniosa e isenta de conflitos. Mas também os terapeutas
compartilham essa visão.
O discurso de muitos destes especialistas sugere a idéia de que a
terapia está a serviço da solução de conflitos e da diminuição ou suspensão do
sofrimento. Além disso, cabe lembrar ainda que o próprio terapeuta de fanulia
opera com uma noção de grupo solidário, harmonioso, no qual não há lugar para
idéia de confronto. Essa percepção é, na verdade, bastante generalizada, como
vimos ao final do capítulo 3. Ela está amplamente presente na mídia, que
incorpora estas imagens, associando o consumo doméstico a essa felicidade
harmoniosa da família.

• Amor romântico e as novas composições familiares

Podetnos perceber que, apesar das profundas transformações da


rede familiar, a idéia do amor romântico, tão bem trabalhada por autores como
Nobert Elias (1993), penetrou profundamente no pensrunento ocidental e
representa o modelo de referência para a família atual. Um certo ideal de
felicidade, baseado no amor romântico faz parte da expectativa dos clientes que
buscam uma solução para suas crises familiares e, muitas vezes, também esse é
o referencial com o qual trabalham os especialistas no processo de ressignificar
os laços da rede familiar.
O amor de tipo romântico surgiu na Europa da Idade Média
como parte integrante do conceito de cavalheirismo. Naquele contexto, o
cavalheiro adorava mna dama de alta linhagem e procurava atendê-la em toda
circunstância e quaisquer que fossem os esforços necessários para tanto, isto é,
mesmo arriscando sua vida. Na época, este tipo de amor estava desligado da
idéia de casamento, que era negociado pelas famílias. Podia ocorrer, portanto,
que a musa runada pelo cavalheiro fosse casada com outro e que o cavalheiro
nunca chegasse a conversar pessoalmente com sua amada. A imagem de amor

181

romântico que chega aos nossos dias conserva as características de ser um amor
desinteressado, integral e perfeito. O amor do cavalheiro era demonstrado
através de poemas e canções, cujos temas falavam de perfeição. O trovador não
esperava de sua amada um reconhecimento ou uma expressão de afeto em troca.
O cavalheiro idolatrava sua musa, chorava, sofria e podia até morrer de tanto
amor. Deste modo o amor romântico realizava-se pela idolatria.
Dado o âmbito deste trabalho, não nos cabe recuperar os
caminhos materiais e simbólicos que tomaram possível a permanência e a
vitalidade dessas representações, apesar das profundas transformações pelas
quais passaram as relações amorosas e o casamento desde então. No entanto,
nos parece importante assinalar que o modo como esse ideal amoroso organiza
as escolhas afetivas traz para cliente e terapeuta dilemas de dificil solução.
A conquista do divórcio fundou-se basicamente na idéia de que
o casamento é uma instituição cujo fundamento é a escolha livre dos parceiros
em função do sentimento amoroso que os une. Sendo o amor o compromisso
maior desse contrato, quando ele desaparece o laço pode ser desfeito. A
possibilidade do divórcio e da contração de outro casamento viabilizam,
portanto, no plano institucional, a aspiração ao casamento amorosamente
perfeito e feliz.
Entretanto, o ideal de felicidade amorosa e familiar que
impulsiona novos casamentos entra em contradição com as composições de
família resultantes dessas uniões sucessivas; composições estas que, de um lado
fazem emergir frustrações e demandas que revelam a distância insuperável entre
a relação afetiva real e o modelo de amor esperado e, de outro; introduzem na
experiência cotidiana do casamento uma desordem que não pode ser contida no
ideal de hannonia e coesão familiar.
Como mostramos no capítulo 3, as queixas dos clientes nas
entrevistas que realizamos expressam bem essa faceta narcísica e onipotente270

170 Esta cliente expressa o aspecto onipotente nas relações farrúliares. Ao comentar que o filho quer ser super-
homem e homem-aranha, diz: "Com os pais que tem... a gente também é muito onipotente! Gosta de
coisas muito diflceis para a maioria da humanidade. Quer fazer tudo ao mesmo tempo, estar em todos os
lugares, trabalhar mais do que pode, ter mais filhos do que pode. (ri)"(. ..) "Fantasia bem onipotente! Um
dia de 24 horas para a gente não dá, o dia tinha que ter 50 horas!"
A mesma mãe relata a cena de ida ao Hospital para levar bebê doente. A médica infonna que o bebê estava
com pneumonia e a mãe sente-se desesperada. Pensava: "O meu bebê Johnson, idealizado, saudável,
incrível, lindo, maravilhoso, fofinho, gordinho? Com pneumonia!!!?"
Conta que a pediatra pediu-lhe que se acalmasse, dizendo que o nenen precisaria dela; que fariam
inalações três vezes ao dia e ele melhoraria. No carro desatou a chorar e o outro filho ficou nervoso. Ela se
perguntava: "Porque aconteceu comigo? O que será que eu fiz de errado?"
O marido comenta que sentiu que tinha que ser pai de todos. Diz: "Constrói, constrói, de repente uma
coisinha derruba tudo! Passa uma mosca e derruba todo o contexto, só o zumbido fica. O zumbido na sua
insignificância derruba o castelo."

182
das relações amorosas contemporâneas. Esse amor ideal estimula uma projeção
constante do eu na figura da pessoa amada, tomando insuportável a percepção
das limitações e fraquezas do outro. Essa relação especular e narcísica lida mal
com as diferenças, embora muitas vezes exista no casal um esforço para
compreendê-las. Constatamos que a frustração é grande quando o indivíduo se
dá conta de que o parceiro é diferente e não poderá corresponder à imagem
idealizada que faz dele e que só encontra dentro de si mesmo. 271 A busca desse
amor ideal que, cabe relembrar, legitima os casamentos sucessivos,
paradoxalmente, acaba por tomar cada vez mais inacessível o modelo de grupo
familiar almejado.
Numa avaliação extrema desta tendência, podemos arriscar dizer
que, com o advento do divórcio, este aspecto romântico ainda presente no nosso
imaginário foi canalizado para um certo "consumo de parceiros"- o desejo de
completude e/ou perfeição leva ao movimento de substituição do outro. Com
isto, ao invés do indivíduo ser auxiliado a lidar com os limites que a realidade e
a vida psíquica impõem, estaria sendo estimulado pela sociedade a enredar-se
em uma sucessão de parceiros "substituíveis", em busca do arranjo pleno e
perfeito. Não podemos esquecer que toda a área da publicidade nos convida a
consumir produtos que vão sendo trocados por melhores ou que se esgotam e
precisam ser repostos. Como na sociedade de consumo se troca tudo facilmente,
porque não, então, um câmbio de parceiros? Esta "solução" poderia parecer
mais simples ao homem moderno, intolerante com os conflitos, do que o esforço
de lidar com as emoções que afloram nos vínculos que estabelece com as outras
pessoas e do que o manejo dos conflitos advindos dos novos arranjos.
As novas estruturas de parentesco trouxeram novos arranjos que
são, em geral, sentidos como mais complexos e, por muitos, até como tnais
desconfortáveis, tendo em·vista que se objetiva, a cada novo casamento, reeditar
o modelo consangüíneo ideal272 : pai, mãe e filhos consangüíneos. Os novos
arranjos parecem, então, progressivamente distanciar homens e mulheres

2 71
Observe o aspecto da exigência e intolerância presentes' neste diálogo de um casal:
Ele: "O oposto do que eu acho que no caso eu exigiria, se comporta diversamente, opostamente do que
eu pretendia, o oposto do que eu acho que seja... "
Ela: "Todas as situações ele tem uma observação para fazer do meu comportamento. "
Ele: "Quando a gente briga, marca mais do que quando acontece algo bom. "
272
Sobre a aspiração a um tipo de família ideal observe estas afirmações de Da Matta (1987: 125/130), que
entende que a família não é somente uma instituição, mas também um valor: "Há uma 'escolha' por parte
da sociedade brasileira, que valoriza e institucionaliza a família como uma instituição fundamental." (. .. )
"Possuir uma família completa, então, é um valor no sentido que revela uma forma de sucesso ou de
superioridade social." O autor acredita que o modelo patriarcal permanece no sistema, como uma forma de
revelar sucesso e domínio, para a classe média alta. Mesmo uma terapeuta de família se utilizou do termo
"família intacta", o que pode sugerir que tal família ainda não se desorganizou. Em geral, o que está
intacto, não foi alterado ou danificado.

183
contemporâneos das metas ideais almejadas.
Vejamos com mais detalhes algumas das características
presentes nessa representação contemporânea do amor romântico.

a) O mito da "alma gêmea" ou da "cara-metade"


O aspecto romântico do desejo de plenitude presente e operante
no imaginário de nossos entrevistados pode ser constatado em seu discurso, no
qual se percebe uma complementaridade, de preferência automática e integral
no parceiro - apesar do reconhecimento de que há um aspecto idealizado neste
procedimento.
As matérias publicadas pela imprensa, que no geral está em
sintonia aguçada com os desejos mais íntimos e as expectativas do público,
expressam essa aspiração de completude através de noções como "alma gêmea"
e "cara-metade". Um olhar mais sistemático sobre essas matérias nos permite
perceber a recorrência dessas imagens, sobretudo em revistas direcionadas a
adolescentes. (Veja Anexo 26). O número de lançamento da revista ENCONTRE,
dirigida a .adultos, teve como principal propaganda em outdoor a seguinte frase:
ENCONTRE- a revista para você encontrar a sua outra metade. (Veja Anexo 27).
Monica Buonfiglio (1996), autora de diversos livros de esoterismo, ao publicar o
livro Almas Gêmeas, fez surgir o comentário de que pessoas estavam se
separando para procurar a alma gêmea, ao acreditarem na- 'idéia que o livro
defende. Cabe lembrar que a emergência de livros de grande mercado, em geral,
reitera a imagem de senso comum para uma grande massa de leitores.
Outras expressões próximas a de alma gêmea são também
bastante conhecidas: "cada panela tem sua tampa"; "cada pé torto tem seu
chinelo velho"; "a outra metade da laranja" e assim por diante. Essas expressões
têm em comum a representação de que a união marital é um encaixe de duas
peças diferentes, com funções opostas, mas que se encaixam perfeitamente,
constituindo uma totalidade funcional. Esta noção de encaixe perfeito273 ,
presente no discurso do senso comum, no dia-a-dia das pessoas, também está
presente no discurso dos veículos de comunicação de massa, como: jornais,
revistas e sistema de televisão.274
Esta forma de entender a relação amorosa275 , aliada aos novos

273 Este tema, naturalmente, não se inscreve apenas na realidade brasileira, mas é observado também em
outros países. Para que se constate isto, basta focalizarmos termos equivalentes em outras línguas, por
exemplo: sou/mate, em inglês; âme gémelle, em francês; bechert, em hebraico.
274 Mesmo no discurso religioso este aspecto pode aparecer, por exemplo, na idéia de que homem e mulher
"serão uma só carne". Nisto está a idéia de que dois serão um.
275 É possível encontrar falas de clientes sobre a concepção de "alma gêmea" e a idéia de que o outro é a
(continua)

184
valores e dilemas que emergiram com as famílias constituídas após a legalização
do divórcio e o aparecimento de novas composições, gerou inúmeras
contradições. Busca-se o que não se pode encontrar. O que se pode encontrar
permanece muito longe da fantasia idealizada do encaixe perfeito com a "alma
gêmea". Esta cliente, em terapia de casal, manifesta isto:

"Essa relação homem e mulher é mais complexa do que parece. Eu imaginava confiança e
intimidade. Esta coisa de competição, inveja, disputa, poder, não pus no casamento! Se
disputa poder, amor dos filhos, o que se vai poder comprar, poder do dinheiro, status
social, cultural, quem estudou, quem não estudou, estou sentindo mais ela [a competição].
Tudo é fantasia, de que ele é meu colaborador!"
Em outro momento: ''A gente não se relaciona com o X e Y reais, mas a gente está se
relacionando com o que o outro não é, não tem e não faz!"

As frustrações advindas dessa impossibilidade da relação


conjugal constituir-se na unidade imaginária perfeita pode ser uma das razões da
grande insatisfação com o casamento, conforme apontado por pesquisas
recentes. Uma pesquisa do IBOPE de 1995 276 mostra que, na cidade de São
Paulo, por exemplo, 74% das mulheres se decepcionam com o casamento. (Veja
Anexo 28). ·Este descompasso entre o que se espera do vínculo conjugal e o que,
de fato, se pode viver nele é constantemente mencionado no atendimento a
casrus.
O tema da completude é complementar a outra representação
não menos importante: a do príncipe encantado. Para que a unidade primordial
se realize é preciso encontrar o parceiro perfeito.

b) "Príncipe e Cinderela" - representações desadaptadas


O trabalho de Moraes (1994) sobre o casamento mostra coino as
mulheres ainda sonham com príncipes. O título de sua obra é sugestivo: Sapos
não viram príncipes, em alusão à estória na qual a moça se casa com um sapo,
mas tendo superado, através do amor, o horror presente naquela imagem de
feiúra e imperfeição, revela, pelo beijo, o príncipe escondido atrás da forma do
asqueroso animal. A pesquisa fala sobre a idealização do casamento e o
sentimento de frustração com o mesmo quando decorridos alguns anos de
convivência. No resumo presente na abertura de seu trabalho, Moraes afirma:

metade complementar. Vejamos estas frases de pessoas diferentes: "O oposto da alma-gêmea é a cópia
xerox. "; 'j4 X ... é o meu negativo. "
276 ffiOPE - Instituto Brasileiro de Opinião e Estatística. Pesquisa realizada em 6 regiões metropolitanas, em
todos os níveis sócio-econômicos (camadas de A a E), com pessoas de idade a partir de 16 anos, de vários
níveis de instrução (primário até superior).

185
"Os dados revelam que as mulheres procuram um parceiro amoroso inteligente,
culto, que saiba partilhar sua vida com ela, suas fraquezas e conquistas, que seja
fiel e se disponha a uma certa permanência nas relações sem, no entanto,
assumir o controle da vida da parceira, respeitando sua liberdade e autonomia e
renunciando à ilusão de ser o centro da vida da mulher. Parece, no entanto, que
esse homem é dificil de ser encontrado."
As estórias de Cinderela, da Bela e a Fera e de Branca de
Neve277, não parecem fazer somente parte do contexto dos contos da inf'ancia. A
imagem da espera pelo príncipe no cavalo branco persiste no desejo de
proteção, harmonia e plenitude que se espera encontrar no casamento.
Este tema está muito presente na mídia, demonstrando o quanto
ele faz parte da sensibilidade masculina e feminina atualmente. Em matéria da
Revista da Folha de São Paulo, parte integrante do jornal de 07.09.97 (Ano 61 nº
281), intitulada: Somos Todas Princesas. Traída, vítima de bulimia e à procura
de um amor, Diana parecia sintetizar os principais problemas da mulher
modema. A reportagem fala sobre a "síndrome de Lady Di", vivida pelas
mulheres, sugerindo que a morte de Diana revelaria depois de anos de
feminismo, que o maior drama das mulheres ainda é encontrar um príncipe. A
imagem principal é a de que Diana se casou e o príncipe virou "sapo" logo após
a lua-de-mel. Nesta mesma linha, veja também o livro de Dowling (1982),
Complexo de Cinderela, que chegou a ser um dos mais vendidos em nosso país.
As frustrações advindas dessa idealização narcísica do parceiro
aparecem, com freqüência, nas falas dos clientes em consultório:

''Eu me relaciono com você não pelo que você demonstra. mas pelo que eu imagino que
você seja. " (. ..) ''Fica difícil porque isso começa a acontecer dos dois lados. O outro nunca
vai entender o que você está falando. No fim a gente se relaciona com a gente mesmo. E se
você se casa com você mesmo, não suportaria, é uma relação absurda!"(. ..) '~gente càsa
querendo que o outro seja igual a gente. Conforme vai passando os anos isso se arrebenta
ou você modifica isto porque isto fez outro casamento dentro do casamento, ou a gente se
separa mesmo. Agora estamos tentando. Você é você, eu sou eu. No comeco a gente não se
casa assim não. não casa com o outro, casa com você mesmo querendo que o outro faça o
que você faria. Todo mundo casa assim!" (...) ''Porque? Acontece. É gostoso, mais
acolhedor, é um terreno mais amigo. mais conhecido, você fantasiar e achar que o teu
marido é aquele que você espera que seja. Se você acha que ele vai te ajudar em casa etc., g_
mais gostoso que o real, é tapete mais macio. " (...) '~cho que ninguém que se enxergar na
hora casa. Casamento quando você casa é muito... muito... massagem de Ego. Você entra
nessa relação para se massagear, não para se machucar. Quando vem alguma coisa forte
de conflito ou você abafa ou você tenta não ver. A maioria sai direto da casa do pai e da

277 A história de Branca de Neve, por exemplo, é relatada tendo como referência a posição de madrasta e há
uma idealização do homem e da figura da verdadeira mãe.

186
mãe e no dia seguinte está na casa com o outro. Aí não dá mesmo"(...) '~ gente está
conseguindo recasar com o outro novamente. "

Fica bem clara nesta fala a presença do tipo de imagem na qual a


busca da plenitude é o eixo da narrativa. No entanto, como dissemos
anteriormente, os especialistas também compartilham esses modelos assim
como parecem procurar responder ao tipo de demanda que eles supõem. Parte
deles parece estar tentando atender a um tipo de "demanda corretiva", ou seja
"corrigir" o que não está bem, o que não é saudável ou faz sofrer, de forma a
alcançar a totalidade implícita no modelo. Com efeito, algumas técnicas
terapêuticas parecem ter sido desenvolvidas justamente para resolver o insolúvel
dilema de como viver sem conflitosz7&, já que o serviço está voltado à sua
resolução. (Veja Anexo 29).
Alguns dos especialistas entrevistados estão conscientes dos
riscos destas crenças míticas de completude. Estes terapeutas percebem a
incapacidade de seus clientes de lidar com os conflitos vividos e o desejo de
alcançar as realidades idealizadas:

'~s pessoas saíram do primeiro casamento e aí tem o que eu chamo o mito da separação,
porque para você se separar, que é uma situação difícil, você, lógico, tem que imaginar que
vai para uma melhor, porque, se você imaginar que vai para uma pior, não pensa em se
separar nunca, não é? Então, você imagina"(. ..) "que você vai ficar livre, você vai ficar
com mais tempo1 _ com mais disposição, com mais prazer, com mais tudo! Só que, de tudo
isso, não acontece nem a metade, obviamente, porque... as tuas dificuldades continuam
sendo tuas e o marido não foi com as tuas dificuldades, elas ficaram com você. " (. ..) ''No
Congresso, eu fiquei sabendo de uma pesquisa que fizeram nos Estados Unidos, que a gente
supõe que os segundos casamentos... que nos segundos casamentos haveria menos
separação que nos primeiros casamentos, mas é exatamente ao contrário. E se você vai
pensar, tem uma lógica, porque, no primeiro casamento, tem a dificuldade . do
desconhecido, da insegurança da mulher, de como é que fica. Mas, quando já atravessaram
esse processo, ficam mais seguros e, por outro lado, mais intolerantes e, como a segunda
situação é mais complicada que a primeira, realmente as pessoas ficam com mais conflito e
com menos tolerância. "
''Eu tenho sentido assim... muita intolerância" (. ..) ''Essa outra relação que pode ser
segunda, terceira, quarta... essa outra relação tem que dar muito certo. "

278 Pode ser a promessa implícita atrás do tipo de discurso de alguns serviços oferecidos, que se propõem a
dissolver os incômodos. O tema da idealização e da exigência mútua apareceu mesmo entre terapeutas,
pela forma como se organizou o "I Congresso". Após discussão sobre os questionários que não haviam
chegado para todos (para as entidades que não estavam cadastradas) e queixas dirigidas à Comissão
organizadora do Congresso, diz uma terapeuta: "Eu senti um pouco o clima, da cobrança do que foi feito,
porque não foi feito o ideal, mas no real possível." (... ) "Ele ainda está muito perto do mínimo e a gente
quer levar lá perto do ideal."

187
Observamos que parte dos especialistas procura alertar os
clientes dos problemas do processo de idealização no casamento e na família,
enquanto outra parte parece engajar-se na busca interminável por soluções aos
conflitos, no sentido de extingui-los, atendendo à demanda de aperfeiçoamento
por parte de seus clientes. Isto revela uma dupla resposta ideológica: parte dos
terapeutas procura desmontar a idealização, enquanto outra trabalha no sentido
de atendê-la, buscando com a família a perfeita harmonia.

c) A idealização da família
Entendemos aqui o mecanismo de idealização, no modo como
ele é definido pela psicanálise: "Processo psíquico pelo qual as qualidades e o
valor do objeto são levados à perfeição. A identificação com o objeto idealizado
contribui para a formação e para o enriquecimento das chamadas instâncias
ideais da pessoa (ego ideal e ideal de ego)." (Laplanche, 1982: 291) Pensemos um
pouco, agora, no movimento de idealização da família, na linha da aspiração de
um grupo pleno, perfeito.
A realidade vista sob a óptica da completude, conforme os
moldes da "alma gêmea", parece colaborar para que algumas pessoas se
disponham a uma busca interminável por parceiro. Ao aspirarem à perfeição, à
relação completa, abrem um abismo insuperável entre a atuação possível e as
expectativas do casal e da família.
Isto sugere um certo desajuste entre as representações
aprendidas e as condições que a realidade contemporânea oferece em termos de
possibilidade de alcance destas aspirações. Observamos no discurso sobre os
vínculos conjugais e familiares, uma tendência do indivíduo para buscar formas
perfeitas, idealizadas, que lhe espelhe a melhor imagem, como se fosse possível
passar pela vida e constituir família sem vivenciar e manejar conflitos. Deste
modo, casar e constituir família pode significar uma tentativa de produzir uma
verdadeira "assepsia" na vida, impulsionando cobranças, exigências e
frustrações. A exigência do "espelho" toma inviável a continência, dentro do
casamento ou do grupo familiar, das necessidades e características de seus
membros.
Observamos nestes discursos o que poderíamos denominar
predominância de "traço narcisista" 279 , ou então, priorização da necessidade da
279 A designação narcisismo foi criada por Freud (1914) para denominar o processo de deslocamento do
objeto amoroso para o próprio indivíduo. A Psicanálise passou, a partir daí, a estabelecer uma distinção
entre narcisismo primário, que seria um período normal de auto-investimento da libido vivido pelo bebê, e
o secundário, que constitui uma regressão patológica do adulto àquela fase. Assim, Freud nomeia de
narcisismo primário uma fase no desenvolvimento humano onde o bebê encontra-se num estado fusional
com sua mãe, não discriminando sua existência da dela (o mundo interno do externo). O primeiro tipo de

(continua)

188
busca do parceiro idealizado (da "alma gêmea")280 • Se na época em que viveu
Freud, os sintomas histéricos preocuparam os especialistas, quem sabe hoje,
sejam as desordens narcísicas as que se manifestam de forma expressiva no
homem ocidental do final do século XX.
Esse traço narcísico da subjetividade contemporânea já foi
apontado por Cristopher Lasch (1983 e 1987). O embotamento narcísico281 - viver
de forma auto-referente, esperar que o mundo espelhe a todo o tempo o que se
espera dele, dificuldade de compreender a alteridade - foi tratado por Lasch
como um traço da sociedade atual, a que o autor chamou de "cultura do
narcisismo". Segundo Lasch, a sociedade modema enfrenta tantos conflitos e a
convivência social se mostra de tal forma ameaçadora que o indivíduo teria um
quadro defensivo de auto-investimento. Este ego "reduzido", o autor nomeia de
"eu-mínimo".

identificação seria, então, fusional, onde a mãe (ou a pessoa que cuida) representa um elemento
indispensável e fundante da personalidade do filho, operando como o "outro", que marca a presença de
uma realidade externa e insubordinada aos desejos onipotentes da criança. Neste interjogo mãe-bebê, onde
a mãe precisa exercer continência às demandas de seu filho, ajudando-o a digerir as experiências rumo à
aquisição de uma diferenciação, o bebê inicia sua estruturação de ego. Deste modo, o narcisismo primário
é, para Freud, uma fase constituinte do ego. Assim, em uma fase inicial da vida, o indivíduo encontra-se
investido em si mesmo, na medida em que o "outro", ainda não é percebido por ele, ou seja, há uma
energia vital, que mantém-se investida (catexizada) no próprio sujeito. Com o tempo e o intercâmbio
estabelecido com o ambiente e as pessoas, esta libido se bipartiria, dando origem ao que Freud passará a
chamar de libido objetal. A partir disso, o ego funcionaria como um reservatório único com duas energias:
a libido do ego (mantém-se auto-investida, dirigida ao próprio sujeito) e a libido objetal (disponível para
ser investida no mundo exterior). Depois de rompido com este início, que é a fusão, o auto-erotismo, todo
narcisismo do ego seria secundário. Narcisismo primário e secundário podem ser entendidos, então, como
momentos em que o ego está perante seu desenvolvimento.
280 Este diálogo entre marido e mulher exibe o descompasso entre a expectativa do encaixe pleno e a presença
das diferenças como perturbadoras:
Ele: "A X. gostaria que eu parasse num modelo!"
Ela: "Não foi nada daquilo que eu pensei. Casei com alguma coisa que não é você." (Um pouco
agressiva).
Ele: "Ela adoraria se eu tivesse vindo com o manual do proprietário."
Ela: "Casei com um homem que não é você!"
281 "A mais antiga versão do mito grego de Narciso - que inspirou a teoria freudiana do narcisismo - é
atribuída ao poeta romano Ovídio (43 aC. - 17 d.C.). Segundo ele, Narciso nasceu depois que a ninfa
Liríope, sua mãe, banhou-se nas águas do rio Zéfiro. Tão belo era o menino que a mãe ficou preocupada,
pois os deuses não admitiam que um mortal fosse mais bonito do que eles, habitantes do Olimpo. Liríope
ouviu então de um oráculo que o filho viveria enquanto não visse a si próprio. Certo dia, sentindo sede,
Narciso se aproxima de um lago. Mas, ao deparar na água com a própria imagem, que não sabia ser sua,
sentiu irresistível paixão. Eco, uma ninfa que o seguia, ainda tentou avisá-lo de que aquele rosto era o seu
mesmo. Foi em vão, porque só conseguia repetir as últimas palavras do que ouvia, vítima também ela da
ira dos deuses. E Narciso, não conseguindo se afastar da imagem refletida, definha de fome e sede; ao
perceber, enfim, que aquele era o seu próprio rosto, chora ao dar-se conta de que jamais poderia abraçar o
objeto amado. Suas lágrimas turvaram a água. Narciso achou que a imagem estava fugindo e morreu de
desespero." (Revista Superinteressante, Ed. Abril, Ano 3, nº 3, p. 70-1, março de 1989). A idéia de
embotamento narcísico advém desta imagem, inspirada no mito, de que o indivíduo sucumbe auto-
investido, ao apaixonar-se por si roemo.

189
Em pesquisa realizada para o mestrado (Dias: 199la) sobre
mensagens de despedida (bilhetes, cartas e fitas de áudio), deixadas por
suicidas, constatei estruturas operacionais semelhantes neste grupo de pessoas:
dificuldade em se comunicar em vida (a morte viabilizando a comunicação), de
lidar com perda e, sobretudo, de dar um lugar ao outro como tendo existência
própria. Também ali me deparei com um traço onipotente de pessoas que
pareciam não querer ou não poder suportar a dor do não-controle, de lidar com
o que é diferente de si mesmo. Dificuldades sérias que conduzem pessoas a
estados-limites como o ato suicida. Impossibilitados de compor um casal ideal282
e uma família perfeita, ao se recusarem à vida parecem estar rejeitando conviver
com limites ou recusando uma busca interminável283 e de resultado inatingível.
Com isso, interessaria investigar em maior profundidade, quem
sabe em outro trabalho, qual é a natureza das representações que alimenta esta
busca e como estas aspirações exigentes e narcísicas são geradas. Acreditamos
que a persistência do modelo do amor romântico no imaginário da atualidade
contribui para a constituição de tais expectativas idealizadas no casamento e,
por conseguinte no grupo familiar.

***
Neste capítulo, consideramos que os casamentos "seriados"
podem estar motivados por uma busca de "aperfeiçoamento" 284 num universo
onde todos querem banir os conflitos e o sofrimento deles decorrente. Apesar de
teoricamente (no discurso aparente) conhecerem a inviabilidade deste objetivo e
saberem, racionalmente, que o estado de completude é apenas uma fantasia, as
pessoas mostram-se com freqüência exigentes e intolerantes com as diferenças
nos vínculos.
A despeito de todas as transformações sociais vividas pela

28 2Em situação de consultório, observamos nos discursos de casais que a fala mais racional é direcionada no
sentido de aceitar que os conflitos sejam naturais. Contudo, na prática do relacionamento, tais pessoas
podem se mostrar, paradoxalmente, muito intolerantes e exigentes.
283 As salas de conversação buscadas na Internet e as matérias sobre namoro e casamento entre pessoas que se
conheceram por esta via (Veja Anexo 30) mostram a possibilidade de procurar um(a) parceiro(a) no
mundo (no globo) e cabe pensar o quanto a fantasia de que esta busca de maior alcance geográfico pode
trazer a esperança de que o(a) parceiro(a) ideal surgirá. Sobre a mudança nos costumes, veja em anexo,
alguns artigos que registram o fato (Anexo 31).
284 A imagem de que a condição de estar divorciado(a) e livre para buscar uma nova relação seja a melhor
pode alimentar as buscas sucessivas. Nesta linha, uma mulher avalia: "Agora é bem melhor, posso sair e
bater na casa de um amigo. Antes, ficava aprisionada no casamento esperando aquele homem chegar e
quando chegava trocávamos aquela meia dúzia de palavras terríveis."

190
família nas últimas décadas, a família nuclear consangüínea ainda é o modelo
dominante, para famílias de camadas médias, pelo menos na cidade de São
Paulo. Além disso, espera-se que ela opere de maneira harmônica, solidária e
que haja igualdade de direitos e obrigações entre os cônjuges. Meta que se torna
inviável com as tensões e conflitos que emergiram nas novas modalidades de
grupo doméstico e, também, com a desorganização das categorias tradicionais
da parentela. É utópico o empreendimento de obter o total alívio do sofrimento e
a busca da felicidade plena.
Deste modo, observamos que o modelo de indivíduo que orienta
as ações do sujeito nos vínculos conjugais e familiares é o de um sujeito
idealmente completo. Este modelo de vínculo poderia quase ser chamado de
"não-vínculo" na medida em que um dos princípios organizadores
predominantes destas relações de gênero na atualidade é o da simetria, do
"igualitarismo" ou da "androginia" no qual homens e mulheres circulam nos
mesmos espaços. Tornam-se o mesmo?28 5
Parece difundir-se pois um tnovimento que, promovido pela
tendência à globalização, se expressa também nas relações de gênero. Talvez se
pudesse dizer que, do ponto de vista das transformações sociais, viveu-se o
machismo, contra ele ergueu-se o feminismo e, hoje, o mundo estaria vivendo o
momento de uma supressão da alteridade de gênero, através da composição de
um casal igualitário, isto é, em simetria de condições. Pode-se imaginar, que na
cultura da completude, o indivíduo tem a aspiração de possuir em si mesmo todo
o espectro do~ atributos.
Assim, neste contexto de representação, quando nasce uma
criança e uma famtlia é constituída, caso queiramos usar a linguagem da divisão
sexual do trabalho tradicional, quase que poderíamos dizer que o modelo de
casal apregoado é o de "duas mãezinhas" que atualmente têm acesso ao mundo
da rua. Constatamos, então, uma reordenação do espaço dos gêneros, na qual
ocorre uma tendência a se achatarem as diferenças286 em prol da presença de um

285 Expressou isso a cliente que disse: "A gente fica querendo o igual."
No âmbito do movimento feminista e dos estudos de gênero contemporâneos, existe um debate sobre as
noções de diferença e de desigualdade entre os sexos. Uma das posturas em pauta é a afirmação da
diferença sexual e condenação da transformação desta diferença em desigualdade entre os sexos com
indiferenciação sexual ou dissolução da alteridade. Contudo, não é esta a perspectiva que contemplamos
neste trabalho, uma vez que no discurso do segmento de clientes e profissionais de Terapia de Família que
analisamos este tipo de posicionamento não aparece, ao contrário, o conjunto das representações
focalizadas aponta para a concepção de igualitarismo como supressão da diferença.
286 A publicidade aproveita-se também desta imagem do mesmo, de ter algo em comum, como um valor
positivo e esperado. São exemplos disto algumas propagandas de cigarro que continuamente mostram
pessoas diferentes, mas que se unem através da adição ã mesma marca de cigarro. Veja, também, no
Anexo 32, propaganda de festival com a seguinte legenda: "Nunca foi tão .free, nunca foi tão jazz, nunca
teve tanto em comum com você."

191
indivíduo único como modelo.
O gênero como representação ou auto-representação acaba,
pois, sendo minimizado enquanto referência para organizar os relacionamentos.
Na verdade, parece almejar-se atingir o tipo de pessoa plena, completa,
objetivada na sociedade contemporânea, na qual o modelo conjugal
subliminarmente presente é o do espelho. Há, então, uma mudança no universo
da reciprocidade, na medida em que a tendência dos anos 80/90 é da exigência
do mesmo.
O valor difundido da igualdade organiza a linguagem do conflito
inerente à definição de qual é o lugar de llln e qual é o do outro. Este parece ser,
na verdade, o dilema central da sociedade contemporânea. Nesse sentido, não
seria a família o locus fundamental da crise atualmente. Poderíamos, quem sabe,
até dizer que a família parece em crise para o discurso normativo, que acaba de
ter que lidar com a falta de critério para a definição do parentesco e para com a
questão de gênero, já que estes elementos integram a queixa levada aos peritos.
Tendo este universo como referência podemos inferir que o
terapeuta de casal e farm1ia deparou-se com um contexto propício para o
alargamento de sua presença no mercado das terapêuticas porque seus serviços
foram percebidos pela clientela como um instrumento para alcançar as metas
acima descritas. No caso dos cônjuges que expressam uma expectativa de
neutralizar as diferenças e de atuar em consonância, harmonia287 e simetria, o
perito e sua terapia podem ser concebidos como aquele veículo que oferecerá o
caminho e os parâmetros para o alcance das metas delineadas como ideais. Seja
para formular o discurso da ordem ou para unir-se ao casal e à família na busca
por caminhos, o terapeuta de família encontrou um espaço efervescente de
trabalho num campo que anseia por uma nova ordenação das experiências
domésticas.
Os profissionais entrevistados, em sua experiência de lidar com
a vida familiar, têm percebido que nas novas "reconstituições familiares", o
mesmo indivíduo vai apenas trocando certos tipos de conflitos por outros,
carregando o incômodo de ver suas metas ideais fracassadas. Se isto é verdade,
toma-se cada vez mais urgente investigar quais as causas gerais que estão na
base dessa incongruência. Procuramos, neste trabalho, apresentar algumas pistas
que apontam para a persistência do ideal de consangüinidade na definição da
família e do amor romântico como aspiração narcísica definidora da escolha
matrimonial. Certamente muitos outros elementos estão ausentes desta

287 Mesmo alguns profissionais operam com uma noção de amor vinculado a uma constante harmonia. Vimos
a fala de uma psicóloga do Fórum, no capítulo 5, que afirmava que onde há amor, não há conflito, nem
disputa.

192
explicação. No entanto, o caminho que percorremos, ao decodificar o modelo de
família compartilhado por clientes e especialistas, pennite compreender o
trabalho simbólico que está em operação na intervenção de terapeutas e
psicólogos forenses.

193
CONCLUSÃO

Neste trabalho, procuramos compreender como as transforma-


ções sociais, ocorridas nas décadas de 60/70 fizeram nascer composições de
família muito diversas da tradicional família nuclear monogâmica, apontada
como modelo predominante herdado da sociedade patriarcal.
As novas composições de família, apresentadas como produto
das mudanças provocadas pela possibilidade do divórcio e da contração de
outro(s) matrimônio(s) - instauraram variadas demandas adaptativas, por vezes,
contraditórias entre si. Inúmeros exemplos deste fenômeno foram abordados
quando tratamos da concepção das configurações familiares contemporâneas
como unidades "sobrepostas", ou mesmo, quando examinamos a persistência do
ideal romântico de casamento indissolúvel e de perfeita harmonia entre as
personalidades dos cônjuges.
A inexistência de valores e práticas sociais claros e precisos no
âmbito doméstico conduziu muitos - tanto no discurso técnico, quanto no de
senso comum- a falarem em "crise" na família288 . Este parece ter sido um dos
temas que mais marcaram este final de século. É ainda comum na sociedade
brasileira que os segmentos sócio-econômicos mais elevados vejam as famílias
das camadas mais pobres como arranjos mal constituídos e mesmo em estado de
desorganização.
A idéia de crise aparece, então, associada ao imaginário de
mudança e desintegração, já que o modelo de referência preponderante tem sido
o de farm1ia nuclear. As novas conformações de grupo doméstico geradas
sobretudo em conseqüência do divórcio e dos novos arranjos ocasionaram o
questionamento das imagens anteriores e do próprio conceito dominante de
família. Devemos lembrar que até a Constituição Federal de 1988, a família era
concebida pelo sistema jurídico brasileiro como a unidade que abrangia somente
os cônjuges e seus descendentes.289 É com a nova Carta que a fanúlia passa a
ter proteção do Estado mesmo que não formada através do casamento. As
uniões estáveis passam a ser reconhecidas e também a "comunidade formada

288 Em número dedicado à família, a Revista Travessia (1991: página de abertura) confirma que entre alguns
segmentos leigos e especializados existe a crença de que a família seja uma instituição em crise e mesmo
decadente: "O que é então família? Mas qual família? Existe um padrão de família brasileira? Enquanto
alguns podem assim interrogar-se, outros não exitam em afirmar que se trata de uma instituição em
decadência, ou, para fazer jus a um lugar comum hoje amplamente difundido, dizem pura e simplesmente
que 'a família está em crise'! Com efeito, se nos guiarmos pelas pesquisas realizadas junto à opinião
pública, esta idéia é predomínante."
2 89 Constituição de 1967 (artigo 175) e Código Civil (artigos 229 e 231).

194
por qualquer dos pais e seus descendentes". 29°
Observamos, portanto, que a família não está se extinguindo, ela
está se redefinindo. A redefinição de posições na família trouxe, de imediato, o
aparecimento de novas redes de parentesco e suscitou o questionamento dos
papéis dos novos parentes. 291 A diversificação, ao trazer outras configurações de
família, instaurou novos padrões de sociabilidade. Cabe lembrar que, apesar das
mudanças em sua estrutura, a famHia pode ser sempre vista como um espaço de
aprendizagem das representações sociais, dos padrões culturais, assim como um
espaço onde se estabelece um intercâmbio e onde se atualizam as tensões
SOCiaiS.
Para auxiliar os membros da família a nomeaf292 e ordenar as
novas experiências, buscou-se na Terapia Familiar um novo psicologismo -
especialidade que ganha espaço nas décadas de 80 e 90 em nosso país.
Terapeutas de família, oriundos de variadas formações e predominantemente
adeptos de diversas abordagens da teoria sistêmica293 , passaram a disputar um
espaço no mercado nacional das terapêuticas. O espaço de imprecisão frente às
aceleradas mudanças na famHia fez com que os terapeutas de farm1ia fossem
rapidamente incorporados ao mercado de bens simbólicos.
A inclusão de psicólogos nas V aras da Inf'ancia e da Juventude e
nas Varas de Família também ocorreu por volta deste mesmo período.
Assessorando a decisão do juiz, através do laudo técnico, os psicólogos
ganharam um espaço adicional no mercado de trabalho, auxiliando a elaboração
dos critérios técnicos para que a instituição jurídica exercesse seu papel de
vigilância social.
O mito do declúrio da família construiu-se, portanto, a partir da
visão de determinados segmentos sociais sobre a família, ou seja, trata-se de um
diagnóstico feito a partir do prisma do modelo nuclear de grupo: pai, mãe e

290 Artigo 226, parágrafo 3Q e parágrafo 4Q. Sobre isto consulte Oliveira (s/d).
291 O vídeo didático A Famflia dá Samba, produzido pela organização não governamental ECOS trata deste
tema, apresentando composições de família de estruturas variadas.
292 A questão da dificuldade com a nomeação foi amplamente vista no capítulo 3. Cabe lembrar que a idéia
do novo pode ser vista como sendo o velho recriado. Os pares de termos mãe x madrasta e mãe x
mãedrasta apontam isto. O uso do termo rnãedrasta para a nova esposa do pai já carrega um novo sentido
para esta posição. Por parte dos técnicos, o abandono paulatino do termo "recasamento" em favor do termo
"reconstituição familiar" expõe uma busca por nomes considerados mais apropriados. O tema do "I
Simpósio Internacional de Terapia Familiar Sistêmica" e "III Simpósio de Terapia Familiar Sistêmica do
Rio de Janeiro", ocorrido no período de 19 a 22/10/95, recebeu o título de "Casamento, Divórcio &
Recasamento". Já nos Congressos de Terapia Familiar nacionais, o termo "reconstituição" foi o escolhido.
293 A abordagem sistêmica, que no exterior já se construiu em oposição à Psicanálise de então, pode ter ganho
mercado em nosso país num período em que o boom psicanalítico começava a declinar. Através
principalmente da abordagem sistêmica, sentida como nova e apresentada como uma técnica mais
eficiente e mais rápida, os terapeutas de família conquistaram uma significativa fatia do mercado das
terapêuticas.

195
filhos consangüíneos. Esta imagem de decadência familiar emergiu
predominantemente das classes dominantes rurais e nas classes médias urbanas.
Tais segmentos sociais tendem a perceber o tipo de família encontrado
freqüentemente nas classes populares como desorganizados. 294
A década de 70, marcada pelo feminismo, pelo psicologismo e
pelo boom psicanalítico, constituiu o terreno fértil no qual a Terapia Familiar foi
eleita para explicar os dilemas vividos no âmbito do grupo da fannlia e auxiliar
sua resolução e reordenamento. Na década de 80 houve uma intensa difusão do
pensamento sistêmico no Brasil, em detrimento de outras abordagens que
passaram a ser consideradas menos eficazes. A década de 90 testemunha o largo
espaço ocupado por esta especialidade no mercado das terapêuticas: o
nascimento das Associações Regionais e da Associação Nacional de Terapia
Familiar assim como a consolidação de cursos de especialização e pós-
graduação junto a Universidades atestam isto.
A necessidade de constante negociação para ordenar a vida
doméstica mantém este mercado proficuo, onde especialistas disputam melhores
posições no campo. Mostramos, neste trabalho, o quanto clientes e terapeutas,
ao buscarem significação para a diversidade e imprecisão das novas
experiências, geraram um espaço de mercado para os terapeutas e peritos que se
dedicaram a prestar serviços à família.
Observamos que a noção de comunidade prevalecente nas
famílias de classe média e também entre muitos terapeutas e especialistas do
Sistema Jurídico é a de uma comunidade solidária e harmoniosa. Grande parte
do mercado das terapias de casal e família instituído no Brasil seguiu o estilo de
sua matriz norte-americana que foi o de difundir o discurso de uma terapia
breve, rápida, voltada à solução de conflitos. Os termos "terapia breve" e
"mediação familiar" contrapostos à idéia de que a psicanálise era em si
necessariamente muito longa, fazem parte deste contexto. Assim, o trabalho do
terapeuta familiar, sobretudo de abordagem sistêmica, iniciou-se no Brasil como
uma abordagem voltada para a solução das disputas e conflitos no âmbito da
vida doméstica.
A permanência do ideal romântico é elemento adicional no
estímulo ao mercado das terapias. Afinal, o terapeuta de casal e família pode ser
visto pelo senso comum (e deste modo é apresentado nos anúncios, na mídia)
como o elo necessário para a consecução do projeto romântico. A indústria
cultural parece ter entrado como coadjuvante na construção deste imaginário,
através de constantes matérias sobre a busca da "cara-metade" ou da "ahna

294 Por exemplo, em supervisão do atendimento à criança de baixa renda são freqüentes as queixas de que
cada vez é uma pessoa diferente que traz a criança à sessão de terapia.

196
gêmea" e, também, através da propaganda que associa os produtos à idéia ili
terapia de casal e família.
A busca do pleno, do completo, da perfeição, do encaix{
perfeito, do duplo, ou como se quiser chamar, observada neste contexto de
imaginário conjugal e familiar, coloca-nos diante de um dilema relacionado à
questão da alteridade e do futuro das relações entre os sexos. Estar-se-ia
promovendo uma "guerra dos sexos" ainda maior? Ou a busca é de preencher os
quesitos do ideal romântico (que ainda se faz presente), às expensas de toda a
fluidez e da variabilidade dos modelos da atualidade?
Seria ainda, possível afirmar que o que alimenta as uniões
sucessivas são as tentativas intermináveis de corresponder ao padrão
idealizado? Estar-se-ia, então, criando uma "monogamia seriada" ou uma
"poligamia seqüencial", como pensam alguns295 , como experiências decorrentes
desta busca incessante no sentido de alcançar o modelo romântico? Modelo este
que subsiste, apesar dos casamentos sucessivos que, paradoxalmente, parecem
cada vez mais afastar o indivíduo da possibilidade da concretização deste ideal,
dado que a nova rede de parentes não atende ao que se espera no modelo
nuclear. Nomear ou conceber os lugares dos novos parentes é enredar-se em um
espaço de mais contradição e conflitos domésticos.
A busca do uno, da relação de espelho, na medida em que o que
se espera do outro é também aquilo que se quer ver nele como extensão dos
próprios desejos, colide com a noção de alteridade: todos são diferentes, mas
também todos são um - todos devem corresponder a um padrão dominante de
pessoa, de vínculo conjugal, de relação familiar.
Cabe lembrar também que as relações de gênero vêm sendo
formatadas dentro de um referencial mais amplo, onde o uno e o espelho
perfeito também são aí os alvos almejados. A noção de "igualitarismo" entre o
casal, marca dos anos 90, denuncia este tipo de expectativa.
Nesse contexto os especialistas ganham grande expressão, na
medida em que são identificados como os técnicos que poderiam auxiliar as
pessoas nesta direção, já que muitos voltam seu trabalho à solução de conflitos
e diminuição de tensão no casamento e na família. Seja para desconstruir o mito
da perfeição ou para trabalhar a serviço dele, os terapeutas de família parecem
constituir, no seu conjunto, um dos eletnentos centrais deste embate.
Podemos inferir, a partir disto, que este universo de questões
tem oferecido um vasto terreno para que os terapeutas de família se constituam
como uma classe de especialistas voltada ao trabalho no âmbito das relações de
gênero e das relações familiares. O Projeto Semeando a Terapia Familiar no
295 Veja capítulo 3, pág. 95.

197
Brasil evidenciou isto.296
Os terapeutas de família construíram um diálogo com a família
(nuclear e pós-divórcio), ajudando-a a ressignificar o campo de suas relações e,
ao mesmo tempo, constituindo-se parte integrante desta realidade, ao oferecer
mn instrumental técnico para ordenar estas novas experiências. Organizando-se
como classe de especialistas, os terapeutas de família conseguiram administrar
esta nova demanda e definir hierarquias de competência. Na condição de
pertencentes a entidades de atendimento clínico e de membros de associações
de classe profissional, definem a amplitude de seu campo de ação e suas
estratégias, lutando também por uma fatia no mercado das terapêuticas.

296 Veja capítulo 4, pág. 119.

198
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1986 Shazer, Steve de. Terapia Familiar Breve. Summus Editorial, SP.
1979 Skynner, A. C. Robin. Pessoas Separadas: um só corpo -princípios de psicoterapia
familiar e conjugal. Zahar, RJ.
1983 Soifer, Raquel. Psicodinamismos da Família com Crianças. Vozes, Petrópolis.
1985 Souza, Anna Maria Nunes de. A Família e seu E~paço - uma proposta de
terapia familiar. Livr. Agir Ed., SP.

209
1987 Seabra, Zelíta-&-Muskat, Malvina. Identidade Feminina. Vozes, Petrópolis.
1999 Silva, Evarú Zambon Marques da. Paternidade Ativa na Separação Conjugal. Juarez
de Oliveira, SP.

210
ANEXOS

211
ANEXO 1

Propaganda de Tenda Espírita e outros serviços.

'i[ENDA:ESPÍRJTA
IRMÃ .SARA
FAZ E DESFAZ TRABALHO P/ AMOR.
ViCIOS - IMPOTÊNCIA - INSÔNIA - DEPRESSÃO
TIMIDEZ· TRAGO DE VOLTA SEU AMOR EM 7 DIAS
Faz cur~s. esp_irit~a!s c/ reza~ e simpatias, afasta inimigos,
olho .. VICIO$, 1n~oma, nervosismo, depressão, perturbação
matenal ou espntual.
"Às_ sextas-feiras_ passes_ grátis c/ ramos da sorte, faz
abnmento de cam1nhos e limpeza de corpo, c/ benzimentos e
re~~s, ba~hos de _descarga e simpatia p/ todos os fins.'
BuzJos_lndJano, ~~~1cano e Oriental, cartas, tarôt e vidência.
Garantra total e SIQIIO em seus trabalhos.
Se esta não der jeito, outras não darão. Problemas de
amor, ~aúde, negócios, fraquezas sexuais, qualquer •
que seja o seu problema, procure-nos com confiança.
Faço o trabalho perante a pessoa. Trabalhos rápi-
dos e garantidos.
Atendo em minha residência, das 9:00 as 21:00,
de_2~ a 6ª e também aos sábados, domingos e
fenados.
Pelo Fone: 62-97 48

PElA PRIMEIRA VEZ NO BRASil. VENHA CONHECER AFORÇA DO ORIENTE

@ DOIVA LUCIA ~
.Se você está desorientado, deprimido·, tens dúvida no amor, na saúde, nos
negócios; família ou comércip; necessnas descobrir aliio que o preocupa?'·
Alcançar bom emprego e prosperidade? Facilitar algufn cas_amento difícil?
Quereis fazer vOltar à vossa corilpanhia alguém que vos tenha separado?
Quereis saber de um ente distante? DONA LU_CIA que por meio de seu
profundo estudo- ·trata de vários assuntos. Através do esoterismo você
terá a ajuda que precisa, através dos mais eficazes métodos. Todos tem
épocas favoráveis na vida; mas nem todos conhecem suas oportunidades.
NÃO DEIXE PARA AMANHÃ O QUE SE PODE FAZER HOJE, FAÇA
UMA CONSULTA HOJE MESMO COM A DONA LUC!A, ATRAVÉS DOS
BÚZIOS AFRICANOS, CARTAS CIGANAS, TAROT, BOLA DE CRISTAL
E RUNAS. LEMBRE-SE NÃO HÁ PROBLEMAS SEM SOLUÇÃO,
PORTANTO' A SOLUÇÃO ESTÁ EM SUAS MÃOS.
SEGUNDÀS E SÁBADOS NÃO COBRAMOS CONSULTAS
FAVOR NÃO CONFUNDIR COM OUTRA DONA LUCIA
FAZ~SE PATUÁ PARA O AMOR E PARA OUTROS FINS.
ATEMDE TODOS OS DiAS ·INCLUSIVE sABADOS DOMINGOS f FEIIIIIDOS DAS 9:00 ÀS ZO:DD 115..
..R. DIÍ. CAHDIDO ESPIHHEiRA, 158 • FONE: 825·7331
(ESTA lUA FICA NA ALT•. DO H.IOS • DA AV. PACAEIIBÚ • PROX. A lOJA M.MARTAM
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Favor nAo joga este -folheto em v!a pública - Mantenha a cidade limpa

212
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(' Obs. Não foco Comentários Antes de Uma Visito. l
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JOGA-SE CARTA ESPANHOLA,
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a quem 1nteressar, que através dela pode·
rosa ciência e seus poderes fundamentais,
pode lhe dar uma orientação sobre estes
assuntos: viagens. dificuldades em vencer
algo na vida, sep<:trações amorosas, maus
negócios. cloenças e sofrimento espiritual.
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0pen:1s c um um;1 consulta lerá uma or1en-
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215
ANEX02
Relação das entrevistas realizadas
e das atividades gravadas em áudio.

I- No Fórum de São Paulo/ Varas de Fanúlia-


Entrevistas realizadas no 2Q Semestre de 1992 com:
3 psicólogos: PI (masc.), P2 (masc.), P3 (fem.)
3 assistentes sociais: AS! (fem.), AS2 (fem.), AS3 (fem.)
2 juízes: JI (masc.), J2 (fem.)
Fórum Central;
I psicóloga: P4 (fem.)
Fórum na periferia de São Paulo.
Adicionou-se à análise realizada do capítulo 6, sobre o atendimento à família no sistema
judiciário, minha experiência em supervisão a psicólogos forenses, envolvidos em
processos de peritagem, na década de 90; como, também, minha experiência como
docente, em cursos ministrados a equipes de psicólogos e assistentes sociais, que atuam
em Varas de Família, durante este mesmo periodo.

11 - Entrevistas realizadas com terapeutas de familia - de junho de I 994 a fevereiro de


1995.
Os profissionais entrevistados foram escolhidos seguindo os critérios de expressividade e
reconhecimento público do seu exercício nesta atividade, e de estarem atuando há mais de
10 anos na área, motivo pelo qual podem ser vistos corno os pioneiros da
especialidade. Os I O terapeutas entrevistados são do sexo femirúno, atuam em
consultórios particulares e estão de algum modo ligados a atividades de ensino:
participação em encontros, cursos de extensão, especialização ou pós-graduação. Além
disso, estavam inseridos nas Comissões de organização do JQ Congresso de Terapia
Familiar (julho 94/ SP- Comissões: Científica, Social e de Divulgação).
Nestas entrevistas, pediu-se ao especialista que relatasse sobre o que conhecia da História
da Terapia Familiar no Brasil, procurando estabelecer períodos~ que contasse sobre seu
próprio percurso profissional, situando-se neste universo; que falasse um pouco sobre a
abordagem ou linha de orientação adotada em seu trabalho, e o papel do terapeuta dentro
desta realidade; pediu-se, ainda, que mencionasse sua experiência em atendimento clínico
no consultório, perguntando-se também sobre a experiência profissional com famílias
"reconstituídas"; averiguou-se a possível experiência em atendimento a casal homossexual;
solicitou-se, por fim, ao terapeuta, que contasse como via as transformações nas relações
de gênero ocorridas nas últimas décadas (a partir da década de 60170).
Em consultórios particulares/ 9 entrevistas.
Em Universidade/ 1 entrevista.

m- Três entrevistas realizadas com terapeutas de casal e família com experiência em


atendimento a casal homossexual com ou sem filhos, no período de dezembro de 1994 a
fevereiro de 1995. Os três terapeutas são do sexo feminino.

216
IV~ Respeitados os critérios de sigilo profissional, incluiremos na discussão alguns
temas e afinnações de clientes atendidos por mim, das fumilias que chegaram ao meu
consultório, desde 1982. Aproveitarei, com isso, minha própria experiência clírúca no
atendimento a casais e famílias em psicoterapia.

V - Será utilizado também o discurso de diversos terapeutas de família que participaram


de duas reuniões- uma anterior e outra posterior ao 1 Congresso de Terapia Familiar-,
nas quais se debateu, dentre outros temas, a questão da formação em Terapia Familiar e a
elaboração e aprovação dos estatutos para constituição da ABRA TEF - Associação
Brasileira de Terapia Familiar e Associações Regionais. Tais reuniões foram
integralmente gravadas e transcritas, como também as atividades, em fonna de Workshop
e mesas-redondas, que tratavam do tema do divórcio e da "reconstituição" familiar no
próprio Congresso. Este ocorreu em São Paulo, de 27 a 30 de julho de 1994, e contou
com a presença de terapeutas de diversos Estados.

VI - Acresceu-se, ainda,. ao material de análise, o discurso de diversos terapeutas de


fàndlia (a maioria deles presente nas duas reuniões anteriores citadas) que participaram do
Pré-Encontro do evento Desenvolvimentos em Psicoterapia Familiar - ocorrido no Hotel
Maksoud Plaza, de 29 de junho a 2 de julho de 1995, em São Paulo. Nesta ocasião,
discutiu-se sobre os estatutos que as Associações Regionais de Terapia Familiar já
estavam elaborando para seus Estados e sobre o estatuto da ABRA TEF, e colheram-se
sugestões para o próximo Congresso, a realizar-se em Porto Alegre (ZQ semestre de
1996), onde se encontrava a sede da ABRA TEF na ocasião, e o novo presidente desta
Associação. Além disso, foram gravadas também reuniões realizadas pelo mesmo grupo,
durante o evento, para discussão de alguns temas relativos ao andamento da formação da
ABRATEF e das Associações Regionais (por exemplo, a assinatura de um adendo à Ata
de Assembléia do "IQ Congresso"). Registraram-se ainda os discursos realizados em uma
Conferência sobre A Psicoterapia Familiar no Brasil. Estas fitas foram transcritas, para o
aproveitamento destes discursos na discussão aqui realizada, uma vez que proporcionam
acompanhar a continuidade do Movimento de Terapia Familiar no Brasil, através deste
grupo, um ano depois (grupo este que fez nascer o "[Q Congresso", a ABRATEF e o
próprio evento do Maksoud). O Encontro do Maksoud foi promovido por wna instituição
de Campinas que organiza workshops de profissionais estrangeiros no Brasil. O "IIQ
Congresso de Terapia Familiar" ocorreu em Gramado-RS, no período de 01 a 03 de
agosto de 1996 (dois anos após o primeiro). Nesta ocasião, aprovou-se o Estatuto
definitivo da ABRATEF e parte das Associações Regionais já estavam aceitando
membros associados.

217
ANEX03

Cartão animado para homossexuais.

QUE

~ecr
fiA'i '
"'i"-- ""''':

f ?
' Um dos exemplares da Gay Cards

mande um
cartão animado
Chega de enviar aqueles cartões
s!mp.iticos demais para os amigos.
Agora tem uma coleçAo amiga d~
cartões abusados para dizer olá, ser
meigo ou mandar aquele recadl·
nho..
São os Gay Cards, colori(los e
bem-humorados. Tem de ani-
versário, Natal, namoro, amizade e
inimizade. Diz que est!iO â venda
em papelaria~. boa!~. bancas e se.,
shops. Procure!
O mais divertido é um que na
frente pergunta "Que gay sou eu?"'
dentro tem as respostas: assumido.
enrmtido, fervido, quá-qu.i, presu-
mido, todas ou N.D.A.. Env1e para
quem ainda n!io se decidiu. Um
pouco de ironia não faz mal a nin·
guém.
Quem f•z ~o povo da A~;ito &
AçAo. que prom-ete um show-room
com uma linha completa de pape-
laria GLS, com cartões de V!Sita,
agendas e até convites de casa-
mento. falta só aprovarem o casa-
mento no BrasiL Será que vai
acontecer? • jac-k5on A.
AgilO l< -'10o. l"go d> Up.., jl, L;p>. '""' o<!lo
Tol.!j>->j>O-
218
ANEX04

Cartão de Natal para a terapeuta- família dividida.

219
"
~ lSi
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_. '-:
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} ô ;:_, !ti
! ~-~ J: }~ ~ .$ .':!

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~d i~l~~
~~~ ~ 1~-71
dJ};~

i ~ ~ I~ rYJ" I 1 t1
1j 1 ' ~' l i· " ~ f

220
ANEXOS
Impresso de Workshop com profissional norte-
americana, promovido pelo ITFRJ- Instituto de
Terapia de Família do Rio de Janeiro, que utiliza a
expressão "família expandida".

RECASAMENTO E FAMÍLIA
RECONSTITUÍDA
POSSIBILIDADES E LIMITAÇÕES
WORKSHOP COM
ANNE BERNSTEIN
17 E 18 DE AGOSTO, RIO DE JANEIRO

Nos dias 17 e 18 de agosto próximo o


Instituto de Terapia de Família - RJ estará
promovendo um workshop com a Dra.
ANNE BERNSTEIN, terapeuta americana
especialista em famílias reconstituídas. au-
tora - entre outros · do livro Os seus, os
meus e os nossos: como as famílias mu-
dam quando paiS recasados têm umjtlho
juntos. A família reconstituída é definida por
ela como aquela em que pelo menos um dos
membros do casal possui filhos de relacio-
namentos anteriores, incluído aí recasa-
mentos, primeiros casamentos de pais sol-
teiros ou vida em comum de longo prazo
com parceiros hetero ou homossexuais.
Atualmente. nos Estados Üntdos. um em
cada três americanos vive num relacionamen·
to que envolve recasamento. Segundo a espe-
cialista, este formato de família será o preva-
lecente no século XXI. Em nossa sociedade, o
modelo da família nuclear ainda é o dominante
e, por conta disso, muitas vezes terapeutas e
famílias reconstituídas trabalham tendo este
modelo como o único possível. A Dra.
Bernstein enfatiza a necessidade de criarmos
narrativas que não encarem as novas formas
familiares como necessariamente desviantes
ou promotoras de patologias.

Leia o artigo Reconstruindo os irmãos


Grlmm: novos contos para a vida em fa-
mílias reconstituídas, da Dra. Bernstein, na
revista Nova Perspectiva Sistêmica n. 8.

Instituto de Terapia de Família-RJ


Te!.' (0211246-7817
Tel/fa.x.: (021 )266-5492

221
ANEX06

Cartão de Dia das Mães para a Mãe-dastra.

-
mil E-DASTR.4

/'1. I~~J. ,(!.rf......J


~.

222
ANEX07

Propaganda com o tema Casamento Perfoito.

~ -N· Portalda2 ~
~ atureza _.--
. 96 MESES DIRETO COM A I
OU 180 MESES:
I CONSTRUTORA
PELO S.F.H. :
---~~~~~~-­
E AINDA PELO PLANO

. ·p.Q.P.
AS PARCELAS DE ENTRADA DO SEU APARTA-
MENTO SOBEM DE 4 EM 4 MESES E DE
ACORDO COM A OATA·BASE DE SUA ESCOLHA

I ~T.·
J
' I , AQUIA~U~Wn
:I SOBE U,l$ QUE R:U
I 5AUIIO,I'EMIAtollfiR1R.

-- ·M-··· ___ z ·-

2 DORMITÓRIOS,
1 ou 2 GARAGENS
NO LOCAL

AV. 200 . DO 6000 DA AV. 0'? CURSINO) 223


ANEXOS

Propaganda com o tema Terapia de Casal.

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No primeiro andar fica o setor masculino, no segundo,
o feminino. O casal pode ainda se encontrar no
terceiro andar, onde vai conferir as ofertas especiais em
três vezes· sem entrada, ou com 35% de desconto à vista.

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'"3x Cr$ 1.300.000,00 (l + 2) '" 3x Cr$ 290.000,00 (l + 2)
tot'al CrS 3.900.000.0~ ro:~l CrS 572.000.00

Training Importado Camisa Social


a pare ir de Cr$ i.l9~.50C,C0 à vise~ a pan:iràe C6 562.500.00 à vtsta
'"3x Cr$ 530.000,00 (l +2) '"3x C6 250.000,00 (l + 2I
total CrS 1.590.000.C,1 total CrS i 50.í..XJO.O~l

Pr"moç;;r vali.la "'" JC,Oó.9) nu"'"'' 1Crn11nn ~" '"'"""'


il-""' 0 de run<•<>namcnrn; ~. •e~undn ,1 >~H",.,; L Oh Snl>nJ<• ~~é l~:_l,:-;, lrr>monun ,,, te h

FSP 3-1 26.06.93 224


ANEX09
Propaganda de lençóis.

NÓS AINDA FAZEMOS LENÇÓIS


ACREDITANDO QUE
CASAMENTOS SÃO PARA SEMPRE.

-
----
' ~-- ...... .... -.
- .
.
.,.. _. .

Tru;s:m.li. com quu~e 100 anos de tradição na indústrw tê~til. faz hoje a melhor roupa de cama do Brasil. Os lençói~

sUo feitos em "'rer~;ol JOO'k algQdâo, penteado e mercerizado com 200 fios por polegada. Por isso, não imponu

o que mude no mundo. nós vamos continuar sempre fazendo Jençó•s lindos
e confon•Í\"CI,_ que durilm como todas as coisas bom' da vida devcnam durar.
TrussardI•
c,.,.,,-,,1 .J,- .ltt•n<lir"~"'" ~" Con,umi<l'" ·'fel.· tO! li 52.'1-~.J/7 Fa.\! (0]1) 522-.;iJ(,

Revista Claudia ol!J2 Dezembro 95 225


ANEXO 10

Propaganda de canivete .

.' ~
'.'-:j oNAMORON/NGUÉMSABE.
·.i!'
.,
:,;

226
ANEXO 11

Propaganda de livros de editora.

"OSJ<ll\ OU S<lQ~Il!)SUj SE
fe!.IOIJpa~snwwns
I i!WJO)UO::l O·l!JiiW<lJ

~ J a l!ZiiJEF' wo:> o-ey:>U<IiiJd

--------~~~~==~~~~------~
\ ~:: ~: J :';:~a:~::a:~
..

11V13:S ornyssa::J::IN? OYN I '11l'IS0d o:'.ljAJ<lS ossou o


V.LSQdS:ni-OY.LliV:J J az!l!lll 'aJJUO:Jua so o~u OS~)
------------'CC:::..::..::.::_::_::_::_,::::_::..:_::__ _ _ _ _ _ _ _ _ _l ·apepp ll'ns ap

[ SE!JElA!I seu soJAjj sossou EJjnbpy


I
ojnBd O!;!S/t:IO
I
I
l\l<l~N3:J:Jif dn I
ss/sv~~-ov <JSI I
I
------------------------------~

I!SiêJ8 dS Oir110d O~S ~00·8WSO L8ZL 'EP!<>WIV ap OSOPJE:) llll<J


fe'!.IOJ!pa~snwwns

,, .-

" ... E FORAM


FELIZES
i

PARA SEMPRE"
Apoio Cultural
dos
CORREIOS

IMPRESSO
227
GRAÇAS À TERAPIA FAMILIAR
IIMOR CONJUGAL E TERIIPIA DE CASAL BRUXAS E HERÓI$
Uma abordagem arquetfplça Uma •bordag-om lemini$1;o na terapia jungulana de casai,
Vanda Di Yorio Polly Young-Eisendrat~

O relac ioname·lliO ~"~ornem-mulher ê abordado de uma ôplica


Analisa as relaçõe> conjugais associando<> referencial da junguiana e feminista. Uma lenda m..Jieval é tomada como
psicologia anal~ica às técnica> pskodramãticas. A conju- mote. permitindo à autora lfansmillr, em linguagem •imples
salidacle é Vista como lugar po<<M!I para o crescimento da e clara, as leorlÓ> de Jung e Sulllvan. Com eota abordagem,
conoclência e o entrada no pro<:<!O!O de indlviduaç~o. S~o ela procu•a compreender a• inlorier~ncta• do• complexos
ldefl[ificada< oo mecani<Jl'IO< de proieç.!o e •• ideoHuções, indr"iduai• na• relaçOe> de casais, reavaliando o prindpio
ofere<:endo-se alternativas p.oca as ~tuaçOes connituosas ar· leminu1o e a natureza da autOfidade lem inina. Contri boi para
qlretfpicas. Par~ estudantes, profi<~icmais e c.. als em busca si~emali>ar, através desse enfoque, o conhecimento sobro
de cresdmento, Rõf. 551, Rl13,00 terapia de ca"i>. REf. 541 • RJ 18.50

O o.sAllM CRIS~ r.:;;cc-;:;;;c:-;ccc" UM f UM 5AO TRES


Mauri>io Andolli, Claudio Angelo e Carminc Saccu (org.) O casal se auto-revela
Philippe Caillé

Na dio.\mica de qualque< ca,.l interv<!m uma di,..,n>ilo que


Uma coletãnea que reúne os mais ifnj>O<t.1nt.,. pesquisado- e<capa ao oontoole dos doi< pa«ciro.. <= dimen<;lo ainda
res e !erapeUI.u da Europa e EUA em tomo da complexa
nao r«ebeu um nome, mas podeôa ser chamada de o tercei·
problemática do ca>al em !<a'l>(oml.1Ç.!o. Com abordal!l'ns to ex<:lu(do da ,.roçao ou o absolu1o do co<al. Este livro do-
~ue v:kl do. P.<canãlise à Te<><ia SISiêmica, tratando de ques. monst<> que laia r de casal em termo• do doi, el.,.,ntos <) cair
tOe< como a >e><ualidade, os l/lho~ a desintegraç~o e re- na bonolidode, {, •n•lis.l-lo •tram de um modelo falido. O
conSiituiç~o do casal, e<la obra t full<lamentall"' ra lOdos os autor ,.,.r, como o! pos:;l•eft,abolhar >Obre este terceiro ele-
inle=do. oos no~«»caminhosd., rel><;(les conjugai~ REF. meniO, devol~~endo ao casal sua C<iali•idade original. Rõf.
454,RS21,50 42\,R$16.00

A ARTE DE COMPARTilHAR A VIDA FALf COMIGO!


Franco Dei Casale Como romper a silêncio ma>eulino
Kri<~berg

Dividir a vida com oolra pessoa é uma ane que demanda Solidariedade e confiança do as palo,ra<-<h••• d«te
criallvidade, equllrbrio e maturidade. A pa~ir da <ua "Psico- programa criado pela autora. psicóloga de casais, com
logia Relocallzadora•, da Análise Transacionar e da Teoria prop(Kilo do aprofundar a ln~midade nas relações """'""'as.
'~'/1,<\!1:~~·~.,,~ SiS!êmica o auwr nos traz uma abordagemo<iglna.l que con-
Um guia pr.!Uco, com soluções e><eqlll..,;, e. ocima de tudo,
de tem senso, que ajudará a leitora; estimular a comunicaçao
·_; sldera, na terapia, fatores da per<analldade e da hl516ria fa-
miliar que podem inddir <abre a vida do casal. com seu pan:eiro. REf. 508, R$ 17,00
REF. 474, R$ 2],00 Editora ÀGORA

HOGIO ÀS MÃES MÁS, Catherine Ser"-lrier REPETIÇJ.O ETRAN5FORMAÇAO NA VIDA CONJUGAl- A psicoterapia do casa.l
"Uma ~·~sempre perfeita": idéia preeoncebida que a< mulheres carregam a panir Vera L(Jcia C. lamanno
do m<unento em que colocam uma criança no mundo. "N~·. d,z a autora, a mae Uma lormulaçao teórica a respeito do psiquismo conju~al, da5 diferente< lomm do
perleiiO n)o e•i<te o eS5e livro for escrilo para e•plicar "''" afirmaçn<>. Com inte<'Ç><> que um casal pode t"Siabclocor ""longo d.1 mn•i•~nci.l. A at.,nr.l iolm-
simpliddado e panindo do sua ol<)lcrieflcia como lcrapou1.1 o mJo, Sornlfior wi<>o:.a Óul r<i<'i•s ><>hle <>que <t••ia um.1 <>•ganiz,lÇJ<> poic(>(ic.l o uma 0 rganit,,ÇJo nJ<>-
de ponta-cabeça a )magom trodiôonal d a mac, con sidet ada aoram dos <écu los como pslcólica de cas.amcnto. REF. 451. R5 II,SO
um ideal feminino necessário •--- ><Jfidenlo. RCF. 433, R$ IS,SO
INIMIGO INTIMO- Çomo brigar com luldade no amor e no casamento
LEITURA E OIFERENCtAçAO 00 MITO- Hi<l6rias familiar"' de adolescenlcs Geo'i!e R. Bach e Pcler Wyden
com problemas, Marilene Krom Paccola Este li•ro é o relato das técnicas e e>periência• do ln,ituto de Psicoterapia de
A partir da Teoria Si<iêmica, a auwra fornece aoo p<icólogos em geral e"'" só ao< Grupo de Beverly Hills que. po~indo do P"'"Uf>O>tO de qu~ o e<>nflilo •e•bal enlre
lerapeuta< de lamma uma vislo da inn~nda dos mil<>$ familiar .. na interaçao entre marido e mulher é desej;lvel. desenvolveu mftodos quo ensinam a a~e de brigar
seus rnemhrw. REF. 46~, R$ 11.50 baseada em um sistema flexlvel de regras. RCF. 163, R5 33,00

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O Estou anexando o cheque n o - - - - - - - - - - do Banco______________ I acompanhado de cheque nominal à
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Data -,,-------"Assinatura•--------------------------- I (011) 872-3322
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alteração, após esta data. voe~ autoriza o envio? D Sim D Não I (011) 872-7476.

~' 228
ANEXO 12

Capa da revista VIP.

As estréias de
Thomaz Souto Corrêa
e Sig Bergamin

...•·,.. '

'-*
SALVE SEU CASAMENTO,

SEPARE-SE!
SÓ fl BOM
E O MELHOR
DE VENEZA
E MAIS:
Arraial d' Ajuda,
Montevidéu,
Diário de Bordo
PERFUMES DE VERÃO
A CHRYSLER
A

229
ANEXO 13

Capa da revista desCasados.

enTrevista
Cara a Cara com Marilla
Gabriela num papo
Inteligente sobre o casa e
descasa

comPortamento
As feras do ramo, se pudessem
teriam Instalado diva-beliche.

dias de hOje
Na separação ele foi a nocaute.
Ela Jé ouviu um corrig,ueiro
não te amo mais •
número você vai encontrar
a declaração dele e dela.
A conclusão é sua ...

seus direiTos
Você fica com o criada-mudo do
lado esquerdo e eu f1co
com o do lado direito.
Ou será o contn'3rio?

bares E lugares
Alguém disse que
desCasados são "sócios em
transito" do que acontece
no ti-ti-ti da cidade.
Neste número as dicas são
de um bem casado e de
uma moça que topa um
bom casamento.

serViços
Ela descasou. Tudo bem.
Mas ela sabe instalar o
novo video>cassete?
Ele descasou. Tudo bem.
Mas ele sabe lavar a camisa
para ir trabalhar amanhã?

230
SINTA-SE EM CASA

Entrevista 32 Bares e Lugares


10 Marília Gabriela 34 Restaurante
35 Aperitivos
Depoimentos 36 Artes
18 Eu quero a minha 40 Comportamento
mãe 41 Pais e filhos um
22 Ele foi embora sem triângulo nem
dizer uma palavra sempre amoroso
23 Eu não te amo 42 Direito
mais 44 Tv
24 Lua de mel de um só 46 Turismo
desCasados é uma publicação bimestral da
Sgt. Papers Ed~óes Lida. Niio é permitida a 26 Primeira noite de 50 Moda
publicação total ou perclal das matérias
e fotos sem prlivia autorização por escrito uma mulher 51 Cinema
dos ~dítores.
descasada 52 Teatro
27 Primeira noite de 53 Discos

..__
Editores: Ovora Akannan orz-ko,
Juio Fnn~ Vl.na,
M.ii'CIO doo To'*<lo Rodrlgun um homem 54 Livros
Editor respanslovel: Robeno Mor••• descasado 57 Cartoon
58 Em tempo
Assistente de produção: Jülia Raposo
Revisão: Rooynaldo SJivalra Seções
Fotografia:Edú de h~aa.
Foto da capa: Álvaro Povoa 28 Decoração Serviços
Modelos da capa: Tom tifal CEHtel,
ca.udla Molllat rnxn 30 Propaganda para 55 Ciranda, cirandinha
Maquiagem/CaDelos: Marco de S..rroo 56 Vida nova
descasados
'"""
Editoraçiio Eletrónica: HouH Editorial
Fotolito: Pom- Aa....,ladoa S. C. Ltda
Gráfica: GHifiCII ar..JIPna
Rio de Janeiro: Marc11a 8orga•

As maulrias assinadas nesta edição não


refletem, necessariamente, a opini~o d~
redação.

Sgt. Papers Edições Ltda


Rua Aspicuelta, 321
te1.:!011)21 2.1988
Cep: 05433-010 ·São Paulo

Sucursal Aio de Janeiro


Rua Miguel Angelo, •1s
tel.:f021 )581.0512
Cep: 20785·221- llio d.a Janeiro

,,
-
·~····-·~··---·-·

231
ANEXO 14
Foto na Revista Psychology Today.
Cena com a frase Just Divorced.
ANEXO 15

Artigo sobre loja para descasados.

Descasados ganham uma'


loja exclusiva nos lardin~
Do Reportagem loecl com wn pequeno bar, servindo sa~-f
duiches, dririks e com a r -,_
Depois de várias casamentos des- "happy hour", quando o .!
feitos, os irmãos Jorge e Paulo alguns artigos terão desco ;
Calfat, que há alguns anos atuam no valeil. :apesar da venda f
ramo de confecções, resolveram . P,Cib co masculino, chama
aplicar a experiência adquirida na 'C!ul;le_ do Bolinha". "AJ; mulheni-~­
"arte" da separação em prol daque- que aparecerem serao muito bem,
les que passam por essa situaç;lo récebldas", diz Jorge, descasado lr~~­
pela primeira ve~: in.augw"aram. on- vezes, que cootratou três vendedor~.­
tem, na região dos Jardins (zona sul para atende!" OS futuros clientes. · "
de Sao Paulo), uma loja -a BB
Wear- especializada em artigos
para as pessoas' que vivem SÓII. "i!:
A!ém•-~d•o."!\.~~~"~ ;;,:;~p~:l:!.,~~ i
comum o marido descasado sair de
casa levando apenas a roupa do
corpo. A mulher na:o acaba mesmo
ficando com tudo1", diz Jorge Caltat,
34, que reuniu em sua loja desde
cuecas e camisas até porcelanas,
bebidas e jogos americanoo.
-Quem cbegar na loja -localiU~da
na rua Doutor Mário Ferraz, Ita!m-
esperanda encontrar artigos diferen-
tes daqueles adquiridos por qualquer
homem casado, no entanto, ficará
decepcionado. Não estão à venda
passatempos exclusivos para uma
única pessoa, Uvros de receitas ou
pratos congelados. A diferença, se.
guncto Jorge, está no estilo: os pratos
e copos têm desenhos masculúios, as
toalhas de banho -S<'!o sempre do
mesmo tamanho e os jogos de cama
não possuem estampas muito colorl_-
das ou espalhafatosas. ''Homem não
gosta disso", aflrma.
Inspirados em sua própria expe-
riência como descasados, os lnnll.os
Ca!Iat pretendem faze~ da nova loja
um ponto de encontro entre as
pessoas solteiras e o lugar contará

Jocge CallaL, um
duo propri~Lérioo
da BB Wesr, ao
lodo doo
conjunloo do ~h&
<<~fé poro
<i"'"'""do• '!""
i"><l<m ocr
<ti<On!Cü~OO nü
loja

Folha de São Paulo A-9 16.09.87 233


ANEXO 16

Logotipo do "I Congresso de Terapia Familiar"-


um ovo.

ANAIS

Famf/ia:
Lugar seguro para
crescer.P

SÃO PAULO, 27 A 30 DE JULHO DE 1994

ASSOCIAÇÃO PAULISTA DE TERAPIA FAMILIAR

234
ANEXO 17

Logotipo do "II Congresso de Terapia Familiar"-


um sistema.

11 Congresso Brasileiro
de Terapia Familiar
Dias 1, 2 e 3 de Agosto de 1996
Hotel Serrano • Gramado • RS

Tema Central
A Família na Virada do Século

Convidado Especial
MaurizioAndolfi
Promoção:
AGATEF - Associação Gaúcha de Terapia Familiar
ABRATEF - Associação Brasileira de Terapia Familiar

Informações & Inscrições:


VJS ASSESSORIA DE EVENTOS
Telefone: (051) 335.1933 • Fax: (051) 330.1134
Rua Vieira de Castro, 150 f cj. 501 - CEP 9004D-320- Por1o Alegre - RS

'
IMPRESSO
235
11 Congresso Brasileiro
de Terapia Familiar
Dias 1, 2 e 3 de Agosto de 1996 • Hotel Serrano • Gramado • RS

236
ANEXO 18
Logotipo do "III Congresso de Terapia Familiar"-
família no globo.

o <ll
Ol
Ql

a:
-a: oz o
I
z
..,:J
~<C u<(
--
Vl...J -0:::
<C- 2:w
a:~
[O~ o
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u.J<C o
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a:: a:
z::l- o~
~u.J

o lU u
uO zw
H
1=1

237
ANEX019

"Brasil deitado".

r:-;::1 ASSOCIACAO
~REGIONAl
r:-;::1 A.B.
(.";;\ ASSOCIAÇÃO
~ '-2:/ BRASILEIRA
CONGRESSO
(2) representantes
regionais para
o Conselho De-
llbera11vo da
Assoclaçoo Bra-
sileira.

238
ANEX020

Matéria de jornal intitulada O Homem é Mulherzinha.

. 1 • ;1 qpinião segunda-feira, 18 denovembrode1996


~ 151 .• u,, ...
FOLHA DE S.PAULO
-~==::.=.;:==------- ·---- ----
Ohomem é mulherzinha
JOSIAS DE SOUZA Falsa ou verdadeira, prevaleceu a
impressão de que elas não se conten-
São Paulo- A situação não está para tam em ser parte de um todo. Querem
risos, Comece-se por lembrar o caso de ser o próprio todo, o absoluto.
Xuxa. Vende-se hoje a idéia de que elas re-
É bela. É famosa. E ricp. É tudo. Des- colonizaram o mundo e se esqueceram
perta no homem o frêmito do desejo. É de reservar espaço para o neocoloni-
a diva das paixões onanistas. , zado. De modo que a opressão se tor-
Pois resolveu ser mãe. E, como se sa- nou ventre da reação.
be, dá de ombros para o fálus, Pensa
em recorrer a métodos artificiais. Talvez tenha faltado ao feminismo
Xuxa deseja engravidar e ter o filho um bom marketeiro. Um Duda Men-
sem o coito de permeio. Quer a fecun- donça que embrulhasse a causa para
dação assexuada. Busca a gravidez as- presente.
séptica. · Satanizado, o macho diz ter perdido
.É o sinal dos tempos. De· senhor da tudo: a hegemonia no mercado de tra-
situação, o macho foi reduzido a sê- balho, a condição de provedor de fa-
men. Eis algo que nem Freud ousou milia, o titulo de predador sexual...
antecipar. Tudo.
O pai da psicanálise criou a tese de Oprimido, ele reage. E o faz com
que meninas invejam o pênis. Acham rara competência. O masculinismo,
que lhes falta um pedacinho, movimento ainda fresco, é irmão iê-
Só não previu que, adultas, apregoa- meo do feminisnro.
riam a inutilidade das partes masculi- Súbito, o macho rouba da mulher
nas e, de cambulhada, do próprio ho- sua melhor arma: o papel de vitima. O
mem. Quando começou a clamar por homem é a nova mulherzinha. Fragili-
igualdade de oportunidades, não se zou-se, Organiza os primeiros semind-
imaginou que a mulher imitaria o ho- rios por seus direitos. Não demora e
mem no que ele·tem de pior: a onipo- estard- queimando cuecas em praçc_
tência. pública.

239
ANEX021

Serviço PAI 24 HORAS.


Texto de Sócrates Nolasco entregue a pais.

~~ n ~
~.:-~~e;~
~.,-., "" H"HU E.S.!l~-~~

H]~~ ~~i"-'ii~ ~.-;.,"'!!.


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-11 ~ • .;.<:~1ir;; fJ;:,', i1H~ ~
~..!! 2 "'::: dl!l~~ 2 ~ -~g~i
p~1 ~i
o;-.•
~;~ ... .§~~ =~-lln~l.g~
8.:l e o ~J!
-!:il;::E::E,Ps ~~ ~=:-'ª~
. t. P
i Ui~~ i!~o-~"õ"s- ~c c"~

~_§~ij ~ =:..!!E~.,..'/.;!
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241
ÚTERO, CAMIIDA E BISTURI
Sócrates Nolasco"

A proximidade com o século XXI só nos faz ver o quanto é difícil mudarmos velhos
padões de comportamento. por exemplo como um homem se torno pai. Se
considerarmos o preparação e o momento do parto, veremos que nele o que se celebra
é o vinculo médico-mãe.
Existem muitos hospitais que proibem os homens de participarem e
acom~nharem o nascimento de seus filhos. Mesmo que existam justificativas médicos e
disciplinares sobre estes procedimentos. me perece que o que está em jogo é o reforço
dado ao sentimento de eslranhomenlo vivido pelo pai na solo de parto. Nela. cabe a
ele fotografar. filmar o show-business produzido pela técnica.
Os sentimentos dos homens são desconsiderados e. caso apareçam. sõo
desqualificados. "Frescura; estar grávida; ficar nervoso" , sõo alguns adjetivos usados
paro nomear e impedir que um homem identifique seu lugar no cena em que teve uma
pequena, mos significativo participação.
Do modo como está organizado. o porto serve para reiterar que aquele bebe
pertence a mãe. que os homens não estão preparados poro cuidc:r dele, no melhor dos
hipóteses é recomendável que um médico ocupe este lugor e, que o pai registre
direitinho tudo isto. Esta dinâmica que marca o início do distanciamento entre um
homem e seus filhos, está presente na gestação e é coroado na sala de parto.
Seguindo este ritual é compreensível o constrangimento dos homens diante do
bebe. o medo de fazer a ele algum mal. de deixar cair, enfim. fantasias de quem procura
um lugar e que deseja ser reconhecido para além do papel do provedor.
Felizmente hoje. existem pais. médicos e móes que compreendem a importóncia da
participação dos homens neste processo. entendem que convida-los o participarem das
consultm ginecológicas não é o melhor maneiro de atrai-1m. homens não tem úteros.
mas desejam filhas.
O nascimento está para além do porto. Ele marca o ·1n"1cio do estória de vida de
uma pessoa que pertence o si mesmo e para tanto. tem o direito de conhecer seu pai
pelas próprios alhos e sentimentos. sem o mediaçóo do útero ou do bisturi.
A patemidode não nasce apenas do capacidade de um homem poro promover
e registrar os momentos importantes de vida de seus filhos mos, do esforço por vive-Ja
junto e comprometidamente com eles.

(•) Psicólogo e Diretor do Programo PAI- 24 horas


tellax: 294 7l 04
E-mail: nolosco@omega.lncc.br

242
O GLOBO
Depressão: As Amor: Pesquisa
múltiplas origens
de uma doença
perigosa • 2 JORNAL DA FAMILIA DOMINOO, 11 DE AGOSTO DE !996
revela a vida
sexUal na terceira
idade• 4e5

Direito à paternidade

:
.
~~~~~~~~::~~~:''f"l!"""~~~~~~~~~~~~~~~~~~::::::~O;
11' •
tero, camera e bts• turt•
oo .... .,.~ •••••• ~.
;.;.:.;~bO~C~~~~qHO"'
-Oquo!.o;~I<'W'tpan."""mafidc.lno'
''·"'""'"""j'"""'·'-1.>'""''""
.
N
um 1jf11pod< 200>001<01 •~ ""'""""'"'"' ..,,...,...,,..,......,.,...,,....,..,_
'"'"''"dia lodo"""'"',.. "''"'" o.,,.ercocltllr.>:o"""' c<\u omo dUt~~
ooOitMJo do .,,0(0 Eop•«> ,..,.,,. "~"" """"~ qoo mom "'" dll<<ndome"o <o,_., <lo ''"''"'""" .,.,. ., ;.,.,_ .!.< O..ln
'-·~ .. a.,,.'"'11100•.
dtscullndo o p&l"l quo do- o A ""'~'"""' do okuLo 100 "" '" "' o
..... •• ....,l!lho,, .. ~ ' " " " " .......,..
o O<omodo 01 .... de pulo.
''" """" ............ - .....,,,,.. _.
t.«>Oo Eop&ÇO lnl~~.,,......,....,,,,.~""-
"'"''"''"'"''l>u-"""'';lo '~"""'' <dlllcll "''"'"""''""'"podo ... d< ''"'"'' em oltool, I comptt<n<IY<I o llnC.OOJ r<OIIII>dOO< p<Jo d<...,.500...,.i,,..
doo mo ... No ou"" ~do ela eompo~un .. to. ..,. -mpOo, '"'"' .,. ho. ..,..,.....,....,,,..,. ,.,...,. dl..,,. do"""'· ,.,..., .,..,.,.. "'''"'"''I ~""f~'"""<'" pooum
d<WI~ .. C<.<he C""'"l'fl> .,.01 ,. "'" p~. S. coo~o~onn.., • ,,..,.. o!n<dodol.,.,, ·~ ~IU"'m~.ded~..,,~.. ..,,..,~.do-."" q.. ""'"'., ""'.,,.,.,.
<1~ no,.,...,.,,......, p.opo(>Ode '"""'""~... r..;loeo mommta doi""O. """""que"'" ....,.,, !>otuW ... q"m "''"'"" um luiU o 10<1<>1 pod<llo W.. d< lUIS ...,.n,,.l., • dl~
eolhow .,..,.,,.,.,. do•~lhO<"' cn<ho. Com o lo o~""" e<l<b<o e o vinculo medlc<>01". '11'< ;.,~, WR<"""ecldol>•" ~~"' ~. ,.. coldod<> om,.. p.oJo.
ljudo du b<tç""'tu, tsUrlo """""''''~du. E>llt<"' mul<oo hoopll<l< ""' '"'"""' " ,.., do,........,, -n.. """ ,...,........, ,... ""'""''""'~"'
l.,"'>do"""~toodeostimui'l"lo<ll"'"'"'"' holtloooo do putklpuem do""""'"" d• Fel~m""· hol•ll "'"'"' "''"'"' ' " "'"'do p.oJ "&d~loool oqod.o ""'"dbton1o .
.. """'- , .. ,. ,..,..,.... , .. .,..., • """'"""' .,., Olho< . .,.,.,. ,... ,..,,~ Jo>>'k~,... '""'""""'.., '"""'""'"''''"""~"''"' que ddlnho o outorldldt e "Jirlo., ,,.,.,,...
""' Olhoo. No \<m"'ll ...-d~ dur10te """"' m<dkn • ·~~~- ooO<c ,.,,. ''"'""' ..,,...,.,,., ho.....,doodoololdod.,<o pro- d<> do ..,., t """"""., polo......, otl o "'""
""' ""'~ oJudo. o'"'""""" 1 quo p.oJ • '"''
"~do ...,.,,_....,,l"lo
'""· o <><r<""' do patmlldode foi o'"""""
F""""'' Clln<~
'Cultu!O do UflU. qu• ...,.1; prcfl .. looÚ> ,.,
.,..,.,,.,.pu""'"" oq,..<>ll«nloto I•
""""ododo '"''"'""''"ode.,ttw..,.,.o
.,.,,, ,.., pd "'"'' d• ,.,._ N~~ ""' •
..,,._ Erlt<o"" '"' """""" • """''""
du con"'llu J\11« .. 0~00< nlo I 1 ln<lhor
....,..,.,...,., ...... ,,...,..., o>o>lm<t=
'P'""d"" qu~ <m .. ,.,,...... ~lho,~., Ot<-
"""' "'"' «>m<>"'" cuol. ,..,.., q,. nlo '~
úeud<oducot;lo.S<Ildeodi""to.DedOI....,_ ololotog.alaroo ~~-··-•""'""" ""' ..., '"~"" ""- ""' , . , Jun,.. -II<Wdono ~
~~.:..""" ..... · - 0 ........ ""' c!o ""' ·~~ ......................... · - - · ..2a"'!:~.~~~·:~.·.t:.:::-,! d~~·~ =~.!~:!'r::"" 'i:~":.',.~;;
do
-Elos"'"'"""""'" do<tioçiod.,. nlh"'
por culpo du 011 ... que &Cibalot.,lutuwlo o
dor.doo o, <UO opu'<am. o1o • ...,,.,,~~
, dM. "fm<O,. e>l>r vivido, ll<u """""'"·
,..,.,,,,"'''"'~-moo.puoUOio.""'
oditdo d«O<!Mcu '"' p.oJ ,..,, ...., .,..
""'blm•lo..., .. ...,...,....,,qW<pU"'I.m
• '""""" " ' '"""""' .,......,... «&o,.,.
........, ,...._ """'"" "'""quo<>< btbOo ,... o1o .....,.., du ....,...,.., ..,,., ..,,,.,. P>'"" olhooo,..tim<nloo. ,.,,. """'•tio do podu qu>nta oo """''"'·
'"'• ll<ld<t..,.,.,doquololllllq..., ..... ,.. ""'"..,.um hom•" ...,,...,.,.'"''''"no Ototo ou do'"""" - fom01 nO. qu.,., do.,.. cotU formo. ''~
ourar,dorbWo,.t.......,.,MJ;I>OOJ<OI,elo.. ,.....,,..,..,.,.,.,..,poqutm.mnol~ Apot...,dodo .... oniOd•"""''"'"' """""'"""''.....,..,.......,,.,..,e,.....
"""' .,,,.. •• cnanç~O. p.oJo.,tlo """'"''" •....U•• puti<IPI(Io. "" ..,...,. poro""'"''"',"'~"'" oo ~... de poli""'-......._,....,...,.,,,,""""
do ....,.,.,. o oondiÇ>O do ..,... ..,......,.._ n. .... o....,.,..mpmudo, OfW"O"~ mMIOI ltoJ>O~'"'" do vtdo O< ""' ''""· - """"' So.>z.,~ doCn<ho ComMnd~
D<>q .. ...., <><feiUapote<nldodoo<l....... vc ""'' ..Oiotu .... aq,.lo ,.,. ""''"«
& ""'"'"'"'"'"'"'""'" "'"" • <Omp"'~... Paro Corto ....... "'"'"'· I t«ol< do p<o]oto
""'m "''""'"" <OIO<ÇU-M~Uo, P<doiotl'
Lod .. o S..«~ do ..... <0 ""OV•L
'"'~ q•"'' ""~'" olo..UO p<epuldoo p•·
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fUhoo '"""' lo<mo do ,..r.r"' teloçlo.
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po,..,dop.oJ oo Yidodo! ..W.çu.""oftmd.,t< du" ..00#<>.,.. molo m.l•- '""''o"""'" O"""""'"""''"'"'"""·'' duolo ''"""' '""""""' '"' """"" o.,..,..,., do.,.. •
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út~o)ln/O<m'l.., poro om p.oJ ollttoou ""'"'" Culos Edouc!o. doi""''·""''"' oom ... hl• -Sdl«nmi~O..Oiou.,.tmhlo" - · ' ' M{UnU), od" '"' '"' ,.,,.,.,, '"'" '""'"'
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243
ANEX022

Grupos terapêuticos só para homens

GRUPO TERAPÊUTICO DE HOMENS


UM MERGULHO NO UNIVERSO MASCULINO

1 ~w~ _ro~ as ~~o_anças oco~~as nos_~tunos anos na sociedade, mudanças que nos atmgtram
de che1o eXIgmdo de nós uma nova postura e adaptação.
Como os homens estão enfrentando e encarando tais mudanças, uma vez que elas ocorrem em todos
os níveis do relacionamento humano?
De que maneira os homens têm enfrentado a realidade da mulher ter saído para o mercado de
trabalho, ganhando cada vez mais espaço e autonomia?
As relayões entre homens e mulheres .mudaram ,e não dá mais para fazer uso de velhos padrões, a
vrda exige agora novp.'P,O~ ~o:va;atitude_ oon~gq ewm o_ O~!I:O. · .·
Quais os impactos causados por estas mudanças na psique masculina?
Os homens encontram-se perdidos no momento, sem eixo, muitos deles estão numa busca sem
sucesso, outros encontraram seu eixo e estão se adaptando e outros ainda não se deram conta destas
mudanças, mas de uma forma ou de outra estão sendo atingidas por elas.

Objetivo: Este grupo tem como objetivo principal levar os participantes a entrarem em contato com
sua verdadeira essência, a dinâmica masculina.

A quem se destina: A todo homem que esteja interessado em se conhecer melhor e que queira
partilhar com seus semelhantes seus sentimentos, medos, inseguranças, angústias, tristezas e
alegrias.

Inicio: Terâ início no dia 02/julho/98, e realizar-se-á todas as su feiras.


Horário: Das 20 às 21h30.
Local: R: Joel Jorge de Melo 46- Vila Mariana- Tel. 1011) 572-3026.
Inscrições e lnformações: Por telefone e/ou fax com Fabiana de 2a à 6a das 8 às 12 hs-
Telefax: 6941-4587- Va as Limitadas

Psicoterapeuta: Evaldo Teixeira da Rocha, Psicólogo Clinico CRP 06/37.522-6, com


Especialização em Psicoterapia Junguiana coligada às Técnicas Corporais pelo lnstituto Sedes
Sapientiae.

FICHA DE INSCRIÇAO

Nome:_~==============;~~;~======~=============:.~D;,at;a~N~a~so~.
Endereço
CEP·,-_ _ _ _ _ _ _ _ Cidade'----=-------Estado =~/=~=
Com•···============:::Re:•~·=============== 244
Profissão_
Te!.
-
ANEX023
Palestra promovida pelo ITFRJ- Instituto de Terapia
de Família do Rio de Janeiro.

E PESQUISA EM
TERAPIA FAMILIAR SISTfMICA

São Paulo, 16 de abril de 1997.


Caro (a) Colega

O ESPAÇO ABERTO do FA MILitE retoma suas atividades.


Como você sabe, este encontro tem como objetivo manter o diálogo com colegas
que, em suas pesquisas e práticas, especializaram-se em aspectos que podem
enriquecer o nosso fazer clínico como terapeutas de família.
Convidamos você para a nossa próxima reunião com:
VANIA GURI YAZBEK, psicóloga, terapeuta e mediadora de família, fundadora do
FAMIU.LE, membro docente do Instituto Nacional de Mediação e Arbitragem (INAMA-
SP) e membro da equipe de mediação da Fundação INTER FAS (Argentina).

Tema: "Mediação de Conflitos em Família: um Recurso de Resolução"


Data: 12/05/97
Hora: 21:00 horas
Local: Rua Pascoal Vita, 540

Nossos próximos encontros, sempre às segundas, serão:


No 1" semestre
23 de junho: Ora Tai Castilho, diretora do Instituto de Terapia de São Paulo
No 2" semestre
25 de agosto e 24 de novembro
Aguarde nossa correspondência com o tema do próximo encontro desse semestre e
os palestrantes e temas do 2" semestre.

Contamos com sua presença.

Equipe do FAMILitE
245
ANEX024
Artigo: Separações aumentam 22% em quatro anos.
Jornal Folha de São Paulo, 04.08.96.

,1: FOLHA DE S.PAULO A


DIRETORDEREDAÇÃO;OTAVI_OFRIASFJLHO
Si o Paulo, domingo, ~deagouo de 1996
** * UMJORNALASERV!ÇODOSR.\Slt * Al.AMEDABAilÁODEUidEII<A,i>J * AN07~ * N•...,•l * R$>,oo

Brasileiros casam menos e mais tarde

Separações
·aumentam
22%em
quatro anos '""•o• do Arto/lolho lm>,,m

As separações judiciais au-


mentaram 22% no Brasil em
apenas quatro anos, relata José
Roberto de Toledo. Em 94,
foram 86 mil div6rcios e des-
quites,~ontra ?O mil em 90.
Nos casos lítigiosos -que
envolvem disputas na Justi-
ça-, a alta foi maior: 38%.
Além de se separarem mais,
os brasileiros estão casando
menos e mais tarde -e cresce o
mímero de pessoas que vivem
... mais separações
juntas sem vínculo formal. 86mil
A queda no total de matrimô- ~"'
70~~Á~
nios no país foi de 24% de 86 a
94, segundo o IBGE. O percen-
tual de mulheres de 25 a 29 anos
que viviam em união consen-
sual subiu de 9,3% em 80 para :~~"'9~·o>.t<;';h,:'\·.5 ,-,~:~_::Hs~g1-í
l7,8o/oem93. Págs.3-1 a3-5

246
-
ANEX025

Impressos com divulgação de grupos de gênero


("Gender Groups") promovidos por psiquiatra.

RECICLAR-SE É PRECISO

EM BUSCA DE UMA COMPANHIA


"GRUPO MASCULINO EGRUPO FEMININO"
SÁBAD0,29DEMAIO .
.
GENDER GROUP É APOIO Homem ou mulhlll', você não acha qua li
Importante ter alguém que realmanta
PARASEU 'TRABALHO . preencha suas necessidades ala Uvas? Como
encontrar ou transfonnaro vfnculo com quem
Já estamos?
1.-bcé qUB é profissional dB psiquiatria a psicologia, tsm um bom O que esp&ramDll do relaelonam&nto com o
motivo para conhscsr o GENDER GRDUP, porqua o nosso companheiro ou companheira 1
trabalho poda ssr ussdo para J..t:Ocá complamantar o apoio aos auar si!I"Ja o perfil real e não o Idealizado da
ssus clientes, principalmente quando o assunto for quem nacuslto 1
nRa/aclonamsnton. E quem &U tenho, o que 9llconlrol, oomo
Somos especializados a mais de 20 anos nos temas referentes às eslouvtvendo esta "companhia"?
re/açãas do homam a da mulher modernos, sm suas Onde ma atrapalho? Qual o meu maior
necassidadas df!l Jntf!lgraçiio, compreenção f!l raclc/agem no miiCio?
auto-conhl!IC/mento dlJ seus sentimentos a a/atos. Não temos um modêlo adequado para sabsr
como ser esta homem ou esta mulher que
O QUE É GENDER GROUP
pode sa conaetar com seus afalos e que, ao
Os gruoos de gimerotilm ooorrldo em todo o mundo como uma n&eessidada mesmo tempo, se respr~lta a é respeitado pelo
de reformulações nos vínculos entre hcmen~ 9 mulheres. Estamos nos outro. Só entre homens • no grupo
preparando para entrar no século 21 com nwa solicitações e mu~"-" masculino - e só entro mulheres • no grupo
e~~f>oclativas. Nossa eJqJeriência com GENOER GROUP está fundamentada
em trabalhos pOf diversos paisos, participando ou coordenando grupos em feminino • poderemos falar, pesquisar e
Amsterdã, Holanda, Montreal, Canadá {Congresso da Associação perguntar a respeito da como estamos.
Internacional de Psicoterapia de Grup~IAGP) 9 Buenos Aires, Argentina Homens deVem resgatar a energlamascullna.
(Jornada da Sociedade Argentina de Psicodrama.SAP).No Brasil estamos Mulheres devem rasgatar a energia feminina.
trabalhando há alguns anos no Congresso Brasileiro de Psicodrama • É bom encontrar um lugar onde· sa pode
FEBRAP a no Encontro Internacional da Psicodrarna alârn de palestras e conversar sobra estas coisas. Esta grupo foi
grupos de gênero masculino e feminino um vários estados brastleiros (São criado para Isto: para aqueles que querem
Paulo, Rio de Janeiro, Paraná, Minas Gerais e Capital Federal· Ministéno da
Justiça, Conselho Nacional dos Direitos da Mulher). rellellr &obre sua relação com a rriulher ou
Os trabalhos com GENDER (gênero na língua inglesa) refletem as homem, Jncklpandenlemente da ter um
n&eessidadas da sociedade atual a assim utilizamos da nossa experiência ralaclonamenlo constante ou lormall~do
como psicoterapeuta há 20 anos, para criarmos uma raformulação da num casamento e também para quem está à
identidade masculina e feminina.
Proport'IOS em lodos oll nossos grt.tpos, Ut"l'i redimensionamen\o dru; procura da algOOm qua o preencha realmente.
relayões de cada um ~onsigo mesf!!O e com. seu círculo afetivo, social e Num mergulho lnlenso 8 profundo, lidaremos
profissional. Num ambtenta confortaval e amstoso, cnamos um grupo de com as venturas 8 cklsventuras da busca de
desenvolvimento pessoal com abordagem psicodramátlca. R&eiclamos um relacionamento afetivo harmonioso. Serão
seus integrantes no que é ser masculino para o homem e ser feminina para a 8 horas dll trabalho com Jntlli'Valos para
mulher no mundo atual.
lanche a almoço Juntos.

Psiquiatra pela Faculdade de Medicina da Universidade da São Pulo. Professor, supervisor e tarapeuta de alunos pela sociedade oe
Pslcodrama de Siio Paulo e Federal'iio Brasileira de Pslcodrama, Assoclaled Director pelo World Cent"r oi Psychodrama, Morenc·
Jnstltute • N.Y. • U.S.A. Dlrector on Pslcodrama p..lo Instituto J. L Mornno, BU!!nos Alrns, Argentina. Ml!n-bro da tnternatlona!
Assoclatlon oi Group Psychotherspy da Aroorlean Soclety oi Group Psychothernpy and Psychodrema, Supervfsor de Pslcodrama no
Serviço de Pslcoterspla do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clinicas da Faculade de Medicina da Unlverslade de São Paute.
Coordenador a Supervisor do Núcleo de Alendlroonto ao Adolescente da Sociedade de Pslcodrama de São Pauto. Autor do llvr~-
• MascuttnoiFemlnlna"{Edltora Rosa dos Tempos-1992), baseado nos 'GENDER GROUP' dos quais{; precursor no Brasil.

INSCRIÇÕES - FONES 011/887 8726/887 2264 - FAX 011/887 3277


247
RECICLAR-SE É PRECISO

Homeni ~~-- niulh~~.·-~cicê ··não acha que é i-mportante ter alguém que realmente Preencha suas
necessidades afetivas? COmo encontrar ou transformar o vínculo com quem já estamos?_
O que esperamos do relacionamento com o companheiro ou companheira 1 ·
Qual seria o perfil real e não o Idealizado de quem necessito?
E quem eu tenho, o que encontrei, como estou vivendo esta "companhia"?
Onde me atrapalho? Oual_o meu maior medo? ·
-Não temos um modêlo adequado para saber como ser este homem ou esta mulher que pode se conectar
com seus afetos e que, ao mesmo tempo , se respeita e é respeitado pelo outro. Só entre homens • no
grupo masculina • e só entre mulheres • no grupo feminino • poderemos falar, pesquisar e perguntar a
respeito de como estamos.
Homens devem resgatar a energia masculina.
f)llulheres devem resgatar a energia feminina. .
E bom encontrar um lugar onde se pode conversar sobre estas coisas. Este grupo foi criado para isto:
para aqueles que querem refletir &obre sua relação com a mulher ou homem, independentemente de ter um
relacionamento constante ou formalizado num casamento e também para quem está à procura de alguém
que o preencha realmente. . ~
Num mergulho Intenso e profundo, lidaremos com as venturas e desventuras da busca d~ um
relacionamento afetivo harmonioso. Serão 8 horas da trabalho com intervalos para lanche e almoço juntos.

Hc,melns e mulheres encontram dificuldades nos


relacionamentos que ao mesmo tempo os apoiam
e os invadem. A nossa sociedade não nos
preparou para as mudanças que vieram
ocorrendo nestes últimos anos de
transformações das relações homem·mulher.
Particularmente homens têm poucas
oportunidades ou pouco tempo para sentarem.se
e discutirem abertamente como são as
experiências, semelhantes de outros homens. ser
homem hoje é integrar afeto e razão, senfrmento e
inteligência, criação e execução. O grupo de
homens trabalha separado do grupo das
mulheres, encontrando·se posteriormente para
uma reavaliação conjunta.

248
ANEXO 26

Capa e propaganda de outdoor da Revista Encontre.

LEONARDO: Um verdadeiro temooral de amor

ANO l N' I R$ 3,50

E MURILO
AMOR, Se abrem para
o amor

AMOR,
TIGRE
AMO MA

249
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250
ANEX027
Variadas matérias sobre o tema
da "alma-gêmea" I "cara-metade".
Matéria da Revista da Folha -O Homem Ideal.

- - - - - - , Desta vez a Mar'! e o Galli resolveram


tingir que não passam de bons amigos
para ter uma conversa reveladora sobre a
relação

entre •
men1nas e memnos.
endo as canas que recebemos de vocês reporomos que o mmorio

L fala sabre casos de amor que não deram cena. Par que Por que o
tempo passo. os gerações mudam e os h1stórias de amar na
adolescência são sempre os mesmas? Chegamos à conc:/usão de que o
que falta é comunicação entre dois umversos: masculmo e feminmo_
EntOa resolvemos 1magmor: e se nós fôssemos grandes amigos no
--------.1 adolescência e pudéssemos nos dor algumas dicas_'

MAR! -Sabe. tô a fim de um men•- engano. Isso nunca vai aoaixomí-lo, vai MARI -O que eu faço para ele se
no do meu condomíniO, que não sabe no máx•mo, deix.i-lo com tesão. apaixonar por m1ml
que eu existo! MAR I· Como é que eu faço então1 GALLI-É um problema. Nós meni-
GALLI -É mesmo' GALLI ·Acho que uma boa dose nos costumamos estar com o mUseu lo
MARI ·já fiz de tudo! Danço que de m1stério é fundamental para que se do romantismo meio atrofiado. Por isso
nem maluca nas festas. canso de jogar desperte interesse no outro. a gente parece ser menos romântico
charme pra ele e de dar indiretas. uso MAR! ·Acho que fiz besteira' por natureza_ Eu não sei. acho que tem
as roupas mais sensuais possivel. ma5 GALLI ·Por quê? várias formas de fazer um menrno se
nada funciona. Que eu faço? Boto uma MAR I ·Você promete que não apaixonar. Eu estive pensando ... Vou tr.lir
melancia na cabeça? conta pra ninguém? a minha classe e dar uma dica pra você:
GALLI • Eu não sei como você vai GALLI ·Prometo. a melhor forma para isso ê tocar no seu
fazer. mas cuidado para não se vulgan- MAR! ·Fui a uma festa maravilhosa orgulho masculino. Vou expl1car: aco1sa
zar! Porque, eu tenho que confessar. os ontem! E ele estava lá!! Sem dizer nada. mais gostosa que existe e sentir que
meninos são um pouco preconceituo- dei-lhe um beijo na boca' Só que eu esto1,1 protegendo a minha menina_ E
sos em relação a 1sso. Ê contradrtôno: estou arrependida! O que ele está pen- assim com todo homem. Se sentirmáõ-
tudo o que a gente quere que a men•- sando de mim? Socorro' Me ajuda! CI,IIO, forte, homem e protetor é muito
na transe, mas se parecer muito f.ic:il GALU ·Você é louca mesmc>1 Eu par- importante para nós. Mas. na verdade:.
perde a graça. O que eu quero diZer é ticularmente acho meio esqu•slto meni- para isso acontecer. é a menma que tem
que você tem que chamar a atenção do na decidida assim. sempre preferi as mais que deixar ser protegida. já sacou? No
menino de alguma forma. mas talvez a tímidas, mas tem muito amigo meu que fim das contas, quem comanda tudo
melhor forma não seja atraindo ele gosta. Pelo menos você fo• fundol mesmo são vocês men•naó.
Sexualmente. porque voce COrTe o séno MAR I· Como ass1m' MARI·Adoreil Me conta mais. Eu
nsco de se vulgarizar aos olhos dele. GALLI • Eu acho oue na ma•ona prec•so saber de tudo'
MARI • Mas voces só oensam em das vezes. o namoro não rola porq.;e GALLI ·De je'lto nennum'. Se eu
sexo! Como que vou chamar atenção' a gente não tenta de verdade. Expe- contar tudo vocês mulheres oom•narr.
Batendo papo-cabeça é que não é riência própria. Eu era aoaixonado por o mundo! Quem sabe na prox•ma rev•s-
GALll • Voce tem razão. na verda- uma das meninas mais bonrtas da esco- ta eu dou mais algumas d•Ca~ [!S
de é uma c:o1sa enlouquecedora pra la e nunca tentei nada. achando que
gente: "não é o men1no que tem o tesão ela nunca ia querer nada comigo. Anos Maria Mariana. 22 anos.
é o tesão que tem o menino!" Se o tesão depors fui saber por v<inos am1gos em é atnz e autora do livre
enlouquece os meninos sena óbv1o pen· comum que ela era aoa;xonadiss1ma Con(!ssões de Adolescenlf
sar que a melhor forma de chamar sua por m1m e nunca tem:ou nada pelo Edmardo Galli. 26 anos. e
atencão é sexualmente. Ai é ou e esta o mesmo mot1vo. batensta e ator.

'" CAPRICHO· M>1o

251
252
A, NÓS • Eu %-la.,
CLASSILINE DISCK DO-IN- massagem ao- PROCURO - alguém cnlre RAAO PRAZER • fii.OQ> bonl· CASAL • malmonro ""....00,
561<g. """"'"'· .rmp.l.lloo, ~""'"'r ljfiiUo. :;o para 1><:1men11 2012~ que seja sincero, bonito. 10, potuoo, ciaro, 1.78m. 91kg. 3213Sa.. dobem com a vO;Io po-o-
:p0ôor, olnoem e .rn~~,..r mor.....,. e nlio gays. Eu lmlnco, méscuJo e tolalmante discreto pf não elemõnB<lo, procure '""""'"" cur.~m moças sollolras doooom.
IIOCê gatõnh<>. S<lf!Sivol,
• btanoo (l'noreno ou ~·
bonllO, 43<1.CP920 2.
DISCRETO· 4{!a., conslde<ado
futuro rela.cl<><mme<~lo. CP 9591
PROCURO. alguém <ll.le lanho
bonitos. não efeminados, p1 uma
amizade especial. Peço e IJBfDII• MULHER plicadas entre 25J30a .• pera no--
vase•r>oriêflCias.CP9291

.-----------1
'x>m J)OIIe l~co para ••· lo olgUo e discrição, lnclus"" à
11douro. Boi•lnllos e ma·
, me liguem tarnl>6m. CP
bonito, descelldeota de espa-
nllaõs, artista, procur.~ você de
ranlosla de oiver 2001 noilas do
m'"lo prazer e cumpllcidado. Se<
ea.. d<>S. C&o. a vida é uma •ó.
Não lonl>o medo de S<lr foll>. CP
PROCURA MULHER CASAL CASADO • alio '"'""'·
35131a.. procure mulhorM """""
:!S/4\la., chsr~ bem h'""o-
mdo, d'ocm!o, bom "'"""'Ido
pa-
mUculo e bolo rJ a beleu de
sou caráter O<lo pré-requl'"too pl
9143. de :zoa.. para rolaclorl:lmonto
lantasias.CP9163 ~
MAIS SÉRIO • quero mc""'f"""!sso.CP$411 balmmos um papo e ve< o quo ROMÂNTICO • 363., 1.1!5m,
trJI8SSO;tSde181:25a~de 82kg. olhos vordos procurn ho· CASAL OE RAPAZES· r.o.-;.
EU • 27a., lru;leP<!Oldenle, "'"' pododor.Tenho25a.CP&496 mom másculo onlre 22132o .• niv. los. 21/25a .• ambos 1.75m. brao.
~. para rol'"'""'"" cos. não efemln~dos. 631<g. pr<>-
Descarto efeminados. J>0<1.0.vel, procuro pessoas lnte- PROCURO - homem compall- unW., bom r!SicO. que ainda ""'"""
CP9441 llgenle•. aclmo de 42a., do pre- wol, cuUo, crlaUvo, cllscreto, noo dita na folicldade ~ dois. CP c!.Oam: r"'>B.Z de 18/25a.• ,...
lenlncla que •ela eslra"'l"~" a afeminado, lenho ~4a., t.72m, 9391 mesmas cond'ç68$. para afri:a.
SÉRIO • o1 rapaz do rosldenle em Sào Paulo, pla.ml- porlo médio, bachoml em diro>no, do e algo mais. Oispensamos
.<ênda. não elemln.a.<!o, mdoou~omc0..CP9420 curto a nature•a em ospeclal SANSEI • 27o .. 1.nm. 731<g.
porte atlético, lmiv., procuro jo·
pR>nssionais. CP 9JG4.
a r.,r. Eu 25a., 1.67m. HOMEM • 35a., 1.82m, 72kg, ~o~~n;~;;· oloreço e peço sigi· CURIOSiDADE. cosaljovem_
!llaf)ar.CP9492. vens, do 18135a., ~I """•ade ou
procura rapazes alé 30a.. bmn· algomals.CP9521. 2812:1.>... procura """" mu&.cr
i:M COMO EU • se """" eos. mogmo. o>om barba & bôg<>- PROCURO • você ~omem meiga i! carin~osa, para rolo.:õo.
SE VOCE É • oxlrovertódo. som
!r elomino<!o. o quo """'" de.""'""""'"*'" ..,., comp.,.. másculo, alroenl~ unire 30(45;> .• l"'scum•. simples. n~o olomina· """"''''" e lrlis. omboo lniciiD-
ico (<>onclpolmonlo dá<- mlssc.CP92Jol. do b<>O aparilnclo o CUliO poro los.GP9391
do. ac•mo de 1.78m .• nõvcl uni·
óp<>ra ) loalro • ...mg<>ns,
o esplrillolmo, ontro em
LOIRO •
awnlurss
"""oj"'· nóo pmcura
"""' pa;&a1<1mjl<>S.
aml<<td<> oolo<KJo. Eu: 1.7&n .•
35o .. <11scrolo, 78ku. Slll'lo lotai.
'<•rs<láno, llguo poro mim. Toor10 HOMEM • Jla .• oUilllco, ólono
29o .• 1.80m., 1~kg .• cabelos coo- apartncla, nl""l •uporior. pnx:v.
C<l<nlgo. Sou HIV po•lll·
n multa oaUdo, 46a., déUja rolaclonameo>lo •audâvel
e oeguro eom homom aló 40&..
'PROCURO
' ' o'M:':::C:C:C::C=::C-:--
RAPAZES • 1or·
lonhoo o oll>oo . . rdos. Paro rol•-
cionoononlo.Orlo.CP9133
111 casaiS e mulhoroo de corpo
bo<lilo. para fanla~ao. Slglkl ll!l-
SJl<g .• pwfosoor o mUoi· oolulo.CPVJ01.
> ~ol.lmportaolo hOno~ti­ livre. tnleiiiJ<Inlo e dlsctolo. CP loo, boa opotóncla. do 16/23.!1 .• TIMIOO. morooo, ~Oo •• 1.nom.,
>9272 9152 não elomlno<loo. quo usem bolos 72kg .• Proc"'• ami..,do sincero HOMEM LOIRO .J1a.. pm:u.
MORENO ClARO • bonllo. ou nllo. porn oml:•dc ou algo com r>egf"(ls./mUI<>Ios, 25132a., OI· ra casais casados, blssexu:n
• &incent:lode, respoilo e 20a, bi5Se•ual. quor homens até molo.Eu21a.CP94G1. lo, esbelto. com as mlnhos ca· para r=ntor um mlociO<III""""o
•. ••P'"" encont"'r j~m!o
cê. Procuro uma p<>osoa (8a.. bonito, esportista e rico. QUARENTÃO • quem coohe·
ractel!sticas. não efeminado som
viclos, culto. sigiloso. humilde.
""'"' ambos e lentaslas a !ris.
para me ajudar no que for preel•
laclonamonlo sério, Qa· se a realizar nossas tantasias. c ... posooas, não eleminados. de trabalhador. CP 94 78
""' c""'elorislicO> eclma. casado ou ..,llelm. Silgilo lotai. 18125a., boa aparilncia. viril, que
~--:------:- I 'C:'o"":':':;;;-::;-:;;:c-:--:-
~ :- I gootanam
nos braçosde um uma
do ""' pnncesa
ret Sigilo ab- ooguro.
A • 26a, 1.79m, bou MORENO CLARO • dlscroto, •~•""''""''''"~'"''-----­
flsi«J, n4v. unlv .• l)rOCura bOI! nparõncia. sinco...,. 1.70m.. -RAeAZ. '""·· l.Jnm •••• ,.,••
ontre 20130a. tnésculo, 64kg. 31!a. Procuro 111t1 rapa>: " " ''""
" " - · boa opar., pl coro !;Ogoda 8 boos princlplos, bissexual, No eteminado, more·
•evlâg0<\5. CP~129. de 2813111._, p11m bom relaciona· no ~laro, quor en1rar em C<>ntalo
mento.CPS44Q com soldados, PM"s, bombeif"(lS,
"URA • .., você tem enfim, lardado5 em geral. cosa·
co .. do ou nlio, lo!ro, MORENO CLARO • )owm. do ou soJtolro. bof>~o e másculo
""""""• mJialo ou ""' bonito, blssaxual. 1\0\o elo,..no· p"'~ roor.zar fantasias. Sigilo lo· voe~ . nwii>Or do 25/4o•~ nllo
o olomlnado. bonllo -ou
slol ar., de uma grande
do. quoro homens ato146o., bor>l·
tos, e11p0111•tas, que Slllam casa·
,,,,.,,,,,.,.,,!___"C-:--- mascu~nizada. que seja ..-na
pessoa aie{lra alio. nlvel. que d ..
• do amor, llguo pAra dO$ 011 solteiros I'Oitl mim ajudar RAPAZ • 23a., t.e2m. 78~g. soja roaliza< .,a r...,!asias me 11·
"' mo.-o. oo"oir<>, com u que for proclso. em trnça tora """""o claro. não efeminado, gue. Ten001.62m .• 23a.CP9146
.mor para o~er. n~o também tudo que d<>Seja. reaN· fora do cl...,ullo • ....,;.,.,;raoo. RAPAZ· bonito. 19a.• bisse•!.011
ninado e dou sigilo abo.o- "''''""'" junto• nossos fanloi&ôs. proeu"' """'l"""hla co-m AS mos- . 756 qtoef enlrBr em contato com ca-
casados, bombeiros. S!gllotolai.CP9237 mascomctorisllcas.CP9229. sais l""""'s eló 40a., que oejam
bonitos. CIW!Is homo ..,roo ,.,.
,...,., sorão btlm vindos.
';--:c::::~--::CC·
PROCURA-SE •
I cnl"'>dido
p;><<l
nportomonto cn1 Pio~o~•o.. "'I'"'
dovi<llf RAPAZ • pn~lo. 1.a()m.• GO~g.
on•o• co•t:~nho<, r.;,..,.,.,,_ uni-
CASAL r..I."Kl"'·c'é'oMc'c"C;;:c-c:::::c
IA • coo~oocor [X!SSO."IS v"r<il~rio. sio>ecm. "'"'""" r:\pn-
's como voe/i. poro om·
'circulo de amizodo? CP
• .-"io nlcn>nodo. bo1n
""'"I sócio ct~lltoral. doscompli-
cado. Favor lfg.or son•co>to inle·
zcs parn omizado ..,Inhm1lc de
idodo. silUOQIIO ""'""'";'" não
PROCURA CASAL TRAINSPONTJNG • I"""""'
des-cendente de euror>eu.
procor.o ea .. is q"" gostem de
29<1..

ross.ados. CP9460. mo lnloressa. QUem sua amizodo bnno..c~olr~• om ~""'" o cJ,.,..


ro • conhocm r•P'I••• PROCURA-SE • rapO< on!•o '"'""'"Ó°C'"""'""'------- iliu·
mM.CP9344
ou nogrno, al6 40• .• dls· 181:2So .• cabeça lella. paro rolo- RAPAZ • pfo.;u.-a lx>)"> ncima
"11"11 I,_.
CASAL 3BJ29a .• dcsma co· vocE - 110"''""" de vor • """
1\110 olominodos. S.,u cionon>Onlo ou (ulLJro CMO. Eu dn 1 n.o . libcrnis por• .1mlzodo ou "'"'"o' mtihorc• som lirn#s do O!ip05a om OQ~07. Hol ne CP'"""
J.IO .• 1.75n,. 15kg. CP 34a .• 1.G7ou .• GJkg. [>rnnco. ns·
sif11on~'llko.CP921lB
a190 "''""· Eu. 1.75m. l.>ra•>eo.
80kg.28a.CP915J '" '" Idade. boo>ilas para ro>l~ci.,ne·
me-nroa tnls.CP9273
m.,.sagc•n que irá !acllilor nosso
c""talo. Moreno. 33a. CP!/480

Cadê a minha metade?


Gente, essa semana cu vi a minha ''Ciô. cu já sou comprometido''.
amiga Clô tão chocada com mais um Ele reforçou depois: "Eu já sou ca-
fora que ela d-eu com um cura, que cu sado. Com a igreja. Eu vim :tqui para
jmnai~; deixaria de contar aqui. tentar convertê-la''.
Sinta o drama: ela foi a uma fcstu 1t Dcpoi!-; dc.~!-;a, a úic;r dn Clô é: quan-
fantasia no Mnrumbi onde ac:Jhou co- do ap:rrcccr um homem com pinla de
nhecendo tllll bonitiio fanwsiado de deus gn::go, maravilhoso. desconfie.
dcuJ-õ grego. Danç<H<till c rir:un muito a Você acha que se ele não tivesse <.tl-
noite toda c a Clô o convidou para gum dcfcitinho alguém nào o leria
jantar no .\CU apartamento no dia se- ris gado?
guinte. Ele aceitou imcdi<tlamcnlc.
• Yara Rocc;:t
Após um belo jantar J"rancr3s à luz de
velas, eles roram para u sala I'.S. Escreva põlra Yõlnl Hoccõl (Caixa !'o~ tal 42,
conversar. Mas foi só a Clõ cntrnr no a..,sunlo Ccp 01059-970, .SI') conlandu o ~cu din llc Clil
253
O cara sem :t liml:rsia de deu~ grego "rwmoro' ', pronto: o C<lr·a vrrou o ou o H'u di<! com ;r Clíi. As hbl<íri;r.ç mais cngril·
próprio ...abonclc. E~corrcgou c disse: ~·;u.l;rs ser~ o puhlicadas ncsl;l coluna.
c.'> lava mais bonito ainda.
DOMINGO, 9 DE JUNHO DE 1996

I ALTO
I MORENO
!

MAGRO

TRINTÃo

SIMPÁTICO

EXPERIENTE

CULTO

VIAJADO

COMPANHEIRO

254
Cadê o holllein?
Está faltando homem no mercado. Quem diz é o IBGE,
na última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio.
A análise dos dados revelou que, em São Paulo, existem
apenas 85 homens para cada 100 mulheres.

Baseada nessa constatação, a Revista pediu ao Datafolha


uma pesquisa inédita para conferir com as mulheres da
cidade de São Paulo, que não estão casadas ou que não
vivem com um parceiro, duas coisas:
a)Elas estão mesmo sentindo a pouca oferta de homens?
b)Qual o tipo de homem que gostariam de encontrar?

l
I

I
O resultado mostra que, mais do que faltar homens
em quantidade, há, sim, um déficit quanto a homens
de determinada qualidade, que satisfaçam as
exigências da grande demanda feminina.

255
Quem acha que o príncipe encantado ainda é louro de
olhos azuis, pense outra vez. O preferido agora é um
homem moreno, branco, não-musculoso e de cara limpa.

Pelo andar do crescimento demográfico brasileiro, elas


devem continuar esperando, porque esse tipo de
homem é bem raro no país, como comprovam os
levantamentos do IBGE. Raro sim, inexistente não.
Confira nas próximas páginas.
ilustração Pepe Casais

256
o f e;r ta e p r o cu r a
A PESQUISA DO HOMEM IDEAL

o que elas querem é raro


Em busca do companheiro culto e bem de vida
por José Roberto de Toledo nas cerca de 8 milhões. O universo 15 a cada l.OOOdos que entraram
masculino de onde sairá o parceiro nessa corrida ainda estariam no
O ideal nunca esteve tão distante da ideal jii estii reduzido a 17% do gru- páreo, P'rojetando-se a proporção de
realidade. O perfil masculino ideali- po inicial, e os principais fatores de brancos na população masculina
zado pelas mulheres e traçado por eliminação nem foram computados. (60%), só nove chegam à reta finaL
uma pesquisa do Datafolha junto a Diploma não é garantia de cultura,
401 paulistanas é uma raridade entre mas o dado estatístico que mais se Realismo
os homens brasileiros, como mos- aproxima do adjetivo "culto", exigi- Para concluir a prova de obstácu-
tram os dados do IBGE. do pelas mulheres, é o que mede a los, esses parcos sobreviventes preci-
Asondagem do imaginário femini- escolaridade do brasileiro. E essa não sariam ainda ser altos, magros, ter
no revela, em sfntese, a preferência chega a ser um orgulho nacional. olhos castanhos e cabelos curtos,
por um homem de 20 a40anos, cul- A maioria dos candidatos a marido n1iousar barba, ser morenos,
to, bem-sucedido na profissão, sol- ou namorado tem, no miiximo, sete não-musculosos, honestos, compa-
teiro e branco. Vã ilusão. Mais de anos de estudo. Ou seja, não con- nheiros, inteligentes ..
99%dos exemplares nacionais do cluiu o 1~grau. · Em resumo: se o ideal feminino de
gênero tropeçam em ao menos uma O item "sucesso profissional" tam" homem fosse aplicado à realidade,
dessas exigências. bém não consta dos questionários as mulheres estariam condenadas ao
Segundo a última Pesquisa Nacio- de pesquisa do IBGE, mas pode-se ter celibato e a população brasileira
nal por Amostra Domiciliar (Pnad uma idéia do desempenho masculi- entraria num processo de diminui-
93), há cerca de 47,S milhões de no nesse campo através dos seus ren- ção inédito até em tempos de guerra.
homens com mais de 15 anos no dimentos mensais. Na priitica, a teoria é outra. Das 51
Brasil. Na faixa etiiria predileta das Sempre se soube que o brasileiro milhões de brasileiras maiores de 15
mulheres, esse número jii cai para ganha pouco, mas os números da anos, mais da metade está casada:
menos da metade: 22,5 milhões. última Pnad são de assustar: a maio· 28,6 milhões. E com homens mais
O brasileiro médio é mais jovem ria dos homens ocupados recebe até velhos, menos cultos e sem tanto
do que gostariam as solteiras e sepa- R$ 224/mes. Não é exatamente o sucesso profissional quanto o ideal.
radas entrevistadas pelo Datafolha: a que se poderia chamar de sucesso. A explicação para esse ··reali>mo''
faixa etária masculina mais numero- Traduzindo "culto e bem-sucedi- da mulher brasileira talvez este1a no
sa é a de 15 a 19 anos-sem contar, é do'' em z~ grau completo e renda fato de que o mercado matrimonial
claro, os impúberes. mensal igual ou superior a 20 salá- lhe é francamente desfavora1·e1.
rios mfnimos {R$ 2.240,00), o resul- Para começar, ela já enfrenta a !alta
Diplomados tado das exigências femininas é de homens. Há um dHicit de quase
O perfil ideal exige que o homem dramiitico: sobram só 703.768 2 milhões em relação ao contingen-
seja também solteiro. Sobram ape- homens. Em outras palavras, apenas te feminino em idade fértil. Com o
passar dos anos, suas chances de
encontrar um parceiro parecem
enunciado da Lei de Murphy: tudo
vai piorar, é só questão de tempo.
Como ensina ademógrafa F.tza
Berquó em sua t-eoria COJlhecidil
como "pirâmide da solidão", o uni-
verso de parceiros potenciais da
mulher é formado pelos homens da
mesma idade ou mais velhos. Para
os homens, é o oposto.
Dessa forma, quanto mais velha a
mulher, mais perto do topo da pir~·
mide ela fica e, por consequ~ncia,
menos parceiros potenciais ela tem .

. ... . .. .. 8

257
o tamanho
Há hoje ...
da carência ... menos homens
TOTAL

A pedagoga Célia Norberto, 46, interessantes do 61 61


GUe o necessário
divorciada há 16, procura um
homem com caráter, bom nível ... mais homens
intelectual e situação financeira interessantes na 32 34
definida para um compromisso. certa
Como a maioria das de5easadas,
solteiras e viúvas de São Paulo, ela .mais homens
reclama da absoluta falta desse tipo interessantes do 3 2 s 2 3 3 2 s
de homem no mercado. "Os que o necessário
homens são muito imaturos e não
sabem o que querem. Em cada Não sabe 4 2 7 3 7 8
esquina olham para uma mulher
diferente", lamenta.
Outra queixa frequente é a de que
eles não sabem se aproximar, contra- mulheres auto-suficientes, que tra- M<todoloBiO • Eslo pesqui"• "'''"d' p•l• ger!nm do
P"quiSo do OpiniJ~ do D•t•f~h•. fol um t...,ootomoo-
riando a expectativa das mulheres, balham, entào procuram as novi~ to <W>tifi<>do com mufh.,., odult>s. ""' vinculo
que esperam que o homem tome a nhas", esclarece. conjug•l e do da<se< sodoi• A. B < c d><idado do S•o
Já para a atrizAracy Balabanian, mais Poulo. No f...,•ntamento. re•li!odo "'" d"1as '7 e , ~do
iniciativa, busque a abordagem, mas obril do 1996. fonm feit" 401 '""M't" A m.rgom
o faça de maneira interessante. de 50, descasada,~ culpa é em parte do mo dO<Orronto dosso proc<O<o do """'"'gom 1 de
A jornalista Mona Dorf, 36, desca- das mulheres; "A minhageração foi s.o pontos POK<ntuois p•ra mois ou P'" menos. d ..,.
'"' de um in toM lo do conf ;onç.o do gS%. I$5o <igmn.
sada, di<: que os homens tendem a mui-to agressiva com os homem. Eles c. que. •• f<>rom r<alizado> tc>O r...,ont•montos oom •
m""'' molodol<>gia. om 91dolos os resultodos <51•-
procurar as mais novas porque são se assustaram e ficaram arredios, com
rl•m dont"' d• morg<m do er<o P''"'''''·
imaturos. "Eles se assustam com as medo das mulheres.'' (G.M.)

258
Revista Claudia n!! 381 Junho 93

259
ANEX028

Gráfico de pesquisa realizada


pelo IBOPE, em SP, em 1995.

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260
ANEXO 29

Divulgação do evento sobre o tema


Resolução de Conflitos, com Dora Schnitman,
em carta da APTF- Associação Paulista de
Terapia Familiar, aos membros associados.

São Paulo, 26 de Abril de 1999.

( ...)
TEMOS BOAS NOTÍCIAS:

APTF está dando apolo aos eventos:


• RESOLUÇÃO DE CONFLITOS => Dora Schnitman - PUC
21/05/99 =>das 16:00 às 20:00 HS
22/05/99 =>das 10:00 às 13:00 HS
Inscrições Limitada - FONE: 829-0336

• DROGADEPENDÊNCIA => dia 2.9/0 ?/99

• PALESTRA DE MARCELO PAKMAN => dia 25/06/99

• APRESENTAÇÕES das MONOGRAFIAS de : Naira Morgado e Roberta Tito


Pereira =>dia 07/06/99 - das 20:30 às 22:30 hs. Em nossa sede.

• APTF E MIS - FILME e DEBATE => jutho de 1999 - LOCAL: Espaço do


MIS
261
ANEXO 30

Matéria sobre amor na internet.

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OGUIA OAS

BRASILEIRAS
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4. 8 Domingo, 31 de janeiro de 1993
cotidiano FOLHA DES.PAULO

Computador 'Charmosa'
e 'Tíquinho'
põe carentes namoram há
oito meses
e solitários
D> Reporugem loal

A esrudantc Andn!a Akssandra


Makagami, 18 (J!Seudõnif1l() "Char-
mosa ') e o t!cnico em dettónica
Edmílson Figueiredo ('TJqUinho"),

em contato 24, es!ão namror.mdo h4 oito


meses. Eles se conhecer.un no
Adão e E1•a. "Começamos a
com·ersar e descobrimos que mor.J-
,.amos no =smo bairro (Mooca) e
ANDRÉ LOZANO Mas niio é só de paquera que que ele mora•ca ao lado da escola
D•••eom&om lD<>i viv~o videotexto. As estudantes onde esrudei' ·, disse Andréa.
Grauidv c~stano. l 8, (Loba) e
··vou te dei~~• nas nuvens", Be<otril Ãmaro,_ 15, (Bia) conhe- Ela contou que resolveu acessar o
Ext~~v. ··Dclicin<:1111ontc t('><;a '"" cerarn-sc há doiS anos :através do vidcopapo porque eslal\11 pr<XII·
remo'', Brisa. ··Pronta para vidro e ~oje se consideram~~ rando <Jigu&l. "O mistúio do
i.mar'', :-.·ua. Es><os ,ã 0 formas de melhores amigas. ''!'>6s acessa- videore:x:ro t \"oc.! imaginar fisica-
~prc~e.,wçiõo de algum;;; pessoas ~r.os _<; v~deotexto juntas das 22h menre a pessoa com q~m e>ti
que, u;and,J pseudú~imns, pa<sam as 5h , dts>e Graz.~tely. falando''.
hcr~s ~.a freme ó tela de um Ela -que já teve namorado -._ Edmilson disse que enrrou no
.-ompotJdnr à p~;>c~ra Je uma YP- mm~u que_ os encontros "correio elerrônico" porq~- "'es-
"'emura ;exual ou de um relacio- geraon :nuota 2nSt~dade porque ta•·a muito carente". "As mensa-
namc<>•.n om~m<n. Eb< fa>:cm pode haver deccpçiio. "t'ma vez gens criam um clima de mistt!rio
p"rtc d~ um 1milcr.'o de SO mil mami,;e conta10 com um cara que que te e;r;cilam e fur:m vo.:-~
,·iJwp<.J'i't'" rmlma<> ""'' nlidal) tinha umn_ voz maravjlh('l>:~. procurllr UmJI aventura". disse ele.
que podem ter uce~'o ao >erviço Quan~o _o,.,, v~ lO a deceppo. Ele
El~ afirmou tu saído com algumas
AG.'io e E--a devideoexto. era ~amnho e tinha cara de crente menin~do vidcote;r;to. (AL}
O "correio elelrónico·• é us;tdo que carrega livrinho embaixo do
por pessoas com idades entre 14 e braço'', lembrou Graniely.
60 ano~. que aproveitam o <i~ilo Bealriz disse que o vidotexto
do si.>tCma para ··cometer ilma ajudou-a a vencer a ümidez. "Eu Médico comete Encontro decepciona Con:ipuhldor protege e esconde
'úic ~c pcc:.dos"" era muito rctnfda. Tinha vegonha
:-lo incfcio da no:tc. 0 público de conversar com as pe!soas. O ~pequenos pecados' dupla de estudantes Da R~port~8em tocai o relacionamento ioformalizado t
cat,Kicrt<Jico do< u"Jóri<>s do \"Ídeopapo me >OIIOU"'. uma consequência da diticuldade
"'coJrreio cle<rônico" são adoles- O ··c:-rreio eletrônico", ~ um Da Reponagem Loc~l o, Report>gem Local Para psicanalistas ~ troca de de aproximação entre as pessoas.
' centes. !'->ào faltam as mensagens dos códigos de ac:esso do V1deo- mensagens infonnatizadas pode "'Tudo o que é anónimQ ajYda a
~ró1ira~, m~ muitas delas >ilo de texto (1483). ~de,_ a pes.<oa não o médico Márcio, 31, (ele não Experiência menos agradável ser inlcryreta~ como uma defesa pessoa a se defender da outra. A
·'I JOvens à procura de uma paquera.
Muitos passam da !roca de mm-
tem como ser tdenhficada quando
~SI<! passand~ memagcm. _A e_m-
quis rc'·elar seu nome comple10)
marcou três enoomros através do
foi vrvida pelo estudante de enge-
nharia Gustavo de Toledo Mar-
oonua o _rc!actonamcnto natural e
cspontaneo._"A pessoa se distan·
pessoa não se revelando, pode se
sotw mais seus sentimemos por-
s:~geas pelo t;omput.aJor a conver- presa EssOncr~ Tele.:om~nrcaçocs videotexto: com um juiz, um ques, JS. Ele o 0 amigo Luis cia do rclaclOilalllento autêntico", que não hfrensura. ''
sas pelo telerone onde >âo marca- fornece o servtço do ~dão e Eva. agente de viagens e um analista de Alexandre Trava~lini, !8, marca- dis_se a professora apo~ntada de
dos e_rn:ontros. Os casos de namo- Segundo a T.Jesp. e:o;rste.rn 17.263 sis'"mas. !'lão compareceu a ne· ram encomro com duas meninas Ps1~ologra da USP Mana Helena Sogrrodo Maria Hc!eJia, a troca
r~s <<~o frcquent~s e algun•_ tcmri- pe;;.oa< cadastrada~ no v1d~~IC>to. nhum. '"O vidcopapo f<>rnece um• que c~nbcccram no vldcop;po no S'emer.- . . .. de informações pelo .-ideotexto
~quivale A ~nr1a Anllnima e ao an
""tll em<';'""'"""'"· Do oi<'" """' Ma, h.i pdo mcno• :u ""I ""'·i- bda ch"n•·c de você c-ometer uma ''"'I'P'"~ Mon•mbi. Para a p<lcanalrsta M~nan Ch· trote por tddonc. "'No fundo é
P"'" c;! furam rcaliz"<.lus <:inm rios '"piral.as'", o que eleva ? ~rie de pecados porque mantém o '"Quando chegamos, nos depa- naiderrnan, _o computodor proteje
casamentos entre videopapistas. nlllnero para cerca de 50 mil anonimato'", disse ele. · . e
ramos com uma gorda uma com .as pessoas. e fadlita a fantasia uma covardia, porque a. pessoa
não se mostra. Não t n::alizada <i
segundo o organiZJdor dos encon- vide<lpapis:as. . _ Os encontros de MárciO foran-i' cara de COF (Ca..;ias)", disse .. _se:o;ual dos ~s~os:.~'É ~ais fiei!
tros de '(Ps Carlos Albeno Quiri- O usuáno do vtdeo'"~\0 paga, marcados no Jardins. "A gente" Gu~tavo "Para pmrar a srtuação _; Voe! fant:asrar quando_ nao se co- socializaç;;o· nonnal". afirmou
1): no. 33. A tarde, o si; terna é_ usado
por pessoas que deveriam estar.
por _uma assiClatura residencial . fica com um pouco de medo doS
m-:nsal CrS 5Cl.511 ,96 e uma talla _ '·- ellfOiltros. Primeiro porque esta~
elas se encontraram Q)m ol.ltrns -.:'- nbecC O_objei<J. da fanf!tsla~', di>se
duas amigas VPs -anãs. Entramos<- da .... Se~nd~.-· _Chriaidcrman, a.
Maria Helena.
. Para. _ela, as mcn~ns -nao

trabalhando com çomputador e na mensal de Cr$_ !8.7?Cl,10, além .; mos pecando, segundo porque não_ no cinema e eu fiquei morrendo de- convep;a pelo;~rdeo= "<'! uma . reprod~ a verdadc1ra per;ona-.
madrugada t a vez dos insones c de Cr$ 372,51 d~ tmpulso por sabemos com quem estamos sain{ ·- medo que uma delas pulassem em' busca "'!'"!!~do,conla)o'".· _. )idad~ da pessoa, uma vez que ela .
.. caçadon•s deavenmras" _ minuto. ""' -- '· ' ' __ "do". ·. . , ·, (AI: _''" m_i!!C., contOII'elei'"'"""·:-,:.,,. "(AL1')·•'- Maria Hdent'StdnU-dis:se- qu;··~- I!Qdc;Fqlgtirnmla;: !.;·,;';. lill ...
ANEXO 31

Variadas matérias sobre as mudanças nos costumes.

CASA-SEPARA Homens e mulheres adiam a hora de 'juntar', fogem do 'papel passado' e separam-se cada vez mais cedo

Brasileiro casa menos e separa mais


!!$<ia
. Afi~ -daS estatísticas, :o casa- JOS~ ROBERTO DE TOLEDO
:mentp·Íiio eo.tre mro <:!ei:JctinÇão, da Reportagem locar
-su.\tenta Frank.Fur~teliberg ]r.,
pro{(ssor de sodolj)~ da Univer- Os brasileiros estão se casando
Sid~~~Peru!Uvlnla(EU:A)_.. _ menru e se separando cada va
· Um· dos ma.lore,t·es~tas-no mais. Estio adiando também a ho-
asstÚÍtQ, ele Iiióstra, em artigo pa- ra de abrir mão da vida de solteiro.
ra a revista '.'Ame.ricari Ikmogra-_ Ao mesmo tempo. está cr=-
a
ph,ics"' que nlaioria das america- do o nUmero de pessoas que vivem
nas, em 'alguhi momento de suas juntas, sem um vínculo formal
vidas, ainda almejao casamento. Os números mostram que a crise
.!'{~ .?SQ. o (jl.le vale para O.'l do casamento -um fenômeno
EUA também sBve aqui: 93% das que atinge quase todo o Ociden-
brãsil.firas "ija' Caixa_ dos 45 ilçs 49 te- chegou ao Brasil mais taJde
ai]ps oi'st!o óu já !oram caSadas pe- do que aos EUA, mas com intern;i-
lo rii.enoslima.vez. dadeaindamaior.
-·a: qtii: ~lt~!ii04mdo em relação O auge do matrim6nio no Brasil
ao casamento·é quando, como ele aconteceu no Plano Cruzado. Em
oc~equantotempo dura. 86, I milhão de casais disseram sim
Os brasileiros C&tão demorando perame o juiz d~ paz.
mais para se eas;.,. "de papel pas- De lá para cá, esse número ~6
sado". A idade inédia de noivas e caiu. Em 94, h.ouve 763 mil casa·
noiVos iuuÍI~to\l mais de meio memos.
anoentre90para94. A redução de 24% nos matrimô-
Os homens; que enfrentavam o nios num período relativamente
juiz CÇlm 26,4-anos, agora só dizem curto -l:l anos- já seria sinal de
sim com 27,1 anos', em média. k mudanças drásticas no~ costumes.
noivas passaram de 23 anos para Mao a.s mudanças das relaçõe~
23,6anos. conjugais foram mais profundas.
Pode pan:cer pouco, mas, com- Em apenas quatro anos, de 90 a
parativamente a outros países, a 94, as separações judiciais awnen-
mudança está ocorrendo rápido. taram 22% no país. No mesmo pe-
Os EUA, por exemplo, demora- ríodo, as separações litigiosas
ram 34 anos para aumentar em 2,5 -que envolvem disputa na Justi-
anos a idade de seus noivos. ça- subiram em uma velocidade
ainda maior: 38%.
Experimentar antes Como resultado, a taxa de sepa-
Para a coordenadora do Núcleo ·ração por casamento, que no iní-
de Estudos de População da Uni- cio da década era de 9 divórcios ou
cainp, Maria Coleta de Oliveira, desquites para cada 100 matrimô-
essa demora pode ser um sinal de nios/ano, passou em quatro anos
que o brasileiro experimenta a vi- parallporlOO.
da conjugal antes de formalizar o
casamento. Extinção
A hipótese, compartilhada pelo Apesar das estatísticas, o casa-
demógrafo Juarez de Castro Oli- mento não corre risco de extinção
l"eira, do IBGE, tem fundamento -sustenta Frank Furstenberg Jr.,
numérico. professor de sociologia da Univer-
Em 80, 9,3% das brasileiras de 25 sidadeda Pensi!vãnia (EUA).
a 29 anos viviam em união consen· Um dos maiores espedalistas no
sua!. Em apenas 13 anos, quase do- assunto, ele mostra, em artigo pa-
brou esse percentual: já era 17,8% ra a revista "American Demogra-
em93. phics", que a maioria das america-
nas, em algum momento de suas
~lEIA MAIS vidas. aindaalmeja ocasamento.
1obrt!o trl•ono<onm*nronos Nesse coso, o que vale para os
pág•.~.l.4e5 EUA também serve aqui: 93% das
brasileiras na faixa dos 45 aos 49

265
OESP 22.08.93

- - - - - - - - - - - ---------
REPORTAGEM

NÃO OPAP
Marcos acorda no
meio da noite e,
como faz sempre,
arrastando o
cobettorzinho, vai
poro o quarto do
mãe. Ih ... sujou! E
não é que aquele
amigo da mamãe,
aquele mesmo que
nãopórade
telefonar, está 16,
dormindo
justamente no lugar
que era do papal? E
agora. como
encarara
namorado da
mamãe?

suJefto,quenâ<léo maravUha.a,a.o crlanç.a.& quando llnt novo elem,c.:o e

O pal. namorando com


ama.m~e. nl<>é nada.
fácll de enfollr.
Alndamafsqua.ndo ela. tem
um l'lll>odooexo masculino.
podem surpreende•·· Alg..,mas
mulheres o.eredlta.rn que. pelo
fato de gOStarem do
namorado, ••u• nihos
também o &oelt&rlto. "Ela.s
lnS<rldo nesta !"elação..O\ ui<·
dlncUment< elo sora ,,,~ito
com na•u,·~lidade. A c!':>U( :.
Jll'ec!sade uma oMpll<.a;.\o
lOg!ca. QUe Ie''" em co,.'·' .t
:>lo oasoda namorada do pa.]ia1 esquoeemqueacrla.nça, da a!"'IV!do.dc entt'e mA<·::h• ,
mio ó mu\~odifarente. A filha
!dele) disputa. coma.
mesma rorrnaque o o.dul to.
precisam antes conhecera
•= nova pos;oa ..
namoro.<la.a.a.tençao do pai. pessoa para saber se v!o
Dequa.lquerma.ne!ra, a gwtardela."', argumenta. o dr. "O no morado de
separação, par& os fllhoa, e Haruo mlnhc miie mora
umanovaunl!l.o dospa.ls, em culra cidade e
sempre é co!sacomplica.da, eugcsloquando
d!f!clldedtgerlr.
Antes de fa\o.r sobre os elevem passar
novoa paccelrosdos pala é umllnal de semana
importanteanallo.ara aqul.AgenlepOS>elc
separao4o do ponto do vista bastante e mlnhc miio
dos filho•. não grilo comigo
Para a P"icanal!sta Maria ecomcmlnhc
do Carmo Palumbo, um Irmã na trentedole,
dcsa)ustamento lrón!co entre
ramblim, elo vive
"' P.~lsabala toto tatondopro gente
po·orundamente a criança
<1uanto umaoe~ao·açM. "A se comportcr".
ct·lança vive uma btpocrlsla (Enlico. 8anos;
<oue nAo"-Celtaeaenteuma
f.\'i:ri:'á~~M"uÍ~~ldesteo Pat'l' osexologo ~\ · '· .·...
r! lhos slo ct•lanço.a Costa, o adol,•,eon! .. ·
~ngus~ladas". A separa.çAo, umn no,· a l'ola<:,\o ''', ·•. ·
cnt.ão.legall•a um estado de ""'·~fO!'tnadlfol'O>:;·• C.
desentendimento e tevall. Cl'\anÇR411H'tlOL'C> L·;>·
libertaçâode um clima de tenta snhstl t" h· o r
d!sc<>rdla ou Indiferença. comportamento >e·"
Esclarece umasituo.çA<> para lllo'lS&gr0<5!\'n;
os (ilhos desde que se) a ato uns lO anos. tct~ o··
devidamente explicada. com compo•·•.,monlo .,,.,,
J>o1.lavra.sadequada.s. ··nmo<ll!lo" lC ,·ai m.·
Para Maria do Carmo, o "P'"'a QllO u o·ol,,,..l (•
ú1vórcio C tão honroso quanto f LI hos/nam"r.l <la <!c

ó ·-SUPlEMENTO fCMINrNO- 2075

266
_,_ "'·

fllhoslnamocado da ml.e oe)a cabeam4el!darcomo multa dLi. maturidade dos pais


boa b preciso que 08 filhos problema. "Compolie a ela f"-l'er com que os flllloe nlo
peraebamque arela.ç4o explic&roqueoetá. peDsemquo ... trata de uma
patfnamoradaou acontecendo, polo o n&rnoro nova perda.. E çada fllbo va.t
miefnamora.do também seja pode a<>abar e nunca ou& oncararlaao de miLilelra
"S"radável".
A malorladaomulhet•es ~gs~~C..~..~erw~;q~~·~~b1:ii' diferente", reoealt.a. FerniLilda
Marques.
separadas flcaansioS& sobre pode desempenhar o papel de
as repercusoOes que seu mulher, além do papel de
mie". "Aquel viúva oom 39
namorado causará. nos filhos. onose lrês filhos, enlre
as.tnalao dr. Hs.ruo
Okawara. Por Isso, é comum Deve-se, tamMm, oHc e 13 anos. Dediquei·
ocultarem, o mats posstvel, desmio~fflcaros papeis de pai me demais o ele5, quase
seu envolvimento com outro e mlle. A• vezes o pai namora pera sufocar o perd-a de
homem como se tivessem escondido, é reli~ novamente moumarldo.Eele-1
oerteza de que ele nio oer& e passa aos filhO o papel de pocsarom g me-
aprovado. Outras, adeptas do vltima.desof['{ldor. na conh<olar.Sempre que
filosofia de QUe a franqueza é tentativa de manter. diante
dos f11hos. uma Imagem alguém u lnlerenov-a
a melhorpolitl<>a, contam por mlm diziam que eu
aos nlhos que dormem com o ideal. Tudo para evitar um
namorado. possível confronto àos filho• eslava traindo g memÓria
com a namorada dopo L Hojeoslrislim
mulherelllhos.
Eu estou só. Slnfo.me
uMeu pai trato a umP9SOparaele$~
namaradacom (Morta Emlllc. 55 01105)
mais carinho.
Nunca vi,
por &xemplo,
ele se oferecendo (luandoaque\e toquinhode
para ajudar gente, doaltodosseusnove
MOO.chep.pan,a ml.e e diz "eR
na cozinha quando emlllha.lrml nU> queremos
eslava que vocêseCOJ!o de novo••, a
casado com minha colsaflcapreta. Uma salda.
mãe, Com c•so aí, para o dilema seria a mie
Poi, màe, !;lho~.~itim.s oeho que o>l&é responder, pocexemplc, "'n4o
e«p<>>de lovor,po••<>• vou "'"""'''" p;tra agradar ou
o'""' 'I~.,_. ,1' ,. ( ; " ' ' "
,.e,·ccl>c• <- q \I c o ~amto
eco•lnhnr" aboLT<COI'Vocês. Vou<>asnr
pm"que OImportante para mim
,\dtliCH ••11:c•l1'1l\,l'"nl
,.o~,.~,..... '"·"'-""' (Moriono.1~ ono•) :~J~~~~==~~~C, Amo alguém e quero
cst.,hclcooecmlnha ,·!da C<lm
, tllllfl<ll-Ll\:ll•-'nlon"ll~
d\lll\Cllto_ 'b5.UO mc>m<>
------ ele_ F; muita chato que VQC!a
11>io concordem com Isso, mas
•I 1L

wmpo ""'''""sento cLLinw_ O QUE EVITAR nãos;Jo obrlgadoo n conyjver


pa<SaO'" illtCI'C>Mr pOl' co'""'"""·
ga,•ota• EnlL'-o. o sentimento (conselhos poro quem chega) Pesado? l'Rm&I>Sicano.t!sta
pode começn t· n diluü·"so. ,1!\ O dr_ Haruo Okow.,.. d;l d!cu do lll,rumo• ..,,... ""' o """" el .. Maria do Carmo Palumbo,
meninos pe~uenos têm uma menta dos~ "lrnbrogllo" lo. • nama.-a<lo{o.) d""' 0<1!-0C quem fala desse Jeito, RUo CONSULTORES
r·olo~ç~o
edtpinna. do pnS!<c, <1>Sorolu""" dem.'"" 1'<!001 di r!• uJnéin quo o.caboo do oonhoc'" Importa. a J<ladeque tenha., J&é
comnn,.\e Ma"dCtJU<>I<tU"t' ''"' oloéoen~'I<IO•"''· ""'"""! Enti<lnto facalosooom tunoorirut~. adulto. "FreqUentem~nte,
contudo, """'"'crianças
maneu·a. o ,·e•tabctectmento • E<I!Or &omruo. Mod>.!' o oomportAmo.o<o d• um• <tl&llça. ""'''
de nO\'OS \'Inculco amoroso• "'"'""· t..to o P<>OiinolA. L<mbrn ... quo o pol (mi.o)dela OQ(!o n&o ~ costLlJnAffi.., r..,.rde beW.
sempre é benéfico, apesar dos \Ido os "''"""'"conceito> "'brn e<lucaç!o e dloclol!n.L Dol<....., um para teca m4e&ó para ele~~. A HuuoOko"""'
pequenos aeidenté~ de pcuoo i'nlnlla1, Mlli~ v= <I.., têm llClo !lo OIISO oa qoormn ewttr mãe,IMollSClentêmente, 'III'I!B7·ll00
outr.. b<inoadoln.s. ' fortalecelll5Q e obedece aoo
PHl'CUrSO. M•<lo do Com>o> PoiU<ni»
• Mod!!loarOU> vid>.l"t'-odao'-"-l~~d""<rl""""'· E<ttl omolllor ntho.s, havendo ai uma
C11l"nho J>Ua •• <rlar um tlrMo_ F,.ça a quo u .. , do r=r... • .. Inversão de papéis. E nolt! é bom . .1g9.lJ82
orl•nt<l.' darfio um Jol\0 doso lnt.ogro.r, SeJn vocl "'""""o tõdoo .. Pll"' <>.< filho•, que sentam nol~
><ntlr;Lo m&Jolt """""!' l'm clima oloooontr11.ldo o)uoh , comunlcn· l!nLn j)LlS.Illalmpot.ontee
"" insogura perante a lida".

267
Artigo: Os meus, os seus, os nossos.
Revista Veja, 17.04.1999.

-
Como
novos
estão
família
Alice- ·

Ricardo, que amava V'ni


neiro. Ricardo . Nesta primeira foto d 19 .,.,., . ane, ..
- • e ~~. R1oan:to AJbu ,
Viviane, apaixonaram·~ com 11viane Maciel. Eles t$ d querquc está casado
se, trocaram juras .de · ··.-- :. · _ rn uasfifhas.JuflaeJoana.
amor eterno, casariun·Se_ . . _..:·É o fim das farru1ias felizes? Não. ·
numa cerimônia hippie, tiveraiii :dUaS__<, ---m~dru1ça nesse-perfil tem sido acompa-
fillias e viveram felizes - até q~e o ~i~--'· ·nhada.por outra, i!Ju~mente marcante,
vórcio os separou. O desfecho deSsa_,_ nos últimos anos. E a fonna como a se-
história, diferente do enredo dOs Coi:tioS·'. :. 'ciedade se tem adaptado ao novo pa-
_de fada, marca o início-de uma-notável;-· drão-familiar: A idéia de que casamen-
mudança de comportamento ria' :soéie~ >':toS· não vão neCessariamente durar para
dade. Hoje, há no Brasil aproximadâC .- :i'.Semp·re 'é cada vez mais aceita entre o's
mente 14 milhões de famílias resultan~·,;.··,divirsós grupos e classes sociais. Até
tes de experiências como a de Ricardo· ·.alguns anos atrás, o divórcio ern um es-
e Viviane. É uma revolução nos costu.,._:· tigma que marcava pais e
mes que abalou os ali- ........:__...,;~ -. fi.lhos para o resto da Ví-
· -~~U;:...,
..,....,~-c:;,.a
~,~&!:_, --. _..
cerces de uma institui-
çâo que parecia sólida ••• ~·· •
8 da. Expressões como
"mulher divorciada" ou
e duradoura. Aquela q,úâtro "filho de pais separa-
família convencional, oae;amentoG \ .dos" eram pronunciadas
em que maridos e mu- noBra!Si1 ac~~a em voz baixa e de for-
lheres viviam juntos até - ma pejorativa Crianças
que a morre os separas- em eeparaçao que viviam nessa can-
se, ainda é muito forte. dição eram muitas ve-
mas está perdendo ier- zes proibidas de freqüentar
reno numa velocidade assombrosa. determinadas escolas e consideradas
Dentro de mais vinte anos. a famflia. má companhia para os filhos de pais
nuclear, constituída de pais e filhos de casados. "Nós sabfamos que havia na
um primeiro casamento. será minoria tunna uma colega que era filha de pais
no país. O número de divórcios quase separados, mas não falávamos disso",
dobrou no Brasil em apenas dez anos. lembra a educadora Cecília Helena de
Já são cerca de 200 000 por ano (1~eja Souza Queiroz, que na década de 50
quadros nas páginas seguillfes). Um era aluna da tradicional escola Des Oi-
em cada quatro casamentos termina. seaux e hoje dirige o colégio Nossa Se-
em separação. De cada cinco bebês nhora do Morumbi, ambos em São Pau- ••• e os filhos dessas três famílias
que estão nascendo neste ano, um vai lo. "Qualquer comentário sobre separa~
viver em família de pais separados an- ção era absolutamente sigiloso. A situa- 268
tes de atingir a vida adulta. ção agora é outra."
cil de uma fa-
mllia. pai, mãe e filhos,
avós, tios;; _. primos e primas.
Eram rela:ç&s·-<te:-parentesco que se es-
tabeleciam iúna úiiiCa vez· e perduravam
a vida toda; 'A mudança nesse padrão
tem resultado em novos e surpreenden-
tes quebra-c·abeças familiares: Filhos de
pais que se sepnram., e voltam a se casar,
vão colecjonando uma notável rede de
meios-irmãos, meias-innãs, avós, tios c
tias adotivoS. Filha do casamento do
bancário Ricardo Albuquerque com a
empresária Viviane Maciel (o casal ca-
rioca que_ aparece na abertura desw re-
portagem), a estudante Joana, de 21
anos, é um caso exemplar. Um ano de-
pois da separação, sua mãe casou-se de
novo, com o psiquiatra Israel Ber-
linsky, e Joana, que só tinha uma irmã,
Ju\ia, pa~sou a ter sete- e, entre essas,
havia mais uma menina chamada Julia.
"É engra~ado porque eu acabei tendo
duas innãs com o mesmo nome, Julia".
diz. "Para explicar, sempre foi a maior
confusão." Hoje, ela divide o quarto
com duas dessas novas irmãs: Tamara.
Aqui, Yiviane (de óculos) aparece com seu atual marido, de 21 anos, filha do primeiro casamen-
/5roe/ (de cam/5eta ama,.la), o"" Rlcacdo (5ontado,l dlc.), e todo• o5 ~ to de Ber!insky, e Thais, de 14, filha do
desse!> três casamentos: Thais, Tatíana e Joana (da esq. para adir., segundo casamento de sua mãe com o
psiquiatra,·
em pé), Julla, Daniel, Jul/a, Tamara e Tomaz (sentados).
- ' - " - ' . - - ' . -·- - ' veja 17 de março, 1999 109

269
Onde está a

é um
Uriidos, ónde os d.i'VórcioS.·.'-
triplicaram nos últimOS:vinte". ·
·anos, o:Iiúmero de filhos vivendO coln
_ai)e'nas um dos pais dobrou desdC. 1970.
·,Na· Inglaterra, as famílias não conven-
cioltais, ··esultantes de divórcios e sepa-
rações, serão maioria d"entro de ápenas
dez anos. Isso acontece por várias ra-
zÕes. A primeira., produto da revolução
sexual e comportamental dos anos 60 e
70, é que as pessoas se tomaram mais_
objetivas e menos hipócritas em seus re- Nesta fo
(de bra !<:?. Nand L
laciOnamentos afetivos. Antes, o amor nco, acima) a. riojc co~n 18
entre. marido e mulher acabava depois
e '~"' 0 ,,

"'h;;;; do
•suaPrlltte!J
170Ya Ih
f.L. a nos, est,;
U.ucr. Fàtrfcla (d com o pai
de alguns anos de casamento, mas eles ·.. . . . --·---· -~~- ltl casa171Bf1todeJa e Vestido escuro·
conúnuavam vivendo juntos, e infelizes, .· _. doqu:·-~épo- . ~ . . ~ ·PedroeMaria.'
em nome da unidade· da famflia e de ca·em; qp.e se Vlyt_íl uma exutencta cheta ·.- ··..-= . · .;·-", .. --_:·- ·-------:---...,~-
uma suposta felicidade dos filhos. ~ ÇQ'Iifroles sócials .no interior. ções, em afeto:ê -~em re-
"Havia uma pressão enorme da - '-' · ' cursoS: materiais~'Par8.-as crianças, signi-
Igreja e da sociedade para que essas re- SftuaçãO estressante- A maior aceita- fica lidar cóm emOÇões desconhecidas.
gras não fossem quebradas", observa a ção do divórcio ·peJa sociedade tomou na maioria das. vezes traumáticas, como
professora Maria Coleta Oliveira, do mais fácil a vida de crianças e pais sepa- viver sem a presença de um dos pais.
departamentO de antropologia da Uni- rados. Mas é Ílusão achar que exista se- conviver com um qUase estranho que de
versidade Estadual de Campinas, Uni- paração sem dor e sofrimento. O fim de repente apareceu para ficar, ter duas casas
camp. "A qualidade do relacionamemo um casamento é uma das situações mais para pllssar o fim de semana. entrar em
não podia ser questionada, mesmo que estressantes que um ser humano pode contato com crianças que nunca viram e
o casamento estivesse muito ruim." Ho- ertfrentar. Para os pais, envolve projetos que, esperam os pais, sejam amadas co-
je se sabe que, para os filhos, é melhor de vida interrompidos, nos quais ambo;; mo se fosseril innãos e innãs. Tudo isso é
viver com pais separados que lhes dão os cônjuges investiram muito, em emo- muito difícil. O poder aquisitivo da famí-
po 17 de março, 1999 veja 270
e geralmente -
lher; educar e·
um primeiro _' _.de ,Seu novo
comp3.nheiro. ESsa é u~a expêriência in-
te~ent~ nova: na sodi:dade. "~separar
deixou de ser unía catásl;roÍe", diz o psi-
canalista paulista leOppld Nosek. ''As
Vma revolução dentro de casa . . :· · relações ficaram mais.tlj.nsparentes e to-
dos têm muito·a ganhar!!__AJguns estudos
~-.apenas duas déCadas, o número de:faii1nias'nUc:ieares, compostas por pai, apontam até v!)iltagen$\i~~ qiUdanças.
mãe e filhos de um primeiro casamentO, será menor do que Q de novas uniões Em muitOs casos, filhóS·de-p:ili separa-
· resultantes de separações e divórcios dos tendem a desenvolver relações so-
ciais mais ricas e criativas.
<==~ Famílias nucleares ~ Novas famílias
80
Saga de traições -·:A .bu~ca de um
modelo ideal de farrúlia é urfrsorlho tão
60 antigo quanto a própriâ espécie. Poliga-
mia e outras formas de arranjos familia-
res compõem um capítulo riquíssimo
entre as experiências na história huma-
na. A saga dessas farni1ias não conven-
cionais, marcadas por traições e separa-
20 ções, está espalhada pela Bfblia judai-
ca, pelo Carão muçulmano, pelos li-
vros dos Vedas indianos e por inúmeras
o epopéias clássicas, como a llfada, de
llml!l'!llmlll!l31ím!l'I!!llml!l!Eilf.!lllf.!lllE!lllml'lmil!l'l!l
;., veja 17 de março, 1999 111

271
&i6a6 duas
, '\:·fOt.ó~_r.oifl~s)lustram
'a. tra~sfortriSÇão na
fani(lfa _bi-asfl~lra. Na
· - futo so iado,

r:,~· ,~:'~~?;~~ -aparece


Raucâ
do•
<~ofégío

l986,a

··:.-:~:-Roiri«to.-,0 ,c;c;'amento _mo-·


--: :}? nOiãpüco~-·enl,que.-o~;> cônju•-
-> g~. 'prometem fidelidade
· etCrna e irrestrita um ao ou-
ti-o- e:às vezes até cum-
prem a promessa - , é uma
novidade -relativamente re-
cente. No mundo ocidental,
por força da doutrina cristã,
ele se- confundiu com o
conceito de família perfei-
ta e ideal. Em muitos ca-
sos funciona. Em outros,
não, como provam as esta-
tísticas de divórcios e se-
parações. Sigmund Freud.
o pai da psicanálise, não
acreditava que os relacio-
namentos afetivos esti-
vessem destinados à dar
certo de uma vez por to-
das. Achava que as rela-
ções funcionavam sob

dependiam de talentoe
uma base corúlitiva :::~~=~==~=~=::~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~!
(inato) e sorte. "Esse moclelo idealizado bém ajudain a complicar no-
de família serve apenas para atrapa· vos casamentos de pessoas separadas. depende muito de como os
lhar'', afirma o psiquiatra Nosek. Estudos mostram que uma nova famOia pais lidam com a situação.
Como resultado da idealização da leva de dois a dez anos para se tornar Construir uma sólida rede de apoio
familia perfeita. muitos pais separados unidade cOeSa. Mas as pessoas tendem aos filhos durante a separação é funda-
carregam uma imensa culpa e temem a achar que tudo vai dar certo logo na mental para evitar problemas futuros.
que suas experiências ruins se repitam primeira semana. O processo de adap- Avós, tios e primos ajudam a preencher
com os filhos. Expectativas irreais tam- tação é lento, segundo os psicólogos, e a ausência do pai ou da mãe t; esti-
112 17 de março, 1999 veja

272
-ffiulam a criança a recupe~
rar a a~toconfiança. Algu-
_maS: c~anças sofrem exces-
.. siv;pne'iite por assumirem a
· táiéfa de leVar recados para
os ·ex~cônjuges. É natural
que, numa separação, os par-
-ceiros carreguem mágoas um
do outro, mas as impressões
do.·casal não devem interferir
-.~a imagem que os filhos têm
dos .pajs .. Envolver os filhos
:·. nlini.jogo de afeto e poder pode fazê-los·.<'SE~ii;
· dc:senyàJver um medo exCessivo de- ,,;
,_·:-ex~rcitâ:r-":Sliii afetividade. Como ficam · .:·. • ' f" Ih.
f~~fii::ip~s·.para tentar atender, e às ve- :- SeiS I . OS
c;;'zéS_CQf!ciliâi, duas figl.!r:aslão importan-
~0:t~:-pii!B_·el~s·, . tendem aac~ar que sem- ;:'_Na foto menor. acima,
·;~pri'-p:eraefão o afeto de um se tentarem '"'~-:.''dJ~ti~a·i3ion-Cstá:com
rcOri.qriistar,-:o·cto outro. "A lealdade in- _ ;~ 6-ti~S-quatro:fuha:s.·d~tr&;
-,_.çondidón8.1, qUando exigida pe_los'pais, ;::caJ~th~-ntos: Da~i~la·e---Adrlana,
.,--é_ -~~_Ye_~~-ã,deiro. tonnento·pll;l"a o:s·_~- ·.~- -_:·p~:pri~~~ro.tMBria_~~. do
--lhos ;,a~a a_psJcóloga_ Cnst1ana'Ber- _-- .túlj:j~n'4ó:-._é ~d~~ dp ,terCeiro.
.- ·.~hoüd, _ que há doze anos trabalha com :·_.Nz(fOto_ri'li~·Ioi;-CrlSflna·_apareçe
aconselha~ento de famílias na Uniy.er- . - .·êom-.~eo-filhasao.lado.do
... sidade
. de Taubil.té,
. em São Paulo. atuatm~iido, Carlos Gardoso,
-.e oi;úJt:i/5 fllhos,-A/e5sandro e
onda- A geração que~ _.-Ed~~-~~·.<iu~efe.#~de:âo/5
· às faculdades' e -;; · aaeamentoS ·anteHore5,
trnbalho viveu expe- ---S6a_-caçula, KSrlá; vestida
familiares 'inteiramente dife- e
de_havalána, filha de
..·rêntes"da anterior. São os filhos da Cristiniu Carlos.
;_primeira onda de divórcios e separa-
,ç~, ocorrida com casais que se co- de _um reStaurante recém-inaugurado em
.._nheceram nas décadas de 60 e 70. Es- ·soo Paulo,. casou-se com aartista plásti-
Ses jovens estão atingindo agora a ida- ca Pitrícia Ma&ano, que tinha dois filhos

I
de 'de estabelecer seus próprios reJa-·· -.de um primeiro casamento. Sua mãe,
cionamentos familiares. Filhos de pais Eliane, casou-se de novo com o publici-
divorciados estão condenados a tam· rário Frederic Fennus, que também trou- a
bém se separar? Pesquisas mostram xe três filhos de dois casamentos anterio·
que isso não é verdade. Um estudo fei- . res. Hoje,_pQ_rtanto, Nanda tem mais cin- ria
to na Inglaterra com cinqüenta adultos co irm!tos, tomados de empréstimo nes- mento
filhos de pais separados re-
velou que dois terços dos
que tinham casado mantive- Até que o divÓrcio 'os separe ,, · · ·. .
ram o relacionamento est..í-
vel por mais de dezessete
anos - índice semelhante ao
Num período de dez anos, o número de casamentos caiu, enquanto o de divÓrCi~s e separações ~;:
quase dobrou no pais (em milhares por ano)
i'

de todas as pessoas de sua ge-
ração. "É daro que os filhos 1oso ,
/
II!mJ --UfW!#MI
.
1oo ~' i
16' ~
também terão seus problemas.
mas elesjamals serão os mes- 1000 ~~: €
mos dos pais", diz o psiquiatra 175 lo
Leopold Nosek. '"
Veja o exemplo da estu- 900
'
'
dante paulista Maria Fernanda
De Lamare, a Nanda, de L8
anos. Seus pais se separaram
sso
800
150
:l
)" ~
·'-- ~

-
"'
quando ela tinha li anos e ?: "'~
duas innãs. Seu pai, Nando 750 (:,,.~

De Lamare, chef de cozinha 700 l~ !


lmlll'!llll!!llmlillllll'!llll'!!lll'!!lll'!lllml ~
lmlll'!llll!!lillll&ll'!llll'!!lll'!!lll'!lllml!'
... - ·'·v, '· w ""'""'""""w.,ç, ·. lii'X. ii#Sv;:t.~273 ~
-~ nUnca pensei ria
de ·de eles se sepanireni. -
mudaram -muito. Hoj'e, acho
mais chance. Não pelo
d:e'les, que é bom.-Mas
ct?mum se separar.

tim ciúmes dos novos

'
pais e il7'!':os?
Karina .-acho que meu innão mais
velho sente mais. Ele é homem, né?
Sente falta de um pai. A minha irmã
I
menorzinh_a, do segundo casamento,
chora quando eu estou de mãos dadas
Com'meu pai.
Andréia -7- Tem homeus que querem
namorar íninha mãe. Mas quando ela
fala que---tem·três_filhos eles somem. Eu
114 17 de março, 1999 veja

274
separádos ficam
com mais-liberdade.
tenho medo Vinicius ,;_Nu rica pensei na hipótese de_
que ela se case e nossa relação meus pais se separarem. Lógico que há
mude. Se ela for arranjar um namorado, brigas, mas fico torcendo para que isso
ele tem de gostar bastante da gente. E não _aconteça
set bonito.
Marcelo- Minha innã.é muito agarra- Veja - Vocês acham m'esmo que filhos
da ao meu pai. Tem ciúmes dele. Mas de pais separadoS têm mais liberdade?
quando ele arranja uma namorada, ela Man:elo - Meu·s pais são separados e Vej;t_·~-D que voc!S esp;;a~1 d~ uma
acaba conversando com a garota. minha irmã de 15 anos sempie recla- fam'rlia? . .: . · · :.· · ·
ma que quer mais liberdade. É sempre Manlia .;_Família não é só pai, ii-mãos,
Veja- A vida de quem tem pais casa- ass1m. tios, avós. É também aquela pessoa que
dos é muito diferente do que eles estão r
Thomaz Éder (13 anos, série, pais que a gente ama. Não é só o sangue. Preci-
contando? vivem juntos) ~Na minha casa, meus sa ter compreensão, carinho, amor. O
Marília de Souza Lima ( 14 anos, 8° sé- pais são casados, mas cada um pensa de que torna a famOia meio insuportável é
rie, pais que moram jumos) ~ Meus um jeito. a convivência. Mas isso precisa ter, né?
pais fazem questão de jantar com toda Lucila Raucci (13 anos, 8° série, pais Daniel Lacreta (13 ·iJI!os; 8~ série, pais
a farru1ia reunida. Querem que eu con- que moramjwuos)- Lã em casa todo que moram jw1tos) '-. Famflia'é uma re-
te tudo que faço, o tempo todo. Às ve- mundo tem liberdade. Meu pai fala lação de paz, amor, união.' Isso só não
zes aborrece. Dá até vontade que eles dos negócios dele, a gente fala dos acontece lá em casa porque meu innão
se separem. Acho que os filhos de pais nossos problemas. Meus pais são casa- é um pentelho (risoS). •
veja ··!7·.de marÇo, 1999 "115
275
276
La
.. o~~"'!unwoo op <Opm '-"'~!'"".! .,~[q o 'OlU'l!""J o """"' OOU!> Op o!') ,'''I"'"J > ""P' "P"-
1010d <Op"~l"'!~ O)UoWrln .rud y <Opo:iilq ""-"''1"'' ~"' -"'"""' • ogdrud \IOXJ • '''"lllll ·~,uow<>>Jwouo'~ ·OJ <OjUOW]pOdWJ Jod '<10~1 eu "'"''""-' ~nb o opnl ''"'11~
·ISod JOS wown,oo onb 'SOh!l•u ·osd 'mo_q!)O<l'""'!W!'Um> '<rO""' ·•J """''" ou >l<J><>=Uood<a ~ 1"1'"' ••po5eJDo• '""' ·""'""' ••9P'" wo o<oq woo so1úr.nb ·o~ ruo r f.le~np odnroi
-"JJO <OLfUIW"> '"'"P "'Snq C 'uu"'q<>.l! <Op "'!I~Uo .JI!ptlnJ 'OOU\'Il<Y.ll""o>Otç>~OJJOio'on -•od '"''""o•ollopuow 'oop w••r• o "'P"'"' o~, o~u oournb 'P'""P o '<osoo~'l" nO:
''''I ·su>ool "' >JIUO ''"·""I""" -<>JdVIUed "5e:>>JJIUO)J ""'' "!J~' -"!Jl= O '<m[[!":n3' <e 'tw;m~ e '"'11""'"'""' ••J••oooropo • 11od 10 onb wo <<>W"'<>,j ·~ ''·'!'SOQ)JOlOI<l!l Jod 0p1iiooo J[\
_,,J '>"P'" •r >o~uoJ '"" Ol'-"1 "f' O"lS.IJI'?Od<> op o!<Jrd1:lllm<l O ,.>)JOW ep <ml1n:JI!UO, """'P S>QS IDIUOI" op .!OJUWD~• '0 I '"'"'a''"'"""' o "'"'''"'d -u>< ,, '>nb o~u I"'"
o .. 'Oit<OUI
..., wo olu"'"~"'"! • .. •,r,.,~r •r UJ<JO '"'1!'=-:l op <O]nl!l"'[ op O!<J ·S>Jd» Otu<JO w,qum 11!'> O]UOW I[OIO<>J 09\0U!WI'"JP 09U onb o ov5JP"'' •od '"" -r.,odwoo ''"" os•q WOJ
IOliJOd <O ''"d •• <>lU1!~fO!LoO> -"P''"J • """"V="!,. w;<FIJ1!1 ·noop O .,"'"'1"' no ollod wn O[Od ICpO>JOW 'IDJ~OU OCIJ -odo o]aJBI ou "'"'"'"' •• .. [~O<So<iJ>]UI JO\UO O
""'"' ' "P'W"11d 'swruowop ~"'"O '<Olp•d <OP o~~oewo; op "''"'I""•J o"""""' ·=o~l"' ·jwoj o '<>pd9Jd "'"11"" 001 <1<>d oo anb wo •owwo~ ·z ""q oom~ owoo "' '""P '"h
'"""!'' 'ÇJÚ -,;,UnJ 'odoosç.•oq "" ooypod<> Otu:li owoo opop ~PM sop,. OlU>WJli>P"" '= W<>> •muoB!P"I'"IIJWD~ '6 lootUOWOJO O~<un ~ opou "'""'""" oru ..
'"B'w op 501.\0f sop IU!OJOW~d -Joq• ;<;n O =00 OffiW'd "P [1!101 ·O:lY> .. Pl!.IOP!'U<» 0110q0 o 0F '"'""~'" •OI 100 •oJfiGOJ <>pU!QbOJj OJO ,nb JOpU:OIU> lOd O!li9U!
''-p'll"'"'"'"' """"!I '"P "q> "'"d •>nCOol>llnso~..,d"P ·021_JUOI<> ·~uoo op ""'" op <<>p<>113 IOU I<>IUOWO<DO o •!••61 ou oopo•u<>q '"~111 .u,.w op "'"""'"""' o J>qoo
sotr,, ·om, o opunSos •. oo n!(UOOWUJ -. ..,ed O<llq-<>1'"1 0 ·JOj J<>d"'! "" """""' oob '.,o,~ SOJ]OWI•d oodo oopoWJOj oo WO> 'Oioi6IIOJ Ou OUAJ' ou -OJ ;p «J>p S<r>AOf op ;,uo"'"
•l,li'UI OpUnJ >p >O]UO\llf!=<'Jó ''"li!"'"J > ,-ellnfuOO <j>\\ <p op -<lo:"'--'IUOO OWS~Wl,. O!lre:l<J IOJU<>•6iW oP
"'IIJW<>& •e oopOIO> O)UOWU>JnBoo 0~1 ""'"~" um -~r"RI ""~9Jd rp
Op 10dU <OUOIOP >p no "'''"' ·<~'!I""' ~ iml """'"r"' ,.,.,..,d .,.,P "'"'!q '" ~"" "'"' '~' IS]Di> OJCd '" onb wo ••ww<>.J 'L mou~f"d" '-~ opmotl•· 'o'" 1 a
_,,,, '"'-'U>Il<Xh.> >p,, .11\t>;S.'Jl ;p 0.01o{qo O WOO ·~.'d O Op<>l <OUIC'I>Afl" ;!""<>J<Jd !<>"lU[! •OI IJOAJU <OjuO•Oj)p WO> O]OJ •opopopoo nu wodn'o WOO OpJO'" O(l 'P"P"'"' L'[O<I
-OJ O <ouoqJo fOIIJWO~ 'L onb OÇ~jiOd OU O IOJ~WOW I'"' or..luomd op Ol'fqo Oluoo
;,.':\r~J~~~ :.~~ ·[n>U!PO.xa'~';,"'<.f~":r;:
1"""1 1' o JOUHIJ '"' "P''O OW>'I
-r mrd ""' ''""uoo !J8NJ n ·m '"ll'Jid~o 091D $001 10 OJIUO D!>U!AJAUOO "WJO[BA wn ouro' o~u '"P""·''
·<of!'"'~ 5e!f1WOJ Sop OSO!ffi[OJ
OlUowoundwoo o• oruonQ
·!piOA_'P o ""POllllbS:ip 'oru:> tu:l ·:>JqOJd um >p ~"" • .. ='1" ·11•» woo no •<>>oJnll•' '""
•OJ6 IO,JOO op OOI[JWD~ '9
op ••popjj<>potu '"" 'oopow
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<JB<OO J>puolO "'«!~,/$OS -OO>J sow '-""'""" tu:l opop1)1!1 .,O>JIJ10UOru l"!><lS >pop[S<OO'U
·oue 'P"' o '!"dou >P O~ lru!n o Je~,/ [1!101 -tm ep 010JJUOOOe>Qd005 '"""'I<[ IIO~j~ 100< <Op -oi6JI•• ooooq oou o<<>q woo ''"" owoo !"!""'"'"""' op""
<OUilS>PUOfl <OllOqo op $>\)lfflW ·""d • mnbo=l,. >"f''l """'"' ·od <llllM "" - I'..<QUJ5'Jl oou DpJ005 D WOJ[WOUO onb <OPD'Ijlll<>l' 091 <0 [; '10' ·flSUl 'lRIJ>f>J W>OOJRd .. sopr.•
Ç'[ ""I?Jd • w.o1pur (SI'!O) .tiRJ<Iw! ~I • 't6/>P"P!Umiuo~ ""H~olUOp ""!l!iod õwn oPi<>'j <OpoJOdOO 00 IOl]OijOI I]Od •O]IJWDj <O)UOWOdnJ50 Op -L[•~mnpuL "'P'P".OO< <V -.,u,
opnos 'P I"'P""W o~""''"'' \.'P "'!"l!dtln!O v ""Oitlei"'"'"d ·>p o(:ul!J• '"'MI=N '"!""~";< Jod Dp<>jjOLp ~ IOJUWOjl<>l 10d11 <op "'lll!uopj V6/op ->J!P """""'>[dwoo >P'P!I""
-10 •P sop•p -1'"'1! ou >ruow ·(.~• "'PPI • o """' op mtllOJ "" "?Jl , ""'""'"" • ·<Op DiiOUJW own 'lDJjO~UCd ·<>p[UJOjOJ,j Op O~UOdWDJ •wn "'U!l"'P' ofOJ~[ " ofoH
"'"I'"P''"l' op•>~IUJd opu>S ·UOJ OOJIOl l' :mb l<>nnll ~lp 'ouoq• o lU)UOO ~à ons op ·woo ••~• woJOp.ood ..,b SOJ O <>•cd o<<>q•OjXOj 0
·aoN.J •P """
onuquoo ouoq• o onb '"P"" ""'"" S'ilp!<\[CIAUO O~ 'mil<ota "'J -Ul<\JOjOJ - p.l~ J<ll"" ow ·<>~I""' Jod "P"'"PII "I"' I"'" o •wJUO ' .. "'1!'-''"J •p [BillJOj >p
OlUOWn:>op 0 'SOJIOOJOá
'l'HO>~" .ou "'l'IUOp!""OOJOS Ul>pOd 0'10 ~[ ·00 "P\h ~ Ol!OJ!PO IOlliJTjl'OJ tmd o ' - •!<>d <<>p wo <ouod<>
semmeJ.. ap -•P!I!q!JS>' ·~"flUCill "'"~'I"
'" "'"' 'P•P'l!~"'uodo>J op "'n~uo;<e.Jows~oo~ r6/•P~P!tu>m,/ op oquedwoo Op ciUOIOJd o woo- •'1"1 'I'!"'' orssud • 'I"~"~"' o~>
"~"'"á" w>< so~w op op~.,,.­ -ow o 'OUisf\IIWOJ O'O""'JWW!'"" Oll111:l.IOJd~ O[lU:JIO!d Qf!NJ V ·UOJodouow. '"li!"'~~ ·~ sodJJ zap-aii!Jáp ·•1'-' •P woSJ~W \' '""!I""'""'
" '·) OI" - ,,>lU>pUodopuo o~l IIC4JII woo no wo> ··~~I"" DJ IR!niUO~C ,~!HUlJ:Jd J!lOW C!'Í
·npmJ, op ""'"~' onb o o ·,,mu "PIA t OllaJIP <> opiiiiiWIJIIIIH -[~l•l no opuoBoo op IJIJ<>d ..equedttuia -np • oJoqwo •osoqu~p•dsn><
•ODO!UJOIU1 no <Ol!>JOliOJ> SOS D SCpDWJOj JDI/JW~~ .. ., op O!~!J<:>ld op •Jqw<>< ~ "!"'"'
-"'"uo • opuopu:no,. ·•:uoqrnw Ol~O\l\f
f[,ffi,[itl!!!\.1!11
op .,,;sow wo,. o~~"'!l'""' 00'<7NlON0:) '"''"lnil"' no •1<>6 ·Odlllll OS onb '•oplSOIOJd SonS['
O ey!W!J U UleAO!JdWc OllP"tl
·WO<l Op SO)OI SO. 'o:>l]j[Od ""
'' "'><1.~7,',.~~~",~~Po ':i,:,~"~'P ·~UO\IIpu! "!!' """'' so :lJ<l05 ool>1!dWJ w~. '"-'lno "' -u~n!l"! 0110J •P"!" "'"'";; "l
Otlb <>JOI" O <"-'fi]S<ld op OIUOW ·IW m: <ronb oop '"'-'F'I!Sl<lq op .ed 01!"1 !lll1 op se.'U""'J tt=q"'P ·Uolli>IU! Sll>S >p O!>U;•!A>Jqos
->5nopuo op ·~""!"~o 10q1nw s::>QlffiUI 09 o3rnl• ll'm<J<>d v onb op...!i!ll'•o~u·oJPo:! • """"'"' '<oprlo.lll• o '''""'
~ o~"""" ~P 'I"'"' ;umpn o
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'"'"q •P ••os.o<~ ep Op)oz)J01•-• ooooa op 10pn1<> 01p 1!8N.J O'oótnlJII8>Su!ipU11JOJd=t!>nb OAOd op > Vf[!li!OJ Rp op•p!JU>p!
-S>p op '>WOJ op, op~IU>lll!l• '" \1 '•"l""P"'~'P • '!"'',Uow o'SOp~!PPOJOpti>SO~otl~IW • wo> •!PUnJuoo >< o<f\lllJ»
·JOlll .;> OJOl[fi> ""'P"PJ>A "'"" •li[" <ll:J!U"lUOO>-o!"?"OOIP!JlUO>~ ·OJOOllfJn'"""'<f?<iodroonb=q o '[O!UO[Oo opepoooo• "'"N
',,J>q[nw ep or;s!wqn< .~IOdo
I""'U ou yq 'ijBN:) o "'"d UIOQd>:qos os """""ll<>'d <>w,r """" .,., ou ""'!""'! ll!lN:l v
'SOplQhlp >~nf ~ ~ 0!I1JXVU1 on "'"" le:> OU!JO"'OW O!UJWop O[>d-'o
op <ll>Wil-" o ~UII'l .,uownv oo\I[IJ op OIOlm)o o o-"""" or
["'N:> op o>••o om
'S(h'? SOl"""""<> SOU lpllOU ~ ';v, <Op l!!JOA JXI - OJU'i!l S!WJ :r=l '""""
·JOUI•d"'"
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"''""" ""'n ·oa >p ~ op cp "!"fin.rtooo "'!/l11" =no~ "onb zop ,...q.o:
Oll'l'/ OVVC>:) OlNN-N$\0
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JO \1 H~j9!id\i ~/81 V~ •Uf 'ou>o.JQ tfl:udJO)'i OU,_ 0'>O>oJownU 01~ '00'11!1 '" .,_, ro[od •P•P"'"ll"! 'I!'"' a ou
~JOll t!.!OPe!!l'b<od ep ~ 30111 Wl!tfU!A 'J"""' """" no "''lllq"'l O!IJWOJ cp o~~·HUOJUOO tU Otl

.. · ... ,-.,'""""o' o!'l•Pim.~"P"'P"P"'"IIONJV '""'"q omd ,,..., op '""!"" '"'' .,. 'O!'!NJ • opunifo< '"ii"'"'J
,,,I .1 "·'!I? OW"·'!l''[:>J Olll>'l -~ectosopwow~u oo1""wnr
·=~R>J 0~<11 O[od opnJnoo
-<>r so ··~or.vP '""' ?IV ·o; '"""
sop <!od>p o '""" - OOPO!lod
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_,_, oq[•'q"" op ur>'<!'"I"'"P
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·:o O 'IV[OO! O~<U>>Sn Op 0\)UI • ..._, ~<0<=1>:0 O SOWO]UI "''"I -OUIJOjSUl'-'l <l<Op,..Jr 09NJ ': 1\f)~VJ.'li\fd O'(.)IOVill
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n;à[""P J<>d ·,_o[nod O~S-"''11 ·ro.1ponb ~r•!! "!I
O\ f' op OIUROJWOp ossop •? ·<WeJ "''"!A"""' op "P"P'I"P
-ow <"o "rlnfuoo S>Q[Un op sod
''HTIJ OUOObod OUlO Op., 0)00illi1 odwoo o wo"''I'Oi"<>..SJW
-;odmo> o own<Uoo op s:oOlpod -[l zop SOUO\ll O[Od sop~OUIIU>pl
"'"'<UIOUO[OOU JrP""J!P JÕd op ors 'SO>tUI' o 'f! lOM 'S001J01SLq
'soso[~!JOl 'SO>tlJIOd ''!"'"1100
·I'.'""·''! woqw"' o>;"AOJOI \1
IOJfOPOI>~ lllOO "'-'"'') op 01npo1 d 'opoppuoi!oJ
-m~ •Jod opo:>JOW o~~m'!""!
·'"" op "'"'!"'I" woo '"""' op own ow<» ll'''\1 ou •mw•J • ,.,
o'""~" o Joo•w 1 1!"'-'8 ou onb
''"I"'! (:861 op '<Jnb<>d OW,1 ·u_rss•p !'!I!N::l • ''I'N ;><ti1 op
. H"'I"" op SI>AJS<odwo <»
-0.1 <OllllW., '04oo• op suoS•wt
<>popounwoo ·~ opuqu<w"""
S[Odop '"' o •OQ~[nqu,rroo J:>q
_,,, "'"d ''!'do opo1 op <odsjq
l<i-'ll'll >nb SUUO)UO '" OO·W>'OJJd
-11101u 'OlUOlllnoop O Z!P ''"IOA>J SOI><I >JU>wcp•"-'>SOJ OD"'!1"''"
opuos '!'I"' op•PlW>JOJ,i op "q"
""' ntLIIOJI>I '._i\.1 ~p O~'!A 0 JOQ1
-<'Lh'Jl" 0~0 OJ•d 'O]Uo:J 0 Ol!:d ·Cdlllo:) • ..,.d
'"q·O]X>! Q
"'"" opl'>O]O> JOJ ·~q opuenb .'""'!'!'
-''""', ofo11 o ·o~~"!" op •sow
!!OW SOI)~<l"'J]UOWSrn, >~p wn
JOI)IIllOJ O~~c~OJ~osop ~u ""'
''I' <>•uol <U> """"'"" JO >S O!IJW
-':1 o·r "I'" <'OIUoumSII<te., •opop onb' 'I"!'''"P"J·S~d oprpopm ""
-'""""'[ •·r >1qu•Ju.m.) • •~"<!
·""q·<>i>OI u opuLiii:JS ·.. •u~uo~
""'"lll '""I"' <op o~IPI""!I'
op ,uowonmf "'~" •ro ·:uJpj·el
" oonrosop no <:>nro onb ~q"'l ·J>l ou •PdJ!IA!P '(.. op~~J>N ·~
'PUCJ~ o, Owo> OpOio••OldO JOpU>[dSO O .. ) •opUO[ds'1)•1!-''il
> "~'"'I" V ·o!'l~!Unwoo op ·u oJ""d o~or odoa op "'H'!'
<OL>W >O" ·~~)JO S0110J Rlll:lS •UO OAOU R WOO O!UOIU!S UlO Oll
-OJ B!!NJ • 'OI»lU~ OI'>N -U> •!J!WOJ o UJO~ O!.lodn:>OOJd
-.,.,,,,,,!Jofqn< op OJ[n> O[od <op • 'o"! onb '!"W ·•!IJW<j •r
"""''!'" ~'\'> '!O<l>A!UTI SOlO[O.\ J•UoPOUJOIU[ OUV O 0\llO> ~M [
no~1émo W;>qW!I (nNo) ~~p
'" ·' '"·'ll'fqo '"P""PfSUo> '""
·11> ><'WJOU 1\1 'Oi>JO 0" OlllS>W ·mn <>!)/l•N svp 0!~""'·"'''0
' (orro<SOdJO)UI SO<>!lUOJdUlO> v ·..i'"' ow~ '"'!!"'•o~._u"~"l'
'"" u<Oqlll"l Hlli 'so,npoJd O wo> ',.•pop!UJ~)I!J,:I, > U!I!W
,. o< ''''" opu»Jidu os .. J>Arl -•.:1 .. ~"'- "!'l!'~'q of"-'~l 'P
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SAIA JUSTA

Entidade reúne mães solteiras por opção


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279
~TAFOLHA Pesquisa mostra que 51% dos brasileiros são contra o projdo discutido no Congresso; tolerantes são 48%

Maioria é contra união homossexual


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280
FOLHA DE S.PAULO

sábado, 8 de junho de 1996 são paul o 3

Vaticano veta famílias "gays"


das agências internacionais termo "famílias", mas sim "f;:~mí­
lia". Segundo Valls, a primeira op-
O Vaticnno conseguiu que a ção pode dar a entender que qual-
Agenda Hnbitat não reconheça os quer grupo de pessoas se constitua
casais homossexuais como cntida* juridicamente em famíliô.
dcs familiares, informou seu porM Usar o singular exclui qualquer
ta-voz, Joaquim Navarro Valls. situação não-reconhecida pelo di-
A Agenda HabitJt é o documen- reito civil dos pafscs. Significa que
to final da conferência, em que es- não se reconhecem os casais ho-
ta rã o descritas as decisões c ações. mosscxua is como fanu1 ias.
ScguJJdo Valls, tratn-sc de um Nas conferências anteriores o
dos pontos mais import:~ntcs que termo no plural hnvia .sido aceito.
o Vai icano lcYOll ;\ H;1bitat 2. "Volta-se à linguagem tradicíon<~l
Os puíscs aceitaram que o texto da ONU e da Declaração Universal
final do progrnma não reconheça o dos Direitos Humanos'' ,disse.

281
fOLHA DC SPAUlO

· Cla~siliue
O classificailo"'llé Cll'êonf,.os da·Folha. ·
ram ammciar ligue: 224-4422
VFJA COMO FUNCIONA
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282
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Espaço ptóprio e IIIO<I>~ilio. Maior e Molltor. QllollclaOO! S36. f, 543-06831 54:-5040.
P&ltloçorll Bl'f, tnl. Vi<leosl
Prom. Jan. Coorllll 822-3231.

Sulfol Chomoni<. Jol1!0tu<le


conlroternt:açlo cl m1l11ca lran-
PlJ!a~ldos
R~f-73olll
dolicicsos

F~ lluUit Fal de
St voei-- Jestu elo
....monlo!-, 15 ...,, <OqUe-
lék$, joniiiiS ÜJ>I<O•. oon·
cUI 10 OIVO, I pl!lrr <11 A$ 2J Brineando nu Nunnt. Ftslu cJ SuHol lnl. Conltl de F1ú. $111 lvolll..,.. ~Festa lrJitmC..çOes. lorru ou ou-
~ pessoa. F: as3-3ô21. reertaç.lo t $11ow'- Ampla ire• Flila CO/IIjllila t him. • re- ICil,.,-chiQUÜil JostLI~!ar tros eveotos. io;uf:642-1140.
verOa. F. 65·2185 • Pordl:u. ~+lembr.l'udoflm3r Fao. pgto. Brool:&l. 2~168 • Dlna Jaz Pllll v~! '
sonno do Crlan;o Sul. lnlantll. tixas. illooklin. F; 536-0556.
~tenormanra per&arlllindo. Salão
prOjlrro elas(ll domicilio.
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Plgto 3r. F. 530·7~77 _
~ melltor ltsll pato mtnor Caru & CINIII f. l(l.UU ltluUOI/Cilrtlr•L ~IV. 1m (> +
preço. Conlprovellli:lÍIII~ Eoplf'l om Folll llllftollrlf. AUo pac1rto cJ lU 0lriÇ611. 1::1 111 I;III'/I)L F: SG-1133, ~ma
Z. IIG!te • .1.110 41 S.nllnl. Promoçlo dt h!rias! Pn:m Jan:firn. All'lvâo.312.
Bul.l<ll. í.l FIHII. S>0-1110. Venho conlotlr, f. !15-67M.
OuiiJnrv. o• p;rdrao. tllrnq Z. 11ottt • AHo H S.Ontano,
e rocroiÇllo Cl sllow. CMsulll S.Obor dt llel. F: S.Sa!f-0361 Llp-iup Buflollnlllllil. Bul.lnl. U F - . 950.USO
Prom. • • (90 di.,j. 2' a G• Canmenlos, 15 Anol, B~u. flaOOramos lodo~ os <~e~alhes pio OuoiJS&J'( 6o ~·· brlnQ.
10'1. do•c. Sor;eto grt!IS' Conlral. do 11m ele ano. Amplo ,.. lesta do anlvars. do seu lilho. • rvr::riiÇilo rJ .m... ConsoJno
lãO.PIIÇO + qua~dade.f:~l-297j Fo11a a donl. 5711-:m(. V. lolirillna
6ulfel Completo. f1m de Ano.
Conl .. cas .. ínl .. Oq. eoenro
fAO. Payto. Si. prllprJo. 870-4876
SE QUISER CASAR Buflot Krl,toi27H779.
~•.Anh011 l,!tllo.UII . V,Proatnl•
OuaiJCit~
Wonlo Corlo aunot. PRIMEIRA AGÊNCIA INTERNACIONAL DE Prel"' ,

Fazendo Att• Bul ror Compo S.lo


Zona N01t1 merece o molhO!. MATRIMÓN!OS EINFORMAÇÕES
F. Ml-9r~sl m-6167. Pr"'"'s OlfOOIO~ p<Ood Jan '"' 3•
contacta tar sido au a única passo-a no Brasil, que \lonllo 110$ ~F: 556H'II7~
i absoluto, por chicadaa, SuHtlllad Polllj>éi> -!11-.:taõ2.
verdade. ciln'SegUr luo, P"'90S oopocioio. Conllra 11'
mau, que afastou a Gtnlre C>IIIO Bm:lo 11111 M<!O P..t<r
Chocolole Su!fol lnlonUI.
ecradlbvam a restituiu a
Pro~es p/ Ooz_ e J.an01r0.

Perdiz" F: 62-0167.
Cnltlo En;ull~~ Bulfll.
Ouilllclatll. re<1Lifttr. b"~ue­
dos imp, bolão twi'ula.oto.
Vim • Sonhor Sul.lnUJuvenll
2966S21/2956-196A--.iia ftanro
d supet<l•ncel.. potln .. tubo
escorre~ • 2 " ' " ' oe wver•
+ show + " " " ' · f. 530-1658.

lh><oflo Sul. lnl. Compr.to. Collot Houn Eronlos,


minicompo IUI., tecr • ai IV. Ftslas o ,,.nlll$ pr QUiiQUII
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P~ oJoclt.a71· 12113.P"'" ""''

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Terapia para casais vira indústria nos EUA


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"Al ElES C4S4RAM) É POSS[VEL CLARO QUE


.. § YWERAM FELiZES . V1VER FEUZJ• ÉPossfVEJ..
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