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VINGANÇA

O sol de outubro demonstra que será um dia quente, atípico para Nova
Munique nessa época do ano. O casal se abraça no interior da mansão, um casal
tão apaixonado e unido em uma busca desenfreada por dinheiro e poder. A
voracidade de ambos um pelo outro só encontra rival na felicidade de controle;
ele como senador e candidato com grandes chances de ser eleito presidente da
república e ela a segunda dama mais bem vestida de todos os tempos. Giovanna
Richter é um deslumbre no modo de vestir e uma das influenciadoras, quando o
assunto é moda, mais influente no Youtube, com o seu canal com cinco milhões
de seguidoras. Mesmo não sendo uma atividade bem vista pelos conservadores
na política, ela desbravou esse caminho colecionando sucesso, dinheiro em
propagandas e o nariz retorcido das outras mulheres dos políticos.
─ Minha querida, as pesquisas me dão grande chance de ir ao segundo
turno. Nosso sonho está mais perto do que nunca!
─ Eu tenho certeza de que tu serás o melhor presidente do país! Unira
essa nação e enriqueceremos mais ainda, claro.
─ Não há limites para o enriquecimento, querida. Ainda mais com o STF
ao nosso lado. Mesmo com os contratempos do impeachment, disputarei como o
partido de esquerda. O povão burro vai reclamar no início, quando nos aliarmos
de novo, mas um pacote econômico bem feito, eles podendo comprar umas TVs
e pronto, calaremos a boca dessa nação.
─ Querido, o capitã está na frente.
─ Estamos no início do ano, ele vai perder o fôlego, falar alguma merda
ou então...
─ Então o quê?
─ Hum, nada, querida. Apenas rumores da câmara e do senado.
O casal se beija ternamente, o mundo deles nunca esteve tão promissor.
Uma era de muitas vitórias é vislumbrada ante as suas perspectivas políticas.
Desde o incidente onde a sua filhinha foi morta pela furiosa Elisabeth, ambos
não tiveram um dia sequer de derrota. O seu momento terno e íntimo é de
repente pela exigente filha, que adentra a sala trajando o seu vestido para a nova
festa de uma amiga. FULANA não está muito contente, diferente de alguns
minutos atrás.
─ Pai, que tragédia!
─ O que houve minha filha?
─ Pai, eu estou arrasada, a Juliana, filha do deputado Steinhaeger compro
um vestido igual a este! Como eu vou usar algo que uma amiga minha já possui?
─ Ah, querida, calma! A mamãe já vai cuidar disso!
A Sra. Giovanna entra em contato com alguém, via smartphone e em
poucos segundos olha contente para a filha.
─ Pronto, amanhã o Antoine virá até nós para tirar as suas medidas.
─ Amanhã é domingo! Antoine? Virá em pessoa?
─ Apenas um dia como outro qualquer quando o assunto é a família
Richter, querida. Sim, ele sabe que eu não me contentaria com menos.
─ Filha, nós os poderosos, precisamos mostrar o tempo todo a nossa
força! Assim, ninguém ousará nos desobedecer.
─ Isso não é muito democrático, papai ─ FULANA debocha.
─ Ai, não! Vai virar uma justiceira social é? ─ Dr. Zoltan finge espanto.
─ Cruzes! Eu mando e a plebe nojenta obedece. Este é o meu destino.
─ Essa é a minha filhinha, o seu futuro na política será brilhante meu
amor.
─ Sangue alemão, pai... Eu nasci para a vitória e para a riqueza e o
superarei em importância.
─ Para isso, terás de estudar muito e se esforçar além da mediocridade.
─ Sou sua filha, não me contento com menos.
A Sra. Giovanna olha para a filha, depois olha para o marido, abaixa a
cabeça e fica pensativa. Ela enxerga um ponto de tensão, uma fagulha entre
ambos. Dr. Zoltan olha para a filha como admiração e um pouco de espanto, mas
a admiração por enquanto ainda é maior do que o instinto competitivo de um dos
homens mais poderosos do Brasil.
─ Dá um abraço no papai, querida. ─ FULANA corre para os braços do
pai gargalhando e fala baixinho no ouvido dele.
─ Eu te amo, pai.
─ Eu também, minha filha.
─ Porém, pai... eu sou uma Richter e não me contento em ser ofuscada
por ninguém, nem pelo senhor.
─ Não podes me vencer por enquanto. Trilhe o caminho dos estudos e
boa sorte no seu projeto.
Giovanna Richter suspira ao ver a cena tão tocante, mas ela sabe que a
sua filhinha, caso mantenha em mente, o seu desejo de entrar para a política,
será implacável do mesmo jeito que o pai é. Perdida em pensamentos, a esposa
do senador divaga sobre um futuro de glórias para a filha: poder político,
influência, dinheiro, tudo o que esta família tradicional mais deseja. Para os
Richter ganhar poder e dinheiro é objetivo máximo das suas existências. A
empregada entra na sala como o telefone arrancando a Sra. Richter dos seus
devaneios.
─ Alô... ─ apenas há silêncio. ─ Alô?
─ Quem é querida?
Dr. Zoltan observa a sua esposa ficar pálida, ela morde o lábio inferior,
fica de pé e arregala os olhos.
─ Querida o que houve?
Giovanna Richter olha para o marido, lágrimas escorrem dos seus olhos
assustados, ela treme e gagueja indagando quem está do outro lado da linha. Seu
marido se aproxima, ela olha em seus olhos e desmaia. Dr. Zoltan pega o
telefone furioso e grita.
─ QUEM É, PORRA!
─ Dr. Zoltan?
─ Sim, o que pensa que está fazendo, seu bosta?
─ Não entendo, doutor... eu...
─ O que tu disseste a minha esposa, ela desmaiou porra!
─ Ora, eu fiquei perguntando se ela era esposa do senhor, mas ninguém
respondia nada. Mesmo assim eu continuei perguntando até o momento que o
senhor atendeu. O que houve?
─ Ora, diabos! Alguma coisa você falou.
─ Doutor, eu apenas liguei para avisar que segunda-feita antes das
gravações da entrevista da dona Giovanna, haverá um café da manhã especial
para ela aqui na emissora, apenas isso.
─ Tem certeza que foi só isso?
─ Dr. Zoltan, eu não arriscaria o meu emprego fazendo brincadeira e mau
gosto. Conforme for, entre em contato com a emissora e pegue uma cópia da
ligação. Tudo que falamos por telefone é gravado.
─ Farei isso mesmo! Reze para que esteja falando a verdade, porque se
eu descobrir alguma coisa você será despedido e acabar comendo merda na
Ceilândia com aquele povo nojento de lá.
─ Tenha um bom dia, Dr. O Zoltan. ─ O irritado senador desliga o
telefone sem getilezas.
Ele pega a sua amada e leva à limusine dando ordens ao motorista de
levá-lo logo ao hospital. Ele está preocupado, afinal a sua esposa tem a saúde
fragilizada pelos ataques de Elisabeth. Giovanna Richter passou por muitas
cirurgias reparadoras que de uma forma ou de outra exigiram muito da sua
estrutura física. O que mais o senador teme, é a saúde mental da sua amada. Ele
entende que por mais que ela pareça muito bem, o impacto psicológico dos
acontecimentos pode vez por outra cobrar algum tributo da sua psique.
─ Giovanna, Giovanna?
─ Chegamos doutor.
Logo a Sra. Richter é levada para os primeiros exames e o seu marido
sente a dor da angústia em seu coração de ferro. Pensar, depois de tudo que
passaram juntos, na sua esposa doente novamente faz a sua alma gelar. Apesar
da tenacidade e força psicológica acima do normal, ele é apenas um humano.
Sentir-se assim tão vulnerável é algo que ele experimenta pouquíssimas vezes
nos seus cinquenta anos de vitoriosa vida. Ele divaga em seus pensamentos
enquanto a sua esposa descansa. Ele admira cada centímetro dessa mulher. Ele
acredita que foram feitos um para o outro e o que mais o intriga é que o desmaio
se deu por coisa alguma. Nenhuma anomalia foi identificada na bateria de
exames feitos com rigor, isto intriga o Dr. Zoltan não gosta de surpresas. Ele
precisa ter o controle de tudo o tempo todo, um desejo por planejamentos que
beira à neurose. Cada passo que dá é uma jogada como se a sua vida fosse um
tabuleiro de xadrez.
─ Zoltan? Zol...
─ Estou aqui me amor, acalme-se.
─ Querido... querido... eu... eu...
─ Acalme-se, querida. Eu estou aqui e nada acontecerá com você.
─ A voz, Zoltan... a voz...
─ Deite-se meu amor, você precisa descansar. Nada há de errado contigo,
mas precisamos que você se recupere desse colapso.
─ A voz da morta estava no telefone... a voz...
─ Que voz, meu amor? Era apenas um rapaz da emissora de TV, ele disse
que na segunda, antes da entrevista, eles farão um café da manhã especial para
ti.
─ Não... ─ Giovanna Richter começa a chorar ─ a voz, a voz, meu Deus,
eu ouvi, Zoltan... eu...
─ Que voz? Eu vou chama a enfermeira, querida... Espere, você não
poder levantar... Meu amor...
─ NÃO! Eu não quero ficar aqui. Eu ouvi a voz, você não entende?
─ Estás falando do que minha amada, não, precisas deitar!
A enfermeira entra no quarto e o Dr. Zoltan ajuda a conter a esposa para
que a enfermeira aplique um calmante.
─ Larguem-me eu ouvi... eu ouvi... a voz... a... a... voz...
O calor está infernal, o verão como sempre insiste em se prolongar.
Insetos tornam-se uma nuvem neste local sem uma infraestrutura que possa dar
conforto ao seu povo. Barracos se amontoam, uns paupérrimos e outros muito
bem construídos por pessoas caprichosas ou exímios pedreiros que moram no
local. Na base de um morro enorme cinco pessoas se aproximam de uma das
várias barricadas onde soldados do tráfico controlam com rigor militar a entrada
das pessoas.
─ O que tá pegando aí, playboyzada?
─ Estamos visitando o Rio, tchê! Arnaldo Cabrunco nos convidou e disse
para pagar isso a você.
─ Opa! Nóis não pode vacilar, tá ligado? O baile é lá em cima no casarão
da madame.
─ É muito alto? Tenho pernas frágeis, sabe?
─ Podem ser frágeis, mas são lindas novinha! Aê, Cara de Cachorro, Zé
Pelintra, chega mais! ─ os jovens estranham tantos erros de português e o chiado
que o cara faz nas frases.
─ Fala, patrão! Cara de Cachorro, vem cá porra!
─ Pega as moto e leva os playboy na casa da madame. Eles foram
convidados pelo Cabrunco. Sem gracinhas, porra! Os bacana não tão de bobeira.
Os jovens estranham muito aquela situação. Toda a pobreza que viram
nos bairros pobres da sua cidade não é nada comparada ao redor dessa favela
assustadoramente grande. Um verdadeiro formigueiro de pessoas em sua maioria
negras, negros de todos os tons e cores. Negros tipo africano, negros com olhos
azuis, pardos de cabelos lisos, negros de pele tão clara quanto a da maioria deles
ostentando o seu penteado black power, negras com glúteos avantajados, médios
e até pequenos. Mulheres brancas com a estrutura física típica de mulheres
negras e negras com a estrutura física magra de mulheres européias. Um
verdadeiro manancial de etnias e estilos diferenciados convivendo em um
mesmo ambiente tão pobre e a mesmo tempo tão rico em grafites e ritmos
musicais como funk, rap e hip-hop.
─ Cês são de onde playboys?
─ São Paulo.
─ Sampa? Puta merda, nem praia cês tem!
─ Temos muitos prédios lindos.
─ Grande coisa, nóis têm as melhor praia e as mina mais bonita!
─ Verdade, muitas mulheres bonitas aqui, heim!
─ É playboys, aqui nóis manda, as mulher para cês pegá, tem que falar
com o patrão, senão... ─ o bandido aponta o fuzil para o homem e sorri.
─ Nosso carro pode ficar aqui assim?
─ Fica suave novinha, quem mexer no carro dos amigo do Cabrunco, é
microondas. Demoraram seus bostas, lazarentos do caralho! ─ cinco motos
chegam fazendo um barulho intimidador.
─ Nóis tava desenrolanu pra mais tarde, qué que nóis fica como? O
patrão mandou chamá, caralho!
O grupo sobe cada um em uma moto e seguem a destino. Do dia quente
sobrou o abafamento e uma tarja alaranjada no horizonte. À medida que sobem
eles percebem o contraste entre o belo mar e os tijolos aparentes das casas
miseráveis. A cada cem metros, homens ostentam os seus fuzis, um poder de
fogo formidável e nas mãos de jovens com não mais do que dezessete anos. O
grupo fica boquiaberto quando veem crianças aparentando doze anos sorrindo
para eles enquanto carregam os seus AK-47. Qualquer turista que olhe isso tem a
certeza de que este lugar está pronto para uma guerra a qualquer momento.
Finalmente chegam à uma casa enorme e bem construída. Suas possuem
jardineiras enormes com rosas vermelhas, seus vidros escuros contrastam com a
cor amarela da fachada. Uma casa muito grande tendo na porta dois soldados
que parecem terem sido esculpidos em ébano, seus rostos são fortes, mas apesar
de altos, são magros, porém com o semblante intimidador e cada um com o seu
fuzil.
─ O que mandas Cara de Cachorro?
─ Esses playboy, são do patrão! Já pagaram o pedágio, ordem de
ninguém tocá neles!
─ Passem então, divirtam-se meninos.
─ Tu é português, amigo?
─ Não. Eu e o meu irmão aqui somos de Angola? Agora vão e não façam
merda!
─ Boa noite. ─ O belo negro já está de novo focado na rua e não
responde.
Os jovens andam por um corredor enorme e logo eles chegam a um
gande salão cheio de pessoas negras, porém há uma quantidade muito grande de
pessoas brancas aparentando uma origem completamente diferente das pessoas
que eles viram pelo caminho. A ostentação de ouro e jóias chama a atenção dos
jovens, eles se indagam como que em um local tão perigoso pessoas se sintam à
vontade de usar peças tão valiosas.
─ Temos de ser rápidos, amigos!
─ Entendo, mas eu gostaria de aproveitar umas mulheres antes, ha, ha,
há.
─ Não viemos aqui para isso, temos a missão, duas pessoas para pegar e
evadir sem estardalhaço.
─ Ah, vocês...
─ Porra, tchê, sossega esse pau, caralho! ─ ralhou a menor do grupo ─
Estou louca para arrancar essa peruca.
─ Ali, o alvo número um, que rabão! Assim que falam aqui, ora.
─ Deixe de ser tosco! Vamos, temos...
─ Com licença, você é daqui mesmo? Seus olhos são cor de mel, são os
mais...
─ Não sou daqui, sou da casa do caralho! Cai fora babaca, não encostes
em mim meu.
─ Quer engrossar é, paulistinha?
A mulher segura a mão que ousou tocar a sua cintura e o homem entende
que tentou abocanhar mais do que pode digerir. Ele ajoelha por causa da dor e
pede perdão à mulher de cabelos negros e vermelhos.
─ Cai fora, seu bosta!
─ Hei, amiga, não seja tão agressiva, vai chamar a atenção dos soldados.
─ Porra! Eu prometi a mim mesma que ninguém nunca mais me tocaria
assim sem se foder.
─ Cadê a minha amiga doce e carinhosa você a comeu é?
─ Ah, cala a boca, índio do caralho!
─ Ui! A doce menina depois de quatro anos virou um monstro.
─ Hei, aê... vocês três que são os truta do Cabrunco? Nossa, uau, de qual
tribo cê é, gostoso?
─ Muito prazer, que bom que a mulher mais linda da festa veio nos
cumprimentar.
─ Cê não viu nada, gostoso!
─ Eu vim de São Paulo para conhecer as belezas daqui, por favor, dê uma
voltinha para eu admirá-la melhor. Minha nossa, depois de vê-la, meu, podem
arrancar os meus olhos.
A vaidosa mulher ri, seu sorriso de marfim brilha à meia luz. Ela é uma
amazona metida em um vestido vermelho, felina, a beldade dá uma volta bem
devagar cravando os seus olhos nos olhos amarelos do homem. Ela mostra a sua
voluptuosa silueta com seios fartos, cintura fina, coxas grossas e glúteos
avantajados e empinados. A muher possui a pele bem cuidada e o nariz afilado,
simétrico demais para ser natural pensa o homem. Sua pele clara tem o aspecto
de seda e exala um perfume doce que mesmo ao longe alcança os sentidos do
homem. Ele fala em seu ouvido a deixando em êxtase.
─ O que você quer fazer comigo, heim? Preciso de pó e sexo.
─ Aqui eu tenho muito dos dois e vou fazer como você o que eu quiser
seu gostoso!
─ Então me arrasta para fazer o que você quiser, meu! Depois de te
conhecer eu nem quero voltar para casa mais.
─ Vem cá! ─ a mulher beija a sua nova presa com voracidade, mas
alguém não ficou feliz com isso.
─ Djeniffer, que porra é essa! A mulher avança para o homem, grita com
ele e desfere um tapa com as costas da mão esquerda do lado direito da face do
homem. Ele a olha com ódio, mas ela aponta para os seguranças e eles o
carregam para o jardim da casa muito transtornado.
As pessoas em volta começam a se virar, mas o som que o DJ comanda
não permite que as pessoas mais afastadas ouçam a confusão que a mulher faz.
─ Vamos gostoso, meu quarto é lá atrás.
─ E aquele cara, é o seu marido?
─ Sim, mas aqui nesse morro, eu dou as cartas tá ligado? Vamos logo,
porra, quero que você rasgue a minha buceta quente!
O casal some por um corredor e as suas amigas ficam bravas como ele e
sabem que agora ficou mais difícil.
─ Porra, ele só pode estar de sacanagem, puta que pariu! Merece uma
surra de laço, tchê!
─ Calma, meu amor, vem cá e me beija também. ─ A mulher alta de
cabelos cor de fogo agarra a namorada enquanto a amiga que sobrou se afasta e
olha preocupada no entorno. O local é no alto, o salão é amplo e aberto. Ela
caminha até o fim e vê o jardim onde um homem está muito irritado e discutindo
com outros homens. Ela vai ao jardim amplo, deve ter custado muito caro
avançar com uma laje tão grande sobre o precipício que se abre abaixo. Lá de
cima , a mulher de cabelos negros observa as luzes e a negritude de um oceano
que de dia é imensamente azul, tão azul ã os olhos da sua amiga. Ela lembra
quando viu essa imensidão azul na infância e sorri daqueles tempos mais
simples.
─ Boa noite, está a fim de dar um dois?
A mulher vira a cabeça para trás e vê um homem loiro como olhos
verdes, seu sorriso simétrico a agrada muito e seu corpo começa a pedir por sexo
e algo mais.
─ Não, eu não fumo, meu. Mas tem outras coisas que eu quero.
O homem sorri e com suavidade dá um beijo nos lábios da mulher,
lentamente ele percorre os lábios vermelhos e simétricos da sua parceira
arrancando suspiros suaves da beldade.
─ Ai, isso, vem me beija logo.
Ela arrasta o homem e mergulha a sua língua feroz em sua boca, ela
pensa que poderia ser mais gostoso se não fosse o gosto de fumaça que ela sente,
mas o que importa agora é aproveitar enquanto ela pode, porque ela sabe que a
coisa poderá ferver.
Na pista ao som do Nego do Boréu o DJ traz para si o comando da noite,
a sua performance arranca gritos de satisfação enquanto bebidas finas, drogas e
perfumes caros tomam conta dos sentidos de todos ao redor. As duas mulheres
continuam se beijando e dançando enquanto a festa de desenrola sob os atentos
olhares dos soldados prontos para a ação. A pista agora está tomada pela luz
negra, as mulheres vestidas com roupas brancas brilham na pista com seus
corpos esculpidos por horas em academias, o ritmo agora mudou para o techno
mais pesado entremeado com letras de funks mais famosos e os convidados
gritam de empolgação.
─ Ai, meu amor, estou doida para ir embora daqui! Não sei como eles
aguentam esse funk horrível na cabeça.
─ Aqui é a terra do funk, querida! Eu acho também uma merda, mas
acredito que logo, logo, iremos embora.
─ Merda, aquele irresponsável está vindo, espero que tenha feito o que
devia.
─ Meninas...
─ Meninas é o caralho! E ela?
─ Fodemos gostoso, ela cheirou cocaína pra caramba e o demônio a
levou.
─ Bom, tudo certo então, amigão?
─ Sim, agora só falta o... Merda! Se afastem.
As mulheres se afastam e quando viram para olhar o que está havendo, o
homem que levou um tapa no rosto está apontando uma pistola para o
seu companheiro.
─ Seu bosta, cadê a Djeniffer, seu comedia? Fala senão eu te estouro os
cornos.
Os soldados chegam perto da confusão, e começam a falar com o homem
armado que aquilo vai dar problema, que o patrão não quer confusão ali e em
nenhum lugar da comunidade.
─ Calem a boca, porra! Seu índio de merda, agora você morre! ─ quando
o homem resolve puxar o gatilho, uma mulher grita:
─ Maykon!
Ele congela ao ouvir aquela voz e olha em volta, a música parou depois
que ele sacou a pistola. As mulheres ricas logo se afastaram e a cena está pronta.
Ele sente o coração disparar, aquela voz fica ressonando em sua cabeça.
─ Quem está brincando comigo? Quem, porra!
─ Boizinho, calma, o patrão vai te matar, porra!
─ Eu não sou Boizinho, porra! Que apelido escroto, seu filho da puta
você estava agarrado com a minha mulher, você vai morrer agora!
Um estrondo ensurdecedor seguido de uma fumaça vermelha toma conta
do lugar, o DJ lança mais um techno e a festa é retomada, os soldados guardam
as suas pistolas, mas de repente as suas gargantas são cortadas. As drogas e as
batidas da música tornaram o local um verdadeiro pandemônio. Maykon vê o
amante da sua mulher se fugindo e o persegue até o jardim! O homem se afasta
rápido e o caçador ao ver a sua presa fugir, sente-se um leão indo encurralar um
gato, ele se regozija quando a sua presa para no fim do jardim e percebe que não
tem como fugir, a menos que se jogue no precipício.
─ E agora seu merda? Se eu tivesse tempo e paciência, rasparia essa sua
cabeça e depois comeria o seu rabo, seu comédia do caralho!
─ Calma amigo, se você atirar em mim os soldados do Cabrunco virão
aqui e você vai se foder!
─ Com aquela fumaceira vermelha do caralho e um monte de gente
drogada para eles vigiarem, você acha mesmo que alguém vai ouvir? Um tiro, e
você cai lá embaixo seu lixo!
─ Hei, Boi, para com isso! Cê tá louco? O patrão vai te matar!
─ Cara de Cachorro, cai fora senão...
─ Se não o quê? ─ o bandido saca a pistola e mira em Maykon.
─ Pirou, seu comédia? Eu te mato, Cara de Cachorro, que porra!
─ Então atira, seu bosta! Antes de a sua bala chegar aqui eu te acerto.
Os dois agora se encaram, nervos à flor da pele, pistolas em punho e
nenhum dos dois parece querer desistir.
─ Esse comédia comeu a Djeniffer, aquela puta! Paulista filho da puta,
você tá no Rio, seu bosta!
─ Boizinho, para porra! Djeniffer te trai e todo mundo sabe, abaixa a
arma, caralho!
─ Só depois de você abaixar a sua, cara de buceta! Eu vou fazer esse cara
pagar um boquete e depois ele morre!
─ Porra, as minha ordens são garantir a segurança dos clientes, caralho!
As câmeras ali filmando essa merda.
─ Câmeras? Hum, bom saber! ─ sorri de forma zombeteira o paulista.
─ Cale a boca, porra!
─ Urra, meu! Esse lugar é alto mesmo!
─ Cala a boca paulista filho da puta, você vai ver! ─ Maykon atinge o
peito de Cara de Cachorro sem aviso.
─ O que é isso, cara? Está louco? ─ Devia acertar a cabecinha dele.
─ Você é retardado? Vai morrer e fica fazendo graça?
Tiros são disparados na direção de Maykon, mas sem sucesso. Ele agora
deixa Cara de Cachorro sem vida.
─ Agora, você morre seu...
─ Ah, mas sem eu pagar um boquete?
─ Filho da puta! Hey, espera aí... Porra, eu te conheço, seu merda!
Mesmo com essa barba, eu lembro de você!
─ Oi, Maykon!
A voz suave vem do passado para assombrá-lo! Ele vira para trás
atordoado, seus sentidos entram em choque quando veem quem o chamou,
enquanto um urro demoníaco ecoa pelo jardim fazendo a sua alma congelar! Ele
retorna o olhar para onde estava a sua presa indefesa e uma mão enorme o agarra
pelo pescoço sem dar chances de reação, o seu terror é tão grande que ele nem
consegue se mexer. Uma sombra demoníaca se avoluma no jardim, suas asas
enormes se abrem sobre uma pessoa em choque, mas o auge da festa regada a
uísque depravação e drogas encobre a sua saída acompanhada de outros seres
demoníacos rumo às trevas da noite de lua nova.

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