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INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA DO CEARÁ

IFCE CAMPUS FORTALEZA


MESTRADO PROFISSIONAL EM ARTES

CARLOS AUGUSTO CRISÓSTOMO DE MORAIS

REGISTRO SONORO DE MÚSICA DE TRADIÇÃO ORAL:

REFLEXÕES E PRÁTICA DE UM ARTISTA DOCENTE

FORTALEZA 2019
CARLOS AUGUSTO CRISÓSTOMO DE MORAIS

REGISTRO SONORO DE MÚSICA DE TRADIÇÃO ORAL:

REFLEXÕES E PRÁTICA DE UM ARTISTA DOCENTE

Artigo dissertativo e produto apresentado ao


Mestrado Profissional em Artes do Programa de Pós-
Graduação em Artes do Instituto Federal de
Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE) -
Campus Fortaleza, como requisito parcial para
qualificação. Área de concentração: Artes. Linha de
Pesquisa: Processos de Criação em Artes.

Orientador: Profa. Dra. Maria de Lourdes Macena de


Souza.

FORTALEZA
2019
REGISTRO SONORO DE MÚSICA DE TRADIÇÃO ORAL
REFLEXÕES E PRÁTICA DE UM ARTISTA DOCENTE

Carlos Augusto Crisóstomo de Morais


RESUMO
Este artigo apresenta o resultado da pesquisa desenvolvida, buscando conhecer formas mais
adequadas para gravação de música tradicional e realização de um produto artístico constituído por
meio de registro sonoro de música de tradição oral. Neste, a técnica de gravação e coleta se juntam
ao conhecimento e sensibilidade do músico/artista/docente para o desenvolvimento e qualidade da
arte final. Teve como objetivo descobrir, verificar, qual a melhor forma e material para realização
deste tipo de registro, considerando as especificidades das expressões tradicionais e seus Mestres
buscando, com isso, contribuir para o conhecimento da imaterialidade deste patrimônio artístico
cearense e para melhor utilização desse material no ensino e criação em artes. O percurso
metodológico evidencia uma pesquisa qualitativa e etnográfica com estudos bibliográficos. Utiliza,
também, o processo técnico/artístico como metodologia de pesquisa, experienciando material,
tempo, espaço, acontecimentos e pensamentos únicos de cada experiência, utilizando do método
etnográfico descritivo, compartilhando o que foi entendido de cada fenômeno e ainda empregando
registro imagético de observações participantes realizadas. Como resultado final, são apresentados
cinco CDs contendo parte artística das experiências obtidas, acompanhadas das sínteses de
reflexões e notas em artigo científico. O produto artístico tem sua relevância na forma como
evidencia práticas musicais e saberes não hegemônicos, podendo contribuir para a descolonização
epistêmica dos estudos musicais.

Palavras-chave: Música de tradição oral. Patrimônio Imaterial musical. Registro sonoro.

SOUND RECORDING OF ORAL TRADITION MUSIC IN CEARÁ


CONSIDERATIONS AND PRACTICE BY A TEACHER AND ARTIST

ABSTRACT

This article displays the result of a research developed in the search for experiences which proved
more suitable as ways to record traditional music and produce an artistic outcome constituted by the
sound recording of oral tradition music. In this, the technique of recording and collecting sonorous
substance joins the knowledge and sensitivity of the musician / artist / teacher to operate the
development and quality of the final artistic outcome. Thus the aim of this work is to discover, to
verify which was the best way and medium for the accomplishment of this type of recording issue,
considering the specificities of the traditional expressions and their Masters, seeking to contribute to
understand the immateriality of this artistic heritage of Ceará and to better use this data in the
improvement of teaching and creativity in the art disciplines. The methodological course evidences
a qualitative and ethnographic research achieved through bibliographical sources. It also employs
the technical / artistic process itself as a research methodology, experiencing materials, time, space,
events and thoughts which were unique to each experience, taking the descriptive-ethnographic
method and sharing what was understood from each phenomenon and, finally, obtaining image
recordings of participant observations. As a final result we present five CDs containing an artistic
5

part of the experiences lived, accompanied by a synthesis of the reflections and notes included in a
scientific article. The artistic outcome proves its relevance in the way it shows musical practices and
non-hegemonic knowledge, and may contribute for an epistemic decolonization of musical studies.

Keywords: Oral tradition music. Intangible musical heritage. Sound recording.

1. INTRODUÇÃO

Fazendo uma reflexão sobre a influência das sonoridades da cultura popular tradicional no
meu fazer artístico, percebo que isso vem sendo sedimentado desde a minha mais tenra infância,
quando minha mãe ou minhas irmãs colocavam-me para dormir cantando cantigas de ninar.

Percebo tudo o que está em mim a partir do que ficou dos brinquedos cantados, das cantigas
de roda, das histórias de Trancoso que ouvia – dos bumba-meu-boi que passavam pelas ruas e me
causavam um misto de medo e fascínio, bem como dos pastoris, apresentados no Círculo de
Trabalhadores Cristãos, nas festividades natalinas do bairro; das rodas de coco que participava no
período de férias, na praia do Pecém, das quadrilhas ensaiadas e apresentadas no quintal da minha
casa, com direito a casamento matuto; tudo se reflete no que hoje sou e entendo como expressão
musical. Repercute também no meu fazer artístico, a sonoridade do violino tocado como rabeca
pelo meu pai, que foi uma constante em nossas vidas, já que ele tocava todos os dias, depois do
almoço, deitado numa rede para fazer a cesta. Nesse sentido, Richard Louv (2016) entendia que os
ambientes naturais eram essenciais para o desenvolvimento pleno das crianças envolvendo, nessa
perspectiva, a dimensão musical enquanto estrutura cognitiva essencial para o desenvolvimento,
com laços de imitação e repetição que são peculiares aos filhos.

Na adolescência, participei ativamente de movimentos e eventos culturais até ter certeza de


que queria aquilo para a minha vida profissional, época em que passei a fazer parte de grupos
parafolclóricos1. Os laços com essas sonoridades foram se estreitando cada vez mais e minha
admiração e respeito por aqueles que fazem essa transmissão oral crescia, à medida em que ia me
envolvendo.

A graduação em música veio de forma natural. Ali, no espaço acadêmico, aprendi a maneira
formal do conhecimento musical e pude assimilar conhecimentos muito distantes e diversos do
empirismo que me vinha acompanhando desde muito cedo.

Quando comecei a trabalhar, tanto como professor quanto como músico, não me dei conta,
inicialmente, de que o elemento que mais havia me ajudado no desenvolvimento do meu ofício fora,

1
Grupos artísticos que se utilizam de matrizes estéticas tradicionais como uma forma de revisitar expressões de dança e
música.
6

justamente, o fato de ter vivenciado muitas práticas que me deram uma riqueza de elementos
rítmicos e melódicos com várias nuances de possibilidades sonoras, fazendo com que encarasse
com naturalidade todo o percurso profissional até os dias de hoje.

Na década de 1980, participei do GTC, Grupo de Tradições Cearenses, entidade de utilidade


pública municipal sem fins lucrativos, fundada em 12 de outubro de 1966, na Casa de Cultura
Hispânica da Universidade Federal do Ceará que tem, dentre seus objetivos, o de pesquisar, recriar,
preservar e difundir manifestações folclóricas em geral e, sobretudo as cearenses, sem
descaracteriza-las. Passei a conhecer um pouco sobre algumas manifestações folclóricas do Ceará e
de outros estados do Brasil, chegando até a representar nosso país em Festivais Internacionais na
França, Suíça e Espanha.

No início da década de 1990, entrei para o GPTEC - Grupo de Projeção Folclórica da


Escola Técnica Federal do Ceará - onde me conscientizei da importância de valorizar as nossas
tradições e reconheci, com maior intensidade, o valor que têm aqueles que mantêm viva a chama da
cultura popular tradicional.

O GPTEC foi criado em 1982 e, na década de 1990, passou a se chamar Mira Ira, quando a
então ETFCE foi transformada em CEFET - Centro Federal de Educação Tecnológica. Hoje, o
Grupo Mira Ira é um laboratório híbrido que atua de forma abrangente no Ensino, Pesquisa e
Extensão, trabalhando em prol do conhecimento, reconhecimento, difusão e dinamização dos
fazeres e saberes tradicionais brasileiros, oferecendo a quem dele participa um leque de
oportunidades para o crescimento cultural e profissional.

Porém, foi no evento Mestres do Mundo, ocorrido em novembro de 2017, em Limoeiro do


Norte, que participando das rodas de som, reencontrei-me com minhas raízes. A partir daí, nasceu
em mim o desejo de divulgar, de alguma forma, para outras pessoas, aquilo que os Mestres tinham a
nos oferecer e ensinar.

Nesse evento, havia momentos em que os Mestres e seus grupos faziam apresentações
públicas. Nessas ocasiões, percebi que, quando as apresentações eram sonorizadas e, dependendo da
forma como era feita a sonorização, o público quase sempre perdia muito da sonoridade original e
da naturalidade das brincadeiras que aconteciam entre os músicos ou a interação com a plateia. Tal
fato gerou em mim a inquietação que motivou o presente trabalho de pesquisa. Isso acontecia,
geralmente, quando se tentava, na intenção de captar melhor o som, posicioná-los de uma forma
diferente da que eles estavam acostumados. Nessas ocasiões, percebi que, muitas vezes, os Mestres,
músicos e cantores tomavam uma postura diferente do habitual em seu ambiente natural, sem
7

sonorização. Essa mudança de posicionamento, provavelmente, interfere diretamente na emissão


sonora, já que alguns grupos estão acostumados a tocar e cantar movimentando-se o tempo todo.

Em que grau a timidez poderia contribuir para essa mudança comportamental do músico,
durante a arte de tocar em ambientes alheios ao seu cotidiano? Não é o objetivo deste trabalho,
discorrer sobre a timidez, mas julgo pertinente registar o que diz Silva (2014, p.452) quando
assevera que os tímidos não tinham lugar em sociedades belicosas, considerando-se que a coragem
é elemento essencial para o enfrentamento das adversidades. Ainda nesse sentido, Santo Isidoro de
Sevilha, apud LAUAND (2003, p. 14) expõe que tímido é todo aquele que teme intensamente,
“gelando o sangue”.

Quando um grupo se apresenta com toda sua movimentação, suponho ser necessário, por
parte do encarregado da sonorização, prévio conhecimento daquela manifestação, para que se
providencie um equipamento adequado, capaz de captar a produção musical do grupo o mais
próximo do som original, respeitando itens importantes como posicionamento e movimentação dos
participantes. Segundo Pinto, in verbis:

“[...]música é manifestação de crenças, de identidades; é universal quanto à sua existência e


importância, em qualquer que seja a sociedade. Ao mesmo tempo, é singular e de difícil
tradução, quando apresentada fora de seu contexto ou de seu meio cultural”. (PINTO, Rev.
Antropol. vol.44, no.1, São Paulo, 2001)

No entanto, é impossível não verificar que hoje se tornou visível a presença de Mestres da
tradição participando de eventos dos mais diversos fora do seu território, local onde realizam suas
festas, ritos e demais expressões. Tal fenômeno tem contribuído cada vez mais para a recriação
contemporânea dos folguedos tradicionais como bem evidencia Travassos (2004). É importante
destacar também que não apenas nas questões musicais específicas que se aponta, mas é preciso
verificar que, como enfatiza Macena (2018), “ a música é a cama onde tudo se deita”, estando ela
presente nas mais diversas expressões da vida do homem simples, como deixa claro a autora
mencionada em abordagens sobre Danças Dramáticas brasileiras que:

A música é a companheira constante desses personagens, pois dela dependem para


contracenar, seja com os companheiros com os quais se brinca, seja para interagir com o
público. Para aqueles que não utilizam texto escrito, a música passa a ser parte do que se
conta e se fala na representação dançada, gestualizada e mimificada, como ocorre com o
personagem Urubu na brincadeira do Boi em Fortaleza, que entra para agourar o boi morto
e toda a sua teatralidade é feita pela música que se canta enquanto seus gestos imitam o
urubu que procura comer a carniça do boi, para desespero dos brincantes e da plateia, que
tentam expulsá-lo. (SOUZA, 2014, p. 78)

Assim, retomo ao objeto da pesquisa, ao registro sonoro da música de tradição oral, e à


relevância deste trabalho, posto que, como foi destacado, a música tradicional contém elementos
8

muito além dos aspectos musicais em si, que retratam formas de vida, ritos, crenças, costumes e, na
maioria das vezes, instrumentação rústica advinda da inventividade e dos processos de criação
artísticas de técnicas próprias destas comunidades.

Tanto os grupos tradicionais quanto os parafolclóricos, encontram grandes dificuldades em


apresentarem-se em locais como praças públicas ou teatros, pois geralmente, a estrutura que se
monta segue o mesmo formato para outras de captação de som utilizadas em apresentações de
bandas com guitarras, baixos, teclados e bateria. A instrumentação deste tipo de conjunto musical
distancia-se, em muito, da formação e formatação dos grupos em questão que, geralmente, usam
instrumentos acústicos que sofrem com a dificuldade de propagação do seu som em ambientes não
adaptados para eles.

A presente pesquisa, de cunho qualitativo e caráter etnográfico, teve como objetivo principal
encontrar formas e equipamentos mais adequados à gravação de música tradicional e a realização de
um produto artístico constituído por meio de registro sonoro de música de tradição oral. Este foi
desenvolvido a partir das estratégias de captação de áudio, de forma que houvesse o mínimo de
interferência (da parte técnica na performance), mas com o máximo de qualidade no resultado do
objeto em questão, garantindo com isso, o registro de cada obra na forma mais próxima possível do
original. Ao final de tudo, entrego uma síntese por meio de um artigo científico dissertativo, com
descrição detalhada da pesquisa de campo, tendo como produto técnico/artístico, um conjunto de
cinco CDs, cujo título é Sonoridades da Música de Tradição Oral do Ceará, os quais contêm o
registro sonoro e resultado do estudo realizado, cujo detalhamento apresentarei mais adiante.

Em minha trajetória como músico e docente, fui desenvolvendo estudos em/sobre estúdios e
gravações. Aos poucos fui adquirindo equipamentos e aprendendo em atividade prática e inquieta,
sempre buscando qualificação do melhor registro sonoro. Hoje, com este trabalho, procuro
qualificação profissional abrangendo o universo do meu trabalho em si, envolvendo minhas práticas
e experiências como musico/docente/técnico de gravação, adentrando no universo da música
tradicional e tudo o que ela requer.

2. DESENVOLVIMENTO (REFERENCIAL TEÓRICO)

A arte, enquanto linguagem e comunicação, faz-se por meio de seus significados, aspectos
que foram tratados por Vygotysky (1945) em sua abordagem psicológica da arte, e complementados
por Bourdieu (1998) ao acrescentar ao tema o enfoque com o viés sociológico do capital cultural.
Sucintamente, pode-se inferir que o processo de significação da arte, nos moldes dos teóricos
9

citados, está inserido diretamente nas questões sociais, pois os agentes se constroem em razão de
interações entre a plasticidade e a representação. Portanto, valendo-me da visão de Bourdieu, meu
capital musical cultural, objeto deste trabalho, é fruto das minhas vivências familiares e do meu dia
a dia profissional, consolidando-se como a herança social que me permitiu conhecer e investigar as
nuances já referidas.

Pimentel (2015) diz que, embora os conhecimentos sejam construções sociais, dependem de
um movimento interno do sujeito resultando, dessa implicação, a importância de se estudar o
contexto onde efetivamente se processa a construção dos saberes, em espaços de interação que
denominou de ecossistemas, subdivididos em artísticos e estéticos.

Por tratar-se de um sistema de interdependências, se qualquer um dos elos for corrompido


haverá a necessidade de uma nova configuração que resultará em benefícios ou malefícios para
todos. Portanto, percebendo que tais alterações implicam readaptações, busco entender se a
mudança de ambiente, por parte dos artistas em questão, pode estar associada às modificações da
espontaneidade que ocorre com eles quando tocam em ambientes públicos, ou se isso se deve à
ausência de conhecimento por parte do técnico de som ou pela presença dos equipamentos de
captação sonora.

2.1 Música de Tradição Oral, o som, antropologia sonora

Quando penso nas questões relacionadas ao registro da música de tradição oral, imagino que
seja necessário esclarecer acerca do que o termo “música de tradição oral” se refere neste trabalho,
e para tanto, me utilizo do que Travassos diz a respeito:

A expressão ‘música de tradição oral’ é sabidamente imprecisa: afinal, todas as atividades


que classificamos socialmente como musicais dependem da comunicação de sons
percebidos pelo canal auditivo e, em larga medida, produzidos vocalmente. Mesmo assim, a
expressão tem sido usada para referir a todo o leque de atividades musicais ligadas à
sociabilidade vicinal e comunitária, a rituais e festividades; por conseguinte, atividades
musicais que não dependem do mercado nem da profissionalização dos músicos como
fornecedores de serviços e bens no mercado. (TRAVASSOS, 2007, p. 132)

Ou seja, a pesquisa estará voltada para elementos que se relacionam às músicas tradicionais,
tendo aqui como tradição o elemento ancestral musical que ainda permanece hoje na vida
sociocultural de algumas comunidades. Essa tradição Viva (BÂ, 2010) exige, pela sua
especificidade e particularidades, um conhecimento deste universo musical em particular, de
maneira que se possa fazer adequações de material, equipamentos e formas de registro para permitir
10

que este tipo de gravação corresponda o mais perto possível da realidade a que a expressão musical
se refere.

Existe uma diferença entre som e sonoridade. Segundo Tiago de Oliveira Pinto (1988),
quando se fala da antropologia do som surgem dois elementos: o som, enquanto fenômeno físico
inserido em concepções culturais, e o som culturalmente organizado pelo homem.

O que me atrai, neste trabalho, é a busca das sonoridades, tão particulares em cada
manifestação cultural. Sonoridades, essas que podem ser percebidas ao ouvirmos determinada
instrumentação e suas inúmeras possibilidades de combinações, formas de cantar sozinho ou em
grupos; em uníssono ou em duetos; forma de tocar e até na forma de dançar.

A música é um poderoso veículo de comunicação e cada povo tem sua forma de se


comunicar pelas suas sonoridades peculiares. “O fazer musical é um comportamento aprendido,
através do qual sons são organizados, possibilitando uma forma simbólica de comunicação na
interrelação entre indivíduo e grupo” (PINTO, 2001, p.224).

Existe hoje, por parte de alguns pesquisadores, significativa preocupação em manter vivas as
práticas antigas, ou seja, garantir a salvaguarda desse patrimônio imaterial que, segundo José
Rodrigues dos Santos, vem sofrendo uma grande defasagem devido à velocidade das mudanças.

O sentimento de perda que invadiu as gerações de adultos tem um duplo aspecto:


por um lado, o mundo material e simbólico em relação ao qual se construíram,
desmorona-se sob os golpes da ‘modernização’; por outro, os sistemas simbólicos,
herdados das anteriores gerações (nos quais as inovações introduzidas por cada
geração estão embebidas e permanecem em parte inacessíveis à sua consciência),
revelam-se não só desajustados às novas realidades como de difícil transmissão às
novas gerações. (SANTOS, 2010, p. 2)

Acredito que a questão sonora, como elemento importante do patrimônio imaterial, tem
impacto significativo no que diz respeito ao interesse do jovem pelas práticas antigas, pois, se
chegam até eles de forma distorcida e incompleta, podem não trazer nenhum atrativo ao seu ouvido
adestrado aos sons midiáticos.

É mais fácil um jovem ser atraído pelo som de uma guitarra com distorção, chorus e delay,
do que por uma rabeca com captação de contato; ou por uma bateria bem equalizada e com pedal
duplo, do que por um zabumba com sobras de grave.

O responsável pela captação dessa sonoridade deve levar em conta, não só a questão técnica
e de equipamentos, mas, acima de tudo, procurar preservar sua originalidade, respeitando seu
posicionamento de músico e sua movimentação. Querer posicioná-los de acordo com o
11

equipamento que se tem, provavelmente fará com que os músicos brincantes se sintam tolhidos em
seu habitual desempenho.

É muito comum acontecer em estúdios, mesmo com os mais experientes profissionais da


música, deslizes indesejáveis de execução musical, quando se diz a palavra: gravando! A
performance do artista fica comprometida, desencadeando, às vezes, uma série de erros, mesmo que
esse profissional tenha ensaiado muitas vezes.

É importante chamar a atenção para o fato de que

Além de tudo que é ensinado por meio das instituições formais, além muito além,
encontram-se os saberes e fazeres tradicionais. Estes, surgidos no dia a dia de
comunidades, de homens e mulheres que nasceram com o intuito de fazer a vida dar
certo. [...] A manutenção, uso e repasse destes saberes dependem do Mestre, o
detentor dos saberes ancestrais, de seus significados e ressignificação na
contemporaneidade. (MACENA, 2018, p 220)

Percebo que um Mestre, quando canta ou toca seu instrumento, traz na sua musicalidade
uma riqueza de significados impossíveis de serem decodificados em uma partitura – daí a
importância de uma boa captação, que nunca será igual à sonoridade acústica, mas pode chegar bem
perto.

Segundo SONODA (2008, p. 17) “...apesar de ser impossível o registro sonoro de uma
realidade acústica com total fidelidade, ao considerarmos as limitações auditivas do ouvido
humano, tais variações entre performances e gravações podem ser desprezíveis”.

A sonoridade produzida pelos músicos e cantores da cultura popular tem um colorido


especial, que você encontra principalmente nos seus ambientes naturais, nos ensaios que, aliás, são
levados muito a sério e muitas vezes é como se já fosse, na verdade, a brincadeira em si.

É um desafio captar esse som, com o mínimo de interferência possível, para que mais
pessoas possam ouvir e apreciar. Não se trata de captar essa sonoridade com a tecnologia mais
avançada ou de se contratarem os melhores técnicos, mas sim de tentar captar a energia que emana
das performances, quando executadas no universo daqueles que a produzem, privilegiando
naturalidade e espontaneidade.

Angela Lühning (1990) comenta, em seu artigo “Música: Coração do Candomblé”, que as
primeiras gravações foram realizadas em estúdios improvisados e que pouquíssimas gravações
foram feitas dentro do seu contexto, ou seja, durante as festas do candomblé. Nesses registros,
foram observados somente parâmetros da estrutura interna da música, deixando de lado outros
aspectos como sua função, seu uso e seu contexto.
12

No Ceará, temos esse tesouro vivo espalhado por todo o estado, principalmente na Região
do Cariri, onde podemos encontrar muitos grupos de Reisado, Bandas Cabaçais, Rabequeiros,
Poetas, Repentistas, Violeiros, Sanfoneiros e muitos outros artistas e grupos populares que vão
repassando seus conhecimentos pela tradição oral.

A oralidade é uma área de estudo que se desenvolveu no Ocidente a partir da década de 60


(sec. XX). Segundo Bonvini (2006) “nesse tipo de comunicação, o suporte da transmissão é a fala”.
Dessa forma, encontramos, principalmente no interior do estado, um celeiro de Mestres, os
detentores dos saberes ancestrais, que vêm em sua missão de vida, transmitir seus conhecimentos a
futuras gerações por meio da oralidade contribuindo na preservação desse patrimônio imaterial tão
importante para a nossa humanidade.

Segundo Macena Filha (2003), a sociedade brasileira passou a ter uma preocupação maior
com os Mestres, após a instituição do decreto Federal nº 3.5511, de quatro de agosto de 2000, que
instituiu a necessidade de projetos de identificação, reconhecimento, salvaguarda e promoção do
patrimônio imaterial do nosso povo. Na figura da identificação do Mestre, concentraram-se diversas
ações no Brasil, promovendo, de certa forma, a valorização de expressões culturais e grupos
espalhados em nosso território.

Aqui no Ceará ainda são poucas as pesquisas nessa área e o presente estudo pretende dar
uma contribuição no sentido de produzir um material que venha a valorizar e divulgar essa
produção de conhecimento.

A música produzida por essas culturas vai muito além dos seus aspectos sonoros. Seu
processo de transmissão se torna mais significativo do que o produto em si. Muitas vezes, a música
de determinada cultura, apresentada fora do ambiente daqueles que a produzem, não corresponde à
sua real sonoridade, podendo até construir uma imagem sonora distorcida perante o grande público.
Se é comum observarmos o despreparo técnico daqueles que estão manipulando os equipamentos
de som, imagine o grau de desconhecimento daquela manifestação ali realizada.

Acredito que seja imprescindível um conhecimento prévio das manifestações a serem


apresentadas para que possamos perceber detalhes de sua apresentação: tipos de instrumentos
envolvidos, se há movimentação, se tem solista ou coro, quando se toca e quando se fala, além de
outras nuances que por ventura ocorram durante as performances. Atentando para isto, é possível
melhorar qualitativamente a captação da sonoridade daquela manifestação, seja para gravação ou
sonorização de eventos, não se esquecendo, contudo, de minimizar a interferência causada pela
presença do técnico e do equipamento a ser utilizado.
13

A captação das sonoridades de tais manifestações nos seus ambientes naturais (terreiros,
localidades, comunidades, quintais etc.) deve ter a missão de, além de gravar com boa qualidade de
áudio, captar suas nuances e peculiaridades, mas interferindo o mínimo possível, posto que a
presença de um estranho à essa comunidade já caracteriza. certo grau de interferência

É importante destacar que, no que diz respeito ao registro sonoro da música de tradição oral,
não é desejo nosso realizar produção fonográfica para o mercado comercial, mas sim contribuir para
um registro etnográfico que possibilite estudos, reconhecimento e difusão dessa música. A esse
respeito, Sonoda (2008) corrobora e adverte:

Em Etnografias, gravações de áudio, geralmente, primam pela captação da acústica


característica do contexto de performance analisada. Tais gravações, em muitos casos,
possibilitarão estudos e pesquisas sobre a cultura em pauta. Portanto, modificações
acústicas entre a performance e o fonograma podem proporcionar constatações equivocadas
ou incoerentes sobre o objeto em estudo. (SONODA, 2008, p. 55)

Diante de tudo isso, fica claro a necessidade do estudo quanto a equipamentos, métodos e
processos para o registro adequado das distintas formas musicais e instrumentos que possuímos, de
modo a garantir a sonoridade necessária para compreensão destas.

2.2 A voz que vem da alma não espera pelo tom

Gostaria de registrar minha profunda admiração por todas as pessoas com as quais tive a
oportunidade de conviver, que fazem da vida uma entrega, levando a todos que quiserem a arte que
aprenderam e herdaram de seus ancestrais. Particularmente, falo dos que cantam e tocam de
maneira particular, que nunca frequentaram nenhuma escola formal de música. Para começarem a
cantar ou tocar, não necessitam de aparatos técnicos nem de estruturas midiáticas. Sua música vem
da alegria de transformar o que ouvem de sons que os rodeiam, em comunicação com seu interior.
A impressão que dá é que não existe diferença entre ensaio e apresentação, pois a energia
empregada para a performance é a mesma em ambos os casos.

O cantor não pede tom2 para começar. Parece estar sempre pronto para cantar sua loa,
canção, embolada ou o que quer que seja. Percebi, durante o tempo em que convivi com os Mestres,

2
“Tom”, como é compreendido na música popular, refere-se ao conceito de “tonalidade” da teoria musical ocidental:
“Termo que designa a série de relações entre notas, em que uma em particular, a ‘tônica’, é central. O termo se aplica
mais comumente ao sistema utilizado na música erudita ocidental, do séc. XVII ao XX.” (SADIE, Stanley. Dicionário
Grove de Música: edição concisa. Rio de Janeiro: Zahar, 1994)
14

que o tom em que começam a cantar, geralmente tem uma relação com o último que foi ouvido,
como uma quarta acima ou ainda em seu relativo. Por conta dessa suposição é que acredito que seja
esse um dos motivos de vê-los cantando muitas vezes em tons tão altos, a ponto de perderem a voz
ao final de uma apresentação.

Nem sempre, cantores de tradição popular contam com algum instrumento harmônico para
lhes auxiliarem na condução de uma tonalidade adequada à sua tessitura. Isso também contribui
para um esforço demasiado do cantor, que para se fazer ouvir, passa a disputar com instrumentos de
percussão, fato que o deixa em desvantagem na hora da performance, se não tiver um microfone
ligado a um amplificador.

Cabe aqui também ressaltar que esses cantores não usam somente a voz para passarem suas
mensagens, mas sim, todo corpo e alma, pois dançam e interpretam, enquanto cantam – algo bonito
de se ver.

Outro fato curioso que me chamou a atenção foi o de que, apesar da facilidade que hoje se
tem de se adquirir um afinador eletrônico, em nenhum momento presenciei nenhum dos rabequeiros
ou tocadores de viola, ou qualquer outro instrumentista de cordas, fazer uso de tal equipamento. No
entanto, sempre que tinham alguma oportunidade de tocarem juntos, todos os instrumentos estavam
afinados entre si, inclusive com o meu violão, quando tive a oportunidade de tocar com eles que,
diferente de todos, tinha sido afinado usando tal equipamento.

Cada um tem o seu jeito de tocar, e a técnica é a que brota naturalmente e se adapta ao
instrumento como se fosse uma extensão do corpo. Em suas composições, há uma presença
marcante de melodias modais3 e o ritmo predominante é o baião4.

3
“Termo para música baseada em um modo, ao invés de numa escala maior ou menor. Na tradição ocidental, aplica-se
basicamente à música que utiliza os modos eclesiásticos da Idade Média e do Renascimento […] e a obras que se
baseiam em elementos folclóricos da música, por exemplo, a ‘Canção mourisca’ de Pedrillo em O rapto do serralho, de
Mozart, as Fünf Stücke im Volkston para violoncelo e piano, de Schumann, um grande número de músicas de
compositores nacionalistas russos […] e de compositores como Vaughan Williams e Bartók. ” (SADIE, Stanley.
Dicionário Grove de Música: edição concisa. Rio de Janeiro: Zahar, 1994)
4
Ritmo tradicional nordestino de compasso binário, cuja figuração rítmica básica é
15

2.3. Ouvidos precursores

Falar sobre pesquisa etnográfica envolvendo captação de áudio de grupos de tradição oral e
não mencionar nomes como: Mário de Andrade, Luís Heitor, Theo Brandão, Carlos Sandroni, seria
fechar os olhos para a própria história dos registros nessa área. Refletindo sobre isso, e seguindo
algumas orientações, julgo pertinente discorrer um pouco sobre o caminho traçado no
desenvolvimento de suas pesquisas, e qual o impacto delas sobre trabalhos posteriores

Mario de Andrade, nome já bem conhecido do movimento modernista no Brasil, dentre suas
várias habilidades foi escritor, poeta, ensaísta, musicólogo, folclorista e o grande idealizador da
Missão de Pesquisa Folclórica de 1938, coordenada por Luís Saia e patrocinada pela Discoteca
Pública Municipal, pertencente à Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo. Os registros dessa
Missão, feitos em discos, filmes, fotografias são considerados os primeiros, no que se refere a
material áudio visual de Cultura Popular.

Percorrendo estados como Paraíba, Pernambuco, Ceará, Piauí, Maranhão e Pará, a Missão
de Pesquisas folclóricas abriu caminho para uma série de outros trabalhos que iriam fortalecer o
estudo etnográfico dessas manifestações como, por exemplo, a criação do Centro de Pesquisas
Folclóricas em 1946.

É importante salientar que as gravações obtidas em áudio vieram preencher uma lacuna
considerando-se que, antes da MPF, o material que se tinha para esse tipo de pesquisa, eram
notações musicais em partitura, o que para Mário de Andrade e Luís Heitor, era um método precário
para o registro de música folclórica.

Essas pesquisas causaram um grande impacto e uma grande revolução principalmente no


meio acadêmico, mostrando um Brasil autêntico, rico em diversidade cultural, interessante, que
precisava ser visto pesquisado, protegido e amado pelos próprios brasileiros.

Luís Heitor Correia de Azevedo, assumiu o cargo de professor de Folclore Musical da


Escola de Música da Universidade do Brasil, em 1939, onde criou e coordenou o Centro de
Pesquisas Folclóricas na mesma Universidade e foi redator da Revista Brasileira de Música.

Iniciou sua carreira como musicólogo, crítico musical e bibliotecário e não tinha muita
experiência com pesquisas folclóricas, até ser convidado a assumir o cargo de professor na
Universidade, fato que o fez se aprofundar no assunto, participando de vários eventos como, por
exemplo, da fundação da Comissão de pesquisas Folclóricas, junto com Mário de Andrade.
16

De 1939 a 1947 dedicou-se à docência e à coleção de gravações de Música Popular


Brasileira, percorrendo estados não cobertos pela MPF como Goiás, Minas Gerais, e Rio Grande do
Sul, e estados parcialmente cobertos como o Ceará. Tinha como meta, aumentar o material de
estudo à disposição dos folcloristas.

A temática da música popular e folclórica ganhou mais espaço na Revista Brasileira de


Música a partir do ano em que assumiu a disciplina de folclore musical na Universidade do Brasil,
em 1939. Antes, a música predominante no meio acadêmico era a música de concerto.

A respeito de suas gravações, Luís Heitor, assim como Mário de Andrade, contou com apoio
de instituições públicas, órgãos governamentais e até parcerias internacionais. Segundo Chaves
(2018), as viagens etnográficas de Luís Heitor foram patrocinadas por um convênio entre a
Universidade do Brasil e a Biblioteca do Congresso Norte Americano, por intermédio de Alan
Lomax, que emprestou equipamento de gravação e prestou ajuda financeira para duas de suas
viagens.

O material colhido nessas pesquisas, ia além das gravações em áudio, vídeo e fotos. As
anotações, cartas, diários de viagens, prestações de contas, traziam informações valiosas sobre os
bastidores dos registros sonoros em si, revelando um Brasil ainda desconhecido, mas rico em
saberes ancestrais.

Temos também a bela contribuição do Médico, Antropólogo e folclorista Theotônio Vilela


Brandão que, de maneira independente e apaixonada, realizou vários registros sonoros de reisados,
pastoris e, principalmente, de cantadores de Alagoas, tendo como colaboradores maiores Mestre
Manoel Lourenço, embolador de coco e cantador, e Mestre Manoel Floriano Ferreira (Mestre
Neném), considerado por Théo Brandão o maior cantador do sertão alagoano. Foi Secretário geral
da Comissão Alagoana de Folclore por indicação de Manoel Diegues Júnior, um importante nome
das ciências sociais no Brasil,

Diferente de Mário de Andrade e Luís Heitor, Theo Brandão não contava com nenhum tipo
de patrocínio e fazia a maior parte dos seus registros no seu apartamento ou no Engenho Boa Sorte,
de propriedade de sua família, onde viveu muitas aventuras na sua infância, assistindo a cavalhadas,
cheganças e pastoris, e usando um aparelho rec-play para gravar discos de acetato.

Chaves (2018) descreve no livro Enlaces (estudo de folclore e culturas populares), aspectos
do relacionamento de Théo Brandão com as pessoas que faziam as brincadeiras, e, reafirma o que
disse Dulce Martins Lama sobre o envolvimento do grande folclorista, que “ falando a cada um,
conhecendo seu nome, sua ocupação e até seus problemas, tornava-se realmente gente de sua
17

gente”. Era criado em torno dele um ambiente de confraternização e era tratado, não por acaso, por
Doutor Théo Brandão.

Théo Brandão não era musicólogo como Mário de Andrade e Luís Heitor, mas começou a se
utilizar de gravações, segundo o próprio pesquisador, por não ter a memória privilegiada de seu
primo José Aloísio Vilela e, mesmo não entendendo de música, tinha consciência de que,
posteriormente, aquele material seria muito útil para outros pesquisadores.

O que mais me chamou a atenção sobre o trabalho de Théo Brandão foi sua capacidade de
agregar e transformar suas atividades em verdadeiras performances nas quais, pesquisadores e
pesquisados envolviam-se de tal forma, que mais parecia um grande evento. Para CHAVES (apud
Fabian, 2013), “para que a pesquisa de campo e a documentação etnográficas possam acontecer é
imprescindível que o pesquisador e as pessoas pesquisadas coabitem um espaço e compartilhem
algum tempo”.

Por não contar com nenhum tipo de apoio de Universidade ou de Secretaria de Cultura, e por
razões financeiras, Théo Brandão, muitas vezes, teve de economizar o material, gravando apenas o
começo das músicas, deixando o restante para ser apenas copiado, poupando assim algumas fitas.

Mesmo com todas as dificuldades, Théo Brandão tinha a capacidade de criar, nos eventos de
gravações, proximidade e envolvimento pela produção sonora, o que o torna muito especial para o
trabalho aqui desenvolvido.

Isso não quer dizer que não havia envolvimento nas outras gravações. Afinal, as equipes
anteriores procuravam conhecer as manifestações alguns dias antes das gravações propriamente
ditas, criando uma relação entre pesquisadores e pesquisados. Mas Théo Brandão não precisava
pagar ninguém, ao passo que as equipes de Mário de Andrade e Luis Heitor possuíam até uma
tabela de preços para seus colaboradores.

Finalizando esse momento dedicado a aqueles que contribuem com suas pesquisas e
registros de áudio captados de grupos de tradição oral, farei uma pequena abordagem sobre um
trabalho que teve como objetivo traçar um panorama da música tradicional de Pernambuco e
Paraíba hoje, refazendo o percurso feito pela Missão de Pesquisas Folclóricas em 1938. Com isso,
foi possível fazer um quadro comparativo e perceber suas transformações nas últimas décadas.

Em alguns municípios dos estados da Paraíba e Pernambuco, nos anos de 2003 e 2004, o
projeto RESPONDE A RODA OUTRA VEZ, que teve como idealizador e diretor o Doutor Carlos
Sandroni, tomou como guia algumas cidades visitadas pela Missão de Pesquisas Folclóricas de
18

1938. Contudo, adotou uma ação diferente e continuada pelos pesquisadores locais, que o tornou
diferente do formato inicial.

Em Pernambuco, conseguiram revisitar Recife, Tacaratu e Arcoverde, todas cidades onde a


Missão fez gravações. Mas, na Paraíba o mesmo não aconteceu, pois esse Estado foi o mais visitado
pela equipe paulista. Mesmo assim, revisitaram as cidades de Cajazeiras, Pombal, Patos e Areia.

Foram usados como equipamentos de gravação um computador portátil, uma interface de


áudio com oito canais digitais e, em alguns casos, somente um gravador DAT e uma Unidade Móvel
do Núcleo de Etnomusicologia da UFPE. Algumas gravações foram feitas apenas com um gravador
DAT e um par de microfones.

Em algumas dessas cidades, a equipe teve o prazer de encontrar com familiares de


informantes do tempo da Missão e com alguns informantes5 que na época eram muito jovens, como
Dona Senhorinha Freire, que em cujos registros era a informante número 490 e na época tinha 20
anos, e seu Bio Saloia, informante 319, filmado na Barca da Torrelândia, na cidade de João pessoa.

O projeto teve apoio da PETROBRAS, e toda documentação poderá ser encontrada nos
acervos do Núcleo de Etnomusicologia da Universidade Federal de Pernambuco. Produziu 2 CDs,
frutos da pesquisa que se realizou em 2003 e 2004 em municípios dos estados de Pernambuco e da
Paraíba, nas igrejas, casas de família, escolas e clubes.

Observando estes estudos e registros realizados por outros estudiosos da cultura tradicional
popular, o presente trabalho desenvolvido serve para demonstrar que, muito ainda precisa ser feito
apesar do caminho já trilhado, pois ficou claro que os métodos, técnicas e equipamentos não dão
conta da variedade de sonoridades de tradição oral existentes no território brasileiro.

3. MÉTODOS, MATERIAIS, RESULTADOS E DISCUSSÃO

Considerando as particularidades e as experiências individuais do tema em estudo, percebi


que o melhor caminho para a pesquisa de campo seria a realização de uma investigação de cunho
qualitativo de nível descritivo, com caráter etnográfico, viabilizada mediante a observação
participante. Para concluir o processo, utilizei-me da análise dos conteúdos obtidos em todas as
experiências e estudos realizados.

5
Pessoas contratadas na época da Missão de Pesquisas Folclóricas para fazer a intermediação entre pesquisadores e
pesquisados.
19

Para chegar ao resultado final, além das estratégias expostas, participei de várias
experiências como mestrando e músico colaborador em eventos como: XI Encontro Mestres do
Mundo, realizado em novembro de 2017 em Limoeiro do Norte/CE; observador participante na
coleta em campo na Renovação6 do Mestre Aldenir7 em agosto de 2018 no Crato/CE; coordenador
da Roda de Sons no evento XII Encontro Mestres do Mundo em novembro de 2018 em Aquiraz/CE,
momento no qual realizei o registro sonoro da Banda Cabaçal Todos os Santos de Barbalha/CE;
técnico de gravação na apresentação ao vivo da Banda Cabaçal São José de Missão Velha/CE,
durante a realização da I Bienal Internacional de música do IFCE Paulo Abel do Nascimento, em
dezembro de 2018.

Nestas oportunidades, foram captadas várias horas de áudio com equipamentos distintos,
para que eu pudesse obter um grande leque de opções para análise, estudos, audições, observações e
reflexões no âmbito dos objetivos do trabalho. Nessas ocasiões, foram verificados ruídos, conversas
e palmas, em alguns áudios, mesmo depois de editados. Entretanto, isso se fez imprescindível de
constar no produto final para que pudesse garantir a ambiência necessária em todos os casos.

O produto artístico produzido como resultado da pesquisa compõe-se de uma pasta, com arte
exclusiva, contendo cinco CDs, três dos quais documentando a Renovação de Mestre Aldenir e, os
demais, o registro sonoro de duas Bandas Cabaçais: a São José de Missão Velha e a Todos os
Santos, de Barbalha.

Em minhas pesquisas de registros de música de tradição oral, feitos em áudio e vídeo por
outras pessoas, tenho percebido dois aspectos importantes a serem discutidos. No primeiro caso, em
se tratando de gravações apenas de áudio, observo uma grande diferença entre a sonoridade que se
ouve daquele objeto de pesquisa em seu ambiente original, e o mesmo gravado em uma mídia
(wave, mp3) ou em outro formato qualquer. Isso acontece, provavelmente, pelo simples fato de se
tratar a captação de áudio de um grupo de cultura popular tradicional como se fosse uma banda de
forró, por exemplo. Dispõe-se os músicos na frente de seus microfones, estáticos, para que não
comprometam o resultado sonoro final.

6
Por uma orientação do Pe. Cícero, o povo de Juazeiro do Norte - Ceará, tem como costume religioso a instalação da
imagem do Sagrado Coração de Jesus e Sagrado Coração de Maria na sala principal da casa. A cada ano, após a
chegada das imagens, cada família renova os votos com um ato festivo contendo comida, danças tradicionais, bebida,
músicas, orações cantadas, Bandas Cabaçais, ladainhas etc., e este rito é reconhecido hoje como Renovação
7
Considerado um dos mais importantes mestres de reisado do Cariri, recebeu o título de Tesouro Vivo da Cultura,
através da Secretaria da Cultura do Ceará (Secult) em 2004. Seu Reisado é o Reis de Congo e é natural de Juazeiro do
Norte-Ce.
20

A impressão que se tem, quando se conhece o grupo tocando em seu ambiente, é que ali, na
gravação, trata-se de outro conjunto, dada a diferença entre as duas sonoridades. Já no segundo
caso, em se tratando do registro em vídeo, a questão sonora vai para segundo plano, pois prevalece
no registro a questão visual e a música entra apenas como coadjuvante.

Embora a sonoridade dessa captação se aproxime um pouco mais do original que do


primeiro caso, geralmente não há uma preocupação com a qualidade sonora no que diz respeito a
detalhes da instrumentação e execução, o que faz parecer tudo igual aos ouvidos menos atentos.

É importante lembrar que, nos grupos em que a voz prevalece, os Mestres nem sempre
podem contar em seus ensaios com o auxílio de um instrumento harmônico que determine a
tonalidade em que vai puxar sua loa. Como se diz na linguagem popular, “vai só no gogó”,
acompanhado apenas por instrumentos de percussão.

Hoje, com os smartsphones e a expansão das redes sociais, é rápido e fácil captar um áudio
ou um vídeo e lançar no mundo de forma indiscriminada. O uso constante desses aparelhos para
ouvir música faz com que as pessoas tomem como parâmetro um som desprovido de algumas
frequências, onde se perdem, principalmente, aquelas mais graves, fazendo com que esse seja o seu
referencial sonoro, tornando-as menos exigentes em matéria de timbres.

Baseado nesses pormenores e vislumbrando uma contribuição à preservação desses bens


imateriais, resolvi experimentar possibilidades de captação de som com o mínimo de interferência
possível, alcançando resultados satisfatórios, usando vários tipos de microfones e de
posicionamentos, procurando manter uma relação de confiança entre as partes envolvidas.

Para que se proceda a uma boa captação, será necessário o conhecimento mínimo de
técnicas de gravação para que se possa usar um equipamento adequado na hora dessa captação.
Uma gravação externa, que será o nosso caso, requer alguns cuidados específicos como, por
exemplo, um tipo de microfone que seja adequado para cada situação. Os microfones estão
divididos em duas categorias básicas: os dinâmicos e os condensadores. Os dinâmicos são
microfones bastante ecléticos, usados em palcos. São mais robustos, suportam melhor as variações
de níveis de amplitude, mas não possuem a exatidão e clareza dos condensadores. Esses, por sua
vez, são mais frágeis, mas são mais precisos no que se refere ao resultado final. Por causa de sua
maior sensibilidade, capta melhor a ambiência, fazendo com que o som apreendido se aproxime
mais do acústico. Para funcionar, esse tipo de microfone precisa de uma alimentação extra de 48
volts, presente na maioria das mesas de som.
21

Existem, ainda, alguns tipos de microfones que diferem na sua especificidade. São os de
lapela8, os head set9 e os chamados shotguns10. O primeiro e o segundo, apropriados para captarem
o som mais próximo da fonte. Estes, absorvem menos ruídos periféricos, enquanto que o terceiro
pode se manter um pouco mais afastado da sua fonte sonora, desde que seja direcionado a ela.
Capta também a ambiência, mas não pode ficar tão longe, sob o risco de captar mais ruídos que a
fonte sonora desejada.

Na minha primeira experiência de captação sonora de manifestações populares no seu


ambiente natural, realizada na cidade do Crato, na região do Carirì, mais precisamente na casa de
Mestre Aldenir tive, além do prazer de registrar a festa da Renovação, a oportunidade de vivenciar
momentos preciosos, que serviram de aprendizado para as próximas práticas.

A cerimônia da renovação, acontecida no dia 20 de agosto de 2018, foi de muita importância


para a minha pesquisa de campo. Não somente por ser a primeira experiência de captação de áudio
de manifestações populares em seu ambiente natural, mas também pela riqueza de elementos e
situações que ali encontrei e que, certamente, nortear-me-iam nos próximos eventos. Isso sem
contar com a alegria e satisfação de fazer parte de um momento tão bonito e cheio de significados.

Percebi que o evento que tinha sido marcado para as 19:00 horas já havia começado há
muito tempo, pois por volta das 15h e 45min, hora em que cheguei, o clima naquela casa simples, já
toda enfeitada, era de festa e muita alegria. Bandeirinhas enfeitavam o alpendre e, na sala principal,
o altar, com as imagens dos Sagrados Coração de Jesus e Coração de Maria, que já abençoavam a
todos que ali entravam. Na cozinha, várias mulheres da comunidade, juntas à dona da casa,
preparavam em panelões a comida e o café para um batalhão que viria à noite.

Crianças brincavam num entra e sai frenético, mas isso não incomodava a ninguém, pois
traziam mais alegria ao ambiente. Aos poucos, o som de uma sanfona e zabumba ia ficando mais
intenso à medida que nós encaminhávamos até o quintal. Eram os músicos que ensaiavam para sua
participação logo mais na festa. O som dos instrumentos se misturava ao canto dos galos da
redondeza e ao latido de um solitário cachorro que reclamava da minha presença. Para dar
ludicidade aos festejos, o farfalhar do vento nas plantas completava a ambiência sonora que me

8
Pequeno microfone posicionado de maneira discreta, geralmente, no colarinho do usuário para captar bem a voz.

9
Microfone usado com apoio na cabeça deixando o usuário livre para se movimentar a vontade enquanto fala ou
canta
10
Microfone direcional bastante usado em gravações de Cinema e Televisão que tem a capacidade de captar detalhes
mesmo estando longe
22

transportava ao quintal da minha casa, no bairro do Pan Americano, em Fortaleza, recuperando


fortemente acontecimentos que estavam guardados em minha memória.

Ao ser apresentado pela professora Lourdes Macena ao Mestre Aldenir, dono da festa, tive a
nítida impressão de que já o conhecia há muitos anos, tamanha foi a empatia que senti naquele
momento. Parecia que, de alguma forma, todas aquelas pessoas ali presentes pertenciam a uma
mesma família. Passado esse momento de sondagem do ambiente, comecei a me organizar e
posicionar o equipamento, a fim de obter um bom resultado. Procurei ser discreto e interferir o
mínimo possível no desenrolar da festa.

A receptividade do dono da casa, que nos acolheu de forma tão calorosa, fez-me lembrar das
festas que vivenciei quando criança, no quintal da minha casa na periferia de Fortaleza. O
movimento de entra e sai daquelas pessoas que ali estavam para ajudar nos preparativos da festa, as
mulheres preparando comida e fazendo café, enquanto as crianças brincavam no terreiro, tudo me
remetia ao alvorecer de minha existência. Ao fundo, ouvia-se o som de uma sanfona e de um
zabumba que se misturava aos cantos dos galos e aos latidos de um cachorro magro amarrado a uma
bananeira. Todo aquele ambiente sonoro já ia me envolvendo, e eu apenas tinha acabado de chegar.

Depois de explicar o objetivo da minha pesquisa, comecei a montar o meu material na sala
da casa, onde se realizaria a parte religiosa da festa, a Renovação propriamente dita. Posicionei os
microfones com o cuidado de não interferir na espontaneidade dos participantes, mas de forma que
pudesse ter um bom resultado sonoro.

Fiquei um pouco triste ao saber que os grupos de Reisado, Maneiro pau e Coco se
apresentariam após a cerimônia, lá no quintal da casa, e ficaria inviável desmontar o equipamento
da sala e montá-lo fora, visto que haveria muita gente para assistir ao espetáculo, tornando
impraticável um bom posicionamento da minha logística técnica. No entanto, na hora de fazer os
testes com os microfones que havia levado, tive uma grata surpresa que acabou me dando uma ideia
de também gravar o momento das brincadeiras. Apesar de não terem como característica a captação
da ambiência, os microfones de lapela que havia levado faziam muito bem essa função, pois além
de terem longo alcance sem fio, permitiram que eu mantivesse a base do sistema de gravação na
sala, enquanto os levava ao espaço onde seriam realizadas as brincadeiras. Dessa forma, consegui
captar, embora usando equipamentos diferentes para cada momento, a sonoridade da cerimônia e
das brincadeiras ocorridas em ambientes distintos.

Apesar de tecnicamente não ter produzido um resultado satisfatório no que diz respeito ao
âmbito das frequências, a sonoridade captada se aproximou muito daquela realizada ao vivo, pois
23

captei o som do equipamento que eles usam normalmente em suas festividades, e esse era um dos
maiores objetivos deste trabalho. (ouvir apêndice 2 e 3)

3.1 A cerimônia

A primeira parte da festa foi precedida por uma contação de histórias encenadas por uma
atriz local, que nos proporcionou momentos de grande delicadeza, ocasião em que pude presenciar a
chegada das crianças, algumas já vestidas com trajes de suas danças.

Após essa introdução, as pessoas se dirigiram à sala, onde aconteceria a parte religiosa da
festa. Sem nenhum anúncio, começaram a cantar, fazendo com que eu perdesse, na gravação,
algumas palavras. A estratégia que usei, nessa primeira parte da festa, foi muito simples. Posicionei,
pela sala, dois microfones “overs” com a intenção de captar todo o ambiente, enquanto que um
“shot gun” foi direcionado ao centro do altar, onde ficaria a tiradeira11. Um quarto microfone, de
lapela, foi colocado em Mestre Aldenir. Afinal, ele era a pessoa mais importante da festa. O som dos
microfones estava sendo gravado simultaneamente, porém em canais separados para que depois eu
pudesse equilibrar os parâmetros de cada um.

Ali, entoaram vários cânticos, entrecortados por ladainhas puxadas pela tiradeira e
respondidas por todos. Percebia-se a predominância das vozes feminina e em uníssono, mas de vez
em quando, ouvia-se a voz de Mestre Aldenir fazendo uma segunda voz, uma sexta abaixo, dando
um colorido especial e marcando sua presença.

Os cânticos não eram acompanhados por nenhum instrumento e, certamente por isso, a
métrica das músicas muitas vezes era modificada para que a melodia fluísse mais rápido, dando a
sensação de que o tom de cada uma tocasse a nossa alma.

Ao final, cantaram os parabéns para o aniversariante, seguidos de vários “vivas”! O próprio


Mestre cantou uma peça do reisado, que logo foi acompanhada por todos, com direito a
acompanhamento de violão que surgiu de repente no meio deles.

Consolidando o final daquele momento, Mestre Aldenir fez seus agradecimentos e convidou
a todos para assistirem à brincadeira que se realizaria no quintal da casa. (Sugiro ouvir apêndice 1)

11
Pessoa que inicia as cantorias, as preces, as ladainhas e é seguida pelos os demais participantes.
24

3. 2. As brincadeiras

Prossegui com as experiências de captação de áudio para estudos e reflexões, agora nas
brincadeiras que se realizaram no quintal de sua casa. Chamam de brincadeiras as apresentações dos
grupos convidados para abrilhantarem a festa. Presentes ali estavam alguns grupos de Maneiro
Pau12, Coco13 e Reisado14, incluindo o Reisado do Congo, do próprio Mestre Aldenir.

Como eu não tinha equipamento adequado para fazer a gravação em dois ambientes
distintos, resolvi priorizar a gravação da parte religiosa da Renovação, já que era o objetivo
primeiro daquela pesquisa de campo a ser realizada. No entanto, vi a possibilidade de gravar
também as brincadeiras, já que havia levado alguns microfones sem fio e não seria necessário
deslocar todo o equipamento para o quintal da casa, apenas os microfones.

Não eram microfones adequados para a finalidade a que me propunha, mas foi o que
possibilitou fazer o registro sonoro das expressões culturais e, diga-se de passagem, foi o melhor
registro experimental que fiz, pois oportunizou-me um aprendizado valioso em vários aspectos além
do registro em si.

Contando com a ajuda da minha orientadora e de algumas pessoas ali presentes, coloquei em
cada uma delas um microfone de lapela e pedi que se aproximassem dos músicos para que eu
pudesse captar o som da festa a partir do ponto de audição de cada uma, em canais separados, para
posterior trabalho de mixagem. O resultado sonoro se aproximou muito do que se ouviu ao vivo,
pois houve uma soma do que era escutado da caixa, com o som ambiente, incluindo conversas.

Na caixa amplificada deles, ligaram um violão com cordas de aço e captador, um microfone
para a sanfona e outro para a voz, enquanto o zabumba tocava acústico, acompanhando tudo que se
tocasse, fosse xote, baião, marchinha ou rancheira.

De vez em quando, um dos espectadores ali presentes batia o pandeiro que havia levado, o qual se
encaixava bem em termos rítmicos e de frequências, mas ele só o fazia quando queria, deixando o
meu ouvido mal-acostumado. Havia uma participação muito intensa por parte dos brincantes que

12
Maneiro pau – Dança do cariri cearense feita em roda no qual todos os brincantes acompanham ritmicamente com
entrechoque de cassetetes que trazem nas mãos, os versos improvisados do Mestre.
13
Coco – Dança canto do interior nordestino. No Ceará ocorre no sertão e no litoral possuindo formas distintas de
construção dos versos, no entanto a predominância do tipo estrofe e refrão permanece com destaque para as
emboladas.
14
Reisado – “No Ceará o termo é utilizado para denominar o espetáculo que reúne inúmeros entremezes
(dramatizações) e peças (canções cantadas e dançadas)” (NUNES, 2014, p. 167) Para compreender também sobre Reis
de congo que se constitui de um cortejo peregrino empenhado numa guerra santa sugiro ver: Barroso (1996), Cordeiro
(2013) e Nunes (2014).
25

sempre cantavam junto de quem estivesse ao microfone, tornando as apresentações muito dinâmicas
– o que, notoriamente, contagiava os que assistiam e aplaudiam, devolvendo toda aquela energia.

A qualidade sonora não era muito boa, pois a caixa ficou sobrecarregada e, às vezes, dava
sinais de distorção na voz; noutras, surgiam as tradicionais microfonias, o que já é bem comum
nesse tipo de sonorização.

As apresentações iam acontecendo noite adentro, com muita organização e respeito entre os
grupos. Percebia-se grande confraternização entre os mestres que, apesar de terem seus próprios
grupos, ajudavam uns aos outros na condução das brincadeiras.

Reisados compostos só de crianças garantiam a continuidade da atividade votiva brincante,


enquanto um coco, só de senhoras, revelava a vitalidade e a força da mulher do campo, ocupando
seu espaço na cultura popular. Elas, além dos outros grupos de formação tradicional, mostravam
que no Cariri, a música de transmissão oral está muito viva e encantando todos aqueles que têm a
oportunidade de ver e ouvir.

Ao final dessa experiência, embora muito cansado, sentia-me em estado de graças


percebendo que, embora não tivesse gravado com as condições necessárias, vivenciara um
momento de muita beleza e respeito às tradições, ocasião em que as pessoas se tratavam com amor
e com delicadeza. (ouvir apêndice 2 e 3)

3.3 Banda Cabaçal Todos os Santos15

Por ocasião do XII Encontro Mestres do Mundo conheci, dentre vários outros grupos, a
Banda Cabaçal Todos os Santos, da cidade de Barbalha. Com uma formação bem tradicional de dois
pífanos, uma caixa e um zabumba, a Banda Cabaçal Todos os Santos deu-me a oportunidade de
poder captar o áudio de sua performance, bem como registrar algumas imagens. O local escolhido
para a gravação foi a Pousada do Sol, localizada na Praia do Presídio, em Aquiraz - Ceará, espaço
gentilmente cedido pela senhora Andrea Cardoso, pertencente à administração da Pousada. A
gravação foi realizada no salão de jogos, que naquele momento estava vazio, pois todos seus
hóspedes, com exceção dos componentes da banda em questão, haviam saído para um evento dentro
da programação do Encontro Mestres do Mundo.

15
A Banda Cabaçal Todos os Santos, tem uma formação tradicional de dois pifes, um zabumba e uma caixa, e é natural
da cidade de Barbalha, no Carirí. Seus componentes são: Zé Guida e Seu Antônio nos pifes, na caixa Vovô e no
Zabumba, Ednaldo. (Ver fotos no anexo)
26

Preparei meu material e me dirigi à pousada. Após alguns minutos, posicionei os microfones
da forma que me pareceu mais conveniente e estratégica: os overs, para captar o som da banda com
a ambiência; os microfones auriculares nos dois pífanos e microfones de lapela, para a caixa e o
zabumba. Esses últimos, colocados nos instrumentos, eram sem fio, assim como os auriculares. Eles
possibilitariam a movimentação dos músicos, caso viessem a dançar enquanto tocavam, o que me
parecia comum nesse tipo de banda. Notei que, nas primeiras músicas, eles ficaram um pouco
incomodados com os microfones colocados em cada um, pois não estavam acostumados com aquela
situação. Mas, à medida em que iam desenvolvendo o repertório, foram esquecendo o aparato
técnico e a música foi fluindo com mais naturalidade. Percebi que, apesar de tocarem uma única
música autoral, o repertório usado era basicamente do repertório popular apresentado nas emissoras
de rádio, reforçando o que já dizia Luís Heitor em, 1943: “O rádio, cuja força de penetração não
conhece limites, se encarrega de propagar seu tipo de música urbana pelo sertão”, o que me fez
pensar na audiência, penetração e poder de divulgação que ele ainda possui no meio rural.

Apesar de nunca ensaiarem, como disse Zé Guida, um dos componentes da Banda, o


entrosamento entre eles era impressionante, pois bastava soarem as primeiras notas de uma melodia,
para que cada um já soubesse, exatamente, qual seria a sua participação. Vale destacar que, neste
tipo de grupo instrumental o segundo pife, não raro, toca em intervalos de terças, quintas ou de
oitavas acima ou abaixo do primeiro pife, entrando em harmonia majestosa nas composições.

Os ritmos mais usados eram o baião, a marchinha, o xote, a rancheira ou valseado, e uma
espécie de marcha militar, quando tocavam algum hino. A zabumba usada nas bandas cabaçais
pesquisadas, tem um tamanho maior que as usadas nas bandas de forró de pé-de-serra. A forma de
tocar também é um pouco diferente, pois o zabumbeiro da Cabaçal, geralmente, deixa o couro
tocado pela baqueta bem solto, quase sem abafar, e usa muito o bacalhau16 com subdivisões, dando
um molho todo especial ao ritmo. A caixa, por sua vez, também faz esse papel de subdivisão, mas
sempre em sintonia com a zabumba.

Senti falta dos pratos, presentes em algumas Bandas Cabaçais. Porém, fui informado por
membros da banda que, às vezes, dependendo do cachet, não é possível levar todos os componentes
da banda. Nessas situações, infelizmente, o mais penalizado, quase sempre, é o tocador de pratos.

16
Vareta fina usada por Zabumbeiros para fazer variações rítmicas no couro do zabumba do lado oposto ao tocado
pela baqueta
27

A intenção de microfonar individualmente os membros do grupo e, paralelamente, captar o


som geral por meio dos microfones de ambiência, é a possibilidade de ter, no final do registro,
material suficiente para se fazer uma boa mixagem, equilibrando o som geral com o individual.

Ao escutarmos uma Banda Cabaçal tocando naturalmente, sem nenhuma captação por
microfones, percebemos que os instrumentos de percussão, por terem maior volume de som,
sobrepõem-se, muitas vezes, aos pífanos, que são os responsáveis pela melodia.

Quando colocamos microfones tradicionais, como os conhecidos SM58, para que os


músicos toquem parados e de frente para eles, podemos até captar bem o som, mas tiramos a
espontaneidade de tocarem se movimentando, que é o natural entre eles. Assim, com essa
formatação, podemos até comprometer a performance do grupo.

A proposta de captação individual, simultaneamente à gravação do geral, aproveitando a


ambiência, foi uma tentativa de levar ao público um som agradável e muito próximo do acústico,
para que possam valorizar esse tesouro sonoro que é uma Banda Cabaçal.

Acredito que, dessa forma será possível usar tal disposição em apresentações ao vivo,
fazendo com que o público consiga ouvir melhor, mediante um bom trabalho do operador da mesa
de som, cada instrumento em performance, favorecendo a difusão do conhecimento acerca destas
especificidades musicais comunitárias. (ouvir apêndice 4)

3.4 Banda Cabaçal São José17

A captação de áudio da Banda Cabaçal São José foi feita em uma apresentação ao vivo em
um espaço de convivência, no quinto andar do bloco das Artes do IFCE, por ocasião da I Bienal
Internacional de Música Paulo Abel do Nascimento, realizada nessa instituição. Foi uma
experiência muito interessante e diferente das demais, considerando-se que, ali, além de gravar, eu
havia assumido a responsabilidade de fazer a sonorização do evento.

Era a primeira vez que estava fazendo esse tipo de trabalho com aquele equipamento, que
era uma mistura do meu material com o disponibilizado pelo IFCE. O meu equipamento constava
de uma mesa digital de 12 canais, da marca Zoom (L12), com capacidade para gravar áudios em
canais separados, porém de maneira simultânea, sem a necessidade de estar conectada a um

17
A banda Cabaçal São José é natural de Missão Velha e sua formação também é nos moldes tradicionais, contendo
dois pifes, um zabumba e uma caixa e ainda de vez em quando usa também os pratos. Seus componentes são: Cícero
Ribeiro e Francisco nos pifes, Davi na caixa e Antonio Ericles no zabumba. (Ver fotos em anexo)
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computador. Funcionava, portanto, como mesa e gravador ao mesmo tempo. Além da mesa,
também levei dois microfones overs, dois pedestais e uma câmera de vídeo para registrar algumas
imagens.

Para facilitar meu trabalho, usei duas caixas amplificadas do IFCE para PA (public audition)
- sigla que significa som direcionado ao público - uma caixa amplificada para retorno, dois
microfones de lapela e dois head sets, além de dois praticáveis de madeira formando um pequeno
palco para uma melhor visibilidade dos artistas.

Quando os músicos chegaram, eu já havia montado e testado todo equipamento. Diante


desse quadro, tratei de conhecê-los para começar a criar um ambiente de confiança, à medida em
que ia me informando de como seria a performance deles, para daí criar estratégias de captação de
som.

Para a apresentação, usei a seguinte distribuição: dois microfones head set para os pifes,
dois de lapela para a percussão, além de dois overs posicionados estrategicamente nos dois lados do
palco, com o objetivo de gravar o som geral incluindo a ambiência, muito importante para uma boa
mixagem no final.

A participação do público também foi captada para dar mais naturalidade ao resultado final
que, a meu ver, ficou satisfatório tanto pela qualidade técnica, quanto pela performance dos músicos
que fizeram uma bela apresentação contagiando todos ali presentes. (ouvir apêndice 5)

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os resultados obtidos com este trabalho, ao mesmo tempo em que encerram


um ciclo, abrem as portas para novas perspectivas. Envolver-me com esse universo de sons
e de pessoas, proporcionou-me imensa satisfação e um desejo de conhecer cada vez mais os
caminhos que me aproximaram deles.

Os erros e acertos cometidos durante todo processo serviram de estímulo para


que eu pudesse melhorar a cada dia nessa busca de conhecimento. Quanto aos Mestres, só
tenho a agradecer por serem guardiões desse tesouro chamado cultura popular que tanto me
encanta e me faz sentir orgulho daquilo que sou.
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Acredito que, com esse trabalho, estarei apresentando a minha parcela de


contribuição para aqueles que, futuramente, queiram se aventurar ao estudo desse universo
de sonoridades de um povo ou de um grupo que usa a transmissão oral como única forma de
repassar seus conhecimentos ancestrais, assim como outros trabalhos anteriores que me
encantaram e inspiraram.

Esse produto se destina a professores, pesquisadores, amantes das sonoridades


tradicionais e a quem necessita ter um contato mais aproximado com a música de tradição
oral e não teve a oportunidade de ouvi-la pessoalmente. É comum encontrarmos casos em
que o pesquisador visita uma comunidade e desfruta de momentos inesquecíveis com seus
saberes e sonoridades. Maravilhado com essa experiência, esse pesquisador adquire
produtos como instrumentos e CDs que possam ajudá-lo a reproduzir, para outras pessoas
aquela manifestação pesquisada. No entanto, ele descobre, ao ouvir os CDs adquiridos, que
o que se ouve não corresponde ao que ele ouviu no ambiente original da pesquisa. Isso
normalmente acontece quando grupos de tradição oral gravam em estúdios, cujos técnicos
não levam em consideração o conteúdo do trabalho, priorizando apenas o padrão técnico de
gravação. O resultado dessa produção é um som incompatível com a realidade sonora
daquele grupo.

Ao contrário do exemplo acima, o trabalho aqui realizado procurou aproximar o


resultado de suas captações aos de suas fontes naturais de produção sonora, para que o
ouvinte possa fazer uma leitura mais adequada a partir do que se ouve.

Um grande aprendizado nesse trabalho foi a certeza da necessidade de imersão no


ambiente cultural dos grupos investigados para entender a natureza de sua produção sonora.
Tal entendimento vai orientar o que captar, como captar, que equipamentos usar, como
editar...

O produto consiste em uma pasta, confeccionada em papel reciclado, contendo um


artigo descritivo de todo processo, além de uma coletânea de cinco CDs como apêndice, que
registram os áudios das captações realizadas nos grupos aqui pesquisados. Cada CD possui
uma sonoridade bem particular e demonstra seu conteúdo de maneira natural, alguns até
fugindo do padrão de gravação convencional.
30

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BÂ, A. Hampaté. A tradição viva. In: História geral da África, I: metodologia e pré-história da
África. (et al) Editado por J. Ki-Zerbo. 2ª. edi.rev. – Brasília: UNESCO, 2010. P. 167 a 212.

BARROSO, Oswald. Teatro como encantamento: Bois e reisados de caretas. 1.ed. Fortaleza:
Armazém da Cultura, 2013.

BARROSO, Oswald. Reis de Congo. Fortaleza: Ministério da Cultura/Faculdade Latino-


Americana de Ciências Sociais/Museu da imagem e do som, 1996.

BONVINI, Emilio. A formação da Língua Portuguesa, 2006.

BOURDIEU, Pierre. A escola conservadora: “as desigualdades frente à escola e à cultura. In:
POUILLON, Jean. Escritos de educação, Petrópolis: Vozes, 1998.

LAUAND, J. Educação Medieval. Textos e Temas. São Paulo. Editora Mandruvá, 2003, p. 14.

LOUV R. A última criança na natureza: resgatando nossas crianças do transtorno do déficit


de natureza. São Paulo: Aquariana, 2016.

LÜHNING, A. (1990). Música: coração do candomblé. Revista USP, (7), 115-124.

OLIVEIRA PINTO, T. de. Berimbau e Capoeira, (gravação e texto do LP), Instituto Nacional do
Folclore, Rio de Janeiro, Funarte, 1988.

MACENA FILHA, Maria de Lourdes. O potencial turístico das festas populares de Fortaleza.
Fortaleza, 2003.

MACENA, Lourdes. Mestres, saberes e vida real: reflexões necessárias para ações de salvaguarda
p. 220 - 225. In: X Encontro Mestres do Mundo, Mestras e Mestres da Cultura Tradicional
Popular: saberes para todos os tempos. CARVALHO, G., MACENA, L., CASTRO, S. Traduzido
por Samuel Martins. Fortaleza:Instituto Sociocultural e Artístico do Ceará, 2018.

NUNES, Cícera. Reisado cearense, uma proposta para o ensino das africanidades. Fortaleza:
Conhecimento Editora, 2014.

PIMENTEL, Lucia Gouvêa. Fugindo da escola do passado: arte na vida. In Revista Digital do LAV,
Santa Maria (RS) vol. 8, n. 2, p. 5 - 17. – mai/ago 2015.

PINTO, Tiago de Oliveira. Rev. Antropol. vol.44 no.1. São Paulo, 2001.

SILVA, D. da. De onde vêm as palavras: origens e curiosidades da língua portuguesa. 17ª ed.
Rio de Janeiro. Lexikon, 2014, p. 452.

SANTOS, J., & Cabeça, S. (2010). Conservação, salvaguarda, criação e culturas orais: uma
aproximação conceptual. In International Conference on Oral Tradition (pp. 1–20). Ourense:
Concello de Ourense.

SONODA, André Vieira. Processos fonográficos e musica de tradição oral. João Pessoa, 2008.
149f. Dissertação (Mestrado em Música) – UFPB – CCHLA. Disponível em;
https://repositorio.ufpb.br/jspui/bitstream/tede/6624/1/arquivototal.pdf
31

SOUZA, Maria de Lourdes Macena de Souza. Sendo como se fosse – as danças dramáticas na
ação docente do ator professor. Belo Horizonte, 2014. 295f. Tese (Doutorado em Artes) EBA.
Universidade Federal de Minas Gerais. Disponível em:
http://www.bibliotecadigital.ufmg.br/dspace/handle/1843/JSSS-9GFHGX

TRAVASSOS, Elizabeth. Recriações contemporâneas dos folguedos tradicionais: a


performance como modo de conhecimento da cultura popular. In: TEIXEIRA, João Gabriel L.
C. et al (org). Patrimônio Imaterial, performance cultural e (re)tradicionalização. Brasília: ICS –
UNB, 2004.

TRAVASSOS, Elizabeth. Tradição Oral e história. Revista de história 157 - Dossiê, São Paulo:
USP, 129 – 152, 2007.

VYGOTSKY, Lev S. Obras Escogidas. Madrid: Visor, 1995.


32

APÊNDICES

CD contendo o áudio da primeira parte da Renovação de


Mestre Aldenir - Cânticos e rezas.

APÊNDICE 01 Disponível em:

https://soundcloud.com/carlinhoscrisostomo/sets/renova
cao-de-mestre-aldenir-primeira-parte

CD contendo o áudio dos Grupos convidados de Mestre


Aldenir na Festa da Renovação - Reisado, Coco e
Maneiro-Pau
APÊNDICE 02
Disponível em:

https://soundcloud.com/carlinhoscrisostomo/sets/renova
cao-de-mestre-aldenir-segunda-parte

CD contendo o áudio do Reisado Reis do Congo de


Mestre Aldenir

APÊNDICE 03 Disponível em:

https://soundcloud.com/carlinhoscrisostomo/sets/reisado
-reis-do-congo-de-mestre-aldenir

CD contendo o áudio das músicas executadas pela


Banda Cabaçal Todos os Santos de Barbalha

APÊNDICE 04 Disponível em:

https://soundcloud.com/carlinhoscrisostomo/sets/banda-
cabacal-todos-os-santos-de-barbalha

CD contendo o áudio das músicas executadas pela


Banda Cabaçal São José de Missão Velha

APÊNDICE 05 Disponível em:

https://soundcloud.com/carlinhoscrisostomo/sets/banda-
cabacal-sao-jose-de-missao-velha
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ANEXO I – Registro imagético das experiências

Fig. 1. Autor estruturando equipamento na casa do Mestre Aldenir

Fonte: Acervo do autor

Fig. 2. Sala da casa de Mestre Aldenir


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Fonte: Acervo do autor

Fig. 3. Criança com roupa do Reisado ouvindo a gravação em tempo real

Fig. 4. Mestre Aldenir e o Autor da pesquisa na sala onde ocorreu a Renovação


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Fig. 5. Banda Cabaçal Todos os Santos de Barbalha/CE

Fig. 6 Banda Cabaçal São José de Missão Velha/CE


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ANEXO II – Tabelas com equipamentos usados nas gravações

1. RENOVAÇÃO DE MESTRE ALDENIR

Equipamento Marca

01 Mesa de Som e Placa de 12 canais Phonic Helix Board 12

01 Notebook PC HP Pavilion Entertainment PC

01 Microfone Condensador ( Over ) C 100 AKG

01 Microfone Condensador ( Over ) Sem marca definida

01 Microfone Shot Gun ( Unidirecional ) Sound Voice MSG 36

04 Microfones Head Set sem fio Karsect

01 Headphone ( Como monitor ) AKG

04 Pedestais Girafa -

02 Filtros de linha -

02 Extensões -

2. BANDA CABAÇAL TODOS OS SANTOS

Equipamento Marca

01 Mesa de Som e Placa de 12 canais Phonic Helix Board 12

01 Notebook PC HP Pavilion Entertainment PC

01 Microfone Condensador ( Over ) C 100 AKG

01 Microfone Condensador ( Over ) Sem marca definida

04 Microfones Head Set sem fio Karsect

01 Headphone ( Como monitor ) AKG

04 Pedestais Girafa -

02 Filtros de linha -
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3. BANDA CABAÇAL SÃO JOSÉ

Equipamento Marca

Mesa De 12 canais com gravação interna L 12 ZOOM

01 Microfone Condensador ( Over ) C 100 AKG

01 Microfone Condensador ( Over ) Sem marca definida

02 Microfones de La Pella sem fio Karsect

01 Microfone Dinâmico Shure Beta SM 57

01 Headphone ( Como monitor ) AKG

02 Pedestais Girafa -

02 Filtros de linha -

01 Caixa Amplificada Oneal


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ANEXO III – Fotografias da pasta entregue no ato da defesa, como parte do produto

Fig. 7 Frente da pasta

Fig. 8 Costas da pasta

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