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Pólo Luz

SALA SÃO PAULO, CULTURA E URBANISMO


Pólo Luz

Sala São Paulo, cultura e urbanismo


Complexo Cultural Júlio Prestes, 1999
Pólo Luz
Sala São Paulo, cultura e urbanismo
textos de Regina Maria Prosperi Meyer e Alcino Izzo Júnior
Projeto:
Implantação do Complexo Cultural Estação Júlio Prestes

Patrocínio:

Realização:

Incentivo:
LEI DE
INCENTIVO
À CULTURA

MINISTÉRIO
DA CULTURA

O projeto “Implantação do Complexo Cultural Estação Júlio Prestes”, que compreende os projetos de restauro e reciclagem da
Estação Júlio Prestes para sua transformação em sede da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo, com a implantação da sala
sinfônica que recebeu o nome de Sala São Paulo, os estudos urbanísticos do entorno (região da Luz) e a publicação deste livro,
foi uma realização da Associação Viva o Centro, apoiada pelo Ministério da Cultura através da Lei de Incentivo à Cultura e
patrocinada pelas empresas Telefônica, Nossa Caixa-Nosso Banco e BankBoston.
Os paulistas sempre se O conceito de parceria
orgulharam do dinamismo da sua Capital. A agitação das corporificou-se, no caso do Complexo Cultural Júlio Prestes,
ruas, o movimento dos pedestres e carros, e mesmo a fumaça num exemplo de complementaridade eficiente entre diferen-
das chaminés eram identificados como sinais de progresso, tes setores da sociedade. O poder público conduziu o processo
cantados até pelos nossos melhores poetas. Expressando este e a sociedade civil, por meio da Associação Viva o Centro,
sentimento, afirmava-se que São Paulo – a cidade que não empenhou-se, ao assumir o desenvolvimento do projeto, em
podia parar – era também a que mais crescia no mundo. que esse importante investimento se realizasse dentro das exi-
Apostando apenas no futuro, ela avançava sobre os bairros gências técnicas e artísticas compatíveis com as expectativas
mais distantes, entre eles o do Guaré, onde, ainda no século de todos.
XVI, ergueu-se uma pequena ermida dedicada a Nossa A concretização de uma obra da importância da Sala São
Senhora da Luz – origem do nome atual da região. Paulo – um recinto sinfônico de alta qualidade técnica, ins-
Do Mosteiro e Igreja da Luz à estação ferroviária da São Paulo talado de forma inovadora no magnífico edifício da Estação
Railway, passando pelo mais antigo dos nossos parques e pelo Júlio Prestes – dá ao Centro de São Paulo mais um poderoso
prédio da Pinacoteca do Estado, nenhuma das outras localida- instrumento para a sua recuperação.
des da grande urbe conserva tantos edifícios históricos e traduz Nos processos de requalificação de centros metropolitanos, a
tão bem o processo que levou a modesta vila colonial à condi- cultura desempenha um papel fundamental. É no centro que
ção de metrópole. Esta região, que constitui um dos nossos experimentamos o vigor criativo de nossa cidade e as suas
mais importantes pólos de cultura e lazer, conta agora com conexões com o mundo. É para ele que as pessoas acorrem
mais um espaço da maior importância para a cidade: a fantás- para a experiência individual da globalização, através das
tica Sala São Paulo, construída pelo Governo do Estado a par- múltiplas linguagens da cultura.
tir de projetos desenvolvidos pela Associação Viva o Centro. A decisão do governador Mário Covas de assumir a recupera-
Faça-se a luz, foram as palavras de Deus, após criar o céu e a ção do nosso Centro metropolitano como um assunto de sua
terra. Se não podemos e nem precisamos imitar este Seu gestão naquilo em que o Governo do Estado pode efetivamen-
exemplo, devemos, ao menos, nos empenhar no apoio dos te intervir – principalmente o transporte público, a seguran-
poderes públicos e da comunidade para a preservação do ines- ça e a cultura – é de fundamental importância para o futuro
timável patrimônio existente no bairro da Luz, criação cole- de São Paulo como metrópole global e um habitat mais
tiva de todo o povo de São Paulo. humano para os seus cidadãos.

Mario Covas Henrique de Campos Meirelles


Governador do Estado de São Paulo Presidente da Associação Viva o Centro
Presidente do FleetBoston Global Bank
5
Nelson Kon, 1996

Foi em 1995 que, pela A implantação do


primeira vez, pensei sobre a possibilidade de transformar a Complexo Cultural Júlio Prestes com a magnífica Sala São
velha Estação Júlio Prestes num complexo cultural. Paulo foi fruto de uma bem articulada parceria entre o poder
Tratava-se de proposta arrojada que implantaria, em definitivo, público, idealizador e principal financiador das obras, e
em São Paulo, uma política de requalificação urbana através empresas que, através da lei federal de apoio à cultura,
da cultura, num processo que fora iniciado com sucesso na patrocinaram a Associação Viva o Centro no desenvolvimento
reforma da Pinacoteca e no restauro do Theatro São Pedro. dos projetos básicos de arquitetura e engenharia e de estudos
Hoje, a Júlio Prestes, renovada pela cultura, se transformou urbanísticos da área envoltória, a região da Luz.
em âncora para a requalificação urbana de todo o Centro, res- Esta publicação, também resultado desse patrocínio, visa a
gatando do passado a história de uma cidade, já quase perdi- documentar o processo de transformação da estação
da, devolvendo-a a seus cidadãos. ferroviária em sala sinfônica e sensibilizar os poderes públicos
Para nós, a Sala São Paulo significa a transformação de toda para a importância da requalificação urbana da região,
uma região pelo uso cultural, trazendo neste reviver a possi- objeto dos estudos urbanísticos realizados.
bilidade de melhores condições de convívio para milhares de Equipamentos culturais do porte da Júlio Prestes exercem
paulistas e paulistanos. naturalmente um impacto altamente positivo na região onde
Uma obra que para ser realizada precisou de recursos de vulto, se inserem. Tal poder indutor, no entanto, pode e deve ser
de muito apoio do Governo e da parceria com a iniciativa pri- potencializado ao máximo em benefício da coletividade
vada e que, acima de tudo, precisou de coragem para enfrentar através de planos urbanísticos, adequação de zoneamento e
o desafio de transformar pedra e cal em história e cultura. posturas edilícias e incentivos especiais.

Marcos Mendonça Marco Antonio Ramos de Almeida


Secretário de Estado da Cultura Presidente da Diretoria Executiva da Associação Viva o Centro

Estação e Praça Júlio Prestes antes da transformação 7


Gare da Estação Júlio Prestes Jardim da Luz

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Estação da Luz Sala São Paulo Torre da Estação Júlio Prestes
Praça Júlio Prestes Banco do Est

11
tado

Edifício Martinelli

12
Edifício Itália

Edifício Copan
Praça Princesa Isabel Terminal Rodoviário
Sumário

Pólo Luz 17

Estação Júlio Prestes 33

Sala São Paulo 59

Espaços para a vida urbana 107

Propostas para a área (1974-1999) 127

Referências bibliográficas 149

páginas 8 a 14
Vista da cidade a partir da torre da Igreja do Sagrado Coração de Jesus,
com a gare da Estação Júlio Prestes no primeiro plano, 1999
Nelson Kon, 1996
Pólo Luz

Jardim e Estação da Luz em primeiro plano,


Pinacoteca do Estado e Avenida Tiradentes ao fundo
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Nelson Kon, 1996

Um novo modelo para a recuperação da área

Regina Maria Prosperi Meyer

São Paulo é uma cidade cujo desenvolvimento urbano esteve


sempre associado aos seus ciclos produtivos. E, como corolário, sua estruturação física tem sido a
expressão da permanente adaptação do território, tendo em vista um bom desempenho de funções
urbanas específicas. Sua trajetória contém períodos bem definidos, cujas inflexões explicam e
ilustram as relações estabelecidas entre a cidade e esses diferentes processos nela materializados
desde o período colonial até o presente. Hoje, quando se torna evidente um conjunto de profundas
transformações estruturais no seu sistema produtivo, é indispensável, para a compreensão e posterior
enfrentamento de um novo panorama urbano, buscar esclarecer o percurso histórico de questões que
afetam a metrópole contemporânea.
A definição do trecho de cidade e o conjunto de questões presentes no denominado Pólo Luz
representam uma oportunidade importante para indicar um ciclo urbano cujo elemento-chave tem
sido a relação estabelecida entre a cidade e a instalação de uma impactante infra-estrutura produtiva:
a ferrovia. Em termos temporais, trata-se de um período histórico que tem como ponto de partida o
decênio 60/70 do século XIX, quando se deu a sua implantação, e, como ponto de chegada, os anos
90 do século XX, quando a ferrovia muda suas características após transformações drásticas, tais
como a privatização operacional e a sua integração com a rede do metrô. Corresponde, do ponto de
vista da história urbana, ao arco de um século: da instalação do primeiro ciclo industrial paulistano
à atual transição de metrópole industrial para sua etapa pós-industrial.
A implantação do sistema ferroviário entre 1867 e 1875, quando se instalaram na cidade a São
Paulo Railway, a Estrada de Ferro do Norte e a Sorocabana, criou um território urbano diretamente
influenciado pela presença de uma infra-estrutura com grande capacidade de conduzir o processo de

Avenida Tiradentes em direção ao Centro 19


Nelson Kon, 1999
urbanização. São Paulo tornou-se, a partir do final do século XIX, um poderoso entreposto ferroviário
de porte regional. A força desse processo torna-se evidente se lembramos que entre 1870 e 1890 a
cidade duplicou sua população, passando de cerca de 32 mil a 65 mil habitantes.
Do ponto de vista da organização urbana, as ferrovias conjugadas às margens dos grandes rios,
principalmente o Tietê e o Tamanduateí, formaram um extenso território ao norte da colina central
– a orla ferroviária –, onde predominou uma ocupação de tipo industrial. O impacto da ferrovia nos
trechos urbanos já consolidados ou em processo de consolidação foi radical. Embora naquele
momento muitos bairros residenciais cortados pelo sistema ainda estivessem em processo de
formação, a ferrovia tornou-se um elemento decisivo no desenvolvimento das áreas lindeiras. As
chácaras que bordeavam a cidade passavam por um acelerado processo de urbanização, emergindo
concomitantemente como bairros arruados, enquanto se instalava o novo equipamento de transporte.
Redutos do primeiro sistema fabril paulistano, o Brás, o Pari, o Bom Retiro, Santa Efigênia, a Mooca,
cujo perfil popular já era então evidente, receberam, a partir da implantação da São Paulo Railway,
em 1867, ligando o porto de Santos a Jundiaí, e da Estrada de Ferro Sorocabana, em 1902, um grande
impulso urbanizador, com uma nova configuração física dando origem aos chamados “bairros
operários”. Nasceu desse mesmo processo uma nova morfologia urbana que conjugou a fábrica e a
Torre da Estação Júlio Prestes, 1999 casa, e uma nova tipologia habitacional: as vilas operárias.
O quadro do desenvolvimento da cidade a partir da instalação do sistema ferroviário é indiscutível.
São Paulo começa a substituir a partir da década de 70 do século XIX sua fisionomia colonial. São
muitos e claros os relatos das transformações em curso naquela década. Richard Morse (1970),
analisando os testemunhos e os dados do período, sintetiza os desdobramentos positivos introduzidos
pela nova infra-estrutura que selou o seu passado provinciano e colonial e abriu a cidade para um
embrionário ciclo metropolitano.
Embora o “progresso material” estivesse impactando toda a cidade, os bairros lindeiros ao novo
sistema ferroviário, situados ao sul e a oeste do Centro, apresentaram um processo mais acelerado de
transformação. Completou-se ou apenas estabeleceu-se nos “novos territórios”, nas últimas décadas

20 Avenida Tiradentes em direção à Marginal do Tietê


Nelson Kon (064)
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22
Fernando Perelmutter, 1997

do século XIX, um sistema viário que buscou conectar os novos bairros industriais ao Centro e à área
onde estava localizado, a partir de 1900, o mais importante equipamento público da cidade, a
Estação da Luz. A permanente remodelação do sistema viário e a construção de um conjunto de S.a., Arquivo DPH, s.d.

pontes aproximaram os novos bairros operários e aristocráticos, como é o caso dos Campos Elíseos,
na área central da cidade.
Na primeira planta cadastral de São Paulo, datada de 1881, esses empreendimentos urbanos já estão
registrados e marcam o caminho que ia assumindo o crescimento da cidade. Embora houvesse um
grande empenho em estabelecer conexões e relacionar setores, a forma excessivamente fragmentada
do processo de urbanização, resultado direto das características da propriedade fundiária, isto é, o
loteamento das chácaras, gerou uma malha urbana descontínua e pouco eficiente. Do ponto de vista
socioespacial, o processo de urbanização dos bairros que formaram a nossa primeira “periferia”
industrial é bastante distinto daquele que serviu posteriormente de padrão, quando os níveis de
segregação social aumentaram drasticamente. Eles ilustram bem o processo rápido e intenso de
urbanização no qual a principal característica do crescimento pode ser perfeitamente descrita como
fabril e proletária.
Esse processo histórico, que associou durante nosso primeiro surto industrial a fábrica, a ferrovia e
a moradia operária, produziu uma região onde os ingredientes que definem um setor como
metropolitano foram acentuando-se gradualmente. É importante não esquecer que, fugindo dos
tímidos e excessivamente comerciais arruamentos promovidos pelos loteadores, o poder público já Primeira estação da Estrada de Ferro
Sorocabana, na rua Mauá, 1915
havia instalado nessa área, desde as primeiras décadas do século XIX, um equipamento de grande
prestígio: o Jardim Público da Luz (1825), antes projetado como Jardim Botânico. Mais tarde, em
1865, com a Estação da Luz, inaugurada na mesma área, criou-se um setor urbano comprometido
com o destino metropolitano da cidade. Junto à Estação da Luz, equipamentos comerciais e hoteleiros
transcendiam já desde a sua criação às demandas estritamente locais.
Estruturado como um conjunto de bairros residenciais e industriais, pelo menos até os anos 50, o
território composto pelos bairros centrais situados ao norte do Centro atravessou todo o século XX sem

Gare da Estação da Luz, 1997 23


estabelecer uma integração satisfatória com o sistema viário da cidade, oriundo de um sistema
fundiário que gerou um parcelamento aleatório do solo. Os melhoramentos contingentes também
não conseguiram atenuar e reverter a desarticulação urbana causada pela presença inflexível dos
trilhos ferroviários. O longo rol de melhorias urbanas introduzidas nas primeiras décadas do século
XX, sobretudo a partir da gestão de João Teodoro (1872-1875), voltadas para a necessidade de
promover as travessias e as acessibilidades indispensáveis, atesta o grau de desagregação que a
instalação do leito ferroviário e dos pátios de manobra e manutenção ao longo das linhas produziu
na estrutura urbana.
Esse quadro de desorganização urbana, extremamente precoce, parecia ter encontrado sua
configuração definitiva quando um novo modelo urbanístico buscou introduzir variáveis para a sua
reestruturação. O “Plano de Avenidas” apresentado em 1930, de autoria do engenheiro Francisco
Prestes Maia, traduziu os problemas urbanos e os conceitos urbanísticos disponíveis para o
enfrentamento das questões daquele momento. Na sua forma original, o plano propunha uma clara
sistematização da malha viária criando uma nova estrutura para o Centro. Baseou-se sobretudo na
utilização de um modelo geométrico que conjugava uma avenida perimetral a um conjunto de
avenidas radiais, distribuidoras, que deveriam garantir a articulação do Centro com os bairros
centrais. Embora a proposta apresentada por Prestes Maia, seguindo estudo anterior de Ulhôa Cintra,
enfatizasse as questões viárias da área central, a organização física das funções urbanas relacionadas
à circulação e à acessibilidade ultrapassou bastante esses limites.
Pudemos assistir em São Paulo, ao longo das quatro décadas seguintes, a instalação de uma estrutura
de nível metropolitano baseada no modelo proposto e implementado a partir de 1930. Os bairros
centrais ganham, com o traçado do Perímetro de Irradiação e a definição das radiais, uma
delimitação clara. O prolongamento do eixo formado pelo Anhangabaú rumo ao norte (avenida
Tiradentes) é um exemplo de organização viária baseada na superposição de fluxos, até então pouco
utilizada em São Paulo. O plano explorou a conjugação de dois modelos distintos de intervenção
visando a melhoria de condições de acessibilidade. Por um lado, o Perímetro de Irradiação

24 Plataforma da Estação da Luz, com a Estação Júlio Prestes ao fundo, 1999


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representava nitidamente um reforço da centralidade, da estruturação radioconcêntrica; por outro,
o grande eixo transversal norte–sul criava uma maior fluidez viária, com a superposição dos fluxos
da ferrovia e da avenida funcionando “em cruz”.
Ficou portanto definido o eixo norte–sul, o “Sistema Y”, incidindo diretamente ou apenas
repercutindo nos bairros centrais situados ao norte do Centro – sobretudo em Santa Efigênia, Bom
Retiro e Brás – como um novo e poderoso elemento demarcador e intersticial. Configuraram-se, a
partir dos planos traçados nos anos 30, os elementos estruturais do trecho urbano que denominamos
Pólo Luz: a linha férrea, a avenida Tiradentes e a avenida Duque de Caxias, trecho da grande
perimetral.
Esse conjunto de intervenções, gradualmente implantado, possibilitou na década de 50 uma radical
expansão do modelo rodoviarista em São Paulo. É nesse contexto de prioridade absoluta às demandas
da circulação viária e decadência do transporte ferroviário, substituído pelo rodoviário, que os bairros
centrais, entre eles a região que estamos aqui definindo como Pólo Luz, começaram a partir dos anos
60, sem ter resolvido suas crônicas questões de acessibilidade, a sofrer um acelerado processo de
degradação urbana, agravado com a instalação da Estação Rodoviária na praça Júlio Prestes na
década de 70. A frágil malha viária do bairro de Santa Efigênia, implantada um século antes, não
suportou o impacto de um equipamento de transporte rodoviário da proporção da nova estação. O
elevado número de linhas terminais que acessavam a rodoviária acabou por degradar de forma
irreversível as ruas adjacentes. A transferência das atividades da Estação Rodoviária para o Terminal
Tietê, em 1982, não logrou uma reversão do quadro de decadência instalado na região. A
inauguração da primeira linha do metrô, em 1974, com as estações Luz e Tiradentes localizadas na
região, também não chegou a alterar o processo geral de declínio. O índice de imóveis “cortiçados”
aumentou e a nociva atividade do tráfico de drogas se instalou em algumas ruas do bairro.
Na verdade, o processo de “isolamento” e decadência urbana já havia atingido níveis elevados, dada
a absoluta prioridade oferecida à macroacessibilidade metropolitana, principalmente através da
avenida Tiradentes, em detrimento da microacessibilidade local. O eixo norte–sul atingiu no início
Avenida Tiradentes e viaduto sobre ferrovia
Corredor norte-sul, 1999 27
dos anos 90 as características de via expressa. A passagem de nível Tom Jobim, implantada para
garantir a fluidez de tráfego na altura da avenida Senador Queiroz, atesta os conflitos gerados pela
relação da via expressa com o elevado número de pedestres. A passarela de pedestres lançada sobre a
Tiradentes, no trecho junto à Estação da Luz, busca minimizar a incomunicabilidade entre os dois
lados da avenida Tiradentes.
Num momento sombrio, quando os esforços de recuperação de setores urbanos não conseguem sair
dos planos, novas perspectivas de futuro abriram-se para um espaço urbano carregado de
potencialidades: o Pólo Luz. Pelas características do próprio conceito de pólo – trecho privilegiado da
cidade onde se concentram transformações qualificadoras e a partir do qual emanam novas ações
positivas e cumulativas de restituição de qualidades urbanas –, a sua delimitação física será sempre
formal. O processo dinâmico inerente ao Pólo Luz sugere uma permanente anexação de novos
espaços públicos, equipamentos, sistema viário adequado às novas funções, aumento da mobilidade
e do acesso pelo transporte público, serviços complementares, programas de melhoria. As
transformações que cada um desses elementos introduzirá no processo implicarão nova e permanente
redefinição físico-espacial do pólo.
Hoje, o Pólo Luz define-se através dos investimentos já feitos pelo poder público federal e estadual na
reforma e expansão da Pinacoteca do Estado, na instalação da Sala São Paulo, na implantação do
sistema de trens metropolitanos ligando a zona leste ao Centro, e pelos planos de curto prazo de
execução da Linha 4 do metrô e de adequação funcional e restauro da Estação da Luz, em
concordância com suas novas funções. Do ponto vista urbano, podemos estabelecer um perímetro
baseado nos seguintes logradouros: as avenidas Tiradentes e Prestes Maia, no eixo norte–sul; a
avenida Duque de Caxias e a rua Mauá, na vertente sul; a alameda Nothmann, a oeste; e, ao norte,
a rua Três Rios, incluindo a praça Coronel Fernando Prestes.
É muito importante reafirmar a necessidade permanente de rever critérios para a ampliação desse
perímetro. Entretanto, países e cidades onde é intensa a experiência de renovação e requalificação de
trechos urbanos, realizadas através de projeto urbanístico, têm demonstrado que é mais eficiente

28 Ambulantes ao lado da Estação da Luz,1999


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estabelecer balizamentos precisos baseados em uma análise que aponta as potencialidades e
determina os limites da operação projetada. Assim, o Pólo Luz é apenas um dos inúmeros trechos
passíveis de definição no interior da vasta “orla ferroviária” que atravessa a área central da metrópole.
A conjugação de propostas e ações oriundas de diversas frentes, isto é, de diversos níveis do poder
público e de órgãos financiadores, começa a criar uma pressão positiva. O reconhecimento das
enormes potencialidades desse setor urbano passa a sugerir um projeto de transformação
multifacetado. A renovação da Pinacoteca do Estado, concluída em 1998, criou uma referência
fundamental para as artes plásticas em São Paulo. A sutil transferência da sua entrada principal para
a praça da Luz criou “um novo endereço” e uma conjugação muito positiva com dois equipamentos
fundamentais: o Jardim da Luz e a Estação da Luz. O novo perfil tornou-se irreversível com a abertura
da Sala São Paulo nos espaços desativados da Estação Júlio Prestes, criando a primeira sede da
Orquestra Sinfônica do Estado.
Prefigurando o mais importante pólo de integração do sistema ferroviário metropolitano com o
sistema metroviário, a Estação da Luz torna-se novamente foco de intervenção e adequação. Do ponto
de vista da metrópole, o mais importante empreendimento é o Plano Integrado de Transportes
Urbanos, desenvolvido por diversos órgãos do governo do Estado (Metrô, CPTM, EMTU e Emplasa),
que deverá implantar um sistema que tem por objetivo uma integração física, tarifária e operacional
de todo transporte sobre trilhos na metrópole paulistana. A articulação desse sistema com o transporte
rodoviário deverá elevar para novos patamares de desempenho o transporte público em São Paulo.
Cada uma das intervenções mencionadas é exemplar e estimável para a sociedade e para a cidade.
Entretanto, para que o Pólo Luz se realize plenamente, enfrentando as diferentes questões sociais,
urbanas, funcionais e econômicas hoje detectadas, é fundamental criar um projeto que as integre e
potencialize. A oportunidade que se abre no momento é mais decisiva e palpável para a metrópole em
seu novo e inexorável ciclo pós-industrial do que faz crer sua circunscrita inserção urbana. O Pólo
Luz deve tornar-se um paradigma de novo modelo de intervenção e de uma nova face da recuperação
urbana local, com forte repercussão na metrópole.

As torres das estações da Luz e Júlio Prestes, que balizam o eixo ferroviário na região, 1999 31
Estação Júlio Prestes

Estação Júlio Prestes, 1999


De estação de trem a sala sinfônica

Alcino Izzo Júnior

Contornando o centro histórico de São Paulo em direção aos


bairros da Luz e dos Campos Elíseos, uma perspectiva se impõe no cenário urbano. Na convergência
das pistas da avenida Duque de Caxias, bem no eixo de seu ponto de fuga, destaca-se a torre do relógio
da Estação Júlio Prestes, recortada contra o céu.
Parte indissociável da história paulista, essa bela estação assistiu a tudo se transformar várias vezes
ao seu redor. Uma vez concluída, viu a cidade pacata e endinheirada pelo café virar uma outra, “o
maior centro industrial da América Latina”, e em seguida conviver com os contrastes violentos de uma
megametrópole sempre mutante, que beira o descontrole.

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A antiga estação assume hoje um papel radical, agora como participante nas mudanças em seu O Grande Hall, adaptado com cobertura
para eventos e transformado na Sala
entorno, tendo parte de seu interior transformado em sala sinfônica. Ainda mantém um equipamento São Paulo, 1997 e 1999
ferroviário e é portal de acesso da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos) para os
municípios da região oeste da metrópole, mas seus novos signos apontam para uma outra direção,
unindo cultura, música e alta tecnologia em um espaço surpreendente em todos os sentidos. O
Grande Hall da Estação Júlio Prestes, como que há tempos aguardando essa metamorfose, dá forma
a uma experiência sem igual no mundo enquanto reciclagem arquitetônica e funcional de uma
estação de trens.
Numa região diferenciada da cidade pelo seu patrimônio urbanístico-arquitetônico, a iniciativa de
implantar a Sala São Paulo vem se somar aos projetos de reciclagem em edifícios históricos ora em
curso na área central da cidade. A renovação urbana da área da Luz envolve hoje várias iniciativas,
como a readequação do transporte metropolitano sobre trilhos, a transformação da Estação da Luz
em centro articulador desse sistema e a recuperação de logradouros públicos como o Jardim da Luz,

35
Nelson Kon, 1996

levando à consolidação de um pólo cultural expressivo, conectado aos grandes centros do circuito
internacional de música, museus e artes plásticas.
Como sede da Orquestra Sinfônica de São Paulo, a Estação Júlio Prestes recupera sua importância
para a cidade, assim como confirma o caráter irreversível das mudanças em curso na região. Com a
Sala São Paulo, em meio a graves questões urbanas e sociais, a área da Luz se revaloriza sem alterar
sua identidade, reforçando a vocação cultural que lhe cabe nessa metrópole de muitas faces, ponto
nodal da América Latina na rede das supercidades mundiais.

Memória atribulada
Em 15 de outubro de 1938, doze anos após o início de suas obras, foi finalmente inaugurada a
Estação Júlio Prestes, um monumental exemplar da École de Beaux-Arts, temporão estilístico na
cidade que então crescia vertiginosamente moderna. Com o nome de Estação Inicial da Estrada de
Ferro Sorocabana, balizava, tal como hoje, em conjunto com a torre da Estação da Luz, o eixo
ferroviário que corta a cidade ao norte de seu centro histórico.
O projeto para uma nova estação, realizado em 1925, fazia parte de um programa de recuperação
iniciado alguns anos antes pela Sorocabana, pelo qual contava inverter as dificuldades que a
acompanhavam desde sua fundação, em 1875. Com suas linhas avançando para o sudoeste paulista
por conta da produção agrícola da região, principalmente algodoeira, a Estrada de Ferro Sorocabana
não se desenvolveu como as outras ferrovias do Estado, trafegando com seus vagões abarrotados de
café. Projetada inicialmente como ligação entre São Paulo e São João de Ipanema, local de grande
importância siderúrgica na época, passava por Sorocaba e São Roque, até chegar à capital, onde
construiu-se uma estação modesta junto à Estação da Luz, da São Paulo Railway Company. Com isso,
permitia a baldeação com os trens que desciam para Santos. Com vários problemas, a Sorocabana
foi adquirida pela União em 1902, comprada pelo governo de São Paulo em 1907 e arrendada a um
consórcio americano em 1909, voltando ao controle do Estado em 1919.

Estação e Praça Júlio Prestes antes da reciclagem 37


Reprodução Iatã Cannabrava, 1999
Nos primeiros vinte anos do século, o surto de crescimento urbano levou a empresa a elaborar um
ambicioso Plano de Remodelação para ajustar-se aos novos tempos. Como estratégia, a Sorocabana
deveria promover, entre outras ações, a modernização geral de seus equipamentos, a extensão de sua
linha até o extremo oeste do Estado e a ligação direta entre Mairinque e Santos,1 tentando romper o
monopólio da São Paulo Railway Company para o acesso ao porto. O plano previa, também, uma
imponente estação que atendesse ao aumento da demanda de passageiros e, ao mesmo tempo,
moldasse uma imagem forte para a Sorocabana, marcando sua presença na capital paulista. A nova
estação substituiria a então existente na rua Mauá, um projeto de Ramos de Azevedo, de 1914,
construída como almoxarifado e depósito da empresa e que, por sua vez, substituiu a estação original,
de 1902, que existiu até 1964, quando foi praticamente demolida para dar lugar à duplicação do
viaduto Couto de Magalhães.
Por essa época, a segunda estação da Estrada de Ferro Sorocabana foi ocupada pelo DOPS
(Departamento de Ordem Política e Social), de ingrata memória durante a ditadura militar, e hoje
passa por obras de adaptação como parte integrante do Complexo Júlio Prestes. Como lembrete da
história, o prédio deverá abrigar o Museu do Cárcere, preservando algumas das salas utilizadas
durante aquele período de ocupação.
O arquiteto contratado pela Estrada de Ferro Sorocabana para a construção de sua estação na
capital era uma grife na época, Christiano Stockler das Neves. Ele projetou o primeiro arranha-céu
de São Paulo, o edifício Sampaio Moreira,2 de 1924, além de ser responsável pelo projeto da Estação
D. Pedro II, no Rio de Janeiro, e da Estação do Norte, em São Paulo, ambas da Estrada de Ferro
Central do Brasil.
Christiano Stockler das Neves diplomou-se em 1911 pela Escola de Arquitetura da Universidade da
Pensilvânia, na Filadélfia, Estados Unidos. Conservadora e historicista, a escola era repleta de
professores franceses que, aclimatados ao pragmatismo americano, buscavam a fusão das
composições clássicas com as modernas estruturas de aço e concreto, base da indústria da construção
local. De volta ao Brasil, em 1912 Stockler passou a trabalhar com seu pai, o engenheiro Samuel das
Planta da cidade em 1930, com as quadras em frente à Estação Júlio Prestes ainda
38 edificadas e sem a praça; a estação estava em construção
Reprodução Iatã Cannabrava, 1999
A Estação Sorocabana
projetada por Christiano
Stockler das Neves e a que foi
construída, sem as cúpulas que
faziam parte do projeto original
43
44
S.a., Arquivo DPH, s.d.

Neves – titular de um dos maiores escritórios de projetos e construções de São Paulo e responsável,
entre outros, por um dos cartões-postais da cidade na época, o conjunto Palacete Conde Prates,
debruçado sobre o Parque do Anhangabaú.
Desenhado em 1925, o projeto da Estação Sorocabana refletia a visão conservadora de seu autor (e
da empresa) para a época, que já vivia uma certa efervescência cultural – a Semana de Arte Moderna
e o escândalo do início do modernismo em São Paulo completavam três anos. A opção por um estilo
historicista com jeito de fim de século contrastava com as demais correntes arquitetônicas em voga,
como a neocolonial, também tradicionalista, que buscava elementos compositivos nas raízes de
identidade brasileira. Do exterior, destacavam-se o art-nouveau, com seus elementos floreados, e, de
forma mais incisiva, a recusa mesma de qualquer ornamentação, expressa pelo movimento de
arquitetura moderna, que já marcava presença na imprensa nacional nesse mesmo ano.3
De qualquer forma, o projeto da Estação Inicial da Estrada de Ferro Sorocabana recebeu, em 1927,
o Prêmio de Honra no III Congresso Pan-Americano de Arquitetura, em Buenos Aires. Nesse mesmo
ano, suas obras sofrem a primeira de uma série de paralisações. Uma nova diretoria assume a
empresa e questiona o prosseguimento das obras reiniciadas em 1928, impondo modificações ao
projeto inicial que privilegiavam uma nova execução das plataformas de embarque em detrimento
do edifício principal. Desconsiderando a hierarquia com que o arquiteto tratava o percurso dos
passageiros de primeira e de segunda classe, simplificando o acesso para estes e criando uma
circulação cenográfica para aqueles – pelos lances de escadas que levavam da rua até o Grande Hall
e então ao concourse –, a empresa eliminou as diferenças de nível entre os pisos. A alteração criou
um problema para o embasamento das colunas internas do edifício, que perderam sua correta
proporção ao compensar essa diferença não prevista de altura. Ainda em 1928, em razão de novas
paralisações, Christiano Stockler das Neves abandona definitivamente a supervisão das obras,
profundamente desgostoso com a empresa.
Na esteira da crise de 29, a Sorocabana ainda iria alterar de forma mais significativa o projeto
original, com a retirada das imensas mansardas que cobriam o Grande Hall (o acesso de passageiros

Estação Sorocabana em fase de construção, com o Jardim da Luz ao fundo 47


Luizette Nero Davini, 1998

da primeira classe), das cúpulas laterais e da marquise na fachada. Essa atitude levou o arquiteto a
processar a empresa e reivindicar a manutenção dos elementos do projeto original. Ampliando ainda
a questão sobre as disputas ideológicas da época, o arquiteto se manteve intransigente na defesa dos
valores de sua arquitetura contra o ideário do movimento moderno que então se implantava. Como
um sinal da virada dos tempos, a Justiça comum decidiu pela improcedência de seus argumentos.4
E o Grande Hall se transformou num jardim descoberto, um cenário majestoso para os usuários da
estação e, décadas depois, para os vários eventos que ali se realizariam com o fim de arrecadar
recursos para sua manutenção.
Em 1930 foram entregues ao público a ala das plataformas e o concourse, que no projeto original
correspondia ao acesso dos passageiros da segunda classe. Para cobrir as plataformas recém-
inauguradas, a estação usou uma estrutura metálica adquirida da desmobilização do hangar do
dirigível Zepelim, no Rio de Janeiro,5 num total descompasso com o projeto e com as recomendações
do arquiteto.
Após nova paralisação, decorrente dos reflexos na economia paulista trazidos pela revolução de 32,
as obras foram retomadas apenas em 1936, com as simplificações do projeto inicial a cargo do
arquiteto Bruno Simões Magro. Este técnico da Sorocabana entendia essas mudanças do projeto
original como provisórias, que posteriormente seriam complementadas, mas isso nunca aconteceu.
Sem mais interrupções, foi inaugurada em 1938, já com o nome de Estação Júlio Prestes. A Estrada
de Ferro Sorocabana, juntamente com as outras cinco companhias ferroviárias do Estado, deixa de
existir em 1970, dando lugar à empresa estatal Fepasa – Ferrovias Paulista S.A. Nos anos 80, o
trecho entre Itapevi, na Região Metropolitana de São Paulo, e a Estação Júlio Prestes passa a ser
operado pela CPTM.
Com a Estação Júlio Prestes, a cidade incorporou a seu patrimônio arquitetônico uma obra
imponente. Apesar da turbulência constante durante sua execução, foi preservada a maior parte das
características de monumentalidade e qualidade construtiva previstas nos desenhos de seu criador,
Christiano Stockler das Neves.

Plataforma de embarque da Estação Júlio Prestes, 1998 49


Patrimônio arquitetônico

Em arquitetura, a qualidade de um edifício se expressa em níveis diferentes de percepção, resumidos


aqui em dois enfoques principais de leitura. Primeiro, características objetivas do edifício, como seu
dimensionamento e soluções técnicas adotadas, levam à compreensão dos espaços, ou seja, a saber
usá-los e se perceber neles, acomodando-se às suas escalas. Num segundo enfoque, características
mais subjetivas, de natureza estética, levam à contemplação e fruição dos espaços. Para quem circula
pela Estação Júlio Prestes, esses dois níveis se apresentam simultaneamente, envolvendo os usuários
numa espacialidade generosa, composta por múltiplos efeitos cênicos obtidos com elementos
arquitetônicos (vãos, colunatas, arcos e abóbadas), uso de ornamentação (frisos, brasões, florões etc.)
e iluminação natural sobre os ambientes. O resultado dessa intenção projetual torna-se mais
valorizado ainda por tratar-se de uma obra pública, destinada à circulação diária de milhares de
pessoas em suas dependências.
A Estação Júlio Prestes foi prevista como marco urbano desde sua concepção, já considerando a
substituição do casario que a envolvia por uma grande praça arborizada e, posteriormente, pelo
programa de melhorias viárias na área central, do prefeito Prestes Maia, que valorizou sua perspectiva
com a ampliação da avenida Duque de Caxias. À época da inauguração, sua torre era referência que
se destacava nas tomadas panorâmicas dos fotógrafos da cidade.
O projeto da Estação Júlio Prestes se enquadra nos parâmetros ecléticos da École de Beaux-Arts em
sua vertente norte-americana, tendo como modelos a Pennsylvania Station e a Grand Central Station
of New York, construídas por volta de 1910. Um princípio compositivo essencial dessa escola é a
simetria, que orienta a organização dos ambientes e o desenho da fachada. Esta última é formada
por um corpo principal horizontal, de três pavimentos, com dois blocos separados por uma torre de
75 metros de altura, com um relógio de 4 metros de diâmetro em cada face, sob a qual há um acesso
de veículos ao interior da estação. O bloco maior abrigava a gare e a circulação de passageiros e o
menor, em curva, era destinado aos serviços administrativos da empresa.

50
A fachada é ritmada pela disposição das colunas de capitel jônico decorado ladeando as janelas, sendo
o pavimento térreo revestido de pedras rústicas frisadas, solução bastante comum em edifícios
ecléticos da época. Internamente, o edifício se articula com a gare e com suas plataformas de
embarque pelo alinhamento das colunatas. Pelas suas características, a gare configura um conjunto
funcional da estação, não se integrando, estilisticamente, ao restante do edifício.
Concebida para ser a “porta de entrada da cidade”, a estação adotou uma escala monumental,
prevista para a circulação diária de 10 mil passageiros (hoje, o embarque diário é de cerca de 50 mil
passageiros), e impressionava pelo Grande Hall, “o maior salão do Brasil”, como se dizia então. Eram
48 metros de comprimento, 20 metros de largura e 24 metros de altura – dimensões que, sessenta
anos depois, voltariam a impressionar o grupo especial de pessoas que estudava um lugar para
abrigar a sala sinfônica. O projeto original de Christiano Stockler das Neves previa o coroamento desse
espaço por mansardas e, em seu interior, por uma imensa abóbada de berço, com fechamentos em
vitrais artísticos a cargo do mesmo artista responsável pelos vitrais com temas ferroviários do
concourse, Conrado Sorgemith Filho (conhecido pelo trabalho realizado no Teatro Municipal de São
Paulo).
Utilizando elementos construtivos de qualidade, como mármores italianos e serralheria artística
produzida no Liceu de Artes e Ofícios, o edifício teve uma execução primorosa, em consonância com
a competente concepção do arquiteto. Os volumes internos, a alternância das escalas, o ritmo da
colunata da galeria que circunda o Grande Hall e o uso conciso da ornamentação são elementos que
se valorizam na relação espacial que estabelecem nessa arquitetura interior, sem se permitirem
justaposições ou até uma certa sensação de exagero, comuns nos edifícios ecléticos.
Os ambientes que atendem ao programa arquitetônico da estação foram hierarquizados segundo as
regras elitistas de Christiano Stockler das Neves. O projeto faz uma distinção clara entre as áreas
destinadas aos funcionários, praticamente sem ornamentação, as destinadas aos passageiros da
segunda classe, com acesso direto às plataformas de embarque pelo concourse, e os espaços de
circulação para os passageiros da primeira classe, com percurso planejado para a percepção das

Detalhes arquitetônicos, 1997 51


diferenças de escala entre o vestíbulo, a galeria e a passagem pelo Grande Hall. Em comum, guardam
a escala monumental e a solenidade dos espaços internos, obtidas com o uso das abóbadas e dos arcos
revestidos com vitrais.
O fato de o edifício ser construído em concreto armado e com paredes espessas – características
totalmente diversas das até então utilizadas para a arquitetura das estações ferroviárias, com
estruturas metálicas e revestimento de tijolos à vista – viabilizou a transformação do Grande Hall na
Sala São Paulo, na medida em que conferiu ao edifício a “massa” necessária à sua adaptação em um
espaço sinfônico. Essa estrutura sólida, combinada com ornamentos, compõe o repertório do estilo
escolhido para a estação, o Luís XVI – ao qual foi acrescentado o termo “modernizado”, de certa
forma redundante, já que é inevitável a utilização de elementos e materiais contemporâneos.
Na Estação Júlio Prestes, esse estilo é reconhecido pelo embasamento almofadado em granito rosa dos
pilares internos, pelo uso das ordens jônicas e coríntias para as colunas e por todo seu repertório
decorativo – como medalhões elípticos com guirlandas, óvulos nas balaustradas, cornijas, frisos,
mísulas, cimalhas e consolos decorados, ornamentos esculpidos, como cabeças de leão e urnas
flamejantes, e o uso de falsas platibandas escamoteando a visão das estruturas. A despeito de constituir
obra típica de um pensamento que valoriza o efeito da ornamentação como estilo arquitetônico, a
Estação Júlio Prestes não apresenta nenhum tratamento decorativo em sua fachada posterior, voltada
para o pátio ferroviário, uma vez que não é percebida por seus usuários e nem vista como participante
da paisagem da cidade.
Em parte por sua qualidade construtiva, mas também pelo esforço da Fepasa, através de sua
Coordenadoria de Patrimônio Histórico e Ambiental, o edifício se manteve de uma maneira geral em
bom estado de conservação, resistindo com dignidade à decadência do transporte ferroviário no
Estado, à degradação da área urbana e à poluição ambiental ao seu redor.

52 Corredores do primeiro e segundo andar, ainda com a iluminação natural anterior à reforma, 1998
53
Luizette Nero Davini, 1998
Uma casa para a Sinfônica

O projeto da Sala São Paulo foi a conseqüência natural de um outro projeto: o de imprimir à
Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo padrão internacional, objetivo prioritário da Secretaria
de Estado da Cultura e de John Neschling, maestro carioca chamado para sua direção artística após
a morte do maestro Eleazar de Carvalho, titular até então. Neschling, um dos mais respeitados
maestros da atualidade e com larga experiência em concertos no exterior, foi escolhido pelos próprios
músicos, em votação realizada na orquestra.
Ao assumir em janeiro de 1997, o maestro apresentou um plano de reestruturação abrangente para
a Osesp, que incluía, como ponto essencial, sua instalação em uma sede própria que contivesse toda
a infra-estrutura necessária para o funcionamento de uma grande orquestra, como salas para
ensaios, reuniões, gravações, arquivo e biblioteca de partituras. Apoiada pelo governo estadual, a
Osesp transformou-se num conjunto profissional, dedicado integralmente aos trabalhos da orquestra,
apresentando-se regularmente para o público com um repertório inovador, do qual fazem parte
várias peças brasileiras. Sua formação atual é de 95 músicos rigorosamente selecionados, com vários
estrangeiros e brasileiros que retornaram ao país para participar desse novo momento da orquestra.
A previsão do maestro é atingir, assim que possível, sua formação completa, com 118 músicos.
Quanto ao lugar definitivo para a orquestra, decidiu-se procurar uma sala de espetáculos que pudesse
ser adaptada especificamente para música sinfônica. Para tanto, foi convocado, como coordenador
geral do projeto, o engenheiro Ismael Solé, responsável pela restauração dos mais importantes teatros
do país, como o Municipal de São Paulo, o São Pedro de Porto Alegre, e o José de Alencar, de Fortaleza.
Junto com o maestro John Neschling e o secretário de Cultura Marcos Mendonça, o grupo-tarefa parte
em busca desse espaço singular e inédito para a cidade. Em seguida foi chamado a São Paulo o
engenheiro e maestro Christopher Blair, da Artec, empresa norte-americana de renome internacional
em acústica para teatros e auditórios, contratada como consultora para os projetos a serem
desenvolvidos.

Um das portas de entrada principal


Relacionando os espaços com características capazes de atender aos requisitos de uma sala de
concertos, o grupo visitou o auditório Simón Bolívar do Memorial da América Latina, o Teatro Sérgio
Cardoso e o antigo Teatro São Pedro, então em reforma e posteriormente utilizado como sede
provisória da orquestra. Um a um, os espaços foram eliminados por apresentarem restrições
incontornáveis à sua utilização, restando avaliar o lugar de acesso às plataformas da Estação Júlio
Prestes, último local da lista elaborada pela equipe.
A conclusão dessa história quase exige a visualização da cena que se desdobra, com o grupo
adentrando a estação, atravessando o Grande Hall em direção ao espaço do concourse e, uma vez
nele, retornando ao salão descoberto. Ao percorrer com o olhar, vagarosamente, a arquitetura que os
circunda, todos ficam completamente embevecidos. Blair, conhecedor de várias salas de concerto
internacionais, apontou para a similaridade entre a volumetria, a geometria e as proporções do
Grande Hall e salas como a do Boston Symphony Hall, a do Concertgebouw, em Amsterdã, e a da
Musikvereinssaal, em Viena, reconhecidas como referência de qualidade acústica para música
sinfônica. Nasce ali a Sala São Paulo. Logotipo da OSESP

A essa proposta técnica foi somada a necessária decisão política, o que ocorre com o encaminhamento
da proposta pelo secretário de Estado da Cultura, Marcos Mendonça, desencadeando o processo de
viabilização das obras. Por seu papel no esforço de requalificação da área central paulistana, a
Associação Viva o Centro foi convocada pelo governador Mario Covas e passa a participar do
empreendimento, assumindo a responsabilidade pelos projetos de restauro e de implantação da sala
sinfônica, além de realizar estudos sobre a reurbanização da área da Luz, tendo em vista sua
dinamização como pólo cultural metropolitano.

55
Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo – Osesp

A Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo – Osesp – foi criada pelo maestro Souza Lima, Primeiros Violinos
1 spalla, 1 solista,
em 1953, e instituída por lei no ano seguinte. Sua primeira sede foi o Theatro São Pedro, de 1 concertino, 11 músicos
onde saiu nos anos 70 para instalar-se no Teatro Cultura Artística e depois em diversos outros Segundos Violinos
1 concertino, 12 músicos
espaços, nem sempre apropriados, até instalar-se definitivamente na Estação Júlio Prestes, Violas
remodelada especialmente para recebê-la. 2 solistas, 2 concertinos, 3 músicos
Violoncelos
Em 1973, quando o maestro Eleazar de Carvalho era seu diretor artístico, a Osesp promoveu 1 solista, 1 concertino, 5 músicos
sua primeira renovação, recompondo o corpo de músicos por meio de concursos nacionais e Contrabaixos
2 solistas, 1 concertino, 5 músicos
convites a músicos estrangeiros. A orquestra passa, então, a se apresentar regularmente em São Flautas
Paulo e a excursionar por diversas capitais do país, levando, entre outras peças importantes e 2 solistas, 2 músicos, 1 flauta e pícollo
Oboés
mesmo inéditas, o ciclo integral das obras de Mahler, Bruckner e Bartók. 2 solistas, 2 músicos, 1 corne inglês
Com a economia convulsionada pela inflação, ao final dos anos 80, a Osesp mergulha numa Clarinetes
1 solista, 1 co-solista, 1 músico,
profunda crise, que resulta na perda de sua sede e na defasagem dos salários dos músicos. Essa 1 requinta e 1 clarinete, 1 clarone
situação começou a se reverter com a nomeação de John Neschling como diretor artístico, em Fagotes
1 solista, 2 músicos
janeiro de 1997, quando o maestro deu início ao processo de valorização e ampliação do corpo Trompas
de músicos por meio de concursos internacionais, o que resultou na qualificação da Osesp 2 solistas, 6 músicos
Trompetes
como uma orquestra de elevado padrão técnico e profissional. Ao mesmo tempo, a Estação Júlio 2 solistas, 3 músicos
Prestes era assumida e cuidadosamente preparada para ser sua sede definitiva. Finalmente, Trombones
2 solistas, 2 músicos, 1 trombone baixo
a inauguração da Sala São Paulo imprime nova vida à Osesp, que retoma com enorme vigor Tuba
as suas apresentações semanais e os concertos em outras cidades paulistas, destacando em seu 1 solista
Tímpano
repertório as obras brasileiras de todas as épocas. 1 solista, 1 assistente
A estrutura atual da Osesp inclui um centro de documentação que reúne atividades de pesquisa Percussão
4 músicos
histórica, arquivo e biblioteca voltados ao público especializado. Está prevista, também, a Teclados
instalação de uma editora especializada em música brasileira desde o período colonial até a 1 solista
produção contemporânea.
Desde janeiro de 1997, o diretor artístico e regente titular da Osesp é o maestro John Neschling,
e seu diretor artístico adjunto e regente associado é o maestro Roberto Minczuk. Eles são
responsáveis por mais da metade dos concertos apresentados, que incluem, ainda, uma
extensa lista de maestros e solistas convidados de todo o mundo.
A Osesp é uma orquestra jovem, com média de 35 anos de idade entre seus músicos. Em
setembro de 1999, contava com 93 integrantes, dos quais 75% são brasileiros e os demais de
várias nacionalidades, entre americanos, europeus e asiáticos.
Sala São Paulo

Ensaio da Osesp na nova sala, 1999


Térreo da Estação Júlio Prestes

Salão dos Arcos / Hall 2 Salão dos Arcos / Hall 1

Sala São Paulo Sala dos Músicos

Restaurante
Entrada Chapelaria
Estar
Loja
Bar–Café Bilheteria

Projeto arquitetônico da instalação da sede da Osesp na Estação Júlio Prestes.


Dupré Arquitetura, 1997
Corte longitudinal da Estação Júlio Prestes

Piso Técnico

Salão dos Arcos / Hall 2


Salão dos Arcos / Hall 1

Forro Móvel

Elevador do Piano Elevador do Coro


Corte transversal da Estação Júlio Prestes

Forro Móvel 1º Pavimento

Piso Técnico 2º Pavimento

Térreo

Sobreloja
Corte transversal da Sala São Paulo

Piso Técnico

Forro Móvel

Balcão Superior
Camarote Superior

Balcão Mezanino

Camarote Mezanino

Platéia
Sala São Paulo

Piso Térreo

Palco

Platéia Central

Platéia Lateral

Mezanino

Balcão Mezanino

Coro

Camarote
Mezanino

Piso Superior

Balcão Superior

Camarote
Superior
páginas 58 a 77
Construção da Sala São Paulo, 1998 a 1999 71
Pontos de partida

Alcino Izzo Júnior

A execução da Sala São Paulo constituiu-se em um desafio


técnico e arquitetônico por suas múltiplas interfaces, que envolveram questões relevantes para sua
realização. Entre elas, destacam-se cinco situações fundamentais:
• a intervenção em um edifício histórico e patrimônio arquitetônico da cidade;
• o ineditismo de fazer uma sala de espetáculos em uma estação de trens;
• as características do programa de atividades previsto para a sede da Osesp;
• a continuidade da operação ferroviária na estação;
• as exigências técnicas para atender ao padrão de qualidade acústico proposto.
Por se tratar de um patrimônio arquitetônico tombado pelo Condephaat (Conselho de Defesa do
Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo), a preservação das
características originais da Estação Júlio Prestes colocou-se como fundamental para os trabalhos. No
que diz respeito à sala sinfônica em si, a fusão entre a austeridade do antigo salão com os elementos
contemporâneos deveria criar um “clima” especial para as apresentações, ampliando a percepção
estética dos ouvintes e preservando a autenticidade do prédio.
Para a transformação do Grande Hall em sala sinfônica, um condicionante essencial era a
manutenção de sua espacialidade, ou seja, a percepção do efeito de sua volumetria associada à

75
composição estilística, cuja qualidade expressiva era justamente o que tanto encantou a equipe de
especialistas que a escolheu. Ou seja, quaisquer que fossem as interferências previstas, seriam
ajustadas ao alinhamento e ritmo das colunatas e ao rigor da ordenação existente entre seus muitos
elementos decorativos.
A opção por um forro móvel era a mais adequada à Sala São Paulo por permitir uma acústica
ajustável, de acordo com os projetos contemporâneos, e foi possível porque a sala não tinha teto. Sua
adoção atendeu a uma solicitação tanto espacial como acústica para a sala, e implicou duas questões:
no espaço interno, a garantia de visibilidade dos ornamentos, como cimalhas, platibandas e vitrais,
e, na parte externa do edifício, o acréscimo de um volume na cobertura que deveria se relacionar
com a torre do relógio. Neste caso, as proporções da fachada seriam alteradas e de certa forma
dariam oportunidade à complementação, quase setenta anos depois, do projeto original de Christiano
das Neves.
Além da sala de concertos, a adaptação da estação para as atividades da Osesp exigiu a reforma de
um grande número de salas, como as destinadas a ensaios, arquivos, administração e de apoio aos
freqüentadores, como chapelaria, sanitários, cafeteria, restaurantes etc. Além disso, o edifício teve suas
instalações revistas e atualizadas, com a inclusão de elevadores e a informatização de equipamentos
para atender às mudanças.
A reciclagem da Estação Júlio Prestes é um caso singular em projetos de preservação arquitetônica,
colocando-se como um dos raros exemplos em que as funções originais são mantidas ao lado das
novas atividades. A incorporação da gare pelo Complexo Cultural Júlio Prestes – em virtude de um
remanejamento na operação dos trens metropolitanos, em estudo pela CPTM – é algo possível e
mesmo desejável. Contudo, é preciso levar em conta que essa proximidade com a ferrovia foi
particularmente determinante para o projeto da sala sinfônica, uma vez que, além do ruído, a
vibração causada pela passagem das composições implica considerável interferência em seu
resultado.

Cobertura da Sala São Paulo, 1999 79


Ao lado dessas dificuldades, e mesmo como solução para elas, a opção pelo uso de tecnologia de ponta
para a sala sinfônica constitui um encaminhamento lógico para empreendimentos dessa natureza,
voltados para as exigências sofisticadas de um circuito internacional do qual a Orquestra Sinfônica
de São Paulo passa a fazer parte. Para a cidade, significa também refinar e ampliar o público
potencial voltado para a música erudita, carente de uma sala com caraterísticas técnicas ajustadas
exclusivamente para o repertório sinfônico.

Projeto
Como espaço voltado para apresentações sinfônicas, a audição perfeita dos sons – volume,
ressonâncias e reflexões – foi a preocupação predominante entre todos os fatores envolvidos na
execução da Sala São Paulo. Daí sua diferença em relação às outras salas de espetáculos que
apresentam música, dança ou teatro, e que necessitam da moldura de um palco – o chamado palco
italiano – para serem vistos. Uma volumetria bem definida, tal como a encontrada no Grande Hall,
impôs-se como premissa conceitual de ocupação, sendo o palco um elemento cênico em seu interior,
integrado ao espaço da platéia. Para a adequação do espaço, tudo o mais, internamente, foi
reformulado, com a colocação da cobertura e do forro móvel, com o rebaixamento do piso,
fechamentos laterais, implantação de balcões e realização de intervenções como instalação de ar
condicionado e redes de cabos.
Para o desenvolvimento do projeto arquitetônico, foi escolhido o escritório Dupré Arquitetura,
empresa com experiência em executar importantes obras de restauro em teatros do Estado de São
Paulo. O primeiro passo do escritório foi o levantamento físico, fotográfico e cadastral da estação, com
a finalidade de apontar o estado geral do edifício e as áreas comprometidas com infiltrações ou outros
problemas construtivos, e realizar as prospecções necessárias para indicar os elementos do projeto
original danificados ao longo dos anos – como as portas, em que camadas sucessivas de pintura
escondiam o cedro com que haviam sido construídas.

80 Piso técnico: maquinário movimentador do forro, 1999


A partir dos levantamentos, o projeto desenvolveu duas linhas de trabalho complementares: uma,
voltada ao projeto arquitetônico em si, à adequação dos espaços existentes ao programa técnico e
operacional; e outra, voltada ao restauro das características originais do edifício, que deveriam
diferenciar-se claramente das alterações que viriam a ser executadas, propondo um diálogo entre a
linguagem original e a resultante da reforma. Em razão desses cuidados, alguns detalhes só se
revelam ao olhar de um observador mais atento – como o tratamento dado às portas que passaram
por restauração, que conservam as almofadas originais de seu desenho, diferentemente das novas,
bem como suas maçanetas, que foram fabricadas especialmente para esse projeto com base nas
existentes.
Os balcões constituem a interferência mais forte no projeto original e atendem a uma imposição tanto
visual como acústica para a reflexão do som nas áreas centrais da platéia. Seu desenho final, em dois
níveis e encaixado entre as colunas, foi adotado pelos técnicos brasileiros após uma queda-de-braço
com a consultora norte-americana Artec, que apresentou uma concepção de balcão como uma
linha contínua passando em frente às colunas, o que interferia violentamente na arquitetura da sala.
Na disputa que se seguiu, foi fundamental o apoio do Condephaat, órgão com o qual foi mantida
estreita colaboração tanto no desenvolvimento do projeto arquitetônico como na execução das obras,
prevalecendo a intervenção mais respeitosa para a sala. No final, os próprios consultores americanos
aprovaram a solução adotada.
Dotado de elevadores para o piano e para o coro, previsto para comportar até duzentas vozes, o palco
se adapta a arranjos específicos de acordo com o tipo de apresentação, e é complementado por
sistema especial de iluminação. Conforme o programa a ser apresentado, as poltronas destinadas ao
coro podem ser ocupadas pelo público como extensão da platéia. A sala sinfônica ocupa
aproximadamente mil metros quadrados e oferece 1.509 lugares entre a platéia, 22 camarotes e dois
balcões.
Na parte externa da sala, o acesso ao balcão do mezanino resultou em outra interferência forte, com
passarelas metálicas que correm entre os vãos dos arcos da circulação, promovendo um diálogo entre
páginas 82, 83 e 85
84 Placas do forro móvel, 1999
eles e suas vigas em arco invertido. Não há acesso direto à Sala São Paulo, adotando-se antecâmaras
tratadas acusticamente como uma passagem de transição por entre as inúmeras salas que compõem
a sede da Osesp.
O forro móvel, com controle totalmente informatizado, é composto por modulações de painéis que
se articulam em função das apresentações programadas. Acima dele, um piso técnico, em estrutura
de metal e concreto com cerca de 20 cm de espessura, responde pelos seus mecanismos de
deslocamentos e, também, pelas instalações de apoio logístico ao espetáculo, como iluminação,
operação cenográfica e alimentação de ar condicionado. Assim como ele, todos os elementos
participantes da arquitetura da sala – pisos, balcões, forros, painéis laterais etc. – foram projetados
segundo a otimização das características acústicas. Nesse contexto, foi relevante a definição das
poltronas da platéia, com desenho desenvolvido especialmente para a Sala São Paulo, associando
conforto com requisitos acústicos e integrando-se com harmonia na ambientação.
A definição das cores, um tom escuro de azul associado com o bege monocromático dominante, foi
responsável por novos jogos de percepção espacial, “escondendo” o terceiro pavimento da platéia com
a pintura das paredes e destacando os elementos novos dos restaurados. Para a Estação Júlio Prestes
foi desenvolvido um projeto integrado de iluminação ambiental que valoriza os principais elementos
arquitetônicos, envolvendo sua integração com a luz natural e a utilização de desenhos específicos
para as luminárias.
Ao fundo do coro está prevista a colocação de um grande órgão para completar a sala. Para tanto,
foram consultados os principais fabricantes desse instrumento, de modo a compatibilizar suas
exigências com o projeto desenvolvido e tomar as precauções necessárias para a futura instalação,
evitando traumas ou interferências desagradáveis à arquitetura.
O projeto arquitetônico de adaptação da sede da Osesp abrangeu todo o edifício da estação para
abrigar o extenso programa de atividades envolvidas. Com esse fim, foram instalados camarins
individuais e coletivos, salas de ensaio de naipes, do coro e da orquestra, salas administrativas para
diretoria, reuniões, arquivos etc., ambientes para eventos, dois restaurantes completos – um para o

Camarotes da Sala São Paulo, 1999 87


público em geral e outro, sofisticado, para uso mais restrito –, bares, estúdio de gravação e de rádio,
depósitos e oficinas de manutenção, entre outras dependências.

Reciclagem da estação
O edifício escolhido para sediar a Osesp é uma construção sólida, com estrutura de concreto armado
e revestimentos de boa qualidade, tendo sido objeto de várias obras de manutenção nos últimos anos,
a cargo da Coordenadoria de Patrimônio Histórico da Fepasa. Ainda assim, sua renovação e os novos
elementos projetados exigiram cuidados especiais de projeto e engenharia, em razão do pioneirismo
de um trabalho dessa natureza e das condições para a realização das obras – que utilizou máquinas
de grande porte operando muito próximo às paredes do edifício tombado. A vedação acústica da sala
sinfônica e o reforço à infra-estrutura das fundações existentes constituíram a parte mais árdua da
obra, sobretudo porque o edifício original teria seu peso muito aumentado pelo isolamento acústico,
pela instalação do forro móvel e da cobertura metálica e pela implantação de todos os equipamentos
e instalações do piso técnico.
Pela sua natureza, a sala sinfônica foi concebida para ser isenta de ruídos e vibrações externas – estas
últimas bem mais difíceis de serem isoladas, pela localização na área central da cidade e a menos de
100 metros dos trilhos da ferrovia. A solução encontrada foi a construção de uma laje flutuante sob
o piso da sala, deixando-a isolada do restante do edifício. Essa laje é composta de uma superfície de
concreto com 15 cm de espessura apoiada em mais de 2 mil isoladores de vibração, que consistem em
discos com 9 cm de diâmetro e 5 cm de altura feitos de neoprene de alto padrão. Sobre a laje, foi
aplicado um revestimento de madeira compensada com acabamento em tábuas corridas de pau-
marfim, complementando-a. Dessa forma, também se tornaram “flutuantes” o palco e os balcões.
O desenvolvimento desse projeto esteve a cargo do consultor especializado em acústica e vibrações José
Augusto Nepomuceno, com larga experiência em teatros brasileiros.

88 Segmento do forro móvel, 1999


Segundo o cálculo efetuado para a intervenção, constatou-se que seria necessário um adicional de
carga da ordem de mil toneladas na estrutura do edifício – aproximadamente sessenta toneladas por
pilar. Tecnicamente, os pilares suportariam essa sobrecarga, mas não as fundações, que precisaram
ser reforçadas com estacas especiais. Além disso, o tipo de solo encontrado e a existência de um lençol
freático muito alto obrigaram a execução de uma parede diafragma separando o edifício da área ao
fundo, destinada à construção das garagens. Essa precaução garante a contenção da água do terreno,
evitando recalques diferenciais.
As novas funções do edifício levaram a uma revisão geral de alvenarias, pisos e revestimentos, que,
em caráter preliminar, foram lavados com água quente e detergente alcalino sob pressão. Sempre que
necessário, foram implementados elementos de proteção acústica em substituição ou em
complementação aos existentes, mantendo rigorosamente seu desenho e suas características
arquitetônicas. Como não foram encontradas peças de reposição para as pastilhas porcelanizadas do
piso, nem uma empresa que refizesse o trabalho nas condições originais, optou-se pela manutenção
do seu estado atual, protegido por uma camada de material acrílico-metalizado transparente, de alta
resistência à abrasão prevista na circulação de áreas.
A reciclagem da Estação Júlio Prestes e o padrão exigido por suas novas atividades envolveram a
modernização de equipamentos básicos, uma nova circulação, com a execução de escadas para
saídas de emergência e elevadores comuns e para deficientes físicos, a construção de novos banheiros,
a informatização de equipamentos e a instalação de ar condicionado e telefonia.
O resultado dessa transformação é ainda mais evidente para a platéia da sala sinfônica. O forro
projetado com requintes de tecnologia assegura a sonoridade ideal para os diferentes repertórios:
adapta a volumetria da sala às características de determinada obra e ao modo como é executada, seja
por um quarteto de cordas, seja por uma orquestra completa. Seus números impressionam tanto
quanto sua presença. Ele é formado por quinze grandes módulos, pesando cada um cerca de 7,5
toneladas. Esses módulos são subdivididos em três partes, com movimentos articulados por uma teia
de cabos de aço ligados ao piso técnico, acima da cimalha do terceiro pavimento. Acionados por
páginas 91 a 95 e 99
90 Vistas da Sala São Paulo, 1999
computadores, eles operam silenciosamente com dois motores – para que uma virtual pane não
comprometa seu funcionamento – e deslocam-se por toda a altura da sala, podendo chegar até o solo
para as operações de manutenção e limpeza.

Música e arquitetura
O que mais encantou o engenheiro-maestro da Artec e seus colegas brasileiros na escolha do jardim
interno de uma estação quase desativada foi a mistura das características arquitetônicas com uma regra
de proporção acústica 1:1:2 – de comprovada eficiência nas melhores salas de concerto, desde o século
XIX. O salão apresentava a largura (20 metros) correspondente à altura (24 metros), exatamente a
metade de seu comprimento (48 metros). Essa “caixa de sapatos”, como se diz no jargão da acústica,
favorece as reflexões laterais do som, envolvendo a platéia e dando-lhe a sensação de espacialidade dos
sons produzidos. Em todos os sentidos, a Sala São Paulo foi realmente um achado.
Encaixar uma sala sinfônica no Grande Hall da Estação Júlio Prestes foi um exercício de competência
e criatividade para transformar a imensa massa construída do edifício em algo extremamente
delicado, um invólucro de espaço-tempo musical formado por uma infinidade de detalhes que,
somados, levaram à excelência de sua performance. Isso significa que o forro móvel, por si, não é o
único responsável pela qualidade acústica atingida pela sala. A geometria, a disposição e o desenho
dos balcões, o posicionamento do palco, o tipo e a espessura da madeira utilizada, a inexistência de
carpetes ou cortinas, o desenho das poltronas e todas as pequenas irregularidades nas superfícies, que
resultam também em efeitos ornamentais, como frisos, capitéis e figuras incrustadas nas paredes, são
elementos cruciais para a excelência acústica da sala. Detalhes como as ranhuras nos painéis do forro
e o acabamento da parte frontal dos balcões, em desenhos irregulares, constituem, estes também,
mais que soluções arquitetônicas, importantes elementos de difusão do campo sonoro.
O espaço de uma sala sinfônica deve permitir a reflexão multidirecional e sem distorções do som, e
deve ter o clima acústico perfeito: atrasos, volume, brilho, envolvimento, todos sintonizados e ajustados.
Comparação entre algumas das mais importantes salas de concertos do mundo,
96 José Augusto Nepomuceno, 1998
Concertgebouw
Amsterdã

Symphony Hall
Boston

Musikvereinssaal
Viena

PISO TÉCNICO

Sala São Paulo


São Paulo
FORRO MÓVEL AJUSTE 1
A Sala São Paulo, única no mundo a apresentar um forro totalmente móvel, inaugura uma tecnologia
entre nós: a de permitir a variação de sua volumetria para ajustar-se acusticamente às nuances mais
sutis das obras apresentadas. O movimento articulado dos painéis do forro permite uma variação
controlável do volume de ar na sala, de um mínimo aproximado de 12 mil metros cúbicos para um
máximo aproximado de 23 mil metros cúbicos, o que implica diferentes tempos de reverberação. Esses
tempos, enquanto fatores acústicos, estão relacionados com a definição dos sons musicais, ou seja,
permitem uma audição clara da obra em execução, o que efetivamente dá vida à sala.
Subindo ou descendo o forro, é possível ouvir composições executadas segundo sua concepção
original, na medida em que alguns compositores, como Beethoven ou Mahler, compunham para
grandes espaços, exigindo tempos de reverberação maiores – em torno de 2,1 segundos –, enquanto
Mozart ou Haendel, com uma sonoridade suave, apresentavam-se para pequenos grupos em
ambientes palacianos, exigindo tempos menores – em torno de 1,7 segundo.
O forro móvel permite ainda outro requinte. Utilizando o espaço criado entre o piso técnico e o forro
móvel, como uma continuidade do espaço da sala, é possível regular certas nuances no brilho
acústico da sala – e, se for o caso, esse brilho pode ser ajustado com o uso de bandeiras de veludo
estendidas nesse espaço. Todo esse esforço foi necessário em virtude de uma premissa adotada para
a concepção da sala: tão importante quanto garantir o volume e a clareza dos sons no espaço é
expressar seu silêncio. Nos instantes imediatos que antecedem um espetáculo, a sala, imersa na
ausência total de interferências externas, cria uma tensão particular, essencial para a manifestação
da música em toda a sua dimensão. Ao irromper dos primeiros acordes, espaço, músicos, música e
público são como que envolvidos numa experiência única, conjunta, que se estende até se calarem
os instrumentos e imperar, novamente, o silêncio.
As questões arquitetônicas e acústicas tornaram-se de tal maneira entrelaçadas no resultado final da
sala, que é impossível dissociar soluções técnicas de soluções funcionais e estéticas, incluindo-se aqui
desde o desenho da platéia, cujas poltronas, muito próximas umas das outras e distribuídas por
blocos, permitem uma melhor absorção do som, até o forro móvel, que se torna cúmplice na

98
apresentação da sala aos ouvintes, partindo sempre de sua máxima altura para então adaptar-se à
regulagem programada, num movimento acompanhado pelo olhar de toda a platéia.
A Sala São Paulo resultou num espaço arquitetônico limpo e sofisticado, coerente com os padrões
estabelecidos de qualidade e prestígio para a casa de uma orquestra como a Osesp. Como um
instrumento, deverá ser “afinada”, passando por vários ensaios acústicos até que atinja sua plena
otimização. Assim, o ouvinte, imerso nesse clima, afinará simultaneamente a percepção de todos os
sentidos para as sutilezas da música de concerto e suas variantes, podendo incorporar literalmente a
expressão criada por James Joyce: “o olho-ouvido que ouve”.

“Ressurreição”
Sinfonia nº 2, Ressurreição, de Gustav Mahler. A peça inaugural da Sala São Paulo foi uma escolha
carregada de intenções. É uma metáfora para o sopro de vida que, partindo da orquestra, perpassa as
colunas do edifício da Estação Júlio Prestes e se espalha por toda a região da Luz, que vive agora seu
renascimento.
No dia 9 de julho de 1999, diante de uma platéia de convidados que incluiu o presidente da
República, ministros, o governador de São Paulo, secretários de Estado e o prefeito municipal, o
maestro John Neschling apresentou o resultado de seu trabalho renovador à frente da orquestra. Ele
revelou um conjunto de qualidade impressionante, dominando o espaço com uma massa sonora que
pairou sobre o silêncio reverente do público em quase duas horas de execução.
As expectativas com o sucesso da estréia da Osesp em sua casa rebrilhando de nova eram as mais
otimistas, e ainda assim o espetáculo surpreendeu todo o público presente. A confirmação da
excelência acústica, aguardada com ansiedade por toda a equipe responsável pela sala sinfônica, veio
pela emoção manifestada por músicos e platéia ao término da peça, todos maravilhados com o
resultado.

100 Concerto inaugural da Sala São Paulo, 1999


Na platéia, durante o espetáculo, a surpresa estampava os olhos dos que percorriam a sala, a
instigante mistura do antigo e do contemporâneo, o famoso teto móvel. Tudo levando a que, aos
poucos, fosse crescendo a percepção de se fazer parte de um espaço em fusão com a música. Mais que
o acerto das soluções técnicas adotadas, a sala demonstrou possuir um “espírito” responsável pelo
clima de encantamento que ali teve lugar e condição essencial para as salas de concerto dignas desse
nome. De um outro ponto de vista, a Sala São Paulo desperta a consciência do público –
predominantemente habitantes da metrópole e de cidades próximas – para seu papel de cidadão,
enquanto indivíduos merecedores portanto de investimentos públicos em equipamentos culturais
desse padrão.
Para a região da Luz, a Estação Júlio Prestes, restaurada e dotada de uma sala sinfônica de alta
qualidade, deverá se integrar às demais instalações culturais existentes no entorno, consolidando o
caráter de pólo cultural desse setor da cidade e alavancando novas iniciativas que venham a ampliar
sua importância na requalificação dos espaços urbanos do centro histórico paulistano.
A sala agora inaugurada é uma opção democrática de lazer e programa cultural sofisticado, tendo
em vista seu baixo custo e as facilidades de acesso. Significa a oportunidade de formar um público
ouvinte mais exigente, além de apurar a sensibilidade musical das novas gerações, estabelecendo
referências de qualidade necessárias para uma cidade participante de uma rede global de
comunicação e cultura.

Noite de inauguração, 9 de julho de 1999 103


Complexo Cultural Júlio Prestes

A implantação da Sala São Paulo na Estação Júlio Prestes é mais um passo para a ocupação
do Complexo Júlio Prestes, conjunto que abriga as instalações da sede da Orquestra Sinfônica
do Estado de São Paulo e a Secretaria de Estado da Cultura e que se prepara para dar lugar,
no edifício vizinho (o antigo DOPS, Departamento de Ordem Política e Social), a outras
atividades culturais.
A Secretaria da Cultura ocupa a antiga ala administrativa da estação, ao lado da torre do
relógio, onde funcionavam os escritórios da Sorocabana. A transferência desse órgão público
para a região central da cidade é simbólica por expressar, com uma ação concreta, o apoio do
governo do Estado ao movimento de requalificação do centro paulistano.
Quanto ao antigo prédio policial – em cuja preservação está a memória do período da ditadura
militar de 1964 –, será restaurado internamente, perdendo os mezaninos acrescentados para
o desempenho das funções burocráticas da Delegacia do Consumidor, sua última ocupação.
Externamente, o edifício se encontra em bom estado de conservação e deverá ser limpo e
restaurado, tendo suas características arquitetônicas preservadas enquanto patrimônio
histórico.
A convivência de atividades culturais afins define o perfil do que será o Complexo Cultural Júlio
Prestes: um centro que oferecerá, além de atividades específicas referentes a cada edifício,
uma série de opções à disposição do usuário. A idéia é atrair e dinamizar a ocupação do local,
criando um público freqüentador assíduo. O Complexo Cultural tem no terreno ao fundo,
junto da linha férrea, uma garagem subterrânea com acesso para a sala sinfônica. Sobre a
laje da garagem e com acesso direto pela rua Mauá, está projetada uma praça para interligar
os dois edifícios que formam o complexo, com vista voltada para o pátio ferroviário. Com
tratamento paisagístico e mobiliário apropriado, nessa praça serão implantados anfiteatros
para apresentações de pequenos grupos.

Antigo DOPS, parte do Complexo Cultural Júlio Prestes,1999


105
Regina Maria Prosperi Meyer, 1985
Espaços para a vida urbana

Rua Mauá
Praça Coronel Fernando Prestes, 1999
Estação da Luz no eixo da avenida Casper Líbero, 1999
O convívio cotidiano

Regina Maria Prosperi Meyer

Nem mesmo os mais sensíveis e imparciais defensores do


urbanismo funcionalista poderiam antever a devastação e os vícios que alguns dos seus pontos de
doutrina, racionalmente elaborados nas primeiras décadas do século XX, ofereceriam às cidades no
final do mesmo século. As genuínas intenções de criar uma cidade harmoniosa, onde o trabalho
eficiente não escravizaria o trabalhador, onde as “máquinas de espairecer”, estrategicamente
distribuídas pela cidade, ofereceriam “esporte e lazer ao lado de suas casas”, permaneceram presentes
nos manifestos, programas e projetos, mas penosamente ausentes nas cidades. Os obstáculos à
realização desses ideais têm uma longa história, da qual não trataremos aqui por escapar à nossa
abordagem da questão. Sabemos, entretanto, e isso é fundamental lembrar, que, para os mais
empenhados urbanistas do século, esses tangíveis princípios programáticos – segundo os quais a
cidade deveria estar a serviço do bem-estar e da felicidade de seus cidadãos – conviveram com
raciocínios que aceitavam e, muitas vezes, até mesmo defendiam teses que os contradiziam e
anulavam, tais como: “a cidade que dispõe da velocidade dispõe do sucesso”.
UNA Arquitetos, 1996

Jardim da Luz 113


Estação Júlio Prestes e Rua Mauá, 1999 115
Embora considerado materialmente realizável em muitas de suas proposições, o urbanismo que
buscou a realização de uma “cidade ideal” comprometida com as exigências da produção industrial
recebeu, desde os anos 60, críticas bem fundamentadas que acabaram por lhe imprimir uma
conotação de pensamento utópico. Os conflitos teóricos e as incompatibilidades práticas surgidas no
interior de seus postulados – considerando-se as opções operacionais da “gestão urbana eficiente”,
que também buscou “racionalizar” sua ação – caminharam para um impasse. Depois de décadas de
densa e ampla discussão envolvendo o presente e o futuro das metrópoles, podemos dizer, sem a
veleidade de tentar redimir os erros cometidos, que a racionalidade virtuosa, na qual se apoiaram os
melhores pensadores do urbanismo moderno, calculou mal o grau e a forma que sucessivamente
foram assumindo as exigências da produtividade industrial capitalista. A voracidade do processo
acuou o pensamento e vitimou o seu objeto: a cidade.
Há pelo menos três décadas, o exame criterioso de cidades e metrópoles em todo o mundo vem
mostrando um progressivo empobrecimento da vida urbana e um constante declínio do espaço
urbano desde a segunda metade do século XX. Procurar as relações de causalidade entre esses dois
fatos pouco esclarece, na medida em que um é expressão circular do outro. As análises feitas e os
exemplos apontados refletem o despreparo – na melhor das hipóteses – e a indiferença da sociedade
para defender-se e defender as suas cidades diante da implacável “ideologia do progresso”.
A principal vítima dessa evolução histórica das cidades é a própria urbanidade, entendida como
organização da vida, individual ou coletiva, nos espaços públicos. Ameaçada de banimento e extinção
na medida em que se fala do “fim das cidades”, a urbanidade é hoje a pedra angular das questões
urbanas. O espaço público é seu instrumento primordial de realização, isto é, constitui-se em
elemento indispensável da luta pela restauração da urbanidade essencial e pela garantia do futuro
das cidades.
As evidentes perdas provocadas nos países e cidades em que se instalaram esses processos de
decadência levaram à elaboração de projetos urbanos e políticas públicas cuja pauta de ações se
organiza em torno de uma questão prioritária: a reconquista da urbanidade através da recuperação

Jorge Hirata, 1985


116 Rua Mauá
117
Arte: Pedro Izzo, 1999

ampla e sistemática dos seus espaços públicos. A segregação funcional, reconhecidamente um dos
mais nocivos princípios de organização do espaço e da vida urbana saudável, ao lado da adaptação
espacial às exigências da circulação viária que conduzem as propostas, encabeçam a lista dos
problemas a serem enfrentados.
A procura de novos parâmetros para a intervenção tem origem, a partir dos anos 60, nas críticas
produzidas pela observação direta da vida nas cidades. A diversidade funcional, tal como a defendeu
Jane Jacobs no início da década de 60, é o ponto de partida das discussões teóricas e também dos
projetos urbanos cujo objetivo é reverter a desagregação representada, sobretudo, pelo
aprofundamento da distância física e social existente entre o espaço público e o espaço privado.
Apesar da diversidade das abordagens surgidas ao longo do debate acerca das relações entre essas duas
esferas da vida, podemos assumir um ponto consensual: uma vez destruídos os elementos que
relacionavam diretamente o espaço da vida privada e o espaço da vida pública, as cidades perderam
qualidade e, acima de tudo, diminuíram as possibilidades de se constituírem genuinamente como
espaços de vida coletiva. Em outras palavras, as cidades perderam substância urbana e a vida pública
coletiva, o seu espaço de atuação.
O amplo processo de recuperação das áreas centrais de cidades americanas, impulsionado pela
decadência de setores residenciais, foi, nos anos 60, uma resposta para os problemas de desagregação
urbana. Esse tipo de ação, embora seja, na sua origem, um discutível modo de atuar no interior de
setores urbanos, substituindo antigos moradores por novos, de maior poder aquisitivo, influenciou
positivamente o novo ideário urbanístico que se iniciava. A ação conduzida nas áreas centrais de
cidades americanas é traduzida pelo novo conceito de gentrification, e tornou-se exemplo de
operações urbanas cujo produto final foi a iniqüidade. Os movimentos populares de luta e
reivindicação dos moradores atingidos fazem parte de qualquer estudo sobre esse tipo de intervenção.
Sua crítica foi, assim, incorporada como nova condicionante de grande parte dos projetos de
renovação urbana realizados posteriormente.
Principais espaços públicos:
1. Praça Coronel Fernando Prestes, 2. Jardim da Luz, 3. Largo General Osório, 4. Praça Júlio Prestes, 5. Largo Coração de Jesus, 6. Praça Princesa Isabel
Principais eixos estruturais:
A. Eixo ferroviário, B. Av. Tiradentes, C. Av. Casper Líbero, D. Eixo Av. Duque de Caxias - Rua Mauá, E. Anel viário central 119
Jorge Hirata, 1985
Na Europa, a renovação urbana foi, inicialmente, pautada pela continuidade do modelo iniciado
no século XIX, que consistia na modernização e no restauro da trama urbana medieval. Quando
as demandas tornam-se mais complexas, em decorrência da obsolescência dos equipamentos
urbanos de grande porte localizados em suas áreas centrais, assistimos a transformações mais
radicais. Dois mercados centrais de alimentação – Covent Garden, em Londres, e Les Halles, em
Paris – são exemplos marcantes dessa nova modalidade de intervenção. Para atender às novas
escalas e exigências de modernização do comércio atacadista de alimentos, sua transferência para
áreas periféricas é realizada a partir do início dos anos 70. A localização urbana, nos dois casos, foi
decisiva, pois ambos os equipamentos ocupavam parte importante de bairros centrais – The City
e Les Marais –, cuja trama urbana se mostrava incompatível com o volume de tráfego por eles
gerado.
Seguindo modelos de implantação distintos, as duas remoções geraram transformações urbanas
importantes no seu entorno. A polêmica e as questões que acompanharam essas experiências
tornaram-se paradigmáticas para o urbanismo contemporâneo. Tanto Covent Garden quanto Les
Halles continham a força das realizações plenamente implantadas. As profundas transformações
causadas pela substituição dos equipamentos ou pela simples mudança no uso do imóvel trouxeram
para o primeiro plano da discussão questões sociais, sobretudo as de ordem habitacional.
O espaço público, a partir dos anos 70, ganha uma nova função: se antes ele era relegado ao papel
de coadjuvante e justaposto, condição a que fora submetido por projetos equivocados, passa agora a
agente instrumental da nova urbanidade. As experiências marcantes de Londres e Paris serviram de
modelo para as cidades que nas décadas de 80 e 90 sofreram processos de reabilitação e renovação
urbana. As substituições ou as transformações do uso de equipamentos de grande porte, inseridos em
tecidos urbanos consolidados, exigem hoje projetos complexos cujo planejamento do conjunto, bem
como o desenho urbano das suas partes, é um procedimento indispensável. Com o desenvolvimento
dos conceitos de renovação e reabilitação urbana e com a análise das experiências implantadas, os
complexos ferroviários e portos obsoletos, os bairros industriais abandonados, enfim, os degradados

120 Largo Coração de Jesus


121
centros históricos têm a oportunidade de reintegrar-se e projetar espaços propícios ao desenvolvimento
de uma nova urbanidade.
As operações urbanas desenvolvidas nas cidades européias a partir dos anos 80 são, acima de tudo,
um amplo movimento de instalação de nova infra-estrutura de transporte público, de ampliação de
equipamentos culturais e de reconstrução de espaços públicos. Estes últimos vêm ganhando, nesse
contexto, nova relevância nos projetos urbanos, que agora assumem plenamente a sua tarefa:
diminuir a distância entre as atividades desenvolvidas nos espaços públicos e as atividades restritas
ao espaço privado. Esse é o ponto de partida adotado pelas análises e, posteriormente, pelos trabalhos
propositivos de natureza urbanística que estão comprometidos com o restabelecimento da vida
urbana.
Diante do quadro urbano exibido pela cidade de São Paulo nas últimas décadas deste século, tornou-
se fundamental produzir e recuperar o espaço público com critério e qualidade. Definir esses critérios
e executar os projetos efetivamente comprometidos com a qualidade de vida urbana é, sem dúvida,
o grande desafio. Sem nenhuma pretensão de criar modelos, é possível distinguir na história da
constituição dos espaços públicos, sobretudo ruas e praças públicas, uma condição básica: o projeto
deverá beneficiar os moradores do seu entorno bem como os eventuais visitantes da metrópole,
criando para todos um espaço em que seja possível aperfeiçoar o convívio cotidiano e as práticas da
vida urbana coletiva.
Entretanto, para alcançar tal meta, o projeto deverá exibir com clareza o interesse do poder público
pela retomada da vida coletiva, garantida por meio de uma série de intervenções que, em princípio,
são bastante simples: iluminação eficaz, calçamento adequado, sombreamentos vegetais bem
distribuídos, organização do tráfego de passagem, boas relações com o transporte público, limpeza,
possibilidade de fruição estética e segurança. O êxito ou o malogro do projeto será medido apenas pelo
uso ou pela rejeição da população em relação ao novo espaço, voltado para atender às necessidades
da vida pública. Para projetar e construir um espaço público contemporâneo tendo em vista essas
premissas, torna-se obrigatório atualizar o conceito de convívio comunitário e de vida coletiva
UNA Arquitetos, 1996
metropolitana, compreender as formas individuais de estar no espaço público, conhecer o potencial
papel indutor dos equipamentos de caráter público e coletivo.
No caso específico do Pólo Luz, o espaço público é uma herança histórica com imenso potencial de
transformação. O perímetro urbano que o delimita possui um conjunto de espaços públicos muito
representativos da evolução urbana da região. Rivaliza com o Centro na medida em que a sua
imagem urbana está associada às relações que praças e ruas mantêm com os grandes equipamentos
públicos ali existentes. Três elementos, que podemos definir como intrínsecos ao setor, destacam-se:
o Jardim da Luz e as praças da Luz e Júlio Prestes, adjacentes às estações. O sistema viário principal,
hoje dominado pelas avenidas Duque de Caxias e Tiradentes, cria a relação urbana mais abrangente.
É bastante claro que a realização plena do Pólo Luz depende da articulação urbana de suas
importantes instituições. As funções e atividades desenvolvidas na Estação da Luz, na Pinacoteca do
Estado, pela Sala São Paulo, no Museu de Arte Sacra e no Jardim da Luz transcendem suas funções,
entendidas em sentido estrito. O espaço que se abre diante desses edifícios públicos, voltados às
atividades coletivas cotidianas ou esporádicas, é muito mais que um simples espaço adjacente ou
fronteiriço. É na verdade um espaço que articula física e funcionalmente as atividades internas e
externas desses equipamentos. A coesão entre essas duas esferas dependerá do tratamento dispensado
aos elementos arquitetônicos, urbanísticos, funcionais e programáticos que apóiam e estimulam as
suas potencialidades de promover “vida pública”.
A questão que hoje persiste e desafia a instalação plena do Pólo Luz é de ordem social e urbana.
No que diz respeito à questão social, é vital lembrar um princípio da gestão democrática das cidades:
todo investimento público deve traduzir e incluir uma negociação com os usuários do setor urbano
renovado. O exame dos planos e a sua forma de execução – e esse é o espírito da palavra negociação
nesse contexto – devem afastar qualquer tipo de arbitrariedade e buscar corresponder às necessida-
des mais prementes da população residente. Nesse sentido a concentração de cortiços nas princi-
pais ruas do Pólo Luz condiciona e encaminha todo e qualquer projeto efetivo de transformação
desse setor.

UNA Arquitetos, 1996


A questão urbana deverá ser respondida por uma determinação do poder público em suas várias
instâncias, envolvendo uma ação regeneradora que deverá transformar praças, jardins, largos, ruas,
pátios e alamedas, hoje desprovidos de articulações vitais, em um sistema de espaços públicos
conjugados às instituições públicas disseminadas pelo setor. A mais forte e bem-sucedida experiência
do urbanismo contemporâneo deve explorar, através de projeto integrador, as potencialidades da
vinculação entre moradores do entorno dos equipamentos públicos coletivos de abrangência
metropolitana e seus espaços públicos adjacentes. São Paulo não pode ignorar a potencialidade do
Pólo Luz e, acima de tudo, não pode desprezar o fato de que a sua realização depende de uma
intensa reflexão de caráter urbano abrangente.

Convento da Luz e Avenida Tiradentes, 1999 125


Propostas para a área (1974-1999)
Reprodução Iatã Cannabrava, 1999

Região central de São Paulo – projeto “São Paulo Centro – uma nova abordagem”,
desenvolvido por Regina Maria Prosperi Meyer, Fernando de Mello Franco, Marcelo
Laurino e Sarah Feldman para a Associação Viva o Centro, 1996
Pico do Jaraguá
Jaraguá Horto
Flor
estal Guarulhos
Parque da Zona Leste
Brasilândia
Pirituba Tucuruvi
Vila Nova
Pirituba Cachoeirinha S
Parada Inglesa
Jardim São Paulo
Piqueri
Santana
Carandiru Vila Maria
Campo
de Marte
Tietê Parque Cangaíba Guilhermina
Novo Mundo Esperança
Lapa Barra Armênia
Patriar
ca
Osasco Água Funda Tiradentes Aricanduva
Ceagesp Branca Mal. Deodor
o Luz Pari Vila Matilde
Presidente
Sta. Cecília Carrão Penha
República Tatuapé Artur Alvim
Altino Pq. i
Vlla Belém Corinthians
Lobos Sumaré Bresser
Osasco Vila Clínicas Brás Vila Carrão Itaquera
Madalena Sé
Consolação Moóca
Cidade Pinheir
os São Joaquim
Universitária
Vila Formosa
Jardins Aclimação Água Rasa
Rio Pequeno Butantã Paraíso
Ana Rosa Ipiranga Vila Guarani
Parque do
Ibirapuera Oratório Parque do Carmo
Vila Vila Mariana
Olimpia Sapopemba
Morumbi Embuaçu
Vila Sônia Moema Santa Cruz Jardim Grimaldi
Praça da Árvor
e
Brooklin São Mateus
Saúde São Caetano
Paraisópolis
São Judas Utinga
Aeroporto Conceição Prefeito
de Congonhas São Caetano Saladino
do Sul
Santo Jabaquara
Jardim Santo André
Amaro Parque do
São Luiz Estado Capuava
Mauá
Capão Redondo
Jardim Miriam Pir
elli
Diadema Mauá
Jurubatuba
Pedreira Santo André
Rio Bonito
Piraporinha
Autódr
omo de
Jardim Ângela Interlagos
São Bernar
do
do Campo
Cidade Dutra Represa
Represa Billings
Guarapiranga Ferrazópolis
S

Reflexões e propostas

Alcino Izzo Júnior

O reconhecimento do papel singular da área da Luz no contexto


metropolitano de São Paulo, por conta de suas características histórico-culturais, pelo intenso trânsito
de passagem decorrente da ligação estrutural norte-sul da cidade e, ainda, por sua potencialidade
enquanto ponto privilegiado de intersecção intermodal do transporte público (ônibus–metrô–trem
metropolitano), coloca-a como objeto de estudo obrigatório em todas as tentativas de reordenação
urbana que envolva a área central da cidade. Nessa condição, foram destacados, entre os projetos
realizados, aqueles cujas proposições interferem diretamente na região, coordenados por órgãos públicos
das áreas de planejamento urbano e cultura e, mais recentemente, por iniciativas não governamentais.
Em diagnósticos que abrangem a escala metropolitana, municipal e local para a leitura da cidade,
algumas questões se impõem como diretrizes básicas dos trabalhos, condicionando a definição de
seus objetivos e o encaminhamento de suas proposições. São elas:
a) O corte radical da área pela avenida Tiradentes, com catorze faixas de tráfego expresso, provocando
uma ruptura na identidade do bairro e na integração de seus equipamentos.
b) A degradação urbanística da área, visível no descaso para com os espaços públicos – incluindo, de
maneira absurda, um dos mais bonitos parques da cidade, o Jardim da Luz –; no estado geral dos
edifícios, muitos de reconhecido valor arquitetônico; na forma de ocupação das ruas e dos passeios;

Plano Integrado de Transportes Urbanos, PITU 2020, 1997 129


Reprodução Iatã Cannabrava, 1999

no comércio informal e, sobretudo, na concentração de questões sociais relativas aos moradores de


rua, aos grupos de menores carentes, à proliferação de cortiços e a um relativo trânsito livre para
prostituição e tráfico de drogas.
c) As barreiras impostas pela passagem do eixo ferroviário no sentido leste–oeste, segregando bairros
contíguos como Pari e Brás, a leste, e Bom Retiro e Campos Elíseos, a oeste, além de impor uma
paisagem deteriorada e de vazios urbanos em seu traçado.
d) A concentração de edifícios e logradouros de grande importância para o patrimônio ambiental e
arquitetônico da cidade, alguns transformados em equipamentos culturais de expressão, como a
Pinacoteca, o Museu de Arte Sacra, a Oficina Cultural Oswald de Andrade e a Sala São Paulo,
induzindo a formação de um pólo cultural qualificado na área, de porte e abrangência
metropolitana.
Pioneiro e referência para os que vieram em seguida, o trabalho realizado em 1974, “Área da Luz – Área da Luz – Renovação Urbana

Renovação Urbana”, da equipe do escritório Rino Levi Arquitetos Associados, desenvolveu um amplo
diagnóstico técnico e o mapeamento detalhado da área, classificada na legislação de zoneamento
urbano como Z8-007, cujo perímetro era formado pelo traçado da ferrovia ao sul, da avenida do
Estado e de seu prolongamento com a avenida Cruzeiro do Sul a leste, do rio Tietê ao norte e da rua
Prates a oeste.
Esse estudo, encomendado pela Cogep – Coordenadoria Geral de Planejamento, órgão que antecedeu
a atual Sempla (Secretaria Municipal de Planejamento) –, foi realizado às vésperas da entrada em
operação do metrô, com três estações na região e a perspectiva de sua integração com os trens
suburbanos. Na época, a área da Luz já se encontrava dividida pelo alargamento da avenida
Tiradentes para a implantação do metrô, e havia a expectativa de intervenções urbanas de porte em

UNA Arquitetos, 1996


suas proximidades, como o Projeto Cura, para Santana, e a Estação Rodoviária junto ao trevo da
avenida Cruzeiro do Sul.
O estudo propunha um programa para a recuperação e otimização do desempenho funcional da área
da Luz. Apresentava um novo plano de circulação viária a fim de reduzir os efeitos do intenso tráfego

Área da Luz – Renovação Urbana, escritório Rino Levi, 1974 131


Patrimônio ambiental-urbano da área da Luz

1. Museu da Saúde Pública “Emilio Ribas” (antigo Desinfectório Central), 2. E.E.P.S.G. Marechal
Deodoro, 3. Biblioteca Clara Luz (Fundação para o Livro Escolar), 4. Radar Tantã, 5. Grêmio Dramático
Musical Luso-brasileiro, 6. Sociedade Israelita Brasileira “Talmud Thorá”, 7. Sinagoga Centro Israelita de
São Paulo “Knesset Israel”, 8. Instituto de Ensino Lubavit, 9. Colégio Santa Inês, 10. Oficinas Culturais
Três Rios (antiga Faculdade de Farmácia e Odontologia), 11. Sinagoga Comunidade Israelita, 12.
Sinagoga Machzikei Adat, 13. Sinagoga Israelita do Bom Retiro, 14. TAIB – Teatro de Arte Israelita
Brasileiro, ICIB – Instituto de Cultura Israelita Brasileiro, 15. Sinagoga Israelita Brasileira “Beit Itzchak
El Chonon”, 16. Instituto de Educação Hebraico Brasileiro – Renascença, 17. Sinagoga “B’nei Akiva”,
18. Igreja N. Sra. Auxiliadora, 19. Instituto Dom Bosco, 20. Quartel General da Polícia Militar do Estado
de São Paulo, 21. Teatro Franco Zampari (Fundação Padre Anchieta), 22. Curso Pré-Vestibular
Universitário (Antigo Instituto de Hidromecânica da Escola Politécnica), 23. Instituto de Eletrotécnica –
Poli/USP (Edifício Ramos de Azevedo), 24. Faculdade de Tecnologia de São Paulo – Fatec (Edifício
Hipólito Pujol), 25. Faculdade de Tecnologia de São Paulo – Fatec (Edifício Paula Souza),
26. Faculdade de Tecnologia de São Paulo – Fatec (Edifício Santhiago), 27. Praça Coronel Fernando
Prestes (futura praça Cultural), 28. Igreja Apostólica Armênia São Jorge, 29. Senac – Serviço Nacional de
Aprendizagem Comercial, 30. Igreja São Gregório Iluminador (Paróquia Armênia Católica),
31. Museu de Arte Sacra, Igreja N. Sra. da Luz, Mosteiro da Imaculada Conceição, 32. Metrô – Estação
Tiradentes, 33. Arco do Presídio Tiradentes, 34. Quartel da Luz (1º Batalhão da Polícia de Choque
“Tobias de Aguiar”, 35. Chaminé da Usina de Eletricidade, 36. Regimento da Polícia Montada “Nove de
Julho”, 37. Anfiteatro da Banda da Polícia Militar, 38. 2º Batalhão da Polícia Militar (antigo Colégio
Santo Agostinho), 39. Museu da Polícia Militar (antigo Hospital da Polícia Militar), 40. Liceu de Artes e
Ofícios de São Paulo, 41. Residências com valor ambiental urbano nos Campos Elíseos, 42. Palácio dos
Campos Elíseos (Secretaria de Estado da Indústria, Comércio, Ciência e Tecnologia), 43. Santuário do
Sagrado Coração de Jesus, Liceu Coração de Jesus, 44. Conjunto de casas do largo Coração de Jesus,
45. E.E.P.G. João Kopke, 46. Estação Júlio Prestes – FEPASA, 47. Antiga Estação Rodoviária,
48. Primeira Igreja Batista de São Paulo, 49. Monumento a Duque de Caxias, 50. Hotel Flórida,
51. Antiga Estação da Estrada de Ferro Sorocabana (antigo DOPS), 52. Escola de Educação Infantil Dom
Gastão, 53. E.M.E.I. Jardim da Luz, 54. E.E.P.G. Prudente de Moraes, 55. Jardim da Luz, 56. Pinacoteca
do Estado (Faculdade de Belas Artes), 57. Estação da Luz – R.F.F.S.A., 58. Igreja de São Cristóvão (antigo
Seminário Episcopal), 59. Conjunto de hotéis da rua Mauá, 60. Clube Ginástico Paulista, 61. Metrô –
Estação da Luz, 62. Vila Inglesa (Jardim da Marquesa de Itú), 63. Vila Economizadora.

133
de passagem, além de um programa abrangente de diretrizes urbanísticas que propunha uma nova
normatização para o uso do solo da Z8–007, visando a sua incorporação pela legislação vigente.
Entre os objetivos básicos destacavam-se: o incentivo ao adensamento populacional da área, com a
implantação de conjuntos habitacionais; o aumento da qualidade de vida urbana local através da
implantação de centros educacionais integrados e postos de saúde; proteção e valorização do
patrimônio arquitetônico e ambiental da área com base no reconhecimento de seu potencial de uso
para o lazer cultural e como estímulo a uma maior utilização desse conjunto pela população.
Dez anos depois, em 1984, a Secretaria de Estado da Cultura coordenou um trabalho voltado
especificamente para a dinamização da área a partir da estratégia de integrar seu reconhecido
potencial de utilização, ou seja, seus espaços públicos e institucionais, e a população local, moradora
Projeto Luz Cultural e freqüentadora da área. Com o nome de Projeto Luz Cultural, coordenado pela arquiteta Regina
Maria Prosperi Meyer, a iniciativa envolvia a área entre o rio Tamanduateí, a avenida Rio Branco e
a rua Mauá, incluindo os quarteirões adjacentes a esse perímetro.
O projeto propunha a criação de laços entre a comunidade e a área da Luz por meio de ações que
trouxessem à tona novas percepções daquele espaço e novas formas de interagir com ele. Nesse
sentido, várias atividades foram planejadas, com a expectativa de atingir cada vez mais setores da vida
urbana local. Para tanto, tornava-se imprescindível a colaboração dos moradores, o que por si já seria
uma resposta aos planos convencionais de renovação urbana, baseados na expulsão da população
local, principalmente de baixa renda.
O Projeto Luz Cultural assumiu como um de seus pólos a Oficina Cultural Oswald de Andrade,
instalada no edifício tombado e reciclado da antiga Escola de Farmácia e Odontologia da
UNA Arquitetos, 1996

Universidade de São Paulo, que passaria a abrigar a Orquestra Jovem de São Paulo, além de atividades
e cursos de música, artes plásticas e espetáculos cênicos. Por outro lado, associado com a Emurb
(Empresa Municipal de Urbanização), o projeto buscava recuperar áreas comprometidas – como a
praça Fernando Prestes, que seria reurbanizada para transformar-se num ponto de encontro e lazer

134
para a comunidade e da qual os automóveis seriam expulsos, permitindo que o local ganhasse um
calçadão arborizado, com espaço para apresentações musicais.
Além de buscar melhorias para o estado deplorável do Jardim da Luz, o Projeto Luz Cultural buscou
várias parcerias: com a Polícia Militar, que assumiria um policiamento mais efetivo e apresentaria
sua banda nos fins de semana; com a Secretaria Municipal de Cultura, que criou o programa Leitura
no Parque e o projeto Educação Ambiental; e com a Pinacoteca do Estado, quando desenvolveu o
programa Desenho no Parque.
Buscando sua consolidação e, portanto, maior visibilidade em sua área de influência, o Projeto Luz

UNA Arquitetos, 1996


Cultural também procurava viabilizar uma iluminação adequada para os edifícios de valor histórico
e uma comunicação visual específica que identificasse e integrasse os bens culturais da região. Em
poucos meses, porém, a falta de continuidade de alguns dos programas e de apoio às reivindicações
levou ao encerramento prematuro da iniciativa.
Em 1996, a relevância atingida pela degradação urbanística da cidade levou a Prefeitura de São Paulo,
através da Sehab (Secretaria de Habitação e Desenvolvimento Urbano/Comissão Procentro), a realizar
o “Concurso Nacional de Idéias para um Novo Centro de São Paulo”. Essa iniciativa recebeu o apoio Concurso Nacional de Idéias para
um Novo Centro de São Paulo
do IAB/SP (Instituto de Arquitetos do Brasil/Departamento de São Paulo), da Fundação Banco de
Boston e da Associação Viva o Centro, e o projeto vencedor apresentou propostas para intervenções de
porte na região central da cidade e em bairros adjacentes, entre eles a área da Luz.
Aceitando a delimitação da Emurb/Procentro para a Operação Urbana Centro – a legislação que
alterou os índices de aproveitamento do centro paulistano, estimulando seu adensamento –, o
projeto da equipe vencedora redefinia a circulação expressa do corredor norte–sul, através de
passagens subterrâneas – túneis que ligariam as avenidas 23 de Maio e Nove de Julho desde a
entrada no vale do Anhangabaú até a avenida Tiradentes. Nesse quadro, o atual túnel do Anhangabaú
seria reciclado como terminal de ônibus, concentrando as linhas em operação na região.
Em relação ao eixo ferroviário foram mantidas as estruturas físicas do sistema, com alterações em sua
operação: a Estação Júlio Prestes seria terminal para os trens que partissem para o interior do Estado;

135
Reprodução Iatã Cannabrava, 1999

a Estação da Luz, terminal de trens urbanos das linhas noroeste e oeste; e a Estação Roosevelt, para
os trens regionais do vale do Paraíba e para o Rio de Janeiro. O estudo propôs uma nova estação, na
Mooca, para os trens com destino à região do ABC e Santos.
O projeto propõe transformações significativas na paisagem urbana da área da Luz, como a grande
rotatória que arremata a avenida Tiradentes, em frente à Pinacoteca do Estado, o redesenho dessa
mesma avenida, ajustado ao tráfego local, e outra rotatória substituindo o viaduto Couto de
Magalhães, para a reorganização do fluxo da avenida Duque de Caxias em direção à zona norte,
incluindo o redesenho da rua Prates.
Pelo caráter excessivamente voltado às grandes obras viárias, de alto custo e realização complexa, as
interferências desse projeto incidentes na área da Luz somam-se ao acervo de estudos da região
como uma proposta de longo prazo e de difícil realização, pela necessária integração de agentes
públicos e privados, da qual é dependente.
Dentro do Programa de Reabilitação do Patrimônio Cultural, desenvolvido pelo IPHAN (Instituto do Programa de Reabilitação
do Patrimônio Cultural
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional/Ministério da Cultura) e destinado à requalificação de
centros históricos em cidades brasileiras com recursos do BID (Banco Interamericano de
Desenvolvimento), foi apresentado pela Prefeitura, em 1998, o Projeto Luz, destacando o bairro pelo
qual se iniciaria o processo de recuperação da área central da cidade. Trata-se de um projeto
coordenado pelo DPH (Departamento de Patrimônio Histórico, órgão da Secretaria Municipal de
Cultura), em associação com o Condephaat (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico,
Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo), montado com base nos trabalhos já
realizados sobre a área da Luz.
Seu objetivo é também potencializar a vocação cultural do bairro, inserindo-o como uma opção de
qualidade no circuito de lazer e turismo da cidade. Assumindo a Estação da Luz como o centro de um
círculo de abrangência para os investimentos diretos do Programa de Reabilitação, pelo papel de
polarizador do transporte público futuro da região, o projeto propõe a restauração de vários edifícios
históricos, melhorias em praças, a implantação de um camelódromo, um projeto específico de
Projeto vencedor do Concurso Nacional de Idéias para um Novo Centro de São Paulo,
dos arquitetos Martinez Correa, José Paulo de Bem e outros, 1996 137
iluminação, a redefinição do traçado viário local, com inclusão de áreas de estacionamento, e uma
avaliação socioeconômica da área visando a transferência ou o reassentamento da população
moradora de cortiços.
Entre suas propostas, destacam-se algumas ações específicas, tais como:
• recuperação arquitetônica e paisagística do Jardim da Luz, além das antigas garagens em frente
ao parque, das quais uma parte será transformada em estacionamento;
• melhoria do espaço público entre a praça Júlio Prestes e a praça Coronel Fernando Prestes;
• intervenção em imóveis particulares degradados, principalmente ao lado da Estação da Luz, na
rua do Triunfo, rua Mauá e avenida Casper Líbero;
• término das obras da atual sede do DPH, no edifício Ramos de Azevedo, que o projeto pretende
transformar em Casa da Memória Paulistana e reequipar com material do Arquivo Municipal;
• restauro das obsoletas instalações da Garagem Municipal e sua transformação em Centro de
Atividades, em parceria com a iniciativa privada.
O Projeto Luz, no qual o BID participaria com 50%, o governo federal com 30% e a Prefeitura de São
Paulo com 20%, encontra-se em compasso de espera, aguardando a assinatura do convênio entre a
Prefeitura Municipal e o Ministério da Cultura, para então iniciar o detalhamento.
Na esfera das iniciativas não governamentais, a Associação Viva o Centro realizou dois estudos de
São Paulo Centro – fôlego envolvendo a área da Luz. O primeiro, “São Paulo Centro – uma nova abordagem”,
Uma Nova Abordagem
desenvolvido por Regina Maria Prosperi Meyer e o escritório MMBB Arquitetura, aproveitava o
momento político – 1996, ano das eleições municipais – para oferecer uma visão do papel
fundamental do centro paulistano na reorganização da cidade, através de análises e propostas que
pudessem subsidiar a futura administração. O trabalho foi distribuído, na forma de um relatório
técnico contendo mapas e diagramas, a todos os candidatos à Prefeitura e à Câmara Municipal de São
Paulo.
Esse trabalho tornou explícitas as posições da Associação Viva o Centro para as questões da
recuperação da área central da cidade, destacando a necessidade de sua diversidade funcional como

138
condição para a vitalidade da região e, em conseqüência, como incentivo à implementação da
função residencial, revertendo o quadro de diminuição progressiva de moradores do Centro – o que
seria uma solução também para a conservação dos conjuntos sociourbanísticos existentes, com seu
valor histórico preservado. A delimitação proposta para os estudos definia um conjunto de
características urbanas e sociais homogêneas que abrangia os bairros centrais da cidade de São
Paulo, entre os quais os que configuram a área da Luz.
O trabalho incorpora os projetos elaborados por empresas públicas da área de transportes,
principalmente o PITU (Programa Integrado de Transportes Urbanos, coordenado pela Secretaria de PITU
(Programa Integrado de
Estado dos Transportes Metropolitanos de São Paulo), cujo objetivo é a integração física, tarifária e Transportes Urbanos)
operacional de todo o sistema de transporte coletivo de grande capacidade e sua articulação com os
demais modos de transporte na metrópole. Dentro desse programa, destacam-se: o Plano de
Recuperação do Desempenho Operacional dos Corredores de Transporte Coletivo, ora em implantação
pela EMTU (Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos), cujo objetivo é a redução dos ônibus
que acessam o Centro, concentrando as linhas em terminais integrados por linhas circulares de Revaf
(Programa de Revitalização
trolebus; o Revaf, Programa de Revitalização de Áreas Ferroviárias, do governo federal, através do de Áreas Ferroviárias)
Ministério de Transportes, que torna possível a captação de recursos da iniciativa privada como
contrapartida da utilização do considerável patrimônio imobiliário, hoje ocioso, existente ao longo
das linhas; e, ainda, o Projeto Integração Centro, da CPTM, que prevê a desativação da Estação Júlio Projeto Integração Centro
Prestes em seu plano de articulação ferroviária, passando a utilizar a Estação Barra Funda como
terminal para as composições do tronco Oeste. Nesse plano, o antigo tronco Leste da CBTU, hoje
incorporado pela CPTM, estende sua penetração na área central da cidade, deslocando seu terminal
da Estação Roosevelt para a Estação Barra Funda, parando na Estação da Luz.
Sobre esses estudos, o trabalho “São Paulo Centro” estabeleceu um conjunto de diretrizes voltadas
para intervenções no sistema viário, para a ocupação dos vazios ao longo do eixo ferroviário e para
o adensamento residencial da região, fator essencial para a recuperação da vida urbana, com a
otimização da infra-estrutura existente e com a garantia de circulação segura à noite. Em decorrência

139
Iatã Canabrava

Articulação e integração da rede


de espaços públicos – caminhos, projeto
“São Paulo Centro – uma nova abordagem”,
Regina Maria Prosperi Meyer, Fernando de Mello
Franco, Marcelo Laurino e Sarah Feldman, para a
Associação Viva o Centro, 1996

140
do grande número de órgãos públicos instalados no Centro, o estudo propõe a transferência da sede
do governo estadual para essa área, da mesma forma como a Prefeitura, em edifício histórico
tombado pelo patrimônio.
Dentro dos projetos já existentes, a Estação da Luz ganha especial relevância enquanto principal
conexão do Sistema de Transportes de Alta Capacidade, interligando a rede ferroviária unificada e as
duas linhas de metrô (a atual norte–sul e a futura Linha 4). Segundo o Metrô, deverão circular pela
área cerca de 500 mil passageiros diariamente, com as conseqüências previsíveis para a revitalização
Projeto Operação Centro de seu entorno. O Projeto Operação Centro prevê a modernização das instalações, em especial da gare,
por onde circularão os trens com intervalo de três a quatro minutos. Dentro de um padrão Metrô de
operação, também serão instaladas escadas rolantes, bilheterias e bloqueios nas plataformas de
embarque. O projeto de adequação da Estação da Luz à sua nova função estratégica teve orientação,
na forma de diretrizes de restauro, dos órgãos de preservação do patrimônio histórico e arquitetônico
em nível federal, estadual e municipal.
Em relação ao eixo viário norte–sul, o estudo propõe o rebaixamento da calha da via de fluxo
expresso da avenida Tiradentes, garantindo sua travessia sem interferências e dando-lhe ao mesmo
tempo um caráter monumental de avenida para o tráfego local, com amplas calçadas, valorizando
a região, seus espaços públicos e o patrimônio arquitetônico.
O redesenho da avenida Casper Líbero, por sua vez, propõe um uso limitado para veículos, assumindo
a característica de boulevard, mais apropriada ao trânsito de pedestres, e estabelecendo uma
articulação preferencial entre a área da Luz e o Anhangabaú.
Em relação à orla ferroviária, o projeto da Associação Viva o Centro propõe a construção de novas
estações, com o objetivo de dinamizar o entorno, em especial com equipamentos de porte
metropolitano e com a ocupação de conjuntos residenciais. Aponta, também, para a necessidade de
se constituir um encadeamento entre os espaços livres ao longo das linhas, o qual se ampliaria no
entorno das estações, recuperando para a paisagem urbana a antiga barreira representada pelo
traçado da ferrovia na região. Os espaços livres, assumidos como dinamizadores da vida pública, são

142
destacados no estudo como elementos potencialmente estruturadores da região, pelas suas
características simultaneamente funcionais e simbólicas.
Assumindo a dinamização da vida coletiva como forma de recuperar a urbanidade, ou seja, as
relações de convivência equilibrada entre a população e o meio, o estudo “São Paulo Centro”
estabelece três princípios de intervenção nos espaços públicos: a articulação dos espaços públicos
numa rede, constituindo conjuntos interligados; a ampliação dos espaços públicos existentes por
meio da incorporação de áreas internas às quadras e ligações de circulação exclusiva para pedestres;
e a criação de alternativas de convivência entre pedestres e veículos para integrar o espaço público no
funcionamento cotidiano da cidade.
Para a área da Luz, o estudo assinala dois conjuntos de espaços públicos. O primeiro, no bairro da
Luz, envolve o Jardim da Luz e a praça Fernando Prestes, com seus edifícios de entorno, articulado à
rede da área central pelas avenidas Tiradentes e Casper Líbero. O segundo, nos Campos Elíseos,
envolve a praça Pricesa Isabel, a praça Júlio Prestes e o largo do Coração de Jesus, articulando-se à
rede pela avenida Rio Branco.
O papel da reorganização dos espaços públicos na área da Luz torna-se ainda maior pelo patrimônio
histórico-arquitetônico a eles associado. O estudo reafirma seu caráter conjugado enquanto
elementos de expressão urbana, partes de uma mesma unidade espacial, induzindo as intervenções
na área a integrá-los em cenários de alta qualidade, estimulando a percepção e o convívio social dos
lugares em si e sua relação na paisagem urbana da cidade.
O segundo trabalho, “Polo Cultural Luz”, desenvolvido por Regina Maria Prosperi Meyer e o escritório Pólo Cultural Luz

UNA Arquitetos, atendendo solicitação da Associação Viva o Centro, no contexto do projeto


“Implantação do Complexo Cultural Estação Júlio Prestes”, envolveu estudos urbanísticos
abrangendo os bairros da Luz, Campos Elíseos e Bom Retiro e, ainda, um projeto para a praça Júlio
Prestes, enquanto parte integrante do Complexo Cultural Júlio Prestes. Referendando as análises dos
trabalhos anteriores, “Pólo Cultural Luz” propõe duas linhas básicas de intervenção para a área, uma
sobre a orla ferroviária e outra sobre o sistema viário local.

143
Proposta para a praça Júlio Prestes, com esculturas de Eliza Bracher, desenvolvida até
a etapa do projeto executivo (mas não realizada) para a Associação Viva o Centro por
Regina Maria Prosperi Meyer e UNA Arquitetos, 1999
144 Maquetes eletrônicas Clóvis Cunha
Planta do projeto não realizado da Praça Júlio Prestes
1. árvores existentes sobre piso de paralelepípedo, 2. alameda de paus-ferro, 3.
palmeiras imperiais, 4. ipês roxos, 5. bandeiras indicando a programação da praça,
6. piso de mosaico, 7. piso inclinado de granito corumbá apicoado, 8. fontes de
água no piso, 9. entrada da Estação, 10. entrada da Sinfônica, 11. paus-ferro, 12.
piso das calçadas de mosaico português branco, 13. acesso ao edifício, piso de
paralelepípedo, 14. Avenida Duque de Caxias, 15. Alameda Dino Bueno, 16. Praça
Júlio Prestes, 17. Alameda Cleveland

Cortes mostrando diferentes usos da Praça Júlio Prestes


145
Estabelecendo uma articulação entre equipamentos culturais ao longo da ferrovia, da Luz até o
Memorial da América Latina, na Barra Funda, o estudo propõe que as marginais da ferrovia sejam
utilizadas como um extenso passeio público arborizado. No trecho da Luz, são incorporados espaços
adjacentes à Estação da Luz e à Júlio Prestes, incluindo o pátio ferroviário, formando uma esplanada
de uso público.
O redesenho desse trecho implica a demolição do viaduto de concreto e a construção de um outro,
com pistas nos dois sentidos, articulando a avenida Duque de Caxias – convertida para o tráfego nos
dois sentidos – com a rua Prates. O viaduto antigo, metálico, seria destinado à passagem de pedestres,
retornando, enquanto elemento urbano, ao conjunto arquitetônico da Estação da Luz. O estudo
propõe ainda a extensão da rua Prates até a avenida do Estado, como alternativa ao tráfego intenso
da avenida Tiradentes.
Para o corredor norte–sul, o estudo prevê a transformação das pistas expressas em túnel que passaria
sob a linha do metrô, liberando o traçado de superfície da avenida Tiradentes para sua transformação
em grande boulevard, de largas calçadas, adaptadas ao trânsito local e à valorização da paisagem
urbana da região central da cidade. Ainda com essa intenção, o estudo “Pólo Cultural Luz” retoma
propostas anteriores de adaptação da avenida Casper Líbero para uso preferencial de pedestres,
ampliando suas calçadas e valorizando os edifícios históricos lindeiros à via, tornando-a uma
articulação “especial” entre a Estação da Luz e o centro velho. As demais alterações no sistema viário
estão relacionadas à alteração de sentido de fluxos, não implicando intervenções físicas.
O acervo de projetos já propostos para a região apresenta, por um lado, as múltiplas alternativas que
se oferecem para sua recuperação e demonstra, por outro, a necessidade de um plano diretor
abrangente para toda a área central paulistana, em especial para os bairros históricos que
compreendem a área da Luz. A cidade ressente a ausência de um plano diretor para o controle de sua
área urbanizada e, especificamente no caso do centro de São Paulo, de um programa integrado de
ações entre os órgãos públicos que evite intervenções pontuais e que estabeleça, se necessário, normas
e legislações específicas para a proteção dos conjuntos urbanos mais significativos.
Projeto “Pólo Cultural Luz”, desenvolvido por Regina Maria Prosperi Meyer
146 e UNA Arquitetos para a Associação Viva o Centro, 1999
Referências bibliográficas

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Ferro Sorocabana, monografia, xerox, São Paulo, Biblioteca da FAU, s/d.
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Cultura, jan. 1998, no 5.
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Arquitetos do Brasil, jan. 1997.
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KATINSKY, Júlio. "Ferrovias nacionais", in MOTOYAMA, Shozo (org.). Tecnologia e industrialização
no Brasil: uma perspectiva histórica. São Paulo, UNESP, Centro Estadual de Educação Tecnológica
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L’Architecture d’aujourd’hui. Edição especial de “Paris-Londres”, nº 176. Paris, nov./dez. 1974.
LE CORBUSIER. Urbanismo. São Paulo, Editora Martins Fontes, 1992.
LOBELLO, Marino (org.). Estação Júlio Prestes. São Paulo, Editora Prêmio, 1997.
MEYER, Regina Maria Prosperi e UNA Arquitetos. Complexo Cultural Estação Júlio Prestes –
Estudos urbanísticos. Pólo Cultural Luz. São Paulo, Associação Viva o Centro, 1999.
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149
MORSE, Richard. Formação histórica de São Paulo. São Paulo, Editora Difusão Européia do Livro,
1970.
Projeto Funcional – Linha 4 Morumbi/Luz. São Paulo, Companhia do Metropolitano de São
Paulo, 1997.
REIS FILHO, Nestor Goulart. Racionalismo e proto-modernismo na obra de Victor Dubrugas. São
Paulo, Fundação Bienal de São Paulo, 1997.
RINO LEVI, "A arquitetura e a estética das cidades", O Estado de S. Paulo, 15/10/25.
SAES, Flávio Azevedo Marques de. As ferrovias de São Paulo: 1870 – 1940. São Paulo, Editora
Hucitec/Instituto Nacional do Livro-MEC, 1981.
São Paulo Centro – Uma nova abordagem. Regina Maria Prosperi Meyer (coord. geral). São
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SILVA BRUNO, Ernani. História e tradições da cidade de São Paulo (vols. 2 e 3). São Paulo,
Editora Hucitec, 1983.
WARCHAVCHIK, Gregori, "Acerca da arquitetura moderna", Correio da Manhã, Rio de Janeiro,
1º/11/25.

Notas
1 A Estação de Mairinque, uma das mais importantes da E. F. Sorocabana, projetada por Victor
Dubugras em 1906, é considerada a primeira manifestação de modernidade da arquitetura
brasileira: “Em 1906 o arquiteto realizou o projeto para a estação de Mairink, em concreto, que se
tornou famoso como obra moderna, no momento de sua divulgação. O projeto era plástica e tecni-
camente moderno”. Nestor Goulart Reis Filho, Racionalismo e proto-modernismo na obra de
Victor Dubrugas, São Paulo, Fundação Bienal de São Paulo, 1997, p. 61.

150
2Neste edifício, tombado pelo Condephaat, o arquiteto manteve o escritório até sua morte, aos 93
anos, em 1982.
3Artigos publicados na imprensa: “A arquitetura e a estética das cidades”, de Rino Levi, O Estado
de S. Paulo, 15/10/25; “Acerca da arquitetura moderna”, de Gregori Warchavchik, Correio da
Manhã, Rio de Janeiro, 1o/11/25.
4 “Salvo casos individualistas sem maior valor expressional, todas as construções volumosas
estavam nas mãos de firmas construtoras entrosadas com a estrutura governamental. Alguns edifí-
cios que marcaram época nas imediações de 1929 exemplificam a situação existente. A estação da
Sorocabana, projetada inicialmente pelo arquiteto Cristiano S. das Neves e reestudada pelo arquite-
to Bruno Simões Magro, arrastava-se numa construção morosa, depois de ter sofrido o escândalo de
um rumoroso processo judicial, em que as soluções reivindicadas pelo projetista inicial, tais como
mansardas, foram reconhecidas pela Justiça como improcedentes. Sem entrar no mérito nem do
projeto primitivo, nem do projeto remanejado, posto que os horrorosos resultados finais delatam
um nível pouco favorável à qualidade arquitetônica da obra, interessa notar uma circunstância sig-
nificativa: o poder judiciário se instituía como julgador de valores arquitetônicos.” In “Arquitetura
paulista”, de Luís Saia, publicado no Diário de São Paulo, 1959, apud Arquitetura moderna
brasileira: depoimento de uma geração, Alberto Xavier (organizador), São Paulo, Editora
Pini/ABEA/Fundação Vilanova Artigas, 1987.
5 Texto de Christiano das Neves, publicado na revista Architectura e Construção, de 1929, no arti-
go “Arquitetura contemporânea”: “Os hangares de zeppelins não são obras de arquitetura, nem
tampouco tudo que se está fazendo na Alemanha e outros países do norte da Europa nos moldes re-
volucionários do futurismo. São obras de engenharia, em que a solidez e a economia são os únicos
fatores, resultando esse gosto detestável de construção, que absolutamente não poderá medrar”.

151
Implantação do Complexo Cultural Estação Júlio Prestes
Empresas contratadas pela Associação Viva o Centro

Este livro faz parte do projeto Restauro e reciclagem Estudos e projetos Edição do livro

“Implantação do Complexo Cultural geral do edifício urbanísticos Pólo Luz, Sala São Paulo,
cultura e urbanismo
Estação Júlio Prestes”, apoiado pela Coordenação do Análise e estudos de
Lei de Incentivo à Cultura do projeto básico requalificação urbana Serviços de produção e
Ministério da Cultura, que Acunha Solé Engenharia Ltda. da área adjacente ao coordenação editorial do livro

compreende o desenvolvimento dos Complexo Cultural Júlio Editora Terceiro Nome Ltda.
Concepção e estudos preliminares,
projetos básicos de restauro da Prestes e projeto executivo
anteprojeto e projeto básico de Serviços de projeto
da praça Júlio Prestes
Estação Júlio Prestes e de reciclagem arquitetura, memorial descritivo e e produção gráfica
do edifício para sua transformação Regina Maria Prosperi Meyer e
planilhas quantitativas e Editora Marca D’Água Ltda.
UNA Arquitetos S/C Ltda.
em sede da Orquestra Sinfônica do orçamentárias
Serviços de impressão
Estado de São Paulo (Osesp) e para Dupré Arquitetura e Levantamento planialtimétrico
e acabamento do livro
abrigar a Sala São Paulo, assim como Coordenação S/C Ltda. e cadastral em terreno
Hamburg Donnelley Gráfica
a realização dos estudos urbanísticos na praça Júlio Prestes
Concepção e estudos Editora S.A.
e alameda Cleveland
para a inserção do Complexo no preliminares, anteprojeto e
contexto da região da Luz. Etagri – Serviços de
projeto básico de instalações
Engenharia e Construções Ltda.
Pela Associação Viva o Centro, hidráulicas, elétricas e
envolveram-se diretamente na chuveiros automáticos Projeto executivo

viabilização da integralidade deste ("sprinklers") de paisagismo da praça

projeto, desde sua conceituação até o Etip – Projetos de Engenharia Júlio Prestes

acompanhamento em todas suas S/C Ltda. Bonsai Paisagismo e Comércio


de Plantas Ltda.-ME
fases, Marco Antonio Ramos de Concepção e estudos
Almeida, Jorge da Cunha Lima e preliminares, anteprojeto Projetos executivos de elétrica,

Regina Maria Prosperi Meyer. e projeto básico de ar telefonia e hidráulica

O projeto de reciclagem da sala con- condicionado e exaustão na praça Júlio Prestes

tou com o apoio fundamental de Spm Engenharia S/C Ltda. e alameda Cleveland

Antonio Ignácio Angarita Ferreira Ramoska & Castellani


Concepção e estudos
Projetistas Associados S/C Ltda.
Silva, secretário do Governo e Gestão preliminares, anteprojeto e
Estratégica, Dalmo do Valle Nogueira projeto básico estrutural, Projetos executivos de

Filho, secretário adjunto do memorial descritivo e luminotécnica para

Governo e Gestão Estratégica, e do planilhas quantitativas a praça Júlio Prestes

consultor Mário Eduardo Garcia. O Vantec Estruturas Ltda. e alameda Cleveland

projeto contou também com a par- Franco & Fortes Lighthing


Consultoria em acústica para
Design Ltda.
ticipação da Artec Consultants Inc., transformação da Estação Júlio
contratada pela Secretaria de Estado Prestes em sala de concertos

da Cultura. Acústica & Sônica – Assessoria


Para a realização do projeto, a Técnica S/C Ltda.
Associação Viva o Centro recebeu o
patrocínio da Telefônica,
Nossa Caixa-Nosso Banco S.A. e
BankBoston Banco Múltiplo S.A., e
UNA Arquitetos, 1996

contratou os serviços das seguintes


empresas:
153
Profissionais participantes
Empresas contratadas, Associação Viva o Centro
e Secretaria de Estado da Cultura

Adriana Gazoti Edvar Chanhi Pires Patrícia França


Adriana Ribeiro de Mendonça Elisa Bracher Paula A. Kawano
Airton de Souza Lobo Vianna Fábio Rago Valentim Paula Izzo
Akira Tomori Fernanda Barbara Paulo Fernando Presotto
Alcino Izzo Júnior Fernando de Mello Franco Polyana Frangetto
Alexandre da Fonseca Estevez Fernando Felippe Viégas Rafael Leão
Alexandre Presotto Junior Fernando Medeiros Alcoragi Regina Maria Prosperi Meyer
Altino Gianesini Gabriela Martins Reinaldo de Almeida Lopes
Aluízio Amaral Monteiro Leite Gilberto Franco Reinaldo Lopes
Amaury Pereira da Silva Giovanni Palermo Renata Maradini
Ana C. Moraes Gustavo Rosa de Moura Ricardo Vianna
Ana Paula Esquierdo Nicolau Helena L. Cerezer Roberto Zocchio Torresan
Ana Paula G. Pontes Heloísa Hachul Robson Rodrigues
André Caperutto Hiromitsu Miyasato Rogério Moreira Souza
André Caperutto de Almeida Ismael Geraldo Acunha Solé Sandra Maria Dias
André V. de Aguiar Jari Roberto da Silva Sarah Feldman
Andrea Manera Miranda José Augusto Nepomuceno Sérgio Massayuki Shimabukuro
Andrea Semeghini Dupré José Germano Soares Sérgio Sampaio Filho
Anita Toshie Ueda José Paulo Teixeira Sérgio Schneider Moraes
Antonio Carlos Castellani Keity R. C. Gomes Suely de Oliveira Abreu
Antonio José Ayres Zagatto Luciana Soncini Mateus Tatiana Feltrin Perobelli
Apoena Amaral e Almeida Luciane Antunes de Oliveira Tatiana Vianna Vendramim
Arnaldo Ramoska Luiz Carlos Felizardo Teresa Cecília Ramos
Beatriz Bueno Pinto de Queiroz Luizette Nero Davini Tetsuo Miasato
Bento Carlos Martinez Neto Marcelo Laurino Valéria D’Agostini
Bianca De L. Scheffer Marcelo Pucci Valéria Paulo D’Agostino
Carlito Carvalhosa Marco Aurélio Santana Walter Raimundo da Silva
Carlos Fortes Marcos Vinícius Campos
Carlos Roberto M. Morais Marcus Vinícius Jaeger
Cássia Schroeder Buitoni Margarida Cintra Gordinho
Catherine Otondo Maria Cecília Cerroti
Cesar Shundi Iwamizu Maria Eugênia Régis
Cíntia Alen Coutinho Maria Isabel Locatelli
Cláudio Rodrigues Dreyer Maria Tereza Trindade e Silva
Cristiane Muniz Mariana Felippe Viégas
Debora Gomes Pereira Marne D. Rosa
Dilnei R. Contassot Mary Lou Paris
Dominique Ruprecht Mauro D. Rosa
Scaravaglioni Mauro Pucci
Edemir C. Simonato Nelson Dupré
Eduardo Chalabi Pablo Emílio Hereñú
UNA Arquitetos, 1996

155
Coordenação geral Coordenação editorial ISBN: 85-87556-01-0
Associação Viva o Centro Editora Terceiro Nome Dados Internacionais de Catalogação na Publicação CIP
Consultora Editora
(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Regina Maria Prosperi Meyer Mary Lou Paris
Polo Luz: Sala São Paulo, cultura e urbanismo
Assistente de produção textos de Regina Meyer e Alcino Izzo Júnior
Textos Dominique Ruprecht Scaravaglioni Fotos de Luiz Carlos Felizardo
Pólo Luz São Paulo: Editora Terceiro Nome, 1999
Pesquisa
Espaços para a vida urbana Paula Izzo
Regina Maria Prosperi Meyer Vários Patrocinadores.
Preparação de texto Bibliográfia.
Estação Júlio Prestes Maria Eugênia Bittencourt Régis ISBN: 85-85118-29-6
Sala São Paulo
Propostas para a área (1974-1999) Revisão
1. Complexo Cultural Júlio Prestes (São Paulo,
Alcino Izzo Jr. Maria Eugênia Bittencourt Régis
SP) 2. Estação Júlio Prestes 3. Luz (São Paulo, SP) –
Teresa Cecília de Oliveira Ramos
Descrição 4. Renovação Urbana – São Paulo (SP) 5. Sala
Fotos Projeto e produção gráfica São Paulo (São Paulo, SP) 6. São Paulo (SP) –
Luiz Carlos Felizardo Editora Marca D’Água Urbanismo I. Meyer, Regina. II. Izzo Júnior, Alcino. III.
(onde não consta crédito junto à foto) Margarida Cintra Gordinho Felizardo, Luiz Carlos. IV. Título: Sala São Paulo
Debora Gomes Pereira
Sandra Maria Dias 99-4393 CDD–711.570981611
Projeto gráfico
Índices para catálogo sistemático:
Carlito Carvalhosa
1. São Paulo: Cidade: Cultura e urbanismo
Fotolito Planejamento urbano 711.570981611
Editora Marca D’Água
2. São Paulo: Cidade: Urbanismo e cultura
Impressão e acabamento
Planejamento urbano 711.570981611
Hamburg Donnelley

Impresso em São Paulo


2000
LEI DE
INCENTIVO
À CULTURA

MINISTÉRIO
DA CULTURA

Capa: Moema Cavalcanti

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