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Villaça Koch
(org.)
GRAMÁTICA DO
PoRTuGcÊs FALADO
Volume VI: Desenvolvimentos
2' edição revista
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Ur..1v1:.R;m,,.DE E-;T ..,DUAJ nr C.\Ml'IN11'
Reitor
CA;t:_llS H[:-.Jl\ll~l'l' ~li- P,1111·: Cillli..
UMICAMP
Conselho Ediwrial
A1n1< l'fU,l\A - A:--.Ttlhitl C.1:,lilS B'\C:J\W.~rn
Josr A. R. Gt'hTIJu - PAUL~1 FK~h;.'Jlll n - R.lAllllO A~ mo
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11.'l 11
2
A REPETIÇÃO NA LÍNGUA FALADA COMO
ESTRATÉGIA DE fORMUL\Çi\O TEXTUAL
1. A repetição na fala
Mais do que uma simples característica da língua falada, a repetição é uma das
1·stratégias de forn1ulação textual mais presentes na oralidade. i Por .ser un1a estra-
l(·~ia de grande 1naleabilidade funcional, a repetição assun1e un1 variado conjun-
to de funções. Contribui para a organização discursiva e a rnonitoração da coe-
rl·ncia textual; favorece a coesão e a geração de seqüências n1ais compreen-
síveis; dá continuidade à organização tópica e auxilia nas atividades interativas.
llisso tudo resulta un1a textualidade n1enos densa e n1aior grau de envolvi1nento
illlL'rpessoal, o que toma a repetição essencial numa gramática da textualização
na língua falada.
Na fala, as repetições apresentarn características de u1n planejan1ento
li11~liístico on-line con1 traços de un1 texto relativa1nente não planejado (Ochs,
1')79). Como fonna de organização textual-interativa, as repetições conduze1n
i1 produção de seg111entos inteiros duas ou 111ais vezes, n1otivados pelos n1ais
t!iversos fatores, sejam eles de orden1 interacional 1 cognitiva, textual ou sintá-
tlra. Na escrita, con1 a possibilidade de revisão e editoração, con1 apagan1entos
s11ressivos, só se obtén1 a versão final) dilninuindo a presença da repetição. Na
fala, em que nada se apaga, a repetição faz parte do processo de edição. Sua
prl'sença na superfície do texto falado é alta, constatando-se que a cada cinco
105
111
palavras, cn1 rnédia, urna é repetida. É por isso que a repetição ten1 avaliação e lunllor); n1as na linha 7 o você refere-se apenas ao interlocutor. Referir, portan-
papel diverso na fala que na escrita. 111, não é u1n ato linear que aco1npanha a repetição enquanto tal. ;\lanter o tópico
1
li
Este esludo pauta-se na perspectiva textual-interativa, fonnulando a hipótese rn·1n se1npre equivale a 1nanter os referentes indiciados pelos n1esn1os itens le.xicais. ,'I
!1
geral de que, na fala, os padrões sintáticos têrn íntiina relação con1 os padrões /\ rl'pctição pron1ove coesividade, referencialidade e topicidade, n1as não
interacionais, de modo que certas propriedades sintáticas de superfície são co11- luH·aridade, pois cada uni desses processos len1 características próprias.
1
l'I
1
troladas, no nível discursivo, e1n função de propostas co1nunicativas, inas as ações O certo é que identidade e diferença, soh o aspecto lexical, não equivalem 11
interativas são geradas no fluxo de padrões sintáticos en1 andatnento. que opera1n "Identidade e diferença sob o aspecto referencial. Caso típico é o da pal'tíjrnse' 1
co1no base sobretudo para a coesividade, a continuidade tópica, a con1prcensão, q11t•, e1n geral, 1nanifesta-se con1 diferenças lexicais para gerar ideutidades
111:
a interação e a argurnentação. A repetição não é u1n descontinuador textual, n1as n.·/i'renciais, o que não é garantido ne1n tncsn10 no caso da repetição integral, I',.
unia estratégia de con1posição do texto e condução do tópico discursivo, tal co1no 1 D1110 1nostrou o cxe1nplo acima. E esta é une1 regularidade bastante grande na '
já defendido em Koch et ai. 0990) e Koch e Silva (1996). Lda que, e1n virtude das condições de produção, lança 1não da repetição con10 ~ '
H
1·:-.1ratégia facilitadora, rnas que nen1 scn1prc equivale a unia linearidade referencial. jl
Numa definição funcional, pode-se dizer que repetiçtio é a produçclo de :1
2. ;Voções gerais \t'g1uentos discursivos idênticos ou sente/bantes duas ou rnais vezes no 111,
11111/Jito de tttn rnesn1u evento co111unicativo. Nessa definição, entratn \'ários
Intuitiva111ente, todos ad1nitiinos que repetir é produzir o 1nesn10 seginento 11·nnos a sere1n esclarecidos. Assiin:
lingiiístico duas ou 1nais vezes. Contudo, a repelição não é u1n sitnples ato ine- 111'
talingiiístico, pois ela e,spressa algo novo. Marcadores. tais como repetindo, como a. a expressão seg111en to discursivo designa qualquer produção lingiiís- 1.
jd disse, quer dizer, enz su1na etc., poden1 ser avisos de que se trata de un1a 1u ·:1 de u1n texto oral, seja ele uin scg111ento fonológico, un1a unidade lexical, un1
repetição, n1as não avisos de que se vai dizer a 1nesn1a coisa si1nples1nente. No "111ta~1na (u1n constituinte suboracional) ou 111na oração; 1
1
tanto1 repetir as tnesuzaspalavras nurn evento conzunicativo não equivale a ~·ao e.rata;
dizer a tnesn1a coisa. O exe1nplo a seguir ilustra clararnente este aspecto: 2 c. o tern10 senzelhante aponta para a produção de u111 seginento co1n vari- 1
,,~·ao, seja no iten1 lexical, na estrutura (ou parte dela), incluindo-se aí a variação
(1) 1 Ll: você cornpra uni carro carro x prosôdica;
2 você alu::ga... 0 carro x d. a expressão evento co1nunicativo designa 11nu1 unidadc de interação
.1 quando você acaba de pagar dt·sde seu início até o final. Esta especificação faz con1 que a repetição seja
4 1:.
você troca por outro 0 carro y observada no ün1bito do 111es1no evento conn1nicativo con10 condição necessária
5 aí você continua alugando o carro carro z p:tra consideração.
6 você não te1n carro nunca carro n
7 L2: e você vê ... isso isso está descapitalizando o cidadão Aprimeira entrada do segmento discursivo depois repelido é designada como li'
(02-REC-266: 525-529) 11u1triz (ili). A1l1 caracteriza-se por operar con10 base ou n1odelo para a proje-
1·;10 de outro segmento construído à sua semelhança ou identidade, chamado de
Note-se que os referentes de carro varia1n quase a cada vez que aparece a l'<'/1í'/içtio (R). Neste sentido, aM pode condicionar aR em vários níveis: fonológico
palavra no testo. Aretomada é do ponto de vista textual e envolve sentidos que ( l1ic\uindo-se aqui os apspectos prosó<licos), n1orfol6gico, sintático, lexical, se-
cstabelecen1 a continuidade tópica, nuLs não a identidade referencial.] á no caso 111;111tico ou prag1nático, 1nas não iinpede a criatividade ou atividade refonnuh1dora.
de wcê temos algo mais complexo. Parece que o você das linhas de J a 6 refere um ,\ N não é un1 si1nplcs espelhan1ento auto1nático, pois a1tf te1n uma funç.ão pa-
li
indivíduo genérico do tipo '·a gente" (que inclui, entre outros, locutor e inter- radign1ática na relação co1n aR.
106 107
il
1 •.
I'
11
1
li
1
1 ,I
Apartir dessas posições e da estrutura da produção discursiva, obtém-se Observe-se a peculiar estratégia (contra) argumentativa aqui desenvolvida ·1·i
classe da auto-repetição, que chega a 80% de todas as R. Isto sugere que as ~1qui (> si1nétrico inclusive nos procedin1cntos sintáticos de elipses nos 1nes1nos :11
repetições não constituen1 a estratégia 111ais usada para a pro1noção do en- l1j
p1111tos da cadeia, por exe1nplo: ~
volvin1ento interpessoal. 4
111
Aalta incidência daR na fala levou Tannen (1987, 1989) a defender a tese 6 é morar no centro da cidade
de que a língua falada realiza-se em alto grau baseada na "pré-padronização". 0 } perto ue tudo ...
Assim, muito do que se diz não passaria de uma repelição de estruturas pré-fa- 13 é 1norar onde você respire :f,
bricadas. Isto faz con1 que a fala tenha, não obstante sua característica de espon- 0 } onde você acorde de n1anhã
taneidade, um alto grau de formulaicidade. Tanto assim que Tannen (1989, p. 37) 'i
conclui afirmando que "a fala é menos livre1nente gerada, mais pré-padronizada Aestrutura da matriz é e1n grande nún1ero de casos a base para clisõcs 1
do que a n1aioria das atuais teorias lingüísticas reconhecem". .1rrrscin1os ou expansões, inversões, focalizações, seleções etc na construção '11
Atítulo de ilustração, vejamos o segmento (2), que é paradigmático sob da//. Na realidade~ a 1i1 condiciona tanto o tópico co1no uma parte das estraté- "ljl
vários aspectos, e reproduz uma discussão entre dois falantes, um olindense e 1'.las forn11tlativas. 'I
outro recifense, cada qual mais bairrista que o outro: l
11
11,1
(2) L2: eu acho que o meu conceito de morar bem é diferente 1. Manifestações da repetição i
2 pouco da maioria das pessoas que eu conheço
3
11111
l11
a 111aioría das pessoas pensa As repetições se 1nanifestan1de1nuitas 1naneiras e são rnultifuncionais. Sob 1
l1.Ii,
4 que morar benz o ponto de vista do segrnento lingüístico repetido, te1nos:
5 é tnorar num apartamento de luxo ...
6 é morar no centro da cidade .. a. repetiçõesfonolôgicas (aliteração, alongamento, entoação etc.);
7 perto de tudo ... b. repetições de morfemas (prefixos, sufixos etc.); 1!
1
8
1
(D2-REC-05: 1.012-1.022) (repetições con1 identidade de fonna), ou con1 variação ( un1 verbo se nonlinaliza, li
1111 uma forma singular vai para o plural etc.). Observe-se que a R integral, aquela
que reproduziria a1lf exatan1ente, é 1nais rara do que all co111 variação, scn<lo
!08 109
que essa variação aun1enta se considera1nos o aspecto prosódico, pois é 1nals E1n (3) tc1nos urna estrutura narrativa típica da fala e que se reproduz
difícil, por exemplo, 1nanter a entoaçtlo constante ern todos os segn1entos 111111u·ras vezes nos textos do projeto r<rRc. Conco1nitante à narrativa, acha-se
repetidos. De resto, quanto rnaior o scg1ncnto discursivo repetido tanto maior 1111a argu1nentação betn estruturada, con1 n1arcas introdutórias que indica1n
a variação. 1
1posiçües te1nporais e encadeian1 seqüências de fonnas, por exe1nplo:
1u!
Como as l? baseiam-se na recorrência de elc111entos lingüísticos, elas apre·
senta111111uitos c~Lsos de paralelis111os e si1nctrias, tanto na construção textuaJ elltão antigamente (( abrifl I fazia))
co1no nas situações discursivas. Veja1nos aqui u1n exe1nplo con1 .si!netrias notáveis 1 agora ( ( depende I faz/ é))
sob o ponto de vista morfológico (uma espécie de continuidade temporal) e do 1
3 e aprendia a fazer a coisa .. As repetições n1orfológicas relativas ao te111po verbal atua1n con1 a função
4 agora
tl1· len1jJoraUzaçâo. Por outro lado, cstabelece111 relações discursivas interes-
5 ele depende ... de znuitas outras pessoas pra fazer a n1esn1a coisa ... '>:111tes ao aspectualizaren1 a argun1entação situada en1 te1npos contrastlntes, que
6 só que faz em menos tempo
7 clil'{·rencia111 a natureza das ações praticadas.
é 1nais lucrativo sei lá. [certo? As diversas fonnas de rnanifcstação da R gera1n cerca de 50 tzjJos de
8 L2:
1ahn ahn r1•/wlição, sem contar as R fonológicas e morfológicas. 1• já que neste trabalho
9 Ll:
então ... antiganzente se eu quisesse calcular urna ponte. v:unos concentrar-nos apenas nas repetições lexicais, sintag1náticas e oracionais,
10 eu ca{cu{ava ..
11 uu seja, nas que apresenta1n seg111entos discursivos acin1a do nível n1orfcmático. I'
dava para uni desenhista Ein tennos gerais. as tendências rnanifestadas nos 1nateriais analisados no 1
12 ele desellhava ..
13 corpus do Projeto Nt.:ac foratn as scguintes: 7 111
eles tênz un1 ternlinal de co1nputador certo? e, se possível, dentro da 1nesn1a estrutura frasa!; 11
(D2-SP-343: 897-915) " as R integrais n1ais conn1ns são de itens lexicais, sendo que as R oracionais 1
110
J1l
• finalrnente, do ponto de vista estatístico, a fala apresenta cerca de 20% de seus
illi
As R le.vicais 1nenos freqüentes são as distanciadas, isto é, aquelas que apa- li
1nateriais repetidamente, o que não equivale, auto1natica1nente, a unia disper.
são informacional ou rarefação do conteúdo. ''""'lll em tópicos diferentes. Muitas vezes temos dificuldade de saber se se trata 1\11
c\1· 111na repetição, n1as em certos casos tem-se, de fato, u111a reto1nada do próprio
111pirn. Vejam-se os trechos (9 e iO):
Estes resultados inostra1n que a repetição é un1a estratégia usual nas ati·
vidades de formulação textual e contribui de forma decisiva para a formação de
1'11 Li: tu participas de algum grupo ... assim de:: social EXTRA-universidade
cadeias discursivas. Veja1nos alguns exen1plos característicos das diversas assim clube ..
fonnas. ·,ii
( (retomando o tópico três minutos após esse turno))
Li: eu eu eu participo/ eu tenho/ eu sou associada de um clube ..
3.1 Repetição de itens lexicais (D2-REC-340: i37 e 185) 1
(D2-REC-05: .li9-2i) O grande proble1na já apontado para as R !R.x.Y:~s·é S&bei: distinguir entre l
(5) Li: então daí casou foi casando casando todo muudo e de repente ...
a repetição de un1a forma e a repetição de un11nesn10 referente. Continuidade j,
referencial e continuidade co-textual não se equivalem. Veja-se o caso de (8) em
(D2-REC-.l40: 664-5) que as duas prilneiras ocorrências de cavalo de cão usam a expressão, ao !
passo que nas outras duas ocorrências a expressão é 111encionada.
( 6) L2: a sociedade de consumo é diferente ... ela tem que pensar em produzir 1
Ll: pronto
11
L2: e não e1n eco1101nizar ... econonzizar é unia consequência
3.2 Repetição de estruturas sintagmáticas
(D2-REC-266: 581-5) 111
112
113
i 11
, 1
11 10 1.2: hahã
porque isso que nos n1ata sobretudo 11 I
12 11 LI: aí as crianças fazem esporte aí eu ... [tam bérn participo
é a pressa 1
verbos e no1ncs, sendo raras as repetições de adjetivos e advérbios isolada- ele paga lá o clube nê? 1\
20 Ll: é
n1ente, a não ser que se trate da função de ênfase, con10 no caso de "ele falava
tanto !auto tanto que acabou cansando todo 1nundo'', Isto pennite supor
que a repetição te1n a ver cotn os aspectos centrais da condução tópica (e a
(D2-REC-340: 393-415)
I',
Note-se que os itens clube, praia, inverno e jJíscina aparecera111 várias 1'1
manutenção da coesividade pela via do léxico), que se dá em geral a partir dos
vezes repetidos e nunca prono1ninalizados, pouco in1portando a posição sintática l,1
núcleos oracionais constituídos por nornes e verbos. Por outro lado, predo-
minam asR de SNs plenos (em posição pré- ou pós-verbal) fazendo um jogo,
e o status infonnacional. Na verdade, deve-se ta111hé1n ter presente que esses ~
tern1os nen1 sen1pre tê1n o lnesn10 referente, o que é 111ais un1 fator a irnpedir sua
ao nível sentencia], co1n respeito ao status infonnacional desses elernentos.
1
114
1t5
llu
aos sintag1nas e itens lexicais, pois nestes aparecia1n 111ais J( lntegrais. Isto se 8 1.2: que já é um problema grande
deve, ein parte, ao fato de as orações sere111 fenô1nenos mais con1plexos. Os <) Ll: já é um grande problema
segmentos (LI e 14) ilustram esse fato:
IOL2: já é um grande problema
(D2·REC·266: 53.'\.544)
(13) 1 12: [ ... ] eu por exemplo tenho ouvido coisas notáveis
2 de [ Dom Hélder no programa das seis A linha 3 contém a MI que traz uma indagação citada (citação de fala) e
3 11: [é óbvio
qn<' logo a seguir (linha 4) é repetida 1u forma modificada para um discurso
4 L2: horas [da manhã
111direto (citação do conteúdo). Mas essa produção se baseia na estrutura
5 11: [sim que é que tem isso
.\ 11gerida an teriorn1ente (corno é que eu vou .. . ?li conzo é que ele vai ... ?) .
'li
,1
'1
6 12: verdadeiras lições [de vida
la as linhas 8 a 10 trazem heterorrepelições, em que LI (linha 9) repele 12 '"
7 LI: [que é que tem isso' (linha 8) co1n un1a inversão sintática (un1 quiasma sintático) que se torna uma
'
8 12: é um homem inteligente ... nova J11 repetida por 12 (linha 1O). O que se nota é que as R oracionais têm
I'
cada dia Do ponto de vista das funções," as repetições atuam tanto no plano da
co111posição do texto, e111sua1naterialidadc e seqüenciação das cadeias lin-
(D2·REC·05: 23:l·249) gliísticas (relações co-textuais) quanto no plano discursivo de caráter n1ais
1 1,
g\o bal relacionado aos aspectos interacionais, cognitivos e pragináticos (relações
Observe-se que as linhas 8 a 11 tê1n uma série de orações com a n1es1na
estrutura V+SN mudando apenas o complemento do nome. O resultado é uma
sociocontextuais). J
No plano da textualização, a repetição atua com as funções básicas de:
listagem a que nem o preocupado parceiro LI, que antes reclamara do tópico (a i
1·oesivídade (seqüenciação, re(erenciação correção, expansão, parcntetização, 1
auto· repetição da linha 7 em relação àAf da linha 5), resistiu, produzindo ele 1
mesmo umaR na linha I 1 para completar a listagem. t'nquadran1cnto). No plano discursivo, a repetição ten1 u1n número 111ais expres-
sivo de funções e colabora para: conipreeusão (intensificação, esclarecilnento); 11! 1
As R oracionais são rnuito utilizadas para promover o envolvimento e
para contra.argumentar. como ainda veremos adiante. O trecho (14) ilustra o continuidade tópica (amarração, introdução, reintrodução, delimitação);
envolvirnento: argumentatividade (reafirmação, contraste, contestação); interatividade (mo·
nitoração da tomada de turno, ratificação do papel de ouvinte, incorporação). !;f 1
116 117
,,
.,
1
do para a coesão seqüencial, 1nas se achain n1uito presentes tatnbérn na coesão
I,
referencial do texto falado. 5 não se sabe quem:
1
Uma estratégia con1um no caso da coesão seqüencial é o princípio da 6 não se sabe nada 11
listagem. Trata-se da formação de listas facilmente identificadas como parale- (D2-REC-266: 1.094-1.098)
!is1nos sintáticos, geraltnente con1 variações lexicais e rnorfológicas e 1nanuten- '1,1
ção de urna estrutura nuclear. Seus fonnatos são os inais variados. Essas listas As listas são importantes e rnuito usadas porque, alé1n de constituíretn
.1111:1 l'stratégia con1u1n para a conexão inter-frástica, elas criarn un1 rit1110 especial I ''
pode1n constar de palavras, construções suboracionais ou orações. Basta vol- 1 ,,
(15) 112:// vocêconheceíndiaquemorreudeamor Quanto ao aspecto interacional, as listas poden1 ser produzidas por 11111 i1 1
2 você conhece índia que nzorreu de anzor "ºfalante ou apresentar utna estrutura colahorativa con1 a participação de dois 11.,1
J você conhece índio que tnorre1t guerriando pela an1ada !:dantes na sua elaboração como no caso do já citado exemplo (13), ao serem
4 você conhece índio que tnorreu ern luta de tribos rn1nentadas as virtudes de Do111 Hélder, ou então con10 neste caso: '! 11
5 você conhece índio que foi n1orto
6 porque o outro queria tomar a chefia da tribo
118) 1 LZ: ouvir música 1111
1
,li
2 ou.vir nzúsica antiga 1 1
7 queria virar pajé 3
4
cantar essas 1núsicas ... éh do::
do::
'l :I
8 etccétera i
il.',1
9 etccétera 5 do Lupicinio Rodrigues !1l i'
6 LI: do: Orlando Silva né' 11111,
(D2-REC-266: !i4 l-!.750) 7 L2: doA/temar Dutra.. esse negócio aí
9 Ll: Silvio CAL: das.. esse jJOl'O todo ,J 11
Tatnbém ten1os a típica série ordinal que pode ser continuada con10 nu- (DZ-REC-340: 1.618-1.623)
n1eração aberta: 11,I 1
1
Observemos o trecho (19) em que há uma scqücnciação baseada parcial-
06) 1 L2: então a rnulhe volta a primeira vez
2 essa senhora volta a primeira vez
1nente en1 listagens e) parcialn1cnte, en1 reton1adas lexicais: '~ 1
111
3 volta a segunda vez ( 19) l 12: se un1 can1arada chega uo 1neu consultório 1J:1
4 i•olta a terceira 2 seu escritório
110 '
5 volta a quarta . 3 e encontra aquela BELEza ele ambiente 1
. 1
1 '
118
119 1
1
As listas fornecem u111a estrutura con1 base na qual faze1nos todos os preenchi- liasc, a que chamo de suporte; e a variação que forma propria111ente os elen1entos
mento dos vazios sucessiva111ente gerados. O exe1nplo abaixo inostra con10 se da listage111 configura o novo, quei por sua vez, recebe com freqi.iência u1na
vai de uma unidade frasa! completa até uma unidade frasa! composta por um c·ntoação constante. Alistage1n é l11na forn1a econôtnica de con1entar e sustentar o
simples item lexical:
Hipico sem desviar.
Supooho que seria possível defender a hipótese de que as listas manifestam
(20) 1 L2: [ .. J o negócio tá aí pra quem quiser ver
111na das tendências centrais da fala quanto aos deslocarnentos sintáticos. Refiro-
2 o índio pegando moléstias venéreas
1111· ''preferência de deslocar tudo para a direita e não fazer a seqüenciação à 1
1
11
5 { () ) pegando gripe
1·squerda dos núcleos oracionais, já que a listagem não é um procedimento de
4 { () ) pegando sarampo
5 LI: { fj ) vírus
111picalização mas de rematização constante. O princípio de listagem na fala me-
l 11 1
6 L2: { () ) catapora n·rcrü1 um estudo à parte, pois representa u1na estratégia 1nuito peculiar de
lt'\'tualização e1n oposição à escrita. As listas na escrita são 1nais raras e serve1n
d! . 11'
7 etcétera
para produzir nítidos efeitos de sentido. 11 >
8 etcétera
fhi ainda un1 conjunto de estratégias que visatn à con1posição textual no
(D2-REC-166: 1.755-1.760) jo~o de construção-reconstrução de estruturas com base e1n atividades de
[ I'
rt'\H~tição.Veja1nos o seg111ento (22), cn1 que un1a estrutura é composta com a 1111 '1
Con10 se viu, é comum as listas repetire1n integraln1ente apenas u1na parte
da frase. É bastante controversa a sugestão de que os enunciados subseqiientes "recolha'' de partes do discurso anterior. Este procedin1ento coesivo está entre
sejam elípticos, quando se eliminam sucessivamenrle elementos, mas o certo é as estratégias de formulação textual que envolvem às vezes processos de re- 'li
que para se enrender u1n enunciado nu1na lista é necessário pressupor pelo construçâo de estruturas. 1
Ili ':
(2 I) 1 LI :os presentes que eu ganhava lá 5 n1as a gente tenz grupos de danças assin1 que não ten11nui :ta di-
2 eram por exemplo vulgação i'I
]li i
3 eram o lenine né? 6 rnas que são nzuito bons
4 eram o: Zé Rocha (ll2-REC-240: 1.342-1.353)
5 que era um pessoal de Lula Cortes il
6 Te111-se aqui u1na repetição e111 que os elen1entos :.mteriores são aproveitados 1
na suposição da reiteração daquela estrutura. A reiteração é sustentada por uma 3 éh eu preciso trazer planta da rua 1
4 e levar pro meu prédio pra plantar
I,'
120 tll 1
\'i
1 :11
1
5 eu chego a gastar por exemplo cento e setenta pau de táxipm pegar 1 LI: não é que eu goste não
planta 1 '
6 pra trazer pro meu jJrédio 5 que eu acho engraçado ... é Eduardo Dusek
(D2-REC-340: 1.306-1.309)
(D2-REC-340: 678-681)
Corno se nota, as R nos n1ais diversos fonnatos têm utna presença sig-
Neste caso, boa parte das linhas 5 e 6 é un1 an1álga1na de partes antedores.
Quando isto é feito por dois interlocutores resulta nu1na atividade discursiva nificativa no processo de construção do texto falado, providenciando a scqüen-
'
extre111a1nente colaborativa, pois os interlocutores vão sucessiva1nente apro- 1·ia<.:ão e o encadea111ento dos enunciados e servindo con10 estratégia de coesão !
110 texto. A peculiaridade dessas estratégias 1ncrece destaque por seren1 elas
veitando materiais lingüísticos prévios. É o que ocorre no segn1ento (24): 11
pn-ensão todas as li que dão pistas para entender o que se quer dizer. Não se
veitando parte <los 1nateriais do interlocutor e construindo co!aborativarnentc o
texto nurna espécie de a1nalga1nento de idéias e linguage1n. lrata de dar a entender algo de 1naneirae.\11fícita enunciando e111 proposições Ir'.
(25) 1 f .. ] qua11doeusaio 127) 1 1.2: [ .. ] mas eu acho que ele falava tanto
do trabalho 2 tanto
2 cu quero DISTÂNCfA
do trabalho 3 tanto
3 eu quero n1e tornar alienada do trabalho
4 LI: quando eu saio 4 e eu o ad1nirava 1nuito
5 eu tinha a impressão 1 .. ] !li
(D2-REC-340: 45!-454) (D2-SP-360: 1.519-21)
Essa estratégia de forn1ulação às vezes ajuda a jJarentetlzar, 11 na 1nedüht
en1 que u1n certo início é interro1npido, seguindo-se 11111a breve inserção textual,
Já o caso (28) é típico para uma série de repetições que têm por finalida-
dl' transfonnar e1n tópico o que era u111 silnples con1entário, pela ênfase dada
para logo ocorrer uma retomada do tópico com a repetição da última construção
produzida antes da interrupção. Veja-se este exemplo: ao item repetido.
(26) 1 LI: o único roquista que cu conheço (28) 1 LI: de repente se você for fazer um levantamento cm todo o
2 acervo que tá aí hoje já virou un1 sa111ba de crioulo doido
2 que eu acho engraçado
3 L2: que1n é? 3 cu acho
4 L2: não 1nas esse srunba de crioulo doido
122
12l
1
1
11
11 i\
i 1.
i 1
1i1
5 é nossa CULTURA .. ohservare1n que densidade e ralentan1ento infonnacional não se opõe1n mas são 1 '
riquíssitna 1 ''
modos diversos de processan1ento. É justan1ente esse ralenta1nento observado na
6 é nossa formulação discursiva da fala que a faz diferente da escrita.
7 esse samba do criou/o doido 11
8 é a nossa cult! 1
(D2-REC-05: 1.467-76) 1 i
i.1
Se do ponto de vista da organização textual, ali tem como função colaborar '
AsR com função de esclarecin1ento explicita1n as inforn1ações co1n expan- ro1n a coesividade, do ponto de vista discursivo, ela serve para introduzir, i 1'
sões sucessivas, seja pela repetição con1 variação ou con1 pequenas paráfrases. n·introduzir, n1anter ou delirnitar tópicos. Ka verdade, isto tern a ver corn a 1 i
Este é o caso do fragmento (29): 111:Lnutenção da "fluência discursiva'', tal como observaram Koch e Silva ( 1996) 1
111
de cada nova fase do tópico, tal como no trecho (32). Essas.fórmulas determi-
(30) 1 Ll: ora a maneira do homem pré-histórico era ... BAsicameote eu preciso 11:un a própria orientação e relação dos suhtópicos, na n1edida en1 que se ser-
con1er ... vt•in de n1arcadores (por exeinplo, agora) para situar o ouvinte. O caso dos 1
2 e eu jJreciso: ... rne defender dos anin1ais e eu preciso n1c esquentar na 1rês segmentos de subtópicos no exemplo (32) é paradigmático. Aqui, a mãe
medida 1,
t'Stá falando sobre os filhos, suas atividades e seus pendores como tópico ge-
3 do possível. .. certo? ral. Mas ela faz isso em relação a cada um dos filhos. Para tanto, usa uma forma
(EF-SP-405: 109-113) padrão para introduzir os respectivos sub tópicos: agora ..
Seguramente, perder-se-ia muito da força ilocutória e da ênfase pretendida 1.\2) linhas 1291-1295
pela locutora, se ela tivesse dito: ora a n1aneira do ho1nem jJré-histórico (se1~ 1 Ll: agora o nzenino ,gosta muito de nzecânica
era basicanzente (inzagfJJ{ll) "eu preciso conzer, n1e defender dos animais e 2 o de treze anos né? gosta tnuito de mecânica
n1e esquentar na nzedida do possível''. Portanto, as autoras tê111 plena razão ao 3 gosta de mexer corn coisas ...
124
125
1 il
linhas 1367 -1369 15 coisa de divulgação: : on qualqner coisa mais fácil o povo todinho
4. agora a Laura não: se definiu que é n1uito pequena vai [ligar
5. a outra de nove quer ser bailarina 16 L2:
linhas 1416 -1417 Chacrinha
6 agora o Luis. l 7Ll: é o povo todinho vai ligar pra Chacrinha né ... o que é be1n o:
7 o de seís anos .. 18 sinal dos tempos do gênio da [ raça ,li
(D2-SP-360) 19 L2: \e: Ed.
,1
20 LI: eu noto porque eu tenho niuito tenipo de con1unicaçào:: .
O trecho (33) aparece no início de um di{i]ogo. De saída, as documentadoras 21 L2: éh a 111in1111e parece viu que você te111 razão até certo ponto .. até
havia1n proposto aos dois interlocutores, corno tópicos para discussão, os se- certo
guintes te1nas: 22 ponto/ eu sou partidário ac/Jo que con1unicaçâo a dois é sernpre
'i
23 a coJnzuzicação 1nais iJnjJortante ... especialrnente quando: ... bo111 .. 11
Doe. vocês podern falar sobre con1unicação .. transportes ... viagens 24 LI: bon1 é bo111 você não falar a gente falar pouco porque a tua nnilher 1
Após un1a série de trocas en1 que o tópico a ser tratado era negociado) 12 26 L2: agora ... quanto à co1nunicaçâo eu acho válida .. acho válida ... 1
11
dá início ao tópico escolhido sobre comunicação. 27 agora unza co1n1u1ícação fiscalizada essa co1nunícação de n1assa ,11
2
28 comunicação muito.fiscalizada [ .. \ o problema de transmitir [ Hmnlet ,,.,1
é sobre negócio de cornunicaçâo é? 29 J,J: r não eu sou contra 1
3 Ll: bo1n é: o tal negócio ... nós estatnos ... nesse nesse nesse século de 30 L2: na íntegra ... ou Chacrinha ... Chacrinha tem o público dele ... o que
4 con1unícaçâo ... e: ... pra 1ni111 pelo n1enos 1ne parece que co1nuní- 1!
31 1ne parece ilnportante é conduzir o público e1n tennos de un1a co- li
cação é
1nunicação 11
5 faca de doisgu1nes .... co1no conseqüência de un1a urna conzunicação
6 32 séria pra fazer com que o püblico aceite Hainlet. .. ou: ... cultura
nzuito intensa os Estados [nidos tiverai.11 a.lgu1n algu1n te1npo atrás ... 33 evidente1nente ... satisfatória ... e nunca Chacrinha se há Chacrinha
7 éh:: ... uma crise de cultura própria ... e foram obrigados a a a a:: ... 34 se há público pra Chacrinha é porque não l'Í havendo preparação ... não
8 importar homens cultos porque:: ... se eles não tinham analfabetos 35 tá havendo condução do público pra aceitar uma comunicação séria 1
9 ta111bén1 não tinharn grandes culturas ... eu nüo gosto de con1uni- então é preciso que essa con1unicação séria con1ece t ... ] eu por
36 1:,
126 ]?i
'1
í
11 li
44 política en1 que houve unia cons-cien-tiza-ção do povo para certos
45 ltc' l11rmar um subtópico dentro de um quadro tópico em andamento. Por outro 'I
proble1na.s ... o povo não n1ais votou ah: con10 protesto ... e não rnais
46 l~do, notamos que os itens condutores dos subtópicos mais repetidos distribuem- 111
votou e111 branco nern votou nulo i ... J realn1ente pra 1SSO a comu-
nicação "'' 1·111 duas classes de palavras, ou seja, notnes e verbos. As outras classes, tais
'!'..11:
47 foi válida [... até certo ponto [ ... ] é possível que a comunicação
1 01110 adjetivos e advérbios, não se caracteriza111 co1no condutoras de tópico. ti,, 1
4812 1 bom Ainda no caso de (33), o item lexical comunicação surge em ambientes
49 LI: seja boa ... agora como eu lhe digo porque isso aí fica na FAIXA da "l11Liliros diversos, nas produções de an1bos os falantes e na auto- ou hete- 1
53 a grande cultura a alta cultura 1w111111icação que se está falando. O mais provável é que a repetição reiterada,
54 L2: é agora eu não sei a que [ponto 1111:111do 1em referentes iguais e sentidos interligados e vier situada em posição de
55 LI: lopico sentencial, opere co1no estratégia de condução e 111anutenção do tópico
IL
1é mais fácil eu olhar [. 1lisrursivo.
"'
56 L2: é 1nas aí E. você ten1 o seguinte proble1na ... não só o problc1na de 1
quem O trecho acima foi analisado por Risso ( 1993, pp. 49-50) quanto à fun-
57 \ªº do marcador agora, tendo sido observado pela autora que esse marcador
:!
faz a comunicação mas o problema l .. j quem recebe a comuni-
caçâo '"vezes introduz discordância do interlocutor (linha 26) ou restrição à pró-
58 porque ... 1 ... ] pria assertiva (linha 27), o que caracteriza o marcador agora como desen-
radeador de variações na perspectiva da condução tópica, contribuindo assitn
59 LI: outro 111al outro nzal da con-1unicação con10 un1 todo li, nada ,,1
1
Note-se que no trecho acima o ite111 lexical co;nunicação apareceu preci- As repetições, sobretudo de orações) tên1 urn papel in1portante na con- ~
sa1nente 26 vezes en1 diversas construções e carregou consigo u1na série de dução da argu1nentação. Serve1n co1no estratégia para reafir1na1~ contrastar 1
11
outros itens correlacionados ao fenô1neno da co11111nicação, tais con10: 1111 co11testar argumentos. Prototípico é o trecho (34) com váriasR, cujo ob-
jetivo é reafirmar um argumento. O falante afirn1a que "a mercadoria nzais
. cultura e variações corno culto, incultura subcultura; cara ai11da é dinbeiro" (linhas 1 e 2) e se repete (linha 3), sendo reconfirmado
1
. televisão e enzissora; pelas repetições abonadoras do interlocutor (linhas 4 e 5), para reafirmar
, transmitir divulgar, divulgação; (linhas 8, 9, 10) sua assertiva inicial sem que novos argumentos sejam apre-
, povo e outros como público; sentados. Observe-se:
, Cbacrinba, Hamlet entre outros.
(34) 1 L2: a mercadoria mais cara no país.
Ao todo, esses itens soma111 42 ocorrências dentro de un1 mesn10 campo 2 inda é dinbeiro
!
lexical, sendo que cada uni desses itens vai se adensando nu1n certo n101nento co1110 é caro comprar dínbeiro
4 LI: é o negócio mais caro
li
128
129 l"i
1
111
5
6 L2:
inda é dinheiro 1171 o contraste se dá por substituição lexical inserindo itens antonímicos dentro ' li·
porque o dinheiro é tlln eleniento de troca ... certo? 1la 111('s1na proposta estrutural. 1]1
7 o dinheiro é u111 ele111ento de troca
oi
8 então .. a gente pra comprar dinheiro 1 171 l Ll: porque falar bem é bom ,,
11
9 agente paga ca::ro ... 2 falar 1nal não cornpensa não é? 1
10 você paga caro por dinheiro (D2-REC-266: 927) 'I
(D2-REC-05: 497-502) 1
Caso scn1elhante, mas con1 u1na inversão da estrutura (co1n un1 quiasn1a 1
Caso un1 pouco diverso, n1as relacionado a esse, é o que se observa em .. 111t;ilico), é o trecho (38) 1nuito freqüente quando se deseja contra-argu111entar: I ,
(35):
1 IH) 1 Ll: aqui só quem faz economia é o rico 1
130 tJt
(41) 1 LI: toda vez que posso viajar por terra não viajo de avião
O trecho (43) evidencia como o falante constrói suas estruturas dentro
2 L2: ah não eu não l 1ou por terra aonde eu posso ir de avião
d1· opções já antecipadas para realizar contrastes com n1aior ênfase.
(D2-REC-05 926-929)
Adiferença entre (39) e (41) acha-se precisamente no fato de em (39) ser ·1. 5 Interatividade
apenas um contraste estabelecido pelo mesmo falante entre duas opiniões, o que
lhe permite maior volume de repetição integral: já em (41) ternos urna contesta- Aproposta teórica deste trabalho pauta-se na perspectiva textual-interativa,
ção feita por um falante contra o outro. O contraste evidencia uma oposição de por se considerar que a atividade interativa é um aspecto central no processo
princípios, rna.') a contestação é a substituição de u1na assertiva por outra. Veja-se til' formulação do texto falado. Muitas das decisões tomadas pelos falantes de- 1'1
isto de 1naneira n1ais acentuada, até corno discordância brusca no caso de (42): v1·111-se a pressões de orde1n con1unicativa. ~leste caso, insere-se a repetição
,li
ro1n un1 variado nún1ero de funções voltadas particularmente para a pro1noção
(42) 1 LI: então eu acho um barato esse negócio de ... visitar parente entendeu? da interação, tais con10 expressar opinião pessoal, n1onitorar a to1nada de tur-
2 L2 não eu não gosto de visitar parente 110, ratificar o papel de ouvinte, incorporar ou endossar asserções do parceiro,
(D2-REC-.HO: 674-677) 111ostrar polidez etc. As R que promovem a interação são comandadas em boa
parte dos casos pelo princípio da preservação das faces, tal como proposto por
Observe-se o caso de (43), u111pouco111ais con1plexo que os anteriores, llrown e Levinson ( 1978), e são permeadas de marcadores ou atenuadores, ao
que n1ostra con10 un1 falante organiza seu discurso argurnentando e contra-ar- rontrário dos contrastes vistos acilna.
gu111entan<lo con1 base e1n auto-repetições sucessivas calcadas e1n oposições; AR que promove a expressão de opiniões pessoais divergentes é um
!"
(43) 112: renzédío que cura rnso típico e se manifesta sempre como hcterorrepetição. Veja-se o trecho (44) 11
2 é un1 renzédio barato situado no contexto em que L2, uma psicóloga de 25 anos vem expressando sua
3 opinião sobre as condições psicológicas dos indivíduos diante do (des)emprego. 1:
pode custar o mesmo preço que.for Ela inicia seu turno com u1na ressalva ao interlocutor Ll, engenheiro de 26 anos)
4 curou li'
marcando sua fala com um atenuador, "é mas a{ é o tal negócio''. Quando LI
5 curou
6 então é um remédio barato lo1na a palavra, inicia seu turno con1 n1odalizadores de atenuação "eu às vezes" 11
7 / "digarnos" para expressar sua divergência. Para tanto, utiliza a mes1na
8
caro <'strutura de base de L2 no início de turno:
é aquele que rnestno custando unz ou dois cruzeiros
9
li
não 1ne sirva (:i4) 1 L2: é mas aí:: é o tal negócio eu não me jJreocujJo muito com a média ...
não venha servir de nada 2 pra mim interessa::: o:: indivíduo né' salvação individual [ ... ]
12
este siln é que é uni re1nédio caro não é?
(D2-REC-266: 1933-37) 3 LI: é eu às vezes me preocupo com ... digamos com a média pelo
seguinte ...
As oposições aqui seriam: (a) remédio que cura é um remédio barato;
4 eu me preocupo com o que eu estou contribuindo com o be1n da média
não importa o preço. (b) remédio caro é um remédio que não cura; não
importa se custa barato. ou não
Ai estão três oposições nítidas: (D2-SP-343: 568-578)
1
(a) remédio barato Uma outra função, exercida agora pela auto-repetição, é a de monitorar
- re1nédio caro
(b) remédio que cura a tomada do turno. Esta estratégia se expressa por uma insistente repetição,
re111édio que não cura e111 sobreposição de vozes) corno se fosse un1 re_frão con10 se observa no
(c) custando qualquer preço - 1nesmo custanto pouco 1
fragmento (45):
132
tl3
: 1:111
5 L2: SE!Scentinhos ... ele disse" divide divide pelos quatro vê quanto dá'" )',\
(45) 1 LI: você leva a vida ... falsificando a cultura .. éh: ... éh::
4 ele disse "não:: é seiscentos pra cada u1n" "1
2 prostituindo a arte para levá-la ao povo pra cada um
3 L2: mas por quê? ... por que você não leva a cultura ao povo prin1eiro? 5 Ll: 11,i
8 L2: não tiver Sílvio [Santos o povo= LI repete L2 nas linhas 5 e 7 só para confirmar que ele pode prosseguir
9 LI: [ eu continuo achando !alando. Trata-se de un1a R con1 função de envolvi111ento e confinnação do outro \1\i.
10 L2: o povo vai ligar [pra tv universitária=
11 1.1: [ não eu continuo achando viu? ro1110 falante. I':
Existe un1a R interativa que opera co1no estratégia de incorporação de '11'1
12 12: pra Tom Jobim pra Chico Buarque llollanda [Caetano= ,,·11gestões, sobretudo en11non1cntos nos quais o falante parece estar em difi- '
13 LI: [ não! veja eu continuo achando ruldade (seja por problen1as de 1nen1ória ou de conheci1nento do assunto). Assi1n, 111
J4 L2: ora se vai eis contextos de hesitação são pontos propícios para este tipo de "socorro" ime- 1
15 Ll: viu E/ eu continuo achando que o Brasil só tem três problemas diat.unente incorporado, tal con10 ocorre seguidas vezes no trecho (47), reve- 111.
1111,
(D2-REC-05: 305-321) 1-17) 1 LI: [ ... ] agora ele quer ser MESmo pelo gosto dele ele gostaria de ser 1
2 jogador de futebol ( (1isos)) não é1 então ... ele::: troce ... pelo Palmeiras
Chega a ser irritante a insistência con1 que I,1 deseja ton1ar o turno e a 3 e é o:: ... o:: xodó dele é o ... [o verde e branco 11,11
rapidez com que fala L2 para impedir que o interlocutor tome a palavra. LI faz 4 L2: [ele joga? 11
1
a primeira tentativa na linha 4, quando discorda do colega dizendo "não por- e/e joga
5 LI: '11
que:: eu acho que" e aí L2 prossegue en1 sobreposição de vozes nun1to1n1nais
6 L2: ah
alto que 11 e vence o turno. Daí para frente, Ll não escutará n1ais o parceiro e 7 !.!: ele gostaria de:: jogar no::
repetirá 5 vezes a rnesn1a tentativa "eu continuo achando" para, final1nente, 8 L2: no dente de leite
con1 11111 1narcador de atenção (o non1e do interlocutor: "viu E.") ton1ar o turno 9 L l: no dente de leite .. . 111a.s o horário pra nü1n era ruin1 1i1
·1
e prosseguir falando. Mie-se a diferença entre (44) e (45), que servem a pro- 10 mas NO Palmeiras ele me fez [inscrevê-lo 11
pósitos semelhantes con1 estratégias opostas. 11 LZ: [então cortou uma vocaçào [ ((risos)) 1
lima função interativa muito comum das!/ é a de ratificação do papei de 12 LI: [não eu não cortei. 1
ouvinte e ela te1n o n1es1110 objetivo dos rnarcadores do tipo sitn, claro, ahã,
1 1
135
134
Ein suma) confirn1ando observações feitas en1 vários trabalhos, realizados
20 LI: salários dos::
''"''" membros do GT dedicado ao estudo da língua falada na perspectiva textual-
li\'
1
21 12: [jogadores 1111l·rativa1 pode-se dizer que a repetição não é un1 descontinuador textual, rnas 111,'
'1
.'r.
22 LI: [ele segue os salários dos jogadores .. através da:: ' l'I
principalmente uma estratégia de formulação do discurso oral sedimentada na
23 revista Placar ... é u1na revista:: 11
,1
'"i'l'rfície do produto material do texto como reflexo do processo desenvolvido.
24 12: especiali[zada em esporte
25 LI: [especializada em esporte ... então [ ... ] ' 11
1
posta P-R) que tem a função oposta do par (assertiva-pergunta A-P) visto no 1
trecho (36). Quando temos uma P-R, dá-se um caso normal de colaboração, ao .,1
I!,:
passo que uma A-P sugere dúvida, revide ou contestação sob o ponto de vista
interacional. Este é u1n aspecto irnportante nu1na grarnática ilocutória da fala. O 1',\
par das linhas 16-17 mostra um caso de polidez/atenção evidenciada na
:1l1
incorporação de uma sugestão que era u1na sin1ples paráfrase da fonnulação
proposta em sobreposição.
Como se constata, as R-in teracionais trabalham na linha das relações
1 1
1
tais co1no em to1nadas de turno) conclusão de unidades ou de turnos, en1 pares
adjacentes e correções, entre outras. 111
Após estas análises, seria esperançoso poder estar convencido de que não 1 ~ 1
parece equivocado afirn1ar que a repetição 1nostrou ser u1n indicador sistc1ná- 111
Entre as várias conclusões deste estudo, estão estas duas: a repetição tem 1
137
136
111·111/n1s do Projeto l\t'l~c aqui trabalhado compreende uma amostragem de dmii' horas, co111em-
pl.11ulo parks de 6 diálogos entre dois informantes (D2).
11lf.,1Tvaçües a este respeito podem ser vistas em Bessa \feto (1991, p. 127) qn~mdo a autora fala
11.1 "insislcnte lexica\ização da mesma observação'', com o objetivo de realçá-la.
tratamento mais completo desta questão consultem-se: Ramos (1983); i\orrick ( 1987);
l'.11".1 t1111
1'1.1vaglia ( l 988); Hilgcrt (1989); Tanncn (l 989); Bessa Neto (l 990; Marcuschi (l 992).
N:l11 li:í espaço para tanto aqui, mas seria de extremo proveito uma análise da entoaçi"to das uni-
1
1\.1dl's listadas. Aentoação constante com manutenção do tom no final da unidade projeta a con-
/11111idade da lista, ao passo que uma entoação dcscco<lcnte projeta a.finalização <l:1 lista e, às 11
11·11·~. sug,ere entrega <le turno.
j)11a1i10 à questão específica da parcntcti1.ação ou inserção (por muitos chama<la<lc desvio tópico),
N0111s -.11h o ponto de vista da seqüenciação e hierarquização túpica do texto falado. remeto aos trabalhos
1\c·Juhran (1993 e 1996).
l.!I
1.!i
1
Para maiores detalhes sobre a repetição de um modo geral, consultem-se os estudos de 1\far- l1!i
cuschi 0992), Ramos (1983), Bessa Keto ( 1991), Travaglia 0 988), todos enfocando a língua
por!uguesa. É fundamental ter J)re.scnte que a 11oção defotmulação cnvoll'c tanto os :t~pectos de
111
construção como de reconstruçã() textual. Co11tudo, a repetiçào stricto sensu é tida como estra-
tégi~t dej(Jrmu!ação apena:;, construindo os encadeamentos textuais. Somente num sentido muito
'1
amplo, não considerado aqui, ela é uma estratégia de reconstruçâo, envolvendo também a pará- I''
frase. Veja-se sobre isto Koch et al. ( 1990, pp. 158-17 2), Koch e Silva (J '>96) e llilgert 0 993). 11.'
As citações dos exemplos seguem sugestão de ,'t1arcuscl1i l 1992). Trata-se <lc uma disposição que
seqiiencia verticalmente o material lingüístico, com b:L"e na Gtlcgo1ia njJo/lçrTo, a fim de deixar ;·i-
sualmcntc evidentes as relações mútuas entre os elementos rl'petidos. Estes elementos vêm em itálico
quando se deseja indicá-los explicitamente. Em alguns ca~os, devido à extensão do trecho citado,
deixa-se de seguir a transcrição biaxial e opta-se pela linear. Quanto ao material, todo ele procede do 1
Projeto NuRc e sua identificação faz-se assim: D2= Düí!ogo entre dois informantes; EF= Elocuçôes 11 •
formais. \:i seqüência ve111 :1 cidade: REC = Recife. SP= São Paulo, o número do inquérito, as linhas 1
138
139
~"'·"·\.V. e S1Lv.1, M. C. !'. S. "Atividades de composição do texto falado: a elocução
formal", in A. T. de Castilho e M. Basílio (orgs.), Gramática do portu-
guês falado - Vol IV Estudos descritivos. Campinas: Ed. da U'tCAMP,
1996, pp. 379-410.
~hun sc111, L. A. Arepetição na língua falada: fonnas e funções. Tese para con-
curso de professor titular ein lingüística, UFPE. Recife, 1992.
No1rn11:1\, N. "Functions of repetition in conversation", Texf, 7, :1, 1987, pp. 245-64.
ll• 11s, li. "Planncd and unplanned discourse", in T. Givón (ed.), Discourse and
.1ynta.x. Nova York Academic Press, 1979, pp. 51-80.
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